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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A PROPRIEDADE A POSSE E SUA FUNÇÃO SOCIAL LUZ DO CÓDIGO CIVIL E DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL
ILANA FERREIRA DE OLIVEIRA
Orientador: Jean Alves
Rio de Janeiro 2013
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A PROPRIEDADE E A POSSE A LUZ DO CÓDIGO CIVIIL, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DA FUNÇÃO
SOCIAL
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Direito Civil e Privado
Por: Ilana Ferreira de Oliveira
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus em primeiro lugar, pois sem Ele nada disso seria
possível.
Agradeço aos meus amados filhos William e Larissa pela
compreensão ao longo deste ano, pelas horas privadas de minha companhia,
pelo incentivo quando estava cansada e pelos beijinhos e carinhos em todos os
momentos.
Agradeço a minha mãe e meus irmãos por esta jornada juntos.
Agradeço ao meu amigo Fábio Lúcio pela força ao longo desse ano
junto com nossos filhos.
Agradeço aos meus queridos amigos de turma: Regiane Anastácia,
pela parceria ao longo do ano, Fabrícia Lobão minha amiga/filha do coração,
Caio, Leonardo Vinícius, João Victor, João Guilherme, Maria de Lourdes,
Danielle pelas risadas, trocas de conhecimento e parceria ao longo de todo
ano.
Agradeço ao meu orientador Prof. Jean Alves pelas orientações e
dicas nos momentos oportunos.
Agradeço ao querido Professor Luiz Eduardo Chauvet por ter me
inspirado na escolha do tema e pelo incentivo ao longo do curso.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho as minhas razões de
viver, meus filhos: William e Larissa por
trazerem a minha vida o sentido
necessário para sempre seguir em frente.
RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo analisar os institutos da
propriedade, da posse e sua função social dentro do nosso ordenamento
jurídico vigente como o Código Civil e a Constituição Federal.
O estudo da propriedade analisa a sua evolução histórica, o seu
panorama constitucional e o seu tratamento no Código Civil, dirigidos
especialmente para as perspectivas estruturais e funcionais do direito, levando-
se em consideração os princípios e garantias constitucionais, o conceito,
estrutura e função.
Aponta o trabalho, ainda, e compreensão da posse segundo as
principais teorias clássicas e sociológicas e o reflexo delas no Código Civil, a
partir dos seus elementos estruturais, e sua função social.
Em última análise estudo aborda algumas questões relevantes na
consideração da função social com qualificação da posse. De forma que a
função social da propriedade é a própria posse como o fato socialmente
relevante exercido sobre a propriedade.
METODOLOGIA
Os métodos utilizados para elaboração do presente trabalho foram
leituras de vários livros, coletas de dados em sites de pesquisa, pesquisa
bibliográficas.
Com essa finalidade, o presente trabalho monográfico é um estudo
descritivo analítico com pesquisa bibliográfica de autores como Friedrich
Engels, Jose Manuel Arruda Alvim Neto, Maria Helena Diniz, Luis Edson
Fachin, Gilmar Ferreira Mendes, Gustavo Tepedino, Orlando Gomes entre
outros; e pesquisa documental, através de leis. É uma pesquisa pura e
qualitativa, sendo também descritiva e explicativa.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - A propriedade 09
CAPÍTULO II - A Posse 26
CONCLUSÃO 45
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS 47 ÍNDICE
8
INTRODUÇÃO
O estudo da propriedade e da posse sempre foi estimulador, pois são
direitos inerentes da pessoa humana e relacionados entre si. Mesmo que
desejemos legitimar a autonomia da posse frente à propriedade e o
alheamento jurídico deste último direito, nos deparamos com a realidade de
que a posse é o principal instrumento para o exercício do direito de
propriedade, enquanto a propriedade é uma grande aspiração a todos que
exercem apenas posse.
Ambos os institutos são providos de especial potencialidade para
concretizar juridicamente os direitos e garantias fundamentais, determinados
por uma Constituição Federal que abarcou não apenas direitos de proteção em
relação às relações privadas e públicas voltados para os aspectos econômicos
e sociais.
Diante do quadro de evolução da sociedade brasileira essas
questões referentes à propriedade e posse foram repercutindo e sendo
garantidas nos ordenamentos jurídicos vigentes, assim, conforme foi se
ampliando o conceito de cidadania e considerando os fatores sociais, o aspecto
finalístico da propriedade e da posse ganhou proporção e importância jamais
vistas, principalmente a partir do texto constitucional em vigor.
A função social da propriedade passou a ser reunida com outros
princípios e direitos fundamentais, como os da dignidade da pessoa humana,
cidadania, moradia, patrimônio mínimo, dentre outros, fazendo com que se
desprendesse de um regime próprio da propriedade e da posse, deixando,
inclusive, de considerar aspectos da garantia constitucional do direito de
propriedade privada.
Assim, no primeiro capítulo do trabalho abordo toda a evolução da
concepção histórica da propriedade na sociedade bem como a evolução deste
instituto dentro das Constituições Federais Brasileiras, fazendo uma breve
análise da propriedade privada no Código Civil e chegando até a sua relação
com a função social determinada na Constituição Federal vigente.
9
No segundo capítulo, analisa-se se o instituto da posse, que em
nossa sociedade só foi alavancada pela atual Carta Magna que considerou a
posse como o principal instrumento de realização dos demais princípios e
direitos constitucionais, o único capaz de trazer concretude e significado aos
mencionados princípios e direitos fundamentais, mesmo que desprezando o
direto de propriedade, considerado elitizado e insuficiente. Neste capítulo
apontam-se as teorias que embasaram o conceito de posse e sua repercussão
no Código Civil e a proteção possessória garantidas pela nossa Constituição
Federal.
Por fim, expõe sobre o princípio constitucional da função social da
propriedade, fazendo um paralelo entre sua compreensão enquanto direito
fundamental e princípio da ordem econômica, sedimentando sua aplicação em
relação à propriedade urbana e à rural.
Com essa finalidade, o presente trabalho monográfico é um estudo
descritivo analítico com pesquisa bibliográfica de autores como José Joaquim
Gomes Canotilho, Friedrich Engels, Eros Roberto Grau, Gilmar Ferreira
Mendes, dentre outros; e pesquisa documental, através de leis. É uma
pesquisa pura e qualitativa, sendo também descritiva, exploratória e explicativa.
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CAPÍTULO 1 A PROPRIEDADE
1.1) A Evolução Histórica da Concepção de Propriedade
Nos primórdios da história inexistia a noção de propriedade privada,
até por desnecessidade, ante a vasta dimensão de terra e sua pouca utilização
como principio de riqueza. A terra era coletiva, pertencendo a todos. Havia, na
verdade, a ocupação com o fim de subsistência e sobrevivência.
Engels (1982) explica que nas sociedades primitivas as relações de
parentesco eram coletivas, assim como a apropriação da terra, já que todos
permaneciam no mesmo núcleo familiar. Entretanto, no decorrer da história, o
lar passou a ter uma concepção privada, a propriedade foi delimitada e
surgiram direitos relacionados à sucessão patrimonial.
Com o passar do tempo e a evolução da sociedade humana, o que
era coletivo por desnecessidade de acumulação de riqueza virou privado e a
singularização da propriedade alcançou seu apogeu na clássica visão do direito
romano, ao qual era dado ao proprietário o direito de usar, fruir e dispor da
coisa, havendo o caráter absoluto, exclusivo e perpétuo sobre o bem que
detinha, respeitando pequenas limitações ante o confronto com outras
propriedades.
A propriedade com o cunho personalíssimo e individualista começou
a criar mecanismos de defesa a partir da Lei das XII Tábuas, o que fez
arrefecer a concepção de caráter absoluto do direito de propriedade, impondo
um primeiro limite ao direito de propriedade, o Legal, a propriedade deveria ser
usufruída por razões legais, surgiram nesta época às primeiras leis sobre
vizinhança e condomínio.
Contudo, para o direito romano, a propriedade era considerada como
um direito absoluto, permanente e exclusivo de seu titular, que poderia dela
dispor com plenitude.
Segundo Wald (2009) o direito romano distinguiu três espécies de
propriedades, quais sejam a quiritária, a pretoriana ou bonitária e a provincial.
Diz o autor:
11
A primeira recaía sobre os bens imóveis situados em solo itálico cujos titulares fossem cidadãos romanos. Transmitia-se por atos solenes, como mancipatio e a in iure cessio, e correspondia a uma espécie de soberania territorial, constituindo uma esfera jurídica fechada denominada pelo pater familias, cuja autoridade inicialmente não sofria restrições. A ordem jurídica do Estado não penetrava no limites do domus, gozando a propriedade quiritária inclusive de imunidade fiscal, pois a cobrança do imposto seria uma diminuição à onipotência do chefe de família. O pater exercia então um poder político e jurisdicional, e, naquela fase, o direito romano ainda não distinguia entre direitos civis e direitos políticos, estando a autoridade do pai identificada com a propriedade dos bens da família. (...) Mas, como existiam coisas que não eram res mancipi, e, por outro lado, certos bens mancipi eram, em determinadas ocasiões, transferidos a terceiros de boa-fé, se a observância das solenidades necessárias, os pretores sentiram a necessidade de conceder uma proteção especial àqueles que, embora não sendo titulares do dominium ex iure quiritium, estavam na situação de verdadeiros proprietários. Surgiram assim as legis actiones, criadas pelos pretores em favor dos proprietários de coisas não mancipi ou então de coisas mancipi não transferidas com as solenidades necessárias. Essa nova propriedade, cujos fundamentos encontram-se na equidade aplicada pelos magistrados, denominou-se pretoriana ou bonitária. (WALD, 2009, p.124, 125)
Na Idade Média a propriedade sobre terras teve papel de destaque.
Nessa época, auge dos feudos, a propriedade antes privada passou para uma
titularidade concorrente: senhor feudal e vassalo. O território era sinônimo de
poder. Os vassalos serviam ao senhor. O senhor feudal concedia o direito de
utilização econômica do bem e recebia prestação de serviços, inclusive
militares. Para Miranda (2005), a relação feudal era um vínculo pessoal e
vitalício fundado na dominação de quem detinha a terra sobre a subordinação
de quem dela necessitava.
