desenvolvimento e pobreza

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Estratégia de desenvolvimento e combate à pobreza ROBERTO CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE D A COMPREENSÃO contemporânea do desenvolvimento como processo glo- bal, ou seja, envolvendo múltiplas e complexas inter-relações entre o econômico, o social e o político, emergem seus três objetivos: a eficiên- cia, a eqüidade e a liberdade (1). O grau de alcance, por uma sociedade, do objetivo eficiência, de natureza mais econômica, pode ser aferido pelo Produto Interno Bruto (PIB) per capita, que é, na verdade, um indicador de produtividade (2). O objetivo eqüidade é geralmente mensurado através de índices de desigualdade relativa da distribuição interpessoal da renda, o mais conhecido deles sendo o Coeficiente de Gini (3). Sobretudo de caráter político, o objetivo liberdade, de precária quantificação, tem sido avaliado a partir de indicadores relativos a participação política, segu- rança pessoal, liberdade de expressão, eficácia da lei e, em geral, ao exercício dos direitos e deveres da cidadania (4). O cerne do drama experimentado historicamente pelo desenvolvimento reside na incessante e, muitas vezes, frustrante busca de conciliação desses três objetivos. Talvez, ainda que com alguns riscos, possa se dizer que esse anseio está presente no imaginário político do Ocidente desde o Iluminismo, embora so- mente tenha começado a tomar concretamente forma com a gradual emergência, a partir de fins do século XVII, das nações-estados modernas do Noroeste da Europa. No que aqui interessa, a Revolução Industrial pode ser vista como o salto qualitativo na eficiência da produção, e a Revolução Francesa e seus desdo- bramentos - tanto os ideológicos, em particular o ainda chamado socialismo utópico, quanto os pragmáticos, mormente a progressiva universalização da edu- cação formal, pública e leiga -, como engendrando as transformações que vão, com o passar do tempo, resultar em mais liberdade e em mais eqüidade. A modernidade dos países considerados desenvolvidos (seja da Europa, seja da América do Norte, seja do Leste Asiático e do Pacífico (5)), hoje uma modernidade tríplice (6), embora combinando eficiência, eqüidade e liberdade

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  • Estratgia de desenvolvimentoe combate pobrezaROBERTO CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE

    D A COMPREENSO contempornea do desenvolvimento como processo glo-bal, ou seja, envolvendo mltiplas e complexas inter-relaes entre oeconmico, o social e o poltico, emergem seus trs objetivos: a eficin-cia, a eqidade e a liberdade (1).

    O grau de alcance, por uma sociedade, do objetivo eficincia, de naturezamais econmica, pode ser aferido pelo Produto Interno Bruto (PIB) per capita,que , na verdade, um indicador de produtividade (2). O objetivo eqidade geralmente mensurado atravs de ndices de desigualdade relativa da distribuiointerpessoal da renda, o mais conhecido deles sendo o Coeficiente de Gini (3).Sobretudo de carter poltico, o objetivo liberdade, de precria quantificao,tem sido avaliado a partir de indicadores relativos a participao poltica, segu-rana pessoal, liberdade de expresso, eficcia da lei e, em geral, ao exerccio dosdireitos e deveres da cidadania (4).

    O cerne do drama experimentado historicamente pelo desenvolvimentoreside na incessante e, muitas vezes, frustrante busca de conciliao dessestrs objetivos.

    Talvez, ainda que com alguns riscos, possa se dizer que esse anseio estpresente no imaginrio poltico do Ocidente desde o Iluminismo, embora so-mente tenha comeado a tomar concretamente forma com a gradual emergncia,a partir de fins do sculo XVII, das naes-estados modernas do Noroeste daEuropa. No que aqui interessa, a Revoluo Industrial pode ser vista como osalto qualitativo na eficincia da produo, e a Revoluo Francesa e seus desdo-bramentos - tanto os ideolgicos, em particular o ainda chamado socialismoutpico, quanto os pragmticos, mormente a progressiva universalizao da edu-cao formal, pblica e leiga -, como engendrando as transformaes que vo,com o passar do tempo, resultar em mais liberdade e em mais eqidade.

    A modernidade dos pases considerados desenvolvidos (seja da Europa,seja da Amrica do Norte, seja do Leste Asitico e do Pacfico (5)), hoje umamodernidade trplice (6), embora combinando eficincia, eqidade e liberdade

  • em graus bastante diferenciados, no foi obtida de modo historicamenteconcomitante, nem atravs de trajetrias de evoluo nacional equilibradas. Emalguns casos - e muitas vezes por longos e descontnuos perodos de tempo -, aeqidade foi preterida pela eficincia ou pela liberdade; em outros, a liberdadeviu-se sacrificada para dar lugar a mais eqidade ou eficincia; em outros ainda, aeficincia foi postergada em nome da eqidade ou da liberdade. E fato, porm,que esses pases, havendo conquistado nveis relativamente altos de eficincia(representada por PIBs per capita superiores a US$ 8.000 anuais (7)), encon-tram-se melhor equipados para equacionar seus problemas sociais e polticos.

    No extremo oposto, os pases subdesenvolvidos (8), em mais de um sentidoainda pr-modernos, no tendo resolvido suas questes de eficincia produtiva,enfrentam grandes dificuldades para solucionar seus desafios sociais e poltico-institucionais. Embora seus nveis de desigualdade relativa no sejam necessaria-mente elevados, so muito altas suas incidncias de pobreza crtica. E so em geralmuito baixos os graus de liberdade poltica e de estabilidade institucional (9).

    Entre os dois extremos situam-se os pases em desenvolvimento (10), quevivenciam os paradoxos de uma modernidade incompleta e inorgnica. Emboravenham em geral atingindo patamares relativamente elevados de diferenciao ecomplexidade econmica (inclusive, em muitos casos, considervel grau de in-dustrializao), esse processo comumente desigual, setorial e espacialmente,determinando grandes, ainda que quase sempre decrescentes, diferenciais inter-nos de eficincia produtiva. Essas desigualaes econmicas refletem-se emdisparidades sociais (interpessoais, inter-regionais, urbano-rurais), em vrios ca-sos agravadas por assimetrias na distribuio do capital humano, ou por outrosfatores de ordem histrico-cultural. Por sua vez, esses desequilbrios scio-eco-nmicos interagem com formas de institucionalizao do poder de tendnciasoligrquicas, de que redundam performances modestas no que respeita aos indica-dores polticos (11).

    A diversidade das situaes nacionais dos pases em desenvolvimento e ospadres diversos de sua evoluo nas ltimas dcadas dificultam qualquer tenta-tiva de generalizao. Pode-se, contudo, com alguma segurana dizer que, nosltimos anos, a incidncia de pobreza tendeu a reduzir-se bastante rapidamentecom o crescimento econmico continuado, bem como que no se observam cor-relaes significativas, seja entre os nveis de renda, medidos pelos PIBs per capita,e os graus de desigualdade relativa, expressos pelos Coeficientes de Gini, sejaentre esses ltimos indicadores e as incidncias de pobreza.

    A modernidade trplice dos desenvolvidos, objetivo que se presume venhasendo perseguido pelos pases subdesenvolvidos e em desenvolvimento, no sercertamente alcanada atravs de seqncias equilibradas de progresso. pouco

  • provvel, contudo, que ela seja mais rpida e eficazmente obtida mediante a elei-o de um dos objetivos do desenvolvimento - seja ele a eficincia, a eqidade oua liberdade -, em detrimento dos outros dois. Esto de h muito anacrnicas asteses deterministas que submetem o social e o poltico ao econmico, substitu-das pelo reconhecimento das mltiplas e complexas implicaes entre essas trsdimenses do desenvolvimento, que so, na realidade, indissociveis.

    Dentro dessa ordem de idias, as altas incidncias de pobreza crtica encon-tradas nos pases subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, comumente consi-deradas apenas como problemas sociais, tm, na verdade, bvias implicaes eco-nmicas e polticas. De uma parte, a pobreza pode retardar ou comprometer ocrescimento econmico, seja por limitar a capacidade produtiva dos recursoshumanos, seja por inibir a expanso do mercado interno. De outra, a incapacida-de de contigentes significativos da populao de prover, por seus prprios meios,suas necessidades bsicas a prpria negao da liberdade e da eqidade e podeser capaz de gerar conflitos sociais politicamente desestabilizadores.

    A pobreza , portanto, para os pases menos desenvolvidos, questo cen-tral a ser enfrentada na formulao e execuo das diversas estratgias nacionaisde desenvolvimento.

    Considerado esse contexto, nosso objetivo neste estudo o de conceber, apartir da anlise e interpretao da pobreza no Brasil e de suas diferenciadassituaes, rurais e urbanas, modelos de interveno voltada a seu combate, in-seridos na estratgia nacional de desenvolvimento. Modelos que possam vir aser relevantes para a formulao de aes antipobreza no Brasil, alm de terem,eventualmente, alguma validade como paradigmas para outros pases, subde-senvolvidos ou em desenvolvimento.

    O pressuposto terico subjacente a esta abordagem o de que as estrat-gias de interveno planejada em situaes sociais, embora tenham objetivospreestabelecidos, devem definir-se a partir do conhecimento de seus objetos. Ouseja, de que antes necessrio conhecer e interpretar analticamente a realidadepara, em seguida, conceber os cursos de ao com maiores possibilidades concre-tas de modific-la.

    Para que possam constituir referencial s aes antipobreza, os modelospropostos, especificados de acordo com situaes sociais previamente analisadase interpretadas, posicionam-se, com relao a programas ou projetos, em nvel demaior generalidade (isto , so entendidos como molduras, nas quais eles pode-ro vir a enquadrar-se).

    Por outro lado, embora se reconhea que as situaes com elevada incidn-cia de pobreza, em si j bastante complexas, inserem-se em contextos societrios

  • mais amplos (com os quais elas interagem multiplamente), intenta-se evitar, nosmodelos, tanto a excessiva abrangncia quanto o equvoco oposto: a simplifica-o mutilante. No primeiro caso, a perda seria de acuidade; no segundo, de rele-vncia - e, em ambos, comprometer-se-ia a eficcia de programas ou projetos quetomem os modelos como enquadramento.

    Para atalhar esses dois descaminhos, procura-se identificar as variveis es-tratgicas, com fundamento na anlise interpretativa das situaes sociais consi-deradas, bem como as inter-relaes entre elas, realadas nos modelos propostoscom o objetivo de torn-los ferramentas teis programao das mudanassociais que as aes antipobreza objetivam.

    Os modelos especificam, a partir dessas variveis, as aes estratgicas re-sultantes, alm de considerar as medidas complementares decorrentes do examedas caractersticas mais significativas das situaes de pobreza consideradas.

    Pobreza no Brasil: anlise e interpretao

    O nmero de pobres no Brasil em 1990 era de 39, 2 milhes, correspon-dentes a 27% da populao (145,4 milhes) (12).

    A dimenso continental do pas, as diferenciaes estruturais de sua econo-mia, sua diversidade espacial, as disparidades regionais, sub-regionais e urbano-rurais de nveis de desenvolvimento fazem com que, no complexo mosaico socialbrasileiro, ocorram situaes de pobreza extremamente variadas. As incidnciasde pobreza, por exemplo, variam de 69% no Nordeste rural a 6% na regiometropolitana de So Paulo; inversamente, a distncia social entre pobres e no-pobres (13), de apenas 4,8 no meio rural do Nordeste, alcana 17,6 na GrandeSo Paulo. A despeito da pequena variao verificada na renda mdia dos pobres,seja entre as marcrorregies e regies metropolitanas, seja entre os meios rural eurbano, so grandes os diferenciais de nveis de vida entre os pobres metropolita-nos, urbanos no-metropolitanos e rurais (14).

