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JULIANA LECH BERNARDONI
Diversidade funcional das metaloproteinases
do veneno de Bothrops neuwiedi
São Paulo 2017
Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências-Toxinologia do Instituto Butantan, para obtenção do título de Doutor em Ciências.
JULIANA LECH BERNARDONI
Diversidade funcional das metaloproteinases
do veneno de Bothrops neuwiedi
.
São Paulo 2017
Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências-Toxinologia do Instituto Butantan, para obtenção do título de Doutor em Ciências. Orientador: Ana Maria Moura da Silva
Av. Vital Brasil, 1500
São Paulo,05503-900
Tel/Fax: (11) 3726-7222 r 2064
http://posgrad.butantan.gov.br
AUTORIZAÇÃO PARA REPRODUÇÃO DE TRABALHO
Eu, Juliana Lech Bernardoni, aluno de mestrado/doutorado do Programa de Pós-graduação em
Ciências-Toxinologia do Instituto Butantan, autorizo a divulgação de minha dissertação/tese por
mídia impressa eletrônica ou qualquer outra, assim como a reprodução total desta
dissertação/tese após publicação, para fins acadêmicos desde que citada a fonte.
Prazo de liberação da divulgação da dissertação/tese após a data da defesa:
(X) Imediato
( ) 06 meses
( ) 12 meses
( ) Não autorizo a divulgação
Justifique:
São Paulo, 05 de Junho de 2017
.................................................................................. Aluno(a) De acordo:........................................................................... Orientador(a): Dra. Ana Maria Moura da Silva
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São Paulo,05503-900
Tel/Fax: (11) 3726-7222 r 2064
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RESULTADO DA DEFESA DE TESE
DOUTORADO
NOME DO ALUNO(A): Juliana Lech Bernardoni
DATA DO EXAME:.............../07/2017
BANCA EXAMINADORA: Profs. Drs.
NOME Assinatura Aprovado(a) Reprovado(a)
Ana Maria Moura da Silva ______________________ ( ) ( )
(Presidente)
________________________ ______________________ ( ) ( )
________________________ ______________________ ( ) ( )
________________________ ______________________ ( ) ( )
________________________ ______________________ ( ) ( )
DECISÃO FINAL: APROVADO(A) ( ) REPROVADO(A) ( )
Comentários da Banca (opcional):
À Deus e aos meus pais. Obrigada!
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus pais, Heloisa e Edson, que não medem esforços para que eu
alcance todos os meus objetivos. Obrigada pelo apoio incondicional! Sem vocês
nada disso seria possível. Amo vocês!
Ao meu marido, Fábio, que me entendeu e apoiou durante a fase mais crítica deste
trabalho. Que é quem caminha ao meu lado, que sempre estive disposto a ajudar e a
quem eu amo muito!
À minha orientadora, Ana, principalmente pela paciência comigo. Obrigada por
acreditar no meu potencial e pela oportunidade. Foram sete longos anos de
pesquisa, aprendizado e enriquecimento profissional.
À minha irmã paraense, Ane: não tenho palavras para expressar como sua amizade,
apoio e companheirismo foram importantes durante esta longa jornada. Tê-la comigo
durante todo o trajeto foi um presente! E agora, te levo comigo pra vida toda.
Obrigada!
Aos pesquisadores e alunos (ou ex-alunos) do Laboratório de Imunopatologia por
toda ajuda e pelo acolhimento. Foram sete anos de muitos desafios.
Aos funcionários do laboratório, Chiquinho, Juçara, Josefa, Cris e principalmente à
Cleusinha, pelo café e por me aguentarem e me ajudarem sempre que preciso.
À Dra. Mônica Lopes Ferreira, do Centro de Toxinas, Resposta Imune e Sinalização
Celular (CEPID-FAPESP) do Instituto Butantan, pela contribuição nos experimentos
de microscopia intravital e pelas excelentes discussões.
Ao Dr. Benedito Carlos Prezoto, do Laboratório de Farmacologia do Instituto
Butantan, pela contribuição nos experimentos de tromboelastografia.
Ao Dr. R. Manjunatha Kini, do Department of Biological Sciences da National
University of Singapore, e aos alunos do seu laboratório pela orientação durante o
doutorado sanduíche e pela contribuição ao trabalho.
Este trabalho teve o apoio financeiro da Fapesp. Processo: 2012/23018-0 e
Processo: 2014/13592-6.
“Aprender é a única coisa de que a mente nunca se cansa,
nunca tem medo e nunca se arrepende.”
Leonardo da Vinci
RESUMO
Bernardoni, Juliana Lech. Diversidade funcional das metaloproteinases do veneno de Bothrops neuwiedi. 2017. 87 f. Tese (Ciências-Toxinologia). Instituto Butantan, São Paulo, 2017.
As metaloproteinases de venenos de serpentes (SVMPs) são enzimas
abundantes em venenos de espécies da família Viperidae e responsáveis por grande
parte dos sintomas do envenenamento. Sua ação está relacionada com a proteólise
dos componentes da matriz extracelular, proteínas plasmáticas e também com
hidrólise ou ligação a proteínas de superfície celular induzindo a ativação ou inibição
da atividade das mesmas. Neste trabalho, o principal objetivo foi analisar as
implicações da diversidade estrutural e funcional das SVMPs do veneno de B.
neuwiedi, avaliando seus efeitos em distúrbios hemostáticos de mamíferos e frente a
presa ou predador de serpentes. Inicialmente, elucidamos a sequência parcial de
aminoácidos das SVMPs de classe P-I (que apresentaram apenas 78% de
similaridade entre si), além de obter o cristal de uma. Posteriormente identificamos
diferentes graus de hemorragia induzidos pelas SVMPs de classe P-III (com doses
mínimas hemorrágicas de: 3,08 μg para Ic; 5,67 μg para IIb e 7,55 μg para IIc). Além
disso, foram observadas diferentes ações das SVMPs testadas (tanto P-I quanto P-
III) frente aos componentes de matriz extracelular (adesão e clivagem) e frente às
células endoteliais (adesão e viabilidade). Observou-se também, no experimento de
coagulação, a presença de SVMPs que atuaram especificamente no sangue de
mamífero, assim como outras que atuaram apenas em sangue de ave,
demonstrando uma ação seletiva das SVMPs. Deste modo, concluímos que deve
haver a contribuição de outros fatores, além dos domínios estruturais, para a
diversidade funcional de SVMPs. Não obstante, a diversidade funcional das SVMPs
contribuiu para o papel adaptativo dos venenos ofídicos.
Palavras-chave: Bothrops, metaloproteinases, hemostasia, enzimas proteolíticas e
adaptação do veneno de serpentes.
ABSTRACT
Bernardoni, Juliana Lech. Functional diversity of metalloproteinases in the Bothrops neuwiedi venom. 2017. 87 p. Doctorate thesis (Sciences-Toxinology). Instituto Butantan, São Paulo, 2017. The snake venom metalloproteinases (SVMPs) are abundant enzymes in the
venoms of viper snakes and responsible for most of the symptoms of envenoming.
Their actions are related to the hydrolysis of extracellular matrix components, plasma
proteins and hydrolysis or binding to cell surface proteins resulting in the activation or
inhibition of their activity. In this work, the main objective was to analyze the
implications of the structural and functional diversity of B. neuwiedi venom SVMPs,
evaluating their effects on mammal’s hemostatic disorders and against prey or
predator of snakes. Initially, we elucidated the partial amino acid sequence of class
P-I SVMPs (which presented only 78% similarity to each other), in addition to
obtaining the crystal of one. Subsequently we identified different degrees of
hemorrhage induced by class P-III SVMPs (with hemorrhagic minimum doses of:
3.08 μg for Ic, 5.67 μg for IIb and 7.55 μg for IIc). In addition, different actions of the
SVMPs tested (both P-I and P-III) were observed against extracellular matrix
components (adhesion and cleavage) and against endothelial cells (adhesion and
viability). It was also observed in the coagulation experiment, the presence of SVMPs
that specifically acted on mammalian blood, as well as others that acted only on bird
blood, demonstrating a selective action of SVMPs. With this we conclude that there
must be the contribution of other factors, besides the structural domains, to the
functional diversity of SVMPs. Therefore, the functional diversity of SVMPs
contributed to the adaptive role of snake venoms.
Key words: Bothrops, metalloproteinases, hemostasis, proteolytic enzymes and
snake venom adaptation.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 14
1.1. Metaloproteinases de Venenos de Serpentes (SVMPs) ................................ 15
1.1.1. Biossíntese, processamento e estrutura de SVMPs........................................ 15
1.1.2. Diversidade funcional das SVMPs .................................................................. 17
1.2. Importância da diversidade funcional nos venenos de serpentes .............. 20
1.3. O veneno de Bothrops neuwiedi ..................................................................... 21
2. OBJETIVOS .......................................................................................................... 24
2.1. Isolar as principais metaloproteinases presentes no veneno de B.
neuwiedi ................................................................................................................... 24
2.2. Investigar diferenças estruturais entre as SVMPs isoladas ......................... 24
2.3. Verificar possíveis diferenças na ação das SVMPs em componentes do
controle da hemostasia de mamíferos .................................................................. 24
2.4. Verificar possíveis diferenças na ação das SVMPs na coagulação do
sangue de diferentes presas/predadores .............................................................. 24
3. MATERIAL E MÉTODOS ..................................................................................... 25
3.1. Amostras de SVMPs......................................................................................... 25
3.2. Caracterização estrutural das SVMPs da classe P-I...................................... 25
3.2.1. Digestão enzimática das SVMPs de classe P-I: IVa e IVb .............................. 26
3.2.2. Análises por espectrometria de massas .......................................................... 26
3.2.3. Cristalografia ................................................................................................... 27
3.3. Caracterização funcional ................................................................................. 28
3.3.1. Animais ............................................................................................................ 28
3.3.2. Microscopia intravital ....................................................................................... 28
3.3.3. Atividade hemorrágica ..................................................................................... 29
3.3.4. Atividade enzimática ........................................................................................ 30
3.3.5. Efeitos nas proteínas de matriz extracelular (MEC) ........................................ 30
3.3.5.1. Ligação às proteínas de matriz extracelular ................................................. 30
3.3.5.2. Degradação do matrigel ............................................................................... 30
3.3.6. Avaliação dos efeitos das SVMPs sobre células endoteliais .......................... 31
3.3.7. Tromboelastografia ......................................................................................... 32
4. RESULTADOS ...................................................................................................... 33
4.1. Elucidação da sequência de aminoácidos das SVMPs de classe P-I .......... 33
4.2. Determinação da estrutura tridimensional ..................................................... 35
4.3. Ação na microcirculação de camundongos .................................................. 37
4.4. Efeitos das SVMPs nos componentes da MEC ............................................. 40
4.5. Toxicidade celular ............................................................................................ 43
4.6. Ação das SVMPs na coagulação de animais modelo para presas e
predadores de serpentes ........................................................................................ 47
5. DISCUSSÃO ......................................................................................................... 49
6. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 56
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 57
ANEXO...................................................................................................................... 67
Kit de Cristalização: Crystal Screen .......................................................................... 67
Kit de Cristalização: Index ......................................................................................... 69
Kit de Cristalização: Wizard 1-2 ................................................................................ 71
Kit de Cristalização: Wizard 3-4 ................................................................................ 73
Paper ......................................................................................................................... 75
14
1. INTRODUÇÃO
As serpentes do gênero Bothrops estão distribuídas em todo o território
brasileiro sendo representadas por 42 diferentes espécies (Carrasco et al., 2012).
Conjuntamente, estas espécies são responsáveis por 90% dos acidentes ofídicos
que ocorrem no Brasil, os quais são caracterizados por lesões locais, incluindo
hemorragia, micronecrose, dermonecrose e edema, e alterações sistêmicas, com
coagulopatia característica da maioria dos acidentes (França e Málaque, 2009).
Esses eventos envolvem a ação de proteínas que promovem dano microvascular e
interferência na cascata de coagulação, levando à incoagulabilidade sanguínea e
hemorragia, e em componentes teciduais incluindo na reparação tecidual, levando e
a um dano tecidual severo no local da picada (Gutierrez et al., 2009; Moura-Da-Silva
et al., 2009).
