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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATU SENSU AVM FACULDADE INTEGRADA A PRÁTICA DE EQUOTERAPIA COMO FERRAMENTA DE ABORDAGEM PSICOMOTORA Por: Tatiana Naraya Puzzi de Campos Orientador: Profª Maria Esther de Araújo Co-Orientadora: Profª Giselle Böger Brand Itapetininga/SP 2013 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO LATU SENSU

AVM FACULDADE INTEGRADA

A PRÁTICA DE EQUOTERAPIA COMO FERRAMENTA DE

ABORDAGEM PSICOMOTORA

Por: Tatiana Naraya Puzzi de Campos

Orientador: Profª Maria Esther de Araújo

Co-Orientadora: Profª Giselle Böger Brand

Itapetininga/SP

2013

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO LATU SENSU

AVM FACULDADE INTEGRADA

A PRÁTICA DE EQUOTERAPIA COMO FERRAMENTA DE

ABORDAGEM PSICOMOTORA

Apresentação de monografia ao Instituto A Vez do

Mestre – Universidade Candido Mendes como

requisito parcial para obtenção do grau de

especialista em Psicomotricidade.

Por: Tatiana Naraya Puzzi de Campos

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AGRADECIMENTOS

Ao meu marido e filhos, que com

carinho incentivaram constantemente o

desenvolvimento deste trabalho. Aos meus pais,

que sempre me ensinaram o valor do

conhecimento. E a Deus, que me permitiu viver e

sentir o seu amor em todas as áreas da minha

vida.

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DEDICATÓRIA

À minha neta, que me inspira a cada respirar.

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“Para nós os grandes homens não são aqueles que resolveram os problemas,

mas aqueles que os descobriram.”

(Albert Schweitzer)

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RESUMO

A presente monografia tem por objetivo apresentar a equoterapia como estratégia de tratamento que busca o pleno desenvolvimento biopsicossocial do indivíduo, visando salientar os benefícios da sua prática como ferramenta de abordagem psicomotora. O movimento tridimensional do cavalo (cima/baixo, frente/trás, direita/esquerda) transmite ao praticante, a partir do seu contato com a pelve, diversos benefícios, tais como: estimular a sensibilidade tátil, visual, auditiva e olfativa pelo ambiente e pelos trabalhos com o cavalo; promover a organização e a consciência do corpo (esquema corporal); desenvolver a modulação tônica; estimular força muscular; aumentar a auto-estima, facilitando a integração social; ajudar a superar fobias; estimular a afetividade pelo contato com o animal; melhorar a memória; motivar o aprendizado; estimular a lateralidade, além do equilíbrio e da coordenação motora. O indivíduo submetido ao tratamento aprende padrões de movimento coordenados de controle de postura para manter seu centro de gravidade sobre a base dinâmica de suporte que é criado pelo movimento do cavalo. Assim, ele se transforma num participante ativo no procedimento terapêutico, o que favorece o desenvolvimento de aspectos psicomotores necessários ao processo de evolução humana.

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METODOLOGIA

Este estudo propõe pesquisas bibliográficas e webgráficas, além de

entrevista com pais e professores de praticantes e profissionais envolvidos com

a equoterapia, a fim de estabelecer um estreito relacionamento entre a terapia

com o cavalo e a psicomotricidade.

De acordo com MARCONI e LAKATOS (1996), a pesquisa de campo é

uma fase que é realizada após os estudos bibliográficos, para que o

pesquisador tenha um bom conhecimento sobre o assunto, pois é nesta etapa

que ele vai definir os objetivos da pesquisa, as hipóteses, definir qual é o meio

de coleta de dados e metodologia aplicada.

Foi desenvolvido no Centro de Equoterapia Apae de Itapetininga/SP, e o

instrumento utilizado para realização do mesmo foi pesquisa bibliográfica e

webgráfica, com o objetivo de descrever as bases e fundamentos da

Equoterapia e da Psicomotricidade, primeiramente de forma isolada e depois

relacionados entre si. Para tanto, baseou-se essencialmente nos seguintes

autores: LERMONTOV (2004) e CITTERIO (1998), dentre outros.

Além disso, contou com entrevista com pais e professores de praticantes

e profissionais envolvidos com a Equoterapia, sendo 03 pais, 03 professores e

03 profissionais.

A entrevista foi semiestruturada, contando com 04 perguntas (anexo I),

realizada pela própria autora, em dia e horário previamente combinados, no

Centro de Equoterapia supracitado.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 09

CAPÍTULO I – Considerações sobre os fundamentos

teóricos da prática de Equoterapia 12

CAPÍTULO II – Aspectos inerentes aos conceitos psicomotores 21

CAPÍTULO III – Contribuições da Equoterapia no

desenvolvimento da psicomotricidade 30

CONCLUSÃO 39

BIBLIOGRAFIA 41

WEBGRAFIA 44

ANEXOS 45

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INTRODUÇÃO

O tema do presente trabalho pretende analisar de que forma a

Equoterapia atua como agente facilitador da abordagem psicomotora.

A relação e a integração entre a Equoterapia e a Psicomotricidade são

de importância significativa, pois, em paralelo com vários estudos na área,

percebe-se o quanto o trabalho equoterapêutico pode contribuir para o

desenvolvimento de aspectos psicomotores.

Reconhecida como terapia de reabilitação, a Equoterapia torna-se uma

revolucionária maneira de reintroduzir o convívio com a natureza, revalorizando

as atividades ao ar livre, o cheiro do mato, o calor que emana do corpo do

cavalo, seus movimentos cadenciados e respostas às atitudes com carinho.

Em casos nos quais a criança é muito insegura, retraída, desconfiada ou

mesmo desinteressada, o trabalho terapêutico por meio do animal torna-se

uma importante ferramenta clínica. É um “quebra-gelo” fundamental para

aproximar o profissional da criança e possibilitar as intervenções terapêuticas,

sejam psicológicas, fonoaudiológicas, fisioterapêuticas, etc.

Com o aumento da procura de alternativas às terapias convencionais, a

utilização do cavalo, como facilitador da reabilitação humana, em diferentes

patologias, tem se difundido. Além de estimular as funções neuromotoras, o

cavalo como “agente terapêutico” tem uma ação muito mais abrangente,

influenciando também as áreas psicológica, cognitiva, social e comportamental,

pois promove a adaptação afetiva do indivíduo ao meio, proporciona maior grau

de auto-suficiência, aumenta a confiança, estimula a comunicação e a

socialização e melhora a qualidade de vida da criança e da família.

Todo trabalho realizado sobre o dorso do cavalo envolve o corpo e as

suas funções de forma completa, onde a coexistência com o outro se torna

uma unidade dinâmica. Através do corpo do animal descobre-se seu corpo, e a

riqueza de emoções que se traduzem nesta relação faz com que se estabeleça

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um diálogo tônico-afetivo entre animal e praticante, baseado na percepção e

movimento do corpo quente e macio.

É objetivo desta pesquisa apresentar a Equoterapia como ferramenta

facilitadora da abordagem psicomotora, visto que o deslocamento do cavalo

impõe ao praticante um movimento doce, ritmado, repetitivo e simétrico, fatores

estes que, mesmo que o praticante apresente limitações funcionais, trazem

consigo uma oportunidade de interação do sujeito no meio físico e social,

trabalhando a relação que se estabelece entre a consciência de si mesmo e do

mundo que o cerca, promovendo, assim, a sua autovalorização e

conhecimento de suas potencialidades, gerando uma interação e integração

entre os aparatos sensório-motores, cognitivos e afetivo-relacionais.

Com a proposta de facilitar a compreensão do leitor, o presente trabalho

será desenvolvido através de capítulos definidos.

No capítulo I, pretende-se tecer considerações sobre os fundamentos

teóricos da prática de Equoterapia. Esta, por ser um método terapêutico que

utiliza o cavalo, numa abordagem interdisciplinar, busca o desenvolvimento

biopsicossocial do praticante, através do movimento do cavalo e ritmo do seu

passo, exigindo do cavaleiro ajustes tônicos para adaptar seu equilíbrio a cada

movimento. Cada passo completo do cavalo leva o praticante a sofrer três

forças distintas, denominado de movimento tridimensional, levando a reações

na musculatura do indivíduo para manutenção da postura e do equilíbrio.

