docÊncia universitÁria e formaÇÃo docenteufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf ·...

38
DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTE Este engloba três pesquisas cujo foco incidi na docência universitária e a formação docente. A discussão sobre os professores (e futuros professores) do ensino superior tem sido crescente no Brasil e é praticamente impossível discutir esta temática sem tecer reflexões sobre a docência e a formação desses professores. Assim, este painel tem por objetivo fazer reflexões sobre o tema e discutir peculiaridades das pesquisas que o compõe. O primeiro estudo é de abordagem (auto)biográfica, com o uso do método das histórias de vida, com Ateliês Biográficos de Projeto, pautada na investigação- formação, foi realizada na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e teve por objetivo analisar como os professores universitários iniciantes desenvolvem (constroem/delineiam) a sua profissionalidade, afirmando a docência como profissão e ressignificando sua prática, saberes e contextos formativos. O segundo estudo é de caráter qualitativo e teve por objetivo principal analisar a formação de professores para a docência do ensino superior em quatro cursos de Pós-Graduação (Mestrado em Física, Química, Educação Matemática e Educação Científica e Formação de Professores) da Bahia. O último estudo de cunho qualitativo, foi realizado a partir do método e da técnica das histórias de vida, através de entrevistas narrativas, e apresenta reflexões sobre a formação do docente universitário, a partir da análise do processo de aprendizado da docência universitária de quatro professores no contexto dos cursos de Artes da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Assim, através deste, buscamos contribuir para pensar aspectos da trajetória formativa, do desenvolvimento profissional, saberes e identidade do docente ou futuro docente universitário. Palavras-chave: Docência Universitária. Professores. Formação Docente. XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 6708 ISSN 2177-336X

Upload: vutuyen

Post on 10-Nov-2018

212 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTE

Este engloba três pesquisas cujo foco incidi na docência universitária e a formação

docente. A discussão sobre os professores (e futuros professores) do ensino superior tem

sido crescente no Brasil e é praticamente impossível discutir esta temática sem tecer

reflexões sobre a docência e a formação desses professores. Assim, este painel tem por

objetivo fazer reflexões sobre o tema e discutir peculiaridades das pesquisas que o

compõe. O primeiro estudo é de abordagem (auto)biográfica, com o uso do método das

histórias de vida, com Ateliês Biográficos de Projeto, pautada na investigação-

formação, foi realizada na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e teve

por objetivo analisar como os professores universitários iniciantes desenvolvem

(constroem/delineiam) a sua profissionalidade, afirmando a docência como profissão e

ressignificando sua prática, saberes e contextos formativos. O segundo estudo é de

caráter qualitativo e teve por objetivo principal analisar a formação de professores para

a docência do ensino superior em quatro cursos de Pós-Graduação (Mestrado em Física,

Química, Educação Matemática e Educação Científica e Formação de Professores) da

Bahia. O último estudo de cunho qualitativo, foi realizado a partir do método e da

técnica das histórias de vida, através de entrevistas narrativas, e apresenta reflexões

sobre a formação do docente universitário, a partir da análise do processo de

aprendizado da docência universitária de quatro professores no contexto dos cursos de

Artes da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Assim, através deste, buscamos

contribuir para pensar aspectos da trajetória formativa, do desenvolvimento profissional,

saberes e identidade do docente ou futuro docente universitário.

Palavras-chave: Docência Universitária. Professores. Formação Docente.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6708ISSN 2177-336X

Page 2: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

2

PROFESSORES UNIVERSITÁRIOS INICIANTES: PROFISSIONALIDADE,

SABERES PEDAGÓGICOS E APRENDIZAGENS DA DOCÊNCIA

Lúcia Gracia Ferreira

Universidade Federal do Recôncavo da Bahia

Resumo: Esta pesquisa visa contribuir para os estudos sobre a profissionalidade dos

professores universitários iniciantes, a docência e a formação e, principalmente, refletir

sobre a aprendizagem da docência desses docentes. Tem por objetivo analisar como os

professores universitários iniciantes desenvolvem (constroem/delineiam) a sua

profissionalidade, afirmando a docência como profissão e ressignificando sua prática,

saberes e contextos formativos. A pesquisa, de caráter qualitativo e de abordagem

(auto)biográfica, a partir do método das histórias de vida, pautada na investigação-

formação, foi realizada na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, com três

professores universitários com até cinco anos de docência. Foi realizada no ano de 2015

e utilizamos para a coleta de dados instrumentos os ateliês biográficos de projeto

(Delory-Momberger, 2006). com os professores. Os resultados alcançados nesta etapa

dos Ateliês biográficos foram descritos e analisados à luz da técnica de análise temática

(Bardin, 1977) e os dados foram analisados a partir de dois eixos categoriais: 1) como

os professores referem a construção de sua profissionalidade e 2) como os professores

referem seus saberes didático-pedagógicos. Através da análise dos dados foi possível

constatar que, nas formações dos docentes universitários iniciantes há uma lacuna

didático-pedagógica referenciada por eles mesmos. Lacuna essa que reverbera em suas

práticas pedagógicas, muitas vezes, improvisada, intuitiva, sem o devido aporte

científico na Pedagogia e nas Ciências da educação. Verificamos, ainda, nesta pesquisa

elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que os

projetos de cada um desses professores universitários em início de carreira têm relação

com a vida pessoal e continuidade na carreira profissional docente.

Palavras-chave: Universidade, Profissionalidade docente; professores iniciantes.

Introdução

A formação de professores vem durante muito tempo se dando de forma a

fortalecer uma desvalorização já instalada no âmbito da sua profissão. Por isso, vale

salientar que a formação do profissional da educação, na maioria das vezes, tem sido

legada a último plano em relação a outras profissões. Por isso, pensar no professor

como o principal responsável pela boa ou má condução da educação leva-nos a refletir

sobre as possibilidades que esse profissional tem na realidade para a realização de um

trabalho pedagógico voltado para mudanças.

Assim, este artigo é fruto de uma pesquisa em andamento que vem sendo

realizada na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia/UFRB, desde o ano de 2015,

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6709ISSN 2177-336X

Page 3: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

3

cujo objetivo incide em analisar como os professores universitários iniciantes

desenvolvem (constroem/delineiam) a sua profissionalidade, afirmando a docência

como profissão e ressignificando sua prática, saberes e contextos formativos. Neste

cenário, os resultados da pesquisa visam contribuir para o fortalecimento da pesquisa no

campo da formação de professores e do desenvolvimento profissional, sempre

priorizando a formação dos professores e a docência.

Assim, a profissionalização se caracteriza como um processo histórico

desenvolvido no seio das relações sociais e se refere ao conjunto de procedimentos

próprios de um grupo profissional, no interior de uma estrutura de poder (CUNHA,

1999). Ratificando essa concepção Libâneo (2004, p. 75) a define como sendo aquela

que “refere-se às condições ideais que venham a garantir o exercício profissional de

qualidade”. Dessa forma, a busca pela autonomia e valorização profissional é

envolvida pelo movimento de profissionalização.

Sacristan (1995, p. 65) entende “por profissionalidade a afirmação do que é

específico na acção docente, isto é, o conjunto de comportamentos, conhecimentos,

destrezas, atitudes e valores que constituem a especificidade de ser professor”.

Para Boing (2002, p. 10): “marca o início da socialização profissional. É um

conjunto de conhecimentos e capacidades individuais e coletivas socialmente

colocadas como expectativa profissional. Desde a formação inicial, passando pela

formação continuada, percebe-se um constante trabalho de especialistas e profissionais

da área para transmitir os saberes e os fazeres ideais da profissão”.

Para Libâneo (2004, p. 75, 76) “refere-se ao desempenho competente e

compromissado dos deveres e responsabilidades que constituem a especificidade de ser

professor e ao comportamento ético e político expresso nas atitudes relacionadas a

prática profissional. Na prática, isso significa ter o domínio da matéria e dos métodos

de ensino, a dedicação ao trabalho, a participação na construção coletiva do projeto

pedagógico-curricular, o respeito à cultura de origem dos alunos, a assiduidade, o rigor

no preparo e na condução das aulas, o compromisso com um projeto político

democrático”.

D’Ávila (2012, p. 22) afirma que a profissionalidade é “esta capacidade de

mobilizar saberes, competências e valores profissionais no próprio exercício da

profissão, concluímos que a formação inicial constitui-se em etapa fundamental nesse

processo”.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6710ISSN 2177-336X

Page 4: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

4

No contexto da docência universitária, a profissionalidade do professor é

desenvolvida no exercício diário da profissão. Seus saberes didáticos e pedagógicos -

constituintes da profissionalidade como a concebemos - são mobilizados diuturnamente,

tal como acontece com os professores da educação básica. A diferença está no grau de

importância e ressignificação desses saberes ao longo do processo. Ou seja, se os

professores não valorizam (não pesquisam, não estudam, não refletem sobre) os saberes

didático-pedagógicos, considerando-os como de menor monta, sua profissionalidade

estará comprometida. E isso, claro, reverbera no seu profissionalismo (competência

profissional). O docente será mais competente na sua profissão se dominar os saberes

que lhe são constituintes.

Com isso, consideramos que a profissionalidade está vinculada ao processo de

desenvolvimento profissional, em que, no início do exercício da docência os professores

tendem a vivenciar um período de choque com a realidade, de descobertas e de grandes

impactos que são decisivos para sua permanência ou não na profissão.

Esse ritual de passagem, tanto para alunos, como para professores, se revela um

período de descobertas, desafios e dificuldades. Esses sujeitos passam a vivenciar um

duplo processo de aprender a ensinar e ensinar para aprender (MARCELO GARCIA,

2009). Assim, nesse período os professores iniciantes tendem a refletir mais sobre seus

saberes, sua formação e sua profissão. É um momento peculiar de retomada sobre a vida

e o que quer dela e de questionamentos, também, de reflexão sobre a sua

profissionalidade.

Em relação à profissionalidade do professor iniciante do ensino superior,

Marcelo Garcia (1999), ao remeter a formação do professor universitário nos seus

primeiros anos de ensino, aponta que a socialização é um elemento propício para a

aprendizagem da cultura da organização universitária. Dessa forma, enfatiza que no

desenvolvimento profissional do professor universitário deve existir a necessidade de

desenvolver as funções de docência, investigação e gestão.

No/para o desenvolvimento dessas funções os saberes didáticos-pedagógicos dos

professores são/serão imprescindíveis, principalmente sua mobilização e reconstrução.

É nesse processo de ser e estar na profissão docente que se aprende a ser professor e que

os professores iniciantes constroem a sua profissionalidade. Com isso, concordamos

com Ferreira e Bezerra (2015, 195) quando apontam que “tornar-se professor do ensino

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6711ISSN 2177-336X

Page 5: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

5

superior se configura, assim, em uma construção identitária multifacetada, pouco

sistematizada e muito diversificada em relação às possíveis áreas de atuação”.

Procedimentos metodológicos da pesquisa

A pesquisa sobre a profissionalidade de docentes da educação superior em início

de carreira foi realizada na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia/UFRB. Neste

artigo discorreremos sobre os Ateliês biográficos de projeto, trazendo à tona os dados

coletados no ano de 2015. Os ateliês biográficos de projeto se configuram como um

procedimento de formação ligado a “dimensão do relato como construção da

experiência do sujeito e da história de vida como espaço de formação aberto ao projeto

de si” (DELORY-MOMBERGER, 2006, p. 366). Segundo a autora, esses ateliês se

inscrevem em ações de orientação e reorientação profissional, em grupo e numa

prospectiva que liga as três dimensões da temporalidade (presente, passado e futuro).