Venenos de serpentes contêm uma mistura de proteínas e polipeptídeos que
possuem várias funções bioquímicas e farmacológicas. Os componentes
predominantes nos venenos pertencem a um pequeno número de superfamílias de
proteínas. Membros destas superfamílias têm estruturas proteicas similares, mas, às
vezes, diferem notavelmente em seus efeitos biológicos (Doley et al., 2009).
Podemos destacar como os componentes mais abundantes do veneno de serpentes
do gênero Bothrops proteases, como metaloproteinases e serinoproteinases,
fosfolipases A2, L-aminoácido oxidase, 5’-nucleotidase, hialuronidase e lectinas tipo
C (Alam et al., 1996; Kini, 2006; Sousa et al., 2013). As fosfolipases A2 exibem
propriedades biológicas diversas, são anticoagulantes, cardiotóxicas, miotóxicas,
neurotóxicas, hemolíticas, hipotensivas e também contribuem para os efeitos locais,
como dor, edema, e principalmente a mionecrose (Moura-Da-Silva et al., 1990;
Gutiérrez e Lomonte, 1995; Kini, 2006; Gutierrez et al., 2009). Estas toxinas ainda
desencadeiam reação inflamatória aguda, com infiltrado leucocitário, citocinas e
outros mediadores pró-inflamatórios (Teixeira et al., 2003).
As lectinas tipo-C dos venenos de serpentes são proteínas, não-enzimáticas,
que podem ser classificadas em lectinas tipo-C verdadeiras (CTL) e Proteínas tipo
Lectinas Tipo-C (CLP). As CTLs possuem um domínio para reconhecimento de
carboidratos que liga açúcares e são capazes de aglutinar eritrócitos e estimular a
15
agregação plaquetária, já as CLPs, mais presentes nos venenos de serpentes
(Zelensky e Gready, 2005), não apresentam o sítio de ligação para açúcar
(Arlinghaus e Eble, 2012) mas agem como anticoagulantes (Morita, 2005), como
ativadores de pró-trombina, ou ainda como agonistas/antagonistas da agregação
plaquetária (Sajevic et al., 2011). Já as serinoproteinases, são enzimas que também
afetam o sistema hemostático; elas agem em vários componentes da cascata de
coagulação, no sistema fibrinolítico e em células, causando um desbalanço no
sistema hemostático (Pirkle, 1998).
As L-aminoácido oxidases são enzimas que catalisam a desaminação
oxidativa de L-aminoácidos para α-ceto-ácidos, levando à formação de amônia e
peróxido de hidrogênio (Sajevic et al., 2011); e embora também sejam componentes
amplamente distribuídos nos venenos de Bothrops, o papel dessas proteínas nos
envenenamentos ainda não está bem esclarecido; acreditando-se que elas possam
influenciar a agregação plaquetária (Rodrigues et al., 2009; Sun et al., 2010) e
induzir apoptose em células endoteliais, por meio da produção de H2O2 (Du e
Clemetson, 2002), e desse modo contribuir para as hemorragias. Por outro lado, as
hialuronidases, apesar de pouco abudantes nos venenos botrópicos, podem
potencializar a toxicidade destes, promovendo a diminuição da integridade da matriz
extracelular dos tecidos que circundam as veias e aumentando o influxo sistêmico
das toxinas (Girish et al., 2002; Kemparaju e Girish, 2006).
Finalmente, as metaloproteinases são toxinas que atuam tanto nos efeitos
locais, quanto sistêmicos. Elas agem em uma variedade de substratos, incluindo
proteínas plasmáticas, componentes da cascata de coagulação, componentes da
matriz extracelular localizados na membrana basal da microvasculatura, células
endoteliais e componentes envolvidos na agregação plaquetária. Além disso, ativam
células inflamatórias, que liberam mediadores como citocinas, e estimulam a
migração de células para o local da picada (Moura-Da-Silva et al., 2009).
1.1. Metaloproteinases de Venenos de Serpentes (SVMPs)
1.1.1. Biossíntese, processamento e estrutura de SVMPs
As metaloproteinases são os componentes mais abundantes na maioria dos
venenos botrópicos atingindo 53% do total de transcritos produzidos na glândula de
16
veneno de Bothrops jararaca (Cidade et al., 2006). Essas enzimas têm sido
extensivamente estudadas e consideradas toxinas “chaves” para o desenvolvimento
da lesão local e alterações sistêmicas características do envenenamento por
serpentes viperídeas (White, 2005; Moura-Da-Silva et al., 2007).
As SVMPs pertencem à superfamília das metzincinas, subfamília das
reprolisinas, que são peptidases dependentes de zinco e estão relacionadas
evolutivamente às metaloproteinases que degradam matriz extracelular (MMPs) e às
proteínas ADAMs (A Disintegrina and Metaloproteinase) (Bode et al., 1993; Stocker
e Bode, 1995). As SVMPs compreendem uma série de proteínas de variada massa
molecular, que são sintetizadas como precursores multidomínios latentes. Sofrem
diferentes estágios de processamento, gerando moléculas cataliticamente ativas e
domínios livres não enzimáticos, conhecidos como disintegrinas.
As SVMPs são agrupadas em classes e subclasses de P-I a P-III de acordo
com a organização de seus domínios (Fox e Serrano, 2008). Nos venenos, há
predominância das SVMPs da classe P-I e as da classe P-III, na forma
cataliticamente ativa, além de uma variedade de domínios disintegrina livres ou
dimerizados, os quais geralmente apresentam o tripeptídeo RGD, originados do
processamento das SVMPs da classe P-II. As SVMPs classe P-I e P-III contêm o
domínio catalítico funcional semelhante ao das MMPs, com regiões homólogas ao
motivo de ligação ao zinco HEXXHXXGXXH, e um motivo estrutural Met-Turn CI/VM
que estabiliza três resíduos de histidina envolvidos na catálise (Bode et al., 1993). As
SVMPs da classe P-III possuem adicionalmente os domínios tipo-disintegrina e rico
em cisteínas. O domínio tipo-disintegrina das SVMPs da classe P-III é homologo às
RGD-disintegrinas, mas mostra substituição do tripeptídeo RGD, pela seqüência
SECD. Os domínios tipo-disintegrina e rico em cisteínas das SVMPs da classe P-III
apresentam similaridade estrutural com as regiões análogas das ADAMs, que são
proteínas geralmente expressas em membranas celulares de mamíferos,
responsáveis por vários processos de ativação e comunicação celular (Fox e
Serrano, 2008).
SVMPs são sintetizadas a partir de diferentes genes que se acumularam no
genoma das serpentes por mecanismos de duplicação, seguida por evolução
acelerada, exon shuffling, entre outros fatores de geração de diversidade genética
(Moura-Da-Silva et al., 1996a; Juarez et al., 2008; Escalante, T et al., 2011). A
biossíntese e o processamento dessas toxinas são etapas fundamentais para a
17
geração da diversidade estrutural dessa família de proteínas. Após a tradução do
mRNA, as SVMPs perdem a sequência sinal no retículo endoplasmático e são
processadas formando pontes dissulfeto, sofrendo glicosilação, processamento
proteolítico e, em alguns casos, formam estruturas multiméricas (Moura-Da-Silva et
al., 2016). Outra interessante modificação pós-traducional das SVMPs,
principalmente da classe P-III, é a ciclização do resíduo glutamil amino-terminal para
piro-glutamato. Essa ciclização confere resistência às proteínas contra o
processamento proteolítico pelas exopeptidases, protegendo assim suas atividades
biológicas. Dado o grande número de pontes dissulfeto nas proteínas das classes P-
II e P-III, a correta formação destas pontes é um componente crítico da maturação
das SVMPs (Moura-Da-Silva et al., 2009). Os zimogênios de SVMPs são ativados
pela hidrólise do pró-domínio (Grams et al., 1993).
1.1.2. Diversidade funcional das SVMPs
A diversidade estrutural das SVMPs confere a esta família de proteínas uma vasta
diversidade funcional, seja pela biossíntese de componentes distintos ou pela
presença de diferentes motivos funcionais, em regiões distintas de uma mesma
molécula. A ação das SVMPs está relacionada com a proteólise dos componentes
da matriz extracelular (Gutiérrez et al., 2016), proteínas plasmáticas (Sugiki et al.,
1995) e proteínas de superfície celular (Wu et al., 2016). Além disso, SVMPs são
capazes de interagir com receptores de plaquetas (Andrews et al., 2001) e células
endoteliais (Tanjoni et al., 2005), ativando ou inibindo a resposta celular. Esses
efeitos promovem alterações patológicas severas, observadas durante o
envenenamento, como hemorragia, inibição da agregação plaquetária, coagulopatia,
micronecrose e resposta inflamatória (White, 2005; Moura-Da-Silva et al., 2007).
Uma grande variedade de componentes do veneno pode atuar como pró-
coagulantes, causando a ativação in-vivo do sistema de coagulação. Entretanto, isso
não resulta em trombose, mas em depleção do fibrinogênio circulante, tornando o
sangue incoagulável (White, 2005). Entre as SVMPs, destacam-se as enzimas
fibrinolíticas e fibrinogenolíticas (Swenson e Markland, 2005) e também SVMPs da
classe P-III que não possuem atividade hemorrágica, mas exercem efeitos
coagulantes potentes, por ativarem a pró-trombina ou fator X da cascata da
18
coagulação (Kini, 2005; Schattner et al., 2005). As SVMPs da classe P-II também
exercem um papel importante no quadro de incoagulabilidade sanguínea, uma vez
que são precursoras das disintegrinas. O motivo RGD do domínio disintegrina é um
potente inibidor da agregação plaquetária, capaz de se ligar a integrina αIIbβ3,
receptor plaquetário responsável pela ligação ao fibrinogênio que resulta na
agregação (Marcinkiewicz, 2007). As SVMPs da classe P-III também interferem na
agregação plaquetária, inibindo predominantemente a ativação das mesmas via
colágeno (Kamiguti et al., 1996). A interação específica dos domínios tipo
disintegrina e rico em cisteína, presentes nas SVMPs da classe P-III, também
favorecem sua ligação a componentes plasmáticos como o vWF (fator de von
Willebrand) e componentes de matriz extracelular como o colágeno. A ligação da
jararagina, uma SVMP da classe P-III isolada do veneno de B. jararaca (Paine et al.,
1992), ao colágeno foi mostrada como sendo um fator importante para a localização
da toxina aderida a componentes da matriz extracelular, favorecendo assim a
hidrólise das proteínas da membrana basal, ruptura dos capilares e desenvolvimento
da hemorragia (Baldo et al., 2010a).
A degradação da membrana basal (MB) induzida pelas SVMPs enfraquece a
estabilidade mecânica dos vasos capilares. Como consequência da mudança de
pressão e estresse do fluxo normal do sangue, ocorre uma distensão das células
endoteliais até o ponto onde sua integridade é rompida e o extravasamento
sanguíneo ocorre (Gutiérrez et al., 2016) (Figura 1). Portanto, o quadro hemorrágico
está relacionado à ação destas toxinas sobre os capilares sanguíneos, que resulta
em hemorragia. A ação hemorrágica induzida pela perda da integridade dos vasos
capilares, devido a ação das SVMPs, é uma das mais graves consequências do
envenenamento botrópico (Gutierrez et al., 2005; Escalante, T. et al., 2011). Em
acidentes leves, a ação hemorrágica é limitada ao sítio da picada. Contudo, em
casos severos a hemorragia se espalha, afetando tecidos circunvizinhos ou até
órgãos distantes tais como coração, pulmões, rins, intestino e cérebro (Hati et al.,
1999). O quadro hemorrágico é ainda agravado por alterações no sistema
hemostático como a inibição da agregação plaquetária (De Luca et al., 1995;
Kamiguti et al., 1996) e o consumo dos fatores da coagulação sanguínea, como o
fibrinogênio (Willis e Tu, 1988).
19
Figura 1- Hidrólise de componentes da matriz extracelular por SVMPs. Algumas SVMPs hidrolisam componentes da membrana basal (MB) dos vasos capilares, fibras musculares esqueléticas e junção dérmico-epidérmica. No caso das SVMPs hemorrágicas, postulou-se que a hidrólise do colágeno tipo IV é um passo-chave na desestabilização da MB, o que leva ao extravasamento. As SVMPs também hidrolisam proteínas adicionais da matriz extracelular, tais como FACITs, colágeno tipo VI e outros componentes que conectam a MB com o estroma da matriz circundante. Além disso, as SVMPs degradam as proteínas que se ligam e organizam os colágenos fibrilares, levando a uma desorganização da estrutura supramolecular da matriz extracelular. As SVMPs também podem hidrolisar componentes da membrana plasmática, como as integrinas, que interagem com os componentes da MB. Todas estas ações hidrolíticas resultam em uma alteração profunda da matriz extracelular, com consequências para os processos de lesão tecidual induzida pelo veneno, reparo e regeneração. [Adaptado de: (Gutiérrez et al., 2016)].