A terapia com o cavalo traz à tona sentimentos de prazer, autoestima,

autoconfiança e, especialmente, proporciona momentos lúdicos e divertidos,

tornando-se um fator potencializador de elevação espiritual para aqueles que

se envolvem com esta prática.

Os resultados, portanto, tornam-se rápidos e intensos, pois o praticante

responde às solicitações dos profissionais da equipe de forma prazerosa,

desenvolvendo atividades e exercícios sem a mecanização repetitiva e

monótona, em meio ao ar livre e convivendo diretamente com a natureza.

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No capítulo II, o propósito é descrever os aspectos inerentes aos

conceitos psicomotores, uma vez que a psicomotricidade tem por objetivo

principal integrar o corpo, a mente e a emoção. O corpo e o movimento

caminham juntos para fazer a criança pensar e reagir com intenção, descobrir o

sabor da busca do saber. O movimento permite modelar o mundo numa

aprendizagem palpável, buscando metas, planos e desejos, e assim passa a

ser ferramenta construtiva do conhecimento.

A psicomotricidade, segundo Alves (2011), favorece a expressão, e esta

permite que a criança demonstre seus sentimentos e suas dificuldades,

desenvolvendo sua imaginação e autenticidade, além de adotar

inconscientemente os conceitos abstratos, aumentando assim seu processo

criativo e sua capacidade de comunicar-se. De acordo com a autora, estas

capacidades são essenciais ao processo educativo e à consciência corporal

para que haja interação com o outro e com os objetos.

E por fim, no capítulo III, o enfoque é pontuar as contribuições da

Equoterapia no desenvolvimento da psicomotricidade, mostrando que os

aspectos psicomotores são diretamente desenvolvidos com esta prática.

Sabendo que o corpo é intermediário obrigatório entre o indivíduo e o mundo

que o cerca, os estímulos sensoriais e proprioceptivos recebidos pelo indivíduo

no momento da montaria, provocados pelo movimento do animal e ritmo do seu

passo, permitem a criação de novos esquemas motores e integração dos

sentidos.

Diante do exposto, se faz relevante entender o processo pelo qual o

corpo é submetido durante as sessões de equoterapia, relacionando-o aos

aspectos psicomotores necessários para um adequado desenvolvimento do

indivíduo.

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CAPÍTULO I

CONSIDERAÇÕES SOBRE OS FUNDAMENTOS

TEÓRICOS DA PRÁTICA DE EQUOTERAPIA

A Equoterapia proporciona a oportunidade de interação do meio físico e

social, trabalhando a relação entre a consciência do sujeito e o mundo que o

cerca. Complementa o processo ensino-aprendizagem por ser uma

metodologia terapêutica e educacional, que utiliza o cavalo numa abordagem

interdisciplinar, buscando o desenvolvimento biopsicossocial do praticante.

O sujeito que pratica a equoterapia é agente de sua reabilitação e

educação/reeducação na medida em que interage com o cavalo. Nesta

abordagem, o sujeito é responsável pelo seu processo terapêutico e o cavalo é

um facilitador deste (Ande-Brasil, 2001).

A utilização de atividades equestres como recurso terapêutico vem

aumentando consideravelmente nas últimas décadas, sendo apontada por

diversos estudos como uma prática eficaz na tentativa de minimizar as

complicações pelas mais variadas patologias.

A palavra equoterapia foi criada pela ANDE-BRASIL

(Associação Nacional de Equoterapia) em 1989, para caracterizar todas

as práticas que utilizam o cavalo com técnicas de equitação e atividades

equestres, objetivando a reabilitação e/ou educação de pessoas com

deficiência ou com necessidades especiais (DUARTE, 2009, p. 1)

A equoterapia foi reconhecida no Brasil como método terapêutico em

1997, pela Sociedade Brasileira de Medicina Física e Reabilitacional e pelo

Conselho Federal de Medicina (parecer 6/97, aprovado em sessão plenária de

9 de abril de 1997).

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As terapias utilizando o cavalo podem ser consideradas

como um conjunto de técnicas reeducativas que agem para superar

danos sensoriais, motores, cognitivos e comportamentais, através de

uma atividade lúdico-desportiva, que tem como meio o cavalo

(CITTERIO, 1991, p. 20).

O cavalo atua como motivador; por meio da aceitação incondicional e

comunicação não verbal, sinaliza para o praticante com necessidades

especiais que é possível, apesar de algumas limitações, descobrir que ele

possui potencialidades que sirvam de alavanca para se iniciar uma nova vida,

podendo desempenhar seu papel no âmbito social (Cudo, 2002).

Apesar de ter vontade própria e também muita força, o cavalo

estabelece vínculo facilmente com quem está montado sobre ele. Este animal,

que se dispõe a levar uma pessoa em seu dorso, tem a temperatura superior a

sua em um a dois graus, bem como uma pelagem macia, o que traz uma

sensação de conforto e aconchego em seu contato. É símbolo universal de

força, virilidade, velocidade e beleza, e no momento da terapia todos esses

símbolos se encontram totalmente à disposição do praticante. Esta relação se

dá na medida em que o praticante começa a se vincular com o animal, o que

propicia a sensação de superação e, por conseqüência, um aumento na sua

auto-estima.

O vínculo é formado através das relações e, no caso da equoterapia,

esta relação não está apenas no âmbito mental ou psicológico, mas físico

também. Os dois, cavalo e praticante, através dos estímulos que um propicia

ao outro, vão tentando se adaptar. O praticante precisa se equilibrar e

acompanhar os movimentos do cavalo e o cavalo, por sua vez, está atento às

ordens do praticante. Pouco a pouco essa inter-relação vai se ajustando e

trazendo para o mesmo a sensação de ser compreendido, o que, segundo

Rogers (1978), é uma das condições facilitadoras e necessárias no processo

psicoterapêutico.

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Enquanto profissionais mediadores temos a obrigação de oportunizar,

através de técnicas e muita sensibilidade, estratégias para despertar nos

indivíduos emoções (motivos) suficientes para que eles próprios descubram

novas formas de conduta e direção de seus objetivos, e a aceitação

incondicional vinda do cavalo faz com que a equoterapia se torne nossa grande

aliada.

A interação com o animal, incluindo os primeiros contatos, os cuidados

preliminares, a montaria e o manuseio final desenvolvem ainda, novas formas

de socialização, autoconfiança e autoestima (Apostila Ande-Brasil, 1998).

Guimarães (1989) revela a importância e o significado das sessões

serem realizadas longe das clínicas e salas terapêuticas. Como são feitas ao ar

livre, há uma intensa interação com a natureza, proporcionando prazer aos

pacientes adeptos a este método. Os indivíduos então têm a oportunidade de

voltar às suas origens, além de desenvolverem uma atividade revalorizante

para si mesmos.

Freire (1999) refere dados de Citterio, equoterapeuta italiana que, em

1991, esteve no Brasil, e proferiu palestra mostrando dados de pesquisas

realizadas na Itália. Esta relaciona ganhos neuropsicológicos, como melhorar

tempo de reação e de atenção, potencializar capacidade executiva e

discriminação espacial em relação à direção, sequência, alinhamento e

lateralidade, através das ações do cavalo e do comportamento intencional da

criança.

Medeiros (2002) diz que o manuseio do cavalo é fundamental para o

desenvolvimento da terapia. Um dos seus objetivos é auxiliar na aquisição e

desenvolvimento das funções psicomotoras, exigindo do cavaleiro

planejamento e criação de estratégias. Através do alinhamento gravitacional da

díade homem-cavalo, um em relação ao outro se encontram imóveis, mas em

relação ao solo estão em movimento. Ocorre uma estimulação do sistema

nervoso central por vias aferentes provocando um ajuste tônico, melhora do

equilíbrio, alinhamento corporal, consciência corporal, coordenação motora e

força muscular em resposta aos estímulos recebidos.