Esta fase da pesquisa assume um caráter de pesquisa-formação na medida

que « [...] a atividade de pesquisa contribui para a formação dos participantes no plano

das aprendizagens reflexivas e interpretativas e se posiciona nos seus percursos de vida

como um momento de questionamento retroativo e prospectivo sobre seus projetos de

vida e suas necessidades atuais de formação » (JOSSO, 2008, p. 20).

Foi realizada uma pesquisa qualitativa, a partir da abordagem (auto)biográfica,

com o métodos das histórias de vida. A abordagem (auto)biográfica vem sendo muito

utilizada nas pesquisas sobre formação docente, a partir das histórias de vida dos

sujeitos participantes. Tivemos como participantes da pesquisa três professores

universitários iniciantes sendo: P1, Bacharel em Física, Doutor em Física, professor

desde 2014; P2, Licenciatura em Matemática, Mestre em Matemática professor desde

2013 e; P3, Bacharel em Agronomia, Doutor em Antropologia professor desde 2014.

Os resultados apurados nesta etapa dos Ateliês biográficos foram descritos e analisados

à luz da técnica de análise temática ou categorial, que segundo Bardin (1977).

Saberes didáticos-pedagógicos e profissionalidade docente

Dessa forma, neste artigo, optamos por apresentar os resultados da pesquisa a

partir de dois eixos estruturantes, sendo eles: 1) como os professores referem a

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6712ISSN 2177-336X

Page 6: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

6

construção de sua profissionalidade e 2) como os professores referem seus saberes

didático-pedagógicos .

Quanto ao primeiro eixo (construção da profissionalidade):

A minha formação docente simplesmente foi espelhar nos professores

que tive na graduação e na pós-graduação, os que eu tive um bom

aproveitamento tentei seguir na forma de dar aula, na forma como

avalia. (P1)

Eu sempre quis ser professor e no ensino superior onde eu poderia

descobrir a pesquisa, tanto no ensino quanto na Matemática. [...]

Licenciatura e bacharelado, como eu também não sabia a distinção o

que é bacharelado o que é licenciatura, só que eu sabia que queria ser

professor e todo mundo falava que licenciatura era pra isso ... No

ensino superior, em Matemática para ser professor no geral são

pessoas que terminam o bacharelado, fazem o mestrado em

Matemática, o doutorado em Matemática é que conseguem e eu fiz um

caminho que não foi tão simples. (P2)

A pesquisa e a extensão é que faz a minha docência. Minha docência

fica viva por causa de uma pesquisa e uma extensão viva. A partir da

pesquisa e da extensão que eu preparo minhas aulas, que acho o que é

melhor e mais adequado para os estudantes, para receber orientação,

sempre dialogando com as minhas disciplinas. “A universidade, é

onde eu mais me inspiro pra ser docente é no mestrado e doutorado,

nos meus orientadores, nas aulas que eles davam, nos grupos de

pesquisa”. (P3)

P3 diz que sua docência é inspirada principalmente nos seus orientadores (do

mestrado e doutorado), mas remete que o seu ensino hoje está mais ligado a área da

Antropologia do que da Agronomia. Afirma ainda que se tornou professor por causa da

pesquisa e não da docência. Para ele a pesquisa é um caminho para a docência e não o

contrário.

A fala de P1 remete à graduação e à pós-graduação e que foi nelas que

participou de grupos de estudos e pesquisas na Universidade Federal Fluminense/UFF,

e que a partir dos estudos em conjunto, o ajudou a vencer disciplina por disciplina.

Apesar de ter feito o bacharelado e de não ter cursado disciplinas pedagógicas, sabia

desde o início que teria que ser professor e que não tinha vontade de ir para outro campo

da Física que não fosse dentro da universidade e que para fazer pesquisa em Física

muito provavelmente teria que estar na universidade. Remete que a formação para

docência tem a ver com o se espelhar nos professores que teve na graduação e na pós-

graduação, quanto a forma de dar aula, de avaliar.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6713ISSN 2177-336X

Page 7: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

7

P2, por sua vez, sempre quis ser professor, já lecionou na Educação Básica. Fez

a licenciatura porque sempre quis a docência.

No momento da produção e socialização da segunda narrativa, os três

participantes destacaram aprendizagens relacionadas aos grupos de pesquisa, a pós-

graduação e a pesquisa, e revelaram como aprenderam/vem aprendendo a/sobre a

docência e com isso fazem referência aos saberes identificados nas falas. Nessa

perspectiva, Abdalla (2006, p. 93) ao falar do conhecimento profissional do professor,

pergunta: “mas afinal, como é que se processa o conhecimento sobre o ensino e para o

ensino? Como é que se estrutura a experiência de ser professor? Como é que o professor

aprende sua profissão?”. E as narrativas apontam que esses professores universitários

iniciantes dão pistas sobre esses questionamentos referenciando os saberes didáticos-

pedagógicos. Assim, é inerente à docência os saberes construídos nos percurso

formativo ou mobilizados na prática, ou seja, toda docência se faz a partir/com saberes

de ordem didático-pedagógica.

No percurso formativo, é perceptível que só P2 tem o curso de licenciatura, ou

seja, foi graduado para ensinar; os outros professores adquiriram essa licença por serem

pós-graduados. P1 e P2 iniciaram a participação em grupo de pesquisa na graduação. A

pós-graduação então é um espaço/tempo importante de aprendizagem da docência. Isso

explica o peso que tem a pesquisa em seu processo formativo. Na maioria dos exemplos

de docentes universitários, a pesquisa acaba se tornando a atividade acadêmica mais

importante, e a mais valorizada socialmente (em detrimento da docência). Recuperar,

pois, o papel fulcral que desempenha (ou deveria desempenhar) a docência em si (o

ensino), na vida acadêmica do professor universitário, é um dos objetivos subliminares

desta pesquisa.

A aprendizagem da docência é um processo longo, doloroso e, na maioria das

vezes, muito solitário. Grande parte dos professores universitários iniciantes chegam às

salas de aula em universidades públicas (nosso lócus de pesquisa), após a aprovação em

concurso público, sem terem passado por formação didático-pedagógica, como

mencionamos anteriormente. São bacharéis que cursaram mestrado e doutorado em suas

áreas disciplinares com uma formação calcada sobre a pesquisa, sem o devido preparo

didático-pedagógico. Vejamos em seguida a fala de P1, emblemática nesse sentido:

Quando eu estou caminhando normalmente, me pego despercebido e

observando mais as pessoas que estão na frente e eu fico na minha

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6714ISSN 2177-336X

Page 8: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

8

consciência assim, como é que vou chegar nesse pessoal que está lá

atrás, como é que eu vou fazer eles participarem também da aula. Ai é

minha tentativa de ir alcançando todo mundo dentro da sala. É isso, eu

tô dando minha aula a deriva, do jeito que eu preparei sem dá conta

dessas coisas. Quando eu me dou conta é que eu começo a adentrar.

(P1)

Essas aprendizagens da docência são latentes e constantes nos professores

iniciantes e, muitas vezes, perduram por toda a carreira profissional.

P1 e P3 demonstram aspectos dos saberes didáticos-pedagógicos (Eixo 2) que

vem aprendendo no processo de mobilização dos mesmos:

P3 falou do que vem dos estudantes, como aproveitar aquilo. Eu ainda

tenho essa dificuldade de sondar a minha turma, saber de onde eles

vêm qual a formação prévia deles para começar a falar sobre Física.

Às vezes eu acho que eu poderia ir mais lentamente no conteúdo que

eu estou passando. (P1)

Como trazer para dentro da sala de aula uma dinâmica que permita a

quebra das traduções e ao mesmo tempo em que você busque dele o

saber mais enraizado, que é diferente dessa tradução até ele identificar

o que essa tradução, o que é meu saber. Quando eles chegam aqui eles

já passaram por 8, lá na escola, 12 anos dentro de uma sala de aula,

então não é só um conhecimento enraizado dos saberes das

comunidades deles não [...]. Até a própria dinâmica, didática, assim,

você jogar na lousa tudo que vem sendo trazido por eles, quando vê a

lousa está um emaranhado de coisas escritas, relacionadas, então é

uma dinâmica muito, que didática é essa. (P3)

O espaço da prática é referenciado como espaço de desafio e de aprendizagem.

É espaço de saberes e, segundo Tardif (2012, p. 39), os saberes “são elementos

constituídos da prática docente”. Ambos os professores fizeram o bacharelado, mas P3

mostra que a formação da pós-graduação em Ciências Sociais e Antropologia e a

realização de pesquisas etnográficas com a convivência em comunidades do campo lhe

permitiu uma prática voltada mais para o social. Ele dá aula num curso com a

modalidade da Pedagogia da Alternância (Curso de Licenciatura em Educação do

Campo – área de Ciências Agrárias) e busca alcançar que seus alunos pensem a Ciência

Agrária e isso é da formação em Ciências Sociais dele.

Em seguida, apresentamos falas dos professores reveladoras dos saberes didático-

pedagógicos que mobilizam de forma intuitiva ou, muitas vezes, "improvisada" como

refere o P3:

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6715ISSN 2177-336X

Page 9: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

9

E passo muito por isso, geralmente as aulas são muita exposição. Hoje

que eu estou começando a pedir para eles lerem um capítulo para na

próxima aula eles iniciar um certo debate, mas sempre sou eu que....

(P1)

Como é que eu faço para esses alunos que não são aqueles que

participam mais da aula participem também, eu vou perguntando eles

vão respondendo, mas tem também aqueles que ficam lá sem saber de

nada. Fico pensando como chegar até eles. Geralmente eu ponho eles

para botar a mão na massa. Exemplo, na última aula eu pedi que todo

mundo falasse suas alturas para gente fazer uns probleminhas, acabou

todo mundo da sala participando. (P1)

Houve um equívoco, nosso curso é licenciatura não é bacharelado em

Matemática, mas a idéia é que nós precisávamos estudar de repente

matemática, e a ideia estava criando uma dicotomia educacional entre

a Educação Matemática, que é um campo, e a Matemática e eu vivo a

todo momento com essa situação, justificando, fazendo esse elo da

Matemática do ensino superior com a Matemática do ensino básico e

tentar justificar todo o curso. Por exemplo, tem uma disciplina

chamada Análise na reta que até então os alunos pensavam que era

para quem ia fazer Matemática, não viam relação. Então é uma

situação em que eu estou tento que ler material extra, fora, que

envolve Educação Matemática e a Matemática pura. Cada turma eu

trato diferente da outra. Já é a terceira vez que eu pego Sequência de

setas, a disciplina Cálculo III que eles chamam, mas assim eu trato

sempre uma turma diferente da outra pelo fato de ser pessoas

diferentes, o teste é mais inicial de uma turma para outra. (P2)

Para mim o tempo inteiro é improvisação porque a gente conta muito

com o saber dos estudantes. Mesmo que eu passe algumas atividades,

desde saber que aquelas atividades pode não ter sido feita, textos, mas

é muito buscar a partir do saber deles, a partir da relação que eles têm

[...]. Sala de aula é improviso o tempo todo por isso é a pesquisa e a

extensão que me dão orientação. Lógico que tem a preparação da aula,

o que está embasando ali por trás da aula, mas aquilo é só um

embasamento mesmo para poder estabelecer o diálogo, é constante

improvisação”. (P3)

Eles mostram a mobilização de saberes didático-pedagógicos e consequente

desenvolvimento da profissionalidade através dos conhecimentos da formação

profissional, dos conhecimentos dos conteúdos, dos conhecimentos dos seus alunos, dos

saberes construídos na prática. São saberes de experiência vivenciados como amálgama

na prática do trabalho docente.