Ao fazer um comparativo entre sistema feudal e o Direito Romano,
pode-se observar que, enquanto neste, o homem era o proprietário absoluto da
terra, naquele a terra se apropriou do homem, já que os servos eram meros
acessórios quando a terra era vendida. Essa referência com a propriedade
permaneceu até o surgimento de novos meios de produção de bens, da divisão
do trabalho, da produção massificada, do aumento do comércio em distintas
regiões e da formação de cidades, gerando a base econômica do capitalismo,
12 com o qual a terra deixou de ser o principal, e praticamente único, meio de
dominação e status social.
A Revolução Industrial seguida da cultural determinou a reordenação
do alcance do caráter ilimitado do direito de propriedade. Novas ideologias
surgiram a partir da segunda metade do século XIX, propiciando uma nova
ótica a esse direito, partindo-se do ângulo de visão de novos matizes político-
econômicos.
A Revolução Francesa não alterou a concepção filosófica da
propriedade advinda do direito romano, mudando apenas o titular deste direito
da nobreza e do clero para burguesia (MIRANDA, 2005).
Nesta fase da história além das características estruturais da
propriedade, Alvim (2000) reconhece a existência da função social ainda no
século XIX, considerando um equívoco negar tal fato:
Mas, de qualquer maneira, nós podemos dizer que a marca da função social do século XIX, em relação ao direito de propriedade era de que a propriedade se mostrava como uma espécie de garantia da liberdade, ou mesmo uma condição da própria liberdade (Alvim, 2000, p.129)
Na terceira fase do Estado Moderno nos séculos XIX e XX
vislumbra-se, o Estado Social ou a social-democracia, na qual o mínimo
existencial, como saúde e educação deveriam ser garantidos por um Estado
intervencionista.
Os movimentos de insatisfação e os distúrbios sociais populares
compeliam a sociedade a perceber que o conceito de propriedade deixou de ter
o caráter privatista e passou a ser concebido de forma mais abrangente. Este
rever da concepção veio a modificar o sentido de que a propriedade, mesmo
privada, deveria ter como foco sua adequada utilização, quando não, deveria
servir ao bem comum, numa dimensão bem mais avançada.
Como se percebe, o encaminhamento dado ao direito de propriedade
passou a ter outro rumo. Muitos pensadores passaram a defender a idéia de
que a propriedade privada deveria vestir um papel social, distanciando-se da
velha concepção individualista. Todas as idéias partiam da concepção de que o
proprietário não é um titular de um direito subjetivo, mas apenas o detentor da
13 riqueza, mero administrador da coisa que deveria ser socialmente útil. (LEVY,
1973, p.125)
Os pensamentos antiliberais e os Estados totalitários começaram a
surgir com a crise do Estado Liberal e a I Guerra Mundial e suas práticas
reprimiam as liberdades individuais. Muitos anos após a II Guerra Mundial,
devidos aos vastos relatos de violação dos direitos humanos na grande guerra
foi elaborada em 1945 pelas Nações Unidas a Declaração Universal de Direitos
do Homem considerada como a um dos mais importantes documentos da
história dos direitos humanos e contempladora do direito à propriedade em seu
artigo 17: “ I) Todo o homem tem direito à propriedade, só ou em sociedade com
outros. II) Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade”.
Muitas foram as Constituições que incorporaram os direitos sociais
em seu texto, a exemplo da Constituição Mexicana de 1917 e da Constituição
de Weimar de 1919, consideradas marcos na elevação da teoria da função
social da propriedade à categoria de princípio jurídico constitucional. As duas
cartas políticas consagraram que a propriedade deve satisfazer ao bem da
coletividade, tendo influenciado fortemente a Constituição brasileira de 1934.
No Brasil, o direito de propriedade tornou-se relevante a partir da
Constituição Federal de 1934, avançando na interpretação doutrinária e
jurisprudencial e nas leis infraconstitucionais, como o Estatuto da Terra, até
chegar à concepção de propriedade disposta na Carta Política de 1988 e no
Código Civil de 2002.
1.2 O Direito de Propriedade nas Constituições Brasileiras
Do período do Império até a República Federativa do Brasil o país
passou por diversas mudanças nos aspectos políticos, sociais e econômicos,
que refletiram nas Constituições. A primeira Constituição foi à monárquica de
1824, outorgada pelo Imperador D. Pedro I, de conteúdo liberal, marcado pelo
individualismo. Abordava-se de constitucionalismo, em contraponto ao
absolutismo e lutava se na época pelo compromisso com os direitos e
liberdades fundamentais, a exemplo do panorama político europeu.
O Estado brasileiro era unitário, caracterizado pela centralização
político-administrativa, e dividido em províncias. E, em confronto com os
14 princípios liberais e democráticos, a separação de poderes era marcada pela
presença do Poder Moderador, privativo de D. Pedro I, que tinha a prerrogativa
de controlar a organização política do Império do Brasil, enfatizando seu
caráter centralizador e autoritário. Neste contexto, a Constituição do Império
garantia o direito de propriedade, em toda sua plenitude, todavia não
mencionava sua função social.
No mesmo passo da declaração da República, em 15 de novembro
de 1889, veio à primeira Constituição republicana, de 1891 tornando os direitos
e garantias individuais, como pilares do Estado Liberal. Essa Carta Política
dispunha na seção reservada à declaração de direitos, além do direito à
propriedade, a desapropriação por utilidade pública, em conjunto com a prévia
e justa indenização.
Apesar de se distanciar-se da realidade brasileira, a Constituição de
1891 perdurou por muitos anos, sendo abolida somente com a Revolução de
1930.
Os brasileiros viram-se contemplados com a proteção constitucional
que a Constituição de 1934 dava aos interesses da coletividade, positivando os
direitos sociais como característica marcante do Estado Social.
A Constituição de 1934 determinava em seu art. 113, item 17 a
garantia ao direito de propriedade, “que não poderá ser exercido contra o
interesse social ou coletivo, na forma que a lei determinar”. Estabelecendo os
institutos da desapropriação por necessidade, utilidade pública ou por
requisição administrativa, limitações ao direito de propriedade em prol do
interesse público.
Após o golpe de Estado de Getúlio Vargas e a instituição do Estado
Novo, em 1937 foi outorgada uma nova carta política, dessa vez de caráter
ditatorial. A Constituição de 1937, também conhecida como “Constituição do
Estado Novo” ou “Constituição Polaca”, foi marcada pela forte concentração de
poderes no Presidente da República e pela restrição aos direitos e garantias
fundamentais, previu o direito à propriedade e a “desapropriação por
necessidade ou utilidade pública, mediante indenização prévia” (art. 122, 14).
Em um momento seguinte, consagrando o fim do Estado Novo e a
derrubada de Getúlio Vargas, houve o resgate da linha política da democracia
15 social, outorgou-se a Carta Magna de 1946, que segundo Mendes (2008,
p.173) diferentemente do que ocorrera na elaboração das Cartas Políticas de
1824, 1891 e 1934 não partiu de um anteprojeto vindo de fora, preferindo os
seus responsáveis formar uma “Grande Comissão”, que adotou como texto-
base a Constituição de 1934 . Foi, assim, uma síntese de experiências do
Brasil, com os aspectos político-representativos de 1891 e sociais de 1934.
Na Constituição de 1946 no capítulo reservado aos direitos e
garantias individuais, contemplou o direito de propriedade e notadamente a
desapropriação por interesse social, como vemos a seguir:
Art. 141 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 16 - É garantido o direito de propriedade, salvo o caso de desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro. Em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina, as autoridades competentes poderão usar da propriedade particular, se assim o exigir o bem público, ficando, todavia, assegurado o direito a indenização ulterior. § 17 - Os inventos industriais pertencem aos seus autores, aos quais a lei garantirá privilégio temporário ou, se a vulgarização convier à coletividade, concederá justo prêmio. § 18 - É assegurada a propriedade das marcas de indústria e comércio, bem como a exclusividade do uso do nome comercial. § 19 - Aos autores de obras literárias artísticas ou científicas pertence o direito exclusivo de reproduzi-las. Os herdeiros dos autores gozarão desse direito pelo tempo que a lei fixar. (Constituição brasileira de 1946).
Declarou, ainda, de forma explícita, que o uso da propriedade estaria
condicionado ao bem-estar social e que à lei caberia a regulamentação da
promoção da “justa distribuição da propriedade, com igual oportunidade para
todos” (art. 147). Com efeito, ao período compreendido entre 1930 e 1964 deu-
se o nome de “populismo”, devido à sua preocupação com o Estado Social.
Caminhando na linha do tempo chegamos a Emenda de 1961, o
golpe militar de 1964 que acabou com o multipartidarismo e levou à
promulgação Carta Política de 1967, numa forma ditatorial e autoritária. Esta
Carta, apesar de ter reduzido os seus direitos individuais, garantiu o direito à
propriedade e dispôs, em seu art. 150, caput e §22, a desapropriação por
16 necessidade ou utilidade pública ou por interesse social e sobre a requisição
administrativa.
Tornou-se um marco ao contemplar de forma explícita a função
social da propriedade no título reservado à ordem econômica e social.
Art. 157 - A ordem econômica tem por fim realizar a justiça social, com base nos seguintes princípios: (...) III - função social da propriedade; §1º - Para os fins previstos neste artigo a União poderá promover a desapropriação da propriedade territorial rural, mediante pagamento de justa indenização, fixada segundo os critérios que a lei estabelecer, em títulos especiais da dívida pública, com cláusula de exata, correção monetária, resgatáveis no prazo máximo de vinte anos, em parcelas anuais sucessivas, assegurada a sua aceitação, a qualquer tempo, como meio de pagamento de até cinqüenta por cento do imposto territorial rural e como pagamento do preço de terras públicas. (Constituição brasileira de 1967)
Após vários atos institucionais, em especial os atos no. 5 e 16, os
Ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar, editaram
a Emenda n. 1 à Constituição de 1967, em 1969, que vigorou até a
promulgação da Constituição de 1988.
A nova Assembléia Nacional Constituinte, soberana, concebeu a
Carta Política que vigora atualmente, consolidada pelas noções de Estado
Democrático de Direito e de dignidade da pessoa humana.