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A equoterapia emprega as técnicas de equitação e atividades equestres

para proporcionar ao praticante, benefícios físicos, psicológicos, educacionais e

sociais. Para isto é necessária uma participação global do corpo, contribuindo

assim, para o desenvolvimento do tônus e da força muscular, relaxamento,

conscientização do próprio corpo, equilíbrio, aperfeiçoamento da coordenação

motora, atenção, autoconfiança e auto-estima (Boulch, 1996).

Observa-se, portanto, que além dos benefícios físicos, as principais

conquistas da equoterapia são o desenvolvimento da autoconfiança,

segurança, concentração e bem-estar, especialmente porque o cavalo funciona

como um ponto de sedução em relação ao praticante, devido à imponência e

poder transmitido pelo mesmo. É um animal com um porte magnífico, e

conquistar sua confiança, domá-lo, cavalgá-lo e direcioná-lo é uma experiência

prazerosa e até mesmo transformadora para algumas pessoas.

Na presença do cavalo é possível observar manifestações ligadas às

questões psicológicas da personalidade da pessoa, bem como à

aprendizagem, à motivação, à memória, à inteligência, ao funcionamento do

sistema nervoso, e também à comunicação interpessoal, à agressividade, ao

prazer e à frustração.

Assim, o cavalo é fonte de estímulos múltiplos, não a única na vida

humana, mas sem sombra de dúvida, relevante. Quem está mais envolvido

com este animal experimenta uma relação sensível e desafiante, pois o cavalo

proporciona, a cada instante, situações na relação com o homem em que ele

necessita aceitar fatos, trabalhar frustrações e ser criativo na solução de

problemas, na superação de limites propícios num trabalho sem preconceito.

É muito comum ouvir alguém dizer que o bom cavalo é aquele que, com

uma criança em cima, é muito calmo e cuidadoso, e esse mesmo cavalo,

quando montado por alguém experiente e exigente, mostra-se fogoso e veloz.

Outro exemplo aparece quando a pessoa que monta não está muito bem,

automaticamente o cavalo muda o seu comportamento. Estas observações são

feitas por pessoas que lidam diariamente com cavalos. O cavalo muitas vezes

está lento e sem ânimo, indicando que o praticante pode estar da mesma

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forma, ou seja, o cavalo capta o mundo interior do praticante de maneira muito

clara e instantânea, porém existem as intempéries do animal, dias em que este

também reage diferente, forçando assim o praticante a perceber que o cavalo

não é uma extensão sua, mas sim um parceiro que trabalha em sintonia com

ele naquele momento, que pode ser “suas pernas” e lhe ceder todo o seu vigor

e energia naquele momento.

Para Beaunont (1972), a equitação desenvolve a confiança do praticante

em si mesmo, a força muscular, a noção de espaço, o senso tátil e

proprioceptivo, não só dos membros superiores, mas de todo corpo. Seu

movimento com ritmo e balanço fortalece a musculatura e melhora a

coordenação do praticante.

Stabdacher (1985, apud FREIRE, 1999, p. 31) ressalta a importância de

um contato com o cavalo, veículo motor que proporciona uma articulação de

movimentos correta e objeto natural de alto encargo afetivo. É nessa relação

com o cavalo que o indivíduo em tratamento encontra subsídios para uma

reeducação, reabilitação e educação, além do favorecimento de uma interação

afetiva. Nos estudos do campo da psicomotricidade, ressalta a influência que

os movimentos ondulatórios do cavalo exercem sobre o desenvolvimento do

esquema e imagem corporal, da organização espaço-temporal, e da

estruturação da fala e da linguagem.

De acordo com Lermontov (2004, p. 68), os agentes

essenciais do movimento, os músculos, movem mecanicamente

as alavancas ósseas. Estas abrem e fecham de modo alternado

os ângulos articulares e desencadeiam a oscilação do membro,

modificando o equilíbrio, que é a base da tomada da andadura.

Desta maneira, têm-se no cavalo um instrumento facilitador e

potencializador para o tratamento de diversas dificuldades, distúrbios,

patologias orgânicas e psíquicas, favorecendo uma sadia sociabilidade, uma

vez que integra o praticante, o cavalo e os profissionais envolvidos.

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Romaszkan, Junqueira e Dims (1986, apud FREIRE, 1999, p. 42), “o

cavalo possui três andaduras naturais: passo, trote e galope. Outros tipos de

andaduras e movimentos que o cavalo pode executar são ensinados pela

pessoa que o adestra e por isso não são considerados naturais.”

Desde 351 a.C., Hipócrates recomendava no livro “Das Dietas” a prática

da equitação como sendo benéfica para a saúde, mais especificamente para

insônia. Em 1782, o livro “Ginástica Médica e Cirúrgica”, de Tissot, relata os

efeitos positivos da equitação e as contraindicações, e considera o “passo” a

andadura mais eficaz do ponto de vista terapêutico (Freire, 1999).

No decorrer do passo, o cavalo desloca o pescoço para

baixo e para cima. A base do pescoço, onde se apoia a sela,

descreve um movimento de baixo para cima, movendo-se

alternadamente à esquerda, quando o cavalo descansa o

membro anterior esquerdo, e à direita, quando o faz com o

membro anterior direito. Sendo assim, o praticante sofre três

forças distintas sobre o cavalo: uma força para cima e para baixo

(plano vertical), uma força lateral alternada (plano horizontal /

eixo transversal), e uma força sobre o plano póstero-anterior

(plano horizontal / eixo longitudinal). A junção dessas três

formas, denominada de movimento tridimensional, proporciona

ao praticante uma adaptação ao ritmo do passo do cavalo,

exigindo contração e descontração simultâneas dos músculos

agonistas e antagonistas, determinando um ajuste tônico da

musculatura para manutenção da postura e do equilíbrio

(Lermontov, 2004, p. 61).

O efeito desse movimento tridimensional do dorso do cavalo foi descrito

e estudado, pela primeira vez, pelo médico alemão Samuel Theodor Quelmaz

(apud ANDE, Fundamentos Doutrinários da Equoterapia no Brasil. In: Apostilas

do curso básico de Equoterapia, 1999), produzido pelo movimento do cavalo e

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pelo ritmo de seu passo, que tornam o cavalo um instrumento

cinesioterapêutico.

O cavalo, portanto, com sua andadura ao passo e através de

movimentos sequenciados, proporciona, em quem está montado, sensações

por todo o corpo. Funciona, assim, como coautor do desenvolvimento

psicomotor dessa pessoa.

A esses movimentos associa-se um quarto: é uma torção

da bacia do cavalo da ordem de oito graus para cada lado.

Considerando a posição do cavaleiro sentado, com uma perna

de cada lado do animal, a combinação da inflexão da coluna do

cavalo com o abaixamento da anca do mesmo lado faz com que

o quadril do cavaleiro acompanhe a torção provocada pela linha

das ancas. Em cada passo é executado um movimento de

rotação do quadril para cada lado. Os deslocamentos da cintura

pélvica produzem vibrações nas regiões ósteo-articulares que

são transmitidas ao cérebro, via medula, com a frequência de

180 oscilações por minuto, o que já foi apontado como sendo a

mais adequada à saúde. Cada passo completo do cavalo

apresenta padrões semelhantes ao do caminhar humano: o

homem, ao deslocar-se, inicia seu movimento por meio de

perdas e retomadas de equilíbrio e dá sequência ao seu

deslocamento pela força muscular de seus membros inferiores

(Lermontov, 2004, p. 61-62).

Lermontov ainda afirma que o cavalo, ao deslocar-se, exige do cavaleiro

ajustes tônicos para adaptar seu equilíbrio a cada movimento. O ritmo do passo

tem uma frequência de 1 (um) a 1,25 (um e vinte e cinco) movimentos por

segundo, que leva o cavaleiro a realizar 1.800 (um mil e oitocentos) a 2.250

(dois mil e duzentos e cinquenta) ajustes tônicos em trinta minutos de sessão).

A quantidade de repetições torna o exercício bastante intenso, apesar da

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pouca tensão muscular solicitada nesta andadura. Por esse motivo, não é

recomendado que uma sessão de equoterapia dure mais de 30 minutos.

