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1 Instituto Superior de Educação do Vale do Juruena Pós-Graduação Lato Sensu em GESTÃO ESCOLAR Disciplina Supervisão e Orientação Pedagógica Professor: Dr. Cláudio Silveira Maia Novo Progresso-PA Novembro, 2012

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Instituto Superior de Educação do Vale do Juruena

Pós-Graduação Lato Sensu em GESTÃO ESCOLAR

Disciplina

Supervisão e Orientação Pedagógica

Professor: Dr. Cláudio Silveira Maia

Novo Progresso-PA

Novembro, 2012

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EMENTA: Abordagens emergentes em Cultura organizacional dos

espaços educativos. A organização do trabalho pedagógico na educação

básica em seus diferentes níveis e modalidades de ensino. Instâncias

colegiadas. Plano de Desenvolvimento da Educação. Projeto Político-

Pedagógico (PPP). Currículo, planejamento e avaliação (institucional) em

Gestão. Formação continuada nas organizações. Integração Escola,

Família e Comunidade.

ORIENTAÇÃO BIBLIOGRÁFICA

HORA, D. L. Gestão democrática na escola: artes e ofícios da

participação coletiva. Campinas: Papirus, s.d

LIBÂNEO, José Carlos; OLIVEIRA, João Ferreira de; TOSCHI, Mirza Seabra.

Educação escolar: políticas, estrutura e organização. São Paulo: Cortez, 2003.

VEIGA, Ilma Passos Alencastro (org.). Escola: espaço do projeto político

pedagógico. Campinas: Papirus, s.d.

TÁBUA DE MATÉRIAS

GESTÃO DA EDUCAÇÃO E A FUNÇÃO DE SUPERVISÃO PEDAGÓGICA

O PAPEL DO PEDAGOGO NO CONTEXTO ESCOLAR

CONSELHO DE CLASSE: ESPAÇO DE ANÁLISE, REFLEXÃO E AVALIAÇÃO DO

TRABALHO PEDAGÓGICO

ESCOLA E DISCIPLINA: UMA ABORDAGEM FOUCAULTIANA

PARA UMA VISÃO TRANSFORMADORA DA SUPERVISÃO (Estágios) PEDAGÓGICA

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GESTÃO DA EDUCAÇÃO E A FUNÇÃO DE SUPERVISÃO PEDAGÓGICA

EDUCATION MANAGEMENT AND THE FUNCTION OF PEDAGOGICAL SUPERVISION

SORAIA CHAFIC EL KFOURI SALERNOA; SAMIRA FAYEZ KFOURI DA SILVAB

Resumo

O texto trata da Gestão Educacional em sua função de supervisão pedagógica no contexto da escola contemporânea, um contexto de intensas contradições que incidem na origem do papel da supervisão educacional em sistemas de ensino no Brasil. A ação supervisora nos sistemas ensino passam por várias manifestações, ora em âmbito de unidade, ora em instâncias intermediárias. As avaliações de sistemas despontam como um desafio para a supervisão pedagógica, pois requer conciliar indicadores externos de qualidade ao projeto de educação que se deve construir localmente no alcance da democratização das aprendizagens. Palavras-chave: Supervisão Pedagógica, Avaliação de Sistema, Projeto Pedagógico

Abstract

The text is about Educational Management regarding its supervisory role in the educational context of contemporary schooling, a background of intense contradictions that affects the origin of the educational supervision role in Brazilian education systems. The supervisory action in education systems pass through various events, sometimes in the context of unity, others in intermediate instances. The evaluation systems are emerging as a challenge to the pedagogical supervision, because it requires reconciling good external indicators with the project that should be built locally inside of learning democratization. Key-words: Pedagogical supervision. System Evaluation. Pedagogical Project. a Doutora em Políticas Educacionais e Sistemas Educativos - Univesirade Estadual de Campinas (UNICAMP), Docente da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e Universidade Norte do Paraná (UNOPAR). E-mail: [email protected] b Doutora em Comunicação Social - Universidade Metodista de São Paulo - (Metodista), Docente da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Coordenadora Pedagógica e docente da EAD na Universidade Norte do Paraná (UNOPAR). E-mail: [email protected]

* Endereço para correspondência: Rua da Lapa, 498, Jd. Higienópolis Cep: 86.015-050 - Londrina - PR

1 Introdução

Falar da gestão educacional em sua função de supervisão

pedagógica é sem dúvida um desafio, considerando a contradição presente nesta atuação a partir de uma perspectiva histórica e sob o olhar comprometido com uma escola de qualidade.

Toda atividade humana apresenta intencionalidade, remete-nos a um fim, respaldado numa noção de justiça, pois procura alcançar o “certo”, o “justo”, o “prioritário” ou mesmo o inverso, estes parâmetros se localizam em concepções de mundo, de homem, de sociedade.

O campo educacional, não distinto, mas parte desta engrenagem manifesta noções de justiça ao logo da história, nas escolhas que envolvem as determinações de governos, dirigentes e profissionais localmente situados. Uma grande engrenagem que envolve responsabilidades diversificadas.

Discutir o papel da gestão educacional em sua função de

supervisão pedagógica implica reconhecer que uma escola não é fruto somente do que se deseja, nem mesmo do que se dispõe a fazer, no sentido de “é só arregaçar as mangas que se consegue”, mas também, é fruto de toda uma determinação histórica, geográfica, econômica e social, a qual pode promover os sujeitos, bem como privá-los de construírem sua história, de conquistas – como o direito à educação. Portanto, a escola é fruto de iniciativas e de esforços dos profissionais localmente situados mesclados à rede de determinações, das escolhas na “micro física” às escolhas em âmbito macro.

Partindo desde ponto – a contradição que buscamos desvelar na atuação da gestão educacional em sua função supervisora, ocorre num campo ideológico que expressa a luta por direito ao acesso a bens culturais; direito que não está dado em sua integralidade, sendo necessário conquistar. As privações históricas e a correlação de poder existente são próprias da relação entre saber e poder.

A correlação de forças, como busca e expressão de poder, envolve a ação de dirigentes educacionais, num campo de abrangência maior, bem como de proximidade imediata, como no caso das unidades escolares. As relações de poder entre os homens não se reduzem a um campo específico, como se fossem definidas em um conceito universal e/ou um conjunto de características definisse sua manifestação. A ação humana é dinâmica, intencional, tanto quanto acidental e provisória, dependendo da situação; portanto qualquer reducionismo validaria uma visão parcial (SALERNO, 2007, p. 107).

As unidades escolares vivenciam no seu cotidiano

manifestações de uma intencionalidade, mesmo que esta não

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Gestão da Educação e a Função de Supervisão Pedagógica seja conhecida pelos que executam e são impactados, mas o acaso também está presente nas relações entre os sujeitos, portanto não cabe uma teoria geral do poder, com intuito de generalização como algo unitário e global, conforme postula Foucault (1979)1 no sentido de que toda a correlação está subjugada à questões econômicas ou a função repressiva, mas outro aspecto se presencia como ação de sujeitos que operam por meio de desejos, visão, crença, intencionalidade e estratégia, no uso do conhecimento, para “empodeirar” outros.

A atuação do supervisor na escola ou com vistas ao desenvolvimento do trabalho escolar comporta esta contradição, pois se reconhece num espaço de luta expressa ao longo da história. Então que espaço é esse? Qual o papel da Escola?

2 O Contexto da Escola Contemporânea

Para falar sobre o contexto escolar, no que se refere

à definição de sua identidade, é necessário situarmos o atual momento histórico e conceitual, para buscar alguns desvelamentos sobre sua manifestação.

Do moderno ao pós-moderno, supõe-se um movimento histórico, da fragmentação pela via da especialização, à homogeneização pela via da valorização das diferenças — enquanto defesa da pós-modernidade, essas características mostram-nos somente sua superfície. Esse movimento não representa uma ruptura, pois não rompe com a lógica do capital, que favorece a interesses economicistas.

Habermas (apud ANDERSON, 1999), ao tratar sobre o inconcluso projeto da modernidade, diz ser um amálgama contraditório de dois princípios opostos: especialização e popularização.

O pós-moderno surge anunciando a morte da grande narrativa, como direitos universais defendidos pela própria burguesia, a partir dos anos de 1970, quando o comunismo, uma alternativa ao capitalismo (ou um “concorrente” dele), enfraquece.

O uso da expressão pós-moderno surge para designar um estilo “pós-moderno”, no mundo das artes. A noção de pós-moderno, antes circunstancial pelo seu uso de sentidos diversos, segundo Anderson (1999), só ganhou difusão mais ampla a partir da década de 1970, compondo-se como características de um período, deixando de ser somente uma tendência artística.

Anos 1970: época marcada por crises no comunismo, crise no petróleo; portanto, crises econômicas, bem como ideológicas. Para Hobsbawm (2000), a escolha de uma data específica não passa de uma convenção, e não é algo por que os historiadores estejam dispostos a brigar. Há apenas um indício claro do término do Século Breve: sabemos que, desde 1973, a economia mundial entrou em nova fase.

Hobsbawm (2000) identifica o colapso da União Soviética coincidindo com uma série crise de depressão na economia dos países ocidentais. Não que outras crises não tenham surgido, pois a economia sofre oscilações relativamente pequenas, ao passo que de 1970 para cá, presenciamos um período de fortes crises.

No entanto, Hobsbawm (2000), ao ser indagado sobre finalização de um processo globalizante, responde que não acredita que chegamos ao fim de um processo e que o resultado esteja posto, pois não se encontra encerrado, mas em mudança.

Estar numa nova fase não significa a conclusão de um processo. A pós-modernidade, então não deve ser entendida como a superação da modernidade.

Tem-se, então, com a expressão pós-modernidade, uma dispersão da modernidade, não o seu fim; presencia-se uma crise persistente num período duradouro, apresentando-se com uma base material: a globalização econômica, que é a superação do local, na conquista de novos espaços a serem explorados; uma base ideológica: o neoliberalismo, calcado na lógica de mercado, defendendo um estado mínimo em detrimento de um estado benfeitor, e uma base política: a planetarização, difusão de estilos de administração gerencial com foco nos resultados, respaldada na base ideológica, manifesta-se pela desconstrução dos Estados nacionais periféricos, pela demonstração de sua incompetência, numa intervenção que os sujeita aos países centrais. Esses aspectos se entrelaçam, gerando um contexto de fortes influências para as políticas educacionais - considerando que um projeto de escola não se dissocia de um projeto de nação.

Considerar, porém, o momento atual2 como um processo de diluição do Estado nacional ainda é tratar superficialmente, pois um movimento contrário se estabelece, e se presencia um Estado mínimo para benefícios sociais e um Estado interventor para a concretização de interesses de corporações internacionais.

Esse perfil de Estado mediador de interesses hegemônicos é expresso num movimento no eixo centralismo–descentralismo, que podemos identificar como um recentralismo moderno.

Casassus (apud BORGES, 2002, p. 47),

Lembra as recomendações do Fundo Monetário Internacional, que, ao renegociar as dívidas dos países, sugere a diminuição dos gastos públicos, para tanto motivando tais países já endividados, sem distinção ideológica, a levarem adiante processos de descentralização educativa.

Neste contexto, Borges aponta que a descentralização,

por sua lógica e seu significado, conduz à individualização e à privatização. Descentralização essa manifesta pela desconcentração, que traz um movimento diretivo de cima para baixo, e não como conquista de espaços de decisão.

1 Microfísica do Poder. 2 Final do século XX a começo do século XXI. 30 SALERMO, S. C. K.; KFOURI-SILVA, S. F. / UNOPAR Cient., Ciênc. Human. Educ., Londrina, v. 11, n. 1, p. 29-38, Jun. 2010

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A desconcentração está mais próxima ao centralismo, pois traz a idéia da divisão, fragmentação para o exercício de melhor regulação.

Essa lógica de descentralização é reflexo de um novo modelo administrativo, a administração gerencial, que difere da administração burocrática no que se refere ao alcance de objetivos, enfatizando o controle dos resultados, defendendo uma autonomia processual, numa nova cultura organizacional.

A escola é determinada por esse movimento histórico, porque reflete as contradições dos dispositivos políticos desencadeados pelas atuações governamentais, e estas, determinadas, quando não “amarradas”, pelo contexto normativo legal condicionado por corporações internacionais.

A partir da década de 1960, o sistema escolar se expande, o efeito “entusiasmo pela educação” traz o tema escolarização a uma pauta, tem-se a internacionalização da educação —; a escola passa a ser uma instituição conhecida por todos, num cenário de expansão para toda a América Latina, com características semelhantes.

Mas, à medida que a escola se expande, como conseqüência de implementações políticas, os recursos encolhem, não acompanhando a real necessidade; o dualismo se intensifica, dissociando-se o político do econômico, esvaziando a declaração de universalização de direitos. O reconhecimento da necessária unidade do político, ação intencional voltada para a pólis, para o bem comum, com a consistência de condições para tal, é questão sine qua non.

A escola então absorve as diferenças sociais, constituídas numa sociedade de classes, diferenças antes excluídas desde seu acesso à escolarização, agora excluídas no processo de parcos recursos no contexto da escolarização. De uma exclusão do processo de escolarização à participação num processo de escolarização excludente.

Nesta última década – anos 1990 –, de maneira mais intensa, assistimos a dispositivos legais que conduzem os sistemas educativos à definição de sua identidade pela via da elaboração de seu projeto pedagógico.

Vale lembrar que a expressão “político”, do projeto pedagógico, foi excluída do contexto normativo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/96), Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) e Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), embora se mantenha na literatura e por algumas unidades escolares, talvez como resistência. Não podemos desconsiderar que a linguagem, idéias e valores exercem certo grau de direcionamento, veiculam idéias.

A elaboração do projeto pedagógico da escola atenderia, então, à política da identidade, considerando o atendimento às diferenças regionais e locais, ou seja, seria a focalização na escola.

Ao voltarmos o olhar para os dispositivos no nível macro, identificamos um caminho normativo conflituoso, como a elaboração dos PCN para o ensino fundamental elaborado

Gestão da Educação e a Função de Supervisão Pedagógica

pelo Ministério da Educação e Cultura, anterior à elaboração da LDB (1996), bem como a elaboração das DCN para o ensino fundamental (1998), elaboradas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), que, supõe-se, deveria dar o “norte” para a elaboração dos PCN (1997). Como se isto não bastasse, presencia-se, no contexto desses documentos, PCN e DCN, omissões e desentendimentos entre o MEC e CNE, como aponta Bonamino e Martínez (2002), já que expressões tratadas num contexto são omitidas em outro, como temas transversais (PCN) para vida cidadã (DCN), e um documento (DCN) desobriga a adoção do outro (PCN). Observamos, então, ausência de colaboração e falta de diálogo por duas instâncias responsáveis pela implementação da reforma curricular nos sistemas educativos. Num contexto desagregador como este, a escola é “orientada” a construir sua identidade, a rever sua função social, a ser competente, sem que se considerem as condições para tal.

O contexto escolar, fruto desta contradição, apresenta-se como partícipe de uma estrutura excludente, pois o Estado, esvaziado de seu sentido, passa a reforçar a diferenciação pela focalização na escola, gerando a desagregação.

Para além do certo e do errado, nem buscando ser otimista ou pessimista, como efeito de uma posição extremista, mas pela tomada de uma posição que busque o desvelar das políticas desencadeadas, identificando sua lógica, tanto para a autoconsciência como para a consciência coletiva, torna-se essencial a atuação num espaço de profunda contradição: a escola.

O imobilismo tanto quanto a subordinação deliberada, por se considerar impotente, diante deste quadro, devem ser rejeitados. Pois a recuperação do local passa pela valorização do local de trabalho, como um processo rico de relações. Deve- se considerar a valorização do local de trabalho como garantia de direitos universais. A base geográfica dessa construção será o lugar, considerado como um espaço de exercício da existência plena. Essas relações oportunizam novas racionalidades e contra-racionalidades, ou seja, é a resistência a um pensamento hegemônico e (ou) irracionalidades.

Os conflitos existentes nos possibilitam uma nova consciência, pois o momento histórico é exigente de uma mais elaborada interpretação. O momento não é para nostalgias românticas, o desejo do retorno, mas para a proposição, a definição esclarecida de intencionalidade e o exercício de uma nova política, para garantir, não de maneira compensatória, o direito a um bem universal: o saber produzido historicamente pelas gerações passadas, como suporte para a produção de novos saberes, que é a função social da escola – a efetiva socialização do saber, sua real identidade.

O ponto de partida para uma ação supervisora transformadora passa por uma “ampla visão” e esta coletiva, contrária a uma postura individualizada que tenta expressar a “super visão”, numa concepção ingênua – a de super herói.

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Gestão da Educação e a Função de Supervisão Pedagógica 3 As Diferentes Manifestações da Supervisão

Existem diferentes pontos de vista e diferentes expressões

da ação supervisora na educação, portanto é importante pensar na sua manifestação pela sua denominação, pois traz a atribuição de sua identidade e o âmbito de atuação.

A supervisão educacional, pois traz uma conotação mais ampla, comportando a atuação tanto em âmbito macro como micro. A expressão educacional extrapola as atividades da escola, portanto, supervisão educacional supõe atuação em âmbito de sistemas de ensino.

A supervisão de ensino é expressão usada, por exemplo, pelo Estado de São Paulo para designar os supervisores que atuam em instâncias intermediárias – diretorias regionais de ensino.

Supervisão escolar, usual a supervisores que atuam diretamente nas escolas envolvendo serviços administrativos, de funcionamento geral e pedagógico, fazendo parte do corpo gestor da instituição.

A coordenação educacional é uma atuação que deriva da supervisão educacional e comporta os sentidos da ação supervisora em aspectos mais específicos, como a coordenação pedagógica realizada em escolas e em processos educacionais em organizações não governamentais, a coordenação de área, acompanha o trabalho por área do conhecimento e a coordenação de curso, destina-se a trabalhar com as questões pedagógicas de cursos na educação básica e superior. Sendo uma das condutas supervisoras, implica em “co-ordenar” – organizar em comum –, prever e prover momentos de integração do trabalho no que se refere ao ambiente de aprendizagem e os sujeitos envolvidos, acompanhando e assessorando a planificação curricular, processo de avaliação, adequação de materiais didáticos, discutindo com os docentes o cotidiano do trabalho, propondo medidas de superação de problemas identificados, socializando experiências, acompanhando a formação dos profissionais.

O rigor na denominação aplicando padrões gerais é um risco, tendo em vista a diversidade presente no sistema educacional brasileiro, pois existem manifestações distintas nos sistemas, ou seja, sistemas diversos no ensino público (Federal, Estaduais e Municipais), no sistema privado (unidades escolares e rede de escolas) e em organizações não governamentais.

De modo geral a função de supervisão se refere à articulação das diretrizes nacionais do sistema com as diretrizes das unidades onde processos educacionais são desenvolvidos, tanto aqueles que se localizam nas capitais, como aquelas dos mais distantes municípios do interior do Brasil, um campo da gestão educacional.

A atuação é reconhecida no contexto legal como o profissional da educação na função de supervisão educacional na LDB 9394/96, no artigo 64:

A formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional

para a educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional (BRASIL, 1996).

Sua formação ocorrerá, conforme a LDB, em cursos de

Pedagogia ou em pós-graduação, ressalta-se a autonomia da instituição ou sistema de ensino, em estabelecer critérios de escolha de formação. E dá outra denominação aos até então chamados de “especialistas”.

Outro dado relevante é expresso no artigo 67 da LDB, parágrafo primeiro, onde estabelece que a experiência docente é pré-requisito para o exercício profissional de quaisquer outras funções de magistério. A docência é a essência da atuação do profissional da educação, pois no âmbito técnico- político cabe acompanhar, assessorar, articular um campo da qual tem experiência, visão ampla.

4 Trajetória da Supervisão no Brasil

A formalização da profissão é recente, sua oficialização

vem com a Lei 5.692/71, apoiada no Parecer do CFE nº 252 de 1969 que reformulou os cursos de Pedagogia criando as habilitações, no lugar de formar o “técnico em educação” com várias funções, passa-se então a formar o “especialista em educação”, introduzindo a lógica da Reforma Universitária de 1968, introduzindo a departamentalização do trabalho e o modelo de administração clássica.

Mas enquanto função, a supervisor no Brasil é anterior sendo percebida no período jesuítico. O papel da educação baseava-se na catequese e na instrução aos indígenas, mas aos filhos da elite colonial era dispensada educação diferenciada. Com a organização das atividades educativas no Brasil, a função supervisora se apresenta a partir do Ratio ataque Instituto Studiorum, chamado abreviadamente de Ratio Studiorum, um plano geral escrito por Inácio de Loiola que regulamentava a educação.

Segundo Saviani (1999), a idéia de supervisão era prevista na figura do prefeito geral, a quem todos os professores e alunos deveriam obedecer. Sendo assistente do reitor, era dever do prefeito: organizar os estudos, orientar e dirigir as aulas; lembrar os professores que devem explicar toda a matéria; ouvir e observar os professores (assistir as aulas de vez em quando e ler os apontamentos dos alunos). Função distinta dos professores e do reitor e sujeito ao prefeito geral.

Com a expulsão dos Jesuítas é extinto o cargo de prefeito dos estudos. A Reforma Pombalina é introduzida, mas ficamos com um período em torno de treze anos sem instrução formal. Houve um retrocesso no campo educacional, pois com eles foram-se a organização baseada no Ratio Studiorum, pouca coisa restou na prática educativa do Brasil.

A Reforma Pombalina, com o alvará de 28 de junho de 1759, criam-se as aulas régias, professores leigos são admitidos, eram mal preparados e mal pagos. Para a manutenção do ensino primário e médio institui o “subsídio

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literário” em 1777, um imposto que incidia sobre a carne verde, o vinho, o vinagre e a aguardente, mas nunca foi cobrado com regularidade o que resultava em longos períodos sem receber vencimentos à espera de possíveis soluções da Metrópole.

O alvará de Pombal, no entanto, previa o cargo de diretor geral dos estudos, englobando aspectos de inspeção e direção; e em níveis locais os diretores de estudos, designados pelo diretor geral, para dirigir, fiscalizar, coordenar e orientar o ensino.

Com a independência, busca-se organizar a instrução pública; a Lei de 15 de outubro de 1827 institui as escolas de primeiras letras, no artigo 5 determinava que os estudos se realizassem com base no “método de Ensino Mútuo” ou método Lancaster3 onde o papel do professor é também de supervisor de monitores (alunos mais avançados). A escolha do método atendia interesses externos à esfera pedagógica, era vantajoso, pois resolvia o problema de falta de professores.

Não dura muito tempo, menos de 10 anos para o fracasso do método, e a função supervisora passa a ser exercida pelo inspetor geral, como um agente específico, o qual tinha a responsabilidade de supervisionar todas as escolas, colégios, casas de educação, bem como conferir diploma, autorizar abertura de escolas e revisava livros.

Para Saviani (1999, p. 24) “[...] a idéia da supervisão ganha contornos mais nítidos ao mesmo tempo em que condições objetivas começam a abrir perspectivas para se conferir a essa idéia estatuto de verdade”.

A figura do inspetor se mantém na Primeira República, como a pessoa qualificada, experiente, acompanhando o currículo pleno das instituições.