1.3) A Propriedade a Luz da Constituição Federal de 1988 e do
Código Civil
A propriedade no Brasil decorre da implantação do sistema de
capitanias hereditárias por Pedro Álvares Cabral, logo em seguida a
colonização portuguesa. Com efeito, o Brasil foi dividido em lotes, mais
especificamente, em 15 lotes doados gratuitamente a grandes nomes da
época, sob a responsabilidade de cultivar e desbravar a terra doada, bem como
de pagar tributos à Coroa portuguesa.
Assim, o regime de sesmarias, que perdurou até a adoção da Lei de
Terras, gerou como resultado inúmeros latifúndios e a ocupação desordenada
de terras no país. Com a Lei de Terras (Lei nº 601/1850), por sua vez, a mera
posse como forma de obtenção da terra foi proibida e para adquiri-la
17 legalmente era necessário a compra formalmente registrada. Findou-se, assim,
a posse pelo trabalho e cultivo da terra, legitimando a propriedade pela
apresentação de documento hábil a comprová-la. Culminando com a abolição
da escravatura e o plantio do café no Brasil, a propriedade imóvel rural se
transforma no principal capital do século XIX, concentrada nas mãos da
burguesia, que podia pagá-la, e excluída da massa populacional, menos
afortunada e compelida, assim, a continuar nela trabalhando.
O Código Civil de 1916 foi concebido neste contexto e tinha caráter
individualista e conservador que corroborou não a concepção de propriedade
em si, mas dos direitos do proprietário, em seu art. 524, assegurando a este “o
direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-lo do poder de quem
quer que injustamente os possua”. Ou seja, consagrou o direito subjetivo do
proprietário de usar, gozar e dispor de seus bens, no plano interno, e, no plano
externo, a prerrogativa de tutela da propriedade contra agressões injustas
alheias.
Em sentindo contrário ao Código Civil de 1916, o Estatuto da Terra,
Lei 4.504/1964, se aproximou do disposto na Constituição Federal de 1967, ao
funcionalizar a propriedade, determinando que toda a terra ser tinha que ser
produtiva, sob risco de penalidade ao proprietário com a perda da terra.
Já o Código Civil de 2002, seguindo o caminho da Constituição
Federal de 1988, prevê expressamente a funcionalização da propriedade,
abandonado o caráter individualista e absoluto tão presente no Código anterior,
apesar de presumi-la plena e exclusiva, até prova em contrário. Assim, dispõe
o artigo 1.228:
O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. §1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com suas finalidades econômicas, sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. (Código Civil, 2002, p.251)
Para Gilmar Mendes (2008), o direito de propriedade, ao contrário do
direito à vida ou à liberdade de ir e vir, por exemplo, não pertence à natureza
18 do ser humano, tendo na ordem jurídica a instituição direta e expressa do seu
âmbito de proteção, à lei não cabe restringi-lo, ou mesmo, regulamentá-lo, mas
apenas dotá-lo de conteúdo, de essência.
A estrutura do direito de propriedade, como visto, é compreendida a
partir das faculdades legais conferidas ao proprietário, tendo à doutrina
demonstrada a amplitude da consideração desses elementos. Exemplo dessa
amplitude pode ser notada quando a doutrina expõe que o direito de usar
importa também no não usar, bem como o dispor pode significar destruir. Neste
sentido, consigna Diniz ( 2001):
Direito de usar - ius utendi. Consiste na faculdade de colocar a coisa a serviço do seu titular, sem modificação na sua substância. O dono a emprega no seu próprio benefício, ou no de terceiro. Serve-se da coisa. Mas é claro que também pode deixar de usá-la, guardando-a ou mantendo-a inerte. O direito de usar da coisa é o de tirar dela todos os serviços que ela pode prestar, sem que haja modificação em sua substância. O titular do jus utendi pode empregá-lo em seu próprio proveito ou no de terceiro, bem como deixar de utilizá-lo, guardando-o ou mantendo-o inerte. O jus abutendi ou disponendi equivale ao direito de dispor da coisa ou do poder de aliená-la a título oneroso (venda) ou gratuito (doação), abrangendo o poder de consumi-la e o poder de gravá-la de ônus (penhor, hipoteca, servidão etc) ou de submetê-la ao serviço de outrem. (...) Sugestivos e esclarecedores são os exemplos de Mourlon, de que usar de uma casa é habitá-la, dela gozar, alugá-la e dela dispor: demoli-la ou vendê-la; usar de um quadro é utilizá-lo na decoração de uma casa, dele gozar é exibi-lo numa exposição a troco de dinheiro e dele dispor é destruí-lo ou aliená-lo ou, ainda, doá-lo (DINIZ, 2001, p.107)
A Constituição Federal de 1988 contemplou o direito de propriedade
como direito fundamental (art. 5º, XXII), assim como a propriedade privada
como princípio da ordem econômica (art. 170, II). Os direitos fundamentais, a
exemplo do direito de propriedade, não são, assim, abstratos, mas pautados
em valores históricos, além dos fundamentos filosóficos e teóricos.
Os fatos sociais estão em constante evolução surgindo à
necessidade de compatibilizar as mudanças ocorridas no bojo da sociedade ao
texto constitucional, evitando o engessamento da própria Constituição. Desta
forma, verifica-se que o conceito constitucional de propriedade não é fixo,
imutável, não é estático, mas sim dinâmico, sendo que “a garantia
19 constitucional da propriedade está submetida a um intenso processo de
relativização, sendo interpretada, fundamentalmente, de acordo com
parâmetros fixados pela legislação ordinária” (MENDES, 2008, p. 439), em
consonância, claro, com os princípios constitucionais.
1.4) Princípio da Propriedade Privada
A Constituição em vigor, além de garantir a inviolabilidade da
propriedade, elencou a propriedade privada como um princípio que norteia a
atividade econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, cujo objetivo é assegurar a todos existência digna.
Tal previsão Constitucional, busca realizar os objetivos mediante o
equilíbrio do sistema econômico especialmente entre o modo capitalista
adotado, amparado na apropriação privada dos meios de produção e preceitos
voltados para uma socialização que garanta dignidade a todos e justiça social.
Ao reconhecer a propriedade privada como um princípio da ordem
econômica, a Constituição adotou um sistema econômico fundado na iniciativa
privada, sendo a propriedade importante instrumento para atingir o fim
especificado na Carta, qual seja: o de assegurar a todos a existência digna,
conforme os ditames da justiça social. Destaca se que, ao servir a tais
propósitos econômicos, a propriedade privada deve perder seu sentido
puramente individual, especialmente diante do princípio da função social
também arrolado como princípio da atividade econômica pela Carta Magna
devendo ser relativizado o conceito e significado de propriedade para cumprir
tal vocação, assumindo o papel de instituto típico da ordem econômica (SILVA,
2006, p. 271 e 812)
A teoria civilista do direito de propriedade não mudou em face da
nova postura constitucional. O que mudou foi à interpretação dada à
propriedade privada diante dos novos rumos conotados pela Constituição
Federal.
É de se observar que o assento constitucional determinou novos
rumos e amplitudes à teoria puramente civilista a respeito do direito de
propriedade, uma vez que distendeu consideráveis limitações à utilização da
propriedade como um todo.
20
Observa – se que a propriedade é, em regra, privada, ou seja, não é
pública, então aponta a própria Carta Magna, excepcionalmente, quais as
hipóteses de bens públicos - ou de possibilidade de aquisição.
E a Constituição em vigor assim procede quando consigna, em seu
art. 20, que são bens da União:
I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos; II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei; III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais; IV - as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II; V - os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva; VII – os terrenos de marinha e seus acrescidos; VIII - os potenciais de energia hidráulica; IX – os recursos minerais, inclusive os do subsolo; X - as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos; e XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios (BRASIL, Constituição Federal, 1988, p.19)
Por outro lado, a Constituição Federal elenca hipóteses de
intervenção pública na propriedade privada, tal como ocorre, com a
desapropriação, prevista no inciso XXIV, do art. 5º, que dispõe: “a lei
estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade
pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em
dinheiro, ressalvada os casos previstos nesta Constituição” (BRASIL,
Constituição Federal, 1988, p.10)
A Constituição prevê também a chamada “desapropriação-sanção”
na hipótese de descumprimento da função social da propriedade urbana, onde
é permitido ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área
incluída no plano diretor, determinar que nos termos da lei federal, o
proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado,
promova seu adequado aproveitamento.
21
No caso de descumprimento da função social da propriedade rural,
prevê a Carta Magna a possibilidade de desapropriação-sanção, pela União e
por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja
cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da
dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo
de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização
será definida em lei (art. 186).
Analisa-se, também, a hipótese de intervenção pública na
propriedade prevista que prescreve que as glebas de qualquer região do País
onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas serão
imediatamente expropriadas e especificamente destinadas ao assentamento de
colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos, sem
qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções
previstas em lei.
Ainda podem ser citadas as hipóteses de intervenção pública na
propriedade privada, prevista no art. 5º, XXV, de requisição no caso de
iminente perigo público, tendo a Constituição permitido o uso de propriedade
particular pela autoridade competente, assegurada ao proprietário indenização
ulterior, se houver dano (Brasil, Constituição (1988), 2007, p. 8)
Todo o exposto demonstra a importância e o prestígio concedido
pela Constituição à propriedade privada, instrumento para a concretização dos
objetivos sociais e econômicos, além da especial proteção perante a
Administração Pública, sem desmerecer a propriedade pública - também
amparada pela cláusula geral de inviolabilidade (art. 5º, caput e incisos XXII e
LIV) - e, mesmo que excepcionalmente, as hipóteses de intervenção pública
voltadas para a satisfação de necessidades ou utilidades públicas, bem como
do interesse social.
1.5) Função Social da Propriedade
Destarte, tem-se que não mudou a teoria civilista a respeito da
propriedade. O que ocorreu foi à mudança provinda da interpretação dessa
teoria diante da nova concepção socializante descortinada na Constituição
Federal, que é mais um lenitivo para se atingir uma sociedade mais equilibrada
22 econômica e socialmente. É a supremacia do interesse público perante o
privado. É a publicização do direito privado, ou seja, há uma mudança de
referencial. O direito de propriedade deixou de ser visto pelo ângulo do direito
individual para ser inserido no contexto de coletividade.