Por isso, a grande vantagem da utilização do cavalo. No caso do

praticante ser incapaz de gerar os movimentos harmônicos por si só, o cavalo

gera os movimentos e os transmite ao praticante, que desencadeia um

mecanismo de resposta. Apesar de os movimentos se processarem de maneira

rápida, não é tão rápido que impeça seu entendimento pelo cérebro humano. E

sua repetição, simetria, ritmo e cadência fazem com que as respostas surjam

de maneira bastante rápida.

De acordo com a Associação Nacional de Equoterapia, se convencionou

que esta prática estaria ligada a quatro fases ou momentos: hipoterapia,

educação/reeducação, pré-esportiva e esportiva.

Na hipoterapia, o cavalo é utilizado como instrumento terapêutico para

objetivos específicos: pessoas com graves dificuldades motoras, controle motor

precário, déficit de controle de cabeça e/ou de tronco.

Os pacientes com capacidade de interação com o animal se enquadram

na segunda fase, a educação/reeducação, visando à coordenação global com

finalidades pedagógicas, onde o paciente possui um mínimo de autonomia.

A terceira fase é a do pré-esporte, coma atividades em grupo, onde os

pacientes se organizam no espaço e no tempo e preparam-se para sua

inserção na sociedade.

O quarto momento é do esporte, com o paciente apto a participar de

provas eqüestres, resultando em socialização, organização espacial mais

elaborada, regularização da própria agressividade e melhora na sua

personalidade.

Ainda segundo a ANDE-BRASIL, a equipe interdisciplinar mínima para

um adequado tratamento na equoterapia deve contar com os seguintes

profissionais: médico, fisioterapeuta, psicólogo e instrutor de equitação. Outros

profissionais, como terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, pedagogo e

educador físico também contribuem positivamente para o sucesso da terapia,

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atuando com enfoques diferentes, dependendo da fase em que está inserido o

praticante.

Pela atuação física e psíquica que a equoterapia alcança, na ativação e

estimulação de diversas funções do corpo humano, tais como a respiração, a

fala, a atenção, a memória, a cognição, a concentração, a autoimagem, a

autoconfiança, entre outros, a criança sente-se estimulada a seguir em frente e

participar ativamente do tratamento. Por vezes ela mesma estabelece desafios

a serem pouco a pouco superados.

É válido mencionar que a equoterapia deve ser segura, benéfica e

agradável para todos os membros da equipe. O desejo de proporcionar uma

experiência única para uma criança com limitações funcionais, por mais bem

intencionado que seja, não deve ultrapassar o conhecimento e o bom senso.

Estar sobre um cavalo deve ser uma experiência de cura em todo o sentido da

palavra e deve trazer uma sensação de liberdade e movimento.

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CAPÍTULO II

ASPECTOS INERENTES AOS CONCEITOS

PSICOMOTORES

O corpo é o intermediário obrigatório entre a criança e o mundo e, por

esta razão, o usamos como ponto de referência.

São os gestos do corpo que vão levar o indivíduo à consciência de seus

limites e possibilidades. Nos movimentos, são expressos sentimentos de

frustração, desagrado, prazer e euforia, como dimensão de um estado

emocional, tão difícil de ser manifestado em uma criança autista ou com

deficiência intelectual.

A Psicomotricidade é uma nova ciência que cuida do indivíduo a partir

de seu corpo e de sua capacidade psíquica de realizar movimentos. Não se

trata da realização do movimento propriamente dito, mas da atividade psíquica

que transforma a imagem para a ação em estímulos para os procedimentos

musculares adequados.

Psicomotricidade, portanto, é um termo empregado para uma

“concepção de movimento organizado e integrado, em função das experiências

vividas pelo sujeito, cuja ação é resultante de sua individualidade, sua

linguagem e sua socialização.” (Lermontov, 2004, p. 20).

Seu objetivo é fornecer elementos para que a criança

possa construir seu desenvolvimento global, através de seu

próprio corpo e da relação do corpo com o meio ambiente. É

tocando, apalpando, correndo, cheirando, observando, que a

criança desenvolve seu físico, realiza seus conhecimentos,

elabora seus conceitos, desperta suas emoções, enfim, percebe

o mundo que a cerca e constrói seu mundo interior (OSÓRIO, p.

48).

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Todo ser humano, desde a sua concepção, tem uma lógica biológica,

maturativa e evolutiva que faz com que o seu desenvolvimento aconteça de

maneira contínua, sequencial e progressiva. Presume-se que cada etapa desse

processo reflita em um estado de organização particular do comportamento

motor.

À medida que o indivíduo domina melhor seu corpo e sentimentos,

gradativamente, ele irá conduzir-se com mais segurança em seu ambiente e

caminhar satisfatoriamente no decorrer do seu desenvolvimento.

Segundo a Sociedade Brasileira de Psicomotricidade, a

Psicomotricidade é a ciência que tem como objetivo de estudo o homem

através do seu corpo em movimento e em relação ao seu mundo interno e

externo, bem como suas possibilidades de perceber, atuar, agir com o outro,

com os objetos e consigo mesmo. Está relacionada ao processo de maturação,

onde o corpo é a origem das aquisições cognitivas, afetivas e orgânicas

(S.B.P., 1999).

Alfred e Françoise Brauner (apud OSÓRIO, p. 48), relatam que “é a

interação que existe entre o nosso pensamento consciente e o movimento

efetuado por nossos músculos”.

Historicamente o termo "psicomotricidade" aparece a partir do discurso

médico, mais precisamente neurológico, quando foi necessário, no início do

século XIX, nomear as zonas do córtex cerebral situadas mais além das

regiões motoras. Com o desenvolvimento e as descobertas da neurofisiologia,

começa a constatar-se que há diferentes disfunções graves sem que o cérebro

esteja lesionado ou sem que a lesão esteja claramente localizada. São

descobertos distúrbios da atividade gestual, da atividade práxica. Portanto, o

"esquema anátomo-clínico" que determinava para cada sintoma sua

correspondente lesão focal já não podia explicar alguns fenômenos

patológicos. É, justamente, a partir da necessidade médica de encontrar uma

área que explique certos fenômenos clínicos que se nomeia, pela primeira vez,

o termo Psicomotricidade, no ano de 1870. As primeiras pesquisas que dão

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origem ao campo psicomotor correspondem a um enfoque eminentemente

neurológico (SBP, 2003).

Em torno de 1925, os estudos de Henri Wallon foram importantes para o

surgimento da psicomotricidade. Ele, diferentemente de Duprè que relacionou a

motricidade com a inteligência, estudou a relação entre a motricidade e o

caráter. Isso permitiu relacionar o movimento ao afeto, à emoção, ao meio

ambiente e aos hábitos da criança. Para Wallon, a consciência, o

conhecimento e o desenvolvimento geral da personalidade não podem ser

isolados das emoções (Lermontov, 2004). Ele aprofundou seus estudos na

relação que une o tono (pano de fundo de todo ato motor) e a emoção.

Maine de Biran (apud Coste, 1992), conceberam noções próximas das

que utilizamos hoje. Este foi o primeiro a falar quo o movimento é um

componente essencial da estrutura psicológica do eu e que é na ação que o eu

adquire consciência de si mesmo e do mundo.

Para Nicola, uma conceituação atual de psicomotricidade

é que esta ciência nova, cujo objeto de estudo é o homem nas

suas relações com o corpo em movimento, encontra sua

aplicação prática em formas de atuação que configuram uma

nova especialidade. A psicomotricidade estuda o homem na sua

unidade como pessoa (NICOLA, 2004, p. 5).

Nicola ainda fornece outro conceito, pautada na soma do termo

Motricidade e do prefixo Psico:

“Motricidade: por definição conceitual é a propriedade que têm certas

células nervosas de determinar a contração muscular.

Psico (Gr Psyquê): vem representar a alma, espírito, intelecto.

24

24

Psicomotricidade: condição de um estado de coisas corpo / mente. Visão

global de um indivíduo, onde a base de atuação está no conhecimento desta

fusão.”

É fato, portanto, que a mente e a expressão corporal da criança estão

inteiramente ligadas, identificando como a criança pode se desenvolver através

da expressividade corporal, mostrando como seus movimentos são importantes

para que ela se descubra dentro da sociedade e a partir de então interagir com

o meio.

