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DT\836072PT.doc AP100.801v02-00 PT Unida na diversidade PT Euro-Latin American Parliamentary Assembly Assemblée Parlementaire Euro-Latino Américaine Asamblea Parlamentaria Euro-Latinoamericana Assembleia Parlamentar Euro-Latino-Americana ASSEMBLEIA PARLAMENTAR EURO-LATINO-AMERICANA Comissão de Assuntos Políticos, da Segurança e de Direitos Humanos 18.10.2010 DOCUMENTO DE TRABALHO Luta contra o Tráfico de Drogas e a Criminalidade Organizada na União Europeia e na América Latina Co-relator PE: Boguslaw SONIK (PPE)

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DT\836072PT.doc AP100.801v02-00

PT Unida na diversidade PT

Euro-Latin American Parliamentary AssemblyAssemblée Parlementaire Euro-Latino Américaine

Asamblea Parlamentaria Euro-LatinoamericanaAssembleia Parlamentar Euro-Latino-Americana

ASSEMBLEIA PARLAMENTAR EURO-LATINO-AMERICANA

Comissão de Assuntos Políticos, da Segurança e de Direitos Humanos

18.10.2010

DOCUMENTO DE TRABALHOLuta contra o Tráfico de Drogas e a Criminalidade Organizada na União Europeia e na América Latina

Co-relator PE: Boguslaw SONIK (PPE)

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1. INTRODUÇÃO

O problema da droga representa uma complexa interacção entre Estados do hemisfério norte desenvolvido e os Estados produtores e de trânsito do hemisfério sul em desenvolvimento. No comércio das drogas, são os países em desenvolvimento que fornecem produtos acabados lucrativos aos consumidores dos países do Norte desenvolvido, sobretudo os EUA e a Europa. Em 2009, assinalou-se o centenário do sistema internacional de controlo das drogas e, de acordo com o Relatório Mundial sobre Drogas de 2010, registaram-se recentemente alguns avanços animadores neste domínio1. Todavia, o mesmo relatório reconhece que os êxitos recentes devem ser encarados no contexto do desafio a longo prazo.

A maior parte do tráfico a longa distância envolve cocaína e heroína, embora haja também algum contrabando de resina de cannabis e de ecstasy entre regiões. Empresários criminosos aperceberam-se de que a globalização lhes permite implementar estratégias empresariais multinacionais, estabelecendo redes impressionantes a nível industrial, financeiro, do transporte, da informação e das comunicações à escala internacional. Neste contexto, as organizações criminosas transnacionais (OCT), nomeadamente as que estão associadas ao tráfico de drogas, começaram a ser encaradas como sérias ameaças à segurança na era pós-Guerra Fria, devido à grande influência que podem ter sobre instituições políticas e económicas a todos os níveis, tanto nos países produtores como nos países de trânsito. Além disso, após os atentados terroristas de Setembro de 2001, a ligação entre grupos terroristas e as OCT é vista como podendo constituir uma maior ameaça para as pessoas, os Estados e a comunidade internacional. O casamento de conveniência entre as OCT e grupos rebeldes pode fortalecer as operações de ambas as partes, através da ajuda mútua a nível de recursos financeiros e capacidades militares.

No que respeita ao consumo, o UNODC (Gabinete das Nações Unidas contra a Droga e o Crime) estima que entre 155 e 250 milhões de pessoas (3,5 a 5,7 % da população mundial do grupo etário entre os 15 e os 64 anos) consumiu substâncias ilícitas pelo menos uma vez em 2008. No cerne do consumo de drogas reside o problema dos toxicodependentes, aquelas pessoas que injectam drogas e/ou são consideradas dependentes, enfrentando por isso sérias consequências a nível social e da saúde. Com base nas estimativas globais do número de consumidores de cannabis, opiáceos, cocaína e ATS (estimulantes do género das anfetaminas), calcula-se que em 2008 havia entre 16 e 38 milhões de consumidores problemáticos de drogas a nível mundial. Estima-se que anualmente haverá entre 15 e 19,3 milhões de pessoas que consomem cocaína (prevalência anual de 0,3% a 0,4%) em todo o mundo. A América do Norte (2 %), a Oceânia (1,4 a 1,7 %) e a Europa Ocidental (1,5 %) são as regiões em que se registam as taxas de prevalência mais elevadas.

O tráfico e o consumo de cocaína estão a expandir-se rapidamente na América Latina, pondo em risco a estabilidade política e económica e minando todos os esforços para consolidar a democracia da região. A América Latina é o campo de batalha onde se trava esta luta, não só porque este fenómeno atinge com particular intensidade os países mais pobres da região, mas também porque "a maior ameaça à segurança pública provém do tráfico de drogas e da

1 Publicado pelo Gabinete das Nações Unidas contra a Droga e o Crime (UNODC).

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violência perpetrada pelo crime organizado1". Além do mais, as OCT latino-americanas desenvolveram vastas redes com máfias italianas e russas que ligam diferentes partes do mundo. As redes internacionais assim criadas possibilitam a distribuição de mercadorias ilícitas à escala mundial. O que é mais alarmante é o facto de alguns aspectos fundamentais do problema terem sido tradicionalmente negligenciados no combate ao tráfico internacional de drogas, nomeadamente o papel essencial que a vertente da procura desempenha, os efeitos nefastos das políticas uniformes ou "de tamanho único", ou a falta de uma visão partilhada do problema. Deveriam ser ponderadas novas abordagens e uma análise multidimensional para lidar com o problema, reconhecendo a realidade multifacetada dos países produtores, consumidores e de trânsito.