Esta nova visão do direito de propriedade foi impelida pela
necessidade de garantir interesses sociais relevantes, pois a anterior ficou
dissonante com esta nova visão da realidade vivida. Com efeito, não bastasse
toda ordem de mudanças ocorridas no cenário político mundial no final século
XIX e início do século XX, viu-se que o êxodo rural, a industrialização e o
conseqüente aumento da população nas cidades resultaram numa conturbada
convivência e numa irascível discrepância social.
Problemas antes não vistos e não conhecidos são hoje aparentes e
quando tomados em conta, propiciam novos conceitos para o Direito.
Percebe-se que a modificação é essencialmente de função, mas a
inserção de interesses sociais no elemento funcional gera, por via reflexa, uma
remodelação da estrutura do direito de propriedade. A propriedade passa a ser
vista não mais como direito absoluto ou "poder inviolável e sagrado" do
proprietário, mas como situação jurídica subjetiva complexa em que se inserem
direitos, deveres, ônus, obrigações (TEPEDINO, 1999, p.279)
A função social da propriedade foi estabelecida como garantia
fundamental e como princípio de ordem econômica, também servindo de manto
para a nova redação do art. 1.228 do Código Civil de 2002.
Com o advento da nova ordem constitucional observou-se que a
propriedade privada restou mais uma vez garantida, mas, ao seu lado, quer
como cláusula pétrea ou como princípio da ordem econômica, o constituinte fez
inserir que ela deva cumprir sua função social.
A propriedade está condicionada a sua função social, logo o
pressuposto para a tutela do direito de propriedade é justamente o
cumprimento da função social. O descumprimento desse requisito da função
social da propriedade leva à perda da proteção constitucional.
Desse modo, no sistema jurídico-constitucional brasileiro, a
propriedade dotada de função social legitima-se pela função.
23
Nesse ambiente social, a Constituição de 1988 avançou quanto ao
aspecto funcional da propriedade, tratando do assunto em momentos distintos
e de forma estruturada. Inicialmente, a Constituição prescreveu em seu art. 5º,
inc. XXIII, ou seja, dentre os direitos e garantias fundamentais, que a
propriedade deve cumprir sua função social.
Posteriormente, consigna no inc. III, do art. 170, a função social da
propriedade dentre os princípios gerais da atividade econômica. Em seguida,
regulamenta o cumprimento da função social da propriedade urbana ou rural
nos artigos 182, 184 e 186, prevendo, inclusive, sanções para o caso de
descumprimento do comando constitucional.
Como visto, após garantir a inviolabilidade do direito individual e
fundamental de propriedade (art. 5º, caput e inc. XXII), a Constituição consigna
a necessidade de a propriedade atender a uma função social (art. 5º, inc.
XXIII). Tal previsão, mesmo diante de uma visão mais restritiva decorrente da
rigidez do regime jurídico pertinente ao direito de propriedade, indica que o
referido direito, apesar de inviolável, está suscetível de delimitações
decorrentes dos princípios da ordem econômica (art. 170) e das políticas
urbanas (art. 182) e fundiárias (art. 184 e seguintes), de forma a compatibilizar
a amplitude das faculdades inerentes ao direito às balizas ou moldes ditados
pela própria constituição, sempre visando “assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social”, bem como a operacionalização do
desenvolvimento urbano,fundiário e da reforma agrária (BRASIL, Constituição
Federal, 1988.p. 89)
Quanto aos imóveis urbanos, a Carta Magna traçou o contorno do
que seria a função social da propriedade, consignando que a função social da
propriedade é atendimento das exigências fundamentais de ordenação da
cidade expressas no Plano Diretor Urbano, obrigatório para as cidades com
mais de vinte mil habitantes.
A Constituição dispôs, ainda, que a política de desenvolvimento
urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais
fixadas em lei (Lei Federal - Estatuto da Cidade) têm por objetivo ordenar o
pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de
seus habitantes.
24
A função social da propriedade rural, por sua vez, segundo a
Constituição Federal de 1988, segue critérios e graus de exigência
estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I) aproveitamento racional e
adequado II) utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e
preservação do meio ambiente III) observância das disposições que regulam as
relações de trabalho e IV) exploração que favoreça o bem-estar dos
proprietários e dos trabalhadores.
Ao assim dispor, a Constituição identifica o que é função social sob
uma ótica que exige intervenção pública, seja para fixar, por meio da lei
municipal ou federal, a exata compreensão do aspecto funcional, seja
outorgando poderes e deveres aos entes públicos para coagirem o
cumprimento do propósito constitucional. Conseqüentemente, mesmo tendo a
Constituição garantida à inviolabilidade do direito individual de propriedade,
prevendo que esta, em regra, é privada, deve esta mesma propriedade, por
força da mesma Constituição, servir à sua função social, segundo os moldes
legalmente previstos, atendendo à realidade social.
Esclareça-se que funcionalizar a propriedade ao atendimento de
interesses sociais não significa, de modo algum, propor o aniquilamento dos
direitos individuais ou pregar a negação da propriedade privada. Muito pelo
contrário. A função social, impondo ao proprietário a observância de
determinados valores sociais, legitima a propriedade capitalista e a
compatibiliza com a democracia social que caracteriza os sistemas políticos
contemporâneos. O proprietário permanece como beneficiário imediato, e
quase sempre predominante, do domínio; apenas se impõe a ele que exerça o
seu direito atendendo também aos interesses sociais. A propriedade se
mantém privada, mas se afasta da definição individualista de "poder absoluto
do proprietário" para buscar na conformação ao interesse social a sua
legitimação, a razão e o fundamento de sua proteção jurídica. Nessa nova
concepção, a propriedade passa a ser tutelada apenas na medida em que
observe os interesses sociais relevantes. A conduta do proprietário e a tutela
dos seus interesses passam a estar condicionadas ao atendimento da função
social da propriedade. Não se oprime o indivíduo, mas se exige dele alguma
atenção aos anseios mais graves do organismo social em que se insere.
25
O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, apesar de prestigiar o
princípio da função social da propriedade, salienta, contudo, a necessidade de
observância dos limites, formas e procedimentos fixados pela própria
Constituição, confirmando que eventual condicionamento para a proteção do
direito fundamental de propriedade deve ter como parâmetro as próprias
disposições da Carta Magna.
A jurisprudência dos Tribunais, de igual forma, sinaliza pela
necessidade de cautela na aplicação imediata do princípio da função social,
especialmente como condicionante para o deferimento de proteção
possessória ou da propriedade.
Salienta-se, ainda, que a importância dada à propriedade e sua
destinação social foi de tal magnitude que o constituinte fez inseri-la como
princípio da atividade econômica, no capítulo que trata sobre a ordem
econômica e financeira, garantindo a todos a existência digna, conforme os
ditames da justiça social (CF, 1988, art.170, incs. II e III).
A teoria civilista do direito de propriedade não mudou em face da
nova postura constitucional. O que mudou foi à interpretação dada à
propriedade privada diante dos novos rumos conotados pela Constituição
Federal.
No próximo capítulo tratarei da posse em alguns de seus aspectos,
pois exercer faticamente alguma ação sobre a propriedade nada mais é do que
o próprio conceito de posse. Logo, a função social da propriedade é a própria
posse como o fato socialmente relevante exercido sobre a propriedade não
mais limitando a posse à inócua e socialmente irrelevante colocação de uma
cerca em um solo urbano e rural a posse juridicamente relevante é aquela que
se caracteriza pelo exercício fático de atividade socialmente relevante.
26
CAPÍTULO II
POSSE
2.1) Teorias possessórias
O estudo da posse esta impregnado de questões relevantes
relacionadas à exata compreensão do instituto e do seu regime jurídico. Sua
explicação, inclusive, é fruto da demonstração de como a posse se apresenta
no mundo dos fatos ou quais são os fatos que mereceram proteção no direito.
Merece destaque às duas principais teorias sobre a posse que
orientaram a maioria dos diplomas civis em vigor na atualidade, conhecidas
como subjetiva e objetiva, de Friedrich Carl Von Savigny e Rudolf Von Ihering,
respectivamente.
Não há consenso sobre a verdadeira definição posse. Contudo, as
duas teorias buscam explicar o fenômeno possessório por meio da análise de
sua estrutura, mas especificamente, por meio dos seus dois elementos
fundamentais: o corpus e o animus. Tendo a teoria subjetiva prestigiado o
animus, enquanto a teoria objetiva segunda prestigiou o corpus.
A explicação das duas teorias ocorre no sentido de que, para
Savigny o corpus não é como pretendiam os jurisconsultos romanos, o contato
material com a coisa, nem são os atos simbólicos que, graças a uma ficção
jurídica, representam esse contato, mas, sim, a possibilidade real e imediata de
dispor fisicamente da coisa, e de defendê-la contra agressões de terceiro. Já o
animus que caracteriza a posse é o animus domini (a intenção de ter a coisa
como se fosse proprietário dela), que não se confunde com a crença de ser,
realmente, o proprietário da coisa possuída. Portanto, o que distingue a posse
da detenção é a circunstância de que, na posse, mister se faz a existência do
animus domini. (ALVES, 1999, p.212)
Por outro lado Ihering (2005, p. 49,50) considera a posse a
exteriorização da propriedade, razão pela qual a proteção da posse equivale,
em quase sua totalidade, à proteção da propriedade sendo a posse a
exteriorização ou a visibilidade da propriedade, o critério para a verificação de
sua existência é a maneira pela qual o proprietário exerce, de fato, sua
27 propriedade, o que implica dizer que o corpus é a relação de fato entre a
pessoa e a coisa de acordo com a sua destinação econômica, é o
procedimento do possuidor, com referência à coisa possuída, igual ao que teria
normalmente o titular do Domínio. Além disso, quanto ao elemento subjetivo,
Ihering nega a qualificação do animus como sendo o que distingue posse de
detenção, entendendo que tal distinção é legal, ou seja, objetiva. (ALVES,
1999, p.222, 223).
