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Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto
Escola Superior de Arte e Design
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para a
Aquisição e Análise do Movimento Mandibular
Isa Cristina Teixeira Santos
Dezembro de 2005
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para a
Aquisição e Análise do Movimento Mandibular
Dissertação submetida para efeito de atribuição do grau de Mestre em Design Industrial pela Universidade do Porto
Isa Cristina Teixeira Santos
Licenciada em Engenharia Mecânica pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (2003)
Dissertação realizada sob a supervisão de:
Prof. João Manuel R. S. Tavares (Orientador) Professor Auxiliar do Departamento de Engenharia Mecânica e Gestão Industrial da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto
Prof. Joaquim Gabriel Mendes (Co-Orientador) Professor Auxiliar do Departamento de Engenharia Mecânica e Gestão Industrial da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto
Prof. Manuel Pedro da Fonseca Paulo (Co-Orientador) Professor Associado da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto
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Agradecimentos
Gostaria de agradecer aos meus orientadores, o Prof. João Tavares, o Prof.
Joaquim Mendes e ao Prof. Manuel Paulo, pela disponibilidade e pelo apoio
dispensado na realização deste trabalho.
Agradeço ao Prof. Fernando Martins pelo apoio dado na implementação do
algoritmo de redes neuronais.
Ao Eng. Rui Neto e ao CETECOFF – Unidade de Fundição e Novas Tecnologias
(INEGI) agradeço pela realização dos protótipos e à Investigadora Principal Teresa
Restivo (FEUP-DEMEGI) pela disponibilização do “Laboratório de Instrumentação
para Medição” para a realização das medições experimentais.
Agradeço à Rhopoint Components LTD (Inglaterra) pelo envio dos sensores
utilizados neste trabalho e à Ningbo Ketian Magnet CoLtd (China) pelo envio de
ímanes.
Também agradeço à Ana Pereira, ao Bruno e ao Artur pela ajuda.
Para terminar, quero agradecer à minha família e aos meus amigos pelo
incentivo e pela ajuda nas pequenas e nas grandes coisas.
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Resumo
Esta Dissertação relata o desenvolvimento de um sistema protótipo para a
aquisição e análise do movimento mandibular 3D.
Em Medicina Dentária, o estudo do movimento mandibular revela-se de grande
importância no desenvolvimento de trabalhos de reabilitação oral, pois permite
determinar se existem ou não patologias ao nível da articulação
temporomandibular, possibilitando a realização de diagnósticos e a elaboração de
planos de tratamento adequados.
Neste trabalho, numa primeira fase, foi feito um estudo sobre a anatomia
dentária e o funcionamento da articulação temporomandibular para melhor
compreender o problema em questão.
Em seguida, foi realizado um levantamento dos vários sistemas existentes para
a aquisição do movimento para conhecer as suas vantagens e limitações.
Finalmente, optou-se por adaptar um arco facial comum em Medicina Dentária
de modo a usar sensores electromagnéticos para fazer a aquisição do movimento.
Algumas peças do arco facial seleccionado foram redesenhadas de modo a garantir
o conforto dos pacientes durante os exames, e foi desenvolvido um suporte
específico para os sensores.
Para visualizar e analisar o movimento 3D adquirido num computador pessoal
foi desenvolvida uma aplicação computacional em LabVIEW. Para converter em
coordenadas cartesianas a tensão dada pelos sensores electromagnéticos foi criado
o “algoritmo do ponto mais próximo” e foram também utilizadas redes neuronais.
Ao desenvolver o sistema protótipo procurou-se adoptar um processo de
desenvolvimento de produto estruturado: foram identificadas as “necessidades dos
clientes” (os médicos dentistas), foram definidas as especificações do produto,
foram definidos conceitos e a arquitectura do mesmo, e foram desenvolvidos e
testados protótipos. Também foram estimados os custos de produção do protótipo
desenvolvido.
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Abstract
This thesis presents the development of a prototype system for the acquisition
of the 3D mandibular movement.
In Dental Medicine, the study of the mandibular movement is very important in
the development of oral rehabilitation treatments because it allows to determine if
exists or not pathologies in the temporomandibular joints, allows the diagnostic
and the elaboration of adequate treatment plans.
In this project, in an early stage, it was made a study about dental anatomy
and the functioning of the temporomandibular joint to better understand the
problem. Were also identified some of the existing systems for the acquisition of
the mandibular movement to know there advantages and limitations.
Finally, it was chosen to adapt a common facial arc in Dental Medicine to use
electromagnetic sensors to acquire the movement. Some parts of the facial arc
were redesigned in order to ensure the comfort of the patients during the exams
and it was developed a specific support for the sensors.
To visualise and analyse the 3D movement acquired in a personal computer it
was developed a computational application in LabVIEW. To transform in cartesian
coordinates the electrical signal obtained by the electromagnetic sensors it was
created the “algorithm of the nearest point” and were also used neural networks.
To develop this prototype system it was adopted a structured product
development process: the costumer needs, the product specifications, the concept
and the product architecture were defined and prototypes were created and
tested. It were also estimated the production costs of the developed prototype.
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Índice
1. Introdução à Dissertação.............................................................. 1
1.1: Introdução............................................................................ 3
1.2: Organização da Dissertação ....................................................... 5
1.3: Principais contribuições do trabalho desenvolvido ............................ 6
2. Introdução à Anatomia Dentária ..................................................... 9
2.1: Articulação temporomandibular ................................................. 11
2.1.1: Ligamentos ..................................................................... 12
2.1.2: Músculos ........................................................................ 13
2.2: Movimentos ......................................................................... 15
2.3: Oclusão .............................................................................. 21
2.3.1: Desenvolvimento da oclusão ................................................ 21
2.3.2: Forma do arco dental......................................................... 25
2.3.3: Ângulos cuspídeos, cúspides guias, planos e curvas oclusais
imaginários ............................................................................. 26
2.3.4: Angulação dos eixos dos dentes............................................. 27
2.3.5: Forma funcional dos dentes ................................................. 29
2.3.6: Contacto oclusal............................................................... 30
2.4: Resumo .............................................................................. 33
3. Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico....................... 35
3.1: Disfunções temporomandibulares ............................................... 37
3.2: Diagnóstico das disfunções temporomandibulares............................ 38
3.3: Aquisição e análise do movimento mandibular................................ 39
3.3.1: Sistema Zebris JMA system .................................................. 41
3.3.2: Sistema ARCUSdigma ......................................................... 42
3.3.3: Sistema K7 Evaluation System .............................................. 43
3.3.4: Sistemas ópticos............................................................... 44
3.4: Resumo .............................................................................. 47
4. Introdução ao Desenvolvimento de Produto e Apresentação do Caso em
Estudo ................................................................................... 49
4.1: Introdução ao Desenvolvimento de Produto ................................... 51
ix
4.2: Apresentação do caso em estudo: Desenvolvimento de um sistema
protótipo para aquisição e análise do movimento mandibular 3D............... 54
4.2.1: Introdução...................................................................... 54
4.2.2: Desenvolvimento do sistema protótipo .................................... 56
4.3: Resumo .............................................................................. 58
5. Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do
Movimento Mandibular 3D ........................................................... 61
5.1: Sensores electromagnéticos ...................................................... 63
5.2: Íman .................................................................................. 66
5.3: Arco Facial Arcus................................................................... 67
5.4: Redesign efectuado................................................................ 69
5.5: Sistema de suporte para os sensores............................................ 70
5.6: Protótipos desenvolvidos.......................................................... 73
5.7: Montagem electrónica desenvolvida ............................................ 77
5.8: Interface gráfica desenvolvida................................................... 79
5.9: Conversão da Tensão em Coordenadas Cartesianas .......................... 82
5.10: Utilização do sistema ............................................................ 87
5.11: Estimativa dos custos de produção ............................................ 91
5.12: Comercialização do produto .................................................... 92
5.13: Resumo ............................................................................. 94
6. Conclusões Finais e Perspectivas de Trabalho Futuro ........................... 97
6.1: Conclusões Finais................................................................... 99
6.2: Perspectivas de Trabalho Futuro ...............................................100
Bibliografia .................................................................................103
Anexo A. Programação em LabVIEW...................................................109
x
Índice de Figuras
Figura 2.1: Articulação temporomandibular (imagem adaptada de [Moore,
1999]). ....................................................................................... 11
Figura 2.2: A articulação temporomandibular: a) vista lateral; b) vista medial; c)
secção sagital (imagens adaptadas de [Williams, 1995]). ........................... 13
Figura 2.3: a) Músculo temporal esquerdo; b) Músculos pterigóideos esquerdos
(imagens de [Williams, 1995]). .......................................................... 14
Figura 2.4: Modificações das relações do côndilo da mandíbula, o disco articular
e a face articular do osso temporal durante uma abertura completa (A>D) e
fecho (D>A) do ciclo da boca (imagem de [Williams, 1995])........................ 17
Figura 2.5: Representação esquemática do movimento mandibular bordejante no
plano sagital: CR - relação cêntrica; CO - oclusão cêntrica; F - protrusão
máxima; PR - posição de repouso; E - abertura máxima; B e CR - abertura e
fecho sobre o eixo de rotação, sem mudança no raio (r) (imagem adaptada
de [Major, 1987]). ......................................................................... 18
Figura 2.6: Movimento lateral direito da mandíbula, com representação
esquemática do movimento no ponto incisivo no plano horizontal (CR, LL, P,
RL) e na cabeça da mandíbula (W, C, B, P): CR - relação cêntrica; LL -
lateral esquerda; P - protrusiva; RL - lateral direita; CO - oclusão cêntrica;
BG – ângulo de Bennett; de C a P - movimento protrusivo (imagem de
[Major, 1987]). ............................................................................. 20
Figura 2.7: Figura de Posselt no plano frontal (imagem de [Weingärtner, 1997]). ... 21
Figura 2.8: Dentição de leite (imagens adaptadas de [ADMT, 2005]). .................. 22
Figura 2.9: Dentição definitiva (imagem adaptada de [ADMT, 2005]). ................. 23
Figura 2.10: Sequência eruptiva favorável dos dentes permanentes (imagem de
[Major, 1987]). ............................................................................. 24
Figura 2.11: Curva de Spee (imagem de [Bastos, 2000]).................................. 27
Figura 2.12: Curva de Wilson (imagem de [Bastos, 2000])................................ 28
xi
Figura 2.13: Angulação dos eixos dos dentes: A – incisivos; B – primeiro pré-
molar; C – segundo pré-molar; D – primeiro molar; E – segundo molar; F –
terceiro molar (imagem de [Major, 1987]). ........................................... 28
Figura 2.14: Os terços incisal e oclusal da coroa dental apresentam superfícies
côncavas ou convexas em todas as áreas de contacto oclusal (imagem de
[Major, 1987]). ............................................................................. 29
Figura 2.15: A - Desenho esquemático da face mesial das coroas dos primeiros
molares superiores e inferiores em relação cêntrica (foram colocados
círculos dentro dos contornos das formas cuspídeas para enfatizar as
