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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA CONTRIBUIÇÕES DA NEUROCIÊNCIA PARA A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL Por: Ana Rosa Ferreira dos Anjos Orientador Profª. Dra. Marta Relvas Rio de Janeiro 2015 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

CONTRIBUIÇÕES DA NEUROCIÊNCIA PARA A

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES DA

EDUCAÇÃO INFANTIL

Por: Ana Rosa Ferreira dos Anjos

Orientador

Profª. Dra. Marta Relvas

Rio de Janeiro

2015

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

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PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

CONTRIBUIÇÕES DA NEUROCIÊNCIA PARA A

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES DA

EDUCAÇÃO INFANTIL

Esta publicação atende a complementação

didático-pedagógica da disciplina de

metodologia da pesquisa e a produção e

desenvolvimento de monografia à AVM

Faculdade Integrada como requisito parcial

para obtenção do grau de especialista em

Neurociência Pedagógica.

Por: Ana Rosa Ferreira dos Anjos

.

Rio de Janeiro

2015

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AGRADECIMENTOS

À minha família. A todos que

cruzaram meu caminho em

minha jornada profissional:

colegas, pacientes, crianças,

famílias, alunos, que

depositaram confiança em

meu trabalho e tanto me

ensinaram. À orientadora

dessa monografia, Prof.ª

Marta Relvas, que enquanto

nos ensina a importância da

motivação no aprendizado,

nos presenteia com seu

exemplo, nos motivando e

nos encantando com suas

aulas. Ao corpo docente da

AVM Faculdade Integrada. E

a todos que direta ou

indiretamente, contribuíram

para a realização dessa

monografia.

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DEDICATÓRIA

À Aurora, minha mãe querida,

presença doce e constante, que

ao dar suporte em meu lar,

possibilita que eu disponibilize

tempo para meu

aperfeiçoamento profissional.

Também aos meus filhos

Dayanna, Gabriela e Daniel,

pelos incentivos, carinhos,

companheirismo e pela alegria

que trouxeram para minha vida.

Ás amizades sinceras que

possuo, que com certeza se

reconhecem nessa citação e que

sempre me oferecem seus

ombros nos momentos difíceis e

compartilham com risos e

sorrisos os momentos alegres.

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RESUMO

Essa produção oferece ao leitor um panorama sobre a influência das

vivências pessoais dos educadores, ligadas à sua primeira infância,

na prática cotidiana da Educação Infantil. Esse estudo se baseia nos

conhecimentos da neurociência acerca da memória, da emoção e dos

padrões de comportamento. Pretende-se uma produção teórica útil ao

campo da Educação que ofereça subsídios para trabalhos a serem

desenvolvidos por gestores, psicólogos, pedagogos e demais

profissionais ligados à coordenação de Instituições de Educação

Infantil. Sugere-se a partir daí propostas de trabalho que favoreçam a

reestruturação de processos mentais que emergem no exercício

profissional do professor e promovam uma melhor qualidade na

relação educador-criança e, consequentemente, no desenvolvimento

afetivo e cognitivo desses futuros adultos. Acredita-se, portanto, que

esse estudo pode contribuir, de forma indireta, para uma melhor

qualidade das relações e da sociedade como um todo. .

.

Palavras-chave: Infância – Educação Infantil– Educadores

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METODOLOGIA

A metodologia utilizada destina-se a apresentar contribuições

teóricas, embasadas na Neurociência, na Psicanálise e na Educação.

Será realizada pesquisa bibliográfica e documental enfocando

temas relacionados às primeiras relações objetais dos bebês

(Winnicott e Wallon), estudos da neurociência abordando plasticidade

cerebral, memória e o papel das emoções nas funções cerebrais

(Marta Relvas, António Damásio) e conceitos de autores da Educação

(Paulo Freire e Edgar Morin).

Esse estudo tem sua motivação a partir da vivência

profissional da autora em Instituição de Educação Infantil e nas

questões suscitadas a partir dessas experiências. Assim, além da

revisão bibliográfica das teorias supracitadas, o presente trabalho

apoia-se nas observações cotidianas de crianças de 0 á 5 anos e em

supervisões para profissionais multidisciplinares ligados ao universo

da Educação Infantil.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO-----------------------------------------------------------------------08

CAPÍTULO I

O cotidiano da Educação Infantil e a importância dos primeiros -----11

anos de vida na formação da personalidade

CAPÍTULO II

A neurociência e um novo olhar sobre a memória, a emoção e------25

ressignificação afetiva

CAPÍTULO III

“Cuidando do outro cuido de mim...”------------------------------------------35

CONCLUSÃO --------------------------------------------------------------------- 51

BIBLIOGRAFIA ------------------------------------------------------------------ 53

WEBGRAFIA ----------------------------------------------------------------------57

INDICE ------------------------------------------------------------------------------- 58

ANEXOS --------------------------------------------------------------------------- 60

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INTRODUÇÃO

Diante da reflexão sobre os diversos atravessamentos que

perpassam os educadores da Educação Infantil, em especial os que

lidam com as crianças de 0 a 3 anos, torna-se relevante pensar nos

aspectos subjetivos que influenciam o cuidar e o educar crianças tão

pequenas.

Esse estudo parte do pressuposto de que as ações desse

profissional estão diretamente vinculadas a sua história, seus valores,

suas crenças e influenciam o processo de construção de identidade

da criança numa etapa crucial de seu desenvolvimento. Propõe-se,

assim, um estudo acerca da emergência de conteúdos inconscientes,

relacionados às vivências da primeira infância do educador, que se

manifestam em suas ações cotidianas ao lidar com bebês. Cabe

lembrar que estes demandam um processo intenso de investimento,

por parte do adulto, na construção de uma forte vinculação afetiva,

indispensável para o desenvolvimento saudável de crianças nessa

faixa etária.

A partir dessas consideraçõ2es surgem as seguintes questões:

É possível pensar em uma formação em serviço de professores e

educadores da Educação Infantil sem levar em conta as vivências

infantis atualizadas na sua prática? Como um trabalho desenvolvido

com esses profissionais pode contribuir com para remodelação de

antigos padrões comportamentais e afetivos? Como os estudos da

neurociência podem contribuir para o processo de ressignificação

afetiva de vivências da primeira infância?

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Considerando a importância das primeiras relações dos bebês

e que essas, ao se darem no âmbito da Creche, incluem também as

experiências pessoais dos educadores envolvidos, acredita-se que

desenvolver trabalhos com esses profissionais, baseados nos

estudos da neurociência acerca da plasticidade cerebral no adulto, da

memória e do papel das emoções nas funções cerebrais, pode

subsidiar o trabalho desenvolvido com crianças na Educação Infantil.

Nesse sentido, pretende-se estudar as bases neurocientíficas da

memória afetiva e como ela é evocada a partir de novas experiências,

podendo também ser revestidas de novos conteúdos.

O primeiro capítulo “O cotidiano da Educação Infantil e a

importância dos primeiros anos de vida na formação da

personalidade” aborda temas do cotidiano da Educação Infantil como

o impacto emocional da entrada da criança na creche, o processo de

adaptação e mordidas como um ato presente nessa faixa etária,

correlacionando-os com a importância da atuação do profissional

envolvido para o desenvolvimento saudável da personalidade da

criança.

O segundo capítulo “A neurociência e um novo olhar sobre a

memória, a emoção e ressignificação afetiva” aborda estudos da

neurociência que possam lançar luz sobre alguns comportamentos

suscitados a partir de experiências atuais remetidas a vivências

anteriores remotas e inconscientes.

O terceiro e último capítulo “Cuidando do outro cuido de mim...”

desenvolve a hipótese que o contato e o cuidado cotidiano com

bebês atinge camadas profundas do psiquismo do profissional

promovendo, por vezes, a emergência de conteúdos emocionais

inconscientes. Pensa-se, a partir daí, em propostas de trabalho que

favoreçam o autoconhecimento e a superação de impasses no âmbito

emocional, ativando o potencial criativo e curativo dos sujeitos e

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promovendo a assimilação de conteúdos afetivos e a transformação

de padrões comportamentais.

Acredita-se que esse estudo contribuirá com profissionais que

atuem diretamente ligados a gestão escolar de creches e pré-escolas,

principalmente, psicólogo escolar, pedagogo e psicopedagogos.

Acredita-se também que essa compreensão de aspectos subjetivos

ligados à prática do professor, pode reverter-se em fonte de

crescimento pessoal para o mesmo, diretamente ligado à sua prática

profissional.

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CAPÍTULO I

O COTIDIANO DA EDUCAÇÃO INFANTIL E A

IMPORTÂNCIA DOS PRIMEIROS ANOS DE VIDA

NA FORMAÇÃO DA PERSONALIDADE

Os bebês têm necessidade de uma história para se

construírem, uma história que não seja somente biológica ou

genética, mas também uma história relacional.

1.1 DESCOBRINDO O MUNDO, DESCOBRINDO O

OUTRO, CONSTRUINDO A SI MESMO...

O processo de adaptação escolar, também chamado de

inserção ou acolhimento, é compreendido como o tempo e as

estratégias propostas pela instituição de ensino no sentido de

favorecer a formação e o fortalecimento gradativo do vínculo entre a

criança e o adulto que doravante irá se constituir como seu cuidador.

Em última instância, é composto por medidas que visam evitar que o

bebê sofra angústia de separação nesse momento de afastamento da

figura materna.

Esse processo, em geral, tem seu enfoque principal no bem-

estar do bebê e nas atitudes e sentimentos maternos que facilitam ou

dificultam esta separação. É um momento, porém que afeta de forma

intensa todos os a atores que dele fazem parte.

Este estudo abordará este tema sob a perspectiva da dinâmica

geral que abrange esse processo, partindo de considerações sobre a

primeira separação mãe-bebê (que ocorre no parto) à entrada em

uma instituição, enfocando um aspecto pouco falado que trata do

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impacto emocional desse momento sobre o professor que acolhe a

dupla mãe-bebê.

1.1.1 A PRIMEIRA SEPARAÇÃO

Durante a gestação mãe e bebê encontram-se num sistema de

inter-relação visceral no qual a sobrevida intrauterina depende

absolutamente de sua mãe e a saúde do bebê tem impacto direto

sobre a saúde e sobrevivência materna.

Nesse período a gestante vai reorganizando sua imagem e seu

esquema corporal frente às sucessivas e intensas mudanças

biológicas que seu corpo passa num curto intervalo de tempo.

