dis2e design para a inovaÇÃo social: uma … · social, pretende criar competências para...
TRANSCRIPT
DIS2E DESIGN PARA A INOVAÇÃO SOCIAL: UMA EXPERIÊNCIA DE ENSINO‐APRENDIZAGEM
BERNARDO PROVIDÊNCIA 1
1Escola de Arquitetura da Universidade do Minho, providê[email protected]
Resumo: Em ambiente de workshop intensivo, alunos do 1º ano dos cursos de teatro e design, desenvolvem um
projeto conjunto com uma comunidade local num território específico. Cinco casas, cinco famílias, cinco objetos e cinco grupos, foi o mote para construir com a comunidade um espetáculo, que dá voz às memórias materiais e imateriais de um lugar, Couros, que é um eixo estratégico no centro histórico de Guimarães. Mais do que a iniciação às metodologias participativas, o modelo de ensino‐aprendizagem do design para inovação social, pretende criar competências para trabalhar com as comunidades, de forma a cooperar no desenvolvimento integrado da zona de Couros aproximando vivências, interesses e expectativas de alguns do seus ocupantes, neste caso, alunos, professores e habitantes locais. A colaboração no sentido da socialização entre múltiplos criadores funcionou como uma ferramenta de trabalho do design na valorização e na revitalização social e cultural da zona do campus urbis da Universidade do Minho. Palavras Chave: inovação social, metodologias de design, desenvolvimento local, cultura
1. O design para a inovação social: reflexões de partida
Na obra “Making Things Happen...“, Manzini (2014) aborda um conjunto de casos a partir de uma postura de inovação radical inspirada no co‐design, no qual desmonta o conceito de “Design para a inovação Social”. Uma metodologia de design colaborativo baseada no designing for and with communities que quebra com as metodologias de design quer tradicionais quer incrementais, para configurar novos modelos onde a inovação deixa de se circunscrever ao “produto” ou “processo” para se focar nas populações, nas suas expectativas e aspirações.
As metodologias do design surgem como motor da relação social e cultural das pessoas e populações na interação com o território e com as necessidades das comunidades. O designer passa a participar em equipes heterogéneas de diferentes áreas disciplinares e formações de base, co‐concebendo e co‐produzindo atividades, produtos e serviços orientados pela inovação disruptiva (Christensen, C., Baumann, H., Ruggles, R. & Sadtler, T., 2006).
Entramos na era onde o design e os designers encontram novas abordagens (Young, 2008) que passam por intervenções com as comunidades locais do tipo bottom‐up, onde a estratégia de trabalho radica em metodologias participativas que colocam a população local e designers e outros criativos a trabalhar conjuntamente na afirmação de valores culturais.
Um dos exemplos da análise sobre inovação social em Portugal encontra‐se documentado num audiovisual coproduzido por Parente, Martinho e Providência (2014), que retrata, entre outros exemplos, o caso da cooperativa Terra Chã. De há 20 anos a esta parte, que a cooperativa desenvolve um trabalho baseado numa metodologia colaborativa que valoriza os recursos endógenos, a população autóctone e a comunidade, e despoleta, numa perspetiva bottom‐up, um modelo de construção e estruturação de projetos de desenvolvimento local orientados para a revitalização social, cultural e económica, privilegiando a relação intergeracional e as aprendizagens entre pares.
Este modelos de intervenção social trazem uma nova dimensão ao design, conferindo hoje ao ensino do design, uma vertente social, de valorização de pessoas, produtos e comunidades locais, até então
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3 3201
inexistente. Tendo em conta o nosso papel de profissionais, investigadores e professores na área do design, não podemos ficar alheios a este movimento humanizador e mais efetivo de uma disciplina, que mantendo o seu cariz técnico, integra uma nova dimensão experimental de projetos “para e com as comunidades”. Esta abordagem impõe a necessidade de repensar a metodologia de design, bem como o impacto que estas podem ter na educação dos nossos estudantes em termos da sua formação académica, profissional e pessoal.