2. A REGIÃO ANDINA E A PRODUÇÃO DE COCAÍNA

O cultivo e o consumo de coca nos Andes remontam a mais de quatro mil anos. A folha de coca era um elemento importante da organização social e religiosa das civilizações pré-colombianas da região. Era (e continua a ser) um elemento importante da dieta dos montanheses indígenas, servindo para eliminar a fome, aliviar o enjoo de altitude e fornecer alimentação suplementar. Hoje em dia, a importância da indústria da cocaína para a região está associada à pobreza de longa duração e ao subdesenvolvimento. Centenas de milhares de camponeses empobrecidos e sem terra mudaram-se para outros lugares a fim de tirarem partido das oportunidades que a coca oferece.

Em toda a região andina, a área total de cultivo de coca está muito abaixo dos níveis registados na década de 1990. A diminuição dos níveis de produção foi atribuída aos programas governamentais, incluindo as campanhas de erradicação financiadas pelos EUA (i.e. o "Plano Colômbia" e a Iniciativa Andina contra a Droga), e aos regimes de interdição reforçada.

No entanto, a longo prazo, a diminuição da produção esconde tendências mais inquietantes no que respeita ao cultivo da coca. A região andina continua a ser não só um produtor cada vez mais importante de matéria-prima para o fabrico de cocaína, mas também o local onde se desenvolve uma indústria mais resiliente e poderosa.

A nível do cultivo, o programa agressivo de erradicação aérea, em especial no sul da Colômbia, obrigou os agricultores a deslocarem as suas culturas para áreas mais remotas da região, muitas das vezes para locais onde anteriormente não havia cultivo de coca. Por essa razão, os fumigadores de culturas passaram a ter mais dificuldade em detectar e erradicar os campos ilícitos.

De igual modo, nos últimos anos, as ligações entre fornecedores dos Andes e traficantes de outros locais da região tornaram-se ainda mais complexas, o que veio agravar as dificuldades das agências responsáveis pela aplicação da lei em desmantelar as operações de empresas internacionais.

1 Antonio Maria Costa, Subsecretário-Geral das Nações Unidas, nomeado em Maio de 2002 para os cargos de Director Executivo do Gabinete das Nações Unidas contra a Droga e o Crime (UNODC) e de Director-Geral do Gabinete das Nações Unidas de Viena (UNOV).http://www.unodc.org/unodc/en/about-unodc/speeches/2008-10-10.html

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As políticas mais rigorosas em matéria de transferência de dinheiro e informação bancária introduzidas a partir de 11 de Setembro de 2001 obrigaram os traficantes a adoptar esquemas mais elaborados para movimentarem o dinheiro. Em vez da lavagem de montantes vultuosos, passaram a utilizar redes formadas por múltiplos corretores que conseguem gerir quantias mais pequenas mas que fizeram aumentar os custos das transacções.

A premissa-chave na equação do comércio ilegal de drogas é que nenhuma política pode ser viável se não atacar os problemas de base do lado dos produtores. Assim, para cumprir essatarefa, é necessário obter previamente um conhecimento profundo de vários factores: a escala das culturas de droga e da produção de cocaína nas diferentes áreas; as diferentes circunstâncias socioeconómicas e as alternativas existentes em cada região/país de produção; a natureza e o modus operandi diferenciados das redes transnacionais. Como podemos ver nas informações que se apresentam em seguida, o problema está concentrado sobretudo em três países principais: Colômbia, Peru e Bolívia.

2.1 Colômbia

Apesar dos elogios feitos pela ONU ao empenhamento da Colômbia na luta contra a produção e o tráfico de drogas na última década1, este país continua a ser o principal produtor mundial de cocaína; as 610 toneladas que produziu em 2007 representam 62% do total mundial2 (ver anexo 1). Este padrão está patente nos níveis de cultivo de coca, que aumentaram cerca de um quarto (27 %) em 2007. A produção de folha de coca e de cocaína estava altamente concentrada: dez municípios representavam quase metade da produção total de cocaína (288 toneladas métricas) e um terço do cultivo (35 000 hectares). Além disso, como Antonio Maria Costa salientou, "na Colômbia [...] as regiões em que se cultiva a maior parte da coca estão sob o controlo dos rebeldes".

A complexidade do caso da Colômbia advém da ligação existente entre os produtores e as FARC. Após o desmantelamento dos cartéis colombianos dominantes na década de 1980, os traficantes desenvolveram relações com uma série de fornecedores, muitos dos quais são ramificações da guerrilha colombiana e grupos paramilitares.

2.2 Peru

O Peru continua a ser o segundo país mais importante no que respeita ao cultivo de coca (ver anexo 2), com 36 % da produção mundial de folha em 2008. Após uma ligeira diminuição das culturas para 48 200 hectares em 2006, o cultivo aumentou para 56 100 hectares em 2008. O que é mais alarmante é a probabilidade de a capacidade do Peru para fornecer cocaína a nível internacional aumentar nos próximos anos. O potencial de produção de cocaína poderá ser superior às 280 toneladas que tinham sido estimadas para 2007 com base em dados incorrectos relativos à área cultivada.

1 Níveis recorde de erradicação por via aérea e manual, números impressionantes de apreensões de cocaína, intercepção de precursores químicos importados, destruição de laboratórios de processamento e acção contra narcotraficantes e grupos armados.2 "Latin American drugs: losing the fight" [A droga na América Latina: perdendo a batalha], Relatório sobre a América Latina n.º 25 –14 de Março de 2008, Grupo de Crise Internacional & UNODC, Relatório Mundial sobre Drogas 2008