“HABITANDO UM CORPO EM

TRANSFORMAÇÃO”

Um ser habita meu corpo

Do meu próprio corpo nasceu

Mas não sou eu

Nem tampouco ousa ainda ser outro

Instala-se no meu corpo

Mas não é um inquilino

Habita o meu eu

Onde eu mesmo desconheço

No entanto nem posso dizer que o conheço

E o amo tanto

Por sua causa

Meu corpo vira e revira

Cresce e decresce

Minhas entranhas se desacomodam

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E minhas vísceras se desarrumam

Para depois se reorganizarem

E é tão inofensivo, dependente...

Meu corpo nunca mais será o mesmo

Eu nunca serei a mesma

E ao mesmo tempo

Por esse outro

Eu nunca fui tão eu mesma.” (Anjos, A.R. – Jornal “O Ventre”, 1993)

Esse processo de aproximadamente 40 semanas culmina com

um grande desafio de reorganização corporal, emocional e social que

é a chegada de um bebê.

Quando tem a oportunidade de vivenciar um trabalho de parto,

a mulher “desengravida” em no máximo 20 horas. Contudo no Brasil o

índice de cesáreas em 2014 foi de 43% sendo que na rede particular

chega a 80% (o recomendado pela Organização Mundial de Saúde é

no máximo 15%). Portanto, nesse país, o nascimento e a primeira

separação entre o bebê e sua mãe, concretizada no corte do cordão

umbilical, ocorrem em média em trinta minutos.

Assim mãe e bebê tem esse curto período de tempo para

adaptar-se a uma relação que passa de intra a extra-uterina e à

elaboração de tudo que envolve essa mudança. Pode-se considerar

também como uma variável que interfere nessa vinculação, a rotina

hospitalar na assistência ao pós-parto, que ocorre nos grandes

centros urbanos brasileiros.

Dessa forma, a relação extra-uterina mãe-bebê é inaugurada

frente a uma série de procedimentos que impõe inúmeros desafios

para que o contato corporal (simbiótico até então) se dê de forma

fluida e contínua.

Durante o trabalho de parto, a ocitocina, produzida no

hipotálamo é liberada sendo responsável pelas contrações uterinas e

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pela produção do leite. Essa liberação de ocitocina atinge seu pico

após o nascimento do bebê e hoje se sabe que sua função não se

restringe a amamentação, mas também tem um papel importante na

vinculação mãe-bebê. Pesquisas recentes demonstraram que quando

a mãe ouve um sinal de fome do bebê aumentam os níveis de

ocitocina em seu sangue.

A liberação de ocitocina contribui para explicar as bases

neurofisiológicas do amor, enquanto fundamento que sustenta

fisicamente a capacidade de constituir vínculos e mantê-los, mas que

não se reduz a ele. Segundo Moura e Ribas (2005) as características

físicas dos filhotes humanos, tais como cabeça grande, proeminência

das bochechas e extremidades curtas e grossas, provocam no adulto

o desejo de ocupar-se deles, cuidando-os e protegendo-os. Essa

relação, contudo, se desenvolverá a partir da história de vida dessa

mãe, dessa família e das reações do bebê.

Esse conjunto dinâmico ativará um complexo neurobiológico

envolvendo o sistema límbico e o sistema de recompensa, tendo na

ocitocina um neuromodulador com papel relevante no

estabelecimento da vinculação mãe e bebê.

Assim, em condições gerais, a fêmea humana, desde seu

trabalho de parto (ou mesmo sem ele) tem uma condição

neurofisiológica predisposta a uma vinculação “apaixonada” com seu

filhote.

Há que se considerar, entretanto, não somente a mãe

biológica, mas quem quer que ocupe na vida do recém-nascido o

papel da maternagem, visto que essa engrenagem fisiológica

incrementada pela ocitocina está presente nas relações afetivas com

intensa vinculação afetiva. Isso pode ser exemplificado nas situações

em que mães adotivas ou avós amamentam seus bebês.

Dessa forma, de agora em diante, quando nesse estudo

houver referência à mãe estará tratando da pessoa que exerce

primariamente a maternagem.

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1.1.2 – ENTRADA NA CRECHE - ESCOLHA OU

IMPOSIÇÃO SOCIAL?

A primeira creche que se tem notícia foi criada em 1844, em

Paris, como local para abrigar crianças recolhidas das ruas, filhas de

operárias numa época em que, devido às modificações sociais

ocorridas. Em decorrência de uma nova estrutura no mercado de

trabalho, a figura feminina deixou o cuidado exclusivo da casa e dos

filhos para trabalhar fora.

No decorrer do tempo, inúmeras concepções acerca da mulher

e seu papel social e familiar foram tecidas. Não se pode negar os

fatores sociais, culturais e econômicos que impõe à mulher uma

jornada de trabalho intensa que a afasta ou determina uma nova

forma de lidar com os afazeres domésticos e cuidados maternos e a

implicação disso na sociedade. Por outro lado, essa saída da mulher

“da casa para o mundo” é visivelmente marcada por motivos que

extrapolam a emergência de uma necessidade externa e apontam

para um anseio feminino de envolvimento com outros interesses.

Talvez este anseio estivesse presente em outras épocas e

manifestado de acordo com o contexto em que estava inserido. Por

exemplo, algumas mulheres na Idade Média, quando em condições

sociais para tal, incumbiam às amas secas os cuidados com a criança

pequena e, quando passado os primeiros perigos em relação à

sobrevivência, os infantes eram entregues aos preceptores a quem

era delegada sua educação.

Quer seja em tempos mais remotos na figura da ama seca e

do preceptor ou atualmente na figura da creche e sua cada vez mais

expressiva e reconhecida importância na Educação Básica, o fato é

que a relação mãe/bebê em um dado momento é atravessada por um

outro que se interpõe no cuidado e na educação da criança. Este

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estudo debruçará seu olhar para a entrada do bebê nas instituições,

seu impacto na relação mãe/filho e as consequências e possiblidades

para os profissionais que ocupam esse papel.

1.1.3 PROFESSOR: O REPRESENTANTE

INSTITUCIONAL DA SEPARAÇÃO

A entrada do bebê na creche marca o início socialmente

instituído de um novo ciclo. A família, recém re-organizada pela

chegada de seu novo membro se vê diante do desafio de permitir que

seu bebê dê continuidade à sua jornada de crescimento, agora longe

da família.

O desenvolvimento do bebê se dará, a partir dos vínculos

iniciais constituídos. Assim o envolvimento primordial com suas

figuras parentais dará a base para o posterior “des-envolvimento”

(separação necessária para a vida saudável), e determinará as bases

para que a adaptação à creche, onde encontrará novas rotinas,

cuidados e relações, se dê de forma saudável.

Numa perspectiva psicanalista, a função materna é a função

primordial para a organização da estrutura psíquica, constituindo e

erogenizando o corpo do sujeito. A função paterna está ligada ao

corte que reacomoda o idílio da relação mãe/filho e oferece-se como

outro polo de identificações.

Pode-se interpretar a instituição creche (e seu contato mais

imediato: o professor) como um representante da função paterna, na

medida em que se institui como uma instância mediadora do desejo

materno.

Percebe-se assim uma dualidade na creche enquanto função.

Se por um lado, endereçada pela autorização materna, deverá

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exercer a maternagem, substituindo a mãe quando ela não está; por

outro se constitui o local que afirma e sustenta essa ausência.

Essa dualidade atravessa a relação família creche em diversos

aspectos:

Como um profissional da educação, e com maior experiência

com crianças, torna-se uma referência que orienta, tranquiliza e diz

para família o que é esperado e os estímulos adequados para a faixa

etária de seu filho. Em contrapartida percebe-se certa desvalorização

do professor de educação infantil, herança de uma história onde os

cuidados dos pequenos eram delegados às amas de leite,

inicialmente escravas. Devido ao fato de ainda estar presente no

imaginário cultural a concepção do educador “serviçal”, esse

profissional, que é citado como “uma melhor opção que a vovó ou a

babá”, também recebe a projeção de profissional de menor valia.

O professor é um aliado na medida em que proporciona à mãe

retomar sua vida profissional ou outros aspectos de sua vida que

foram temporariamente postos de lado em função da maternidade. O

afeto que a criança demonstra por esse adulto é que dará a seu

responsável a tranquilidade que seu filho está sendo bem cuidado.

Paralelamente, esse professor torna-se um rival, já que muitas vezes,

permanece com seu filho por um tempo maior do que a própria

família e presencia eventos, como, por exemplo, o início do

engatinhar, da marcha, da fala, e por vezes, a própria introdução

alimentar que ocorre nesse espaço.

Dessa forma, o professor, representante institucional que se

interpõe nessa relação de paixão, torna-se alvo de sentimentos

ambíguos por parte da família que a ele delega os cuidados de seu

bebê.Confiança/desconfiança, ciúme, hipervalorização/desvalorização

são exemplos de sentimentos a ele endereçados. Ele passa a habitar

o imaginário de ideais que a mãe tem a respeito de seu bebê e da

educação de seu filho.

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1.1.4 A DEMANDA EMOCIONAL QUE SE IMPÕE AO

PROFESSOR FRENTE O ACOLHIMENTO DE CRIANÇAS

PEQUENAS

O processo de adaptação à creche deve acontecer de forma

gradativa e ser regulado conforme as necessidades da família e da

criança. É necessário um cuidado e olhar específico para esse

momento. As intervenções por parte dos profissionais devem facilitar

a reorganização familiar de forma que o vínculo parental com o bebê

seja preservado, não se instalando uma relação ansiogênica em

função da separação.

As pessoas que irão receber essas crianças precisam estar

sensíveis e disponíveis para oferecer um suporte essencial, de modo

que a criança se sinta amparada e acolhida nesse espaço social que

a ela se apresenta de maneira intensa, evitando que se torne lugar ou

momento de sofrimento, exaustão e desespero.

Não se pode falar de disponibilidade para o trabalho com

bebês sem se falar em acolhida corporal. Tanto o abandono corporal,

como também o outro extremo, o envolvimento excessivo ou

aprisionamento do bebê no corpo do adulto, por questões

inconscientes deste, ameaçam seu desenvolvimento.

Pensar a relação do indivíduo com a infância estende-se para

além do aspecto sócio-histórico-cultural dos grupos sociais. O sujeito

comprometido com a infância está em primeiro lugar atravessado

pela sua própria infância, que se atualiza e reescreve-se no cotidiano

do seu papel de educador.