curvaturas); B - Esquema das relações de contacto em dentes não
desgastados; C - Modificação nas relações de contacto oclusal com o
desgaste (imagem de [Major, 1987]).................................................... 30
Figura 2.16: Relações vestibulares dos dentes nos arcos opostos (imagem de
[Bodin, 2004]). ............................................................................. 30
Figura 2.17: Sobressaliência e sobremordida (imagem adaptada de [ADMT,
2005]). ....................................................................................... 32
Figura 2.18: Esquema idealizado para todos os contactos das cúspides de suporte
com fossas e cristas marginais dos dentes oponentes: A - arco superior; B -
arco inferior (imagem de [Ramfjord, 1984]). ......................................... 32
Figura 3.1: Sistema Jaw Motion Analyzer (JMA) da Zebris GmbH (imagem de
[Enciso, 2002]).............................................................................. 41
Figura 3.2: Sistema ARCUSdigma da Kavo (imagem de [www.kavo.com]). ............ 42
Figura 3.3: Os quatro passos necessários para a aquisição do movimento com o
sistema ARCUSdigma (imagem de [Pröschel, 2002]). ................................ 43
Figura 3.4: Sistema K7 Evaluation System da Myotronics (imagem de [Garcia,
2003]). ....................................................................................... 44
Figura 3.5: Íman utilizado para detectar o movimento, montado sobre os
incisivos (imagem de [Leles, 2003])..................................................... 44
Figura 3.6: Interface gráfica que acompanha o sistema K7 Evaluation System da
Myotronics (imagens de [www.myotronics.com]). ................................... 45
Figura 3.7: Paciente sentado no interior do campo de visão das duas câmaras
posicionadas ortogonalmente. O paciente usa um suporte com marcadores
inferiores e um capacete de referência (imagem de [Leader, 2002])............. 45
xii
Figura 3.8: Sistema desenvolvido por Mesnard: a) Molde dos dentes do paciente e
a calha onde vão ser montados os alvos; b) Alvos “montados” no paciente
(imagens de [Mesnard, 2003])............................................................ 46
Figura 3.9: Sistema desenvolvido por Kinuta (imagem de [Kinuta, 2003])............. 47
Figura 3.10: Imagem obtida pela câmara utilizada por Kinuta (imagem de
[Kinuta, 2003]). ............................................................................ 47
Figura 4.1: Processo genérico de desenvolvimento de produto (imagem adaptada
de [Ulrich, 2000]). ......................................................................... 53
Figura 5.1: Efeito de Hall: a) sem campo magnético; b) com campo magnético
(imagens de [Honeywell, 2005]). ........................................................ 63
Figura 5.2: Efeito GMR, “Giant Magneto Resistive”: A – Camada condutora; B –
Camadas magnéticas; C – Corrente eléctrica; D – Campo magnético (imagens
adaptadas de [NVE, 2005]). .............................................................. 64
Figura 5.3: a) Sensores AA002-02 da NVE Corporation (USA) usados; b) Esquema
do sensor (imagem de [NVE, 2002])..................................................... 65
Figura 5.4: Configurações possíveis do íman/sensor usado (imagens adaptadas de
[Honeywell, 2005]). ....................................................................... 66
Figura 5.5: Modelação 3D da montagem dos sensores usados e das placas de
circuito impresso desenvolvidas. ........................................................ 66
Figura 5.6: Íman usado na aquisição do movimento mandibular. ....................... 67
Figura 5.7: Íman revestido a teflon (diâmetro: 5 mm; altura: 11 mm)................. 67
Figura 5.8: Arco facial Arcus da Kavo usado neste trabalho como estrutura
principal de suporte do sistema de aquisição mandibular (duas vistas). ......... 68
Figura 5.9: a) Exemplo de utilização do arco facial Arcus da Kavo; b) Pormenor
do auricular; c) Pormenor da glabela (imagens de [www.kavo.com]). ........... 68
Figura 5.10: Modelação 3D realizado neste trabalho do arco facial Arcus usando o
programa Autodesk Inventor Professional (duas vistas). ............................ 69
Figura 5.11: Um dos auriculares originais do arco facial Arcus da Kavo (duas
vistas). ....................................................................................... 69
Figura 5.12: a) Modelação 3D obtida para o auricular original; b), c) e d)
Redesign obtido para a mesma peça.................................................... 70
Figura 5.13: Modelação 3D do suporte dos sensores desenvolvido (quatro vistas).... 71
xiii
Figura 5.14: a) Montagem das placas de circuito dos sensores no dispositivo de
suporte respectivo; b) e c) Sistema de abertura/fecho por tampa deslizante. . 72
Figura 5.15: Pormenor da fixação do suporte desenvolvido para os sensores
electromagnéticos ao arco facial da Kavo. ............................................ 72
Figura 5.16: a) Pormenor da parte terminal do suporte dos sensores; b) Pormenor
da ligação dos cabos dos sensores....................................................... 73
Figura 5.17: Primeira versão dos auriculares desenvolvidos. ............................ 74
Figura 5.18: Primeira versão do suporte desenvolvido para os sensores. .............. 74
Figura 5.19: Segunda versão do suporte dos sensores e dos auriculares
concebidos neste trabalho usando o método de estereolitografia (duas
vistas). ....................................................................................... 75
Figura 5.20: a) Segunda versão dos auriculares desenvolvidos; b) Montagem do
novo auricular no arco facial Arcus da Kavo........................................... 75
Figura 5.21: a) Segunda versão do suporte dos sensores desenvolvido; b)
Pormenor da fixação das placas de circuito impresso dos sensores; c)
Pormenor de fixação ao arco facial Arcus da Kavo. .................................. 76
Figura 5.22: Montagem dos sensores na segunda versão do suporte desenvolvido
para os mesmos. ........................................................................... 76
Figura 5.23: Sugestão para o plano de apartação do suporte desenvolvido para os
sensores (duas vistas). .................................................................... 77
Figura 5.24: NI USB-6008 da National Instruments: 1 - Indicador da orientação
dos conectores; 2 - Conectores; 3 - Etiquetas; 4 - Cabo USB (imagem de [NI,
2005]). ....................................................................................... 78
Figura 5.25: Fonte de alimentação usada na alimentação do sistema (imagem de
[www.rs-portugal.com]). ................................................................. 79
Figura 5.26: Caixa desenvolvida para alimentação dos sensores
electromagnéticos e aquisição por um computador pessoal dos seus sinais. .... 80
Figura 5.27: Interface gráfica desenvolvida neste trabalho recorrendo à
ferramenta LabVIEW: em cima surgem os campos relativos aos dados
pessoais do paciente, enquanto que na parte de baixo surgem os botões de
controlo e os gráficos dos resultados obtidos. ........................................ 81
Figura 5.28: Interface gráfica desenvolvida: projecção da trajectória no plano
sagital........................................................................................ 82
xiv
Figura 5.29: Interface gráfica desenvolvida: localização do relatório da medição
obtida. ....................................................................................... 83
Figura 5.30: Exemplo de um relatório obtido com a interface desenvolvida.......... 83
Figura 5.31: Montagem utilizada na aquisição experimental dos pontos 3D usada
para calibrar o sistema desenvolvido. .................................................. 84
Figura 5.32: Pormenor do “zero” do sistema de coordenadas 3D usado para
calibrar o sistema desenvolvido. ........................................................ 85
Figura 5.33: Interface desenvolvida durante este trabalho para a aquisição dos
pontos 3D necessários para a calibração do sistema. ................................ 85
Figura 5.34: Pontos 3D adquiridos 3D para calibrar o sistema desenvolvido: Eixo 1
– segundo xx; Eixo 2 – segundo zz; Eixo 3 – segundo yy. ............................. 86
Figura 5.35: Funções de transferência: a) Função de transferência dos neurões
da camada escondida; b) Função de transferência dos neurões da camada de
saída (imagens de [Demuth, 2005]). .................................................... 87
Figura 5.36: Arquitectura da rede de base radial utilizada: R - número de
entradas; S1 - número de neurões na camada escondida; S2 - número de
neurões na camada de saída (imagem adaptada de [Demuth, 2005])............. 87
Figura 5.37: Sistema protótipo desenvolvido para a aquisição e análise do
movimento mandibular 3D................................................................ 88
Figura 5.38: Preparação do sistema protótipo desenvolvido para a aquisição e
análise do movimento mandibular 3D. ................................................. 89
Figura 5.39: Preparação do arco facial: substituição das peças auriculares........... 89
Figura 5.40: a) Colocação do arco facial no paciente; b) Pormenor da peça
auricular desenvolvida neste trabalho; c) Sistema pronto para a aquisição do
movimento. ................................................................................. 89
Figura 5.41: Marcação “CE” que deverá ser aposta no dispositivo desenvolvido
(imagem da Portaria nº 136/96 de 3 de Maio)......................................... 93
xv
xvi
Índice de Tabelas
Tabela 2.1: Dentição de leite (dados de [Moore, 1999]).................................. 22
Tabela 2.2: Dentição definitiva (dados de [Moore, 1999]). .............................. 23
Tabela 5.1: Características dos sensores AA002-02 da NVE Corporation (dados de
[NVE, 2002]). ............................................................................... 65
Tabela 5.2: Características da placa de aquisição NI USB-6008 da National
Instruments (dados de [NI, 2005]). ..................................................... 78
Tabela 5.3: Parâmetros do comando “newrb” utilizado para construir a rede
neuronal radial utilizada neste trabalho. .............................................. 87
Tabela 5.4: Estimativa dos custos para produzir o sistema protótipo desenvolvido
para a aquisição e análise do movimento mandibular 3D. .......................... 92
xvii
1. Introdução à Dissertação
Introdução à Dissertação
1.1: Introdução
Quando se fala em desenvolvimento de produto é um equívoco pensar que se
resume somente à definição da forma e das características. Pois, trata-se de um
processo que ocupa um lugar de destaque nas empresas por abranger áreas tão
distintas como o marketing, a engenharia, o design e o planeamento do processo de
fabrico incluindo a definição dos custos.
O desenvolvimento de produto pode-se referir à criação de novos produtos ou à
adaptação de artigos já existentes. Geralmente, o processo é iniciado e altamente
condicionado por influências internas e externas tais como encomendas, pedidos
dos clientes, lacunas no mercado, ideias inovadoras ou directrizes das próprias
empresas que definem as características do produto e as tarefas que este deve
desempenhar.
Nesta Dissertação é descrito o desenvolvimento de um novo produto: um
sistema protótipo para a aquisição e análise do movimento mandibular 3D. Neste
caso, o processo de desenvolvimento começou com a identificação de uma
oportunidade durante uma conversa com um médico dentista. Inicialmente falou-se
da articulação temporomandibular e dos problemas que ela pode causar, mas
rapidamente foi apontada a necessidade de um sistema que auxiliasse o diagnóstico
das disfunções temporomandibulares que fosse prático e acessível.
A mandíbula humana, juntamente com a articulação temporomandibular,
forma um interessante e complexo sistema biomecânico que desempenha várias
funções e tem a capacidade de exercer elevadas forças com grande precisão. As
anormalidades na mandíbula, além de causarem problemas estéticos, são
responsáveis por cargas assimétricas na articulação que por sua vez conduzem a um
desenvolvimento desigual dos músculos e a dores na articulação e, uma vez que a
articulação é essencial para morder e mastigar, a dor é incapacitante e reduz
consideravelmente a qualidade de vida de quem a sente.
Grande parte da população padece de dores de cabeça, dores no pescoço,
dores na face, sensação de “assobio”, vertigens e dor nos ouvidos. Muitas vezes
diz-se que este mal-estar está “na cabeça dos pacientes” ou é o resultado do stress
e procura-se aliviar as dores recorrendo a analgésicos. No entanto, estes sintomas
Isa Cristina Teixeira Santos 3
Introdução à Dissertação
podem significar problemas na articulação temporomandibular. Para um correcto
diagnóstico o padrão do movimento mandibular deve ser estudado, pois a
existência de desvios nos movimentos pode ser revelador quanto à presença ou não
de problemas a nível da articulação.
O conhecimento do movimento mandibular é importante no estudo do
movimento condilar, da fala, da mastigação e dos movimentos musculares. Em
Medicina Dentária, a cinemática mandibular é essencial para simular as
articulações temporomandibulares, posicionar os modelos dos dentes em
articuladores e reproduzir os movimentos mandibulares de modo a garantir uma
oclusão satisfatória.
A peculiar construção da articulação permite que a mandíbula se mova segundo
seis graus de liberdade tornando complexa a aquisição do movimento.