    Crescimento e reduo da pobreza

    Quando se examina a evoluo, nos ltimos anos, dos nveis de pobrezacrtica, no Brasil como um todo, em confronto com o desempenho global daeconomia, verifica-se elevada correlao entre o crescimento do PIB per capita e areduo da pobreza.

    Com efeito, entre 1970 e 1980, enquanto o produto interno bruto (PIB)per capita nacional exibiu crescimento de 81% (6,1% ao ano), a pobreza crtica se

  • reduziu de 44,7 milhes de pessoas (47% da populao) para 29,5 milhes (25%).Nos anos 80, contudo, o nmero de pobres se elevou para 39,2 milhes (1990),correspondentes a 27% da populao, enquanto o PIB per capita declinou 4%(0,4% ao ano).

    Embora os efeitos do crescimento sobre a reduo da pobreza sejam am-plamente reconhecidos, o acontecido no Brasil na dcada de 1970 ficou, pelomenos at recentemente, obscurecido pelo debate gerado em torno das desigual-dades relativas de renda, as quais se mantiveram, no perodo, em patamares extre-mamente elevados.

    A esse propsito, seria de observar-se que o grande aumento nas desigual-dades relativas de renda do pas ocorreu na dcada de 1960, quando o Coeficientede Gini se elevou de 0,50 para 0,57 (15). Os estudos mais recentes realizadossobre os anos 70, ou concluem por um pequeno aumento desse coeficiente, oupor uma leve reduo dele (16), alm de registrarem uma importante expansotanto dos rendimentos mdios, em todos os decis, quanto do emprego, bemcomo significativa queda da proporo das pessoas sem rendimento na popula-o economicamente ativa.

    Na verdade, balano da situao social do Brasil na dcada de 1970, realiza-do para o Frum Nacional, concluiu que o dinamismo econmico verificado noperodo foi acompanhado de processo de convergncia social, envolvendo, almda reduo da pobreza j referida, a elevao da participao dos 40% mais po-bres na renda, a diminuio das disparidades inter-regionais e urbano-rurais denveis de bem-estar e a emergncia de uma sociedade de consumo em massa (17).

    O precrio desempenho dos programas antipobreza

    Entretanto, tm sido muito modestos os resultados das intervenes pbli-cas direcionadas ao combate pobreza no pas.

    Com efeito, tomem-se como exemplo desse pobre desempenho os progra-mas de desenvolvimento rural integrado executados no Nordeste, desde meadosdos anos 70, o maior e mais abrangente esforo de reduo da pobreza jamaisrealizado no pas.

    Desde 1974, os governos da Unio e dos estados daquela regio vm em-preendendo, com o apoio do Banco Mundial, grande programa de desenvolvi-mento rural integrado, voltado para a populao de baixa renda. Foram destina-dos aos 23 projetos aprovados recursos da ordem de US$ 4 bilhes (dlares de1988), dos quais US$ 1,7 bilho foi obtido, mediante emprstimos, do BancoMundial. Esses projetos elegeram, como pblico-alvo, quase um milho de fam-

  • lias rurais pobres (cerca de cinco milhes de pessoas) em rea que acaboucorrespondendo a virtualmente todo o Nordeste rural (do Maranho at a porode Minas Gerais includa no Polgono das Secas).

    Uma primeira gerao de doze projetos (1975-84), integrantes doPolonordeste (18), envolvendo US$ 1,9 bilho, concentrou-se em reasselecionadas, totalizando 500 mil km2 (cerca de 1/3 do Nordeste), e pretendiabeneficiar 280 mil famlias pobres. Estruturalmente complexos, dadas suas carac-tersticas de interveno abrangente do tipo big push (19), esses projetos, emboraconcentrados espacialmente, contemplaram desde a infra-estrutura de transportee energia e a reorganizao fundiria at o apoio produo e comercializaoagrcolas (irrigao, extenso e crdito rurais, pesquisa agrcola, comercializao)e a infra-estrutura e os servios sociais (sade, educao e treinamento de mo-de-obra, abastecimento d'gua). Essa complexidade buscava tirar partido dacomplementaridade entre os diversos componentes, concentrados geograficamenteem reas de elevado potencial agrcola (20), julgados capazes de gerar efeitossinrgicos propiciadores da elevao da produtividade e da renda dos produtoresrurais beneficiados.

    Uma avaliao independente da execuo desses projetos, realizada em 1988-89 (21), evidenciou resultados muito desiguais, se considerados os desempenhosde seus vrios componentes. E verdade que foram despendidos, nos dez projetossobre os quais se obtiveram informaes mais completas, cerca de 2/3 dos recur-sos programados, beneficiando, de um ou de outro modo, um nmero de fam-lias maior do que o inicialmente previsto. Contudo, os componentes de infra-estrutura bsica (estradas, eletrificao rural, abastecimento d'gua e, inclusive,reforma agrria), bem como os sociais (sade e educao), foram consideradostanto muito melhor implementados quanto de maior impacto, quando compara-dos com os voltados mais diretamente para a o aumento da produo, da produ-tividade e da renda agrcola retida pelos pequenos produtores rurais (crdito,extenso rural e assistncia tcnica, comercializao) (22). Ou seja, foram justa-mente aqueles componentes que demandavam participao ativa dos beneficirios,como agentes econmicos capazes de assimilar e praticar novas tcnicas de pro-duo, alm de inserirem-se mais amplamente no mercado, que revelaram maispobre desempenho.

    Uma segunda gerao de onze projetos (1985-89), integrantes do Papp (23),embora tenha consideravelmente reduzido o nmero de componentes - abando-nando a infra-estrutura, a educao e a sade, concentrando-se naqueles segmen-tos mais diretamente vinculados produo agropecuria (como o acesso terra,o crdito e a extenso rural) e dando grande nfase a um novo componente, odesenvolvimento comunitrio -, ampliou grandemente tanto a rea beneficiada(1,4 milho de km2, quase todo o Nordeste) quanto o total dos potenciais bene-

  • ficiados: quase 700 mil famlias. As duas medidas - a concentrao do programanos componentes que, malgrado essenciais, no passado tinham se revelado dedifcil execuo, e a indiscriminada extenso da rea de atuao -, a par deimpecilhos conjunturais (de financiamento, com recursos internos, e de naturezapoltico-institucional), comprometeram seriamente a execuo do Papp.

    Esses obstculos, alm de dvidas sobre a prpria eficcia do programa,determinaram nova reviso de seu contedo e estratgia (realizada em 1991-93),a qual caminhou para reforar ainda mais a autodeterminao dos projetos, con-fiando tanto seu desenho quanto sua gesto aos prprios beneficirios.

    No existe anlise, abrangente e atualizada, do impacto econmico-socialdos projetos de desenvolvimento rural do Nordeste. Recentemente reformuladose com sua execuo redinamizada desde fins de 1993, eles voltam a despertarnovas esperanas, com suas nfases na descentralizao e autogesto, na eleiode componentes pelas comunidades, nos projetos de pequeno porte, na inclusode aes especificamente voltadas para as pequenas cidades, compreendidas, ade-quadamente, como ncleos urbano-rurais. Porm ainda transpira, entre Washing-ton, Braslia e aquela regio, sensao de desconforto e de descrdito com relaoa ambos os modelos anteriores de interveno, s formas de sua execuo e prpria performance das populaes participantes, agora promovidas a rbitros desuas necessidades e a atores de sua insero produtiva e ascenso social.

    fato, entretanto, que, a despeito do meritrio esforo representado peloPolonordeste, pelo Papp e seus desdobramentos, a pobreza rural daquela regio,que se reduzira de 13,2 milhes (88% da populao) em 1970 para 11 milhes(66% da populao) em 1980 - em grande medida devido s migraes, uma vezque os efeitos do crescimento sobre a pobreza so sabidamente muito mais signi-ficativos no meio urbano do que em economias rurais ainda em grande medidade auto-subsistncia-, elevou-se para 12,6 milhes (69% da populao) em 1990.E no h, infelizmente, como aferir o quanto pior teria sido essa involuo naausncia daqueles programas.

    Situaes de pobreza: perfisPesquisas anteriores (24), que examinaram, com fundamento em um con-

    junto de indicadores econmicos e sociais, as diferentes caractersticas e a diferen-ciada evoluo, nos ltimos anos, da pobreza no Brasil, embasam a escolha, paraos propsitos deste estudo, de trs situaes de pobreza crtica no pas: o Nordes-te rural, o Sudeste metropolitano e o Nordeste urbano.

    Os critrios de seleo dessas situaes de pobreza levaram em conta agrande dimenso e a alta incidncia da pobreza, relativamente s brasileiras (casos

  • do Nordeste rural e urbano); a rapidez de sua expanso ao longo dos ltimosanos (caso do Sudeste metropolitano); a variada influncia, sobre o nmero depobres, do crescimento econmico (que atua como grande redutor de pobrezano Sudeste metropolitano, tem menor impacto relativo no Nordeste urbano e pouco significativo no Nordeste rural); o papel das migraes internas (que ate-nuam a dimenso da pobreza rural no Nordeste e a ampliam nas metrpoles doSudeste e nas cidades nordestinas); e os efeitos, sobre os nveis de vida, da exten-so, s reas de concentrao de pobreza, das diversas polticas sociais pblicas(com presena mais significativa no Sudeste metropolitano, relevante no Nordes-te urbano e menos importante no meio rural dessa ltima regio) (25). Para osefeitos das classificaes internacionais referidas na introduo deste estudo, oNordeste rural pode ser considerado como de baixa renda ou subdesenvolvido, eo Sudeste metropolitano e o Nordeste urbano, como em desenvolvimento, oprimeiro apresentando renda mdia alta e o segundo, renda mdia baixa.

    O Nordeste rural: a pobreza como destino

    A pobreza no meio rural do Nordeste tem carter endmico e , econmi-ca, social e psicossocialmente, de natureza estrutural. Torna-se visvel em seus trsmundos: no mundo da natureza, no mundo social e no mundo intra-subjetivo(26). Explicita-se, porm, pragmaticamente, nas relaes, protagonizadas pelohomem, seja com a realidade objetiva, seja com seus semelhantes, seja consigomesmo.

    Os 12,6 milhes de depauperados do Nordeste agrrio (27) representam63% da pobreza rural do pas (28) e 32% dos pobres brasileiros. Sua renda fami-liar per capita, de US$ 201 anuais, equivale a 89% da dos pobres do pas e a 48%da renda correspondente linha de pobreza adotada neste estudo (US$ 417). Ospobres rurais nordestinos, sendo 9% dos brasileiros, auferem menos de 1% darenda familiar nacional.

    Os pobres do Nordeste rural seriam certamente muito mais numerosos naausncia das grandes migraes rural-urbanas verificadas ao longo das ltimasdcadas, que operaram, o mais das vezes, meras transferncias inter-regionais eintra-regionais de pobreza. Com efeito, na dcada de 1960, o volume lquido deemigrantes do Nordeste rural foi de 4,1 milhes, dos quais 42% ficaram retidosno meio urbano regional, com os restantes 58% seguindo para outras regies, emespecial para as grandes metrpoles do Sudeste. Nos anos 70, aquele volume foide 4,6 milhes, com as cidades do Nordeste apresentando maior poder de absor-o: 63% (2,9 milhes) (29). Isto significa que o Nordeste agrrio tem reveladobaixssima capacidade de reteno relativa do crescimento vegetativo de sua po-pulao: de 28% dele na dcada de 1960 e de 16% na dcada de 1970 (30). Nosanos 80, essa capacidade de reteno tornou-se negativa porquanto o Nordeste

  • apresentou reduo de 3% em sua populao rural (31), o que provavelmente sedeveu ao efeito acumulado de acentuada queda na fecundidade, da mesma inten-sidade relativa das emigraes e de moderada reduo da mortalidade.

