documento protegido pela lei de direito autoral karina beringuy da silva os arquÉtipos femininos...

52
Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve e A moça tecelã. Rio de Janeiro 2002 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

Upload: doandung

Post on 21-Jan-2019

218 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

Karina Beringuy da Silva

OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma

leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve e A

moça tecelã.

Rio de Janeiro

2002

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

Page 2: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

2

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO VEZ DO MESTRE

OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma

leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve e A

moça tecelã.

OBJETIVOS:

Estabelecer uma ligação entre os contos de fada e as

imagens arquetípicas femininas, construídas ao longo de

milhares de anos no inconsciente coletivo, e de como

essas imagens são importantes para estabelecer uma

ligação da mulher com o arquétipo que mais fala ou seu

inconsciente. Objetiva-se desenvolver uma narrativa

onde fique claro para o leitor que cada um dos contos

desenvolvidos trabalha com um tipo diferente de imagem

arquetípica feminina.

Page 3: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

3

AGRADECIMENTOS

A todos os amigos que contribuíram com esse trabalho,

emprestando suas narrativas e suas histórias de fadas e

de vida, para que aos poucos eu fosse conseguindo

montar esse quebra-cabeça; aos professores que

sempre ofereceram o máximo de si. Ao Conte-reconte –

Contadoras de Histórias, que começou tudo; e a Deus

em primeiro lugar, que fez e faz com que tudo seja

possível.

Page 4: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

4

DEDICATÓRIA

A Ricardo, pela paciência, dedicação absoluta, carinho e

amor com que me ajudou na realização deste trabalho e

em tantos outros aspectos da minha vida, principalmente

nos que dizem respeito ao coração e, sem o qual, eu

não teria conseguido identificar minhas próprias imagens

arquetípicas. E aos meus pais, que me permitiram

conhecer todos os contos de fadas e agüentaram todas

as minhas fases princesa desde “Cinderela”, até “A

moça tecelã”.

Page 5: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

5

RESUMO

Este trabalho nasce com a idéia de desvelar o que existe por traz da

natureza feminina mais primitiva. Todas as histórias inseridas aqui são

histórias tão antigas que ninguém sabe ao certo quando começaram a ser

contadas.

Na verdade, onde e quando essas histórias começaram a ser

contadas não importa tanto para nós aqui, o que importa e faz muita

diferença para nós é – a forma como essas histórias atingem nosso

inconsciente. A forma como somos afetados por elas. É isso que teremos

dentro dessas cinqüenta e poucas páginas. Uma sucessão de contos e suas

respectivas leituras simbólicas, aliadas a idéia de transmitir uma carga

feminina a esses aspecto simbólicos.

A idéia do arquétipo feminino surge com um trabalho realizado com

um grupo de contação de histórias a mais de três anos. São quatro mulheres

que contam e cantam histórias e que ao longo do tempo, foram descobrindo

que uma história tem mais a cara de uma que de outra. Que uma outra

história não poderia nunca ser contada por aquela – não fazia parte dela.

Aos poucos foi se percebendo que determinadas histórias deveriam ser

contadas por uma determinada contadora, senão não convenceriam o

público. Algumas histórias pertenciam mais a uma que a outras. E então se

fez a fatídica pergunta: por que?

E pesquisando, descobriram-se as teorias Junguianas e o conceito

que faltava: o arquétipo. Aquela determinada história só poderia ser contada

por uma contadora específica por que de alguma forma aquela contadora

encarnava aquele personagem; por que de alguma forma ela dava vida a

ele.

Aconteceu então a idéia de fazer uma monografia juntando coisas tão

pertinentes ao contexto: arquétipos, mulheres e histórias. E aqui estamos.

Page 6: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

6

METODOLOGIA

A metodologia utilizada se destina a estabelecer pontos de tangência

entre os conceitos de arquétipo e sua aplicabilidade de análise em contos de

fada que retratem de algum modo a natureza feminina, levando em

consideração experiências de cunho pessoal e teórico.

O desenvolvimento se dá passo a passo introduzindo primeiro a

questão da arteterapia e seu processo terapêutico, depois falando sobre os

arquétipos, e por fim sobre os contos de fadas e os arquétipos femininos

contidos neles.

A proposta deste trabalho é concentrar um volume de informações

suficiente para que possamos entender como o arquétipo e o símbolo são de

fundamental importância para o desenvolvimento da psique, e como as

figuras femininas aparecem nesses contos revestidas de tantas

possibilidades, quando de versões para as histórias de fadas.

É importante ressaltar que um prévio conhecimento dos temas em

questão seria interessante para a compreensão mais abrangente do tema,

mas que uma consulta aos livros identificados na bibliografia podem resolver

qualquer problema que possa vir a ocorrer.

Page 7: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

7

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 09

SOBRE ARTETERAPIA 12 SOBRE ARQUÉTIPOS 15 SOBRE CONTOS DE FADAS 20 CONCLUSÃO 48 BIBLIOGRAFIA 50 ÍNDICE 52

Page 8: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

8

Conta um mito grego que há três deusas irmãs,

denominadas as Moîras que personificam o destino.

Seus poderes são de tal forma inquestionáveis que nem

mesmo os deuses as podem inquestionáveis que nem

mesmo os deuses as podem contrariar sem que isso

coloque em perigo a ordem universal.

Donas incontestes do destino do homem, as três Moîras,

cumprem impassíveis, cada uma a sua função:

Cloto – a fiandeira – segura o fuso e vai puxando o fio da

vida do homem a partir de seu nascimento;

Láquesis – a sorteadora – enrola o fio da vida e sorteia o

momento da morte; e

Atròpos – a inflexível – corta o fio da vida no momento

certo.

Quando Cloto escolhe fios de cores suaves para colocar

no fuso, os dias são felizes e amenos, mas quando ela

escolhe tecer com fios escuros, os dias se tornam tristes

e pesados.

Page 9: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

9

1 INTRODUÇÃO

“Era uma vez”. A maior parte das histórias que conhecemos, e

principalmente os conto de fada começam assim: Era uma vez. Por que?

Esse trabalho não tem como objetivo principal resolver essa questão, mas

por quê a ausência do era uma vez faz algo não conectar em nossas vidas.

Por que precisamos da narrativa do conto para estabelecer paralelos com

nossa própria vida?

As dificuldades deste trabalho foram inúmeras. A primeira delas foi que,

com a experiência de contadoras e colecionadora de histórias; e de amante

dos contos de fadas, a idéia de escolher apenas um conto para colocar aqui

com a função de ilustrar a imagem arquetípica, se avistava para mim como

algo impossível – e foi. Tanto que encontraremos no decorrer do trabalho

três contos de fada clássicos (Cinderela, A Bela Adormecida e Branca de

Neve) e um que determinei de um conto de fadas moderno (A moça tecelã).

A idéia principal de caracterizar apenas os arquétipos e especificá-los

foi perdendo território, para a idéia de revelar no texto a relação dessas

figuras femininas com a sua saga, com a sua própria história.

Impressionante é que tanto os contos contados e recontados por gerações,

quanto o moderno conto, tem uma estrutura narrativa e simbólica muito

semelhantes.

A forma como a mulher é abordada nesses contos, aparecendo em

forma de donzela ou em forma de bruxa é recorrente. Figuras arquetípicas

presentes no nosso imaginário e que certamente já foram absorvida por

qualquer mulher em algum momento de sua vida, seja na infância, na

adolescência ou, na fase adulta. Percebemos então que as imagens

arquetípicas continuam as mesmas apesar do passar dos anos.

Page 10: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

10

Trataremos aqui da questão do arquétipo e fundamentalmente, do

arquétipo feminino nos contos de fadas. O que existe de tão profundo

nesses contos que faz com que meninas esperem anos a fio por seu

príncipe encantado, ou encarnem a Borralheira, e acreditem que serão

sempre submetidas ou jugo das irmãs e da madrasta má? Porque essas

estruturas arquetípicas continuam tão arraigadas em nosso inconsciente que

permanecem fazendo sentido para nós? De acordo com Marie Louise von

Franz;

“Contos de Fadas são a expressão mais pura e mais

simples dos processos psíquicos do inconsciente

coletivo. Conseqüentemente, o valor deles para a

investigação cientifica do inconsciente e sobejamente

superior a qualquer outro material. Eles representam os

arquétipos na sua forma mais simples, plena e concisa.

Nesta forma pura, as imagens arquetípicas fornecem-

nos as melhores pistas para compreensão dos

processos que se passam na psique coletiva”1

Para uma melhor compreensão, falaremos da arteterapia, uma vez

que os contos são usados como uma forma importante de ponte para o

inconsciente, e muito utilizados no processo da arteterapia. Depois

trataremos da questão dos arquétipos. O que são. Como se desenvolvem.

Qual a sua importância para nós. E como aparecem nos contos de fada.

Após isso, trataremos dos contos de fada e de seu desenvolvimento no

decorrer do tempo, utilizando os contos para marcar a presença do arquétipo

feminino nestes.

É obvio que não responderemos a todas as perguntas, mas

descobriremos que nem sempre o mais importante é obter as respostas.

1 FRANZ, Marie-Louise von. A Interpretação dos Contos de Fadas. Rio de Janeiro: Achiamé, 1981 p. 15

Page 11: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

11

Quando começamos a fazer as perguntas já estamos dando um grande

passo para a solução tanto dos contos quanto de nossa própria alma.

Page 12: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

12

2 SOBRE ARTETERAPIA

Para falar sobre o início da arte com uso terapêutico (arteterapia),

utilizaremos um artigo extraído de um periódico da Universidade Cândido

Mendes:

“Tem-se conhecimento do uso terapêutico da arte nas

civilizações gregas mais antigas. Porém, a arte como

profissão Arte Terapia é de uso recente, data de

aproximadamente 30 anos.

No final do século XIX renomados psiquiatras europeus

demonstraram interesse nas produções plásticas dos

pacientes internados em hospitais psiquiátricos,

produzidas em oficinas de terapia ocupacional. Os

psiquiatras Kraepelin e Bleuler, conhecidos mestres da

psiquiatria, mencionaram e valorizaram a arte no

processo terapêutico. Na Alemanha, o psiquiatra

Prinzhorn (1922) enfatizou o papel da arte em relação ao

tratamento de doentes mentais, sugeriu que a alma

sofrida deveria ter acesso ao remédio da arte natural e

vital e acesso a imaginação “. No Brasil a psiquiatra Nise

da Silveira fundou o Museu da imagem e do

inconsciente, sendo pioneira no uso da arte como

processo terapêutico.