A distinção entre as teorias objetiva e subjetiva, decorre da
compreensão dos elementos estruturais da posse, tendo Savigny proposto uma
explicação dando mais valor à pessoa do possuidor, enquanto Ihering propõe
sua teoria dando maior valor ao elemento físico, sem ter que se indagar a
vontade de que exerce a posse.
Segundo Gomes (2006) Savigny conceitua posse como a soma de
corpus, assim entendido como sendo a possibilidade de apreensão física da
coisa e de proteção contra a ingerência de terceiros e animus qualificado pela
vontade de ser dono negando tal direito a outrem, sendo que a presença de
apenas um destes elementos é incapaz de tipificar posse, mas apenas, a
detenção. (GOMES, 2006, p.32).
Para Ihering, a posse é a conjugação dos dois elementos, mas não
da maneira compreendida por Savigny, não apenas porque o elemento do
animus já está implícito no elemento material, mas também porque o corpus
não exige o contato físico e imediato, mas apenas, a possibilidade deste
contato sendo a forma de utilização normal das coisas. O corpus, em seu ver,
decorre do uso segundo o seu valor econômico, ou seja, os propósitos pelos
quais a coisa existe. A posse é como exteriorização do domínio, é uma forma
de proteção da propriedade, entende o autor que a análise do proveito
econômico da coisa deve levar em consideração a forma como o proprietário
age com relação às estas coisas, nada mais. E para explicar a existência de
situações fáticas, nas quais, apesar de identificarem a situação possessória, o
direito romano não outorgava proteção, consignava o autor que se tratava de
uma opção legislativa, ou seja, a mesma lei que concede a proteção para uma
determinada situação pode afastar esta proteção para outra especial.
(IHERING, 2005, p.49)
28
As idéias expostas por Ihering (2005, p.50), utilizadas para justificar a
valorização do elemento corpóreo que exterioriza propriedade e a própria
proteção possessória, podem ser avaliadas nos dias atuais levando-se em
consideração o aspecto funcional, sofrendo, também, as mesmas delimitações
decorrentes da função social da propriedade, não com o propósito de criar uma
identidade para a posse, mas para compreender a sua evolução funcional,
prestigiada legalmente na atualidade.
Com a grande relevância concedida ao princípio da função social da
propriedade, a partir da Constituição de 1988, ganhou ênfase doutrinária as
chamadas teorias sociológicas da posse, que passaram a ser analisadas a pela
doutrina civil juntamente com as duas teorias clássicas de Savigny e Ihering.
Referidas teorias foram propostas por Silvio Perozzi, Raymond Sailelles e
Antonio Hernandez.
Sobre as duas primeiras teorias sociais, de Perozzi e de Saleilles,
salienta-se que ambos são historiadores, que desenvolveram uma
compreensão de posse a partir de uma hegemonia dos fatos sobre os
conceitos, e na relatividade dos próprios conceitos em função do seu específico
conteúdo. Ambos apresentam posições que tentam confrontar as teorias
clássicas de Savigny e Ihering (SOARES, 1996, p.96)
Ao explicar a primeira teoria, Soares (1996) diz que Perozzi analisou a
posse no direito romano como sendo um fenômeno social de gênese e
natureza consuetudinária, sendo um produto sociológico. Referida teoria, nas
palavras de Soares, pode ser assim descrita:
Esta natureza consuetudinária da posse desde logo influi na sua distinção relativamente à propriedade (pelo menos na distinção, para se não dizer na autonomia ou independência). Mas então ocorre perguntar como, para PEROZZI, diferem as duas categorias que vimos de referir, ambos os produtos sociológicos, manifestações da vida social. A propriedade depende social e juridicamente do estado enquanto com a posse isso de modo nenhum acontece. A propriedade existe porque o Estado quer: - ela tem a sua garantia existência no dever legal de abstenção imposto pela ordem jurídica a favor de um indivíduo. Ao contrário, a posse depende do fato da própria abstenção de terceiros, por estes costumeiramente observados. Apesar desta diferença fundamental, existe, todavia entre ambos os institutos um face de semelhança. PEROZZI surpreende naquilo que, como que sendo um domínio, a posse tem de ser social. Mas
29
não se pode deixar de reconhecer que, com a afirmação de uma tal analogia, desde logo se divisa uma frustração da autonomia possessória. Isto, não obstante a espécie de ‘propriedade’ que a posse seria: ‘A posse - escreveu o autor das Institutas de Direito Romano - assemelha-se à propriedade enquanto é em si mesma uma propriedade - precisamente uma propriedade social, um estado de liberdade de ação relativamente à coisa, vigorando por virtude de forças sociais (SOARES, 1996, p.96 e 98)
No que se refere à segunda, Sailelles também buscou afastar a
explicação da posse das teorias clássicas, porém, com “a conveniência de o
jurista, ao estudar uma instituição dos nossos dias, ter em consideração o
desenvolvimento que o precedeu” (SOARES, 1996, p.107)
Por fim, quanto à terceira teoria social proposta por Hernadez Gil, a
função social atua como pressuposto e como fim das instituições reguladas
pelo direito. Na sua doutrina, as grandes coordenadas da ação prática humana,
que são a necessidade e o trabalho, passam pela posse. Todavia, nem os
juristas nem os sociólogos se têm abalançado a dar uma significação
específica da posse. Surpreende que a posse, com tão forte conteúdo de fato,
isto é, de acontecer vital, se apresente como que resumida nos livros e nos
códigos. Ela tem sempre fundida as suas razões nas mais elementares
manifestações da convivência social e, contudo, não se retiraram disso as
indispensáveis conseqüências. Para Hernandez Gil, a posse, enquadrada na
estrutura e na função do Estado social com um programa de igualdade na
distribuição dos recursos coletivos, encontra-se chamada a desempenhar um
importante papel, sendo importante a colaboração de juristas e sociólogos para
a compreensão de sua teoria nos dias atuais.
De igual forma explica Fachin (1988) consignando que, para o
professor Hernández Gil, são três os planos de explicação da posse: 1-
Técnico jurídico: o fundament6o da concepção possessória se encontra no
exercício dos direitos, em particular dos direitos reais, estando, assim,
vinculada ao direito de propriedade; 2- Sociológico ou econômico-social; a
posse não é uma relação de Direito, e, em não sendo, a vontade do estado em
nada intervém para sua constituição. Desse modo, teria notório caráter de
espontaneidade, sendo um costume social ou uma propriedade social, ou uma
efetividade consciente e querida de apropriação econômica das coisas; 3-
30 Historicista, que trata da determinação da origem histórica da posse. (FACHIM,
1988, p.20,21).
Ressalta se que essas teorias chamadas sociológicas, além de
serem alvo de estudo pela doutrina na construção de uma compreensão do
aspecto funcional da posse, influenciaram também os representantes do Poder
Legislativo quanto à formulação de proposta para a alteração do conceito de
posse, em tramitação no Congresso Nacional.
2.2) Teoria da Posse a luz do Código Civil
O nosso Código Civil em vigor fez a opção por seguir a chamada
teoria objetiva de Ihering, conclusão extraída do conceito de posse positivado
no seu artigo 1.196 que “considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o
exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.”
(Código Civil, 2002, p.249)
Da redação do referido dispositivo, denota-se ser prescindível, para a
tipificação da posse, a investigação sobre qualquer ânimo daquele que se
encontra na situação descrita, sendo suficiente a análise objetiva do exercício,
pleno ou não, de algum dos poderes do proprietário. Assim, a materialidade da
posse é apurada, basicamente, mediante a verificação do corpus, segundo a
explicação de Ihering, lastreado na faculdade conferidas por lei ao proprietário
de usar, gozar, dispor e reaver a propriedade.
Vale ressaltar que a conclusão a de que o Código Civil brasileiro
adotou a teoria objetiva de Ihering decorre do fato de que não há no Título I, do
Livro III, do Código Civil, reservado exclusivamente à posse, qualquer menção
a elemento anímico para a configuração da posse, o que faz crer estar ele
implícito no corpus, tal como proposto por Ihering.
Ainda a amparar o entendimento manifestado, diz Ihering (que a
distinção entre posse e detenção decorre de uma desqualificação normativa, e
não da ausência de um animus qualificado (domini), tal como defendido por
Savigny
Desta forma nos artigos 1.198 e 1.208, são indicadas as hipóteses
de detenção existentes no ordenamento civil brasileiro:
31
Art. 1198. Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas. Parágrafo único. Aquele que começou a comportar-se do modo como prescreve este artigo, em relação ao bem e à outra pessoa, presume-se detentor, até que prove o contrário. Art. 1208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.
Como visto, descreve o artigo 1.198, do Código Civil, que é detentor
aquele manifesta faticamente uma relação de dependência com outra pessoa,
conservando a posse em nome deste último. Não houvesse tal previsão,
restaria configurada a posse em razão do fato do exercício, pleno ou não, de
umas das faculdades legalmente conferidas ao proprietário.
De igual modo está previsto no segundo artigo transcrito, que não há
posse na hipótese de esta à pessoa com uma coisa apenas por mera
permissão ou tolerância, atos considerado precários e insuficientes para
merecer a tutela possessória. Contudo, não houvesse tal previsão, haveria sim
posse, pela regra geral prevista no artigo 1.196, do Código Civil. O artigo diz
ainda que não há posse quando a coisa está sendo mantida por uma pessoa
mediante o emprego de violência ou no estado de clandestinidade, situação
fática que identificaria posse caso a sua tipificação não fosse degradas pelo
referido dispositivo (FREITAS, 2007, p.565)
Ressalta-se não há nestas situações fáticas consideradas detenção
qualquer referência legal à necessidade de se investigar o animus de que está
com a coisa, sendo a análise puramente objetiva e legal, o que, como visto,
também corrobora a conclusão de que o Código Civil segue a doutrina objetiva
de Ihering.
2.3) A posse no Código Civil
É importante reconhecer na relação entre a posse e a propriedade
um papel de realização ou concretização, no mundo dos fatos, das
expectativas individuais e sociais da comunidade, em qualquer época ou
localização. E para uma melhor compreensão da referida relação entre posse e
32 propriedade, torna-se oportuna a verificação do conceito jurídico e da
manifestação da posse no ordenamento brasileiro.
