diálogos

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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X DIÁLOGOS PARA O ENFRENTAMETNO AO RACISMO,AO SEXISMO E À HOMOFOBIA UMA CONSTRUÇÃO COLETIVA DE POLÍTICAS PÚBLICAS Amélia Tereza Santa Rosa Maraux1 Kelly Cristina Ferreira da Costa2 Ana Lúcia Gomes da Silva3 Resumo: A presente comunicação tem o propósito de refletir acerca das políticas de educação voltadas para a inserção dos conteúdos de gênero, raça e sexualidade no currículo da Educação Básica na rede pública estadual da Bahia. Relata a experiência da ação intitulada Diálogos Formativos em Direitos Humanos combatendo o racismo, o sexismo e a homofobia na escola. Contempla desde o processo de elaboração da proposta da ação articulando Estado, universidade e movimentos sociais, a realização do encontro, o resultado das contribuições sistematizadas dos grupos de trabalho, a síntese da avaliação dos/as participantes e os desdobramentos que resultaram em um projeto de enfrentamento ao sexismo, racismo e homofobia no espaço escolar. Revela os limites e as possibilidades de implementação dos conteúdos supracitados, trazendo a discussão sobre a formação inicial e continuada, o currículo e o material didático. Palavras-chave:Políticas Públicas. Escola. Currículo. Gênero. Raça. Sexualidade. Introdução Reconhecendo que é compromisso do Estado garantir que os métodos educacionais, os currículos e os recursos didáticos sirvam para melhorar a compreensão e o respeito pelas diversas orientações sexuais, identidades de gênero e de raça, a Superintendência de Desenvolvimento daEducação Básica SUDEB -SEC/BA, em diálogo permanente com as universidades públicas e movimentos sociais do estado da Bahia, promoveu, no período de 17 a 19 de outubrode 2012, em Salvador, a açãode formação continuada de professores e gestores intitulado Diálogos Formativos Educação em Direitos Humanos: combatendo o racismo, sexismo e homofobia na escola, que se apresentou à sociedade baiana como um espaço de problematização da escola na sua complexidade, com o intuito de promover reflexão/ação na perspectiva da mudança dos currículos da Educação Básica e das licenciaturas,interseccionalizando o debate sobre gênero, raça e sexualidade nas escolas e universidades. 1 Superintendente de Desenvolvimento da Educação Básica da Secretaria da Educação do Estado da Bahia; Profª. Assistente da Universidade do Estado da Bahia (UNEB); Pesquisadora do Núcleo de Estudos de Gênero e Sexualidade NUGSEX DIADORIM/UNEB. Salvador/BA - Brasil. 2 Diretora de Educação e suas Modalidades daSecretaria da Educação do Estado da Bahia; Profª. da rede pública estadual da Bahia. Salvador/BA - Brasil. 3 Diretora da Educação Básica da Secretaria da Educação do Estado da Bahia e do Projeto de Monitoramento, Acompanhamento, Avaliação e Intervenção Pedagógica na Rede Pública Estadual da Bahia (PAIP); Profª. Adjunta da Universidade do Estado da Bahia (UNEB); Pesquisadora do Núcleo de Estudos de Gênero e Sexualidade NUGSEX DIADORIM/UNEB. Salvador/BA - Brasil.

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Artigo científico

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X

DIÁLOGOS PARA O ENFRENTAMETNO AO RACISMO,AO SEXISMO E À

HOMOFOBIA – UMA CONSTRUÇÃO COLETIVA DE POLÍTICAS

PÚBLICAS

Amélia Tereza Santa Rosa Maraux1

Kelly Cristina Ferreira da Costa2

Ana Lúcia Gomes da Silva3

Resumo: A presente comunicação tem o propósito de refletir acerca das políticas de educação

voltadas para a inserção dos conteúdos de gênero, raça e sexualidade no currículo da Educação

Básica na rede pública estadual da Bahia. Relata a experiência da ação intitulada Diálogos

Formativos em Direitos Humanos – combatendo o racismo, o sexismo e a homofobia na escola.