Ao mesmo tempo em que é suscitado no adulto o sentimento

de cuidar e proteger, é suscitado também o sentimento de evitar

sensações que nele são evocadas ao lidar com crianças pequenas.

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Os bebês reativam no educador suas próprias posições infantis, suas

angústias e depressões primárias. Por isso, sua atenção deve ser

dirigida não só aos bebês de carne e osso com os quais se ocupa

atualmente, mas também direcionada ao seu interior, ao bebê que ele

mesmo foi um dia.

A construção de um trabalho de formação continuada com

educadores, que vise à construção real de uma práxis, deve levar em

conta esses últimos aspectos. Nesta perspectiva, questiona-se uma

formação que considera exclusivamente aspectos teóricos sem levar

em conta a intensa mobilização emocional que atinge o profissional

que interage durante grande parte do dia, com bebês e com suas

famílias, necessitando de estratégias de reorganização interna para

dar continuidade as suas atividades.

Considerando a formação da subjetividade do educador em

suas experiências afetivas como fato interferente na qualidade

relacional que este estabelece com o bebê, pode-se concluir que não

bastam informação e reflexão cognitiva para um trabalho de boa

qualidade.

Portanto, para a construção de um bom trabalho com crianças

desta faixa etária é preciso uma efetiva práxis voltada para o

acompanhamento afetivo e pessoal do educador. Conclui-se, em

última instância, que é necessário criar espaços de desconstrução,

acolhimento e reorganização para que os professores tenham

amparo institucional para exercer uma prática pedagógica diferente

da que foram submetidos nos anos cruciais de seu desenvolvimento.

Isso implica numa reaprendizagem da proposta de formação

de educadores, o que compromete toda a instituição destinada a esse

serviço. Educadores e todos os membros da instituição escolar são

afetados (no sentido de estar exposto aos afetos) pela reorganização

interna que esta proposta induz. A proposta de uma organização

institucional que permita momentos de investimento na reorganização

subjetiva do professor instaura um processo em construção,

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inacabado, no sentido de permitirem-se sempre novas possibilidades

e reorganizações.

Dessa forma para propiciar aos profissionais momentos para

uma reorganização interna, também a própria instituição precisa de

estratégias que permitam sua constante reformulação e recriação

sem ameaçar, contudo, a integridade de suas propostas ou sua

unidade.

1.1.5 MORDIDA – UM DOS MUITOS DESAFIOS DA

EDUCAÇÃO INFANTIL

A mordida entre crianças na faixa etária de 1 a 3 anos de idade

é uma ocorrência comum na Creche. Muitos pais temem e outros

adultos correlacionam à frequência com que determinada criança

morde como uma tendência à agressividade, porém não há nenhum

estudo que comprove a relação entre crianças “mordedoras” e

adolescentes, jovens ou adultos violentos.

Nesta fase a criança usa a oralidade para explorar o ambiente

que a cerca. Ela experimenta o mundo com a boca e o outro. Seja

uma criança ou um adulto, também são objetos de sua

experimentação.

Elas não compreendem a dor que causam no outro porque

nessa idade só faz sentido para a criança o que acontece em sua

sensoralidade. Algumas crianças mordem e, quando a criança que foi

mordida chora, se assustam e choram também. Outras mordem e

observam a reação do colega com curiosidade, depois tentam morder

novamente como se experimentassem se o efeito é o mesmo, tal qual

fazem com um brinquedo que ao apertarem toca determinado som.

Há crianças que colocam a mão dentro da boca do colega com

curiosidade e ao serem mordidos choram, mas depois repetem a

ação explorando esse orifício tão interessante. Algumas

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experimentam as demonstrações de afeto, tão aprovadas pelos

adultos, abraçam e beijam, mas no meio do trajeto, tem o impulso de

outro contato e.... simplesmente mordem.

Aos poucos, a criança vai percebendo que essa ação produz

efeitos, e que numa disputa, seja por espaço, por brinquedo ou para

defender-se, consegue o que deseja. Mas, por outro lado, também

percebe que seu ato provoca extrema desaprovação nas pessoas

que representam sua segurança, o adulto com quem tem vínculos e

cuida dela, como seus pais ou a professora.

Essa “desaprovação” (no tom e na medida certa, sem colocá-la

em evidência, mas deixando clara a censura ao ato) vai dar a criança

subsídios para controlar seus impulsos até que o desenvolvimento da

organização do pensamento e da linguagem lhe permita ter

condições de compreensão e de empatia. Assim a ação do adulto e

suas frases (tais como: “Isso dói!”; “O amigo ficou triste”; “Não pode

morder”) a principio não fazem muito sentido para a criança, mas vão,

gradativamente ajudando-a a buscar outras formas de expressão, de

exploração e controle sobre seu impulso.

Por isso é muito importante que, embora seja corrigida, a

criança não seja humilhada por seu ato. O adulto deve ser seu “ego

auxiliar” que representará a sua possibilidade de socializar-se.

Colocá-la como foco da atenção ou rotulá-la de agressiva vai

contribuir para fixar esse comportamento sob o qual tem pouco

domínio. Afinal, a mordida também é uma forma de descarregar

tensão, e às vezes inclusive a criança morde a si mesma, o que não é

preocupante desde que não seja frequente e associado a outros

comportamentos.

Entender que a mordida é, dentre outras coisas, uma fonte de

prazer torna-se fácil ao pensar que é comum também estar presente

nas trocas afetivas dos adultos, seja em brincadeiras com crianças

(“tão fofinho, dá vontade de morder”) como nos jogos sexuais entre

adultos.

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Nessa faixa etária além da mordida, as crianças têm uma

interação corporal intensa. Seja na exploração do espaço ou

experimentando as possibilidades de deslocamento, esbarram-se,

empurram-se e ás vezes optam por ficarem “coladas” em um espaço

pequeno embora não estejam compartilhando uma brincadeira e haja

bastante espaço disponível a sua volta. Também disputam objetos,

puxam cabelo, orelhas e jogam seu corpo sobre o corpo do colega,

experimentando as diversas possibilidades de ocupar o espaço e

estabelecer o contato corporal. Nessa interação choram, riem,

assustam-se, divertem-se e vivenciam os prenúncios do convívio

social.

Em algumas situações a criança recupera-se rapidamente da

mordida que recebeu, mas fica extremamente “sentida” com o

brinquedo que foi arrancado da sua mão. Outras vezes chora

assustada devido a um barulho ou chora intensamente por um motivo

que não fica aparente ao adulto que dela cuida, e, ao qual, frente à

inexistência de pistas a respeito do que causou tamanha angústia,

resta apenas acolhê-la e confortá-la.

Nesse universo do coletivo infantil, como a Creche, dentre as

inúmeras situações que a criança vivencia, a mordida deixa um

registro (a marca dos dentes) que denuncia a seus pais uma das

muitas ações, vinda de outra criança, que seu filho experimentou.

Essa ação, em geral, imprime no imaginário dos familiares da criança

mordida uma cena que dificilmente se inclui no cenário da Educação

Infantil. É comum visualizarem seu filho desprotegido e impotente

sendo vítima de um ato feroz.

A culpa por terceirizar os cuidados com seu filho entra em jogo.

A isso se somam os fantasmas de sua própria história de vida, os

anseios, as concepções e as expectativas que projetam sobre ele.

Perguntas tais como: “Será que ele é muito bonzinho e ninguém

presta atenção nele? ”; “Será que chorou (sofreu) muito quando foi

mordido? ”; “Será que ele é muito passivo, não reage, é igual a ...

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(pai, mãe, avô(ó)...)”; “Será que ele provoca, implica?”; são comuns

quando se conversa com os pais sobre mordida.

Por outro lado, os pais das crianças que mordem também

ficam apreensivos e temerosos. Medo que seu filho seja rotulado ou

excluído, de serem julgados como pais que não dão limites,

agressivos ou que deduzam que a criança está passando por algum

problema familiar; dúvida de como agir quando a ação ocorre na sua

presença e questionar se seu filho morde porque não se sente bem

no ambiente da creche, são os mais comuns.

O professor torna-se então alvo de desconfiança e de raiva por

parte dos pais, que, ao mesmo tempo, anseiam por reparar este

sentimento, pois desejam e necessitam manter seu filho sob seus

cuidados. A capacidade do profissional de proteger e orientar é

questionada. Embora compreendam que “é uma característica dessa

faixa etária”, os familiares necessitam que o professor lhe reafirme e

garanta que o ambiente educacional é seguro e que seu filho estará

protegido física e afetivamente (mas não imune a essa e outras

situações). Eles querem acreditar que, embora entre muitos, a criança

recebe um olhar específico que o reconhece como único.

O professor precisa sentir-se confiante o suficiente para passar

essa segurança, mas, também, humilde o suficiente para rever seu

grupo e sua proposta de trabalho. Refletir se a equipe de cuidadores

que com ele trabalha encontra-se em harmonia, compreendendo que

quando há tensão no grupo de adultos, há tensão no grupo de

crianças, que é captada e manifestada em mensagens corporais.

Avaliar se as atividades pedagógicas estão suficientes, interessantes

e adequadas às faixas etárias, pois as crianças pequenas mordem

quando estão ociosas, entediadas ou tensas. Pensar também se as

estratégias de acolhimento estão boas para suprir a necessidade de

crianças tão pequenas.

Às vezes, em suas reflexões esbarra em impossibilidades e

limites da instituição que trabalha como, por exemplo, a quantidade

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de crianças/adulto, o tamanho da turma, disponibilidade de material

pedagógico adequado, expectativa da coordenação ou o próprio

projeto pedagógico da instituição.

Assim o professor encontra-se na convergência de

expectativas diversas e variadas que colocam constantemente em

xeque sua competência e sua autoestima. O professor que trabalha

na pré-escola e mais especificamente na Creche é alvo de uma série

de projeções. É preciso considerar os recursos emocionais que

necessita ter ou desenvolver para atender essa demanda e avaliar

como sua vivência pessoal pode influenciar em sua prática

profissional.

É certo que, enquanto profissional qualificado, o professor de

Educação Infantil encontra-se (ou deveria estar) habilitado

teoricamente acerca do desenvolvimento infantil e das situações

cotidianas que envolvem o coletivo dessa faixa etária. Mas além de

seu conhecimento teórico, consciente, organizado, fruto de seu

estudo e sua prática, o professor possui também outro saber sobre a

infância. Há um conhecimento mais profundo que atravessa sua

prática: sua própria história infantil.

