direitosegarantiasfundamentais2

9
Renata Fiore Brazil Teoria da Constituição e direitos fundamentais 7.4. Direitos fundamentais – natureza e eficácia José Afonso da Silva 1 adverte que os direitos fundamentais do homem são situações jurídicas objetivas e subjetivas definidas no direito subjetivo, visando estabelecer a dignidade, igualdade e liberdade da pessoa humana. A natureza dos direitos fundamentais é constitucional, posto que se inserem no texto de uma Constituição; “são direitos que nascem e se fundamentam, portanto, no princípio da soberania popular.” 2 Muito embora se estatua que as normas tenham aplicação imediata, por regra, “as normas que consubstanciam os direitos fundamentais democráticos e individuais são de eficácia contida e aplicabilidade imediata, enquanto as que definem os direitos econômicos e sociais tendem a sê-lo também na Constituição vigente, mas algumas, especialmente as que mencionam uma lei integradora, são de eficácia limitada, de princípio programáticos e de aplicabilidade indireta.” 3 As características dos direitos fundamentais se baseiam, como alerta a doutrina, em concepções 1 Silva, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo, p. 179. 2 Ibid, p. 180. 3 Ibid, p. 180.

Upload: direitounimonte

Post on 23-Jun-2015

423 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: Direitosegarantiasfundamentais2

Renata Fiore BrazilTeoria da Constituição e direitos fundamentais

7.4. Direitos fundamentais – natureza e eficácia

José Afonso da Silva1 adverte que os direitos fundamentais do homem

são situações jurídicas objetivas e subjetivas definidas no direito subjetivo,

visando estabelecer a dignidade, igualdade e liberdade da pessoa humana.

A natureza dos direitos fundamentais é constitucional, posto que se

inserem no texto de uma Constituição; “são direitos que nascem e se

fundamentam, portanto, no princípio da soberania popular.” 2

Muito embora se estatua que as normas tenham aplicação imediata,

por regra, “as normas que consubstanciam os direitos fundamentais

democráticos e individuais são de eficácia contida e aplicabilidade imediata,

enquanto as que definem os direitos econômicos e sociais tendem a sê-lo

também na Constituição vigente, mas algumas, especialmente as que

mencionam uma lei integradora, são de eficácia limitada, de princípio

programáticos e de aplicabilidade indireta.” 3

As características dos direitos fundamentais se baseiam, como alerta a

doutrina, em concepções jusnaturalistas, sendo direitos inatos, absolutos,

invioláveis, intransferíveis e imprescritíveis.

Baseiam-se ainda em fatos históricos, nascem, desaparecem,

modificam-se. Quando falamos em inalienabilidade, remetemo-nos a fatos

inegociáveis, direitos indisponíveis, não tem conteúdo patrimonial que permite

ser vendido, por exemplo.

No que pertine à imprescritibilidade, boa parte dos direitos

fundamentais não deixam de ser exigíveis, não se perdem com o tempo e, por

fim, irrenunciável, pois você pode até não exercê-lo, mas também não se

admite sua renúncia.

7.4.1. Classificação dos direitos fundamentais

1 Silva, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo, p. 179.2 Ibid, p. 180.3 Ibid, p. 180.

Page 2: Direitosegarantiasfundamentais2

Renata Fiore BrazilTeoria da Constituição e direitos fundamentais

O nosso Direito Constitucional pátrio estabelece um critério quanto ao

seu conteúdo, à natureza do bem e o objeto tutelado. Admite a Constituição

Federal de 1988, outros direitos fundamentais, mesmo não enumerados, senão

vejamos a redação do § 2º do artigo 5º:

“... os direitos e garantias previsto neste artigo não excluem outros

decorrentes dos princípios e do regime adotado pela Constituição e dos

tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

Com esta premissa, podemos dizer que temos três fontes dos direitos

e garantias: os expressos, os decorrentes e os decorrentes de tratados e

convenções internacionais.

Quanto ao conteúdo, os direitos fundamentais são:

- direitos individuais – autonomia aos particulares, iniciativa e

independência aos indivíduos, conhecido como direitos individuais (art. 5º) e

liberdades civis e liberdades-autonomia (liberdade, igualdade, segurança,

propriedade)- art. 5º;

- direitos à nacionalidade – e suas faculdades – art. 12;

- direitos políticos – direitos políticos (art. 14), chamados de

democráticos ou direitos de participação política- art. 14 a 17;

- direitos sociais – direitos assegurados ao homem em relações

sociais e culturais – art. 6º - saúde, educação, seguridade – art. 6º, 193 e

seguintes;

- direitos coletivos – art. 5º;

- direitos solidários - direito à paz, desenvolvimento, comunicação,

meio ambiente, patrimônio comum da humanidade – art. 3º e 225;

Page 3: Direitosegarantiasfundamentais2

Renata Fiore BrazilTeoria da Constituição e direitos fundamentais

A classificação acima não esgota o tema, mas o agrupa de forma que

os analisaremos em seguida.

