documento protegido pela lei de direito autoral · como os de ressonância magnética e de...
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
Memória e Atenção no Processo de Aprendizagem, seus
Benefícios para a Prática Pedagógica dos Professores do
Ensino Fundamental I
Por: Simone da Silva Barbosa
Orientadora
Prof.ª Marta Relvas
Rio de Janeiro
2015
DOCUMENTO PROTEGID
O PELA
LEI D
E DIR
EITO AUTORAL
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
Memória e Atenção no Processo de Aprendizagem, seus
Benefícios para a Prática Pedagógica dos Professores do
Ensino Fundamental I
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Neurociência Pedagógica
Por: Simone da Silva Barbosa
AGRADECIMENTOS
Muito obrigado Senhor! Muito obrigado pelo que me deste.
Muito obrigado pelo que me dás!
Obrigado pela minha voz. Mas também pela sua voz.
Pela voz que canta. Que ama, que ensina, que alfabetiza.
Que trauteia uma canção. E que o Teu nome profere com sentida emoção!
Obrigado Senhor! Porque eu nasci!
Obrigado porque creio em ti! Pelo teu amor, obrigado senhor!
(Trechos do Poema de Gratidão - Amélia
Rodrigues (Divaldo Pereira Franco)
DEDICATÓRIA
Dedico esta monografia ao querido e
amado Eduardo, companheiro de jornada
terrena que tanto apóia o meu
crescimento e nada pede em troca.
RESUMO
O melhor entendimento do funcionamento do cérebro no processo de
aprendizagem, as funções da memória e atenção, sem dúvida abrem uma
gama de opções em benefício da prática pedagógica. A Neurociência oferece
essa base, mostrando que o desenvolvimento do cérebro decorre da
integração entre o corpo e o meio social. O educador precisa potencializar essa
interação por parte dos alunos. Refletir sobre a relação entre: memória,
atenção e processo de aprendizagem, nos leva, sem muito esforço, a
modificação de alguns pontos importantes da prática pedagógica em sala de
aula.
PALAVRAS – CHAVE
Memória, Atenção, Aprendizagem e Prática Pedagógica.
METODOLOGIA
Este estudo monográfico se fará através de pesquisas bibliográficas nos
conceitos e nas teorias de Ivan Izquierdo, Marta Pires Relvas, Celso Antunes,
Roberto Lent, Michael Gazzaniga, Suzana Herculano Houzel, Joseph Ledoux,
Eric Kandel, Gustavo Teixeira, Mark F. Bear, Barry W. Connors, Michael A.
Paradiso, entre outros. Também serão utilizados os seguintes websites:
Sociedade Brasileira de Neurociência, Cérebro Nosso de Cada Dia,
Neurociências em Benefício da Educação, que além de informações
relevantes, elucidarão com imagens esse trabalho. A análise de artigos das
revistas científicas Mente & Cérebro e Galileu, criará a possibilidade do contato
com outras formas de apresentação do conteúdo em pauta, dando a
possibilidade de comparação e reflexão sobre os temas propostos na
realização desta pesquisa.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I
Memória e Atenção, as funções cognitivas mais utilizadas pelos
seres humanos. 09
CAPÍTULO II
Processos Cerebrais envolvidos na aprendizagem. 22
CAPÍTULO III
A neurociência instrumentalizando o professor do ensino fundamental I, em benefício da prática pedagógica. 37 CONCLUSÃO 56
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 58
ÍNDICE 60
8
INTRODUÇÃO
Com as descobertas da Neurociência no campo da aprendizagem por
meio de pesquisas, experimentos comportamentais e do uso de aparelhos
como os de ressonância magnética e de tomografia, que permitem observar as
alterações no cérebro durante o seu funcionamento, algumas questões
começaram a ser respondidas de forma mais clara e coerente.
Graças aos estudos nesta área, afirma-se que o cérebro se modifica em
contato com o meio, que a atenção é fundamental na aprendizagem, a emoção
interfere no processo de retenção de informação, é preciso motivação para
aprender, a formação da memória é mais efetiva quando a nova informação é
associada a um conhecimento prévio. Hoje em dia, essas e outras informações
relacionadas ao processo de aprendizagem são construídas com base em
evidências neurocientíficas.
A utilização dessas bases científicas para melhor compreensão do
funcionamento de determinados processos cerebrais no ato de aprender se
torna fundamental. O que é transmissão sináptica, para que servem os
neurônios? É certo que há uma correlação entre um ambiente rico de estímulos
e o aumento das sinapses. Mas o que é isso, como e onde esse processo
funciona? Quem define o que é um meio estimulante para aprendizagem?
Memória e a atenção estão associadas ao processo de aprendizagem?
A Neurociência responde esses questionamentos, mas não fornece
estratégias de ensino. Isso é trabalho da educação, por meio da prática
pedagógica. Como, então, o professor pode incentivar o processo de
aprendizagem usando os conhecimentos científicos da memória e atenção?
O presente trabalho pretende abordar essa questão, focando na memória,
atenção, sua relação com o processo de aprendizagem e a prática pedagógica.
Apesar da memória, atenção e aprendizagem serem processos
associados, serão apresentados de forma separada no início para melhor
compreensão do conteúdo, finalizando com os processos interligados em
benefício de uma prática pedagógica mais eficaz.
9
CAPÍTULO I
MEMÓRIA E ATENÇÃO, AS FUNÇÕES COGNITIVAS
MAIS UTILIZADAS PELOS SERES HUMANOS.
“A verdadeira arte da memória é a arte da atenção.”
(Samuel Johnson)
A atividade cerebral está presente em todas as tarefas cotidianas.
Para ler e compreender um texto, na escrita, no reconhecer de um rosto e
associá-lo a um nome, nos cálculos, na conversa informal, identificando que
rosa é uma cor e que carro é um meio de transporte, lembrando o caminho de
casa, esses são apenas alguns exemplos de uma infinidade de funções que o
cérebro faz no dia a dia. As principais funções cognitivas são: percepção,
atenção, memória, linguagem e funções executivas. É a partir da relação entre
todas estas funções que se entende a grande maioria dos comportamentos,
desde o mais simples até as situações de maior complexidade, e que exigem
atividades cerebrais mais elaboradas. Memória e atenção serão o foco deste
capítulo.
A atenção é uma função cognitiva bem complexa e diversos
comportamentos resultam de um nível adequado de atenção para serem bem
sucedidos, por exemplo: assistir um filme e compreendê-lo; manter o foco de
conversação em um ambiente ruidoso. A atenção também é um pré-requisito
fundamental para o processo de memorização.
A memória é uma das funções cognitivas mais utilizadas pelo ser
humano em seu cotidiano. Memória é a capacidade de armazenar informações,
lembrar delas e utilizá-las no presente. O bom funcionamento da memória
depende inicialmente do nível de atenção. Os aspectos gerais dessas
importantes funções cerebrais, memória e atenção, seus tipos e características
principais, serão apresentadas a seguir.
10
1.1 – O que é Memória?
Segundo Izquierdo, (2011, p.11): “Memória significa aquisição,
formação, conservação e evocação de informações”. Esta curiosa capacidade
mental forma a base do conhecimento, está envolvida com a orientação no
tempo e no espaço e as habilidades intelectuais e mecânicas.
Houzel(1999), explica que as memórias são feitas por células nervosas
(neurônios), que se armazenam em redes de neurônios e são evocadas pelas
mesmas redes neuronais ou por outras (fig.1).
Fig.1 (esquema básico de um neurônio / Fonte: Google image)
Memorizar é um processo complexo, que envolve troca de informações
entre os neurônios, através da transmissão sináptica, explicada abaixo por
Houzel (1999), (site Cérebro Nosso de Cada Dia):
“...o que permite que a atividade elétrica de um neurônio
influencie a atividade elétrica do neurônio seguinte é a
transmissão sináptica, o processo de transformação de
um sinal elétrico em um sinal químico, e deste sinal
químico de volta em um sinal elétrico - agora, no neurônio
do outro lado da sinapse. A sinapse, portanto, é esse local
onde a atividade de um neurônio é capaz de influenciar a
atividade do outro neurônio (fig.2). Essas substâncias
liberadas são os neurotransmissores, ou
neuromoduladores, dependendo de sua ação sobre a
célula pós-sináptica”. (HOUZEL, 1999. Site Cérebro
Nosso de Cada Dia).
11
Fig.2 (transmissão sináptica / Fonte: site Cérebro Nosso de Cada Dia)
Izquierdo(2011) afirma que a memória não está localizada em uma
estrutura isolada no cérebro; ela é um fenômeno biológico e psicológico
envolvendo um conjunto de sistemas cerebrais que funcionam juntos:
Segundo informações de Houzel(1999), o lobo temporal está localizado
abaixo do osso temporal (acima das orelhas), assim chamado porque os
cabelos nesta região geralmente são os primeiros a ser tornarem brancos com
o tempo. A neurocientista ainda aponta esta região como sendo
particularmente importante para armazenar os eventos passados.
Fig.3 (Fonte: Site Meu Cérebro.com)
Porque nesta região também existe um grupo de estruturas
interconectadas entre si que parece exercer a função da memória para fatos e
eventos (memória declarativa), entre elas está o hipocampo, as estruturas
corticais circundando-o e as vias que conectam estas estruturas com outras
partes do cérebro:
Fig.4 (fonte:Google image)
12
• O hipocampo: ajuda a selecionar onde os aspectos importantes
para fatos e eventos serão armazenados e está envolvido também
com o reconhecimento de novidades e com as relações espaciais,
tais como o reconhecimento de uma rota rodoviária.
• A amígdala: se comunica com o tálamo e com todos os sistemas
sensoriais do córtex, através de suas extensas conexões. Os
estímulos sensoriais vindos do meio externo como som, cheiro,
sabor, visualização e sensação de objetos, são traduzidos em
sinais elétricos, e ativam um circuito na amígdala que está
relacionado à memória, o qual depende de conexões entre a
amígdala e o tálamo. Conexões entre amígdala e hipotálamo, onde
as respostas emocionais provavelmente se originam, permitem que
as emoções influenciem a aprendizagem, porque elas ativam
outras conexões da amígdala para as vias sensoriais, por exemplo,
o sistema visual.
• O Córtex pré-frontal: tem um papel importante na resolução de
problemas e planejamento do comportamento. Uma razão para se
acreditar que o córtex pré-frontal esteja envolvido com a memória,
é que ele está interconectado com o lobo temporal e o tálamo.
1.1.1 - Tipos e características da memória:
Para Izquierdo(2011), existem diferentes categorias de memórias, entre
elas estão:
• A memória ultra-rápida: a retenção não dura mais que alguns
segundos;
• A memória de curto prazo (ou curta duração): que pode durar
minutos ou horas e serve para proporcionar a continuidade do
sentido do presente;
13
• A memória de longo prazo (ou de longa duração): que estabelece
traços duradouros (pode durar dias, semanas ou mesmo anos). O
processo de armazenar novas informações na memória de longa
duração é chamado de “consolidação”. Izquierdo (2011, p.45),
De acordo com Izquierdo (2011, p.25), a capacidade de lembrar
eventos não se reflete na operação de um único sistema de memória, mas em
uma combinação de no mínimo duas estratégias usadas pelo cérebro para
adquirir informação. As principais são:
• Memória operacional: ela mantém a informação viva durante
poucos segundos ou minutos, enquanto ela está sendo percebida ou
processada. Armazena-se na memória operacional, o local da vaga do
automóvel, uma informação que será necessária até o momento de
chegada ao carro, por exemplo.