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CAPÍTULO II

A NEUROCIÊNCIA

E UM NOVO OLHAR SOBRE A MEMÓRIA, A

EMOÇÃO E A RESSIGNIFICAÇÃO AFETIVA

Trabalhar com a educação remete a discussões sobre a

formação – tanto do educando quanto do educador – discussões

essas que geralmente são direcionadas por um foco na

profissionalização. Assim, a ideia de formação pode limitar-se, em um

sentido mais trivial, à graduações, títulos, cursos e seminários.

Porém, quando se trata de Educação Infantil, chama à atenção as

mobilizações de afeto que ocorrem na dinâmica cotidiana do trabalho

com crianças. Dessa forma fica clara a necessidade de ampliar o

conceito de formação, remetendo-o a outro modo de aprendizagem,

que diz respeito não só ao acúmulo de conhecimentos, mas a

experiência que se torna marca nos corpos e manifesta-se em ações.

A estrutura cerebral, enquanto órgão, antecede a estruturação

psíquica. Enquanto função, porém ela só se desenvolve a partir da

atividade, ou seja, no caso do bebê a partir dos estímulos vindos do

ambiente do qual depende. Na primeira infância vai se constituir uma

complexa rede neuronal a partir do estabelecimento de conexões,

que por analogia vão se organizando em circuitos, de acordo com as

experiências vividas.

Os circuitos podem ser modificados, à medida que se alteram

as experiências, mas os estímulos repetidos vão fixar conexões

neurais e consequentemente comportamentos cuja origem por vezes

não está acessível à consciência. As conexões estabelecidas na

primeira infância, são particularmente estáveis.

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A criança busca experimentar o que é já capaz de fazer e

imagina o que será capaz de fazer futuramente. Para Erikson, a partir

da observação dos adultos no desempenho de seus papéis sociais e

da possibilidade de desempenhá-los em seus jogos simbólicos, a

criança estará também aprendendo como funciona o mundo social e

como ela funciona dentro dele. Essa aprendizagem se dá no corpo e

pelo corpo, sendo este o mediador e o suporte desses processos,

onde a partir das identificações com o adulto cuidador e as

informações fornecidas pelo seu próprio corpo a criança irá

construindo um conjunto representativo de si mesma.

Na relação que se estabelece entre a criança e o educador,

duas singularidades estão em jogo, não só a criança responde ao

corpo do adulto, mas também, este, na sua relação com a criança,

atualiza elementos de sua história, sua vivência, seus desejos. A

representação de seu mundo interno, quer seja consciente ou não,

manifesta-se em seu mundo externo através de sua corporeidade, e

são apreendidas pela criança. “O socius ou o outro é um parceiro

perpétuo do eu na vida psíquica” (Wallon, 1979).

2.1 - MEMÓRIA AFETIVA

No cérebro humano o sistema límbico é a sede das emoções,

sendo formado principalmente por estruturas cerebrais responsáveis

por essas e secundariamente pela memória e aprendizagem, além de

ter uma interação importante com o sistema endócrino. Duas

estruturas do sistema límbico são de extrema relevância no estudo da

memória afetiva: a amígdala e o hipocampo. A amígdala é uma pequena estrutura amendoada situada no

interior da região antero-inferior do lobo temporal. Possui conexão

com a área pré-frontal, com os núcleos septais, com o núcleo dorso-

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medial do tálamo e com o hipocampo. A amígdala coloca o animal em

estado de alerta numa situação de perigo, atuando na

autopreservação. Ela processa a informação trazida pelos sentidos e

ajuda a determinar se uma experiência foi prazerosa ou ameaçadora.

O hipocampo atua principalmente na formação da memória de longa

duração e no arquivo desses registros. Essas duas estruturas, em

conexão com inúmeras outras, promovem um arquivo emocional das

experiências e são a base para as respostas cognitivo-

comportamentais posteriores. O ato de pensar envolve o esquecimento de detalhes e a

possibilidade de fazer generalizações. A tendência é esquecer, de

alguma forma, aquilo que não traz benefícios ou é prejudicial. Existem

várias formas de esquecimento, as principais são: extinção, repressão

e esquecimento real.

No esquecimento real as sinapses são extintas por falta de uso

(atrofia sináptica), ou por lesão. Essas lembranças são

definitivamente descartadas e não há como acioná-las.

A extinção e a repressão são conceitos que se confundem. A

extinção é um mecanismo bastante utilizado nas teorias

comportamentais, desenvolvidas a partir dos primeiros estudos de

Pavlov sobre condicionamentos. A extinção opera basicamente com a

remoção ou introdução de estímulos associados a uma determinada

memória levando à mudança de padrões de comportamentos e

pensamentos indesejáveis oriundos da experiência passada. Isso se

mantém desde que os padrões antigos não sejam reforçados pela

realidade atual do sujeito.

Na chamada repressão, termo utilizado por Freud, a memória

está “inativa”, mas mediante um estímulo específico, a lembrança, ou

percepções a ela associadas, poderão vir à tona.

A experiência agradável, ao ser evocada, provoca no

organismo desejo de repeti-la, caso contrário entra em mecanismo de

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fuga (defesa) que é disparado frente a uma situação (real, imaginária

ou recordada) de ameaça.

As situações que provocam esse impacto no professor inibem

momentaneamente seu potencial cognitivo, e isso explica porque,

mesmo habilitado teoricamente para lidar com as questões que se

impõe em seu cotidiano, por vezes lida com elas de forma

inadequada.

Dessa forma pode-se supor que ao lidar com crianças

pequenas, emoções associadas à sua infância mais remota podem

vir à tona. Os professores e educadores de Creche estão sujeitos à

estímulos que reavivam conteúdos reprimidos. Esses conteúdos vão

impregnar sua forma de lidar com algumas circunstâncias de sua

prática profissional, reforçando alguns comportamentos das crianças

e rejeitando ou censurando outros.

Ao perceber o que está ocorrendo e na medida, que, em geral,

são situações corriqueiras, seu cérebro estará desafiado a criar novas

respostas ou entrar em situação de stress.

O corpo da criança é “a porta de entrada” para o cérebro. Na

creche, o ambiente físico e a linguagem corporal e verbal do

professor vão formar grande parte de seu primeiro repertório de

vivências (sinapses) sob as quais vão se sobrepor suas experiências

posteriores e suas futuras conexões cerebrais irão se estabelecer.

Nos ambientes familiares suficientemente saudáveis, a

vivencia em casa é extremamente significativa. Para que deseje estar

na creche e suporte a frustração de não estar no contexto que é o

seu referencial de segurança, esta deverá lhe oferecer experiências

que sejam também significativas e prazerosas. O professor precisa

estar bem emocionalmente para promover estratégias educacionais

que acolham e otimizem o potencial de seus alunos.

Considerando que o cérebro conta com experiências do

passado para tomar decisões no presente, a escola deve oferecer ao

educador oportunidade de promover sua qualidade de vida

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emocional, pois lida com crianças em uma etapa fundamental para

estabelecer os limites e possibilidades de sua aprendizagem.

2.2 – UM ESPAÇO COM EMOÇÕES Á FLOR DA PELE

Na origem das emoções humanas estão os mecanismos

básicos, simples e sem conteúdos, desenvolvidos a partir da busca

pela sobrevivência, que se apoia nos sistemas de luta e recompensa.

A partir daí o organismo busca repetir experiências prazerosas (nas

quais estão envolvidos os neurotransmissores que atuam no sistema

de recompensa) e evitar as ameaçadoras (neurotransmissores

envolvidos nos mecanismos de defesa).

As vivências iniciais do ser humano vão construir o seu

“repertório” de experiências agradáveis e desagradáveis. Dessa

forma, nos primeiros anos de vida vão sendo constituídos os

marcadores somáticos, os reguladores biológicos que classificam

uma experiência como agradável ou desagradável. As experiências

posteriores vão se apoiar na análise da situação baseada em

associações com eventos anteriores vividos.

A creche é uma instituição que lida com a infância não só das

crianças, mas também dos profissionais que nela atuam. Um adulto

cuidador de idosos trata de uma faixa etária acima da sua e tem uma

experiência pessoal dessa idade como um porvir, um mosaico do que

já sentiu, ouviu e presenciou referente à experiência de um outro.

Diferentemente, todo adulto já foi criança, logo todo professor da

Educação Infantil já vivenciou essa etapa e possui um conhecimento

vivencial armazenado, tanto em seu consciente como em seu

inconsciente, acerca dessa faixa etária.

Esse conhecimento encontra-se em seu hipocampo, em seu

sistema límbico e manifesta-se em sua linguagem corporal, tão

facilmente captada pelas crianças. Seu conhecimento teórico é fruto

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da atividade de seu córtex frontal. Conciliar essas fontes de

informações é um desafio que se impõe à rede cerebral do professor

de Educação Infantil.

Alguns estudos apontam que docentes formam uma das classes

mais vulneráveis ao stress e no seu nível mais crônico à Síndrome de

Burnout. A chamada Síndrome de Burnout atinge a capacidade de

realização profissional do individuo e tem consequência direta em

outros aspectos de sua vida. Caracteriza-se por uma exaustão frente

às tarefas que tem a responsabilidade de cumprir e uma

desmotivação que o impede de fazê-lo, o que leva a uma cobrança

por parte dos envolvidos na situação como também a uma auto

cobrança e a um sentimento de ineficiência. Essa consequência

provoca uma exaustão ainda maior que deixa o individuo com menos

condições de realizar suas tarefas, configurando um ciclo vicioso que

pode levar a um estado patológico grave, já que o stress é também a

porta de entrada para outros transtornos tanto físicos como mentais.

O termo "estresse" é uma adaptação em português da palavra

inglesa "stress", que significa "pressão", "tensão" ou "insistência". Foi

uma definição utilizada primeiro na área da física, referindo-se aos

esforços, sobrecargas, pressões e desgastes a que estão expostos

os materiais. Posteriormente foi um termo adotado na biologia para

indicar uma síndrome produzida por causas externas diversas que

atuam nocivamente em um indivíduo podendo levar a exaustão e a

patologias físicas e mentais.

O estresse ocorre quando há um desafio no ambiente que faz o

individuo sair da sua homeostase, isso é do seu equilíbrio, obrigando-

o a se reorganizar para dar uma nova resposta frente a um novo

contexto, ou seja, a se adaptar.