O conceito de posse no Código Civil brasileiro é claro e preciso,
sendo definido a partir de elementos fáticos e objetivos, tal como se observa do
disposto no artigo 1.196, sendo considerado o fato do exercício pleno ou não,
de um dos poderes do proprietário, que, nos termos do artigo 1.228 caput, são
os de usar, gozar, dispor e de reivindicar a coisa das mãos de quem
injustamente a possua ou detenha.
Assim, haverá posse quando algum dos poderes do proprietário
elencados no artigo1.228, caput, estiver sendo exercido, de forma plena ou
não, transparecendo,faticamente, o comportamento esperado por uma pessoa
comum quanto à coisa, sendo este o momento a partir do qual se verifica a
aquisição e manutenção da posse, bem como se compreende a sua perda.
O legislador cuida da posse e de sua classificação no capítulo inicial
do Livro III da Parte Especial do Código Civil, examinando os artigos é possível
separar as espécies de posse, distinguindo a posse direta, da indireta, a posse
justa, da injusta, a posse de boa-fé, da posse de má-fé.
Não obstante, para completar a classificação, fazem-se necessárias
mais duas distinções, que levando em consideração a idade da posse, temos a
distinção entre posse nova e posse velha, e com relação aos efeitos da posse,
temos a chamada posse “ad interdicta”, e a posse “ad usucapionem”.
2.3.1) Posse direta e indireta
O artigo 1197 do Código Civil conceitua a posse direta e indireta:
“A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto”.
A classificação da posse em direta e indireta tem por finalidade
determinar em relação às pessoas, a extensão da garantia possessória e suas
conseqüências jurídicas.
É indireta a posse quando o seu titular, afastando de si por sua
própria vontade a detenção da coisa, continua a exercê-lo mediatamente, após
haver transferido a outrem a posse direta.
33
Assim, são possuidores diretos, o credor pignoratício, o depositário, o
usufrutuário, o depositário, o comodatário, o locatário, pois todos detêm a coisa
que lhes foi transferida pelo dono, mas este, ao transferir a coisa, conservou a
posse indireta.
As posses diretas e indiretas coexistem, não colidem nem se
excluem. Ambas, mediatas e imediatas, são igualmente tuteladas, sendo lícito
ao terceiro oponente invocar em proveito próprio o desdobramento. Uma vez
que coexistem e não colidem, é lícito aos titulares defendê-la.
2.3.2) Composse
Dispõe o artigo 1.199 do Código Civil sobre a composse:
“Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma exercer sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros compossuidores” .
A composse ocorre quando, em virtude de contrato ou herança, duas
ou mais pessoas se tornam possuidoras do mesmo bem, embora, por quota
ideal, exercendo cada uma sua posse sem embaraçar a da outra; para que se
tenha a posse comum ou composse será mister a pluralidade de sujeitos e a
coisa ser indivisa.
Deste modo a composse pro diviso ocorre quando há uma divisão de
fato, embora não haja de direito, fazendo com que cada um dos
compossuidores já possua uma parte certa, se bem que o bem continua
indiviso.
Já a composse pro indiviso dá-se quando as pessoas que possuem
em conjunto o bem têm uma parte ideal apenas, sem saber qual a parcela que
compete a cada uma.
2.3.3) Posse justa e injusta
O Código Civil no seu artigo 1200 define como posse justa aquela não
for “violenta, clandestina ou precária”. (CÓDIGO CIVIL, 2002, artigo 1120, p.
249)
Conclui-se que é injusta a posse eivada de um desses três defeitos:
34
A Posse violenta é aquela conquistada através de força injusta, ou
seja, através do esbulho. Entretanto cessada a violência o vício convalesce e a
posse ganha juridicidade.
A Posse clandestina é a obtida como o próprio nome diz
clandestinamente, ou seja, às escondidas. Há também, neste caso, a
possibilidade da convalescença do vício, quando diante de posterior
publicidade da posse, com atos de construção, plantação, etc, o legítimo
proprietário nada faz deixando escoar mais de ano e dia.
A Posse precária é quando alguém recebe alguma coisa que deveria
devolvê-la, entretanto deixa de fazê-lo quando lhe é reclamado.
Nesta modalidade de espécie de vício da posse, não cabe a
convalescença devido ao fato que a precariedade jamais cessa, será, portanto
sempre viciosa.
São exemplos de situação que podem ensejar a posse precária, a
locação, o comodato e o usufruto.
Além da convalescença, a posse injusta pode tornar-se justa se o
possuidor que obteve o bem pela violência ou clandestinidade vier a comprá-lo
ou herdá-lo do desapossado.
Entretanto, se o adquirente a título clandestino ou violento provar que
tal situação cessou a mais de ano e dia, a sua posse passa a ser conhecida
conforme alude artigo 1.208 do Código Civil.
2.3.4) Posse de boa-fé e posse de má-fé
O artigo 1.201 no Código Civil define a posse de boa-fé:
“É de boa fé a posse, se o possuidor ignora o vício ou o obstáculo que a aquisição da coisa.” Parágrafo único. O possuidor com justo título tem por si a presunção de boa fé, salvo prova em contrário, ou quando a lei expressamente não admite esta presunção”.(CÓDIGO CIVIL, 2002, artigo 1201, p. 249)
35
É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo
que lhe impede a aquisição da coisa, ou do direito possuído. Para que alguém
seja possuidor de um bem, possuindo-o, a ninguém prejudica.
Será de má-fé quando o possuidor exerce a posse a despeito de
estar ciente de que é clandestina, precária, violenta, ou encontra outro
obstáculo jurídico à sua legitimidade.
Destarte, o que distingue uma posse da outra é a posição do
possuidor. Se o possuidor conhece a existência do vício, sua posse é de má-fé.
Se ignorar o vício que a macula, sua posse é de boa-fé.
2.3.5) Posse nova e posse velha
A posse nova é a que não atingiu um ano e dia, já a posse velha, já
transcorreu tal prazo.
A necessidade da ultrapassagem de ano e dia denota da
possibilidade de convalidação daquela posse viciosa. Além disso, a importância
da verificação deste prazo se dá porque diante da posse nova o titular do
direito pode utilizar-se do desforço imediato (CODIGO CIVIL, artigo 1210
parágrafo 1º, 2002, p. 250) ou obter a reintegração liminar em ação própria
(CPC, arts. 926 e s.). Entretanto, se velha for à posse o possuidor terá a
proteção dos interditos possessórios. (DINIZ, 2002, p.58).
2.3.6) Posse “ad interdicta” e posse “ad usucapionem”
A posse “ad interdicta” é a que pode amparar-se nos interditos,
quando esta for ameaçada, turbada, esbulhada ou perdida, desde que seja
uma posse justa. Entretanto, o possuidor injusto ou de má fé com relação a
determinado sujeito tem o direito de defender a posse, contra terceiros em
relação quais a exerce sem qualquer vício.
Ocorrerá a posse “ad usucapionem” quando ensejar a usucapião da
coisa, desde que obedecidos os requisitos legais. Assevere-se que com o
tempo que transcorre até que se adquira o direito da usucapião, e
conseqüentemente o domínio da coisa, não interessa mais que a posse tenha
sido viciosa.
36 2.4) Efeitos da Posse
São esses os efeitos da posse:
2.4.1) Dos frutos
Os frutos são acessórios da coisa principal, podendo por ela ser
produzidos periodicamente sem importa-lhe a perda da substância (frutos
propriamente ditos) ou utilidades retiradas da coisa com redução de sua
substância.
Quando o possuidor for simultaneamente proprietário, receberá o
direito aos frutos produzidos pela coisa por ser direito inerente a esta condição.
Contudo, quando tratar-se exclusivamente de possuidor, teremos de considerar
sua boa ou má-fé quando da utilização da coisa.
Portanto, aquele que atua de boa-fé jaz jus aos frutos que colheu ou
que estão armazenados, posto que fez a coisa produzir acreditando que ela era
sua , tendo feito-a produzir em razão disso. Já o possuidor de má-fé sabe que
a coisa não lhe pertence, tendo agindo maliciosamente e fazendo produzir
coisa que sabe que a outrem pertence. (CÓDIGO CIVIL, 2002, artigo1215,
p.250)
Quanto ao justo título é o instrumento que seria apto a transmitir o
domínio senão fosse eivado de alguma irregularidade. É instituto distinto da
boa-fé, entretanto lhe faz indício.
Tendo em vista tais considerações, temos que a boa ou má-fé deve
ser apurada no caso concreto.
Desta forma conclui-se que todo aquele que de boa-fé possuir
determinada coisa, fará jus aos frutos percebidos e, quanto aos pendentes,
será indenizado pelas despesas de produção. Já o possuidor de má-fé, terá de
ressarcir os frutos colhidos e percebidos, bem como os que por sua culpa
deixou de colher ou colheu antecipadamente, tendo somente direito as
despesas de produção ((CÓDIGO CIVIL, 2002, artigos 1214, 1216 p.250).
2.4.2) Das benfeitorias.
Aquele que de boa fé estiver possuindo a coisa “tem direito à
indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às
37 voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem
detrimento da coisa (...)” (CÓDIGO CIVIL, 2002, artigo1220, p.250)
Já ao possuidor de má-fé serão tão somente pagas as benfeitorias
necessárias, destinadas tão somente a conservação da coisa a fim de evitar
seu perecimento (CÓDIGO CIVIL, 2002, artigo1220, p.250).
2.4.3) Da perda da coisa.
Destaca-se ainda que o possuidor de boa-fé “não responde pela
perda ou deterioração da coisa, a que não der causa.”, contudo “O possuidor
de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais,
salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do
reivindicante.” (CÓDIGO CIVIL, 2002, artigo 1217 1220, p.250).
2.4.5) Direito de retenção
Este instrumento destina-se a proteção do possuidor de boa-fé, pois
permite que ele apreenda a coisa em seu poder até que o proprietário lhe
indenize das despesas que fez dos com as benfeitorias necessárias e úteis na
coisa (CÓDIGO CIVIL, 2002, artigo 1219, p.250).
