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1 REDE DE MONITORAMENTO EM DIREITOS HUMANOS NO BRASIL P E R N A M B U C O CONSTRUÇÃO DO INFORME PARALELO DA SOCIEDADE CIVIL Monitoramento da Implementação do PIDESC pelo Brasil DOCUMENTO PERNAMBUCO RECIFE PE SETEMBRO / 2015

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REDE DE MONITORAMENTO

EM DIREITOS HUMANOS NO BRASIL

P E R N A M B U C O

CONSTRUÇÃO DO INFORME PARALELO DA SOCIEDADE CIVIL

Monitoramento da Implementação do PIDESC pelo Brasil

DOCUMENTO PERNAMBUCO

RECIFE – PE

SETEMBRO / 2015

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO

I – Os casos exemplares de violação de Direitos Humanos com ênfase na violência.

1.1– Violência contra a Mulher

1.2– Violência contra a juventude

1.3– Violações de direitos aos povos indígenas de PE

1.4 – Violência urbana e assassinatos de jovens da periferia – Olinda/PE

1.5 -Violência contra Crianças e Adolescentes

1.6 - Violência contra Crianças e Adolescentes LGBT

1.7– Violência no campo

1.8– Violência na cidade

1.9 – Violações nas comunidades tradicionais de Pescadores(as)

1.10– Violência no sistema carcerário

1.11– Violência contra a população LGBT

1.12-Violações de Direitos junto a população TRANS

1.13- A Comunicação como um Direito Humano e as várias violações praticadas pelos meios de

comunicação hegemônicos locais

II – O estado da arte das políticas públicas de proteção aos Direitos Humanos

2.1 - Violação de Direitos na Assistência à Saúde da Mulher em Pernambuco

2.2 - Pessoas vivendo com HIV-AIDS E A FALTA DE ACESSO À SÁUDE

III - POLÍITICA PÚBLICA DE SEGURANÇA PÚBLICA

3.1 Os desafios da gestão democrática na construção de uma política de segurança pública em

Pernambuco

IV– Um balanço dos mecanismos, das estruturas, dos órgãos responsáveis, dos arranjos

institucionais participativos que visam à proteção e defesa dos Direitos Humanos em

Pernambuco.

4.1 - Política Pública de Direitos Humanos em Pernambuco: ausências e desafios

V – As violações aos Direitos Humanos e os processos de erosão e flexibilização dos

sistemas jurídicos de proteção e defesa.

5.1 – Ordenamento jurídico e segurança da posse da terra: entre a omissão do estado e o

conservadorismo do judiciário

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APRESENTAÇÃO

As organizações da sociedade civil brasileira que atuam no campo dos direitos

humanos, especialmente dos Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais

(DhESC), tem promovido ações permanentes de monitoramento do cumprimento dos

compromissos do Estado/governo brasileiro em matéria de direitos humanos.

Neste espírito, a sociedade civil brasileira se mobilizou, em 1999/2000, para a

construção do Informe da Sociedade Civil sobre o cumprimento do Pacto Internacional

dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) através da realização de 17

audiências públicas das quais participaram muitas organizações em vários Estados do

País. O informe foi apresentado pelas organizações que coordenaram o processo, o

Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), a Comissão de Direitos Humanos

da Câmara dos Deputados e a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do

Ministério Público Federal ao Comitê DESC/ONU em 2000 e saudado como iniciativa

inédita, já que, pela primeira vez, a sociedade civil se antecipou ao governo na

apresentação do informe, visto que o governo brasileiro estava atrasado na apresentação

e somente veio a fazê-la em agosto de 2001.

Com a apresentação do Informe Oficial, a Plataforma Brasileira DhESC, rede de

articulação de organizações da sociedade civil que atuam em DhESC, coordenou a

apresentação do Contra Informe. Sua construção incorporou o acumulado do Informe da

sociedade civil (1999/2000), o relatório produzido pelo Projeto Relatores Nacionais em

DhESC e contribuições de organizações diversas e foi apresentado oficialmente ao

Comitê DESC/ONU em maio de 2003.

O Comitê DESC/ONU analisou o Informe Oficial e contou com apresentações de

representantes de organizações da sociedade civil brasileira que procuraram incidir para

que o Comitê chegasse a conclusões que pudessem ajudar o Brasil a avançar na

implementação do PIDESC. No final de maio de 2003 o Comitê DESC/ONU divulgou

suas Observações Conclusivas sobre o cumprimento do PIDESC pelo Brasil, analisando

a situação e emitindo recomendações. O documento foi traduzido e divulgado por

diversos meios pela sociedade civil a fim de subsidiar o monitoramento de seu

cumprimento. Entre as recomendações, o Comitê pede ao governo brasileiro que

apresente até junho de 2006 o segundo informe sobre o cumprimento do PIDESC.

A construção do Segundo Contra Informe da Sociedade Civil sobre o cumprimento do

PIDESC pelo Estado brasileiro, embora tenha acolhido o acúmulo produzido pela

experiência dos processos anteriores (do Informe da Sociedade Civil, do Primeiro

Contra Informe e do Primeiro Relatório Periódico), e outras iniciativas de cada rede ou

organização de luta pelos direitos humanos no Brasil (Ex. Projeto Relatores Nacionais),

foi um marco importante nos processo de monitoramento em DH no Brasil. Além de

oportunizar a continuidade da realização da ação de monitoramento dos DH, viabilizou

um processo de articulação e de comunicação mais amplos, com coordenação feita por

representantes de redes de atuação em direitos humanos no Brasil: o Movimento

Nacional de Direitos Humanos (MNDH), a Plataforma Brasileira de Direitos Humanos

Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (DhESCA Brasil), o Processo de

Articulação e Diálogo entre Agências Ecumênicas Europeias e Contrapartes Brasileiras

(PAD) e os Parceiros de Misereor no Brasil.

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Neste novo momento, o Segundo Contra Informe, foi construído entre 2005 e 2007,

contando com a realização de seminários e oficinas nacionais de parceiros e

organizações da base das REDES que coordenam o processo, bem como com a

realização de 26 audiências estaduais. Durante este período houve boa interlocução

política com o governo brasileiro, que veio a apresentar o Informe Oficial no final de

2006. O documento final do Segundo Contra Informe ficou pronto em maio de 2007, e

foi apresentado ao Comitê DESC ONU no início de 2008. Em maio de 2009, após o

Brasil (governo e sociedade civil) apresentar e argüir sobre os relatórios, o Comitê

DESC ONU, emitiu as novas recomendações ao Estado Brasileiro.

A fim de dar continuidade ao processo de monitoramento sobre o cumprimento do

PIDESC pelo Estado Brasileiro neste período, o Movimento Nacional de Direitos

Humanos (MNDH), o Processo de Articulação e Diálogo entre Agências Ecumênicas

Européias e suas contrapartes brasileiras (PAD Brasil) e Parceiros de Misereor no

Brasil, juntamente com as organizações da base e Redes parceiras avançam na

construção do Terceiro Informe, a diferença do processo anterior é que este será um

Informe Paralelo, ou seja, um informe independente e sem comentários ao Informe

Oficial – o que não exclui a possibilidade de, posteriormente, se assim vier a ser

compreendido, vir a elaborar comentários pontuais ao Informe Oficial. Além desse

objetivo, as organizações também pretendem pressionar o governo brasileiro a cumprir

a recomendação do Comitê e apresentar o Informe Oficial no prazo solicitado, que é

junho de 2014.

A construção do Informe Paralelo conta com vários momentos, programados a fim de

garantir o máximo de participação e envolvimento das organizações da sociedade civil

no processo. É neste contexto que se localiza a proposta de realização de Audiências

Públicas nos 26 Estados e o Distrito Federal para o que este Termo de Referência

pretende servir de orientação.

Coordenação e Parcerias

A Coordenação Geral do Projeto será feita de forma conjunta entre Parceiros de

Misereor no Brasil, MNDH e PAD Brasil. As responsabilidades políticas gerais e o

monitoramento da execução das atividades estão a cargo da coordenação do projeto, que

poderá contar também com a participação de organizações e Redes parceiras em algum

momento (ex: Oficinas Nacionais). Para o encaminhamento das atividades previstas a

coordenação se reunirá periodicamente, conforme agenda do projeto.

As Coordenações Estaduais serão formadas por organizações membro das Redes e

Articulações que compõe a Coordenação Geral do projeto que estarão encarregadas de

dinamizar o processo em nível estadual, de modo especial, mobilizar, preparar e

conduzir as Audiências Públicas / Oficinas, motivando as organizações de sua área de

abrangência a conhecer a dinâmica e a participar do processo. É fundamental que em

cada estado sejam mobilizados parceiros e organizações o mais diversas possíveis, e que

se busque apoio junto às CDHs das Assembléias Legislativas, Ministérios Públicos,

Conselhos Estaduais de Direitos Humanos.

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Secretaria Nacional do Projeto

A Coordenação Geral do Projeto é realizada de forma conjunta entre Parceiros de

Misereor no Brasil, MNDH e PAD Brasil. As responsabilidades políticas gerais e o

monitoramento da execução das atividades estão a cargo da coordenação do projeto.

Todo o processo de construção do Informe Paralelo conta com uma secretaria de suporte

à Coordenação Geral. Está sediada em Porto Alegre/RS, e tem como secretário

executivo Enéias da Rosa cujos contatos de email são: [email protected] e

[email protected] Fones: (51)81410084 ou (51)32761561.

Secretaria e Coordenação em Pernambuco

De acordo com o documento nacional da iniciativa “as Coordenações Estaduais serão

formadas por organizações membro das Redes e Articulações que compõe a

Coordenação Geral do projeto que estarão encarregadas de dinamizar o processo em

nível estadual, de modo especial, mobilizar, preparar e conduzir as Audiências Públicas /

Oficinas, motivando as organizações de sua área de abrangência a conhecer a dinâmica

e a participar do processo”.

Neste caso, em Pernambuco, a iniciativa tem sido secretariada pela EQUIP e SOS Corpo

que, junto com organizações como FASE, FETAPE e CENDHEC, Centro Sabiá, além de

outras iniciativas como redes, fóruns e articulações estaduais têm constituído a Comissão

de coordenação política e pedagógica do monitoramento.

Alguns aspectos metodológicos e de conteúdos que orientaram a produção dos

diagnósticos que integram este subsídio

Com base num roteiro geral comum definido numa das várias reuniões preparatórias,

optou-se por solicitar essa produção escrita adiante, ou seja, esse monitoramento inicial a

coletivos, redes, fóruns, articulações, movimentos, dentre outros, como um convite à

manifestação pública, participação ativa e propositiva na programação do monitoramento

, especialmente, por considerar que esses coletivos tem legitimidade para tratar dos casos

sugeridos devido ao seu histórico de atuação na defesa dos direitos humanos no estado e

no país.

Foi solicitado a cada responsável que a produção considerasse, impreterivelmente, as

dimensões e implicações das violações aos Direitos Humanos na perspectiva de (a)

gênero; (b) Raça e etnia e (c) geração.

Como se trata da produção de um Relatório Sintético visando monitoramento da situação

dos Direitos Humanos no estado, solicitou-se de cada coletivo a produção sobre o

caso/violação limitada a duas páginas. Foi sugerido que eventuais dados quantitativos

incorporados a cada caso/violação considerassem os últimos 6 (seis) anos para coincidir

com o período do ultimo relatório nacional apresentado ao comitê Desc/ONU (maio de

2009).

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I – OS CASOS EXEMPLARES DE VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS

COM ÊNFASE NA VIOLÊNCIA.

1.1 – Violência contra a Mulher

VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER – FACES PERVERSAS DE UMA VELHA

HISTÓRIA

Mércia Alves – Assistente Social, Educadora SOS Corpo e Militante do FMPE/AMB

Este texto busca sintetizar as informações relativas à violência contra a mulher no

estado de Pernambuco considerando as análises produzidas pelas organizações

feministas e movimento de mulheres. Destaca-se nesta síntese três documentos – Dossiê

do Fórum de Mulheres de Pernambuco à CPMI sobre a Violência Contra Mulher

(2012); O Relatório da CPMI (2013); Diagnóstico da Situação da Violência Contra as

Mulheres e Rede de Serviços na Mata Sul -PE ( 2014) e dados da rede de atendimento

de Pernambuco disponibilizada pela Secretaria de Política para Mulheres (SPM).

A primeira questão a trabalhar é quanto ao conceito e perspectiva de enfrentamento à

violência para o movimento de mulheres e feminista. Sendo este um desafio para luta

em nível nacional e em Pernambuco, de forma particular no estado, pela falta de

informações sobre os reais números que possam revelar e/ou desvelar o tamanho do

problema decorrente do sexismo que impera historicamente nas relações de gênero.

Primeiro é importante qualificar, a partir da perspectiva feminista, a violência contra a

mulher como marca e expressão da sociedade patriarcal e como instrumento de

dominação e subordinação das mulheres em diferentes espaços da vida social, A

violência sexista caracteriza-se no ambiente doméstico pela sua constância e por

diferentes impactos na vida da mulher (tanto no campo objetivo quanto subjetivo).

Como face e interface dessas expressões da violência contra a mulher estar as

interdições que se colocam tanto no espaço publico quanto privado, resultando nas

dificuldades das mulheres em se inserir em diversos campos da vida social, como

trabalho, política, educação, dentre outros. Sua superação envolve uma análise plural, e

em muitos casos para as mulheres romperem com esse ciclo de violência faz-se

necessário um apoio externo e uma rede de proteção e atendimento eficaz, como aponta

as diretrizes da Lei Maria da Penha (nº 11.340/2006).

Observando os dados sistematizados no Relatório da CPMI da Violência Contra a

Mulher (2013), apontam que Pernambuco apresenta, do ponto de vista da organização,

uma estrutura dos organismos da rede de atendimento às mulheres vítimas de violência

em fase de ampliação, comparando aos demais estados da federação. No entanto, com

155 organismos de gestão de Política Pública para Mulheres, num universo de 185

municípios, ainda aponta uma estrutura deficiente, com equipe reduzida e orçamento

aquém das necessidades apontadas pelas mulheres e movimentos. Essa fragilidade no

campo da gestão institucional, mesmo considerando os avanços em 8 anos de ampliação

(em 2011 eram 117 (CPMI), em 2015 (SPM) 155) de secretarias e coordenadorias de

política pública para mulheres.

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Para a Secretaria da Mulher de PE (CPMI,2013) cabe as Secretarias e coordenadorias a

responsabilidade para implementar a política pública para as mulheres e sua rede de

atendimento, e ao estado cabe as casas-abrigo, delegacias especializadas e políticas de

prevenção, em PE dialoga com um dos eixos do Pacto pela Vida. Bem, essa divisão no

campo da gestão é um problema na execução da política pública para mulheres uma vez

que há como perspectiva uma ação em rede e compartilhada entre os entes federativos e

junto aos órgãos do mesmo ente.

Mas, o que essa ampliação nos revela, a partir da fala das mulheres, é que este

crescimento quantitativo, se revela como um compromisso em instaurar um sistema de

gestão para afirmação da política de gênero no município. Mas, ao mesmo tempo aponta

para as poucas condições da gestão (execução de políticas) e interfaces com as ações no

campo da política pública, seja municipal ou estadual. Ainda persiste a lógica de que

política para mulheres é afeta a única secretaria e, com isso padece de uma

desarticulação institucional com as demais políticas públicas (saúde, educação, moradia,

trabalho, etc).

Observando, portanto, os dados de 2012 do estado de Pernambuco fornecido para o

Relatório da CPMI, há uma ampliação na rede de enfrentamento a violência contra a

mulher, considerando as informações dispostas no sítio da SPM. Vejam quadro abaixo:

SERVIÇOS QUANTIDADE

CMPI/2013

SPM 2015

DEAMs 08 10

Centros de Referência 12 13

Casas Abrigo 06 04

Juizados/ Varas de Violência

Dom/Familiar

03 06

Promotorias da Mulher 02 02

Defensorias da Mulher 01 02

Serviços de Perícia 03 03

Serviços especializados de

Saúde

04 08

Considerando o quadro acima, na qual deve ser comemorado, uma vez que esta é uma

das demandas do movimento de mulheres. No entanto, é importante destacar que esse

quadro não diminui as preocupações quanto a sua dificuldade de chegar às mulheres que

estão nos municípios mais distantes da capital. Soma-se ainda as preocupações e críticas

as falhas no atendimento, a reduzida equipe multiprofissional para trabalhar nestes

serviços e o pouco investimento em formação de gestores para compreender e notificar

os casos de violência contra mulher. E, vários locais, sobretudo no interior, o fato de não

ter uma delegacia especializada, as denúncias de violência contra mulher é tratado como

questão de menor potencial.