Actualmente, existem vários dispositivos que permitem fazer a aquisição e a
avaliação do movimento mandibular com grande exactidão mas, tanto os sistemas
comerciais correntes como os dispositivos desenvolvidos à medida, são
considerados demasiado caros e de difícil utilização comum, pelo que geralmente o
seu uso é restrito. Perante esta situação, procurou-se desenvolver durante este
trabalho um sistema económico, fácil de utilizar e que tivesse elevada exactidão.
No desenvolvimento do sistema protótipo foi adoptado um processo de
desenvolvimento de produto estruturado: foi identificada uma oportunidade, foram
definidas as especificações do produto, foram definidos conceitos e a arquitectura
do mesmo, e finalmente foram desenvolvidos e testados protótipos.
As especificações do produto foram definidas, juntamente com um médico
dentista, depois de ser realizado um estudo sobre anatomia dentária e a
articulação temporomandibular, e os conceitos só foram desenvolvidos depois de
ser feito um levantamento sobre os sistemas existentes para a aquisição do
movimento mandibular.
No protótipo desenvolvido neste trabalho, foram utilizados sensores
electromagnéticos para registar o movimento de um pequeno íman colado junto ao
ponto incisivo da mandíbula do paciente; esta tecnologia foi escolhida por permitir
efectuar medições sem contacto e por ser de baixo custo.
No sentido de reduzir custos e generalizar o uso do sistema, em vez de se
conceber um novo suporte para os sensores, foi adaptado um arco facial comum em
Isa Cristina Teixeira Santos 4
Introdução à Dissertação
Medicina Dentária. Assim, foi escolhido um arco facial recente e compatível com
vários articuladores; posteriormente, algumas das suas peças foram redesenhadas
para melhorar o desempenho na sua nova função e foi criado um suporte dedicado
para os sensores.
Para a aquisição do sinal dos sensores foi usado o módulo NI 6008 da National
Instruments e o software LabVIEW. Com esta ferramenta foi desenvolvida uma
aplicação para visualizar e analisar o movimento mandibular 3D. Procurou-se que a
interface criada fosse intuitiva, e que o médico dentista pudesse registar todas as
informações relevantes para o diagnóstico das disfunções temporomandibulares.
Durante a criação da interface, surgiu a necessidade de converter a tensão
registada pelos sensores electromagnéticos em coordenadas cartesianas de modo a
traçar a trajectória 3D do íman. Para este efeito, foi criado um algoritmo a que se
chamou “algoritmo do ponto mais próximo” e também foram experimentadas redes
neuronais.
Como o processo do desenvolvimento do produto só termina quando este é
comercializado, foram indicados os procedimentos necessários para a
comercialização em Portugal de um dispositivo médico. Também foram apontados
alguns dos custos envolvidos na produção do sistema.
1.2: Organização da Dissertação
Esta Dissertação descreve o desenvolvimento de um novo sistema protótipo
para a aquisição do movimento mandibular 3D, que inclui uma aplicação
computacional desenvolvida em LabVIEW para visualizar e analisar o movimento
adquirido.
Esta Dissertação é constituída por seis capítulos e um anexo. Em seguida, são
descritos resumidamente os restantes cinco capítulos e o referido anexo.
No capítulo seguinte apresenta-se sucintamente a anatomia dentária. É feita
uma descrição da articulação temporomandibular, dos músculos e ligamentos
envolvidos no movimento mandibular, e os vários movimentos da mandíbula são
explicados assim como alguns dos factores que os influenciam.
Isa Cristina Teixeira Santos 5
Introdução à Dissertação
No terceiro capítulo fala-se das disfunções temporomandibulares e do seu
diagnóstico. Neste capítulo também são apresentados alguns dos sistemas
existentes para a aquisição e análise do movimento mandibular.
O quarto capítulo desta Dissertação começa com uma introdução teórica ao
desenvolvimento do produto. Posteriormente descreve-se, sucintamente, o
procedimento adoptado no caso de desenvolvimento de produto e são explicados os
passos a tomar na comercialização de um dispositivo médico.
No capítulo seguinte, o desenvolvimento do sistema protótipo é relatado
detalhadamente.
No último capítulo são apresentadas algumas conclusões finais e indicadas
várias propostas para trabalhos futuros.
No final desta Dissertação, incluiu-se um anexo com vários diagramas de blocos
referentes à programação da interface desenvolvida usando a ferramenta LabVIEW.
1.3: Principais contribuições do trabalho desenvolvido
Apesar do movimento mandibular ser importante no diagnóstico de problemas
da articulação temporomandibular são poucos os médicos dentistas que possuem
equipamento adequado para proceder à sua aquisição. Com esta Dissertação
procurou-se chamar a atenção para esse facto e desenvolver um sistema protótipo
para a aquisição e análise do movimento mandibular 3D que fosse prático e
acessível.
Para melhor compreender o problema estudou-se anatomia dentária e a
articulação temporomandibular e foram descritos alguns dos sistemas existentes
para a aquisição do movimento mandibular.
Procurou-se que o processo do desenvolvimento do sistema protótipo fosse um
processo de desenvolvimento de produto estruturado pelo que foi necessário
também estudar este assunto.
Tal como já foi referido, foi desenvolvido um sistema protótipo para a
aquisição do movimento mandibular 3D que foi materializado recorrendo a
técnicas de protipagem rápida.
Isa Cristina Teixeira Santos 6
Introdução à Dissertação
Foi criada uma aplicação gráfica para a aquisição e análise do movimento
mandibular 3D, e para que ela funcionasse de forma o mais adequada possível foi
necessário utilizar redes neuronais.
Uma vez que foi ponderada a comercialização do sistema protótipo foram
estimados custos de produção, e foram indicados os procedimentos necessários
para a comercialização.
Isa Cristina Teixeira Santos 7
2. Introdução à Anatomia Dentária
Introdução à Anatomia Dentária
2.1: Articulação temporomandibular
A articulação temporomandibular faz a ligação entre o osso temporal e a
mandíbula; mais precisamente, entre o côndilo da mandíbula, a eminência
articular e a fossa do osso temporal, Figura 2.1.
Figura 2.1: Articulação temporomandibular (imagem adaptada de [Moore, 1999]).
Esta articulação é constituída por ossos, a porção anterior da fossa mandibular,
a eminência articular do osso temporal e o côndilo da mandíbula, ligamentos, disco
articular e membrana sinovial. As superfícies funcionais do côndilo (a face anterior)
e da eminência articular (a inclinação posterior) estão cobertas por uma camada de
tecido fibroso. Entre o côndilo e o osso temporal, encontra-se o disco articular.
O disco articular [Williams, 1995], uma lâmina oval de tecido fibroso com uma
forma bicôncava, divide a articulação num compartimento superior e outro
inferior. Frequentemente, este disco é incompleto e perfurado de variadas formas.
A sua principal função é permitir o movimento do côndilo reduzindo assim o risco
de trauma: o disco adapta e estabiliza o côndilo em repouso e em movimento,
distribui as pressões por uma área maior, e preenche os espaços vazios de modo a
permitir maior equidade na dinâmica articular.
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Introdução à Anatomia Dentária
A fossa mandibular é uma depressão oval ou oblonga do osso temporal; é
limitada pela eminência articular, pela raiz longitudinal do processo zigomático do
temporal, pela parede anterior do meato acústico externo e pela parte timpânica
do osso temporal. A forma da fossa mandibular corresponde, aproximadamente, às
superfícies posterior e superior da cabeça da mandíbula.
O côndilo é convexo em toda a superfície articular, porém, achatado
posteriormente, apresentando-se com uma saliência arredondada e sendo mais
amplo lateromedialmente do que antero-posteriormente.
Os longos eixos do côndilo estão num plano lateral, e à primeira vista, parecem
estar desalinhados, porque se fossem prolongados encontrar-se-iam num ponto
anterior ao forame magno formando um ângulo de, aproximadamente, 135º [Major,
1987]. O côndilo é perpendicular ao ramo da mandíbula.
2.1.1: Ligamentos
A articulação temporomandibular é um exemplo de uma diartrose1 cujos
movimentos são uma combinação de movimentos de charneira e de deslizamento.
A cápsula fibrosa está inserida nas margens da área articular do osso temporal
e à volta do colo da mandíbula. A articulação tem uma membrana sinovial superior
e outra inferior; a superior, reveste a cápsula e a parte superior do disco enquanto
que a inferior, reveste a parte inferior do disco e a cápsula.
A ligação da mandíbula ao crânio é feita pelos ligamentos temporomandibular
lateral, esfenomandibular e estilomandibular, Figura 2.2.
O ligamento temporomandibular lateral está inserido na parte superior do
zigoma e na face lateral e na parte inferior da margem posterior do colo da
mandíbula. Por sua vez, o ligamento esfenomandibular é uma faixa fina, achatada,
que desce da espinha do osso esfenóide e se alarga para alcançar a língula do
forame da mandíbula; na mecânica da mandíbula, a função deste ligamento é
desprezível. Já o ligamento estilomandibular é um feixe especializado da fáscia
cervical profunda, que se estica do ápice e da face anterior adjacente do processo
estilóide até ao ângulo da mandíbula e à margem posterior. Finalmente, o
ligamento pterigoespinhal estende-se entre a espinha do osso esfenóide e a borda 1 As diartroses são articulações móveis.
Isa Cristina Teixeira Santos 12
Introdução à Anatomia Dentária
posterior da lâmina lateral do processo pterigóideo próximo da extremidade
superior; algumas vezes “ossificado”, ele completa um forame que dá passagem
para os ramos do nervo mandibular para o temporal, masseter e pterigóideo
lateral.
a) b) c)
Figura 2.2: A articulação temporomandibular: a) vista lateral; b) vista medial; c) secção sagital (imagens adaptadas de [Williams, 1995]).
2.1.2: Músculos
Os músculos masseter, temporal e pterigóideos estão directamente
relacionados com os movimentos da mandíbula durante a mastigação, deglutição e
fala, Figura 2.3.
O músculo temporal estende-se “como um leque” a partir da fossa temporal;
ao passar pelo arco zigomático, forma um tendão que se insere na borda anterior e
na superfície mesial do processo coronóide da mandíbula, e ao longo da margem
anterior do ramo. Este músculo apresenta três componentes e parece comportar-se
como se estes componentes fossem distintos e independentes. O temporal é
responsável pela elevação da mandíbula, quando se fecha a boca e se aproximam
os dentes; também está relacionado com os movimentos laterais da trituração e na
retrusão.
Por outro lado, o músculo masseter é um músculo quadrilátero que se estende
do arco zigomático ao ramo da mandíbula. A sua principal função é a elevação da
mandíbula, embora também possa auxiliar na projecção simples; tem um papel
dominante na elevação da mandíbula.
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Introdução à Anatomia Dentária
a) b)
Figura 2.3: a) Músculo temporal esquerdo; b) Músculos pterigóideos esquerdos (imagens de [Williams, 1995]).
Por sua vez, o pterigóideo medial é um espesso músculo quadrilátero que
começa na superfície medial da lâmina lateral do processo pterigóideo do osso
esfenóide e do osso palatino e termina no forame da mandíbula. Este músculo tem
como principais funções elevar e desviar lateralmente a mandíbula, sendo também
activo durante a protrusão2.
Finalmente, o pterigóideo lateral é um músculo curto e espesso com uma
cabeça superior proveniente da superfície infratemporal e da crista da asa maior
do osso esfenóide, e uma cabeça inferior proveniente da face lateral da lâmina
lateral do processo pterigóideo. A função principal deste músculo é a projecção do
côndilo, enquanto dirige o disco para a frente. O músculo pterigóideo parece
relacionar-se com todos os graus do movimento de projecção e de abertura da
mandíbula. Durante os movimentos de lateralidade, este músculo é auxiliado pelos
músculos masseter, pterigóideo médio e temporal.