A década de 20 culmina com os “técnicos em escolarização”, com o movimento escolanovista e a remodelação do aparelho organizacional, promovendo a dicotomia do técnico-pedagógico com o especificamente administrativo. Esta separação é condição essencial da figura do supervisor distinta do papel do diretor, dicotomia que expressa o reflexo da administração fayolista no Brasil.

Fayol propôs-se a escrever sobre a função administrativa e o fez diferenciando-a de todas as outras funções [...]. Essa clássica divisão das funções distingue o papel do administrador do papel da organização como um todo. Eis aí a herança da distinção ainda presente na escola, do que seja parte administrativa e parte pedagógica, que usual e formalmente se testemunha nas literaturas e discursos nos sistemas de ensino. No entanto, as funções administrativas englobam os elementos da administração; são funções do administrador: prever, organizar, comandar, coordenar e controlar, e elas não se dissociam do papel da organização (SALERNO, 2007, p. 53, grifo do autor).

Gestão da Educação e a Função de Supervisão Pedagógica

Esta herança, fortemente presente nos sistemas de ensino, obscurece o papel pedagógico da escola, a qual deve existir direcionada pelo seu projeto de educação. Tem-se o supervisor distinto da função do diretor e em alguns casos em oposição como se observa ate os dias de hoje no artigo da Revista do Projeto Pedagógico da UDEMO4, ao tratar da atuação supervisora em instâncias intermediárias,

Assim, a supervisão poderá, através de constante verificação, auxiliar a direção, ação essa a qual não devemos nos opor, em nome da pseudo interferência em nossa escola, sob pena de estarmos, deliberadamente, impedindo a solução de problemas que, em última análise, poderão em algum momento trazer-nos sérios prejuízos. Aliás, os poucos supervisores que agem ‘policialescamente’, normalmente são incompetentes e acabam por ‘meter os pés pelas mãos’, até pelo desconhecimento da legislação que deveria mover-lhes a ação (UDEMO, 2004).

O possível papel de oposição, entre diretores e supervisores,

aparece em situações onde a estrutura hierárquica é manifesta por práticas conservadoras que emperram um processo construtivo, têm-se com isso desabafos constantes de diretores como resquícios de práticas herança da divisão fayolista.

Com o Manifesto dos Pioneiros em 1932, propagava a necessidade de uma identidade nacional, mediante um plano racional. Fernando de Azevedo, autor da redação do manifesto, denunciava que a falta de unidade e o descontinuísmo de pensamento nos planos estavam relacionados à fragmentação do setor educacional, a ponto de as instituições não serem atraídas por uma concepção de vida e nem se submeterem aos princípios da administração clássica, cujo tratamento científico, segundo ele, ajudaria a encontrar processos mais eficazes para a superação de problemas da administração escolar.

A formalização do cargo de supervisor ocorre num contexto de vínculos educacionais com Brasil e Estados Unidos da América, consolidados no período militar. O curso de pedagogia, pelo Parecer n. 252/69 passa a se configurar com as habilitações e na Lei 5.692/71 o supervisor passa a figurar como um dos especialistas em educação5, com registro profissional próprio (art. 74).

O supervisor como um especialista em educação, exercia função como controlador do processo de produção, como elemento mediador entre o sistema e a unidade.

A década de 80 tem-se o reconhecimento da crise econômica e o novo período com o fim da ditadura militar, tem-se um período de turbulências, de mobilizações, de manifestações operárias em busca de retomadas e conquistas.

A efervescência nas discussões pedagógicas abre espaços pra novos e velhos questionamentos: sobre qual o papel da escola? Que homem se quer formar?

3 Ensino Mútuo foi trazido para a Inglaterra pelo pastor anglicano André Bell, da Índia, mas foi lá divulgado pelo Quaker Joseph Lancaster. 4 UDEMO: Sindicato de Especialistas de Educação do Magistério Oficial do Estado de São Paulo. 5 Lei 5692/71 - cap IX, dos professores e especialistas SALERMO, S. C. K.; KFOURI-SILVA, S. F. / UNOPAR Cient., Ciênc. Human. Educ., Londrina, v. 11, n. 1, p. 29-38, Jun. 2010

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Gestão da Educação e a Função de Supervisão Pedagógica

Os supervisores ainda com toda a ênfase técnica se percebem em crise e sob fortes críticas sobre o seu papel repressor e reprodutor no sistema.

Nos anos subseqüentes, nossos dias, as discussões sobre o curso de Pedagogia a extinção das habilitações, os sistemas de ensino ainda em processo de adequação quanto aos critérios de acesso em concursos públicos para esta atuação e se cargo ou função, ainda impulsionam debates sobre o papel do supervisor educacional.

5 O Papel do Supervisor Educacional

Atuação reconhecida na LDB 9.394/96, presente nos

sistemas de ensino de maneiras diversas, como abordado no início deste, desponta como agente transformador, necessário para a superação dos desafios presentes no século XXI.

A função supervisora deve ser vista como a articuladora do projeto de educação onde se encontre em sistemas de ensino ou em organizações não governamentais.

Como ponto de partida é necessário reconhecer a trajetória de sua atuação para tomar posição quanto à continuidade, ruptura e ressignificação de seu papel – um profissional comprometido com seus pares e com vistas à efetivação das aprendizagens.

O prefixo “super” não deve remeter a uma posição hierárquica superior, mas sim a uma visão do e sobre o processo de aprendizagem, que expressa em sua essência uma “ampla visão” proporcionando elementos de integração, coletividade, colaboração e companheirismo.

Implementar, participar, articular e/ou assessorar uma prática pedagógica transformadora implica clareza de sua historicidade e reconhecimento de seu papel, mediadas por atitudes concretas no cotidiano de trabalho, como plano de trabalho concebido por meio de uma concepção de educação.

Compondo o corpo gestor numa secretaria, numa instância intermediária ou numa unidade de ensino requer o estabelecimento de indicadores de qualidade para estabelecer como meta, definindo o percurso com diálogo franco entre os seus e integrando os interesses e necessidades da comunidade local numa prática profissional qualificada pelo uso de instrumentos de gestão necessários.

Acompanhamento do processo de avaliação como avaliação omnilateral, em sintonia com o projeto de educação construído coletivamente, utilizando-se da transparência de critérios e concepção, como recurso de prestação de contas à população envolvida, bem como ao sistema de ensino em que a unidade escolar está inserida.

Promover um ambiente de trabalho que estimule a iniciativa de ações transformadoras no espaço institucional com criatividade e valorização profissional, num percurso de conquista da autonomia para o desenvolvimento de uma educação de qualidade, é uma dos objetivos que deve estar presente na atuação do supervisor.

Ao se falar em qualidade, uma categoria ambígua que ganha sentido quando ressignificada localmente, pelos que

participam do processo educacional, a supervisão necessita considerar a outra ponta que é a avaliação. A qualidade ganha sentindo num processo de avaliação.

6 A Avaliação e a Supervisão Pedagógica

Quando falamos de qualidade necessariamente o papel

da avaliação emerge como o processo que julga a educação que temos e a que desejamos. Para a LDB/96 a avaliação é destaque, pela importância que adquire para todo o sistema de ensino no Brasil, não somente para o local de aprendizagem. A qualidade é ponto central nas discussões de organismos internacionais a partir da década de 1990, pois se reconhece que os sistemas avançaram no aspecto de universalidade, ou seja no acesso e permanência, no entanto, a permanência não contempla índices de qualidade necessários para os diversos sistemas de ensino.

Ao estabelecer indicadores ou padrão de qualidade não podemos prescindir de um processo que acompanhe, verifique, julgue e tome decisões no processo de ensino em busca de melhores resultados.

Para Luckesi (2002), a avaliação é entendida como um juízo de qualidade sobre dados relevantes, tendo em vista a tomada de decisão durante o processo. Observa-se que o processo de avaliação implica num julgamento de valor que envolve escolhas referentes a procedimentos, conteúdos, tempo e desempenho. Ao julgar cabe o posicionamento – caminhos a seguir.

O papel da supervisão torna-se relevante pela visão de amplitude, necessária ao trabalho enquanto processo integrador, o qual envolve professores, alunos, corpo gestor e comunidade representativa (Conselho de Classe, Conselho de Escola, APM, Grêmio Estudantil, Conselho Municipal, Conselho Tutelar), onde ao acompanhar o processo, oportuniza elementos de análise e espaços para um diálogo problematizador.

Um processo de avaliação indispensável no desempenho profissional, em unidades escolares ou em espaços não escolares se substantifica num processo interdependente e sistêmico, pois se constrói numa prática social mais ampla antes mesmo do espaço onde se manifesta temporal e espacial, com os sujeitos específicos.

Portanto, um processo de avaliação deve atentar para os valores que permeiam a sociedade e o tempo histórico destes sujeitos, o isolamento da escola e mesmo do processo em si deve ser evitado. A escola que conhecemos foi gerada com intuito de primar pela privacidade da criança, protegendo-a das mazelas do mundo adulto, como defendia Rousseau (século XVIII), o reconhecimento de que a educação é uma prática social é recente e que precisa reconhecer-se integrada ao mundo social, está relacionado ao final do século XIX e mais intensamente ao século XX, com a evolução do pensamento laico. Mas, ainda presenciamos o isolamento da escola e do processo pedagógico, o qual precisa ser superado para o reconhecimento do espaço educacional como espaço

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A avaliação de sistemas vem da década de 1980, quando o no sistema nacional para a educação básica:

Fonte: http://provabrasil.inep.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=81&Itemid=98

público de educação, com o intuito de enriquecer a construção curricular das escolas.

Silva Junior (1999) aponta a tríade conceitual presente nos sistemas de ensino: Supervisão-Currículo-Avaliação, no sentido de identificar que a atuação da supervisão é indissociada dos estudos sobre currículo no Brasil, pois esta função carrega em sua origem a grande função de guardião do currículo, cabendo a orientação sobre a aplicabilidade do currículo estabelecido, bem como os critérios e procedimentos de avaliação a serem observados. A viabilização do currículo de maneira centralizadora, sem questionar suas origens, era a missão da supervisão e aos professores e escola sua observância.

A partir da década de 1980, com a efervescência do debate educacional, trouxe à tona as discussões sobre uma teoria crítica da escola, do currículo, dos sujeitos envolvidos no campo educacional. As possibilidades de ressignificar o papel da supervisão se consolidam frente às vertentes de avaliação de sistemas, avaliação institucional/escola e avaliação de aprendizagem.

Gestão da Educação e a Função de Supervisão Pedagógica

MEC iniciou estudos sobre avaliação educacional, estimulado, principalmente, pelas agências internacionais. Os acordos assinados entre o Brasil e o Banco Mundial (Bird) tiveram um componente de avaliação educacional, visando verificar a efetividade das ações geradas pelos projetos financiados pelo Banco. No entanto, o MEC e o Banco Mundial tinham posicionamentos diferentes quanto à avaliação, pois o Banco se preocupava com os resultados de projetos específicos e a necessidade do Brasil se reportava por uma qualidade no sistema e não por medidas pontuais, estas nem sempre abarcando necessidades prioritárias, mesmo que pontuais.

Com base neste impasse avançamos para a criação de um sistema nacional de avaliação que foi criado na década de 1990, ainda limitado, sendo somente em 1995 aplicado com metodologia amostral, o Sistema Nacional e Avaliação da Educação Básica (Saeb) é ampliado a toda a federação no período da gestão FHC. Na gestão Lula é implementado a Prova Brasil, em 2005, com metodologia universal, concomitante ao Saeb. Observe o comparativo histórico extraído do site do MEC sobre as duas avaliações presentes

Como indicador de desempenho é criado o Ideb, identificado no site do MEC como Índice de Desenvolvimento

da Educação Básica (Ideb), criado pelo Inep em 2007, este

índice reúne num só indicador dois conceitos: o fluxo

escolar e médias de desempenho nas avaliações. Segundo

informações do MEC, não basta aprovar o aluno sem o alcance

de aprendizagens efetivas, pois o Ideb agrega ao enfoque

pedagógico dos resultados das avaliações em larga escala do Inep a possibilidade de resultados sintéticos, facilmente

assimiláveis, possuindo capacidade de identificar a qualidade

educacional para os sistemas. O indicador é calculado a partir

dos dados sobre a aprovação escolar, obtidos pelo Censo

Escolar e médias de desempenho nas avaliações (Saeb – para as

unidades da federação e a Prova Brasil – para os municípios).

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Prova Brasil Saeb

A prova foi criada em 2005. A primeira aplicação ocorreu em 1990.

Sua primeira edição foi em 2005, e em 2007 houve nova aplicação.

É aplicado de dois em dois anos. A última edição foi em 2005. Em 2007 houve nova prova.

A Prova Brasil avalia as habilidades em Língua Portuguesa (foco em leitura) e Matemática (foco na resolução de problemas)

Alunos fazem prova de Língua Portuguesa (foco em leitura) e Matemática (foco na resolução de problemas)

Avalia apenas estudantes de ensino fundamental, de 4ª e 8ª séries.

Avalia estudantes de 4ª e 8ª séries do ensino fundamental e também estudantes do 3º ano do ensino médio.

A Prova Brasil avalia as escolas públicas localizadas em área urbana.

Avalia alunos da rede pública e da rede privada, de escolas localizadas nas áreas urbana e rural.

A avaliação é quase universal: todos os estudantes das séries avaliadas, de todas as escolas públicas urbanas do Brasil com mais de 20 alunos na série, devem fazer a prova.

A avaliação é amostral, ou seja, apenas parte dos estudantes brasileiros das séries avaliadas participam da prova.

Por ser universal, expande o alcance dos resultados oferecidos pelo Saeb. Como resultado, fornece as médias de desempenho para o Brasil, regiões e unidades da Federação, para cada um dos municípios e escolas participantes.

Por ser amostral, oferece resultados de desempenho apenas parao Brasil, regiões e unidades da Federação.

Aplicação em 2007: 5 a 20 de novembro. Aplicação em 2007: 5 a 20 de novembro.

Parte das escolas que participarem da Prova Brasil ajudará a construir também os resultados do Saeb, por meio de recorte amostral.

Todos os alunos do Saeb e da Prova Brasil farão uma única avaliação.

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Gestão da Educação e a Função de Supervisão Pedagógica

Alguns sistemas estaduais e municipais têm iniciativas quanto a um sistema de avaliação próprio, a exemplo do Saresp em São Paulo e do Proeb em Minas Gerais.

O desafio para os profissionais da educação que atuam localmente é correlacionar os resultados extraídos das avaliações de sistema aos resultados das avaliações locais: avaliação de aprendizagem e avaliação institucional.

A avaliação de aprendizagem é ponto central do processo pedagógico, pois é avaliação não só do aluno, mas do processo, portanto, do trabalho do professor e das condições nas quais o trabalho acontece, portanto não é unilateral, mas omnilateral. A leitura no dinamismo do processo pedagógico, o que potencializa as escolhas, ajusta o foco - a visão.

A visão de processo implica no reconhecimento do alvo. Para Nóvoa (2006), a prioridade da escola, não deve centrar- se no conhecimento (abordagem tradicional) ou no aluno e professor (abordagem escolanovista), mas na aprendizagem. Primar pela aprendizagem, é claro, não exclui os demais sujeitos e componentes, integra-os. Para Nóvoa (2006), uma coisa é dizer que o objetivo está centrado no aluno outra coisa é dizer que está centrado na aprendizagem.

A aprendizagem é o resultado na prestação de contas que os profissionais devem dar. Avaliar é prestar contas do trabalho desenvolvido, buscando efetivar as aprendizagens, numa dinâmica de transparência e de auto-avaliação.

Um processo de avaliação que tenha em vista a democratização das aprendizagens necessita superar uma concepção acrítica da educação, a qual produz um sentimento ilusório, considerando que a escola por si só é capaz de dar conta da democratização pelo simples fato de incluir a classe majoritária, antes alheia ao espaço escolar, ou pelo sentimento de impotência presente na concepção crítico-reprodutivista, a qual considera que a escola cumpre o papel de reforçar e legitimar a marginalidade que é produzida socialmente6.

O processo de superação passa pelo reconhecimento do campo educacional como um campo de luta contra a seletividade, discriminação e rebaixamento do ensino. Uma luta na qual estamos a favor das aprendizagens, para tanto, faz-se necessário uma concepção crítica substantificada numa prática reflexiva – uma práxis pedagógica –, a qual reconhece a contradição e nela batalha para alcançar seus objetivos.

Sendo assim, um processo de avaliação de caráter emancipatório necessita dar conta de suas funções, quais sejam: função diagnóstica, a que identifica o estágio/progresso do aluno para proporcionar meios adequados para o alcance dos objetivos; função pedagógico-didática, busca dar conta dos objetivos previstos na proposta curricular; função de controle, a que traz a superfície níveis de alcance de aprendizagem, por meio de verificações parciais e finais que ocorrem durante o processo e no final. Essas funções, na medida em que visam a aprendizagem, se distanciam da concepção da avaliação

vista tão somente para aprovar ou reprovar, mas devem ser concebidas como um instrumento leitura do processo para encaminhamentos adequados.

A competência técnica se faz necessária para o cumprimento dessas funções, pois seu desempenho ocorre com planejamento e rigor, utilizando-se de instrumentos adequados para cada situação de aprendizagem.

Para Luckesi (2002), a avaliação subsidia decisões a respeito da aprendizagem.Aescola ao centrar na aprendizagem do aluno, utiliza-a para enriquecer o ambiente educacional. A gestão escolar estando submetida e direcionada ao alcance desta aprendizagem, promove o papel da escola com empenho coletivo, mediada por uma avaliação institucional/escolar.

A avaliação institucional/escolar se configura na avaliação do projeto de educação que escola se propõe a desenvolver num trabalho coletivo e participativo, portanto, uma avaliação do alcance das condições e possibilidades que envolvem a prática dos profissionais. O projeto pedagógico como elemento técnico-político traz à tona a intencionalidade dos profissionais.

7 Considerações Finais

A educação como prática social política requer a clareza

desta intencionalidade, portanto, torna-se indispensável sua planificação, pois traz a relevo sua concepção, objetivos, metas, procedimentos e avaliação, bem como os recursos que dispõe para tal manifestação.

O projeto pedagógico da escola é o elemento integrador que necessita contemplar a correlação da avaliação de aprendizagem com a avaliação de sistema mediada pela avaliação institucional/escolar – se configurando numa auto- avaliação da escola.

Há muito a ser alcançado no interior da escola para que a qualidade necessária seja conquistada resultando num projeto de elevação cultural da classe majoritária. Para tanto, faz se necessário uma supervisão instrumentada técnica e politicamente para viabilizar uma prática coletiva.

A gestão educacional em sua função de supervisão pedagógica apresenta potencial como partícipe de um projeto emancipatório para a educação, quanto exerce sua função política comprometida com a elevação cultural dos alunos e professores. Encarar a supervisão como elo de integração no desenvolvimento de um projeto coletivo, implica compreender a responsabilidade deste profissional onde junto com seus pares assume o compromisso pela efetivação das aprendizagens.

Evitar a ingenuidade e romantismo ilusório é ponto de partida, pois as condições concretas de trabalho enfrentadas pelos profissionais da educação ainda são obstáculos que nos deparamos. Um longo caminho precisa ser percorrido. Mas, como qualquer sonho, segundo Paulo Freire (1998), não se faz com palavras desencarnadas, mas com reflexão e prática.

6 Ver Saviani (1985)

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O PAPEL DO PEDAGOGO NO CONTEXTO ESCOLAR

Karina Gomes Rodrigues (FACINTER). [email protected] Edi Marise Barni (FACINTER). [email protected]

Resumo Este trabalho tem como objetivo realizar uma reflexão sobre o papel do pedagogo no contexto escolar. Para fundamentar essa proposta, optou-se pela estratégia metodológica bibliográfica, onde os autores em questão promovem uma abordagem democrática em termos de prática pedagógica na orientação e supervisão escolar. Ao longo da leitura do material notou-se que tanto a orientação pedagógica e a supervisão pedagógica, são fundamentais para o caminhar da escola. Percebe-se que por mais que a discussão sobre esse assunto tem avançado, ainda tem muito a melhorar. Fazer com que a escola cumpra o seu verdadeiro papel não é tão simples assim, depende de um trabalho de parceria entre professores, equipe pedagógica e comunidade em geral. A orientação pedagógica, e a supervisão pedagógica têm um papel preponderante no aspecto de criar subsídios para que a parceria aconteça, no sentido de ter como foco principal o resultado com sucesso do processo de ensino-aprendizagem do aluno. Palavras-chave: Supervisão Escolar. Orientação Escolar. Pedagogo.

THE ROLE OF THE PEDAGOGUE IN THE SCHOOL CONTEXT

Abstract This work has as objective to carry through a reflection on the paper of pedagogo in the pertaining to school context. To base this proposal, it was opted to the bibliographical metodológica strategy, where the authors in question promote pedagogical a democratic boarding in terms of practical in the orientation and pertaining to school supervision. Throughout the reading of the material one noticed that as much the pedagogical orientation and the pedagogical supervision, are basic to walk it of the school. One perceives that no matter how hard the quarrel on this subject has advanced, still it has much to improve. To play with that the school fulfills its true role is not so simple thus, depends on a work of partnership between professors, pedagogical team and community in general. The pedagogical orientation, and the pedagogical supervision has a preponderant paper in the aspect to create subsidies so that the partnership happens, in the direction to have as main focus the result successfully of the process of teach-learning of the pupil. Keywords: School monitoring. School Orientation. Pedagogue.

Introdução A premissa de que a educação é o reflexo daquilo que se encontra ideologicamente

alicerçado em um contexto histórico, pode ser analisada sob a ótica da visão de mundo, assumida na década 80, onde o modelo criado para a gestão industrial e gestão do trabalho, pautado na estratégia de especializar setores e funções, passa a vigorar também no contexto escolar.

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Com base em uma estrutura de pensamento oposta ao referenciado acima, é que se pretende questionar, nesse trabalho, que tem por objeto, o estudo do real papel do pedagogo no ambiente escolar, toda essa divisão de tarefas que não delimitam ao certo, o que se quer, desse profissional, em termos de estrutura pedagógica, bem como demonstrar de que forma pode e deve se dar o trabalho integrado entre a supervisão escolar e a orientação educacional, e entre a supervisão escolar e a orientação pedagógica.

Para fundamentar essa proposta, optou-se pela estratégia metodológica bibliográfica, onde os autores em questão promovem uma abordagem democrática em termos de prática pedagógica.

A Importância do trabalho integrado entre supervisão escolar e orientação educacional Para que se possa compreender como se dá historicamente a presença do pedagogo

em um contexto escolar, é necessário, antes de tudo, verificar alguns conceitos relacionados à supervisão escolar e à orientação educacional. Nesse viés, afirma-se que a mentalidade contemporânea estimula um propósito de mudança da prática pedagógica, numa perspectiva democrática, uma vez que o contexto histórico mostra que, desde o séc. XVIII, o controle e a fiscalização do trabalho do professor, marcaram as ações que caracterizaram o papel do supervisor educacional no Brasil.