O segundo ponto a destacar no campo da violência contra mulher diz respeito aos

problemas na rede de proteção e atendimento as mulheres vítimas de violência. No

Dossiê do FMPE apresentado a CMPI e Diagnóstico Mata Sul, vários dos problemas

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elencados ainda persistem, como: a concentração dos serviços como juizados,

delegacias especializadas, promotorias, serviços especializados de saúde nos municípios

da Região Metropolitana do Recife, deixando as regiões da Mata, Agreste e Sertão

desassistidas, o que contribui para manter o ciclo da violência, em razão da situação de

impunidade e cultura do medo da denúncia.

Pernambuco tem mais de 8 milhões de habitantes, destes 4 milhões e meio, composta de

mulheres, ou seja, cerca de 51% da população. E os dados sobre a violência contra a

mulher, apesar da sua notificação, no relatório da CPMI-VCM coloca o estado na “10ª

posição nacional, com a taxa de 5,5 homicídios femininos por 100 mil/mulheres. Entre

as capitais ocupa a 6ª posição com taxa de 7,6 (Mapa da Violência, CEBELA, 2012)”.

Relatório CPMI-VCM, junho/2013, p.552). E entre os 100 municípios mais violentos,

constam na análise do Mapa da Violência, 8 se destacam de PE, dentre eles citamos

Bezerros, Abreu e Lima, Ipojuca, Surubim, Cabo de Santo Agostinho, Vitória de Santo

Antão, Paulista e Arcoverde, metade destes 8, são municípios da RMR. E vale destacar

que a posição destes municípios como os mais violentos variam entre a 26ª a 100ª

posição em escala crescente em números de feminicídios.

No ano de 2015, as informações estatísticas sobre os dados de violência sexista e os

feminicídios não encontram-se dispostos no sítio da Secretaria Estadual da Mulher. O

que há como informação, genérica, diz respeito “a redução comparado ao primeiro

quadrimestre de 2014, esse ano, Pernambuco e Região Metropolitana do Recife

comemoram a derrota da violência contra mulher. No Estado, os índices de Violência

Letal Intencional – CVLI tiveram uma queda de 5% e na RMR uma diminuição de

12%”1. E ainda no portal destaca: “Os Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLIs)

contra as mulheres continua em queda. De 2013 para 2014, caiu de 5,30 crimes para

4,98, respectivamente, para cada 100 mil pernambucanas. No ano passado, foram

assassinadas 243 mulheres e até o último dia 9/02/15, o número chegou a 24 (20 em

janeiro e 04 em fevereiro). Os dados são do Sistema Estadual de Informação sobre as

Mulheres (SEIMULHERES) da Secretaria da Mulher de Pernambuco (Secmulher-PE).

No entanto, fontes dos jornais locais apontam para um crescimento da violência contra a

mulher em dois municípios, “os registros de violência contra a mulher cresceram em

Petrolina, no Sertão de Pernambuco. De 2009, onde foram registrados 229 notificações,

para 2014, houve um aumento de mais de 677%. Somente no ano passado, foram 1.781

notificações. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

(IBGE),existem mais de 150 mil mulheres em Petrolina. Quase 65 mil a mais do que a

população masculina”. ( Portal G1 9/5/2015). E no agreste conforme informações do

TJPE em 8 de março de 2015, os dados estatísticos revelam que, entre janeiro a agosto

de 2014, a Delegacia da Mulher de Caruaru registrou 1.172 ocorrências, e a de

Petrolina, 617. E segundo dados da Secretaria de Defesa Social até maio foram

registrados cerca de 110 feminicídio no estado de PE, ou seja, uma mulher é morta a

cada 2 horas.

Observa-se que as informações encontram-se disposta de forma desarticulada e que a

categorização da Violência Letal Intencional – CVLI, diz respeito aos homicídios,

encontrando-se fora, toda notificação referente a violência contra a mulher que diz

respeito a violência física (agressão), violência sexual (abuso, estupro), dentre outras

expressões da violência sexista não registradas nos dados acima.

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Como aponta Ana Paula Portela em artigo - Impactos de Gênero na Redução da

Mortalidade Violenta: Reflexões sobre o Pacto pela Vida em Pernambuco (2014). “

Diferentemente, porém, da Secretaria de Defesa Social (SDS), que disponibiliza em sua

página eletrônica os dados mensais referentes aos CVLI e ao PPV, a Secretaria da

Mulher não divulga informações sobre a realização ou sobre os resultados das ações.

Esse é um fator limitante para a análise aqui pretendida, uma vez que a Política de

Enfrentamento à Violência contra a Mulher detém a competência técnica e política para

atender às especificidades das situações de violência vividas pelas mulheres, mais

dificilmente atendidas por uma política de perfil generalista e universal, como é o PPV

[ Pacto pela Vida]”.

Na ocasião da elaboração do Relatório da CPMI-VCM o Fórum de Mulheres de

Pernambuco desenvolveu várias estratégias de incidência a fim de revelar a realidade do

estado de Pernambuco, tendo como foco a fragilidade da rede de atendimento à mulher

em situação de violência, e essa estratégia permanece com as chamadas blitzs aos

serviços da rede de atendimento. Na ocasião já demonstrava que entre os maiores

problemas na implementação de uma politica de atenção as mulheres vítimas de

violência estava e está a falta de diálogo entre gestão pública e movimento de mulheres.

A subnotificação, inclusive no tocante a questão racial, a falta de informação ainda é um

problema para se compreender o fenômeno da violência sexista no estado, aliado a uma

desarticulação dos organismos da rede de atendimento à mulher – centros de referência,

delegacias especializadas, juizados e varas de violência familiar e doméstica, núcleo

especializado da defensoria pública, serviços de abrigamento e de atenção à saúde das

mulheres em situação de violência.

1.2 – Violência contra a juventude

CONTRA O EXTERMÍNIO DA JUVENTUDE NEGRA

Adelmo B. Araújo e Eliedson M. Silva (Leo)

Os jovens representam cerca de 25% da população total do estado de Pernambuco.

Estudos e pesquisas dão conta de que esse segmento tem particularidades e necessidades

específicas e que, portanto, necessitam de políticas públicas voltadas especificamente

para a população situada na faixa etária entre 15 e 29 anos. Não basta garantir o direito à

saúde e à educação. O jovem, na condição de sujeito de direitos, deve também ter

assegurado o direito ao trabalho, à cultura; ao lazer, ao esporte e demais direitos

previstos no Estatuto da Juventude (Lei Federal nº 12.852/2013) e o Estatuto da Criança

e do Adolescente (Lei Federal nº 8.069/1990), no caso dos jovens adolescentes.

Em 2008, Pernambuco foi o primeiro estado brasileiro a institucionalizar a política

pública de juventude, após um amplo processo de diálogo com as juventudes, nas 12

Regiões de Desenvolvimento do Estado. Nesse contexto, foram instituídas as Leis de nº

13.607 e 13.608, em outubro de 2008, criando o Conselho Estadual de Políticas

Públicas de Juventude e o Plano Estadual de Juventude, respectivamente.

Existe um relativo consenso que houve avanço no plano institucional com a criação

desses dois importantes instrumentos. Em contra partida, podemos facilmente constatar

que do ponto de vista efetivo se avançou muito pouco. Os programas, projetos e

políticas são pontuais e fragmentados e continuam muito aquém das necessidades. As

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ações governamentais são basicamente voltadas aos jovens em conflito com a lei, num

modelo falido e conservador que não cria condições objetivas para reinserção social dos

jovens. As três últimas gestões estaduais são um bom exemplo dessa política baseada na

repressão policial via Pacto pela Vida (pela vida de quem?) e construção de novas

unidades de “acolhimento socioassistencial”, as FUNASE. Outro exemplo da falta de

compromisso dos governos foi a mudança na estrutura administrativa do órgão

responsável pela política de juventude no Estado, que mudou de nome e de secretaria

por três vezes: Secretaria Especial de Juventude e Emprego; Secretaria da Criança e da

Juventude; e por fim perdeu status passando a ser uma secre4taria executiva

subordinada à Secretaria de Direitos Humanos.

Dessa forma, podemos assegurar que ser jovem, negro, pobre e do sexo masculino em

Pernambuco tem hoje um significado: é estar situado num grupo populacional altamente

sujeito à violência. Os dados são assustadores e para alguns especialistas a situação

pode ser caracterizada como extermínio da juventude negra. Ou seja, as vítimas dos

assassinatos tem sexo (masculino), cor (negro), faixa etária (12 aos 29 anos) e em sua

grande maioria são pobres.

Estudo recente divulgado pela Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) da Presidência

da República, utilizando um indicador inédito, o Índice de Vulnerabilidade Juvenil -

Violência e Desigualdade Racial (IVJ) mapeou onde os jovens negros de 12 a 29 anos

estão mais expostos ao problema. O Estado de Pernambuco aparece em 3º lugar como

local de maior risco, atrás apenas de Alagoas (1º) e Paraíba (2º).

Segundo Marlova Noleto, diretora da área programática da UNESCO no Brasil é nas

periferias onde ocorre a grande parte dos assassinatos de jovens negros, indicando que

há uma “geografia da morte” no Brasil, relacionada à carência de políticas sociais

direcionadas a determinados segmentos sociais. A pesquisa aponta que, em 2012,

enquanto 28 jovens brancos foram assassinados (para cada 100 mil habitantes da mesma

faixa etária e cor), no caso dos negros a taxa atinge a marca dos 71.

No tocante aos municípios, o Cabo de Santo Agostinho, situado na região Metropolitana

do Recife (RMR) aparece em primeiro lugar no ranking dos municípios mais violentos

do país.

Dados divulgados pela imprensa local dão conta que de janeiro a março de 2015 foram

notificados 1.300 assassinatos no Estado. Índice superior a 2014, o que evidencia a

desestruturação ou falência do Pacto pela Vida, programa que era considerado um dos

pontos fortes da gestão Eduardo Campos (PSB).

Os dados denotam o descaso do governo com a juventude pobre e em particular dos

jovens negros. É preciso por em prática as ações previstas no Plano no Estadual de

Juventude e fortalecer o Conselho Estadual de Juventude, enquanto instrumentos de

garantia e fortalecimento da cidadania juvenil.

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1.3 VIOLAÇÃO DE DIREITO AOS POVOS INDÍGENAS DE PERNAMBUCO

Maurílio Nogueira - Índio do povo Truká Pernambuco

Dentro dos limites, do Estado de Pernambuco, existem 12 povos Indígena, distribuído

entre os municípios de Águas Belas, Pesqueira, Buíque, Cabrobó, Inajá, Ibimirim,

Petrolândia, Jatobá, Tacaratu, Floresta, Carnaubeira da Penha, Orocó, Salgueiro, e

Itacuruba, cuja população soma aproximadamente 40.720 Índios de ambos os

sexos.Apesar do contato, há mas de cinco séculos, com as sociedades não Indígena, esta

população ainda consersa traços marcantes, de sua cultura e manifestação religiosa de

origem, que os diferencia, sobremaneira da sociedade e dos demais povos indígenas do

Estado de Pernambuco, que são os FUNI-Ô, PANKARARU, XUKURU, ATIKUM,

KAPINAWA, TUXA, PIPIPÃ, PANKARÁ,TRUKA, KAMBIWÁ, PANKAIWKÁ,

ENTRESERRAS.

O Estado de Pernambuco, hoje é considerado o 4º maior estado, em população indígenas

do país, só perdendo para a Amazonas, Mato Grosso e Pará.

A maioria dos grupos indígenas de Pernambuco, tem o mesmo ritmo, só havendo alguns

mudanças nas melodias, que imitem palavras de suas línguas maternas.

Foram séculos de resistência contra a invasão e luta por seus direitos. Ainda hoje se

repete as perseguições e os processos de criminalização aos povos indígenas de

Pernambuco, a exemplo de não ter algumas terras desentrosadas/homologadas e o

assassinato de algumas lideranças indígenas. Em 1980 tivemos o assassinato da grande

liderança indígena Chicão Xukuru cacique do povo Xukuru de Ororubá, assassinado por

fazendeiros. Em 2005, Adenilson dos Santos e seu filho Jorge dos Santos ambos mortos

pela própria polícia na aldeia enquanto a comunidade indígena culminava o projeto

junino escolar, ainda hoje o caso continua impune. Outra liderança do povo truká foi

Mozenir de Araújo em 2008 assassinado em plena rua pública de Cabrobó.

Outro fator, é que o próprio Estado nos ameaça de uma forma brusca, o exemplo disso é a

educação escolar indígena, professores contratados há mais de quinze anos sem o direito

a concurso público, assim fica os professores sem nenhuma segurança enquanto

funcionário do Estado.

O projeto de transposição do Rio São Francisco também é uma ameaça ao território

indígena no município de Cabrobó impactando e ameaçando o povo truká

desestruturando a comunidade e sobretudo o direito ao acesso ao rio, o governo nunca fez

uma política que defendemos que é fazer uma revitalização do Rio São Francisco e

ajudasse a viver mais, outra grande iminência é a usina nuclear que atormenta o povo

indígena pankará do município de Itacuruba, que ameaçara a extinção do nosso povo.

O Cacique Neguinho Truká diz: "Meu povo não aguenta mais ver nosso sangue

derramado. O Estado deve tomar providências. Um Estado democrático não pode ficar

conivente com os maus policiais". Neguinho expõe que o povo Truká vem sendo vítima

de um processo de criminalização e assassinatos, vários deles os autores são policiais

militares.

O cacique Marcos Xukuru faz um relato do processo e violência e criminalização que

vem sofrendo os povos indígenas no Brasil, destacando os povos de Pernambuco. "Estou

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ameaçado de morte; ando escoltado com dois policiais. Sofri um atentado em 2003 onde

dois índios jovens foram assassinados. Lutamos pela melhoria da qualidade de vida dos

povos indígenas". E pela garantia sagrada dos nossos costumes e direito de viver segundo

as nossas tradições.

1.4 Violência urbana e o governo não investe na prevenção – Assassinato dos jovens

da periferia

Mães da saudade

Introdução

Projeto mães da saudade que há três anos vem atuando na comunidade de peixinhos

com objetivo de atuar na prevenção e na garantia das políticas de segurança públicas

junto com as mães da saudade.

Nossas ações

Neste período foi realizado a primeira e segunda cartilha, momento de escuta e o

mapeamento da violência: todo esse material foi elaborado e sistematizado a partir de

fatos que evidenciam o forte crescimento da violência letal contra a adolescente e

juventude, sendo peixinhos um bairro periférico com alto índice de desigualdade social.

São muitas dessas na comunidade de Peixinhos, Mães da saudade que vive com a saúde

e a vida profundamente abaladas pela violência. O assassinato de filhos e netos

desencadeou transtornos diversos que demandam um apoio psicológico continuo.

Demandas também um olhar do poder publico sobre as causas da melancolia

generalizada no bairro. Com o total falta de perspectiva para seus filhos e netos

sobreviventes, mães da saudade se desesperam por saber que eles muito possivelmente

terão o mesmo fim.

Os jovens por não terem o que fazer, acaba entrando no mudo das drogas sem

alternativa. Na comunidade de peixinhos existe uma organização governamental que

atendia cerca de 200 jovens nos turno manha e tarde, conhecido como Centro da

Juventude, hoje este centro permanece fechado e por conta disso muito adolescente

entra no mundo da criminalidade por não terem alternativas.

Os jovens do projeto mães da saudade realizavam oficinas de intervenção com eles e

abordávamos temas como violência urbana.

Peixinhos visceral

É, portanto, possível afirma que peixinhos sofre de luto endêmico, isto é toda semana

acontece assassinados, iremos relatar alguns fatos bem recentes:

Adolescente que foi baleado e depois jogado no rio Beberibe por policiais, este fato foi

presenciado por toda comunidade da Giriquiti que foi socializado pelas redes sociais.