Tratamos neste artigo de projetos que nos parecem ilustrar, pelo menos parcialmente, as novas metodologias de design, dando ênfase ao projeto EM CAIXA desenvolvido no âmbito da unidade curricular de Projeto Uso e Identidade da Licenciatura em Design de Produto da Universidade do Minho. É enquanto docente da unidade disciplinar que propomos refletir sobre a experiência que tem entusiasmado a equipa composta por professores, criativos, estudantes ‐ de design e teatro ‐ e população local que anualmente dedica algumas semana de trabalho intenso, mas igualmente gratificante à co‐produção de uma peça de teatro cenografada a partir das inspirações da cultura local.
2. EmCaixa: um projeto de ensino‐aprendizagem de design para Couros
2.1. O território: Couros
Couros é uma zona habitacional, outrora industrial no coração da cidade de Guimarães, banhada por uma pequena ribeira, eixo dos ofícios de curtumes e têxteis desde o séc. XIII. Caracteriza‐se por uma expressiva malha de tanques em granito (Figura 1)., local onde em tempos os artesãos curtiam e tratavam peles. Este local esteve na origem de um polo de industria têxtil que, em finais do séc XX, viria a desaparecer.
Figura 1 Curtumes. Tanques de curtição. Operários. Décadas de 1930/1940, Couros, Fonte Muralha, Associação de Guimarães para a Defesa do Património.
Com a classificação de centro histórico como Património Mundial pela UNESCO em 2001 e a Capital Europeia da Cultura em 2012, Guimarães, requalifica o património industrial de Couros com a construção de um projeto estratégico que alia as competência da Universidade do Minho ao desenvolvimento local por via autárquica. Esta vontade política concretizou‐se na criação de um polo criativo de extensão universitária, o campus urbis, que integra cursos de primeiro ciclo universitário, nas áreas de teatro e design, sendo que se prevê a breve trecho, a abertura de uma licenciatura em artes plásticas.
Neste quarteirão, desenhado a sul pela Ribeira de Couros e a norte pelo Largo do Trovador (séc. XIX ‐ XX), encontramos uma comunidade de famílias, algumas das quais aqui nasceram, trabalharam e viveram, edificando um capital imaterial patente em cada porta que se abre. São as histórias dos ofícios, dos saberes e das famílias que se transmitem de geração em geração, recheadas de pequenas experiências materiais e imaterias, que simbolizam memórias e traços culturais locais.
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3 3202
A proposta de um plano integrado no âmbito das unidades curriculares de Laboratório de Teatro e Projeto de Design – Uso e Identidades dos cursos respetivamente de teatro e design, nasce da necessidade da construção de metodologias de ensino‐aprendizagem que a partir da interdisciplinaridade e co‐participação com a comunidade local, permita reequacionar a função destes cursos, como parceiros e atores da construção de uma nova realidade para Couros. O propósito é integrar atores, que muitas vezes andam de „costas voltadas“, possibilitando a partir da interação socializadora entre a comunidade académica e a comunidade local, uma partilha de valores e de práticas para o desenvolvimento e construção conjunta de projetos futuros mais humanizados, sejam eles de índole, social, económica ou cultural.
2.2. As fontes inspiradoras: “Arraial”
O modelo design para a inovação social baseado na coparticipação na criação de espetáculos, viu em Guimarães 2012, Capital Europeia da Cultura, a sistematização de um conjunto de experiências. É o caso do espetáculo “Arraial”, que sob a direção de Madalena Victorino e produção da Companhia Circulando, trabalhou com habitantes de Donim, freguesia vizinha à cidade, bailarinos e músicos uma peça alusiva à festa popular, desenvolvendo um trabalho colaborativo de integração social e interpretação de papéis .