Hoje, propõe-se uma prática dinâmica e inter-relacionada, pois: É preciso um Orientador e um Supervisor trabalhando interdisciplinarmente, redimensionando sua prática assumindo uma postura de educadores comprometidos com a formação do indivíduo, com o desenvolvimento e o fortalecimento da vivência das relações democráticas na escola. (FRISON.2000, p.20)

Embora exista essa mentalidade diferenciada nas discussões de cunho educacional, ainda é possível verificar resquícios dessa autoridade, vivenciada no século XVIII, em muitas instituições escolares brasileiras, o que contraria a ideia do autor acima citado. Essa mentalidade fiscalizadora da supervisão educacional, e da orientação educacional se dá no período histórico da industrialização no Brasil. Elas surgem num momento de crise econômica aliada a um regime totalmente autoritário que consequentemente refletia no interior das escolas. Nesse contexto de ideias, é importante salientar que, o trabalho da supervisão escolar foi marcado por três fases, segundo as autoras, Urbanez e Silva, (2008, p.42):

Fiscalizadora: nesta fase, a supervisão confunde-se com a inspeção escolar, visto que sua atuação estava mais preocupada com cumprimento de prazos e leis; Construtiva: O autor usa uma expressão interessante para essa fase: Supervisão orientadora, que dá ideia de preocupação com o trabalho de orientação dos professores, corrigindo as falhas que pudessem apresentar e orientando-os nos procedimentos considerados mais adequados; Criativa: é a fase atual, em que a supervisão se separou definitivamente da inspeção escolar caminhando em direção do aperfeiçoamento das pessoas envolvidas no processo de ensino aprendizagem. As fases explicitadas retratam as lutas pela democratização do ensino, desde o fim do regime militar até os dias de hoje. Nota-se que a educação passa por transformações significativas, sobretudo no papel dos especialistas da educação, que são o retrato do amadurecimento neste campo tão mal desenhado. Da mesma forma ocorreu com a orientação pedagógica, que surgiu da necessidade de organizar o interior da escola, marcada pelo sistema trabalhista, cujo papel era a preparação dos alunos para o mundo do

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trabalho. O orientador tinha como função mestra, desenvolver ou descobrir a vocação profissional do aluno, de modo a colocá-lo no lugar certo [...] com o orientador não foi diferente [...] com a ideia de orientação vocacional [...] sua linha mestra, o aconselhamento, visava direcionar as crianças e jovens ao mundo do trabalho [...]. (URBANEZ e SILVA, 2008, p.43)

O surgimento do supervisor escolar, na realidade das escolas, contribuiu para a divisão do trabalho, onde cada um dos membros responsáveis pela educação e aprendizagem dos alunos, realizava sua tarefa de querer fazer bem o seu papel, mas de forma individualizada.

Neste sentido, a própria concepção de supervisão era autoritária, antidemocrática, de modo que a ação do supervisor era centrada no conteudismo. Dessa forma, o acesso ao conhecimento passou a ser inerte sem o envolvimento com outros especialistas, professores e alunos, necessário à aprendizagem. Diante dessa reflexão, iniciou-se o questionamento da função da escola, de modo que se chegou à conclusão de que, a mesma, não poderia ser um simples veículo de informação, tornando-se um espaço sem sentido, deixando de lado o conhecimento significativo como fator primordial da aprendizagem.

A partir de 1980, começa a mudar o discurso sobre o papel da escola, inclusive dos profissionais da educação e da necessidade da formação e da presença de um pedagogo, seja supervisor ou orientador nas instituições escolares aliado ao professor na tarefa de unir as forças, para enfrentar os desafios que a própria profissão se encarrega de mostrar.

Em relação a essa ideia, nas palavras de Makarenko, (apud Gadotti, 2002. p. 136): Não se pode educar um coletivo, pelo menos um coletivo infantil, se não houver um

coletivo de pedagogos. Não restam dúvidas de que não se poderá fazê-lo se cada um dos pedagogos de uma escola realiza, separadamente, o seu trabalho educativo segundo o seu próprio entendimento e desejo. Portanto, a partir da década de 80 à supervisão educacional vai se transformando, à medida que a figura do supervisor deixa de ser aquele que dita ordens e o outro tem que obedecer. Essa mentalidade vai sendo substituída pela função do supervisor. Essa função supervisora pode ser compreendida como um processo em que um professor, mais experiente e mais informado, orienta outro professor [...]. (ALARCÃO, 2001, p.13).

Com essas novas reflexões, surgem os primeiros sinais da importância do trabalho integrado de todos os profissionais da educação, principalmente do supervisor e orientador educacional. Atualmente é travada uma luta de superação das tarefas atribuídas ao orientador educacional, o qual deve atender aos alunos e os supervisores atenderem aos professores. O trabalho fragmentado, próprio do período tecnicista foi denunciado por diversos estudos e pesquisas realizado neste campo do saber. Assim sendo, o que se busca é o pedagogo e não mais o supervisor ou orientador isoladamente. (URBANEZ E SILVA, 2OO8, p.62)

Dessa forma, integram-se as duas funções, seja ela do supervisor ou do orientador educacional, comprometidos com o trabalho coletivo e fazendo uso da democratização do conhecimento em parceria com a direção, professores, alunos e comunidade, de modo a buscar sempre, o trabalho em equipe. Nesse sentido, o supervisor é um educador e, se ele é um educador, ele não escapa a sua prática a esta natureza epistemológica da educação. (FREIRE, 1982, p.95).

O supervisor educacional, assim como o orientador, tem formação de um educador, e lhes é atribuído trabalhar esse aspecto, cujo relacionamento deve ser de amparo, de aproximação com os professores em momentos de crise, colocando-se no lugar do outro, de

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forma a conquistar a confiança da equipe docente. Tudo isso, tendo em vista um relacionamento humano autêntico, de modo a analisar os pontos positivos e negativos da questão. Além disso, comprometer-se com o planejamento do Projeto Político Pedagógico da escola, instrumento essencial, que favorece a integração entre supervisor e orientador. O sucesso de uma escola comprometida com a aprendizagem dos alunos, só é possível com a integração efetiva desses profissionais na busca de um ensino integral e de qualidade.

Pedagogo: uma dimensão histórica Tendo em vista a análise anterior, pode-se dar continuidade com as reflexões a

respeito da função do pedagogo, profissional da educação, que nas escolas do Brasil, surge na década de 1930. Os primeiros pedagogos, em nosso país, iniciam as atividades, como técnicos em educação. A partir da década de 60, as escolas expandem-se. Vivencia-se nesse contexto, um momento onde o capitalismo rege a sociedade e, em prol da dominação econômica e demanda do capital, é necessário que as escolas, juntamente com seus pedagogos técnicos, contribuam com a reprodução das relações sociais. Diretamente falando, que cada cidadão, mantenha-se na mesma classe social.

Surge, então, a fragmentação do trabalho com os modelos taylorista/fordista que estabeleceram como princípios ideológicos: a produtividade, a eficiência, a eficácia e o controle. Esse método de trabalho acabou influenciando a organização dos procedimentos pedagógicos dentro das escolas. Isso significa afirmar que, a ideia de escola passa a ser a de um ambiente que prioriza o âmbito administrativo em detrimento do âmbito pedagógico.

Para atender a demanda, ou seja, para garantir a nova ideologia vigente nesse novo contexto escolar, o Conselho Federal de Educação, por meio do Parecer 252/69, reformula o curso de Pedagogia e estabelece regras e normas para que este habilite seus alunos, ao final de seu curso, com a formação de: administrador escolar, supervisor escolar e orientador educacional. A função desses profissionais era atender o que o capitalismo exigia: reproduzir e manter as relações sociais. Essa mentalidade reforça o seguinte pensamento: engana-se quem considera começar, dentro da escola, o processo educativo. Ele está idealizado para além dos muros da própria escola. Nos anos 60, os índices de evasão escolar e repetência foram altos. São apresentados por intelectuais capitalistas às escolas como situações que impedem o desenvolvimento econômico do Brasil, e defendem a implantação da tecnologia educacional para que estes sejam resolvidos. Nesse contexto, A educação passa a ser vista como investimento individual e social, em decorrência do que deve vincular-se aos planos globais de desenvolvimento.

A expectativa de que a educação atenda às necessidades econômicas, políticas e sociais conduz inicialmente à avaliação dessas mesmas necessidades, o controle da execução dos projetos e a posterior verificação do grau de atingimento dos objetivos propostos. (KUENZER & MACHADO, 1982, p.34).

A educação passa a ter um cunho econômico pela qualificação da mão-de-obra, pela redistribuição de renda, pela maximização da produção e ao mesmo tempo, pelo desenvolvimento da consciência política indispensável ao Estado autoritário. (KUENZER E MACHADO, 1982, p.34).

Por isso, é fundamental reproduzir e manter as relações sociais. Desse modo, Saviani (2004, p. 20) reafirma que: [...] o problema de encaminhamento que se deu à questão do curso de pedagogia reside numa concepção que subordina a educação à lógica do mercado.

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Assim, a formação ministrada nas escolas deveria servir à produtividade social, ajustando-se, o mais completamente possível, às demandas do mercado de trabalho que, por sua vez, são determinadas pelas leis que regem uma sociedade de mercado como esta em que vivemos.

A partir de 1990, a globalização da economia, a nova relação entre Estado e sociedade e a reestruturação das formas de produção irão provocar mudanças significativas nas relações no mundo do trabalho e, como consequência, as demandas impostas pelo capitalismo antes dos anos 90 para com a educação também serão alteradas radicalmente, Na dimensão de compromisso político com a qualidade da vida social e produtiva. Ao mesmo tempo, exigem-se novos comportamentos, em decorrência dos novos processos de organização e gestão do trabalho, onde as práticas individuais são substituídas por procedimentos cada vez mais coletivos, onde compartilham responsabilidades, informações, conhecimentos e formas de controle, agora internas ao trabalhador e ao seu grupo. (KUENZER, 1999, p.30)

Analisando todas essas mudanças ideológicas e a influência dessas mudanças no âmbito educacional, cabe, a todos os profissionais dessa área, promover uma educação que ajude os alunos a solucionar os desafios do mundo contemporâneo.

A importância do trabalho pedagógico integrado entre supervisão e orientação pedagógica Torna-se pertinente caracterizar qual a saída, para que se possa representar a crítica

diante de todas essas mudanças de cunho pragmático no aspecto educacional. Tal saída pode estar vinculada ao trabalho integrado, entre supervisão e orientação educacional. Essa mentalidade é necessária, pelo simples fato de que todos, dentro de uma escola, possuem um objetivo comum: a aprendizagem do aluno. Porém, para que essa integração seja efetivada, é necessário romper com algumas práticas existentes no âmbito escolar, pois, muitos ainda não têm clareza, a respeito do que vem a ser realmente a função do pedagogo na escola. Vê-se nas escolas, como .função do pedagogo.: correr atrás de aluno que não quer assistir aula, atender alunos que se machucam, que brigam, que vem sem uniforme, que desacatam professores e funcionários, atender turmas em que o professor não consegue conter a indisciplina, que não dá os conteúdos previstos, enfim, são inúmeras as situações do dia-a-dia na escola que impedem a efetivação e integração do trabalho de supervisão e orientação pedagógica.

Diante do exposto, muitas escolas, acabam optando pela fragmentação dos trabalhos, pois, o que é essencial ao trabalho de um pedagogo, acaba ficando de lado novamente. É preciso examinar se nossa atuação, enquanto profissionais da educação, articula-se com todos os envolvidos no processo pedagógico, havendo uma multidimensão de seu papel: social, política, cultural, mas não numa plurifunção. (FANK, 2006, p. 3).

Nesse caso, o papel do pedagogo, entre muitos exemplos, é o de despertar a mestria em seus professores. Nesse sentido, de acordo com Makarenko (apud Gadotti 2002, p.137), é necessário não só dar instrução aos professores, mas também educá-los. Em que sentido educar um professor? No sentido de mostrar-lhe o que a academia não ensina, como o fato de sorrir para os alunos, de sentar-se, de falar, de olhar, de erguer a tonalidade da voz etc. Isso para iniciar pelo mínimo. Esse é o motivo que diferencia um mestre de um professor, uma escola de um produto do capital. É função do pedagogo, nortear novos caminhos para a educação, a aprendizagem, o interesse, a motivação do aluno, a construção

de uma nova escola que busque humanizar o que foi e continua sendo barbaramente,

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desumanizado pelo capital: a relação entre os seres humanos. (CARVALHO, 2007, p.12). É preciso romper com a visão estagnada que se tem do pedagogo. Esse profissional da educação precisa entender-se e compreender-se como agente transformador da sociedade. Nesta discussão não podemos deixar de afirmar que não podem existir mais nas escolas, trabalhos isolados, mas sim o trabalho de parceria e com o olhar para a coletividade é fundamental. Perrenoud (2000) afirma a necessidade de dez competências essências para o andamento da escola com sucesso, são elas: organizar e dirigir situações de aprendizagem, administrar a progressão das aprendizagens, conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação, envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho, trabalhar em equipe, participar da administração da escola, informar e envolver os pais, utilizar novas tecnologias, enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão e administrar sua própria formação contínua. Não vamos entrar em cada item desses, pois iríamos longe, mas iremos nos ater a importância do supervisor e orientador pedagógico, fundamentar seu trabalho em bases solícitas e com pressupostos teóricos/práticos na ação do dia a dia da escola.

O olhar para a totalidade da escola, no sentido de buscar um resultado que satisfaça as diretrizes e bases da educação no que é pertinente. É necessário que os papéis executados pelo supervisor e orientador pedagógico, estejam em consonância com os demais profissionais da escola, e respeitando as leis que regem esse contexto.

Considerações finais O pedagogo ainda nos dias de hoje continua tendo sua função desvirtuada devido à

fragmentação das funções dentro do contexto escolar. Esse resgate deve ser feito para que o pedagogo possa exercer sua função, segundo os preceitos que norteiam sua qualificação dentro de uma gestão democrática, social e igualitária. Para tanto, vale ressaltar, que se não houver uma linguagem única no ambiente escolar, onde os professores também tenham ciência de que o papel do pedagogo, dentro desse contexto, não é o de apagar incêndio, esse profissional continuará acumulando para si, atividades que não lhe cabem. Por isso, a ideia de que é necessário educar os professores, não pode ficar a esmo, pois o comodismo dos mesmos em querer delegar tudo para aqueles que estão na função de organizadores do processo pedagógico, é mais forte do que a própria vontade de eles mesmos encontrarem soluções para as questões adversas.

É necessário um trabalho de parceria entre todos da escola, que tenham um projeto político pedagógico bem definido e construído e reavaliado por todos. A escola é de todos, para todos. REFERÊNCIAS ALARCÃO. Isabel. Do olhar supervisão ao olhar sobre a Supervisão. In: Rangel Mary (ORG). Supervisão Pedagógica: princípios e práticas. Campinas, SP: Papiros, 2001. BÜHM, Winfred. A história da pedagogia: de Platão à atualidade. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010. CARVALHO, M.F. de Os entraves na atuação das/os Pedagogo/as. Edição Pedagógica, 2007. APP-Sindicato FANK, E. O papel do pedagogo no contexto das políticas educacionais e do cotidiano escolar: para além do bombeiro, o cientista da educação. 2006 (mimeografado)

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FREIRE, Paulo. Educação: Sonho Possível. In: BRANDÃO, Carlos Rodrigues (org.) O educador vida e morte, 2ª edição. Rio de Janeiro: Graal, 1982. FRISON, Lourdes Maria Bragagnolo. A perspectiva do especialista em educação: um olhar sobre a Orientação Educacional: avanços e possibilidades. In. Seminário Interdisciplinar em Supervisão Escolar e Orientação Educacional. Santa Cruz do Sul: UNISC, SET. DEZ, 2000 in: Atuação do Orientador Educacional na Construção de uma escola democrática. Disponível em: HTTP://www1.fapa.com.br. Acesso em 10/12/2009. GADOTTI, Moacir. História das ideias pedagógicas. São Paulo: Ática, 2002. KUENZER, A.Z. Ensino Médio: construindo uma proposta para quem vive do trabalho. São Paulo: Cortez Editora, 2000. KUENZER, A.Z. Trabalho Pedagógico: da fragmentação à unitariedade possível ou da taylorização à toyotização do trabalho pedagógico: a unitariedade possível. 1999. UFPR MACHADO, L.R. Educação e divisão social do trabalho: contribuição para o estudo do ensino técnico industrial brasileiro. São Paulo: Cortez; Campinas: Autores Associados, 1982. MANTOAN, Maria Teresa Eglér. Inclusão Escolar: O que é? Por quê? Como Fazer? São Paulo: Moderna, 2003. PERRENOUD, Philippe. Dez novas competências para ensinar. Tradução: Patrícia Chittoni Ramos. Porto Alegre, 2000. SAVIANI, D. O espaço acadêmico da pedagogia no Brasil. São Paulo, 2004. URBANETZ, Terezinha Sandra. SILVA, Simone Z. Orientação Supervisão Escolar Caminhos e Perspectivas. Curitiba: IBPEX, 2008. VASCONCELLOS, Celso dos S. Coordenação do Trabalho Pedagógico do projeto político ao cotidiano da escola. 10ª edição. Editora Libertat, 2009.

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CONSELHO DE CLASSE: ESPAÇO DE ANÁLISE, REFLEXÃO E AVALIAÇÃO DO

TRABALHO PEDAGÓGICO

Marta Betanes da Silva1

Resumo

O eixo reflexivo deste artigo é o Conselho de Classe enquanto espaço legitimador de

discussão e avaliação do aproveitamento dos alunos e da turma como um todo. Enquanto

órgão colegiado presente na organização da escola, tem função de buscar alternativas para a

superação dos problemas de aprendizagem apresentados pelos alunos, porém não tem dado

conta de modificar, bimestre após bimestre, o resultado de fracasso. Assim sendo, o artigo

apresenta uma análise do Conselho de Classe de uma escola pública do município de

Jaguapitã, Paraná, faz uma reflexão sobre qual a concepção de Conselho de Classe que

permeia o pensamento dos professores, pedagogos e alunos da escola pesquisada, como se

dá o processo de intervenção e quais os resultados alcançados após cada Conselho.

Palavras-chave: Conselho de Classe. Avaliação. Intervenção. Aprovação.

Abstract

The axis of this article is reflective of the Council as an area legitimized in class

discussion and evaluation of the use of students and class as a whole. As acollegiate body in

the organization of school function, he has to seek alternatives to overcome the problems

presented by students of learning, but has not given account to modify term after term

result of the failure. Therefore, the article presents an analysis of the class of a public school

in the municipality of Jaguapitã, Parana, which is a reflection on the design of board of class

that permeates the thinking of teachers, educators and students of the school investigated,

as gives the process of intervention and what the results after each council.

Keywords: Class Council. Assessment. Intervention. Approval.

Introdução

O Conselho de Classe é um órgão colegiado de gestão. Dentro da organização do

trabalho pedagógico se configura como espaço que possibilita a análise do desempenho do

aluno e do desempenho da própria escola de forma coletiva propondo ações e intervenções

para a melhoria da aprendizagem do aluno e da prática docente. Entretanto essa não tem

sido a prática da maioria das escolas, que veem no Conselho de Classe um momento apenas

de aprovação e reprovação, considerando, muitas vezes, práticas fragmentárias do trabalho

pedagógico. Durante o momento da discussão muitas são as análises feitas sobre as turmas

1 Especialista em Administração, Supervisão e Orientação Educacional. E-mail

[email protected]

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e sobre o desempenho acadêmico dos alunos. São formuladas propostas para a superação

dos problemas de aprendizagem, buscam-se soluções alternativas para as dificuldades que

aparecem, realimenta-se o planejamento, porém no próximo Conselho de Classe,

novamente, os mesmos alunos apresentam os mesmos problemas como se os indicadores

de resultado do Conselho anterior e suas decisões não tivessem subsidiado a condução do

planejamento.

No último Conselho de Classe cabe ao colegiado dar o veredicto: aprovado, aprovado

por Conselho de Classe, reprovado pelo Conselho de Classe. Esta prática está sedimentada

em muitas escolas da rede pública de ensino. Este artigo propõe uma reflexão sobre o

Conselho de Classe, seu conceito, objetivo, sua organização e seu caráter avaliativo voltado

para o redimensionamento da ação pedagógica e a pouca interferência destas ações na

recuperação da aprendizagem do aluno, a fim de contribuir para que o resultado alcançado

seja outro. A ideia do estudo deste tema surgiu da necessidade de compreender por que os

Conselhos de Classe realizados bimestralmente não alteram os resultados finais dos alunos.

O locus da pesquisa se deteve na Escola Estadual Dr. Waldemiro Pedroso – Ensino

Fundamental, do município de Jaguapitã – Paraná, no período de 2006 a 2008. Para a

obtenção dos dados foram utilizadas entrevistas com professores, pedagogos e alunos e

feita a análise da Ficha de Acompanhamento Bimestral, preenchida pelos professores da

escola juntamente com o pedagogo. A pesquisa privilegiou técnicas qualitativas porque

parte do pressuposto de procurar a explicação para os resultados finais da escola, a partir do

alto índice de aluno reprovado ou aprovado por Conselho de Classe.

A literatura relativa ao Conselho de Classe é escassa. Dentre os muitos temas que

ocupam a atenção dos nossos teóricos educacionais, o Conselho de Classe não tem ocupado

lugar de destaque, porém o material escrito sobre o mesmo foi de suma importância para

compreender a organização desta instância colegiada e o seu funcionamento. Uma vez que o

Conselho de Classe tem uma função importante no processo avaliativo do aluno e que sua

prática não tem alterado os resultados no final do ano letivo, fez-se necessário buscar

informações para, assim, fundamentar o estudo. À luz da teoria foi possível analisar o

Conselho de Classe, sua importância para o processo de aprendizagem e as implicações para

a vida do aluno, quando as propostas de intervenção não dão conta do resultado levando o

mesmo à reprovação e ao fracasso escolar. Se o Conselho é um espaço democrático de

avaliação coletiva, questionamos: como garantir que esse mesmo espaço promova

resultados concretos e garanta a aprendizagem do aluno? O problema estaria nas

avaliações? A escola adota um modelo de avaliação no Projeto Político Pedagógico e os

professores na sua maioria praticam outro? O problema estaria nas intervenções?

Professores e pedagogos definem ações para a superação dos problemas de

aprendizagem, registram em ata e, após o Conselho não aplicam as mudanças

metodológicas e caem na rotina didática? Ou o professor assume com responsabilidade as

intervenções e não encontra público interessado em aprender? É claro que estas são

algumas das hipóteses.

Poderíamos enumerar outras.

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Diante de um quadro em que, a escola, espaço que deveria promover a ascensão

social pelo conhecimento, tem sido uma instituição que está favorecendo a exclusão, não

por conta de sua organização, mas por conta de sua prática, urge aproximar os objetivos do

Conselho de Classe, os resultados obtidos, e, buscar as causas desta situação de descrédito

deste órgão colegiado, propondo ações pautadas na responsabilidade de todos.

O que é o Conselho de Classe?