• Memória declarativa (ou explícita): é a memória para fatos e
eventos, por exemplo, lembrança de datas, fatos históricos, números de
telefone, etc. Reúne tudo o que se pode evocar por meio de palavras
(daí o termo declarativa). Dividida em:
• Episódica: quando envolve eventos datados, relacionados
ao tempo. Usa-se a memória episódica, por exemplo, quando
vem a lembrança do ataque terrorista em 11 de setembro;
• Semântica: Abrange a memória do significado das
palavras (do latim "significado"), usa-se este tipo de memória
ao aprender que Einstein criou a teoria da relatividade, ou que
a capital da Itália é Roma.
• Memória não-declarativa (ou implícita): Se difere da explícita
(declarativa) porque não precisa ser verbalizada (declarada). É a
memória para procedimentos e habilidades, por exemplo, a habilidade
para dirigir, jogar bola, dar um nó no cordão do sapato e da gravata,
etc. Pode ser de quatro subtipos:
• Memória adquirida e evocada por meio de "dicas"
Priming (Izquierdo, 2011, p 34): memória de representação
14
perceptual - que corresponde à imagem de um evento,
preliminar à compreensão do que ele significa. Um objeto, por
exemplo, pode ser retido nesse tipo de memória implícita antes
que se saiba o que é, para que serve. Considera-se que a
memória pode ser evocada por meio de "dicas".
• Memória de procedimentos - refere-se às habilidades e
hábitos. Os movimentos necessários para dar um nó em uma
gravata, nadar, dirigir um carro, são conhecidos sem que seja
preciso descrevê-lo verbalmente.
• Memória associativa e Memória não-associativa: Estas
duas últimas estão ligadas a algum tipo de resposta ou
comportamento. A memória associativa é empregada quando
se saliva pelo simples fato de olhar para um alimento apetitoso,
este pode trazer lembranças de algum momento da vida que
estava associado ao prazer da alimentação, a saciedade da
fome ou até mesmo lembranças afetivas. Por outro lado, usa-
se a memória não associativa quando, de forma automática,
aprende-se que um estímulo repetitivo, por exemplo, o latido de
um cãozinho, não traz riscos, o que faz relaxar e ignorá-lo.
1.1.2 - A arte de esquecer
A memória é tão fundamental ao homem quanto o esquecimento de
certos dados, fatos ou acontecimentos. O excesso de informações e os ruídos
da sociedade vêm afetando a saúde mental. Existe a necessidade de "apagar"
algumas lembranças para o bem estar psíquico. De acordo com Izquierdo
(2010), em seu livro “A arte de Esquecer”:
“De fato, é preciso esquecer, ou pelo menos manter longe
da evocação certas lembranças que nos perturbam, como
aquelas de medos, humilhações, desencantos amorosos
e outros maus momentos. Já pensou se nos
15
lembrássemos de todos os nossos fracassos?
Passaríamos metade da vida nos remoendo. Para nossa
paz de espírito, por meio de um mecanismo de
autoproteção, o cérebro simplesmente inibe determinadas
memórias, um fenômeno que os psicanalistas chamam de
repressão. E isso ocorre o tempo todo, mesmo sem
percebermos".
Izquierdo(2010), afirma que o cérebro humano, apesar de ser
fantástico processa e armazena informações de forma limitada. Para reter
novos dados a mente precisa de intervalos de descanso e também deixar de
lado memórias desnecessárias. Seria incrível a capacidade de lembrar cada
palavra, som, gesto, imagem, cheiro ou cada sensação que passa ao longo da
vida, porém o cérebro não consegue armazenar tantos dados assim.
Para Izquierdo (2010), a arte de esquecer é um dos fenômenos mais
importantes da memória, já que possibilita a mente abrir novas janelas para
adquirir mais informações.
O próximo item mostrará que essas informações são selecionadas pelo
cérebro através da atenção, onde alguns autores chamam de “porta para
aprendizagem”.
1.2 – Atenção, foco direcionado sobre um estímulo específico.
De acordo com, James (1890):
“Todos sabem o que é atenção. É tomar posse da mente,
de forma clara e vívida, de um dos muitos que parecem
ser os objetos e linhas de pensamento simultaneamente
possíveis...”
Em qualquer ambiente existem vários estímulos que podem chegar ao
cérebro para serem processados. Sensações táteis, visuais, olfativas e os
próprios pensamentos estão presentes todo o tempo, mesmo quando não se
dá conta deles.
16
Gazzaniga(2010), define a atenção como sendo um mecanismo
cerebral cognitivo que possibilita processar informações, pensamentos ou
ações relevantes, enquanto ignora outros irrelevantes ou dispersivos.
Existem diferentes redes neurais que processam diferentes estímulos.
Então, em outras palavras, atenção pode ser definida como a atividade neural
que facilita o processamento de determinada informação selecionada e inibe o
processamento de informações concorrentes.
Toda essa atividade serve para que informações preferenciais sejam
processadas de forma eficiente, até porque, de acordo com Izquierdo(2010), o
sistema nervoso tem a capacidade limitada de processamento.
Antunes(2011), afirma que uma série de fatores pode modificar a
eficácia da atenção mesmo dentro dos limites da normalidade. Vários estados
emocionais podem alterar a capacidade de atenção, ora alterando sua
intensidade, ora alterando sua tenacidade ou sua vigilância. Sob a influência de
determinados alimentos, de bebidas alcoólicas e de substâncias
farmacológicas, a atenção também pode experimentar alterações em seu
rendimento e em sua eficiência.
Izquierdo(2010) ressalta também, a importância dos intervalos de
descanso da mente para recompor a capacidade de absorção do
conhecimento:
"Sabe-se que o ser humano apresenta oscilações em sua
capacidade de atenção, cujas ondas duram
aproximadamente noventa minutos. Logo após absorver
um certo número de informações consecutivas,
dependendo da densidade, precisamos de um descanso
para metabolizar tais dados".
Por mais que a memória humana seja muito ampla e resistente,
Izquierdo(2010), afirma em seu vídeo: “Memória”, que a memória atualmente
trabalha no limite, principalmente por causa do excesso de informações e
ruídos da sociedade. Existe um bombardeio de informações, vindas da
televisão, computadores, celulares, internet, ipod, ipad e outras coisas mil. Até
agora não se sabe o limite do que a memória de trabalho pode suportar, porém
17
percebe-se que todo este ruído vem afetando e muito a saúde mental do
indivíduo.
Em seu livro "Silêncio, por Favor", Izquierdo (2011) defende a
necessidade de escapar destes ambientes cheios de ruídos para conseguir
pensar e articular com profundidade:
"O ruído não é só auditivo, é visual, linguístico e
multisensorial. O ruído não nos deixa distinguir os sinais
que realmente nos interessam e por isso nos incomoda.
Afirmo que não são os estímulos em si que nos
perturbam, pois os humanos estão ai para receber,
analisar, filtrar e guardar informações, o problema é que
estamos construindo um mundo no qual o principal hoje é
o ruído e não os sinais".
Para Izquierdo (2010), as pessoas vêm absorvendo tantos códigos,
valores, ícones e imagens que acabam por não conseguir pensar com
profundidade em quase nada, o que atrapalha paralelamente a memorização, a
percepção e a sensibilidade. Nesse sentido, Izquierdo (2010) afirma que é
preciso selecionar os sinais em meio a tantos ruídos, que só poluem a mente:
"Temos que discriminar informação de ruído, separar o
joio do trigo, tanto para evitarmos absorver coisas que
não valem a pena ser evocadas, saturando o cérebro de
mediocridades, como também obtermos mais qualidade
de vida, já que teremos mais tempo para fazer o que
realmente importa, como, por exemplo, amar, pensar, ser
nós mesmos".
18
1.2.1 – Distribuição da Atenção
Para Gazaniga(2010), há vários tipos de atenção:
“...a atenção involuntária ou passiva que é voltada para
eventos externos ao indivíduo como os barulhos, uma
porta que se abre, um cheiro, etc.; a atenção voluntária ou
ativa que é a vigília; a atenção sustentada na qual o
sujeito se mantém atento ao que está sendo tratado por
um longo período; a atenção alternada ou dividida,
quando se sai de um foco de atenção e a compartilha com
outros estímulos e a atenção seletiva, que é o que
fazemos com o que nos é significativo, ou seja,
selecionamos aquilo que nos interessa.”
Fig.5 (Fonte: Site Neurociências em Benefício da Educação)
A atenção do indivíduo, num determinado momento pode estar
distribuída de várias maneiras no campo da realidade. Pode estar concentrada
num único objeto, dando-se pouca atenção ao resto, pode estar espalhada,
sem que uma parte específica esteja predominantemente em foco ou, por fim,
pode estar dividida entre vários objetos, quando então a pessoa procura
prestar atenção, simultaneamente, a duas ou mais coisas. Quanto maior a
19
divisão da atenção entre objetos, maior a perda de qualidade da atenção dada
a cada parte.
Atenção pode ser entendida como um holofote em uma peça de teatro:
facilita o que quer que seja visto e oculta e dificulta a visão do que não se
deseja que seja visto (fig. 6).
Mas e quando não se consegue focar a atenção por um tempo mínimo
necessário, para aprender algo? A capacidade de manter a concentração é
restrita, e depende de inúmeros fatores, desde a falta de vontade ou ânimo por
algum assunto, até dificuldades específicas, como as presentes no TDAH
(transtorno do déficit de atenção/hiperatividade) que interferem na capacidade
de atenção seletiva e dividida, ou seja, todos têm alguma dificuldade
atencional, se isso representa um problema a ser tratado, depende do grau de
comprometimento e do número de sintomas. Será abordado no item seguinte o
déficit de atenção, comumente chamado de TDAH.
Fig.6(Fonte: Google Image)
1.2.2 – Transtorno do déficit de atenção/hiperatividade (TDAH)
Para o psiquiatra Gustavo Teixeira (2013), TDAH não é uma doença
nova. Um dos primeiros relatos de sintomas aparece em quase meio século
antes do nascimento de Jesus Cristo, 493 a.C., o filósofo e médico Hipócrates
descreveu pacientes que apresentavam comportamento impulsivo e de baixa
capacidade de concentrar sua atenção. O médico atribuiu essa condição a um
desequilíbrio do fogo com relação á água. O tratamento proposto por
Hipócrates consistia na alimentação rica em cevada em substituição ao pão, no
20
consumo de peixe em vez de carne vermelha, na ingestão de líquidos e na
prática de atividade física.
De acordo com a ABDA (Associação Brasileira de Déficit de Atenção) o
distúrbio afeta de 3% a 5% das crianças em idade escolar e sua prevalência é
maior entre os meninos. A dificuldade para manter o foco nas atividades
propostas e a agitação motora que caracterizam a síndrome podem prejudicar
o aproveitamento escolar e ser responsável por rótulos depreciativos que não
correspondem ao potencial psicopedagógico dessas crianças.
Estudos científicos de Fonseca(1995), mostram que portadores de
TDAH têm alterações na região frontal e nas suas conexões com o resto do
cérebro. A região frontal é uma das mais desenvolvidas no ser humano em
comparação com outras espécies animais e é responsável pela inibição do
comportamento, isto é, controlar ou inibir comportamentos inadequados, pela
capacidade de prestar atenção, memória, autocontrole, organização e
planejamento. O que parece estar alterado nesta região cerebral é o
funcionamento de um sistema de substâncias químicas chamadas
neurotransmissores (principalmente dopamina e noradrenalina), que passam
informação entre as células nervosas (neurônios).
De acordo com o DSM V, o manual de classificação das doenças
mentais, a síndrome pode ser classificada em três tipos:
• TDAH com predomínio de sintomas de desatenção.
• TDAH com predomínio de sintomas de hiperatividade/impulsividade.