    Algumas outras caractersticas econmico-sociais da populao pobre quecontinuava vivendo no Nordeste rural, em 1990, confirmam a persistncia ali desituao de grandes carncias. O nmero mdio de dependentes por famlia era de4,3 pessoas (comparados com 2,5 pessoas para os no-pobres). S 65% das crian-as (0-14 anos) freqentavam a escola, 66% dos chefes de famlia no tinham qual-quer instruo e menos de 4% deles tinham mais de quatro anos de escolaridade.Viviam da agricultura de auto-subsistncia 83% dos chefes de famlia pobres, cujarenda familiar dependia em 76% daquela atividade. Apenas 3% dos domicliosdispunham de alguma forma regular de abastecimento d'gua e somente 7% ti-nham geladeira. Entre as famlias pobres consideradas socialmente mais vulner-veis, sobressaam as chefiadas por mulheres (15%) e por pessoas de cor preta (6%),com menos de 18 anos (0,6 %) ou com mais de 60 anos (18%) (32).

    Nesse contexto - e considerada a elevada incidncia de pobreza, j referida -,no ser preciso lembrar que o Nordeste rural em seu conjunto , relativamente aoBrasil ou por qualquer outro critrio que se venha a adotar, subdesenvolvido.

    Com efeito, se sua populao 13% da brasileira, sua renda somente 3%.A renda familiar per capita anual dos no-pobres de apenas US$ 961 (sendo 4,8vezes superior dos pobres), e a do conjunto da populao (US$ 435) mal supe-ra a linha de pobreza.

    Se, deixando de lado o critrio-renda, se consideram, ainda para o Nordes-te agrrio como um todo, alguns indicadores capazes de mensurar, mais concre-tamente, o grau de atendimento de necessidades humanas bsicas, sua situaosocial revela-se ainda mais carente. Com efeito:

    no que respeita educao, o percentual de crianas (7-14 anos), pobres eno-pobres, que freqentam escola de 67% (Brasil, 84%; Brasil rural, 72%);

    nas relaes de trabalho, a percentagem de empregados com carteira de traba-lho assinada de 31% (Brasil, 67%; Brasil rural, 41%) e o percentual detrabalhadores por conta prpria, contribuintes da previdncia social, de 3%(Brasil, 22%; Brasil rural, 7%);

    no que respeita condio dos domiclios, somente 7% deles dispem deabastecimento d5gua (Brasil, 63%; Brasil rural, 12%) e 15% possuem gela-deira (Brasil, 69%; Brasil rural, 36%).

  • Na verdade, utilizando-se ndice agregado (o ICB), que mede o grau deatendimento das necessidades fundamentais das famlias brasileiras, o Nordesterural obtm ICB de 165 (Brasil, 590; Brasil rural, 262) (33).

    Note-se que os dados acima apresentados retratam situao social - o Nor-deste rural - de grande expresso demogrfica, ocupando espao ecotropical di-versificado, que no deve ser confundido com o Serto rido territorialmentedominante. Integra-o, ao norte, a Pr-Amaznia maranhense; contorna-lhe o li-toral atlntico a Mata mida, que se prolonga na transio, do submido ao semi-rido, caracterstica do Agreste; e os Cerrados avanam fundo por seu flancosudoeste. A essa variedade de paisagens correspondem antigas e pluriformes aesantrpicas, perturbadas, nos ltimos anos, por intromisses da moderna agricul-tura de mercado, adentrando-se, com a irrigao tcnico-intensiva, pelo Serto:elas so verdadeiros enclaves plantados nos domnios da agropecuria tradicio-nal, em grande medida de auto-subsistncia, que continua a padecer o alto esecular risco das secas.

    Se esses influxos paradoxais de modernidade esto a atestar a viabilidadeda agricultura e do desenvolvimento em pleno Polgono das Secas, eles tambmacentuam o contraste entre a riqueza possvel a alguns poucos e a pobreza a que amaioria parece condenada. E se eles tm impacto sobre os nveis globais de pro-duo e produtividade agrcolas, no detm, contudo, a fora necessria paraalterar as tristes condies de vida de milhes de deserdados.

    Isto no significa, porm, que no existam inter-relacionamentos entrepobres e no-pobres no meio rural do Nordeste. Eles so intensos e fortementeestruturados na sociedade tradicional que ali se formou ao longo de trs sculos,e conformam uma teia de laos que perpassam as relaes de famlia, de trabalhoe de propriedade, bem como as formas institudas de exerccio do poder. A fam-lia no meio rural no apenas a unidade nuclear moderna, centrada no casal eintegrada pelos filhos: um corpo social expandido, pluridomiciliar, que incor-pora toda a parentela alm de muitos agregados, superando as clivagens rico-pobre e cidade-campo e urdindo vnculos de lealdade, sentimentos de responsabi-lidade e elos de dependncia. No trabalho, h as vrias formas de parceria, maisou menos espoliativa, dos pobres pelos no-pobres, envolvendo o complexo agri-cultura de subsistncia-agricultura comercial-pecuria. Nas relaes com a pro-priedade, ainda subsistem os moradores pobres sem terra das palhoas, ranchosou mocambos espalhados pelas fazendas alheias, que nelas podem botar seus roa-dos em meao e ainda ajudam o dono da terra na criao de gado. E nas relaesde poder, permanece importante a proteo que o pobre recebe de seu chefe -coronel, tenente, capito ou major -, geralmente proprietrio rural de maiores pos-ses, vivendo nas pequenas e mdias cidades do interior, e que substitui ou repre-senta^ perante ele, as autoridades pblicas (o governo}.

  • O que explica a persistncia, por tanto tempo e em to grande nmero, dapobreza rural do Nordeste? Por que ele continua gerando e exportando, indefini-damente, grandes contingentes de pobres? Qual a razo da pouca eficciatransformadora das aes pblicas antipobreza que tm sido ali empreendidas,em particular nos ltimos vinte anos, a exemplo dos projetos de desenvolvimentorural integrado j analisados neste estudo?

    A resposta a essas indagaes deve ser buscada muito mais em exame de*natureza psicossocial e antropolgico das concepes do mundo e da existnciaque povoam as representaes mentais do homem rural do Nordeste, do que natentativa de identificar as restries, sobejamente conhecidas, que impem a na-tureza e a ordem econmico-social em que ele se situa (34).

    Com efeito, a viso que o homem rural do Nordeste tem da realidade obje-tiva, de seus semelhantes e de si prprio no a do homem ocidental moderno,confiante em seus prprios poderes: no poder da razo, decifrador da realidade;no poder da cincia e da tcnica, gerador de progresso e bem-estar; no poder,quase demirgico de criar a histria, vencendo as incertezas inerentes ao faturo.Habitam as mentes do homem rural nordestino formas de percepo e de com-preenso mticas, tradicionais e modernas, em confuso amlgama, intra-subjeti-vamente conflitivo, gerando, em muitos casos, imobilismo nas relaesinterpessoais e passividade ante os desafios da natureza.

    Essa interpenetrao de formas de conhecimento retm, da conscinciamtica, a percepo, atemporal e pr-histrica, do mundo e da vida como repeti-o continuada de uma totalidade indissociada do prprio homem (35); a valori-zao dos ritos como fora de organizao social; a crena nos poderes objetivosda magia (36); e uma certa indistino entre natureza e cultura (37).

    De outra parte, incorpora, das tradies do velho Ocidente europeu, con-servadas em Portugal e transmitidas pela colonizao, viso pr-moderna domundo, associada ao catolicismo medieval, dogmtico, ritualstico, proftico,messinico, que favorece, neste mundo, a aceitao contrita e passiva da misriahumana, acenando, no outro, com as promessas redentoras do paraso (38).

    A assimilao da conscincia moderna ocorre, nesse contexto, de formaseletiva, incompleta, truncada. As reverberaes da civilizao, que penetram,com intensidade crescente nas ltimas dcadas, aqueles espaos sociais, interes-sam ao homem rural pelos servios e amenidades que encerram - e pelas promes-sas de uma vida melhor que prenunciam. Elas no so, contudo, facilmente inte-gradas por eles, nem se refletem em suas atitudes e comportamentos. De um ladoporque essas mensagens de modernidade no lhe so transmitidas de modoestruturado e compreensivo. De outro lado porque a percepo delas pelo ho-

  • mem rural tem os efeitos sobre sua conduta neutralizados pelas foras interditriasdo mito e da tradio, cujo rationale implcito desconfia, defensivamente, de quais-quer novidades que possam vir a fragilizar suas bases de sustentao, comumentejulgando-as com desfavor ou as vendo com indiferena.

    Esses bloqueios de natureza cultural inibem a racionalidade instrumentalcomo postura pragmtico-formal bsica perante a natureza e a sociedade - e, emdecorrncia, os modos de organizao eficiente do trabalho e da produo;desestimula as inovaes ao reafirmar sua peculiar e rotineira liturgia da repeti-o; desconsidera a prtica da poupana, sem significado num mundo que aindano se introduziu inteiramente no tempo e na histria e que, portanto, no capaz de legitim-la culturalmente.

    E evidente que a mentalidade do homem rural do Nordeste est mudando medida que a modernizao avana, pelo interior, nas rodas dos caminhes enas ondas do rdio e da televiso. Chegar o momento em que essas resistnciascedero, vencidas pela modernidade, que transporta com ela suas prprias formasde comportamento econmico. Esse processo de transformao, contudo, almde lento, d-se mais por fora do que por dentro, s excepcionalmente atingindo oumbral a partir do qual comeam a alterar-se, pela racionalizao institucionalizada,as resistentes rotinas do trabalho e da vida cotidianos.

    O Sudeste metropolitano: o pobre na riqueza

    As trs regies metropolitanas do Sudeste (So Paulo, Rio de Janeiro eBelo Horizonte), com 22% da populao total do pas e 29% da urbana, respon-dem, respectivamente, por 34% e 38% das rendas nacionais total e urbana (39).

    As dimenses relativa e absoluta da pobreza metropolitana vm sendo,no Brasil dos ltimos anos, extremamente sensveis s variaes da conjuntu-ra econmica.

    Em 1970, os pobres do Sudeste metropolitano eram dois milhes, corres-pondentes a cerca de 15% de sua populao total. Em meados da dcada (40),esse nmero caiu para 816 mil (4,5% da populao), com reduo absoluta de60% em perodo que engloba a fase da chamado milagre econmico, no qual arenda metropolitana, capita cresceu 45% (7,7% anuais).

    Em contrapartida, no perodo seguinte, globalmente de estagnao, situa-do entre meados dos anos 70 e final dos 80, a pobreza metropolitana expandiu-sedos mencionados 816 mil para 2,9 milhes, com a renda metropolitana per capitadecrescendo 27% (2% ao ano) (41).

  • De outra parte, singular, no Brasil, o contraste entre os pobres e os no-pobres que se observa em suas trs maiores regies metropolitanas.

    Em 1990, os 3,1 milhes de pobres dessas regies (8% dos pobres dopas), correspondiam a quase 10% da populao, porm detinham apenas 0,8%da renda metropolitana: em So Paulo, a incidncia de pobreza era 6% e a parti-cipao dos pobres na renda, 0,4%; no Rio de Janeiro, esses valores eram 13% e1,4%; e em Belo Horizonte, 16% e 1,7%, respectivamente.

    Medida pelo critrio da renda, a distncia social entre pobres e no-pobresnas trs regies era de 13,2 (42), com a renda mdia familiar dos pobres sendoUS$ 226 e a dos no-pobres, US$ 2.991. Essa distncia cresce, entre as trsregies, medida que se eleva a renda mdia dos no-pobres, sendo de 10,8 noRio de Janeiro (com renda mdia dos no-pobres de US$ 2.688), 11,1 em BeloHorizonte (US$ 2.694) e, conforme j referido, 17,6 em So Paulo (US$ 3.232).Vale ainda observar que, para o conjunto das trs metrpoles nacionais, se a rendaper capita dos pobres equivale brasileira (elas so US$ 226 e US$ 225, respecti-vamente), a dos no-pobres 28% maior (US$ 2.991 e US$ 2.342), sendo a dospobres e no-pobres, juntos, 54% mais elevada (US$ 2.723 e US$ 1.772) (43).