Após ter sido utilizada no passado como atividade

secundária e acessória no tratamento em hospitais

psiquiátricos europeus e norte-americanos, a arte como

terapia, Arte Terapia, tem hoje uma presença marcante

nos estudos e utilização prática por arte terapeutas de

vários países”2.

2 A Arteterapia através do tempo. Comunicandido, Rio de Janeiro, julho .2002. p.2

Page 13: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

13

E ainda quanto ao saber relativo ao arteterapeuta a autora do artigo nos diz

o seguinte:

“A arte terapia utiliza conhecimentos das áreas da

psicologia e das artes plásticas. Porém sua prática, sua

metodologia e fundamentação teórica estão se

estruturando em um saber próprio, com formação

específica.

O processo arte terapêutico viabiliza o fazer criativo, o

crescimento interior, solidifica a relação do indivíduo

consigo mesmo e com uma linguagem artística. Este

processo acontece através do lidar com diferentes

modalidades expressivas, (...) Cabe ao terapeuta o papel

de guia, pois a forma como ele conduz o indivíduo ao

processo de criação e a “posterior” leitura de sua obra,

vai ser um fator relevante na relação que se desenvolve

entre ele e seu cliente, entre este e sua produção

plástica (sua arte) e seu estar no mundo.”3

Dessa forma, pudemos observar que ainda existe muito que se explorar

no que tange a arteterapia. Apesar de ser uma linguagem recente no Brasil e

que enfrentou algumas restrições por parte da própria comunidade

terapêutica, a arteterapia, sem dúvida trabalha com riquíssimas

possibilidades já que a arte, é inerente ao ser humano e este tem produzido

arte a milhões de anos, consciente ou inconscientemente.

A arteterapia é composta de inúmeras expressões artísticas. Dentre elas

podemos destacar: a dança, o teatro, a música, a expressão corporal, a

literatura (ou apenas textos soltos e, até mesmo palavras), o uso de imagens

da História da Arte ou de fotografias e as artes plásticas. No que tange as

artes plásticas, podem ser abordadas inúmeras técnicas, tais como:

colagem, pintura, escultura, modelagem, instalações, desenho etc. E, dentro

dessas técnicas, é ainda mais ampla a possibilidade de materiais que podem

3 ibid., p.2

Page 14: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

14

ser utilizadas, podendo destacar: lápis (de cor, (aquareláveis, de cera), giz

de pastel seco ou oleoso, massinha, papier maché, argila, inúmeros tipos

diferentes de papel, vários tipos de fios e linhas, retalhos, contas coloridas,

tintas (guache, acrílica, óleo), aquarela, fitas e qualquer outro material que

permita ao homem a criação. “Essas atividades têm em comum a

objetivação da representação visual do domínio figurativo a partir da

transformação da matéria” (PAÏN, 1996, p.9).

Então, o que diferenciaria o artista que transforma a matéria e produz

um objeto artístico de uma pessoa que se submete ao processo terapêutico

que a arteterapia propõe e que também transforma a matéria? Na

arteterapia existe um atribuir simbólico. Ao contrário do artista que pensa e

executa, no processo terapêutico o que ocorre é o inverso – executa-se e

depois se reflete sobre o objeto. Procurando-se a atribuição de valor

simbólico a produção.

É obvio que muitas das obras de arte que conhecemos provavelmente

também foram primeiro produzidas e depois refletidas. Mas o modus

operandis do artista (que tem um domínio pleno da técnica que está sendo

utilizada) é diferente de um indivíduo sendo submetido a uma terapia onde, o

objetivo máximo é deixar fluir o inconsciente por meio da expressão artística,

seja ela plástica ou não.

Page 15: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

15

3 SOBRE OS ARQUÉTIPOS.

A idéia central deste trabalho consiste em relacionar imagens

arquetípicas femininas e sua relação com os contos de fadas. Portanto,

definir arquétipos se torna fundamental. Utilizaremos aqui para introduzir a

questão arquétipo, palavras de Nise da Silveira que nos diz que (...)

“arquétipos são possibilidades herdadas para representar imagens similares,

são formas instintivas de imaginar. São matrizes arcaicas onde

configurações análogas ou semelhantes tomam forma”. (SILVEIRA, 1994,

p.79).

Quando falamos de contos de fadas e suas imagens arquetípicas,

estamos falando de matrizes arcaicas de figuras que povoaram o

inconsciente popular no passado e continuam a povoar atualmente. Mesmo

em culturas remotas, onde não haveria a menor possibilidade de contato

entre elas seja pelo tempo, seja pela distância, veremos que muitos

personagens de contos de fada irão aparecer com uma mesma história e

uma mesma estrutura de personalidade, que irão se adequar ou ao meio, ou

ao período histórico, mas não perderão o fio condutor de sua narrativa. Para

falar de imagens arquetípicas, utilizaremos a seguinte citação:

(...)”o arquétipo funciona como um módulo de

concentração de energia psíquica. quando essa energia,

em estado potencial, se atualiza, toma forma, então

teremos a imagem arquetípica. Não poderemos

denominar essa imagem de arquétipo, pois o arquétipo é

unicamente uma virtualidade.”4

Essas imagens pertencem ao nosso interior, a nossa estrutura de

pensamento desde os tempos mais remotos até os dias atuais. Qual a

menina que não pensa em esperar o príncipe encantado? Ou se depara com

4 SILVEIRA, Nise da. Jung – vida e obra.14ª edição. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra,1994. p. 80-81

Page 16: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

16

a figura da bruxa no decorrer de sua vida? Assim como qual a menino que

não quer ser um herói como Hércules ou não crescer nunca como Peter

Pan? Estas imagens continuam permeando nosso imaginário porque

inconscientemente fazem um grande sentido para nós, porque nos

baseamos nelas para construir nosso ego.

“A noção de arquétipos, postulando a existência de uma

base psíquica comum a todos os seres humanos,

permite compreender por que em lugares e épocas

distantes aparecem temas idênticos nos contos de

fadas, nos mitos, nos dogmas e ritos das religiões, nas

artes, na filosofia, nas produções do inconsciente de um

modo geral – seja nos sonhos de pessoas normais, seja

em delírios de loucos.”5

Esse acontecimento, aparentemente inexplicável de repetições

aparentemente impossíveis de acontecer com a estrutura da narrativa dos

contos, Jung chamará de inconsciente coletivo: “Enquanto o inconsciente

pessoal é composto de conteúdos cuja existência decorre de experiências

individuais, os conteúdos que constituem o inconsciente coletivo são

impessoais, comuns a todos os homens e transmitem-se por

hereditariedade.” (SILVEIRA, 1994, p.79)

E como se originariam esses arquétipos? Como eles apareceriam tão

freqüentemente dentro das culturas mais diversas? Como explicar tantas

Cinderelas de origens e etnias tão diferentes? Ou tantas versões diferentes

para Chapeuzinho Vermelho?

Nise da Silveira comentará este fato utilizando as seguintes palavras:

“Resultariam do depósito das impressões superpostas

deixadas por certas vivências fundamentais, comuns a

todos os seres humanos, repetidas incontavelmente

5 ibid. p. 81

Page 17: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

17

através de milênios.(...)Seriam disposições inerentes à

estrutura do sistema nervoso que conduziriam à

produção de representações sempre análogas ou

similares.(...), existiriam tendências herdadas para

construir representações análogas ou semelhantes.” 6

Ou ainda, no que tange a transformação dessa energia psíquica, no

referente a essa diversidade de possibilidades de imagens arquetípicas, ela

nos dirá o seguinte:

(...) Mas a prova da transformação de energia psíquica

em imagens nos é dada todas as noites nos nossos

próprios sonhos, quando personagens conhecidas os

estranhas surgem das profundezas para desempenhar

comédias ou dramas em cenários mais ou menos

fantásticos.”7

A grande questão do estudo dos contos de fada é que eles são

essenciais por que “delineiam a base humana universal ” (FRANZ, I990, p.

39). As imagens arquetípicas dos contos de fada são muito mais acessíveis

e chegam muito mais facilmente os ouvidos e ao coração porque podem

sempre ser revestidos de uma outra carga cultural. Ao contrário dos mitos,

que pertencem a uma determinada cultura e se tirados daquele contexto,

não fariam sentido por estarem carregados de uma estrutura sócio-cultural

muito forte, os contos de fadas, não estão atrelados a nenhuma cultura

específica sendo encontrados nas mais diversas culturas revestidos com um

outro contexto social, étnico ou temporal.

“Segundo Jung, as concepções de cada arquétipo são,

na sua essência, um fator psíquico desconhecido, e por

isso não há possibilidades de traduzir seu conteúdo em

6 ibid. p.80 7 ibid. p.81

Page 18: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

18

termos intelectuais. O melhor que podemos fazer é

circunscrevê-lo com base em nossa própria experiência

psicológica e a partir de seus estudos comparativos,

trazendo à luz toda a rede de associações às quais as

imagens arquetípicas estão interligadas exatamente

como aparecem.” 8

Outro aspecto importante que deve ser observado é que os contos de

fada ao contrário dos mitos não pertencem a nenhuma civilização específica

eles simplesmente surgem no imaginário coletivo, por isso são muito melhor

absorvidos por diferentes culturas e por isso são recursos muito utilizados no

processo terapêutico e dentro do atendimento feito por arteterapeutas. Marie

Louise von Franz deixa isso muito claro no relato que se segue:

O estudo dos contos de fadas é essencial para nós, pois

eles delineiam a base humana universal. Eles são

especialmente importantes quando se analisa pessoas

do outro lado do mundo; se um hindu ou um australiano

chega ao seu consultório, e se você estudou apenas

alguns mitos, será difícil lançar uma ponte humana até

esse homem. Se, entretanto, o analista conhece as

formas humanas básicas, ele será capaz de contata-lo.

Eu ouvi, certa vez, um missionário das Ilhas dos Mares

do Sul dizer que a maneira mais simples de entrar em

contato como os habitantes de lá era contando-lhes

contos de fadas. É uma linguagem que todos entendem.

