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••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 34 [ .AIIIIT: " -- ... --] Direito e Lógica: Raciocínio Razoável no Direito Ao investigar a lógica jurrdica, perceber·se·á que sua constituição tem pou· cas características da lóg ica matemática ou formal, ao contrário do que pensam conceituados autores e doutrinadores do Direito. O que ocorre é que não se pode conceber o raciocínio jurídico partindo de premissas absolutas e incontestáveis ;' os juízos jurídicos são in va ria ve lmente juízos de valor, e essa imbricação do Direi- to co m a cultura e com a moral acaba por realizar o comprometimento de suas estruturas lógicas. Os procedimentos decisó rio s e o raciocínio jurídico não obe· decem, de for ma alguma, a esquematismos pré-concebidos ou a qualquer tipo de predeterminação de seus conteúdo s. Enfim, sobretudo quando se pensa na apli- cação do Direito, deve·se afirmar que se está a utilizar o lógos do razoáve l. ' I. " Em um siSlema formal, uma vez enunciados os axiomas e formuladas as regras de dedução admitidas, resta apenas aplicá· los corretamenle para demonstrar os teoremas de uma forma impositiva. Se a demonstração estiver correta, devemos inclinar-nos diante do resultado obti- do e, se aceitarmos a verdade dos axiomas, admitir a verdade do teorema, enquanto não river- mos dúvidas sobre a coerência do sistema. O mesmo, porém, não acontece quando argumen· tamos" (Pfrelman, L6glCa juridica, 1999, p. 170) . 2. A expressão é utilizada dentro do sistema de idéias de Recaséns Siches, que vem exposto, em algu ns de seus aspectos, nessa tópica. Sobre o papel revolucionário do lógos do razoá vel na in· terpretação juridica, consulte-se Siches, Tratado general de filosofia del derecho, 1975, p. 627- 665. Ainda, consulte -s e, do mesmo autor, a obra Nuevafilosofía de la il1terpretaciól1 dei derecho. 1973. DI REITO E LÓGICA: RACIOCÍNIO RAZOÁVEL NO DIREITO 493 o juízo aplicativo não se resume ao juízo judiciaL' aplicação em que existe o tr atamento conjugado do dever-ser com o ser, de modo a que o dever-ser torne· se ser. 2 Em todo ato aplicativo interrompe-se a promessa de que algo venha-a-ser, para que efetivamente o seja; na aplicação, o dever ·ser deixa de ser potência e torna- se ato. A norma, em sua aplicação, passa de seu estado letárgico, estático, adentrando ao mundo do ser, no qual se insere com todas as problemáticas a ele inerentes; sua natureza de dever-ser, seu sentido neutro e impassível, sua estrutu- ra cristalina, sua perfeição apriorística, são apenas momentos do sentido, antes de sua reificação. Percebe-se que a temática da aplicação en vo lve necessariamen- te a abordagem da interpretação, pois não aplicação sem interpretação. Todo texto que contém uma decisão jurídica, à qual se chega pelo exercício de interpretação de outros textos, é, a principio, apenas um ato fonnal pertencente a um procedimento. Na verdade, porém, é muito mais: é, com toda a carga do termo, um texto jurídico,' e isso porque reúne em sua aparente simplicidade um incontável número de fatores que lhe determinam a essência. Trata-se de um gran· de complexo de signos, ou, ainda, da junção de vários códigos travestidos em uma única linguagem: a linguagem jurídico.decisória. Ora, a atividade decisória é uma atividade de sentido que parte de textos nonnativos, coadunando- os a QUO'os textos reunidos no curso de um procedimento Uudicial ou administrativo); não se resume somente à interpretação, muito me- nos à pura atitude decisória, muito menos à integração do Direito, pois essa atividade se revela criadora do Direito. O Direito funciona à medida que suas práticas discursivas interagem entre si e com outras práticas alheias ao sistema juríd ico. Nesse sentido, a atividade deci- sória é essencial, pois cria textos que individualizam discursos e que, portanto, são capazes de fundar sent ido, at uando in concreto, a partir de interpre- tações de outros discursos, construídos in abst ÃCto.· Com isso se afirma que o discurso decisório movimenta o sentido normativo. 1. Estudar-se·á com maior profundidade O discurso decisó ri o jurídico (administrativo c judicial) e suas injunções em específico no Capítulo seguinte àquele em que se confere tratamento ao discurso nonnativo. Dessa forma, pode-se melhor discutir qual a reláção entre ambos os dis· cursos. 2. Dizer qUt: o dever·ser transforma-se em ser é o mesmo que dizer que a conduta humana encon- trava.se cristalizada na norma jurídica. Aqui. adota-se literalmente a expressão utilizada por Siches em várias passagens de seu texto, inclusive nesta: "Una norma jurídica es un pedaz.o de vida humana objetivada" (Siches. Op. dt., p. 135). 3. O complexo emaranhado de notações sígnicas normativas e não flOr/nativas carreadas e reuni- das no contexto de um processo decisório é fei to ponto de apoio para a decisão. que também par si se utiliz.a de novos signos lingüfsticos para exprimir o decisul/I. 4. "Esta observación pane de manifiesto que el sentido de la obra cultural - de conocimiento, de arte, de política, de Derecho etc. -, es siempre un sentido Circunstancial, cs decir, un sentido reCerido a las circunstancias concretas en que SE presenló la necesidad estimulante, cn las que se concibió la conveniencia y la adccuación dei fin, y en el que se apreció la idoneidad y la cficada de los medias adaptados" (Siches. Op. cit., p. 140). , ;; , I r-.. ar.