(abril /2015)

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Outro adolescente morto em frente de sua casa por nome de Edvaldo foi assassinado

com 08 tiros no DETRAN. Este jovem estava envolvido com o trafico de drogas. (maio

/2015)

Em aguazinha vindo do trabalho, seu Geneci marido de uma mae da saudade, foi

atingido por uma bala perdida. (maio/ 2015)

Dia 18 de maio Bruno um jovem de 21 anos foi assassinado na rua D em peixinhos, este

fato mobilizou a imprensa, que repercutiu, bastante, pois esse jovem estava indo para o

trabalho.

Observa-se que esses fatos acontecem diariamente e a sociedade banaliza, pois ainda

ocorre uma grande mobilização das pessoas em ver a pessoa estendida no chão e fazer

comentários diversos pejorativos a denegrindo a quem não pode se defender. Observa-se

também que a repressão em nossa comunidade e grande e a falta da prevenção e

bastante visível, basta da uma volta ao seu redor

Relato da Mãe da saudade

Mãe de Alexandre Ele era muito bom, maravilhoso, adorava ir para o grupo. Faz mais de sete anos que

morreu, mas parece como se fosse ontem, sempre deitava no meu colo para dormir. O

pai não gostava dele. A música que me faz lembrar o meu filho é obsessão é uma banda

de brega local, sempre foi muito participativo com as coisas.

Sinto meu filho todos os dias comigo, o sinto na minha cama me abraçando, ouço ele

me chamando, às vezes vejo vulto. Às vezes eu bebo, não para diversão, mas para poder

esquecer essas lembranças que me faz sofrer muito. Eu odeio o dia das mães, nesse dia

vejo meu filho me chamando, tento corresponder com o chamado, se pudesse sairia

desse lugar.

A minha historia foi muito triste, dormi na rua passei muitas dificuldades e meu filho

sofreu com a rejeição do pai, mas ele era muito suprido de carinho por todos da família.

Com a morte todos passaram a tomar remédio controlado. Quando passa um rapaz eu

fico olhando pedindo que a mãe não passe o que eu passei.

1.5 – Violência contra Crianças e Adolescentes

PELO FIM DAS MORTES DE ADOLESCENTES E JOVENS EM

CUMPRIMENTO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS EM PERNAMBUCO

(Fórum Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente de Pernambuco)

Os adolescentes e jovens das unidades de internação do Sistema Socioeducativo de

Pernambuco continuam sendo mortos, torturados, agredidos e tendo diversos outros

direitos violados. Entre janeiro de 2012 e maio de 2015, dezesseis adolescentes e

jovens, foram brutalmente assassinados dentro dos Centros de Atendimento

Socioeducativo (CASEs). Veja o histórico das mortes:

2012 10 de janeiro – CASE do Cabo de Santo Agostinho – três jovens mortos: dois

foram queimados e um decapitado.

28 de maio – CASE de Abreu e Lima – um adolescente foi morto a pauladas.

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01 de setembro – CASE de Abreu e Lima – um adolescente foi queimado até a

morte.

16 de novembro – CASE do Cabo de Santo Agostinho – um adolescente foi

morto a golpes de instrumento perfurante.

30 de novembro – CASE de Abreu e Lima – um adolescente foi esquartejado e

queimado. Partes do corpo da vítima foram jogadas para fora da unidade.

2013

08 de fevereiro – CASE de Caruaru – dois adolescentes foram queimados até a

morte.

08 de abril – CASE de Abreu e Lima – um adolescente foi estrangulado.

12 de agosto – CASE de Abreu e Lima – um adolescente foi morto em mais

uma prática de estrangulamento.

2014

06 de janeiro – CASE de Caruaru – um adolescente foi morto a golpes de

instrumento perfurante.

2015

Primeiro semestre – CASE de Caruaru – quatro adolescentes morrem como

resultado de duas rebeliões.

As tragédias, infelizmente, poderão continuar a se repetir se o Governo do Estado de

Pernambuco permanecer na postura de não tomar providências concretas para reordenar

o Sistema Socioeducativo do Estado. Ainda esperamos os resultados das investigações

que o governo disse ter realizado sobre as rebeliões e mortes ocorridas nesses anos.

Ainda esperamos que o Plano de Reordenamento do Sistema Socioeducativo de

Pernambuco seja executado como previsto e não por meio de ações paliativas. Acima de

tudo, ainda esperamos que sejam respeitados e garantidos os direitos dos adolescentes e

jovens que cumprem medidas socioeducativas neste estado, pois sem esse respeito, não

haverá paz para a sociedade e os CASEs continuaram sendo centros de direitos violados

e espaços de aprendizados de novos crimes.

Diante desta cruel realidade, o Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do

Adolescente de Pernambuco (Fórum DCA/PE) ergue a sua voz em favor da

socioeducação de adolescentes e jovens que cumprem medidas socioeducativas, ao

mesmo tempo em que se opõe ao silêncio estratégico diante das mortes de adolescentes

e jovens em conflito com a lei, à indireta permissão do Governo do Estado de

Pernambuco aos assassinatos nas unidades de internação e à defesa da redução da idade

penal como solução para a diminuição da violência no seio da juventude

1.6 - Relatório sobre as violações dos/as Crianças e adolescentes LGBT

Eleonora Pereira – Mães pela Igualdade

A violação de Direitos Humanos relacionada à orientação Sexual e identidade de gênero

presumidas das vitimas constitui um padrão em todo o mundo, envolvendo variadas

espécies de abusos e discriminações. Tais violações incluem desde a negação de

oportunidades de emprego e educação, discriminações relacionadas ao gozo de ampla

gama de direitos humanos até estupros, agressões, torturas e homicídios, e tendem a ser

agravadas por outras formas de violência, ódio e exclusão, baseadas em aspecto como

idade religião, raça/cor, deficiência e situação socioeconômica.

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Tal superposição de vitimização indica o agravamento da vulnerabilidade de grupos

sociais como pobres, quando a essa condição associam-se orientação sexual e/ ou

identidade de gênero estigmatizadas.

Violências dos mais variados tipos contra a população LGBT estão presentes nas

diversas esferas de convívio social e constituição de identidades dos indivíduos. Suas

ramificações se fazem notar no universo familiar, nas escolas, nos ambientes de

trabalho, nas forças armadas, na justiça, na polícia, em diversas esferas do poder público

– onde se manifesta a homofobia institucional.

Vale também sublinhar que a violência homofóbica é cometida contra os indivíduos

cuja orientação e/ ou identidade de gênero presumidas não se conformam à

heteronormatividade. Ou seja, são também recorrentes episódios contra sujeitos que,

apesar de se auto-identificarem como heterossexuais e/ou cisgênero, têm a eles

atribuídas características que fazem com que os perpetradores das violências os

classifiquem como LGBT.

O elevado número de adolescentes e jovens entre as vítimas de violências homofóbicas

é confirmado por sua distribuição etária, e parece indicar não apenas a confirmação de

jovens entre as principais vítimas de violências no Brasil, mas também o

empoderamento de adolescentes LGBT para a denúncia de violações desta espécie.

À faixa etária das vítimas. Percebe-se que, apesar do elevado grau de não informação

(31,7%), as vítimas concentram-se na população jovem, entre 15 e 29 anos (47,1%).

Neste universo, as vítimas entre 15 e 18 anos totalizam 16,0%, e as que têm entre 19 e

29 anos, 31,1%. O predomínio de vítimas de até 29 anos (50,3%) parece também se

relacionar com as lutas por visibilização e acesso aos direitos da população LGBT,

responsável por nomear violências e conscientizar sujeitos acerca da violação de seus

direitos.

As relações existentes entre suspeitos e vítimas que se conheciam, pode-se perceber,

que familiares (38,2%) e vizinhos (35,8%) são os mais frequentes. Entre os familiares,

destacam-se as mães que cometem violações contra seus filhos/as, com 9,5% das

ocorrências, seguidas pelos pais, com 4,8%. Sob a categoria “companheiro(a)”, estão

contabilizados maridos (0,4%), esposas (0,2%), ex-maridos (0,3%), ex-esposas (0,1%),

namorados(as) (1,9%) e companheiros(as) (6,9%)..

No que tange à faixa etária dos suspeitos, revela há elevada taxa de não informação,

com 55,2% do total. Entre as idades informadas, a faixa de jovens (de 15 a 29 anos)

conta com 18,1% do total de suspeitos, seguida pela faixa entre 30 e 39 anos, com

10,1%. As faixas etárias dos suspeitos apresentam-se muito mais variadas do que as das

vítimas, concentradas especialmente na juventude.

As violações de direitos humanos de caráter homofóbico no diz respeito ao local em que

tais violações ocorreram. Apontam que violências homofóbicas acontecem tanto em

espaços públicos (como ruas, estradas, escolas, instituições públicas, hospitais e

restaurantes) quanto em espaços privados, o que se repete entre as violações reportadas

ao poder público. 42,0% das violações ocorreram em casa – da vítima (21,1%), do

suspeito (7,5%), de ambos ou de terceiros. O segundo local de maior ocorrência de

violações são as ruas, com 30,8% do total. A homofobia estrutural da sociedade

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brasileira se verifica em casa e na rua, no público e no privado, vitimando diariamente a

população LGBT.

Pode-se verificar que violências psicológicas foram as mais reportadas, com 42,5% do

total, seguidas de discriminação, com 22,3% e violências físicas, com 40 15,9% do total

de violações denunciadas. Ressalte-se também o significativo número de negligências

(466 violações) e violências sexuais (com 337).

Dentre os tipos mais reportados de violência psicológica encontram-se as humilhações

(32,3%), as hostilizações (25,9%) e as ameaças (20,6%). Ressalte-se que as ameaças, ao

contrário do que ocorre com as duas primeiras violações. Calúnia, injúria e difamação,

também tipificadas no Código Penal, contaram com 9,7% das respostas. Vale notar que

o local em que mais foram reportadas violências psicológicas foram nas casas, com

36,9%.

A discriminação por identidade de gênero aparece como o segundo subtipo mais

reportado, com 14,1% das respostas, e se relaciona com as construções de gênero com

as quais os indivíduos se reconhecem psicológica, individual e socialmente. Aqui são

patentes especial, mas não unicamente, as transfobias, ou seja, discriminações contra

travestis, homens transexuais e mulheres transexuais. Vale também notar que as

discriminações se sobrepõem, fazendo-se presentes o racismo, a discriminação social,

contra pessoas com deficiência, religiosa, geracional, etc. O local em que mais ocorrem

discriminações reportadas são as ruas, com 33,6% do total de violações

discriminatórias.

A predominância de crianças e adolescentes entre as vítimas de negligência 70,2% das

vítimas têm até 18 anos.

As violências sexuais também se fazem presentes dentre as violações reportadas, com

337 ocorrências, equivalendo a 4,9% do total. Dentre elas foram mais reportados abusos

sexuais (utilização de um corpo para a prática de qualquer ato de natureza sexual,

coagindo a vítima física, emocional ou psicologicamente), com 60,8% é estupros,

63,5% do total de violências sexuais ocorreu no âmbito privado, dentro de casa.

1.7 – Violência no campo

CONTRIBUIÇÕES DOS POVOS DO CAMPO PARA A CONSTRUÇÃO DO INFORME PARALELO

SOBRE AS VIOLAÇÕES DOS DIREITOS HUMANOS EM PERNAMBUCO

ROSELY F. M. ARANTES - FETAPE

Falar da violência no campo não necessariamente implica falar apenas da negativa

estatal na observância do direito à terra. Significa falar dos direitos que não se efetivam

com a posse, mas na garantia de viver com a segurança legal da posse desta terra, da

disponibilidade ao acesso às políticas públicas sociais, como educação, saúde,

habitação, infraestrutura, política de crédito e de comercialização institucional,

assistência técnica, entre outras.

Falar da violência no campo implica olhar no não asseguramento de uma alimentação

adequada a partir da produção agroecológica e que não disponibiliza os alimentos em

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quantidade e qualidade suficientes para satisfazer as necessidades das pessoas. Implica

falar do direito à vida e à dignidade da pessoa humana que são negados também na

construção do território como um lugar de pertencimento dos homens e das mulheres do

campo. Por fim, a violência no campo se expressa quando se nega o direito de acesso à

terra, que na essência nega a vida.

O exercício da vida que é negado na medida em que os direitos garantidos na Carta

Magna e/ou pactuados nos tratados internacionais são violados por meio da sua não

execução. Violações denunciadas em manifestos, na militância e na abrangência das

mobilizações que reivindicam a efetivação dos direitos, do acesso à terra, da defesa dos

territórios tradicionais, da implementação de políticas públicas que criem as condições

necessárias à produção de alimentos de qualidade e ao desenvolvimento sustentável do

campo, como a Marcha das Margaridas, o Abril Vermelho, o Grito da Terra Brasil e os

locais.

Essas pautas continuam a se repetir ano a ano, o que caracteriza não apenas o

descompromisso do governo estadual, mas para além dele, comprova a inexistência de

uma política pública comprometida com a temática do campo, com a criação de

estratégias que propiciem a permanência das famílias no campo, uma convivência com

o semiárido e com a reestruturação socioprodutiva da Zona da Mata.

Em Pernambuco, estado do nordeste brasileiro, fortemente marcado por práticas

patriarcais seculares enraizadas nas relações sociais e nas diversas institucionalidades do

Estado, discutir direitos e o enfrentamento contra os latifúndios ainda é um exercício

hercúleo. Só no último ano, foram 55 casos de conflitos envolvendo as questões da

terra, água e o trabalho escravo no campo, atingindo quase 50 mil pessoas1 (Conflitos

no Campo Brasil/ 2014).

A busca pela igualdade e o enfrentamento das desigualdades do campo faz parte da

história nordestina, história esta construída em diferentes espaços e lugares com a

participação de diferentes identidades dos povos campesinos, homens e mulheres, mas

sempre com a menor visibilidade e presença política que modifique a secular condição

da vida das pessoas do campo.

Das violações no tempo de hoje

Baixa efetivação da política de Reforma Agrária

Trabalhadores acampados em áreas destinadas para a reforma agrária há 10, 12, 14 ou

mais anos sem acesso a nenhum benefício das políticas sociais; e muitas vezes, quando

se transforma em assentamentos é feita parte da infraestrutura (casa), mas não recebem

o restante dos benefícios (crédito, parcelamento das terras) impossibilitando de fato a

concretização da Reforma Agrária.

1 Importante registrar que são excluídos desses dados os casos de violência, inclusive assassinatos, que

acontecem no âmbito rural e não tenham relação com conflitos pela disputa, posse, uso ou ocupação

da terra, ou pelo acesso ou uso da água, ou na defesa de direitos por trabalho realizados no campo; 2.

Casos de conflitos pela posse, uso ou ocupação da terra em áreas urbanas. Excetuam-se os casos em

que a disputa pela terra se dá por comunidades tradicionais (indígenas, quilombolas, pescadores

artesanais, etc...) mesmo que se dê em área urbana, pois defendem um modo de vida rural. 3.

Conflitos entre latifundiários ou grandes empresários do agronegócio; e, 4. Casos de Trabalho

Escravo em atividades urbanas.

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A capacitação técnica e o acesso aos créditos de forma diferenciada e discriminatória

especialmente para a pessoa idosa, mulheres e jovens alimentando a burocracia e

dificultando o acesso às políticas.

Descaso do Estado para garantir os processos de desapropriações de terra e as

demarcações dos territórios tradicionalmente ocupados.

Educação no Campo

Segundo dados o Ministério da Educação, já somam mais de 2 mil escolas do campo

fechadas (ou extintas), no período de 1999 a 2013. Isso em decorrência de uma

determinação política do Estado de municipalizar o ensino fundamental. Como

consequência, temos:

a) o aumento da nucleação das escolas, localizando-as nas sedes dos

municípios;

b) o descumprimento da Lei nº 12.960, de março de 2014, que altera a Lei

no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da

educação nacional, para fazer constar a exigência de manifestação de órgão

normativo do sistema de ensino para o fechamento de escolas do campo,

indígenas e quilombolas. Esta lei é fruto das pressões e tensões dos

Movimentos Sociais do Campo que tem pautado a luta pela Política Pública

de Educação do Campo.