Embora o Conselho de Classe tenha surgido na França (Rocha, 1984) e sua

implantação no Brasil, inicialmente tenha sido voluntária e depois determinada por portarias

e deliberações a fim de avaliar o resultado do aluno de forma coletiva, ainda hoje esse

Conselho, embora teoricamente deva servir a este propósito, o que se observa é outra

perspectiva. Os Conselhos de Classe têm-se constituído em espaço legitimador da exclusão

dos alunos das classes populares da escola. Isso pode ser observado quando se analisa o

resultado final e observa-se o grande número de alunos de uma mesma série que foram

retidos e se não foram, garantiram a aprovação por este mesmo Conselho. Mas afinal o que

é Conselho de Classe? Iniciemos pela conceituação. Rocha (1984) assim conceitua:

O Conselho de Classe é uma reunião dos professores da turma com

múltiplos objetivos, entre outros destacamos: avaliar o

aproveitamento dos alunos e da turma como um todo; chegar a um

conhecimento mais profundo do aluno e promover a integração dos

professores e de outros elementos da equipe da escola. (ROCHA,

1984, p. 9)

Neste primeiro conceito já se observa a forma conjunta e colaborativa dos

integrantes da escola nesse espaço avaliativo que é o Conselho de Classe. O magistério

talvez seja a profissão que mais reúna, num mesmo grupo, diferentes personalidades vindas

das mais variadas classes sociais para adquirir conhecimentos transmitidos por alguns

profissionais do ramo. Por isso o atendimento individual muitas vezes se perde. É nesse

aspecto que o Conselho de Classe ganha importância porque reúne informações que muitas

vezes passam despercebidas por alguns e que são fundamentais para o entendimento da

situação escolar do educando. Sant’ Anna (1995) define Conselho:

É uma atividade que reúne um grupo de professores da mesma série

visando em conjunto chegar a um conhecimento mais sistemático da

turma, bem como acompanhar e avaliar cada aluno individualmente,

através de reuniões periódicas. (SANT’ANNA, 1995, p. 88)

As reuniões do Conselho de Classe devem ser entendidas como fonte de

informações, como acréscimo de conhecimentos que auxiliarão o educador na compreensão

do processo de aprendizagem. Cruz (1995) vai um pouco mais além. Aproxima o conceito de

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conselho ao conceito de avaliação. Assim, o conselho de classe: É o momento de uma

avaliação diagnóstica da ação pedagógica – educativa feito pelos professores e alunos (em

momentos distintos, às vezes) à luz do Marco Operativo da Escola. (CRUZ, 1995, p. 117) O

conceito apresentado por Cruz traduz dois momentos importantes. O primeiro é que o

Conselho de Classe é um momento de avaliar diagnosticamente o trabalho coletivo a partir

de um referencial e em determinado tempo. O segundo é que ele deve subsidiar as ações e

o Projeto Político Pedagógico, onde no marco operativo estão descritos os objetivos que se

pretende alcançar. Portanto é uma reflexão conjunta da ação pedagógica na vida da escola.

Dalben (2004), estudiosa do assunto, com o maior referencial teórico assim

conceitua:

O Conselho de Classe é um órgão colegiado, presente na organização escolar, em que

vários professores das diversas disciplinas, juntamente com os coordenadores pedagógicos,

ou mesmo os supervisores e orientadores educacionais, reúnem-se para refletir e avaliar o

desempenho pedagógico dos alunos das diversas turmas, séries ou ciclos. (p. 31)

Vasconcellos (1994, p. 72-3) afirma que os Conselhos de Classe podem ser importantes

estratégias na busca de alternativas para a superação dos problemas pedagógicos,

comunitários e administrativos da escola. São organizados através de reuniões durante o

ano onde devem participar professores, pedagogos, direção, alunos ou seus representantes,

auxiliares de disciplina e pais, a fim de ter uma visão de conjunto e o seu enfoque principal

deve ser o processo educativo. Nessa reunião devem ser apontadas as necessidades de

mudança em todos os aspectos da escola, devem ser tomadas providências, registradas e

avaliadas no Conselho seguinte. Libâneo(2004) também define Conselho de Classe:

O conselho de classe é um órgão colegiado composto pelos professores da classe, por

representantes dos alunos e em alguns casos, dos pais. É a instância que permite

acompanhamento dos alunos, visando a um conhecimento mais minucioso da turma e de

cada um e análise do desempenho do professor com base nos resultados alcançados. Tem a

responsabilidade de formular propostas referentes à ação educativa, facilitar e ampliar as

relações mútuas entre os professores, pais e alunos, e incentivar projetos de investigação.

(p. 303) Libâneo, como os demais, conceitua o Conselho atentando para a responsabilidade

que este órgão colegiado tem de formular propostas com base educativa que garantam uma

relação cordial entre professores, alunos e pais.

Conselho de Classe e Avaliação

Embora haja uma escassa bibliografia sobre a importância dos Conselhos de Classe

nas unidades escolares, muitos dos conceitos citados pertencem especificamente a

literatura sobre avaliação do trabalho pedagógico. Através de uma leitura mais reflexiva

sobre o Conselho de Classe observa-se que ele é importante considerando a amplitude de

sua ação que é avaliar. Avaliar o aluno, avaliar o professor, avaliar a escola como um todo.

Sendo assim é muito pertinente o conceito de conselho apontado por Cruz (1995): avaliação

diagnóstica da própria avaliação praticada na sala de aula, em suas diversas representações.

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Então os Conselhos de Classe representam uma instância privilegiada e oferecem a

oportunidade de discutir e avaliar o trabalho de toda a equipe escolar e a situação do aluno

naquele momento. Ao conceituar o Conselho de Classe há uma defesa pontual da avaliação.

Nessa perspectiva, essa avaliação conjunta dos professores remete a uma prática de

trabalho coletivo norteada por uma proposta comum. Essa proposta comum está

intrinsecamente ligada à avaliação e sua concepção no interior da proposta pedagógica

curricular de cada disciplina definida pelo grupo de professores. A concretização de um

projeto de avaliação baseado na análise do desempenho a fim de garantir que os objetivos

sejam alcançados, deve ser comungada por todos os profissionais que trabalham na unidade

escolar. As reuniões de Conselho de Classe parecem ser um dos poucos espaços em que as

diferentes visões de ensino e de mundo se encontram, porém nesse momento do cotidiano

escolar, estas visões diferentes não têm encontrado espaço para se confrontarem e deste

confronto emergir uma proposta articulada de trabalho, aproximando a avaliação que se

pratica no interior de sala de aula à avaliação discutida no Conselho de Classe. E, se o

processo não é feito com responsabilidade profissional de todos, como garantir que o

resultado seja eficiente?

Paro (2001, p. 39) acredita neste princípio: Em educação, é pela realização de um

bom processo que se podem aumentar as probabilidades de realização de um bom produto;

daí a importância da constante e adequada avaliação desse processo. O tipo de avaliação

que se pratica na escola deve ser assumido com responsabilidade a partir dos princípios da

justiça e da igualdade, pois é no interior do processo que se realiza a formação humana de

cujo êxito depende o futuro do indivíduo e também o da sociedade.

Conselho de Classe como órgão de integração

O termo “Órgão Colegiado” é citado por mais de um autor. Compreende que não é

formado somente pelo diretor, pelo contrário, é constituído por todos os professores da

turma, por pedagogos, diretor e em alguns lugares por pais, alunos ou representantes de

alunos. A representatividade desta forma é conjunta e coletiva. A todos é dado o direito de

participação. Cada um pode e deve contribuir na análise, discussão, reflexão e avaliação dos

resultados da sala de aula em relação ao desempenho do aluno, do desempenho do

professor e da escola. O trabalho coletivo deve fazer parte desse momento, pois o seu

resultado será melhor quanto maior for a integração entre os seus membros. A participação

efetiva de professores, pedagogos e direção permite que se desenvolva um processo

educativo de reflexão e discussão coletiva sobre a prática de toda escola possibilitando uma

visão de conjunto e como se dá a construção do projeto pedagógico abordado por Cruz

(1995). Embora nesse coletivo nem sempre o aluno se faz presente. No entanto, é dele e

sobre ele que será falado. Ele é a figura central, presente por meio dos resultados positivos

ou negativos. Rocha (1984 p. 28) afirma que:

O grande potencial educativo do Conselho de Classe está no fato de constituir,

dentro do processo educacional, o principal instrumento a ser utilizado para atingir uma

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maior participação dos professores. Este aspecto de integração é essencial, pois é no

Conselho que os professores de ensino fundamental e médio encontram seus pares e

discutem problemas pertinentes ao trabalho de sala de aula. Esta participação dos

envolvidos no processo educativo é importante por razões didáticas e por realização pessoal.

Conselho de Classe e sua organização

O Conselho de Classe é um órgão deliberativo e configura por ser um espaço de

análise e de tomada de decisões sobre o trabalho pedagógico. E tendo esta característica,

Dalben (2004), enumera algumas preocupações que devem estar presentes organização do

conselho: é órgão deliberativo sobre: a) objetivos de ensino a serem alcançados; b) uso de

metodologias e estratégias de ensino; c) critérios de seleção de conteúdos curriculares; d)

projetos coletivos de ensino e atividades; e) formas, critérios e instrumentos de avaliação

utilizados para o conhecimento do aluno; f) formas de acompanhamento dos alunos em seu

percurso nos ciclos; g) critérios para apreciação dos alunos ao final dos ciclos; h) elaboração

de fichas de registro do desempenho do aluno para o acompanhamento no decorrer dos

ciclos e para informação aos pais; i) formas de relacionamento com a família; j) propostas

curriculares alternativas para os alunos com dificuldades específicas; l) adaptações

curriculares para alunos portadores de necessidades educativas especiais; m) propostas de

organização dos estudos complementares. (p. 33)

O Conselho de Classe deve primar pela autenticidade na busca do melhor resultado

para o aluno em questão. As informações passadas nas reuniões devem ser estudadas,

pesquisadas e avaliadas antes de qualquer tomada de decisão. E todo processo adotado

deve ter continuidade e ser objeto de análise. Através da relação das deliberações citadas

por Dalben (2004) realmente constata-se que este órgão é um espaço prioritário de

discussão pedagógica que na verdade não termina no mesmo dia, nem começa no mesmo

dia, requer um acompanhamento anterior e um atendimento posterior onde o professor,

em conjunto com o pedagogo, realimenta o planejamento , seleciona o conteúdo e prepara

uma metodologia capaz de estimular o desenvolvimento intelectual do aluno. O trabalho

pedagógico exige justamente isso: diagnóstico da realidade da aprendizagem, planejamento,

ação, avaliação, replanejamento continuamente. A atividade pedagógica é uma roda viva.

Exige do profissional uma ação dinâmica sobre a aprendizagem do aluno, a fim de superar as

distâncias entre a cultura do aluno e o conhecimento. (...) os processos de avaliação/reflexão

da prática apoiam-se na inter-relação permanente entre professor-aluno-conhecimento,

denominada aqui de interestruturação. A finalidade do processo de avaliação é realizar uma

investigação contínua da realidade para melhor conhecê-la e entendê-la cabendo aos

educadores o papel de captar essa totalidade de relações, coletando dados e informações

sobre o desenvolvimento dos alunos e cuidadosamente, registrando suas necessidades e

possibilidades. (DALBEN, 2004, p. 72)

Pode-se observar que não é de uma prática burocrática que Dalben está se referindo.

Esta também existe na escola quando as ações dos profissionais são desvinculadas da sua

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responsabilidade docente. É de uma prática que busque nos resultados dos dados

investigativos um investimento pedagógico que altere os encaminhamentos didáticos para

mudar este referencial diagnosticado. Desta forma, no dia do Conselho, com base nos dados

desta análise anterior e com o seu grupo coletivo fazem a avaliação do desempenho do seu

aluno, turma, propõe encaminhamentos comuns, individuais, realimentam o planejamento,

não de forma fragmentada, isolada, distante do pedagógico, como se o tempo que parasse

para pensar no seu aluno fosse tempo perdido. Mas, ao contrário, veem nessa prática o seu

caráter pedagógico ligado ao ato de ensinar e ao ato de aprender. A reflexão que se faz é

que se o Conselho de Classe, na sua organização conta com um arsenal de funções tão

amplo, então porque não dá conta de mudar os resultados?

Seria a prática do Conselho uma prática mecânica onde as discussões são superficiais

e as propostas de solução são apenas clichês para serem registrados em atas a fim de

atender exigências burocráticas, com pouca consequência prática no sentido de melhorar o

ensino ofertado? Repensar o sentido que o Conselho de Classe assumiu no processo escolar,

constitui caminho para análise e possível redirecionamento do projeto pedagógico da escola.

Assim, o repensar crítico sobre o Conselho deve estar relacionado ao próprio projeto

educacional. Isso implica em um posicionamento político. Nesse sentido, o movimento a ser

considerado são as implicações que o Conselho de Classe traz para o processo de

aprendizagem, tanto a teoria que vem informando os educadores como a legislação que

normatiza este órgão. A reflexão do professor, do pedagogo e do gestor sobre o seu próprio

trabalho será o melhor instrumento de aprendizagem e é essa nova atitude desses

profissionais da educação que trará um novo significado às práticas do Conselho de Classe.

Na verdade o Conselho de Classe é uma oportunidade ímpar que possuem os

envolvidos com a aprendizagem, pois além da liberdade que cada um tem de expor suas

impressões, ainda são encorajados pelos pares que ao longo da discussão vão apresentando

argumentos para a soma do resultado ou a busca do melhor caminho. Só o que não pode

faltar em cada membro desse Conselho é o comprometimento com a causa e a justiça na

tomada de decisão.

A escola em estudo

A escola em estudo pertence à rede pública estadual. No início de 2008, data de

início da pesquisa a escola contava com 897 alunos matriculados sendo 412 do período

matutino, 357 do período vespertino e 128 são alunos matriculados no noturno numa faixa

etária que varia entre dez e dezesseis anos distribuídos nos três turnos. Por ser essa a única

escola pública que atende a 2ª etapa do ensino fundamental 5ª a 8ª série, ela abrange todas

as classes sociais do município e dentro de suas limitações, enfrenta um conjunto de

dificuldades relacionais e de aquisição de conhecimentos.

A escola está organizada da seguinte maneira: conselho escolar; direção e direção

auxiliar; professores e alunos; conselho de classe e equipe pedagógica; secretaria, auxiliar

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administrativo, biblioteca e serviços gerais; Associação de Pais, Mestres e Funcionários

(APMF).

Para distribuir esses alunos nas turmas em primeiro lugar consideram-se a idade,

depois a repetência e as multirrepetências, ficando numa mesma sala alunos egressos da

turma anterior e alunos repetentes considerando a mesma porcentagem de meninos e

meninas, salvo casos específicos conforme análise da equipe pedagógica ou solicitação do

corpo docente em Conselho de Classe.

A distribuição de aulas segue classificação conforme Resolução Estadual da Secretaria

de Estado da Educação. Para atender a parte pedagógica há na escola uma demanda de cem

horas divididas entre três professoras pedagogas; duas que atuam no período da manhã e

da tarde e uma que atende o período noturno. O corpo docente da escola em 2008 é

formado por 21 professores efetivos e 13 professores contratados pelo processe seletivo

simplificado. Há uma diretora e uma diretora auxiliar.

O planejamento executado pela escola é semestral, porém é realimentado após cada

Conselho de Classe considerando as intervenções propostas pelos professores durante o

Conselho. Para o planejamento das aulas, estudo, leitura, o professor tem hora atividade e

nesse momento ele planeja, estuda, e desenvolve suas aulas partindo do plano semestral. As

metodologias aplicadas nem sempre conseguem atingir a maioria dos alunos e envolvê-los

nas atividades propostas e isso leva o professor à busca de métodos diferenciados na

tentativa de despertar o interesse e a participação dos alunos, ainda que de forma individual

em cada disciplina, muitas vezes sem clareza de uma linha teórica que a fundamente. Os

conteúdos são distribuídos por disciplina, obedecendo ao disposto das Diretrizes

Curriculares organizados de maneira sequencial, dando maior ênfase na assimilação de

conteúdos.

O sistema de avaliação proposto é de um processo diagnóstico semestral, onde o

professor avalia 8,0 pontos através de instrumentos diversos de avaliação e os outros 2,0

pontos são atribuídos pelo Conselho de Classe, através da análise de uma ficha de

acompanhamento bimestral que avalia o desenvolvimento intelectual, a organização pessoal

e o relacionamento do aluno. A definição dos 2,0 pontos é feita apenas no final de cada

semestre.

A escola sendo a maior fonte de cultura do município é pouco valorizada pela

sociedade em geral a começar da própria família. A falta de conscientização de muitos pais

na educação dos filhos, o desemprego e a passividade do cidadão na exigência de seus

direitos e cumprimento dos seus deveres são dados observados constantemente nos

atendimentos feitos pela direção e pelas pedagogas. Através do acompanhamento mensal

da frequência feita pelas pedagogas e pelo comunicado aos pais, observa-se a necessidade

de constantemente a escola ter de recorrer ao Conselho Tutelar para que interceda junto à

família a fim de garantir o direito do aluno a frequência e o aproveitamento escolar. Mesmo

assim é uma ação mais coercitiva do que educativa e seu resultado é mínimo diante dos

resultados de repetência e evasão.

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Os dados estatísticos

As estatísticas do ano de 2005 e 2006 evidenciam um resultado preocupante. Em

2005 observe que de 109 alunos matriculados nas 5ª séries do período da manhã, 63 alunos

foram aprovados, 18 alunos foram aprovados pelo Conselho de Classe e 22 alunos

reprovados. As 5ª séries do período da tarde no ano de 2005 tiveram o seguinte resultado:

150 alunos matriculados, 58 alunos aprovados, 31 aprovados por Conselho de Classe e 43

reprovados. À noite a situação foi um pouco pior. Dos 31 alunos matriculados, 22

abandonaram a escola, 1 aluno foi aprovado por mérito próprio, 3 alunos aprovados por

conselho de classe e 5 reprovados.

Veja o desempenho das 6ª séries no ano de 2005. No período matutino 107 alunos

matriculados, 56 alunos aprovados, 16 aprovados por Conselho de Classe e 25 reprovados.

No período vespertino, 128 alunos matriculados, 59 aprovados, 13 por Conselho de Classe e

25 reprovados, considerando também que houve evasão de 6 alunos desta série. O período

noturno 28 alunos matriculados, 15 abandono, 1 aluno aprovado, 1 alunos aprovado por

conselho de classe e 9 reprovados. Observe agora o ano de 2006 estas mesmas séries. 5ª

série período matutino: 115 alunos matriculados, 56 aprovados por nota, 20 aprovados por

Conselho de Classe, 29 alunos reprovados. O período vespertino: 131 alunos, 44 aprovados

por nota, 28 aprovados pelo Conselho de Classe, 25 reprovados. O período noturno: 17

matriculados, 01 aprovado por nota, nenhum aprovado por Conselho de Classe e 3

reprovados, 12 alunos abandonaram a escola.

Analise o resultado das 6ª séries de 2006. Período matutino: 114 alunos, 56

aprovados por nota, 25 aprovados por Conselho de Classe, 26 reprovados. O período da

tarde: 119 matriculados, 41 aprovados, 23 aprovados por Conselho de Classe, 34 reprovados

por nota e 7 abandonos. O período noturno 41 alunos matriculados, 1 aluno aprovado por

nota, 3 aprovados pelo Conselho de Classe e 30 evadidos. Estes são dados gerais de apenas

5ª e 6ª série desta escola, porém as 7ª e 8ª séries, a realidade não é muito diferente nesta

escola.

Como se dá aprovação nesta escola? A aprovação se dá pelo cálculo de médias

semestrais atingidas pelo aluno ou por análise e definição do Conselho de Classe. A ênfase

para a aprovação está no crescimento pessoal do aluno, em detrimento dos objetivos das

disciplinas nas séries. A realidade de cada turma, turno e formação do professor favorecem a

diferença de aprendizagem na aprovação do aluno, ocasionando baixa qualidade na

aprovação e defasagem na série seguinte.

Diante da análise da estatística de resultados verifica-se alto índice de evasão no

período noturno, constatando-se, que em sua maioria são alunos fora da idade/série e

trabalhadores, com multirrepetências e que priorizam outros aspectos de sua vida. O

trabalho do professor nestas turmas fica prejudicado diante do rodízio de alunos nas aulas

em função das faltas dos mesmos.

Os índices demonstram um aumento na aprovação, mas não se percebe na realidade

uma melhora na qualidade de aprovação. Analisando a ficha mais atentamente observa-se

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que os alunos que foram citados em 2005 com problemas na leitura, escrita e compreensão

nas disciplinas de história, ciências, no ano de 2006, estes mesmos alunos observados

deixaram de ser citados nestas disciplinas e passaram a apresentar os mesmos problemas

nas disciplinas de língua portuguesa e geografia, além de matemática. Observa-se assim que

a falta de clareza na definição dos indicadores e a falta de critérios dos profissionais ao

avaliar diariamente estes indicadores definidos no coletivo assim como as propostas de

intervenção para superar as dificuldades merecem mais atenção por parte do coletivo. Um

outro fator que prejudica é o fato de que muitas vezes diante de resultados insatisfatórios

em determinadas turmas em virtude da defasagem de aprendizagem, aprova-se o aluno

pelo crescimento, mesmo sem atingir os objetivos da série. É um problema que necessita de

enfrentamento urgente com ações integradas entre gestão, equipe pedagógica, professores,

alunos e pais.

A função da escola é garantir que o aluno aprenda e é no Conselho que isso deve

ficar claro para todos. A reunião que acontece bimestralmente deve avaliar o trabalho

docente, analisar o resultado discente e buscar alternativas para garantir aprendizagens.

Apesar de o Conselho discutir os problemas pertinentes à aprendizagem e propor

intervenções para a superação dos resultados muitas ações ainda devem ser feitas a fim de

garantir aprendizagem para todos.

Este é um quadro que muito tem preocupado direção, professores e pedagogos da

escola. No início do ano letivo é analisado, estudado e muitas propostas de intervenção são

sugeridas, porém há de se dedicar mais estudo para minimizar estes problemas e garantir a

melhoria da aprendizagem do aluno sem que o mesmo dependa da decisão do conselho

para seguir para a série seguinte.

Como é o Conselho de Classe da escola pesquisada

A escola em estudo, em seu Conselho de Classe, conta com uma ficha de

acompanhamento preenchida previamente pelos professores na semana que antecede o

Conselho. Observa-se pela análise dessa ficha, a dificuldade que muitos professores

apresentam na prática cotidiana em decorrência do emprego de instrumentos avaliativos

diferenciados. Percebe-se que, observando atentamente a ficha há uma falta de coerência

entre os critérios de avaliação adotados pelos diferentes professores ao indicar na ficha, os

itens referentes a leitura, escrita e compreensão. Na maioria das turmas analisadas, há

certa distância entre estes critérios, onde alguns professores citam os alunos porque não

conseguem ler com fluência, apresentam problemas na oralidade e devem ser

trabalhados, não compreendem o que pede o enunciado de um exercício e não identificam

a ideia central do texto. Porém este mesmo aluno em outras disciplinas não é citado, como

se a dificuldade dele não existisse, ou melhor, não dominar a leitura, escrita e não

entender os enunciados são apenas detalhes que não são registrados por alguns

professores por não considerar importante ou por não diagnosticar isso nas avaliações.

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Onde está o nó dessa desarmonia avaliativa? No excesso de alguns professores ou na falta

de zelo de outros?

Ao iniciar o Conselho as pedagogas entregam uma cópia da ficha de

acompanhamento bimestral das turmas em análise para os professores. Na escola

pesquisada os professores se reúnem por série e por turno. Assim no período da manhã se

encontram no mesmo Conselho todos os professores de quinta série do período da manhã.