Em 1977, há a criação da primeira iniciativa na América Latina, A

Associação Argentina de Psicomotricidade e, a partir de 1980, a difusão e

extensão da psicomotricidade conquistam o mundo. No Brasil, os estudiosos

uniram-se em torno da Sociedade Brasileira de Psicomotricidade, por eles

fundada em 1980.

A Psicomotricidade abrange todas as aprendizagens do indivíduo, dirige-

se a todas elas individual ou coletivamente, processando-se por progressões

bem específicas nos quais todas as etapas são necessárias. Faz com que o

mesmo participe ativamente. Ele deve falar, compreender, corrigir, atuar e

descobrir, facilitando assim a aprendizagem. A pessoa parte do concreto para o

abstrato, através de exercícios do mais fácil para o mais difícil, repetindo-os

sempre que necessário.

O desenvolvimento psicomotor evolui do geral para o específico. No

decorrer do processo de aprendizagem, os elementos básicos da

psicomotricidade (esquema corporal, estruturação espacial, lateralidade,

orientação temporal e pré-escrita) são utilizados com frequência, sendo

importantes para que a criança associe noções de tempo e espaço, conceitos,

ideias, enfim adquira conhecimentos. Um problema em um destes elementos

poderá prejudicar a aprendizagem, criando algumas barreiras.

Pode-se entender, portanto, que a prática psicomotora tem ênfase na

saúde, e não na doença, e possibilita um tempo e um espaço onde o sujeito, de

forma espontânea, possa expressar com liberdade e autenticidade todo o seu

25

25

potencial motor, cognitivo, afetivo, social e relacional, para que,

consequentemente, possa melhorar o desenvolvimento global de sua

aprendizagem e de sua capacidade de adaptação social e afetiva.

A utilização de técnicas psicomotoras visa também estimular a cognição,

pois o intelecto se constrói a partir do exercício físico, que tem uma importância

fundamental no desenvolvimento não só do corpo, mas também da mente e da

emoção. Sem o suporte psicomotor, o pensamento não poderá ter acesso aos

símbolos e à abstração.

A abordagem da psicomotricidade irá permitir a compreensão da forma

como a criança toma consciência do seu corpo e das possibilidades de se

expressar por meio dele, localizando-se no tempo e no espaço. O movimento

humano é construído em função de um objetivo. A partir de uma intenção como

expressividade íntima, o movimento transforma-se em comportamento

significante. É necessário que toda criança passe por todas as etapas em seu

desenvolvimento.

Atualmente existem dois eixos pelos quais a psicomotricidade educativa

avança: a psicomotricidade funcional e a psicomotricidade relacional. A

primeira toma como referência inicial o perfil psicomotriz da criança avaliada a

partir de testes padronizados, e que se serve de famílias de exercícios como

atividade-meio, não deixando espaço à exteriorização da expressividade

motriz. A segunda, por sua vez, utiliza como atividade-meio à ação de brincar,

a criação, a representação e a imaginação, isto é, utiliza-se do jogo como

elemento pedagógico (NEGRINE, 2002).

Segundo Lermontov (2004), podemos citar os seguintes conceitos

psicomotores: esquema corporal (tonicidade e equilíbrio), imagem corporal,

coordenação motora (coordenação dinâmica global e coordenação viso-

motora), lateralidade e dominância lateral, estruturação espacial e orientação

temporal, ritmo, percepção, cognição, atenção e concentração.

Discorrendo sobre a psicomotricidade funcional, podemos considerar

que o esquema corporal, segundo Hurtado (1991), é a organização psicomotriz

global, compreendendo todos os mecanismos e processos dos níveis motores,

26

26

tônicos, perceptivos, sensoriais e expressivos, processos nos quais e pelos

quais o aspecto afetivo está constantemente investido. Sendo o esquema

corporal, portanto, o conhecimento que temos do corpo em movimento ou

posição estática, em relação aos objetos e ao espaço que o cerca, podemos

destacar a tonicidade e o equilíbrio como dois elementos fundamentais para

sua correta elaboração. No caso da tonicidade, não se trata apenas de um

aspecto da ação física ou muscular em sua dosagem adequada para cada ato

motor, mas possui um significado psicológico e humano, pois está intimamente

ligado às flutuações emocionais do indivíduo. Já o equilíbrio, como é a base de

toda coordenação dinâmica, afeta a correta construção do esquema corporal,

pois trata-se da capacidade de manter a estabilidade enquanto se realizam

diversas atividades locomotoras e não-locomotoras (Hurtado, 1991). Um

equilíbrio inadequado traz como conseqüência a perda da consciência da

mobilidade de alguns segmentos corporais.

É na eficaz aplicabilidade do esquema corporal que temos a formação

do EU, da personalidade da criança, pois é por meio da consciência do seu

corpo que a criança aprende a expressar-se por intermédio deste (corpo). É

com noções corporais precisas que adquirimos gestos precisos e adequados,

melhorando a vida afetiva e social.

Sendo assim, a própria criança será transformadora do mundo que a

cerca, promovendo mudanças de atitudes que facilitem seu deslocamento

durante suas atividades físicas em relação a si mesma e em relação aos

outros.

Lermontov (2004) diz que um bom desenvolvimento do esquema

corporal vai ser mostrado na evolução da imagem corporal, no reconhecimento

do próprio corpo.

A imagem corporal é um conjunto de sensações

concernentes ao próprio corpo. Imagem ou sensação que tem o

indivíduo acerca do seu corpo, como resultado da soma total de

suas experiências. É o produto da percepção, atitudes e valores

27

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que ele tem acerca de seu ambiente. É a representação mental

que o indivíduo tem do próprio corpo (HURTADO, 1991, p. 65).

Temos ainda como aspecto importante da psicomotricidade funcional a

coordenação motora, a qual supõe a integridade e maturação do sistema

nervoso, permitindo combinar a ação de diversos grupos musculares na

realização de uma seqüência de movimentos com o máximo de eficiência,

economia e rapidez. Lermontov relata que a coordenação é a base do

aprendizado, buscando o gesto mais apropriado para uma ação específica e

tendo, como conseqüência, maior e melhor ação no meio ambiente. Divide-se

em coordenação dinâmica global, onde envolve movimentos amplos com o

corpo todo, e coordenação viso-motora, onde engloba movimentos de

pequenos músculos em harmonia na execução de uma atividade, utilizando

dedos, mãos e pulsos.

No momento em que os movimentos se combinam e se organizam numa

intenção motora, faz-se necessária a presença de um lado predominante, que

se impõe e irá ajustar a motricidade, ocorrendo assim o processo de

dominância lateral. Este processo difere da consciência da lateralidade. Esta,

diz respeito à percepção que temos de cada lado do nosso corpo (direito e

esquerdo) e dos movimentos por eles realizados independentemente. Os lados

do corpo não são homogêneos e essa distinção se manifesta na ao longo do

desenvolvimento e da experimentação, aprendendo a diferenciar os lados do

corpo em torno dos 5 anos e saber com precisão quais são os lados direito e

esquerdo em torno dos 7 anos (Lermontov, 2004).

Assim, podemos perceber que a área de dominância lateral é

naturalmente definida durante o crescimento por princípios neurológicos,

apesar de sofrer influências de hábitos sociais. O praticante percebe que tem

diferença no desempenho de atividades físicas, dependendo do membro

utilizado durante uma determinada atividade, como, por exemplo, a cavalo,

efetuar exercícios de elevação das coxas simultâneas ou alternadamente, com

o animal ao passo.

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28

Perceber que o corpo possui dois lados e que um é mais utilizado que o

outro constitui uma primeira etapa da orientação espacial, a qual é definida por

Hurtado (1991, p. 83) como a “capacidade de movimentar o próprio corpo, de

forma integrada, em volta dos objetos no espaço-ambiente e passando por

eles.” A noção de espaço estrutura-se, a princípio, tendo o “EU” como

referencial em relação ao mundo exterior, depois a outros objetos ou pessoas,

em posição estática ou em movimento. Está intimamente ligada à orientação

temporal, e Lermontov nos leva a entender a estruturação espaço-temporal

como a capacidade de situar-se e orientar-se a si próprio, localizar outras

pessoas e objetos num determinado espaço e tempo. É a noção de direção

(acima, abaixo, frente, trás, direita, esquerda), de distância (longe, perto) e de

tempo (na sucessão dos acontecimentos e da duração dos intervalos).