SVMPs desempenham ainda um papel relevante na resposta inflamatória
induzida durante os envenenamentos por Bothrops, e estudos demonstram a
participação de mediadores inflamatórios na indução desta resposta. SVMPs podem
ativar mecanismos pró-inflamatórios endógenos através do processamento de TNF-
α (Moura-Da-Silva et al., 1996b) e liberação de citocinas (Clissa et al., 2001; Lopes
et al., 2009). São responsáveis pelo acúmulo de leucócitos no local da inoculação do
veneno (Costa et al., 2002; Lopes et al., 2009), e pelo desenvolvimento da necrose,
um mecanismo dependente de TNF-α (Laing et al., 2003). Em células endoteliais,
20
ativam a produção de NO (óxido nítrico), prostaciclina e IL-8 (Schattner et al., 2005),
potencializando o edema e contribuindo para o dano local severo.
A diversidade funcional exibida pelas SVMPs está diretamente relacionada
com sua complexidade e diversidade estrutural gerada no processo de evolução
dessa família de proteínas.
1.2. A importância da diversidade funcional nos venenos de serpentes
O veneno é produzido nas serpentes por glândulas especializadas localizadas
na mandíbula superior. O aparecimento da glândula e do aparato inoculador de
veneno representou uma inovação chave na evolução ofídica que permitiu às
serpentes derivadas a transição da imobilização mecânica (constrição) para a
química (veneno), sendo uma vantagem para o processo de caça uma vez que
possibilitou a captura de presas por processos de imobilização e não apenas a força
constritora (Juarez et al., 2008).
A composição do veneno tem sido considerada um fenótipo plástico e
associado principalmente à dieta (Daltry et al., 1996; Gibbs e Mackessy, 2009; Gibbs
et al., 2011). Durante o desenvolvimento ontogenético da serpente podem ocorrer
mudanças na dieta, devido à disponibilidade de presas ou mudanças no tamanho do
corpo, que podem acarretar mudanças na composição do veneno (Gibbs et al.,
2009; Zelanis et al., 2010). Nesse sentido, a glândula de veneno, local onde é
produzido o arsenal bioquímico dos venenos, expressa genes que codificam toxinas,
capazes de paralisar e matar diferentes tipos de presas, dos quais a serpente se
alimenta ao longo de seu ciclo de vida, em diferentes estações, e é razoável esperar
que a modulação da expressão de tais genes resulte na variabilidade do veneno. Em
venenos não neurotóxicos de viperídeos, os mecanismos utilizados para imobilizar e
matar presas estão relacionados com a interrupção da função hemostática dos
animais. Logo, uma boa estratégia para a eficácia do mecanismo de indução de
distúrbios hemostáticos na presa, seria a diversificação do arsenal de toxinas, para
conseguir toxinas funcionalmente distintas, com ação potente em diferentes alvos da
cascata da coagulação e sistemas vasculares (Bernardoni et al., 2014).
Comparando toxinas de venenos pertencentes a uma mesma família de
proteínas, frequentemente notamos variações significativas em sua sequência e
estrutura, ainda que tipicamente preservem o “arcabouço” molecular de proteínas
21
ancestrais (Fry e Wuster, 2004). Os genes de toxinas provavelmente evoluíram a
partir de genes que codificavam proteínas endógenas, com funções fisiológicas
normais, que foram recrutados para a glândula de veneno (Casewell et al., 2013), e
a variabilidade observada no veneno, provavelmente é resultado da frequente
duplicação de genes, das mutações pontuais em regiões de codificação de
proteínas, seguidas por seleção positiva e neofuncionalização (geração de nova
função protéica, que não era a função primária na proteína ancestral) das cópias de
genes duplicados (Lynch, 2007; Pahari et al., 2007; Juarez et al., 2008; Doley et al.,
2009; Fry et al., 2012; Brust et al., 2013). Juntos, esses mecanismos evolutivos
levam a alterações nos efeitos biológicos das toxinas, gerando entre as isoformas
um leque abrangente de moléculas, capazes de interagir com diversos receptores,
em diferentes tipos de presas.
1.3. O veneno de Bothrops neuwiedi
Iniciamos em nosso laboratório os estudos com o veneno de serpentes do
complexo Bothrops neuwiedi para estudar mecanismos evolutivos envolvidos na
geração da diversidade funcional de SVMPs. Essas serpentes, originalmente
classificadas como Bothrops neuwiedi, estão passando por um processo de revisão
sistemática, sendo ora descritas como uma única espécie com várias subespécies
ora como espécies distintas (Silva e Rodrigues, 2008). Estudos sugerem inclusive
alterações no gênero dessas serpentes (Fenwick et al., 2009).
Serpentes do complexo B. neuwiedi ocorrem no Brasil, na Bolívia, na
Argentina, no Paraguai, no Uruguai e no Peru. O veneno contém uma variedade de
enzimas, tais como metaloproteinases, serinoproteinases, fosfolipases A2 e uma
variedade de peptídeos potenciadores de bradicinina, que podem contribuir para os
efeitos tóxicos deste veneno tais como edema, hemorragia, necrose, atividade
anticoagulante e inibição da agregação plaquetária (Abreu et al., 2007).
Rodrigues e colaboradores (1998) estudaram a variação da composição dos
venenos de serpentes Bothrops neuwiedi, obtidos de espécimes dos estados de São
Paulo e Minas Gerais, bem como a variação dos venenos entre as subespécies B. n.
pauloensis e B. n. urutu no estado de Minas Gerais. Nesse estudo, os autores
observaram uma grande variedade de miotoxinas nos espécimes de São Paulo, que
não estavam presentes em nenhum espécime de Minas Gerais; verificaram ainda, a
22
presença de uma toxina básica no veneno da subespécie B. n. pauloensis, ausente
na subespécie B. n. urutu, mostrando uma variação entre subespécies da mesma
região (Rodrigues et al., 1998).
Com relação às SVMPs, algumas já foram isoladas do veneno de B. neuwiedi e
relacionadas com diferentes atividades biológicas. Em 2001, foi isolada e
caracterizada bioquimicamente uma SVMP de classe P-I nomeada de neuwiedase
(Rodrigues et al., 2001). Neuwiedase é uma metaloproteinase de 22 kDa capaz de
degradar in vitro fibrinogênio, fibrina, colágeno tipo I, fibronectina e laminina. É
desprovida de atividade hemorrágica no modelo convencional, mas induz
sangramento quando aplicada em músculo cremaster de camundongo, em
experimentos de microscopia intravital. Além dos efeitos mencionados, a
neuwiedase também induz dano tecidual local, caracterizado pela desorganização e
degradação das miofibrilas resultando em micronecrose (Rodrigues et al., 2001;
Baldo et al., 2010b), reação inflamatória caracterizada por edema e recrutamento
leucocitário (Rodrigues et al., 2001), e expressão de citocinas pró-inflamatórias
(Lopes et al., 2009). Interessantemente, na tentativa de isolamento da neuwiedase,
a partir de um pool de venenos de B. neuwiedi, nosso grupo isolou as
metaloproteinases BnP1 e BnP2, semelhantes à neuwiedase em massa molecular,
mas apresentando apenas 69% de identidade na estrutura primária (Baldo et al.,
2008). Além disso, a BnP1 apresentou diferenças marcantes quanto suas atividades
biológicas em relação à neuwiedase: mostrou atividade hemorrágica fraca na pele
de camundongos, sem induzir miotoxicidade (Baldo et al., 2008); induziu apoptose
em células endoteliais, mas não mostrou alteração nos vasos capilares ou hidrólise
de colágeno da membrana basal em estudos ex vivo (Baldo et al., 2010a). SVMPs
de alta massa molecular também já foram isoladas do veneno de B. neuwiedi. NHFa
com 46 kDa e NHFb de 58 kDa, ambas com baixa atividade caseinolítica e alta
atividade hemorrágica (Mandelbaum et al., 1984). E embora a estrutura primária
dessas proteínas não tenha sido elucidada, acredita-se que sejam SVMPs da classe
P-III, devido à alta massa molecular e potente atividade hemorrágica de ambas.
A grande diversidade de componentes no veneno das serpentes do complexo
B. neuwiedi poderia ser resultado de variações interespecíficas, uma vez que a
sistemática desse grupo ainda não está completamente resolvida. Nesse sentido,
análises individuais ou de venenos colhidos a partir de exemplares de uma mesma
população seriam de grande importância.
23
Vários autores utilizam metodologias de análises globais como
transcriptômica ou proteômica para entender a diversidade dos venenos de espécies
ou populações de serpentes (Calvete et al., 2009). Essas análises permitem uma
visão abrangente da diversidade estrutural, caracterizando várias sequências com
base em análises comparativas em bancos de dados. Entretanto, essas abordagens
apresentam dois grandes inconvenientes: não incluem a caracterização funcional
das toxinas e geralmente, as caracterizações de sequências são baseadas em
análises de fragmentos das moléculas, de tamanhos variáveis, que pode omitir
variações estruturais importantes que determinem novas funções para uma dada
proteína.
Dessa forma, com o intuito de compreender as origens e mecanismos da
diversidade estrutural das SVMPs, nosso grupo analisou a glândula de veneno de
um único espécime de B. neuwiedi, e verificou a presença de ao menos onze
transcritos distintos de SVMPs. Esses transcritos codificavam SVMPs com
diferenças estruturais que poderiam ser relevantes do ponto de vista da
variabilidade funcional do veneno (Moura-Da-Silva et al., 2011). Avançando nessa
hipótese, durante o mestrado isolamos seis SVMPs, de um mesmo pool de venenos
de B. neuwiedi, com distintas atividades biológicas. Dentre as SVMPs isoladas,
duas apresentaram atividades fibrinolítica e hemorrágica, duas apenas atividade
hemorrágica e as outras duas apenas atividade fibrinolítica, sugerindo uma
diversidade estrutural/funcional importante para os efeitos biológicos do veneno.
Dessa forma, no presente trabalho analisamos as implicações da diversidade
estrutural e funcional das SVMPs do veneno de B. neuwiedi, avaliando seus efeitos
em distúrbios hemostáticos de mamíferos, e no sistema de coagulação de modelos
animais representativos de presas e predadores de serpentes.
24
2. OBJETIVOS
Estudar as implicações da diversidade estrutural e funcional das SVMPs,
avaliando seus efeitos em distúrbios hemostáticos de mamíferos e frente a presa ou
predador de serpentes.
Para tanto, os objetivos específicos compreendem:
2.1. Obter as principais metaloproteinases presentes no pool de venenos de
serpentes do complexo de B. neuwiedi;
2.2. Investigar diferenças estruturais entre as SVMPs isoladas;
2.3. Verificar possíveis diferenças na ação das SVMPs em componentes do
controle da hemostasia de mamíferos;
2.4. Verificar possíveis diferenças na ação das SVMPs na coagulação do
sangue de diferentes presas/predadores.
25
3. MATERIAL E MÉTODOS
3.1. Amostras de SVMPs
As SVMPs (de classe P-III: Ic, IIb, IIc e de classe P-I: IVa, IVb) foram isoladas
do veneno de Bothrops neuwiedi como descrito por Bernardoni et al. (2014) (vide
anexo). Resumidamente, o veneno foi fracionado por cromatografia de exclusão
molecular e de troca iônica utilizando o sistema Äkta (GE Healthcare). Foram
aplicadas amostras de 50 mg de veneno em uma coluna Hiprep 16/60 S-200 (GE
Healthcare) previamente equilibrada com Tris 20 mM, CaCl2 1 mM e NaCl 150 mM,
pH 7,8, submetida a eluição isocrática com fluxo de 0,5 mL / min. Posteriormente, as
frações contendo metaloproteinases foram reunidas, dialisadas e aplicadas em uma
coluna Mono-Q HR 5/5 (GE Healthcare) utilizando Tris 20 mM, CaCl2 1 mM, pH 7,8,
com fluxo de 1 mL / min. As cromatografias foram monitoradas pela leitura da
absorbância a 280 nm. A pureza das proteínas foi avaliada por SDS-PAGE, a
identidade verificada por Western blotting e ELISA, a caracterização feita por
espectrometria de massas e, além disso, foram realizadas as atividades
hemorrágica, fibrinolítica e enzimática e coagulante.