• TDAH combinado. Quando predomina a desatenção, os pacientes apresentam dificuldade
maior de concentração, de organizar atividades, de seguir instruções, e podem
saltar de uma tarefa inacabada para outra, sem nunca terminar aquilo que
começaram. São pessoas que se distraem com facilidade e frequentemente
esquecem o que tinham para fazer ou onde colocaram seus pertences. Não
conseguem também prestar atenção em detalhes, demoram para iniciar as
21
tarefas e cometem erros por absoluto descuido e distração, o que pode
prejudicar o processo de aprendizagem e a atuação profissional.
Ainda segundo Teixeira(2013), em todas as faixas etárias, portadores
do transtorno estão sujeitos a desenvolver comorbidades, isto é, a desenvolver
simultaneamente distúrbios psiquiátricos, como ansiedade e depressão. Na
adolescência, o risco maior está no uso abusivo do álcool e de outras drogas.
Para efeito de diagnóstico, que é sempre clínico, os sintomas devem
manifestar-se na infância, antes dos sete anos, pelo menos em dois ambientes
diferentes (casa, escola, lazer, trabalhos), durante seis meses, no mínimo.
Devem também ser responsáveis por desajustes e alterações comportamentais
que dificultam o relacionamento e o rendimento dos portadores nas mais
diversas situações.
De acordo com Teixeira(2013), o problema fica claro nos primeiros
anos de escola, apesar de estar presente desde o nascimento, o diagnóstico
deve ser feito por especialistas com base nos critérios estabelecidos pelo
DSM.V. Avaliações precipitadas podem dar origem a falsos positivos que
demandam a indicação desnecessária de medicamentos.
Constatou-se aqui a importância da atenção e os prejuízos com a falta
dela, ficou claro que ao focar a atenção, as tarefas são compreendidas mais
facilmente e realizadas de uma forma mais completa. Inclusive no processo de
memorização da informação, isso porque atenção e memória são processos
cognitivos altamente interligados e dificilmente dissociados. Para que uma
memória seja eficaz é indispensável a compreensão do objeto sobre o qual se
destina a atenção, condição essa que depende da afetividade e do interesse. O
próximo capítulo abordará a entrada da aprendizagem nesse contexto.
22
CAPÍTULO II
PROCESSOS CEREBRAIS ENVOLVIDOS NA
APRENDIZAGEM.
Segundo Fonseca (1995): “a aprendizagem constitui uma mudança de
comportamento resultante da experiência”, para explicar melhor essa
afirmação, será tomado como base a diferenciação entre a aprendizagem
humana e a aprendizagem animal.
No animal, o comportamento adquirido de forma aleatória ou
circunstancial, não reflete qualquer planejamento, previsão ou seleção. A
resposta é imediata e prática, não resulta de uma escolha entre várias
hipóteses, nenhum animal, pode transmitir novos comportamentos para outros
da mesma espécie ou para novas gerações.
Fonseca (1995), afirma ainda, que no ser humano, a aprendizagem é o
reflexo da assimilação e conservação do conhecimento, controle e
transformação do meio, que foi acumulado pela experiência da humanidade
através dos séculos.
O homem escolhe uma entre várias hipóteses possíveis. Compara
várias formas para alcançar um fim ou um resultado. Elabora planos, os
executa e avalia os resultados obtidos. Examina as possibilidades e as
condições e estabelece seqüencialmente os comportamentos necessários para
alcançar um objetivo. Descobre a solução antes de aplicar, utilizando para um
resultado, um planejamento antecipado das ações exigidas pelas tarefas.
Até o momento, a conclusão é que a aprendizagem no ser humano é
uma mudança de comportamento, uma resposta modificada, estável e durável,
interiorizada e consolidada no próprio cérebro do indivíduo.
Todas as informações acima estão baseadas em várias décadas de
estudos sobre a aprendizagem, com o objetivo de entender melhor o processo
de aprendizagem, se faz necessário a realização de um breve histórico com os
principais teóricos da aprendizagem.
23
Existem várias teorias quando o assunto é aprendizagem, o presente
estudo ficará apenas com as mais importantes para a estruturação do trabalho.
As teorias conexionistas estímulo-resposta, onde ressaltam os trabalhos de
Thorndike (1903) e Hull (1943), defenderam que a aprendizagem depende da
relação compreendida entre estímulo e resposta. Thorndike (1903) especificou
a aprendizagem em três leis: a do exercício, a da aptidão e a do efeito. Já Hull
(1943), equacionou a aprendizagem em modelos matemáticos, calculando
número de tentativas, a quantidade de reforço, a intensidade do estímulo, a
inibição reativa e a inibição condicionada, como funções preditivas do potencial
de aprendizagem.
Guthrie (1886-1959), outro Behaviorista, avançou com vários
postulados: o da associação entre o estímulo e a resposta, o da adaptação
positiva, a lei da freqüência de Watson (1878-1958), o do hábito e ocorrência, e
por último, o do condicionamento, isto é, a evocação de respostas por
estímulos incondicionados, substituídos posteriormente por estímulos
condicionados, que, segundo Pavlov(1903), tendem a provocar “reflexos
psíquicos”.
Tolman(1932), a quem se deve a teoria do sinal, introduz a noção de
significação entre o estímulo e a resposta correspondente, sublinhando a
totalidade do comportamento, ao contrário das anteriores teorias, que por
fragmentarem o comportamento, foram consideradas como moleculares. As
variáveis entre a situação e a ação são diferenciadas em: interesse, apetite,
tendência, aquisições anteriores e motivação.
Para os Gestaltistas, Wertheimer (1890-1943), Kohler (1887-1947),
Kofka (1896-1941) e Lewin (1890-1947), transformam a noção de
aprendizagem em relações interiorizadas de significação entre o estímulo e a
resposta, quer no todo, quer nas suas partes, a que chamaram de “insight”.
Essa teoria foi posteriormente adotada por Hilgard (1904-2001), a quem se
deve a teoria funcionalista, e foi fundamentalmente aplicada à educação por
Dewey (1859-1952).
Outras teorias, também merecem referências, como as de Woodworth
(1869-1962), Miller (1941) e Skinner (1904-1990). Todos esses autores
24
combinam conceitos anteriores, sendo de destacar, pela sua importância, a
teoria do condicionamento operante.
Para Skinner (1904-1990), a aprendizagem se reflete na mudança de
comportamento, porque é emitida pelo organismo e não pelo estímulo. A
resposta desejada tem a probabilidade de êxito se a seqüência das respostas
for desencadeada do simples ao complexo e com base sempre no reforço de
respostas corretas, evoluindo progressivamente por aquisições bem sucedidas.
Esse simples resumo sobre as teorias da aprendizagem mais
significativas não pode deixar de fora as teorias de Hebb (1958), e de
Anokhine, (1975). O primeiro defende a aprendizagem como o resultado de
interações interneuronais (redes) e de mudanças sinápticas dependentes de
sistemas internos e de sistemas ideacionais. Tais sistemas são baseados na
atenção (controle dos neurônios que não interessam a tarefa em causa) e na
inibição (processo de seleção e recrutamento de neurônios para manutenção
de funções cognitivas).
Para Anokhine (1975), discípulo de Pavlov, encara o comportamento
como manifestação psíquica superior que se desenrola através de sistemas
funcionais complexos, desde os reflexos adquiridos filogeneticamente (de
acordo com a evolução da espécie), até os automatismos mais diferenciados,
adquiridos ontogeneticamente (de acordo com a genética), e que constituem a
experiência sócio histórica da humanidade. Para o mesmo autor, a
aprendizagem envolve funções psíquicas superiores resultantes de sistemas
que combinam funções neurofisiológicas inferiores. Luria (1973) e Vigotsky
(1896-1934) completam essa dimensão, afirmando que o comportamento deve
ser encarado como um sistema funcional complexo que organiza e auto regula
reflexos, sensações, automatismos, emoções, percepções e conceitos de
origem sócio histórica.
Todos os teóricos citados acima têm seu papel fundamental na busca
da compreensão do processo de aprendizagem. E de uma forma ou de outra,
sempre chegam num ponto em comum, a necessidade de conhecer as
estruturas e o funcionamento do cérebro (fig.7) para melhor compreensão das
suas relações dinâmicas e complexas na aprendizagem.
25
Fig.7(Fonte: Google image)
A compreensão do comportamento, bem como a sua modificação,
pede o conhecimento das estruturas e das funções do órgão que o coordena e
o organiza, isto é, o cérebro, verdadeiro produto da evolução biossocial da
espécie. O órgão mais organizado do organismo.
Segundo Relvas (2010):
“A aprendizagem é uma associação de memória, atenção,
concentração, interesses, desejos, estímulos intrínsecos
(neurotransmissores/hormônios) e extrínsecos
(informações externas do ambiente) que permeiam a
mente e o cérebro humano.”
O cérebro isolado não possui função nenhuma, ele só estabelece um
funcionamento quando em conjunto com outros sistemas que se
interconectam, recebem e respondem aos estímulos para realizar um potencial
de atividades elétricas e químicas.
Segundo Fonseca (1995), o cérebro durante a aprendizagem, recruta
seletivamente seus inúmeros neurônios e neuroglias, nesse recrutamento
seletivo está implícito um elevado grau de organização neurológica.
Um estudo sobre o comportamento das células neurais no processo de
aprendizagem, publicado na revista Mente & Cérebro (2011, nº26), vem
constatar que essas células funcionam como unidades processadoras de
informações. Seus corpos formam a substância cinzenta, o córtex, que compõe
a camada externa do cérebro. Cada neurônio pode receber sinais de outras
células, transmitidos pelos pontos de contato (mas sem continuidade material
26
entre ambas as células), as sinapses, e depois encaminhados ao longo de
extensões chamadas axônios. Eles ficam dentro do cérebro, ou seja, embaixo
do córtex, e são chamados substância branca. Sua função é ligar os neurônios
por longas distâncias, permitindo a comunicação entre diversas áreas.
A cor clara vem da camada de gordura isolante que envolve os
axônios. A bainha de mielina, uma substância formada por lipídios e proteínas,
que acelera o encaminhamento dos sinais, contribuindo para uma comunicação
rápida sem perdas de dados. A bainha mielínica é interrompida a pequena
distância pelos nódulos de Ranvier; os sinais praticamente “saltam” de um
nódulo para outro. Sem essas interrupções, os sinais se difundiriam mais
lentamente e, em trechos mais longos, acabariam por se extinguir. O grau de
mielinização, portanto, influencia a velocidade e a força dos impulsos: quanto
mais grossa a camada isolante, melhor e mais rápido os dados são
transmitidos (fig.8).
Fig.8(Fonte: PUC.rio.br)
Outro tipo de transmissão do sinal no sistema nervoso central da
espécie humana são as sinapses químicas (fig.9), esse evento se inicia com a
secreção de uma substância química chamada neurotransmissor, que irá atuar
27
em proteínas receptoras presentes na membrana do neurônio subsequente,
promovendo a excitação ou inibição.
Fig.9(Fonte: www.infoescola.com)
Quimicamente, os neurotransmissores são moléculas relativamente
pequenas e simples. Diferentes tipos de células secretam diferentes
neurotransmissores. Cada substância química cerebral funciona em áreas
bastante espalhadas, mas muito específicas do cérebro e podem ter efeitos
diferentes dependendo do local de ativação. Segue abaixo uma lista com os
principais neurotransmissores e suas funções:
• Dopamina: Controla níveis de estimulação e controle motor em
muitas partes do cérebro. Quando os níveis estão extremamente
baixos na doença de Parkinson, os pacientes são incapazes de
se mover de forma voluntária. Presume-se que o LSD e outras
drogas alucinógenas ajam no sistema da dopamina.