Se ele houvesse contado a história de algum grande

mito, não teria tido tão bons resultados. Ele tinha que

usar o material básico em sua forma mais simples,

porque esta é a expressão da estrutura mais geral, e ao

mesmo tempo mais básica do ser humano. Isto também

se deve ao fato de o conto de fadas estar além das

8 FRANZ. op. cit. P.15

Page 19: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

19

diferenças culturais e raciais, podendo assim migrar

facilmente se um país para outro. A linguagem dos

contos de fadas parece ser a linguagem internacional de

toda a espécie humana – de idades, raças e culturas.9

9 FRANZ. op. cit. p.38.

Page 20: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

20

4 SOBRE OS CONTOS DE FADA.

A importância das histórias para a vida é fundamental. É Por meio delas

que temos o primeiro contato com o mundo sobrenatural, é com elas que

viajamos para reinos distantes, matamos dragões, visitamos palácios e

castelos; conhecemos gênios, bruxas, heróis, ou a “fada que nenhum

homem viu10”. É por meio dela que temos o início do nosso processo de

sociabilização e aprendemos a lidar com o impossível e com o mágico

O mito grego acima nos mostra como seres mágicos sempre povoaram

o imaginário popular de forma aliviar a aridez da vida cotidiana. A fantasia

impulsiona o homem a procurar respostas, e mais que isso, a fazer

perguntas. E por quê utilizarmos a física ou a matemática para resolver

todos os problemas se é possível criar soluções mágicas para as

adversidades, se podemos dar uma solução criativa para aquilo que nos

atormenta ou incomoda. É isso que a humanidade tem feito através dos

tempos, e é por isso que os contos de fadas têm sua permanência

assegurada até o esmorecer da raça humana. Porque eles garantem a

nossa ligação com os deuses, eles dão respostas em campos onde muitas

vezes a ciência falha e, principalmente, pela carga simbólica que é absorvida

pela nossa psique e que garante a permanência dos arquétipos recorrentes

que são tão antigos quanto a própria existência humana,

Às vezes se encontram histórias muito parecidas, em lugares muito

distantes. seus enredos se repetem em diferentes culturas. Jung vai

identificar isso e atribuir ao inconsciente coletivo. Nise da Silveira em seu

livro Jung – Vida e Obra nos diz que: “O inconsciente coletivo funciona, na

interpretação psicológica, como o denominador comum que reúne e explica

numerosos fatos impossíveis de entender, no momento atual da ciência,

sem sua postulação”(SILVEIRA, 1994, P.79).

10 Refere-se ao conto africano O Baú de histórias, onde Anansi, o homem aranha, deve levar para Umboro – o rei dos céus – três prendas em troca de todas as histórias do mundo. Dentre essas prendas está Moatcha – a fada que nenhum homem viu.

Page 21: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

21

Todos os contos de fadas têm finais felizes e sempre apresentam a

busca da felicidade, do amor, da riqueza etc. Existem sempre dificuldades

para serem vencidas. Eles continuam vivendo porque mexem com a nossa

imaginação e nossos sentimentos. Sempre ficamos torcendo pela vitória dos

personagens bons sobre os maus e vivendo com eles as dificuldades

encontradas, absorvendo aquilo que precisamos naquele momento de

nossas vidas, seja na infância ou na vida adulta – sempre extraímos algo de

alguma história ainda que ela não seja um conto de fadas. As histórias

sempre têm muito a dizer, ainda que nós não saibamos que precisamos

ouvir, existe sempre algo a falar à mente ou ao coração .

Nem todos os contos de fadas têm fadas – elas são criaturas

fantásticas, vivem na fantasia, assim como os gnomos e os duendes, que

estão no folclore de muitos países, principalmente nas zonas rurais. Dizia-

se que elas eram espíritos, anjos decaídos, sobreviventes de uma raça

extinta. Achava-se que tinham pouca simpatia pelos humanos e que

estavam sempre dispostas a se vingar de quem as ofendesse. Os

camponeses a chamavam de “boa gente” em sinal de respeito. (Warner,

1999, p. 13)

Depois de existirem muito tempo como histórias orais, os contos de

fadas começaram a ser escritos. Perrault, no final do século XVII (1697),

publicou os Contos da Mamãe Gansa, onde apareceram, pela primeira vez,

histórias conhecidas até hoje, como Cinderela, Bela Adormecida,

Chapeuzinho Vermelho, O gato de Botas, Barba Azul etc. No século XIX, os

Irmãos Grimm recolheram contos de fadas tradicionais junto com velhas

pessoas que os sabiam e escreveram esses contos, fazendo muito sucesso.

Em seguida, muitos outros pesquisadores também começaram a ouvir

histórias do povo e escreveram.

Mas a face que verdadeiramente nos interessa dos contos de fadas

aqui é aquela que aborda os contos e sua linguagem simbólica e,

Page 22: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

22

incisivamente, aquela que aborda a linguagem simbólica quanto à

representação arquetípica feminina.

4.1 CINDERELA – A MULHER QUE ESPERA

4.1.1 A História

Um homem ficou viúvo e, tendo uma filha para acabar de criar, decidiu

se casar de novo. Escolheu então uma mulher grosseira e convencida, mãe

de duas meninas tão rudes e presunçosas quanto ela e em tudo contrarias à

orfãzinha, que era a criatura mais doce do mundo.

Mal se instalaram na casa do viúvo, mãe e filhas se dedicaram a

atormentar a pobre menina. Tratavam-na com maus modos, não admitiam

que vestisse outra coisa alem de trapos velhos e a obrigavam a trabalhar

com uma escrava. O único lugar onde a coitadinha conseguia encontrar um

pouco de paz era o cantinho ao lado do fogão, junto às cinzas. Por isso a

madrasta e suas filhas caçoavam dela e a chamavam de Cinderela.

Anos depois o rei daquele país organizou uma festa que se duraria

uma noite inteira, e convidou todos os aristocratas.

A perspectiva de se exibir no palácio empolgou as irmãs de Cinderela,

que passavam horas experimentando roupas, sapatos, jóias, penteados...

Naturalmente quem corria de um lado para o outro para atende-las era a

filha do viúvo, que, apesar de nunca reclamar de suas exigências e servi-las

sempre com gentileza, só recebia repreensões em vez de agradecimentos.

Quando as duas irmãs finalmente conseguiram caber em seus vestidos

novos e saíram, Cinderela foi para o seu cantinho perto do fogão, baixou a

cabeça e chorou.

De repente, ao erguer o rosto para enxugar as lágrimas, deparou-se

com uma velha senhora de sorriso bondoso eu trazia uma varinha na mão.

Dizia ser sua fada madrinha e após saber o motivo da tristeza da jovem - o

fato de não poder ir ao baile como as irmãs – mandou que esta fosse até o

Page 23: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

23

quintal e pegasse uma abóbora e a trouxesse até sua presença. A fada

madrinha tocou a abóbora com a sua varinha mágica e esta se transformou

em uma carruagem dourada. Depois tocou seis ratinhos que estavam em

uma ratoeira e os transformou em elegantes cavalos; e em uma ratazana

que se transformou em um gorducho cocheiro; e finalmente pediu a afilhada

que fosse no quintal e pegasse seis lagartixas que estavam atrás do

regador, que foram transformadas, ao toque da varinha, em lacaios e pajens.

Por fim tocando com a varinha mágica os trapos sujos que a moça

vestia, estes se transformaram num rico vestido de fios de ouro e prata,

bordados de perolas, e substituiu seus chinelos rotos por reluzentes

sapatinhos de cristal.

Então, acompanhou a moça até a carruagem recomendando-lhe que

saísse da festa antes de soarem doze badaladas da meia noite, pois depois

disso tudo voltaria a ser como antes.

Prometendo não esquecer de suas palavras de aviso, Cinderela rumou

para o palácio, onde atraiu todas as atenções, especialmente a do príncipe,

filho do rei. Indiferente aos comentários, Cinderela dançou com o príncipe o

tempo todo se distraindo a tal ponto que só ouviu o relógio da torre quando

soou a primeira badalada da meia noite. Então, assustada, saiu correndo,

sem se despedir e correu para a carruagem. O príncipe a seguiu, mas em

seu rastro encontrou apenas um sapatinho de cristal. Perguntou aos guardas

se viram a princesa, porem eles responderam que por ali só passara uma

moça esfarrapada, rápida como uma flecha.

Enquanto isso, Cinderela corria para casa, sem carruagem, nem

cocheiro. Tudo o que lhe restara do esplendor daquela noite era um

sapatinho de cristal.

Perdidamente apaixonado, o príncipe anunciou que se casaria com a

jovem que conseguisse calçar o reluzente sapatinho. E foi pessoalmente

experimenta-lo em toda donzela do reino, sem encontrar sua legítima dona.

Por fim chegou à casa do viúvo. As duas irmãs tentaram a todo o custo

enfiar o pé no delicado sapato, mas não conseguiram.

Questionadas se não havia mais nenhuma moça naquela casa pelo

príncipe, já meio sem esperanças, responderam que se ele considerasse

Page 24: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

24

uma maltrapilha imprestável que vivia junto as cinzas de um fogão com uma

moça, que havia sim. O príncipe ordenou que a chamassem, o que as irmãs

fizeram muito a contragosto.

E Cinderela calçou o sapatinho, que lhe coube como uma luva. Vendo-

a de pé, na sua frente, suja e esfarrapada, o príncipe ainda assim a

reconheceu como a moça elegante que conquistara para sempre o coração.

Alguns dias depois, Cinderela se casou com o príncipe e, como era

uma jovem de bom coração, perdoou suas irmãs e as convidou para morar

no palácio, onde mais tarde se uniriam a dois fidalgos da corte.

4.1.2 A Interpretação.

Cinderela, ou Borralheira, ou A Gata Borralheira, ou Aschenputtel.