Após o isolamento, as amostras foram liofilizadas e mantidas a - 80°C até a
utilização.
3.2. Caracterização estrutural das SVMPs da classe P-I
A sequência de aminoácidos das SVMPs IVa e IVb foi elucidada por
espectrometria de massas dos peptídeos gerados após clivagem com diferentes
enzimas. Os peptídeos foram gerados pela digestão das proteínas com enzimas
como tripsina, quimotripsina e endoproteinase Asp-N (Promega). Em cada caso,
aproximadamente 30 µg de proteína foi dissolvida em 30 µL de água milli-Q para a
clivagem. Já a estrutura terciária foi avaliada por cristalografia.
Esses experimentos foram realizados durante o estágio no Department of
Biological Sciences da National University of Singapore, em colaboração com o Dr.
R. Manjunatha Kini.
26
3.2.1. Digestão enzimática das SVMPs de classe P-I: IVa e IVb
Para digestão tríptica, a amostra foi misturada a 60,5 µL de 50 mM
Bicarbonato de amônio (NH4HCO3) contendo 2 μL de 1% ProteasMAX surfactante
(Promega), seguida pela redução com 1 μL de 0,5 M Dithiothreitol (DTT) (a 56°C por
20 minutos) e alquilação com 2,7 μL de 0,55 M iodoacetamida [a temperatura
ambiente (TA) por 15 min no escuro]. Posteriormente, a proteína foi submetida à
digestão (a 37°C por 5 min ou 3 horas) com 1,8 μL de tripsina (1 μg / μL) e 1 μL de
1% ProteasMAX surfactante para melhorar a clivagem pela tripsina.
Para digestão com quimotripsina, a amostra foi reduzida com 10 μL de 20 mM
DTT (a 56°C por 20 min), alquilada com 10 μL de 75 mM Iodoacetamida (a TA por
15 min no escuro) e depois misturada com 48,5 μL de 100 mM Tris e 10 mM CaCl2.
A seguir, a proteína foi submetida à digestão (a 25°C por 3 horas) com 1 μL de
quimotripsina (1 μg / μL).
Para a digestão com Asp-N, a amostra foi reduzida com 10 μL de 20 mM DTT
(a 56°C por 20 min), alquilada com 10 μL de 75 mM Iodoacetamida (a TA por 15 min
no escuro) e depois misturada com 46,25 μL de 10 mM Tris, pH 7.8. Finalmente, a
proteína foi submetida à digestão (a 37°C por 3 horas) com 3,75 μL de Asp-N (0,04
μg / μL).
3.2.2. Análises por espectrometria de massas
As proteínas digeridas (80 µL) foram submetidas a LC-MS/MS usando um
espectrômetro de massas ESI-Ion Trap (Thermo Scientific). Foi usada uma fase
estacionária C18 Hvpersil Gold, 1.9 μm [Thermo scientific (50 mm × 21 mm)]. A
cromatografia foi realizada com solvente A (0,1% de ácido fórmico em água) e B
[0,1% TFA em acetonitrila (ACN)], a um fluxo de 200 μL / min usando um gradiente
crescente de B: de 0% a 40% em 32 min; 40% a 80% em 25 min; 80% a 100% em 3
min; seguidos por 12 min com 100% de B.
A aquisição de MS/MS foi realizada utilizando a dissociação induzida por
colisão (CID). O espectro dos fragmentos foi comparado contra o banco de dados de
lepidosauria e a sequência de proteínas deduzida do transcriptoma da glândula de
veneno de B. neuwiedi (Moura-Da-Silva et al., 2011), usando o software SEQUEST.
27
Os parâmetros de busca foram definidos como segue: sem restrições a espécie de
origem ou massa molecular da proteína, duas clivagens perdidas permitidas,
modificações variáveis na metionina (oxidação), na cisteína (carbamidometilação) e
tolerância de massa do precursor (1 Da).
3.2.3. Cristalografia
As SVMPs IVa e IVb liofilizadas (5 mg) foram reconstituídas em 1 mL de 15
mM HEPES e 100 µM ZnSO4, pH 7.5.
A determinação da condição de cristalização das proteínas foi realizada
usando quatro kits de cristalização, nos quais a proteína é submetida a variações de
pH, sal e diferentes concentrações dos agentes precipitantes (Kits de cristalização:
Rigaku e Hampton - Anexo).
Foram utilizadas placas de 24 poços pré-lubrificadas e lamínulas siliconizadas
de 22 mm. Os poços das placas foram preenchidos como segue com 0,1 M Tris e
polietileno glicol (PEG 3,350 – QIAGEN):
Placa 1 e Placa 2
Placa 3
Inicialmente a proteína (1 µL – 5 mg/mL) foi pipetada na lamínula. A solução
precipitante (do poço correspondente) foi pipetada em igual volume na gota de
proteína e gentilmente misturada. A seguir, a lamínula foi colocada sobre o poço,
28
pressionada para baixo com cuidado e torcida a 45 ° para garantir uma boa
vedação.
Os cristais da proteína IVb foram embebidos em 20% de glicerol no líquido
mãe, funcionando como crioprotetor. Os dados de difração foram coletados de um
único cristal, usando o MicroMax-007 HF rotating anode (Rigaku) equipado com um
detector Saturn 994+ CCD (Rigaku), a um comprimento de onda de 1.54 Å a 100 K.
Os dados de difração foram processados e integrados com iMOSFLM (Battye
et al., 2011) e dimensionados com AIMLESS (Evans e Murshudov, 2013). A
estrutura de IVb foi resolvida por substituição molecular com Phaser (Mccoy et al.,
2007) usando as coordenadas da proteína BaP1, uma metaloproteinase do veneno
de Bothrops asper (Watanabe et al., 2003). Construção/reconstrução e refinamento
do modelo interativo foi realizado com Coot (Emsley et al., 2010) e REFMAC5
(Murshudov et al., 2011), respectivamente.
3.3. Caracterização funcional
3.3.1. Animais
Os experimentos envolvendo animais foram realizados utilizando-se galinhas
fêmeas adultas Gallus domesticus (white leghorn chicken – 1 a 1,7 Kgs, 10 a 15
semanas) adquiridas de fonte comercial; ratos machos Rattus novergicus (Wistar –
250 a 300 g) e camundongos Mus musculus (Swiss – 18 a 20 g) fornecidos pelo
Biotério Central do Instituto Butantan. Os animais foram mantidos com ração e água
filtrada fornecidos ad libitum, à temperatura ambiente em um ciclo de 12 horas
claro/escuro.
Os experimentos envolvendo animais foram aprovados pela Comissão de
Ética Animal do Instituto Butantan (CEUAIB - 121/04), São Paulo, Brasil, protocolo nº
1028/13. De acordo com as recomendações do Colégio Brasileiro de
Experimentação animal (COBEA).
3.3.2. Microscopia intravital
A dinâmica das alterações na microcirculação foi determinada por
microscopia intravital (MIV), conforme descrito por Umekita et al. (2001) com
29
algumas modificações. Uma abordagem baseada em microscopia de luz que
permite a obtenção de imagens de estruturas subcelulares de animais vivos. O
músculo cremaster foi usado como o tecido principal para a análise dos capilares e
de interações leucócito-parede do vaso, devido à sua natureza fina e transparente.
Os camundongos foram anestesiados com uma injeção intraperitoneal de Xilazina a
2% (Calmiun®, Agener Union, São Paulo, SP) e 0,5 g / kg de ketamina (Holliday-
Scott SA, Buenos Aires, Argentina) e o músculo cremaster foi exposto. Os
camundongos foram mantidos vivos em uma placa de aquecimento controlada por
termostato a 37° C, que incluía uma plataforma transparente na qual o tecido foi
colocado para ser transiluminado. As vênulas pós-capilares, com diâmetro 25-40
μM, foram escolhidas para avaliação de sangramento e estase induzidas pelas
SVMPs e também para avaliação da interação de leucócitos com a superfície
luminal do endotélio venular. O músculo cremaster exposto foi submetido a uma
aplicação tópica de 20 μL de PBS (controle) ou SVMPs (10 μg / 20 μL de PBS). Os
resultados são representativos de três experimentos independentes.
Esses experimentos foram realizados no Laboratório Especial de Toxinologia
Aplicada, no Instituto Butantan, em colaboração com a Dra. Mônica Lopes Ferreira.
3.3.3. Atividade hemorrágica
A atividade hemorrágica baseou-se no método descrito por Kondo e
colaboradores (1960) com algumas modificações. As SVMPs diluídas para
diferentes concentrações [0,2; 0,5; 1; 3 e 5 μg em 50 μL de solução salina
tamponada com fosfato (PBS)], foram injetadas por via intradérmica na pele dorsal
de camundongos. Após 3 h, os animais foram eutanasiados em câmara de CO2.
Imediatamente após, a pele dorsal foi removida e os pontos hemorrágicos medidos
considerando-se o produto do maior diâmetro e o perpendicular a este. A dose
mínima hemorrágica (DMH) foi definida como a quantidade mínima de toxina em μg,
que produziu áreas hemorrágicas com um diâmetro médio de 10 mm após 3 horas.
Grupos de 4 animais foram testados com as amostras e um grupo controle foi
injetado apenas com PBS. Os resultados representam a média ± DP de três
experimentos independentes.
30
3.3.4. Atividade enzimática
A avaliação da atividade catalítica de SVMPs foi realizada como descrito
(Zelensky e Gready, 2005). Para esses ensaios, as SVMPs (25 nM) foram testadas
frente aos substratos FRET (Fluorescence Resonance Energy Transfer) Abz-
ETGSLLVL-EDDnp (MM: 1158,24; 200 µM) e Abz-AGLA-EDDnp (MM: 657,7; 200
µM) (Fox et al., 1986), diluídos em tampão 50 mM Tris, 10 mM CaCl2, 150 mM NaCl,
0,05% de Brij 35, pH 7,5. As reações enzimáticas foram monitoradas a 37° C, em
um fluorímetro SpectraMax® M2 (Molecular Devices) com excitação a 320 nm e
emissão a 420 nm, em modo cinético ao longo de 10 minutos, com intervalos de
leitura de 1 min. Os resultados foram expressos em RFU/min/µg. Os resultados
representam a média ± DP de três experimentos independentes.
3.3.5. Efeitos nas proteínas de matriz extracelular (MEC)
3.3.5.1. Ligação às proteínas de matriz extracelular
Placas de microtitulação foram revestidas com 100 µL de colágeno tipo I,
colágeno tipo IV, laminina, fibronectina (10 µg / mL em tampão carbonato, pH 9,6) e
nidogênio (5 µg / mL em tampão carbonato, pH 9,6) com incubação durante 18 h a
4° C. A seguir, as placas foram lavadas e diferentes diluições das SVMPs foram
adicionadas às placas e a ligação foi detectada em espectrofotômetro a 490 nm,
após a incubação com os anticorpos policlonais anti-jararagina (1:200), seguido de
anti-IgG de coelho conjugado com peroxidase [A0545 – Sigma (1:2000)] e com o
substrato OPD (o-Phenylenediamine dihydrochloride). Os resultados representam a
média ± DP da absorbância de três experimentos independentes.
3.3.5.2. Degradação do matrigel
A análise da degradação do matrigel foi realizada tal como descrito por
Escalante et al. (2006) com algumas modificações. A hidrólise do matrigel TM (gel de
31
ECM, a partir de Engelbreth Holm-Swarm sarcoma de rato - Sigma) foi realizada por
meio da incubação das SVMPs com 100 µg de matrigel em uma proporção
enzima:substrato de 1:10. A incubação de SVMPs e matrigel foi realizada durante 3
horas a 37 ° C. A seguir, a reação foi interrompida pela adição de SDS com agente
redutor (β-mercaptoetanol) e por ebulição das amostras durante 5 minutos. Uma
amostra de matrigel incubada apenas com PBS, sob as mesmas condições, foi
utilizada como controle. Posteriormente, a eletroforese foi realizada utilizando um gel
gradiente de poliacrilamida de 5-15%, e as bandas foram visualizadas com azul de
Coomassie. Os padrões de peso molecular utilizados foram: 225 KDa, 150 KDa, 102
KDa, 76 KDa, 52 KDa, 38 KDa, 31 KDa, 24 KDa, 17 KDa, 12 KDa (Amersham Full-
Range Rainbow Molecular Weight Markers – RPN800E - GE).