2.4.6) Da proteção da Posse
Determina o artigo 1.210 do Código Civil (2002, p. 250) “O possuidor
tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de
esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser
molestado.” Deste dispositivo legal extraímos as principais ações destinadas à
proteção possessória, quais sejam: a) manutenção de posse, onde aquele que
se ver cerceado, tolhido (turbação) em sua posse poderá intentar esta ação, b)
reintegração de posse, destinada ao possuidor que foi totalmente privado
(esbulho) de sua posse, e c) interdito proibitório, instrumento manuseado por
aquele que ser ver na iminência, baseada em justo receio, de ser turbado ou
esbulhado em sua posse.
2.4.7) Do usucapião
Sobre este importante instituto da proteção possessória me limitarei
a uma abordagem geral, para não sair do foco central.
Assim, conceitua-se como modo originário de aquisição da
propriedade, abrangendo bens móveis ou imóveis seu objetivo é conferir a
propriedade ao possuidor que satisfaça os requisitos legais, concedendo mais
38 estabilidade ao seu direito do que tinha quando era apenas possuidor; portanto,
pressupõe posse prolongada no tempo, variando do tipo de usucapião
requerida (extraordinária, ordinária, especial, coletiva ou indígena) e suas
condições variarão dependendo da espécie que se quer ver reconhecida
judicialmente, sendo a prova da posse o tempo exigido, justo título e boa-fé.
É interessante ressaltar que a ação de usucapião tem como um de
suas bases, principalmente com o advento da Constituição de 1988, a função
social da propriedade, de modo a conceder a propriedade a todo aquele
possuidor que utiliza determinada coisa de maneira a beneficiar toda a
sociedade.
2.5) A função Social da Posse
Ao analisar a evolução do direito de propriedade, é inevitável a
análise do direito possessório também segundo a sua perspectiva funcional,
especialmente por ser a posse o grande instrumento para o cumprimento da
função social da propriedade.
A fim de compreender a finalidade social da posse é preciso remeter-
se as duas teorias da posse, já referidas anteriormente, são explicadas a partir
de um liame com o direito de propriedade, ora com o elemento subjetivo da
posse (Savigny), ora com o seu elemento objetivo (Ihering). Assim, enquanto
Savigny identifica a posse mediante a análise do ânimo de propriedade animus
domini, sem o qual de nada adiantaria o corpus ou o animus simples (que
podem representar detenção, no máximo), desta forma Ihering explica a
configuração de posse por meio do comportamento de proprietário, que deve
ser manifestado no corpus, assim entendido como o agir conforme a
destinação econômica das coisas e a forma como o proprietário age com
relação a estas coisas (FREITAS, 2007, p.565).
O Código Civil brasileiro em vigor, seguindo modelo do Código Civil
de 1916, adotou a teoria objetiva de Ihering, demonstrando que, para a
tipificação da posse, não é necessária identificação de qualquer elemento
subjetivo, mas apenas, a demonstração fática do exercício, pleno ou não, de
algum dos poderes do proprietário (usar, gozar, dispor e reaver), descritos no
caput do artigo 1.228, do Código Civil.
39
A mudança do panorama funcional da propriedade repercute na
posse, como se a evolução a evolução do direito de propriedade guiasse, de
forma inevitável, a evolução do direito possessório. Conseqüentemente, se a
propriedade é funcional, é inevitável concluir que a posse também deve ser
funcional.
Esta visão da posse sob o prisma social permite que o direito
possessório seja hábil ao atendimento das necessidades da pessoa humana
dentro da realidade em que esta inserida, influenciando na valorização da
posse em situações especiais tratadas pelo Código Civil como no caso do
usucapião, desapropriação privada e outras. De igual forma, a doutrina confere
à posse um destaque principal a luz da Constituição Federal semelhante ao da
função social da propriedade, fazendo com que o princípio ocupe um lugar
central, ressaltando-se, contudo, que os princípios não devem ser tratados
como se fossem apenas um.
Neste contexto, são claros os esclarecimentos elaborados por Fachin
(1988) mesmo que direcionados a uma perspectiva da usucapião imobiliária
rural e segundo a sua visão sobre o tema. Diz o autor:
A doutrina da função social da propriedade corresponde a uma alteração conceitual do regime tradicional; não é, todavia, questão de essência, mas sim pertinente a uma parcela da propriedade que é a sua utilização. (...) O processo histórico de apropriação do homem sobre a terra se desenvolveu de modo artificial, e em cada época a propriedade constituiu-se de contornos diversos, conforme as relações sociais e econômicas de cada momento. O grau de complexidade hoje alcançado pelo instituto da propriedade deriva indisfarçadamente do grau de complexidade das relações sociais. (...) Tal princípio não chega a afirmar que o trabalho se constitui no único modo para ter a propriedade: afirma que somente o trabalho do homem sobre a terra é que legitima a sua propriedade. Como se vê, são duas posições não excludentes, contudo, basicamente distintas. A primeira consiste numa inversão entre domínio e trabalho; a segunda tão somente inclui no bojo do domínio o elemento trabalho, como fator de legitimação, mas não como condição sine qua non para adquirir o direito de propriedade. (FACHIN,1988, p.18,20)
Após destacar que a propriedade não deve ser considerada uma
função social, mas sim ter uma função social como princípio norteador dos
poderes que lhe são inerentes adverte o Fachin (1988, p. 18-20) que o princípio
40 não transfere o instituto para o direito público, devendo a “noção de função
corresponder a limitações em sentido largo impostas ao conteúdo da
propriedade”. Já a função social da posse, segundo o autor, “situa- se em plano
distinto.” E explica:
(...) a função social é mais evidente na posse e muito menos evidente na propriedade, que mesmo sem uso, pode se manter como tal. A função social da propriedade corresponde a limitações fixadas no interesse público e tem por finalidade instituir um conceito dinâmico de propriedade em substituição ao conceito estático, representando uma projeção da reação anti individualista. O fundamento da função social da propriedade é eliminar da propriedade privada o que há de eliminável. O fundamento da função social da posse revela o imprescindível, uma expressão natural da necessidade. (FACHIN, 1988, p.18-20)
Porém, FREITAS (2007, p. 566), expôs de forma mais compatível
com o nosso ordenamento a exata compreensão da função social da posse.
Afirma que:
“ao falar em função social da posse, está implicada uma disputa de espaço – desenvolvida no curso do tempo – com relação ao direito de propriedade. Ou seja, ao falar-se em função social da posse, não é incomum significar-se o prestígio de uma situação possessória, em detrimento de uma situação de domínio, pois em parte essa é uma faceta – das muitas outras – da função social da propriedade”(FREITAS, 2007, p.566)
Desta forma, a função social da propriedade repercute na posse,
como forma de orientar uma nova finalidade, aproveitando o liame entre os dois
institutos e a potencialidade da posse para concretizar o princípio
constitucional. O vínculo entre a posse e a propriedade, sob o aspecto objetivo,
decorre de uma opção do nosso ordenamento jurídico, o mesmo que está se
amoldando aos novos tempos, mediante técnicas legislativas modernas que
buscam acompanhar a dinâmica dos fatos na atual sociedade. São visíveis as
modificações e inovações constitucionais e infraconstitucionais que buscam
prestigiar a posse, qualificando-a, não visando afrontar ou rechaçar o direito de
propriedade, mas sim, valorizar a conformação estrutural imposta pela função
social.
41
Nesse liame verifica-se que a função social da propriedade impõe um
uso conforme por parte do proprietário, que se inclui dentre as suas faculdades
legalmente outorgadas, assim, é inevitável concluir que este o uso poderá
qualificar o exercício da posse, de forma que, eventual negligência do
proprietário quanto a este comportamento, poderá ser validado, nos termos da
lei, em razão do uso conforme exercido pelo possuidor. É o que ocorre na
usucapião especial urbana ou rural, qualificado pela chamada posse trabalho
ou posse-moradia. Não há qualquer afronta à constituição ou ao princípio da
garantia da propriedade nesta hipótese, diferentemente do que ocorre quando
simplesmente se valoriza uma situação possessória em detrimento do direito
de propriedade, sem qualquer baliza ou referência normativa.
Destarte, não importa quem é o possuidor, se o proprietário ou
terceiro, mas sim apenas que este se utilize da coisa com vistas a atender os
interesses sociais e não os estritamente individuais.
São exemplos de posse qualificada pela função social, dentre outros,
todas as hipóteses de usucapião previstas na Constituição, Código Civil e
Estatuto da Cidade, a concessão de uso especial para fins de moradia, previsto
no parágrafo 1º, do artigo 183, da Constituição Federal, 1.225, incisos XI e XII,
do Código Civil, e Lei nº 11.481, de 31.05.2007, bem como a desapropriação
judicial, prevista nos parágrafos 4º e 5º, do artigo1.228, do Código Civil.
Os Tribunais tem se manifestado no sentido de que a posse tem que
observar o cumprimento da função social para ter a outorga da proteção
possessória, in verbis:
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro
0002675-51.2007.8.19.0206 (2008.001.57602) - APELACAO - 1ª
Ementa DES. ROBERTO DE ABREU E SILVA - Julgamento: 09/12/2008 -
NONA CAMARA CIVEL
REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CESSÃO DE DIREITOS.
DESTINAÇÃO ECONÔMICA DO TERRENO. FUNÇÃO SOCIAL DA POSSE. O
art. 1196 do Código Civil de 2002 determina que se considera possuidor todo
aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes
inerentes à propriedade. O conjunto probatório carreado aos autos evidencia
que prevalece a posse do réu. O réu apresentou não só a cessão de direitos de
42 posse realizada em seu favor e registrada em cartório de Registro de Títulos e
documentos, como também toda a cadeia de cessões de direitos anterior. O
título translativo do réu data de 15 de maio de 1998, ou seja, é anterior a
cessão realizada pelo autor. Em sendo a posse um estado de fato, há que se
analisar o efetivo exercício para fins de sua configuração. A prova dos autos
evidencia que o autor não utilizava o terreno com vistas a dar-lhe destinação
econômica e social. DESPROVIMENTO DO RECURSO. - Data de Julgamento:
09/12/2008.