É importante dizer que não se trabalha a estruturação espacial sem que

se tenha alcançado um bom desenvolvimento do esquema corporal.

Ainda no que diz respeito à estruturação temporal, a autora relata que o

ritmo é como fator de sustentação e adaptação ao tempo, abrangendo a noção

de ordem, sucessão, duração e alternância.

Para que uma criança adquira noção de esquema corporal ou uma outra

noção indispensável ao seu desenvolvimento, devemos percorrer caminhos de

aprendizagem natural, etapa por etapa. Primeiro com exercícios motores,

seguidos pelos sensoriais, depois pelos sensório-motores e finalmente pelos

perceptomotores.

Para tal procedimento, temos a opção pela utilização do cavalo

enquanto instrumento terapêutico, promotor de movimentos adequados e

precisos para as aquisições das principais áreas psicomotoras.

Aspectos como percepção, cognição, atenção e concentração

complementam os pilares da psicomotricidade funcional, onde o indivíduo

passa pelo processo de reconhecimento do objeto por meio dos sentidos

(percepção), realiza diversas operações mentais com o intuito de

aprender/raciocinar (cognição), é capaz de selecionar uma resposta para um

estímulo discriminativo (atenção) e dirige a sua atenção para alguma coisa

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29

durante um tempo considerável, terminando uma tarefa antes que a atenção se

dirija para outra (concentração).

A comunicação, expressão, afetividade, agressividade, limite e

corporeidade, são termos que fazem parte da psicomotricidade relacional onde

o brincar espontâneo e a comunicação não-verbal permitem à criança, ao

adolescente, ao jovem e ao adulto expressar suas dificuldades relacionais,

tendo o corpo como instrumento relacional com o meio.

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CAPÍTULO III

CONTRIBUIÇÕES DA EQUOTERAPIA NO

DESENVOLVIMENTO DA PSICOMOTRICIDADE

Para o MEC (1998), contextualizar o conteúdo que se quer aprendido

significa, em primeiro lugar, assumir que todo conhecimento envolve uma

relação entre sujeito e objeto. A contextualização visa dar significado ao que se

pretender ensinar ou desenvolver, fazendo com que o aprendiz sinta

necessidade de adquirir um conhecimento que ainda não tem.

Como a prática da equoterapia se dá em pleno contato com a natureza,

sendo aplicados exercícios de psicomotricidade, recuperação e integração,

acaba sendo uma complementação das terapias tradicionais que utilizam

instrumentos tecnológicos em clínicas, consultórios e hospitais (Rodrigues,

2006).

Ainda de acordo com o autor Rodrigues (2006), o cavalo consegue

produzir os mais variados efeitos no praticante, tais como:

• Efeito Funcional: o cavalo nunca fica imóvel, portanto o praticante tem

que fazer ajustes musculares e corporais para manter-se em cima do animal;

• Efeito Fisiológico: o movimento estimula o peristaltismo do estômago e

intestino. E a temperatura do animal provoca relaxamento da musculatura;

• Efeito Psicológico: ajuda a melhorar a confiança, concentração,

autoestima e a integração com o grupo;

• Efeito Sensorial: os movimentos realizados pelo cavalo estimulam o

sistema nervoso periférico e central.

Na equoterapia o cavalo atua não apenas como um espelho em que são

projetadas as dificuldades, processos e vitórias, mas também como um novo

estímulo, que propicia novas percepções e vivências para os seus praticantes.

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Assim podemos considerar que a equoterapia favorece a reintegração

social, que é estimulada pelo contato com da pessoa com outros praticantes,

com a equipe e com o animal, trazendo-o cada vez mais ao o convívio da

sociedade na qual convive.

Conforme Medeiros e Dias (2002), na equoterapia há a participação do

corpo inteiro do praticante, contribuindo em seu desenvolvimento global.

Quando o cavalo se desloca ao passo, ocorre um movimento

tridimensional que é transmitido ao praticante pelo contato do seu corpo com o

do animal, proporcionando movimentos mais complexos atuantes nas funções

neuromotoras, assim auxiliando na regularização do tônus postural,

organização da cabeça, tronco e extremidades.

Com a organização do tronco, este realizará suas funções

adequadamente. O tronco deve ser capaz de alinhar os segmentos vertebrais e

estabilizá-los, tanto na posição estática quanto na sustentação do peso, além

de efetuar movimentos de flexão, extensão, inclinações laterais e rotações,

podendo estes serem combinados graças à mobilidade da coluna vertebral.

Esta dupla função, movimentação/estabilização, é assegurada pelos músculos

do tronco (Calais-Germain, 1991).

Os estímulos propiciados pelo cavalo contribuirão para o ajuste postural

adequado, estabilizando os membros superiores e cintura escapular, e assim

promovendo alinhamento, estabilidade, movimentos harmônicos, facilitando a

execução da função (Medeiros e Dias, 2002).

Ademais, de acordo com Lermontov (2004), o calor do cavalo, acoplado

com o movimento rítmico, lento, uniforme e constante, provoca no praticante

um embalo relaxante e adormecedor, estimulando uma diminuição do nível

tônico muscular, sendo útil na redução da disposição muscular anormal, no

caso de uma tonicidade exacerbada (hipertonia), promovendo um relaxamento

no cavaleiro e ajudando na melhora dos padrões anormais, quebrando padrões

patológicos. Em casos de uma tonicidade muscular diminuída (hipotonia), o

aumento do tônus muscular é obtido pelas informações dadas pelo trote, por

ser este um movimento vertical e saltitante, ou pelo passo encurtado, que

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determinam uma ação reflexógena muito estimulante, favorecendo assim o

aumento do tônus muscular.

Para Haehl (1994), a “equoterapia pode ser considerada, também, um

parâmetro de controle ambiental para ajudar na reorganização de um

movimento levando a novos padrões de movimentos coordenados” (apud

Freire, 1999, p. 31).

Shepherd (1995) colabora afirmando que o ambiente exerce importante

papel na modulação do desempenho motor.

As atividades relacionadas com a prática de Equoterapia, conforme

explica Masiero (2010), exigem suas execuções diretamente relacionadas com

as habilidades psicomotoras. Além da montaria, diversas situações

desenvolvem e estruturam conceitos psicomotores. Como exemplos, atividades

de aproximação, pastoreio dos animais, organização do material de

encilhamento, higienização do animal, conduzir/ser conduzido pelo cavalo,

apear e despedir-se, indicam que tais aspectos são amplamente favorecidos,

pois podemos observar estímulos significativos para o desenvolvimento da

coordenação motora, do esquema corporal, dominância lateral, equilíbrio e

estruturação espaço-temporal.

O proposto é permitir que o praticante vivencie seu corpo ativamente em

todas as situações envolvidas no ambiente equoterapêutico. OSÓRIO (p. 48)

afirma que o objetivo da psicomotricidade é “fornecer elementos para que a

criança possa construir seu desenvolvimento global, através do seu próprio

corpo e da relação do corpo com o meio ambiente” (apud LERMONTOV, 2004,

p. 20).

Ao montar o cavalo, estamos trabalhando movimento

amplo e dissociação, pois o praticante tem de lançar a perna

direita por cima do animal. Jogar bola, abraçar, pegar na orelha

ou no rabo do cavalo, assim como dar banho e escová-lo são

alguns exemplos para movimentos amplos e dissociação de

movimentos. Estes últimos são também importantes na relação

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afetiva que a criança começa a estabelecer com o animal,

proporcionando melhora na autoestima e autoconfiança,

independência e senso de responsabilidade. O segurar a rédea

com as mãos já estimula os movimentos finos, como fazer trança

e pegar pequenos objetos presos na crina do cavalo ou então

pegar folhinhas das árvores, visto que o trabalho é feito ao ar

livre, o que ajuda na motricidade fina (LERMONTOV, 2004, p.