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34 [ .AIIIIT:" .~ - ~ --... --]

Direito e Lógica: Raciocínio Razoável no Direito

Ao investigar a lógica jurrdica, perceber·se·á que sua constituição tem pou· cas características da lógica matemática ou formal, ao contrário do que pensam conceituados autores e doutrinadores do Direito. O que ocorre é que não se pode conceber o raciocínio jurídico partindo de premissas absolutas e incontestáveis;' os juízos jurídicos são invariavelmente juízos de valor, e essa imbricação do Direi­to com a cultura e com a moral acaba por realizar o comprometimento de suas estruturas lógicas. Os procedimentos decisórios e o raciocínio jurídico não obe· decem, de forma alguma, a esquematismos pré-concebidos ou a qualquer tipo de predeterminação de seus conteúdos. Enfim, sobretudo quando se pensa na apli­cação do Direito, deve·se afirmar que se está a utilizar o lógos do razoável. '

I. "Em um siSlema formal, uma vez enunciados os axiomas e formuladas as regras de dedução admitidas, resta apenas aplicá· los corretamenle para demonstrar os teoremas de uma forma impositiva. Se a dem onstração estiver correta, devemos inclinar-nos diante do resultado obti­do e, se aceitarmos a verdade dos axiomas, admitir a verdade do teorema, enquanto não river­mos dúvidas sobre a coerência do sistema. O mesmo, porém, não acontece quando argumen· tamos" (Pfrelman, L6glCa juridica, 1999, p. 170) .

2. A expressão é utilizada dentro do sistema de idéias de Recaséns Siches, que vem exposto, em algu ns de seus aspectos, nessa tópica. Sobre o papel revolucionário do lógos do razoável na in· terpretação juridica, consulte-se Siches, Tratado general de filosofia del derecho, 1975, p. 627-665. Ainda, consulte-se, do mesmo autor, a obra Nuevafilosofía de la il1terpretaciól1 dei derecho. 1973.

DI REITO E LÓGICA: RACIOCÍNIO RAZOÁVEL NO DIREITO 493

o juízo aplicativo não se resume ao juízo judiciaL ' Há aplicação em que existe o tratamento conjugado do dever-ser com o ser, de modo a que o dever-ser torne· se ser.2 Em todo ato aplicativo interrompe-se a promessa de que algo venha-a-ser, para que efetivamente o seja; na aplicação, o dever·ser deixa de ser potência e torna­se ato. A norma, em sua aplicação, passa de seu estado letárgico, estático, adentrando ao mundo do ser, no qual se insere com todas as problemáticas a ele inerentes; sua natureza de dever-ser, seu sentido neutro e impassível, sua estrutu­ra cristalina, sua perfeição apriorística, são apenas momentos do sentido, antes de sua reificação. Percebe-se que a temática da aplicação envolve necessariamen­te a abordagem da interpretação, pois não há aplicação sem interpretação.