Inicialmente os professores traçam o perfil das turmas. Em seguida com a ficha na mão

iniciam a análise da mesma observando onde há a concentração de dificuldade. Ao mesmo

tempo fazem uma análise comparativa entre as turmas, observando se há distância entre o

desenvolvimento intelectual e a formação pessoal. Detectadas as fragilidades dos

indicadores presentes na ficha, são feitas reflexões e diante da análise e dos problemas

levantados, muitos professores justificam o baixo nível de aprendizagem pelo desinteresse

dos alunos, pela falta de perspectiva de futuro, pelo não envolvimento nas aulas e pela não

realização das atividades propostas por parte de muitos alunos. Estes fatores necessitam de

um diagnóstico individual, pois as causas em algumas situações são do processo de ensino, e

em outras por distúrbios ou disfunções de aprendizagem. Outro indicador analisado é o

problema disciplinar que os alunos vêm demonstrando cada vez mais ao deixar de executar

regras, assim como respeitar colegas e professores, consequência essa, da falta de

acompanhamento e limites claros e firmes.

Concluída essa análise os professores propõem encaminhamentos comuns para os

problemas detectados na ficha que devem ser superados. Essas ações que devem ser

aplicadas por todos e estão ligadas à dificuldade de leitura, escrita e compreensão,

problemas quanto a execução de tarefas, relacionamento e normas. Em seguida cada

disciplina faz a sua proposta de intervenção para superar a dificuldade que o aluno encontra

na mesma. Fica para o último momento as solicitações feitas pelos professores para a

equipe pedagógica e direção sobre encaminhamentos referentes aos alunos que

apresentam problemas nos itens presentes na ficha referentes a normas, relacionamento.

Assim que termina o Conselho cada professor conselheiro agenda uma data para apresentar

aos pais o resultado do aproveitamento escolar do filho. Nesta reunião o professor com a

ficha de acompanhamento bimestral apresenta os resultados da turma e entrega um

boletim diagnóstico onde consta o desenvolvimento intelectual do aluno e informativos

sobre o seu desempenho em sala de aula. Há também neste boletim solicitação aos pais no

processo de intervenção para a superação das dificuldades, caso o aluno necessite.

As pedagogas elaboram um quadro contendo um resumo das ações que devem ser

implementadas ao longo do bimestre. Essa ação permite que a equipe escolar procure novos

caminhos e estabeleça outras ações, para que todos tenham oportunidade de aprender,

garantindo o direito do aluno a um ensino de qualidade e o cumprimento da função social da

escola.

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A voz dos professores, pedagogos e alunos diante do Conselho de Classe

Para subsidiar essa reflexão foi feita uma pesquisa junto aos 44 professores, 3

pedagogos e 30 alunos da escola pesquisada. 100% dos questionários foram respondidos e

devolvidos. O objetivo da pesquisa foi justamente verificar qual é a concepção de Conselho

de Classe dos envolvidos no processo educacional no seu âmbito de competência, qual o seu

papel, e se estão alcançando os objetivos da forma como este órgão colegiado está

organizado.

A voz dos professores

Dos 34 professores entrevistados, 21 pertenciam ao quadro próprio do magistério e

13 são professores contratados pelo Processo de Seleção Simplificado (PSS) O questionário

era composto por 5 questões referentes ao conceito, organização e funcionalidade do

Conselho de Classe. Ao analisar a primeira questão quanto a concepção de Conselho de

Classe percebe-se que a maioria dos professores entende que o Conselho de Classe é o

momento mais apropriado para se avaliar o trabalho desenvolvido, buscando nas

experiências dos outros a solução para as dificuldades apresentadas no decorrer do

processo. Para dezesseis professores entrevistados o Conselho de Classe é uma reunião para

avaliar o resultado do trabalho. É interessante observar que ao definir Conselho de Classe

muitos apontaram o Conselho como um momento de avaliação do próprio trabalho a partir

do desempenho do aluno.

Professor P ¨ momento em que o educador pode avaliar o resultado do seu trabalho

analisando o desempenho do aluno¨

Professor C ¨momento que vamos avaliar o resultado do nosso trabalho e

aprendizagem do aluno¨.

Professor I 1 ¨momento em que avaliamos como está o nosso trabalho em sala de

aula e quais as intervenções que devem ser feitas para sanar as dificuldades dos alunos¨

Professor I 2 ¨momento de fundamental importância para a prática docente, pois

podemos repensar a nossa prática e buscar soluções em conjunto¨.

Professor EF ¨de suma importância, pois avalia não só o aluno, mas o processo,

envolvendo o docente e o discente¨.

Para onze deles o Conselho é uma reunião que verifica se houve aprendizagem e

analisa as dificuldades da turma a fim de propor intervenções. Professor G ¨é nele que o

corpo docente se reúne para discutir de que forma está a aprendizagem e cria maneiras e

métodos mais eficazes para superar as dificuldades dos alunos¨.

Professor EF 2 ¨analisar a situação real do aluno para se fazer intervenções se

necessário¨.

Para os demais entrevistados o Conselho é uma reunião para analisar o aluno e para

uma troca de informações. Pode-se observar que os professores entrevistados têm

convicção da importância do Conselho, porém é preciso aproximar esta listagem de

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conceitos com a prática cotidiana, considerando que o objetivo desta análise é diagnosticar

porque os Conselhos são inoperantes nos resultados. Isso será apresentado mais adiante.

Ao concluir a análise da questão 1, constata-se que embora alguns dos entrevistados

não responderam a questão, muitos professores entendem que o Conselho de Classe é uma

reunião importante com o intuito de avaliar o trabalho docente, com vistas para a melhoria

da aprendizagem do aluno, porém, nenhum dos entrevistados apresentou no conceito de

Conselho de Classe reunião com professores, equipe pedagógica e direção. Interessante

observar que a equipe pedagógica assim como a direção que preside o Conselho não tem

participação nas concepções apresentadas pelo corpo docente nesta primeira questão.

A segunda questão tinha como objetivo analisar qual é o papel do Conselho de Classe

no processo de avaliação do aluno e da escola. No processo de avaliação dos alunos, as

respostas dos professores foram bastante variadas prevalecendo a ideia de que o papel do

Conselho de Classe no processo de avaliação do aluno é analisar o aluno e diante das

dificuldades detectadas propor encaminhamentos para sanar os problemas de

aprendizagem.

Algumas frases ilustram a ideia de que o papel do conselho no processo de avaliação

do aluno é analisar o aluno e encaminhar.

Professor P ¨ analisar e definir encaminhamentos comuns para que o aluno supere

sua dificuldade¨.

Professor EF1 ¨detectar lacunas na aprendizagem deste e solucioná-las objetivando

maior aproveitamento e avanço¨.

Professor EF 2 ¨verificar as dificuldades do aluno e buscar alternativas na superação

dos problemas¨.

Na verdade, pelas respostas percebe-se que o papel do Conselho no processo de

avaliação do aluno é analisar a sua aprendizagem e buscar soluções para as dificuldades

encontradas no decorrer do processo. Novamente as respostas são assertivas e se

aproximam dos conceitos dos teóricos que em outras palavras apontam para finalidade do

Conselho como sendo um espaço de análise, discussão e encaminhamento de propostas

para a superação do resultado. No processo de avaliação da escola as respostas foram

bastante variadas: buscar melhorias no ensino, avaliar o trabalho pedagógico, verificar o

trabalho do aluno e do professor, verificar o nível dos educadores e da escola, acompanhar o

desenvolvimento do aluno, mudar a partir dos resultados. Embora as respostas sejam

bastante variadas, percebe-se que a preocupação é com a avaliação tanto do professor

quanto do aluno.

Professor P ¨diante dos resultado avalia-se o trabalho pedagógico e verifica-se como

e porque está interferindo na aprendizagem¨.

Professor C ¨dar subsídios aos professores, alunos e pais diante do levantamento de

problemas¨.

Professor C 2 ¨verificar se todos os envolvidos estão atendendo aos objetivos

propostos¨.

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Professor I ¨colaborar para que os alunos tenham garantido o seu direito de aprender

e superar dificuldades¨.

Professor EF 2 ¨ajudar os professores a rever seus métodos, sua forma de avaliar¨.

Entende-se que todos confiam e esperam que a escola ou sua parte administrativa e

pedagógica seja um auxílio no trabalho do professor em sala de aula, subsidiando e

apoiando as mudanças necessárias ao bom andamento do trabalho, numa espécie de

cumplicidade mútua nas explicações sobre o que não deu resultado.

A terceira pergunta feita faz referência à ficha de acompanhamento bimestral,

preenchida na semana que antecede o Conselho. Cada professor, durante sua hora atividade

preenche com o pedagogo a Ficha de Acompanhamento Bimestral de seus alunos por turma.

O objetivo desta ficha é fazer um levantamento diagnóstico sobre o desempenho do aluno

no campo do desenvolvimento intelectual (leitura, escrita e compreensão, aprendizagem,

tarefas), organização pessoal (autonomia, organização, atenção e concentração) e

relacionamento (professor, colegas e normas) antes do Conselho de Classe. Os indicadores

presentes na ficha são definidos anualmente pelos professores, equipe pedagógica e

direção. Durante o Conselho de Classe os membros do colegiado fazem uma análise da ficha

apontando as dificuldades da turma, seu perfil. Diante desta análise são definidas

intervenções necessárias ao processo ensino aprendizagem, com encaminhamentos comuns

a todos os professores da turma e específicos por disciplina e ou aluno. Neste momento há

também a definição de encaminhamentos pela direção e ou equipe pedagógica. Após o

Conselho é entregue aos professores uma síntese das ações comuns para enfrentamento

dos problemas apontados na ficha que deverão ser aplicadas por todos ao longo do

bimestre.

A problematização da pesquisa está justamente aí. Depois de um raio x feito entre

professor e pedagogo sobre o desempenho individual do aluno, depois da análise da turma e

da definição de metas para serem alcançadas ao longo de um bimestre, o que acontece

entre a execução e a reavaliação destas mesmas turmas que no Conselho seguinte

apresentam o mesmo quadro diagnóstico? Assim, as próximas questões da entrevista estão

voltadas para o uso da ficha e sua aplicação na sala de aula e no planejamento. Os objetivos

destas últimas perguntas eram identificar se os professores consideravam a ficha

importante, qual sua finalidade frente aos resultados do Conselho de Classe e se utilizam a

mesma no decorrer do bimestre. Pelas respostas dadas observa-se que a maioria (28) aprova

o preenchimento da ficha como forma de avaliar o trabalho, prevenir injustiças, fazer um

diagnóstico e também como auxílio na avaliação. Para o professor a ficha serve como um

documento de comprovação do desempenho do aluno. Apenas três dos entrevistados

disseram não utilizar a ficha, dois utilizam com pouca regularidade, apenas para pressionar o

aluno a estudar mais e um professor não respondeu. Alguns professores abordaram a

importância da mesma no desenvolvimento do Conselho de Classe.

Professor H ¨o preenchimento da ficha é de suma importância, pois tem como

finalidade orientar o Conselho de Classe, além de ser através da mesma que se pode analisar

alunos com problemas de aprendizagem¨.

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Professor P 3 ¨é importante preencher a ficha porque ela norteia os

encaminhamentos e as tomadas de decisões no Conselho de Classe¨.

Apenas um professor faz uma ressalva quanto a importância do preenchimento da

ficha, diz ser importante desde que seja com seriedade.

Acredita que nem todos os seus pares estão preparados para avaliar o cotidiano do

aluno.

A última pergunta feita está relacionada à objetividade do Conselho de Classe. Dos

professores entrevistados, dez acreditam que o Conselho de Classe realizado na escola onde

atuam atinge seu objetivo, sete dizem que não. Onze acham que em parte atingem os

objetivos e os demais não sabem. Apenas um professor não respondeu a esta questão.

Embora o Conselho seja visto como grande auxiliar do professor pela maioria, constata-se

que essa mesma maioria acredita que ele alcança só em partes seu objetivos. Alguns são

extremistas ao afirmarem que não. Isso demonstra que mudanças são necessárias para se

chegar a um denominador comum. Importante ressaltar que os que responderam que sim

valorizam a troca de experiências, as ideias lançadas e as medidas tomadas em conjunto.

Analisando as respostas dadas pelo corpo docente fica claro que eles não apresentam

problemas quanto ao conceito de Conselho de Classe, pelo contrário trazem nos seus

discursos uma concepção teórica clara de Conselho, porém pelas respostas dadas à última

pergunta se o Conselho atinge o seu objetivo pelas respostas observa-se que a prática dos

professores está um pouco distante da teoria, embora eles mesmos reconheçam isso. Ao

que parece o Conselho é a finalização de todo o trabalho e a indicação de uma meta

cumprida, porém as decisões tomadas em conjunto dividem responsabilidades e

providências.

A voz das pedagogas

As três pedagogas entrevistadas mantiveram coerência em todas as perguntas e têm

uma concepção de Conselho de Classe de análise do desempenho dos alunos e do professor

e entendem que no processo de avaliação do aluno o Conselho analisa o rendimento escolar

e as dificuldades e na avaliação da escola ele é útil na medida em que identifica dificuldades

e define intervenções, quer sejam individual quer sejam coletiva quanto ao processo ensino

aprendizagem. Entendem também que o pré-conselho adotado pela escola é importante

porque ajuda a agilizar o Conselho e registra o embasamento para a conversa com os pais,

além de servir como parâmetro para o trabalho do professor. Quanto aos problemas que

prejudicam o preenchimento da ficha, são unânimes em citar o descompromisso de alguns e

a falta de conhecimento da realidade. O que leva ao preenchimento infiel.

Concordam também que o Conselho até hoje ainda não atingiu no total os seus

objetivos, primeiro porque a prática muitas vezes difere do que ficou decidido em reunião,

ou por desconhecimento, ou por descompromisso com a causa. Para elas falta um

envolvimento mais efetivo de alguns professores desde o preenchimento da ficha até a

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seleção das intervenções no momento do Conselho de Classe. Essa falta de envolvimento

acaba por comprometer o sucesso deste órgão colegiado.

A voz dos alunos

Os alunos da escola também foram ouvidos sobre o Conselho de Classe. Foram

entrevistados trinta alunos sendo dez aprovados por mérito próprio, dez aprovados pelo

Conselho de Classe e dez reprovados. Para fazer a seleção destes alunos considerei o ano de

2006 como referência e a 5ª B e a 6ª série B do período matutino e 5ª D e 6ª série D, do

período vespertino. Esta experiência de “dar voz” ao aluno, o maior interessado no processo

de aprendizagem, permitiu, dentre outros aspectos, analisar através das respostas o quanto

é necessário voltar a atenção para a voz do aluno. Qual é o conceito que ele tem de

Conselho de Classe, como se dá a sua relação com a aprovação e ou reprovação. Em linhas

gerais os alunos entrevistados foram bastante coerentes em suas respostas, o que não quer

dizer comprometimento com o estudo. Para eles o Conselho de Classe existe para avaliar o

aluno e aceitam isso como uma simples norma da escola. Ter o nome citado no Conselho,

para eles é fato corriqueiro e dá até certa fama. O professor cumpre o seu papel de informar

o resultado do Conselho, mas a maioria não apresenta preocupação para que seu nome saia

da lista da próxima reunião. Os que foram aprovados pelo Conselho veem isso como

conclusão normal e se dizem merecedores porque estavam na média. Os reprovados

apresentaram o mesmo conformismo e têm plena consciência de que a causa está na falta

de dedicação, nas notas baixas durante o período, na falta de estudar e na indisciplina.

As vozes dos diversos atores escolares: professores, pedagogos e alunos revelaram

que, teoricamente, conceituam Conselho de Classe denotando o caráter organizacional do

mesmo. Embora todos reconheçam a importância do Conselho de Classe na análise do

desempenho do aluno e no resultado do trabalho pedagógico do docente, os dados

levantados esclarecem que os alunos atribuem ao Conselho de Classe uma responsabilidade

que eles não se eximem em se condenar: reprovam pelo Conselho porque não se dedicaram.

Implementação do trabalho

Desenvolver uma proposta de intervenção é essencial quando há uma problemática e

essa problemática está interferindo na qualidade da produção da aprendizagem. No

decorrer da pesquisa os professores e pedagogos participaram de um estudo tendo como

referencial teórico um caderno pedagógico. Este caderno Pedagógico foi organizado em 04

unidades. A lógica para o aprofundamento do estudo teve como ponto de partida

Conceituando Avaliação na 1ª unidade; Avaliação e Legislação na 2ª unidade; Avaliação e

Reprovação Escolar na 3ª unidade e na última unidade Conselho de Classe e Avaliação. O

estudo do caderno pedagógico ao longo de 2008 ofereceu momento de reflexão,

aprofundamento teórico sobre temas próximos do Conselho de Classe como avaliação,

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reprovação e Conselho de Classe, discussão por disciplinas e finalmente momento da

elaboração de um plano de ação para cada temática estudada.

A leitura e reflexão de cada unidade aconteceram durante cada encontro pedagógico

previsto no calendário escolar. A primeira temática estudada foi a tão falada avaliação. Os

professores fizeram uma revisão de conceitos. Quando questionados sobre suas

experiências com a avaliação no ensino fundamental e médio muitos disseram que não

houve muito avanço nos instrumentos avaliativos, permanecem os mesmos. Disseram,

porém que há um grande esforço dos professores diante das muitas leituras que fazem de

acertar e tirar da avaliação o seu estigma de agente classificatório e punitivo. Um professor

do grupo fez uma boa reflexão sobre a avaliação e seu objetivo. Disse que no passado a

avaliação era apenas a prova e seu objetivo era mostrar o resultado da aprendizagem do

aluno, porém hoje a avaliação é um sinalizador para melhorar o trabalho do docente com

vistas a melhoria da aprendizagem do aluno. Realmente a avaliação não pode ficar apenas

na constatação como muitas vezes acontecem nos Conselhos de Classe, mas ela deve

fornecer subsídios imediatos para corrigir o processo educativo. Paro (2001) observa que a

avaliação educativa deve significar precisamente o cuidado com a qualidade do ensino. Ele

assim acaba definindo a razão de ser da avaliação.

(...) a razão de ser da avaliação educativa não é a classificação ou a

retenção de alunos, mas a identificação do estágio de compreensão e

assimilação do saber pelo educando, junto com as dificuldades que

este encontra, bem como os fatores que determinam tais

dificuldades com vista à adoção de medidas corretivas de ação.

(PARO, 2001, p. 40).

Verifica-se que, nesse sentido, para Vítor Paro, o conceito de avaliação toma outros

rumos que não é mais de promover uns e reprovar outros, mas fazer um diagnóstico dos

resultados e propor medidas para a superação, melhorando, consequentemente, a

aprendizagem do aluno. A segunda unidade teve como objetivo refletir sobre a

Avaliação/Recuperação prevista na Deliberação nº 007/ 99, Regimento Escolar, no Projeto

Político Pedagógico, nas Diretrizes Curriculares e na prática docente. Discutir a prática

pedagógica avaliativa à luz da legislação vigente após o estudo dos conceitos apresentados

na unidade anterior trouxe resultados positivos, pois durante as discussões foi possível

aproximar a teoria da legislação e da prática presente nas diretrizes curriculares e do plano

de trabalho docente. Os professores devem ter claro qual é a concepção de avaliação

presente tanto no regimento da escola quanto nas diretrizes para desenvolver um trabalho

coerente. Todos através da discussão foram unânimes em afirmar que o professor deve

considerar a legislação para, a partir da mesma rever suas ações e garantir a aprendizagem.

Nesta unidade o que mais gerou polêmica foi fazer uma reflexão sobre a recuperação de

estudos previsto na Deliberação nº 007/99.

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Na verdade o que é recuperar? É possível recuperar algo que não foi construído. O

conceito de recuperação no campo educacional merece atenção, pois o seu conceito é vago.

Teoricamente recuperar significa tentar novamente. Em educação significa voltar, garantir o

que não aprendeu. A recuperação de estudos é parte integrante do processo de construção

do conhecimento e deve ser entendida como criação de novas situações de aprendizagem.

Este mecanismo está colocado à disposição da escola e do professor para garantir a

superação da dificuldade diagnosticada pela avaliação. A Lei de Diretrizes e bases da

Educação Nacional e nas Normas Regimentais Básicas para as escolas estaduais em seus

princípios e diretrizes garantem aos alunos oportunidades que promovam os avanços

escolares. A recuperação de estudo ainda causa muita discussão.o professor, pegagogo e

aluno sabem que consta na legislação, no Regimento Escolar, porém essa recuperação deve

ser revista. Da forma como vem sendo executada na maioria das escolas não dá. Ela é

apenas mais um estereótipo da avaliação. Vitor Paro (2001, p. 42) afirma que para corrigir o

equívoco da reprovação seria preciso considerar o conceito de recuperação do processo de

ensino, isso implica em revisão e correção da prática pedagógica.

Paro, (2003) observa que a recuperação não deve ser aplicada para melhorar os

dados estatísticos dos aprovados. A recuperação, em vez disso, deveria ser pensada como

um princípio derivado da própria avaliação. Está num processo contínuo e permanente,

embutido no próprio exercício de ensinar e aprender, diagnosticaria os problemas e

dificuldades que a recuperação, também num processo contínuo e permanente cuidaria de

solucionar (ou intentar soluções) pelo oferecimento de novos recursos e alternativas de

ação. (PARO, 2001, p. 42)

A recuperação de estudos é mais um mecanismo colocado à disposição da escola, do

professor e consequentemente do aluno para garantir que as dificuldades encontradas neste

ou naquele conteúdo sejam superadas durante o percurso escolar. Para que ela se efetive é

necessário entendimento de sua função, objeto de planejamento inserido no trabalho

pedagógico, constituindo-se em intervenções imediatas, assim que as dificuldades são

constatadas. A terceira unidade partiu da análise estatística dos resultados em 2003, 2004,

2005 e 2006 sobre aprovação – reprovação – abandono. Analisar a questão da reprovação

no processo de avaliação do ensino e da aprendizagem do aluno trouxe certa angústia para

os professores. Ao comparar os dados estatísticos referentes a taxa de aprovação

perceberam que houve redução da aprovação e expansão da reprovação e do abandono.

Atribuíram as causas a diversos fatores desde a família até ao próprio sistema de avaliação.

O tema reprovação escolar está posto pela escola em suas ações como resultado da falta do

aluno conseguir “média” para que seja aprovado. Não é possível falar em reprovação sem

abordar a avaliação. É preciso discutir a avaliação no contexto em que ela se realiza, pois

uma avaliação seletiva implicará numa reprovação irresponsável. Desta forma não se deve

transferir para a avaliação a responsabilidade do fracasso escolar nem isentá-la inteiramente

dos resultados uma vez que ela representa um mecanismo através do qual se define o

sucesso ou insucesso do aluno.

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Para Esteban (1999, p.7) “qualquer reflexão sobre a avaliação só tem sentido se

estiver atravessada pela reflexão sobre a produção do fracasso/sucesso escolar no processo

de inclusão/exclusão social”. Arroyo (2000, p.13), afirma que nas últimas décadas instaurou-

se tanto no ensino privado, como no público uma “indústria da reprovação”. Desta forma, ao

invés de o professor se preocupar com a aprendizagem deste aluno vale a cultura da

reprovação e o aluno sem ser recuperado fica com o pé na rua, ampliando os dados

estatísticos da evasão escolar.