Este conto é provavelmente a que possui o maior numero de versões e

talvez a mais conhecida história do mundo. Tem um atrativo especial porque

fala tanto para os meninos quanto para as meninas; é uma história que fala

da rivalidade fraternal: (...) “é uma história onde são vivenciados os

sofrimentos e as esperanças que constituem essencialmente a rivalidade

fraternal, bem como a vitória da heroína humilhada sobre as irmãs que a

maltrataram.”(...).(BETTELHEIM, 2002, p.277)

Cinderela perde a mãe e seu pai, então viúvo casa-se novamente

com uma mulher grosseira e convencida mãe de duas meninas rudes e

presunçosas. A história descrita acima é uma versão reduzida da narrativa

desenvolvida por um nobre francês do século XVI, utilizada por ele para

entreter as damas da corte. Contudo recebemos a informação de como são

a madrasta e as meio-irmãs de Cinderela.

Nesta versão Cinderela faz de tudo par agradar as irmãs e a

madrasta, mas ainda assim é tratada com indelicadeza. Cinderela – a

mulher que espera; quanto ela terá que suportar até se ver livre de tamanho

sofrimento? Quantas vezes em nossas vidas nos sentimos sufocados por

acontecimentos que nos jogam nas cinzas, no borralho. A rivalidade fraternal

Page 25: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

25

aqui é lançada sobre a menina aponto dela viver entre as (...) “a madrasta

sacrifica os interesses de Borralheira em favor das irmãs; deve executar os

trabalhos mais sujos e mesmo fazendo-os bem, não é aceita por eles; só lhe

fazem mais exigências.” (...) (BETTELHEIM, 2002, p.278)

Existe uma outra questão envolvendo os elementos cinzas e borralho.

Cinzas são consideradas o produto final do fogo um elemento purificador,

então, cinzas estarão associadas a algo limpo, já borralho é o produto sujo

do fogo, contendo uma grande quantidade de impurezas.

Em seu livro “A psicanálise nos contos de fadas”, Bruno Bettelheim

estabelece uma comparação entre Cinderela e as virgens Vestais Romanas

– guardiãs do fogo sagrado, responsáveis por mante-lo acesso – ou mesmo

tempo em que possuíam uma posição de prestigio entre os cidadãos

romanos. Quando dizemos que a menina vivia entre as cinzas, podemos

estar atribuindo a ele características quase que sagradas. “Assim, ser

inocente, puro , e ser guardião do fogo significam a mesma coisa nas

conotações antigas. (BETTELHEIM, 2002, p. 295)

Quando as irmãs vão a festa e negam a Cinderela que ela também vá

a rivalidade fraternal fica ainda mais acirrada. Uma fada aparece então para

possibilitar a ida de Cinderela ao baile. Essa fada pode ser considerada

simbolicamente como uma imagem materna, já que em algumas versões a

fada surge dentro de um tronco de árvore planta por Cinderela no túmulo da

mãe. Então, utilizando uma abóbora, e alguns animaizinhos a fada-madrinha

concede o desejo de sua afilhada.

A transformação de animais considerados sujos em empregados pode

ser considerado um símbolo de sublimação de seus interesses fálicos

enquanto ela amadurece.

Cinderela vai ao baile, mas deve retornar antes da meia noite, porque

nesse momento o feitiço será desfeito. E no momento de saída perde um de

Page 26: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

26

seus sapatos que são a chave entre ela e o príncipe, será a forma que ele

utilizará para encontrá-la.

Cabe ressaltar que no oriente, especialmente no Japão, pés

pequenos eram considerados sinais de beleza extrema a ponto de as

mulheres enfaixarem seus pés desde criança para que esses não

crescessem. Aqui os pés de Cinderela também sinalizam beleza porque as

irmãs fazem de tudo para tentar calçá-los, mas não conseguem. Apenas os

pés de Cinderela recebem o sapato sem maiores esforços e o príncipe

então, se descobre diante da mulher amada. No final, Cinderela renasce

das cinzas como a fênix mítica.

4.2 A BELA ADORMECIDA – A MULHER FADADA.

4.2.1 A História

Era uma vez uma vez um rei e uma rainha que queriam muito ter um

filho, mas precisaram esperar anos e anos para que seu desejo se

realizasse. Ficaram felicíssimos quando finalmente tiveram uma menina e

convidaram sete fadas para madrinhas. Sabiam que cada fada presentearia

a criança com um dom, e, assim sua filha seria a princesa mais perfeita do

mundo.

No banquete que celebrou o batizado as sete fadas se sentaram à

mesa, e tendo cada uma um prato, uma faca e um grafo de ouro maciço na

sua frente. Mal se acomodaram, uma fada velha e feia entrou no salão.

Andava sumida havia bem uns cinqüenta anos, por isso ninguém a

convidara. Vendo que o rei não mandara fazer prato e talheres de ouro e

prata para ela, ficou furiosa e jurou vingança. A fada mais jovem escutou e

se escondeu atrás da cortina, para oferecer o seu dom por último e assim

remediar o mal que a resmungona fizesse.

Page 27: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

27

Terminado o banquete, as fadas começaram a atribuir qualidades para

a sua afilhada. A primeira lhe conferiu o dom da beleza; a segunda o da

sabedoria. As outras quatro garantiram que ela seria extremamente

graciosa, dançaria muito bem, cantaria como um rouxinol e teria

extraordinário talento para a música. Chegou a vez da velha fada que

grunhiu que a princesa havia de espetar o dedo em um fuso e morrer.

A fada mais jovem esperou a fada velha sair e saiu de seu esconderijo

e lançou um feitiço dizendo que ao se espetar no fuso a princesa não

morreria mais cairia em um sonso de cem anos até que um príncipe a

desperta-se com um beijo de amor verdadeiro.

Imediatamente o rei mandou queimar todos os fusos do reino, para

evitar que a praga da fada velha se cumprisse.

Assim a princesa cresceu, linda e saudável, longe do perigo.

Um dia ela viajou com seus pais para um castelo que tinha no campo.

Ali subiu até o alto da torre onde a velha fada, disfarçada de fiandeira, fingia

trabalhar inocentemente com seu fuso. A princesa observou durante algum

tempo e resolveu experimentar fiar também, mas, logo que pegou o fuso,

espetou o dedo e caiu num sono profundo.

Depois de esgotar todos os recursos para despertar a filha, o rei

ordenou aos criados que a levassem para o melhor quarto do castelo e a

deitassem numa linda cama de ouro e prata.

Quando soube do acontecido a fada mais jovem fez todos no castelo

cair em um sono profundo, evitando que quando acordasse, depois de cem

anos, a princesa se visse entre estranhos. De outra feita, ergueu mais uma

vez sua varinha mágica e imediatamente brotaram da terra espinheiros

enormes, que rodearam o castelo como uma muralha impenetrável,

deixando à vista apenas o topo das torres.

Cem anos se passaram e um dia o filho de um soberano de uma terra

distante estava cavalgando em busca de aventuras, com sua comitiva,

quando avistou de longe as torres do castelo encoberto por espinhos. Com o

coração saltando de curiosidade, o príncipe rumou para o castelo. Assim que

se aproximou da imensa muralha vegetal que rodeava o castelo, os

Page 28: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

28

espinheiros misteriosamente se afastaram para lhe dar passagem, porem

logo se juntaram para impedir que sua comitiva o acompanhasse.

No pátio o príncipe encontrou as pessoas e os animais deitados no

chão, como se estivessem mortos. Sem se amedrontar, entrou no saguão e

viu uma fila de guardas roncando de pé, com as lanças em punho. E ao

longo de toda a sua caminhada se deparou com gente adormecida, inclusive

o rei e a rainha.

Algo em seu intimo o impelia para ir até a torre mais alta. Até que

finalmente chegou ao quarto da princesa. Aproximado-se da cama, beijou-a

com toda a delicadeza. Esta despertou de seu sono de cem anos linda e

com um sorriso encantador.

Nesse momento todas as criaturas do castelo despertaram. O fogo

reacendeu, crepitando sob a carne que voltou a girar no espeto. Os músicos

pegaram seus instrumentos e, apesar de terem ficado em silencio durante

um século, tocaram divinamente.

Depois do jantar num salão revestido de espelhos, o príncipe e a

princesa se casaram naquela mesma noite.

4.2.2 A Interpretação

A bela adormecida, a mulher fadada. Assim com todos os contos de

fada, existem muitas versões para este conto. Alguns diferem do número de

fadas, outros quanto ao tipo de espinheiro que cresce ao redor do castelo e

ainda outros quanto ao motivo do sono da princesa, mas o fato é que a

princesa está fadada, ou seja, ela está destinada a sofrer as conseqüências

de um acontecimento onde ninguém é culpado.

Como em Branca de Neve, os reis queriam muito um filho e seu

desejo demora muito para ser atendido, porém em A Bela Adormecida, a

mãe não morre assim que a menina nasce. Aliás, a figura da mãe só é

mencionada até o nascimento da menina, após isso o relacionamento dela

se dá com o rei e mais tarde com o príncipe.

Page 29: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

29

A figura arquetípica da madrasta má é aqui substituída pela bruxa ou

pela fada que não foi convidada. Assim como Branca de Neve que está

fadada a cair no desgosto da madrasta sem ter feito nada para merecer o

tratamento que esta lhe dispensa, o mesmo acontece com A Bela

Adormecida (Aurora ou Bela em algumas versões) em que a bruxa lhe fada

a morrer quando espetar o dedo no fuso de uma roca.

As imagens arquetípicas femininas que aparecem aqui são: a de uma

menina no início da puberdade, despertando para a sexualidade e uma

bruxa que se sente rejeitada por que não foi convidada para a festa.

A conotação púbere é muito forte nesta história. A ligação com a

questão da menstruação é bem clara. Em algumas versões é dito pela fada

má que ela completará quinze anos, espetará o dedo no fuso de uma roca e

morrerá, o dedo sagrará e como o próprio dedo, ela mesma quando

completara a idade (levando em conta que a menstruação acontecia mais

tarde antigamente). É a maldição da fada que ocasiona o sangramento, é no

encontro com uma mulhere mais velha que ela sangra, não com um homem,

é uma “maldição herdada de mulher para mulher” (BETTELHEHEIM, 2002,

p.273), Assim como a conotação do fuso da roca é absolutamente fálica.