Contempla desde o processo de elaboração da proposta da ação – articulando Estado, universidade e

movimentos sociais, a realização do encontro, o resultado das contribuições sistematizadas dos

grupos de trabalho, a síntese da avaliação dos/as participantes e os desdobramentos que resultaram

em um projeto de enfrentamento ao sexismo, racismo e homofobia no espaço escolar. Revela os

limites e as possibilidades de implementação dos conteúdos supracitados, trazendo a discussão

sobre a formação inicial e continuada, o currículo e o material didático.

Palavras-chave:Políticas Públicas. Escola. Currículo. Gênero. Raça. Sexualidade.

Introdução

Reconhecendo que é compromisso do Estado garantir que os métodos educacionais, os

currículos e os recursos didáticos sirvam para melhorar a compreensão e o respeito pelas diversas

orientações sexuais, identidades de gênero e de raça, a Superintendência de Desenvolvimento

daEducação Básica – SUDEB -SEC/BA, em diálogo permanente com as universidades públicas e

movimentos sociais do estado da Bahia, promoveu, no período de 17 a 19 de outubrode 2012, em

Salvador, a açãode formação continuada de professores e gestores intitulado Diálogos Formativos

– Educação em Direitos Humanos: combatendo o racismo, sexismo e homofobia na escola, que

se apresentou à sociedade baiana como um espaço de problematização da escola na sua

complexidade, com o intuito de promover reflexão/ação na perspectiva da mudança dos currículos

da Educação Básica e das licenciaturas,interseccionalizando o debate sobre gênero, raça e

sexualidade nas escolas e universidades.

1Superintendente de Desenvolvimento da Educação Básica da Secretaria da Educação do Estado da Bahia; Profª.

Assistente da Universidade do Estado da Bahia (UNEB); Pesquisadora do Núcleo de Estudos de Gênero e Sexualidade

NUGSEX – DIADORIM/UNEB. Salvador/BA - Brasil. 2Diretora de Educação e suas Modalidades daSecretaria da Educação do Estado da Bahia; Profª. da rede pública

estadual da Bahia. Salvador/BA - Brasil. 3 Diretora da Educação Básica da Secretaria da Educação do Estado da Bahia e do Projeto de Monitoramento,

Acompanhamento, Avaliação e Intervenção Pedagógica na Rede Pública Estadual da Bahia (PAIP); Profª. Adjunta da

Universidade do Estado da Bahia (UNEB); Pesquisadora do Núcleo de Estudos de Gênero e Sexualidade NUGSEX –

DIADORIM/UNEB. Salvador/BA - Brasil.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X

Como educadoras da gestão da Superintendência de Educação Básica – SUDEB -SEC/BA,

envolvidas na articulação, organização e realização do referido encontro formativo, nosso propósito

nessa comunicação é refletir acerca das políticas de educação voltadas para a inserção dos

conteúdos de gênero, raça e sexualidade no currículo da Educação Básica, na rede pública estadual

da Bahia, a partir da experiência do encontro Diálogos Formativos. Sem nenhuma pretensão de dar

respostas definitivas para os problemas da educação na Bahia, ressaltamos que esse estudo se

caracteriza em um relato de experiência, construído à luz das teorias feministas.

Por uma educação anti-racista, anti-sexista e anti-homofóbica

Nos últimos dez anos, o debate em torno da garantia de direitos, principalmente dos direitos

humanos, tem se intensificado, a partir dos resultados das Conferências, sobretudo as dedicadas à

discussão e à proposição de políticas públicas com recorte de gênero, raça e LGBT4. Em todos os

documentos publicados, a educação aparece como eixo estruturante no enfrentamento às violências

decorrentes do preconceito e, principalmente, como possibilidade de superação das desigualdades

sociais, provocadas pelo racismo, sexismo e homofobia. Nesse debate, o Estado, a universidade e os

movimentos sociais são atores fundamentais na construção de um projeto de sociedade que tem

como princípio, a inclusão e o respeito à diferença. Nesse contexto, a escola se consolida

historicamente como um espaço gendrado, generificante e racializado,cuja primazia é a do gênero

masculino e branco (CARDOSO; SILVA, 2010), e como tal,lugar de reflexão acerca dos limites e

possibilidades de enfrentamento e superação das violências e desigualdades.