• Serotonina: Esse é um neurotransmissor que é incrementado
por muitos antidepressivos tais como o Prozac, e assim tornou-
se conhecido como o 'neurotransmissor do 'bem-estar'. ' Ela tem
um profundo efeito no humor, na ansiedade e na agressão.
• Acetilcolina: A acetilcolina controla a atividade de áreas
cerebrais relacionadas à atenção, aprendizagem e memória.
Pessoas que sofrem da doença de Alzheimer apresentam
tipicamente baixos níveis de ACTH no córtex cerebral, e as
28
drogas que aumentam sua ação podem melhorar a memória em
tais pacientes.
• Noradrenalina: uma substância química que induz a excitação
física, mental e bom humor. A produção é centrada na área do
cérebro chamada de locus ceruleus, que é um dos muitos
candidatos ao chamado centro de "prazer" do cérebro.
• Glutamato: O principal neurotransmissor excitante do cérebro,
vital para estabelecer os vínculos entre os neurônios que são a
base da aprendizagem e da memória a longo prazo.
• Encefalinas e Endorfinas: Essas substâncias são opiáceos que,
como as drogas heroína e morfina, modulam a dor, reduzem o
estresse, etc. Elas podem estar envolvidas nos mecanismos de
dependência física.
Com isso, conclui-se que o aprendizado, também está baseado em uma
comunicação entre as células do cérebro. Mas existe um lugar específico no
cérebro para aprendizagem?
A forma de aprender está relacionada ao recebimento de estímulos que
são captados pelos sentidos. Esses estímulos conhecidos como informações
(som, visão, tato, gustação, olfato) chegam ao tálamo que é uma estrutura no
cérebro que tem a função de receber esses estímulos e reenviá-los para áreas
específicas que são responsáveis na elaboração, decodificação e associação
dessas informações. O tálamo funciona como um “aeroporto” e junto com o
hipotálamo, as amígdalas cerebrais (responsáveis pela emoção), e o
hipocampo (responsável pela memória de longo prazo), promovem as
lembranças e a aprendizagem significativa.
A aprendizagem é, portanto, uma função do cérebro. Não há uma
região específica do cérebro que seja exclusivamente responsável pela
aprendizagem. O cérebro é no seu todo funcional e estrutural responsável pela
aprendizagem, que é resultante de complexas operações neurofisiológicas.
Tais operações associam, combinam e organizam estímulos com respostas.
29
Porém, a aprendizagem também sofre influência de outros fatores
importantes, para Relvas (2014), a sensação, a capacidade de percepção,
motivação, emoção, memória e atenção, assim como o aspecto biológico, a
genética de cada um e os estímulos recebidos, vão determinar de forma crucial
a formação desse processo cognitivo que humaniza o indivíduo.
De acordo com Relvas (2014): “... sensação é o nível mais primitivo do
comportamento...”. A sensação pode ser considerada como o processo de
detecção e recepção dos estímulos recebidos, já a percepção, tem como
função principal organizar e interpretar essas informações sensoriais.
É comum encontrar freqüentes dúvidas sobre a diferença entre
sensação e percepção, muitos confundem esses conceitos, mas são bem
distintos, enquanto que as sensações são meras traduções, captações de
estímulos, a percepção exige um trabalho de análise e síntese. A sensação
é a experiência simples dos estímulos, a percepção envolve a interpretação
das informações sensórias recebidas. Ambas são capacidades
fundamentais para a captação de informações no processo de aquisição do
conhecimento.
Memória e atenção também estão diretamente ligadas ao processo de
aprendizagem. Um exemplo bem simples dessa interligação é a comparação
da memória a um cômodo fechado dentro de uma casa, pode-se dizer que a
atenção é a chave que abre a porta desse cômodo e permite entrar, seja para
guardar, ou retirar algo que é necessário. Sem a chave, a porta não abre, e a
memória pode falhar.
Para Fonseca (1995), o processo de aprendizagem exige um certo
nível de atenção (vigilância e seleção) para manter as atividades cognitivas,
inibindo o efeito de muitos neurônios que não interessam à situação no
momento de determinada aprendizagem. A memória, também não pode se
dissociar desse processo, pois se para lembrar precisa antes aprender, para
aprender precisa lembrar de informações já residentes na memória,
estabelecendo comparações e associações entre elas.
Segundo Izquierdo (2011):
30
“Não podemos fazer aquilo que não sabemos, nem
comunicar nada que desconheçamos, isto é, nada que
não esteja na nossa memória.”
Foca-se num estímulo através da capacidade de atenção, a memória
evoca, associa, armazena e preserva a informação, só depois da
consolidação se dá a compreensão. Só se reconhece o estímulo, depois de
estar retido na memória. Dá-se aí a interligação desses importantes
sistemas responsáveis pela evolução da espécie humana.
De todos os fatores já citados, será abordado agora um que influencia
diretamente a todos eles, sem o qual, o processo de aprendizagem fica
mais difícil de ser realizado: as emoções. Como o assunto é bem vasto
constará num subcapítulo com os pontos mais importantes, para se
entender melhor o contexto das emoções no processo de aprendizagem.
2.1. O Papel da Emoção no Processo de Aprendizagem
De acordo com Lent (2002):
“A emoção, é uma experiência subjetiva acompanhada de
manifestações fisiológicas e comportamentais
detectáveis”.
As emoções são fundamentais para o desenvolvimento saudável e até
mesmo para a sobrevivência. Os animais também trazem consigo emoções,
embora não tão elaboradas, específicas e variadas como os seres humanos.
Uma emoção propriamente dita é um conjunto de respostas químicas e
neurais que formam um padrão diferente do habitual. Estas respostas são
produzidas quando o cérebro normal recebe um estímulo que “quebra” esse
“equilíbrio”, desencadeando a emoção.
Segundo Damásio (2012): “As emoções ocorrem no teatro do corpo.
Os sentimentos ocorrem no teatro da mente”. Existe uma cadeia complexa de
acontecimentos no organismo que começa na emoção e termina no
sentimento, há uma parte do processo que se torna pública (emoção) e uma
31
parte que sempre se mantém privada (sentimento). Damásio (2012) distingue
vários tipos de emoções:
• Emoções Primárias: são consideradas inatas ou “reflexas”,
são comuns a todos os seres humanos, independentemente
de fatores sociais ou socioculturais. Deste grupo fazem parte
as emoções básicas ou elementares, como: a alegria, tristeza,
medo, nojo, raiva e surpresa.
• Emoções Secundárias ou sociais: são mais complexas que as
primárias, dependem de fatores e variáveis socio-culturais.
Estas podem variar amplamente e radicalmente entre culturas
e/ou sociedades. E não são possíveis de enumerar: a culpa, a
vergonha, a gratidão, a simpatia, a compaixão, o orgulho, a
inveja, o desprezo, o espanto, etc.
• Emoções de Fundo: estão relacionadas com o bem-estar ou
com o mal-estar interno. São induzidas por estímulos
internos, com origem em processos físicos ou mentais,
levando o organismo a um estado de tensão ou relaxamento,
fadiga ou energia. Estas emoções expressam-se em
alterações musculoesqueléticas, refletindo-se em variações
na postura e nos movimentos.
Desvendar as bases neurais das emoções, vem sendo um desafio ao
longo do tempo para neurociência. James Papez (1883-1958) foi quem mudou
o eixo de raciocínio da idéia de centros isolados da coordenação emocional
para o conceito de sistema ou circuito, isto é, um conjunto de regiões
associadas, envolvido com os vários aspectos das emoções (o sentimento, as
reações comportamentais, os ajustes fisiológicos). Papez (1883-1958)
percebeu que essas regiões eram conectadas reciprocamente de modo
circular, o que revelava uma rede neural que ficou conhecida como Circuito de
Papez. Mais tarde passou a ser conhecido por Sistema Límbico (fig.10),
32
definido como o conjunto de regiões localizadas, a maioria delas, na face
medial dos hemisférios e no diencéfalo.
Lent (2002), revela que o circuito de Papez original incluía: o córtex
cingulado, o hipocampo, o hipotálamo e os núcleos anteriores do tálamo.
Outras regiões foram adicionadas posteriormente, em função de novas
descobertas científicas. Seu funcionamento básico se dava da seguinte forma:
o córtex cingulado recebe projeções de diversas outras regiões corticais
associativas e com elas forneceria a base para a experiência subjetiva das
emoções. Ao circuito adicionou-se a amígdala cerebral, mas verificou-se que o
hipocampo propriamente dito não participa de modo determinante nos
mecanismos neurais das emoções, a não ser como responsável pela
consolidação da memória explícita (inclusive as que têm conteúdo emocional).
A amígdala, por outro lado, revelou-se uma estrutura de enorme relevância,
uma espécie de botão de disparo e modulador de toda experiência emocional.
O hipotálamo foi reconhecido desde o início como a região de controle das
manifestações fisiológicas que acompanham as emoções, realizando essa
tarefa através dos sistemas nervoso autônomo, endócrino e imunitário.
Algumas manifestações comportamentais foram também atribuídas ao
hipotálamo. E finalmente o conjunto de núcleos anteriores ao tálamo. Não
deixando de mencionar a importância do lobo da ínsula, que conecta o Circuito
de Papez com o córtex pré-frontal, modulando as emoções.
Fig. 10 (Fonte: American Scientist)
33
Todo esse processo da emoção é uma construção bioquímica,
produzindo adrenalina e cortisol através do medo, estresse, ou dopamina na
reação de prazer ou recompensa.
Tendo posse de todos esses conhecimentos, se estabelece a seguinte
reflexão: Que tipo de emoção seria ideal para o processo de aprendizagem?
Sabe-se que no momento de perigo ou numa situação de estresse, o cérebro
entra em ação, ou melhor, o Sistema Nervoso Autônomo, mais precisamente
os núcleos da base. Com isso, entra-se num estado de alerta. No perigo as
informações vão chegar ao cérebro por vias sensoriais, pousando no tálamo,
que recebe essas informações e distribui para todas as áreas cerebrais,
perpassando pelo hipocampo, para ver se existe alguma memória parecida,
para enviar ao córtex pré-frontal através do giro do cíngulo. Simultaneamente e
automaticamente, o hipotálamo, a hipófise, as amígdalas cerebrais atuam no
processo neural autônomo das glândulas supra-renais, que produzem
adrenalina, levando ao movimento de luta ou fuga, e o cortisol, que faz
paralisar numa situação de perigo.
Portanto, nenhuma situação de medo, perigo, estresse, que
desencadeie a produção de adrenalina e cortisol, levando o indivíduo a
paralisar, fugir, tremer, se desconcentrar, favorecem o processo de
aprendizagem. Mas e as emoções positivas, podem desencadear a motivação
e influenciar de forma positiva o processo de aprendizagem?
Izquierdo (2010), afirma: “Da mesma forma que sem fome não
apreendemos a comer e sem sede não aprendemos a beber água, sem
motivação não conseguimos aprender”.
Segundo Lent (2002), no cérebro existe um sistema dedicado à
motivação e à recompensa. Quando o sujeito é afetado positivamente por algo,
a região responsável pelos centros de prazer produz uma substância chamada
dopamina. A ativação desses centros gera bem-estar, que mobiliza a atenção
da pessoa e reforça o comportamento dela em relação ao objeto que a afetou.
O sistema de recompensa compreende algumas regiões do cérebro,
localizadas dentro do sistema límbico, como já foi visto, que são responsáveis
pelas emoções. O sistema de recompensa cerebral ou circuito do prazer
34
começa na área tegmentar ventral, localizada na região cinzenta do tronco
cerebral. Impulsos elétricos são criados nessa região e esses estímulos
atingirão o núcleo accumbens e posteriormente o córtex pré-frontal, região
responsável pela consciência emocional (fig. 11).