A ultima fada ao conceder sua benção, não podendo reverter a

maldição da outra (uma vez que é um fato inexorável na sua condição de

mulher o sangrar e o perfurar) diz que ela não morrerá, apenas dormirá um

sono de cem anos. A metáfora do sono pode ser entendida como o período

macilento que as meninas passam nos momento s que antecedem a sua

menstruação ou de acordo com Bettelheim:

“Atualmente muitos jovens – e seus pais – temem o

crescimento calmo, onde parece não acontecer nada,

devido a uma crença comum de que só se fazendo

coisas pode-se atingir os objetivos. “A Bela Adormecida

diz que um período longo de calma, de contemplação,

Page 30: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

30

concentração sobre o eu, pode levar e seguidamente

leva às maiores realizações.” 11

O pai de Bela Adormecida tenta então impedir a todo o custo o

destino da filha e manda que todas as rocas sejam dstruidas, mas isso não

impede que a menina cumpra o destino que lhe foi previsto, então mesmo

com todas as rocas destruídas. A velha fada finge ser uma fiandeira e faz

com que o destino se cumpra esta parte é fundamental para que

compreendamos que o crescer independe da vontade paterna, ainda de

acordo com Bettelheim;

(...) “o tema central de todas as versões de “Bela

Adormecidaӎ que, embora os pais tentem de todas as

maneiras impedir o despertar da sexualidade do filho,

este ocorre inexoravelmente. Além disso, os esforços

mal-intencionados dos pais podem adiar a conquista da

maturidade no momento devido, como é simbolizado no

sono da Bela Adormecida de cem anos de duração, que

separa o despertar de sua sexualidade da união com o

amado.”(...)12

E ainda:

(...)“Por mais precauções que um pai tome, quando a

filha está madura para isso, a puberdade se instala. A

ausência temporária dos pais quando o fato ocorre

simboliza a incapacidade dos pais de protegerem os

filhos das várias crises de crescimento pelas quais todo

ser humano tem de passar.”13

11 BETTELHEIM, Bruno. Psicanálise dos contos de fadas. 16ª. Ed Paz e Terra: Rio de Janeiro, 2002. p.266 12 ibid. p. 271. 13 Ibid. p.272.

Page 31: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

31

Podemos concluir que Bela adormecida é uma menina despertando

para a sexualidade, contudo, existe um fato neste conto que o diferencia dos

outros que é sono de Bela Adormecida. Ela adormece porque é necessário

para ela esse período de latência. Entretanto ela não adormece como

Branca de Neve que está sob a maldição da madrasta. Ela adormece porque

precisa esperar, porque precisa passar por um período com o seu eu. Outro

fato importante é que junto com ela dormem todas as outras pessoas e coisa

do castelo, se estamos dormindo para o mundo, ele não existe para nós, ele

só passa a existir quando acordamos e decidimos fazer parte dele.

(...) “O mundo inteiro fica morto para a pessoa: eis o

significado simbólico e admonitório do sono mortífero em

que caem tudo e todos que circundam Bela Adormecida.

O mundo só está vivo para a pessoa que desperta para

ele. Só o relacionamento com outros nos”desperta”do

perigo de deixar nossa vida adormecida. O beijo do

príncipe rompe a praga do narcisismo e desperta a

feminilidade que até então não se desenvolvera. Só se a

donzela se transforma em mulher a vida pode

prosseguir”.14

Quando chega o momento certo, príncipe passa pela muralha de

espinhos, mas apenas ele, sua comitiva não penetra no interior do castelo.

Cabe a ele, e somente a ele, a missão de despertar a princesa. Ela espera

por ele a cem anos, e segundo o feitiço da última fada, ela só despertaria

com o beijo de um amor verdadeiro, ou seja, ela só coabitaria com um

homem quando estivesse pronta para tal.

Sem dúvida alguma esse é um dos contos que exercem maior

fascínio sobre as meninas e as mulheres em geral, talvez porque fale de

amor verdadeiro e sobre a importância do esperar talvez porque nos diga

que no final tudo acaba bem. Bettelheim termina seu capítulo sobre “A Bela

14 ibid. p.274.

Page 32: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

32

Adormecida com um fantástico texto que vale a pena ser citado aqui como

um ponto final para este capítulo:

(...) “Mesmo na forma reduzida que o conto nos chegou,

onde o príncipe desperta Bela adormecida com um beijo

– sentimos – e não sem que isso seja explicitado como

nas versões mais antigas – que ela é a encarnação da

perfeita feminilidade.” (...)15

4.3 BRANCA DE NEVE – A MULHER QUE VENCE A MADRASTA

4.3.1 A História

Numa tarde nevosa, uma bela rainha bordava junto à janela, quando

picou o dedo com a agulha, fazendo-o sangrar. Ao ver o rubro do sangue no

tecido e a neve branca desejou ter uma filha de pele branca como a neve e,

lábios vermelhos como o sangue e cabelos negros como o ébano.

Meses mais tarde a rainha deu a luz uma menina como a que

desejara e a chamou de Branca de Neve. No entanto, a rainha morreu logo

após o parto.

Ao fim de um ano de luto, o rei se casou com uma mulher arrogante e

vaidosa, que vivia perguntando a seu espelho mágico quem era a mais bela

mulher que existia. Ao que o espelho respondia que somente a rainha era a

mulher mais bela.

Ela, então, sentia-se feliz, porque sabia que o espelho só podia dizer

a pura verdade. No entanto, Branca de Neve crescia e aumentava em

beleza e graça; aos sete anos de idade era tão linda como a luz do dia e

muito mais que a rainha.

Um dia a rainha, sua madrasta, consultou como de costume o

espelho.

15 ibid. p.276.

Page 33: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

33

O espelho respondeu, porém, que Branca de Neve era ainda mais

bela!

A rainha estremeceu e ficou verde de ciúmes. E daí então, cada vez

que via Branca de Neve, por todos adorada pela sua gentileza, seu coração

tinha verdadeiros sobressaltos de raiva. Sua inveja e seus ciúmes

desenvolviam-se qual erva daninha, não lhe dando mais sossego, nem de

dia, nem de noite.

Enfim, já não podendo mais, mandou chamar um caçador e disse-lhe

que levasse a menina para a floresta onde teria de matá-la e trazer-lhe,

porém, o coração e o fígado como prova de sua morte.

O caçador obedeceu. Levou a menina para a floresta, sob pretexto de

lhe mostrar os veados e corças que lá havia. Mas, quando desembainhou a

faca para enterrá-la no coraçãozinho puro e inocente, a menina desatou a

chorar, implorando para que o caçador a deixasse viver, prometendo ficar na

floresta, e nunca mais voltar ao castelo.

Era tão linda e meiga a menina que o caçador, que não era mau

homem, apiedou-se dela e disse que ficasse na floresta, porque a morte

seria certa se ela voltasse ao castelo. E, em seu intimo, estava a pensando

que nada arriscava, pois os animais ferozes certamente iriam devorar a

menina em breve e a vontade da rainha iria ser satisfeita, sem que, fosse

obrigado a suportar o peso de um crime cruel.

Justamente nesse momento passou correndo um veadinho; o caçador

matou-o, tirou-lhe o coração e o fígado e levou-os a rainha como se fossem

de Branca de Neve. O cozinheiro foi incumbido de prepará-los e cozê-los. E,

no seu rancor feroz, a rainha comeu-os com alegria desumana, certa de

estar comendo o que pertencera, a Branca de Neve.

Durante esse tempo a pobre menina, que ficara abandonada na

floresta, vagava trêmula de medo, sem saber, que fazer. Tudo a assustava,

o ruído da brisa, uma folha que caía, enfim, tudo produzia nela um terrível

pavor.

Ouvindo o uivar dos lobos, pôs-se a correr cheia de terror; os

pezinhos delicados feriam-se nas pedras pontiagudas e estava toda

Page 34: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

34

arranhada pelos espinhos. Passou ao pé de muitos animais ferozes, mas

estes não lhe fizeram mal algum.

Enfim, à noitinha, cansada e ofegante, encontrou-se diante de uma

linda casinha situada no meio de uma clareira. Entrou, mas não viu ninguém.

Contudo, a casa devia ser habitada, pois notou que tudo estava muito

asseado e arrumadinho, dando gosto de se ver.

Branca de Neve, que estava morta de fome e sede, aventurou-se a

comer um pouquinho do que estava servido em cada um dos sete pratinhos

que estavam em uma bela mesinha. Depois, não agüentando o cansaço, foi

deitar-se numa caminha, mas a primeira era curta demais, a Segunda muito

estreita, experimentando-as todas até que a sétima tinha a medida justa.

Então fez sua oração, encomendou-se a Deus e em breve adormeceu

profundamente.

Ao anoitecer chegaram os donos da casa; eram os setes anãos, que

trabalhavam durante o dia na escavação de minério na montanha.Viram que

alguém entrara em sua casa, porque não estava tudo na ordem perfeita

conforme haviam deixado ao sair. Descobriam, por fim, Branca de Neve

dormindo a sono solto na sua caminha. Sentiam-se tão transbordados de

alegria, com a beleza e meiguice da menina, que não quiseram acordá-la e

deixaram-na dormir tranqüilamente.

No dia seguinte, quando Branca de Neve acordou e levantou-se, ficou

muito assustada ao ver os sete anões. Mas eles sorriram-lhe e perguntaram

com a maior amabilidade. Ela contou-lhes como sua madrasta mandara

mata·-lá e como o caçador lhe permitira que vivesse na floresta. Após ter

corrido o dia todo chegara ali e, vendo a linda casinha, entrara para

descansar um pouco.

Os anões perguntaram-lhe se ela queria ficar com eles, cuidar da

casa, fazer a comida, lavar e passar a roupa, coser, tecer as meias e manter

tudo muito limpo e em ordem; mas; quando tiver acabado o trabalho, ser a

rainha deles. Anuiu a menina de todo o coração.

E ficou morando com eles, procurando manter tudo sempre em

ordem. Pela manhã eles partiam para as cavernas em busca de ouro e

minérios e, à noite, quando voltavam, todos jantavam juntos muito alegres.

Page 35: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

35

Como a menina ficava só durante o dia, os anões advertiram-na que se

acautelasse e tivesse cuidado com a madrasta; pois não tardava em

descobrir onde ela estava, por isso, durante a ausência deles não devia

deixar ninguém entrar na casa.