Aspectos da ação docente estão bem presentes nessas falas, o improviso no

ensinar foi apontado por P1 e P3. O primeiro fala como ele se enxerga em sala de aula,

como eterno aprendiz, que caminha lentamente, que observa para aprender; fala da sua

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6716ISSN 2177-336X

Page 10: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

10

especificidade (A Física). P2 remete a essa especificidade também (A Matemática).

Todos eles falam de um modo se construir professores com suas singularidades,

aspectos que os diferenciam e revelam muito de suas identidades e dos professores que

são; e construir saberes para ensinar, num processo de construção, mobilização e

transformação.

Na perspectiva das narrativas, estas revelam que esses professores referenciam a

profissionalidade também a partir da aprendizagem coletiva, eles aprendem na

socialização profissional. Assim:

A ideia do professor-pesquisador que P3 falou, o professor em sua

sala de aula, no laboratório, na verdade, me chamou atenção. E P1 de

ser aprendiz. Nunca estou acabado, estou sempre na posição de

aprendiz, busco isso também. (P2)

A minha é enxergar a sala de aula como um laboratório, em que a

pesquisa, colocar na sala de aula ao mesmo tempo. Eu percebi pela

fala de P2 na Física a gente passa meio que por isso também tentar

colocar para os estudantes as disciplinas de Física geral, a importância

delas, porque é que tem que fazer aquilo tudo quando no Ensino

Médio você não faz nem metade. (P1)

Pensar formas que tragam as pessoas. Eu não obrigo a ficar na sala por

causa de, quer assinar e quer ir embora vá, elas são adultas, se estão

aqui é porque tem um interesse. Então como fazer com que a aula se

torne, e saber que como é um grupo diverso algumas coisas podem

interessar uns e outros não e entrar naquela forma de diálogo, acho

que é o que P1 falou. (P3)

No momento da socialização da segunda narrativa todos eles concordaram com a

ideia de aprendizagem ao longo da vida (ALHEIT e DAUSIEN, 2006, p. 179). Para P2

sala de aula é um lugar de aprendizagens constantes, um laboratório onde experiências

(de ensinar e aprender) acontecem. Para P1, cuja formação além de ser em bacharelado

é de uma área de conhecimento em que os resultados da aprendizagem são concretos

realizados a partir de laboratório, há a dificuldade de enxergar a sala de aula como esse

laboratório, pela própria ideia de laboratório que possui, oriunda de sua formação. E P3

fala do conhecimento dos alunos, da relação de todos com a aula. Todos eles nestes

relatos comentam as falas uns dos outros.

Nessa perspectiva, no momento dos ateliês, os professores aprenderam,

socializaram saberes, num processo de formação coparticipada em que não só

possibilitaram a coleta de dados para esta investigação, mas em contrapartida também

mergulharam num processo formativo onde suas singularidades profissionais foram

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6717ISSN 2177-336X

Page 11: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

11

socializadas, expostas, o que gerou possibilidades de mudanças de transformações de

suas práticas. Ainda, esses revelaram aspectos das três dimensões da temporalidade –

passado, presente e futuro, conforme apontado por Pineau (2003) e que os projetos de

si, ressaltado por Delory-Momberger (2006, 2008) (esses projetos estão ligados às

temporalidades) envolvem a carreira profissional docente e a vida pessoal. Eles

projetam o futuro com base no presente que vivenciam e no passado que formaram. Em

síntese, os ateliês formativos representaram mais uma etapa na construção da

profissionalidade desses atores sociais e que querem continuar na carreira docente.

Considerações finais

A relevância do presente estudo dá-se devido a proporção dos conhecimentos

gerados a partir dele e das mudanças que serão alcançadas. Assim, os resultados da

pesquisa revelam a lacuna didático-pedagógica referida pelos docentes universitários

iniciantes, em suas formações. Lacuna essa que reverbera em suas práticas, muitas

vezes improvisada, intuitiva, sem o devido aporte científico na Pedagogia e nas

Ciências da educação. Os professores se ressentem de solidão em seus processos de

aprendizagem da docência.

Nesse processo de ensinar e aprender os professores revelaram que revisitar o

passado, olhar com atenção o presente é necessário para a construção do futuro, essa é a

perspectiva dos ateliês, que olhemos para os nossos projetos de vida nas dimensões da

temporalidade e que esses sejam temporalidade da formação. Os professores revelam

isso quando falam da graduação, da pós-graduação e da entrada na carreira profissional

docente.

Referências

ABDALLA, Maria de Fátima Barbosa. O senso prático de ser e estar na profissão.

São Paulo, SP: Cortez, 2006.

ALHEIT, Peter; DAUSIEN, Bettina. Processo de formação e aprendizagem ao longo da

vida. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 32, n. 1. jan./abr., 2006. p. 177-197.

BARDIN L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições. 1977.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6718ISSN 2177-336X

Page 12: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

12

BOING, Luiz Alberto. A profissionalidade docente. Anais... VIII Jornada Pedagógica

do Grupo Escolas Rio. Rio de Janeiro, 2002.

CUNHA, Maria Isabel da. Profissionalização docente: contradições e perspectivas. In:

VEIGA, Ilma Passos Alencastro; CUNHA, Maria Isabel da (Orgs.). Desmistificando a

profissionalização do magistério. Campinas, SP: Papirus, 1999. p. 127-147.

D’ÁVILA, Cristina. Didática: a arte de formar professores no contexto universitário. In:

D'AVILA, Cristina; VEIGA, Ilma Passos Alencastro (Org.). Didática e docência na

educação superior: implicações para a formação de professores. Campinas: Papirus,

2012, p. 15-30.

DELORY-MOMBERGER, Christine. Formação e socialização: os ateliês biográficos

de projeto. Educação e Pesquisa, v.32, n.2. São Paulo. p.359-371, maio/ago, 2006.

____________. Biografia e Educação: figuras do indivíduo-projeto. Natal, RN:

EDUFRN; São Paulo: Paulus, 2008.

FERREIRA, Lúcia Gracia; BEZERRA, Paloma Oliveira. O professor do ensino

superior e sua formação: uma discussão necessária. Revista de Ciências da Educação.

Americana, Ano XVII, v. 01, n. 32, p. 05-28, jan-jun, 2015.

JOSSO, Marie-Chritine. As narrações centradas sobre a formação durante a vida como

desvelamento das formas e sentidos múltiplos de uma existencialidade singular- plural.

Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade, Salvador, n. 29. jan./jun. 2008,

p. 17-30.

LIBÂNEO, José Carlos. A organização e a gestão da escola: teoria e prática. 5 ed.

Goiânia: Editora Alternativa, 2004.

MARCELO GARCIA, Carlos. Formação de professores: para uma mudança

educativa. Porto: Porto Editora. 1999.

_____________. Los comienzos en la docencia: um profesorado con buenos princípios.

Revista de Currículum y Formación del profesorado. Universidad de Granada, v. 13,

n. 1, p. 1-25, 2009.

PINEAU, Gaston. Temporalidades da formação: rumo a novos sincronizadores.

Tradução de Lúcia Pereira de Souza. São Paulo: Triom. 2003.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6719ISSN 2177-336X

Page 13: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

13

SACRISTÁN, J. Gimeno. Consciência e acção sobre a prática como libertação

profissional dos professores. In: NÓVOA, António (org). Profissão professor. Porto:

Porto Editora, 1995. p. 63-92.

TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. 14. ed. Petrópolis, RJ:

Vozes, 2012.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6720ISSN 2177-336X

Page 14: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

14

DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES NOS

PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO

Adriana Guerra Ferreira

Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia/UESB

Resumo: Este artigo apresenta uma breve discussão sobre a formação docente ocorrida

nos Programas de Pós-Graduação (PPG) na área das Ciências Exatas e da Terra e da

área Multidisciplinar, uma vez que esta formação tem apresentado, segundo a literatura

diversos problemas referentes a prática pedagógica na docência do Ensino Superior. O

objetivo deste estudo é analisar o currículo e a formação de professores para à docência

do ensino superior em quatro cursos de Pós-Graduação (Mestrado em Física, Química,

Educação Matemática e Educação Científica e Formação de Professores). Neste

trabalho, optamos por apresentar o recorte referente a formação para a docência

universitária. Este é um estudo de abordagem qualitativa, com o uso de entrevistas com

os coordenadores dos cursos de Pós-Graduação investigados . Nesse sentido, o que nos

preocupa é a maneira como acontece esta formação nos PPG, dado que poucas são as

disciplinas pedagógicas que deveriam compor os currículos destes programas a fim de

contribuir para a formação docente para a inserção do profissional no ensino superior.

A atividade de estágio em docência, com caráter pedagógico, presente em alguns

cursos, são obrigatórios apenas para bolsistas e esta pesquisa evidenciou que este não é

tão presente, principalmente, nos cursos das áreas de exatas. No bojo dessa discussão,

percebemos que o grande destaque nesse processo e a ênfase são direcionados para a

formação do pesquisador em detrimento da formação docente. A formação para a

docência universitária deve ser pensada nestes PPG, pois sairão destes os profissionais

que serão formadores de formadores e terão uma grande responsabilidade com a

melhoria do ensino superior, portanto, estes devem possuir para exercer tão função, o

conhecimento pedagógico necessário para atuar.

Palavras-chave: Ensino Superior. Formação Docente. Profissionais.

Introdução

Os Programas de Pós-Graduação (PPG) stricto sensu (acadêmicos) brasileiros

têm sido bem representados internacionalmente, visto que, desde a década de 1970 o

Brasil vem construindo um Sistema Nacional de Pós-Graduação (mestrado e doutorado)

que estabelece a parte mais exitosa do seu sistema de ensino, considerado

unanimemente o maior e melhor da América Latina (MARTINS, 2003).

Esses programas são de caráter público e recebe apoio financeiro de algumas

agências de indução e fomento, preferencialmente, da Coordenação de Aperfeiçoamento

de Pessoal de Nível Superior (Capes), uma política pública do governo que demonstra

certa preocupação com a formação do professor do ensino superior. Apesar dos poucos

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6721ISSN 2177-336X

Page 15: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

15

recursos, principalmente em sua fase inicial, essa agência realizou diversas tentativas a

favor do ensino superior, promovendo resultados positivos, o que favoreceu a expansão

dos cursos de pós-graduação no país.