Os estressores podem ser positivos ou negativos. Quando o

estresse é positivo (eustresse), o desafio é motivador de mudança e o

ciclo é fechado com uma resposta adaptativa eficiente que leva o

organismo a um novo estado de equilíbrio. O resultado final “re-

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compensa” o desgaste promovido pelo mecanismo de adaptação.

Quando o estresse é negativo, a resposta não se traduz em bem-

estar e o organismo “des-compensa” levando a um desgaste

cumulativo que impede o sujeito de gerar novas respostas

adaptativas satisfatórias, resultando em uma sobrecarga que culmina

em sintomas tanto físicos como psicológicos.

Frente a um estímulo estressante o ser humano, tal qual qualquer

outro mamífero, aciona seu sistema adrenérgico, isto é, prepara o

organismo para luta ou fuga desencadeando uma série de respostas

em seu corpo. Para qualquer outro mamífero, os sinais de perigo são

objetivos e incluem uma ameaça a sua sobrevivência. O ser humano,

além das emoções primárias, ligadas ao sistema límbico, possui

emoções secundárias e sentimentos que se associam às primárias,

fazendo com que estímulos não necessariamente ameaçadores

sejam vivenciados como tal. Além disso, possui um córtex frontal que

lhe dá condições de controlar alguns impulsos e reações frente ao

ambiente externo.

Assim o ser humano é capaz de vivenciar uma determinada

situação como ameaçadora, desenvolver pensamentos que avaliam e

questionam a periculosidade dessa situação e controlar algumas

reações de evitação ou de ataque. Entretanto, todo seu organismo irá

gerar reações involuntárias se preparando para essa reação

(aumento da frequência respiratória pela ação do núcleo

parabraquial; aumento da frequência cardíaca e pressão arterial pela

estimulação do locus coeruleus; ativação da substância cinzenta

periaquedutal preparando o organismo para a fuga e ativação

excessiva do córtex orbitofrontal, córtex cingulado anterior e o

hipotálamo gerando o medo) provocando um desgaste equivalente a

uma situação de perigo real e uma sobrecarga ao organismo.

Os constantes avanços das pesquisas neurocientificas descrevem

em detalhes o mecanismo pelo qual o organismo se prepara frente a

situações de stress e suas consequências, a curto e a longo prazo.

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Porém, o mais importante em conhecer os efeitos e mecanismos

envolvidos no estresse é poder criar estratégias para lidar com ele.

Saber os diversos fatores que podem contribuir para diminuição e

prevenção do estresse e criar programas que o incluam é de vital

importância. Para tal deve se considerar que embora alguns fatores

possam ser considerados estressantes por si só, como por exemplo,

várias características dos grandes centros urbanos (trânsito, excesso

de pessoas, poluição sonora e visual, dentre outros) o limiar que irá

definir o que é suportável, patológico e estimulante para cada um

será diferente, pois o que afeta cada individuo irá variar segundo as

suas características pessoais e história de vida. Logo o

autoconhecimento é imprescindível para que o indivíduo reconheça

os seus limites e perceba as estratégias que funcionam para si.

Pensando no universo escolar e na responsabilidade de cada ator

social desse contexto pode se considerar que cabe aos adultos

educadores, sejam pais ou professores propiciar um ambiente à

criança que seja estimulante e favorável a aprendizagem, propor

tarefas que sejam adequadas a sua faixa etária tanto em quantidade

como em qualidade e criar expectativas e exigências que sejam

viáveis de serem cumpridas, enfim, promover o seu desenvolvimento

baseado na autoestima e na confiança em si mesmo e no outro.

Por outro lado, cabe ao empregador, oferecer condições de

trabalho justas, respeitar a autonomia do profissional em realizar as

tarefas para a qual foi contratado e possibilitar espaços de formação

continuada que minimizem os efeitos de um contexto estressante

ativando os recursos internos e externos disponíveis para elaboração

dos desafios pessoais com os quais se depara em sua prática

profissional.

Este processo de construção compromete os membros da

equipe multidisciplinar em sua própria reorganização pessoal e novas

conexões entre as especialidades são construídas. Em contrapartida

os impasses e os incômodos que o exercício da interlocução promove

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lança o desafio de criar novas respostas pessoais. Propõe-se assim a

edificação de um trabalho multidisciplinar que disponibilize os

profissionais a uma abertura de novos horizontes sem, contudo,

ameaçar a inteireza de sua especificidade e de sua realização

existencial.

2.3 AUTO-CONHECIMENTO E MOTIVAÇÃO, ASPECTOS

FUNDAMENTAIS A SEREM CONSIDERADOS NA

FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Damásio nos diz que a emoção e a razão não são elementos

dissociados como propôs Descartes, nem tampouco contrários, como

acredita grande parte do senso comum.

Suas pesquisas, bem como a de outros neurocientistas,

demonstram que pessoas que sofreram lesões em regiões cerebrais

ligadas a emoção apresentam dificuldades na aprendizagem. Os

estudos mostram que quando as conexões emocionais de uma

pessoa estão danificadas no cérebro, ela não pode tomar nem

mesmo as decisões simples porque não sentirá nada sobre suas

escolhas, logo, as emoções ajudam e orientam a tomada de

decisões. Assim, embora as emoções não sejam responsáveis

diretas pela cognição, são fundamentais neste processo.

Segundo Damásio as emoções geram sentimentos e esses

são utilizados para a aprendizagem: “Se as emoções provêem uma

resposta imediata para certos desafios e oportunidades enfrentados

por um organismo, o sentimento relacionado a elas provê isso com

um alerta mental. Sentimentos amplificam o impacto de uma dada

situação, aperfeiçoam o aprendizado e aumentam a probabilidade

que situações similares possam ser antecipadas. ”. (DAMÁSIO, 2001,

p. 781)

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Assim, os novos conhecimentos em neurociência apontam

para a importância da motivação e dos aspectos emocionais na

cognição. Para que o professor possa trabalhar com o aluno dentro

desta perspectiva, ele também precisa estar motivado e

emocionalmente envolvido.

Criar espaços onde o professor possa entrar em contato com

as emoções suscitadas no processo educacional no qual está

inserido e ressignificá-las é um investimento na relação

professor/aluno e consequentemente na qualidade do ensino.

Para promover encontros que proporcionem uma experiência

enriquecedora, e essa se traduza em uma prática posterior

influenciada pelas marcas deixadas na interação com o grupo

trabalhado, é necessário promover uma mobilização emocional, quer

pela própria natureza dos temas abordados, pelas atividades lúdicas,

ou pelo trabalho corporal.

Essa mobilização visa promover um ambiente que favoreça

conscientização das potencialidades e limitações dos indivíduos e

ofereçam condições para a adoção de novos posicionamentos. Parte-

se do principio que a estimulação mental pautada na afetividade pode

induzir os fatores neurotróficos a preservarem células essenciais e

inervar novos alvos terapêuticos, ocasionando alteração nas emoções

e no comportamento.

Não se trata de “terapia para professores”, mas de uma

proposta de formação continuada que ofereça aos professores da

Educação Infantil a oportunidade de um trabalho que possibilite o

contato com os aprisionamentos e potencias que residem em si, fruto

de sua história de vida, favorecendo consequentemente uma troca

mais intensa com a criança.

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CAPÍTULO III

CUIDANDO DO OUTRO CUIDO DE MIM...

Ao revisitar a história da educação no Brasil, pode-se refletir

acerca da memória sociocultural desse povo. A função do educador

e a complexidade de interesses a qual está sujeito, alguns visíveis

outros não, por vezes se contrapõe a expectativa de seu papel

fundamental na constituição de um sujeito crítico e de um cidadão

que contribua positivamente com seu mundo.

Quando referenciado no trabalho com bebês, este sujeito-

educador é também lançado ao encontro do bebê que ele mesmo foi

e que não está ao alcance de suas lembranças cognitivas, mas

registradas somaticamente a partir de suas experiências afetivas,

positivas e negativas.

Não podemos considerar aspectos técnicos de sua formação

dissociados de seus aspectos existenciais. Considerando que a

grande maioria dos professores é fruto de uma educação informal e

formal, desde sua infância até sua graduação e além, que não leva

em conta sua singularidade, suas habilidades, suas emoções e seu

contexto, torna-se crucial abrirem-se espaços propícios a mudanças

internas.

Como possibilitar uma educação que seja coerente com a

vivência de cada um, se os próprios professores são filhos de uma

educação que formaliza conteúdos distantes de sua vivência?

É comum associar o “saber” à teoria e o “fazer” a prática,

porém teoria e prática só são passíveis de separação didaticamente.

O trabalhador refaz o que lhe foi prescrito, adequando o trabalho à

realidade que vivencia. Pensando o trabalho enquanto produtor de

vida, é necessário que haja espaço para este trabalhador reconfigurar

seu fazer, recriando possibilidades de ação. Neste sentido, Lacerda

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(1999) propõe que “a criação de possibilidades de reflexão sobre

esse agir e o estar no mundo se dá na medida em que a pessoa atua

e se afasta dessa atuação para poder refletir, voltando, em seguida, a

concretizar novas ações. ” (p. 17)

É necessário investir um tempo abordando temas tabus ou

temas surgidos na demanda institucional para que os professores

possam ser ouvidos, trabalhados e considerados em sua

singularidade. Desta forma poderão também construir novas

maneiras de ensinar que considere a singularidade de seus alunos,

proporcionando uma ação inovadora e coordenada, baseada na

confiança mútua.

Habilitar-se para trabalhar com as crianças é consequência de

um trabalho interior de resgate que ocorre incessantemente. A

“formação” deve transcender uma forma ou corre o risco de vir a ser

uma de-formação. A formação deve ser um exercício continuado,

uma experiência de trans-forma-ação, que ouse ir para além de

padrões, regras, teorias concebidas, para engajar uma conexão com

o educador-sujeito que escolhe e decide seus caminhos de ação a

partir de sua própria e única história contextualizada no tempo e

espaço no qual existe.

Em geral, é difícil reunir momentos em que toda a equipe de

uma instituição de Educação Infantil possa estar reunida, mas é mais

viável o trabalho em pequenos grupos. O sentimento de

pertencimento evocado pelo trabalho grupal pode reverberar na

coesão do grupo maior, que tem como objetivo comum a realização

de um bom trabalho com as crianças e o enfrentamento dos desafios

emergentes no exercício dessa função.