A inserção do músculo digástrico faz-se próximo da margem inferior da
mandíbula e próximo da linha mediana. Existe um tendão, entre os seus ventres
anterior e posterior, que está fixo por uma fita de tecido conjuntivo ao osso hióide.
O ventre anterior está recoberto pelo músculo platisma e, abaixo, encontra-se o
músculo milo-hióideo. A zona anterior do digástrico, junto com outros músculos
supra-hióideos e com o músculo pterigóideo lateral, relaciona-se com a descida da
mandíbula, sendo mais proeminente no fim da descida mandibular.
2 A protrusão é o movimento de avanço da mandíbula.
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Introdução à Anatomia Dentária
Os dois músculos genioióideos dirigem-se para baixo e para trás, a partir das
bordas milo-hióideas, no lado lingual da mandíbula e inserem-se no osso hióide. A
função destes músculos é semelhante àquela dos músculos digástricos, na descida e
retracção3 da mandíbula. Estes músculos também elevam o osso hióide durante a
deglutição.
2.2: Movimentos
A mandíbula pode ser descida ou elevada, protruída ou retruída, e pode rodar
em torno de um eixo horizontal; apesar de ambas as articulações agirem juntas, o
movimento de cada uma pode deferir ao longo de um movimento real. Estas acções
envolvem movimentos de charneira (rotação), movimentos de deslizamento e
movimentos de translação.
As posições básicas da mandíbula são: oclusão cêntrica (OC) ou posição
intercuspídica (PI), relação cêntrica (RC) ou posição de contacto retrusiva e posição
de repouso (PR).
A oclusão cêntrica, é definida como a máxima intercuspidação dos dentes;
também pode ser chamada de oclusão central, posição intercuspidiana, posição
dentária, cêntrica adquirida ou cêntrica habitual. Nesta posição, as cúspides dos
dentes inferiores e superiores interrelacionam-se de forma máxima.
A relação cêntrica corresponde à trajectória de abertura e de fecho sem
translação das cabeças da mandíbula, na qual os côndilos estão em posição mais
superior e medial na fossa mandibular.
Na posição de repouso, os dentes superiores e inferiores estão ligeiramente
afastados. Esta posição é uma posição postural da mandíbula determinada
amplamente pela actividade neuromuscular e, em menor grau, pelas propriedades
visco elásticas dos músculos. Muitos factores, como a tensão emocional e factores
periféricos (como dores de dentes) influenciam esta posição impedindo de ser
utilizada como referência para transferir as relações da mandíbula a um
3 A retracção é o movimento de recuo da mandíbula.
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Introdução à Anatomia Dentária
articulador4. A posição de repouso está relacionada com o espaço interoclusal: esta
distância, com a madibula na posição de repouso e cabeça na posição vertical, é de
cerca de 1 a 3 mm nos incisivos, com uma variação normal considerável de 8 a 10
mm (sem evidência de disfunção) [Major, 1987].
A Figura 2.4, mostra os movimentos dos côndilos num ciclo completo de
abertura e de fecho da boca. A partir da posição de repouso, quando se abre a
boca, os côndilos giram sobre um eixo horizontal comum e deslizam para a frente e
para baixo sobre as faces inferiores dos seus discos articulares. Por sua vez, estes
discos deslizam na mesma direcção sobre os ossos temporais, devido às suas
inserções nas cabeças das mandíbulas e à contracção dos músculos pterigóideos
laterais puxando as referidas cabeças e discos para os tubérculos articulares. O
deslizamento do disco termina quando as suas inserções fibroelásticas posteriores
nos ossos temporais são esticadas até ao limite. O basculamento e deslizamento
ulteriores colocam-nos em articulação com as partes mais anteriores dos discos à
medida que a boca se abre totalmente. No fecho, os movimentos são invertidos:
cada cabeça desliza para trás e báscula sobre o disco respectivo, ainda sustentado
pelo músculo pterigóideo lateral que relaxa para permitir ao disco deslizar para
trás e para cima na fossa mandibular.
O trajecto efectuado pelos eixos de rotação transcraniais dos cônilos aquando
da abertura da mandíbula chama-se guia condilar e pode ser medido apartir do
plano Frankfurt (orbital ao tragos)5.
Usando equipamento específico, tal como pantógrafos ou cinesiógrafos é
possível registar os movimentos da mandíbula em relação a um plano de referência
(plano sagital ou médio, horizontal e frontal). Assim, traçando a trajectória
descrita pelo ponto incisivo, localizado nas margens incisais dos dois incisivos
centrais inferiores, no movimento máximo de lateralidade e de protrusão, no
movimento retrusivo e no movimento máximo de abertura, é possível definir os
movimentos bordejantes ou de “envelope”. Todos os movimentos funcionais e
parafuncionais ocorrem durante esses movimentos, [Major, 1987; Koolstra, 2001].
4 O articulador é um instrumento onde são montados os moldes dos dentes que é utilizado para reproduzir
as relações entre a mandíbula e o maxilar. Estas relações são registadas recorrendo a um arco facial, [Ogden, 1995].
5 O plano Frankfurt é um plano que passa pelo ponto mais baixo da orbital esquerda e pelo ponto mais alto de cada uma das margens externas do meato auditivo, [Ogden, 1995].
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Figura 2.4: Modificações das relações do côndilo da mandíbula, o disco articular
e a face articular do osso temporal durante uma abertura completa (A>D) e fecho (D>A) do ciclo da boca (imagem de [Williams, 1995]).
A Figura 2.5 ilustra os movimentos bordejantes mandibulares registados no
plano sagital. Se a mandíbula for mantida para trás e para cima, pode ser traçado
um movimento de bisagra para os incisivos inferiores, de CR para B (uma distância
de cerca de 1 mm, mais raramente entre 2 a 3 mm [Major, 1987]). Este
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Introdução à Anatomia Dentária
movimento, chamado de movimento de bisagra terminal da mandíbula6, mantém
um eixo de rotação estacionário, C, através das duas articulações
temporomandibulares geralmente localizadas nos côndilos. Esta posição denota o
intervalo funcional posterior da mandíbula, e tem sido definida como a posição
mais posterior da mandíbula a partir da qual podem ser realizados
confortavelmente os movimentos de abertura e de lateralidade.
Eixo de rotação
Eixo de rotação e fecho
D
Figura 2.5: Representação esquemática do movimento mandibular bordejante no plano sagital: CR - relação cêntrica; CO - oclusão cêntrica; F - protrusão máxima; PR - posição de repouso;
E - abertura máxima; B e CR - abertura e fecho sobre o eixo de rotação, sem mudança no raio (r) (imagem adaptada de [Major, 1987]).
Em condições fisiológicas normais do sistema mastigador, este centro de
rotação e o trajecto dos movimentos mandibulares são constantes e reprodutíveis,
desde que os côndilos assentem contra o menisco no fundo da fossa glenóide.
Quando se tenta abrir a mandíbula em trajecto retrusivo, Figura 2.5, abaixo de
B, o eixo de rotação passa para D, ligeiramente atrás do forame mandibular, os
côndilos movem-se para baixo e para a frente e o ponto incisivo move-se para E.
Naturalmente, o movimento realiza-se ainda ao redor do eixo intercondilar, que
continua o seu movimento para baixo e para a frente. O fecho com a mandíbula
numa posição para a frente, ou protrusiva, segue o trajecto de E para F, enquanto
que o côndilo localiza-se sobre o tubérculo articular. Quando os dentes posteriores 6 Este movimento também pode ser chamado de relação central, posição de bisagra terminal, posição de
contacto retruído ou de posição ligamentosa (por ser determinado pelos ligamentos e pela estruturas da articulação temporomandibular).
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entram em contacto, o fecho protrusivo interrompesse em F. O trajecto de F para
CO, com os dentes ainda em contacto, é determinado pela relação oclusal entre os
dentes de ambos os arcos. A posição de CO, isto é, fecho completo, é determinada
pela intercuspidação máxima dos dentes.
O trajecto entre as posições CR e CO da Figura 2.5, ou o movimento cêntrica
em deslize, é realizado quando os dentes entram em contacto em relação central
(CR) e as maxilas deslizam conjuntamente em oclusão central (CO). O deslizamento
é frequentemente uma combinação de movimentos para a frente e para os lados.
A partir da posição de repouso, PR da Figura 2.5, quando se abre a mandíbula,
o ponto incisivo segue o trajecto de R para E, e o côndilo move-se para a frente e
para baixo, com um centro de rotação próximo de D. Com o toque entre dentes
superiores e inferiores, em ligeiro contacto inicial a partir de R, é atingida uma
posição próxima de CO; entretanto, o contacto inicial depende da postura devido à
“memória muscular” dos contactos oclusais e ao equilíbrio muscular.
A Figura 2.6 ilustra os movimentos mandibulares no plano horizontal quando os
dentes não estão em oclusão. Os movimentos bordejantes para o ponto incisivo
podem ser esboçados por um traçado de arco gótico, ou traçado de Gyst, que pode
ser registado em vários graus de abertura. Com a mandíbula na posição de bisagra
estacionária ou relação central, o ponto CR corresponde à relação central. À
medida que a mandíbula se move em movimentos de lateralidade retrusiva, o
ponto incisivo registra a linha de CR para RL. A partir de RL, a mandíbula pode ser
movimentada para a frente e medialmente ao ponto P. Um traçado semelhante
pode ser realizado considerado o outro lado, de CR para LL.
O deslocamento lateral da mandíbula, chamado movimento de Bennett, é
medido pela distância com que se move o côndilo do lado de trabalho, de C para W
na Figura 2.6. O côndilo oposto move-se para baixo, para a frente e para dentro, e
realiza um ângulo (BG)7 com o plano mediano, quando projectado
perpendicularmente sobre o plano horizontal. O movimento lateral pode ter
componentes imediatos, bem como componentes progressivos. No lado de
trabalho, o côndilo em rotação pode mover-se lateralmente de C para W cerca de 3
mm [Major, 1987]. O movimento lateral pode ter um componente retrusivo ou
7 Este ângulo (BG) é chamado ângulo de Bennet.
Isa Cristina Teixeira Santos 19
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protrusivo, ou mover-se rectilínea e lateralmente. O movimento pode terminar em
qualquer ponto num triângulo de 60 graus.
Figura 2.6: Movimento lateral direito da mandíbula, com representação esquemática do movimento
no ponto incisivo no plano horizontal (CR, LL, P, RL) e na cabeça da mandíbula (W, C, B, P): CR - relação cêntrica; LL - lateral esquerda; P - protrusiva; RL - lateral direita; CO - oclusão
cêntrica; BG – ângulo de Bennett; de C a P - movimento protrusivo (imagem de [Major, 1987]).
Os modelos de movimentos mandibulares registados no plano frontal, Figura
2.7, variam grandemente com o tipo de relações de contacto oclusal. Com oclusões
excelentes e com movimentos mastigatórios desinibidos, o ciclo mastigatório tem
uma forma razoavelmente uniforme do tipo oval larga. No ciclo mastigatório, o
retorno ou a abertura a partir da oclusão central é muito irregular e pode mesmo
inverter-se próximo ao trajecto do golpe de fecho. Mais comum em pessoas com
liberdade irrestrita de movimentos de contacto oclusal é um trajecto suave não
cruzado de movimentos, que retorna muito proximamente à mesma posição
fechada para todo o golpe mastigador. O contacto oclusal durante a mastigação
ocorre quase invariavelmente em oclusão central, mas na maioria dos ciclos
Isa Cristina Teixeira Santos 20
Introdução à Anatomia Dentária
existem contactos oclusais para parte do movimento de fecho e mesmo,
ocasionalmente, no movimento de abertura.