A rainha, entretanto, certa de ter comido o fígado e o coração de

Branca de Neve, vivia despreocupada. Ela pensava, satisfeita, que era,

novamente, a primeira e mais bela mulher do reino.

Certo dia, porém, teve a fantasia de consultar o espelho, e certa de

que lhe responderia não ter mais nenhuma rival em beldade. Imaginem o

seu furor quando o espelho respondeu que ela era a mais formosa. Mas,

Branca de Neve, que por trás dos montes vive na casa dos sete anões, era

mil vezes mais formosa! A rainha ficou furiosa, pois sabia que o espelho não

podia mentir. Percebeu, assim, que o caçador a enganara e que Branca de

Neve continuava a viver.

Novamente devorada pelo ciúme e pela inveja, só pensava na

maneira de matar Branca de Neve. Pensou, pensou, pensou, depois tingiu o

rosto e disfarçou-se em velha vendedora de quinquilharias, de maneira

perfeitamente irreconhecível.

Assim disfarçada, transpôs as sete montanhas e foi à casa dos sete

anões. Chegando lá·, bateu à porta Branca de Neve, que estava no primeiro

andar e se aborrecia por ficar sozinha todo o santo dia, abriu a janela e

perguntou-lhe o que tinha para vender. Mostrou um cinto de cetim cor de

rosa, todo recamado de seda multicor. Branca de Neve; então desceu,

puxou o ferrolho e comprou o cinto.

A menina postou-se confiante na frente da velha, deixando que lhe

abotoasse o cinto; então a cruel inimiga, mais que depressa, apertou-o com

tanta força, que a menina perdeu a respiração e caiu desacordada no chão.

Gargalhando a rainha, fugiu rapidamente, voltando ao castelo.

Felizmente, os anões, nesse dia, tendo terminado o trabalho mais

cedo que de costume, voltaram logo para casa. E qual não foi seu susto ao

verem a querida Branca de Neve estendida no chão, rígida como se

estivesse morta! Ergueram-na e viram que o cinto apertava demais sua

Page 36: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

36

cinturinha. Logo o desabotoaram e ela começou a respirar levemente e,

pouco a pouco, voltou a si e pôde contar o que sucedera.

A pérfida rainha, logo que chegou ao castelo, correu ao espelho,

esperando, enfim, ouvi-lo proclamar a sua absoluta beleza, o que para ela

soava mais deliciosamente que tudo.Como da outra vez, o espelho

respondeu que Branca de Neve que era mais formosa. Compreendeu que a

rival ainda estava viva. Pensou, novamente, num meio de matar a inocente

menina.

Pegou num magnífico pente cravejado de pérolas e besuntou-lhe os

dentes com o veneno. Depois, disfarçando-se de outro modo, dirigiu-se para

a casa dos sete anões.

Branca de Neve abriu a janela e dessa vez disse que não podias abrir

para ninguém. Mas, Branca de Neve deixou-se tentar pelo brilho das

pérolas; e depois de ter bem examinado o pente, quis comprá·- lo e abriu a

porta ã velha.

A pobre menina, sem saber, deixou-a pentear o seu cabelo para

demonstrar o pente. Então, a velha enterrou-lhe o pente com violência o

cabelo. Mal os dentes tocaram na pele, Branca de Neve caiu morta sob ação

do veneno. A rainha maldosa resmungou satisfeita e soltando uma

gargalhada medonha, apressou-se a regressar ao castelo.

Já estava anoitecendo e os anões não tardaram a chegar. Quando

viram Branca de Neve estendida no chão, desacordada, logo adivinharam

nisso a mão da madrasta. Procuraram o que lhe poderia ter feito e

encontraram o pente envenenado. Assim que o tiraram da cabeça, a menina

voltou a si e pôde contar o que sucedera. Novamente a preveniram que

tomasse cuidado e não abrisse a porta realmente para ninguém.

De volta ao castelo, a rainha correu a pegar no espelho apenas para saber

que a menina ainda vivia.

Levou vários dias consultando todos os livros de bruxaria;finalmente

fechou-se num quarto, ciosamente oculto, onde jamais entrava alma viva e

aí preparou uma maçã, impregnando-a de veneno mortífero.

Page 37: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

37

Disfarçou-se em camponesa e como tal encaminhou-se a casa dos

sete anões. Branca de Neve saiu à janela e disse que não podia abrir a

ninguém, pois os sete anões a proibiram.

a falsa camponesa disse que se a menina receava que, por acaso, a maça

estivesse envenenada, ela iria comer a metade da maçã para que a menina

ficasse mais tranqüilizada.

Cortou a maça e pôs-se a comer a parte mais tenra, pois a maçã

havia sido habilmente preparada, de maneira que o veneno estava todo

concentrado na cor vermelha.

Branca de Neve, tranqüilizada, olhava cobiçosamente para a linda maçã e

não resistiu e pegou a parte envenenada. Apenas lhe deu a primeira

dentada, caiu no chão, sem vida.

Apressou-se a madrasta a voltar ao castelo; mal chegou, dirigiu - se

ao espelho e perguntou ao espelho, obtendo, finalmente a resposta que

tanto almejava; agora era ela a única mais linda.

Os anões, regressando à noitinha; encontraram Branca de Neve

estendida no chão, morta. Levantaram-na e procuraram, em vão, o que

pudera causar-lhe a morte; desabotoaram-lhe os vestidos, pentearam-lhe os

cabelos. Lavaram-na com água e vinho, mas tudo foi inútil: a menina estava

realmente morta.

Então, colocaram-na num esquife e choraram durante três dias.

Depois cuidaram de enterra-la, porém ela conservava as cores frescas e

rosadas como se estivesse dormindo. Eles fabricaram um esquife de cristal

para que fosse visível de todos os lados e gravaram - na tampa, com letras

de ouro o seu nome e sua origem real; colocaram-na dentro e levaram-na

para o cume da montanha vizinha, onde ficou exposta, e cada um por sua

vez ficava ao pé dele para a guardar contra os animais ferozes.

Mas podiam dispensar-se disso; os animais, todos da floresta, até mesmo os

abutres, os lobos, os ursos, os esquilos e pombinhas, vinham chorar ao pé

da inocente Branca de Neve.

Muitos anos passaram Branca de Neve dentro do esquife, sem

apodrecer; parecia estar dormindo, pois sua tez era ainda como a desejara a

Page 38: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

38

mãe: branca como a Neve, rosada como o sangue e os longos cabelos

pretos como ébano; não tinha o mais leve sinal de morte.

Um belo dia, um jovem príncipe, filho de um poderoso rei, tendo-se

extraviado durante a caça na floresta, chegou à montanha onde Branca de

Neve repousava dentro de, seu esquife de cristal. Viu-a e ficou deslumbrado

com tanta beleza, leu o que estava gravado em letras de ouro e não mais a

esqueceu.

Pernoitando em casa dos anões pediu o esquife para poder leva-lo ao

seu castelo. Vendo a grande tristeza do príncipe, os anões compadeceram-

se dele e deram-lhe Branca de Neve, certos de que ele não deixaria de

coloca-la na sala de honra do seu castelo.

O príncipe tendo encontrado seus criados, mandou que pegassem no

caixão e o carregassem nos ombros. Aconteceu, porém, que um dos criados

tropeçou numa raiz de árvore e, com o solavanco, pulou da boca meio

aberta o bocadinho de maça que ela mordera, mas não engolira.

Então Branca de Neve reanimou-se; respirou profundamente, abriu os

olhos, levantou a tampa do esquife e sentou-se, pois estava viva.

O príncipe, radiante de alegria era encantador e muito gentil, Branca de

Neve aceitou-lhe a mão. O rei muito satisfeito com a escolha do filho

mandou preparar tudo para umas núpcias suntuosas.

Para a festa, além dos anões, foi convidada também a rainha que,

ignorando quem era a noiva, vestiu os seus mais ricos trajes, pensando

eclipsar todas as damas e donzelas. Depois de vestida, foi contemplar-se no

espelho, certa de ouvir proclamar sua beleza triunfante. Qual não foi seu

espanto ao ouvi-lo responder que a noiva do filho do rei era mil vezes mais

formosa!

A perversa mulher soltou uma imprecação e ficou tão exasperada que

não podia controlar-se e não queria mais ir à festa. Entretanto, como a inveja

não lhe dava tréguas, sentiu-se arrastada a ver a jovem rainha. Quando fez

a entrada no castelo, perante a corte reunida, Branca de Neve logo

reconheceu sua madrasta e quase desmaiou de susto.

A horrível mulher fitava-a como uma serpente ao fascinar um

passarinho. Mas sobre o braseiro já estavam prontos uns pares de sapatos

Page 39: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

39

de ferro, que haviam ficado a esquentar em ponto de brasa; os anões

apoderaram - se dela e, calçando-lhe à força aqueles sapatos quentes como

fogo, obrigaram-na a dançar, a dançar, a dançar, até cair morta no chão. Em

seguida, realizou-se a festa com um esplendor jamais visto sobre a terra, e

todos, grandes e pequenos, ficaram profundamente alegres.

4.3.2 A interpretação

No texto apresentado acima, entramos em contato com duas figuras

arquetípicas femininas centrais: o da menina ingênua e o da madrasta má.

Existe ainda uma terceira que pode ser observada como um desdobramento

da madrasta ou vice-versa, que é o da mãe zelosa.

“Ambas as figuras femininas coexistem nesse conto

quase até o fim, e quem sabe também dentro de nós

mesmos. Uma menininha inocente, toda bonitinha, mas

que contém igualmente um lado adulto, invejoso, que

não permite ao outro lado existir. Tão extremado, o lado

mais exigente, que quer ser o melhor e mais

reconhecido pelos outros, acaba sufocando o lado mais

frágil, pequeno e desprotegido.”16

Branca de Neve é desejada desde antes de sua concepção e quando

nasce perde a mãe que segundo podemos imaginar era uma bela mulher. O

Pai, que mantém luto por um ano, casa-se logo após este com uma mulher

muito bonita, mas profundamente amarga e invejosa.

Esta madrasta pode ser lida como uma outra face da mãe, a mãe que

é amorosa e presente até que a filha ameace o seu reinado então, o que ela

passa a desejar é a morte da filha ou a sua paralisação no processo de

tornar-se uma bela mulher, desabrochando para a sexualidade e tomando o

16 BONAVENTURE, Jette. O que conta o conto. São Paulo: Edições Paulinas, 1992. p. 125

Page 40: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

40

centro das atenções. Tanto que a presença da menina só começa a

incomodar depois dos sete anos.