Em “Arraial1”, encontramos um espetáculo carregado de identidades, seja pelo afeto, seja pelas memórias e tradições, onde se expressam códigos individuais e coletivos da população local (Figura 2). Criado com base em símbolos, do que mais genuíno a população tem, como por exemplo os “ex‐votos2”, o trabalho parte da co‐participação entre os habitantes de Donim, e coreógrafos, bailarinos, músicos e técnicos, para a construção de novas linguagens, gramáticas visuais e de movimento performativo. Como resultado vimos nascer ao longo de quase um ano de trabalho, o potencial de valorização humana, bem como de um património imaterial que que se consagra, em 2012, com a peça, que representa a síntese da construção de uma memória coletiva.
Figura 2 Arraial, cena final, Guimarães 2012.
O projeto envolveu uma metodologia colaborativa, onde durante 2011 e 2012, um grupo de trabalho, constituído por equipas mistas entre as populações locais e profissionais das áreas criativas diversificadas em termos de formação de base e consequentes códigos culturais e de leitura do real, concebeu, produziu e representou um espetáculo em torno das vivências dos habitantes da freguesia de Donim.
O modelo baseou‐se num processo constante de reflexão dos valores autóctones da população local para a partir de diversos tipos de registos, quer orais, como memórias, histórias, crenças e hábitos de vida, quer
1 O termo arraial designa uma festas popular ao ar livre em épocas de romarias.
2 Ex‐votos são comummente reconhecidas sob as formas de pinturas ou desenhos, figuras moldadas em cera, representando muitas vezes partes do corpo que estavam adoecidas e foram curadas. São usados em atos religiosos para efeitos de agradecimento de uma promessa.
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3 3203
materiais, como artefactos diversos, construir enxertos que serviram de base à construção de contextos e das cenas que enformam as várias partes do espetáculo.
Esta metodologia acabaria por ser determinante no desenho do exercício EmCaixa, sobre o qual nos deteremos a seguir e que reconheceu neste exemplo a necessidade de trabalhar “com” e não “para” a população local no âmbito do projeto EmCaixa.
3. Um modelo de ensino‐ aprendizagem do design para a inovação social: a experiência do EmCaixa
3.1 A proposta do EmCaixa
A partir das dinâmicas sociais e culturais de trabalho com e para a comunidade local de Couros, e inspirados nas experiências descritas, bem como num anterior projeto piloto designado de “Andando”, o primeiro projeto de articulação entre os cursos de Teatro e Design, começou‐se no ano letivo 2014‐2015 a desenhar uma intervenção que envolvesse ativamente a população de este território especifico, com alunos e professores num novo projeto, que se pretendia participado e colaborativo.
O objetivo do projeto foi alinhar os processos de trabalho e os produtos de 2 áreas científicas e de ensino, a de Teatro e Design, com as necessidades e expectativas locais, articulando experiências, sentidos e aprendizagens numa produção conjunta, que, no caso dos alunos e professores, culmina no trabalho do final de semestre das 2 áreas. Para a população local cremos que culminou no sentimento de dignificação e reconhecimento das suas vivências.
O Projeto orientado, na fase de arranque, pelos docentes e uma equipa criativa (encenadores e atriz), previu um guião de trabalho que contemplava uma articulação dos programas académicos de cada curso num desafio de envolvimento com a comunidade local. A integração da comunidade começou com a participação população do largo do Trovador que acolheu nas suas casas grupos de alunos. Previamente, ao acolhimento a população foi contactada pelos professores, e colocada a par do projeto, de forma a decidir participar, ou não, do mesmo. Os alunos, munidos de grelhas de observação, tinham como missão explorar o interior da casa, com a recolha de fontes materiais e imateriais, que testemunham a vida local. Esta interação entre alunos e população local envolveu cinco casas, onde viviam cinco famílias, que constituíram o núcleo central da metodologia participativa.
O trabalho conjunto desenvolvido daria origem a um produto final ‐ sob a forma de um sistema integrado ‐, que se materializava em: i) “objetos” ‐ produtos físicos – próprios da investigação em design, que se materializou em cenários, ou seja, na produção dos contexto para as diferentes cenas; e ii) no ato de representação em teatro de cinco peças que caraterizam o local a partir da pesquisa em contexto doméstico. Como resultado final teríamos uma peça representada por alunos, com uma produção concebida pela equipa composta pelos alunos e a população local, que manifestaria a integração dos vários intervenientes na edificação de cenas que enraízam factores identitários de Couros.