Figura 2.7: Figura de Posselt no plano frontal
(imagem de [Weingärtner, 1997]).
O movimento máximo de abertura é de 50 a 60 mm, dependendo da idade e do
tamanho do indivíduo, entretanto um limite de 40 mm pode ser normal. O
movimento de lateralidade máxima, na ausência de problemas na articulação e
sem dor, é cerca de 10 a 12 mm.
2.3: Oclusão
Nos dicionários, oclusão refere-se ao acto ou efeito de fechar, encerramento.
Em Medicina Dentária, os conceitos de oclusão variam com a especialidade. Comum
a muitas delas é a definição de oclusão estática, na qual os dentes superiores, por
intermédio de zonas específicas, contactam com os dentes inferiores.
2.3.1: Desenvolvimento da oclusão
Os dentes decíduos ou de leite, Figura 2.8, irrompem, geralmente, numa
sequência de anterior para posterior; isto é, na ordem incisivos, caninos e molares,
Tabela 2.1. O período de erupção destes dentes é devido, em grande parte, à
hereditariedade e, em pequena parte, a factores ambientais. O desenvolvimento e
Isa Cristina Teixeira Santos 21
Introdução à Anatomia Dentária
a erupção dos dentes de leite são quase independentes do desenvolvimento e
maturação da criança como um todo. No entanto, o significado de factores
ambientais locais no desenvolvimento da oclusão, considerada no seu sentido
amplo, é relativamente desconhecido. Assim, a aprendizagem da mastigação pode
ser bastante dependente do estágio de desenvolvimento da oclusão (tipo e número
de dentes presentes), da maturação do sistema neuromuscular e de outros factores
como o regime alimentar.
Figura 2.8: Dentição de leite (imagens adaptadas de [ADMT, 2005]).
Tabela 2.1: Dentição de leite (dados de [Moore, 1999]).
Incisivo médio
Incisivolateral Canino 1º molar 2º molar
Erupção (meses) 6 a 8 8 a 10 16 a 20 12 a 16 20 a 24
Queda (anos) 6 a 7 7 a 8 10 a 12 9 a 11 10 a 12
A forma do arco primário é do tipo oval e a sua largura é estabelecida aos 9
meses de idade, tanto para a dentição de leite como para a permanente [Major,
1987]. Esta afirmação é algo surpreendente quando se compara a face de uma
criança com a de um jovem adulto, mas o que sucede é o aumento da dimensão
antero-posterior dos maxilares para a integração dos molares permanentes.
A posição dos dentes de leite nos arcos mostra, em geral, um certo
espaçamento interdental que tende a desaparecer com a erupção dos dentes
definitivos.
A sequência de erupção dos dentes permanentes varia mais do que a decídua e
não segue o mesmo padrão antero-posterior, Figura 2.9, Tabela 2.2. Além disso, há
diferenças significativas na sequência de erupção dos dentes superiores e inferiores
Isa Cristina Teixeira Santos 22
Introdução à Anatomia Dentária
que não aparece na dentição primária. A sequência de erupção dos dentes
permanentes pode então variar, sendo a apresentada na Figura 2.10 a ideal para a
prevenção da maloclusão8. No caso dos segundos molares irromperem antes dos
pré-molares estarem completamente erupcionados, dá-se um encurtamento
significativo do perímetro do arco que vai dar origem a maloclusão, mesmo que as
dimensões do arco alveolar sejam adequadas para o tamanho da dentição
permanente.
Figura 2.9: Dentição definitiva (imagem adaptada de [ADMT, 2005]).
Tabela 2.2: Dentição definitiva (dados de [Moore, 1999]).
Incisivo médio
Incisivo laterais Canino 1º pré-
molar 2º pré-molar
1º molar
2º molar
3º molar
Erupção (anos) 7 a 8 8 a 9 10 a 12 10 a 11 11 a 12 6 a 7 12 13 a 25
No caso da dentição permanente, também os dentes inferiores irrompem antes
dos superiores. Esta tendência inverte-se em relação aos pré-molares, devido à
diferença no período de erupção dos caninos em ambos os arcos. Assim, no arco
inferior e superior o canino irrompe antes do pré-molar.
8 A maloclusão pode ser definida como qualquer desvio da oclusão normal (tanto do ponto de vista
morfológico como do funcional). Este termo também se pode referir a uma oclusão instável.
Isa Cristina Teixeira Santos 23
Introdução à Anatomia Dentária
Figura 2.10: Sequência eruptiva favorável dos dentes
permanentes (imagem de [Major, 1987]).
Uma parte importante do arco dental no desenvolvimento da oclusão dos
dentes permanentes é o segmento pré-molar. Nesse segmento, os dentes pré-
molares apresentam dimensões mésio-distais significativamente menores do que os
molares primários que lhe substituem. A dinâmica desta modificação nas dimensões
do arco, particularmente no arco inferior, é importante para uma correcta
compreensão do desenvolvimento da oclusão e da maloclusão.
Um ponto complexo na análise da dentição mista é a diminuição do perímetro
do arco durante o crescimento da mandíbula. O perímetro do arco da dentição
permanente, medido a partir da face mesial dos primeiros molares inferiores,
diminui em média cerca de 4 mm. Isto ocorre ao mesmo tempo que a mandíbula e
o osso basal verificam um crescimento posterior significativo. Devido a essa
mudança ser observada em maior extensão na mandíbula do que na maxila, e
devido ao facto dos molares inferiores apresentarem uma acentuada tendência
para o desvio mesial, as relações oclusais estão activas durante os últimos estágios
da dentição mista. Parte do espaço que se torna disponível pelo “espaço
compensatório”9 deve ser utilizado para o alinhamento dos incisivos inferiores uma
vez que esses dentes irrompem com uma média de 1,6 mm de apinhamento. O
espaço remanescente será utilizado pelos molares inferiores. Esse movimento do
molar inferior corrige uma relação molar normal na dentição mista e na relação
molar normal na dentição permanente; isto é, a cúspide mésio-vestibular do
primeiro molar superior oclui na fossa central do primeiro molar inferior (relação
molar classe I de Angle).
9 O espaço compensatório é a diferença em tamanho entre os pré-molares e os molares decíduos.
Isa Cristina Teixeira Santos 24
Introdução à Anatomia Dentária
2.3.2: Forma do arco dental
Os dentes superiores, bem como os inferiores, estão posicionados de tal modo
a formar um arco quando visto por oclusal10. Este arco é, em grande parte,
determinado pela forma do osso basal. De um modo geral, as más posições dos
dentes não alteram a forma do arco, mas se vários dentes estão mal posicionados,
podem-se verificar irregularidades ou assimetrias.
A forma do arco, como é definido pelo centróide dos dentes (centro da forma
oclusal), é uma curva parabólica. A forma foi descrita como sendo um segmento de
elipse, mas existem variações em forma de “U” (forma quadrada) e cónica. O arco
cónico, geralmente, aparece no arco superior como consequência de um
estreitamento patológico da porção anterior do palato pelo hábito de “chuchar no
dedo”.
As modificações na forma do arco dental, dentro de limites anatómicos, não
têm efeito significativo na oclusão. A forma do arco maxilar tende a ser mais larga
do que na mandíbula, ocasionando uma passagem dos dentes superiores sobre os
inferiores, quando em oclusão cêntrica (posição da máxima intercuspidação).
Esta relação do arco dental tem a vantagem de, durante a abertura e fecho da
boca, as bochechas, os lábios e a língua terem menos probabilidades de serem
mordidos. Uma vista lateral ou antero-posterior dessa ultrapassagem é designada
de sobressaliência.
Apesar da forma geral do arco dental poder ser elíptica, as superfícies
vestibulares não estão todas no contorno da elipse. Certos dentes (nomeadamente,
o incisivo lateral superior, os caninos superior e inferior e o primeiro molar
superior), devido ao seu tamanho ou forma, estão posicionados ligeiramente para
vestibular ou lingual da elipse ideal (em “U” ou segundo a forma cónica).
Os incisivos superiores estão posicionados de tal modo que as suas faces
linguais e dos caninos descrevem uma curva suave. Devido à menor espessura
vestíbulo-lingual dos incisivos laterais superiores, a face vestibular dos mesmos
está mais lingualmente colocada. A maior dimensão vestíbulo-lingual dos caninos
coloca a sua face vestibular em posição mais saliente, em relação a uma elipse
ideal, do que qualquer incisivo.
10 Visto lateralmente com os dentes fechados.
Isa Cristina Teixeira Santos 25
Introdução à Anatomia Dentária
A face vestibular do primeiro molar superior está localizada vestibularmente
em relação à elíptica ideal, devido à largura vestíbulo-lingual desse dente. Essa
face é também bastante mais angulada com a face disto-vestibular mais lingual do
que com a médio-vestibular, permitindo assim à cúspide distovestibular uma
oclusão mais marcada com o primeiro molar inferior.
A estabilidade da oclusão e a manutenção das posições dos dentes dependem
das forças que agem sobre os mesmos. Forças oclusais, forças eruptivas, forças dos
lábios, das bochechas e da língua, estão todas envolvidas na manutenção da
posição dos dentes e enquanto estão equilibradas, os dentes e a oclusão
permanecem estáveis. Modificação na magnitude, duração ou na frequência numa
destas forças originam a perda de estabilidade e o desvio dos dentes com
consequente quebra duma oclusão previamente estável.
2.3.3: Ângulos cuspídeos, cúspides guias, planos e curvas oclusais
imaginários
O ângulo cuspídeo é formado pelas vertentes de uma cúspide que têm
intersecção com um plano que passa pela ponta da cúspide e que é perpendicular à
bissectriz da cúspide.
As cúspides maxilares vestibulares e mandibulares linguais são chamadas
cúspides guias. Os planos oclusais internos que se dirigem para essas cúspides são
chamados de planos inclinados guias, porque, nos movimentos de contacto, guiam
as cúspides de suporte para fora da linha média. Existem, assim, os planos
inclinados vestíbulo-oclusais11 dos dentes maxilares posteriores, e os planos
inclinados ocluso-linguais12 dos dentes posteriores inferiores.
Um plano de oclusão é um plano imaginário que contém as bordas incisais dos
incisivos centrais inferiores e a ponta das cúspides distovestibulares dos segundos
molares inferiores.
As superfícies oclusais dos arcos dentais geralmente adaptam-se a superfícies
curvas. O arco mandibular normalmente adapta-se a uma ou mais superfícies
11 Planos inclinados linguais das cúspides vestibulares. 12 Planos inclinados vestibulares das cúspides linguais.
Isa Cristina Teixeira Santos 26
Introdução à Anatomia Dentária
aparentemente côncavas, enquanto que o arco oposto apresenta uma curvatura
aparentemente convexa.
Von Spee [Major, 1987] notou que as cúspides e a margem incisal dos dentes,
quando observados lateralmente, tendem a alinhar-se de maneira curva. Esta
curva, que está dentro do plano sagital, é conhecida como curva de Spee, Figura
2.11, e é determinada pela inclinação mesio distal dos dentes póstero inferiores.
Quando a curva de Spee é demasiado pronunciada pode indicar que existem
obstáculos que impedem os movimentos funcionais.
Figura 2.11: Curva de Spee (imagem de [Bastos, 2000]).
As pontas das cúspides de molares, projectadas no plano frontal, formam a
curva de Wilson, Figura 2.12. Esta curva modifica-se do primeiro para o terceiro
molares com o desgaste da dentição. A curva de Wilson nos primeiros molares
inferiores é côncava para os dentes inferiores, numa dentição sem desgaste, mas
torna-se convexa numa dentição desgastada. Já uma curva harmoniosa indica que a
movimentação lateral é suave.