Fig.11 (Fonte: http://neuropsicopedagogianasaladeaula.blogspot.com.br)
Ausubel (1968) afirma que: “O prazer, mais do que estar na situação de
ensino ou mediação, pode fazer parte do próprio ato de aprender.”
Trata-se da sensação boa que a pessoa tem quando se percebe capaz
de explicar certo fenômeno ou de vencer um desafio usando apenas o que já
sabe. Com isso, acaba motivada para continuar aprendendo sobre o tema.
De acordo com Houzel (2010), tarefas muito difíceis desmotivam e
deixam o cérebro frustrado, sem obter prazer do sistema de recompensa. Por
isso, são abandonadas, o que também ocorre com as muito fáceis.
Para Marta Relvas (2010): “Aprende-se com a cognição, mas sem
dúvida alguma, aprende-se pela emoção, o desafio é unir conteúdos coerentes,
desejos, curiosidades e afetos para uma prazerosa aprendizagem”.
Tanto a atenção, quanto a memória, importantíssimas no processo de
aprendizagem, são moduladas pelas emoções, pelo nível de consciência e
pelos estados de ânimo. É fácil aprender ou evocar algo, alertas e de bom
ânimo, e fica difícil aprender qualquer coisa, ou até lembrar o nome de uma
pessoa ou de uma canção, cansados, deprimidos, com medo ou muito
estressados.
De acordo com o relato de IZQUIERDO, em seu vídeo “Memória”:
35
“Todo mundo se lembra do que estava fazendo quando
morreu Ayrton Senna, mas porque será que ninguém se
lembra do que fazia algumas horas antes do ocorrido?
Provavelmente as pessoas se recordam do momento
porque se emocionaram com o infeliz fato, mas não se
lembram do que fizeram horas antes da morte, pois estas
lembranças não tocaram seus sentimentos.”
Izquierdo explica que isto ocorre, pois a memória fixa muito melhor
emoções do que fatos, já que as vias nervosas são reguladas por emoções e
sentimentos.
No vídeo “Em Busca da Memória”, de Eric Kandel, neurocientista
ganhador do prêmio Nobel por descobertas significativas no campo da
memória, narra com perfeição de detalhes, um acontecimento marcante
ocorrido na sua infância, quando ganha de presente um carrinho azul com
controle remoto de seu pai, pelo qual ele esperava com muita ansiedade.
Embora tenha brincado por poucos momentos, porque o carrinho foi retirado
dele de forma abrupta, a emoção prazerosa ficou marcada em sua memória de
longa duração.
O mesmo aconteceu com sua paixão por Viena. Mesmo com todos os
acontecimentos ruins, sua fuga para Nova York, para fugir dos nazistas, Kandel
manteve a fascinação por sua terra natal, guardou em sua memória detalhes
de sua infância, pessoas que o ajudaram e de como era bem recebido por sua
mãe quando chegava da escola na loja de seu pai. De acordo com Izquierdo
(2010):
"A emoção é acompanhada pela descarga de dopamina e
de noradrenalina em certos lugares do cérebro, que se
incorporam na memória. Então, toda a vez que, por algum
motivo, essas substâncias forem liberadas e se
mantiverem no cérebro, a tendência é lembrar de coisas
que apreendemos sob a influência delas".
36
Por esse motivo que o indivíduo memoriza com maior facilidade
assuntos que são prazerosos e recordações que mexem com as emoções, ou
mesmo besteiras que nos chocam: "Uma besteira apreendida sob emoção será
melhor lembrada que uma genialidade apreendida com indiferença",Izquierdo
(2010).
37
CAPÍTULO III
A NEUROCIÊNCIA INSTRUMENTALIZANDO O PROFESSOR DO ENSINO FUNDAMENTAL I, EM
BENEFÍCIO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA.
“O pensamento parece uma coisa à toa, mais como é que a gente voa quando começa a pensar...”
(Felicidade. Lupicínio Rodrigues.)
O foco do presente capítulo está nos conhecimentos da neurociência e
sua contribuição para o trabalho do professor, na sua prática pedagógica. Será
abordado também o perfil do aluno do ensino fundamental I, a estimulação
cognitiva na medida certa, o sono e a alimentação influenciando diretamente na
aprendizagem, o ambiente escolar, a memória e atenção perpassando pelos
caminhos que levam a melhor compreensão da prática educacional.
Cosenza (2011) alerta a respeito do uso dos conhecimentos
neurocientíficos, para que o mesmo não seja reduzido em soluções simplistas:
“Embora muitas vezes se observe certa euforia em
relação às contribuições das neurociências para a
educação, é importante esclarecer que elas não propõem
uma nova pedagogia nem prometem soluções definitivas.”
Surge a Neurociência da Educação, como um novo ramo do
conhecimento que tem como objetos de estudo a educação e o cérebro,
entendido como um órgão social que pode ser modificado pela prática
pedagógica. Situa-se na interface de conhecimentos entre as áreas de
Anatomia, Genética, Psiquiatria, Neurologia, Psicologia, Pedagogia, entre
outros, com o objetivo de compreender como os seres humanos aprendem
melhor, de forma que os professores possam conduzir e maximizar esse
aprendizado.
Relvas (2012) mostra uma definição bem mais ampla sobre a
neurociência na educação:
38
“O conhecimento e a aplicação da neurociência na
educação perpassam por uma visão neurocientífica do
processo de ensinar e aprender. Contribui na identificação
de uma análise biopsicológica e comportamental do
educando por meio dos estudos da anatomia e da
fisiologia no sistema nervoso central. Explica, modela e
descreve os mecanismos neuronais que sustentam os
atos perceptivos, cognitivos, motores, afetivos e
emocionais da aprendizagem.”
A revolução no estudo da mente ocorrida nas últimas décadas tem
conseqüências importantes para a educação, conduzindo a abordagens muito
diferentes das encontradas nas escolas atuais, em relação à prática
pedagógica.
O crescimento das investigações interdisciplinares, as tecnologias e os
novos tipos de colaborações científicas começaram a tornar mais visível, o
caminho que leva da pesquisa científica básica, a prática educacional. Anos
atrás, os educadores prestavam pouca atenção ao trabalho dos
neurocientistas, e esses por sua vez, trabalhavam bastante afastados das
salas de aula. Atualmente, em países da Europa, os pesquisadores estão
dedicando mais tempo ao trabalho com professores, testando e refinando suas
teorias em salas de aulas reais, onde podem ver como os diversos ambientes e
as interações nas salas de aula influenciam as aplicações das suas teorias.
A neurociência começa a fornecer provas dos diversos princípios de
aprendizagem que surgiram a partir da pesquisa de laboratório, e está
mostrando como a aprendizagem modifica a estrutura física do cérebro e, por
meio disso, a sua organização funcional.
Todos esses desenvolvimentos no estudo da aprendizagem dão inicio
a uma época em que a neurociência ganha nova relevância para a prática
pedagógica. Nos países que investem em pesquisa científica, o investimento
retorna em aplicações beneficiando a educação Esses avanços na
compreensão de como os seres humanos aprendem são particularmente
39
importantes quando se levam em conta as mudanças que podem ser
realizadas nos sistemas educacionais de uma nação.
Nos primeiros anos do século XX, a educação focalizava a aquisição
das habilidades de letramento: leitura, escrita e cálculos básicos. Para os
sistemas educacionais, a regra geral não era treinar as pessoas para pensar e
ler criticamente, para se expressar com clareza e de modo convincente, para
solucionar problemas complexos de ciências e matemática. Hoje em dia, esses
aspectos do letramento avançado são exigidos de quase todos, para que
possam lidar com sucesso, com as complexidades da vida contemporânea. As
exigências de qualificação para o trabalho aumentaram sensivelmente, assim
como a necessidade de que as organizações e os trabalhadores mudem para
atender as pressões competitivas do ambiente de trabalho. A participação
consciente no processo democrático também se tornou cada vez mais
complexa, a medida que o foco da atenção se deslocou do interesse local para
o nacional e o global.
As informações e o conhecimento crescem a um ritmo muito mais
acelerado do que jamais visto na história da humanidade. Como sabiamente
afirmou o premio Nobel Herbert Simon (1978): “O significado de "saber"
mudou: em vez de ser capaz de lembrar e repetir informações, a pessoa deve
ser capaz de encontrá-las e usá-las.”
O aluno já chega à sala de aula com idéias preconcebidas sobre como
o mundo funciona. Se o seu entendimento inicial não for considerado, é
possível que não consigam compreender os novos conceitos e informações
ensinados, ou que os aprendam somente com o objetivo de fazer uma prova,
mas recaindo depois em suas idéias preconcebidas, fora da sala de aula. Isto
ocorre porque, os conhecimentos prévios que constavam de sua experiência,
armazenados na memória, não foram associados ao novo conteúdo, ou seja,
fica tudo sem sentido para o aluno.
O processo de entender o mundo tem início muito cedo. As crianças
nos anos pré-escolares começam a desenvolver uma compreensão, nem
sempre correta, dos fenômenos ao seu redor. Essa compreensão precoce
pode ter um efeito poderoso sobre a integração de novos conceitos e
40
informações. Ás vezes, sua compreensão é correta, fornecendo o fundamento
para a construção do novo conhecimento. Outras vezes, porém, é incorreta. No
caso da disciplina de história, por exemplo, alguns alunos, acabam por
assimilar os fatos como uma simples luta entre mocinhos e bandidos, sem
refletir muito bem sobre o contexto histórico. Um aspecto decisivo do ensino é
trazer à tona a compreensão que os alunos têm sobre o assunto a ser
ensinado e proporcionar oportunidades para que elaborem ou contestem a
compreensão inicial.
Segundo a teoria de Ausubel (1999), os conhecimentos prévios dos
alunos devem ser valorizados, para que possam construir estruturas mentais
utilizando, como meio, mapas conceituais que permitam descobrir e redescobrir
outros conhecimentos, caracterizando, assim, uma aprendizagem prazerosa e
eficaz.
O entendimento que as crianças trazem a sala de aula já pode ser
muito influente nas primeiras séries escolares. Por exemplo, de acordo com o
artigo da PsiqWeb (2011), verificou-se que algumas crianças se agarravam a
suas idéias preconcebidas de que a Terra era plana, imaginando uma Terra
redonda com o formato de uma panqueca. Nesse caso, a construção de um
novo entendimento era orientada por um modelo da Terra que ajudava a
criança a explicar como as pessoas conseguem ficar de pé ou caminhar em
sua superfície. Na matemática, diversas crianças têm dificuldade em aceitar
que um oitavo é menor do que um quarto, pois oito é maior do que quatro. Se
as crianças fossem quadros em branco, seria adequado falar para elas que a
Terra é redonda ou que um quarto é maior que um oitavo. Mas, como já tem
idéias sobre a Terra e sobre os números, essas idéias devem ser tratadas
diretamente, a fim de transformá-las ou expandi-las. Para que a compreensão
científica substitua a compreensão ingênua, os alunos precisam revelar esta
última e ter a oportunidade de perceber em que ponto ela é deficiente. Dá-se aí
a importância da prática pedagógica baseada nos estudos do funcionamento
do cérebro, pois entendendo o cérebro que chega até a escola, se obtém
instrumentos valiosos para a melhoria da educação.