Todo texto que contém uma decisão jurídica, à qual se chega pelo exercício de interpretação de outros textos, é, a principio, apenas um ato fonnal pertencente a um procedimento. Na verdade, porém, é muito mais: é, com toda a carga do termo, um texto jurídico,' e isso porque reúne em sua aparente simplicidade um incontável número de fatores que lhe determinam a essência. Trata-se de um gran· de complexo de signos, ou, ainda, da junção de vários códigos travestidos em uma única linguagem: a linguagem jurídico.decisória.

Ora, a atividade decisória é uma atividade de sentido que parte de textos nonnativos, coadunando-os a QUO'os textos reunidos no curso de um procedimento Uudicial ou administrativo) ; não se resume somente à interpretação, muito me­nos à pura atitude decisória, muito menos à só integração do Direito, pois essa atividade se revela criadora do Direito.

O Direito funciona à medida que suas práticas discurs ivas interagem entre si e com outras práticas alheias ao sistema jurídico. Nesse sentido, a atividade deci­sória é essencial, pois cria textos que individualizam discursos normativos~ e que, portanto, são capazes de fundar sentido, atuando in concreto, a partir de interpre­tações de outros discursos, construídos in abst ÃCto.· Com isso se afirma que o discurso decisório movimenta o sentido normativo.

1. Estudar-se·á com maior profundidade O discurso decisório jurídico (ad ministrativo c judicial) e suas injunções em específico no Capítulo seguinte àquele em que se confe re tratamento ao discurso nonnativo. Dessa forma, pode-se melhor discutir qual a reláção entre ambos os dis·

cursos. 2. Dizer qUt: o dever·ser transforma-se em ser é o mesmo que dizer que a conduta humana encon­

trava.se cristalizada na norma jurídica. Aqui. adota-se literalmente a expressão utilizada por Siches em várias passagens de seu texto, inclusive nesta: "Una norma jurídica es un pedaz.o de vida humana objetivada" (Siches. Op. dt., p. 135).

3. O complexo emaranhado de notações sígnicas normativas e não flOr/nativas carreadas e reuni­das no contexto de um processo decisório é fei to ponto de apoio para a decisão. que também par si se utiliz.a de novos signos lingüfsticos para exprimir o decisul/I.

4. "Esta observación pane de manifiesto que el sentido de la obra cultural - de conocimiento, de arte, de política, de Derecho etc. -, es siempre un sentido Circunstancial, cs decir, un sentido reCerido a las circunstancias concretas en que SE presenló la necesidad estimulante, cn las que se concibió la conveniencia y la adccuación dei fin, y en el que se apreció la idoneidad y la cficada de los medias adaptados" (Siches. Op. cit., p. 140).

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TÓPICOS CONCEITUAIS

A re-construção do sentido nonnativo,l por meio da interpretação, nesse sen­tido, quando vertida para a atividade aplicativa, possui a capacidade de fundar uma nova ordem textual, a saber, aquela capaz de individualizar o sentido jutidi­co, de pôr fim a uma querela, enfim, de apresentar decisões. Nesse processo de individualização normativa detecta-se, fundamentalmente, uma atividade pru­dencial (prudentia) .'