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2.3 Bolívia

A Bolívia é actualmente o terceiro maior produtor mundial de cocaína (ver anexo 3) e fornece sobretudo a Europa e outros mercados da América do Sul. De acordo com as Nações Unidas, o cultivo de coca na Bolívia aumentou de 23 600 hectares em 2003 para 27 500 hectares em 2006, e estima-se que no mesmo período o potencial de produção de cocaína da Bolívia terá aumentado de 100 para 115 toneladas métricas. Após uma redução espectacular das culturas de coca para 14 000 hectares graças à erradicação manual forçada no âmbito do Plano Dignidade1, tem-se vindo a assistir na Bolívia a um aumento constante do cultivo2. O Presidente Evo Morales continua a aplicar a sua política "zero cocaína, mas não zero coca", procurando industrializar a cultura da coca e aumentar o seu cultivo legal. Esta política viola a legislação boliviana em vigor e a Convenção das Nações Unidas sobre Droga de 1998, e ameaça neutralizar os progressos realizados pela Bolívia a nível da erradicação e da interdição. Neste aspecto, o Governo boliviano continua a enviar mensagens enganadoras à comunidade internacional. A lei boliviana 1008 antinarcóticos permite o cultivo legal de 12 000 hectares da cultura de coca, que tradicionalmente é consumida pelos agricultores bolivianos para suportarem a fome e poderem trabalhar a altas altitudes. La Paz também suspendeu todo o tipo de colaboração com a agência norte-americana de combate à droga(DEA - Drug Enforcement Administration) acusando-a de "espionagem e de financiar grupos criminosos na tentativa de minar o seu governo3".

3. OS PAÍSES DE TRÂNSITO

Os países de trânsito deveriam merecer a mesma atenção que é dada aos países produtores, não só porque fornecem uma via para os mercados de consumo da Europa e dos EUA, mas também devido ao efeito de arrastamento do tráfico de droga e à violência que lhe está associada nas respectivas sociedades.

3.1 México

Não estão disponíveis dados fidedignos sobre a quantidade de cocaína que entra no México proveniente dos países produtores da América do Sul e dos países de trânsito da América Central. Todavia, é de consenso geral que em 2007 quase 90 % da cocaína entrada nos EUA passaram pelo México.

No intuito de explorar o rico mercado do trânsito de drogas, surgiram vários cartéis no México. Presentemente grassam neste país duas guerras entre cartéis que em 2009 produziram níveis de violência sem precedentes. A primeira guerra é o conflito entre o Governo mexicano e os cartéis da droga. A segunda, uma guerra paralela, é a luta entre os vários cartéis que disputam entre si o controlo de lucrativas rotas de fornecimento. Pouco tempo depois da sua tomada de posse em Dezembro de 2006, o Presidente Felipe Calderón iniciou um esforço máximo para combater os cartéis que na sua opinião representam uma grande ameaça para a segurança e a estabilidade do México. Nos últimos três anos, os esforços da administração de Felipe Calderón fizeram enfraquecer e dispersar alguns dos principais cartéis (nomeadamente

1 Com início em 1998, o "Plano Dignidade" deste país levou à erradicação quase total da produção de coca no Vale Chapare, outrora conhecido como a segunda maior região produtora de coca do mundo2 Coca, Drugs and Social Protest in Bolivia and Peru [Coca, Droga e Protesto Social na Bolívia e no Peru], Relatório sobre a América Latina n.° 12, 3 de Março de 20053 http://www.nytimes.com/2008/11/02/world/americas/02bolivia.html?ref=world

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os cartéis do Golfo e de Sinaloa), mas estes progressos do governo perturbaram o equilíbrio de poderes entre os cartéis, originando ainda mais violência. A sociedade mexicana terá de dar muitos passos importantes para ajudar a resolver a crise de segurança que o país atravessa. Porém, a falta de oportunidade económica e a desconfiança em relação às autoridades contribuem para fomentar um cumprimento da lei deficiente e um baixo nível de cooperação com os esforços do governo e de apoio aos mesmos.

3.2 América Central

Os países da América Central são vistos como um canal natural para as actividades ilícitas das organizações de tráfico de drogas (OTD) que cresceram em dimensão e se reforçaram durante a última década, enfraquecendo as capacidades dos Estados para manterem a segurança pública. Os sete países da América Central são todos eles utilizados activamente pelas grandes OTD para fazer entrar drogas nos Estados Unidos. Os agentes responsáveis pela aplicação da lei em muitas partes da América Central estão a lutar para conter a violência nos centros urbanos e nos principais pontos de tráfico. Além disso, é provável que o desenvolvimento de rotas de contrabando mais difusas tenha estendido a influência corruptora do narcotráfico aos serviços públicos. Essas rotas alteraram a economia política de muitas comunidades em que o influxo de dinheiro levou ao abandono de indústrias tradicionais, como a pesca e o turismo, a favor de actividades ilícitas.

3.3 As Caraíbas: Haiti e República Dominicana

A instabilidade política, a ausência quase total de um aparelho de Estado funcional, a existência de bandos armados, a pobreza e a corrupção generalizadas, todas elas contribuíram para aumentar a importância do Haiti como um ponto de transbordo para a cocaína. De acordo com a agência norte-americana de combate à droga (DEA), em 2007, passaram pela Ilha Espanhola 83 toneladas de cocaína e foram detectados 159 voos com drogas vindos da América do Sul para essa ilha, mas desconhecem-se as quantidades transitadas para cada país.

3.4 Venezuela: um caso sui generisOs Estados Unidos continuam a distinguir a Venezuela por não ter conseguido realizar progressos no cumprimento das suas obrigações internacionais em matéria de luta contra a droga e por não ter "dado provas de que estava a fazer esforços suficientes para combater o tráfico de drogas1". Não é surpresa para ninguém o tumulto gerado pela suspensão dos programas bilaterais estabelecidos entre Caracas e a agência norte-americana de luta contra a droga (DEA) em 2005, se tivermos em conta o potencial da Venezuela como uma importante rota para os traficantes transportarem cocaína da vizinha Colômbia para os mercados europeu e norte-americano.