Política Salarial que gera condições de trabalho análogas à escravidão moderna.

a) Descumprimento da Legislação Trabalhista e dos Instrumentos Coletivos de

Trabalho (ex: CLT ,Convenções Coletivas, Norma Regulamentadora Rural –

NR 31). O/a assalariado/, mesmo tendo a carteira de trabalho assinada, na

maioria das vezes é vítima de trabalho indecente e degradante: atraso no

pagamento dos salários, não pagamento de verbas rescisórias, exploração no

local de trabalho com exigência de produção exaustiva levando ao

adoecimento ou até mesmo a morte do trabalhador/a, ausência e/ou desgaste

de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) além de outros

descumprimentos que ferem a lei trabalhista e as convenções trabalhistas.

b) A informalidade no meio rural. Aqui o/as assalariado/as são desprovidos de

acesso aos direitos trabalhistas legais e previdenciários, além de ficar a

mercê das precárias relações de trabalho, sendo submetidos a condições de

trabalho escravo. Esse trabalhador fica invisível à sociedade.

Saúde do Campo

a) Ausência de implantação da Política Nacional de Saúde Integrada das

Populações do Campo, Floresta e das Águas;

b) Inexistência do Programa Saúde da Família (PSF) nas comunidades rurais,

comprometendo o atendimento e acompanhamento específicos para as

pessoas idosas, mulheres, jovens e crianças;

c) Outra violação diz respeito a não priorização da Saúde do Trabalhador, pois

a Saúde é vista como um todo não fazendo o recorte as especificidades a

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saúde do trabalhador no seu local de trabalho;

d) Incentivo ao uso de agrotóxicos por meio de assistência técnica que é

disponibilizada também para todo/as o/as trabalhadores rurais.

1.8 – Violência na cidade

5 atos da violação do direito à cidade em Pernambuco (Evanildo B. Silva e Rudrigo

Rafael)

Ato número 1: O estado de Pernambuco, na última década, surge nos indicadores da economia

brasileira como um dos mais dinâmicos e atraentes para investimentos públicos e

privados. O Produto Interno Bruto (PIB) do estado suplantou durante muitos anos o PIB

nacional inserindo essa Federação entre as melhorias economias da região Nordeste,

difundindo dentro e fora do país sua alta capacidade de atração de novos negócios e de

oferta de “vantagens comparativas” adicionais. Essa realidade local foi também

responsável por instituir novas dinâmicas de produção do espaço urbano na metrópole e

em algumas cidades polos do estado. Ainda que sem enfrentar os altos déficits de

prestação de serviços públicos em moradia, saneamento, transporte e mobilidade,

resíduos sólidos, etc, o governo estadual coordenou e promoveu uma profunda

reestruturação na dinâmica urbana, notadamente sua expansão à Oeste da Região

Metropolitana e no interior da Capital.

Ato número 2: Esse modelo de desenvolvimento expressa uma contradição estrutural sobre os ideários

e os acúmulos políticos e jurídicos sobre o planejamento e ordenamento das cidades,

cujo impacto negativo estrutural ainda está por acontecer, muito embora as violações já

sejam sentidas por populações removidas para dar lugar a projetos urbanísticos de alto

luxo. Mesmo diante de todos os avanços no campo jurídico-formal e de construção de

importantes sistemas operacionalização da política urbana, o que se vivenciou nos

últimos anos no estado foi intensificação de processos de desregulação e flexibilização

da legislação, desrespeito aos espaços de participação social, repasse para a esfera

privada da prerrogativa do planejamento e regulação do solo urbano. Esse modelo de

desenvolvimento urbano expressa sim uma subordinação das cidades (e seus gestores)

aos interesses do capital imobiliário e à lógica privatizante do planejamento urbano, de

oferta pelo mercado dos serviços públicos urbanos e principalmente de sua gestão

baseada no lucro como se observa nos casos da Arena da Copa, da Parceria Público

Privado (PPP) do saneamento e do aumento das rodovias estaduais pedagiadas.

Ato número 3: Os grandes investimentos até aqui aportados para viabilizar um amplo conjunto de

empreendimentos como o Complexo de Suape, a Copa do Mundo ou mesmo os projetos

de habitação e de entretenimento de elevado padrão para o turismo acentuam as

transformações sobre o espaço urbano, produzindo um modelo de cidade que tem

aprofundado significativamente as desigualdades sociais e ambientais. Na esteira das

obras da Copa do Mundo, os projetos de mobilidade urbana não só estão paralisados

como, por exemplo, o que foi executado significou, de um lado, a expulsão de

comunidades de baixa renda de seus locais de origem e, de outro lado, a apresentação de

uma conta adicional aos cofres públicos ainda por ser totalmente revelada devido aos

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aditivos realizados sobre os contratos, o que revela a ausência de planejamento

governamental adequado e informado pelo princípio da economicidade sobre o erário

público.

Ato número 4: Esse contexto de transformação urbana se fez acompanhar do surgimento de uma

diversidade grande de conflitos urbanos devido ao caráter privatizante que está sendo

dado às cidades e ao uso do espaço urbano, ao caráter autoritário das decisões técnicas

de alocação de recursos públicos e de aprovação de projetos de alto impacto urbanístico

e ambiental sobre as áreas urbanas e, principalmente, pelas violações recorrentes dos

direitos humanos praticadas pelo estado sobre as populações removidas e ou impedidas

de sobreviverem nos seus próprios territórios de origem. A Copa do Mundo 2014

apareceu como uma síntese da violação do direito à moradia: mais de 2.000 famílias da

Região Metropolitana do Recife sofreram remoções. O Loteamento São Francisco, em

Camaragibe, onde 130 famílias foram removidas para dar lugar a um ramal e uma

estação de ônibus nunca concluídos, assim como no Coque (Recife) foram áreas

reconhecidas pela Relatoria do direito à cidade da Plataforma Brasileira de Direitos

Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais, Ambientais (Plataforma DHESCA) e pela

Relatoria para o Direito à Moradia da Organização das Nações Unidas (ONU) como

sendo exemplos de violação pela ação do estado. Sobre o Loteamento São Francisco

ficou evidenciada a inexistência de projetos alternativos à remoção, de modo que a

violação do direito à moradia ficou imediatamente caracterizada pela Relatora da ONU,

Raquel Rolnik, quando afirmou que:

“Também existe uma regra de ouro que diz que, quando acontece

uma remoção a situação da moradia da pessoa que vivia ali

nunca pode piorar. Uma opção é o reassentamento ou uma

indenização que permita que ela compre um lugar no mínimo

igual ao que tinha, e o que está acontecendo aqui é que estão

produzindo mais famílias sem-teto”. (Depoimento público de

Raquel Rolnik. Recife, 2014)

Ato número 5: Passada a Copa do Mundo ainda permanece viva a incapacidade de prevenir e mediar

conflitos fundiários pelo estado. Na capital, casos como o da Comunidade Vila Oliveira,

das ocupações Olga Benário e Cacique Chicão se mostraram emblemáticos. O

Judiciário, por sua vez, no caso da comunidade de Passarinho, agiu com senso de

prevenção: após a expedição de uma reintegração de posse e uma forte mobilização

social, este se mostrou habilitado a se mover com justeza diante do risco de uma

violação e reviu a sentença, evitando a expulsão de mais de 5.000 famílias de uma área

ocupada há décadas. No caso do projeto imobiliário Novo Recife – cuja resistência

social se deve às movimentações do “Ocupe Estelita” – se pode testemunhar uma gama

abrangente de violações do direito à cidade pelo governo municipal do Recife e pela

Câmara de Vereadores. Esse empreendimento prevê a construção de várias torres de até

40 pavimentos no Cais José Estelita. É parte de uma negociação envolvendo o

Consórcio Novo Recife que é formado pelas corporações da construção civil Moura

Dubeux, Queiroz Galvão, G.L. Empreendimentos e Ara Empreendimentos. Em termos

jurídicos se constata a omissão do poder público quanto ao exercício de sua função

reguladora tanto da atividade econômica como dos impactos urbanísticos sobre o

conjunto da região afetada. A legislação federal tem sido violada em favor do projeto,

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assim como o ritual de sua aprovação (O Conselho das Cidades não foi ouvido) e, por

essa razão, o Ministério Público de Pernambuco (MPPE) ingressou com ação civil

pública no Tribunal de Justiça de Pernambuco pedindo para que seja declarada a

nulidade da Lei nº 18.138/2015 (Lei que institui o Plano Específico para o Cais José

Estelita, Santa Rita e Cabanga). O fato é que o projeto foi aprovado pela Câmara dos

Vereadores (04/05/15) e sancionado nesse mesmo dia pelo prefeito do Recife (essa Lei

foi publicada no Diário Oficial do Município no dia seguinte) e até o momento o

município não se posicionou para o Ministério Público de Pernambuco.

1.9 - VIOLAÇÕES NAS COMUNIDADES TRADICIONAIS DE

PESCADORES(AS)

PESCADORES, PESCADORAS ARTESANAIS E A NEGAÇÃO DOS DIREITOS

TERRITORIAIS: ECONÔMICOS, SOCIAIS, AMBIENTAIS E TRABALHISTAS

Severino Antônio e Laurineide Maria Santana- CPP-NE

Os planos de privatização de corpos d’água para os projetos AQUICULTIVOS, seja do

mar ou seja dos rios, estão em curso desde 2003, contudo, apenas nos últimos anos

visualizamos os seus efeitos de maneira mais evidente. Neste contexto, ocorreu: a

aprovação da Lei4.895/29103; as investidas do então Ministério da Pesca e Aquicultura

(MPA) para desregulamentar leis ambientais que protegiam os ecossistemas; os

investimentos maciços em infraestrutura e desenvolvimento de tecnologias voltadas

para o hidro-negócio; e a consolidação de alianças com setores do empresariado

interessados nesta fatia do mercado voltado para exportação.

A CARCINOCULTURA tem deixado no mundo inteiro um rastro de insustentabilidade

e representa uma das atividades que mais degrada áreas de manguezais e reduz o habitat

de numerosas espécies. Essa destruição dos manguezais e de outros ecossistemas

costeiros e águas de interiores segue avançando, e a ela se soma uma violação

sistemática dos direitos humanos e ambientais dos povos das águas do mar, dos

mangues, das lagoas, dos açudes e dos rios. As fazendas de carcinocultura utilizam

metabissulfito de sódio e antibióticos em grande quantidade que contaminam as águas e

representam um significativo impacto potencial para a saúde humana. Hoje no estado de

Pernambuco, a carcinocultura está mergulhada em falência, os cultivos de camarão

dizimados por graves doenças virais, como a mancha branca e a mio necrose infecciosa,

muitos tanques estão abandonados e muitas áreas degradadas.

Outro impacto da criação de camarão está na contaminação ou salinização dos poços

artesianos das comunidades locais, como é o caso da comunidade do Guaiamum, no

município de Sirinhaém, onde aproximadamente 20 famílias tiveram seus poços

artesianos salinizados por conta das áreas onde foram instalados os tanques da

Carcinocultura “ Costa Dourada”.

As Comunidades Pesqueiras e o Turismo

As comunidades pesqueiras habitam áreas costeiras e ribeirinhas que foram preservadas

com sua beleza e riqueza de recursos naturais por gerações. Estas áreas estão cada vez

mais sendo cobiçadas pela crescente perspectiva do avanço de empreendimentos do

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TURISMO (hotéis de luxo, Náutica de Lazer). Este modelo causa a expulsão das

comunidades tradicionais para dar lugar aos grandes empreendimentos que, em geral,

não prezam pela conservação dos ambientes aquáticos que dão sustentação à atividade

pesqueira.

Com o proposito de alavancar o TURSIMO, o Governo de Pernambuco adotou no início

dos anos 2000 o programa PRODETUR 1 e 2 que se somou aos mega empreendimentos

turístico desenhados para o Litoral Sul e tendo como foco as praias do município de

Ipojuca (Porto de Galinhas) e Sirinhaém (Guadalupe) e o Complexo Paiva no Cabo de

Santo Agostinho. A ocupação do litoral pernambucano pelo grande empreendimento se

mostrou excludente e totalmente ameaçador para a continuidade do modo de vida das

comunidades tradicionais locais.

Esse modelo de turismo traz também a prostituição, o tráfico e o consumo de

entorpecentes pelos jovens locais. Além de provocar deslocamento de comunidades

tradicionais pesqueiras para áreas distantes das praias, como hoje a comunidade do Soco

em Porto de Galinha, e a Vila dos Pescadores em A-Ver-o-Mar (Sirinhaém).

As Comunidades Pesqueiras e Avanço Industrial.

As ações do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), protagonizadas pelo

governo federal e estadual, avançaram nos últimos anos com o apoio aos grandes

projetos, funcionando assim como implementador de infraestruturas de apoio aos planos

de desenvolvimento do Nordeste – o “chamado vocacional da grande região Nordeste”.

Obras como as grandes barragens, montadora de automóvel, estaleiros naval, refinaria

de petróleo, os investimentos para o turismo etc se beneficiam de interesses privados e

da lógica do mercado em detrimento dos direitos da coletividade e de territórios

tradicionalmente ocupados.

Em Pernambuco, por exemplo, vale destacar empreendimentos como: Porto de SUAPE,

Refinaria Abreu e Lima, o Estaleiro Naval Atlântico Sul - e ainda há anúncio da

instalação de mais 05 estaleiros que ocuparão uma área de 443,5 hectares em áreas de

manguezal com investimento de 4 bilhões de reais, no Litoral Sul; o Polo Automotivo

de Goiana – capitaneado pelo empreendimento Fiat, Polo Farmaquímico, indústrias de

bebidas e projetos de instalação de um terminal portuário, no Litoral Norte; além dos

projetos de engodamento de praia e de navegabilidade dos rios Capibaribe e Beberibe,

na Região Metropolitana.

Por consequência desse avanço industrial, os pescadores e agricultores, principalmente

de Cabo de Santo Agostinho, estão perdendo seus territórios tradicionais. A produção

pesqueira diminuiu em média 80%, e esses grupos perderam o livre acesso ao mar e aos

espaços de moradia.

Pesca Artesanal, Gênero e Saúde da mulher Pescadora

Historicamente as diferenças biológicas foram utilizadas como justificativa para a

discriminação das mulheres. Essa construção social relegou as mulheres ao espaço

doméstico na tentativa constante de negação de sua importância econômica e social.

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As pescadoras compõem em média 50% da força de trabalho deste setor pesqueiro em

Pernambuco. No entanto, elas são invisibilidades nas políticas públicas e investimentos

em âmbito das políticas para a pesca.

Na pesca, o exercício da atividade da mariscagem, em que muitas mulheres trabalham

mergulhadas na lama e na água por horas, com posição envergadas que podem lhes

garantir, no futuro, problemas de coluna e até Lesões por Esforço Repetitivo (LER);

além de desenvolver diversas doenças (pele, visão, contaminação), não possui uma

política de saúde que trate de prevenção, tratamento.

O MPA, através de normatização, está definindo estratégias de exclusão dos pescadores

artesanais e em especial das pescadoras, já que vem desconsiderando o regime de

economia familiar.

Para o estado de Pernambuco, o RGP registra 13.128 pescadores e pescadoras

cadastrados. (Fonte: RGP, 2012), do total de pescadores e pescadoras cadastrados no

RPG, 99,16% são pescadores artesanais. (Fonte: RGP, 2012);, deste em 2014, foram

cancelado 4.300 RGP.

A lei 11.959\2009 define atividade pesqueira no¨Art. 4o A atividade pesqueira

compreende todos os processos de pesca, explotação e exploração, cultivo, conservação,

processamento, transporte, comercialização e pesquisa dos recursos pesqueiros¨. No

Parágrafo único. Consideram-se atividade pesqueira artesanal, para os efeitos desta Lei,

os trabalhos de confecção e de reparos de artes e petrechos de pesca, os reparos

realizados em embarcações de pequeno porte e o processamento do produto da pesca

artesanal.

Neste contexto, o decreto 8.424 exclui do RGP as pescadoras, que estão diretamente

envolvidas na cadeia produtiva da pesca, o que as impede de acessar os direitos

previdenciários e trabalhista, ampliando a dívida social do Estado para com a categoria

da pesca artesanal.