    Esses dados sugerem, por um lado, um nivelamento por baixo da popula-o pobre brasileira, provavelmente operado pelas migraes, deduo que serefora quando se observa que a renda familiar per capita dos pobres rurais do pas de US$ 214, a dos urbanos, US$ 237 e a dos metropolitanos, US$ 230. E, poroutro, revelam graus de desigualdade crescentes entre pobres e no-pobres, medida que se elevam os nveis de renda - ilao que se impe se salientado quea distncia social entre esses dois grupos de 5,6 no Brasil rural, 10,8 no urbanoe 12,5 no metropolitano.

    Essas concluses, contudo, precisam ser melhor qualificadas.

    Com efeito, quando se examina, a partir de indicadores sociais seleciona-dos, o grau de atendimento das necessidades bsicas dos pobres do Sudeste me-tropolitano, em confronto com os dos pobres rurais, urbanos e metropolitanosdo Brasil em seu conjunto, chega-se constatao de que ali so mais elevados osnveis de bem-estar por eles alcanados:

    no Sudeste metropolitano, o percentual de crianas pobres (7-14 anos) fre-qentando a escola de 83% (67%, 81% e 83%, respectivamente no Brasilrural, urbano e metropolitano);

    o percentual de empregados com carteira assinada de 65% (Brasil rural,25%; urbano, 44%; metropolitano, 59%);

  • o percentual de domiclios com abastecimento d'gua atinge 74% (4%, 54%e 64% para os Brasis rural, urbano e metropolitano);

    a porcentagem dos domiclios com geladeira chega a 77% (Brasil rural, 16%,urbano, 48% e metropolitano, 64%); e

    o ICB para o Sudeste metropolitano pobre, de 463, indica que o grau deatendimento das carncias bsicas ali muito mais elevado do que no -Brasilrural (136), urbano (366) ou mesmo metropolitano (438) (44).

    Como a renda mdia familiar dos pobres das metrpoles do Sudeste equivale brasileira, provvel que esses diferenciais de condies de vida se expli-quem pelas maiores facilidades de acesso dos pobres metropolitanos educao,ao mercado organizado de trabalho, aos servios pblicos domiciliares e at aosbens durveis de consumo. Acesso esse devido muito mais s melhores condiesda oferta, em grande medida pblica, desses servios e bens do que a demandaassociada ao nvel de renda (45).

    O nmero mdio de pessoas por famlia pobre no Sudeste metropolitano(4,1 pessoas: 4,5 em Belo Horizonte, 4 no Rio de Janeiro e 3,9 em So Paulo) bem menor do que no Nordeste rural (5,3) e urbano (4,6). porm superior aodas famlias no-pobres (3,4, sendo 3,6 em Belo Horizonte, 3,5 em So Paulo e3,2 no Rio de Janeiro). A dependncia familiar da renda dos chefes de famliapobres de 76%, com duas pessoas em idade ativa (15 anos e mais) por famliagerando os restantes 24% da renda. Essa dependncia menor entre os no-pobres (72%, com 28% da renda familiar sendo gerados por 1,9 pessoa em idadeativa), o que sugere haver bastante espao entre os pobres para intensificao douso do trabalho como forma de complementao de renda.

    As famlias pobres chefiadas por mulheres chegam a 36% no Sudeste me-tropolitano (38% no Rio de Janeiro e 35% em So Paulo e Belo Horizonte),comparados com 21% para as no-pobres (24% em Belo Horizonte, 23% noRio de Janeiro e 19% em So Paulo). Esse percentual, sendo mais alto do que oencontrado para o Brasil urbano (33%), indica que a desestruturao da famlia,j maior no meio urbano nacional do que no rural, agrava-se mais nas trs metr-poles do Sudeste. Outras famlias potencialmente mais vulnerveis so as chefia-das por menores de 18 anos (1%) e maiores de 60 anos (12%), alm daquelascujos chefes de famlia so de cor preta (10%) (46).

    Variam consideravelmente, entre as trs regies, tanto a participao depessoas de cor entre os chefes de famlia quanto as correspondncias entre cor epobreza. No Elo Janeiro, 16% dos pobres so de cor preta (9% dos no-pobres), 41% de cor parda (30% dos no-pobres); em Belo Horizonte, 14%

  • dos pobres so pretos (8% dos no-pobres), 56% pardos (39% dos no-pobres); em So Paulo, 5% dos pobres so pretos (4% dos no-pobres), 34%pardos (23% dos no-pobres).

    No conjunto das trs regies metropolitanas, so as atividades de servios,comrcio e construo civil (nesta ordem de importncia) que concentram omaior nmero de chefes de famlia pobres, destacando-se, no Rio de Janeiro e emSo Paulo, o setor informal de servios e, em Belo Horizonte, a construo civil.

    Embora as taxas de analfabetismo dos chefes de famlia pobres sejam me-nores do que as nacionais nas trs regies (So Paulo, 21%; Belo Horizonte,19%, Rio, 16%, comparados com 35% para o Brasil urbano), o analfabetismofuncional (pessoas sem instruo ou com at quatro anos de escolaridade) ainda muito elevado: 76% em Belo Horizonte, 66% em So Paulo e 55% no Rio deJaneiro, comparados com 76% para o Brasil urbano.

    Diferentemente dos pobres rurais do Nordeste, que apresentam caracters-ticas econmicas e psicossociais relativamente mais uniformes, as situaes depobreza do Sudeste metropolitano so extremamente diversificadas, constituin-do-se sua compreenso um srio desafio para o desenho de modelos de interven-o eficazes a seu combate.

    No suficiente, para entend-las, tom-las como uma totalidade capaz deauto-explicar-se a partir das formas dominantes de sua organizao social e dospadres de conduta e modos de agir dos indivduos que as integram (47). Tampouco bastante consider-las como decorrncia do processo histrico global em queessas situaes sociais (e as metrpoles que as abarcam) se situam (48). Emboraessas abordagens possam ter sua utilidade, elas em geral no se detm no exame dasrelaes que se estabelecem, dentro das cidades, entre os pobres e os no-pobres,nem na considerao do significado de sucessivas ondas migratrias que perma-nentemente transferem grandes contingentes de pobres do campo para as cidades,de certo modo diluindo nelas a tradicional anttese entre o rural e o urbano.

    As mltiplas e multiformes relaes entre os pobres e os no-pobres dentrodas trs metrpoles nacionais levam, com efeito, a questionar o que nelas significamarginalidade urbana - ecolgica, econmica ou culturalmente -, bem como aindagar em que medida possvel associar, linearmente, marginalidade a pobreza.

    Ecoespacialmente, a marginalidade urbana seria constituda pelos chama-dos assentamentos humanos subnormais (favelas), ou seja, por aqueles em que ascondies de ocupao do solo, de habitao e, em geral, de meio ambiente sovistas como desordenadas, precrias e degradadas com relao aos padres nor-mais prevalecentes nas metrpoles. No h, porm, como confundir, nas regies

  • em exame, todas as favelas com o locus necessrio da pobreza (sobretudo da po-breza crtica, tal como conceituada neste estudo): embora elas sejam, em geral,espaos de maior concentrao de pobreza, muitos dos que hoje as habitam noso pobres (alguns nunca o foram); e nem todos os pobres tm acesso fcil atodas elas (49).

    Do ponto de vista econmico, a marginalidade seria caracterizada pela ex-cluso dos pobres da economia urbana moderna. No h, contudo, razo sufici-ente para considerar economicamente excludos da modernidade os chefes defamlia que, malgrado pobres, trabalham na indstria de transformao (22% dototal deles em So Paulo, 16% no Rio de Janeiro e 14% em Belo Horizonte) ouem outras atividades, secundrias e tercirias, que indiscutivelmente se inseremnos modos de organizao racional da produo prprios do capitalismo moder-no. E, de outra parte, seria difcil negar a funcionalidade - e complementaridade- do comrcio ambulante e outras atividades informais de servios, exercidas(comumente por pessoas pobres) de modo bastante integrado e articulado sformas de produo dominantes e s demandas associadas aos modos de vida dosno-pobres.

    Culturalmente, no h base emprica para afirmar que os pobres metropo-litanos permanecem, em sua totalidade, impermeveis ao mundo moderno emsuas variadas manifestaes, constituindo uma subcultura radicalmente parte dacultura nacional vivida pela cidade envolvente. Ao contrrio, os diversos graus deaculturao ou de converso ao esprito moderno observados entre eles que tmlevado, por exemplo, alguns estudiosos das favelas do Rio de Janeiro a considerar,alternativamente, os pobres seja como marginais, seja como integrados (50).

    O que parece sensato admitir que os pobres metropolitanos do Sudesteconstituem uma complexa heterogeneidade e que, embora continuando po-bres, protagonizam uma insero dinamicamente diferenciada na grande cida-de. Os graus variados dessa integrao sujeitam-se a mltiplos fatores. De umaparte, ao tempo de vivncia metropolitana ou urbana deles, os nascidos nasgrandes cidades tendendo a apresentar vantagens na sua integrao social sobreos migrantes das pequenas cidades ou do meio rural (e, por sua vez, os migrantesmais antigos sendo favorecidos nesse processo, relativamente aos mais recen-tes). De outra parte, dependem do nvel de educao formal alcanado, quetende a ser mais elevado na populao mais jovem, e das experincias de traba-lho e de viver urbanos experimentadas, mecanismos estes de sociabilizao tar-dia porm certamente muito eficazes.

    Seriam justamente os pobres mais integrados que estariam melhor habilita-dos a se beneficiar mais do crescimento da economia urbana organizada e a assu-mir as diversas funes que a sociedade moderna propicia aos indivduos que dela

  • realmente participam: os papis de produtor e de consumidor, de contribuinte ecliente do Estado, bem como os direitos e deveres inerentes cidadania (51).

    E de notar-se, contudo, que somente o exerccio continuado dessas funessociais engendra o processo de individualizao, de autodisciplina e, em geral, deracionalizao da vida, caractersticas do homem ocidental moderno, processoque, com o tempo, se torna irreversvel.

    Essa irreversibilidade, entretanto, ainda no teria ocorrido para a maioriados pobres das trs metrpoles do Sudeste, os quais, ao contrrio, submetem-semuitas vezes, nas prprias favelas, ao jugo de poderes paralelos quase absolutos ea vivncias humanas que reforam, atavicamente, as molduras que circunscrevemas sociedades primitiva e tradicional, nas quais eles ainda em parte remanescem.

    Com efeito, a marginalidade - agora denotando conduta delituosa - que,sobretudo nos morros e baixadas cariocas e fluminenses, se manifesta no crimeorganizado, neles constri complexas estruturas de domnio, que ignoram, desa-fiam ou cooptam os poderes do Estado. Essas formas de dominao estabelecemredes de relaes com as metrpoles envolventes que, malgrado desviantes, so arazo de ser de sua sobrevivncia. E de certo modo reproduzem no meio urbanoo personagem ambguo - benfeitor e espoliador, justiceiro e criminoso, protetore algoz - do coronel, seu prottipo rural (52).

    Esses poderes esprios utilizam-se dos pobres como suas massas de mano-bra. Sem alternativas de trabalho, ignorados por um Estado que quase sempre sediz ausente, muitos deles acabam, de um ou de outro modo, cedendo, por adeso,lenincia ou temor, a um violento e ancilar imprio, facilmente acoplado aos arqu-tipos mentais que sua memria ainda carrega de passado social no muito distante.

    E nesse caldo de cultura que se instala, enraza e prospera o crime organizado.

    O Nordeste urbano: a pobreza rurbana,

    O Nordeste urbano, tomado em seu conjunto, ainda no , relativamenteao Brasil, espao social desenvolvido. Numa escala internacional, poderia ser con-siderado como de renda mdia baixa.