Efectivamente, a Venezuela é um importante país de trânsito para os carregamentos de drogas destinados aos Estados Unidos e à Europa, sendo anualmente transportadas através do seu território 150 toneladas métricas de cocaína e quantidades crescentes de heroína2. Em suma, o Governo venezuelano não conseguiu resolver o problema da utilização crescente do seu território para efeitos de trânsito, nem erradicar os campos de coca e de papoila dormideira 1 International Narcotics Control Strategy Report 2008 [Relatório sobre a Estratégia Internacional para o Controlo de Narcóticos 2008]. Bureau of International Narcotics and Law Enforcement Affairs, Março de 20082Bureau of International Information Programs, Departamento de Estado dos EUA. Sítio Web: http://usinfo.state.gov

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nas proximidades da sua fronteira com a Colômbia, nem combater a corrupção no seio das suas forças de segurança. Pelo contrário, o Equador – também país vizinho dos dois maiores produtores de coca – é amplamente elogiado pelo seu empenhamento em proteger as suas fronteiras e o seu território contra o tráfico de drogas e outros crimes transnacionais. A Venezuela é um exemplo claro em que a luta contra o tráfico de droga – não obstante a sua intensidade – está profundamente entranhado na sua política externa e na sua estratégia nacional face aos países vizinhos, criando assim um cenário terrível para os esforços realizados para os neutralizar.

3.5 O Cone do Sul: Brasil, Argentina e Chile

O Brasil tornou-se uma importante plataforma giratória para o transbordo de cocaína com destino à Europa e à América do Norte devido às extensas fronteiras que tem como os três principais produtores de coca e de cocaína, bem como às vias navegáveis interiores e às infra-estruturas rodoviárias que possui na região amazónica. Assim, o tráfico é efectuado por grupos chefiados por colombianos, que utilizam empresas de fachada com trabalhadores brasileiros para a realização das operações e a lavagem de dinheiro. Essas empresas estão sedeadas nas grandes cidades (São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Recife) a partir das quais as drogas são embarcadas para as Caraíbas na rota norte-americana e para a África na rota europeia.

Desde o início da década de 2000, o papel tradicional da Argentina enquanto país de trânsito para a cocaína boliviana, peruana e colombiana destinada à Europa tem vindo a alterar-se e passaram a ser produzidas e consumidas mais drogas no país. As principais entradas de cocaína na Argentina fazem-se por terra através das regiões nordestinas de Salta e Jujuy, as únicas províncias que fazem fronteira com a Bolívia. Embora o aeroporto internacional de Buenos Aires seja um importante ponto de transbordo para a Europa, os maiores carregamentos de drogas são transportados de barco de Buenos Aires para a Europa.

O Chile é um ponto de transbordo para os carregamentos maiores de cocaína que provêm sobretudo da Colômbia através do Equador e do Peru, bem como para pequenas quantidades que atravessam directamente a fronteira do Peru e da Bolívia a caminho dos EUA. Nos últimos anos, tem-se assistido a um aumento do tráfico para a Europa, sobretudo por via marítima para Espanha, Portugal e Países Baixos, mas também através do aeroporto de Santiago.

4. A VERTENTE DA PROCURA: EUROPA E ESTADOS UNIDOS

É indubitável que o fenómeno do tráfico de drogas é um processo bidireccional alimentado pela variabilidade da oferta e da procura (ver anexo 6). Em termos absolutos, os Estados Unidos continuam a ser o maior mercado único de consumo de cocaína do mundo, com uma procura anual constante estimada em 250-300 toneladas. De modo semelhante, a Europa é o segundo maior mercado de cocaína do mundo e está a crescer com uma entrada anual de cocaína no continente estimada em 250 toneladas. Não há nada que se possa fazer nos países de origem enquanto a procura continuar a crescer a estes ritmos alarmantes.

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4.1 A Política dos Estados Unidos

Desde a década de 1960 que os Estados Unidos consideram o tráfico de cocaína como uma ameaça à segurança nacional. Isto porque vêem no tráfico da cocaína um risco potencial para a sua economia nacional e os seus valores morais, bem como um apoio potencial para o terrorismo internacional e a instabilidade regional. No que toca ao impacto em termos diplomáticos, os EUA receiam a instabilidade regional alimentada pelos narcodólares, bem como o fluxo massivo de cocaína proveniente da América Latina.

Desde meados da década de 1990, o Governo dos Estados Unidos definiu a luta contra o tráfico de drogas – especialmente na região do Andes e no México – como um objectivo primordial da sua política externa. Para travar o fluxo de drogas ilegais, Washington dedica especial atenção às três primeiras fases da oferta: cultivo, transformação e trânsito. São dois os programas emblemáticos desta estratégia na América Latina: o Plano Colômbia, enquanto principal país fornecedor, e o Plano Mérida, que visa os principais países de trânsito.

A priori, Washington pretende desencorajar o plantio de coca e obter a cooperação dos governos para convencer as comunidades locais e sobretudo os agricultores pobres a erradicarem as culturas. As alternativas propostas podem ser dinheiro, culturas de substituição e, mais recentemente, projectos de infra-estruturas comunitárias e um conjunto mais alargado de actividades geradoras de rendimento. Em caso de falta de cooperação está também prevista a erradicação forçada. Em termos de prioridades e compromisso financeiro, o financiamento do desenvolvimento alternativo tem sido tratado como o aspecto menos importante da estratégia. Os funcionários governamentais reconhecem em privado que não têm conseguido convencer os agricultores bolivianos, colombianos e peruanos a abandonar o cultivo da coca, nem têm conseguido impedir os traficantes de manter o fluxo de cocaína para os Estados Unidos. Ao mesmo tempo, há cada vez mais críticas de que os orçamentos da maior parte dos países produtores são demasiado reduzidos para se preverem programas paralelos a juntar à especialização militar exportada por Washington, tais como investimento em infra-estruturas e desenvolvimento das comunidades, particularmente nas áreas de subsistência onde ocorre uma parte importante do cultivo de coca. Porém, a abordagem norte-americana ao controlo das drogas ignora por vezes a soberania de outros Estados e o direito internacional. As dificuldades com que o Governo norte-americano se debate em relação à Venezuela e à Bolívia são disso um exemplo. Esta situação pode desencadear desavenças, pese embora o facto de os Estados latino-americanos estarem fortemente dependentes da ajuda económica dos Estados Unidos.