Percebendo os limites da escola, estudos apontam a sua dificuldade em promover os direitos

humanos, na medida em que valores e concepções baseados e definidos pelaheteronormatividade

legitimam as relações de poder fortemente hierarquizadas.Esses valores são reproduzidos no

ambiente escolar através do currículo que nega a existência do “outro” e reafirma o “eu”

hegemônico, ou seja, o sujeito masculino, branco e heterossexual. A heteronormatividade,

percebida como um conjunto de regras e normas sociais que promovem a heterossexualidade como

única expressão da sexualidade humana(MISKOLCI,2012) constrói assim, sujeitos

compulsoriamente heterossexuais, ao tempo em que promove e alimenta a homofobia, a misoginia e

o racismo.

4A partir do governo Lula, em 2003, os movimentos sociais se organizam em torno das Conferências de onde foram

demandadas ações nas diversas áreas sociais as quais resultaram em programas, planos, entre outras políticas.

Ressaltamos o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, o Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos

Humanos LGBT e as políticas de Ações Afirmativas para a população afro-brasileira.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X

Os espaços educativos, lugar de produção e reprodução de sentidos sobre o “eu referente” e

sobre o “outro”, refletem valores e normas, isto é, são espaços culturalmente forjados pelo

pensamento educacional, (re)produtor da ideologia patriarcal, que promove o pensamento

dicotômico, hierarquizante e excludente, reforçando assim a ideia da existência de

oposição entre homem/mulher, branco/preto, heterossexual/homossexual, teoria/prática e

ensinar/aprender.

SegundoJunqueira(2009), os dados apresentados em pesquisa realizada pela Unesco em

2003sobre o “Perfil dos Professores Brasileiros” mostram que dos cinco mil professores

entrevistados da rede pública e privada, 59,7% reconhecem ser inadmissível que uma pessoa tenha

relações homossexuais e 21,2% tampouco admitiriam vizinhos homossexuais.

Em outra pesquisa realizada em treze capitais brasileiras e distrito federal, os dados da

Unesco revelam o alcance da homofobia nos espaços escolares. Constatou-se, que: a) o percentual

de professores que declaram não saber como abordar os temas relativos à homossexualidade na

escola vai de 30,5% em Belém a 47,9% em Vitória; b) 12% dos professores em Belém, Recife e

Salvador, ainda acreditam ser a homossexualidade uma doença.Também, o percentual de 33,5% dos

estudantes do sexo masculino de Belém não gostariam de ter colegas homossexuais; no Rio de

Janeiro, Recife, São Paulo, Goiânia e Fortaleza esse índice é de 42%; e em Maceió e Vitória 44%

dos estudantes masculinos não gostariam de ter colegas homossexuais. Ainda, 17,4% de pais de

estudantes do sexo masculino do Distrito Federal não gostariam que homossexuais fossem colegas

de seus filhos;em São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador esse índice vai de 35 a 39%;em Fortaleza e

Recife o índice está entre 59 e 60%. Em outro estudo,no qual foi apresentado para estudantes do

sexo masculino uma lista de seis ações violentas, a opção “Bater em homossexual” foi apontada

como menos grave(ABRAMOVAY et al citada por JUNQUEIRA, 2009, p.17).

Os dados aqui apresentados têm desafiado a Secretaria de Educação do Estado da Bahia –

SEC/BA a propor diretrizes que orientem a rede de educação básica na implementação de ações

voltadas ao respeito e à não discriminação racial, por identidade de gênero e por orientação sexual.

Essas diretrizes visam impactar o currículo, incorporando conteúdos didáticos e promovendo a

formação continuada de nossos/as professores/as, na perspectiva da construção de políticas públicas

de educação, extensiva a todas as escolas da nossa rede.

Vale ressaltar, que nos espaços de formação docente, como bem mostra Louro (2003), há

um vazio intenso no que diz respeito aos conteúdos que reflitam a diferença. Envolvidas pelo

preconceito social, as questões relativas a gênero, à diversidade de orientação sexual e à questão

racial, são, em geral, tratadas superficialmente. Quando apontadas no currículo, que também é um

elemento ideológico, fruto do pensamento patriarcal, referenda a supremacia do “eu referente”:

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homem, branco e heterossexual. Nesse sentido, Tomaz Tadeu (2004), explicita que o currículo é

sempre o resultado de uma seleção; é uma pista de corrida; relação de poder; uma arena, um

território, um espaço, um lugar. É também discurso, documento de identidade. Assim, no curso

dessa corrida, acabamos por nos tornar o que somos. Está, pois, o currículo inevitavelmente

imbricado naquilo que somos, naquilo que nos tornamos.