Essa é. uma visão que destaca e acentua o relevo do agente decisório na cria­ção e aplicação da textualidade normativa à materialidade dos acontecimentos jurídicos, enquanto exerclcio da razão prática, enquanto prudentia. A atuação da razão prática é uma atuação que apela para o uso discursivo. Ao mesmo tempo, porém , a razão prática avoca a introdução da noção filosófica de 16gos do razoá­vel. Ai inclusive se encontra a chave para a compreensão da relação entre lingua­gem , discurso e lógica jurfdica'

Os conflitos expostos à decisão, em verdade, não cessam de criar novos con­ntras; mas, agora, esses novos conflitos são de caráter semântico, que antepõem as partes entre si, as partes com o órgão decisor, o órgão decisor com as instân­cias superiores ... Então, o que se tem é que todo ato decisório constitui-se em um ato complexo, pois parte de um texto normativo (e o precedente ou os costumes fazem as vezes de norma para o sistema da common law) para, logo em seguida, desconstruf-Io, atribuindo-lhe um sentido pragmaticamente identificável, inferível a partir de seu próprio construto de signos. Esse texto decisório é, desde que con­siderada a autoridade que se encontra subjacente a essa espécie de discurso, vinculante.

Em verdade, a interpretação e o entendimento do agente decisó rio, assim como das cortes judiciárias que controlam as demais decisões e atividades juris­dicionais, ou das autoridades administrativas de cassação, são limites para a ex­pansão do campo de entendimento e apresentação dos problemas exegéticos pelo

1. A esse respeito: Ibidem, p. 136. 2. "Quando, por razões de bom senso, de eqüidade ou de interesse geral, uma soluçA0 se apre·

sente como a única admissível, ela é que tende a impor·se também em direito, ainda que se seja obrigado a recorrer a uma a.rgumentação especiosa para mostrar sua conformidade com as nonnas legais em vigor" (Perelman, Légicajurfdica, 1999, p. 190).

3. A thulo ilustrativo, pode·se colacionar este julgado quc ilustra com lodas as letras a boa absor­ção prállca da teoria do lógos do razoável na condução dos fenômenos jurídicos: "O Direito, como fato cultural, é fenômeno histórico. As normas jurfdicas devem ser inl erpretadas con· soante o significado dos acontecimentos quc, por sua vez, constituem a causa da relação jurí­dica. O CPP dAta do inkio da década de 40. O país mudou sensivelmente. A complexidade da conclusão dos inquéritos policiais e a dificuldade da instrução criminal são cada vez maiores. O prazo de conclusão não pode result ar de mera soma aritméllca. Faz·se Imprescindíve l racio· ci nar com o juízo da razoabilidade para definir o excesso de prazo. O discurso jurldico não é si mples racioclnio de lógica formal" (ST J - RH C 1.453 - ReI. Vicente Cemicchlaro - DJU, de 9· 12·91 , p. 18.044).

_______ ~D~IR~E=rr-'-'o E LóG_,CA_: ~C_'_OC_IN~ RAlfl .EI. 'I;() llllUJ I (J

leitor-receptor da norma. O sentido de li ma norm:1, p;ua um C;'lSO COIll' leIO, {'c;;I,i

em aberto até que o poder defin a o que é essa norl11<1. ' Assim, na at ividade de co nstru ção do se nt ido da s normas, ou ltIesmo de

dirimição da problemática ori unda da ausência destas (lacuna), bem romo da existência de duas ou mais normas connitantes para a resolução de UIll mesmo conflito (antinomia), o bom estudo dos fenômenos sfmióti<.::os e Sociossfmiólico\ é determinante para o entend imento da complexidade de 4ue se reveste {} aIO de julgar, A decisão, quando apresentada para valer como norma ind ivldllal \'i1U.: ul:lIllc para as partes, é sempre um reu'cula culruraU E isso pe lo fato de resultar de Ultl.l

midade de processos decodifica rivos, imerprewnvos, lógico,'. cll l t l/l'(I ;,\, rdl'o/úSICtH,

programáricos, psicológicos, sociais e funciollals, em virtude do innuxo <Ir ('ondi donantes na determinação do decisório fin al.'