    Sua populao, correspondendo a 17% da brasileira (23% da urbana), de-tm menos de 12% da renda nacional (menos 13% da urbana). Sua renda fami-liar per capita, de US$ 1.236, se 2,8 vezes superior renda rural regional,corresponde, no entanto, a 70% da brasileira como um todo e a apenas 57% darenda urbana nacional.

  • Para efeito analtico, possvel distinguir, dentro do espao urbano regio-nal, o Nordeste metropolitano e o no-metropolitano. O primeiro, integradopelas aglomeraes de Fortaleza, do Recife e de Salvador, com 5% da populaodo pas e 7% da urbana, tem participao nas rendas total e urbana nacionais de4,9% e 5,5%, respectivamente - e, em decorrncia, sua renda per capita equivalea 95% e 78%, respectivamente, das rendas nacionais total e urbana. O segundo,com 12% da populao nacional total e 16% da urbana, detm somente 6,7% e7,4% das rendas nacionais correspondentes - e, portanto, sua renda per capitaequivale a 58% e 48% das rendas total e urbana brasileiras.

    E de 9,1 milhes o nmero de pobres do Nordeste urbano (53), o querepresenta 23% da pobreza total do pas e 48% da urbana. Desse total, 2,2 mi-lhes (24%) vivem nas trs regies metropolitanas regionais (Fortaleza: 735 milpobres; Recife: 895 mil; Salvador: 574 mil) e os restantes 76% (6,9 milhes)habitam as demais cidades, vilas e reas urbanas isoladas (54). A incidncia depobreza, de 38% para o meio urbano regional como um todo, de 29% para asregies metropolitanas e de 41% para o Nordeste urbano no-metropolitano.

    A despeito da grande diversidade de situaes sociais encontrada no Nor-deste urbano, algumas das principais caractersticas da pobreza que l vive apre-sentam, em alguns aspectos essenciais, certa homogeneidade.

    Com efeito, a renda familiar per capita anual dos pobres urbanos da regio de US$ 231, a dos metropolitanos, US$ 234, e a dos urbanos no-metropolita-nos, US$ 230; os nmeros mdios de pessoas por famlia so de 4,6, 4,6 e 4,7,respectivamente; e os percentuais de crianas (0-14 anos) freqentando a escolaso de 80%, 83% e 79%.

    Outros indicadores, contudo, relativos s disparidades internas de renda, scondies de trabalho e disponibilidade de alguns servios e equipamentos do-miciliares, revelam considerveis discrepncias entre o Nordeste metropolitano eo urbano no-metropolitano.

    Assim que, nas metrpoles regionais, a parcela da renda familiar totaldetida pelos pobres de apenas 4%, comparados com 9% no meio urbano no-metropolitano, determinando renda familiar per capita dos no-pobres dez vezessuperior dos pobres no primeiro caso, e sete vezes no segundo.

    Por outro lado, indicadores como o percentual de trabalhadores pobrescom carteira assinada (52% nas metrpoles e 37% no restante do meio urbano),o percentual de ocupados por conta prpria contribuintes da previdncia social(9% e 5%, respectivamente), as disponibilidades domiciliares de gua com cana-lizao interna (52% e 43% dos domiclios) e de geladeira (51% e 33%) de-

  • monstram que as condies de vida dos pobres metropolitanos so melhores doque a dos demais pobres urbanos. Isto revela que muitos dos servios sociaispblicos na regio se distribuem desigualmente entre os pobres no espao urba-no, beneficiando mais as populaes metropolitanas.

    A pobreza urbana do Nordeste reduziu-se significativamente nos anos 70 emdecorrncia do crescimento econmico, ainda que em menor grau do que a doSudeste metropolitano. Entre o incio e o fim daquela dcada, enquanto a rendaurbana capita crescia 65% (5,1% ao ano), a pobreza se reduzia tanto em termosabsolutos (de 6,2 para 5,6 milhes) quanto, sobretudo, em termos relativos (de60% para 33% da populao) (55). Esse fato torna-se ainda mais relevante quandose considera que a populao urbana regional cresceu 49% naquela dcada, ou seja,4,1% ao ano, o que se deve em grande medida s migraes rurais (estimadas em2,9 milhes) (56), que explicam a metade desse crescimento.

    Em contrapartida, na dcada de 1980, concomitantemente queda da ren-da per capita urbana da ordem de 15%, ocorreu aumento importante da pobrezaurbana (de 63%, em termos absolutos, e de 33% da populao urbana para os38% j referidos), com a ausncia de dinamismo econmico bloqueando a inser-o dos pobres em mercado de trabalho estagnado, ampliando-se, assim, tanto odesemprego quanto o subemprego.

    Algumas das caractersticas dos chefes de famlia pobres do Nordeste ur-bano complementam, em alguns aspectos significativos, a anlise empreendidaat aqui (57).

    Com efeito, a renda familiar dos pobres depende, em 71%, do trabalhode chefes de famlia, que tm em mdia 3,6 dependentes, dos quais apenas 1,2com menos de 15 anos. Portanto, 2,4 pessoas por famlia, j em idade ativa,geram somente 29% da renda familiar. Embora esse ltimo percentual seja maiordo que o do meio rural pobre da regio (24%, para 2,9 pessoas por famlia emidade ativa), sabido que as possibilidades de intensificao do uso indepen-dente do trabalho familiar so relativamente maiores no meio urbano regionaldo que no rural (58).

    O percentual de famlias chefiadas por mulheres de 31% (23% para asno-pobres), com a regio metropolitana de Salvador alcanando o percentual de38% (24% para as no-pobres). Esses valores, muito maiores do que os encon-trados no meio rural (Brasil: pobres, 14%; no-pobres, 13%; Nordeste: pobres,15%; no-pobres, 17%) sugerem que, tambm no Nordeste, o processo de desa-gregao da famlia muito mais intenso no meio urbano, particularmente entreos pobres. Dentre as demais famlias consideradas como potencialmente vulner-veis incluem-se as chefiadas por menores de 18 anos (1%) ou maiores de 60 anos(17%), bem como por pessoas de cor preta.

  • Com respeito cor, observe-se que os chefes de famlia pobres pretos (8,1%)e pardos (68,3%) so proporcionalmente mais numerosos do que os no-pobres(5,2% de pretos e 59,1% de pardos), chegando eles em Salvador a 90,1% dototal de pobres (28,6% de pretos e 61,5% de pardos, comparados com 13,6% e56,4%, respectivamente, para os no-pobres). Estabelece-se, assim, no meio ur-bano do Nordeste, tendncia que associa, muito mais fortemente do que no meiorural regional ou no Sudeste metropolitano como um todo, cor e pobreza (59).

    Parcela significativa dos chefes de famlia pobres do Nordeste urbano(21%) vive da agricultura: como o mesmo no ocorre no subconjunto metro-politano, onde apenas 7% vivem de atividades agrcolas, de esperar-se que ofenmeno ocorra mais nas pequenas e mdias cidades e vilas, em muitos aspec-tos um prolongamento da vida rural. Um tero deles trabalha em outras ativi-dades que em geral tambm apresentam baixa produtividade: construo civil(13%) e servios informais (20%). Os restantes 46% trabalham no comrcio(14%), na indstria de transformao (12%) e em outras atividades (20%).Entre os empregados, 31% no possuem carteira assinada, Entre os ocupados,34% trabalham por conta prpria.

    Os nveis educacionais dos chefes de famlia pobres so alarmantementebaixos no meio urbano do Nordeste: 47% so analfabetos, 34% tm quatro anos,ou menos, de escolaridade, e apenas 19% possuem cinco anos, ou mais, de esco-laridade. Esse quadro educacional melhora um pouco apenas no Recife e emSalvador, com o percentual de analfabetos reduzindo-se para 35% e 26%, respec-tivamente, e a parcela dos que tm cinco anos ou mais de instruo elevando-separa 30% e 39% (60).

    Os nveis de subeducao da populao ativa do Nordeste como um todoatuaram decisivamente, tanto para determinar desconcertante segmentao domercado de trabalho urbano e agravar a desigualdade quanto para impedir, nasdcadas de 1970 e 1980, maior crescimento relativo da renda dos pobres e suamais ampla insero na economia organizada em expanso. Com efeito, a partici-pao dos 40% mais pobres na renda regional reduziu-se de 8,8% em 1970 para8,5% em 1980 e 7,8% em fins dessa ltima dcada. E a renda das pessoas ocupa-das, maiores de vinte anos e com cinco anos ou mais de escolaridade, sendoequivalente do total das pessoas ocupadas nessa faixa etria em 1970, j era 50%maior em 1980 e alcanou quase o dobro em fins desse decnio. esta uma claraevidncia da importncia da educao fundamental na determinao do nvel derenda individual na regio, fenmeno que mais relevante no meio urbano.

    O pobre do Nordeste urbano no o mesmo pobre do meio rural da re-gio. No , tampouco, o pobre do Sudeste metropolitano. O seu ser pobre situa-

  • se, por assim dizer, entre uma e outra dessas pobrezas: ele participa de suas duasnaturezas, distanciando-se, entretanto, tanto duma quanto doutra.

    Duas caractersticas o aproximam dos pobres rurais nordestinos. Duas ou-tras mimetizam as situaes de pobreza do Sudeste metropolitano.

    A primeira indica, conforme j se observou, que alta nas cidades a inci-dncia de pobreza (38%). Note-se agora que essa incidncia sofre uma gradao: menor nos ncleos das trs regies metropolitanas (24%), aumenta em suasperiferias (35%) e se torna mais grave nos outros centros urbanos (42%) (61).Quando se considera, entretanto, que esse percentual, para as cidades regionaiscomo um todo, embora se tenha reduzido em perodos de crescimento econmi-co, nunca foi inferior a 1/3, conclui-se que a base econmica do Nordeste urbanono se tem revelado suficiente para absorver produtivamente seu contingente depobres, que aumentou em 2,9 milhes na dcada passada.

    A segunda caracterstica ressalta que a pobreza urbana regional alimenta-da, em grande medida, pelas migraes internas rural-urbanas, que transportampara as cidades, e nelas propagam, formas de sentir, pensar e agir dominantemen-te pr-modernas. Os migrantes pobres se assentam nas periferias urbanas(comumente nos alagados e morros das grandes cidades litorneas), ali misturan-do-se pobreza gerada nas cidades. Assim reduzindo, pela prpria dimenso queesse contingente de pobreza adquire, as possibilidades, j limitadas, de inseroeconmica e de ascenso social.

    A terceira caracterstica revela que, como nas metrpoles do Sudeste, nose encontram os pobres urbanos do Nordeste segregados da sociedade envolvente.Eles convivem com a cidade, sendo afetados pelos eflvios da modernidade, queconfundem suas vises do mundo sem, contudo, alterar significativamente ascondies objetivas de acesso s benesses do progresso. Pois mais uma vez adimenso excessiva dos pobres, relativamente aos no-pobres, que impede a for-mao de teia de relaes de complementaridade entre eles com a abrangncia e osignificado da que se observou no Sudeste metropolitano.

    A quarta caracterstica traz de volta a questo do homem marginal versushomem integrado, que se examinou quando da anlise das trs metrpoles na-cionais. No caso do Nordeste urbano (inclusive do metropolitano), o pndulopende relativamente mais para a marginalizao do que para a integrao (62). Aesse respeito, os dados anteriormente apresentados indicam que a pobreza urbanado Nordeste no possui as habilidades bsicas para que sua insero nas cidadeslhe promova a desejada ascenso social. Se pode haver inapetncia dos pobrespara adquiri-las, fato, no entanto, que a oferta pblica dos equipamentos eservios que propiciariam a aquisio dessas habilidades (em particular os educa-

  • cionais e de qualificao para o trabalho) ali mais escassa e de menor qualidadejustamente nas reas de concentrao de pobreza. E se h, da parte deles, algumadesconfiana quanto utilidade desse aprendizado, essa insuficincia dos serviosdo Estado decerto contribui para inibir suas iniciativas de integrao, alm demant-los desigualados na disputa pelas poucas oportunidades de emprego e departicipao na renda proporcionadas pela economia.