A extensão da curva de Spee e da curva de Wilson a todas as cúspides e bordas
incisais revela a curva de Monson.
2.3.4: Angulação dos eixos dos dentes
O conhecimento da angulação dos eixos dos dentes, Figura 2.13, revela-se de
grande importância para a estabilidade oclusal. Apesar de não existirem regras
Isa Cristina Teixeira Santos 27
Introdução à Anatomia Dentária
absolutas para descrever as relações axiais dos dentes superiores e inferiores em
oclusão cêntrica, sabe-se que cada dente está colocado no ângulo que melhor
resiste às linhas de força incidentes durante a função do mesmo.
Figura 2.12: Curva de Wilson (imagem de [Bastos, 2000]).
Figura 2.13: Angulação dos eixos dos dentes: A – incisivos; B – primeiro pré-molar; C – segundo pré-
molar; D – primeiro molar; E – segundo molar; F – terceiro molar (imagem de [Major, 1987]).
Os eixos dos dentes incisivos formam com o plano horizontal um ângulo de
cerca de 60º e um ângulo mais agudo com os dentes inferiores. Os caninos estão
localizados de tal modo, que os seus eixos são menos agudos seguidos pelos
primeiros pré-molares que se assemelham aos caninos na forma de se
posicionarem. Os eixos dos segundos pré-molares e dos primeiros molares
superiores são quase paralelos ao plano horizontal. Os segundos e terceiros molares
inferiores formam com a horizontal ângulos ligeiramente mais agudos que o eixo do
primeiro molar.
Isa Cristina Teixeira Santos 28
Introdução à Anatomia Dentária
2.3.5: Forma funcional dos dentes
Quando os dentes de um arco entram em contacto oclusal com os seus
antagonistas durante os vários movimentos mandibulares, faces curvas, que podem
ser côncavas ou convexas, contactam-se. Uma face convexa, representando um
segmento do terço oclusal de um dente, pode entrar em contacto com um
segmento convexo ou côncavo de outro dente; no entanto, são sempre segmentos
curvos que entram em contacto, Figura 2.14.
Figura 2.14: Os terços incisal e oclusal da coroa dental apresentam
superfícies côncavas ou convexas em todas as áreas de contacto oclusal (imagem de [Major, 1987]).
A face lingual dos incisivos superiores apresenta uma certa superfície côncava,
onde a zona convexa da margem incisal dos incisivos inferiores entra em contacto
oclusal.
O contacto oclusal das cúspides, cristas marginais e sulcos dos dentes
posteriores multicuspidados podem ser traduzidos pelos desenhos esquemáticos da
Figura 2.15.
Embora os dentes em oclusão cêntrica pareçam intercuspidar intimamente,
verifica-se que existem escapes. Estes escapes, que podem atingir alguns
milímetros [Major, 1987], são necessários para que a oclusão seja eficiente durante
a mastigação.
As zonas de escape surgem em consequência das formas das cúspides, dos
sulcos e dos espaços interdentais, ou ameias quando os dentes ocluem, e são
alteradas quando a relação oclusal é modificada.
Isa Cristina Teixeira Santos 29
Introdução à Anatomia Dentária
Figura 2.15: A - Desenho esquemático da face mesial das coroas dos primeiros molares superiores e inferiores em relação cêntrica (foram colocados círculos dentro dos contornos das formas cuspídeas
para enfatizar as curvaturas); B - Esquema das relações de contacto em dentes não desgastados; C - Modificação nas relações de contacto oclusal com o desgaste (imagem de [Major, 1987]).
2.3.6: Contacto oclusal
Uma vista vestibular de uma dentadura normal em oclusão cêntrica mostra que
cada dente de um arco oclui com porções de dois dentes do arco oposto, Figura
2.16, com excepção do incisivo central inferior e do terceiro molar superior. Cada
uma das excepções apresenta somente um antagonista no arco oposto. Tal serve
para equilibrar as forças de impacto na oclusão, distribuir o trabalho e auxiliar na
preservação da integridade da dentadura no caso da perda de um dente.
Figura 2.16: Relações vestibulares dos dentes nos arcos
opostos (imagem de [Bodin, 2004]).
A permanência da forma do arco depende do suporte mútuo dos dentes em
contacto. Em caso de perda de um dente, os restantes tendem a ocupar o seu
espaço de modo a preencher o vazio, conduzindo a uma perturbação das relações
de contacto.
Isa Cristina Teixeira Santos 30
Introdução à Anatomia Dentária
Os arcos dentais formados por pares de dentes, um direito e outro esquerdo,
iniciam-se na linha mediana. Cada par é constituído por dois dentes semelhantes
em forma e dimensão, mas, uma vez que um é direito e o outro esquerdo, a forma
de contorno inverte-se de um lado e do outro, para acomodar a situação. Os
incisivos centrais só estão em contacto um com o outro na linha mediana; os outros
pares estão distais aos centrais e o representante de cada par estará à direita ou à
esquerda e em contacto em ambos os lados, com os representantes de outros
pares. Cada arco é simétrico bilateralmente ocorrendo a divisão em metade na
linha mediana.
O arco mandibular é mais estreito do que o arco maxilar, quando medido nas
faces vestibulares dos dentes posteriores. Esta relação é consequência das
diferenças na largura mésio-distal entre os dentes anteriores superiores e inferiores
(em particular os incisivos), e da projecção lingual das coroas dos dentes
posteriores inferiores.
O trespasse horizontal (sobressaliência) dos dentes é a característica na qual a
crista incisal ou crista da cúspide vestibular dos dentes superiores, se estende
vestibularmente à crista incisal, ou crista da cúspide vestibular dos dentes
inferiores, quando os dentes estão em relação de oclusão cêntrica, Figura 2.17.
O trespasse vertical (sobremordida) dos dentes é a característica na qual a
crista incisal dos dentes anteriores e superiores, estende-se abaixo da crista incisal
dos dentes anteriores inferiores, quando os dentes estão em relação de oclusão
cêntrica, Figura 2.17. A presença do trespasse horizontal nos molares previne a
mordida da bochecha.
As cúspides linguais dos dentes posteriores superiores e as cúspides
vestibulares dos dentes posteriores inferiores são as cúspides de suporte. Os pontos
cêntricos são as áreas de contacto que uma cúspide de suporte estabelece com os
dentes oponentes. A Figura 2.18, apresenta uma representação esquemática de
todos os pontos cêntricos.
As relações de contacto oclusal fora da oclusão cêntrica envolvem todos os
movimentos mandibulares possíveis localizados dentro dos movimentos
bordejantes. Esses movimentos são geralmente denominados por movimentos
lateral, lateral protrusivo, protrusivo e retrusivo. Os movimentos lateral e lateral
protrusivo, podem dar-se tanto para a direita como para a esquerda. Quando se
Isa Cristina Teixeira Santos 31
Introdução à Anatomia Dentária
fala em movimento lateral, frequentemente exclui-se o movimento protrusivo
lateral e os movimentos básicos são reduzidos ao movimento lateral direito e
esquerdo (movimentos de protrusão e retrusão).
Figura 2.17: Sobressaliência e sobremordida
(imagem adaptada de [ADMT, 2005]).
Figura 2.18: Esquema idealizado para todos os contactos das cúspides de suporte
com fossas e cristas marginais dos dentes oponentes: A - arco superior; B - arco inferior (imagem de [Ramfjord, 1984]).
Durante o movimento lateral direito, a mandíbula baixa e os arcos dentais
ficam separados, a mandíbula move-se para a direita e os dentes contactam nos
pontos à direita da oclusão cêntrica no lado de trabalho direito. No lado esquerdo,
denominado lado de balanceio, os dentes podem ou não estar em contacto.
Por outro lado, durante o movimento protrusivo, a mandíbula baixa e move-se
directamente para a frente fazendo com que os dentes anteriores contactem nos
pontos mais favoráveis para a incisão dos alimentos. O movimento protrusivo é
seguido por um movimento retrusivo até à oclusão cêntrica.
Isa Cristina Teixeira Santos 32
Introdução à Anatomia Dentária
Nos movimentos laterais de mastigação, a mandíbula vai para baixo e para a
direita ou para a esquerda em oclusão cêntrica. À medida que o ciclo de
movimento continua e retorna à oclusão cêntrica, as porções vestíbulo-oclusais dos
molares inferiores entram em contacto com as porções oclusais dos molares
superiores, lingualmente ao topo das cúspides vestibulares e em contacto com as
cristas triangulares das vertentes de cada um dos lados, continuando o contacto
deslizante até que a oclusão cêntrica seja completada.
2.4: Resumo
A mandíbula e a articulação temporomandibular formam um complexo sistema
biomecânico. A articulação temporomandibular é constituída por ossos, ligamentos,
disco articular e membrana sinovial e faz a ligação entre a mandíbula e o crânio. A
sua particular construção permite que a mandíbula, se mova segundo seis graus de
liberdade.
Os músculos masseter, temporal e pterigóideos estão directamente
relacionados com os movimentos da mandíbula que pode ser descida ou elevada,
retruída ou potruída e pode rodar em torno de um eixo horizontal.
Para os médicos dentistas, o conhecimento da trajectória 3D do ponto incisivo
projectada nos planos sagital, horizontal e frontal é importante na detecção de
disfunções temporomandibulares. Vários aspectos da oclusão, tais como o seu
desenvolvimento, a forma do arco dental, a forma funcional dos dentes também
podem ser reveladores quanto à existências de problemas ao nível da articulação.
Torna-se assim importante em Medicina Dentária a utilização de dispositivos
que permitam a aquisição e análise do movimento mandibular 3D.
Isa Cristina Teixeira Santos 33
3. Disfunções Temporomandibulares:
Causas e Diagnóstico
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
3.1: Disfunções temporomandibulares
A expressão “disfunções temporomandibulares” (DTM) tem sido usada como um
termo genérico para diagnosticar dores faciais e disfunções maxilares. Apesar de
ser referido como síndrome, actualmente os investigadores apoiam a ideia de que
as DTM sejam um grupo de problemas relacionados com o sistema mastigatório,
anormalidades morfológicas intra-articulares, mialgias, diferentes tipos de
deslocamentos do disco, doenças articulares degenerativas, artrites inflamatórias,
sinusais e condições congénitas e neoplásticas que afectam a articulação
temporomandibular [Crusoe-Rebello, 2003].
A identificação precisa dos sintomas referidos anteriormente permite
classificar as disfunções como articulares e musculares, e o seu correcto
diagnóstico revela-se de grande importância para a definição do plano de
tratamento mais apropriado.
Os problemas temporomandibulares podem-se manifestar através de dores
intensas nas articulações, mialgias nos músculos mastigadores, ruídos articulares e
anomalias na cinemática mandibular [Laplanche, 2002]. A oclusão também pode
ser afectada sendo responsável pelo desgaste excessivo dos dentes ou mesmo pela
perda destes [Weingärtner, 1997, 1998]. Ramfjord [Ramfjord, 1984] acrescenta que
as disfunções podem prejudicar (contínua ou intermitente) a audição e provocar
sensação de falta de ar ou “obturação” nos ouvidos (nos momentos da refeição),
sensação de assobio, vertigem e dor nebulosa dentro e em redor dos ouvidos.
Oliveira [Oliveira, 2003] afirma que dores cervicais também podem ser resultado
destas disfunções.
Os dados actuais [Lapanche, 2002] revelam que não existe um paralelo
anatomo-clinico; isto é, grandes alterações morfológicas não implicam
obrigatoriamente impotência funcional e que não existe um método terapêutico
invasivo (cirurgia, reabilitação oclusal total, etc.) que seja superior aos
tratamentos convencionais. Assim sendo, o tratamento das disfunções passa pela
sedação dos sintomas dolorosos, pelo aumento da mobilidade mandibular, com o
objectivo de melhorar as funções mastigatórias, pela optimização das condições
funcionais (posição dos côndilos, funcionamento neuromuscular, etc.) afim de
Isa Cristina Teixeira Santos 37
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
favorecer a adaptação fisiológica dos tecidos e, finalmente, pela optimização
eventual das funções oclusais, com o objectivo de melhorar o compromisso entre o
decurso da terapia e os benefícios desta.