No sentido da ruptura da ordem da lóg ica fOI mal é que 'ie deve lil pidi\f ti

espaço da lógica do razoável, que apela não para respostas apriorís ticas, mil\ p:lI ,I

atitudes situacionais,4 permeadas pelas pregn;i ncias pr6prins ao cont extO em que se desenvolvem e surgem eSSé\S questões. Aqui, rlhre·se espilço teóri<.'o para U111

apelo de contrariedade ;1 lógica mate l1\ á li cfl ~ n:l in terprelil \'rlo judcli cól, pois tndo o tema da aplicação e da interplctaçfio demamla raloabilidade, ou seja, ponder;\ ção do que seja e do que não seja, circunstancia lmente, e de acordo com inú mc ras variáveis valorativas que não podem ser cultivadas no terreno da pu ra lógir;l artificia l.

O lógos do humano, para Siches, é uma aposta numa lúgica cspecírica aos dados da ação, da razão prática; uma aposta num raciocínio humano que lida COI1l

o contingente da decisão (de acordo com as possibilidades, inconsl1\nci.\s, irregu "\ I

eX) laridades, nuxos e refluxos dos valores).'

t.

2.

Não de outra forma fo i que a tcoria kelseniana apontou es'(' ("ar,itel lia IIlterpl(·t,I~.i" jmhn.11 como uma interpretação originária. e isso porque vmCUla ll1e. "Estn observación pone de manificslO que el sent ido de la obro c.:t1ht1lal-, de wllolillll('l1tO. 1.11-arte, de polhica, de Derecho etc. -, es siempre IJIl <;clltillo CWCIf/WUI/ClUI, cs dt'rir, Ull sentido referido a las ci rcunslancias concretas en que se pre!ien tó la necesidad c<;timulallle, en 1:1<; que se concibió la conveoiencia y la adecuación dellin , y eo cl que- se aprcrió In itloneidild y 1.1 rOcólcia de los medios adaptados" (Siches. Op. dI. p. 140).

3, Toda a ca rga de elementos determinantes do decisório constltui·se como con<;ldcrações ncercl de uma teoria do repert6rio aplicável aO pensamento juri <;dicional, Icndo·se {' m vista qllC este se encontra na posição de intérp rete c leitor, sendo pro"""I:1melHe ('<;I:1 a C\rem de l11i1nif('~wç511 do interprecan ft peirceano. A idéia oão é "reprodud r la norma ge neral, sino en un ad ;l pliu' la paul,1 ~cnNal por e11a <eilal:lIl.1 a cada caso singul ar C .. )" (S iches. Op. dI. p. 14 1 l.

4.

5. Lt:la·se: "La lógica trad icional es meramente enunciativa dei <;er ) dei no se r. pt' ro !lO COlll1Cl1I.' puntos de vista de valor ni estimaciones sobre la corrccción de lus ' in('< , !li <;obr(' lil (On~nll'nül entre medias en relación coo un determi nado fin" (llmlcl1l. p. 1(6)

6. "Ahora bien, el proceso de interprewdôn de una norm~l ~l'lIr r:11 r,"sllCt'ln de- 1u\ (;I\U<; qll~\lI,1 res, la individuali7.3ción de las consecuencias de esa normi! paról 1 ;, l e~ caso<;, y la<; v;llnrat'iOIll"

que la int erprelación y la individualización deban ir rxperimeOl:1ndo. toclo e'iO. del\f" (,1('1 j,"11I

li)

v . -t.

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TÓPICOS CONCEITUAIS 0="'--__

Negar essa perspectiva é negar a própria ratio essendi do Direito. Isso por­que toda prática jurídica possui uma lógica de valores, que se utiliza de uma raeio instrumental para regrar o convívio social. Com isso, há de se reconhecer sua natureza como uma natureza mutante, em perene processo de mutação. Então, para a melhor definição da razoabilidade que aqui se erige como ponto central da discussão, deve-se dizer que:

a) é exercida em função da ponderação de variantes circunstanciais, de modo que sua produção impede que se cristalize ad perpetuul1l, perma­necendo claramente variante;

b) não se exerce como expressão da opinião singular e não necessariamen­te como expressão da opinião coletiva, mas obedece a parâmetros de en­tendimentos jurídicos majoritários, o que reclama o estudo das palpita­ções da teoria da argumentação e do convencimento na busca do sent i­do mais plausível e sustentável;

c) operacional iza-se em função de necessidades práticas e ocorrências feno­mênicas que demandam uma ação, no caso, jurídico-decisória pelo dis­curso performativo, de modo que ocorre dentro de práticas sociojurídicas de sentido, imersa numa cultura ;

d) apela para a prudentia humana, que extrai soluções e vivencia experiên­cias in caSll, a partir de variáveis situacionais e vivenciais;

e) constrói no uso discursivo e argumentativo a situação de exercício da razão jurídica, em comunicação e historicamente;