O foco deste estudo está centrado nos programas stricto sensu acadêmicos,

designadamente, os Programas de Pós-Graduação referente ao Ensino das Ciências

Exatas e da Terra, isto é, os cursos voltados ao estudo de Física, Química e Matemática,

todos de instituições públicas. Assim, o objetivo principal deste estudo é analisar o

currículo e a formação de professores para à docência do ensino superior em quatro

cursos de Pós-Graduação (Mestrado em Física, Química, Educação Matemática e

Educação Científica e Formação de Professores). Neste trabalho, optamos por

apresentar o recorte referente a formação para a docência universitária.

Procedimentos metodológicos da pesquisa

Esta pesquisa foi desenvolvida a partir da abordagem qualitativa, pois toda

pesquisa pressupõe a produção de conhecimentos e essa possibilita a dialética e a

relação dinâmica entre sujeito e objeto nesse processo de produção. A finalidade não foi

buscar dados estatísticos, mas sim compreender o seu objeto de estudo, o panorama

histórico dos Programas de Pós-Graduação.

Quanto aos objetivos, a mesma assume o caráter de uma pesquisa exploratória-

descritiva, pois buscou descrever as características apresentadas nos PPG das Ciências

Exatas e da Terra. Em se tratando dos procedimentos técnicos, a mesma se classifica

como uma pesquisa de campo.

Assim, foram utilizados artigos científicos, livros, dissertações e,

posteriormente, a partir da realização de um levantamento de dados no site da Capes e

dos PPG, visando conhecer as condições estabelecidas, o crescimento e o desempenho

dos Programas Pós-Graduação; e das entrevistas com os coordenadores dos cursos

investigados, sendo: Programa de Pós-Graduação em Física e Programa de Pós-

Graduação em Educação Matemática da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) e

Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Formação de Professores e

Programa de Pós-Graduação em Química da Universidade Estadual do Sudoeste da

Bahia (UESB). De posse dessas informações, classificamos quais pontos seriam

importantes para discussão. Em seguida, realizamos um comparativo dos dados

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6722ISSN 2177-336X

Page 16: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

16

buscando relacioná-los, analisá-los e descrevê-los. Desse modo, os dados foram

coletados através dos instrumentos citados e analisados a partir do material bibliográfico

estudado, que fundamenta esta pesquisa.

A formação do professor para docência do Ensino Superior

Conforme Masetto (2002), Pachane (2003), Isaia e Bolzan (2004), entre outros

teóricos, o domínio do professor no ensino superior na prática pedagógica tem

apresentado uma elevada deficiência, quando se fala em profissionalismo na docência.

Segundo Masetto (2002), eventualmente, seja pelo fato de nunca ter surgido a

oportunidade de entrar em contato com a área de atuação ou por não considerar como

um ponto fundamental para sua prática de ensino. E, ainda, acrescentamos a falta da

abordagem dessa prática nos cursos de mestrado e doutorado, uma vez que são nesses

cenários que deveria existir certo contato com essas discussões, pois de certa forma

temos como verdade que é a pós-graduação que forma o professor para a docência do

ensino superior, no entanto o que é mais comum nos cursos superiores são críticas

relacionadas a didática do professor, ou seja, a sua inexistência.

Pachane (2003) aborda esta questão em um dos seus trabalhos realizado na

Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), na qual discute a formação pedagógica

de pós-graduandos para a atuação no magistério do ensino superior, e em seus

resultados aponta que:

A pós-graduação tem sido o lócus privilegiado para a formação do

professor universitário, porém, tende a priorizar em suas atividades a

condução de pesquisas, tornando-se responsável, mesmo que não

intencionalmente, por reproduzir e perpetuar a crença de que para ser

professor basta conhecer a fundo determinado conteúdo ou, na

educação superior, ser um bom pesquisador. De maneira geral,

considera-se que a titulação, automaticamente, capacitaria o professor

para a docência (PACHANE, 2007, p.220).

A exigência de que o professor precisa ter uma formação pós-graduada para

assumir uma vaga no ensino superior começou no final da década de 1960 com a

Reforma Universitária (Lei n.º 5.540/68), e com esta reforma houve definitivamente o

fim das cátedras e deu se início uma nova corporação de professores nas instituições

universitárias. Nesse período, passou a classificar o corpo docente universitário em três

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6723ISSN 2177-336X

Page 17: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

17

classes distintas: professor auxiliar, assistente e adjunto. Para a primeira classe, não

existia concursos público de provas e de títulos, mas sim um contrato inicial por dois

anos, podendo ser renovado por mais dois, porém deveria apresentar uma aprovação

numa pós-graduação lato sensu para que fosse recontratado. Na segunda e última classe

as exigências permanecem até os nossos dias, pois é necessária a formação no mínimo

em mestrado e no doutorado, respectivamente. Hoje existe concurso público para a

classe de auxiliar que exige, normalmente, somente a graduação, mas isso depende do

estatuto da universidade e da necessidade de cada região.

Em 1970 a formação docente para o ensino superior começa a ter maior apoio

através da Capes com a implantação dos PNPG, de modo a buscar melhoria na

formação para docência do ensino superior. E assim, os cursos de mestrado e doutorado

se desenvolveram e se expandiram rapidamente no país, possivelmente, um dos fatores

que favoreceu estes acontecimentos, seja a vasta procura de professores a fim de se

adequar as exigências estabelecidas no final da década de 1960. Nesse sentido, a Capes

instaurou, ainda, como um dos objetivos da pós-graduação “a formação docente para o

ensino superior”.

Anos mais tarde as reivindicações quanto a titulação para docência no ensino

superior continuam a ser reforçadas através da nova LDB em 1996 (Lei nº.9.394/96),

deixando estabelecido no Artigo 16 que “a preparação para o exercício do magistério

superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente, em programas de

mestrado e doutorado”. Em 1999 é sancionado o Plano Nacional de Graduação no XII

Fórum Nacional de Pró-Reitores de Graduação das Universidades Brasileiras

(FORGRAD), após muitas críticas, reflexões e sugestões dos participantes desse fórum,

se expressou por meio deste documento a qualidade de formação desejada nos PPG,

uma vez que as atividades realizadas na pós-graduação não devemestá distante da

graduação, de fato:

A perspectiva científica indispensável para o docente de graduação é

objeto de formação específica própria do nível de pós-graduação. A

pós-graduação precisa integrar, à sua missão básica de formar

pesquisador, a responsabilidade de formação do professor de

graduação, integrando, expressamente, questões pedagógicas às que

dizem respeito ao rigor dos métodos específicos de produção do saber,

em perspectiva epistêmica (PNP, 1999, p.11).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6724ISSN 2177-336X

Page 18: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

18

Ou seja, a pós-graduação assumiu um papel maior após estas reformas, pois ela

teria que não apenas formar profissionais para o setor econômico e/ou pesquisadores,

mas, ainda, formar professor para a docência do ensino superior. Consequentemente, a

Capes neste mesmo ano passa a exigir dos PPG que, pelo menos, os bolsistas de cursos

de mestrado e doutorado fizessem o “Estágio de Docência”, no mínimo por um

semestre, concluindo que esta tarefa seria crucial na formação docente.

Apesar de todas as exigências e as reformas surgidas, percebemos, através de

algumas pesquisas concluídas (BOTOME E KUBO, 2002; MASETTO, 2002;

ARROIO, RODRIGUES FILHO E SILVA 2006; BRITO, 2006; PACHANE, 2003 e

2007; CUNHA, 2009; entre outros), que o desenvolvimento das atividades no interior

dos PPG não tem favorecido a prática pedagógica, cujo prestígio e prioridade estão

voltados preferencialmente à formação do pesquisador. Eventualmente, seja devido ao

processo avaliativo, realizado pela Capes nos PPG, está centrado sua atenção,

prioritariamente, à produção científica, pois quanto mais desenvolve pesquisas, maior e

melhor é o reconhecimento do PPG nacional e internacionalmente.

Nessa oportunidade, não existe análise na área pedagógica dos Programas de

Pós-Graduaçãopara inquirir se o pós-graduando que está sendo formado para a docência

da educação superior está apto ou não para desenvolver a tarefa, também, de ensino.

Conforme Pachane (2007):

[...] a formação esperada do professor universitário tem sido restrita ao

conhecimento aprofundado da disciplina a ser ensinada, sendo este

conhecimento prático -decorrente do exercício profissional - ou

teórico/epistemológico - decorrente do exercício acadêmico. Pouco,

ou nada, tem sido exigido em termos pedagógicos (PACHANE, 2007,

p.220).

Contudo, considera que uma vez conhecedor do conteúdo da disciplina que será

lecionada, seja o suficiente para realizar um excelente trabalho de ensino. Segundo

Masetto (2002) estas questões relacionadas ao ensino tem como base a crença de “quem

sabe, automaticamente, sabe ensinar”. Fazendo uso das palavras de Paulo Freire,

descarta-se a hipótese de que ensinar se resume em transmitir conhecimento, porque

ensinar significa criar possibilidades, para que seja possível o aluno relacionar o

conhecimento prévio com aquele estudado em sala de aula, ou melhor, o aluno

relacionar a teoria e a prática contextualizando e compreendendo de formaconcreta,

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6725ISSN 2177-336X

Page 19: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

19

porém no melhor modo de organizar o seu próprio conhecimento.Todavia, é

indispensável a formaçãopedagógica nos cursos de pós-graduação, pois esta é capaz de

favorecer e contribuir no exercício docente.

Vale destacar, que os PPG dos quais menos ou que não abordam discussões ou

atividades, de hipótese alguma, sobre a formação pedagógica são aqueles de área

específica, como Química, Física e Matemática, cujo prestígio e prioridade são

centrados, preferencialmente, à formação do pesquisador, pois não abarca as questões

mais particulares sobre a “pedagogia universitária”.

De acordo a Pachane (2003), é necessário chamar a atenção, também, para

aquelas instituições que organizam programas obrigatórios de formação pedagógica

para os pós-graduandos, apenas para cumprir as exigências legais, estabelecendo

unicamente o complemento de um curso de formação de mestres e doutores para a

docência superior, sem relacionar com as demais atividades realizadas no mesmo e sem

qualquer elo com a prática, se definindoà apresentação de parte mínima de teorias

educacionais ou até, para a oferta de algumas técnicas de conduzir as aulas, sem existir

determinada reflexão mais vasta sobre o ensino superior. São casos que podem pôr a

perder todo um esforço pela mudança da cultura de desvalorização da formação

pedagógica dos docentes universitários.

Aspectos da formação para a docência universitária nos cursos de Pós-Graduação

De acordo as exigências da Capes, um dos objetivos de qualquer Programa de

Pós-Graduação é a formação docente para o ensino superior, no entanto, o foco de

muitos PPG está muito distante dessa realidade, em outras palavras, o processo

formativo consistente na pós-graduação tem centrado preferencialmente na formação do

pesquisador. Mesmo tendo como objetivo “formaçãodo professor e formaçãodo

pesquisador”, percebemos isso, a partir da estrutura curricular de cada curso. Uma vez

que esse fator pode provocar a defasagem na área de formação docente e refletir no

exercício do magistério superior e no cumprimento de sua tarefa de formar diversos

profissionais em qualquer área. Com isso, gera práticas de ensino que se configuram

como sendo insuficientes ou insatisfatórias para o desenvolvimento das atividades

docentes, por conta da realidade da formação proporcionada pelos cursos de mestrado e

doutorado.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6726ISSN 2177-336X

Page 20: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

20

Assim, fizemos o recorte da perspectiva formativa a partir do estágio de

docência dos PPG. O Estágio de Docência foi proposto pela Capes, apenas, para os

discentes bolsistas de pós-graduação desta agência de fomento em 28 de fevereiro de

1999, no entanto foi regularizada pela assembleia de pesquisa e pós-graduação e pelo

presidente da Câmara de Pesquisa e Pós-Graduação no dia 19 de dezembro de 2000.

