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Disciplina: Sistemas Fluidomecânicos Análise Dimensional - Semelhança

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Disciplina:Sistemas Fluidomecânicos

Análise Dimensional -Semelhança

Introdução

• A solução de muitos problemas da Mecânica dos Fluidos por métodos analíticos é em geral trabalhosa, e por vezes, impossível, devido ao grande número de variáveis.

• Devido a isto, foram desenvolvidos métodos experimentais que permitem produzir modelos matemáticos condizentes com a realidade.

Grandezas Fundamentais e Derivadas

• Grandezas fundamentais: grandezas independentes, a partir das quais podem ser relacionadas todas as demais. O conjunto dessas grandezas recebe o nome de base completa da Mecânica, e conforme o tipo de pesquisa a ser conduzida, pode ser a FLT (força, comprimento e tempo) ou a MLT(massa, comprimento e tempo).

• Por simplicidade e praticidade, será adotada a base completa FLT no material que se segue.

• Todas as demais grandezas que não fazem parte da base completa são denominadas de grandezas derivadas e são relacionadas com as grandezas fundamentais através de equações da Mecânica.

Exemplo 1

• Escreva a equação dimensional da viscosidade cinemática na base FLT (portanto massa será considerada como grandeza derivada).

� =�

� = �.��

��⇒ � = �.

��

��⇒ � =

�.��

��⇒ � =

��.�

��

=�. �

��

� =�

∀=

��∀

=�

�. ∀⇒ � =

��� . �

�=�. ��

��

Viscosidade cinemática: ni: mi: ro

� =�. �

��

� =�. ��

��

� =�

�=

�. ���

�. ��

��

=��

• Como FLT é a base utilizada, então

� = ��. ��. ���

: ni: mi: ro

Números Adimensionais

• Um número é adimensional quando independe de todas as grandezas fundamentais, isto é, sua equação dimensional apresenta expoente zero em todas as grandezas fundamentais (por exemplo, F0 . L0 . T0 ).

• O número de Reynolds é um número adimensional importante para a Mecânica dos fluidos. Este número é representado por Re, mas na análise dimensional os números adimensionais costumam ser representados pela letra grega .

Números Adimensionais e a Pesquisa Física

• Seja a determinação da força F de arrasto exercida por uma esfera lisa inserida em um escoamento.

• O pesquisador verificou esta força depende, qualitativamente, do diâmetro D da esfera, da velocidade V do escoamento e da massa específica e da viscosidade dinâmica do fluido.

F

V

D

• No laboratório, o experimento será conduzido em um túnel de vento (se o fluido for um gás) ou em um canal de prova (se o fluido for líquido), e a medida de força será efetuada por um dinamômetro.

• O experimento será feito para diversos diâmetros de esfera, sendo que, para cada diâmetro de esfera, serão feitas medidas da força de arrasto empregando uma ampla gama de velocidades de escoamento, tudo para um mesmo fluido.

• Após encerrada esta série de medidas, esta será repetida integralmente para uma gama de diferentes viscosidades, assim como para uma variedade de massas específicas.

• A pesquisa visa determinar analítica ou graficamente

� = � �, �, �, �

• O tempo consumido neste experimento seria grande, além de ser necessário superar diversas dificuldades de ordem prática, tais como obter fluidos de massa específica fixa e viscosidade variável.

• Diante das dificuldades dessa operação, vejamos como ela poderia ser simplificada em termos de tempo e recursos.

• Suponha a existência dos seguintes números adimensionais, contendo todas as variáveis do estudo:

�� =�

�. ��. ���� =

�. �. �

• Seja uma única esfera de diâmetro D e um único fluido de massa específica e viscosidade . Varia-se V e medem-se as variações de F no dinamômetro.

• Obtida uma tabela de F em função de V, pode-se tabelar 1 e 2.

Número de Reynolds

• Observe que estes números estão interligados pela existência da velocidade em ambas as expressões. Deste modo, para cada 1 existe um 2, sendo assim possível construir um gráfico 1 = f (2).

1

2

• Note que, como 1 e 2 são adimensionais, as coordenadas de cada ponto da curva independem dos valores individuais de F, D, V, , e . Assim, o fato de ter sido utilizado um único fluido e uma única esfera não tirará a generalidade da pesquisa.

1

2

• Cada ponto da curva envolve as infinitas combinações de valores das variáveis do fenômeno, e o problema da determinação da força de arrasto sobre a esfera fica assim resolvido.

�� =�. �. �

�� =�

�. ��. ��

100

0,4

Exemplo 2

• Determinar a força de arrasto F para uma esfera D = 10 mm em um escoamento de V = 0,01 m/s. Fluido água. Utilize os números adimensionais 1 e 2 apresentados anteriormente.