Alternativamente, as proteínas presentes nos géis gradiente também foram
transferidas para membranas de nitrocelulose, que foram imersas em solução de
bloqueio (5% de leite desnatado em Tris-salina durante 2 h à temperatura ambiente)
e, em seguida, incubadas com os anticorpos anti-colágeno (1:100; Fitzgerald - 1
mg/mL), anti-laminina (1:300; Novus Biologicals – 1 mg/mL) ou anti-nidogênio (0,6
µg / mL; R&D Systems, uma marca Biotechne) durante 18 h, à temperatura
ambiente. Depois de lavadas com Tris-salina (Tris 50 mM pH 7,5 em 150 mM de
NaCl), as membranas foram incubadas com anti-IgG de coelho conjugado com
peroxidase [A0545 – Sigma (1:1000 - para o colágeno e laminina)] ou anti-IgG de
cabra conjugado com peroxidase [A5420 – Sigma (1:250 - para nidogênio), durante
2 h a 37° C. As bandas reativas foram detectadas, após a última etapa de lavagem,
por incubação com 4-cloro-α-naftol e H2O2.
3.3.6. Avaliação dos efeitos das SVMPs sobre células endoteliais
A ação das SVMPs foi avaliada quanto à adesão e viabilidade celular em
células endoteliais murinas derivadas do timo (tEnd), como descrito por Bussolino et
al (1991). Células tEnd foram cultivadas em meio RPMI 1640 contendo 10% de SFB
(soro fetal bovino), 2 mM de L-glutamina, 2 mM de piruvato de sódio, 1 mM de
aminoácidos não-essenciais e 60 µg / mL de gentamicina, a 37 ºC e 5% de CO2.
A viabilidade e a adesão celular das células tratadas com as SVMPs foi
quantificada pela atividade da succinato desidrogenase, uma enzima mitocondrial,
cujo substrato é o MTT. Após os diferentes tempos de tratamento (6, 12, 24 e 48h)
32
com as SVMPs (10 e 40 µg / mL), as placas contendo as células foram lavadas com
PBS (para os ensaios de adesão), foi adicionado o MTT (5 mg / mL em PBS), e
então as placas foram incubadas por 3 horas a 37°C na estufa de CO2 (5%), seguida
da adição de SDS 10% em PBS 0,01 N. Após 18 horas de incubação a 37°C, a
intensidade da reação foi determinada pela leitura da densidade óptica a 570 nm em
um leitor de placas. PBS, jararagina (SVMP de classe P-III isolada do veneno de
Bothrops jararaca) e triton 0,1% foram utilizados como controles dos testes. Os
resultados representam a média ± DP de três experimentos independentes,
realizados em triplicata.
3.3.7. Tromboelastografia
Ensaios tromboelastométricos foram realizados utilizando o sistema de quatro
canais ROTEM® (Pentapharm) de acordo com as instruções do fabricante. Volumes
(300 µL) de amostras de sangue de galinha ou de rato citrados foram misturados
com 40 µL de: Grupo 1 - apenas PBS (controle, n = 3); Grupo 2 - 10 µg do veneno
bruto de B. neuwiedi (n = 3) e Grupo 3 -10 µg dos pools de SVMPs (n = 3). A mistura
final de 340 µL foi colocada em cubetas e incubada por 60 min para avaliar os
seguintes parâmetros do perfil Rotem: tempo de coagulação (CT [s], o tempo a partir
do início do ensaio, até a formação de um coágulo com uma amplitude de 2 mm -
verde); tempo de formação do coágulo (CFT [s], tempo a partir do final do CT
[amplitude de 2 mm] até que a firmeza de 20 mm do coágulo seja atingida - cor de
rosa); firmeza máxima do coágulo (MCF [mm], o pico de intensidade do coágulo,
resultante da interação de fibrina, plaquetas ativadas e fator XIII [FXIII] - azul); e lise
máxima (ML [%], a redução máxima observada na firmeza do coágulo após MCF ser
atingido, é dada como uma porcentagem do valor de MCF).
Os dados mostrados são representativos de três experimentos
independentes. Esses experimentos foram realizados no Laboratório de
Farmacologia do Instituto Butantan, em colaboração com o Dr. Benedito Carlos
Prezoto.
33
4. RESULTADOS
A primeira etapa deste trabalho consistiu na elucidação da sequência de
aminoácidos das SVMPs de classe P-I isoladas do veneno de B. neuwiedi, seguida
pelo estudo de suas estruturas tridimensionais.
4.1. Elucidação da sequência de aminoácidos das SVMPs de classe P-I
A sequência parcial de aminoácidos das proteínas IVa e IVb isoladas foi
realizada por espectrometria de massas, gerando peptídeos que resultaram em uma
cobertura de cerca de 83% para IVa e 88% da IVb. As sequências de aminoácidos
foram então alinhadas e comparadas com os transcritos identificados na glândula de
veneno de B. neuwiedi. Como mostrado nas figuras 2 e 3, as sequências revelaram
uma elevada identidade com dois transcritos de SVMPs (MP_I2 e MP_IIa), 96% e
100%, respectivamente. A IVa possui 213 e a IVb possui 214 aminoácidos. Levando
em conta o alinhamento, a IVa difere de MP_I2 em apenas 8 resíduos, o que
corresponde a cerca de 96% de identidade. Por outro lado, a IVb apresentou 100%
de identidade com MP_IIa, ou seja, as duas sequências não diferiram em nenhum
resíduo de aminoácido e parecem ser idênticas no domínio catalítico.
Analisando as sequências obtidas (Figuras 2 e 3) observarmos que a IVa é
uma SVMP de classe P-I típica, por outro lado a IVb parece ser uma SVMP de
classe P-I que foi gerada a partir de um precursor de SVMP de classe P-II. Quando
comparamos as duas SVMPs de classe P-I notamos uma similaridade de apenas
78% (Figura 4).
34
IVa
10 20 30 40 50 60
| | | | | |
MP_I2 FSPKYIELAVVADHGMFTKYNSNVNTIRTWVHEMVNSLNGFFRSMNVDASLVNLEVWSKK
IVa -....X.X..................X..........X............X..X......
70 80 90 100 110 120
| | | | | |
MP_I2 DLIKVEKDSSKTLTSFGEWRERDLLPRISHDHAQLLTTIVFDQQTIGIAYTAGMCDPSQS
IVa .XX.........X..........XX..X......XX..X...NYVX.XTEFGK-------
130 140 150 160 170 180
| | | | | |
MP_I2 VAVVMDHSKKNIRVAVTMAHELGHNLGMDHDDTCTCGAKSCIMASTISKGLSFEFSDCSQ
IVa --------------------------...............X....X...X.........
190 200
| |
MP_I2 NQYQTYVTKHNPQCILNKPL
IVa ..............XX...X
Figura 2 - Alinhamento da sequência da IVa com a MP_I2. Sequência parcial da IVa obtida por espectrometria de massas (X: Ile ou Leu) e alinhamento contra MP_I2 usando o CLUSTAL W. Os traços representam lacunas (aminoácidos não identificados). As caixas cinza correspondem às regiões cobertas pelo sequenciamento, no qual os resíduos idênticos estão indicados pelos pontos e o sítio ativo da SVMP está em vermelho.
IVb
10 20 30 40 50 60
| | | | | |
MP_IIa FSPRYVELAVVADNGMFTKYNSNLNTIRTRVHEMVNTVNGFFRSMNVDASLANLEVWSKK
BnP2 .......X..................X.......................X..X......
70 80 90 100 110 120
| | | | | |
MP_IIa DLIKVEKDSSKTLTSFGEWRERDLLPRISHDHAQLLTTIVFDNYVIGITKFGKMCDPKLS
BnP2 .XX.........X..........XX..X......XX..X......X.X..........X.
130 140 150 160 170 180
| | | | | |
MP_IIa VGVVLDHSEISLQVAVAMAHELGHNLGMHHDGNQCHCNAPSCIMADTLSEELSYEFSDCS
BnP2 ....X---------------------................X....X...X........
190 200
| |
MP_IIa QNQYQTYLTNRNPQCILNKPL
BnP2 ...---.X.......XX...-
Figura 3 - Alinhamento da sequência da IVb com o domínio catalítico da MP_IIa. Sequência parcial da IVb obtida por espectrometria de massas (X: Ile ou Leu) e alinhamento contra MP_IIa usando o CLUSTAL W. Os traços representam lacunas (aminoácidos não identificados). As caixas cinza correspondem às regiões cobertas pelo sequenciamento, no qual os resíduos idênticos estão indicados pelos pontos, o sítio ativo da SVMP está em vermelho e o motivo RGD está sublinhado.
35
10 20 30 40 50 60
| | | | | |
IVa -SPKYXELAVVADHGMFTKYNSNVNTXRTWVHEMVNSXNGFFRSMNVDASXVNXEVWSKK
IVb F..R.V.......N.........X.....R......TV.............A........
70 80 90 100 110 120
| | | | | |
IVa DLXKVEKDSSKTXTSFGEWRERDXXPRXSHDHAQLLTTIVFDNYVIGITEFGK-------
IVb .................................................K...MCDPKXS
130 140 150 160 170 180
| | | | | |
IVa -----GMDHDDTCTCGAK-SCXMASTXSKGXSFEFSDCSQNQYQTYVTKHNPQCXXNKPX
IVb VGVVX..H..GNQCHCNAP.....D...EE..Y..........---X.NR.........-
Figura 4 - Alinhamento da sequência da IVa com a IVb. Sequências parciais da IVa e da IVb obtidas por espectrometria de massas (X: Ile ou Leu) e alinhamento usando o CLUSTAL W. Os traços representam lacunas (aminoácidos não identificados). Os resíduos idênticos estão indicados pelos pontos e o sítio ativo parcial das SVMPs está em vermelho.
4.2. Determinação da estrutura tridimensional
Quando a SVMP IVa foi reconstituída em tampão 15 mM HEPES e 100 uM
O4SZn, pH 7,5 ou 20 mM HEPES e 100 mM NaCl, pH 7,5, ocorreu precipitação da
amostra e por isso esta proteína não pode ser usada para o experimento de
cristalização. Por outro lado, quando a IVb foi utilizada, os cristais cresceram sob 2
das 384 condições testadas:
100 mM CAPS/hidróxido de sódio, pH 10,5, 200 mM sulfato de lítio e 1200
mM fosfato de sódio monobásico/800 mM fosfato de potássio dibásico (Kit:
Wizard 1- poço C3);
0,1 M Tris, pH 8,5 e 25% PEG (Kit: Index - poço D9).
Então, uma vez que a primeira condição apresentava grande quantidade de
sal e, assim, aumentava a chance de crescimento de cristais de sal, apenas a
segunda condição foi otimizada para obtenção de novos cristais como descrito no
material e métodos.
Assim sendo, como mostrado a seguir, os cristais de IVb foram obtidos pelo
método de difusão de vapor de gotas suspensas a 37 º C. A solução do poço
consistiu em 500 µL de 0,1 M Tris (intervalo de pH: 8,25-9,5) e PEG (intervalo: 19 a
32%). Os cristais cresceram em cerca de dois dias nas condições marcadas com X
nas placas mostradas na figura 5.
36
Placa 1
Placa 2
Placa 3
Figura 5 - Esquema das placas de cristalização otimizadas. Placas 1 e 2: intervalo de pH: 7,75 - 9,0 e intervalo de PEG: 19 - 28%. Placa 3: intervalo de pH: 8,5 - 9,5 e intervalo de PEG: 26 - 32%.
Os cristais obtidos pertencem ao grupo espacial P1, com parâmetros de
célula unitária a=43,8 Å, b=44,7 Å, C=61,3 Å, a=89,3°, p=69,7°, γ=73,8°. Existem
duas moléculas do domínio catalítico de IVb na unidade assimétrica, com teor de
solvente de aproximadamente 46%. Os dados de difração foram processados a 2,09
Â. Phaser (Mccoy et al., 2007) colocou com sucesso duas cópias das coordenadas
pesquisadas na unidade assimétrica. Não foi observada eletrondensidade adicional
para o domínio disintegrina na estrutura.