4.1.1 O Plano Colômbia

Combater o problema da droga num dos países produtores mais proeminentes foi a lógica que presidiu à implementação desta estratégia integral antinarcóticos adoptada em 1998 sob as administrações dos Presidentes Andrés Pastrana e Bill Clinton. O objectivo era "assegurar um aumento da ajuda norte-americana aos projectos contra as drogas, o desenvolvimento económico sustentável, a protecção dos direitos humanos, a ajuda humanitária, estimulando o investimento privado, e juntando-se a outros doadores e instituições financeiras internacionais para promover o crescimento económico da Colômbia1".

1 Reunião do Presidente Pastrana com o Presidente Bill Clinton dos EUA (3 de Agosto de 1998)

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Consequentemente, o Plano Colômbia tinha como objectivo central acabar com a produção de cocaína, ajudando os camponeses a desenvolver culturas alternativas e apoiando o desenvolvimento económico. Desde 1997, o financiamento norte-americano para o Plano Colômbia aumentou de 86 milhões para 756 milhões de dólares1. Cerca de 97 % desses fundos foram dedicados a armamento militar, transferências de armamento, treino militar e ataques militares contra as FARC.

Vários elementos desta estratégia suscitaram amplas críticas, tais como os efeitos secundários da fumigação aérea em grandes quantidades, danos nas culturas legais ou violações dos direitos humanos. Além disso, os críticos da iniciativa também afirmavam que elementos treinados pelos EUA no seio das forças de segurança colombianas apoiavam ou toleravam abusos praticados pelas organizações paramilitares. Acresce ainda que o carácter predominantemente militar da iniciativa fez com que os potenciais doadores sentissem relutância em cooperar na sua vertente social e acabou por se tornar um dos seus principais fluxos2.

4.1.2 A Iniciativa Mérida (também designada Plano México pelos críticos)

A Iniciativa Mérida é homóloga do Plano Colômbia e foi lançada pelos governos norte-americano e mexicano juntamente com os países da América Central (através do Sistema de Integração Centro-Americana) para lidar com o problema do tráfico de drogas na região e evitar a sua expansão para os Estados Unidos.

A Iniciativa Mérida, anunciada em Outubro de 2007 e assinada em Junho de 2008, é uma proposta de cooperação plurianual na área da segurança lançada pelo Presidente mexicanoFelipe Calderón e pelo Presidente George W. Bush. O seu objectivo consiste em fornecer equipamento e formação para apoiar as operações de aplicação da lei e assistência técnica à reforma a longo prazo e à supervisão das agências de segurança. Verifica-se, contudo, uma grande diferença em relação ao Plano Colômbia, já que a filosofia subjacente a esta política consiste em dedicar uma rubrica orçamental aos países beneficiários em vez de intervenções militares directas no seu território. O ambicioso orçamento proposto inclui 450 milhões de dólares para o México e 100 milhões de dólares para a América Central para o período 2009-2010, compreendendo treino militar, equipamento, serviços secretos e programas de acção comunitários nos países da América Central para implementar medidas contra os gangs e expandir o alcance dessas medidas.

4.2 A situação na UE

Os Estados-Membros da UE continuam a ter perspectivas políticas diferentes no que toca à questão das drogas. Todavia, a cooperação na luta contra as drogas tem vindo a aumentar a nível europeu. Tal facto está patente no desenvolvimento de um sistema transversal de acompanhamento do fenómeno da droga que engloba 303 países com uma população total de quase 600 milhões de pessoas. Está também patente na estratégia e no plano de acção de luta contra a droga da UE, que são ferramentas concebidas para reunir a informação disponível e transformá-la em acção prática e colectiva. Para avaliar a situação da droga na Europa, é 1 Centro de Política Internacional, Washington.2 Resolução do Parlamento Europeu sobre o Plano Colômbia e o apoio ao processo de paz na Colômbia, de 1 de Fevereiro de 2006.3 Os 27 Estados-Membros da UE, a Croácia, a Turquia e a Noruega.

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necessário conhecer simultaneamente as características nacionais, as especificidades sub-regionais e, de uma forma crescente, as tendências comuns a nível europeu ou mesmo a nível mundial.

O Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência (OEDT), no seu relatório de 2009, apresenta as seguintes estimativas1:

Cannabis: - Prevalência do consumo ao longo da vida: pelo menos 74 milhões (22 % dos europeus adultos). Consumo no último ano2: cerca de 22,5 milhões de adultos europeus ou um terço dos consumidores ao longo da vida.

Cocaína: - Prevalência do consumo ao longo da vida: cerca de 13 milhões (3,9 % dos adultos europeus). Consumo no último ano: 4 milhões de adultos europeus ou um terço dos consumidores ao longo da vida.

Ecstasy: - Prevalência do consumo ao longo da vida: cerca de 10 milhões (3,1 % dos adultos europeus). Consumo no último ano: cerca de 2,5 milhões ou um quarto dos consumidores ao longo da vida.

Anfetaminas: - Prevalência do consumo ao longo da vida – cerca de 12 milhões (3,5 % dos adultos europeus). Consumo no último ano: menos de 1 milhão.

Opiáceos: - Consumidores problemáticos de opiáceos: estimados entre 1,2 e 1,5 milhões de europeus. As mortes induzidas pela droga correspondiam a 4 % das mortes de europeus entre os 15 e os 39 anos de idade, tendo sido encontrados opiáceos em cerca de três quartos dos casos.