Diante desse contexto, a Secretaria de Educação buscou refletir e materializar ações

estruturantes que alterem a perspectiva dos currículos que ignora a diferença, bem como, a

formação inicial e continuada de professores/as. Desse modo estabeleceu o diálogo com parceiros,

para a construção e realização de uma ação inicial, cuja experiência será relatada a seguir.

Dialogos Formativos: uma experiência de construção coletiva

A experiência Diálogos Formativos – Educação em Direitos Humanos: combatendo o

racismo, sexismo e homofobia na escola,constituiu-se, apriori, como uma ação coletiva, desde a sua

concepção até sua realização, articulando o diálogo da Secretaria da Educação do Estado da Bahia

comos movimentos sociais5,as universidades

6e a educação básica. O nosso intuito, nesta sessão, é

discorrer sobre o processo de elaboração da sua proposta, passando pela definição do objetivo, da

estrutura/programação e do produto que seria construído.

A Superintendência de Desenvolvimento daEducação Básica – SUDEB -SEC/BA, assumiu

a responsabilidade de implementar ações que estruturassem a inserção na organização do trabalho

pedagógicodas questões relativas às orientações sexuais, identidade de gênero e de raça, ações estas

de enfrentamento ao racismo, ao sexismo e à homofobia na escola. Chamamos a atenção para o

caráter de interseccionalidade das questões supracitadas, que conforme explicita Kimberlé

Crenshaw (2002),afirma a coexistência de diferentes fatores, vulnerabilidades, violências,

discriminações, também chamados de eixos de subordinação que acontecem de forma simultânea na

vida das pessoas. A interseccionalidade, segundo Kimberlé (2002, p.117),“trata especificamente da

forma pela qual o racismo, o patriarcalismo, a opressão de classe e outros sistemas discriminatórios

criam desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de mulheres, raças, etnias, classes

e outrasӃ fundamental evidenciamosque falamos da realidade de um Estado de maioria negra, que

compõe o perfil majoritário dos/as estudantes da rede pública estadual da Bahia, onde a questão

étnico-racial é determinante na elaboração de políticas públicas educacionais. Como ponto de

5 Fórum Baiano LGBT e Liga Brasileira de Lésbicas/BA.

6Núcleo de Estudos de Gênero e Sexualidades NUGSEX - DIADORIM da Universidade do Estado da Bahiae o Núcleo

de Estudos Interdisciplinares da Mulher (NEIM)da Universidade Federal da Bahia.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X

partida, decidimos por realizar um encontro pedagógico. Mas, qual o perfil desse encontro? O que

de fato se pretendia com ele? Iniciados os diálogos com os parceiros envolvidos, que se

desdobraram em uma série de reuniões de trabalho, após algumas discussões, chegamos à síntese

deum encontro que fosse ao mesmo tempo formativoe propositivo.Definiu-se, ainda, que teria por

objetivo:discutir e elaborar proposições para composição de um documento de referência

quesubsidiaria a implementação de ações de enfrentamento ao racismo, sexismo e homofobia nas

unidades escolares da rede pública estadual.

Para dar materialidade aos propósitos do encontro supracitado, reuniões periódicas com os

parceiros aconteceram por um período de aproximadamente dois meses e neles fora construído o

encontro Diálogos Formativos em Educação e Direitos Humanos: combatendo o racismo, o sexismo

e a homofobia na escola, cuja proposta veremos a seguir:

1. O encontro foi formatado paratrês dias - totalizando cinco turnos, cujo escopo da

programação contaria com uma palestra de abertura – à noite, quatro mesas redondas – turno

matutino e cinco grupos de trabalhos temáticos (GT) – turno vespertino.