Os encontros, quando solicitados pela coordenação, podem ter

atravessamentos suscitados por questões envolvendo as posições

hierárquicas. Mas quando o grupo se disponibiliza e confia, em geral,

a demanda de trabalho, externa ao grupo, vai sendo substituída por

uma demanda do próprio grupo que se manifesta referindo-se à

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oficina como um momento prazeroso e demonstrando desejo de dar

continuidade ao trabalho.

Propõem-se oficinas que ocorram com certa regularidade, mas

entre uma e outra se torna necessário um espaço de tempo para que

as reflexões emergidas possam ser aliadas à prática diária. Em

contrapartida, é importante a garantia desse espaço de trabalho, e o

retorno a essas questões, não no que se refere a temas, mas sim ao

exercício da interlocução entre a prática, a reflexão teórica e a

vivência pessoal.

Diversas metodologias podem contribuir para possibilitar a

reflexão sobre a prática, a partir do contato consigo mesmo e da troca

com o outro, mas pode se pensar em três grandes frentes de

trabalho: técnicas expressivas, trabalhos corporais e troca verbal.

Essas atividades oferecem aos adultos, durante seu período

laborativo, momentos que propiciam o resgate de sua possibilidade

imaginativa através do criar, do brincar e do pensar. Dessa forma

concretiza o que se propõe uma perspectiva construtivista do

conhecimento, pois o princípio para o educador poder trabalhar com o

inusitado do dia-a-dia, num processo criativo e construtivo, precisa

ser iniciado de dentro para fora.

A seguir serão apresentadas propostas de trabalhos grupais, a

partir da experiência da autora em Instituições de Educação Infantil.

3.1 TÉCNICAS EXPRESSIVAS

O trabalho com técnicas expressivas visa ampliar as

potencialidades individuais, ativando núcleos saudáveis através do

processo criativo. Esse processo leva o individuo a se perceber,

prazerosamente ou não, transformando materiais.

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Alguns materiais, por suas características físicas, remetem

com mais facilidade a elaboração de determinados conteúdos

simbólicos. Contudo, todos os materiais se prestam a simbolização

de conteúdos inconscientes, quem irá definir esse processo será o

próprio sujeito que irá usá-lo.

Todos são criativos, o que varia é a facilidade de expressão

material do potencial criativo. O fazer, transformando um material,

propicia o contato consigo mesmo através da experiência sensorial,

favorecendo a representação de conteúdos íntimos e a

conscientização desses conteúdos através da interação entre o autor

e sua obra.

Esse momento investido em uma exploração de

potencialidades através da expressão não verbal favorece a relação

intra e interpessoal através de recursos físicos, cognitivos e

emocionais. Quando o indivíduo subjetiva a sua criação e a traduz em

palavras há uma conexão entre o emocional e o racional.

Várias técnicas podem ser utilizadas associadas à dinâmicas

de grupo, de acordo com o objetivo a ser trabalhado. As mais

simples e mais comuns são desenho, pintura, modelagem e recorte e

colagem. Seguem dois exemplos de trabalhos grupais associados a

técnicas com materiais expressivos.

3.1.1 - CONSTRUÇÃO DE BRINQUEDOS COM SUCATAS

A oficina pode iniciar com um dinamizador facilitando a

atividade num momento destinado a supervisões e desdobrar-se ao

longo de um período pré-determinado onde os professores se

organizam quanto ao tempo investido na atividade. Há também a

possibilidade da interação e continuidade na construção de um objeto

que foi iniciado por outro. Os participantes podem se organizar de

forma espontânea determinando o ritmo e as regras da atividade.

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O espaço deverá ser organizado de forma a dar visibilidade

aos materiais oferecidos, composto de sucatas diversas, tais como:

tampas de garrafas, garrafas pet, rolinhos de papelão, folhas secas,

pedras, dentre outros e materiais de conexão como: fitas adesivas

coloridas e transparentes, barbantes, cola, etc..

Os materiais são disponibilizados de forma que seja possível

aos participantes uma ampla exploração antes de iniciar. A proposta

é a construção de um brinquedo ou objeto para ser usado nas

turmas. Isso possibilita que o educador se envolva em uma atividade

prazerosa e desafiante para ele, mas também voltada para as

crianças com quem trabalha, contudo, garantido um distanciamento

que lhe permite uma reflexão sobre a prática.

Nesse processo o adulto entra em contato com seu processo

criativo; com a frustração de um tempo instituído que o interrompe;

com a curiosidade-disponibilidade para a exploração sensorial; com a

expectativa de aprovação e o receio da desaprovação; com a sua

capacidade de imaginar e de executar e a conexão ou discrepância

entre elas; enfim, com aspectos intensos da vivência infantil.

É importante um fechamento com um encontro do grupo inicial

para compartilhar esses aspectos do processo criativo, propiciar

insights quanto á prática com as crianças, decidir o destino dos

materiais confeccionados e a avaliar a oficina.

Nesse tipo de atividade é comum a expectativa que alguém

direcione a atividade no sentido de "ensinar" algumas técnicas.

Expressões tais como: "não sei" e "não levo jeito", são comuns no

início da atividade, como "fiquei feliz quando percebi que..." são

comuns no encerramento. Também é comum expressões de

gratificação quando o adulto percebe o grande interesse da criança

em materiais aparentemente tão simples.

É necessário que o adulto se sinta à vontade para tentar

construir alguma coisa e supere a sua autocritica. A sucata tem uma

“magia”, a possibilidade de ver a transformação de uma coisa em

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outra. Não são construções ao acaso, mas manifestações do

processo criativo. Esse material possibilita a sensação da capacidade

de produzir através da transformação do inútil em possibilidade.

3.1.2 QUADRANTE

Essa atividade pode ser proposta para trabalhar questões onde

os professores se sintam oprimidos ou confusos quanto aos limites

entre seus valores pessoais e profissionais.

Cada participante receberá uma folha de papel dividida em

quatro partes com os seguintes títulos em cada uma: Eu / Meu Lar /

Meu Trabalho / Minha Crença. É proposto que em cada espaço

desenhem livremente o que aquelas palavras lhes suscitar.

O desenho servirá como um instrumento para deflagrar

reflexões e elaborá-las. Após o desenho algumas perguntas podem

ser lançadas, com o grupo de olhos fechados e após um breve

relaxamento:

“-O que tenho que abrir mão nos diferentes espaços da minha vida?

-Em que situações me sinto privado de expressar valores importantes

para mim?

-Quais as situações em que me sinto inadequado?

-O que posso levar de um espaço para outro e o que não posso? ”

Após um tempo é instruído que abram a folha que haviam

desenhado, como se fosse uma carta que acabaram de receber,

percebam a sensação que o desenho lhe provoca e pensem como

ele “responderia” as questões colocadas. Depois abre-se para uma

troca verbal, na qual cada um se apresenta a partir do desenho.

Os temas selecionados dizem respeito a quatro aspectos da

vida que costumam ser relevantes para a maioria dos indivíduos

promovendo a identificação de características comuns que podem

aproximar as pessoas, como também o respeito às diferenças a partir

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de um maior conhecimento mútuo. Esse encontro pode possibilitar

uma maior interação com pessoas com as quais não têm proximidade

e também dá a oportunidade de conhecer novos aspectos de colegas

que consideram próximos.

Propor ao professor uma atividade com desenho o leva ao

universo das crianças com quem lida, afinal essa é uma das

atividades mais corriqueiras da Educação Infantil, mas também o

remete a sua infância.

Quando a criança começa a se expressar graficamente ela

inicialmente rabisca. Seu grafismo evolui da rabiscação à escrita

passando por diversas fases. Quando seu pensamento e sua

linguagem verbal ainda não estão desenvolvidos ela expressa seu

mundo interior através do desenho. Á medida que cresce se distancia

dessa linguagem substituindo-a por outra mais elaborada, a escrita. O

desenho remete o sujeito a uma linguagem mais remota onde seus

pensamentos eram expressos de uma forma mais rudimentar, porém

mais espontânea e com menos censura.

Assim sendo o desenho possibilita aos participantes acesso a

conteúdos inconscientes que possam emergir em suas

representações gráficas.

Em certo livro mundialmente conhecido, um aviador, ao

encontrar um pequeno príncipe no deserto, é surpreendido com o

pedido de um desenho de carneiro. Após algumas tentativas

frustradas, e já sem paciência, pois o carneiro nunca estava como o

príncipe desejava, rabiscou uma caixa. “Esta é a caixa. O carneiro

está dentro. ” Admirou-se com a resposta do príncipe: “Era assim

mesmo que eu queria! ”. Talvez, falte ao adulto a disponibilidade para

escapar ao que parece óbvio, certo, a única ou a melhor maneira de

ser ou agir. Um desenho de carneiro não necessariamente retrata o

carneiro. Fixar uma ideia em um único padrão impede que se alcance

o mundo infantil das “invenções”, e isso pode servir para evitar a

angústia de lidar com o novo.

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“ “Meu amigo nunca dava explicações ”

disse o aviador. “Julgava-me talvez

semelhante a ele. Mas infelizmente, não

sei ver carneiro através de caixa. Sou

um pouco como as pessoas grandes.

Acho que envelheci. ” ” (SAINT-

EXUPÉRY, 1993, p. 12-13 e 19).

3.2 TRABALHOS CORPORAIS

É importante reconhecer a importância da conscientização do

professor da educação infantil, sobre a sua disponibilidade corporal e

sua relevância como instrumento de trabalho. Sendo um meio de

comunicação prioritário com crianças pequenas a linguagem corporal

é imprescindível para a promoção do seu desenvolvimento integral,

das “suas múltiplas habilidades” e da construção de uma autoimagem

positiva, aspectos que constituem o foco da Educação Infantil.

Os trabalhos voltados para o adulto e seu corpo podem levá-lo

a identificar os entraves e possibilidades em sua corporeidade. Trazer

à tona expressões, gestos e posturas, é liberar para o mundo e para

si mesmo aspectos do mundo interior.

A expressão corporal evoca e libera emoções e sentimentos

que podem ser sentidos como ameaçadores no mundo tido como

real, mas que não o são no faz-de-conta. Assim, o sujeito pode,

através do lúdico, apropriar-se de uma forma singular de expressar-se

corporalmente que estava adormecida, paralisada, reprimida.

Algumas atividades precisam ser conduzidas por profissionais

experientes na área, tais como psicomotricistas ou terapeutas

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corporais, mas algumas propostas mais simples podem ser

vivenciadas a partir da coordenação de profissionais do contexto

educacional.

A respiração e o relaxamento podem ser trabalhados como

aquecimento e fechamento de uma atividade ou como um fim em si

mesmo.