O em meio ajuízos de intertextualidade, o poder estabelece sentido, em face da necessidade de decidir, à medida que encerra a cadeia interpretativa, atribuindo sentidos às normas jurídicas.

Na objetividade com a qual se inscreve o discurso decisório, interpretativo e aplicativo, diluem-se os elementos que condicionam e condicionaram o agente decisório na cunhagem do juízo. Em sua aparência puramente formal , de ato aplicativo de um procedimento, em verdade, é também um fato social e socioju­rídico. Essa decisão é mais que ato fonual , pois é capaz de re-orientar entendimen­tos, redimensionar estruturas de sentido solidificadas, entre outros efeitos meta­processuais. Nenhuma decisão provém ex nihilo, ou muito menos se direciona ex nihilo.

l'l dominio dellogo.~ de lo humano, dd lagos de la acción humana. No es algo fOl1uito, ni tampom 'llgo que pueda ser decidido arblfrariameme. Es algo que debe ser resueho razonablrmeme. Pem pilra eso no sirven Itls raz.ones de tipo matemático. L..11ógica tradicional, la de la razón pura, no !ouve para tratar ni resolve r tales problcma~. Necesitamos orro ripo de lógica, la cUdl es también lógica, pero diferente de la lógica tradicional: necesilamos la lógica de lo humano, la lógica de \n rawnable, a diferencia de la lógica de lo racionar· (Ibidem, p. 143).

DIREITO E LÓGICA: RACiOCíNIO RAZoAvEL NO DIREITO 497 . --- ..•

No entanto, de qualquer forma, o decisum como construção semióc;ra, ao ser prolatado por seu produtor, deixa de ser uma estrutura permeável à busca da inrencionalidade, fazendo-se, da mesma forma como ocorre com as nonnas jurí­dicas promulgadas, um produto semântico autônomo. A det'isão torna-se um pro­dutor sem sujeiw; a partir de sua produção, o texlO decisório passa a vincular·se a um amor, na proposta de Paul Ricoeur. Toda (. _cisão pressupõe uma imertex­tualidade. Uma decisão, ainda que proveniente de um único agente decisório, não é só axiologia pessoal, mas um discurso que se age intenex tualment e com as pres­crições vigentes (princípio da legalidade da decisão), de acordo com as orienta­ções de sentido sustentáveis em torno da norm a a aplicar (opiniões doutrinais, correntes ju risprudenciais, pré-julgados.,,).1

Decorre, de qualquer maneira, que o ato de julgar é um mo complexo, nfio se podendo afirmar que este corresponda a um mero ato dedutivo.' De falO, o texto da norma é tomado como apenas um ponto de partida para o estél beleci mellto de uma cadência de todos os significados e todas as implicações que se referem i.I uma situação fática que demanda uma postura decisória. Pnra eslól nfio é suficient e, portanto, um procedimento dedllti vo de adequaçiio norlllil/ rolu .. T('lmk, po is para lal adequação entre o jurídico e O rático prcssupõe·se ;1 illlcrvcnç;io de U111 agell te decisório, frágil a uma miríade de elementos que condicionam se u agir.

Também, não é tão simples o processo de identificação da norma aplit<ível in casu; uma multiplicidade de normas candidma-se para a resoll\(;iio do caso slIb judicem, e já nesta escolha da norma aplicável pelo agente decisório já há inter­pretação, de normas e do sistema jurídico.' Essa at ividade calcu lado", e de sele­ção dos elementos cabíveis para um decisum, a partir de umu ou mais normns, é sempre complexa. A seleção a que se procede é propriamente umu atividade que se pode denominar prudencial, e isso porque concilia códigos, va lores e informa­ções, ou seja, elementos heterogêneos.