4.3. A política da UE

A União Europeia deu-se conta da ameaça que o tráfico de drogas representa para a saúde pública, a coesão social e a estabilidade política (dos países afectados). Abordar directamente essas questões contribui para a concretização dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) que incluem a erradicação da pobreza e a melhoria da saúde. A abordagem da UE aocontrolo das drogas aceitou a resolução aprovada na sessão especial da Assembleia-Geral das Nações Unidas sobre drogas (UNGASS) em 1998: responsabilidade partilhada, ênfase no multilateralismo, abordagem equilibrada, integração do desenvolvimento nas diferentes políticas e respeito pelos direitos humanos. Tendo em conta o impacto do tráfico de drogas na UE, este é visto mais como uma ameaça à segurança da sociedade e não tanto como uma ameaça à segurança nacional.

1 As estimativas referem-se à população adulta (grupo etário dos 15 aos 64 anos).2 2008.

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Em Dezembro de 2004, o Conselho Europeu aprovou a Estratégia da UE de Luta contra a Droga (2005-2012) que definiu o quadro, os objectivos e as prioridades para 2 planos de acção quadrienais consecutivos que deveriam ser apresentados pela Comissão Europeia. Esta estratégia inclui cinco componentes básicas:

- Diálogo político;

- Planos de Acção de Luta contra a Droga envolvendo outras regiões do mundo;

- Acordos e esforços de cooperação internacionais tendentes a prevenir o desvio de precursores químicos necessários para o fabrico de drogas;

- Acordos comerciais preferenciais;

- Financiamento de projectos relacionados com a luta contra a droga.

5. ESFORÇOS CONJUNTOS UE-ALC NO COMBATE AO TRÁFICO DE DROGAS

Esta cooperação baseia-se no entendimento mútuo da responsabilidade partilhada, numa abordagem equilibrada e assente em provas e no cumprimento do direito internacional, incluindo o respeito dos direitos humanos. Em 2007, a UE e a ALC confirmaram estes princípios básicos com a declaração de Porto de Espanha, e materializaram-nos em áreas comuns de cooperação (redução da oferta e da procura, desenvolvimento alternativo e outras questões relacionadas com as drogas como a lavagem de dinheiro e a cooperação aduaneira, policial e judiciária).

No que respeita ao quadro institucional, a cooperação UE-ALC realiza-se a três níveis complementares:

1. Nível bilateral/regional – através do diálogo político bilateral e do Programa Indicativo Nacional acordado entre a Comissão Europeia e cada país e/ou região individual;

2. Nível inter-regional – através de dois esquemas de diálogo e cooperação existentes:

- Mecanismo de Coordenação e de Cooperação UE-ALC em matéria de drogas, lançado em 1995 em Madrid;

- Diálogo especializado de alto nível UE-CAN sobre a droga, que teve a sua primeira reunião em 1995;

3. Nível multilateral – através de uma coordenação estreita da UE e do Grupo GRULAC nas reuniões anuais da Comissão de Narcóticos das Nações Unidas (CND) em Viena, procurando apoiar as resoluções uns dos outros.

O primeiro nível supramencionado – nível bilateral/regional – inclui 5 componentes básicas:

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a) Diálogo político

A cooperação da UE com os países da América Latina na luta contra o consumo, a produção e o tráfico de drogas tem sido tradicionalmente uma das pedras angulares do diálogo UE-ALC, porque são considerados como um dos principais factores de desestabilização e um sério risco para a consolidação da democracia e a estabilidade. É importante ter em mente o problema crescente da produção ilegal e do tráfico de drogas sintéticas e dos precursores químicos naregião da América Latina e das Caraíbas. Neste contexto, é necessária assistência da UE através da partilha de boas práticas, de formação especializada, bem como de apoio técnico aos países da América Latina e das Caraíbas.

De um modo geral, as relações da União Europeia com a América Latina e as Caraíbas foram consideravelmente reforçadas desde meados da década de 1980, tendo sido concluída a todos os níveis uma gama completa de acordos assentes três pilares: diálogo político, cooperação e relações comerciais. Assim, o estabelecimento do Diálogo de São José e a institucionalização de um diálogo político da UE com o Grupo do Rio, com a região andina, com o Mercosul, com o México e com o Chile têm de ser vistos como marcos importantes na integração da dimensão política nas relações UE-ALC, o primeiro passo para conseguir uma abordagem comum nesta matéria. Para além destas realizações importantíssimas, vale a pena mencionar também a celebração de acordos de associação com o México, o Chile, a recente conclusão das negociações com os países da América Central tendo em vista um acordo de associação, bem como com a Colômbia e o Peru, e o Acordo de Parceria Económica (APE) entre a UE e os países das Caraíbas.

b) O Plano de Acção

- Plano de Acção do Panamá: Em Abril de 1999 foi adoptado no Panamá um Plano de Acção que foi depois apoiado pela Cimeira UE-ALC do Rio em Junho de 1999. De acordo com este Plano de Acção, que acabou por se tornar o grande plano da UE neste domínio, foram identificadas quatro áreas de actividade:

1) procurar reduzir a procura e a oferta (desenvolvimento alternativo e erradicação; controlo dos precursores de drogas lícitas);

2) promover a cooperação policial, aduaneira e judiciária e combater o tráfico de armas relacionado com a droga;

3) combater a lavagem de dinheiro;

4) promover a organização judiciária e a legislação em matéria de drogas e reforçar as capacidades institucionais.

Tendo em conta o papel fundamental que o desvio de químicos precursores desempenha ao possibilitar o fabrico de drogas ilícitas, a UE assinou acordos com um número limitado de países, incluindo os membros da Comunidade Andina, o Chile e o México, para prevenir esse desvio. Os acordos em questão criaram mecanismos para agilizar a comunicação e o intercâmbio de informações no que respeita ao comércio mútuo de químicos susceptíveis de serem utilizados para o fabrico ilegal de cocaína, heroína e drogas sintéticas.