Muito embora afirmamos que o homem é sujeito de direitos

fundamentais, não nos bastaria somente sua positivação, mas também se faz

necessário que o sistema jurídico garanta eficácia. “Ruy Barbosa já dizia que

uma coisa são direitos, outras as garantias.”4

O professor José Afonso da Silva separa as garantias dos direitos

fundamentais em dois grupos: garantias gerais e garantias constitucionais,

senão vejamos:

a) garantias gerais – asseguram a efetividade dos direitos – condições

econômico-sociais culturais e políticas; trata-se de “uma sociedade

democrática, que conflui para a concepção do Estado Democrático de Direito,

consagrada agora no artigo 1º que já falamos;”

b) garantias constitucionais – “consiste nas instituições, determinações

e procedimentos mediante os quais a própria Constituição tutela a observância

ou, em caso de inobservância, a reintegração dos direitos fundamentais”

B.(1) garantias constitucionais gerais – técnicas de garantia e respeito

aos direitos fundamentais – respeito à pessoa humana;

B.(2) garantias constitucionais especiais – técnicas e mecanismos que

limitam a atuação dos órgãos estatais ou particulares, protegendo a eficácia

7.4.2. Destinatários dos direitos e garantias individuais

4 Apud José Afonso da Silva, op. cit, p. 186.

Page 4: Direitosegarantiasfundamentais2

Renata Fiore BrazilTeoria da Constituição e direitos fundamentais

Direitos individuais são aqueles que reconhecem autonomia aos

particulares, garantindo iniciativa e independência aos indivíduos dos demais

membros da sociedade política e do próprio Estado, como já vimos.

O disposto no artigo 5º da Constituição a princípio parece que destina

somente às pessoas físicas, ou seja, ao indivíduo. No entanto, passou a se

admitir que pessoas jurídicas brasileiras também gozassem de alguns direitos

dispostos.

José Afonso da Silva alerta que “vários dos direitos arrolados nos

incisos do art. 5º se estendem às pessoas jurídicas, tais como o princípio da

isonomia, o princípio da legalidade, direito de resposta, o direito de

propriedade, o sigilo da correspondência e das comunicações em geral, a

inviolabilidade do domicílio, a garantia do direito adquirido, o ato jurídico

perfeito e à coisa julgada, assim como a proteção jurisdicional e o direito de

impetrar mandado de segurança”.

Indagamos, e com relação ao estrangeiro? Pois bem, aos residentes

do no país não somente os direitos arrolados no artigo 5º, como também os

direitos sociais, em especial aos trabalhistas.

E quanto ao estrangeiro não residente? A Constituição garante os

direitos do artigo 5º aos residentes, “isso não quer dizer que os estrangeiros

não residentes, quando regularmente se encontrem no território nacional,

possam sofrer o arbítrio, e não disponham de qualquer meio incluindo os

jurisdicionais, para tutelar situações subjetivas. Para protegê-los, há outras

normas jurídicas, inclusive as de Direito Internacional, que o Brasil e suas

autoridades têm que respeitar e observar...” 5

7.5 Quem são os titulares de direitos coletivos?

5 Silva, José Afonso da, op. cit, p. 193.

Page 5: Direitosegarantiasfundamentais2

Renata Fiore BrazilTeoria da Constituição e direitos fundamentais

Na medida em que o indivíduo tem suas garantias constitucionais

estabelecidas, é forçoso concluir que também tem o dever de respeitar o direito

do outro. A inviolabilidade dos direitos coletivos é respeitar um direito

destinado a todos, como por exemplo: acesso ao transporte coletivo, à energia,

saneamento básico, meio ambiente sadio, direito à qualidade de vida,

preservação da paisagem e identidade histórica, cultural, direito às informações

do Poder Público, direito de reunião, associação, sindicalização, manifestações

coletivas, dentre outros.

7.6. Do direito à vida

A vida não é considerada pelo direito somente no sentido biológico, é

algo que é indivisível, todo ser dotado de vida é um indivíduo, explica José

Afonso da Silva, é uma pessoa. O que se assegura no direito é a vida humana

e isto inclui outros direitos decorrentes – físicos e até mesmo psíquicos.

Constitui “a fonte primária de outros bens jurídicos”.

a) Direito à existência – direito de lutar pela vida, defender a própria

vida, ou seja, permanecer vivo; não interrupção, salvo pela morte espontânea.

Direito a uma existência digna? Sim, porém não para justificar a

eutanásia.

b) Direito à integridade física – não se pode agredir o corpo humano,

pois atinge à vida; a Constituição Federal assegura a integridade física (art. 5º,

XLIX) e proibição da tortura (art. 5º, III).

E a doação de órgãos? Desde que autorizada por lei e para salvar

vida; não podemos mutilar a própria vida de forma que é vedado a venda de

órgãos.

A autorização para doador deverá ser gravada na Carteira de

Identidade ou na Carteira Nacional de Habilitação – Lei 10.211/2011, art. 2º.

Page 6: Direitosegarantiasfundamentais2

Renata Fiore BrazilTeoria da Constituição e direitos fundamentais

c) Direito à integridade moral

A honra do homem deve ser preservado – valores imateriais são

preservados pela Constituição Federal, como os morais – nome, boa fama,

reputação – artigo 5º, V e X.

d) Pena de morte

A tutela primordial do direito é a vida, portanto, a pena de morte se

contrapõe. É vedado, sendo admitido somente no caso de guerra externa

declarada – artigo 84, XIX (art. 5º, XLVII, a).

e) Eutanásia

Chamada de “morte bela”, “morte suave, tranqüila”, “morte sem dor”,

“homicídio piedoso”.

A eutanásia “está vedada pelo direito à vida consagrado na

Constituição, que não significa que o indivíduo possa dispor da vida, mesmo

em situação dramática. Por isso, nem o consentimento lúcido do doente exclui

o sentido delituoso da eutanásia no nosso Direito”.6

f) Aborto

O aborto também é repelido do ordenamento jurídico e é considerado

crime pela legislação penal, salvo em casos especiais que o Judiciário possa

conceder tal permissão, como por exemplo: estupro.

g) Tortura

A tortura é outra prática repudiada no ordenamento jurídico que fere o

direito à vida e não é somente isso é uma crueldade que atinge a humanidade

como um todo – art. 5º, incisos III e XLIII.

6 Ibid, p. 202.