Segundo Vasconcellos (1998, p.17), a temática da avaliação é importante, pois traz

repercussões negativas como a evasão e os altos índices de reprovação. Para ele, a

importância se deve ao fato de que a avaliação pode contribuir para a “construção de uma

escola democrática e de qualidade para todos”. Segundo Vasconcellos (1994) há uma

determinação social que projeta para a escola a função reprovatória como saída. Assim,

professores, pedagogos, direção e até pais, assimilaram esta determinação social e

consideram que a escola deve reprovar e que reprovação é uma coisa tão normal quanto

aprovação. Nem todos devem ser aprovados, pois não tem nota e nem todos aprenderam. O

contexto criado para avaliar e classificar, para promover e reter é da nossa competência

profissional. É um desafio e a atividade pedagógica que se dá na escola deve buscar meios

de mudar este quadro. Analisar as estatísticas sobre retenção, defasagem, idade-série deve

ir além de um simples olhar, de buscar justificativas para estes dados. Deve promover

mudança de foco e deixar de considerar apenas o aluno como elemento de culpabilidade,

pois a punição só recai sobre ele, seu pouco esforço, seu desajuste, sua falta de inteligência.

O retorno do que se ensina é que se classifica em aprovação e reprovação, por isso é

preciso cuidado na hora de avaliar. Repensar a ação avaliativa é trabalhar a favor da

aprovação. No momento da elaboração do plano de ação para concluir a 3ª unidade os

professores citaram que para reverter esta situação é preciso uma ação conjunta onde todos

os envolvidos se sintam corresponsáveis para que os resultados sejam positivos. Na última

unidade o assunto em estudo foi o Conselho de Classe. O objetivo que pautou esta unidade

foi refletir sobre o Conselho de Classe, seu objetivo, sua organização, seu caráter avaliativo e

seus resultados. Nesse processo coletivo de avaliação todos os participantes têm condições

de analisar de forma global o aluno e assim estruturar o trabalho pedagógico apontando

encaminhamentos comuns para superar dificuldades de leitura, escrita e compreensão em

todas as disciplinas, além de definir estratégias de ação para recuperar as dificuldades

específicas por disciplina.

Os professores que participaram do estudo do caderno pedagógico concordam que a

prática do Conselho de Classe não se efetua concretamente e reconhecem que eles mesmos

têm responsabilidade sobre essa ineficiência, pois ao retornar para a sala de aula retomam a

rotina didática de vencer os conteúdos do plano de trabalho e se esquecem de considerar

durante todo um bimestre as intervenções definidas no coletivo. A falta de tempo, os

desencontros entre os critérios para atingir os objetivos são apontados também como

responsáveis pela inoperância do Conselho de Classe. Apontam também para a falta de ação

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da equipe pedagógica que não oferecem atendimento necessário por estarem

constantemente resolvendo conflitos ocasionados em sala em virtude da indisciplina.

Para concluir o estudo apresentaram como plano de ação propostas práticas para

que as intervenções propostas no Conselho de Classe aconteçam no dia a dia da sala de aula

levando os alunos a superarem as suas dificuldades. Uma análise mais detida do estudo a

partir do caderno pedagógico vai ao encontro do objetivo central do trabalho. De qualquer

modo, o importante a registrar aqui é o enriquecimento do estudo e da reflexão

possibilitado pela análise, leitura, discussão e plano de ação. Esta breve síntese do trabalho

com o material didático teve o propósito de aproximar a pesquisa feita com os professores e

pedagogos e o estudo que aconteceu ao longo destes oito meses.

Considerações finais

Esta pesquisa surgiu de uma preocupação com o Conselho de Classe, da necessidade

de compreender porque seus objetivos nem sempre são alcançados. Consegui diante da

análise dos dados, da implementação do trabalho através do estudo do caderno pedagógico

alcançar os objetivos propostos no início da elaboração do plano de trabalho, porém, por ser

o Conselho de Classe um tema que traz ainda muita discussão merece mais estudos. Fazer

uma leitura e uma reflexão do material teórico e da legislação, foi de suma importância para

aproximar a teoria da prática e melhor compreender a razão de ser do Conselho de Classe

como um órgão consultivo dentro do sistema escolar. Para que ele tenha eficácia é

necessário um planejamento por parte da gestão e da equipe pedagógica a fim de definir as

metas a serem cumpridas. Sendo um espaço coletivo de avaliação onde participam do

mesmo todos os professores da turma, pedagogos e direção é dever de todos dividir as

responsabilidades e assumir o papel que lhe cabe.

Nesse sentido a parceria deve ser estabelecida no momento que são definidas as

ações a serem implementadas. Para que isso aconteça os educadores precisam ter clareza

para conduzir o trabalho pedagógico que vai desde a seleção dos conteúdos, definição dos

objetivos até a sua execução por meio de uma metodologia. Os professores, que são os

envolvidos direto no processo devem acreditar numa educação que transforma e que o

Conselho de Classe é o espaço privilegiado para uma reflexão pedagógica servindo para

reorientar o trabalho do docente e do aluno. Vasconcellos (1994 p. 53) alerta que qualquer

mudança na realidade escolar requer uma modificação de mentalidade e esta não pode se

resumir apenas ao discurso, requer dos envolvidos uma mudança de prática. Para que isso

aconteça professores, pedagogos e direção devem assumir um posicionamento pedagógico

claro onde as responsabilidades sejam divididas. A falta de articulação coletiva frente às

intervenções e ações em sala de aula acaba comprometendo o trabalho de todos. O papel

do Conselho é justamente esse, tornar dinâmico o processo de avaliação por meio da análise

dos participantes e estabelecer no coletivo, meios para a superação das dificuldades quer

sejam de aprendizagem, de relacionamento dentre outros. Estudar os resultados é o

primeiro momento coletivo de análise deste órgão colegiado. Com a ficha de

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acompanhamento bimestral preenchida no pré-conselho da escola pesquisada, é possível

descrever e problematizar a realidade da sala de aula, interpretar os resultados da

aprendizagem de forma crítica, aproximar este resultado da prática do professor e propor

alternativas de ação. Este é o grande momento coletivo.

Rocha (1984) comenta que um dos objetivos do Conselho de Classe é justamente de

propiciar o conhecimento profundo do aluno, por ser o momento em que todos os

professores de uma turma se encontram, numa situação profissional. Isso acontece no

interior da escola pesquisada, porém há uma falta de posicionamento pedagógico de alguns

professores. A análise dos dados a partir das entrevistas e das reflexões oportunizadas pelo

estudo do caderno pedagógico apontou que embora teoricamente os Conselhos de Classe

realizados na escola acontecem conforme previsto no regimento escolar e no Projeto

Político Pedagógico, falta muito ainda para que o momento do Conselho de Classe possa ser

um espaço legitimador da avaliação. O estudo evidencia a necessidade de um maior

envolvimento de todos os membros do colegiado, por parte do docente na consolidação das

ações em sala de aula, por parte da equipe, que muitas vezes, não desenvolve o seu trabalho

em razão dos problemas ocasionados devido a indisciplina e outros problemas e por parte

da direção que é quem conduz todo o Conselho promovendo a discussão. O estudo em

questão não se esgota aqui, há muito a se fazer. O primeiro passo é mesmo a

conscientização dos professores, em sua totalidade.

A seriedade do trabalho do professor contribui para o real desenvolvimento do

aluno. Continuar buscando melhorias, acreditar no trabalho e se empenhar para um bom

resultado são objetivos que devem nortear sempre o trabalho de todos os professores. Essa

conscientização exige esforços de todos no sentido de estarem continuamente avaliando o

processo de aprendizagem dos alunos.

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JULIANO LUIS BORGES

Mestrando em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Londrina

Escola e disciplina: uma abordagem foucaultiana

Juliano Luis Borges

Resumo

O objetivo fundamental da escola não é mais qualidade de ensino ou elaboração de meios que facilitem o aprendizado. Esse fato acarreta indagações e incertezas sobre o funcionamento da instituição escolar. Para esclarecer essas questões e fornecer os elementos para uma análise dessa realidade Michel Foucault se apresenta como a principal referência teórica, possibilitando a compreensão das relações presentes no cotidiano escolar. Nas relações de poder contidas nesse ambiente, o “poder disciplinar” demonstra toda sua eficácia. Os mecanismos componentes desse poder são os responsáveis pela afirmação de um sistema punitivo que move toda “engrenagem” educacional.

Palavras-chave: escola, poder, disciplina, vigilância, punição.

Abstract

The school’s basic purpose is not the teaching quality or the elaboration of means which facilitate learning. This fact causes questionings and uncertainties on the functioning of the school. In order to clear these questions up and provide elements for an analysis of this reality, Michel Foucault is presented as the main theoretical reference, enabling the understanding of the relations present in the daily activities of the school. In the power relations that belong to this environment, the “disciplinary power” demonstrates all its efficacy. The component mechanisms of this power are responsible for the confirmation of a punishing system that moves all the educational “organization”.

Keywords: school, power, discipline, monitoring, punishment.

1- INTRODUÇÃO

Nas pesquisas realizadas para o trabalho de conclusão de curso em Ciências Sociais sobre o papel da Sociologia nas Escolas Estaduais, um problema não delimitado anteriormente emergiu nos entremeios do contato com professores e alunos (não apenas de Sociologia) em

[1] Sobre o papel da educação em termos normativos, conferir a Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).

[2] Apreender a realidade escolar através do instrumental analítico foucaultiano é perceber, através de uma multiplicidade de minúcias que compõem o social, como as relações de poder perpassam esse universo e adquirem formas

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específicas em contextos particulares. Pensar o cotidiano escolar por esse viés não consiste uma reflexão unilateral e generalizante, mas sim na capacidade perceptiva de questões que aparecem atomizadas e diluídas nas relações.

[3] No Brasil essa comparação não é possível pois, a grande maioria dos presídios, não possuem um caráter disciplinador e sim, aviltante e embrutecedor. Superlotação e violência transformam a instituição em reforço da criminalidade que deveria combater. Para mais detalhes ver os trabalhos

reuniões periódicas realizadas nas escolas. Desde planejamento didático, financeiro, lazer e até apenas comunicados, a discussão disciplinar permeia os diálogos. Essa questão, de uma nitidez até certo ponto enfática, sobrepõe-se a todas as outras problemáticas no cotidiano escolar constituindo-se, num desafio e uma preocupação essencialmente explícita.

Todo conteúdo e prática exigidos por lei e conduzidos por parâmetros curriculares sobre o sentido e objetivo da educação acabam, em contextos específicos, adquirindo roupagens diferenciadas[1]. Nas discussões sobre o universo escolar em sua totalidade a fala predominante não se baseava no processo educacional em si - ações pedagógicas, melhorias nos programas, materiais didáticos, projetos educativos, etc - mas sim, na questão disciplinar.

Para uma reflexão teórica sobre a disciplina, uma dos várias questões que permeiam o cotidiano escolar, e entendê-la como um conjunto de relações pertencentes às esferas sociais, a análise de Michel Focault presente, fundamentalmente, em “Vigiar e punir” constitui-se na principal referência deste trabalho[2].

A disciplina torna-se o grande alvo a ser alcançado e a responsável em manter o nível de aprendizado em um patamar aceitável. Segundo essa perspectiva, é através da disciplina dos alunos e dos professores que o sistema educativo se engrena. Manter o professor em um regime disciplinar como de operários fabris, produzindo em todo tempo designado e, impondo ao aluno seu poder como forma de utilizar o tempo como máximo de proveito, torna-se o objetivo almejado.

A relação hierárquica no ambiente escolar revela como a disciplina dociliza os corpos e os coage numa constante utilização.

A escola configura-se como um ambiente parecido com uma prisão em sua disposição física, seus mecanismos de disciplinarização, sua organização hierárquica, sua vigilância constante. Essa analogia refere-se ao sistema penitenciário no contexto apresentado por Foucault, em que as prisões disciplinares tinham por objetivo a readaptação e integração de “corpos dóceis” à sociedade[3].

Compreender o porquê da ênfase das escolas com a questão disciplinar e entender como as mesmas exercem esse poder é o escopo desse trabalho. Recorrendo conceitos de poder, disciplina, vigilância e, seus desdobramentos essa análise se assenta, fundamentalmente, numa abordagem foucaultiana. É através dessa análise que as relações de poder contidas no universo escolar adquirem uma visibilidade concreta e sistemática. É uma questão importante em sua teoria entender essas relações não somente como algo negativo, mas também produtivo.

Característica da sociedade contemporânea, a disciplina percorre

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de Sérgio Adorno e de César Barros Leal sobre esse tema.

[4] Para mais detalhes, referenciado em um trabalho introdutório sobre a questão, conferir o excelente trabalho de Wolfgang Leo Maar.

[5] “O Panóptico de Bentham é a figura arquitetural dessa composição. O princípio é conhecido: na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre; esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda

instituições apresentando todo seu poder, produzindo indivíduos e utilizando-os como seus instrumentos.

2- O PODER E SEUS DESDOBRAMENTOS

Para uma definição conceitual de poder é necessário remeter a reflexões indissociáveis à análise política e suas relações. O poder se expressa nas diversas relações sociais, assim, pode-se falar em relações de poder.

A luz dessa afirmação, não atendo-se à profundidade do conceito, onde existem relações de poder existe política[4]. A política se expressa nas diversas formas de poder e pode ser entendida de duas maneiras: num “sentido restrito” e num “sentido amplo”.

No sentido restrito refere-se à política relacionada ao Estado e num sentido mais abrangente consideram-se outras dimensões da vida social não menos importantes.

Em sua famosa conferência, “A Política como Vocação”, Max Weber afirma que a política não se restringe ao campo institucional estatal e, explicita claramente, que a política permeia outras atividades da vida cotidiana. “Hoje, nossas reflexões não se baseiam, decerto, num conceito tão amplo. Queremos compreender como política apenas a liderança, ou a influência sobre a liderança, de uma associação política, e, daí hoje, de um Estado” (WEBER, 1974, p. 97).

Apesar das considerações acerca da abrangência das relações políticas, nessa abordagem, Weber atém-se à análise do Estado e seus desdobramentos e, aponta caminhos analíticos sobre outras esferas da vida social.

Localizar o poder em um lugar específico, pontualmente o Estado, é um grande erro, pois, como foi apresentado, existem relações de poder, e estas estão presentes não apenas no aparelho estatal. Conceituar as relações de poder somente interligadas ao campo institucional do Estado parece ser um pouco simplista, ver o Estado como ponto de referência do poder não corresponde a toda sua amplitude. Conceber as relações de poder restritamente mascara seu caráter extremamente amplo.

O Estado é um órgão que possui poder, mas não se restringe a ele, não é a única referência de poder. Deve-se tratar o poder inserido nas relações e não entendê-lo vulgarmente através de concepções que o coisificam.

Se somos todos, como já enfatizei, fatores de poder e, além do mais, se o poder não se resume tão-somente ao poder estatal, todos aqueles que se integram à luta pela democratização da sociedade e das relações autoritárias de poder que se expressam tanto a nível de Estado como no cotidiano da vida social e afetiva. Volto a repetir que as relações de poder são multiformes, apresentam mil e uma faces e não escolhem

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espessura da construção (...). Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar” (FOUCAULT, 1977, p. 177).

[6] São documentos redigidos pela diretoria e, obrigatoriamente assinado pelo transgressor, como uma forma de confissão de suas ações.

[7] Ver “Vigiar e punir”, especialmente p. 161.

lugares para se manifestarem (PARANHOS, 2000, p.58).

Segundo a ótica foucaultiana as relações de poder se manifestam de múltiplas formas, não possuem localização nem sujeitos específicos.

Quero dizer que em uma sociedade como a nossa, mas no fundo em qualquer sociedade, existem relações de poder múltiplas que atravessam, caracterizam e constituem o corpo social e que estas relações de poder não podem se dissociar, se estabelecer nem funcionar sem uma produção, uma acumulação, uma circulação e um funcionamento do discurso (FOUCAULT, 2003, p. 179).

Ter o poder, buscar o poder são expressões que o transforma em coisa, que se tira ou se dá, que se conquista ou se perde. O poder é composto por relações dispersas em toda sociedade, todos são sujeitos e objetos de poder.

(...) o poder não deve ser encarado exclusivamente como algo que atua sobre nós, como se nos limitássemos a ser objeto de sua ação. Ele também é exercido por nós, o que nos coloca simultaneamente na condição de sujeitos e objeto do exercício do poder (PARANHOS, 2000, p.56).

Entender o poder como algo palpável, como uma coisa que se adquire ou se compra, consiste em um grande engodo.

Dispomos da afirmação que o poder não se dá, não se troca nem se retoma, mas se exerce, só existe em ação, como também da afirmação que o poder não é principalmente manutenção e reprodução das relações econômicas, mas acima de tudo uma relação de força (FOUCAULT, 2003, p. 175).

O autor apresenta as relações de poder como constitutiva da vida social concebendo os indivíduos como transmissores que o poder perpassa sendo, assim, “efeitos de poder”.

O poder deve ser analisado como algo que circula, ou melhor, como algo que só funciona em cadeia. Nunca está localizado aqui ou ali, nunca está nas mãos de alguns, nunca é apropriado como uma riqueza ou um bem. O poder funciona e se exerce em rede. Nas suas malhas os indivíduos só circulam mas estão sempre em posição de exercer este poder, são sempre centros de sua transmissão (FOUCAULT, 2003, p. 183).

Foucault afirma que o poder penetra na vida cotidiana não se fixando nas relações estatais, essa característica denominada “micro-poder”. Analisa também que esses “micro-poderes” possuem uma história específica e se relacionam com o poder presente no aparelho do Estado. Essas duas modalidades de poder se articulam - os micro-poderes não são subordinados ao poder estatal -, se intercruzam - mas não são

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interdependentes - nos diversos níveis das relações sociais.

Muitas vezes o poder é associado à dominação, aqueles que possuem poder dominam outros indivíduos que, por sua vez, são destituídos de qualquer forma poder. Identificar poder e dominação é muito comum, porém nem toda relação de poder envolve dominação. Não é correto considerar que “(...) toda relação política envolve necessariamente uma relação de dominação” (PARANHOS, 2000, p.59).

Avançando mais ainda nessa questão, pensar o poder no sentido de dominação o conota como algo perverso e negativo. Nesse sentido Foucault discorre acerca dessa problemática, diz que deve-se

(...) deixar de descrever sempre os efeitos de poder em termos negativos: ele ‘exclui’, ‘reprime’, ‘recalca’, ‘censura’, ‘abstrai’, ‘mascara’, ‘esconde’. Na verdade o poder produz; ele produz realidade, produz campos de objetos e rituais da verdade. O indivíduo e o conhecimento que dele se pode ter se originam nessa produção (FOUCAULT, 1977, p. 172).

O poder não é apenas dominação, mas também produção, é a partir dessas relações que a realidade se configura. As relações de poder estão presentes em toda vida social, na igreja, na família, no namoro, na escola, no Estado, na indústria, nos hospitais, etc.

Foucault pesquisou e descreveu o papel do poder, especificadamente a disciplina, na formação histórica de instituições como o presídio, o hospital, a escola e a fábrica.

Nessa perspectiva, “(...) o poder e o saber produzidos pelas normas disciplinares são fundamentais para a organização burocrática. Em uma sociedade de instituições burocratizadas como a nossa, o poder disciplinar se desenvolve em todo tecido social” (KRUPPA, 1994, p. 102).

Sobre esse poder disciplinador direcionado especificadamente para a escola, pode-se constatar a predominância de mecanismos de vigilância (disciplinadores) sobre a questão qualitativa da construção do saber educacional. O ensino é sobreposto pela vigilância.

3- ESCOLA E DISCIPLINA: RELAÇÕES DE PODER

Posteriormente a conceituação de poder já apresentada, vale, neste momento, visualizar o poder da disciplina presente nas instituições escolares. Nelas existem mecanismos que efetivam a disciplinarização dos indivíduos que a compõe.

Segundo Foucault (1977, p. 126), esses mecanismos “(...) permitem o controle minucioso de operações do corpo, que realizam a sujeição constante de suas forças e lhes impõem uma relação de docilidade - utilidade são o que podemos chamar as ‘disciplinas’”. Continuando a

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discorrer sobre essa questão afirma que a “(...) disciplina fabrica assim corpos ‘dóceis’. A disciplina aumenta as forças do corpo (em termos econômicos de utilidade) e diminui essas mesmas forças (em termos políticos de obediência).”

Foucault (2003, p. 182), oferece referências que permitem “(...) captar o poder em suas extremidades, em suas últimas ramificações. Lá onde se torna capilar; captar o poder nas suas formas e instituições mais regionais e locais (...)”, e por conseqüência, analisar a escola como o lugar onde o poder disciplinar produz saber, mantém-se, é aceito e praticado por todos os membros da instituição escolar numa relação hierárquica.

Exercer pressão constante sobre os alunos para que todos dêem atenção nos estudos façam as tarefas e respeitem as normas é parte de um sistema punitivo com função normalizadora. O normal se estabelece como princípio de coerção e com ele o poder de regulamentação.

3.1- O espaço físico: a escola-prisão

A disciplina exige um espaço específico para seu exercício, um espaço no qual os indivíduos possam ser vigiados nos seus atos, que tenham seu lugar específico para visualizar seu comportamento para poder sancioná-lo ou medir suas qualidades.

O espaço deve ser visto como algo útil e funcional a escola deve ser dividida através de séries e classes e as mesmas individualizarem os alunos através da disposição em filas o que facilita a vigilância e o controle. O professor visualiza os alunos, pois cada um se define pela sua posição na classe, nesse sentido “(...) a sala de aula formaria um grande quadro único, com entradas múltiplas, sob o olhar cuidadosamente ‘classificador’ do professor” (FOUCAULT, 1977, p. 135).

A exigência da distribuição das classes em fileiras, com alunos em ordem e uniformizados tem como objetivo garantir a obediência dos alunos, e uma melhor utilização do tempo. Cria espaços funcionais e hierárquicos, “(...) trata-se de organizar o múltiplo, de se obter um instrumento para percorrê-lo e dominá-lo, trata-se de lhe impor uma ‘ordem’” (FOUCAULT, 1977, p. 135).

A comparação física das escolas e das prisões procede de acordo com sua composição arquitetônica. Classes distribuídas lado a lado sem nenhuma comunicação, grandes nas janelas, refeitório comunitário, muros altos e com grades, portões sem nenhuma visibilidade com o lado externo à escola.

A construção das escolas obedecem a quase todas essas disposições e com uma peculiaridade importante, a posição da sala da diretoria permite ter uma visão global de todo estabelecimento, um “olhar

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panóptico” - uma construção que se aproxima ao Panóptico de Bentham[5]. O panoptismo é característica das prisões mas, certamente, está presente nas instituições escolares. Mesmo que não apresente efetivamente todas as características descritas, a funcionalidade do posicionamento da sala da diretoria e supervisão remetem a uma forma de vigilância efetiva. Nas escolas as práticas transgressoras são “registradas” na forma de “ocorrências”[6], estas relatam as ações dos alunos e dos professores que, posteriormente são arquivadas e avaliadas. Através dessas “ocorrências”, ambos podem ser suspensos ou expulsos (no caso dos professores, são exonerados do cargo por serem funcionários públicos) dependendo da gravidade do ocorrido.