1.10 – Violência no sistema carcerário

ARTICULAÇÃO ONG -AIDS/ PASTORAL DA AIDS Regional NE2/CNBB

Breve relato dos presos acerca da situação prisional dos estabelecimentos prisionais da

regional metropolitana do Recife durante visitas da Articulação ONG´S-AIDS e pastoral

da Aids aos presos infectados pelo vírus HIV/AIDS nas unidades prisionais da RMR..

Problemas:

Superlotação acima do normal - Grande déficit de vagas;

Redução da quantidade de alimentos fornecidos semanalmente aos presos

em detrimento do aumento da população carcerária da RMR;

Número de agentes penitenciários insuficientes para dar conta do

quantitativo de presos, o que influi na quantidade de horas de banho de sol

por pavilhão;

Racionamento excessivo de água e armazenamento de água em garrafas

peti;

Falta de manutenção do prédio/estrutura física das unidades prisionais,

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muitas goteiras e infiltração;

Enfermarias sem infraestrutura: cama sem colchão, papelão utilizado como

colchão nas camas e utilizados como camas no chão;

Presos que não tem necessidade de permanecer na enfermaria estão

ocupando o espaço daqueles que realmente se encontram doentes;

O presídio feminino Bom Pastor, não tem enfermaria, apenas atendimento

emergencial;

Na maioria das unidades não tem carro, nem escolta para atendimento de

emergência aos presos (as);

No HCTP não tem mdico psiquiatra de plantão 24 horas;

Falta quem vai buscar no hospital de referência o medicamento para pessoas

vivendo com HIV/AIDS;

Faltam insumos e medicamentos para atendimentos de urgência nas unidades

prisionais;

Número insuficiente de ttécnicos(advogados, médicos, psicólogos,

assistentes sociais, enfermeiros(as) dentistas, técnico em saúde bucal, técnico

em enfermagem para atender · população carcerária;

Falta escolta para levar os presos para audiência;

Falta medicamentos controlados para pacientes diabéticos, com transtorno

mental, dentre outros, para os presos;

Violação de direitos quanto ao tratamento dispensado aos presos por agentes

e policiais militares em relação aos familiares durante a entrada das visitas;

As unidades prisionais não oferecem banheiros suficientes para as visitas;

Não são realizadas campanhas de prevenção de DST´s – HIV/AIDS, teste

rápido Sistematicamente;

Os presos informam que nas unidade prisionais, a tortura continua muito

forte;

O chaveiro e sua equipe, ainda uma figura marcante nas unidades prisionais

na RMR. OBS: chaveiro aquele preso que manda no pavilhão, ou seja, preso

mandando em preso, bem como sua equipe tem os mesmos poderes, ou seja

uma hierarquia de poder;

Proibição da utilização de máquinas fotográficas no interior das unidades

prisionais por equipes de direitos humanos. Proibição essa determinada pelo

Secretário de ressocialização de PE;

Presos Estuprando presos nas unidades prisionais;

Muitos presos dormindo nos corredores dos pavilhões dos estabelecimentos

prisionais;

A comunidade LGBT ainda sobre muita violação de direitos, agressões

físicas e verbais nas unidades prisionais masculinas da RMR;

A consequência da dívida das drogas: brigas, mortes, tortura, submete a

família a pagar a dívida com dinheiro ou sexo por parte das irmãs, esposas e

filhas.

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1.11 – Violência contra a população LGBT

Violações de Direitos Humanos da População LGBT (Rildo Véras Martins)

Em tempos de permanente enfrentamento ideológico entre setores conservadores da

sociedade de um lado e, do outro, defensores de direitos humanos, o Brasil enfrenta

grandes dificuldades para assegurar direitos historicamente conquistados com árduas

lutas sociais.

Dentre as violações de direitos que acometem a população LGBT (Lésbicas, Gays,

Bissexuais,Travestis e Transexuais) a violência, em suas diversas faces, constitui-se

enquanto desafio primordial que exige de gestores públicos e da sociedade civil

organizada redobrada atenção. Segundo o “Relatório sobre a violência homofóbica no

Brasil: ano 2012”,da Secretaria de Direitios Humanos da Presidência da República, a

partir de denúncias feitas ao “Disque 100” foram registradas 3.084 denúncias de 9.982

violações relacionadas à população LGBT, envolvendo 4.851 vítimas e 4.784 suspeitos.

Em relação a 2011 houve um aumento de 166,09% de denúncias e 46,6% de violações,

quando foram notificadas 1.159 denúncias de 6.809 violações de direitos humanos

contra LGBTI, envolvendo 1.713 vítimas e 2.275 suspeitos.

Centrando o olho na região Nordeste – historicamente marcada pela desigualdade sócio-

político-econômica em relação a outras regiões do Brasil – mas, também, celeiro de

grandes lutas sociais, da mobilização de diversas organizações da sociedade civil e de

riqueza cultural, percebemos que ainda impera o machismo, a

homofobia/lesbofobia/transfobia que se materializam em práticas discriminatórias,

desigualdade no acesso aos direitos, discursos preconceituosos e violências diversas. A

tabela a seguir nos dá uma noção sobre o aumento de tais violações embasadas na

orientação sexual e identidade de gênero:

UF 2011 2012 % Aumento

AL 17 65 282,35%

BA 94 201 113,83%

CE 63 143 126,98%

MA 67 105 56,72%

PB 28 94 235,71%

PE 52 115 121,15%

PI 107 68 -36,45%

RN 22 75 231,82%

SE 7 31 342,86%

Fonte: Governo Federal, 2012.

Vale salientar que os dados apresentados não representam o todo das violações, mas nos

dão apenas uma idéia da dimensão do problema, que é significativamente maior diante

da existência de elevada subnotificação (mesmo tendo o número de denúncias ao

Disque 100 aumentado em 2012). E ainda que existam em quase todos os estados

nordestinos organismos de políticas públicas LGBT - inclusive com centros de

referência - há uma escassez de informações, fruto da fragilidade de tais políticas. Até

mesmo em estados e municípios com legislações que visam coibir preconceitos e

discriminações tal fragilidade é preponderante. Outro fator que contribui para o

agravamento dessa realidade é que não é constante, todavia, entre a população brasileira

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e, em especial, a nordestina a boa prática de denunciar toda e qualquer violação de

direitos por acreditar que a denúncia não produzirá efeito, ou seja, não contará com a

devida importância e encaminhamento pelo poder público. Esta forma de perceber a

realidade só fortalece a situação de vulnerabilidade social dessa população.

Em sua face mais cruel, as violações de direitos LGBT expressam-se nas diversas

formas de violência que acometem essa população: física, moral, psicológica, etc, sendo

o enfrentamento aos homicídios um dos principais desafios postos a gestores públicos.

Como exemplo de atuação governamental nesse sentido, em Pernambuco, o Centro

Estadual de Combate à Homofobia – CECH, órgão do Governo do Estado, deu

andamento à coleta de dados realizada inicialmente pela ONG Movimento Gay Leões

do Norte sobre os casos de homicídios publicados pelos principais jornais do estado

(Folha de Pernambuco, Jornal do Comércio e Diário de Pernambuco), além do

acompanhamento dos casos junto à polícia, rede de serviços e lideranças LGBT locais e

familiares das vítimas. O estado de Pernambuco tem sistematicamente figurado entre os

três primeiros lugares onde mais se assassinam LGBT. Por outro lado, a carência de

dados qualificados de outros estados da região pode influenciar na credibilidade desta

informação.

Os assassinatos LGBT dispõem de perfil e metodologia específicos, ou seja, em sua

maioria ocorrem com requintes de crueldade, (com pauladas, pedradas, facadas,

espancamentos, etc). Diante da invisibilidade decorrente do preconceito de parentes e

familiares que optam pelo anonimato dos casos e pela negação da condição sexual das

vítimas, poucos são, ainda, os casos registrados.

Assassinatos contra LGBT em Pernambuco por ano (2012-2014)

2012 2013 2014

34 42 22 Fonte: Centro Estadual de Combate à Homofobia – CECH, 2014 – Governo de Pernambuco.

Sendo a violência um problema social, esta se apresenta em diferentes formas e

proporções a depender de fatores variados: condição social, gênero, orientação sexual e

identidade de gênero, cor da pele, escolaridade, dentre outros. Em casos que dizem

respeito à população LGBT as informações dão conta, ainda, de que existem tipos de

violência específica para cada categoria. A principal violação de direitos das lésbicas

são conflitos familiares e com vizinhos. Gays e bissexuais também têm nos conflitos

familiares a principal forma de violência, chegando a conseqüências extremas como a

expulsão de seus lares. No tocante às travestis, as maiores demandas são a retificação de

registro civil e a dificuldade de inserção no mercado de trabalho. Por sua vez,

transexuais femininas demandam mais em função de discriminação em espaços públicos

e privados, conflitos entre vizinhos, conflitos relacionados à identidade de gênero,

intolerância religiosa, cirurgia de redesignação sexual e retificação de registro civil. E os

transexuais masculinos denunciam sérias dificuldades de inserção no mercado de

trabalho, de realização de cirurgias de transgenitalização, conflito familiar e retificação

de registro civil.

Em vista do exposto, o movimento LGBT brasileiro tem atualizado suas pautas

reivindicatórias, de modo que as principais bandeiras de luta giram em torno de: I-

criminalização da homofobia; II- enfrentamento das diversas formas de violência, com

destaque para os assassinatos de LGBT; III- inclusão no mercado formal de trabalho

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(principalmente da população de travestis e transexuais) e IV- aprovação do Estatuto da

Diversidade Sexual, que conta com a parceria e defesa da Ordem dos Advogados do

Brasil (OAB).

Com a luta pela garantia dos direitos humanos LGBT não se quer retirar direitos dos

heterossexuais para dar aos homossexuais, mas assegurar a cidadania plena para quem

não se acostuma a viver à margem da sociedade. E mais que isso, trata-se de garantir o

direito fundamental à vida, porque concretamente, nesse país, pessoas ainda são mortas

pelo fato de ousarem expressar a sexualidade de forma diferente daquela que

convencionou categorizar como normal e padrão.

1.12 Violações de direitos junto a população Trans

Glayciane Andrade – AMOTRANS/PE

A luta pelos direitos humanos de travestis e transexuais, onde faço parte de uma

instituição na função de vice- coordenadora da Amotrans-pe, (Articulação e Movimento

para travestis transexuais de Pernambuco, considerando tudo que foi relatado sobre a

violação de direitos humanos na população LGBT no nosso estado de Pernambuco,

tendo em vista que Pernambuco precisa melhorar muito no campo de politicas de

governo voltada para essa população que ainda é alvo das injustiças sociais,

principalmente com relação as pessoas trans ainda são as pessoas mais estigmatizada

dentro desse contexto de violação, pessoas tendo suas vidas ceifadas como vem

ocorrendo nacionalmente, como foi citado sofremos todo tipo de violência no nosso

cotidiano, a física, verbal e psicológica , vejo que ainda nesse estado vem se

predominando a forte intolerância principalmente do fundamentalismo religiosos com

relação a população LGBT, a cada dia vem aumentado esse ciclo pessoas.

E por fim ressalto ainda: não há o reconhecimento do uso nome social das pessoas trans

e identidade de gênero nos locais públicos, as pessoas ainda nos hostilizam e nem

respeitam nossa condição de pessoas trans, seja feminino ou masculino. E, também,

quando necessitamos de irmos ao banheiro somos barrada; direito ao mercado de

trabalho ainda sofremos pela exclusão e toda forma de preconceito e intolerância nos é

posta. Tivemos uma portaria aprovada do uso nome social para travestis e transexuais

desde 2011 em Pernambuco, mais ainda encontramos resistência das pessoas a não nos

respeitar por sermos pessoas trans seja ela feminino ou masculino, isso também é uma

forma de violação de direitos humanos.

1.13 - A Comunicação como um Direito Humano e as várias violações praticadas

pelos meios de comunicação hegemônicos locais.

Comunicação como direito humano: violações em Pernambuco (Ivan Morais)

Em 28 de julho de 2010, foi encaminhada ao Ministério Púbico de Pernambuco (MPPE)

uma denúncia de violação aos direitos humanos pelo programa Bronca Pesada,

apresentado pelo âncora Joslei Cardinot. Desta vez, o alvo das violações foi a religião

de matriz africana da qual faz parte o babalorixá Ivon D’Oya. Na matéria, no decorrer

da exibição, o telespectador ouve o som de uma galinha cacarejando. Na edição de

imagens vê-se fotos do terreiro do Babalorixá ao som do cacarejar da ave. “Abri minha

casa para a equipe de reportagem, abri o meu sagrado, a minha religião para que eles

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fizessem uma reportagem respeitosa, como nossa religião merece. Mas tiraram foi

onda, nos desrespeitaram”, diz. Mais em: http://ombudspe.org.br/analises/bronca-

pesada-e-o-desrespeito-as-religioes-de-matriz-africana/

Em 14 de setembro de 2011, o programa Cardinot Aqui na Clube, da emissora TV

Clube, veiculou cenas da execução de um rapaz, gravadas por cinegrafista amador,

numa clara apologia da violência e violação da dignidade da pessoa humana e de sua

memória. Tais cenas foram gravadas pelo Centro de Cultura Luiz Freire e

encaminhadas, junto a uma representação, ao Conselho de Ética do Sindicato do

Jornalistas de Pernambuco (SinjoPE) e à Frente Parlamentar de Comunicação de

Pernambuco (FPComPE), mas – na ocasião – nada foi feito. Mais em:

http://ombudspe.org.br/artigos/tragedias-na-hora-do-almoco/

Em 3 de setembro de 2012, o Instituto Pró-Vida publicou uma peça publicitária que

fazia parte da campanha “Pernambuco não te quer – Homossexualismo”, na Folha de

Pernambuco e no Diario de Pernambuco. Mais em:

http://ombudspe.org.br/noticias/dois-anos-apos-campanha-homofobica-justica-

pernambucana-proibe-a-publicidade-ofensiva-aos-direitos-humanos/

De 2012 até os dias atuais, o movimento #ocupeestelita, que propõe a discussão pública

e democrática sobre o uso público do terreno localizado no Cais José Estelita, em

oposição aos interesses do capital imobiliário, tem sido invisibilizado e/ou

criminalizado pela maior parte da mídia comercial pernambucana, que tem evitado o

debate público e promovendo a iniciativa chamada “Novo Recife”, ao invés de informar

a população sobre ela. Durante esses anos, jornalistas e colunistas foram impedidos de

escrever sobre o tema nos jornais em que atuam/atuavam Mais em:

https://direitosurbanos.wordpress.com/2013/10/07/a-servico-do-progresso-semioforo-

ideologia-e-sobre-como-o-jornal-do-commercio-tornou-se-porta-voz-do-consorcio-

novo-recife/ e em http://ombudspe.org.br/artigos/censura-do-diario-de-pernambuco-a-

clovis-cavalcanti-pode-ser-a-ponta-de-um-iceberg/

Na mesma época, eventos que envolviam a desapropriação de pessoas residentes em

áreas “afetadas” pela Copa do Mundo também foram solenemente ignorados pela mídia

comercial pernambucana, alijando essas pessoas da voz que precisavam para que

fossem fazer seus direitos. Durante o processo, centenas perderam suas casas (e ainda

não foram indenizadas). Algumas, não suportando a pressão da perda, acabaram

falecendo. Mais em http://ombudspe.org.br/artigos/por-que-a-midia-nao-fala-nas-

desapropriacoes-da-copa-em-pernambuco-uma-entrevista-com-eduardo-amorim-do-

midia-capoeira/

Em Pernambuco, o poder judiciário por vezes também coaduna-se em mecanismos de

censura. Caso importante foi o ocorrido em setembro de 2013, quando o Diário de

Pernambuco e o Jornal do Commercio, dois dos maiores veículos de comunicação de

Pernambuco, foram proibidos de citar o nome e veicular a imagem do presidente da

Assembleia Legislativa de Pernambuco, Guilherme Uchoa (PDT), por uma liminar

concedida pelo juiz Sebastião de Siqueira Sousa. A decisão atingiu também a TV Clube.