3.2.1 BRINCANDO COM BOLINHAS DE SABÃO

Ao som de uma música tranquila, cada participante é convidado

a brincar de forma livre e descontraída fazendo bolinhas de sabão.

Essa brincadeira simples, além de incentivar um resgate do

lúdico, proporciona, de forma espontânea, uma alteração no ritmo

respiratório incentivando uma inspiração e uma expiração mais lenta.

Pode ser utilizada como “quebra-gelo” no início de uma atividade

ou no final como relaxamento, em ambos os casos promove o alívio

de tensões e a descontração.

3.2.2 OLHAR

Olhar em silêncio é um olhar que provoca proximidade. É difícil

o exercício desse olhar no cotidiano, pois, em geral, ocupa-se esse

contato com palavras, o que o torna menos profundo. O verbo serve,

nessa e em outras situações, como um distanciador de intimidade.

O bebê, que ainda não possui o recurso da palavra, impulsiona

o adulto a esse exercício. O professor da Educação Infantil é

demandado constantemente a uma disponibilidade para essa relação

tão íntima.

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Propor uma atividade com os professores, divididos em duplas,

na qual os participantes simplesmente olhem-se fixamente nos olhos

é uma proposta simples, mas muito mobilizadora.

As palavras do facilitador da atividade, bem como uma música

suave podem facilitar esse contato. Se for percebido muita resistência

pode-se sugerir que se concentrem em apenas um dos olhos do

colega.

Emoções podem ser expressas na forma de choros ou risos. O

tempo da atividade vai variar de acordo com a percepção do

facilitador na avaliação de quanto os integrantes suportam sem

desestruturarem, mas levando também em conta que é necessário

um tempo mínimo para que possa ser estabelecida alguma

intimidade.

3.2.3 CONTATO FÍSICO

Quando manipulamos o corpo do bebê nos cuidados diários,

não há pensamentos e julgamentos por parte da criança avaliando o

que está ocorrendo, isso a lança numa relação profunda de entrega

ao adulto cuidador.

Uma oficina na qual o adulto possa vivenciar o cuidar e ser

cuidado o leva refletir sobre os diversos aspectos que a interação

física e afetiva constante, que crianças demandam, provoca nos

adultos que com elas lidam.

Para trabalhar este aspecto pode se propor uma atividade, em

dupla, na qual o individuo que será cuidado permanece de olhos

fechados, deitado em um colchonete. Não há troca verbal e o

“cuidador” irá massagear o corpo do colega no intuito de provocar o

máximo de relaxamento possível. Depois os participantes trocam de

lugar.

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É comum uma dificuldade inicial na qual o cuidador não sabe o

que fazer nem quais são os desejos e limites da pessoa que está

recebendo o cuidado. Esse desconforto e a tentativa de ir

experimentando toques confortáveis para ambos favorece o

desdobramento posterior de diversas reflexões tais como: Quais os

desejos da criança em relação ao contato corporal; Como ela é

acolhida quando precisa e respeitada para não ser invadida, quando

deseja um distanciamento?

A posição de “ser cuidado” remete à vulnerabilidade da criança

frente ao adulto.

3.2.4 RESGATANDO O LÚDICO

Como o professor lida com aspectos da infância tais como o

brincar, o rir, a espontaneidade, a criatividade e a flexibilidade? Como

concilia essas vivências com sua “adulteza” e sua função de

educador? Como isso lhe influencia ao permitir, evitar ou favorecer

que as crianças vivam o lúdico, explorem seu corpo no espaço e

experimentem diversas formas de organizar o ambiente, o tempo, as

brincadeiras.

Uma proposta simples pode ajudar o contato com essas

questões. Espalhar pela sala vários blocos de espuma de diferentes

cores, formas e tamanhos de forma que ocupem grande parte do

espaço deixando muito pouco para a circulação livre. Propor que

explorem a sala, brinquem livremente e se permitam fazer o que lhes

der vontade. Uma música animada pode ajudar na descontração,

músicas folclóricas ou infantis são bastantes apropriadas.

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3.3 TROCA VERBAL

A verdadeira escuta abre para o inusitado, para o mergulho no

sentir do outro enquanto ele ainda o desconhece, para o

reconhecimento de seus limites e possibilidades que se alteram

enquanto lhe fala deles. Em meio a essa escuta compartilham-se

conhecimentos, mas também desconhecimentos, pois os espaços

vazios possibilitam a construção coletiva do novo. Sendo escutado

dessa forma o profissional de sala está amparado para poder

responder e acolher o que a criança estiver lhe endereçando e não a

projeção de seus próprios conteúdos.

É comum, no adulto, uma certeza quanto ao autoconhecimento

que o circunscreve a uma imagem cristalizada de si mesmo,

dificultando o encontro com novos sentidos e novas percepções da

realidade – inclusive acerca de vivências passadas. A criança se

encontra em um estado de abertura à construção de si e problematiza

o cotidiano de forma intensa e inusitada, não aceitando como natural

o que para o adulto por vezes já está formatado.

Repensar o conceito de infância perpassando o âmbito pessoal

e profissional possibilita redefinir a forma de lidar com o ensinar e

com o aprender. A infância remete a um estado de desconhecer e à

possibilidade de conhecer, isto é, a disponibilidade para incluir o

novo. Acessar a “infância interna” é fundamental para se relacionar

com a criança de forma diferenciada, construindo uma relação no

encontro das infâncias do profissional e da criança.

É um encontro que produz dor e prazer, promovendo uma

crise, no sentido de impulsionar o adulto a passar por processos de

mudanças e a entrar em embates internos que oscilam entre

reafirmar conceitos e ações incrustados ou acompanhar a construção

do novo que a criança está realizando.

O adulto é levado sair do seu lugar de saber para ocupar o de

eterno aprender. A partir do encontro de percepções constrói

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respostas junto com a criança, ao invés de oferecê-las prontas ou

conduzi-la a sua verdade. Isso desloca o professor da posição de

poder que o status de detentor do conhecimento lhe garante.

Esse entendimento induz a novas maneiras de lidar com as

crianças. Mas não basta ter ciência disso, é necessário mobilizar

afetos, acolhendo o estado de incompletude que marca a todos e

possibilita a transformação dos indivíduos e das relações.

A troca verbal ajuda a organizar a experiência vivida.

Dependendo do contexto e do objetivo, o trabalho inicia com uma

dinâmica que sensibiliza o grupo para determinada reflexão. Pode ser

também que o objetivo principal seja a vivência e a palavra sirva

apenas para sintetizar a experiência. Em outros momentos há um

tema emergente e é necessário abrir espaços para a escuta, nesse

caso o trabalho em si é a própria discussão teórica, mas ela precisa

ser sensível e referenciada à prática propiciando reflexões que se

renovem e mantenham-se vivas no cotidiano profissional.

O profissional que conduz a proposta deve ter claro o seu

objetivo do tema, embora deva alterá-lo se achar mais produtivo. Em

última instância os encontros devem propiciar um contato reflexivo do

profissional com sua própria infância de forma que este movimento

reflexivo possa afetar a prática diária.

Algumas perguntas podem nortear temas a serem trabalhados.

Quando for formulada diretamente como uma questão é importante

que seja na primeira pessoa do singular para que cada um se coloque

nesse lugar de reflexão. Segue abaixo uma listagem de alguns

questionamentos fundamentais para os profissionais da Educação

Infantil:

Como eu me relaciono com minha infância e como ela me

influencia quando eu me deparado com as crianças no

cotidiano da creche?

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Como se manifesta essa vivência quando entro em contato

com uma criança que me mobiliza? Quais os sentimentos que

essa criança desperta?

Quando uma criança fala ou faz algo que abala uma crença

antiga há uma abertura interior para repensar uma nova forma

de me posicionar ou reproduzo algo que foi definido como

certo sem me dar conta disso?

Como lido com sentimentos negativos que a criança me

evoca? Nego, reajo ou busco estratégias para lidar com eles?

Qual o meu sentimento quando uma criança pequena expressa

com seu corpo sua frustração? Como permito, acolho ou

encaminho a manifestação de suas dores ou seus

descontentamentos?

Como faço quando recebo uma orientação da coordenação

com a qual não concordo? Como reajo quando uma criança

me desobedece?

Faço comentários sem me dar conta que eles estão sendo

ouvidos e percebidos pelas crianças? Falo a seu respeito, na

sua presença, mas sem me dirigir à ela?

É possível realmente passar tanto tempo do dia junto às

crianças sem, em algum momento ter alguma fala

inadequada? Quais os critérios para julgar a gravidade de uma

“inadequação”? Ela se torna mais grave porque uma família

sinalizou incomodo ou preocupação?

Quais comentários realmente não devo fazer e quais são

apenas brincadeiras ou desabafos? Qual o limite entre a

brincadeira e a inadequação?

É possível fazer um “autopoliciamento” quanto ao que se diz

sem perder a espontaneidade ou engessar numa postura

pouco afetiva?

Algumas falas são aceitas quando vindas de um adulto, mas

recriminadas quando pronunciadas por outros? Isso é justo?

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Será que combinam com algumas pessoas, mas quando ditas

por outras, que possuem outro temperamento, ficam

dissonantes ou ganham outra conotação?

Como me sinto e me posiciono quando a fala inadequada vem

por parte do responsável?

A continuidade desse trabalho leva a um debate que pode

incluir questões sobre a dinâmica institucional como: clareza das

normas, regras e orientações. É pertinente aprofundar a reflexão

sobre a responsabilidade individual na construção coletiva.

3.4 ENCERRAMENTOS DAS ATIVIDADES

Durante trabalhos em grupo, cuja proposta vise atingir

conteúdos emocionais, os participantes podem ficar muito

mobilizados e isso é de relevância para possibilitar mudanças. Há de

haver alguma abertura (instabilidade) para que efeitos ocorram.

Contudo o objetivo do trabalho não é que as pessoas saiam

desestruturadas, nem enquanto grupo, nem enquanto indivíduo, mas

que, embora mobilizadas, possam estar seduzidas pelas novas

possiblidades de reorganização emocional, ou seja, é preciso um

estado simultaneamente prazeroso e desconfortável para que ocorra

a elaboração de novos conteúdos.

Como dito anteriormente, relaxamentos e práticas respiratórias

podem ser utilizados nesse momento. Músicas e poesias também

podem ser usadas com intuito de “fechar” o trabalho e unir o grupo. A

música instrumental costuma a induzir um aprofundamento e é

melhor utilizá-la nas “aberturas” dos trabalhos.