�� =�. �. �

�� =�

�. ��. ��

= 998 kg/m3

= 0,001 N.s/m2

100

0,4

Teorema dos

• Seja um fenômeno físico em que intervêm n variáveis x1, x2, x3, ..., xn, interligadas por uma função � ��, ��, ��, … �� = 0.

• Existe outra função � ��, ��, ��,…�� = 0, rigorosamente equivalente à anterior para o estudo do fenômeno indicado, onde:

a) Os i são números adimensionais independentes, construídos por combinações adequadas das grandezas ou variáveis influentes no fenômeno.

b) A quantidade de números adimensionais é m = n – r, onde né o número de grandezas envolvidas no fenômeno, e r é o número de grandezas fundamentais. Neste caso, r 3.

c) Os números adimensionais são obtidos por expressões do tipo

�� = ����. ��

��. … . ����. ����

�� = ����. ��

��.… . ��

��. ����

...

�� = ����. ��

��.… . ����. ��

• Note que em todos os adimensionais de um mesmo fenômeno, os primeiros r fatores são os mesmos com exceção dos expoentes.

• Este conjunto de r fatores é denominado de base das grandezas envolvidas. As grandezas da base devem ser independentes.

• Para sua escolha, escreve-se a equação dimensional de todas as grandezas e seleciona-se um número delas, de forma que cada uma difira da anterior por, pelo menos, uma grandeza fundamental.

• Por exemplo, num fenômeno em que existem as grandes fundamentais FLT, a base poderia ser constituída por

• � = �. ���. ��

• � = �. ���

• � = �

Independe de F que comparece em

Independe de T que comparece em V

• Neste grupo, L é um comprimento característico, por exemplo o diâmetro de uma esfera, a corda de uma asa, o comprimento de uma placa, etc.

• Quando esta trinca estiver presente entre as grandezas de um fenômeno, deverá ser preferida, pois a maioria dos adimensionais conhecidos dela tem origem (número de Reynolds, por exemplo).

• O último fator de cada adimensional será constituído de cada uma das grandezas não incluídas na base.

Exemplo 3

• Verificou-se em laboratório que a força de arrasto, que age numa esfera lisa que se movimenta num fluido, é dada por uma função do tipo � = � �,�, �, � . Determine a função de números adimensionais equivalente a função indicada.

• 1º passo: análise dimensional das grandezas que intervêm no fenômeno:

� = � � = �. ���. �� � = �. ���

� = � � = �. ���. �

• 2º passo: número de adimensionais independentes:� = � − �

• O número de grandezas envolvidas é 5 (�, �, �, �, �), portanto n = 5; a base completa da Mecânica empregada é a FLT, portanto r = 3 (número de grandezas fundamentais).

• Assim, m = 2.

• 3º passo: seleção das grandezas que integrarão os números adimensionais. Procura-se sempre selecionar inicialmente a trinca tradicional recomendada (�, �, �).

• 4º passo: Construção de adimensionais�� = ���. ���. ���. �

�� = ���. ���. ���. �

• 5º passo: Determinação dos expoentes e :�� = � ��. � ��. � ��. � = ��. ��. ��

�� = �. ���. �� ��. �. ��� ��. � ��. � = ��. ��. ��

�� = � ����. � ����������. � ��������� = ��. ��. ��

�1 = −1 �2 = −2 �3 = −2

Similarmente�1 = −1 �2 = −1 �3 = −1

• 6º Passo: Montagem dos adimensionais:

�� = ���. ���. ���. � =�

�. ��. ��

�� = ���. ���. ���. � =�

�. �. �

• A função equivalente será

��

�. ��. ��,

�. �. �= 0

Números Adimensionais Típicos

• Alguns exemplos de números adimensionais:

• Número de Reynolds: �� =�.�.�

• Número de Euler: �� =��

�.��

• Número de Freude: �� =��

�.�

• Número de Mach: � =�

�Escoamentos compressíveis

Relação entre forças de inércia e forças devido a aceleração da gravidade: escoamento superficial com ondas.

Relação entre forças de pressão e forças de inércia em escoamentos

Relação entre forças de inércia e forças viscosas em escoamentos

Semelhança ou Teoria dos Modelos

• Para que os resultados de grandezas medidas em ensaios com modelos em escala reduzida tenham valor prático em relação ao objeto de estudo em tamanho real (chamado aqui de protótipo), certas condições devem ser cumpridas:

1. Semelhança geométrica entre modelo e protótipo.

2. Semelhança cinemática entre modelo e protótipo, isto é, as velocidades das partículas de fluido homólogas deverão manter uma relação constante.

3. Semelhança dinâmica entre modelo e protótipo, isto é, as forças que agem em pontos homólogos devem manter relações constantes.