2. Os temas foram definidos, baseados em quatro linhas elementares às reflexões e

discussões balizadoras dos trabalhos, quais sejam: marcos legais; organização do trabalho

pedagógico; formação de professores; e experiências pedagógicas, articulando os conteúdos de raça,

gênero e sexualidades. Correlatas aos temas,asementasforam definidas (ver Quadro de temas e

ementas das mesas), buscando um alinhamento metodológico, para preservar a coesão dos trabalhos

e prevenir repetiçõesdesnecessárias.Para tratar os temas, foram convidados: estudiosos,

representantes de movimentos sociais e gestores da educação. Outro aspecto importante na

definição dos/as palestrantes e mediadores/as das mesas e grupos de trabalho foraconsiderar os

sujeitos autoreconhecidos fora dos padrões da heteronormatividade, portanto, dissidentes. Assim,

participaram nessa mediação/discussão educadores/as e ativistasdos movimentos negros, feministas

e LGBT: travestis, transexuais, lésbicas, bissexuais, gays, por compreendermos o valor da

experiência e a história de vida de cada um/a, as representações que trazem na pele e a importância

das suas contribuiçõespara as reflexões e proposições. Como ocorreu com a palestrante de abertura,

Profa. Dra. Luma Nogueira de Andrade (SEDUC-CE), primeira travesti doutora no Brasil.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X

Quadro de temas e ementas das mesas

Temas das Mesas Ementas

Diálogos Formativos na Educação

Básica: combatendo o racismo, o

sexismo e a homofobia (palestra de

abertura)

A necessidade de desnaturalização dos preconceitos na escola e a

garantia do direito à Educação. A interseccionalidade das

categorias raça, gênero e sexualidade para compreensão e diálogo

com as diferenças na escola. Acolhimento e estranhezas da

experiência trans no espaço escolar.

Marcos Legais: implementação da

diversidade no currículo escolar.

Panorama e contextualização dos marcos legais e a garantia das

identidades na escola. Reflexão sobre as temáticas de gênero,

raça/etnia e sexualidade na escola. Os currículos, as diversidades e o

direito ao percurso educativo digno

Organização do Trabalho

Pedagógico: articulando os

conteúdos de gênero, raça e

sexualidade do PPP à sala de aula.

O projeto coletivo da escola, para o enfrentamento ao racismo,

sexismo e homofobia - inserções à construção do PPP. A

materialidade da articulação dos conteúdos de gênero, raça e

sexualidades no fazer pedagógico cotidiano escolar.

Formação de professoras/es:

diálogos entre a universidade e

educação básica.

Reflexão sobre a formação para a diversidade de gênero, de raça e

de identidade sexual no currículo das licenciaturas e seus nexos com

a Educação Básica. Desenvolvimento de programa de formação do

corpo docente, gestão e administração das escolas para o

enfrentamento da homofobia, sexismo e racismo.

Experiências de projetos/programas

de enfrentamento ao racismo,

sexismo e homofobia na escola.

Apresentação de experiências e práticas exitosas no combate à

homofobia, ao racismo e ao sexismo na escola

3. Formação de cinco grupos de trabalho (GT), cujos temas definidos estabeleciam nexos

com aquelesdas mesas,a saber: GT 1–Currículo - uma construção de identidades e diferenças; GT 2

– Prática docente - interseccionando as diversidades; GT 3 – Discriminação e estereótipos nas

mídias e nos livros didáticos – possibilidades de leituras críticas na escola; GT4 – Experiências

educacionais dos movimentos sociais e suas contribuições para o currículo da educação básica;GT

5 – Problematizando o racismo, sexismo e homofobia na escola.Foram, ainda, definidas suas

respectivas ementas. Os GT, além de promover as discussões sobre suas temáticas, teriam a

responsabilidade de sistematizar proposições que viessem a compor o documento de referência que

subsidiaria a implementação de ações de combate ao racismo, sexismo e homofobia nas unidades

escolares da rede pública estadual. Cada GT contou com dois mediadores convidados, estudiosos

das temáticas, representantes dos movimentos sociais e gestores da educação. Como apoio,

contaram com um pequeno texto de orientações básicas ao desenvolvimento dos GT e um

instrumento para registro da síntese das propostas, elaborados especificamente para a ação em foco.

Após a sistematização das propostas nos GT,estas seriam apresentadas a todos os demais

participantes, pelo respectivo relator, previamente escolhido pelo grupo.