    O que se pode, em sntese, dizer do pobre que vive nas cidades do Nordes-te que ele se situa, psicossocialmente, em transio do rural para o urbano. Seriaele um homem rurbano (63), seja intra-subjetivamente, seja nas atitudes que suaconduta objetivamente manifesta. Se o seu drama maior a prpria pobreza, essaambigidade existencial, alm de limitar suas chances de super-la, acarreta-lhedistrbios de percepo, desvios de comportamento, acmulos de frustraes,to psiquicamente traumticos quanto socialmente tensivos.

    Combatendo a pobreza I: variveis e aes estratgicas

    Verificou-se, na anlise interpretativa das situaes de pobreza empreendi-da anteriormente, que existe forte correspondncia, em especial no meio urbano,entre crescimento econmico sustentado e reduo da pobreza. Observou-se tam-bm que h formas variadas de relacionamento, geralmente refletindocomplementaridade e interdependncia, entre pobres e no-pobres.

    Essas duas constataes sugerem que as intervenes pblicas em situaesde pobreza no devem consider-las isoladamente da sociedade envolvente, nemserem vistas de modo esttico, sendo, ao contrrio, necessrio contextualiz-las, apartir da seleo das variveis que, na dinmica do desenvolvimento: produzemmais renda e riqueza; afetam sua distribuio social, em particular entre pobres eno-pobres; e operam o engate entre a primeira e a segunda. As duas variveisque sobressaem nesse contexto so o crescimento e o conhecimento. O engate entreelas d-se pragmaticamente atravs da varivel trabalho. Crescimento, conheci-mento e trabalho constituem as variveis estratgicas que integram o ncleo co-mum dos modelos de interveno propostos, embora as aes estratgicas decor-rentes variem consideravelmente de uma situao social para outra.

    Crescimento: beneficiando a pobreza

    Se no h nada de novo ou surpreendente na escolha do crescimentoeconmico como varivel estratgica no combate pobreza, so grandes e dife-renciadas suas implicaes na concepo de modelos de interveno delineadosneste estudo.

  • Por um lado, no se deve dissociar nesses modelos poltica econmica depoltica social (64). No h crescimento socialmente neutro: ele gera renda eacumula riqueza, que so socialmente apropriadas. Nesse sentido, as aes pbli-cas antipobreza precisam estar explicitamente consideradas na formulao e exe-cuo das polticas econmicas - e no meramente de forma apendicular e subsi-diria, ou apenas como medidas compensatrias -, pois se, de uma parte, osinvestimentos destinados a reduzir a pobreza podem afetar, positiva ou negativa-mente, o ritmo do crescimento, este , sem dvida, crucial arma em seu combate.

    Um simples exerccio hipottico seria eloqentemente ilustrativo dessaltima inter-relao. Com efeito, crescimento da renda familiar per capita, total(de pobres e no-pobres) do Sudeste metropolitano de apenas 0,7%, que fosseapropriado inteiramente pelos pobres, seria suficiente para elevar sua renda mdiaacima da linha de pobreza adotada neste estudo. Para obter-se o mesmo efeitono Nordeste urbano, seria necessrio crescimento de 5,7%; e, no Nordesterural, de 34,4% (65).

    Embora se saiba que a apropriao de todo o produto do crescimento pelospobres no factvel- inclusive em decorrncia das relaes de complementaridadeeconmica entre pobres e no-pobres antes referidas, com efeitos na determina-o da renda dos primeiros -, fica demonstrado que uma maior participao dospobres nos resultados do crescimento estratgia que se deve privilegiar por suairrecusvel eficcia.

    Por outro lado, so bastante diferenciados os efeitos do crescimento comomecanismo de transmisso espontnea de renda dos no-pobres para os pobres.Recorde-se que a anlise das trs situaes sociais antes empreendida fortementesugeriu produzirem-se nelas impactos diversos do crescimento na reduo dapobreza: de intensidade alta no Sudeste metropolitano, mdia no Nordeste urba-no (mdia-alta nas metrpoles regionais e mdia-baixa no meio urbano no-me-tropolitano) e baixa no Nordeste rural. que, num extremo, o pobre do Nordes-te agrrio, alm de majoritrio (constituindo mais de 2/3 da populao), insere-se em economia globalmente muito pobre e fragilmente estruturada, alm deachar-se defendido dos estmulos de mercado e imerso em invlucro culturalpouco permevel. No outro extremo, o pobre das metrpoles nacionais, minoritrio(formando menos de 10% dos habitantes), encontra-se mais integrado em eco-nomia muito mais rica, complexa e solicitante, e em sociedade polimorfa e forte-mente interligada. No meio situa-se o Nordeste urbano, com seus pequenos n-cleos urbanos aproximando-se do primeiro extremo e as regies metropolitanas,do segundo.

    No Sudeste metropolitano, portanto, o crescimento da economia organi-zada transbordar mais facilmente para os pobres, contribuindo para reduzir a

  • pobreza (embora possa estimular novas imigraes de pobreza, do meio rural ede outras cidades). No Nordeste rural, ao contrrio, crescimento da agriculturaque se assente em bases empresariais modernas ser incapaz de incorporar, emnveis significativos, o grande contingente de pobres que ali vive, podendo redu-zir ainda mais a capacidade de reteno da populao no campo, impulsionandoa emigrao. No Nordeste urbano, embora seja importante buscar no reforo dabase econmica moderna fontes mais dinmicas de expanso produtiva, essa se-qncia de crescimento dificilmente ser suficiente, a mdio e mesmo longo pra-zos, para absorver amplamente a pobreza (sobretudo se persistirem as imigraesde origem rural).

    Isto significa que a estratgia econmica para o Nordeste, tanto urbanoquanto rural, deve ter, como um de seus componentes essenciais, a incorporaoda pobreza produo e ao consumo, o que , efetivamente, condio para aprpria viabilidade de crescimento que pretenda ser sustentado e que em parte seapoie em mercado interno regional em expanso. Pois, mesmo desconsiderandoo objetivo eqidade, difcil imaginar crescimento sustentado em regio, de ra-zovel dimenso (mais de 40 milhes de habitantes e PIB de cerca de US$ 60bilhes anuais), que por muito tempo mantenha a metade de sua populao eco-nomicamente excluda de seus benefcios.

    Esse processo de gradual incluso somente ocorrer mediante estratgia decrescimento que combine o upgrade dos recursos humanos da populao pobrecom a criao de oportunidades de sua efetiva utilizao produtiva.

    Conhecimento: estendendo a educao e a qualificao aos pobres

    Um dos fatores que reconhecidamente mais afeta a expanso e a distribui-o social da renda e da riqueza o conhecimento, que se incorpora aos indiv-duos sob a forma de capital humano.

    Sabe-se, de um lado, que o domnio e a aplicao do conhecimento naeconomia e, em geral, na sociedade importam, mais e mais, riqueza das naes.Sabe-se, de outro, que em cada uma delas tambm crescente sua influncia narepartio inter-regional e interpessoal da renda. Habilitar os pobres a maiorparticipao na expanso do produto social implica, portanto, elevar seus nveisde conhecimento atravs da educao e da qualificao para o trabalho, de modoa capacit-los a insero na economia que lhes assegure, como requisito mnimo,a satisfao das necessidades bsicas.

    Releva, no contexto do objetivo mais amplo de universalizao da educa-o bsica, que as populaes pobres sejam alcanadas pelo que se poderia cha-mar de esforo de formao de mentalidade moderna.

  • No se postula, claro, uma escola para a criana ou o adolescente pobresdiferente da escola para os no-pobres. O que se deseja que a escola, nas reasurbanas e rurais de concentrao de pobreza, atenda a padres mnimos de qualida-de (envolvendo capacitao docente, instalaes e equipamentos, contedoprogramtico, mtodos de ensino-aprendizado, formas eficientes de gesto e deavaliao de resultados). Que seja uma instncia inoculadora de modernidade eminterao com o mundo do trabalho e as vivncias do cotidiano. Que, enquanto tal,ensine a pensar logicamente e a agir estrategicamente, estimulando o raciocnio, ocomando da linguagem, a autonomia crtica, a experimentao. Que torne irreversvela capacidade de auto-aprendizado e enseje a qualificao profissional (66).

    Porm se v como igualmente necessria uma ao educativa especfica, decarter supletivo, voltada para a populao pobre j em idade ativa, em particularno Nordeste (tendo em vista os baixos nveis de escolaridade ali prevalecentes).Ao esta acoplada a formao profissional que propicie insero mais produtivana economia.

    Se a escola regular, ao ministrar s crianas e adolescentes o ensino funda-mental, deve estar atenta, sem prejuzo da homogeneidade imprescindvel, svariadas situaes de pobreza, o ensino supletivo e a qualificao para o trabalhodevem ver essas diferenciaes como essenciais a sua pertinncia e eficcia. Aquio objetivo primordial capacitar adultos pobres, de forma compacta, ordenada econcentrada, para a vida em sociedade crescentemente complexa e para o traba-lho mais produtivo em atividades to diversas como a pequena agricultura debase familiar e a indstria de transformao praticando novas e mais participativasrelaes de trabalho.

    Trabalho: elevando a renda dos pobres

    O trabalho deve operacionalizar o enlace entre o conhecimento e o cres-cimento de que resulte, para o pobre, maior participao na produo e narenda (67).

    As precondies necessrias desse enlace so, de um lado, a capacidadeda economia de gerar, com o crescimento, oportunidades de trabalho capazesde ser apropriadas pelos pobres; do outro, o xito dos esforos de suplementaoeducativa e de qualificao dos adultos (no curto-mdio prazo) e de educaobsica e formao profissional das crianas e adolescentes pobres (no mdio-longo prazo).

    Um olhar sobre os pases mais desenvolvidos, que j avanaram em suatransformao produtiva, no inspira entusiasmo sobre a capacidade de gerao

  • de postos de trabalho pela economia urbana brasileira, j de algum tempo emprocesso de reestruturao industrial e de insero internacional competitiva -mormente quando se prev, na presente dcada, demanda por 2,4 milhes de no-vos empregos no Sudeste metropolitano e trs milhes no Nordeste urbano, apenascomo decorrncia do crescimento demogrfico vegetativo (68). Contudo, cabeconsiderar que o processo de modernizao produtiva ser desigual espacial esetorialmente, alm de, em geral, pouco intenso nas atividades que no enfrentama concorrncia das importaes ou no se voltam para o mercado externo (agricul-tura de subsistncia, comrcio, grande parte dos demais servios, construo civil,utilidades pblicas, pequenas empresas). E nessas atividades que a absoro pro-dutiva dos pobres poder ser mais facilmente realizada, inclusive por serem elasgeradoras de empregos ainda pouco exigentes em capital humano.

    Nas regies metropolitanas do Sudeste as aes pblicas propiciadoras deemprego aos pobres devem centrar-se - a partir de educao supletiva e qualifica-o tcnica, restritas (pelo menos num primeiro estgio) ao essencial para venceras limitaes da sub-renda - na intermediao no mercado de trabalho e na aorganizao mais racional dos servios prestados por conta prpria. Pois naaplicao de mais conhecimento em trabalho mais produtivo e, por isso mesmo,mais remunerador que reside o cerne de uma insero econmica superadora dacondio de pobreza (69).