3.2: Diagnóstico das disfunções temporomandibulares
De modo a evitar diagnósticos imprecisos e tratamentos incorrectos, deve-se
fazer um exame físico ao paciente e estudar a sua história clínica.
Aquando da elaboração da história clínica, o dentista deve ouvir as queixas do
paciente e indagar no sentido de recolher informações pertinentes sobre os
sintomas: é importante saber quando surgiram, o tipo e a distribuição da dor, se a
dor está associada a um tipo de movimento mandibular em particular, à
mastigação, a um determinado momento do dia, ao bruxismo13, etc. Também é
relevante saber se existe alguma restrição ou impedimento dos movimentos
mandibulares, se existem ruídos ou estalos nas articulações temporomandibulares e
se existem sintomas periféricos nas mesmas articulações.
Também devem ser recolhidas informações sobre a existência de artrite ou
reumatismo noutras partes do corpo, mialgias ocupacionais e posturais, tensões
psíquicas ou emocionais, tensão e fadiga físicas e sobre doenças e desordens
sistémicas. O comportamento do paciente durante a elaboração da história clínica
deve ser observado com atenção porque pode ser revelador do seu estado psíquico.
O exame físico deve incluir um exame sistemático da articulação
temporomandibular, da cabeça e do pescoço e algumas observações do corpo todo.
Por vezes, para um correcto diagnóstico das disfunções, pode ser necessário
recorrer a exames radiográficos e a testes terapêuticos.
O médico dentista deve verificar se existe assimetria da face e/ou da cabeça e
outras irregularidades que possam indicar hipertrofia ou atrofia dos músculos,
intumescimento ou lesão traumática.
O padrão do movimento mandibular também pode ser revelador quanto à
existência de disfunção. Os desvios dos movimentos mandibulares podem estar
13 A palavra bruxismo é utilizada, em Medicina Dentária, para designar o ranger e desgaste dos dentes por
propósitos não funcionais.
Isa Cristina Teixeira Santos 38
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
relacionados com interferências oclusais, fracturas, paralisia muscular e distúrbios
na articulação.
A palpação das articulações com os dentes em oclusão e em repouso, com os
movimentos de abertura e fecho da mandíbula é essencial para detectar estalidos.
Assim, deve-se notar se existem ruídos nas articulações, sinais de bruxismo e
hiperactividade muscular.
A análise funcional do sistema mastigatório deve incluir uma tentativa de
localização da relação cêntrica e das interferências oclusais, na relação cêntrica e
no movimento de translacção protusivo e de lateralidade da mandíbula. As facetas
de desgaste sobre os dentes, a mobilidade destes e qualquer indicação traumática
instável ou não equilibrada devem ser anotadas.
O modo de andar e a postura do paciente podem revelar doenças ósseas e
articulares, desordens musculares e doenças do sistema nervoso.
O exame radiográfico é essencial para detectar alterações condilianas,
fracturas ou fracturas cicatrizadas anormalmente, osteoartrite, doenças dos
ouvidos, seios nasais e paranasais, alterações dentárias, doença periodontal,
hiperplasia unilateral do condilo e neoplástica, [Ramfjord, 1984].
A duração do período de silêncio dos músculos masseter e temporal, obtida por
electromiografia14, pode ser útil no diagnóstico da síndrome de disfunção dos
músculos e da articulação.
3.3: Aquisição e análise do movimento mandibular
Segundo Laplanche [Laplanche, 2002] a análise do movimento mandibular é um
elemento importante no diagnóstico do funcionamento do aparelho mastigador
porque as limitações na abertura da boca, os desvios e as deflexões nas trajectórias
mandibulares funcionais são muitas vezes sinais clínicos que testemunham uma
cinemática condiliana perturbada. No entanto, o mesmo autor afirma que mesmo
quando a análise cinemática avalia perfeitamente o grau de impotência ou da
alteração funcional, não é um indicador muito sensível nem especifico do
deslocamento condilano devido a fenómenos de compensação (uma sobre-rotação
14 A electromiografia faz o registro das cargas eléctricas sobre os músculos.
Isa Cristina Teixeira Santos 39
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
condiliana pode permitir uma abertura normal apesar de, por exemplo, existir uma
desunião condilo-discal bilateral permanente), e à ausência da quantificação
precisa dos deslocamentos mandibulares, espaciais e temporais. Esta ideia é
também reforçada por Lewis [Lewis, 2000] e por Petrie [Petrie, 2003].
Actualmente, existem vários dispositivos que permitem fazer a aquisição e a
avaliação do movimento mandibular e condiliano, obtendo os valores necessários
para montar e ajustar correctamente os moldes dos maxilares nos articuladores, de
forma a que estes reproduzam o mais fielmente possível os movimentos
mandibulares dos pacientes em estudo. Tanto os sistemas comerciais correntes
como os dispositivos desenvolvidos à medida, têm exactidão adequada mas são
considerados demasiado caros e de difícil utilização comum, pelo que geralmente o
seu uso se restringe a casos clínicos especiais e aos hospitais universitários [Kinuta,
2003; Petrie, 2003].
Um dos exames mais comuns para analisar o movimento mandibular é a
axiografia. Trata-se de um registro gráfico dos movimentos condilianos: são
registrados e traçados os movimentos do eixo charneira condiliano
simultaneamente nos planos sagital, frontal e horizontal.
Na axiografia mecânica, os traçados são feitos por marcadores, colocados sobre
o eixo charneira15, que se deslocam sobre as placas parasagitais estabilizadas por
um arco pericraniano. Os deslocamentos horizontais são medidos com um
comparador e os valores são depois transpostos para um gráfico. Os traçados são
orientados em relação ao plano axio-orbital (“axio-orbitaire”) e a dois planos
perpendiculares que definem um referencial ortonormal.
Outro exame comum é a condilografia que utiliza o mesmo princípio da
axiografia. Neste exame é realizada uma análise instrumental da cinemática
condiliana recorrendo a um condilógrafo que traça os movimentos do eixo
charneira bicondiliano, simultaneamente nos planos sagital e horizontal, nas placas
sagital e sub-horizontal fixas num arco pericraniano.
A pantografia é um outro método consensual para registar os movimentos
mandibulares, que utiliza pantógrafos para registar os movimentos bordejantes 3D
da mandíbula.
15 O princípio da axiografia reside na supressão da componente de rotação, pelo que os marcadores têm
que ser colocados imperativamente sobre o eixo charneira.
Isa Cristina Teixeira Santos 40
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
Seguidamente, são resumidamente descritos alguns dispositivos comerciais e
desenvolvidos à medida que permitem a análise do movimento mandibular.
3.3.1: Sistema Zebris JMA system
O sistema Jaw Motion Analyzer (JMA) da Zebris Medical GmbH (Alemanha,
[www.zebris.com]) usa ultrasons para registar os movimentos mandibulares, Figura
3.1. O referido sistema é composto por três transmissores, montados num suporte
que é fixo com uma “cola” nos incisivos inferiores, e por quatro receptores
montados num arco facial ajustável à cabeça do paciente. Um computador controla
a emissão dos ultrasons, e mede o tempo gasto desde a emissão até à recepção por
cada um dos receptores; o tempo é então convertido em distância permitindo
determinar a posição dos transmissores em relação ao arco facial. As distâncias são
depois transformadas em três coordenadas cartesianas e em três ângulos de
rotação, constituindo os seis graus de liberdade da posição do centro do
transmissor em relação a um sistema de referência predeterminado. A trajectória é
guardada num ficheiro ASCII e os vários parâmetros (ângulo de Bennett, inclinação
condilar, etc.) são calculados em função do articulador desejado com os
parâmetros obtidos [Enciso, 2002; Hugger, 1999].
Figura 3.1: Sistema Jaw Motion Analyzer (JMA) da Zebris GmbH
(imagem de [Enciso, 2002]).
O utilizador pode escolher e introduzir os pontos de referência no sistema com
a ajuda de um dispositivo apropriado.
Isa Cristina Teixeira Santos 41
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
Hugger [Hugger, 1999] mostrou que os erros de medida deste sistema são
independentes da extensão do movimento; este facto torna o sistema JMA
apropriado para registar movimentos amplos (movimentos bordejantes).
3.3.2: Sistema ARCUSdigma
O sistema ARCUSdigma da Kavo (Alemanha, [www.kavo.com]), derivou do JMA
da Zebris GmbH. Tal como o JMA, o ARCUSdigma mede o tempo que os impulsos de
ultrasons demoram desde os três transmissores colocados num suporte, que é fixo
na mandíbula, até aos quatro receptores montados num arco facial, Figura 3.2.
Figura 3.2: Sistema ARCUSdigma da Kavo
(imagem de [www.kavo.com]).
Para calcular os ângulos sagital e horizontal, essenciais para regular as guias
posteriores do articulador a considerar, é necessário definir um plano em relação
ao qual os movimentos serão registados, Figura 3.3; para tal, tem que se colocar o
suporte inferior alinhado de modo a que os três transmissores fiquem no plano
horizontal e que o eixo mais longo fique alinhado com o plano sagital e registar a
posição da relação cêntrica. O passo seguinte, é o registo dos vários movimentos
mandibulares. O programa computacional que acompanha o ARCUSdigma traça
tangentes às trajectórias e calcula automaticamente os ângulos sagital (inclinação
condiliana) e horizontal (ângulo de Bennett), [Pröschel, 2002]. Com os valores
obtidos é então possível montar os moldes dos dentes no articulador desejado.
Isa Cristina Teixeira Santos 42
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
Enquanto que a maioria dos sistemas procura transferir as diferentes
geometrias craniomandibulares do paciente para os simuladores mecânicos
associados (os já referidos articuladores), este sistema faz o inverso, limitando
assim o uso das medidas obtidas ao articulador produzido pela própria Kavo.
Figura 3.3: Os quatro passos necessários para a aquisição do movimento com o
sistema ARCUSdigma (imagem de [Pröschel, 2002]).
3.3.3: Sistema K7 Evaluation System
O dispositivo K7 Evaluation System da Myotronics (USA,
[www.myotronics.com]), baseia-se na variação de um campo magnético para
registar o movimento da mandíbula. Vários sensores montados num arco facial
leve, Figura 3.4, seguem o rasto de um pequeno íman, com 12 x 6 x 3 mm de
dimensões colado nas gengivas junto aos incisivos inferiores, Figura 3.5. Esta
configuração é vantajosa, pois não interfere nos movimentos realizados pelo
paciente e não dificulta o acesso à cavidade bucal, [Garcia, 2003; Leles, 2003].
Isa Cristina Teixeira Santos 43
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
Figura 3.4: Sistema K7 Evaluation System da Myotronics
(imagem de [Garcia, 2003]).
Figura 3.5: Íman utilizado para detectar o movimento, montado
sobre os incisivos (imagem de [Leles, 2003]).
O sistema K7 é vendido juntamente com um programa computacional que
permite gravar e rever os movimentos adquiridos, mas que não calcula o ângulo de
Bennett nem a inclinação condiliana, Figura 3.6.
Segundo o fabricante, este sistema é virtualmente imune a pequenos
movimentos da cabeça, a objectos metálicos próximos e também a interferências
electrónicas.
3.3.4: Sistemas ópticos
Leader [Leader, 2002] descreve um sistema para adquirir a cinemática
mandibular durante os seus movimentos naturais utilizando um sistema de
coordenadas não ortogonal móvel, Figura 3.7.