41
Para Cesar Coll (1995) o aluno do ensino fundamental I (1º ao 5º ano),
que engloba as faixas etárias de 7 aos 12 anos aproximadamente, passam por
mudanças muito importantes no seu funcionamento cognitivo. No início deste
período, o perfil é de uma criança que possui uma capacidade intelectual
realmente notável, como manifesta, por exemplo, ao ser capaz de realizar as
complexas tarefas que estão por trás da aprendizagem da leitura ou da
resolução de simples problemas algébricos. Sem dúvida a aquisição da leitura
e da escrita é um marco que caracteriza a atividade escolar das crianças nesta
idade. Elas passam de aprender a ler para “ler para aprender”, com a
necessidade de desenvolver certas estratégias que lhes permitam realizar essa
tarefa com eficácia.
O aprendizado da leitura depende do envolvimento de várias áreas
cerebrais. O lobo occiptal envia informações para uma área visual mais
específica, denominada parietal, que se encarrega em reconhecer as formas
visuais das letras. Essa área deve se relacionar com a área temporal verbal
que produz os sons e a capacidade de fonar as letras, sílabas e palavras
escritas. Já o aprendizado da escrita, requer um treinamento motor para
especializar neurônios da área responsável pelo controle da mão, no córtex
motor, para controlar o desenho das diversas letras do alfabeto. Esses
neurônios devem se associar àqueles que identificam visualmente as letras no
córtex parietal, e também aos neurônios que identificam oralmente os sons
equivalentes.
Fonte: ENSCER/2015
A compreensão de um texto escrito é uma tarefa de grande
complexidade, fruto da interação de diferentes processos cognitivos, que tem
42
como resultado a construção de uma representação mental do significado do
texto. Esta representação mental é determinada não somente pelo próprio
texto, mas também pelo indivíduo, e em particular pelos conhecimentos de
diferente natureza que este traz a sua construção. Entre estes encontram-se os
conhecimentos sobre como estão organizados os textos e como é possível
extrair e evocar, de forma eficaz, a informação que está contida nele.
As crianças na idade, dos 7 aos 12 anos, aproximadamente, estão no
estágio do desenvolvimento cognitivo que Piaget denomina de operações
concretas. Já apresentam bem menos egocentrismo e podem começar a
utilizar lógica, o pensamento e reflexões na resolução de problemas. Lidam
bem melhor com os conceitos de grandeza e com os números, compreende os
conceitos de tempo e de espaço, distingue a realidade da fantasia, classifica
eventos ou objetos e já pode olhar os eventos através de diferentes habilidades
operatórias. Ainda não é adulta e tem dificuldade em compreender em termos
hipotéticos. No final do ensino fundamental I, o que se encontra, já não é uma
criança, mas um pré-adolescente, no qual além de espetaculares
transformações biológicas e sociais, ocorrerão, igualmente, importantes
transformações cognitivas que mais tarde, vão lhe permitir realizar tarefas
intelectuais mais complexas. A importância desses conhecimentos para a
prática pedagógica permite ao professor planejar a atividade adequada e o seu
grau de dificuldade de acordo com a faixa etária do estudante, para que esse
aluno atinja toda sua potencialidade e aumente suas conexões neurais.
O sono e a alimentação também interferem nas conexões neurais e na
vida escolar do aluno do ensino fundamental I. A neurociência mostra que toda
vez que a criança dorme, estão sendo formadas proteínas fundamentais para a
memória, capacidade de aprendizado e outras conexões neurais importantes.
A melatonina é um neuro-hormônio produzido pela glândula pineal, tem
o papel de regular o sono. Esse hormônio é produzido a partir do momento em
que os olhos são fechados na hora de dormir. Na presença de luz, é enviada
uma mensagem bloqueando a sua formação, a secreção dessa substância é
quase exclusivamente determinada por estruturas fotossensíveis,
principalmente à noite.
43
De acordo com Lent (2002), a produção da melatonina está
diretamente ligada à presença da luz. Quando a luz incide na retina o nervo
óptico, as demais conexões neuronais levam até a glândula pineal essas
informações inibindo a produção da melatonina. A maior produção da
melatonina ocorre à noite, entre 2:00 e 3:00 horas da manhã, num ritmo de vida
normal, e esta produção aumentada produz sono.
Durante o sono normal, onde grande parte da energia e do equilíbrio
orgânico se restabelece, além da adequada produção de melatonina outros
fenômenos acontecem, dentre eles: diminuição significativa da produção de
cortisol e de adrenalina, restauração das moléculas de DNA lesadas e bloqueio
dos canais de cálcio.
De acordo com a revista Psique (dezembro/2013), um estudo recente
realizado por especialistas da Universidade de Lubeck, na Alemanha, com 191
adultos, mostrou que dormir bem durante a noite é fundamental para memória
do aprendizado. Os cientistas alemães realizaram especificamente dois
experimentos. Num experimento foi pedido que cada participante memorizasse
40 pares de palavras; em outro, as pessoas deveriam participar de um jogo da
memória. Em cada uma das atividades, metade dos voluntários era informada
que faria testes para avaliação do aprendizado do dia dentro de dez horas,
enquanto a outra metade fazia o teste de surpresa. Somente alguns voluntários
puderam dormir durante o período entre as tarefas e a avaliação. Os autores
do estudo descobriram que aqueles que descansaram obtinham melhores
resultados nos testes de memória do que os que ficavam acordados, ainda que
estudando.
Isso acontece porque durante o descanso ocorre a síntese de
proteínas responsáveis pelo desenvolvimento de conexões neurais, o que
aprimora habilidades como atenção e memória. Durante a noite, o cérebro
seleciona as informações acumuladas, guardando aquilo que considera
importante e descartando o supérfluo, fixando, assim, lições aprendidas ao
longo do dia. Por esse motivo, quem dorme mal, geralmente, tem dificuldade
em lembrar-se de situações simples, como episódios ocorridos no dia anterior
ou nomes de pessoas próximas, baixa capacidade de atenção e concentração.
44
Mas se uma pessoa privada de sono cochilar por uma ou duas horas, poderá
ter um rendimento normal em tarefas que exijam atenção e concentração,
como uma prova ou um trabalho complexo. Fica a sugestão para os
professores, não adianta gritar ou brigar com um aluno caindo de sono, se as
condições permitirem, um pequeno cochilo em local reservado já lhe equilibra
os níveis de cortisol e adrenalina. Verificar também se esse tipo de
comportamento é uma constante na sala de aula, o aluno que chega todos os
dias com muito sono e permanece assim até o final da aula, merece um olhar
mais individualizado e orientações específicas.
Durante o sono o cérebro processa novas memórias, fixa e afia
habilidades e até resolve problemas. O sono permite que o cérebro acesse
memórias e estabeleça conexões capazes de produzir lampejos de
conhecimento criativo. Uma boa noite de sono permite ao aluno manter a
atenção direcionada para determinada tarefa trazendo benefícios para o seu
bom desempenho na aprendizagem.
Além do sono, outro fator importante que influencia a aprendizagem
escolar, merece também um olhar diferenciado do professor em sua prática
pedagógica é a alimentação. Não é novidade para ninguém que é difícil
aprender com a barriga vazia. A maioria das pessoas concorda com o papel
fundamental da alimentação no desempenho escolar. Há algumas décadas,
luta-se no Brasil para que as escolas assumam o papel de alimentar
adequadamente seus alunos antes e depois das aulas. Não apenas por causa
do aspecto social, mas também do ponto de vista neurocientífico essa
preocupação é justificável.
De acordo com a revista Mente & Cérebro (março/2015), boa parte de
toda a glicose consumida pelo corpo destina-se ao cérebro. Recentemente,
testando substâncias capazes de aumentar o aprendizado, o pesquisador
americano Paul Gold verificou que uma das mais eficazes é justamente a
glicose. Produzida a partir da ingestão de açúcar e carboidratos, ela é o
combustível essencial para o funcionamento das células do organismo. No
cérebro, seu papel é especial. É a glicose que contribui para a liberação de
acetilcolina, neurotransmissor que faz parte do processo de memória.
45
Mas não é só a glicose que é importante no fornecimento de energia
para as células cerebrais. O ferro é outro componente importantíssimo. O ferro
é o carro condutor do oxigênio pelo organismo. A falta dessa substância pode
prejudicar a capacidade de atenção e concentração. Para se ter idéia de como
essa combinação entre glicose e ferro é importante, basta lembrar que o
cérebro humano pesa em torno de 1,5 kg, e sozinho consome
aproximadamente 30% da energia total do corpo.
O cérebro é o órgão que mais consome energia. Segundo pesquisa
publicada na folha de São Paulo (2014), no recém-nascido, 87% das calorias
ingeridas são consumidas por ele. Esse número cai para 44% aos cinco anos;
34% aos dez; 23% nos homens e 27% nas mulheres adultas. Aos três anos de
idade, o cérebro da criança atingiu 80% das dimensões do adulto. Nessa fase,
já existem trilhões de conexões entre os neurônios (sinapses), condição
essencial para que o desenvolvimento intelectual aconteça em sua plenitude,
por isso é tão importante que o profissional de educação insira esses
conhecimentos em sua prática pedagógica, pois as necessidades de sono e
alimentação supridas facilitam bastante o processo de aprendizagem do aluno.
Outro tema relacionado ao aumento de sinapses facilitando a evolução
do aluno é a presença do estímulo adequado na hora certa, Antunes (2000),
chama de “ginástica cerebral”. O presente autor dá um exemplo bem
elucidativo com relação aos estímulos de dentro de casa, alegando que o berço
é a primeira sala de aula de uma criança e sua primeira escola da vida é o
quarto, a sala e a cozinha, com mães e pais estimulando todas as inteligências.
Mas isso não pode ser feito o tempo todo. Cabe à escola, ao professor ou aos
pais estarem ligados na criança sempre e sentirem que, quando surgir o
interesse pelo desafio, a dúvida, o questionamento, é importante ter em mãos
ou em mente, recursos que possam ser utilizados com sabedoria, instigando,
mediando, estimulando o processo de aprendizagem.
A diversidade de estímulos ambientais interferem no desenvolvimento
físico, cognitivo, intelectual e, sobretudo, emocional da criança, ocasionando
imensas diferenças individuais. Uma criança com dois anos, de uma classe rica
46
da cidade grande, muitas vezes, recebeu mais estímulos que uma criança de
seis anos em uma comunidade rural pobre.
O estímulo na quantidade suportável, no tempo certo é muito
importante para o desenvolvimento das potencialidades do cérebro. Mas
Antunes (2000) leva a seguinte reflexão: “Existe um tempo certo para estimular
o cérebro?”. O autor alega que pode-se dizer como resposta: “a vida inteira”,
mas com prioridade na fase dos dois aos doze anos, pois no início dessa fase
o organismo produz com intensidade a mielina, uma substância que envolve os
neurônios e que ajuda a aumentar a velocidade na transmissão de informações
(cap II). Para algumas crianças os estímulos educacionais só acontecem com o
ingresso na escola, com o contato do professor, que é o responsável por
fornecer a maior parte dos estímulos recebidos por essas crianças. Mas será
apenas esse o papel da escola?
O ambiente escolar faz parte do desenvolvimento intelectual, social e
emocional da criança. A aquisição de novos conhecimentos na escola
possibilita uma reorganização cognitiva, que determina a atuação dos
indivíduos no meio social, permitindo-lhes compreender e resolver
adequadamente os problemas por eles enfrentados.
Com relação à função da escola, RELVAS (2014), em seu livro Sob o
Comando do Cérebro, conduz a seguinte reflexão:
“A melhor escola é a que tem mais conteúdo, considerada
a ‘forte’, ou a que saiba valorizar os aspectos cognitivos,
emocionais, sociais e afetivos?”
Esse questionamento começa rondando a mente dos pais assim que
seus filhos entram em idade escolar. Qual é a melhor escola para o meu filho?