Para o encerramento recomendam-se letras que, de alguma

forma, remetam ao conteúdo trabalhado. Seguem exemplos de

trechos de duas músicas e de uma poesia que podem levar a

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associações com temas presentes no universo da Educação Infantil e

com os aspectos abordados nessa dissertação:

“Amor de Índio” de Beto Guedes fala da valorização do

trabalho para além de sua concretude material (“Sim, todo amor é

sagrado e o fruto do trabalho é mais que sagrado... A massa que faz

o pão vale a luz do teu suor”); em outros trechos pode remeter a

importância, a delicadeza e a emoção que envolve atos simples como

ocorre nos cuidados do dia-a-dia com crianças (“Tudo que move é

sagrado e remove as montanhas com todo o cuidado... No inverno te

proteger, no verão sair p’ra pescar, no outono te conhecer, primavera

poder gostar”); outros trechos podem ainda ser associados com uma

noção de tempo e expectativas de um porvir vivenciado de um modo

diferente pelas crianças. (“Abelha fazendo o mel vale o tempo que

não voou”... “Todo dia é de viver para ser o que for e ser tudo”).

“Bola de meia, bola de gude” de Milton Nascimento e Fernando

Brant traz a infância atemporal, revivida e atualizada durante toda

existência do ser humano. (“Há um menino, há um moleque, morando

sempre no meu coração.Toda vez que o adulto balança ele vem p’ra

me dar a mão...”)

“Cantares Y Provérbios” Poema XXX de Antônio Machado

remete a essência das teorias que apostam na construção do

conhecimento como saber inacabado e compartilhado e não como

mera reprodução de conteúdos. (“Tudo passa e tudo fica, porém o

nosso é passar, passar fazendo caminhos, caminhos sobre o mar...

Caminhante, são tuas pegadas o caminho e nada mais; caminhante,

não há caminho, se faz caminho ao andar. ”)

Ao utilizar letras de músicas ou poesias para encerrar um

trabalho não é necessário interpretá-las, pois sua função não é literal,

nem de fornecer um sentido tal qual “moral da história”. Ela cumprirá

seu papel de “fechamento” no sentido de “acolhimento” e não de

“completude”, e isso acontecerá de acordo com a singularidade de

cada indivíduo.

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CONCLUSÃO

Espera-se que o professor de Educação Infantil esteja

embasado teoricamente para receber a criança e sua família e que

cumpra diversas tarefas práticas como: os cuidados rotineiros (troca

de fraldas, banho e alimentação, dentre outros); a comunicação com

os pais, que em geral se dá via agenda e garante a participação e

supervisão da família no cotidiano de seu bebê; a organização e

prestação de contas do material de higiene e roupas que transitam

entre a casa e a creche; a atenção a qualquer alteração física ou

comportamental da criança e o desenvolvimento de um projeto

pedagógico que inclua atividades que visam à estimulação adequada

à faixa etária com a qual trabalham.

Além desses aspectos práticos, sabendo-se da singularidade

de uma família recém-formada e da delicadeza deste momento de

separação de sua mãe, espera-se também que este profissional seja

sensível e afetivo ao lidar com os bebês e suas famílias. Essa expectativa de afetividade, depositada no professor,

parece estar ligada a uma ideia equivocada e ilusória na qual a

sensibilidade e o afeto pudessem se resumir a mais uma tarefa que

alguém se propõe a cumprir e não ao contato com emoções inerentes

ao “sentir” e ao “ser afetado”.

Somente estando em contato com suas vivências infantis um

profissional poderá estar atento à necessidade de uma criança

enquanto sujeito. Isso possibilita investir nessa relação na qual afeta

e é afetado, pois, em seus atos de cuidado relaciona-se através de

sua linguagem corporal e dessa forma percebe e se comunica com o

bebê que se expressa primordialmente por seu corpo.

É necessária a inclusão de uma proposta de formação

continuada que inclua momentos que facilitem a reorganização

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interna dos aspectos regredidos evocados em sua prática diária e que

dê suporte para dar continuidade as suas atividades cotidianas.

Desta forma o professor enquanto sujeito, mobilizado pela

relação que estabelece com a criança, se reinventa e se descobre, e

percebe seu trabalho como fonte de crescimento pessoal. A promoção de um sujeito mais liberto e mais potente irá

contribuir para o estabelecimento de relações mais saudáveis, não só

com as crianças que educa, mas também com os demais adultos que

o cercam, torna-se, assim um multiplicador de saúde emocional na

sociedade que compõe.

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http://www.brasilmedicina.com.br/especial/clinicam_t18s1.asp

http://clinicaesportivajaneteneves.blogspot.com.br/2011/11/ocitocina-

da-amamentacao-as-boas.html

https://osha.europa.eu/pt/topics/stress/definitions_and_causes

http://portaldoprofessor.mec.gov.br/conteudoJornal.html?idConteudo=

38

http://www.semar.edu.br/revista/downloads/edicao4/artigoparadgmast

ress.pdf

http://www.significados.com.br/estresse/

http://super.abril.com.br/saude/brasil-campeao-mundial-cesarianas-

447884.shtml

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ÍNDICE

CAPA 01

FOLHA DE ROSTO 02

AGRADECIMENTO 03

DEDICATÓRIA 04

RESUMO 05

METODOLOGIA 06

SUMÁRIO 07

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

O COTIDIANO DA EDUCAÇÃO INFANTIL E A IMPORTÂNCIA

DOS PRIMEIROS ANOS DE VIDA NA FORMAÇÃO DA

PERSONALIDADE

11

1.1 Descobrindo o mundo, descobrindo o outro,

construindo a si mesmo...

11

1.1.1 A primeira separação 12

1.1.2 Entrada na creche - escolha ou imposição social? 15

1.1.3 Professor: o representante institucional da separação 16

1.1.4 A demanda emocional que se impõe ao professor frente

o acolhimento de crianças pequenas

18

1.1.5 Mordida – um dos muitos desafios da educação infantil 20

CAPÍTULO II

A NEUROCIÊNCIA E UM E UM NOVO OLHAR SOBRE A

MEMÓRIA, A EMOÇÃO E A RESSIGNIFICAÇÃO AFETIVA

25

2.1 - Memória afetiva 26

2.2 - Um espaço com emoções à flor da pele 29

2.3 - Autoconhecimento e motivação: aspectos 33

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fundamentais a serem considerados na

formação de professores

CAPÍTULO III

CUIDANDO DO OUTRO CUIDO DE MIM... 35

3.1 Técnicas expressivas 37

3.1.1 Construção de brinquedos com sucatas 38

3.1.2 Quadrante 40

3.2 Trabalhos corporais 42

3.2.1 Brincando com bolinhas de sabão 43

3.2.2 Olhar 43

3.2.3 Contato físico 44

3.2.4 Resgatando o lúdico 45

3.3 Troca verbal 46

3.4 Encerramentos das atividades 49

CONCLUSÃO 51

BIBLIOGRAFIA 53

WEBGRAFIA 57

ÍNDICE 58

ANEXOS 60

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ANEXOS

Amor de Índio

(Beto Guedes)

Tudo que move é sagrado

E remove as montanhas

Com todo o cuidado

Meu amor

Enquanto a chama arder

Todo dia te ver passar

Tudo viver a teu lado

Com arco da promessa

Do azul pintado

P’ra durar

Abelha fazendo o mel

Vale o tempo que não voou

A estrela caiu do céu

O pedido que se pensou

O destino que se cumpriu

De sentir seu calor

E ser todo

Todo dia é de viver

Para ser o que for

E ser tudo

Sim, todo amor é sagrado

E o fruto do trabalho

É mais que sagrado

Meu amor

A massa que faz o pão

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Vale a luz do teu suor

Lembra que o sono é sagrado

E alimenta de horizontes

O tempo acordado de viver

No inverno te proteger

No verão sair p’ra pescar

No outono te conhecer

Primavera poder gostar

No estio me derreter

P’ra na chuva dançar e andar junto

O destino que se cumpriu

De sentir seu calor e ser tudo

Sim, todo amor é sagrado

Bola de meia, bola de gude (Milton Nascimento e Fernando Brant)

Há um menino

Há um moleque

Morando sempre no meu coração

Toda vez que o adulto balança

Ele vem pra me dar a mão

Há um passado no meu presente

Um sol bem quente lá no meu quintal

Toda vez que a bruxa me assombra

O menino me dá a mão

E me fala de coisas bonitas

Que eu acredito

Que não deixarão de existir

Amizade, palavra, respeito

Caráter, bondade alegria e amor

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Pois não posso

Não devo

Não quero

Viver como toda essa gente

Insiste em viver

E não posso aceitar sossegado

Qualquer sacanagem ser coisa normal

Bola de meia, bola de gude

O solidário não quer solidão

Toda vez que a tristeza me alcança

O menino me dá a mão

Há um menino

Há um moleque

Morando sempre no meu coração

Toda vez que o adulto fraqueja

Ele vem pra me dar a mão

“Cantares Y Provérbios” Poema XXX (Antônio Machado)

Tudo passa e tudo fica

porém o nosso é passar,

passar fazendo caminhos

caminhos sobre o mar.

Nunca persegui a glória

nem deixar na memória

dos homens minha canção

Eu amo os mundos sutis

leves e gentis,

como bolhas de sabão.

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Gosto de vê-los pintar-se

de sol e grená, voar

abaixo o céu azul, tremer

subitamente e quebrar-se…

Nunca persegui a glória

Caminhante, são tuas pegadas

o caminho e nada mais;

caminhante, não há caminho,

se faz caminho ao andar.

Ao andar se faz caminho

e ao voltar a vista atrás

se vê a senda que nunca

se há de voltar a pisar

Caminhante não há caminho

senão há marcas no mar…

Faz algum tempo neste lugar

onde hoje os bosques se vestem de espinhos

se ouviu a voz de um poeta gritar

“Caminhante não há caminho,

se faz caminho ao andar”…

Golpe a golpe, verso a verso…

Morreu o poeta longe do lar

cobre-lhe o pó de um país vizinho.

Ao afastar-se lhe viram chorar

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“Caminhante não há caminho,

se faz caminho ao andar…”

Golpe a golpe, verso a verso

Quando o pintassilgo não pode cantar.

Quando o poeta é um peregrino.

Quando de nada nos serve rezar.

“Caminhante não há caminho,

se faz caminho ao andar…”

Golpe a golpe, verso a verso.