A proposta de ensino‐aprendizagem é desafiadora, e diríamos mesmo arrojada, dado que trabalhávamos com alunos do primeiro ano, que viam neste trabalho o seu primeiro contacto de co‐construção com comunidade, que, por sua vez, em tão pouco tempo de convivência criou expectativas sobre o processo co‐construtivo. Tratando‐se de um projeto de final de ano, o projeto tinha todas as condições para correr bem. Os dias são grandes, o que permitia longas sessões de trabalho, e a meteorologia ajudaria com boa temperatura e dias soalheiros.
O Projeto, que se pretendia focado no processo de ensino‐aprendizagem, acabou por assumir uma dimensão maior, com o convite feito à equipa para a participação no festival Gil Vicente, uma estratégica autárquica de aglomerar os vários espetáculos de teatro da cidade.
3.2 A metodologia
O projeto EmCaixa surge como um exercício que pretende trabalhar as competências interpessoais dos alunos de design que até então apenas tinha tido a experiência de desenho de produto tangível. Este
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3 3204
exercício aciona uma perspetiva de desenvolvimento e consciência social, ao trabalhar as capacidades de cada aluno na articulação com equipas pluridisciplinares que envolvem cursos diferentes, bem como a comunidade local.
O projeto nasce do contacto com a comunidade local na perspetiva de construir com a própria comunidade o espetáculo. Em torno de desafio de construção de um espetáculo, o projeto encontra em cinco casas do largo do trovador, cinco famílias, cinco possibilidades performativas que, com a ajuda de uma plateia móvel, criam a narrativa para progressivamente desvendar a memória imaterial da zona de couros.
Criam‐se cinco grupos mistos que partem para largo do trovador com um guião exploratório.
É um exercício de espaço público quer para os alunos de teatro como de design. O processo de co‐construção da peça decore num modelo de workshop intensivo, em que alunos, professores e a equipa criativa, se articulam durante uma semana num processo contínuo de trabalho que se reparte entre o Largo do Trovador (objeto do trabalho e local de apresentação do trabalho final), Instituto de Design de Guimarães (onde se fabricam os protótipos e montam e desmontam de adereços) e as instalações do curso de teatro (lugar de ensaios e reuniões).
Nas instalações do curso de design, faz‐se a apresentação de toda a equipa de docentes, alunos e equipa de criativos. É criado o primeiro exercício a partir da análise de um texto (figura 3), em que se visa encontrar pontos de contacto e interpretação na perspetiva de uniformizarem códigos de comunicação.
Figura 3 Primeira sessão de trabalho entre os alunos dos cursos de teatro e de design em atividade de exploração de um texto.
Cada grupo tem a seguir o desafio de fazer a visita a uma casa, onde uma família os espera para uma partilha mútua de experiências e onde são recolhidos de testemunhos orais e escritos, registos visuais e solicitado a cada família a cedência de um objecto de carácter pessoal com uma carga emotiva representativa da família ou de algum acontecimento excecional.
Este momento de incursão pelas 5 casas do largo do trovador, tornavam‐se o momento de construção da partilha, um momento disruptivo face ao processo de interação entre todas estas gentes, que apesar de coabitarem o mesmo local, não se conheciam e por consequência não partilhavam o testemunho de várias gerações, histórias de vida, conjunturas carregados de uma identidade local.
Cada uma das cinco casas acolheu um grupo, partilhou histórias, e de forma carinhosa disponibilizou um objeto referencia daquele lar. Foram muitos os olhares dos alunos que descobriam entre conversas com os nativos, pequenos contos, histórias de vida que peça a peça contavam a história passada e presente da zona de couros (figura 4).
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3 3205
Figura 4 Recolha de material de uma das habitações do Largo do Trovador
Uma nova sessão de trabalho tem lugar e os alunos fazem o mapeamento e análise dos registos, o que dá inicio ao trabalho de construção de textos e de esboços cenográficos para a construção da identidade de cada um dos cinco espetáculos. Este exercício, tanto parte do testemunho oral, como de uma fotografia ou objeto pessoal.