A partir da referência à prudellria deliberali vél, enquil lll0 derivéltivo da r':lz;io prática (l1ot1s prakrikós), é que se pode enunciar, COtn os devidos lermos, uma !l'O­ria da razoabilidade no campo jurídico. De acordo C0111 eStil, as noçõcs clt' meio­nalidade e razoabilidade não são coi ncidentes. O raciocínio juríd it:o deixa de ser equiparado ao raciocínio lógico, abscrativo-ciemífico ali matem\Ítico:1 A nlividn­de interpretativa torna-se, então, calculadora , o que quer dizer que to llHl em COI1 -

1. Não necessariamente adsrrila ao acolhimento da colllll"/IIi.~ IJplllio, todn lendêm.ú inovador.1 que se afigura em dissonância com o cllIendimento generõlli7<l(\u deve ser sustentada, (' i' til'''· se sentido que se avulta o papel da teoria da argumentação no seio da)lIridicicfallr.

2. A idéia não é "reproducir 1<1 norma general. sino en un õld;rplar I" piHllil ~t·n{'fal pm dia ~('iia l;ld ir a cada caso singular (. .. )" (Siches. Op. cito p. 141),

3. De faro: "es el juez quien [iene que decidir la elección de liI premisa 1Tl<l)'or, sobre 1;1 {'ual v;ry;r a fundar su senrencia , si es que se presenta el problema de que hayõl más de una premi~<I pos.~ihl(', cada una de ellas v:ilida en el ordenamiento jurídico po.~: " ·.o" lIbidcm. p. 237) .

<1. Ibidem, p. 168.

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(/J'J 11)

Ei',

.~ ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 498 TÓPICOS CONCEITUAIS

sideração OS diversos elementos que subjazem ao universo hennético do sujeito­da -interpretação que decide, plasmando-os ao lado de outras variantes. Fica cer­to, pois, que a autoridade decisória, ao adotar uma resposta para a problemática fática, antes d~ qualquer coisa, vaiara. I

Destitufda de sentido, ponanto, resta a teoria que consagra a silogicidade do julgamento, de modo que se pode afirmar que, antes de mais nada, esta é uma plaga arenosa, senão pantanosa .' Tal escassez de conteúdo da teoria silogística é que lhe retira o estatuto de uma teoria viável para o desnudamento da complexi­dade do ato que conjuga aplicação e interpretação. Nesse sentido, esvaziar de valorações e de teleologia o ato decisório foi seu maior erro. 3

Conclus~;

A lógica jurídica não pode ser resumida à lógica formal. O reducionismo pro­vocado por esse tipo de racioclnio compromete a aceitação da entrada e saída de valores no universo das práticas jurídicas, o que prejudica sobremodo a formação de uma consciência mais aproximada da realidade entre prática e teoria juridica. Ora, o razoável, o prudencial, o ponderável, o meio-termo são partes constitutivas das práticas jurídicas sobre o justo. Apostar na vinude prudencial, e nas próprias incertezas que daí decorrem. é apostar na capacidade humana de criar soluções satisfatoriamente justas para lides e conflitos decorrentes da inter-ação social.

1. Ibidem p. 236. 2. '\ ... ) la lóglca tradicional es meramente enuncmllva dei ser y dei no ser, pera no conuene puntas

de VlSI8 de valor ni eSlimaclones sobre la correcclón de los fines, ni sobre la conJtrucncia enrre medias cn relaclón con un determinado fin" (Ibidem, p_ 166),

3. "Ese proceso deve estar regido por un tipo especIal de lógicd, que es diferente de la lógica tra­dicional, a saber, dcbe estar regido por una especial lógica de la acción humana re ferida a va­lores y encaminada a realización de fines" (Sichcs, NuevafilQsofia de la inferpretacr6n dei derecho, 1973, p. 142).

o ID

15"'­C-