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4. Também, como material de apoio aos estudos e discussões, foi elaborado um glossário

com verbetes relacionados às temáticas, disponibilizados textos de base para osGT e um cd com

uma coletânea de textos correlatos.

Os Diálogos Formativos – Educação em Direitos Humanos: combatendo o racismo o

sexismo e a homofobia na escola, contou com a participação de 169 pessoas, dentre

elas:educadores/as das unidades escolares, gestores/as, técnicos/as do órgão central da SEC,

técnico/as do PAIP7, representantes dos movimentos sociais, representantes de outras secretarias de

Estado e representantes de universidades.

Asatividades planejadas para o encontro Diálogos Formativosforam desenvolvidassuperando

as expectativas, com intensas e significativas discussões, alto nível de envolvimento dos

participantes e compromisso nas discussões e sistematizações das propostas dos GT, que serão

apresentadas na próxima sessão deste relato.

Sinalizações do Coletivo – as propostas sistematizadas nos Grupos de Trabalho (GT)

Ao retomarmos a pauta sobre os trabalhos dos cinco GT, abordaremos os resultados das

propostas elaboradas. Estas, constituem-se em contribuições para a composição de um documento

de referência, com o caráter de subsidiar a implementação de ações de enfrentamento ao racismo,

aosexismo e à homofobia nas unidades escolares da rede pública estadual.

Cada grupo de trabalho, embasado pelos conhecimentos prévios e pelos conhecimentos

construídos durantes as exposições dos palestrantes e discussões das mesas e, também, dentro do

GT, foi orientado a elaborar propostapara o documento de referência eregistrá-las no instrumento

próprio. Dentre as proposições elaboradas, cada GT foi orientadoa selecionar as seis mais

relevantes, por ordem de prioridade, para apresentação e discussão junto aos demais participantes.

Das propostas formuladas pelos GT, fizemos um recorte e sistematizamos por categoriasas

quaisapresentaremos a seguir.

1. Formação Inicial e Continuada

1.1 Promover e garantir cursos de formação inicial e continuada presencial e semipresencial,

para os profissionais da educação (professores, gestores e coordenadores) da rede pública estadual

sob a perspectiva da Educação em Direitos Humanos, contemplando as discussões relacionadas às

7 Projeto de Monitoramento, Acompanhamento, Avaliação e Intervenção Pedagógica na Rede Pública Estadual da

Bahia.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X

questões de raça/etnia, de gênero e diversidade sexual na sala de aula, em todos os níveis e

modalidades de ensino;

1.2Assegurar a formação continuada dos NUPAIPRegionais8, no sentido torná-los

competentes no acompanhamento das ações voltadas para voltadas para a implementação dos

conteúdos relativos à raça, gênero e diversidade sexual;

Realizar diálogos formativos regionais;

1.4 Formar redes regionais/territoriais de formação articuladas com movimentos sociais e

universidades;

1.5 Debater a importância da laicidade do Estado e consequentemente da Educação. Ao lado

disso abordar as diferentes práticas e denominações religiosas, com igual valorização das múltiplas

visões do ponto de vista científico, como uma das formas deenfrentar o racismo e intolerância

religiosa;

1.6 Recomendar que as UniversidadesPúblicasEstaduais promovam a inclusão do

componente curricular Educação em Direitos Humanos, nos cursos de Pedagogia e demais

Licenciaturas, nos cursos de Graduação e Pós-graduação.

2. Organização do trabalho pedagógico e gestão pedagógica

2.1 Problematizar e garantir na (re) construção do Projeto Político Pedagógico (PPP) das

unidades de escolares da rede pública estadual do Estado àsquestões relacionadas aos Direitos

Humanos, sob enfoque da diversidade sexual, racismo e gênero, para o enfrentamento à homofobia,

ao racismo ao sexismo.

Tratar das questões discutidas nos Diálogos no planejamento pedagógico que ocorre no

início do ano letivo nas unidades escolares da rede pública estadual.

Promover encontros no ambiente escolarpara tratar da temática em pauta.