Depois de algumas rodadas iniciais de construção/reconstrução do modelo,
as densidades de elétrons para os íons de zinco e cálcio puderam ser identificadas
para cada cópia da IVb (Figura 6). O íon zinco coordenou com His142, His146,
His152 e um íon água. O íon cálcio coordenou com Glu9, Asp93, Asn200 e o
oxigênio da carbonila de Cys197.
Devido às incertezas na sequência de IVb, a construção/reconstrução do
modelo e refinamento de IVb ainda está em curso. Os valores atuais de R- e de R-
37
livre para a estrutura foram de 0,22 e 0,26, sem valores atípicos de Ramachandran e
boas geometrias. O refinamento da estrutura será finalizado quando a sequência
completa da IVb for determinada.
Figura 6 – Eletrondensidade das subunidades de IVb. (A) Eletrondensidade do Zn2+
na subunidade A. (B) Eletrondensidade do Zn
2+
na subunidade B. (C) Eletrondensidade do Ca
2+
na
subunidade A. (D) Eletrondensidade do Ca2+
na subunidade B.
Uma vez que ainda precisaríamos de maiores estudos, o que demanda
tempo, para elucidar as estruturas tridimensionais das SVMPs isoladas do veneno
de B. neuwiedi, partimos para próxima etapa do estudo focando na avaliação de
uma das principais atividades biológicas descritas para SVMPs - a hemorragia.
4.3. Ação na microcirculação de camundongos
Após as análises estruturais, na próxima etapa do trabalho foi realizada a
caracterização funcional das SVMPs. Inicialmente, foram avaliados os efeitos das
toxinas na microcirculação de camundongos por microscopia intravital.
Durante as análises, observamos que diferentes graus de hemorragia foram
induzidos pelas SVMPs (Figura 7), sendo verificados vários pontos de sangramento,
na microcirculação dos animais, com todas as amostras testadas. Porém, o tempo
38
de pico e a intensidade da hemorragia foram variáveis entre as SVMPs, até mesmo
entre as de mesma classe. Aos 10 minutos de experimento, observou-se hemorragia
discreta após a administração das SVMPs de classe P-I (amostras IVa e IVb) e
sangramentos maiores induzidos por SVMPs de classe P-III (amostras Ic, IIb e IIc). A
hemorragia inicial aumentou consideravelmente em camundongos tratados com
SVMPs de classe P-III, ao longo de 20 e 30 minutos. Esta observação qualitativa foi
confirmada posteriormente, avaliando-se quantitativamente a hemorragia por meio
da dose mínima hemorrágica (DMH) na pele dorsal de camundongos sendo obtidos
valores de 3,08 μg para Ic; 5,67 μg para IIb e 7,55 μg para amostra IIc. Entretanto,
embora a amostra Ic tenha sido a hemorragina mais potente, seu efeito foi retardado
quando comparado as amostras IIb e IIc, mostrando atividade aumentada somente a
partir de 20 minutos. Além disso, as amostras Ic, IIb e IVb foram capazes de causar
estase vascular a partir de 10 minutos de experimento em algumas das vênulas
observadas (Figura 7).
39
Figura 7 - Ação das SVMPs na microcirculação do músculo cremaster. Análises de microscopia intravital do músculo cremaster submetido à aplicação tópica intraescrotal das SVMPs (10 µg). O painel à esquerda mostra o desenvolvimento do sangramento em 10, 20 e 30 minutos. O painel à direita mostra a estase vascular em 30 minutos (setas).
Além da ação hemorrágica avaliamos também, por microscopia intravital, o
efeito das amostras de SVMPs no rolling de leucócitos na microcirculação. Com
relação à circulação de leucócitos, todas as SVMPs foram capazes de aumentar o
número de leucócitos circulantes a partir de 10 minutos de experimento, mantendo
este número aumentado até 30 minutos (Figura 8). Pode-se observar a seguir, que a
amostra Ic foi a mais potente com 10 minutos, a amostra IIc foi a menos potente em
todos os tempos testados e com 30 minutos a amostra IVa se equipara às amostras
Ic e IIb.
40
Figura 8- Leucócitos circulantes na microcirculação de camundongos. Análises de microscopia intravital do músculo cremaster submetido à aplicação tópica intraescrotal das SVMPs (10
µg). #diferença significativa quando comparado a Ic;
a
diferença significativa quando
comparado a IIb; &
diferença significativa quando comparado a IIc.
Os dados descritos anteriormente ressaltam a diversidade funcional das
SVMPs, e demonstram que as SVMPs estudadas (independente da classe a que
pertencem) agem de maneiras distintas na microcirculação.
Portanto, para investigar alguns dos mecanismos que poderiam regular os
diferentes efeitos das SVMPs em micro vasos, avaliamos posteriormente a ação
destas proteínas em componentes da matriz extracelular e também seus efeitos em
culturas de células endoteliais.
4.4. Efeitos das SVMPs nos componentes da MEC
Considerando a importância da atividade enzimática para os efeitos das
SVMPs sobre as proteínas da MEC, avaliamos inicialmente a atividade catalítica
destas enzimas frente aos substratos FRET (Abz-ETGSLLVL-EDDNP e Abz-AGLA-
EDDnp). Como mostrado na Figura 9, a atividade catalítica das SVMPs foi muito
diferente, tanto quando comparamos umas às outras, quanto quando comparamos
suas ações frente aos diferentes substratos.
41
As amostras IIb, IIc e IVb apresentaram uma atividade semelhante
(aproximadamente 300 RFU / min / µg), enquanto que a amostra Ic mostrou-se
extremamente menos eficiente frente ao substrato Abz-ETGSLLVL-EDDNP (80 RFU
/ min / µg) e a amostra IVa não mostrou nenhuma atividade no mesmo substrato.
Por outro lado, as amostras IIb e IIc apresentaram uma atividade consideravelmente
mais alta frente ao segundo substrato (800 e 1000 RFU / min / µg, respectivamente)
cerca de 3 vezes maior, enquanto as amostras Ic, IVa e IVb mostraram uma
atividade muito baixa (abaixo de 50 RFU/min/µg) frente ao substrato Abz-AGLA-
EDDnp.
De acordo com os resultados obtidos, as SVMPs podem apresentar
diferentes níveis de atividade catalítica, dependendo do substrato utilizado. E esta
atividade não parece estar relacionada à sua classe estrutural.
Figura 9 - Atividade catalítica das SVMPs. A catálise das SVMPs (25 nM) sobre os substratos FRET - Abz-ETGSLLVL-EDDNP (200 µM) e FRET - Abz-AGLA-EDDnp (200 µM) foi monitorada num fluorímetro SpectraMax® M2 com excitação a 320 nm e emissão a 420 nm, a 37 ° C em modo cinético ao longo de 10 minutos, com intervalo de leitura de 1 min.
Nossa próxima abordagem foi analisar a ação catalítica das SVMPs sobre
proteínas da matriz extracelular. Como mostrado na Figura 10, todas as SVMPs
foram capazes de clivar a laminina α1 (Figuras 10A e 10B), o que pode ser visto pela
redução da banda de 400 kDa (a). Por outro lado, não houve alteração na banda de
250 kDa (b) (Figuras 10A e 10B). O colágeno também foi clivado por todas as
42
amostras, como observado pela redução da intensidade da banda de 300 kDa
corada pelo anticorpo anti-colágeno (Figura 10C), e pelo aparecimento de bandas
reativas adicionais com massas moleculares inferiores. Além disso, as amostras IIb
e IIc foram as únicas capazes de clivar o nidogênio, com redução da banda de 98
kDa (d) (Figura 10D).
Figura 10 - Hidrólise de proteínas do Matrigel pelas SVMPs. O matrigel foi incubado com as enzimas numa proporção 1:10 de enzima:substrato durante 3 horas. Um controle de Matrigel incubado sem enzima foi incluído. As reações foram interrompidas pela adição de tampão de amostra com agente redutor, e as misturas foram separadas por SDS-PAGE, executado sob condições redutoras, utilizando um gel de gradiente de poliacrilamida 5-15%. O gel foi corado com Coomassie Briliant Blue (A). No controle (M), as bandas de Matrigel mais abundantes correspondem a (a) Laminina α-1, (b) Laminina β e y, (c e d) nidogênio. Alternativamente, as proteínas presentes nos géis de gradiente também foram transferidas para membranas de nitrocelulose, e, em seguida, incubadas com anticorpos anti-laminina (1:300) (B), anti-colágeno (1:100) (C) ou anti-nidogênio (0,6 µg/mL) (D) durante 18 h à temperatura ambiente. Seguido de incubação com IgG anti-coelho conjugado com peroxidase (1:1000 - para o colágeno e laminina) e IgG anti-cabra conjugado com peroxidase (1:500 - para nidogênio) durante 2 h a 37 ° C e as bandas reativas foram detectadas com 4-cloro-α -naphtol e H2O2.
Também foi avaliada a capacidade das SVMPs de se ligarem aos principais
componentes da matriz extracelular. A figura 11 mostra que, apenas as amostras IIb
43
e IIc (SVMPs de classe P-III) foram capazes de se ligar com alta afinidade ao
colágeno I (Figura 11A) e colágeno IV (Figura 11B). A ligação a fibronectina e
laminina foi insignificante, com todas as amostras (Figuras 11C e 11D). As SVMPs
de classe P-I (IVa e IVb) não foram capazes de se ligar a qualquer proteína de
matriz extracelular testada. Além disso, nenhuma das SVMPs se ligou ao nidogênio
(dados não mostrados).
Figura 11 - Ligação das SVMPs às proteínas da matriz extracelular. As placas de microtitulação foram revestidas com colágeno do tipo I (A), colágeno do tipo IV (B), fibronectina (C) e laminina (D) (10 µg / mL), incubadas durante 18 h a 4 ° C. Diferentes diluições de amostras foram, em seguida, adicionadas e a ligação foi detectada a 490 nm após a incubação com os anticorpos policlonais de coelho anti-jararagina, seguido de anti-IgG de coelho conjugado com peroxidase e o substrato da enzima (OPD).
4.5. Toxicidade celular
A seguir, demos continuidade à caracterização funcional das SVMPs
avaliando seus efeitos citotóxicos sobre células endoteliais. Para o teste de
toxicidade foram realizados os experimentos de viabilidade e adesão celular em
44
cultura de células endoteliais murinas (tEnd), utilizando as doses de 10 e 40 µg / mL
de SVMPs.
Figura 12 - Efeito das SVMPs na adesão de células tEnd. A cultura de células tEnd foi tratada com 10 µg / mL das amostras Ic, IIb, IIc, IVa e IVb pelos períodos de 6h, 12h, 24h e 48h. Os controles utilizados foram: PBS, jararagina (SVMP de classe P-III isolada do veneno de Bothrops jararaca) e triton 0,1%. Nos diferentes tempos, a quantidade de células viáveis/aderidas foi acessada pelo MTT, como descrito no material e métodos.
No experimento de adesão celular com 10 µg / mL de amostra (Figura 12),
observou-se que as SVMPs Ic, IIb e IIc (todas de classe P-III) e IVa (SVMP de
classe P-I), semelhantemente, não foram capazes de induzir a perda de adesão em
um número significativo de células, quando comparado às culturas controle, tratadas
com PBS. Por outro lado, a amostra IVb (SVMP de classe P-I) foi a que demonstrou
maior potência, com atividade semelhante à da jararagina, utilizada como controle
positivo. Neste caso, a perda de adesão ocorreu a partir das 24 horas (h) e todas as
células já estavam descoladas em 48h.
Já no experimento de adesão celular com 40 µg/mL de amostra (Figura 13),
as SVMPs IIb e IIc (SVMPs de classe P-III) e IVa (SVMP de classe P-I) induziram
perda de adesão celular a partir de 24h, tendo descolado todas as células com 48h.
A amostra Ic (SVMP de classe P-III) mostrou-se a menos potente, uma vez que só
foi capaz de descolar as células no tempo de 48h. Por outro lado, a amostra IVb
(SVMP de classe P-I), foi capaz de induzir perda de adesão a partir de 12h, tendo
45
descolado todas as células a partir de 24h, mostrando-se assim mais potente que a
jararagina.