0001477-60.2005.8.19.0040 (2007.005.00160) - EMBARGOS
INFRINGENTES - 1ª Ementa DES. BINATO DE CASTRO - Julgamento:
25/09/2007 - DECIMA SEGUNDA CAMARA CIVEL
EMBARGOS INFRINGENTES. Ação de reintegração de posse.
Alegação de possuidora que realizava plantio em terreno baldio ao lado de sua
residência de ter sido perturbada por real proprietário. Discussão de melhor
posse. Não demonstração por parte do demandado de fazer cumprir a sua
propriedade com a sua função social. Possuidora de boa fé que realizava
plantios e limpava o local. EMBARGOS REJEITADOS. ACÓRDÃO MANTIDO.
Superior Tribunal de Justiça
Processo Ag 1270864
Relator(a) Ministra NANCY ANDRIGHI
Data da Publicação 17/06/2010
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1.270.864 - RJ (2010/0014301-7)
RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
AGRAVANTE: MARIA DAS DORES LIMA DE OLIVEIRA
AGRAVADO: ROBSON DE SOUZA MONTEIRO E OUTRO
Direito processual civil. Agravo de instrumento. Recurso especial.
Ação de reintegração de posse. Prequestionamento. Ausência. Súmula
211/STJ. Reexame de fatos e provas. Inadmissibilidade. - A ausência de
decisão acerca dos argumentos invocados pelo agravante em suas razões
recursais, não obstante a interposição de embargos de declaração impede o
conhecimento do recurso especial. - O reexame de fatos e provas em recurso
especial é inadmissível. Agravo de instrumento não provido. DECISÃO Cuida-
se de agravo de instrumento interposto por MARIA DAS DORES LIMA DE
43 OLIVEIRA, contra decisão interlocutória que negou seguimento a recurso
especial fundamentado na alínea "a" do permissivo constitucional. Ação: de
reintegração de posse, ajuizada pela agravante, em face de ROBSON DE
SOUZA MONTEIRO E OUTRO, devido à ocorrência de esbulho possessório
representado pela invasão de um terreno de sua posse. Sentença: julgou
improcedente o pedido. Acórdão: deu parcial provimento à apelação interposta
pela agravante, nos termos da seguinte ementa: REINTEGRAÇÃO DE POSSE.
TEORIA OBJETIVA. EDIFICAÇÃO NO TERRENO. FUNÇÃO SOCIAL DA
POSSE. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. O conjunto probatório
carreado aos autos evidencia que prevalece a posse da autora. A prova
testemunhal e o depoimento pessoal dos réus são assentes em afirmar que o
ex-companheiro da autora utilizava o terreno para adentrar com veículo em seu
imóvel. Após o rompimento com seu companheiro, a autora passou a utilizar o
terreno para estender roupas no varal e criar galinhas. Inegável o exercício da
posse pela autora, segundo a Teoria Objetiva de Ihering adotada por nosso CC
no art. 1196, considerando-se que possuidor é todo aquele que tem de fato o
exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.
Ademais, a autora sempre defendeu sua posse contra atos ilegítimos, como se
infere do depoimento da própria ré. Tem-se ainda que a comunidade local
sempre reconheceu a autora como a verdadeira possuidora do terreno, não
havendo dúvidas sobre a posse exercida, uma vez que, nos dizeres de Ihering,
a posse é a exteriorização da propriedade. Por outro vértice, observa-se que os
réus iniciaram edificação no terreno. A obra encontra-se finalizada e, de acordo
com perícia elaborada é considerada nova e supera o valor do terreno, sendo
certo que não há que se falar em má-fé dos réus uma vez que, mesmo após
provocação da autora para interrupção das obras, o d. juízo não se pronunciou
a respeito, não havendo qualquer intimação. Nesse diapasão, impõe-se a
aplicação do art. 1.255, parágrafo único do CC/02, por analogia, na esteira do
Princípio da vedação ao enriquecimento ilícito e da função social da posse.
Deste modo, os réus permanecerão com a posse do terreno, cabendo a autora
indenização pelo esbulho de sua posse, devendo o valor ser apurado pelo i.
perito do juízo, em liquidação de sentença. PROVIMENTO PARCIAL DO
RECURSO. (e-STJ fl. 287) Recurso especial: alega violação dos arts. 1201 e
44 1255 do CC/02. Assevera que: i) configurou-se posse de má-fé por parte dos
agravados, porquanto esses realizaram construção no imóvel, após a citação
da ação de reintegração de posse; ii) diante da existência de má-fé, seria
inaplicável o instituto da acessão inversa; iii) subsidiariamente, o valor a ser
pago, a título de indenização, é irrisório. Relatado o processo, decide-se. - Da
ausência de prequestionamento O acórdão recorrido, não obstante a
interposição de embargos de declaração, não decidiu acerca dos argumentos
invocados pelo agravante em seu recurso especial quanto ao art.1255 do
CC/02, o que inviabiliza o seu julgamento. Aplica-se, neste caso, a Súmula
211/STJ. – Do reexame de fatos e provas O TJ/RJ assim se manifestou a
respeito da configuração de posse de má-fé por parte dos agravados: Assim,
inegável o esbulho possessório praticado pelos réus uma vez que a escritura
declaratória de posse acostada em fls.24/25 configura-se apenas em um
documento produzido unilateralmente pela 2ª ré. Nesse diapasão, tendo em
vista o relevo social que o instituto da posse ostenta, sendo uma situação
geradora de intensos conflitos na sociedade, impõe-se a tutela da posse da
autora. (STJ fl.289) Alterar o decidido no acórdão impugnado exige o reexame
de fatos e provas, o que é vedado em recurso especial pela Súmula 7/STJ.
Ademais, alterar o decidido no acórdão impugnado, no que se refere à
modificação do valor fixado a título de indenização, exige o reexame de fato se
provas, o que é vedado em recurso especial pela Súmula 7/STJ. Forte nessas
razões, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento. Publique-se. Intimem-
se. Brasília (DF), 09dejunhode2010. MINISTRA NANCYANDRIGHI Relatora.
45
CONCLUSÃO
Atualmente em nossa sociedade existe uma grande discussão em
torno da propriedade e da posse envolvendo os seus aspectos estruturais
funcionais em virtude das mudanças das concepções individualistas para
sociais, sendo o direito de propriedade um relevante paradigma que serve de
significativa orientação para a compreensão dos demais institutos com os quais
se relaciona em especial a posse.
Não obstante a Constituição Federal tratar do direito de propriedade,
garantindo sua inviolabilidade e determinando o cumprimento de sua finalidade
social, além de preceitua - lá como instituto da ordem econômica e financeira,
não há na Carta Magna a sua conceituação, tarefa historicamente
desempenhada pela legislação civil infraconstitucional, especificamente, pelo
Código Civil.
Assim, direito de propriedade pode ser delimitado a partir da
configuração do exercício, pelo proprietário, das faculdades de usar, gozar e
dispor da coisa, bem como de reavê-la das mãos de quem quer que a possua
ou detenha, faculdades que representam os elementos estruturais do direito.
Contudo percebe-se, que mesmo havendo uma grandiosidade de
permissões legais aos titulares do direito, há certa evolução normativa quanto
a satisfação do interesse público e social, situação que se torna ainda mais
evidente quando considerado o princípio constitucional da função social, em
razão ao exercício do direito de propriedade, voltados para a consecução de
objetivos sociais e econômicos, compatíveis com a garantia de inviolabilidade
da propriedade e com o princípio constitucional da propriedade privada.
Fato este demonstrado no artigo 1.228, do Código Civil, onde ao
mesmo tempo em que confere as faculdades de usa, gozar, dispor e
reivindicar, determina que estas faculdades devem ser exercidas “em
consonância com as suas finalidades econômicas e sociais” (§ 1º). De igual
forma, apesar de indicar no caput uma proteção legal que pode ser
considerada ampla, especialmente diante do poder de reivindicar a coisa, o
dispositivo expõe que tal proteção cede diante da situação fática descrita nos
parágrafos 4º e 5º, significativa de um interesse social econômico relevante.
46
Dessa forma é possível compreender que os dispositivos constantes
no Código Civil Brasileiro sobre o direito de propriedade devem ser analisados
sob os indicativos da Constituição Federal com o objetivo da finalidade social.
No mesmo viés temos a posse que esta ligada à propriedade e
apesar de ser controversa a sua definição, já que há duas teorias denominadas
subjetiva e objetiva, de Savigny e Ihering que procuram explicar explicá-la por
meio da análise de seus dois elementos fundamentais: o corpus e o animus,
ganha papel de destaque, pelo fato de ser a exteriorização da propriedade e
conseqüentemente o instituto capaz de operacionalizar o cumprimento da
função social da propriedade
Ressalta-se que a posse e a propriedade estão histórica e
intrinsecamente relacionadas entre si, por seu aspecto estrutural e finalístico. A
propriedade como citado, se manifesta predominantemente mediante a posse,
representativa das prerrogativas outorgadas pela lei ao proprietário, em
especial o direito de usar. Portanto, se estas prerrogativas visam um fim
individualista ou social, é inevitável concluir que a posse terá esta mesma
finalidade, ou será exercida de forma a concretizar esta função.
Conclui-se que o nosso ordenamento jurídico brasileiro vem se
modificando para viabilizar a concretude das normas previstas na Constituição,
visando atender à realidade de uma sociedade complexa, sem, contudo, deixar
de prestigiar com uma segurança jurídica em relação à posse e a propriedade
quanto às conseqüências advindas da realização dos princípios e direitos
fundamentais, dentre os quais, o da função social.
47
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50
INDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
A PROPRIEDADE 9
1.1 - A Evolução Histórica da Concepção de Propriedade 10 1.2 - O Direito de propriedade nas Constituições Brasileiras 13 1.3 - A Propriedade a Luz da Constituição Federal de 1988 e do Código Civil 16 1.4 -Princípio da Propriedade Privada 19 1.5 - Função Social da Propriedade 21
CAPÍTULO II A POSSE 2.1) Teorias possessórias 26 2.2) Teoria da Posse a luz do Código Civil 30 2.3) A posse no Código Civil 31 2.4) Efeitos da Posse 36 2.5) A função Social da Posse 38
CONCLUSÃO 45
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS 47
ÍNDICE 50