A dinâmica de trabalho passa pelo trabalho dividido entre os laboratórios de design, os espaços de teatro e o largo do trovador que é constantemente visitado de forma a reenquadrar os exercícios que estão a ser desenhados.
São observados o dia a dias das pessoas que por aqui passam e aperfeiçoadas as linguagens, tendo em consideração a população, o movimento, os objetos, a partir do carácter cenográfico das performances.
Nos bastidores dos laboratórios de design, concebem‐se objetos de grande escala. De acordo com os pressupostos assumidos no trabalho de equipa com os alunos de teatro, os alunos de design intervêm em objetos de grande escala que fazem a demarcação do espaço cenográfico no largo do trovador. Objetos como banheiras de ferro, móveis, frigoríficos que aparentemente teriam sido retirados de cada uma das casas são trabalhados de forma a enfatizar o espetáculo de teatro (figura 5)
Figura 5 Sessão plenária sobre a construção dos objetos.
Durante uma semana entre manhãs de trabalho acompanhados por tutores (professores e equipa criativa), tardes e noites de ensaios e criação de protótipos, o espetáculo vais nascendo.
O entusiasmo e a emoção da revisitação do local, das pessoas e das tradições de outras épocas são os sentimentos que se vão vivendo quotidianamente no processo de co‐construção.
Paralelamente, em jeito de desafio, a academia de música da cidade também ela ensaia pequenas partituras como elemento de ligação entre uma procissão de inicio do espetáculo ou de articulação entre
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3 3206
cada uma das peças. A academia de musica intervêm entre cada uma das cenas, acompanhando o reposicionamento de uma plateia móvel de onde se vê o espetáculo.
3.3 O produto do EmCaixa
Como resultado, assistimos à construção e desencadeamento de cinco pequenos espetáculos, acompanhados por uma amovível plateia que, ao som dos alunos da academia de música da cidade, se readaptava e posicionava para cada peça (figura 6).
Figura 6 Momento entre espetáculos com o movimento da plateia
Foi um espetáculo composto por várias cenas onde o palco era o largo em si, com todas as casas, os habitantes locais, alunos e demais pessoas que se foram associando a este projeto e que por fim levaram a experiência de um dia.
Chegado o momento, entre curiosos, população, alunos e demais que se quiseram juntar à festa, o espetáculo dá inicio, consagrando‐se a partilha tida até então, de forma mais privada, no âmbito de cada família e cada casa. Este é o momento de concretização de uma memória que durante anos se escondia em cada uma das casas, e que por momento sai à rua e se transforma em identidade coletiva.
Encontramos no olhar de cada um, seja a Dona Maria, ou dos estudantes que conjuntamente com o seu testemunho construíram o trabalho, a construção de um valor imaterial, um grito de afirmação e construção conjunta de uma nova identidade para Couros e para as suas populações que cremos ser potenciadora de dignidade social, de densidade humana e de desenvolvimento local.
Assistimos à construção de novas histórias sem muros nem barreiras em que na construção peças cenográficas ou na criação de um espetáculo, transportavam um misto de valorização das experiências partilhadas na reinterpretação de cada elemento deste novo coletivo composto por alunos, habitantes locais ou equipes de apoio.
Foram momentos coletivos onde desde de os protagonistas, habitantes de cada uma das casas nas suas janelas ou varandas, os estudantes e a comunidade em geral, por momentos quebraram barreiras.
Durante a construção do espetáculo, entre a construção dos cenários e dos espetáculos em si, sentíamos a construção de uma relação entre alunos e a comunidade local onde se sentia a integração de todos na construção de um todo coletivo.
Durante o espetáculo, assistimos à vivencia de cada habitante em particular, quer na forma como podiam olhar o espetáculo da janela da sua casa, como na integração do espetáculo, no apoio na movimentação da móvel plateia, ou na forma como agradeciam aquando da recolha dos objetos pessoais a partilha mútua de toda esta comunidade agora mais rica também com os cursos de teatro e design.