Comparando as amostras de mesma classe, fica clara a diferença entre elas.
No caso das SVMPs de classe P-III, a Ic foi a menos potente e entre as SVMPs de
classe P-I, foi a IVa. Já fazendo esta comparação entre as amostras de diferentes
classes, a IVb que pertencem a classe P-I foi a mais potente entre todas as SVMPs
estudadas.
Figura 13 - Efeito das SVMPs na adesão de células tEnd. A cultura de células tEnd foi tratada com 40 µg / mL das amostras Ic, IIb, IIc, IVa e IVb pelos períodos de 6h, 12h, 24h e 48h. Os controles utilizados foram: PBS, jararagina (SVMP de classe P-III isolada do veneno de Bothrops jararaca) e triton 0,1%. Nos diferentes tempos, a quantidade de células viáveis/aderidas foi acessada pelo MTT, como descrito no material e métodos.
Posteriormente, considerando as diferenças encontradas nos ensaios de
adesão, demos continuidade aos testes de citotoxicidade, avaliando os efeitos das
SVMPs sobre a viabilidade das células endoteliais. Porém, com relação aos
experimentos de viabilidade celular, usando uma concentração de 10 µg / mL
(Figura 14), observou-se que nenhuma das amostras testadas foi capaz de alterar,
significativamente, a quantidade de células viáveis (inferida pela densidade óptica).
Embora a amostra IVb tenha sido capaz de diminuir a viabilidade celular em
aproximadamente 50%, quando testada na concentração de 40 µg / mL, com 48h
(Figura 15).
46
Figura 14 - Efeito das SVMPs na viabilidade de células tEnd. A cultura de células tEnd foi tratada com 10 µg / mL das amostras Ic, IIb, IIc, IVa e IVb pelos períodos de 6h, 12h, 24h e 48h. Os controles utilizados foram: PBS, jararagina (SVMP de classe P-III isolada do veneno de Bothrops jararaca) e triton 0,1%. Nos diferentes tempos, a quantidade de células viáveis/aderidas foi acessada pelo MTT, como descrito no material e métodos.
Figura 15 - Efeito das SVMPs na viabilidade de células tEnd. A cultura de células tEnd foi tratada com 40 µg / mL das amostras Ic, IIb, IIc, IVa e IVb pelos períodos de 6h, 12h, 24h e 48h. Os controles utilizados foram: PBS, jararagina (SVMP de classe P-III isolada do veneno de Bothrops jararaca) e triton 0,1%. Nos diferentes tempos, a quantidade de células viáveis/aderidas foi acessada pelo MTT, como descrito no material e métodos.
47
Embora as SVMPs não tenham se mostrado significativamente tóxicas para
as células endoteliais (tEnd), nos tempos e concentrações avaliados, os dados
apresentados, demonstraram diferenças funcionais importantes entre as SVMPs
estudas, que poderiam repercutir na diversidade funcional do veneno de B. neuwiedi
e contribuir para a ecologia das serpentes.
4.6. Ação das SVMPS na coagulação de animais modelo para presas e
predadores de serpentes
O próximo passo foi verificar se as diferenças funcionais das SVMPs
poderiam refletir uma seletividade diferenciada para presa/predador. Para testar
essa hipótese, avaliamos a atividade pró-coagulante de cada SVMP em amostras de
sangue total de ratos e galinhas, como representantes de presa/predador
(mamíferos e aves), respectivamente. Como pode ser visto na Figura 16, na
ausência de cálcio, o veneno tem ação pró-coagulante em ambas as amostras de
sangue testadas. O efeito do veneno foi mais rápido em amostras de sangue total de
ratos (verde).
Comparando-se as SVMPs, apenas a IIc foi eficaz na coagulação do sangue
de ratos, tendo apresentado tempo de coagulação semelhante ao do veneno
(verde), mas resultando em um coágulo mais estável (azul). Por outro lado, as
SVMPs Ic, IIb e IIc foram capazes de coagular o sangue de galinha, porém
apresentando um ritmo mais lento (verde) que o veneno. A SVMP mais ativa no
sangue de galinha foi a IIb. As SVMPs IVa e IVb não mostraram nenhuma atividade
em ambos os sistemas, sendo semelhantes ao PBS (controle negativo). As SVMPs
que mostraram atividade pró-coagulante foram tratadas com um inibidor de
metaloproteinases (orto-fenantrolina) e, depois deste tratamento, a atividade pró-
coagulante foi significativamente reduzida em todas elas. Apenas um coágulo
discreto e friável (rosa) foi observado em sangue de rato incubado com a SVMP IIc e
no sangue de galinha incubado com a SVMP IIb, confirmando que as
metaloproteinases eram responsáveis pela atividade pró-coagulante apresentada.
48
Figura 16 - Perfil de amostras, em sangue citratado de rato ou galinha, tratadas com os pools de SVMPs. As amostras (10 µg / 40 µL) foram misturadas com amostras de sangue citratado de rato ou galinha (300 µl). Os dados são representativos de três experimentos independentes e foram adquiridos durante 1 hora.
Desse modo, neste experimento pode-se observar a presença de SVMPs que
atuam especificamente no sangue de mamífero, assim como outras que atuam
apenas em sangue de ave, demonstrando uma ação seletiva das SVMPs testadas
frente à coagulação de presas/predadores da serpente B. neuwiedi.
49
5. DISCUSSÃO
As SVMPs são os componentes mais abundantes em venenos botrópicos.
Estudos com análises transcriptômicas de glândulas de veneno de Bothrops atrox
têm demonstrado que aproximadamente 60% dos transcritos são constituídos por
metaloproteinases, sendo esse padrão considerado similar ao encontrado para
Bothrops jararaca, que possui elevada expressão de metaloproteinases da classe P-
III, além de outros componentes menos abundantes (Neiva et al., 2009). Além disso,
análises proteômicas dos venenos de várias espécies de Bothrops, incluindo B.
neuwiedi, mostraram que a maior parte proteínas do veneno são metaloproteinases
(Sousa et al., 2013).
As SVMPs são agrupadas em classes (P-I a P-III) e subclasses de acordo
com a organização de seus domínios (Fox e Serrano, 2008). Análises venômica e
transcriptômica da glândula de veneno de Bothropoides pauloensis (também
classificada como Bothrops neuwiedi pauloensis) realizadas por Rodrigues e
colaboradores (2012) demonstraram que aproximadamente 38% dos componentes
deste veneno são metaloproteinases, das quais aproximadamente 26% são de
SVMPs da classe P-III e cerca de 12% da classe P-I. Além disso, estudo realizado
por Tashima e colaboradores (2008) demonstrou que 73,1% das proteínas do
veneno de Bothrops cotiara correspondem a metaloproteinases, sendo 3,1% de
SVMPs da classe P-I e 70% de SVMPs da classe P-III, além de 1,2% de
disintegrinas; enquanto que no veneno de Bothrops fonsecai o conteúdo de SVMPs
é de cerca 42,5%, dos quais 3,4% são da classe P-I e 39,1% da classe P-III, além
de 4,4% de disintegrinas. Estes e outros relatos refletem a diversidade de SVMPs
presentes nos venenos de serpentes do gênero Bothrops.
A diversidade estrutural das SVMPs pode ser explicada pela evolução da
família gênica que as codifica, onde duplicações e divergências de genes ancestrais
são muito comuns (Moura-Da-Silva et al., 1996a). Esses mecanismos evolutivos
levam a alterações nos efeitos farmacológicos, gerando um leque abrangente de
moléculas capazes de interagir com diversos receptores.
Anteriormente, em nosso laboratório, foram identificados e caracterizados
onze cDNAs completos e muito distintos de SVMPs, a partir da glândula de veneno
50
de um único espécime de B. neuwiedi (Moura-Da-Silva et al., 2011). Neste trabalho,
durante as análises estruturais, foram parcialmente elucidadas as sequências de
aminoácidos das duas SVMPs de classe P-I (IVa e IVb), além da descrição das
condições necessárias para obtenção do cristal da IVb, uma vez que as tentativas
de se obter o cristal da outra P-I falharam. As SVMPs IVa e IVb foram submetidas ao
sequenciamento e a maior similaridade foi observada em bancos de dados com
MP_I2 e MP_IIa, respectivamente. De acordo com Moura-da-Silva et al. (2011), "os
precursores BnMP_IIa são, muito provavelmente, os responsáveis pela geração
independente dos domínios catalítico e disintegrina no veneno de B. neuwiedi”.
Estes dados foram corroborados pelos nossos resultados, uma vez que a IVb
aparentemente é a proteína codificada por BnMP_IIa, já que ambas sequências
possuem 100% de identidade no domínio catalítico, e este é um domínio
independente.
Ainda de acordo com Moura-da-Silva et al. (2011) a sequência da BnMP-IIa
foi consequência da recombinação entre os genes de P-I e P-II, que pode ocorrer
nos níveis de DNA, RNA e pós-transcricional. Por conseguinte, BnMP-IIa tem o
domínio catalítico de P-I e o domínio disintegrina clássico RGD (P-II típico). Porém a
IVb, isolada a partir do veneno, corresponde apenas ao domínio catalítico gerado
pela tradução de BnMP-IIa, que possui um domínio típico de SVMPs classe P-I. Por
outro lado, a BnMP_I2 e, consequentemente, a IVa são típicas SVMPs classe P-I.
Parece razoável que pequenas diferenças nas sequências de aminoácidos das
SVMPs possam contribuir para a sua versatilidade funcional, uma vez que
diferenças na sequência podem resultar em diferentes arranjos estruturais. Portanto,
o próximo passo consistiu no estudo do cristal da proteína IVb.
No cristal da IVb o íon zinco coordenou com His142, His146, His152 e um íon
de água, semelhante ao que foi observado em BaP1, outra SMVP classe P-I isolada
do veneno de B. asper (Lingott et al., 2009). O íon cálcio coordenou com Glu9,
Asp93, Asn200 e com a carbonila do oxigênio da Cys197. O local de ligação do
cálcio não foi observado em BaP1, mas está presente em Adamalysin II, uma
endopeptidase dependente de zinco isolada do veneno de Crotalus adamanteus
(Gomis-Rüth et al., 1993). Porém, uma vez que a sequência completa da IVb não foi
elucidada, o refinamento da estrutura ainda precisa ser finalizado.
51
No entanto, estudos de dados estruturais carecem de abordagens
experimentais que possam demonstrar diferenças nas atividades das proteínas
correspondentes a esses transcritos; o que poderia contribuir, significativamente,
para o entendimento acerca da diversidade estrutural e funcional das SVMPs.
Assim, estudos comparativos utilizando diferentes classes de SVMPs e / ou
diferentes proteínas da mesma classe, obtidas a partir de um mesmo veneno, são
importantes para determinar o papel dos diferentes domínios estruturais e
caracterizar as diferenças funcionais entre as SVMPs.
No presente trabalho nós analisamos as implicações da diversidade
funcional de cinco SVMPs do veneno de B. neuwiedi, sendo duas de classe P-I e
três da classe P-III. A ênfase do estudo foi dada na investigação de efeitos
relacionados às ações hemorrágica e pró-coagulante dessas proteínas.
Metaloproteinases de mesma classe podem apresentar variações funcionais
em uma mesma atividade, como é o caso da jararagina e berythractivase (SVMPs
classe P-III dos venenos de B. jararaca e B. erythromelas), que exercem diferentes
efeitos sobre a sobrevivência e proliferação de células (Schattner et al., 2005).
Durante o mestrado isolamos e caracterizamos as SVMPs de classes P-III e P-I (Ic,
IIb, IIc e IVa, IVb), e verificamos que estas SVMPs possuíam atividades
hemorrágica, fibrinolítica e coagulante completamente diferentes (Bernardoni et al.,
2014).
Sendo assim, partimos para as próximas etapas do trabalho nas quais
utilizamos as SVMPs das classes P-III (Ic, IIb, IIc) e P-I (IVa e IVb) anteriormente
isoladas por nosso grupo (Bernardoni et al., 2014) para melhor caracterizar suas
diferenças funcionais.