A escola torna-se “(...) um espaço fechado, recortado, vigiado em todos os seus pontos, onde os indivíduos estão inseridos num lugar físico onde os menores movimentos são controlados onde todos os acontecimentos são registrados (...)” (FOUCAULT, 1977, p. 174). Esse tipo de vigilância permite a diretoria um controle sobre todas as movimentações na escola: quem está no corredor, quem vai ao banheiro, a classe “indisciplinada” e outros mais.

O poder disciplinar exercido através da configuração arquitetônica e, da mesma forma, o controle da diretoria sobre o professor e o aluno através do “olhar panóptico” demonstra de forma veemente como a disciplina faz “(...) funcionar o espaço escolar como uma máquina de ensinar mas também de vigiar, de hierarquizar, de recompensar” (FOUCAULT, 1977, p. 134).

3.2- Os mecanismos de controle e punição

Nas reuniões da diretoria com professores, o centro dos discussões centrava-se em elaborar meios ou mecanismos para os alunos estudarem de maneira disciplinar e, cumprir com a programação anual.

A diretoria, de forma contundente, exige o cumprimento de todo o horário de aula, pois os professores como funcionários devem produzir sua tarefa e, de forma hierárquica “obrigar” os alunos a se adequarem a esse sistema. Deve garantir que as individualidades se integrem a uma funcionalidade “orgânica”, ou seja, que funcionem como um organismo com atividades controladas e codificadas.

De acordo com Foucault (1977, p. 141), “(...) o corpo, do qual se requer que seja dócil até em suas mínimas operações, opõe e mostra as condições de funcionamento próprio a um organismo. O poder disciplinar tem por correlato uma individualidade não só analítica e ‘celular’, mas também natural e ‘orgânica’.”

O horário esgotado e totalmente utilizado requer do professor um controle bastante rígido. A configuração espacial - como já apresentado -

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permite esse controle, um olhar disciplinador e consistente.

Não basta apenas o cumprimento do horário por parte dos professores e alunos, “(...) procura-se também garantir a qualidade do tempo empregado: controle ininterrupto, pressão dos fiscais, anulação de tudo que possa perturbar distrair; trata-se de constituir um tempo integralmente útil (...)” (FOUCAULT, 1977, p. 137).

A diretoria fiscaliza se o professor está utilizando o tempo de maneira proveitosa e este fiscaliza o aluno e o vigia para que cumpra com sua tarefa.

Como Foucault (1977, p. 155-156) específica, o “(...) edifício da Escola devia ser um aparelho de vigiar (...)”, mas esse aparelho necessita para a eficácia da disciplina de uma vigilância hierárquica, “(...) o olhar disciplinar teve de fato, necessidade de escala (...). É preciso decompor suas instâncias, mas para aumentar sua função produtora. Especificar a vigilância e torná-la funcional.”

Nessa perspectiva a vigilância se efetiva na escola com a presença do diretor, dos vice-diretores, da supervisão pedagógica, da orientação educacional, dos professores e finalmente dos alunos.

Essa hierarquia fundamenta um controle, “(...) um poder que, em vez de se apropriar e de retirar, tem como função maior ‘adestrar’; ou sem dúvida adestrar para retirar e se apropriar ainda mais e melhor” (FOUCAULT, 1977, p. 153).

Esse poder disciplinar não procura reter as forças, mas sim interligá-las, multiplicá-las e utilizá-las, sua consolidação utiliza-se dessa vigilância hierárquica e outros meios coercitivos de punição.

A entrada na escola dos alunos só é permitida se estiverem uniformizados, já na portaria entregam uma “carteirinha” de identificação para fiscalização do comparecimento, os alunos só podem sair da classe em horário de aula munidos com o cartão do professor, essas são algumas das normas sobre circulação no interior do estabelecimento escolar.

Esse controle rigoroso aliado a outras regulamentações forma um sistema punitivo, este, composto por dispositivos disciplinares que fazem funcionar normas gerais da educação. Essas normas permitem a medicação dos desvios e a redução desses se daria pela aplicação de

“(...) micropenalidades do tempo (atrasos, ausências, interrupções das tarefas), da atividade (desatenção, negligência, falta de zelo), da maneira de ser (grosseira, desobediência), dos discursos (tagarelice, insolência), do corpo (atitudes incorretas, gestos não conformes, sujeira), da sexualidade (imodéstia,

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indecência) (FOUCAULT, 1977, p. 159).

São inúmeros os exemplos que caberiam nessas colocações, no cotidiano escolar esses fatos permeiam a maioria das relações. Constatada a transgressão à norma, a penalidade é uma conseqüência lógica.

(...) trata-se ao mesmo tempo de tomar penalizáveis as frações mais tênues da conduta, e de dar uma função punitiva aos elementos aparentemente indiferentes do aparelho disciplinar: levando ao extremo, que tudo possa servir para punir a mínima coisa; que cada indivíduo se encontre preso numa universalidade punível-punidora (FOUCAULT, 1977, p. 159).

O receio dos alunos quanto às sanções que vão receber caso infrinjam as normas, demonstra a eficácia das penalidades, e o funcionamento da engrenagem do sistema punitivo. Essas punições são expressas através de suspensões, expulsões, reunião com os pais, redução nas notas, mudança de classe e, dependendo da gravidade, ocorrência policial.

Essas formas de punição fazem parte de um sistema duplo que Foucault chama de “gratificação-sanção”[7].

Esse sistema consiste em tornar operante a correção dos alunos no tocante às relações em sala de aula. O professor deve utilizar mais de gratificações do que de sanções, pois os infratores serão incitados a procurar mais as recompensas e se afastarem das penalidades garantindo assim, que os comportamentos se inclinem na busca por gratificações e reconhecimento.

Todo ano a diretoria da escola promove uma premiação, com medalhas e certificados, para os “melhores” alunos do ano, aqueles com melhores notas e comportamentos disciplinares exemplares.

O poder disciplinar usa como forma de coerção uma relação que compara os melhores e piores alunos, construindo essencialmente, uma relação hierárquica de qualidades. Essa hierarquização não remete somente aos alunos dentro de uma classe, ela existe entre as classes ( Ibid., p. 166). Na escola existem classes “boas” e classes “ruins”, ou seja, as classes são classificadas dessa forma porque os alunos que a integram possuem essas qualificações. A mudança de classe, de sair de uma posição “vergonhosa” para uma “posição honrosa” reforça ainda mais o poder disciplinar da instituição escolar.

Outro mecanismo indicador do poder disciplinar nas escolas é o exame ou provas. Através dele o professor conhece seus alunos, descritos, mensurados, comparados a outros, treinados, classificados, normalizados. “O exame combina as técnicas da hierarquia que vigia e a sansão que normaliza. É um controle normalizante, uma vigilância que permite qualificar, classificar e punir” (FOUCAULT, 1977, p. 164).

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Nas escolas, a aplicação do exame envolve todo um ritual desde a padronização de sua estética até a conduta disciplinar e temporal. Os exames são aplicados em classes com alunos em ordem alfabética, enfileirados, com um horário mínimo para término, com a proibição de qualquer conversa ou gestos. O exame deve ser feito de maneira sistemática e objetiva. Esse ritual renova constantemente o poder, demonstra a força que a disciplina possui no cotidiano escolar. O exame compara os alunos e permite analisá-los e se necessário, sancioná-los.

Através dele, obtém-se o conhecimento sobre o aluno, sobre suas aptidões e deficiências, sobre sua evolução ou desvio ao mesmo tempo de transmissão do saber, esse método pressupõe “(...) um mecanismo que liga um certo tipo de formação de saber a uma certa forma de exercício do poder” (FOUCAULT, 1977, p. 166).

Pode-se dizer que o exame constitui-se uma das peças fundamentais para a edificação da pedagogia (Ibid., p. 166).

De maneira geral pode-se afirmar que na escola o poder disciplinar torna-se natural e legítimo. A construção de um saber qualitativo na educação, de ações e projetos pedagógicos é sobreposta pelo caráter disciplinar das escolas.

O educar significa ensinar, qualificar, esclarecer mais também, disciplinar, vigiar, punir.

4- CONCLUSÃO

Essas qualificações do caráter educativo das escolas constatadas através da vivência com alunos e das reuniões pedagógicas freqüentes demonstram como os alunos se habituaram com o sistema disciplinar e legitimam a eficácia desse poder.

As reuniões entre diretoria, pais e professores são transformadas em seções de queixas disciplinares, em constatações e repressão dos alunos “desviados” no ambiente escolar.

A contribuição de Foucault é fundamental para o entendimento dessas questões presentes na escola, pois é a partir dela que a realidade efetiva se clareia, que as relações de poder cotidianas ganham seu devido status.

A escola passa a constituir-se num observatório político, num aparelho que permite o conhecimento, o controle perpétuo de seus componentes, através dos diretores, dos professores, dos funcionários e dos próprios alunos. Essa relação hierárquica induz todos a se sentirem sempre vigiados e controlados.

A escola e suas técnicas disciplinares fazem com que os indivíduos aceitem o poder de punir e de serem punidos.

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Nessa perspectiva, o poder disciplinar conquista um lugar privilegiado nos discursos e nas ações, sendo a principal personagem das relações que compõe o universo escolar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FOUCAULT, M. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 2003.

_____________. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 1977.

KRUPPA, S. M. P. Sociologia da educação. São Paulo: Cortez, 1994.

MAAR, W. L. O que é política. São Paulo: Brasiliense, 1986.

PARANHOS, A. Política e cotidiano: as mil e uma faces do poder. In: MARCELLINO, N. C. (org.) Introdução às Ciências Sociais. Campinas: Papirus, 2000.

WEBER, M. A Política como Vocação. In: Ensaios de sociologia. Rio de Janeiro: Zahar, 1974.

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Última atualização: 01 dezembro, 2004.

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Educ. Soc., Campinas, vol. 29, n. 105, p. 197-217, jan./abr. 2009 197 Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br>

Flávia Vieira PARA UMA VISÃO TRANSFORMADORA

DA SUPERVISÃO PEDAGÓGICA FLÁVIA VIEIRA2

RESUMO: O principal objectivo do texto é propor uma visão transformadora da supervisão pedagógica inscrita em valores da democracia, pressupondo que as finalidades e a natureza das práticas supervisiva e pedagógica devem estar articuladas e que ambas devem inscrever-se numa direcção emancipatória. Num primeiro momento, apresenta-se uma proposta de conceptualização da relação entre supervisão e pedagogia, defendendo-se a sua indissociabilidade e um conjunto de princípios que as podem orientar numa direcção potencialmente emancipatória. Num segundo momento, discutem-se condições que favorecem ou limitam a operacionalização desta direcção, tomando-se o exemplo de um projecto supervisivo em curso da Universidade do Minho desde 1995. O projecto ilustra potencialidades, constrangimentos e paradoxos da supervisão pedagógica como prática situada entre a reprodução e a transformação da ordem social implícita nos contextos de intervenção. Palavras-chave: Supervisão. Pedagogia. Formação de professores. Transformação. Emancipação. TOWARDS A TRANSFORMATIVE VISION OF PEDAGOGICAL SUPERVISION

ABSTRACT: The main purpose of this paper is to propose a transformative vision of pedagogical supervision within a democratic value framework based on the assumption that the goals and the nature of supervisory and pedagogical practices should be articulated and that both should be empowering. A proposal for conceptualizing the relation between supervision and pedagogy is presented, which assumes that they cannot be dissociated and should be oriented towards empowerment through a set of guiding principles. Conditions that favor and hamper this direction are then discussed on the basis of a supervision project that has been developed at the University of Minho since 1995. This project illustrates the potential value, constraints and paradoxes of supervision as a practice that stands between the reproduction and the transformation of the social order that is implicit in the contexts of intervention. Keywords: Supervision. Pedagogy. Teacher’s education. Transformation. Empowerment. Propósitos do texto

O presente texto defende uma visão transformadora da supervisão pedagógica, pressupondo que as finalidades e a natureza das práticas supervisiva e pedagógica devem estar articuladas e que ambas devem inscrever-se numa direcção emancipatória. Inicialmente, apresenta-se uma proposta de conceptualização da relação entre supervisão e pedagogia, evidenciando a sua indissociabilidade e alguns princípios que as podem orientar 2 Professora do Centro de Investigação em Educação, do Instituto de Educação e Psicologia da Universidade do Minho (Braga, Portugal). E-mail: [email protected]

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naquela direcção. Na sequência, discutem-se possibilidades de operacionalização do quadro ético-conceptual proposto, tomando-se o exemplo de um projecto supervisivo em curso da Universidade do Minho desde 1995, desenvolvido com estagiários no campo da educação em línguas, no ano final da sua licenciatura em ensino. 1 Ao longo da minha história profissional de formadora e investigadora da formação, tenho aprendido a desconfiar da razoabilidade e ressonância dos discursos educacionais construídos à margem das escolas e dos professores, ou até à sua custa, valorizando aqueles que se constroem em estreita relação com a experiência dos professores.

Ainda assim, e embora as ideias apresentadas neste texto integrem uma teoria da acção supervisiva que resulta do trabalho com supervisores e professores no campo da educação em línguas, há razões para colocar em dúvida a sua consistência e impacto, e uma das minhas intenções é também evidenciar constrangimentos e paradoxos que afectam a sua operacionalização e que configuram a relação entre supervisão e pedagogia como um fenómeno sempre local e inacabado, marcadamente ideológico, situado entre a reprodução e a transformação da ordem social implícita nas situações de intervenção.

Supervisão e pedagogia: proposta de conceptualização Supervisão e pedagogia: breve definição de termos

No domínio educacional, a noção de supervisão tem uma herança histórica associada

às funções de inspecção e controlo (Duffy, 1998; McIntyre & Byrd, 1998), apesar da viragem radical operada com o movimento da supervisão clínica, iniciado nos Estados Unidos a partir da década de 1960 e introduzido em Portugal por Alarcão na década de 1980 (Alarcão, 1982). No contexto do presente trabalho, afastamo-nos de uma concepção institucional da supervisão como processo de gestão organizacional associado à noção de “escola reflexiva” (Alarcão, 2001), que não tem tradição no nosso país, e definimos a supervisão como teoria e

prática de regulação de processos de ensino e de aprendizagem em contexto educativo

formal, instituindo a pedagogia como o seu objecto. Esta definição abrange práticas de auto-supervisão e supervisão acompanhada, mas é sobretudo às segundas que nos referiremos ao longo do texto, em particular no contexto do estágio em formação inicial.

Opta-se por falar em pedagogia e não em didáctica ou metodologia de ensino pela abrangência transdisciplinar do primeiro termo, bem visível na pequena grande obra de Paulo Freire, intitulada Pedagogia da autonomia – saberes necessários à prática educativa (2002), onde o pedagogo apresenta 27 dimensões essenciais à compreensão do acto educativo como projecto praxeológico, epistemológico, ontológico e ideológico. Ao centrar-se no ensino e aprendizagem de conhecimentos disciplinares específicos, as didácticas ou metodologias de ensino têm produzido um conhecimento relativamente fragmentado sobre a educação escolar, mostrando alguma dificuldade em promover aquilo que Correia (1999, p. 22) descreve como uma “‘racionalidade comunicacional’, isto é, uma racionalidade construída na troca entre (…) as diferentes linguagens e concepções disciplinares do trabalho”. Segundo o autor, as “novas didácticas” necessárias à “invenção de consensos possíveis entre determinantes intrínsecas a cada um dos ramos do saber” deslocariam o seu eixo de referência para as “determinantes da acção educativa, que é sempre o resultado de uma dinâmica interdisciplinar, mesmo quando gerida por um único professor” (idem, ibid.).

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O termo “pedagogia” pode talvez responder melhor a este desafio, evitando uma redução do campo da reflexão didáctica às dimensões mais directamente afectas ao conteúdo substantivo das disciplinas escolares. A supervisão e a pedagogia comportam uma componente conceptual e outra experiencial, cuja integração resulta no que podemos designar como praxis, definida por Van Manen (1990, p. 128) como “thoughtful action: action full of thought and thought full of action”. Sendo actividades profissionais, teorizá-las implica construir teorias práticas ou teorias de acção, de orientação normativa, as quais apresentam duas faces: teoria perfilhada e teoria-em-uso, cujas (in)congruências importa desocultar e analisar, no sentido de compreender que factores elevam ou reduzem o seu potencial transformador, e também no sentido de reformular a própria teoria e a realidade que ela cria (Argyris & Schön, 1974).

Embora as teorias que mais determinam as opções de quem pratica a supervisão e a pedagogia sejam aquelas que os profissionais constroem em estreita relação com a sua acção local, as teorias públicas desempenham um papel regulador e explicativo, reflectindo e promovendo intencionalidades e posicionamentos face ao mundo, e condicionando as possibilidades de resignificação da realidade (Segall, 2004). Na verdade, todo o conhecimento educacional é ideologicamente marcado e, portanto, pedagógico, ainda que não seja intencionalmente pedagogizado. Como afirma Alves (2003, p. 35), “Todo pensamento sai do nosso ventre, como o fio da teia. Cada teoria é um acessório da biografia, cada ciência, um braço do interesse”. É este também o caso do presente texto.

Supervisão e pedagogia: que relação?

Na medida em que a supervisão permite a regulação da qualidade da pedagogia, ela

representa uma condição da sua compreensão e renovação. Isto significa que a pedagogia sem supervisão é menos pedagógica, tal como o será a supervisão sem uma visão da pedagogia. Na expressão “supervisão pedagógica”, o adjectivo reporta-se não apenas ao objecto da supervisão – a pedagogia –, mas também à sua função potencialmente educativa. Entende-se que a supervisão, quando orientada por uma visão crítica de pedagogia, torna a acção pedagógica mais consciente, deliberada e susceptível à mudança, permitindo o reconhecimento da sua complexidade e incerteza e impedindo a formulação de soluções técnicas e universais para os problemas “pantanosos” que nela se colocam (Schön, 1987).

Esta perspectiva prende-se com a natureza inefável da pedagogia, a qual obriga o educador a uma reflexão constante e continuada sobre aquilo que (não) torna a sua acção “pedagógica”: “If pedagogy were absent in a particular situation, how would we be able to tell the difference?” (Van Manen, 1990, p. 149). É a inefabilidade da pedagogia que exige (...) um atento e abrangente olhar supervisivo que contemple e atente ao perto e ao longe, ao dito e ao não dito, ao passado e às hipóteses de futuro, aos factos e às suas interpretações possíveis, aos sentidos sociais e culturais, à manifestação do desejo e à possibilidade/impossibilidade da sua concretização, ao ser e à circunstância, à pessoa e ao seu devir. (Sá-Chaves, 2000, p. 127)

Assim concebidas, as actividades supervisiva e pedagógica são indissociáveis e fazem parte de um mesmo projecto: indagar e melhorar a qualidade da acção educativa. Sempre que um educador regula a sua acção (auto-supervisão), as duas actividades fundem-se numa só, tornando-se praticamente indistinguíveis do ponto de vista epistemológico. Contudo, elas tendem a distinguir-se nos casos da supervisão pedagógica acompanhada, sobretudo quando a função da supervisão é exercida por alguém com um papel relativamente

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especializado (“supervisor”, “orientador”, “consultor”, “coordenador pedagógico”, “conselheiro crítico” etc.).

São estas situações de assimetria estatutária e funcional dos participantes do acto supervisivo que têm justificado um estudo mais aprofundado da teoria e prática da supervisão no contexto português, o que explica que a sua emergência e afirmação como área de conhecimento se associe fortemente à orientação da prática pedagógica em estágio, e que a criação de cursos de pós-graduação em supervisão pedagógica se tenha alicerçado na necessidade de formar os supervisores das escolas que acolhem os estagiários das instituições de ensino superior. No entanto, diria que a finalidade principal da supervisão acompanhada será ajudar os formandos a tornar-se supervisores da sua própria prática e que, se isso não acontecer, falhou no essencial: dotá-los da vontade e capacidade de (re)conceptualizarem o seu saber pedagógico e participarem, individual e colectivamente, na (re)construção da pedagogia escolar.

Supervisão pedagógica e transformação da educação

Enquanto actividade de natureza conceptual e experiencial, a pedagogia é movida, a

meu ver, por quatro forças estruturantes e interrelacionadas, frequentemente em tensão: visão <-> acção <-> reflexão <-> contexto. Transformar as teorias e práticas pedagógicas implica indagar e refazer o modo como estas forças se (des)articulam ou (re)forçam entre si. Esta será a principal função da supervisão pedagógica como prática de regulação. Nesta perspectiva, a transformação da educação exige um investimento sistemático e deliberado na reconstrução da visão de educação que orienta a acção educativa e também na problematização dos contextos de acção<->reflexão profissional. E é aqui que o contributo da supervisão acompanhada pode ser crucial: promovendo a reflexão crítica sobre as forças históricas e estruturais que condicionam a pedagogia; apoiando a construção colaborativa de uma visão da educação capaz de resistir ao poder erosivo dessas forças; interrogando as inúmeras formas de autoridade a que o educador está sujeito; orientando-o para a gestão da incerteza e da complexidade; questionando os interesses aos quais a escola serve; mantendo a esperança na possibilidade de melhorar as condições irracionais, injustas e insatisfatórias da educação.

Não se trata, portanto, de uma supervisão qualquer, mas sim de uma supervisão de natureza transformadora e orientação emancipatória, potencialmente transgressora e subversiva, assente nos valores democráticos da liberdade e da responsabilidade social, que é capaz de reconhecer a ausência e reclamar a (maior) presença desses valores nas práticas

da educação escolar, e também nas suas próprias práticas. Trata-se de uma supervisão que se move lentamente entre o que a educação é e o que deve ser, explorando o possível, mas duvidando sempre do seu próprio valor, e encontrando nessa dúvida a sua principal razão de ser. Waite (1995, p. 87) e Glickman et al. (2004, p. 8) usam as grafias superVisão e SuperVisão para sublinhar a necessidade de construir uma visão comum do que a educação deve ser, defendendo uma prática supervisiva colegial e dialógica, orientada para a construção de uma sociedade democrática e assente numa concepção do ensino como acto moral e político. Entende-se que uma pedagogia para a autonomia se inscreve nesta concepção e constitui uma direcção defensável para a supervisão, promovendo nos professores e nos seus alunos “a competência para se desenvolverem como participantes autodeterminados, socialmente responsáveis e criticamente conscientes em (e para além de) ambientes educativos, por referência a uma visão da educação como espaço de

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emancipação (inter)pessoal e transformação social” (Jiménez Raya ET al., 2007, p. 1). Só esta visão de educação garantirá que a autonomia do educador se construa em estreita ligação com a autonomia dos educandos e não à sua margem, instituindo a autonomia como interesse colectivo.

No cenário proposto, podemos avançar alguns princípios reguladores de uma prática supervisiva de natureza transformadora e orientação emancipatória (Vieira, 2006, p. 31):

• Articulação entre prática reflexiva e pedagogia para a autonomia, com reflexos na

definição das finalidades, conteúdos e tarefas da supervisão; • Indagação de teorias, práticas e contextos como condição de criticidade, necessária

a que o professor se torne consumidor crítico e produtor criativo do seu saber profissional; • Desenho, realização e avaliação de planos de intervenção, onde o professor desafie

os limites da sua liberdade e explore campos de possibilidade no ensino e na aprendizagem, por referência a uma visão transformadora da educação escolar;

• Criação de espaços de decisão do professor e de condições para que este assuma papéis potencialmente emancipatórios, por referência a critérios como a reflexividade, a (inter)subjectividade, a negociação e a regulação;

• Promoção da comunicação dialógica, através do cruzamento de experiências, interesses, expectativas, necessidades e linguagens, num processo interactivo que se caracteriza por um elevado grau de contingência, simetria e democraticidade, facilitador da construção social do saber;

• Avaliação participada dos processos e resultados do desenvolvimento profissional e da acção pedagógica, mediante critérios de qualidade definidos à luz de uma visão transformadora da educação.