• Para que todas estas condições sejam obtidas, verifica-se que os números adimensionais referentes ao protótipo devem ser iguais aos referentes ao modelo. Nestas condições, diz-se que existe uma semelhança completa entre modelo e protótipo.

• Entretanto, isto nem sempre é possível, e dependerá da experiência do pesquisador associar ao protótipo os resultados obtidos através do modelo.

F

V

D

F

V

D

���

���=���

���= ⋯ =

����

modeloprotótipo

Escalas de Semelhança

• As escalas de semelhança são indicadas pela letra K:

• Escala geométrica: �� =��

��

• Escala de velocidades: �� =��

��

• Escala de viscosidades: �� =��

��

• Genericamente: �� =��

��

Relação entre Escalas

• Para que modelo e protótipo mantenham semelhança completa, é necessária igualdade dos respectivos números adimensionais.

• Tal igualdade conduz a relações entre escalas que devem ser observadas para que os ensaios com modelos tenham significado em relação ao protótipo.

• São apresentadas a seguir estas relações quando Re, Eu e Frforem selecionados como adimensionais característicos do fenômeno.

• ��� = ���

��. ��. ����

=��. ��. ��

����

����

=��. ��. ����. ��. ��

Logo�� = ��. ��. ��

• ��� = ���

��

��. ���. ��

� =��

��. ���. ��

� ������

=��. ��

�. ���

��. ���. ��

Logo

�� = ��. ���. ��

Número de Reynolds

Número de Euler

• ��� = ���

���

��. ��=

���

��. ����

���

��� =

��. ����. ��

Logo

��� = ��. ��

• Como a gravidade é normalmente considerada como uma constante, então Kg = 1.

Número de Froude

Exemplo 4

• Deseja-se determinar a força de arrasto que age no sonar de um submarino por meio de testes efetuados com um modelo na escala de 1:5. Testes foram realizados em água a 20oC, a uma velocidade de 60 km/h, e a força de arrasto medida foi de 30 N. Sabendo-se que o protótipo (submarino real) será utilizado em água a 4oC, calcular (a) a velocidade do submarino em condição de semelhança completa e, nessas condições, (b) determine a força de arrasto correspondente.

Submarino Classe Akula, Rússia

sonar

• Sabe-se que a força de arrasto Fs é influenciada principalmente pelas grandezas V, L, e , portanto

� ��, �, �, �, � = 0

• Isto nos leva aos adimensionais

���

�. ��. ��,�. �. �

�= 0

• Propriedades da água a 20oC e a 4oC:

Propriedade 4oC 20oC

[kg/m3] 1000 998

[N.s/m2] 1,6 10-3 1,0 10-3

(Eu, Re) = 0

Fonte: Fox & McDonald

Propriedades da Água vrs. Temperatura (SI)

(a)

• Da relação entre escalas, relativa ao número de Reynolds:

�� = ��. ��. ��

• ou����

=��. ��. ����. ��. ��

• Logo

1,0 × 10��

1,6× 10��=

998.��. 1

1000. ��. 5⇒

����

= 3,1313

• Como Vm = 60 km/h, então Vp = 19,16 km/h.

16,67 m/s 5,32 m/s

(b)

• Da relação entre escalas, relativa ao número de Euler:

�� = ��. ���. ��

• ou����

=��. ��

�. ���

��. ���. ��

• Logo

����

=998. 16,67�. 1�

1000.5,32�. 5�⇒

����

= 0,3920

• Como Fm = 30 N, então Fp = 76,5 N.

Exemplo 5

• Uma bomba centrífuga é acionada por um motor que gira a 1800 rpm e fornece 3 L/s quando a carga manométrica é de 18 m. Determinar suas características quando o motor gira a 1500 rpm.

Bomba centrífuga em corte

• Em uma bomba centrífuga, as grandezas características são , rotação da bomba (n), diâmetro do rotor (D), viscosidade dinâmica (), vazão volumétrica (Q) e a diferença entre a pressão de entrada e saída (p2 - p1 = .g.HB). Desta forma,

� �, �, �, �, �, �. �. �� = 0

• Adotar diretamente a base tradicional , V, D não é possível, mas pode-se usar , n, D :

� = ��� � = �. ���. �� � = �

• Aplicando o teorema dos , chega-se aos seguintes adimensionais:

�� =�. �. ��

��� =

�. ���� =

�.��

��. ��

• Pela condição de semelhança

��� = ��� ��. �� = ���. ��

��� = ��� �� = ��. ���

• Como a gravidade atuante e o rotor do modelo e do protótipo são iguais, KD = Kg = 1.