Desse modo, sabendo que a hemorragia é um dos efeitos mais graves do
envenenamento causado por Bothrops, primariamente relacionado ao dano
microvascular causado pelas SVMPs (Gutierrez et al., 2005; Escalante, T. et al.,
2011); e que este efeito é dependente da atividade catalítica destas toxinas, já que o
tratamento com agentes quelantes resulta na inibição completa da ação hemorrágica
(Howes et al., 2007). Avaliamos a ação destas enzimas em substratos FRET
específicos para SVMPs, e com exceção da IVa, todas as outras SVMPs testadas
mostraram atividade sobre o substrato Abz-ETGSLLVL-EDDNP, por outro lado,
apenas as IIb e IIc, ambas de classe P-III, apresentaram uma atividade relevante
52
sobre o substrato e Abz-AGLA-EDDnp. Por outro lado, a IVb que é uma SVMP da
classe P-I apresentou ação catalítica comparável às toxinas da classe P-III (no
substrato Abz-ETGSLLVL-EDDNP), mas é apenas fracamente hemorrágica,
sugerindo a participação dos domínios não catalíticos na atividade hemorrágica.
Alguns autores explicam a discrepância do potencial hemorrágico de SVMPs da
classe P-I e P-III baseando-se na presença dos domínios tipo-disintegrina e rico em
cisteína, presentes apenas nas toxinas da classe P-III (Jia et al., 1997; Baldo et al.,
2010a). Estes dados suportam nosso resultado de microscopia intravital, no qual as
SVMPs de classe P-III mostraram-se muito hemorrágicas, enquanto que as SVMPs
de classe P-I apresentaram uma pequena hemorragia.
Ainda quanto às atividades funcionais de metaloproteinases, a maioria das
SVMPs da classe P-I e da classe P-III apresentam atividade pró-inflamatória com
indução de migração leucocitária e liberação de citocinas (Moura-Da-Silva et al.,
2007). Diante disso, avaliamos a migração leucocitária induzida pelas SVMPs na
microcirculação do músculo cremaster de camundongos, e verificamos que todas as
SVMPs foram capazes de aumentar o número de leucócitos circulantes a partir de
10 minutos de experimento, mantendo este número aumentado até 30 minutos.
Esses dados corroboram os achados de Lopes et al. (2009), que verificaram
infiltrado inflamatório a partir de 1h de experimento em músculo gastrocnêmico com
neuwidase (SVMP de classe P-I, isolada de B. neuwiedi), e BJ-IP2 (SVMP de classe
P-I isolada de B. jararaca) que causa infiltrado inflamatório com 3 h de experimento
na pele do dorso de ratos (Da Silva et al., 2012). Além disso, Costa e colaboradores
(2002) demonstraram que a jararagina (P-III, isolada do veneno de B. jararaca) é um
potente agente pró-inflamatório, que induz acúmulo de leucócitos no tecido
subcutâneo de camundongos. A diferença no tempo de ação das enzimas deve ser
avaliada de acordo com o tecido utilizado, uma vez que nós avaliamos o aumento de
leucócitos circulantes nos micro vasos e os outros trabalhos avaliaram leucócitos
presentes nos tecidos.
De acordo com Gutierrez et al. (2005), as SVMPs são capazes de induzir
hemorragia de duas maneiras: em primeiro lugar, pela proteólise limitada de
componentes da matriz extracelular, causando diminuição da estabilidade da
membrana basal e distensão do capilar por causa das forças hemodinâmicas
normalmente operantes na circulação (por exemplo: pressão na parede do vaso),
53
levando a uma perda da integridade e ao extravasamento de sangue. Assim, nós
avaliamos também a capacidade das SVMPs em hidrolisar os componentes da
matriz extracelular. Baldo et al. (2010a) também estudou a ação de duas SVMPs:
jararagina ( P-III do veneno de B. jararaca) e BnP1 ( P-I isolada a partir do veneno
de B. neuwiedi), em componentes da matriz extracelular in vivo, e verificou que
ambas as proteínas eram capazes de alterar a distribuição de laminina e colágeno
IV na membrana basal, a BnP1 em menor escala.
Os resultados obtidos em nossas análises mostraram que apenas as
amostras Ilb e IIc foram capazes de se ligar ao colágeno I e IV. Este fato é bastante
interessante, pois apesar da amostra Ic ser a mais hemorrágica, ela não se
comporta como as outras hemorraginas, sugerindo um mecanismo de ação diferente
das demais. Além disso, nenhuma SVMP foi capaz de se ligar à laminina, à
fibronectina ou ao nidogênio. Embora todas as SVMPs tenham clivado a laminina α1
e o colágeno, apenas as SVMPs de classe P-III (IIb e IIc) foram capazes de clivar o
nidogênio. Nossos dados são suportados pelos achados de Escalante et al (2006)
que estudaram as diferenças entre a jararagina e BaP1 (SMVP de classe P-I isolada
do veneno de B. asper) na hidrólise do matrigel (in vitro), mostrando que ambas as
proteínas foram capazes de hidrolisar a laminina e o nidogênio.
Desse modo, sabendo que as SVMPs degradam os principais componentes
da matriz extracelular e estão envolvidas na ligação ou bloqueio de moléculas de
integrina, que estão relacionadas com a interação célula / matriz (Kamiguti et al.,
1996), torna-se importante estudar os efeitos frente à células endoteliais, como uma
parte importante da caracterização funcional destas proteínas. Avaliamos, então, a
ação das amostras de SVMPs na viabilidade e adesão de células endoteliais
murinas (tEnd).
Com relação à adesão celular, com 10 µg/mL apenas a amostra IVb foi capaz
de induzir perda de adesão a partir das 24 horas (h), tendo descolado todas as
células com 48h. Por outro lado, as SVMPs Ic, IIb, IIc e IVa induziram o mesmo
efeito apenas na concentração de 40 µg/mL. Estes dados corroboram os achados de
Baldo e colaboradores (2008) nos quais a BnP1 (P-I, isolada do veneno de B.
neuwiedi) também foi capaz de descolar todas as células com 48h; entretanto, a
BnP1 foi efetiva com uma concentração de apenas 2 µg, enquanto que em nosso
estudo a concentração necessária para a observação do mesmo efeito com a IVb foi
54
de 10 µg. Neste caso, devemos levar em consideração a utilização de linhagens
celulares diferentes, já que em nosso experimento utilizamos linhagens
imortalizadas, enquanto no trabalho citado foi utilizada linhagem celular primária
(célula endotelial de cordão umbilical - HUVEC).
Com a concentração de 40 µg/mL a amostra IVb foi capaz de induzir perda de
adesão a partir de 12h, tendo descolado todas as células com 24h. Tanjoni e
colaboradores (2005) obtiveram um resultado semelhante utilizando como amostra a
jararagina e a mesma linhagem celular. Com isso verificamos um potência similar
entre a amostra IVb (SVMP de classe P-I) e a jararagina (SVMP de classe P-III) para
induzir descolamento em culturas de células endoteliais (tEnd).
Uma vez que o descolamento de células endoteliais, geralmente precede o
processo de morte celular via apoptose, avaliamos também a ação das toxinas na
viabilidade das células. Neste caso, somente a SVMP IVb foi capaz de diminuir a
viabilidade das células, nos tempos testados, e apenas na maior concentração.
Neste caso, nossos dados diferem dos achados de Tanjoni e colaboradores (2005),
que observaram uma diminuição na viabilidade das células, a partir de 24h de
experimento com a jararagina. Achê e colaboradores (2015), descreveram uma
SVMP de classe P-I do veneno de Bothrops pauloensis, capaz de diminuir a
viabilidade celular em aproximadamente 50%, a partir da concentração de 20 µg/mL
e com 24 horas de tratamento. Essas diferenças de atividade podem estar
relacionadas ao fato de que as amostras avaliadas em nosso trabalho só foram
eficazes em descolar todas as células com 48 horas, e o ensaio de viabilidade foi
realizado apenas até 48 horas; sendo assim, as células tinham acabado de perder a
aderência e talvez não tenham tido tempo suficiente para sofrer apoptose.
A última etapa do trabalho foi verificar se as diferenças funcionais observadas
entre as SVMPs poderiam refletir uma seletividade para presa/predador; uma vez
que a composição final do veneno pode ser caracterizada pelo nível de expressão
de diferentes membros das famílias de toxinas, que conjuntamente, levarão à
eficiência do veneno para a manutenção das serpentes, ou seja, captura de presas e
evasão de predadores, refletindo também nas características dos envenenamentos.
As serpentes do gênero Bothrops são na sua maioria generalistas (Gibbs et
al., 2009) e para que seu veneno seja eficiente contra as diferentes presas, o
arsenal de toxinas nesses venenos, deve incluir toxinas capazes de paralisar e
matar diferentes tipos de presas. Para conseguir tamanha variedade de toxinas, tem
55
sido descrito um mecanismo complexo de modulação de expressão de genes
(Casewell et al., 2014). Em venenos que perturbam a hemostasia, as famílias de
toxina mais variáveis (lectinas tipo C, serinoproteinases e SVMPs) são codificadas
por múltiplas cópias de genes que sofrem ainda a seleção e diversificação a nível
pós-transcricional e pós-traducionais (Casewell et al., 2014). Como resultado deste
processo de diversificação, a hipótese é de que as toxinas presentes no veneno,
podem agir sobre alvos distintos da coagulação e sistemas vasculares de
mamíferos, aves, anfíbios ou de invertebrados. Esta hipótese foi confirmada no
presente estudo, uma vez que as SVMPs isoladas do veneno de B. neuwiedi agiram
com potência distinta no sangue de mamíferos e aves. Testamos os efeitos das
SVMPs sobre a coagulação do sangue ratos e de galinhas, que são os animais mais
próximos às presas/predadores nativas de serpentes. Por tromboelastografia,
apenas a SVMP IIc foi eficaz na coagulação do sangue de rato, enquanto as SVMPs
Ic e IIb coagularam melhor o sangue de galinha. De acordo com Martins e
colaboradores (2009), as espécies do gênero Bothrops geralmente tem uma dieta
generalista, mas os autores destacam que a maioria das subespécies do complexo
Bothrops neuwiedi é especialista em mamíferos. Neste caso, as aves poderiam
representar um importante predador de serpentes B. neuwiedi explicando por que o
veneno mostrou ainda mais eficácia contra o sistema de coagulação de aves. Assim,
o padrão de alimentação entre as espécies de serpentes Bothrops provavelmente
não é o único fator de modulação da plasticidade do veneno e a composição deste
pode também ser afetada por outros parâmetros ambientais que atuam sobre a
expressão de diferentes componentes do veneno.
Portanto, a diversidade estrutural de diferentes classes de SVMPs pode
influenciar a diversidade funcional dessas toxinas, como já descrito anteriormente na
literatura e suportado por nossos testes funcionais, nos quais as diferentes classes
de SVMP apresentaram diferentes atividades. Por outro lado, nosso estudo também
demonstrou a mesma diversidade funcional entre as SVMP de mesma classe,
sugerindo a contribuição de outros fatores para a diversidade funcional de SVMPs,
como a sequência primária e as modificações pós-traducionais das toxinas. No
entanto, considerações mais conclusivas sobre esses achados requerem
informações detalhadas das sequências de proteínas e suas estruturas
tridimensionais.
56
6. CONCLUSÃO
Grandes diferenças funcionais foram observadas entre as SVMPs analisadas,
inclusive entre as pertencentes a uma mesma classe, sugerindo a contribuição de
outros fatores, além dos domínios estruturais, para a diversidade funcional de
SVMPs. Não obstante, a diversidade funcional das SVMPs definitivamente contribui
não apenas para os sintomas dos envenenamentos em humanos, como também
para o papel adaptativo dos venenos ofídicos, uma vez que fornece mecanismos
especializados para caça de presas e evasão de predadores.
Pools Classe de SVMPs
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g/m
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L)
Via
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ad
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g/m
L)
Ma
mífe
ro
Ave
Ic P-III 3,08 + +++ + + + + - + + - - - + - - - ++
IIb P-III 5,67 + +++ ++ +++ +++ + +++ +++ +++ - - - ++ - - - ++
IIc P-III 7,55 - + ++ +++ +++ + +++ +++ +++ - - - ++ - - +++ +
IVa P-I - - + - - +++ + - - - - - - ++ - - - -
IVb P-I - + + ++ - ++ +++ - - - - - +++ +++ - ++ - -
Atividades Biológicas
57
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67
ANEXO
Kit de Cristalização: Crystal Screen
68
69
Kit de Cristalização: Index
70
71
Kit de Cristalização: Wizard 1-2
72
73
Kit de Cristalização: Wizard 3-4
74