O projecto que a seguir se apresenta explora estes princípios, não sem obstáculos e limitações.

Possibilidades de transformação: o caso de um projecto

Génese e natureza do projecto

O projecto de supervisão aqui referido tem sido desenvolvido com colegas do Departamento de Metodologias da Educação da Universidade do Minho, no âmbito do estágio pedagógico na educação em línguas (Inglês e Alemão; v. nota 1), desde 1995 (Moreira, 2006; Moreira et al., 1999 e 2006). Embora procure aproximar-se da visão de supervisão defendida, ilustra igualmente alguns dos constrangimentos e paradoxos inerentes à sua operacionalização neste contexto de formação, os quais poderão ser comuns a iniciativas análogas.

Na génese do projecto, estiveram dois estudos realizados por duas formadoras da equipa no âmbito de provas académicas, nos quais se explorou a possibilidade de desenvolver a autonomia dos alunos na aprendizagem de uma língua estrangeira (Vieira, 1996; 1998) e as potencialidades da investigação-acção como estratégia de formação reflexiva de professores de língua estrangeira em estágio (Moreira, 1996; 2001). Na sua génese esteve também a consciência da equipa de que, na instituição a que pertence, não existia (e não existe ainda), verdadeiramente, um projecto consistente para a supervisão no estágio, verificando-se alguma ambiguidade nas suas finalidades e estratégias e na visão de educação que promove. Tal como noutros países, a formação inicial de professores tem

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estado fortemente associada à tradição racionalista técnica da formação profissional, subvalorizando uma epistemologia da prática e mantendo um divórcio maior ou menor entre as universidades e as escolas. Na verdade, este divórcio simplifica o trabalho dos formadores universitários, pois, como Argyris e Schön já afirmavam, há mais de três décadas, “the practical tends to have been separated from the theoretical not because it is easy but because it is so difficult to understand” (1974, p. 195).

Numa perspectiva de maior integração entre teoria e prática, o conhecimento construído na supervisão pedagógica será essencial à validação e revisão das teorias perfilhadas pela academia, e não um subproduto dessas teorias. Isto significa que a actividade dos supervisores deve articular objectivos de formação e de investigação, contribuindo para o desenvolvimento do conhecimento supervisivo e pedagógico. Assim, e com base nos estudos acima referidos, a equipa desenhou um projecto que procura promover e investigar processos de formação reflexiva dos estagiários em articulação com uma pedagogia para a autonomia no ensino de línguas, recorrendo à investigação-acção como estratégia formativa. Os seus objectivos são: problematizar contextos pedagógicos e de formação; indagar teorias (e) práticas pedagógicas; promover uma pedagogia centrada nos alunos e na aprendizagem; valorizar a autodirecção e a colaboração no desenvolvimento profissional; promover um posicionamento crítico face à profissão. A concretização destes objectivos pode ser facilitada pela condução de projectos de investigação-acção, na medida em que esta tem uma orientação prática e situacional, valoriza a construção participada do conhecimento, direcciona-se para a mudança e melhoria da acção, centra-se no desenvolvimento integrado do professor e dos alunos e visa a promoção da sua autonomia. Globalmente definida como uma actividade de questionamento sistemático das práticas para uma melhoria da racionalidade e justiça das mesmas e dos contextos em que decorrem (Carr & Kemmis, 1986), a investigação-acção articula-se com os princípios supervisivos acima propostos.

As noções de “ensino como investigação” e “professor-investigador” têm implicações nos papéis dos estagiários, elevando o seu controlo sobre a produção de conhecimento pedagógico e a renovação de práticas. Defende-se o seu envolvimento na indagação crítica da experiência de formação e de ensino de línguas, com o apoio dos supervisores, funcionando a investigação-acção como estratégia de (auto-)formação ao serviço de uma pedagogia que crie espaços pedagógicos para a reflexão dos alunos sobre a língua e o processo de aprendê-la, a experimentação de estratégias (meta)cognitivas e sócio-afectivas, a regulação das aprendizagens e a negociação de sentidos e decisões.

Importa sublinhar que o nosso propósito não é formar professores-investigadores, mas sim professores reflexivos, com predisposição e capacidade para:

• Compreender a educação em línguas e o seu papel no currículo; • Compreender a teoria e a prática de uma pedagogia para a autonomia no ensino de

línguas; • Conceber o ensino de línguas como uma actividade indagatória e exploratória; • Desafiar rotinas, convenções, tradições (ser subversivo/a, se necessário); • Partilhar teorias e práticas pedagógicas com os pares; • Encorajar os alunos a assumir posições críticas face a valores e práticas sociais e

educativos, envolvendo-os na procura de soluções adequadas (embora não necessariamente ideais);

• Partilhar teorias pedagógicas, responsabilidades e decisões com os alunos;

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• Reconhecer e aceitar que os alunos podem não pensar como o/a professor/a e que nem sempre é fácil, ou até desejável, chegar a uma única conclusão ou ponto de vista;

• Articular a dimensão pessoal da aprendizagem com a natureza social e interactiva da cultura da sala de aula;

• Promover a comunicação, onde todos têm o direito de se expressar e de contribuir para a co-construção de sentidos;

• Recolher informação dos/sobre os alunos, de modo a compreender os seus processos de aprendizagem e a sua evolução (por ex., através do diálogo, observação, questionários, entrevistas etc.);

• Analisar a informação recolhida com o objectivo de melhorar as práticas de ensino e de aprendizagem, envolvendo os alunos em processos de reflexão sobre essas práticas e negociação pedagógica;

• Integrar os alunos nas práticas avaliativas e encontrar formas de incorporar a sua competência de aprendizagem na avaliação global das aprendizagens (por ex., através da negociação de critérios de avaliação e da auto-avaliação).

O papel das supervisoras da equipa, em colaboração com os supervisores das escolas,

é apoiar o desenho, desenvolvimento e avaliação dos projectos de investigação-acção dos seus estagiários, definidos com base na análise dos contextos de acção e incidentes em áreas diversificadas da educação em línguas. Os projectos são documentados em portefólios individuais de natureza reflexiva, que incluem dados de avaliação do seu impacto nos professores e nos alunos. Na avaliação da estratégia supervisiva por parte da equipa, as principais fontes de informação são os portefólios dos estagiários e alguns estudos de investigação centrados em dimensões particulares do projecto. Essa avaliação tem permitido identificar potencialidades e limitações do trabalho desenvolvido, referidas no ponto seguinte.

Em suma, o projecto surgiu como uma tentativa de criar uma microcultura de

supervisão que se afastava das práticas institucionais mais correntes, não só pela direcção que procurava imprimir aos processos supervisivos e pedagógicos, mas ainda porque nele se articulavam objectivos formativos e investigativos, ou seja, a equipa dinamizadora passou a assumir uma postura investigativa face à sua prática supervisiva, promovendo, em simultâneo, uma atitude investigativa nos estagiários face à sua prática pedagógica, por meio da realização de projectos de investigação-acção em sala de aula. Assim se criavam condições para a construção progressiva e sustentada de uma teoria da acção supervisiva, em estreita articulação com uma teoria da acção pedagógica, ambas sujeitas a um escrutínio continuado.

Avaliação de práticas: entre a reprodução e a transformação?

Uma das principais finalidades de uma formação reflexiva é a interrogação da visão

de educação que subjaz às práticas de ensino, assim como dos contextos em que elas se realizam, nomeadamente no sentido de desocultar as forças históricas e estruturais que condicionam o nosso pensamento e acção e encontrar alternativas que se afigurem mais satisfatórias. Nesse sentido, a supervisão pedagógica pode ser entendida como uma actividade de problematização da realidade e imaginação de possibilidades, ou ainda, como “um jogo de subversão de regras (...), onde o prazer de jogar reside em transgredir o que torna as práticas educativas irracionais e injustas, instituindo princípios que as tornem mais

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racionais e justas” (Fernandes & Vieira, 2006, p. 234). Assim, um dos objectivos do projecto supervisivo em curso é promover a indagação e intervenção críticas, apoiando o desenho e a condução de planos de acção pedagógica que entram, muitas vezes, em choque com a cultura escolar instalada, nomeadamente pela adopção de uma abordagem que procura desenvolver a autonomia dos alunos e dos professores. Quando chegam às escolas, os estagiários detêm, usualmente, representações acerca do seu papel e do papel dos alunos que se aproximam genericamente do quadro de uma pedagogia para a autonomia, o que pode ser observado nas respostas que dão a um questionário inicial sobre as suas teorias pessoais, onde explicitam os princípios pedagógicos que defendem e rejeitam com especial convicção.

Para este posicionamento concorre alguma da sua formação académica anterior, em particular no âmbito das disciplinas de Metodologia de Ensino, onde se exploram os pressupostos e princípios de acção da abordagem proposta em estágio. Durante e após o desenvolvimento dos projectos, e apesar das diversas dificuldades que enfrentam, os estagiários avaliam positivamente a experiência de estágio, reconhecendo inúmeras potencialidades à investigação-acção como estratégia formativa que visa aliar um ensino reflexivo a uma pedagogia centrada nos alunos. Salientam ganhos importantes: a formação de profissionais mais conscientes e mais responsáveis; o desenvolvimento de uma atitude investigativa, crítica e reflexiva face à profissão; a reconceptualização de teorias e práticas pessoais; uma maior vontade e confiança na experimentação pedagógica; um maior conhecimento dos alunos e o desenvolvimento das suas competências de comunicação e de aprendizagem; a promoção da autonomia e emancipação profissionais (Moreira et al., 2006).

É surpreendente, e por vezes mesmo comovente, a forma entusiasta como estes jovens professores, após terem passado pelas dificuldades inerentes a um ano de estágio e sabendo que dificilmente encontrarão emprego, devido ao excedente de professores no sistema de ensino português, relatam as suas pequenas lutas por uma educação melhor, numa sessão que anualmente dinamizamos para os seus colegas em início de estágio. Sente-se na sua voz uma força interior que exteriorizam sem receios, dando conta dos dilemas sentidos e das conquistas alcançadas, encorajando os colegas e revelando na sua postura profissional que não há lugar à mudança sem esperança, uma vez que, e como diz Van Manen (1990), ter esperança significa acreditar na possibilidade. Contudo, e a par dos ganhos da abordagem supervisiva desenvolvida, a avaliação dos estagiários também tem permitido identificar constrangimentos de ordem cultural, metodológica e pessoal, relativos, por exemplo, às tradições do ensino e ao choque da realidade, à inexperiência profissional e às dificuldades inerentes à investigaçãoacção, à falta de hábitos de reflexão e de exposição ao outro, e aos receios associados à avaliação do seu desempenho. Assim, e embora reconhecendo o potencial transformador da abordagem, reconhecem igualmente problemas na sua operacionalização, evidenciando a existência de uma tensão permanente entre ideais e práticas.

A mesma tensão é identificada em estudos realizados por elementos da equipa sobre diferentes vertentes do projecto (v. Paiva et al., 2006), os quais apontam para a validação das nossas escolhas ético-conceptuais e metodológicas, mas também para a existência de factores que impõem limites à criticidade e à democraticidade dos processos formativos. Estes factores reportam-se, sobretudo, a circunstâncias paradoxais da prática supervisiva. Desde logo, verifica-se a existência do dilema emancipação-sujeição, criado pela contradição entre a intenção de promover a autonomia dos estagiários e o facto de actuarmos como uma espécie de modelo para o que (não) é aceitável pensar ou fazer em educação. Os

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efeitos deste paradoxo são acentuados pela assimetria experiencial e estatutária dos participantes, e ainda pela tensão latente entre apoio e avaliação no exercício das funções supervisivas. Tudo isso pode inibir uma relação de sinceridade ou fomentar atitudes de conformismo acrítico ou camaleónico como estratégia de sobrevivência, o que afecta, necessariamente, o potencial emancipatório da formação. O tempo constitui também um constrangimento particularmente significativo neste contexto formativo, onde a transição do papel de aluno a professor implica transformações complexas e descontínuas que se operam lentamente. Paradoxalmente, a necessária centralidade da experiência pedagógica nos processos supervisivos coloca fronteiras ao que é legítimo esperar, na medida em que a novidade e a urgência da prática dificilmente se conciliam com o tempo necessário à sua problematização, obrigando-nos a moderar as nossas expectativas enquanto supervisoras e, portanto, também os efeitos da nossa acção.

Contra a nossa intenção, o tempo adquire por vezes uma dimensão “empresarial” traduzida na procura de soluções rápidas para problemas técnicos, o que reduz a possibilidade de instaurar um “tempo público” (Giroux, 2007), desacelerado e assente num diálogo continuado de des/reconstrução do acto educativo, mais consonante com a inefabilidade e a complexidade da pedagogia, e mais potenciador de um olhar supervisivo expandido. Por outro lado, temos verificado, ao longo dos anos, que os tipos de intervenções didácticas desenvolvidas pelos estagiários nos seus projectos de investigação-acção, apesar de direccionados ao desenvolvimento da autonomia dos alunos, exploram pouco a sua dimensão política em comparação com a sua dimensão psicológica (Benson, 1997), focando-se principalmente na promoção de estratégias de aprendizagem associadas aos processos de compreensão e produção textuais.

Também aqui, paradoxalmente, a focalização nestes processos, essencial ao desenvolvimento da competência de comunicação dos alunos, acaba por desviar a nossa atenção de questões curriculares mais transversais, como o papel social da educação em línguas ou o papel dos programas e manuais escolares na determinação do conhecimento válido. Observa-se, ainda, alguma dificuldade na fundamentação teórica das estratégias de acção desenvolvidas, assim como na avaliação do seu impacto através da recolha e análise sistemáticas de informação, o que pode colocar em risco a consistência dos projectos e a perdurabilidade das aprendizagens profissionais. Por último, não é possível ignorar a força socializadora dos contextos profissionais, tendencialmente conservadores, em que esta formação decorre. Por um lado, o estágio coloca os estagiários entre dois mundos – o da comunidade académica de onde vêm e o da comunidade escolar em que começam a integrar-se no seu novo papel de professores. De notar que é na segunda comunidade, e não na primeira, que se inscreve o seu futuro e também grande parte do seu passado, o que favorece a sujeição às suas regras, mesmo quando estas transgridem a visão de educação defendida. Por outro lado, e porque o projecto assenta numa orientação emancipatória da supervisão que não é consensual na academia, torna-se difícil a sua afirmação nas comunidades universitária e escolar. Podemos mesmo dizer que as suas condições de emergência e sustentabilidade se têm consolidado num jogo de resistências que, em simultâneo, justifica a sua relevância social e fragiliza a sua expansão.

Em síntese, a avaliação do projecto tem-nos permitido compreender potencialidades e limitações de uma abordagem supervisiva que, visando a emancipação profissional dos estagiários e a transformação das práticas escolares, encontra obstáculos à concretização deste propósito. Na dinâmica visão <-> reflexão <-> acção <-> contexto, torna-se claro que os elementos “visão” e “contexto” entram frequentemente em conflito, condicionando a

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natureza, âmbito e impacto da reflexão para/sobre a acção e, também, necessariamente, a natureza, âmbito e impacto da acção. Assim, e reconhecendo que não poderemos “conferir à pedagogia uma autonomia que ela não tem” (Kuenzer, 2002, p. 64), na medida em que se inscreve num quadro sócio-educativo que instaura limites ao poder dos professores na sua transformação, devemos igualmente reconhecer que não poderemos conferir à supervisão

pedagógica uma autonomia que ela não tem. Face aos constrangimentos encontrados, devemos mesmo perguntar se ela serve a uma finalidade transformadora ou reprodutora, e se concorre para a assunção de posições críticas ou conservadoras.

A nossa resposta a este tipo de interrogação é cada vez mais re(ide)alista: tendo em conta a realidade com que nos deparamos e sem perdermos de vista os nosso ideais, procuramos criar culturas de possibilidadesignificativa, ou seja, ambientes de trabalho onde, simultaneamente,interrogamos os contextos de acção e nos ajustamos a eles, pensandoe actuando contra e a favor do sistema. Esta constatação remete-nos para a natureza ideológica da abordagem da equipa, a qualse situa algures entre o status quo e uma visão ideal de educação, ouentre a reprodução e a transformação, explorando a contradição como espaço de inquietação e potencial mudança. Admitindo que a transformação das relações sociais e produtivas não depende apenas da escola e exige a “coincidência entre transformação das consciências e das circunstâncias” (Kuenzer, op. cit., p. 77), cumpre-nos, na posição de formadoras, elevar, em nós e nos outros, a consciência das circunstâncias

como passo para a transformação de ambas, numa posição que não é apenas realista ou idealista, mas onde a realidade e os ideais se misturam na luta permanente e incerta por uma educação melhor.

E ainda... sobre a construção e distribuição do conhecimento

Podemos dizer que o projecto aqui discutido traduz uma forma de construir e divulgar conhecimento através da indagação crítica e (re)construção de teorias e práticas locais, contrariando uma visão aplicacionista da formação e a ideia do conhecimento supervisivo como subproduto de teorias académicas desenvolvidas à margem das escolas.

No entanto, é também aqui, nas questões da construção e divulgação do conhecimento, que reside um dos seus principais paradoxos. De facto, a teoria de acção supervisiva aqui apresentada decorre do trabalho de uma equipa que é realizado de uma

determinada posição, a de formadoras e investigadoras da formação, o que porventura nos distancia da pedagogia, mais do que o desejável. Apesar de ela constituir o centro da nossa acção supervisiva, só indirectamente surge no conhecimento produzido sobre essa acção, e dar-lhe outro destaque implicaria a parceria dos estagiários e dos supervisores das escolas na sistematização e divulgação desse conhecimento. Por outro lado, e embora estes sejam participantes centrais do projecto, têm um papel reduzido na (re)construção e disseminação de teorias e práticas da supervisão, tarefas estas que ficam, sobretudo, também a nosso cargo. Opera-se, dessa forma, uma divisão social de trabalho que acaba por conferir supremacia a um determinado tipo de conhecimento (supervisivo) e a determinados agentes de produção desse conhecimento (as supervisoras-investigadoras). Esta é, talvez, a principal limitação e obstáculo epistemológico do projecto, reflectindo a existência de uma contradição essencial entre a sua direcção emancipatória e o papel pouco expressivo de alguns dos seus intervenientes na sistematização e disseminação do saber pedagógico, assim como na (re)construção e disseminação do saber supervisivo.

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Embora a assimetria estatutária dos diversos participantes seja a explicação mais conveniente para esta situação, teremos de reconhecer que é uma explicação ideologicamente marcada por uma tradição académica que sempre relegou os professores das escolas para um plano secundário na produção e difusão do conhecimento educacional, criando, dessa forma, uma cegueira epistemológica a outras formas de construir e vulgarizar esse conhecimento, e também a outras formas de conhecimento para além das que são convencionalmente validadas e legitimadas pela academia. Para reconhecer e procurar superar esta cegueira, é necessário admitir que as actuais condições de produção e distribuição do conhecimento distorcem e mistificam a realidade, silenciando, em maior ou menor grau, as vozes daqueles que a experienciam em primeira mão e construindo discursos que, por muito prestígio que alcancem na comunidade científica, podem revelar-se pouco relevantes à transformação da educação e da sociedade. Portanto, e embora o nosso projecto pressuponha a participação de outros na reconstrução do saber educacional, teremos de aceitar que há ainda um longo caminho a percorrer na concretização de todas as implicações desse pressuposto, até que esses outros sejam parte de um nós.

Concluindo…

Ao longo deste texto, procurei defender uma visão transformadora da supervisão pedagógica, partindo de uma proposta transdisciplinar de conceptualização da relação entre supervisão e pedagogia e passando à discussão

de um projecto de supervisão desenvolvido com estagiários de línguas, em curso na Universidade do Minho há mais de uma década. O exemplo ilustra uma forma de operacionalização do quadro ético-conceptual proposto, evidencia formas de articulação entre a investigação académica e a actividade supervisiva, salienta o papel que a investigação-acção pode assumir, como estratégia de formação profissional ao serviço de uma pedagogia para a autonomia nas escolas, e traduz uma forma de construir e divulgar conhecimento através da indagação crítica e (re)construção de teorias e práticas locais. Em cada um destes aspectos, o projecto evidencia ainda um conjunto de constrangimentos e paradoxos que afectam uma orientação emancipatória na formação inicial de professores, possivelmente presentes em iniciativas análogas, os quais nos remetem para a dimensão ideológica da supervisão pedagógica como prática situada entre a reprodução e transformação da ordem social implícita nos contextos de intervenção.

Se a base experiencial das ideias aqui apresentadas eleva, potencialmente, a sua ressonância e razoabilidade, também será verdade que lhes impõe limites decorrentes das fronteiras do meu quadro conceptual, dos meus filtros interpretativos e, ainda, da natureza local das experiências que servem de suporte ao desenvolvimento das minhas teorias práticas. Porque as teorias práticas são simultaneamente âncoras e instrumentos de cristalização da acção, devemos obrigar-nos a um esforço continuado de autocrítica. Como afirmam Argyris e Schön (1974, p. 27), “one must treat his theory-in-use as both a psychological certainty and an intellectual hypothesis”. É dessa forma que as ideias aqui propostas e discutidas deverão também ser lidas: como convicções que, emergindo da acção e suportando a acção, terão de ser permanentemente interrogadas e revistas, e em cuja (in)certeza residirá a sua força transformadora. São, por isso mesmo, ideias fundadas na esperança, porque é esta que permite a possibilidade, negando qualquer noção de fechamento. Como diz Bauman (2007, p. 77), “a esperança é sempre a esperança de

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plenitude, mas o que mantém viva a esperança e assim conserva a existência aberta e em movimento é precisamente a sua incompletude”.

Nota 1. As licenciaturas em ensino da Universidade do Minho a que se reporta este

projecto, presentemente em fase de remodelação decorrente do Processo de Bolonha, têm a duração de cinco anos: quatro anos de formação académica em domínios da área de docência e da educação e um ano de estágio profissional, realizado pelos alunos estagiários em pequenos grupos, em escolas básicas e secundárias que têm um protocolo com a instituição. A supervisão do estágio é assegurada por dois supervisores de cada área disciplinar, um da escola de acolhimento e outro da universidade, podendo este último pertencer a departamentos da Especialidade ou da Educação. O projecto aqui referido abrange apenas os estagiários de Inglês e Alemão que, anualmente, são atribuídos à equipa que o tem dinamizado. Esta tem sofrido alterações ao longo dos anos, tendo até este momento contado com a participação, para além de mim, das colegas Maria Alfredo Moreira, Isabel Barbosa, Madalena Paiva, Isabel Sandra Fernandes, Graça Branco e Júlia Amaro. Referências ALARCÃO, I. Supervisão clínica: um conceito ao serviço da formação de professores. Revista

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