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c) Acordos Comerciais

Um ponto fundamental inscrito na agenda da CE é o "Regime SPG-Drogas" que autoriza a UE a conceder acesso ilimitado e isento de impostos aos países das regiões dos Andes e da América Central, desde que cumpram as directrizes acordadas neste domínio específico. O objectivo derradeiro deste regime comercial era e continua a ser o de ajudar esses países a diversificar a sua produção e as suas exportações, acabando com as drogas ilícitas mediante a redução dos incentivos ao cultivo e ao tráfico de drogas.

d) Financiamento

Os Estados-Membros e a Comissão têm dedicado recursos consideráveis a projectos de luta contra as drogas na América Latina e noutras regiões do mundo. A Comissão financia projectos de luta contra as drogas através das suas rubricas orçamentais geográficas e através da rubrica orçamental dedicada à cooperação Norte-Sul no domínio da luta contra as drogas e a toxicomania.

No quadro do Plano de Acção Regional de luta contra as drogas na América Latina, foram concedidos mais de 100 milhões de euros a projectos de desenvolvimento alternativo na Bolívia e no Peru e aos laboratórios de paz na Colômbia.

e) O conceito de responsabilidade partilhada

O controlo das drogas é actualmente reconhecido como parte integrante dos esforços globais para promover o desenvolvimento social e económico num sentido mais amplo. A nível mundial, a UE aceita o princípio da responsabilidade partilhada, i.e. reconhece que o elevado nível da procura nas nossas sociedades estimula a produção noutros locais. O problema das drogas é cada vez mais percepcionado a partir de um conjunto mais vasto de questões relacionadas com o bem-estar humano, abordando as dimensões sociais e económicas do desenvolvimento sustentável quer nos países produtores quer nos países consumidores.

No que respeita ao nível inter-regional, a 11.ª reunião de alto nível do Mecanismo de Coordenação e de Cooperação UE-ALC em matéria de droga, realizada em Quito (Equador) em 26-27 de Maio de 2009, decidiu continuar a reforçar a cooperação bi-regional UE-ALC no domínio da luta contra o problema mundial das drogas. Neste contexto, foram lançadas três novas iniciativas: o Programa de Cooperação entre a ACL e a UE sobre políticas de luta contra a droga (COPOLAD); parcerias entre cidades europeias, latino-americanas e caribenhas; prevenção do desvio de precursores de drogas na região ALC (PRELAC). A primeira iniciativa – COPOLAD – terá por objectivo reforçar a cooperação bi-regional nas políticas de luta contra as drogas a nível nacional, sub-regional e bi-regional. A iniciativa "Cidades em Parceria" envolveu um total de 1 125 pessoas, e 47 cidades participaram em diversas acções de colaboração levadas a cabo. A iniciativa PRELAC teve início em 1 de Março de 2009. Os seus objectivos específicos são o reforço das capacidades das autoridades administrativas nacionais de controlo de países da região seleccionados para prevenir o desvio de precursores.

Na Declaração de Madrid adoptada em 18 de Maio de 2010, os Chefes de Estado e de Governo da União Europeia e da América Latina e Caraíbas afirmaram a sua decisão de intensificar a sua cooperação bi-regional existente para combater o problema mundial da

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droga, em conformidade com o princípio da responsabilidade comum e partilhada. A Declaração também chamava a atenção para um novo problema constatado nos países latino-americanos: a crescente ameaça das drogas sintéticas.

O Parlamento Europeu foi pioneiro na luta contra as drogas. Em 1986, aprovou uma resolução em que convida a Comunidade Europeia a reagir contra as drogas a nível internacional. Um ano mais tarde, foi criada a primeira rubrica orçamental dedicada à luta contra as drogas nos países em desenvolvimento. Desde finais da década de 1980, o PE aprovou inúmeras resoluções sobre questões relacionadas com a droga e sobre questões relacionadas com regiões ou países latino-americanos como o Mercosul (12 de Outubro de 2006), a Comunidade Andina (15 de Março de 2007), a América Central (15 de Março de 2007), o Brasil (12 de Março de 2009), o México (11 de Março de 2010) e a América Latina (5 de Maio de 2010). O PE sempre insistiu que a questão das drogas não pode ser resolvida por cada Estado individualmente e que por esse motivo é essencial que a UE adopte uma verdadeira política europeia de luta contra as drogas e a implemente de maneira integrada e global, utilizando todos os meios necessários para prevenir os problemas que acarreta em termos de saúde humana e de exclusão social, e reparando os danos causados à sociedade pelas organizações de tráfico de drogas. Além disso, o PE recomendou ao Conselho que aumentasse consideravelmente a ajuda ao desenvolvimento dos países produtores de drogas, através de programas para financiar culturas alternativas sustentáveis e a redução radical da pobreza, explorando também a possibilidade de promover e salvaguardar a produção para fins médicos e científicos.

Durante mais de 30 anos (1974-2005) o PE e o Parlamento Latino-Americano (PARLATINO) realizaram reuniões periódicas (Conferências Interparlamentares) que contribuíram para o estabelecimento de laços estreitos entre a Europa e a América Latina, insistindo no diálogo político, nas questões económicas e na cooperação bilateral. Em 1981, nas conclusões da IV Conferência, foi dirigido um convite a todos os órgãos legislativos ali representados para que tomassem medidas contra a produção e o tráfico de drogas. A partir de 1987, todas as conferências subsequentes têm a questão das drogas inscrita nas suas agendas. Na XII Conferência foi salientado pela primeira vez o princípio da responsabilidade comum e partilhada.

6. RUMO A UMA NOVA POLÍTICA EM MATÉRIA DE LUTA CONTRA AS DROGAS?

De acordo com o parecer do OEDT, torna-se necessário adoptar uma abordagem integrada, multidisciplinar e equilibrada ao problema das drogas, que conjugue a redução da procura e da oferta. É necessário que a estratégia para enfrentar esta realidade multifacetada seja focalizada em duas áreas de intervenção fundamentais bem como em dois temas transversais: "Cooperação internacional" e "Investigação, informação e avaliação"1.