Com o entendimento de que este exercício tem significado pedagógico, profissional e

político, porém com a necessidade de planejar, no intuito de constituir-se em

experiência acadêmica significativa para os pós-graduandos.

De acordo a Capes, as atividades de ensino que devem ser desenvolvidas pelo

pós-graduando nos cursos de graduação na prática do estágio são: planejamento,

desenvolvimento e avaliação; construção de material didático; execução de aulas

teóricas ou práticas/laboratórios; auxílio aos alunos; e correção de provas e exercícios.

Esta agência de fomento, ainda, destaca o acompanhamento do orientador, do professor

ou coordenador de tal disciplina, onde o aluno atuará como estagiário.

Essa exigência do Estágio de Docência passou a ser considerada por diversos

PPG, ampliando este exercício, também, para aqueles discentes não bolsistas, uma vez

que a Capes solicita a alteração tanto na estrutura curricular quanto no regimento de

cada PPG.

Dos quatro PPG pesquisados, apenas em três deles possui o Estágio de

Docência. No P1 (PPG de Química), o estágio é obrigatório para os bolsistas,

independente da agência de fomento. No P2 (PPG de Física) não existe estágio docente.

E no P3 (PPG de Educação Científica e Formação de Professores) e P4 (PPG de

Educação Matemática) o estágio é obrigatório para todos os alunos, bolsista ou não.

Quanto ao funcionamento e organização desse estágio, os coordenadores relataram,

conforme descrito abaixo:

Todo aluno que recebe bolsa aqui tem essa obrigação, independente, seja bolsa da

Capes ou não; ele tem que fazer o estágio supervisionado, seja bolsa de Fapesb,

seja bolsa da própria instituição. Os alunos que não tem bolsa, que não tem nenhum

vínculo e já são professores em alguma escola, não estão liberados tempo integral.

Isso, a gente não faz essa exigência, mas é muito raro as últimas entradas não

tivemos alunos com essa característica, todos que bolsas, tiveram que fazer estágio

docente. A carga horária é de um semestre letivo dependendo da disciplina no

mínimo uma disciplina de 30 horas. [...] É uma disciplina de laboratório ou

também apoio na parte teórica, pode atuar nas duas, normalmente ele atua nas duas

ele ajuda na elaboração de exercícios, na preparação e também na regência. [...] A

prioridade são as disciplinas que tem atividades práticas, o aluno tira dúvidas

teóricas dos exercícios, vai preparando o experimento no laboratório e ensinando a

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6727ISSN 2177-336X

Page 21: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

21

parte teórica, fundamentação teórica do experimento e a prática do laboratório, mas

também atua na sala de aula na parte teórica. (Coordenação do P1)

Todos os discentes do programa, inclusive aqueles que já são professores

universitários precisam fazer o estágio. [...] Então ele planeja, ele executa, ele

auxilia e depois esse aluno faz um relatório das atividades desenvolvidas. Ele pode

também optar em fazer o estágio em outra disciplina, mas que tem a ver com o

trabalho que ele está desenvolvendo, com a área dele. O que a gente não tem ainda

no programa é uma sistematização desse estágio, então cada supervisor, cada

orientador conduz de uma forma diferenciada. Então, é o que a gente estabelece no

regimento, é que ele acompanhe sistematicamente um professor e a disciplina

durante o semestre inteiro; ela é 60 [horas], mas a gente não estabelece as ações

quando ele vai reger classe, quantas ele vai acompanhar, quantas horas ele vai

planejar isso ele ta livre, tá aberto. (Coordenação do P 3)

É obrigatório e acompanhado, são 60 horas, não é menos do que isso, não é

brincadeira não ele faz de verdade. Não chama assim, chama com outro nome,

Pratica de Ensino. Não são disciplinas pedagógicas, são as disciplinas de

Matemática, raramente eles pegam na licenciatura de matemática alguma coisa de

educação. Para entrar nesse programa o aluno tem que ter o curso completo de

matemática, portanto nada melhor do que ele ir para a graduação de matemática,

vê, assistir. Eles ai tem os relatórios que aprendem tudo isso. [...]. E como a gente

tem licenciatura e bacharelado em matemática a gente leva para área e os

professores aceitam receber, quer dizer, não só nós que damos aula na graduação,

mas os professores da graduação que nem estão ligados aqui conosco eles

permitem que os nossos alunos tenham a prática em sala de aula; ele não pode estar

presente sem que o professor esteja, por lei, ele não está ali para assumir sala de

aula, ele está ali, normalmente, porque o professor permite que ele ministre uma

aula e o professor assiste essa aula, ele acompanha o professor da disciplina e a

gente tem o professor nosso que acompanha esses meninos, assiste aula deles e faz

o acompanhamento. (Coordenação do P 4)

Percebemos que em P1 o Estágio é obrigatório somente para os bolsistas,

independente, da agência de fomento e deve ocorrer em uma disciplina de no mínimo

30 horas. O estágio acontece em disciplinas práticas ou de laboratório e faz parte das

atividades do estágio a realização de exercício, a regência, a teoria e a

prática/experimentos.

Em P3, o estágio é obrigatório para todos os discentes e deve ser realizado em

uma disciplina de no mínimo 60 horas. O desenvolvimento do estágio fica a critério de

cada supervisor, mas as atividades se vinculam ao planejamento, a execução e ao

auxílio em sala de aula. Ainda, os alunos optam por realizar o estágio em disciplinas

específicas ou que tenham a ver com a área do trabalho da pesquisa.

O estágio é obrigatório para todos os discentes também em P4. Este é chamado

também de Prática de ensino e deve ser realizado em uma disciplina de no mínimo 60

horas. Os alunos preferem estagiar em disciplinas específicas de sua área de

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6728ISSN 2177-336X

Page 22: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

22

conhecimento e este PPG conta com a colaboração de professores que não são do PPG

para receber alunos para realização de estágio.

Assim, o Estágio de Docência em alguns PPG é direcionado para os discentes

bolsistas de alguma agência de fomento, fora desse parâmetro torna-se optativo àqueles

discentes não bolsistas que despertam interesse pela atividade. Ainda, muitas vezes

demonstram apenas um cumprimento das exigências da Capes quanto ao Estágio

Docente, pois as demais disciplinas são todas específicas de cada curso, na qual

favorece integralmente a formação pela pesquisa.

Enfim, percebemos que é nítido o perfil dos PPG da área das Ciências Exatas e

da Terra (Física, Química e Matemática) de voltar-se inteiramente para formação do

pesquisador, mesmo aqueles PPG que maquiam com a oferta do Estágio de Docência.

Isso demonstra ser comum nas áreas ditas “duras”, pois a sua maior inquietação são

com os conhecimentos específicos.

Com isso, buscamos refletir sobre os seguintes questionamentos: qual a função

do estágio em cada PPG? Isso tem sido suficiente para a formação do professor?

Apesar da existência do Estágio Supervisionado em muitos dos PPG, é

demonstado que o pós-graduando presente nesse processo de formação para atuar,

também, no ensino universitário não vive a experiência de relacionar a teoria e a prática.

Embora, a formação seja um processo contínuo que não é só concretizada com a oferta

de disciplinas pedagógicas, é válido ressaltar que o conhecimento teórico é necessário

na relação teoria-prática, principalmente para a aquisição de experiências e pode

possível contribuir significativamente no desenvolvimento profissional. Ainda quanto a

questão do ensino e da pesquisa, consideramos que são duas atividades que devem estar

associadas, não devendo desvalorizar nem uma, nem outra. É nesse sentido, que a

formação pode ser vista:

[...] como um processo contínuo, baseado em uma vertente de

crescimento, isto é, não se deve entender a formação do pós-

graduando como uma somatória de disciplinas científicas com

disciplinas pedagógicas e sim, como um amadurecimento ao longo da

formação inicial continuando em formação posterior. Valorizando

assim a experiência profissional, buscando através de uma

diversificação dos modelos e das práticas pedagógicas vigentes com a

instituição de novas relações dos professores com os saberes

pedagógico e científico (ARROIO; RODRIGUES FILHO; SILVA,

2006, p. 1391).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6729ISSN 2177-336X

Page 23: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

23

As disciplinas cursadas sejam na graduação e/ou pós-graduação abarcam ideias

(re)construídas no processo de formação, mas deve-se levar em conta também na

qualificação as experiências profissionais, que ajude o aluno a desenvolver a capacidade

de associar o conhecimento científico adquirido com o conhecimento prático existente.

E essa pode ser uma maneira de minimizar a oposição que coloca de um lado o

pesquisador e do outro o professor, ou seja, a ideia é não trabalhar as disciplinas de

forma isolada e a formação do pós-graduando não ser compreendida e/ou reduzida ao

cumprimento dos créditos propostos.

Em suma, chamamos a atenção à importância e responsabilidade das políticas

públicas e das instituições nas propostas reguladoras de investimentos na formação

profissional do docente universitário, a fim de compreender e reconhecer que os saberes

para a docência exigem uma preparação acadêmica numa dimensão que envolva a teoria

e a prática (CUNHA, 2004). De qualquer modo, conforme, Botomé e Kubo (2002),

essas políticas são de grande relevância na orientação do trabalho dos cursos de

mestrados e doutorados nas Instituições de Ensino Superior, pois os mesmos são

dependentes da existência e da qualidade de um sistema de Ciência, Tecnologia e

Ensino Superior. É difícil manter bons PPG stricto sensu e acadêmicos se não existir

políticas públicas que correspondam a formação de professores de nível superior, e, por

conseguinte, de cientistas para o país.

Considerações finais

Neste estudo, buscamos discutir como acontece a formação nos PPG, das áreas

das Ciências Exatas e da Terra e da área Multidisciplinar. Nos preocupamos com o fato

de ser poucas as disciplinas pedagógicas que deveriam compor os currículos destes

programas a fim de contribuir para a formação docente para a inserção do profissional

no ensino superior.

A atividade de estágio em docência, com caráter pedagógico, presente em alguns

cursos, são obrigatórios apenas para bolsistas e esta pesquisa evidenciou que este não é

tão presente, principalmente, nos cursos das áreas de exatas.

No bojo dessa discussão, percebemos que o grande destaque nesse processo e a

ênfase são direcionados para a formação do pesquisador em detrimento da formação

docente. Nesse sentido, percebemos que o conhecimento pedagógico não é priorizado

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6730ISSN 2177-336X

Page 24: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

24

nas disciplinas. Até mesmo os PPG onde existe a oferta do Estágio Supervisionado

como tarefa obrigatória a todos os discentes, não é perceptível o currículo interesse para

essas discussões, pois o que predomina fortemente é a pesquisa, ou seja, o foco maior

nesses PPG é na formação do pesquisador.

A formação para a docência universitária deve ser pensada nestes PPG, pois

sairão destes os profissionais que serão formadores de formadores e terão uma grande

responsabilidade com a melhoria do ensino superior, portanto, estes devem possuir para

exercer tão função, o conhecimento pedagógico necessário para atuar.