Tornando-se bela, jovem, graciosa e inteligente mulher é obvio que as

comparações entre as duas haveriam de existir (...)”a filha torna-se o

espelho que lhe diz que ela já não é a mulher mais bonita do mundo.17”

E Branca de Neve não toma nenhum tipo de conhecimento dos

sentimentos que desperta na madrasta-mãe, ela permanece num absoluto

estágio de ignorância até o momento em que a madrasta resolve eliminar o

motivo de suas frustrações; até que a madrasta resolve eliminar Branca de

Neve. Mas ela não faz isso ela mesma num primeiro momento. Ela pede que

um caçador o faça – existem aí duas possibilidades. A primeira que esse

caçador seja a própria madrasta imbuída de uma outra imagem arquetípica –

a do caçador. Que é uma figura que caça, que elimina. E aqui a função dele

é eliminar Branca de Neve, ou seja a filha que começa a tomar o seu lugar e

que representa uma ameaça real.

Ou, em uma segunda possibilidade, esse caçador pode representar o

pai ausente, que não se interpela entre os desejos da mulher e da filha e

prefere observar tudo do lado de fora até que lhe é cobrada uma posição a

de ser o caçador responsável por eliminar a filha ou a ameaça a mulher-

madrasta.

“Em Branca de Neve a luta edípica da menina púbere

não é reprimida, mas se concretiza ao redor da mãe como

competidora. Na estória da Branca de Neve, o pai caçador não

consegue uma posição forte e definida. Nem cumpre seu dever

para a rainha, nem sua obrigação moral com Branca de Neve,

ou seja, de dar-lhe segurança e proteção.”(...)18

17 ibid. p. 137 18 BETTELHEIM. op. cit. p.245

Page 41: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

41

Contudo, o caçador é incapaz de matar Branca de Neve e a deixa na

floresta, levando o coração e o fígado de um outro animal que a madrasta

insiste em comer. Em algumas tribos de índios, especialmente as africanas,

os guerreiros vencedores, após um luta como uma outra tribo, comiam seus

melhores adversários como forma de incorporar as habilidades destes como

soldados. Talvez, quando a madrasta exige ao caçador que ele lhe traga o

fígado e o coração de Branca de Neve para que ela os comesse, haveria

algo de intencional em absorver a qualidades da menina como pessoa gentil

e dócil que era.

Após isso ela encontra a casa dos anões que Bruno Bettelheim vai

caracterizar de “uma forma de existência imatura e pré-individual que Branca

de Neve deve transcender” (BETTELHEIM. 2002. p.249).

(...)”Estes “homenzinhos de corpos atarracados e

trabalhando na mineração – penetram habilidosamente

em cavidades escuras – sugerem conotações fálicas. De

certo não são homens em qualquer sentido sexual – seu

modo de vida e o interesse em bens materiais com

exclusão do amor sugerem uma existência pré-

edípica”.19

E passará então a conviver com eles. E aprende que deverá trabalhar

para que possa ficar lá, em troca de ser a rainha deles.

Após isso se sucedem várias tentativas da madrasta de eliminar

Branca de Neve, primeiro como um cinto20 e depois com um pente, ambos

enfeitiçados. Esses episódios conseguem representar o desejo da madrasta-

mãe de paralisar a filha e vê-la sob seu controle parando seu

desenvolvimento; e o desejo da menina-mulher que se enfeita para sentir-se

sexualmente atraente e desejável. 19 ibid. p.249 20 Em algumas versões do conto o cinto é substituído por uma outra peça de roupa; elemento que varia de cultura ou de temporalidade.

Page 42: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

42

E por ambas as vezes os anões conseguem salvá-la, porque tanto o

cinto quanto o pente são elementos externos. Mas no momento em que ela

come a maçã eles não têm como identificar a causa da sua paralisia e não

podem mais salvá-la. Importante é que ela come a parte vermelha da maçã,

onde podemos identificar um outro aspecto o da sexualidade então

finalmente desabrochada. Bruno Bettelheim comenta o seguinte sobre esse

episódio:

(...)”Repetidamente falamos da natureza dupla de

Branca de Neve: era branca como a neve e vermelha

como o sangue – isto é, tinha tanto aspectos assexuais

como eróticos. Quando come a parte vermelha (erótica)

da maçã termina sua inocência.”(...)21

Sucede-se então um período de sono profundo pelo qual Branca de

Neve passa e que pode ser encarado como um período de latência, um

período de preparação para a maturidade ou, de um estágio mais avançado

dessa maturidade.

Quando esse período de latência passa – quando o pedaço de maça

que a sufocava e a mantinha inerte é expulso (o objeto sufocador oferecido

pela madrasta-mãe – ela acorda de seu sono profundo e esta pronta para

viver sua maturidade ao lado do príncipe, que não tem nenhum outro papel

que senão o de indicar o fato de que a menina-mulher pode agora envolver-

se sexualmente e deixar a madrasta-mãe para viver sua própria vida longe

de seu do invejoso, sufocante e controlador olhar. Branca de Neve vence a

madrasta, ou no momento em que consegue se libertar dela.

21 ibid. p.252.

Page 43: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

43

4.4 UM MODERNO CONTO DE FADA; A MOÇA TECELÃ – A MULHER QUE TECE.

4.4.1 A História A moça tecelã

Acordava ainda no escuro, como se ouvisse o sol chegando atrás das

beiradas da noite. E logo sentava-se ao tear.

Linha clara, para começar o dia. Delicado traço da cor da luz, que ela

ia passando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da manhã

desenhava o horizonte.

Depois lãs mais vivas, quentes lãs iam tecendo hora a hora, em longo

tapete que nunca acabava.

Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas, a moça

colocava na lançadeira grossos fios cinzentos do algodão mais felpudo. Em

breve, na penumbra trazida pelas nuvens, escolhia um fio de prata, que em

pontos longos rebordava sobre o tecido. Leve, a chuva vinha cumprimentá-la

à janela.

Mas, se durante muitos dias o vento e o frio brigavam com as folhas e

espantavam os pássaros, bastava a moça tecer com seus belos fios

dourados para que o sol voltasse a acalmar a natureza.

Assim, jogando a lançadeira de um lado para o outro e batendo os

grandes pentes do tear para frente e para trás, a moça passava os seus

dias.

Nada lhe faltava. Na hora da fome tecia um lindo peixe, com cuidado

de escamas. E eis que o peixe estava na mesa, pronto para ser comido. Se

sede vinha, suave era a lã cor de leite que entremeava o tapete. E à noite,

depois de lançar seu fio de escuridão, dormia tranqüila.

Tecer era tudo que fazia. Tecer era tudo que queria fazer.

Mas, tecendo e tecendo, ela própria trouxe o tempo em que se sentiu

sozinha, e pela primeira vez pensou como seria bom ter um marido ao lado.

Page 44: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

44

Não esperou o dia seguinte. Com capricho de quem tenta uma coisa

nunca conhecida, começou a entremear no tapete as lãs e as cores que lhe

dariam companhia. E aos poucos seu desejo foi aparecendo, chapéu

emplumado, rosto barbado, corpo aprumado, sapato engraxado. Estava

justamente acabando de entremear o último fio da ponta dos sapatos,

quando bateram à porta.

Nem precisou abrir. O moço meteu a mão na maçaneta, tirou o

chapéu de pluma, e foi entrando em sua vida.

Aquela noite, deitada contra o ombro dele. A moça pensou nos lindos

filhos que teceria para aumentar ainda mais a sua felicidade.

E feliz foi, durante algum tempo. Mas se o homem tinha pensado em

filhos, logo os esqueceu. Porque, descoberto o poder do tear, em nada mais

pensou a não ser nas coisas todas que ele poderia lhe dar.

- Uma casa melhor é necessária – disse para a mulher. E parecia

justo, agora eram dois. Exigiu que escolhesse as mais belas lãs cor de tijolo,

fios verdes para os batentes. E pressa para a casa acontecer.

Mas, pronta a casa, já não lhe pareceu suficiente.

- Para que ter uma casa, se podemos ter um palácio? – perguntou.

Sem querer resposta, imediatamente ordenou que fosse de pedra com

arremates em prata.

Dias e dias, semanas e meses trabalhou a moça tecendo tetos e

portas, e salas e poços. A neve caía lá fora, e ela não tinha tempo para

chamar o sol. A noite chegava, e ela não tinha tempo para arrematar o dia.

Tecia e entristecia, enquanto sem parar batiam os pentes acompanhando o

ritmo da lançadeira.

Afinal o palácio ficou pronto. E, entre tantos cômodos, o marido

escolheu para ela e seu tear o mais alto quarto da mais alta torre.

- É para que ninguém saiba do tapete – disse. E, antes de trancar a

porta a chave, advertiu:

- Faltam as estrebarias. E não se esqueça dos cavalos!

Sem descanso tecia a mulher os caprichos do marido, enchendo o

palácio dos luxos, os cofres de moedas, as salas de criados. Tecer era tudo

que fazia. Tecer era tudo que queria fazer.

Page 45: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

45

E, tecendo, ela própria trouxe o tempo em que sua tristeza lhe

pareceu maior que o palácio com todos os seus tesouros. E pela primeira

vez pensou como seria bom estar sozinha de novo.

Só esperou anoitecer. Levantou-se enquanto o marido dormia

sonhando com novas exigências. E descalça, para não fazer barulho, subiu

a longa escada da torre, sentou-se no tear.

Dessa vez não precisou escolher linha nenhuma. Segurou a

lançadeira ao contrário e, jogando-a veloz de um lado para o outro, começou

a desfazer seu tecido. Desteceu os cavalos, as carruagens, as estrebarias,

os jardins. Depois desteceu os criados e o palácio e todas as maravilhas que

continha. E novamente se viu na sua casa pequena e sorriu para o jardim

além da janela.

A noite acabava quando o marido, estranhando a cama dura, acordou

e, espantado, olhou em volta. Não teve tempo de se levantar. Ela já desfazia

o desenho escuto dos sapatos, e ele viu seus pés desaparecendo, sumindo

as pernas. Rápido, o nada subiu-lhe pelo corpo, tomou o peito aprumado, o

emplumado chapéu.