Em Junho de 2010, os membros da Organização dos Estados Americanos (OEA) adoptaram uma nova estratégia hemisférica de luta contra as drogas que irá ajudar os países a desenvolver políticas centradas não só na oferta e no controlo mas também na toxicodependência. Essa estratégia reconhece explicitamente que a toxicodependência é uma doença crónica com recaídas, que tem de ser tratada como um elemento fulcral da política de 1 Estratégia da UE de Luta contra a Droga (2005-2012) aprovada pelo Conselho Europeu de Dezembro de 2004.

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saúde pública. A nova estratégia da OEA acompanha a recente mudança de política em matéria de drogas anunciada pelos Estados Unidos. A promessa feita pelo Presidente Barack Obama de afectar mais recursos à prevenção e tratamento da toxicodependência é equiparável à visão hemisférica que considera o consumo excessivo de drogas e a toxicodependência como questões de saúde pública e não como meros actos criminosos.

De modo semelhante, a nova estratégia da OEA em matéria de luta contra as drogas promove o tratamento como uma alternativa à prisão. Inclui a criação de tribunais especializados em matéria de droga, em que a recuperação é supervisionada de perto por um juiz com poder para premiar os progressos e repreender as recaídas. Neste contexto, a Comissão Interamericana para o Controlo do Abuso de Drogas (CICAD), uma agência especializada da OEA, está a dar formação a psicólogos e terapeutas no tratamento da toxicodependência em toda a América Latina.

Como um primeiro passo para a adopção de uma abordagem abrangente em resposta aos desafios interligados do tráfico de drogas e da toxicodependência, é crucial que a América Latina dê maior ênfase à principal causa do problema – o consumo de drogas ilícitas. Aproximadamente 20 % dos toxicodependentes representam quase 80 % do consumo de drogas. Reduzindo progressivamente a dependência entre os consumidores de drogas duras, os novos programas não só contribuem para a redução da procura de drogas mas também afectam a rentabilidade das OCT que ameaçam as economias, a segurança e a governação democrática do hemisfério ocidental.

Vários governos na UE abrandaram as suas políticas em matéria de substâncias controladas, tais como a cannabis, a heroína e a cocaína. Por exemplo, em 2001, Portugal despenalizou a posse de pequenas quantidades destas drogas e agora está a incentivar os toxicodependentes a procurarem tratamento médico. Muitas destas políticas inspiradas no princípio da redução de danos são consideradas ilegais do ponto de vista do direito internacional pelo órgão Internacional de Controlo dos Estupefacientes (OICE), mas têm sido consideradas bem sucedidas, embora seja demasiado cedo para fazer afirmações de grande alcance quanto à sua eficácia.

No entanto, é pouco provável que o Presidente Obama altere o rumo da política dos EUA que foi estabelecido há cem anos. Desde que tomou posse, tem defendido o regime internacional de controlo de drogas em vigor e tem mesmo criticado as alterações adoptadas por certos Estados a nível interno, como o ilustram as declarações desdenhosas dos EUA sobre a importância do apoio popular dos norte-americanos à utilização da cannabis para fins medicinais na sessão de 2010 da Comissão de Narcóticos (CND). No entanto, um artigo do Financial Times dizia o seguinte: "Somando o custo directo da proibição (polícia e prisões) e os impostos que se perdem com o actual regime, os EUA esperariam obter um benefício fiscal de aproximadamente 100 mil milhões de dólares anuais.1

7. CONCLUSÕES

O problema das drogas requer cooperação a todos os níveis – local, regional, nacional, não governamental e internacional. Primeiro que tudo, é necessário assegurar a coordenação da política regional entre os Estados andinos e entre outros Estados latino-americanos, por forma

1 Financial Times, 12 de Abril de 2009.

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a reduzir gradualmente o tráfico e a manter a democracia e a segurança no hemisfério ocidental. A dificuldade em garantir a cooperação multinacional na luta contra o tráfico de drogas reside no facto de cada participante ter uma percepção diferente da ameaça que esse tráfico representa. Por conseguinte, os diferentes intervenientes podem não aceitar cooperar uns com os outros, como sucedeu com a UE e os Estados Unidos no caso do Plano Colômbia. Na perspectiva dos EUA, o tráfico de drogas constitui uma ameaça à segurança nacional que afecta os seus valores e a sua identidade. Enquanto superpotência, os EUA chamam a si o papel de polícia internacional, ao passo que a UE, para controlar a produção de droga nos países latino-americanos, focaliza a sua intervenção no desenvolvimento económico, social e político das regiões onde se cultiva a coca, através de programas de desenvolvimento alternativo.

Uma vez mais, a promoção da integração regional na América Latina deveria constituir a base destes esforços contra o tráfico de drogas e contra os efeitos nefastos que este fenómeno produz nas suas sociedades. No entanto, tendo em conta que a luta contra o tráfico de drogas a nível mundial pressupõe um esforço global, é necessário que as duas regiões receptoras principais, os EUA e a UE, coordenem os seus esforços e harmonizem as suas políticas num plano claro capaz de fornecer uma estratégia adaptada a cada país da região, seja produtor seja de trânsito.

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Anexo 1: Principais rotas do tráfico de drogas1.

1 Fonte: Grupo de Crise Internacional, Março de 2008.

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Anexo 2: Principal fluxo das exportações de drogas na América Latina1.

1 Fonte: Atlas mondial des drogues, PUF, Setembro de 1999.

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Anexo 3: Consumo de drogas a nível mundial.1

1 Fonte: UNODC, 2008.

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Anexo 4: Principais Drogas de Consumo Problemático de acordo com a Procura de Tratamento por Região Década de 1990-2008