Referências

ARROIO, A; RODRIGUES FILHO, U. P; SILVA, A. B. F. A formação do pós-

graduando em Química para a docência do ensino superior. Química Nova. V.29, n.6,

p. 1387-1392, 2006.

BOTOMÉ, S. P.; KUBO, O. M. Responsabilidade social dos programas de Pós-

graduação e formação de novos cientistas e professores de nível superior. Interação em

Psicologia, 2002, 6(1), p. 81-110.

BRASIL. Lei de diretrizes e bases, da educação nacional, de dezembro de 1996.

BRITO, T. T. R. A docência no Instituto de Biologia da Universidade Federal de

Uberlândia: percorrendo caminhos e encontrando representações. Dissertação

(Mestrado em Educação). Faculdade de Educação. Universidade Federal de Uberlândia.

Uberlândia: UFU, 2006.

CUNHA, M.I. Trajetória e lugares da formação do docente da educação superior: do

compromisso individual à responsabilidade institucional. Revista Brasileira de

Formação de Professores, v. 1, n. 1, p. 110-128, mai. 2009.

____________. Diferentes olhares sobre as práticas pedagógicas no Ensino Superior:

docência e formação. Revista de Educação (Lisboa), PUC/RS - Porto Alegre, v. 3,

n.54, p. 525-536, 2004.

ISAIA, S. M. A. ; BOLZAN, D.P.V. Formação do professor do ensino superior: um

processo que se aprende? ISSN 0101-9031. Educação. (UFSM), Santa Maria, v. 29,

n.2, p. 121-133, 2004.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6731ISSN 2177-336X

Page 25: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

25

MARTINS, C. B. Balanço: o papel da CAPES na formação do sistema nacional de pós-

graduação. In:CAPES 50 anos: depoimentos ao CPDOC/ FGV / Organizadoras:

Marieta de Moraes Ferreira & Regina da Luz Moreira. Rio de Janeiro: Fundação

Getulio Vargas, CPDOC; Brasília, DF.: CAPES, 2003. p. 294-309.

MASETTO, M.T. T. Professor universitário: um profissional da educação na atividade

docente. In: ______. (Org.). Docência na universidade. Campinas-SP: Papirus, 2002.

p. 09.

PACHANE, G. G. A importância da formação pedagógica para professor

universitário: a experiência da UNICAMP. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade

em Educação. Universidade Estadual de Campinas. Campinas: UNICAMP, 2003.

___________. Formação pedagógica de pós-graduandos para a atuação Docente no

ensino superior:A experiência da unicamp. Educere et Educare: revista de educação,

Cascável, v.2, n.4, jul./dez., p.219-233, 2007.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6732ISSN 2177-336X

Page 26: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

26

A FORMAÇÃO DO DOCENTE UNIVERSITÁRIO: ITINERÁRIOS DE

APRENDIZAGEM

Paloma Oliveira Bezerra

Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB

Resumo: O presente artigo apresenta considerações sobre a formação do docente

universitário, a partir das análises do processo de aprendizado da docência universitária

de quatro docentes que atuam no contexto dos cursos de Artes da Universidade Federal

de Uberlândia (UFU). Compreende-se que a docência na universidade, desse modo,

exige uma formação que atenda às especificidades desse nível de ensino Destarte, essa

discussão tem como objetivo analisar o processo de aprendizado da docência

universitária no contexto dos cursos de Artes da UFU, com a finalidade de refletir sobre

a formação do docente universitário na contemporaneidade. Assim como ampliar o

conhecimento acerca da docência universitária, e mais especificamente, da atuação e

formação do profissional docente, contribuindo com os debates a respeito da docência

na educação superior. A opção metodológica adotada é definida como qualitativa, dado

o seu caráter interpretativo. A construção dos dados tornou-se possível por meio de

entrevista narrativa e da história de vida como técnica de análise dos dados. Entre os

resultados mais significativos estão: o entrelaçamento das dimensões pessoais e

profissionais no processo formativo do docente universitário; e, que é a universidade

como lócus do exercício profissional que tem se constituído como o lugar da formação

para a docência universitária e não a universidade como aquela que abarca os programas

de pós-graduação responsáveis por essa formação. Ainda, considera-se que é necessário

despertar, nos professores, a vontade de refletir sobre os seus percursos profissionais,

sobre a forma como sentem a articulação entre o profissional e o pessoal, sobre a forma

como foram evoluindo ao longo da sua carreira.

Palavras-chave: Docência Universitária. Formação Docente. Aprendizado da

Docência.

Introdução

As perspectivas da educação atual remetem à necessidade de dinamizar o

processo de ensino-aprendizagem e rever o papel do docente, superando sua condição

de mero transmissor do conhecimento e concedendo-lhe a condição de ser um sujeito

capaz de analisar sua prática, intervir e construir um percurso inovador.

A docência na universidade, desse modo, exige uma formação que atenda às

especificidades desse nível de ensino. Conforme Teixeira (2009), a universidade se

constitui como principal espaço formativo para profissionais de diferentes áreas,

entretanto, tem-se mostrado ineficaz na formação de professores para atuar nas

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6733ISSN 2177-336X

Page 27: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

27

diferentes etapas e modalidades da educação, especialmente na educação

profissionalizante e nos cursos de graduação.

Entende-se que a preocupação com uma formação específica de professores é

recente, no contexto brasileiro o tema passou a ser destaque das principais conferências

e seminários sobre educação no país, especialmente a partir do final da década de 1970

e início dos anos 1980, momento em que estava em discussão em âmbito nacional a

reformulação dos cursos de Pedagogia e Licenciatura (DINIZ-PEREIRA, 2006). Ou

seja, a Universidade tem se constituído como espaço de atuação, mas nem sempre de

formação docente.

Nesse contexto, fruto da pesquisa e análises desenvolvidas durante o mestrado,

no âmbito do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal de

Uberlândia – UFU, o artigo apresenta reflexões sobre a formação do docente

universitário, a partir da análise do processo de aprendizado da docência universitária de

quatro professores no contexto dos cursos de Artes da UFU.

Caminhos Metodológicos

Pesquisar é reconhecer o saber acumulado na história humana, investindo-se do

interesse em aprofundar as observações já realizadas e perpetrar novas descobertas em

favor da humanidade (CHIZZOTTI, 2006). Desse modo, o artigo ora delineado tem

como escopo analisar o processo de aprendizado da docência universitária no contexto

dos cursos de Artes da Universidade Federal de Uberlândia – UFU, com a finalidade de

refletir sobre a formação do docente universitário na contemporaneidade.

A abordagem de pesquisa aqui utilizada foi à qualitativa, a escolha se deu visto

que, segundo Lankshear e Knobel (2008), faz pouco uso de formas estatísticas de

análise, não pressupõe grandes amostras e está especialmente interessada em como as

pessoas experimentam, entendem, interpretam e participam de seus mundos sociais e

culturais.

Para construção dos dados, optou-se pela entrevista narrativa, que conforme

estudos de Jovchelovitch e Bauer (2002, p. 95), “é motivada por uma crítica do esquema

pergunta-resposta da maioria das entrevistas. [...] emprega um tipo específico de

comunicação cotidiana, o contar e escutar história, para conseguir este objetivo”. Assim,

por meio das narrativas de quatro docentes dos cursos de Teatro, Música e Artes Visuais

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6734ISSN 2177-336X

Page 28: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

28

da UFU levantaram-se as informações sobre a formação para docência universitária.

Para análise dos dados, utilizou-se o método e a técnica das histórias de vida,

pois se compreende que as trajetórias formativas – pessoais e profissionais - dos sujeitos

são inseparáveis. Conforme Silva et al. (2007, p. 29), a história de vida pode ser

aproveitada como documento ou como técnica de captação de dados, visto que “[...] é

um método científico com toda força, validade e credibilidade de qualquer outro

método, sobretudo porque revela que por mais individual que seja uma história, ela é

sempre, ainda, coletiva”. Portanto, nas páginas que se seguem a docência universitária

é discutida através dos cenários de formação vivenciados pelos docentes.

Resultados e Discussão

A formação docente é objeto de permanente preocupação por parte de todos

aqueles que se interessam pelos destinos da educação em qualquer sociedade. Não tem

sido diferente no Brasil. Trata-se, sem nenhuma dúvida, de questão crucial para a área,

uma vez que o cerne do processo educacional encontra-se, em última análise, nas

relações concretas que se estabelecem entre educadores e educandos, nas quais a

atuação participativa dos primeiros assume papel decisivo (SEVERINO, 2006).

Quanto aos significados da palavra docência, têm-se, no sentido etimológico,

raízes no latim – docere – que significa ensinar, instruir, mostrar, indicar, dar a entender

(SOARES; CUNHA, 2010). No sentido formal, docência é o trabalho dos professores.

Na realidade, os docentes desempenham um conjunto de funções que ultrapassam as

tarefas de ministrar aulas e, por isso, a necessidade de se pensar na formação do

professor. Nas palavras de Barreiro (2003), a docência, atividade profissional do

professor, é reflexiva e artística, com aplicações de caráter técnico.

Contudo, apesar do avanço das pesquisas, há certa timidez no cenário

educacional quando o foco é a formação do docente universitário. Nos estudos

desenvolvidos a respeito dessa questão a ênfase tem incidido sobre a ausência de uma

preparação específica para a atuação na docência. Sendo assim, “só recentemente os

professores universitários começaram a se conscientizar de que a docência, como a

pesquisa e o exercício de qualquer profissão, exige capacitação própria e específica”

(MASETTO, 1998, p. 11).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6735ISSN 2177-336X

Page 29: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

29

Até a década de 1970, praticamente exigiam-se do candidato a professor de

ensino superior o Bacharelado e o exercício competente de sua profissão. O processo de

ensino era realizado segundo a crença de que os conhecimentos e experiências

profissionais são transmitidos de um professor que sabe e conhece para um aluno que

não sabe e não conhece. Na última década, as universidades passaram a exigir também

cursos de especialização e, atualmente, mestrado e doutorado. Contudo, as exigências

continuaram as mesmas, visto que se referem à experiência profissional e ao domínio do

conteúdo de determinada área (MASETTO, 2003).

Imbernón (2009) revela que a formação dos professores deve estar estreitamente

relacionada ao contexto, pois ela deve partir das necessidades reais surgidas no contexto

de atuação profissional. O autor ressalta a relevância de uma formação permanente do

professorado. Entretanto, os programas de pós-graduação que deveriam se voltar

também para essa finalidade centram-se na formação do pesquisador em seus campos

específicos e sem exigência quanto à formação de professores, mesmo após a Resolução

3/99 do Conselho Nacional de Educação (CNE), que exige oferta de uma disciplina

sobre metodologia de ensino nos cursos de pós-graduação lato sensu. Conforme

ratificado por Cunha (2010),

Os cursos de Pós-Graduação latu sensu e stricto sensu, também, em

alguns casos, incluem uma disciplina pedagógica, em geral ligada ao

campo da metodologia de ensino. No caso das especializações, por

alguns anos, essa iniciativa se dava por força da Lei. Nos demais

casos, a decisão ficava atrelada à sensibilidade dos organizadores das

propostas curriculares, algumas vezes, tendo em vista o interesse de

mestrandos e doutorandos em, futuramente, credenciar-se como

professores (CUNHA, 2010, p. 33).