    No Nordeste urbano as linhas de ao acima mencionadas aplicam-se sregies metropolitanas e s maiores cidades, porm a dimenso da pobreza nelasexistente aconselha a identificao de outras atividades menos dependentes dosestreitos mercados de trabalho locais e mais autnomas com respeito s limitadasdemandas geradas internamente pelos no-pobres (70). O caso das pequenas ci-dades (numerosssimas na regio) entretanto diverso. Muitas so meras proje-es de economia rural depauperada e abrigam grande quantidade de pobres quevivem da agricultura. Elas freqentemente se encontram em estado de letargia ouem franca regresso econmica e mesmo demogrfica, apresentando grande inci-dncia de subemprego. Identificar e viabilizar suas vocaes produtivas de modoa criar mais empregos, seja atravs de revitalizao de suas bases agrcolas, sejamediante novas e mais dinmicas interligaes com os mercados regional enacional (71), o caminho para que os pobres possam nelas encontrar as chancesde ascenso social.

    No meio rural do Nordeste, embora se deva procurar reduzir o grau dedependncia dos pobres da pequena agricultura, o que mais releva transform-la em atividade tecnicamente mais moderna e mais referida ao mercado (aindaque se preserve a unidade familiar de produo). Nesse contexto, importante oacesso dos pobres a terras agricultveis e de dimenses adequadas (seja mediantesua aquisio, seja mediante arrendamento de longo prazo); aos recursos hdricos

  • indispensveis (no semi-rido a pequena irrigao condio necessria de ga-rantia de renda mnima estvel); e eletrificao, ao crdito, assistncia tcnicae s formas no espoliativas de comercializao (72). Inclusive para ampliar acapacidade de reteno demogrfica no campo ao possibilitar aos pobres o usodos fatores produtivos e a prtica de tecnologias agrcolas mais avanadas e me-nos vulnerveis a fatores naturais adversos. Insiste-se, porm, mais uma vez, queessa transformao pressupe uma nova postura do homem rural pobre perante omundo do trabalho que seja capaz de vencer as barreiras culturais que dificultama racionalizao de seu esforo produtivo (73). Isto envolve um processo de es-clarecimento pedagogicamente complexo. Seu objetivo o mesmo da educaosupletiva e da qualificao tcnica, j referido: a formao de mentalidade moder-na, que na verdade equivale a aquisio de uma nova cultura. No Nordeste rural,porm, ela deve sobrepor-se criticamente a formas de pensar e agir profundamen-te arraigadas, cujo rationale determina o comportamento rotineiro e pouco em-preendedor do pobre rural no trabalho. Essa atitude atvica est sendo cada vezmais desafiada pelos fatos e circunstncias de seu prprio cotidiano. Por isso ser-Ihe-, talvez, mais fcil mud-la. Seria, entretanto, ilusrio pensar que ela sersuperada sem intenso reaprendizado do mundo, alcanado concomitantementecom organizao racional da produo, de tal forma que possam gerar-se desseencontro as sinergias que ensejem o pobre a transpor o umbral a partir do qual oprocesso de sua ascenso social se tornar irreversvel (74).

    Combatendo a pobreza II: aes complementares

    A partir do ncleo das aes antipobreza, concebido, algumas aes com-plementares, depreendidas da anlise interpretativa das situaes sociais examina-das, complementam os modelos de interveno propostos, conferindo-lhes maiorespecificidade. Essas aes contemplam (75):

    a focalizao nos pobres das polticas sociais pblicas de carter setorial; o planejamento familiar; a intensificao do uso do trabalho como forma de complementao de renda; a assistncia aos pobres mais vulnerveis, e a universalizao da cidadania.

    Polticas sociais: a pobreza como pblico-alvo

    J se observou que as polticas sociais pblicas de natureza setorial, sendoem geral de extenso insuficiente, descontnua e precria nas reas de concentra-o de pobreza, distribuem-se desigualmente entre elas, numa gradao em queas metrpoles do Sudeste so mais beneficiadas do que o Nordeste metropolita-no, este ltimo melhor atendido do que o Nordeste urbano no-metropolitano,com o Nordeste rural delas recebendo a menor ateno. Esse fato em grande

  • parte explica por que os diferenciais de nveis de vida mdios entre os pobresdessas regies so muito mais elevados do que os relativos a suas rendas per capita.

    Impe-se, portanto, prioridade diferenciada s populaes pobres nas aessociais pblicas em setores como sade, habitao e saneamento bsico, relaesde trabalho, previdncia e assistncia social - alm, evidentemente, da educaobsica e supletiva e da qualificao para o trabalho, conforme j amplamenteenfatizado. Os hiatos entre os nveis de vida e de renda podem reduzir-seimportantemente, no Nordeste rural, urbano e metropolitano, mediante esforogovernamental de ampliao da oferta e da qualidade desses servios e seudirecionamento aos pobres (76).

    Alm de desempenharem importante papel na igualao de oportunidades,a incorporao dos pobres como beneficirios dessas aes pblicas tem, no meiorural e nas menores cidades do Nordeste, efeitos adicionais: o de reduzir os est-mulos s migraes para as grandes cidades e o de influenciar, via mudanas nascondies de vida, percepes, atitudes e condutas individuais mais consentneascom a modernidade.

    A execuo dessas polticas sociais, alm de focalizadas nos pobres, deveser descentralizada, envolvendo, na esfera pblica, os estados e municpios e, naesfera privada, as prprias comunidades beneficiadas. A pouca eficincia dosgastos sociais pblicos no Brasil em parte decorre de excessiva centralizao,envolvendo complexos e custosos aparatos burocrticos e, em parte, devida incapacidade gerencial das entidades governamentais envolvidas e sua relutnciaem confiar s comunidades tarefas que elas podem exercer muito melhor e amenores custos (77).

    Planejamento familiar: dimenso da liberdade

    Ainda que se deva propiciar a todos os pobres, como uma das dimensesdo exerccio de sua liberdade, as informaes e os meios para o planejamentofamiliar responsvel, uma atuao pblica orientada por esse propsito justifica-se particularmente no Nordeste rural (e, embora em menor grau, nas pequenascidades dessa regio).

    Recorde-se que as famlias do Nordeste rural (com em mdia 5,3 mem-bros) so relativamente mais numerosas, e que seu tamanho vem se reduzindomais lentamente com relao seja s urbanas, seja s metropolitanas (78). A ado-o na regio de poltica bem-orientada de planejamento familiar com liberdadeparece impor-se, pois, embora o uso da anticoncepo tenha se expandido a par-tir dos anos 60, as taxas de fecundidade continuam bastante elevadas (79).

  • Intensificao do uso ao trabalho: outras fontes de renda

    A dependncia familiar das rendas dos chefes de famlia pobres um poucomaior do que a dos no-pobres em cada uma das situaes sociais examinadasneste estudo, a despeito de ser mais alto, nas famlias pobres, o nmero mdio depessoas dependentes em idade ativa. Adicionalmente, essa dependncia se eleva,entre os pobres, no Nordeste rural, onde a subutilizao da fora de trabalhofamiliar seria maior, principalmente em funo dos perodos de entressafra pr-prios da agricultura tradicional de subsistncia.

    O mais amplo emprego da fora de trabalho familiar pode, portanto, cons-tituir mecanismo de elevao da renda dos pobres. No Nordeste rural essa inten-sificao do uso do trabalho pode ocorrer com diversificao das atividades pro-dutivas, hoje muito dependentes de agricultura comumente de alto risco: para oartesanato, o beneficiamento domstico de produtos agrcolas, por exemplo.

    Assistncia aos mais vulnerveis

    Por grupos sociais pobres potencialmente mais vulnerveis compreende-seaqui, de uma parte, o subgrupo das famlias chefiadas por mulheres, por pessoasdo sexo masculino menores de 18 anos ou maiores de 60 anos, e por homensadultos (18-60 anos) de cor preta; de outra, o subgrupo (que em parte se sobrepeao primeiro) formado pelas crianas, gestantes e nutrizes, idosos e deficientes (80).

    Este deve ser o pblico-alvo das polticas pblicas antipobreza de cartermais assistencial.

    No se entenda, entretanto, que essas aes devam adotar postura mera-mente assistencialista. Na maioria dos casos a assistncia necessria deve estaracoplada a criao de oportunidades de autopromoo humana, pela educao epelo trabalho. Isso certamente possvel para todo o primeiro subgrupo e para agrande maioria do segundo (excetuados os idosos e os gravemente deficientes,que devem ser atendidos pela previdncia e assistncia sociais).

    Cidadania: presena do Estado em reas de pobreza

    Se freqentemente se admite que o exerccio pleno da cidadania pressupeo atendimento das necessidades bsicas, dimenso essencial da liberdade, tam-bm til entender que, sendo o resultado de relaes de reciprocidade entre oindivduo e o Estado, os direitos e deveres do cidado no podem prescindir dapresena eficaz do aparato tcnico-burocrtico governamental nos espaos eco-nmico-sociais em que o homem vive e trabalha.

  • E dessa presena do Estado como instncia de poder e como agencia deservios que carecem as reas urbanas e rurais de concentrao de pobreza exami-nadas neste estudo - para que nelas se exercite melhor intercomunicao coopera-tiva, entre povo e governo, de que devem resultar menos pobreza e mais cidadania.

    Cabe a propsito referir que essa presena hoje to necessria nas metr-poles nacionais como nas cidades e no meio rural nordestinos. E na ausncia doEstado (e, em muitos casos, sob o manto protetor de seus agentes, cooptadosinclusive pelo suborno) que proliferam, nas favelas metropolitanas (em especialno Rio de Janeiro), os poderes paralelos associados ao crime organizado, quedesafiam impunemente a ordem pblica e subvertem os valores sobre os quais seassenta a sadia convivncia social.

    Enquanto esses quistos de marginalidade ameaam alastrar-se nas grandescidades, no meio rural e nos menores ncleos urbanos do Nordeste ainda subsis-tem, se bem que em regresso, as formas de domnio pr-estatais caractersticasdo coronelismo.

    Essas (e muitas outras) anomalias abertamente denunciam que o Estadobrasileiro ainda no governa inteiramente o seu territrio. E que ele tampoucoassegura a todos o que constitui dever essencial seu: a lei e a ordem, condiesnecessrias, ainda que insuficientes, da liberdade do cidado (81).

    Concluso: estratgia de desenvolvimento e pobreza

    Conforme se observou na introduo deste estudo, h consenso quanto aosobjetivos-fins do desenvolvimento. No existe, entretanto, concordncia sobre asestratgias a serem adotadas para que esses objetivos possam ser alcanados pelospases subdesenvolvidos ou em desenvolvimento.

    E bem verdade que a dbcle do chamado socialismo real restringiu o lequedas opes estratgicas confrontadas pelos estados-naes. Elas, contudo, aindaocupam um amplo espectro, porquanto dependem, entre outros fatores, do est-gio de desenvolvimento atingido, das nfases relativas conferidas aos objetivoseficincia, eqidade e liberdade, da diviso de trabalho entre as esferas pblica eprivada da sociedade, da capacidade poltica de obter convergncia de diferencia-dos interesses e aspiraes sociais.

    As escolhas estratgicas de desenvolvimento pelos pases menos avanados,portanto, so decises que ainda esto a requerer muita reflexo.

    Acresce, ademais, que o iderio poltico tende a sobrecarregar essas estrat-gias com doses generosas de eqidade e liberdade, voluntaristamente eleitas como

  • objetivos de curto prazo, sem exame mais detido de suas condies de viabilida-de. Para evitar frustraes de expectativas, infelizmente to freqentes, seria tilter sempre presente que os objetivos liberdade, eqidade e eficincia impementre si limites muito precisos, embora variveis no tempo e entre pases. Demodo geral, poder-se-ia, por exemplo, afirmar que uma social-democracia depadro ocidental-europeu em um pas com cerca de US$ 3 mil anuais de PIB percapita poderia estar legitimamente impressa em seu ordenamento institucional,mas no ter, a curto, mdio e mesmo longo prazos, condies de ser efetivamen-te praticada, tornando-se, assim, pragmaticamente vazia.