Então, como se ouvisse a chegada do sol, a moça escolheu uma linha

clara. E foi passando-a devagar entre os fios, delicado traço de luz, quando

a manhã repetiu na linha do horizonte.22

4.4.2 A Interpretação

A mulher que tece. A imagem arquetípica da tecelã. Neste conto, um

conto moderno, de um autora moderna, podemos traçar tantos paralelos

com os contos de fada tradicionais (se é que podemos dizer que existem

contos de fada tradicionais) e ao mesmo tempo nenhum. Temos aqui uma

mulher. Apenas uma mulher. Não é uma princesa, uma rainha ou uma fada.

Ela é apenas uma mulher, uma mulher que tece. Por outro lado seu tear é

dotado de poderes mágicos. Ela tece no imaginário e no tapete e algo de

22 COLASANTI, Marina. Um espinho de marfim e outras histórias. Porto Alegre: L&PM, 1999. p. 9

- 12

Page 46: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

46

mágico acontece nesse processo; as imagens produzidas no tear são

transportadas para a vida real.

Mas, como as Moîras citadas no início deste trabalho, Deusas gregas,

cujo comportamento simbolizava o cumprimento do destino, ela não tece um

simples tapete, ela tece sua própria vida. E que conotação fantástica a de

tecer, porque na verdade é isso que fazemos no decorrer de nossa

existência, tecemos nossa vida em um grande tapete e quando chegamos

num determinado ponto olhamos o nosso trabalho e ficamos satisfeitos ou

insatisfeitos com o que vemos e então paramos e pensamos no que iremos

tecer agora.

E ela tece coisas simples, coisas indispensáveis para a existência

humana, como o alvorecer e o anoitecer, a chuva e o vento, as nuvens e as

flores enfim, coisas simples.

Contudo, nossa heroína ou, nossa Moîra moderna, sente-se cansada

de tanto tecer e decide que quando tecer a próxima aurora tecerá junto com

ela um companheiro. Escolhe então os fios com que tecerá esta companhia.

Só que algo sai errado porque o homem que no início pareceu ser uma

resposta para sua solidão acabou utilizando-se dela para conseguir aquilo

que ele queria.

Numa aplicação prática, podemos escolher a nossa companhia, mas

não podemos prever o que irá acontecer ao ficarmos com ela. E nada para

ele parecia ser o suficiente. Talvez, numa visão moderna por mais que uma

mulher se entregue a um homem nunca será o suficiente, ele nunca terá

dela a dedicação suficiente.

O fio é o símbolo da ligação; e como relata Nise da Silveira: (...)”é

uma linguagem universal infinitamente rica, capaz de exprimir por meio de

imagens muitas coisas que transcendem as problemáticas específicas dos

Page 47: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

47

indivíduos.”23 e aqui é a função simbólica que o fio tem, ligar necessidade

com realidade. Se for preciso a chuva, ela escolhe o fio e tece a chuva; se é

preciso o sol, ela escolhe o fio e tece o sol.

Mas a partir do momento em que ele começa a solicitar sempre mais

dela e do tear, ela deixa de ligar necessidade e realidade para ligar apenas

vontade e realidade e então a necessidade deixa de existir. E então ela

começa a sentir-se sozinha novamente, uma vez que ela foi confinada no

lugar mais alto do castelo para garantir a segurança não dela, mas do tear.

Que troca havia entre ela e o companheiro que ela tanto havia desejado?

Qual seria a próxima necessidade dele? Quanto mais ela teria que subjugar

a própria vontade em função da do homem?

E como ela bem sabe, lhe é dada a opção de desfazer o já feito e,

diferente de Penélope que tece e destece para ter assegurada a companhia

do marido quando este voltasse; aqui a moça tece para se desfazer da

companhia que ela não quer mais porque não sabe dividir, não sabe

diferenciar necessidade de vontade. E então ela destece o tapete e apaga

qualquer registro da passagem do homem pela sua vida.

A mulher que tece que cria, que transforma, pode tecer e destecer o

seu destino e a vida ao seu redor porque é dela esta função. E que deuses

serão capazes de questionar a sua decisão? E que homens serão capazes

de não se submeterem as suas fiadas?

23 SILVEIRA. op. cit. p. 85

Page 48: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

48

5 CONCLUSÃO

Quando falamos de contos de fada, estamos falando de uma grande

carga de energia psíquica acumulada em anos de existência, tanto humana

quanto dos contos. Neste trabalho traçamos um paralelo entre a história que

esses contos narram e a nossa própria história.

Concluímos que arquétipos são estruturas muito antigas, mas que não

se cristalizaram. Permanecem atuais e dinâmicos. Fazendo Absoluto sentido

para que se depara com eles, assim como os contos, que não envelhecem.

Eles podem até trocar de roupa, mas permanecem com sua estrutura

intacta. O reconhecemos desde o “Era uma vez” até o “Felizes para

sempre”. Quantas e quantas versões modernas para Cinderela, A Bela

Adormecida e Chapeuzinho Vermelho nós conhecemos.

Com Cinderela aprendemos a esperar pelo príncipe, cultivamos a idéia

de que nos libertaremos do cativeiro e descobriremos nossa própria vida;

descobrimos que não teremos que fazer todo o serviço pesado sozinhos e

que no final, tudo acaba bem.

Com A Bela Adormecida aprendemos que faz parte da vida esperar. Um

período de dormência, que para muitos pode ser encarado como ruim, pode

ser fundamental para que entremos em contato com nós mesmos. É

importante saber esperar. E que, se estamos dormindo para o mundo, não

Page 49: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

49

estamos vivendo. Só se passa a viver quando se acorda para o mundo

quando nos tornamos parte integrante dele.

Com Branca de Neve descobrimos que relacionamentos entre mãe e

filha podem ser muito conturbados se não estamos atentos para nosso

inconsciente. E que mais uma vez, é preciso esperara até que se esteja

maduro para tomar certas decisões.

Com a moça tecelã aprendemos que podemos tecer nosso destino de

acordo com o fio que queremos usar, mas precisamos ter cuidado para não

tecer errado porque nem sempre conseguiremos reverter o processo.

Para dar por encerrado este trabalho, utilizarei palavras de Marie

Louise von Franz, que sobre os contos de fada nos diz:

“Depois de trabalhar muitos anos neste campo, cheguei

à conclusão que todos os contos de fadas tentam

descrever apenas um fato psíquico, mas este fato é tão

complexo, difícil e distante de se representarem seus

diferentes aspectos, que centenas de contos e milhares

de versões (como variações musicais), são necessárias

até que esse fato desconhecido penetre na consciência,

sem que isso consiga exaurir o tema. Este fato

desconhecido é o que Jung chama de SELF, que é a

totalidade psíquica de um indivíduo e também,

paradoxalmente, o centro regulador do inconsciente

coletivo. Cada indivíduo e cada nação têm suas próprias

formas de experienciar esta realidade psíquica”.24

E cada mulher tem suas próprias formas de experienciar estas

realidades psíquicas.

24 FRANZ. op .cit. p.16.

Page 50: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

50

6 BIBLIOGRAFIA BETTELHEIM, Bruno. Psicanálise dos contos de fadas. 16ª. Ed Paz e Terra: Rio de Janeiro, 2002 BETTELHEIM, Bruno. Na Terra das fadas - Análise dos personagens femininos. Ed. Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1997. BONAVENTURE, Jette. O que conta o conto. São Paulo: Edições Paulinas, 1992. DIECKMANN, Hans. Contos de fada vividos. São Paulo : Edições Paulinas, 1986. COLASANTI, Marina. Um espinho de marfim e outras histórias. Porto Alegre: L&PM, 1999. FRANZ, Marie-Louise von. A Individuação nos contos de fada. São Paulo : Edições Paulinas, 1984. FRANZ, Marie-Louise von. A Interpretação dos Contos de Fadas. Rio de Janeiro: Achiamé, 1981. FRANZ, Marie-Louise von. A sombra e o mal nos contos de fada. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. GREENE, Liz e BURKE,Juliet Sharman. Uma viagem através dos mitos. Rio de janeiro: Zahar, 2001. LEXIKON, Herder. Dicionário de Símbolos. 5ª edição. São Paulo: Cultrix, 2002. MOTTA, Fausto. Contos e lendas interpretados pela psicanálise. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1984 PAÏN, Sara e JARREAU, Gladys. Teoria e técnica da arteterapia – a compreensão do sujeito. Porto Alegre: Artes Médicas,1996. PHILIP, Neil. 52 Histórias ao redor do mundo. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 1998. PHILIPPINI, Angela. Cartografia da Coragem – Rotas em Arte Terapia. Rio de Janeiro: POMAR, 2001 SILVEIRA, Nise da. Jung – vida e obra.14ª edição. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra,1994.

Page 51: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

51

WARNER, Marina. Da fera a loira – sobre contos de fadas e seus narradores. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. A Arteterapia através do tempo. Comunicandido, Rio de Janeiro, julho.2002. p.2

Page 52: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL Karina Beringuy da Silva OS ARQUÉTIPOS FEMININOS NOS CONTOS DE FADA – uma leitura de Cinderela, A Bela Adormecida, Branca de neve

52

7 ÍNDICE

1 INTRODUÇÃO 9

2 SOBRE ARTETERAPIA 12

3 SOBRE OS ARQUÉTIPOS. 15

4 SOBRE OS CONTOS DE FADA. 20

4.1 CINDERELA – A MULHER QUE ESPERA 22 4.1.1 A História 22 4.1.2 A Interpretação. 24

4.2 A BELA ADORMECIDA – A MULHER FADADA. 26 4.2.1 A História 26 4.2.2 A Interpretação 28

4.3 BRANCA DE NEVE – A MULHER QUE VENCE A MADRASTA 32

4.3.1 A História 32 4.3.2 A interpretação 39

4.4 UM MODERNO CONTO DE FADA; A MOÇA TECELÃ – A MULHER QUE TECE. 43

4.4.1 A História 43 4.4.2 A Interpretação 45

5 CONCLUSÃO 48

6 BIBLIOGRAFIA 50 7 ÍNDICE 52