Fomentar diálogos formativos com as famílias através da realização de atividades

socioeducativas e culturais no espaço escolar, abordando questões relacionadas aos direitos

humanos das mulheres, das pessoas negras e dos/as homossexuais;

Garantir no Regimento Unificado das Escolas da Rede Pública uma educação para mudança

e transformação social, fundamentada nos princípios de: dignidade humana; igualdade de

direitos;reconhecimento e valorização das diferenças e das diversidades;laicidade do Estado.

8NúcleosRegionais do Projeto de Monitoramento, Acompanhamento, Avaliação e IntervençãoPedagógica, na Rede

Pública Estadual da Bahia. A gestão daSecretaria da Educação conta com 33 Diretorias Regionais de Educação

(DIREC),cujas coordenações pedagógicas constituem os NUPAIP Regionais.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X

3. Diálogos intersetorial e com os movimentos sociais

Articular outros setores do Estado (ação social, saúde, justiça e direitos humanos, promoção

da igualdade, políticas para mulheres e outros) no enfrentamento ao racismo, sexismo e homofobia

na escola;

Garantir a publicação e divulgação das experiências educacionais exitosas desenvolvidas na

educação básica e por movimentos sociais;

Formar um GT estadual,da Secretaria de Educação, para enfrentamento ao racismo, sexismo

e lesbo/trans/homofobia na escola, com representação dos movimentos sociais,

governamental,comunidade escolar euniversidades.

4. Campanhas e informativos

4.1 Produzir/atualizar e veicular,anualmente, cartilha informativa contendo “endereços

úteis” de órgãos governamentais e organizações não governamentais de combate ao racismo,

sexismo e homofobia;

4.3Realização de campanhas publicitárias em parceria com estudantes e professores para o

enfrentamento ao racismo, sexismo e homofobia nas Unidades Escolares.

5. Material didático-pedagógico

5.1Produção e/ou aquisição de material didático-pedagógico relativos à raça, a gênero e à

sexualidades;

As propostas elaboradas pelos GT revelam possibilidades de diálogos entre as ações, que

traduzem a complementaridade necessária à composição de um plano operacional estruturante,

compreendido aqui como um conjunto de ações que alteram e estruturam a inserção dos

conhecimentos referentes às orientações sexuais, à identidade de gênero e de raça. Percebemos o

quanto as ações de formaçãosão relevantes nesse processo, uma vez que a maior parte dos/as

professores que atua na redenão obtiveram na sua formação inicial acessos aos conhecimentos

relativos às conteúdos propostos. Isso implica em refletir e alterar não somente os currículos das

escolas, mas, também os dos cursos de licenciatura, evidenciando a necessidade do constante

diálogo entre Educação Básica e universidade.

Notas sobre avaliação dos Diálogos Formativos

Para avaliação dos Diálogos Formativos, foi aplicado um instrumento especialmente

elaborado para essa finalidade, com campos para registro de conceito – em uma escala onde A

correspondia a ótimo,B a bom, C a regular e D a insatisfatório – e campos para registro de

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X

justificativas, complementações e sugestões, quando o participante considerasse necessário. O

Instrumento apresentava-se estruturado em cinco grandes categorias: 1. Programação –contendo

aspectos que perpassavam pela estrutura e organização dos trabalhos, compreensão da proposta,

alcance dos objetivos, dentre outros; 2. Avaliações de cada mesa; 3. Avaliação de cada GT; 4.

Aspectos logísticos; 5.Avaliação geral do encontro. Embora tenham sido entregues a todos os

participantes, apenas 61 (sessenta e um) instrumentos foram devolvidos. Atribuímos esse baixo

quantitativo ao fato de termos deixado a aplicação para o final da ação, quando muitos

participantes, residentes no interior do Estado, precisaram se retirar em função do horário de retorno

às suas cidades.

Da análise dos resultados verificamos a satisfação dos participantes em todas as categorias

da avaliação, com média registrada de 88,5% de predominância nos conceitos A e B. Dos campos

abertos, é importante destacarmos aqueles mais relevantes que identificamos como os fatores

críticos, sugestões e complementações. Os fatores críticos recaíram sobre o tempo, considerado

insuficiente: pouco tempo para realização da ação;pouco tempo para os palestrantes;pouco tempo

para tantas informações.Nas complementações e sugestões, verificamos que a ação foi muito bem

acolhida, a partir da constatação de reiterados registros que apontavam: relevância da temática,

solicitações de continuidade, aprofundamento das temáticas, ampliação do quantitativo de

participantes, inclusão de mais gestores nas formações; de reconhecimento da ação, da seriedade

com que a temáticafoi tratada e das solicitações de encontros que possibilitem explorar mais a

temática relacionando-a com práticas pedagógicas.