Não é uma decisão fácil, mas quando o assunto é prática pedagógica, sabe-se
da grande influência que o ambiente tem no processo de aprendizagem
educacional, então será abordado aqui como deveria ser a escola ideal.
A influência das emoções na aprendizagem é muito grande, por isso, é
importante que a escola seja planejada levando sempre em consideração as
emoções positivas (entusiasmo, curiosidade, envolvimento, desafio), já as
47
negativas (ansiedade, apatia, medo, frustração) devem ser minimizadas para
que não perturbem a aprendizagem.
Gardner (2000) reforça essas idéias, quando afirma que o processo de
aprendizagem é dependente de um ambiente que ofereça segurança e um
determinado desafio.
O ambiente escolar deve ser estimulante, de forma que as pessoas se
sintam reconhecidas, ao mesmo tempo em que as ameaças precisam ser
identificadas e reduzidas ao mínimo. COSENZA (2011) compara o ambiente
escolar com um dos tempos musicais: “alegro moderato”, justificando que a
escola precisa ser estimulante e alegre, mas que permita o relaxamento e
diminua a ansiedade.
RELVAS (2014) também concorda que a escola seja um lugar de
educação emocional, desenvolvimento cognitvo e social, e vai além, a autora
defende a “neuroaprendência”, (a capacidade de sentir, pensar e agir), a
metacognição (o pensar sobre o pensar), e a resiliência emocional (capacidade
de autossuperação), como fatores principais dentro de uma proposta
pedagógica comprometida com o desenvolvimento saudável do aluno.
Segundo COSENZA (2011), não existe uma receita única a ser
seguida, mas a neurociência indica algumas direções para que a escola seja
um local facilitador do processo educacional.
Nesse processo educacional o professor desempenha um papel
fundamental de mediador, cabendo a ele o papel de possibilitar as melhores
condições e meios para a aprendizagem, através da sua prática pedagógica.
Refletindo com Markova (2000):
“Precisamos aprender a facilitar o processo de
aprendizagem. Em vez de simplesmente acumularmos
novas teorias e mais informações, que estarão
ultrapassadas em alguns anos, devemos nos concentrar
em aprender como aprender.”
A complexa rede formada pelo sistema nervoso e as funções por ele
desempenhadas fornecem potenciais aplicações para a prática educativa, que
48
deve ser considerada pelos professores durante a escolha das estratégias
pedagógicas com o objetivo de oferecer ao aluno o conteúdo da disciplina da
forma que este tem mais facilidade de aprender, ou seja, de acordo com a
linguagem natural que sua mente utiliza para aprender, exigindo do professor a
habilidade e sensibilidade de perceber a diversidade que existe na sociedade e
que na sala de aula se torna maior, sendo um desafio para ele preparar sua
prática pedagógica para levar o conhecimento a todos os alunos,
reconhecendo as diferenças e promovendo a aprendizagem significativa.
Como em uma sala de aula o professor não tem condições de adotar
metodologias de ensino que atenda a todos os alunos ao mesmo tempo, o
aconselhável é que ele diversifique suas estratégias pedagógicas, alternando-
as e assim atentando a todos os alunos em algum momento.
Para que os professores consigam atingir os resultados esperados, é
necessário combinar, modificar, adaptar e alternar as diversas estratégias
pedagógicas, de acordo com o perfil dos alunos e da turma. E isso, somado
com os recursos didáticos disponíveis, como o quadro branco, livros textos e
complementares, computadores, filmes, vídeos, TV, rádio, data show,
apostilas, dentre outros.
Se o professor tem o conhecimento do funcionamento cerebral e
entende a importância de preparar aulas que explorem os diferentes estilos de
aprendizagem dos alunos, ele será capaz de dar um novo significado a sua
prática docente (SOARES, 2003). Além disso, o professor deve ter a
sensibilidade de perceber as necessidades de seus alunos e compreender que:
“Ensinar significa aceitar os riscos do desafio do novo,
enquanto inovador, enriquecedor, e rejeitar quaisquer
formas de discriminação que separe as pessoas em raça,
classes. É ter certeza de que faz parte de um processo
inconcluso, apesar de saber que o ser humano é um ser
condicionado, portanto, há sempre possibilidades de
interferir na realidade a fim de modificá-la (FERNANDES,
2010).”
49
Relvas (2014), nos mostra, que o professor, ao estabelecer as
estratégias de ensino em relação ao seu conteúdo em seus planejamentos,
deve estar ciente de que suas turmas constituem uma “biologia cerebral”, tal
qual uma verdadeira “ecologia cognitiva”. Quando o professor possui os
conhecimentos neurocientíficos fica mais fácil perceber seus alunos como um
“sujeito cerebral”, com os sistemas biológicos muito estimulados e um
movimento de conexões nervosas sempre ativo. Ainda de acordo com Relvas
(2014), esse sujeito cerebral é o estudante que argumenta, questiona e que
tem autonomia em aprender. O papel do professor é provocar desafios,
promover ações reflexivas e permitir o diálogo entre emoções e afetos num
corpo orgânico e mental. De acordo com RELVAS (2014):
“Para garantir que as informações sejam transformadas
em aprendizagem, as aulas devem ser emolduradas pela
emoção, pois quando estas têm significado para a vida e
vêm pelo caminho da emoção, jamais serão esquecidas.
O novo caminho que o professor poderá percorrer a fim de despertar o
interesse do estudante para as novas aprendizagens é pelas conexões afetivas
e emocionais do sistema límbico que são ativadas no cérebro de recompensa.
O cérebro é ávido por novas informações. O professor que não instiga seus
estudantes à dúvida e à curiosidade inibe o potencial de inteligência e
afetividade no processo de aprender. O cérebro humano, no início de uma
aula, solicita, por meio de suas conexões neurais, fatos novos, pois a
concentração inicial é fundamental para receber novas informações, devido à
produção e acetilcolina, que mantém os movimentos das sinapses da célula
neural. E muitas vezes, o professor usa os momentos iniciais das aulas, que
são importantes para o cérebro, fazendo a chamada ou dando informações que
o cérebro já conhece, como uma revisão da aula passada.
O professor precisa provocar no educando aquilo que ele ainda não
sabe ou não conhece, e propor desafios. O cérebro agradece, diante de fatos
novos. Ao final de uma aula, solicite ao estudante que relate oralmente, ou por
escrito, ou por outra estratégia, o que ele aprendeu. Na verdade, ele não diz o
50
que aprendeu, e sim o que fez na aula. Por isso, é momento de se pensar uma
nova maneira de ensinar, pois o aprender é se transformar por reflexões de
atitudes e de comportamentos. O estudante tem de encontrar significado no
que estuda, deve encontrar coerência na informação que recebe, senão apaga.
Quando se entende o funcionamento da aprendizagem neural,
compreende-se que esta é individual e personalizada, por isso não combina
com currículo escolar, porque o tempo da escola institucional não é o ritmo da
sinapse neural. O aluno tem de aprender os conteúdos diante das
necessidades estatísticas, e na maioria das vezes apresenta uma determinada
dificuldade e esta não é resolvida, cria-se um processo acumulativo, chegando
num processo de insucesso escolar ao longo de sua vida acadêmica e, muitas
vezes, desistindo de estudar. Quando se fala em aprendizagem é o ritmo de
cada um, isto tem a ver com as sinapses neurais que perpassam pelo interesse
do cérebro de recompensa e o desejo do sistema límbico e cognitivo.
Os objetivos educacionais e as práticas pedagógicas precisam ser
repensados, a fim de valorizar a aprendizagem biológica ou sináptica, mas
também a subjetiva, a afetiva, a emocional, a social e a cultural. Os agentes
destas mudanças são os representantes e integrantes envolvidos na escola e
na família.
As atividades pedagógicas apresentadas em sala de aula e na escola
devem promover especificamente o aprofundamento dos conceitos e o
desenvolvimento de pensamentos mais abrangentes e complexos do cérebro,
a fim de saber aplicar e provocar diferentes estímulos, no momento certo, nos
métodos pedagógicos.
Na perspectiva da sala de aula existem vários fatores a serem
analisados pelo professor, mas o principal deles é que todo aluno é capaz de
aprender e tem seu ritmo de aprendizagem. A partir dessa constatação
também é necessário focar nos métodos de ensino, variando-os de acordo com
as necessidades específicas dos alunos, utilizando, portanto métodos de
ensino multisensoriais.
A neurocientista Suzana Houzel, em seu site (cérebronosso.bio.br),
dispõe de jogos que trabalham a memória e atenção, servindo de sugestão
51
para o professor diversificar sua aula e estimular a turma. Abaixo alguns jogos
retirados do site com as respectivas explicações da neurocientista sobre as
áreas do cérebro trabalhadas nas atividades:
1) Atenção espacial: siga aquele cérebro Este é um jogo muito divertido: trata-se de acompanhar um objeto que
se move pela tela.
Habilidades específicas:
• Atenção visual espacial (córtex parietal);
• Manutenção de objetivo e supressão de distratores (córtex pré-frontal);
Fonte: site cérebronosso.bio.br
2) Multitasking: será que é possível prestar atenção em duas coisas ao
mesmo tempo?
O único problema é fazer tudo ao mesmo tempo. É aqui que se
descobre a limitação intrínseca da atenção no cérebro: não é possível
prestar atenção em duas coisas ao mesmo tempo, muito menos três ou
quatro. Tudo o que se consegue fazer é alternar rapidamente o foco da
atenção entre assuntos diferentes.
52
Fonte: site cérebronosso.bio.br
3) Planejamento e memória de trabalho: jogo do estacionamento.
Missão: estacionar cada carro na vaga da mesma cor. Basta clicar no
carro e ele irá para a vaga disponível.
Habilidades específicas:
• Planejamento de ações sequenciais (córtex pré-frontal), que por
sua vez exige...
• Memória de trabalho (córtex pré-frontal dorso-lateral), para
guardar a ordem de movimentos necessária;
Fonte: site cérebronosso.bio.br
Todas essas atividades também podem ser facilmente adaptadas para
outras versões sem computador, os desafios podem ser apresentados e
53
realizados pelos próprios alunos como na confecção das peças do jogo, um
tabuleiro de cartolina desenhado com o circuito e carrinhos de cores diferentes,
viabilizam o jogo. No caso do jogo multitarefas, por exemplo, o aluno pode ter
como objetivo fazer duas tarefas diferentes ao mesmo tempo. Vale a
criatividade, ou seja, a utilização do neocórtex de cada um.
Para Relvas (2014), “é necessário provocar desafios”, o espaço fora da
sala de aula sempre que possível deve ser utilizado, criar projetos de leitura e
escrita, promover debates, elaborar palavras cruzadas. Usar as músicas
preferidas das crianças para trabalhar conceitos, jogos de estratégias, usar
informações em gráficos, estabelecer linhas do tempo, proporcionar atividades
de movimentos. Desenhar mapas e labirintos, conduzir atividades de
visualização, jogo de memória. Permitir a criação, valorizando o ritmo de cada
um, designar projetos individuais e direcionados, estabelecer metas, oferecer
oportunidades de receberem informações uns dos outros e envolver em
projetos de reflexão, promovendo o trabalho em equipe.
Fonte: Google image.
Cosenza (2011), afirma que a prática pedagógica têm mais chance de
obter sucesso quando levam em conta a forma do cérebro aprender. Entram
nesse contexto os processos de atenção e memória, porque perpassam por
todos os fatores que influenciam a prática pedagógica.
A atenção, pré-requisito para a aprendizagem é fundamental para a
recepção da informação, é necessário ter atenção para focar no estímulo a ser
aprendido. Estando atento a um estímulo o cérebro registra a informação na
memória, que é a capacidade de adquirir, formar, conservar informações e
recuperá-las, de acordo com a necessidade, para poder utilizá-las no presente.