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3 3207
4. Conclusão
Com a Capital Europeia da Cultura e o exercício desenhado entre a autarquia e a universidade, assistimos à criação de uma dinâmica que passa pela requalificação de edifícios da cidades e utilização dos mesmos para a construção de um polo criativo da universidade.
A criação de um campu urbis da Universidade do Minho na zona de Couros, com o Instituto de Design e o Centro de Formação Pós Graduada onde estão instalados respetivamente o curso de design e o curso de teatro, bem como o Centro de Ciência Viva fazem parte de uma estratégia entre a autarquia e a universidade para a revitalização e desenvolvimento do território.
O trabalho cooperativo entre os alunos e a população da zona de Couros, estimula com base em metodologias participativas, a aproximação a valores endógenos materiais e imateriais, na construção de uma identidade.
Estas duas experiências, primeiro o “Andado”, agora o EmCaixa, serviram como ponto de partida para perceber a importância de aproximação às comunidades locais na construção de um produto com valor social, acreditando que o desenvolvimento local não se faz somente pela via da economia, mas também de outras áreas disciplinares que orientados pelos princípios de partilha de experiências e valorização pessoal são alicerces de uma vida dignificante.
O modelo de construção deste trabalho em torno de um workshop intensivo com equipas mistas, ajuda os alunos a desenvolver competências interpessoais, planeamento e gestão de tempos e resolução de conflitos, mas também, proporciona a construção de uma inter‐relação pessoal com a população que se manifesta no autorreconhecimento da valorização pessoal e coletiva da mesma.
Por sua vez, os alunos de design como os de teatro têm necessidade de criação de públicos quer para os seus espetáculo quer para os seus produtos e serviços, e de contactar com os mesmos de modo a perceber esses mesmos públicos, construindo diálogos que permitam trabalhar as suas necessidades, sejam em produtos mais tangíveis ou intangíveis.
A criação de metodologias participativas envolvendo comunidades locais, estudantes e profissionais de diversas áreas numa perspetiva de desenvolvimento local, nasce como contraponto de uma perspetiva massificada de trabalho para a produção de um produto standard.
Parece‐nos deste modo que o desafio que se adivinha, passa muito mais pela aproximação à população local, a partir de metodologias de trabalho bottom‐up, onde se valoriza a particularidade de cada um, alunos, habitantes do largo do trovador, músicos e equipe criativa, pela incorporação num produto coletivo.
Por ultimo acreditamos na criação de metodologias que trabalhem dinâmicas da inclusão como forma de promover desenvolvimento mais democrático e sustentável.
Agradecimentos
Este trabalho tem o apoio financeiro do Projeto Lab2PT‐ Laboratório de Paisagens, Património e Território ‐ AUR/04509 e da FCT através de fundos nacionais e quando aplicável do cofinanciamento do FEDER, no âmbito dos novos acordos de parceria PT2020 e COMPETE 2020 – POCI‐01‐0145‐FEDER‐007528.
Referências
MANZINI, E. (2014). Making Things Happen: Social Innovation and Design. Design Issues, Volume 30, No. 1, Pages 57‐66
CHRISTENSEN, C., BAUMANN, H., RUGGLES, R. & SADTLER, T. (2006). Disruptive Innovation for Social Change. Harvard Business Review, 84 (12), 94‐101.
YOUNG, R. (2008), A perspective on Design Theory and Service Design Practice, in: Designing for Services ‐ Multidisciplinary Perspectives: Proceedings from the Exploratory Project on Designing for Services in Science and Technology‐based Enterprises. Kimbell, Lucy and Seidel, Victor. P. (Ed.). Oxford: University of Oxford Press, pp. 43‐45.
PARENTE, C, MARTINHO, A. L., PROVIDÊNCIA, B.(2014) ÉS SOCIAL. Documentário realizado por R. D. Ribeiro ‐ KINTOP. Universidade do Porto ‐ Faculdade de Letras, Porto.
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3 3208