A censura, depois retirada, foi direcionada a matérias sobre um polêmico caso de

concessão de guarda de um bebê investigado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ)

envolvendo a filha do político, a advogada Giovana Uchoa. O parlamentar entrou com o

pedido de suspensão das publicações sob a alegação de que as reportagens são

tendenciosas e de que seu nome e imagem estão sendo prejudicados indevidamente,

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dando a impressão de que é ele o envolvido. Mais em https://knightcenter.utexas.edu/pt-

br/blog/00-14349-em-mais-um-caso-de-censura-judicial-jornais-de-pernambuco-sao-

proibidos-de-citar-nome-, em http://ultima-

instancia.jusbrasil.com.br/noticias/100670734/oab-pe-condena-censura-a-imprensa-de-

pernambuco e em http://www.anj.org.br/anj-protesta-contra-censura-em-pernambuco

Durante as investigações e divulgação de notícias sobre a Operação Lava Jato, a

imprensa pernambucana esquivou-se de divulgar qualquer fato que pudesse manchar a

imagem do ex-governador Eduardo Campos e de integrantes do poder judiciário

pernambucano, mesmo que seus parceiros nacionais publicassem tais notícias. Os

episódios foram denunciados pela Comissão de Ética do Sindicato dos Jornalistas. Mais

aqui http://noeliabritoblog.blogspot.com.br/2014/10/comissao-de-etica-do-sinjope-

alerta.html e aqui

https://www.facebook.com/sinjope/photos/a.406478682770126.96255.40283669980099

1/623335971084395/

Sobre a gestão Eduardo Campos anotam-se outros casos de censura. Algumas, de forma

direta, negociando a retirada de notícias diretamente com os gestores dos veículos;

outras vezes a partir do uso do poder judiciário, como se pode ver aqui

http://jornalggn.com.br/documento/pernambuco-censurado-sindicato-dos-jornalistas-

manifesta-preocupacao-de-censura-por-parte-do-governo-eduardo-campos-e-

Protestos das mais diversas ordens, na Região Metropolitana do Recife, via de regra são

noticiados a partir dos ‘prejuízos’ que causam ao trânsito do que – como seria legítimo –

a partir das demandas das comunidades e grupos envolvidos. Particulamente afetados

por esta criminalização estão movimentos como o dos trabalhadores sem terra e o dos

estudantes que anualmente vão às ruas contra os já tradicionais aumentos na passagem

de ônibus. Mais em: http://ombudspe.org.br/artigos/o-aumento-de-passagem-as-

manifestacoes-e-os-jornais/ e em http://ombudspe.org.br/artigos/o-

%E2%80%9Ccaos%E2%80%9D-midiatico-e-a-legitimacao-da-ordem/

No dia 7 de abril de 2015, o colunista Robson Sampaio, da Folha de Pernambuco,

publicou em sua coluna de opinião “Folha da Cidade” uma nota em que repudiava um

programa televisivo que supostamente estaria estimulando a efeminação de meninos e

que estaria colaborando com o fim dos “homens de antigamente”. Mais em:

http://ombudspe.org.br/noticias/estudantes-de-jornalismo-da-ufpe-repudiam-

preconceito-de-genero-de-colunista-da-folhape/

Os movimentos sociais que atuam para a garantia do direito à comunicação consideram

a existência e independência de meios públicos, populares, independentes e

comunitários uma saída importante para diluir o chamado “monopólio da mídia

comercial”. Para isso, depois de muita luta, foi criada em 2013, a Empresa Pernambuco

de Comunicação que teria essa tarefa.

Até hoje, porém, a EPC não conta com recursos humanos e materiais para que possa

cumprir seu papel. Mais em http://ombudspe.org.br/noticias/ato-pela-ressurreicao-da-tv-

pernambuco-usa-o-bom-humor-para-protestar-contra-falta-de-recursos-para-a-midia-

publica/

No âmbito municipal do Recife, também foi promessa – não cumprida – de campanha a

instalação da Rádio Frei Caneca FM, pública, que deveria funcionar como instância de

participação popular na arena pública de discussão de temas relevantes para a cidade.

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Mais em: http://ombudspe.org.br/noticias/a-frei-caneca-ta-pra-sair-ta-mesmo/

No que diz respeito ao trabalho de jornalistas, esses profissionais são muitas vezes

impedidos de trabalhar e ameaçados pela polícia ou por outros sujeitos interessados em

coibir sua atuação de forma livre. Alguns episódios foram denunciados pelo Sindicato

dos Jornalistas nos últimos anos, como este http://www.sinjope.org.br/noticias-

detalhe.php?idNoticia=4200, este http://www.sinjope.org.br/noticias-

detalhe.php?idNoticia=4251 e este http://www.sinjope.org.br/noticias-

detalhe.php?idNoticia=4287

“O QUE PROPOMOS”

Inclusão de área específica no Portal da Transparência para a publicação, a cada

trimestre, dos gastos com comunicação e publicidade, classificados por tipo de

veículo de comunicação, empresa contratada e serviço prestado;

Apoio às tevês, rádios e outros meios públicos, populares, livres e comunitários,

inclusive através de acesso democrático a fundos que garantam seu

funcionamento e independência;

Interrupção imediata de anúncios publicitários oficiais em veículos de

comunicação que mantém programas/colunas que comprovadamente violam

direitos humanos de forma sistemática;

Fortalecimento da Empresa Pernambuco de Comunicação, que deverá ser

contemplada com recursos financeiros, técnicos e humanos adequados ao seu

funcionamento e transmissão de qualidade para todo o estado;

Instituição, nas escolas do ensino público, da disciplina de “Educação para a

Mídia”, de forma a contribuir para a leitura crítica dos meios de comunicação no

nosso Estado;

Instauração do Conselho Estadual de Comunicação, com maioria (eleita) da

sociedade civil, que terá entre suas prerrogativas propor e fiscalizar as políticas

públicas de comunicação do governo, como a destinação da verbas publicitárias

e o fortalecimento da mídia pública;

Incentivo a redes livres via pontos de cultura, telecentros, radios comunitárias e

estímulo direto a criação de provedores comunitários;

Criação de conselho e fundo para políticas de inclusão digital e banda larga,

buscando parcerias com o Programa Nacional de Banda Larga;

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II – O ESTADO DA ARTE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE PROTEÇÃO AOS

DIREITOS HUMANOS

2.1 Violação de Direitos na Assistência à Saúde da Mulher em Pernambuco.

Fórum de Mulheres de PE.

Violação de Direitos na Assistência à Saúde da Mulher em Pernambuco.

O conceito de saúde da mulher incorpora hoje o reconhecimento e efetivação dos

direitos sexuais e direitos reprodutivos como direitos humanos das mulheres, com

ênfase na melhoria da atenção obstétrica, planejamento familiar, atenção ao

abortamento inseguro; prevenção e tratamento dos agravos decorrentes da violência

doméstica e sexual, prevenção e tratamento das mulheres vivendo com HIV/Aids e

ainda cuidados às mulheres com doenças crônicas de diferentes tipos, atenção à saúde

mental, prevendo ainda ações diferenciadas para as diferentes faixas etárias das

mulheres.

O movimento de mulheres é um dois sujeitos políticos construtores da política de

atenção à saúde da mulher no Brasil e no mundo. Em Pernambuco, desde muitos

anos, o Fórum de Mulheres de Pernambuco articula a luta das mulheres pelo direito à

saúde em torno à duas prioridades: 1) a qualidade de atenção à saúde a rede SUS e 2) a

assistência à saúde da mulher. Nesta perspectiva o Fórum de Mulheres organiza sua

atuação na Conferencia Estadual de Saúde de Pernambuco, prevista para outubro, e

elabora um dossiê a partir de escuta às mulheres e coleta de informações junto às suas

militantes que integram conselhos de saúde municipais e/ou conselhos gestores de

algumas unidades de saúde no estado. Deste dossiê em elaboração destca-se aqui os

seguintes dados e informações:

Desmonte das Equipes Médicas

– Foram fechados 15 leitos da clínica médica do Hospital Barrão de Lucena, a UTI de

Neonatologia e o plantão noturno de pediatria do Hospital Maria Lucinda, com metade

da equipe pediátrica demitida;

– todos os pediatras da UPA do cabo de Santo Agostinho foram demitidos;

– todos os pediatras da UPA Imbiribeira foram demitidos;

– UPAS estão trabalhando com cota de 30 atendimentos máximo por dia(!)

Esta situação deixa as mulheres sobrecarregadas e sem apoio algum nos cuidados à

saúde de crianças e urgências domésticas e familiares que ocorrem diariamente.

Violação às normas técnicas e protocolos em saúde: Por todo o estado são recorrentes

os testemunhos de mulheres quanto aos maus tratos em caso de abortamento e parto.

Nos serviços não especializados as mulheres em situação de abortamento sofrem com a

falta de acolhimento, são preteridas no atendimento, agredidas verbalmente, mesmo

aquelas que tem o procedimento garantido por lei, ou seja, em caso de estupro. A

orientação conservadora religiosa tem prevalecido sob os protocolos da política pública,

situação que se agrava pela política de gestão através de OSCs muitas das quais tem

seus procedimentos influenciados por preceitos religiosos com a conivência da gestão

pública.

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Prática de violência obstétrica de vários tipos. As mulheres descrevem casos de

violência em várias cidades do estado: uso de medicamentos para apressar o trabalho de

parto mesmo sem a gestante querer; impedimento da presença de acompanhantes na

hora do nascimento; imposição da posição do parto, sem consulta à parturiente; fazer

sucessivos procedimentos na grávida sem explicar quais são e seus porquês; uso de

linguagem grosseira e intimidadora na sala de parto, durante o trabalho..

Falta de leitos. A gestão de leitos nas maternidades têm sido precária e não garante

atenção de qualidade. As mulheres continuam peregrinando entre diferentes municípios

para conseguir assistência ao parto em maternidade, sem contar com serviços de

transferência entre maternidades de forma adequada e muitas vezes se vem obrigadas a

buscar atendimento arcando com os custos de deslocamentos. Por vezes após mais de

um deslocamento, partos ocorrem de forma improvisada na entrada de maternidades e

nas próprias ambulâncias. A lei de acompanhante não está sendo cumprida na maioria

das unidades. As UTI das maternidades são exclusivamente neonatais, atendem apenas

as crianças, enquanto as mulheres, em casos de emergência, tem de ser deslocadas a

outra unidade de saúde aumento os riscos de morte.

Alto índice de cesarianas em Pernambuco. A alta de incidência de cesarianas é um

dos principais problemas apontados pela pesquisa do Comitê Estadual de Estudos da

Morte Materna em Pernambuco (CEEMM-PE): a média é de 54,5% cesarianas nos

hospitais da 1ª Gerência Regional de Saúde (Geres). A recomendação da Organização

Mundial de Saúde (OMS), atualizada em abril deste ano, é a realização de cesariana

somente quando há razões médicas para cirurgia. Até então, a OMS recomendava que as

cesáreas representassem entre 10% e 15% dos partos.

Fazem parte da 1ª Geres os hospitais das cidades de Abreu e Lima, Araçoiaba, Cabo de

Santo Agostinho, Camaragibe, Chã Grande, Chã de Alegria, Glória de Goitá, Fernando

de Noronha, Igarassu, Ipojuca, Itamaracá, Itapissuma, Jaboatão dos Guararapes,

Moreno, Olinda, Paulista, Pombos, Recife, São Lourenço da Mata e Vitória de Santo

Antão.

Suspensão no fornecimento de medicamentos, entre eles antirretrovirais

(medicamentos para a aids) indispensáveis ao tratamento e manutenção da qualidade de

vida das pessoas com HIV/aids. Novamente a política de terceirização impacta o

atendimento: a empresa encarregada pela logística e distribuição de medicamentos no

Estado está sem pessoal para realizar a entrega dos medicamentos nas unidades do

Estado de Pernambuco

Despreparo e baixa formação dos profissionais de saúde como resultado do

desisvetimento de formação continuada das equipes e alta rotatividade de

profissionais pela prática da terceirização: – As mulheres vivendo com AIDS denunciam que com frequência têm sua sorologia

exposta nas salas de espera e que não são informadas adequadamente sobre os

procedimentos para evitar a transmissão vertical, além disso, há profissionais que se

recusam a assisti-las por preconceito;

– As mulheres negras relatam comentários racistas por parte de profissionais em

momentos de exames: " negra tem muito mal cheiro", "minha filha você está podre! ",

"aguenta que você é forte, parideira"....;

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– No caso dos hospitais escolas, não se pende consentimento a mulher para que os

alunos acompanhem o procedimento médico, expondo as mulheres a todo tipo de

constrangimento, violando seu direito à privacidade;

– Ainda há uma baixa notificação de casos de violência contra mulher.

2.2- Pessoas vivendo com HIV-AIDS E A FALTA DE ACESSO À SÁUDE

Propostas para serem incorporadas ao Relatório Estadual sobre a violação de

Direitos Humanos.

A Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV– Núcleo Pernambuco - RNP/+PE,

criada em 1996 tem por objetivo promover o fortalecimento das Pessoas Vivendo com

HIV, independente de gênero, orientação sexual, credo, raça, cor ou etnia e

nacionalidade, vem solicitar desta comissão, que sejam incorporados no Relatório de

Violação de Direitos Humanos do Estado, as violações de Direitos por este estado, para

as: Pessoas que Vivem Com HIIV e AIDS.

Sobre Tratamento e Assistência:

Medicamentos:

A falta de medicamentos para as Pessoas Vivendo com HIV e AIDS do Estado de

Pernambuco os (ANTIRETROVIRAIS) tem sido constante, tornando-se realmente não

apenas uma violação de direitos, como um atentado contra a vida das pessoas que vivem

com HIV e AIDS, pelo o fato de dependerem dessa medicação para se ter uma boa

resposta ao tratamento como também uma boa qualidade de vida.

Como também a falta de medicamentos para doenças oportunistas, oriundos dos efeitos

colaterais proporcionados pelas medicações.

Hospitais de Referência, Rede de atendimento, leitos para internação:

Outra situação grave que precisa de resolução urgente é a insuficiência de leitos, uma

realidade nas emergências do Estado.

Hospitais de Referência como o CORREIA PICANÇO, HOSPITAL DAS CLINICAS,

HOSPITAL UNIVERSSITARIO OSVALDO CRUZ a deficiência com relação a

internação ainda se trata de um grande desafio.

As condições das instalações físicas, limpeza e higiene dos serviços de referência em

Aids de modo geral ainda são precárias.

População Carcerária:

A violação de Direitos para esta população que vive com HIV e AIDS ainda se torna

mais grave, pois pelo o fato de estarem presos, o acessos a: Consultas, medicações, etc.

é um grande desafio .pelo o fato de não ser disponibilizados pelo o poder público,

condições para que o detento soropositivo tenha acesso estes serviços..

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III - POLÍITICA PÚBLICA DE SEGURANÇA PÚBLICA

3.1 OS DESAFIOS DA GESTÃO DEMOCRÁTICA NA CONSTRUÇÃO DE UMA

POLÍTICA DE SEGURANÇA PÚBLICA EM PERNAMBUCO.

Edna Jatobá- GAJOP

Este texto não tem a pretensão de esgotar a discussão sobre as inúmeras dificuldades

para o estabelecimento de uma cultura de gestão democrática no âmbito da segurança

pública. Mas, tem o propósito de refletir sobre as relações entre gestão democrática e

políticas de segurança pública, mais especificamente, no estado de Pernambuco.

Segurança é um termo que dependendo do contexto e do regime, pode inclusive, ter o

seu significado invertido. Realizada de forma privada, pode ser uma ameaça à ideia de

civilização, voltaríamos ao estado de natureza em que prevaleceria o olho por olho,

dente por dente. Realizada a partir do Estado, é uma condição conquistada pelo

processo civilizatório. Nas últimas duas décadas, surgiram novas formas de designar o

campo da Segurança, com a utilização de termos que guardam semelhanças, mas que já

demarcam sentidos distintos. “Segurança Cidadã”, pensada como a segurança exercida

com foco na articulação de forças sociais para uma convivência segura; “Defesa

Social”, pensada como segurança do cidadão/ã abrangendo também a noção de defesa

civil. A própria designação “Segurança Pública” vem ganhando novos significados:

conceito mais tradicional, que em algum momento foi pensado como a segurança do

Estado é agora revisitado por alguns estudiosos impondo-lhe uma noção mais

republicana. Sinal de que existem tentativas para se avançar conceitualmente nesta

discussão. Entretanto, após 1988, poucas foram as iniciativas de se avançar na

democratização da segurança no Brasil.