110-111).

Da mesma forma, o esquema e a imagem corporal são estimulados

através de nomeação, função, comparação e representação, todos realizados

no ambiente terapêutico, utilizando-se da montaria ou não. Além disso,

sabemos que a criança percebe seu próprio corpo por meio de todos os

sentidos. Lermontov explica que o esquema corporal, que é neurológico, se

estabelece pela simultaneidade das informações proprioceptivas e

exteroceptivas. As informações proprioceptivas são percebidas pelas regiões

articulares, musculares, periarticulares e tendinosas. O praticante, quando

sentado sobre o cavalo, recebe novas informações, diferentes das habituais da

posição em pé, sobre os pés, as quais levam a novas percepções sensoriais e

consequentemente novo conceito neurológico de esquema corporal.

A lateralidade já começa a ser estimulada quando o praticante monta,

pois normalmente subimos pelo lado esquerdo do animal. Guiar o cavalo

sozinho, por exemplo, já requer uma noção de lateralidade, para que não se

erre o caminho estabelecido pelos terapeutas.

Ainda segundo Lermontov, todas as funções intelectivas, como memória

(visual, auditiva, cinestésica), atenção (visual e auditiva), concentração,

organização e orientação espacial e temporal, ritmo, lateralidade, direção,

análise e síntese, associação de idéias, figura-fundo, raciocínio lógico,

compreensão, seqüência lógica, organização do pensamento, cor, forma, etc.,

estão sendo estimuladas durante qualquer tipo de exercício na equoterapia.

Dependendo da necessidade de cada praticante, uma função será mais

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34

enfatizada através de atividades específicas e adaptadas, podendo também

fazer uso de jogos e atividades recreativas, dependendo de cada caso.

Baseando-se nessas afirmações podemos então entender que a

equoterapia oferece uma poderosa eficiente modalidade para remediar

deficiências da cognição. A autora descreve que nossa cognição, assim como

nosso sistema de fala e linguagem, é influenciada pela integridade de nosso

sistema motor, perceptual e de comportamento. O efeito tridimensional do

cavalo, então, pode ser usado para produzir efeitos em todo mecanismo

humano.

Marins (2010) declara que as atividades realizadas sobre e com o animal

envolvem o corpo do indivíduo de forma “una”, e podem ser consideradas

dentro de um contexto intelectual, emocional, mental, motor e psicológico. O

corpo em movimento passa a ter um significante e um significado, e o aumento

da função é o resultado frequente de um bom posicionamento.

Ao cavalgar a criança precisa coordenar seus movimentos aos do cavalo

e se concentrar, prestar atenção no cavalo e no meio que o cerca. O cavalgar

cria a todo momento uma instabilidade de movimento, permitindo que o

paciente seja encorajado a desenvolver novas maneiras de coordenar uma

resposta postural, fundamental no processo de aprendizagem, na realização de

atividades funcionais e principalmente no desenvolvimento psicomotor.

“O domínio do corpo físico necessário em equitação, que passa a ocupar

um espaço diferente no ambiente, conduz melhor o domínio de afetos, ligados

à imagem do corpo do sujeito” (LERMONTOV, 2004, p. 89).

Ter controle sobre o um animal maior e mais forte do que o praticante

faz com que a autoconfiança se processe, o que se torna algo grandioso para

ele. Pela execução de pequenas tarefas com habilidades mais avançadas, a

confiança passa a ser adquirida gradualmente. A sensação de ser capaz, de

poder realizar bem alguma coisa, pode ser considerada uma tarefa muito fácil

para pessoas ditas “normais”, mas para o indivíduo deficiente ou com algum

déficit psicomotor o faz sentir importante e útil, fazendo toda a diferença no seu

processo de habilitação/reabilitação. A pessoa especial começa a ver que ela

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própria tem controle sobre a força e a imponência transmitidas pelo cavalo que

ela monta, o que favorece também a melhora da auto-estima e o

desenvolvimento da paciência e autocontrole.

Lermontov (2004) descreve que na equoterapia, o cavalo é uma

novidade em relação a outras técnicas terapêuticas, pois ele não é uma pessoa

nem um objeto, mas um ser vivo e comunicante que pode ser carregado de

significados simbólicos. Ele é usado para despertar interesses, que já

começam pelas características corporais, como o calor, cheiro, tamanho, etc.

Ele funciona como “objeto” intermediador entre o mundo intra-psíquico do

praticante, carregado de fantasmas, desejos e angústias, e o mundo exterior,

supondo uma relação triangular entre praticante, cavalo e terapeuta.

O equilíbrio é outro aspecto amplamente estimulado nas sessões de

equoterapia, através do ritmo proporcionado pela andadura do cavalo ao

passo. HOLLE (1990) define o equilíbrio como a capacidade que o indivíduo

tem de controlar a estabilidade, ou seja, capacidade de manter constante em

relação à gravidade, a sua posição. A capacidade de equilibrar-se está

relacionada principalmente ao labirinto e cerebelo, que exerce grande

influência sobre o equilíbrio, pois controla a coordenação de todos os

movimentos. Segundo BAUMANN (1978, pg. 1460) “a associação do ritmo com

o deslocamento pélvico durante o passo do cavalo é um excelente exercício

para melhorar o equilíbrio”.

O ritmo está presente o tempo todo durante uma sessão de equoterapia,

desenvolvendo a melhora do equilíbrio, tornando possível ao praticante a

percepção dos seus próprios ritmos como a batida do seu coração e ainda

proporcionando uma sensação agradável mesmo que inconscientemente, ao

trazer lembranças do seu passado através da estimulação sensório-motora ou

afetiva. UZUN (2005, pg. 71) diz que “seu ritmo, sua cadência, seu balançar,

criam um efeito tranquilizador e caloroso de maternagem”.

Conforme Ayres (1972), o cérebro organiza as informações, de modo a

dar uma resposta. E afirma, ainda, que o indivíduo responde de acordo com

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suas capacidades e com o meio, sendo estas respostas ações objetivas e

intencionais capazes de provocar mudanças neste meio.

Shepherd (1995) afirma que a prática de um ato constitui um pré-

requisito indispensável para se adquirir habilidade na sua execução.

De acordo com Duk (2006), sempre que os alunos possam aplicar

concretamente o que aprendem, eles terão melhor lembrança e sentirão maior

interesse em aprender.

Complementarmente a esses dados, Alípio (2005) aponta que

comprometimentos sociais e emocionais, tais como autismo, esquizofrenia,

psicose, deficiência visual, deficiência auditiva, problemas escolares (distúrbios

de atenção, percepção, linguagem, hiperatividade) e pessoas saudáveis, sem

nenhuma deficiência física ou psicológica, podem ser auxiliados e ter ganhos

físico-emocionais pela equoterapia.

É fato, portanto, que a equoterapia proporciona um ambiente controlado

capaz de fornecer base para adequação do processo sensorial e

funcionamento neuromotor, ou seja, o praticante emite respostas adaptativas

ao meio ambiente e aos movimentos do cavalo, podendo resultar em facilitação

do processo de desenvolvimento psicomotor e melhor adequação da função.

Sabemos que, para uma criança aprender, seja o conteúdo dado na

escola, seja uma regra de jogo, um relacionamento com colegas, pais ou com a

professora, seja uma história, um desenho ou um filme na televisão, ela

precisam do funcionamento de um conjunto de características que agem

integradamente. Estas características são orgânicas, motoras, cognitivas,

emocionais, sociais e metodológicas.

Atualmente, a tendência é de enfatizar a interdisciplinaridade dos

conhecimentos de diversas áreas para o diagnóstico e o tratamento das

dificuldades de aprendizagem. O principal embasamento para tal é o

conhecimento do desenvolvimento e da aprendizagem em suas diversas

abordagens.

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Ao observar, portanto, um praticante em cima do cavalo, podemos ver

que ele vivencia um momento lúdico, explorando aquele momento com os

olhos, nariz, mãos e ouvidos, tentando descobrir sua finalidade e seus

segredos, confirmados por descobertas de sensações e impressões táteis.