A formação docente para a educação superior tem ficado a cargo das iniciativas

individuais e dos regimentos das instituições responsáveis pela oferta de cursos de pós-

graduação. Também, de acordo com Pachane (2006), a partir dos parâmetros de

qualidade institucional estabelecido pelo governo, muitas instituições de ensino superior

organizam e desenvolvem programas de preparação de seus docentes, orientadas por

tais parâmetros. Além disso, as políticas públicas não estabelecem diretamente

orientações para a formação do professor universitário, pelo contrário, há omissão das

políticas no que se refere a esses aspectos.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6736ISSN 2177-336X

Page 30: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

30

Ao retomar o exercício de suscitar os sentidos da palavra, como praticamos com

a palavra docente, passamos a pensar na palavra “formação”. O termo “formar” define-

se como dar corpo ou forma, constituir, organizar, fundar, conceber, imaginar, preparar

e, até mesmo, amoldar. Bolzan e Powaczuk (2009) apontam o processo de formação

como um movimento prospectivo de desenvolvimento, ou seja, “um movimento de

transformação do sujeito em direção ao que deseja vir a ser, evidenciando a estreita

relação entre suas potencialidades e as condições contextuais nos quais esta

transformação acontece” (p. 92).

Segundo o dicionário Aurélio (1986), (do latim formatione) formação é: - Ato,

efeito ou modo de formar. - Constituição, caráter. - Maneira por que se constitui uma

mentalidade, um caráter ou um conhecimento profissional. Com base no dicionário,

podemos significar formação docente como a constituição de uma mentalidade ou de

um conhecimento profissional, constituição do que caracteriza o professor. Essa

composição de vocábulos é complexa e esquecida. Ao versar sobre a formação docente,

Castro (2013, p. 138), brincando com as palavras, procura significados para “Formação.

Forma-ação. Ação de formar. Ações que formam. Colocar numa fôrma? Enformar?

Reformar? Dar forma? Ações de um sobre o outro e sobre si mesmo/a. Formação

docente: ação de formar um sujeito docente [...]”.

As considerações do referido autor nos remetem a diversos questionamentos,

afinal o que é formar um docente, ou melhor, como formar um docente? Quais ações

são necessárias para formar um docente na contemporaneidade? No que se refere ao

docente universitário, Miranda, Naves e Silva (2012) suscitam a discussão sobre a

pouca efetividade dos processos de formação para a docência na academia. Para as

autoras, há um “pequeno investimento em pesquisas desenvolvidas neste tema

específico [...] Talvez, por essa razão não se tenha notícias da existência de políticas

públicas de formação do docente universitário” (p. 57).

O descaso com a formação do docente universitário tem raízes históricas, como

já proferimos. Na organização do ensino superior no Brasil, o domínio de

conhecimentos específicos da área de conhecimento (ou disciplinares) e a experiência

profissional sempre foram privilegiados como os únicos requisitos para a docência nos

cursos superiores. Acreditava-se que quem sabe, sabe ensinar (MASETTO, 2003).

Porém, ainda hoje se tem dificuldade em discutir a formação do docente universitário,

especialmente quando se trata da elaboração de conhecimentos relacionados à docência.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6737ISSN 2177-336X

Page 31: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

31

Diversos estudos (BALZAN, 1988; CUNHA, 2010; MASETTO, 1998;

PACHANE, 2006; entre outros) revelam que o cenário do ensino superior na

contemporaneidade aponta para a necessidade de formação pedagógica de seus

professores.

A formação pedagógica do professor universitário deve ser um

processo sistemático e contínuo através do qual o docente, ou futuro

docente, se qualifica para o exercício do magistério. A formação

pedagógica não se limita aos aspectos práticos (didáticos ou

metodológicos) do fazer docente, porém engloba dimensões relativas

a questões éticas, afetivas e político-sociais envolvidas na docência.

[...] Fundamenta-se, portanto, numa concepção de prática educativa e

do ensino como atividade complexa que demanda dos professores

uma formação que supere o mero desenvolvimento de habilidades

técnicas ou simplesmente o conhecimento aprofundado de um

conteúdo específico (PACHANE, 2006, p. 134).

Nesse sentido, a formação pedagógica está para além das técnicas de ensino,

entendida como componente do processo de desenvolvimento profissional docente,

envolve elementos do fazer docente que ultrapassam a sala de aula, compreendendo as

dimensões éticas e política da educação. Retomando Duarte Jr. (2000), ao tratar da

figura do especialista, compreender as questões éticas, afetivas e político-sociais da

docência é perceber a integralidade do sujeito e do pedagógico. É oferecer ao professor

a possibilidade da reflexão no lugar da reprodução.

Melo (2012) aborda a docência como uma atividade que tem uma dimensão

teórico-prática e, por isso, o docente em formação deverá passar por um processo “de

preparação para assumir tarefas práticas relativas à docência, visto ser essa uma

profissão que demanda uma formação ampla e densa [...]” (MELO, 2012, p. 36).

Todavia, Tardif (2012) evidencia que não só o meio sociocultural, as

representações sociais e os conhecimentos técnico-científicos formam o professor. A

vivência e o fazer propiciam uma competência significativa nas mais diferentes e

adversas situações. Há de se considerar também que o momento de formação é

particular e cada sujeito internaliza-o de modo pessoal, talvez único. Segundo Tardif

(2012, p. 20):

Antes mesmo de ensinarem os futuros professores vivem nas salas de

aula muitas horas. Ora, tal imersão é necessariamente formadora, pois

leva os futuros professores a adquirirem crenças, representações e

certeza sobre a prática do ofício de professor, bem como sobre o que é

ser aluno.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6738ISSN 2177-336X

Page 32: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

32

A formação docente é contínua e se inicia muito antes da graduação. As

experiências trazidas na condição de aluno são importantes para a constituição do

docente. Contudo, ser docente hoje requer ir além dos exemplos de docente e docência

vivenciados ao longo da trajetória escolar/acadêmica. É o docente reflexivo que poderá

exercer os elementos que fazem parte da educação: saber ouvir, saber observar e saber

agir. Segundo Luckesi (2010, p. 29):

Formar o educador, a meu ver, seria criar condições para que o sujeito

se prepare filosófica, científica, técnica e afetivamente para o tipo de

ação que vai exercer. Para tanto, serão necessárias não só

aprendizagens cognitivas sobre os diversos campos de conhecimentos

que o auxiliem no desempenho do seu papel, mas – especialmente – o

desenvolvimento de uma atitude dialeticamente crítica sobre o mundo

e sua prática educacional.

Isto significa dizer que se o docente universitário não tiver clareza de sua

prática, de como organizá-la e para quê, correrá o risco de reduzir-se à mera reprodução

de modelos aprendidos em sala de aula. Portanto, é necessário que a prática docente

esteja submetida a uma reflexão sistemática e contínua (MALUSÀ, 2003, p. 138).

A reflexão consiste na capacidade de se voltar sobre si mesmo, sobre as

construções sociais, sobre as intenções, representações e estratégias de intervenção. A

expressão “pensamento reflexivo” originou-se nas formulações de John Dewey, na

década de 1930, sobre a compreensão da realidade e a construção de significados a

partir das experiências vividas. Para Dewey, a reflexão consiste na capacidade de

distinguir entre aquilo que tentamos fazer e o que sucede como consequência. Assim,

“[...] pensar é o esforço intencional para descobrir as relações específicas entre uma

coisa que fazemos e a consequência que resulta, de modo a haver continuidade entre

ambas” (1979, p. 158).

Ao desenvolver a capacidade de refletir sobre a sua prática de modo a tornar

claro o conhecimento meditado intrinsecamente e baseada em suas experimentações e

vivências o docente poderá compreender conhecimentos internos de forma mais

consciente.

[...] a reflexão se constitui como elemento capaz de promover a

dinamicidade da prática pedagógica, orientando esta de forma a

melhor atender os alunos. Isso possibilita uma formação profissional

reflexiva pautada numa prática que abranja as questões dos saberes,

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6739ISSN 2177-336X

Page 33: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

33

produção de valores e reflexão. A prática reflexiva ainda pressupõe

um vínculo indissociável entre teoria e prática, entre finalidade e ação,

entre o saber e o fazer, entre a concepção e a execução (FERREIRA,

2010, p. 121).

A reflexão sobre as vivências é a base para que o profissional possa efetuar as

críticas, observações sobre as estratégias e as teorias nas quais acredita o que lhe

possibilita modificar, transformar suas formas de atuação. Na perspectiva de Freire, “é

pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima

prática” (1996, p. 22).

Nesse sentido, as narrativas dos docentes pesquisados trazem elementos sobre o

aprendizado da docência partindo da reflexão do cotidiano e das trajetórias pessoais e

profissionais. Os docentes narram que a universidade, como lócus do exercício

profissional tem se constituído como o lugar da formaçãoi.

E tentei naquele momento um mestrado na PUC de São Paulo, eu queria o ensino

da língua portuguesa por meio do teatro. Quando fui prestar na PUC, o que eles me

falaram é o seguinte: olha aqui, na PUC a gente não tem ninguém pra orientar no

sentido do teatro, porque a gente aqui é de letras. Então, assim, você teria que ter

esse conhecimento pra poder fazer esse mestrado com a gente. Aí eu resolvi

estudar teatro. [...] E acabei indo pra escola livre [...] Eu venho de uma geração em

que a gente criticava mesmo a universidade. Por isso que eu fiz escola livre. Porque

naquele momento a gente achava que não tinha que ter universidade e pronto, o

artista é artista, ponto. Hoje eu penso um pouco diferente: a universidade não

existe. A universidade são as pessoas. Então se as pessoas mudam [...] a

universidade é um espaço que a gente tem que ocupar. Porque se a gente não

ocupar, os que realmente acreditam no poder da arte, que a arte é conhecimento, a

gente vai deixar pros picaretas. Eu não quero deixar pros picaretas. Eu quero gente

boa dentro da universidade. [...] Eu vejo assim que não dá pra separar a formação, a

pessoa que você é e a pratica que você tem na universidade, porque senão é

discurso, uma coisa é discurso, e a outra coisa é a prática. [...] Eu acho que essa

perspectiva de compreender que ser professor não é estar numa sala de aula. [...]

Porque eu fiquei pensando isso, porque na universidade, o que a gente menos faz é

dar aula. Porque a gente faz pesquisa, a gente faz extensão (Dona Chiquinha)ii.

[...] e eu acho que na nossa área a gente tem certo privilegio também de poder

investigar inclusive os modos de pesquisar, então eu acho que a faculdade ainda é

esse espaço de formação para o docente, e para mim ela também é um espaço de

formação para o docente porque ele possibilita a prática docente com os estudantes

(Márcia).