Dentro de um sistema cujo a democracia é um valor essencial, quanto mais os

cidadãos/ãs participarem das decisões sobre o que lhes afeta mais diretamente, mais se

consolida uma cultura de democracia participativa. Além de legais, as políticas que

contarem com a participação social terão legitimidade perante a sociedade, que em tese,

estará comprometida, ao menos em parte, na busca dos resultados que tal política

tentará alcançar. Gestão democrática segue o rumo da radicalização e oxigenação da

democracia, procurando mais espaços para o debate e exercício da democracia

participativa.

Apesar de constar no artigo 6º de nossa constituição federal, a segurança pouco é

reconhecida como um direito social. Esse baixo reconhecimento revela-se, entre outras

coisas, pela ausência de mecanismos que favoreçam a gestão democrática, ou quando

existem mecanismos, estes aparecem de maneira tardia e incompleta.

O campo da Segurança Pública não difere das demais políticas. Como bem escreve

Kopittke: “Os canais de democracia participativa devem ser fomentados e vistos como

grandes aliados na construção das políticas públicas brasileiras. A importância de

agregar os diversos interlocutores, públicos e privados, é inquestionável para o sucesso

na execução de uma política nacional de segurança pública.” A política pública de

segurança deu os primeiros passos para incorporar o processo da gestão democrática,

buscando institucionalizar a participação da sociedade na definição de sua condução. A

primeira Conferência Nacional de Segurança Pública aconteceu em 2009, e em 2010, o

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Conselho Nacional de Segurança Pública, existente desde 1989, passou a ser um órgão

colegiado de caráter deliberativo. Em termos comparativos, em 2009 já haviam sido

realizadas treze Conferências Nacionais de Saúde. E, como resultado destes processos, o

país possui um Sistema Único de Saúde (SUS), conselhos nacional, estaduais e

municipais de saúde bem distribuídos, competências dos entes federados bem definidas

(alta, média e baixa complexidade).

Ainda que as condições para a presença polifônica da sociedade nos espaços de decisão

e controle no campo da segurança não estejam amadurecidas a contento, a necessidade

que este lugar seja ocupado e qualificado existe e é patente. A participação social na

construção e monitoramento da política pública de segurança no Brasil é tão importante

quanto desarticulada, e este quadro pode comprometer a concepção e execução de

planos estratégicos com foco no combate à violência e criminalidade. O panorama nos

estados que compõem a federação não é muito diferente. Todos realizaram sua 1ª

conferência pública de segurança entre 2009 e 2010 como exigência para participação

na etapa nacional. A rigor deveríamos ter ao menos um Conselho nacional , conselhos

estaduais em cada uma das unidades da federação, conselhos municipais e conselhos

comunitários, estes deveriam preservar uma diálogo institucional, mas, são poucos os

estados que possuem conselhos estaduais instalados, deliberativos e funcionando. E

pouquíssimos os municípios que possuem conselhos municipais que fomentem a

existência de conselhos comunitários.

EM PERNAMBUCO...

O estado de Pernambuco, nos primeiros anos do século XXI, liderou o ranking de

violência letal (taxa de homicídios por 100.000 habitantes) no Brasil, e sua capital,

Recife, foi considerada por diversas vezes a capital mais violenta do país. Esta situação

cobrava medidas urgentes e eficazes. Segurança passou a ser pauta de todos os

segmentos da sociedade.

Segundo a constituição pernambucana, em seu artigo 101, o governador e o Conselho

de Defesa Social são definidos como atores centrais do estabelecimento da política de

Defesa Social e da coordenação das ações de Segurança Pública. Na última década

Pernambuco contou com dois formatos de conselho, que apesar de serem designados

por nomes diferentes, se ocupavam da mesma coisa. Um chamava-se Conselho de

Defesa Social e tinha por atribuição precípua: “propor políticas públicas nas áreas de

defesa social, bem como ações de planejamento, orçamento, avaliação, coordenação e

integração referentes às ações de justiça e segurança pública no âmbito estadual”. Ao

outro, chamado Conselho Estadual da Paz competiria: “definir ações prioritárias na área

de defesa social, acompanhar e avaliar as políticas de segurança.” Durante a época em

que ambos existiram de fato, nenhuma política estadual de segurança foi criada, e

apenas o Conselho Estadual da Paz foi revogado, no ano de 2007 para a criação do

Fórum Estadual de Segurança Pública que apresentaria, em maio do mesmo ano, o 1º

Plano Estadual de Segurança Pública de Pernambuco – O Pacto pela Vida. Já o

Conselho de Defesa Social, apesar de não funcionar, não foi revogado e ainda consta na

estrutura organizacional da Secretaria de Defesa Social.

O Pacto pela Vida contou, em sua fase de elaboração, com a participação da sociedade

civil a partir de movimentos sociais, organizações não governamentais, núcleos de

estudos da universidade etc. Foi uma iniciativa que agregou legitimidade ao plano de

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segurança, fator primordial para que pudesse lograr êxito. No documento, que contém o

detalhado diagnóstico da realidade local no âmbito da segurança, estão presentes as

marcas da contribuição da sociedade em seus mais de 140 projetos. No entanto,

posteriormente e até hoje, não foi capaz de transformar seu mecanismo interno de

monitoramento em uma instância institucional com participação de outros segmentos

sociais que não apenas os da gestão, como estava previsto em uma das ações contidas na

linha 6 do Pacto pela Vida – intitulada Gestão Democrática. A saber: Criação do

Conselho Estadual de Segurança Pública e Incentivo à Formação dos Conselhos

Municipais e Comunitários de Segurança Pública.

O comitê de monitoramento, pensado como espaço de transição até a implementação do

Conselho Estadual de Segurança Pública, é composto até hoje apenas por gestores ou

representantes do poder público, distribuídos de forma transversal por todas as

secretarias que compõem o Governo de Pernambuco. Neste espaço, chamado hoje de

comitê gestor, procura-se monitorar o Pacto a partir da gestão por resultados, modelo

este adotado para todos os campos de atuação do governo, com o apoio logístico da

Secretaria de Planejamento e Gestão (SEPLAG). Neste modelo, a meritocracia e a

produtividade são critérios para premiação dos profissionais. Assim, foi preciso

fortalecer e aprimorar a coleta e organização dos dados para que se pudesse estabelecer

e controlar o alcance de metas específicas. Estas ações tiveram um rebatimento muito

forte na ação policial e no índice de violência letal.

Ainda que se possa afirmar a regularidade do funcionamento de uma instância intra-

governamental de monitoramento, este fato não deve minorar a necessidade da

participação social na política estatal de segurança.

Como se pode perceber é um longo caminho, que sem dúvida ainda precisa ser melhor

desbravado. É preciso mobilização popular para tirar o assunto Conselho de Defesa

Social da inércia, incorporando-lhe possibilidades operacionais de um dia vir a existir.

Este, sem dúvida, seria um esforço na direção da garantia da participação social na

segurança pública, esperando que um dia gestão democrática e segurança pública

possam fazer as pazes, ou melhor, possam se conhecer um pouco mais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

PERNAMBUCO, Governo de (2007). Pacto pela Vida. Plano Estadual de Segurança

Pública. Recife (PE): CEPE.

KOPITTKE, Alberto; ANJOS, Fernanda Alves dos; OLIVEIRA, Mariana. Segurança e participação

social: uma agenda por fazer. In: Diálogos sobre violência e segurança pública:Razões e Urgências. Rio

de Janeiro: Ibase, 2009

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IV – UM BALANÇO DOS MECANISMOS, DAS ESTRUTURAS, DOS ÓRGÃOS

RESPONSÁVEIS, DOS ARRANJOS INSTITUCIONAIS PARTICIPATIVOS

QUE VISAM À PROTEÇÃO E DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS EM

PERNAMBUCO

Política Pública de Direitos Humanos em Pernambuco: ausências e desafios

Rodrigo Deodato2

Em meio ao variado panorama de fluxos e reflexos passíveis de verificação, no âmbito

do percurso percorrido pela luta em prol do estabelecimento de uma política pública

estadual de Direitos Humanos em Pernambuco, os marcos históricos se entrelaçam com

a própria história em torno da participação social efetiva junto as deliberações e

reflexões sobre esses mesmos Direitos Humanos no estado.

Assim sendo, visando constituir uma linha mais organizada de pensamento em torno do

tempo, escolheu-se como via balizadora da reflexão a sistematização do mecanismo que

mais evidencia o estabelecimento de uma iniciativa no tocante a uma política pública de

Direitos Humanos, no Estado de Pernambuco: o Conselho Estadual de Direitos

Humanos (CEDH).

Fruto de uma luta democrática estabelecida e coroada com a Constituição Federal de

1988, que dentre os seus aspectos mais inovadores, introduziu em seu bojo, no art.1º,

parágrafo único, que "todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de

representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”, a participação

social, por meio de Conselhos de Direitos foi pouco a pouco se estabelecendo.

Foi assim, que após incansável luta da sociedade civil organizada à época, foi

promulgada a Lei estadual nº 12.160, de 28 de dezembro de 2001, que instituiu, em

âmbito estadual, a criação do Conselho Estadual de Direitos Humanos –CEDH, ponto

imprescindível para o estabelecimento de uma política pública estadual de Direitos

Humanos. Entretanto, o referido conselho ainda demorou muito para ser cumprido.

Dados de março de 2004, afirmam que, naquele período, “o secretário de Cidadania e

Políticas Sociais, (...) teria se comprometido a dar o apoio necessário para a entidade

funcionar. Em encontro realizado na última terça-feira, ficou definida a criação de dois

grupos de trabalho. O primeiro, formado por representantes de organizações não

governamentais, do Governo do Estado e da Assembleia Legislativa, ficará responsável

pelos preparativos da conferência estadual. A criação do conselho ficará a cargo do

segundo grupo”3.

Em maio do mesmo ano, houve a realização da I Conferência Estadual de Direitos

Humanos que teve como tema central a “a construção da política de DH´s em

Pernambuco.” A mesma, foi realizada aos dias 21 e 22 de maio de 2004 e contou com a

2 Rodrigo Deodato é Mestre em Direito. Membro da coordenação executiva do Gabinete de Assessoria

Jurídica às Organizações Populares (Gajop). Articulador Estadual do Movimento Estadual de Direitos

Humanos (MNDH/PE) em Pernambuco. Conselheiro Titular do Conselho Estadual de Direitos

Humanos e membro da Coordenação colegiada do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à

Tortura em Pernambuco. 3 DIÁRIO DE PERNAMBUCO. Pernambuco organizará comissão. Edição de Sábado, 13 de

Março de 2004. Disponível em: http://www.old.pernambuco.com/diario/2004/03/13/urbana9_0.html

Acesso em 15 jul. 2015

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participação de 267 participantes, destes 134 delegados(as) e 133 convidados e

observadores, de 44 dos 184 municípios do estado. A avaliação da presente no

diagnóstico do Relatório da referida Conferência, denota que “estes números são

reveladores do exíguo tempo para a realização de uma Conferência de âmbito estadual,

sobretudo, num campo temático onde não há uma cultura de afirmação dos direitos

humanos. Mas, a sua realização, em que pese as dificuldades de mobilização e

articulação dos sujeitos que atuam no campo da promoção e defesa dos direitos,

demonstrou o compromisso e a sensibilização dos participantes em contribuir com esta

nova forma de pensar os DH’s como produto da ação histórica de homens e mulheres e

como parte da agenda pública estatal”4.

Cumpridos os compromissos assumidos para a consolidação do Conselho Estadual de

Direitos Humanos, foi que após as eleições de seus membros se estruturou o seu

funcionamento por meio de regimento interno aprovado ainda em abril de 2004. No

referido regimento, o Conselho assume o seu papel como “órgão autônomo e

deliberativo da Política Estadual de Direitos Humanos, que tem por finalidade promover

o cumprimento das normas vigentes de defesa dos Direitos Humanos, consagrados na

Constituição da República Federativa do Brasil e nas Declarações, Pactos e Convenções

de Direitos Humanos”5.

De toda sorte, se faz interessante notar que até este momento o Estado de Pernambuco

não contava com uma Secretaria que se assumisse as questões de Direitos Humanos,

com toda a bagagem conceitual que o termo evidencia. Foi apenas em janeiro de 2005,

que surgiu a primeira Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos. A aposta de

que, enfim, uma política pública articulada e intersetorial pudesse ser viabilizada junto

com o Conselho de Direitos Humanos aos poucos foi sendo diluída pelas sucessivas

crises estruturais que inviabilizaram muitas ações, apesar do empenho sempre constante

da Sociedade Civil e de alguns atores do Estado.

De toda sorte, a II Conferência Estadual de Direitos Humanos, conseguiu ser estruturada

e realizada, em agosto de 2008, pela Secretaria de Desenvolvimento Social e Direitos

Humanos. Com o tema “Democracia, Desenvolvimento e Direitos Humanos: superando

as desigualdades”, Pernambuco tornou-se o primeiro estado da federação, daquela ano,

a fazer a sua Conferência Estadual, fazendo com que os olhares de todo o país se

voltassem para o que no estado estava sendo debatido.

Foi nesse momento que a Sociedade Civil organizada emitiu um documento com 16

questões de relevância que deveriam ser tratadas na referida conferência. O simples

olhar sobre elas na atualidade e a verificação clara de que muitas ainda permanecem

sem solução ou a devida atenção por parte do Governo do Estado já apresenta indícios

da ausência de uma Política Pública estruturada no âmbito dos Direitos Humanos em

Pernambuco.

4 BLOG DO CONSELHO ESTADUAL DE DIREITOS HUMANOS. Relatório da I Conferência

Estadual de Direitos Humanos de Pernambuco. 31 de maio de 2004. Disponível em:

http://ceddhpe.blogspot.com.br/2005/03/relatrio-da-i-conferncia-estadual-de.html Acesso em 15 jul.

2015. 5 BLOG DO CONSELHO ESTADUAL DE DIREITOS HUMANOS. Relatório da I Conferência

Estadual de Direitos Humanos de Pernambuco. 31 de maio de 2004. Disponível em:

http://ceddhpe.blogspot.com.br/2005/03/relatrio-da-i-conferncia-estadual-de.html Acesso em 15 jul.

2015.

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Em meio à ausência de recursos práticos para o desenvolvimento de suas ações a

própria história do Conselho em muito apenas se conserva na vivencia dos que lá se

encontravam. E neste sentido os relatos de problemáticas e mesmo de violações de

Direitos Humanos dos próprios membros, sobretudo, dos que representam os segmentos

dos Povos Tradicionais, é fator de consternação.

Com o seu mandato encerrado e com problemáticas recursais, o início do ano de 2014

tornou-se um marco importante pra evidenciação do descaso do Poder Público para com

a temática dos Direitos Humanos no Estado. O governo da época decidiu reduzir o

orçamento do Conselho Estadual, que em 2013 era de R$ 26.000,00 para apenas R$

10.000,00. Em uma medida inédita até o momento a Sociedade Civil presente no

Conselho decidiu se afastar do mesmo e denunciar publicamente os ataques recorrentes

que o mesmo sofria. Em fala pública, membros do Conselho afirmaram “Infelizmente,

não existe encaminhamento das deliberações prévias, por exemplo do Pacto pela Vida,

para apreciação do Conselho.

O órgão perde a autonomia até mesmo naquilo que a lei prevê como suas atribuições.

Infelizmente, está faltando um trabalho de política pública para direitos humanos. Se

não usam os órgãos de controle, ele perde a razão de existir. Acho que o governo não

tem interesse na prática de uma verdadeira democracia participativa. Há quatro anos

tentamos audiência com o governador. Acho que há ou negligência ou omissão. Ou

então, os dois”6. Diante de tal ação, o Governo Estadual recuou e manteve o orçamento

anterior para as atividades do Conselho.