    Acrescente-se ainda - e considerando agora basicamente a questo da eqi-dade versus eficincia mais com o intuito de problematiz-la -, que uma opopor redistribuio interpessoal da renda (por exemplo pela via fiscal) pode reper-cutir sobre a trajetria de desenvolvimento de modo radicalmente diferente deuma opo pelo combate pobreza.

    A primeira dessas opes poder ser eficaz em reduzir as desigualdadesrelativas de renda (o Coeficiente de Gini, por exemplo). Porm, ao alterar a estru-tura de demanda, poder desestabilizar o crescimento. E ela no assegura necessa-riamente a reduo da pobreza (mesmo que se admita que o Estado seja eficientena destinao, aos pobres, dos recursos tributrios adicionais arrecadados, os quais,de resto, podem vir a reduzir-se grandemente pela resultante perda de dinamismoda economia). Ou seja, no frigir dos ovos pode-se muito bem ter redistribuiosem (ou com menos) crescimento e sem (ou com menos) reduo da pobreza, oque no o melhor dos mundos.

    A segunda opo - combate pobreza - tambm contm seus riscos. Elesse explicitam teoricamente no conhecido trade-off entre eficincia e eqidade: osrecursos destinados ao combate pobreza poderiam ter alternativa de aplicaomais produtiva (por exemplo, na melhoria da infra-estrutura econmica), de queresultaria mais crescimento (e lembre-se que o crescimento pode espontaneamen-te atuar na reduo da pobreza e constitui quase sempre precondio de sua via-bilidade). Ademais, os efeitos de reduo da pobreza sobre as desigualdades rela-tivas de renda podem ser, pelo menos num primeiro estgio, muito pequenos.

    J se ter, porm, depreendido que neste estudo considera-se a opo pelocombate pobreza como mais prioritria para os pases subdesenvolvidos e emdesenvolvimento porque ela apresenta maiores probabilidades de engendrar aseqncia virtuosa de progresso representada por mais crescimento, mais eqida-de e mais liberdade. A prioridade conferida a essa trajetria decorre do fato deque o no-atendimento das necessidades fundamentais de parcelas considerveisda populao o maior desafio social e poltico desses pases, o qual, enquantono for resolvido, permanecer como sria ameaa a seu desenvolvimento. E suas

  • possibilidades de xito so maiores porque a pobreza crtica uma realidadesocial concreta, visvel, delimitvel, sendo, assim, mais fcil combat-la, bem comoporque se obtm mais facilmente consenso nacional de que preciso erradic-laou, pelo menos, reduzi-la.

    A ltima questo a considerar nesta concluso a que diz respeito aplicabilidade dos modelos de ao antipobreza, esboados neste estudo a par-tir do desenho de trs diferentes perfis de pobreza rural e urbana no Brasil, aoutros pases.

    O que parece sensato defender que o seu arcabouo bsico teria valida-de geral, devendo, entretanto, ser adaptado s peculiaridades de cada situaosocial.

    Afinal, uma das teses centrais apresentadas neste estudo a da grande di-versidade de caractersticas das condies de pobre. E so dois os seus corolrios.O primeiro que cada situao de pobreza comporta interveno especfica, a elaadequada, o que condio para sua efetividade. E, o segundo, a necessidade dedescentralizar a execuo das aes antipobreza - como participao ativa, nelas,dos prprios pobres -, o caminho mais eficaz para que essas peculiaridades sejamrealmente levadas em conta.

    De todo modo, resultaria mais ou menos bvio que o Nordeste rural bra-sileiro - um caso de subdesenvolvimento onde os pobres enfrentam bloqueiosculturais racionalidade econmica e obstculos de acesso aos fatores de produ-o e ao mercado - guardaria similitudes, por exemplo, com o dos pases dafrica subsaariana, onde, de resto, as interdies, de origem tribal, modernidadeseriam ainda mais resistentes. Na outra ponta, o Sudeste metropolitano - umcaso de grandes aglomeraes urbano-industriais que, entretanto, ainda abrigamimportantes contingentes de pobres vivenciando graus diferenciados de integraoeconmica, social e cultural - seria semelhante ao das grandes cidades do mundoem desenvolvimento, como as dos maiores pases da Amrica Latina e do Lesteasitico e Pacfico. No meio, o Nordeste urbano - um caso de pobreza decorrentede urbanizao demograficamente excessiva com relao base econmica, emgrande medida gerada por migraes rural-urbanas - aproximar-se-ia de situa-es de pobreza prevalecentes no Oriente Mdio, no Norte da frica e nos meno-res pases das Amricas.

    Notas

    1 Veja-se, a propsito, do autor deste estudo, Opes de desenvolvimento e estratgiasocial: concepo geral, in Joo Paulo dos Reis Velloso (coord), Estratgia social edesenvolvimento, Rio de Janeiro, Jos Olympio, 1992, p. 29-71.

  • 2 A reduo do desenvolvimento ao crescimento da produo - um vis economicista- tem conduzido simplificao que consiste em tomar o PIB per capita, como medi-da do desenvolvimento. Retomam-se, nos ltimos anos, as tentativas de construirindicadores mais abrangentes, sintticos ou agregados, de que exemplo o IDH -ndice de Desenvolvimento Humano. Cf. United Nations Development Programme -Undp, Human development reports, 1990-3, New York, Oxford Univ. Press, 1990-93.Exemplo de ndice global de desenvolvimento construdo para o Brasil, suas regiese estados encontra-se em Roberto Cavalcanti de Albuquerque (coord.), O Brasilsocial: realidades, desafios, opes, Rio de Janeiro, Ipea, 1993, p.281-414.

    3 Como sabido, o Coeficiente de Gini ndice que, variando de zero a um, expressa emque medida uma determinada distribuio interpessoal de renda se aproxima da igual-dade absoluta (quando o Coeficiente igual a zero) ou da desigualdade absoluta(quando igual a um). O Brasil, com Coeficiente de Gini de 0,57, apresenta, deacordo com esse indicador, um dos mais elevados graus de desigualdade dentre 28pases considerados pelo Undp (1975-88). Cf. Undp, Human development report 1992,cit., p. 160-161.

    4 O Human development report 1992, cit. (p.26-33), intenta construir, para 104 pases,um indicador agregado de liberdade poltica, o ILP - ndice de Liberdade Poltica,expresso em percentuais. A concluso geral que os pases mais desenvolvidos tmum ILP mais elevado (de 90%, em mdia) do que os menos desenvolvidos (ILPmdio de 51%), com os 104 pases apresentando ILP mdio de 61%. Em O Brasilsocial, cit., incursiona-se nesse terreno, ainda pedregoso, da politicometria (loc. cit.esp. p. 423-443).

    5 So eles fundamentalmente os pases membros da Organizao para Cooperao eDesenvolvimento Econmico (Ocde), com exceo da Turquia. Cf. The World Bank,World development report 1993, esp. p. xi e 345.

    6 O conceito de modernidade trplice vem sendo utilizado por Joo Paulo dos ReisVelloso, principalmente em Inovao e sociedade: uma estratgia de desenvolvimento comeqidade para o Brasil, Rio de Janeiro, Jos Olympio, 1994.

    7 O Banco Mundial classifica os pases, segundo esse critrio, em economias de altarenda (PIB per capita anual de US$ 7.911 ou mais), de renda mdia alta (US$ 2.556-7.910), renda mdia baixa (US$ 636-2.555) e baixa renda (US$ 635 ou menos). OBrasil est classificado no grupo de renda mdia alta (PIB per capita de US$ 2.940,em 1991). Cf. World development report 1993, p.344-345 e 253.

    8 So aqui considerados como pases subdesenvolvidos as economias de renda baixa.Cf. nota 7, supra.

    9 Os Coeficientes de Gini para esses pases variam bastante: desde 0,62 (Honduras) at0,34 (Bangladesh). A incidncia mdia de pobreza crtica (ou absoluta) , entretanto,muito elevada (62% da populao, em mdia) e o ndice de Liberdade Poltica (ILP),de apenas 48%. Cf. Human development reports 1992-93, cit.

  • 10 Pases de renda mdia baixa e alta (ver nota 7, supra).

    11 Os pases em desenvolvimento apresentam Coeficientes de Gini que variam de 0,31(Indonsia) a 0,66 (Jamaica). As incidncias de pobreza crtica tambm so bastantediversas: vo de 17% da populao (Tunsia) a 58% (Indonsia), situando-se, emmdia, em 25%. O ILP, para esses pases, de 50%, muito pouco superior ao dospases subdesenvolvidos. Cf. Human development reports 1992-93, cit.

    12 Trata-se de pobreza crtica (ou absoluta), entendida como a condio scio-familiarna qual as necessidades bsicas no esto atendidas. Pobres so neste estudo conside-radas aquelas pessoas cujo rendimento familiar per capita igual ou inferior a 1/4 dosalrio mnimo vigente em 1980 (valor esse correspondente a US$ 35 mensais, ou aUS$ 417 anuais - dlares de 1990). Cf. Albuquerque, Roberto Cavalcanti de. Po-breza e excluso social. In: Velloso & Albuquerque, Pobreza e mobilidade social, SoPaulo, Nobel, 1993, p. 53-102. Admitida a mesma incidncia de pobreza (27%), ospobres no pas seriam, em 1994, 41,2 milhes (populao estimada para 1994:152,8 milhes).

    13 A distncia social medida pelo quociente das rendas familiares per capita dos no-pobres e dos pobres. Cf. Pobreza e excluso social, cit.

    14 Para os efeitos desta anlise foram examinadas as situaes de pobreza correspon-dentes aos meios rural e urbano das macrorregies brasileiras - Norte (somente omeio urbano), Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste -, bem como as nove regiesmetropolitanas do pas (Belm, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio deJaneiro, So Paulo, Curitiba e Porto Alegre): ao todo, dezenove situaes. As rendasfamiliares per capita dos pobres variam, entre essas situaes, apenas 18% em tornoda mdia nacional (US$ 225 anuais). Entretanto, indicador agregado que mensurao grau de atendimento relativo das necessidades bsicas de pobres e de no-pobresdo pas (o ICB - ndice de Carncias Bsicas), que varia entre 100 (muito baixoatendimento) e 900 (atendimento muito alto) apresenta considervel variao entreos pobres (num extremo, o ICB dos pobres do Nordeste rural de apenas 105 e, nooutro, o de Belo Horizonte de 499). Cf. Pobreza e excluso social, cit.

    15 Cf., por exemplo, Bonelli, Regis & Sedlacek, Guilherme Lus, Distribuio de ren-da: evoluo no ltimo quarto de sculo, in Sedlacek, G.L. & Paes de Barros, R.(eds.), Mercado de trabalho e distribuio de renda: uma coletnea, Rio de Janeiro,Ipea, 1989, p. 7-24.

    16 Veja-se Bonelli & Sedlacek, cit.

    17 Cf. Albuquerque, R.C. de & Villela, R., A situao social no Brasil: um balano deduas dcadas, in A questo social no Brasil, cit., p. 23-104. Veja-se, tambm, Castro,A. Barros de, O Brasil a caminho do mercado de consumo de massa, in Velloso, J.P.dos Reis, As perspectivas do Brasil e o novo governo, So Paulo, Nobel, 1990, p. 121-126. Esses trabalhos foram apresentados no Frum Nacional, reunio anual de eco-nomistas, cientistas sociais e polticos e lideranas representativas da sociedade, rea-lizada sob os auspcios do Instituto Nacional de Altos Estudos (Inae), do Rio deJaneiro.

  • 18 Programa de Desenvolvimento de reas Integradas do Nordeste. A concepo origi-nal do Polonordeste, formulada pelo Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada -Ipea a partir do conceito de reas integradas, espacialmente descontnuas, foi adota-da, em 1974, pelo II PND [Cf. Repblica Feder