�� = �� =1800

1500= 1,2

• Portanto,

�� =��

��= 1,2 ⇒ �� =

3

1,2= 2,5�/�

�� = ��� = 1,2 � = 1,44 =

���

���⇒ ��� =

18

1,44= 12,5

nova vazão

nova carga manométrica

Exemplo 6

• Um modelo de navio, na escala 1:100, é testado em laboratório. O protótipo tem 100 m de comprimento. Para uma velocidade que corresponda a 10 m/s no protótipo, a força de arrasto medida no modelo é 10 N. Supondo que, no teste do modelo, a água é igual a aquela em que navegará o protótipo, pergunta-se qual seria (a) a velocidade de teste do modelo e (b) a força de arrasto no protótipo.

Modelo da Corveta Classe K130 Braunschweig Alemanha

• No caso do navio, como este se desloca na superfície, os efeitos da força não podem ser desprezados, de modo que

� �, �, �, �, �, � = 0

• Adotando-se a base tradicional , V, L, tem-se

� = �. ��� � = �. ���. �� � = �

• Aplicando o teorema dos , chega-se aos seguintes adimensionais:

�� =�. �. �

��� =

��

�. ��� =

�. ��. ��

Número de EulerNúmero de Reynolds Número de Froude

• Sabe-se que�� = ��. ��. ��

��� = ��. ��

• Então

1 = 1.��. �� ⇒ �� =1

��=

1

����

=1

1100

= 100

��� = ��. 1 ⇒ ��

� =����

=1

100⇒ �� = 0,1

• Incompatíveis!

Número de Reynolds

Número de Froude

• Uma das formas de corrigir isto é utilizar um fluido diferente no ensaio, de modo que:

�� = ��. ��. �� ⇒ ��

��= ��. �� =

1

10.1

100= 0,001

• Entretanto, isto nem sempre é possível obter um líquido que atenda as especificações, ou ainda, nem seja praticável empregar tal líquido no ensaio.

• Na prática, o que se faz é assumir que não se pode obter a semelhança completa.

• Sabendo-se que, em elevados número de Reynolds, a viscosidade varia pouco em relação à variação do número de Reynolds, considera-se aqui desprezar o efeito da viscosidade.

• Como será desprezada a influência da viscosidade, obviamente o número adimensional 1 (número de Reynolds) não pode ser usado inicialmente, de modo que a melhor opção é empregar o número adimensional 2 (número de Froude), devido ao menor número de variáveis desconhecidas:

��� = ��. ��

��� = ��. 1 ⇒ ��

� =����

=1

100⇒ �� = 0,1

�� =����

⇒ 0,1 =��10

⇒ �� = 1�/�

• Empregando o número adimensional 3 (número de Euler):

�� = ��. ���. ��

�� = 1 × 0,1� × 0,01� = 0,000001

����

=10

��= 0,000001

�� = 10000000 = 1 × 10��

• Deste modo, a velocidade de teste do modelo, 1 m/s, e a força de arrasto no protótipo seria de 10 MN.

• Mas os resultados alcançados seriam realmente coerentes?

• Os resultados são válidos somente para elevados números de Reynolds.

• Não é necessário que o modelo e o protótipo operem no mesmo número de Reynolds, porém é necessário que ambos operem longe do regime laminar.

• Então, para verificar se a metodologia empregada oferece respostas realistas, estima-se o número de Reynolds do escoamento no ensaio com o modelo e do protótipo em operação:

��� =��. ��. ��

��=998× 1 × 1

0,001= 9,98× 10�

��� =��. ��. ��

��=998× 10 × 100

0,001= 9,98× 10�

• Ambos operam em regime turbulento, portanto o efeito de viscosidade é desprezível para ambos. Aprovado!

turbulento

turbulento

Teste de modelo. Laboratório de Dinâmica Marinha, SSPA Sweden AB, Suécia.

Teste de modelo. Laboratório de Dinâmica Marinha, SSPA Sweden AB, Suécia.

Ensaio em túnel de vento realizado na NLR (Netherland Aerospace Centre), Holanda

Ensaio de lançamento e recuperação de helicóptero, em túnel de vento.Este ensaio será feito simulando condições polares de operação.

3 m x 6 m icing wind tunnel, National Research Council Canada.

SHOL Wind tunnel testing, NLR, Holanda.

Demonstração da capacidade de um quebra-gelo, no Laboratório de Dinâmica Marinha do National Research Council of Canada.

Bibliografia

Franco Brunetti

Mecânica dos Fluidos; 1ª ed., Editora Pearson, Prentice Hall, 2005.

ISBN 85.87918-99-0

Bibliografia

Robert W. Fox, Alan T. McDonald

Introdução à Mecânica dos Fluidos. Rio de Janeiro RJ, 4ª.Ed.; Editora Afijada.

ISBN-10: 8521610785

ISBN-13: 978-8521610786