Apenas em 2015, e com procedimento aberto junto ao Ministério Público do Estado de

Pernambuco, é que os trâmites relativos à nova eleição e posse para a reativação do

CEDH se estabeleceram. Mas apesar disso, os ventos não se mostram tão favoráveis

assim no âmbito dos Direitos Humanos no estado. A dissolução da Secretaria

Estadualde Desenvolvimento Social e Direitos, em duas outras pastas, ou seja, a

Secretaria de Justiça e Direitos Humanos; e a Secretaria de Desenvolvimento Social,

Infância e Juventude, fez com que muitas ações que trabalhavam, ainda que sem uma

política pública estrturada e norteadora , em parceria dentro de uma mesma Secretaria

de Estado agora estejam dispersas, desrespeitando o princípios de universalidade,

interdependência e indivisibilidade que são fundantes de todos os direitos humanos.

Ademais, como uma luz no fim do túnel prepara-se a III Conferência Estadual de

Direitos Humanos, depois de anos de atraso, e pela primeira vez a ações de Direitos

Humanos ingressaram no eixo de marcos prioritários do Governo de Pernambuco.

Mas ainda há muito diálogo e luta a ser travada. Em tempos de recrudescimento de

direitos e garantias conquistados no decorrer dos anos pelo esforço dos movimentos

sociais, enfrentar um fluxo hostil, conservador e, sobretudo, contrário as demandas

sociais é um desafio para todas e todos que militam nas fileiras dos Direitos Humanos.

Todavia, se em muito a história das organizações não governamentais na área dos

Direitos Humanos, nos já distantes anos 80 do século XX, em Pernambuco, em muito

foi marcada pelas palavras de Dom Hélder Câmara, hoje, onde os movimentos

espontâneos e coletivos nas redes sociais apresentam capacidade impar de mobilização

e pressão popular sobre os desmandos dos governos, a mesma frase do “Dom”, serve de

6 O GLOBO. Campos recua e repõe verba que foi cortada para Direitos Humanos em PE. Edição de

11 fev. 2014. Disponível em: http://oglobo.globo.com/brasil/campos-recua-repoe-verba-que-foi-

cortada-para-direitos-humanos-em-pe-11571899#ixzz3fypTz7GG Acesso em 15 jul. 2015.

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inspiração para superamos as ausências e vencermos os desafios: “Minhas palavras

adquirirão ressonância dramática quando, hoje e aqui, começarem a repercutir, nesta

sala, vozes que clamam por justiça em termos de bradar aos céus”, ou seja, a luta

continua...!7

São as questões principais, a saber:

O fim do Presídio Professor Aníbal Bruno e a construção de novas unidades

descentralizadas e com uma estrutura que permita a ressocialização;

A implementação efetiva do Pacto pela Vida, que deve ter os Direitos Humanos

como paradigma;

A adoção de programas de combate ao racismo institucional, especialmente no

sistema de justiça e na segurança pública e a implementação de uma política de

promoção da igualdade racial;

O fim das unidades de internamento de Paratibe em: Abreu, Lima, Caruaru,

Cabo de Santo Agustinho e a construção de unidades com base nos parâmetros

SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Sócio Educativo;

A implementação e ampliação do programa de proteção de crianças e

adolescentes ameaçadas de morte, com a responsabilização dos autores dos

homicídios praticados contra o público infanto-juvenil e a criação de novas varas

privativas de crimes contra crianças e adolescentes, enfatizando a agilização dos

processos em que há envolvimento de agentes públicos;

O imediato cumprimento e implementação da Lei Maria da Penha;

A criação imediata de uma rede da casas de abrigo para mulheres em situação de

violência;

A criação imediata do Sistema de Proteção à Pessoa, com o aperfeiçoamento dos

Programas: PPCAAM – Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes

Ameaçados, PROVITA – Proteção às Vítimas e Familiares de Vítimas de

Violência e PPDDH – Programa de Proteção aos Defensores/as de Direitos

Humanos, transformando-os em políticas públicas efetivas que enfrentem o pano

de fundo das violações e ameaças;

A criação de mecanismos e espaços institucionais democráticos, com

participação efetiva da sociedade civil, de controle e responsabilização pelas

violações aos direitos humanos cometidas pelo Judiciário, Polícias e

representantes dos Ministérios Públicos, tais como a omissão que garante a

impunidade das violações de Direitos Humanos e as ações que criminalizam

defensores de Direitos Humanos e movimentos sociais;

A defesa de um modelo pautado na soberania alimentar e no respeito dos

direitos dos povos tradicionais, camponeses e das populações ribeirinhas, contra

o modelo de desenvolvimento econômico pautado pelo agrohidronegócio e pelas

transnacionais, simbolizado no estado de Pernambuco por projetos como: a

construção das barragens Riacho Seco e Pedra Branca no sertão do São

Francisco; os projetos de irrigação Pontal Sul em Petrolina; Canal do Sertão e a

transposição do Rio São Francisco; e o Programa de Promoção dos

Agrocombustíveis;

O cumprimento da função social ambiental e trabalhista da terra com a

desapropriação de todas as áreas que descumprem esse preceito constitucional –

a exemplo das 24 usinas multadas pelo Ibama por cometerem crimes ambientais;

A retomada das terras públicas em posse da Usina Trapiche para a criação da

7 DOM HELDER CAMARA. O Artesão da Paz. Brasília,DF: Edições do Senado Federal - Volume 120. 2009. p.

121.

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reserva extrativista das Ilhas de Sirinhaém;

A rapidez na condenação judicial e a aplicação imediata da Constituição

Federal, com a desapropriação das áreas das usinas multadas por

descumprimento da função social;

A implementação imediata da Plataforma Nacional de Combate aos Despejos

Forçados, garantindo o acesso às terras urbanas e rurais, como formas de

garantia dos Direitos Humanos;

A integração das políticas públicas das três esferas de governo para acesso,

racionalização e otimização dos recursos, em conformidade com o artigo 25 da

Constituição Federal, o Estatuto da Cidade, o Código Brasileiro de Trânsito, a

Agenda 21 e Agenda Habitat II, envolvendo todos os segmentos da sociedade

civil, na elaboração e implementação de marcos regulatórios e projetos em

diversas áreas, implementando e fortalecendo diversos instrumentos como o

Plano Diretor Participativo para o desenvolvimento urbano, rural e regional;

A estruturação da Defensoria Pública do Estado de Pernambuco, com recursos

humanos, financeiros e materiais, para instalação de um núcleo de assistência

judiciária de regularização fundiária direcionado para resolução dos conflitos

fundiários e defesa da segurança da posse da terra da população de baixa renda.

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V – AS VIOLAÇÕES AOS DIREITOS HUMANOS E OS PROCESSOS DE

EROSÃO E FLEXIBILIZAÇÃO DOS SISTEMAS JURÍDICOS DE PROTEÇÃO

E DEFESA.

5.1 - ORDENAMENTO JURÍDICO E SEGURANÇA DA POSSE DA TERRA:

ENTRE A OMISSÃO DO ESTADO E O CONSERVADORISMO DO

JUDICIÁRIO

Alexandre Pachêco, Historiador e Advogado do Cendhec

O ordenamento jurídico brasileiro, em especial a Constituição Federal de 1988, está

profundamente marcado pela busca de uma sociedade igualitária fundamentada pelos

Direitos Humanos. No que concerne à garantia do direito a moradia e à Função Social

da Cidade e da Propriedade não é diferente, pois a legislação editada nos últimos 20

anos colocou à disposição do Poder Público um rol de ferramentas poderosas para o

enfrentamento da insegurança da posse da terra e outros problemas urbanos. Entretanto,

esta não é utilização que vem sendo dada à legislação no desenrolar da vida cotidiana,

fenômeno que guarda relações com elementos políticos e econômicos de ordem interna

e externa.

Nessa análise é essencial destacar que críticos como Slavoj Zizek e David Harvey têm

apontado com perspicácia um processo político e econômico mundial pautado por dois

elementos centrais: 1) a expansão do mercado com a consequente diminuição do espaço

público e seus serviços (Educação, Saúde, Cultura); e 2) um crescente autoritarismo do

poder político.

Nos espaços urbanos brasileiros é fácil perceber essas dinâmicas, sobretudo com a

busca das cidades por criar atrativos para o capital financeiro através do repasse de

ativos urbanos públicos (imóveis e infraestrutura) por preços desvalorizados. Ativos que

passam a integrar o circuito internacional financeiro. Trata-se da construção de uma

nova governança empresarial das cidades que, para sua consolidação, o poder público

não tem hesitado na utilização de práticas políticas autoritárias, inclusive, do uso do

aparato repressivo a sua disposição.

De forma complementar a este processo, Loïc Wacquant tem alertado para a tendência

no incremento do “Mais Estado” (policial, poder judiciário e prisional) que visa

“solucionar” o aumento da insegurança objetiva e subjetiva no mundo. Insegurança esta

que o sociólogo criminal aponta ser fruto da própria escolha pela diminuição do Estado

nos fronts econômico e social. Ou seja, existe uma crescente mentalidade ocidental que

advoga pela assepsia do crime das classes baixas nas ruas, em detrimento dos crimes

cometidos pelas grandes corporações, visto que assim seria possível “abafar e conter as

desordens urbanas geradas nas camadas inferiores da estrutura social”.

Nesse contexto, o IBGE informou que, no Brasil de 2010, existiam 6.329 Aglomerados

Subnormais distribuídos em 323 municípios e que 28% destes encontravam-se no

Nordeste. Considerando que um dos critérios de caracterização dos referidos

aglomerados é a ausência de título de propriedade dos ocupantes, este número guarda

relação direta com a irregularidade nas cidades brasileiras, a insegurança da posse dessa

parcela da população e o déficit habitacional do Brasil. Mesmo em números

subestimados, uma vez que o critério do IBGE requer no mínimo 51 habitações no

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local, devemos supor que o Brasil, de cinco anos atrás, tinha no mínimo 11.425.644

pessoas vivendo em condições que não atendiam ao Direito Humano à moradia

adequada.

Em Pernambuco, o IBGE identificou 347 aglomerados subnormais onde habitavam

875.378 pessoas, das quais 852.700 residiam na região metropolitana de Recife e 41,1%

do total de domicílios nestes assentamentos encontravam-se na Capital Pernambucana.

De forma simples, o Instituto apontou que 97,04% dos moradores de assentamentos

precários de Pernambuco residem na Região Metropolitana do Recife. Esta é a parcela

da população para qual a legislação urbanística dedicou especial atenção no sentido

proporcionar minimamente a segurança de sua posse e assim a possibilidade de

gradativas intervenções urbanísticas que garantissem a habitabilidade necessária.

Porém, as ações e os recursos das diversas unidades da federação que deveriam

concretizar o sentido da legislação sofreram reduções violentas de recursos ou

simplesmente nunca aconteceram. Assim, mais uma vez, Pernambuco e o Brasil

encontram-se inseridos num processo internacional de insegurança da posse da terra, em

especial aquelas ocupadas pelas populações de baixa renda. Processo esse que vem

sendo debatido na Organização das Nações Unidas, desde 2012, com o relatório

apresentado pela então Relatora Especial para o Direito à moradia Adequada, Raquel

Rolnik.

Entretanto, em meio ao processo caracterizado Zizek e Harvey, o Brasil vivenciou uma

excessiva valorização da terra urbana nos últimos anos, aliada à ausência de avanços

concretos na busca por atribuir segurança à posse da terra das comunidades de baixa

renda. O que tem ampliado assustadoramente a vulnerabilização da posse de populações

de baixa renda e, consequentemente, o número de remoções forçadas. Aqui não só

existe um papel na omissão do Estado brasileiro no desenvolver de ações de

regularização dessas posses e propriedades, como também há uma forte atuação do

Poder Judiciário por meio da aplicação conservadora do ordenamento jurídico.

Recife é exemplo de como a estrutura de planejamento urbano e gestão participativa de

áreas de baixa renda foram paulatinamente desmontadas e esvaziadas de recursos,

comprometendo a execução de ações prevista na legislação municipal. As equipes

técnicas ligadas à Empresa de Urbanização da Cidade (URB) foram reduzidas e uma

reformulação administrativa, vivenciada em 2013, retirou de suas atribuições a

construção de planos de urbanização e regularização fundiária das ZEIS (Zonas

Especiais de Interesse Social). Concomitantemente, o Fundo específico para o

desenvolvimento dessas atividades (Fundo do PREZEIS) foi radicalmente diminuído e,

nos últimos anos, o recurso sequer foi utilizado, tendo de ser devolvido ao erário

público.

As tentativas da Sociedade Civil de implementar planos de Regularização Fundiária em

parceria com alguns órgãos Municipais, principalmente através de ações de usucapião

baseadas no Estatuto da Cidade (Lei Federal 10.257/01) e na Constituição Federal de

1988, esbarram em forte resistência do Poder Judiciário. Ações que tramitam por até 20

anos devido a exigências não previstas em lei e impostas pelos magistrados de 1º grau,

poderiam ter garantido a segurança da posse da terra de milhares de moradores de áreas

pobres. Áreas que atualmente encontram-se sob forte pressão do setor construtivo e que

por isso podem ser esvaziadas para projetos econômicos de alto luxo e assim

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comprometer o direito à moradia de milhares de famílias.

Além dos setores da construção civil, algumas comunidades sofreram deslocamentos

forçados devido à execução das chamadas obras de mobilidade e dos megaeventos

esportivos que o país vem sediando (Copa do Mundo de 2014). As obras, exigidas pela

Copa do Mundo de 2014, afetaram aproximadamente 2 mil famílias em pelo menos 7

(sete) municípios da Região Metropolitana de Recife através de no mínimo 457

desapropriações levadas a cabo pelo Governo do Estado de Pernambuco.

Para execução dessas obras, muitas flexibilizações legais foram realizadas, à exemplo

daquelas realizadas no plano diretor da cidade de São Lourenço da Mata (cidade sede

em Pernambuco) que recaracterizou áreas em torno do local como Zonas de

Urbanização Preferencial e criou uma ZEU - Zona de Expansão Urbana. O que

demonstra uma ampla mobilização de recursos políticos e econômicos estatais em total

distonia com o princípio constitucional da Função Social Da Propriedade e o Direito à

Moradia.

Ainda relativo à Copa é necessário apontar os impactos nos municípios de Camaragibe

e no próprio Recife. Na primeira, a comunidade do loteamento São Francisco teve mais

de 200 casas derrubadas fruto de um processo de desapropriações agressivas

caracterizado por intimidações, ausência de assessoria jurídica pelos órgãos públicos,

pagamento de indenizações irrisórias e não-pagamento de muitas delas até a presente

data.

Quanto ao Recife, há de se apontar que a realização de um megaevento apenas acirrou o

processo de mercantilização da cidade, trazendo a oportunidade para o poder público de

acelerar/realizar de obras de mobilidade (Via Mangue), legitimar projetos urbanos de

luxo aprovados de forma ilegal (Projeto Novo Recife e Polo Jurídico), além de exercer

pressão para desocupação de áreas recentemente valorizadas e ocupadas há gerações por

comunidades pobres protegidas como ZEIS (Coque). O que provocou não só remoções

forçadas e consequentemente vulnerabilização de centenas de famílias de baixa renda,

muitas vezes com indenizações irrisórias, outras tantas sem qualquer indenização.

Fica claro, nos relatos colhidos pelo Comitê da Copa e pela Relatora Especial da ONU

para o Direito à Moradia Adequada, que o Estado Pernambucano e os Municípios não

só vêm desrespeitando os princípios da Política Urbana (Lei Federal nº 10.257/01) de

forma sistemática, como também não existem quaisquer atuações destes entes públicos

para efetivar as garantias e Princípios Constitucionais do Acesso à Justiça (CF/88, art.

5º, XXXV), Direito à Moradia (CF/88, art. 6º) e da Função Social da Propriedade

(CF/88, art. 5º, XXIII). O que se torna ainda mais espantoso quando observado que este

último é um dos princípios orientadores da Ordem Econômica (CF/88, art. 170, III).

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ANEXO:

Documento: O Problema das dragagens no CIPS/PE: denúncia dos impactos e

irregularidades. Denunciantes: Associação Fórum Suape Espaço Socioambiental; Conectas

Direitos Humanos; Colônia de Pescadores Z08 – Gaibu; Both ENDS