[...] como que as artes podem ajudar a universidade ser mais criativa, falta

criatividade de modo geral na universidade brasileira [...] Então, acho que juntar a

arte com a pesquisa pode ser um bom caminho, nesse sentido da criação, de novos

campos de conhecimentos [...] Eu tive oportunidade de fazer o mestrado na

Unicamp em história da arte, que é muito bom, e logo depois que eu terminei o

mestrado eu já comecei a trabalhar como professor substituto, primeiro lá no Rio

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6740ISSN 2177-336X

Page 34: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

34

de Janeiro, onde eu sou nascido, então assim eu terminei o mestrado na Unicamp,

fiz a graduação e o mestrado lá. [...] Como eu já estava nesse caminho, de dar aula

etc., eu comecei, mais tarde, a dar umas aulas em São Paulo também, e nesse

período eu compreendi que já que eu estava trabalhando como professor

universitário, e então eu queria pelo menos investir mais nessa carreira, eu senti

necessidade de fazer um doutorado. [...] Claro que o mestrado e doutorado

contribuem e contribuíram no meu caso para a formação docente, porque me deram

um método de pesquisa, de reflexão, e conteúdo também, em função das pesquisas

que eu fiz, e isso me ajuda muito, justamente quando eu preparo as aulas, ou seja,

eu sei que tem gente que critica o mestrado, a pós-graduação, mas o profissional

não aprende a ser professor, mas ele aprende a ser pesquisador, e eu acredito que

um aspecto importante do trabalho docente universitário é a pesquisa, eu não

acredito numa docência universitária que não tenha pesquisa. [...] (Alex).

[...] eu fui fazer música porque eu queria descobrir qual o segredo da música, só as

coisas básicas, o segredo da música. E isso foi que me encaminhou para a

universidade [...] Eu fui entender de fato quando eu tava no mestrado: ah isso que é

universidade, isso que é fazer pesquisa, isso é que é orientar, não fazia a mínima

ideia. Então isso atrasa um pouco a forma como você se organiza (Pereirinha).

Identificam-se diversas questões possíveis de reflexão nas narrativas acima.

Márcia, por exemplo, certifica a universidade como lugar para formação do docente e

para pesquisa, e também remete a uma aprendizagem da docência na prática

pedagógica. Pereirinha e Alex também expõem a arte como pesquisa. E já nas falas de

Pereirinha, Alex e Dona Chiquinha, a afirmação da arte como conhecimento e criação.

Evidenciam, ainda, que a universidade legitima o conhecimento em arte, já que todos

buscaram a instituição como espaço de formação, seja na graduação ou na pós-

graduação. Pereirinha, por exemplo, na busca pelo “segredo da música” procura uma

instituição de ensino superior. Nesse sentido, a universidade é considerada como lugar

do conhecimento, da pesquisa. No momento em que decide “descobrir o segredo da

música” na instituição, Pereirinha afirma a universidade como espaço de construção do

conhecimento, e, desse modo, do conhecimento em música, em arte.

Em compensação, as falas também abordam a importância da arte para a

universidade, e a necessidade da universidade ser ocupada por artistas, tanto para

afirmar a arte como um campo do saber, quanto para possibilitar a instituição

universitária ser mais criativa, promovendo novos campos de conhecimento, indo contra

a pobreza de experiências. Todo o corpus da pesquisa revela o processo formativo e a

formação dos professores pesquisados. Formação se refere à vida, “significa, assim,

reconhecimento das trajetórias próprias dos homens e mulheres, bem como exige a

contextualização histórica dessas trajetórias, assumindo a provisoriedade de propostas

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6741ISSN 2177-336X

Page 35: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

35

de formação de determinada sociedade” (BATISTA, 2002, p. 136). De fato, o percurso

profissional dos professores foi reconstruído, narrado e foram dados a eles novos

sentidos e significados.

De tal modo, embora os docentes associem a formação para docência apenas à

formação inicial e/ou continuada, percebemos em suas falas que é no ir e vir, no

constante movimento da articulação entre a prática, os saberes e a formação que nossos

personagens vão constituindo seus processos formativos como docentes.

Considerações Finais

Essa caminhada teve como ponto de partida as reflexões sobre a formação do

docente universitário. Nas análises dos dados, nota-se que todos os docentes sujeitos da

pesquisa cursaram mestrado e doutorado. Embora esses cursos serem incumbidos pela

formação dos formadores, eles têm delimitado esse processo à pesquisa, deixando

fragilizada a formação dos professores ao não tratar dos conhecimentos pedagógicos.

Isso nos revela que é a universidade como lócus do exercício profissional que

tem se constituído como o lugar da formação para a docência universitária e não a

universidade como aquela que abarca os programas de pós-graduação responsáveis por

essa formação, que precisa ser referendada por políticas públicas específicas, deixando

de ser assumidas ao bel-prazer de cada programa.

A universidade não tem olhado para si no sentido de perceber o ensino na

mesma perspectiva da pesquisa, pois desenvolve pesquisas diversas, mas se coloca

muito pouco como objeto de suas próprias pesquisas, fazendo com que o tripé – ensino,

pesquisa, extensão – cresça de modo competitivo e não de maneira indissociável. Nessa

perspectiva, a docência tem sido menos visualizada nesse lugar. Forma o professor que

irá atuar na educação básica e pouco ou nada faz para formar o professor responsável

pela formação de todos os demais profissionais. Mesmo nos programas de pós-

graduação em Educação, há escassas ações específicas para esse fim.

Por fim, nota-se que esses professores se formaram/formam nas universidades,

especialmente, nos programas de pós-graduação, pois é a esses que se remetem quando

abordam seus processos formativos, com exceção de Dona Chiquinha, que cita também

a Escola Livre de Teatro. Entretanto, compreende-se que os docentes dessa pesquisa se

formam no transcorrer, ou melhor, no entrelaçamento das dimensões pessoais e

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6742ISSN 2177-336X

Page 36: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

36

profissionais, ao mobilizar/construir saberes na prática docente e artística, ao constituir

suas identidades. É imperioso, portanto, despertar, nos professores, a vontade de refletir

sobre os seus percursos profissionais, sobre a forma como sentem a articulação entre o

profissional e o pessoal, sobre a forma como foram evoluindo ao longo da sua carreira.

Referências

BALZAN, N. C. A didática e a questão da qualidade do ensino superior. São Paulo:

Cortez, 1988.

BARREIRO, A.C.M. A prática docente na Universidade. In: MALUSÁ, S. A Prática

da docência universitária. São Paulo: Factash Editora, 2003. p.137-174.

BATISTA, S. H. S. S. “Formação”. In: FAZENDA, I. (org.). Dicionário em

construção: interdisciplinaridade. São Paulo: Cortez, 2002.

BOLZAN, D.P.V.; POWACZUK, A.C.H. Docência universitária: a construção da

professoralidade. Revista Brasileira de Formação de Professores-RBFP. v.1.,n.3,

2009, 90 – 104.

CASTRO, R.P. Formação docente, subjetividades e experiência: problematizações a

partir dos percursos, pela pesquisa e pela docência. In: FERRARI, A. A potencialidade

do conceito de experiência para a educação. Juiz de Fora, MG: UFJF, 2013, p. 139 –

158.

CHIZZOTTI, A. Pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais. 4. ed.

Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.

CUNHA, M. I. (org.). Trajetórias e lugares de formação da docência universitária:

da perspectiva individual ao espaço institucional. Araraquara, SP: Junqueira & Marin;

Brasília, DF: CAPES: CNPq, 2010.

DEWEY J. Democracia e educação. São Paulo: Companhia Editora Nacional; 1979.

DINIZ-PEREIRA, J. E. Formação de professores: pesquisas, representações e poder. 2

ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.

DUARTE JR., J. F. O Sentido dos sentidos: a educação (do) sensível. Tese.

(Doutorado). Programa de Pós-Graduação em Educação. Universidade Estadual de

Campinas. Campinas – SP, 2000.

FERREIRA, L. G. Professoras da zona rural: formação, identidade, saberes e práticas.

Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Educação e

Contemporaneidade. Universidade do Estado da Bahia: Salvador- BA, 2010.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de

Janeiro: Paz e Terra, 1996.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6743ISSN 2177-336X

Page 37: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

37

IMBERNÓN, F. Formação docente profissional. Forma-se para a mudança e a

incerteza.9.ed .São Paulo: Cortez, 2009.

JOVCHELOVITCH, S; BAUER, M. W. Entrevista Narrativa. In: BAUER, M. W;

GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático.

Petrópolis, RJ. Editora Vozes Ltda., 2002. p. 90-113.

LANKSHEAR, C; KNOBEL, M. Panorama da coleta de dados na pesquisa qualitativa.

In: __________. Pesquisa Pedagógica: do projeto à implementação. Trad. Magda

França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2008. p. 149-167.

LUCKESI, C. C. O papel da didática na formação do educador. In: CANDAU, V. M.

(org). A didática em questão. 30. ed – Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2010.

MALUSÁ, S. Investigação sobre a atualização docente no ensino superior. In:

MALUSÁ, S; FELTRAN, R.C. de S. (orgs.). A Prática da docência universitária. São

Paulo: Factash Editora, 2003. p.137-174.

MASETTO, M. T. (Org.) Docência na universidade. Campinas-SP: Papirus,1998

_______________. Competência pedagógica do professor universitário. São Paulo:

Summus, 2003.

MELO, G.F. Docência na universidade: em foco os formadores de professores. In:

MELO, F. G; NAVES, P. L. M. de (orgs). Didática e docência universitária.

Uberlândia EDFU, 2012.p. 29 – 56.

MIRANDA, A.A.B; NAVES, M.L.P; SILVA, R.M.G. Constituição do professor

universitário: um olhar sobre a trajetória de formação e atuação profissional. In: MELO,

F. G; NAVES, P. L. M. de (orgs). Didática e docência universitária. Uberlândia

EDFU, 2012, p. 57 - 76

PACHANE, G. G. Teoria e prática na formação de professores universitários: elementos

para discussão. In: RISTOFF, D.; SEVEGNANI, P. (orgs.). Docência na Educação

Superior. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira, 2006.

SEVERINO , A. J. A busca do sentido da formação humana: tarefa da Filosofia da

Educação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.3, p. 619-634, set./dez. 2006.

SILVA, A. P. et al. “Conte-me sua história”: reflexões sobre o método de História de

vida. Mosaico: estudos em psicologia. Vol. I, nº 1, 2007. p. 25-35.

SOARES, S. R.; CUNHA, M. I. Formação do professor: a docência universitária em

busca de legitimidade. Salvador: EDUFBA, 2010.

TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 14. ed. Petrópolis, RJ: Vozes,

2012.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6744ISSN 2177-336X

Page 38: DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA E FORMAÇÃO DOCENTEufmt.br/endipe2016/downloads/233_10857_36662.pdf · elementos das três dimensões da temporalidade (passado, presente e futuro) e que

38

TEIXEIRA, G.F.M. Docência: uma construção a partir de múltiplos condicionantes.

Boletim. Técnico Senac: a R. Educ. Prof., Rio de Janeiro, v. 35, n.1, jan./abr. 2009.

i As entrevistas narrativas foram individuais e gravadas em áudio. Após a transcrição das entrevistas, os

arquivos foram enviados individualmente para cada docente, a fim de que pudessem fazer as alterações

que julgassem necessárias. Durante a entrevista, os docentes lembravam-se de episódios, pessoas, lugares;

iam dando conta de como se constituíram artistas, docentes. Dado a extensão das narrativas e o objetivo

do artigo apresentado, foram agregados apenas alguns trechos com o intuito de expor as percepções dos

docentes sobre seus processos formativos. ii Os codinomes dos participantes foram atribuídos pelos pesquisadores.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

6745ISSN 2177-336X