Não há como dissociar: atenção e memória da aprendizagem, pois para que a
54
aprendizagem ocorra é fundamental que as informações e os conhecimentos
adquiridos sejam captados pela atenção e se consolidem na memória.
Uma pesquisa publicada na PsiqWeb (2008), comprova que a
introdução é a alma do negócio quando o quesito é atenção. Os diretores de
Hollywood perceberam que os três primeiros minutos são essenciais para o
arrebatamento da audiência e o conseqüente sucesso financeiro de um filme.
Para os profissionais das comunicações, se ganha ou perde a batalha pela
atenção do público nos primeiros trinta segundos de sua apresentação.
Levando essa realidade para prática pedagógica, é essencial que o professor
inicie sua aula com algo interessante, um desafio ou de uma forma diferente do
que a de costume, para chamar a atenção do aluno. Segundo Relvas (2014):
“nosso cérebro é fofoqueiro”, ou seja, adora uma novidade.
Muitos educadores ainda desconhecem esse processo de como os
seus alunos aprendem e quais são os meios que eles utilizam para aprender.
Desconhecem também que algumas das dificuldades que os seus alunos
encontram no processo de aprendizagem podem estar associadas a problemas
com a integridade da sua memória ou atenção, e a todos os fatores que já
foram vistos no presente trabalho. Assim sendo, os alunos dificilmente
conseguirão atingir os objetivos esperados para a sua turma, pois a
aprendizagem não ocorrerá e qualquer das estratégias utilizadas pelos
professores será ineficiente gerando um ciclo vicioso e um desgaste emocional
em todos os envolvidos no processo.
Um ambiente bem elaborado, sendo explorado no momento de
codificar uma nova informação, a utilização de exemplos do mundo real na
hora de repassar um conteúdo, repetir de várias formas diferentes para ajudar
o estudante a memorizar, procurar despertar emoções nos alunos para que
eles associem ao novo conhecimento, são idéias simples, que facilitam a
prática pedagógica levando ao sucesso no processo de aprendizagem.
Constatou-se no presente capítulo, que a má alimentação, a falta de
cuidados com o sono e a precariedade de estímulos influenciam diretamente
nas transmissões sinápticas, limitando a capacidade de aprendizagem escolar.
O professor precisa estar por dentro dessa realidade, porque se depara com
55
essas situações o tempo todo em seu dia a dia. Compreender o aluno sem
julgá-lo, saber o que acontece nas suas estruturas cognitivas, biológicas,
sociais e emocionais, ajuda muito na elaboração de uma prática pedagógica
condizente com a realidade desse estudante.
O professor, que possui uma prática pedagógica consciente do “sujeito
cerebral”, apresenta uma enorme importância no processo de aprendizagem
dos seus alunos, pois é ele quem está em contato direto com esses seres em
evolução, ele é um dos únicos a ter o privilégio, a responsabilidade de poder
compartilhar as vitórias, as dificuldades e necessidades desses alunos, tendo o
papel fundamental de modificar os genes das células cerebrais.
56
CONCLUSÃO
Os processos de atenção, memória e aprendizagem, estão sempre nos
comentários entre os professores, mas nem sempre são compreendidos como
funções cerebrais interligadas que interferem no processo de desenvolvimento
cognitivo do aluno, afetando também a prática pedagógica.
A atenção, por exemplo, é campeã de reclamações nos conselhos de
classe: “os alunos não param quietos, são muito dispersos, bagunceiros...”, a
falta de atenção, nem sempre, é sinônimo de indisciplina ou de TDAH por parte
dos alunos. Quantas vezes os professores, falam de forma ríspida: “Presta
atenção, menino (a)!” Como se a “culpa” fosse da criança. Atenção é foco, está
diretamente ligada ao interesse, a curiosidade e dependendo da idade não se
fixa por muito tempo. A falta de atenção pode ser decorrente de um meio
desestimulante, de problemas familiares, de situações inadequadas à
aprendizagem, a aula pode estar “chata”, sem sentido para criança. Para evitar
isso, o professor deve focar a interação entre ele, o saber e a individualidade
de cada aluno, refletindo sobre as atividades propostas e modificando-as se
necessário.
No caso da memória, outro processo importante para a aprendizagem,
é mais efetiva na associação com um conhecimento já adquirido, envolve
estado emocional, aprender não é só memorizar informações. É preciso saber
relacioná-las, ressignificá-las e refletir sobre elas. É tarefa do professor, então,
aguçar a curiosidade do aluno, para que os conteúdos sejam aprendidos com
prazer, e dar condições para que o aluno construa sentido sobre o que está
vendo em sala. Lembrando sempre que cada aluno é único, apesar de todos
terem as mesmas estruturas cerebrais, o cérebro é quem define seu limite e
seu tempo de aprendizagem.
A aprendizagem básica se dá com a atenção, no momento exato em
que ocorre a captação de uma informação pelas vias sensoriais, pela sua
retenção e fixação nas áreas da memória, função executada pelo córtex
cerebral.
57
Atenção e memória são processos fundamentais para a aprendizagem,
já que ocorrem antes do processo de aprender. O indivíduo conta também com
as suas estruturas física, psicológica e cognitiva e é preciso que haja uma
integração dos fatores emocionais, neurológicos, relacionais (ambiente social)
e ambientais. Qualquer outro fator que influencie negativamente, como a fome,
a falta de sono e estímulos, afetará o processo de aprendizagem.
A neurociência não traz uma receita pronta na resolução dos
problemas pedagógicos, mas ajuda a compreender melhor como se processam
a atenção, memória e a aprendizagem nessa máquina fantástica que é o
cérebro humano, esse conhecimento instrumentaliza a prática pedagógica para
o desenvolvimento de um novo olhar, com argumentos científicos na
elaboração de estratégias lógicas e coerentes com o funcionamento cerebral
do sujeito aprendente. O professor, ao observar todos os fatores envolvidos no
processo de aprendizagem educacional, como as emoções dos estudantes, por
exemplo, pode ter pistas de como o meio escolar os afeta: se está instigando
emocionalmente ou causando apatia por ser desestimulante. Dessa forma,
consegue reverter um quadro negativo, que não favorece a aprendizagem,
utilizando a neurociência a favor da prática pedagógica.
Assim, aprendizagem, memória e atenção, são processos
indissociáveis, funcionando como suporte para todo o conhecimento,
desenvolvendo habilidades, planejamentos estratégicos, fazendo relembrar o
passado, para viver melhor no presente, garantindo a evolução da espécie num
futuro promissor.
58
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
ANTUNES, Celso. Atenção: Saldo ou Défict? Petrópolis, Vozes, 2011.
ANTUNES, Celso. Jogos Para Estimulação Das Múltiplas Inteligências, Petrópolis, 8 ed. Vozes, 2000.
BEAR, Mark F. Neurociências: Desvendando o Sistema Nervoso, Porto Alegre, 2 ed. Artmed, 2002.
CARNEIRO, Celeste. Criatividade e Cérebro, Rio de Janeiro, 3 ed. Wak, 2014.
COLL, César. Desenvolvimento Psicológico e Educação, Porto Alegre, Artmed, 1995.
COSENZA, Ramon M. Neurociência e Educação: como o cérebro aprende, Porto Alegre, artmed, 2011.
DAMÁSIO, António. O erro de Descartes. Emoção, razão e cérebro humano. Temas e Debates, 2011.
FONSECA, Vitor. Introdução às Dificuldades de Aprendizagem, Porto Alegre, 2 ed. Artmed, 1995.
GAZZANIGA, Michael S. Ciência Psicológica – Mente, Cérebro e Comportamento, Porto Alegre, artmed, 2007.
IZQUIERDO, Iván. Memória. 2 ed., rev. e ampl. Porto Alegre: Artmed, 2011.
IZQUIERDO, Iván. A Arte de Esquecer: cérebro e memória. 2. ed.,ver e ampl. Vieira & Lent, 2010.
IZQUIERDO, Iván. Silêncio, Por Favor!. 2. ed.,UNISINOS, 2011.
HOUZEL, Herculano Suzana. Fique de Bem com Seu Cérebro: Guia Prático Para O Bem Estar Em 15 Passos 2 ed. Sextante, 2007.
LEDOUX, Joseph. O Cérebro Emocional. Os misteriosos alicerces da vida emocional, Rio de Janeiro, 2 ed. Objetiva, 2011. LENT, Roberto. Cem Bilhões de Neurônios? - Conceitos Fundamentais de Neurociências. 2ª ed. Atheneu, 2010. LURIA, R.A. A mente e a Memória. Ed. Martins Fontes, 2006.
RELVAS, Marta Pires. Neurociência e Educação, gêneros e potencialidades na sala de aula. Rio de Janeiro, 2 ed. WAK, 2010.
59
RELVAS, Marta Pires. Fundamentos Biológicos da Educação – Despertando Inteligências e Afetividade no processo da Aprendizagem. Rio de Janeiro, 4ª ed. WAK, 2009.
RELVAS, Marta Pires. Neurociência na Prática Pedagógica. Rio de Janeiro, 2 ed. WAK, 2010.
RELVAS, Marta Pires. Que cérebro é esse que chegou à escola? As bases Neurocientíficas da Aprendizagem. Rio de Janeiro, 2 ed. WAK, 2010.
RELVAS, Marta Pires. Sob o Comando do Cérebro – Entenda como a Neurociência está no seu dia a dia. Rio de Janeiro, 2 ed. WAK, 2014.
ZÓBOLI, Graziella. Práticas de Ensino. Subsídios para atividade docente, Rio de Janeiro, Wak, 2014.
HTTP://www.youtube.com/v=9vvtucn2xli - Vídeo: Memória – Dº Iván Izquierdo;
HTTP://www.youtube.com/TSxghT06xTI - Vídeo: Uma Palavra pode Mudar
Nossas Memórias – Dr. Iván Izquierdo;
http://youtu.be/afZ5MFc2whE - Vídeo: Em Busca da Memória – Eric Kandel;
http://tvcultura.cmais.com.br/rodaviva/roda-viva-suzana-herculano-houzel-25-
03-2013
http://neuroeduca.wix.com/blog
http://neuropsicopedagogianasaladeaula.blogspot.com.br/
https://pt-br.facebook.com/mentecerebro
http://nayllanora.blogspot.com.br/
http://www.suzanaherculanohouzel.com/
http://profamartarelvas.blogspot.com.br/
http://www.cerebronosso.bio.br/guia-bsico-de-neurocincia
http://educacao.uol.com.br/biografias/william-james.jhtm - Biografia William
James;
http://www2.uol.com.br/sciam/ - American Scientist Brasil
http://www.infoescola.com/
http://www.puc-rio.br/
http://www.psiqweb.com.br/
http://www.enscer.com.br/
60
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
Memória e atenção, as funções cognitivas mais utilizadas pelos
seres humanos 09
1.1 – O que é memória? 10
1.1.1 – Tipos e características da memória 12
1.1.2 – A arte de esquecer 14
1.2 – Atenção, foco direcionado sobre um estímulo específico 15
1.2.1 – Distribuição da atenção 18
1.2.2 – Transtorno do déficit de atenção /hiperatividade
(TDAH) 19
CAPÍTULO II
Processos cerebrais envolvidos na aprendizagem 22
2.1 – O papel da emoção no processo de aprendizagem 30
CAPÍTULO III
A neurociência instrumentalizando o professor do ensino
fundamental I, em benefício da prática pedagógica 37
CONCLUSÃO 56
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 58
ÍNDICE 60