Cada manobra executada na sessão de equoterapia é uma experiência

que envolve ação e emoção, acarretando um comportamento diferente, em que

podemos observar cada reação igual ou inversa ao que se propõe ao

praticante.

Podemos inferir com essa observação que, a partir de uma experiência

motora simples, o praticante receberá informações preciosas e cumulativas

para a classificação de um conjunto de outras semelhanças, mas percebidas

em outras circunstâncias. Consegue-se, com isso, noções claras de conceitos

como tamanho, forma, cor, espessura, em cima, embaixo, dentro, fora, de um

lado (direito), do outro lado (esquerdo).

Logo, a função motora, o desenvolvimento intelectual e o

desenvolvimento afetivo se fazem presentes e estão intimamente ligados ao

praticante. E é isso que a psicomotricidade quer destacar em sua abordagem:

a relação entre o afetivo, o motor e a mente, por meio de uma técnica

específica.

Na equoterapia, podemos trabalhar a diversidade da perspectiva

ecológica e a importância que o assunto ocupa na atualidade, fazendo a

substituição do material pedagógico convencional, e que muitas vezes já se

tornou ineficaz e/ou desmotivador para o praticante. Pelas possibilidades de

um ambiente natural e saudável, podemos incluir a oportunidade de vivenciar

nossas relações interpessoais, estabelecidas entre praticante – cavalo –

terapeuta – guia condutor e família.

São aspectos peculiares desse ambiente especializado da equoterapia

que o fazem diferente dos demais.

A relação de confiança entre praticante, cavalo e terapeuta, associada a

um ambiente rico em estímulos e organizado em etapas, torna o contexto

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equoterapêutico motivador, gerando prazer na realização das atividades. Este

sentimento organiza a experiência das sensações e favorece o aprendizado no

seu âmbito global, sem deixar de lado os aspectos específicos, contribuindo

assim para o desenvolvimento de aspectos psicomotores, pois cria uma nova

visão do seu próprio corpo e do potencial que se adquire ao vivenciar novas

condutas corporais e percepção do mundo de forma diferenciada.

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CONCLUSÃO

O cavalo é o instrumento terapêutico utilizado com base nos benefícios

de seu movimento natural “ao passo”, movimento este resultante de reações

tridimensionais. É ainda um agente educativo e facilitador da integração físico-

psíquica e social do indivíduo.

O estímulo psicomotor do cavalo ao movimentar-se ao passo favorece

maior noção do próprio corpo, e através do balançar transmitido a quem está

montado e da postura exigida sobre o cavalo ocorre a manipulação corporal, ou

seja, facilitação do desenvolvimento das potencialidades, necessidades e

limites, agindo assim como facilitador do processo de desenvolvimento da

consciência corporal, integração sensorial, coordenação motora, equilíbrio e

força muscular, além da melhora da auto-estima, confiança e autocontrole.

O trabalho ao ar livre diferencia este de muitos outros métodos, o que

representa uma excelente oportunidade de transformar o ambiente de terapia e

oferecer ao praticante uma nova forma de alcançar suas metas.

A equoterapia vem crescendo e ocupando o seu espaço, podendo ser

considerada um novo auxílio às técnicas atuais de reabilitação e educação.

Nela temos a capacidade de associar a atividade lúdico-esportiva e um eficaz

método terapêutico educacional. É um dos poucos métodos capaz de oferecer

simultaneamente uma grande diversidade de estímulos, além de trabalhar o

corpo como um todo, sendo assim uma importante e significativa abordagem

terapêutica que traz consigo aspectos relevantes ao desenvolvimento da

psicomotricidade.

À guisa de uma conclusão, sabemos que a equoterapia é uma prática

complementar que alcança bons resultados em muitos casos onde é aplicada.

Ainda assim, por ser uma prática relativamente recente no Brasil (apenas em

1997 a Sociedade Brasileira de Medicina Física e Reabilitacional e o Conselho

Federal de Medicina reconheceram a equoterapia como método terapêutico)

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necessita ser mais bem fundamentada e explorada em suas aplicações e

desenvolvimentos. As pesquisas nesta área são fundamentais para enriquecer

e fundamentar esta prática. Talvez com o avanço progressivo das

neurociências, possamos verificar e comprovar cientificamente os benefícios

alcançados pela prática de equoterapia e como estes operam a curto, médio e

longo prazo.

41

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• GUIMARÃES, F.L. Apostila de Hipoterapia. Método e Desenvolvimento.

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• HOLLE, Britta. Desenvolvimento motor da criança normal e retardada:

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http://www.psicomotricidade.com.br/psicomotricidade.htm

Acesso em: 08 dezembro 2012.

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ANEXOS

Anexo 1: Entrevista

Com o intuito de complementar as pesquisas bibliográficas e

webgráficas deste trabalho, foi realizada uma entrevista com pais e professores

de praticantes e profissionais envolvidos com a equoterapia, com o objetivo de

obter uma visão da sua realidade e experiência.

Esta foi semiestruturada, baseada em um questionário com 04

perguntas norteadoras, realizada pela própria autora, em dia e horário

previamente combinados, no Centro de Equoterapia Apae de Itapetininga/SP.

Contou com a participação de 03 pais, 03 professores e 03 profissionais

envolvidos com tal prática.

As perguntas que fizeram parte da entrevista foram:

1) No seu ponto de vista, quais os aspectos desenvolvidos pela prática

de equoterapia?

2) Como você relaciona a equoterapia aos aspectos psicomotores

principais? (esquema corporal, coordenação motora global e fina,

equilíbrio, lateralidade, organização espaço-temporal).

3) A terapia com o cavalo atua como agente positivo ou negativo em

relação às emoções do praticante? Por quê?

4) Na sua opinião, o ambiente da equoterapia estimula o

desenvolvimento do praticante como um todo? Explique.”

Após a realização da entrevista com todos os participantes, numa

análise qualitativa, pôde-se observar que as respostas tiveram uma essência

única, onde, em resumo, destacou-se que a equoterapia possibilita que sejam

criados novos conhecimentos, pois melhora o comportamento da criança

fazendo com que retenha mais atenção, interesse, uma conduta motora melhor

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e com isso, num trabalho de intervenção multidisciplinar essa criança passa a

ter ganhos em suas aquisições nos mais variados aspectos.

O ponto de vista das profissionais envolvidas com esta prática traz como

destaque que a alteração do ritmo do cavalo, sua direção, o lado de sentar,

apresentação de outros objetos durante a terapia contribuem para a melhora

da lateralidade, coordenação motora grossa e fina e todos os outros aspectos

abordados no questionário, conforme relatou uma das entrevistadas: “É mais

um instrumento estimulador, de aprendizagem de forma integral. Ao sair das

quatro paredes, ao ar livre, já muda tudo.”

Sob o olhar das professoras dos praticantes, observou-se que o

ambiente lúdico e diferenciado teve a maior ênfase, levando aos ganhos de

aprendizagem de forma integral e não fragmentada, tornando esse processo

terapêutico completo, estimulando as áreas sensoriais, motora, afetiva e

cognitiva. Nesta linha, um dos relatos chamou a atenção: “É tudo de bom. O

raciocínio e o sentido da realidade são estimulados no contato com o animal e

na exploração do ambiente. Eles aprendem brincando.”

Todavia, o que mais se destacou, no meu ponto de vista, enquanto

entrevistadora, foi o depoimento de uma mãe, onde emocionada relatou: “Sem

dúvida, especificamente no caso do meu filho, que tem Paralisia Cerebral, é

hemiplégico à direita, deficiente visual, tem disfunção neurológica e quadro

autista, ou seja, um caso bem complexo, ele ficava mais calmo, aprendeu a

esperar com maior aceitação, interagia com o cavalo, quando estimulado

mantinha uma conversa por um tempo maior, sua memória melhorou

encadeando informações, saía da terapia mais relaxado a ponto de dormir

melhor, sendo possível diminuir a medicação para induzir seu sono, se

alimentava melhor por causa do gasto de energia, mancava menos, ou seja, o

tônus da sua perna direita melhorava, e seu comportamento melhorou

consideravelmente. A equoterapia mudou a nossa vida.”

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