Conclusões: amarando alguns fios da trama

O projeto iniciado pela Secretaria de Educação de construção de uma agenda efetiva para a

inserção dos conteúdos relativos às temáticas de gênero, raça e sexualidades nos currículos da

Educação Básica no estado da Bahia, é uma ação que vem sendo tecida através de uma rede

envolvendo universidade e movimentos sociais. O seu formato foi concebido a partir do

entendimento e reconhecimento de que ao Estado, cabe a responsabilidade de implementar e gestar

as políticas de educação que garantam a todos/as o direito de acessar os conhecimentos e práticas

pedagógicas que reflitam a diferença e a diversidade de ser e pensar a realidade social. As ideias e

proposições que devem estruturar a intervenção do Estado nessa direção estão escrito nos planos e

políticas resultantes das Conferências realizadas. Ao poder público cabe transformá-las em políticas

públicas que garantam a todas/os a superação das desigualdades com equidade.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X

A construção dessa agenda pressupõe a reflexão crítica acerca dos limites e possibilidades

da escola de problematizar e subverter o preconceito e a discriminação. O encontro Diálogos

Formativos nessa perspectiva foi intencional ao propor um deslocamento daqueles/as

professores/as, gestores/as que no cotidiano escolar tem uma enorme dificuldade em ver e entender

os jeitos de corpo, a aparente identidade difusa dos gêneros, a negritude estampada e a

masculinidade exacerbada que alimenta a homofobia, a misoginia e o racismo. A formação inicial e

continuada, a construção de materiais didáticos contextualizados e a elaboração de diretrizes

curriculares, são elementos fundamentais na arquitetura de um Projeto Político Pedagógico- PPP,

capaz de promover os direitos humanos e o enfrentamento a violência e evidenciar no seu bojo

mudanças que apontempara as possíveis intervenções que educadores e educadoras podem realizar

se a sua prática pedagógica tiver como projeto educativo, o ato político implicado na formação

humana com vistas à promoção da igualdade de gênero e consequentemente desafiados a

estabelecer o enlace das interseccionalidade de raça/etnia e sexualidade, permitindo-se o exercício

de buscar superar nossa formação limitada, a qual deve ser constantemente “alimentada” pela

pesquisa, estudos, diálogos interdisciplinares com outros colegas em rede de solidariedade.

Referências

CARDOSO, C. P.; SILVA, Z. P. Pedagogias feministas como alternativa para uma educação anti-

racista e anti-sexista. In: MESSEDER, S. A.;MARTINS, M. A. Enlaçando Sexualidades,

Salvador: EdUNEB, 2010. p.241-254

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homofobia nas escolas. Brasília. Ministério da Educação. 2009

LOURO, Guacira L. “Currículo, gênero e sexualidade – o ‘normal’, o ‘diferente’ e o ‘excêntrico’”.

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MISKOLCI, R. Teorias queer: um aprendizado pelas diferenças. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica,

2012.

Dialoguesfor confrontingsexism, racismandhomophobiain schools-a collective construction of

public policies

Abstract: This communicationis intended toreflecton the policiesofeducation forthe insertionof the

contentsof gender, raceand sexualityin the curriculumof basic educationinthe public stateof Bahia.

12

Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos),Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X

Reports the experienceof the actionentitledFormativeDialoguesin Human Rights-fightingracism,

sexism and homophobiain schools. Guestsfrom theprocess of drafting theproposedaction-

linkingstate,university andsocial movements, the holding of the meeting, the resultof

thesystematiccontributionsof the working groups, the evaluation summaryof the participantsandthe

developments thathave resulted ina projectof copingsexism, racismandhomophobiain the school.

Revealsthe limits andpossibilities of implementationof the contentabove, bringing the discussion

ofinitial and continuing training, curriculum and teaching materials.

Keywords:Public PolicySchool. Curriculum. Gender. Race. Sexuality.