No referido sistema, duas câmaras posicionadas ortogonalmente, e a
sensivelmente 75 cm do paciente, registam a trajectória de sete marcadores
Isa Cristina Teixeira Santos 44
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
esféricos, cada um com 10 mm de diâmetro, montados não colinearmente num
suporte adaptável aos incisivos inferiores e de 3 marcadores, cada um com 13 mm
de diâmetro, montados não colinearmente num capacete. Todos os marcadores são
reflectores, e quatro dos sete marcadores montados no suporte inferior são
detectados por ressonância magnética (“magnetic resonance imaging” - MRI).
Figura 3.6: Interface gráfica que acompanha o sistema K7 Evaluation System da Myotronics (imagens de [www.myotronics.com]).
a) b)
Figura 3.7: Paciente sentado no interior do campo de visão das duas câmaras posicionadas ortogonalmente. O paciente usa um suporte com marcadores
inferiores e um capacete de referência (imagem de [Leader, 2002]).
Para captar o movimento, os marcadores são iluminados por led’s vermelhos, e
uma imagem estática do suporte é usada para calcular a orientação entre o
movimento e os marcadores MRI. As coordenadas 2D obtidas pelas duas câmaras são
depois transformadas em coordenadas 3D.
A estereofotogrametria permite determinar a trajectória espacial dos pontos
usando tramas sucessivas duma película. Mesnard [Mesnard, 2003] aplicou esta
Isa Cristina Teixeira Santos 45
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
técnica ao estudo da cinemática da articulação temporomandibular, de modo a
identificar todos os deslocamentos da mandíbula e do sistema do menisco em
relação ao crânio. Três pontos de posicionamento foram associados com a maxila, e
outros três pontos foram associados com a mandíbula; como os tecidos cutâneos
são demasiados móveis, as zonas ósseas em questão são muito pequenas e o uso de
agulhas seria muito doloroso, os pontos são assim definidos em placas que foram
fixas a dois arcos dentais moldados em metil metracrilato, Figura 3.8. A cada
conjunto de pontos foi definido um referencial. Os seis pontos são então adquiridos
por duas câmaras de vídeo previamente calibradas, e as coordenadas dos pontos e
das trajectórias são depois determinadas por um algoritmo computacional
específico.
a) b)
Figura 3.8: Sistema desenvolvido por Mesnard: a) Molde dos dentes do paciente e a calha onde vão ser montados os alvos; b) Alvos “montados” no
paciente (imagens de [Mesnard, 2003]).
A rápida evolução das câmaras de vídeo digital de uso pessoal, permitiram que
Kinuta [Kinuta, 2003] desenvolve-se um outro sistema para o registo do movimento
mandibular, Figura 3.9 e Figura 3.10. Este sistema utiliza apenas uma câmara, um
espelho e um programa computacional para a aquisição de movimento e permite
detectar de modo automático, contínuo e preciso o movimento realizado por vários
marcadores.
Isa Cristina Teixeira Santos 46
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
Figura 3.9: Sistema desenvolvido por Kinuta
(imagem de [Kinuta, 2003]).
Figura 3.10: Imagem obtida pela câmara utilizada
por Kinuta (imagem de [Kinuta, 2003]).
3.4: Resumo
A expressão “disfunções temporomandibulares” (DTM) é usada como um termo
genérico para um grupo de problemas relacionados com o sistema mastigatório,
anormalidades morfológicas intra-articulares, mialgias, diferentes tipos de
deslocamentos do disco, doenças articulares degenerativas, artrites inflamatórias,
sinusais e condições congénitas e neoplásticas, que afectam a articulação
temporomandibular.
Sendo a articulação temporomandibular essencial para morder e mastigar, a
dor é incapacitante e reduz consideravelmente a qualidade de vida de quem a
Isa Cristina Teixeira Santos 47
Disfunções Temporomandibulares: Causas e Diagnóstico
sente. Para um correcto diagnóstico das DTM deve-se fazer um exame físico
cuidado ao paciente e estudar a sua história clínica.
Existem vários sistemas para proceder à aquisição do movimento mandibular
mas são considerados caros e de difícil utilização. Dos sistemas comerciais,
salienta-se o sistema Jaw Motion Analyzer (JMA) da Zebris Medical GmbH e o
sistema ARCUSdigma da Kavo, que utilizam os ultrasons para registar o movimento
mandibular, e o sistema K7 Evaluation System da Myotronics que utiliza sensores
electromagnéticos.
Esta dificuldade de utilização e preço elevado dos sistemas actualmente
existentes, para a aquisição e análise do movimento mandibular 3D, justificam a
tentativa de desenvolvimento de um novo sistema que ultrapasse satisfatoriamente
tais limitações.
Isa Cristina Teixeira Santos 48
4. Introdução ao Desenvolvimento de Produto e
Apresentação do Caso em Estudo
Introdução ao Desenvolvimento de Produto e Apresentação do Caso em Estudo
4.1: Introdução ao Desenvolvimento de Produto
O sucesso económico de uma empresa reside na sua capacidade de identificar
as necessidades dos actuais e potenciais novos clientes, e de desenvolver
rapidamente produtos que satisfaçam essas necessidades e sejam produzidos com o
menor custo possível. Para atingir tais objectivos não basta definir uma boa
estratégia de marketing, um plano de produção cuidado ou ter produtos com um
design arrojado, é preciso ter um processo global de desenvolvimento de produto
que inclua todas estas vertentes de forma integrada.
Pode-se definir “produto” como algo que uma empresa vende aos seus
clientes, e “desenvolvimento de produto” como o conjunto de actividades
necessárias para a sua produção. Neste conjunto de actividades, inclui-se a
detecção de uma oportunidade de mercado, o desenvolvimento de conceitos, a
análise económica, a concepção de desenhos técnicos e modelos, a elaboração de
protótipos e planos de produção, a produção de algumas unidades do produto, o
teste e ensaio, a produção em larga escala, o marketing e a distribuição e venda.
Vários autores (por exemplo Ulrich [Ulrich, 2000], Marxt [Marxt, 2005] e Vajna
[Vajna, 2005]) afirmam que o desenvolvimento do produto é uma actividade
interdisciplinar que requer a participação de (quase) todos os membros de uma
empresa. A organização e o tipo de equipas depende muito das empresas
envolvidas e do tipo de produtos a desenvolver, mas existem três áreas
fundamentais: o marketing, a concepção e desenvolvimento, e a produção.
O marketing é a área responsável pela ligação entre a empresa e os clientes;
são os elementos desta área, que identificam as oportunidades de mercado e as
necessidades dos clientes alvo, definem os segmentos de mercado, realizam a
divulgação da empresa, definem o preço final do produto e são responsáveis pelo
lançamento e pela promoção do mesmo.
O papel da concepção e desenvolvimento, que inclui obviamente o design de
produto, é essencial no desenvolvimento do produto porque define a forma e as
propriedades físicas que melhor respondem às necessidades dos clientes alvo.
Neste contexto, design inclui o design industrial (a estética, a ergonomia e as
Isa Cristina Teixeira Santos 51
Introdução ao Desenvolvimento de Produto e Apresentação do Caso em Estudo
interfaces) e a engenharia (componentes mecânicos, eléctricos, aplicações
computacionais, etc.).
À produção cabe a tarefa de desenvolver e operar o sistema que irá produzir o
produto em causa, e tratar dos processos de compra e de distribuição de todas as
matérias-primas necessárias para tal.
Usualmente, o desenvolvimento de um produto não é um processo rápido, de
baixo custo, nem fácil. De acordo com Ulrich [Ulrich, 2000], a maioria dos produtos
precisam pelo menos de um ano até estarem concluídos, mas existem produtos que
precisam de três, cinco ou mesmo dez anos. Quanto aos custos envolvidos, estes
são obviamente proporcionais ao número de elementos envolvidos na equipa de
concepção e desenvolvimento e ao seu nível técnico, e ao tempo despendido por
estes.
O desenvolvimento de um produto é um verdadeiro desafio: é preciso gerir
sensatamente as relações de compromisso, ser dinâmico na tomada de decisões,
dar atenção aos “mais insignificantes” pormenores, terminar o desenvolvimento em
tempo útil, de modo a satisfazer as necessidades actuais dos clientes, e ter sempre
em atenção o custo final.
O processo de desenvolvimento de um produto é uma sequência de
actividades, na sua maioria intelectuais e organizacionais, que as empresas
utilizam para conceber, desenhar, produzir e comercializar um determinado
produto. Algumas empresas seguem planos de desenvolvimento detalhados,
enquanto outras são incapazes de descrever o seu processo criativo. No entanto,
processos de desenvolvimento de produto bem definidos são preferíveis por
ajudarem a garantir um nível de qualidade adequado, facilitarem a coordenação
entre os diferentes membros da equipa, auxiliarem a planear e gerir correctamente
todas as situações existentes, e por garantirem a existência de um registo
adequado de todas as actividades envolvidas, para que mais tarde seja possível
melhorar o mesmo produto e o seu ciclo de vida e de produção.
A Figura 4.1 ilustra um processo genérico de desenvolvimento de um produto.
Normalmente, este processo é composto por seis fases: planeamento,
desenvolvimento de conceitos, projecto de sistemas, projecto de detalhe, ensaios
e refinamento e, finalmente, o lançamento em produção.
Isa Cristina Teixeira Santos 52
Introdução ao Desenvolvimento de Produto e Apresentação do Caso em Estudo
O planeamento é muitas vezes referido como a “fase 0” de um produto, uma
vez que antecede a aprovação do projecto e o lançamento do desenvolvimento do
mesmo. Esta fase inicia-se com a definição de uma estratégia adequada e a
avaliação da tecnologia envolvida e do mercado alvo. Desta etapa resulta um
documento intitulado “declaração da missão do projecto” (“project mission
statement”) que especifica o mercado alvo, os objectivos do negócio, os
pressupostos assumidos (“key assumptions”) e as restrições.
Planeamento Desenvolvimento de
conceitos Arquitectura do sistema
Projecto de detalhe
Teste e refinamento
Lançamento em produção
Figura 4.1: Processo genérico de desenvolvimento de produto (imagem adaptada de [Ulrich, 2000]).
Durante o desenvolvimento de conceitos, as necessidades do mercado alvo são
identificadas, desenvolvidos e avaliados vários conceitos e um ou mais conceitos
são seleccionados para prosseguir com o desenvolvimento do produto. Neste
contexto, conceito refere-se à descrição da forma, da função e das características
do produto.
O projecto do sistema inclui a definição da arquitectura do produto e a
decomposição deste em subsistemas e nos seus componentes. Também é comum
definir durante esta fase o esquema de produção a adoptar. Geralmente, desta
etapa resulta o desenho (layout) geométrico do produto, a lista de especificações
de cada um dos seus subsistemas, e um diagrama preliminar da sequência de
montagem do produto final.
O projecto de detalhe envolve a especificação completa da geometria do
produto, dos materiais utilizados, das tolerâncias dimensionais e geométricas e das
qualidades superficiais dos componentes que constituem o produto, e identificação
dos componentes que irão ser adquiridos a terceiros. Quando necessário, é durante
Isa Cristina Teixeira Santos 53
Introdução ao Desenvolvimento de Produto e Apresentação do Caso em Estudo
esta etapa que se fabricam os dispositivos e as ferramentas necessárias à produção
interna.
Durante a fase de ensaios, testes e refinamento, constroem-se e avaliam-se
várias pré-produções do produto, geralmente designadas por protótipos.
A derradeira fase no desenvolvimento usual de um produto é o lançamento em
pré-produção. Nesta etapa, o produto é produzido usando-se já o sistema de
produção final. O objectivo principal deste processo é preparar quem vai operar
com o sistema de produção em larga escala e resolver alguns problemas que ainda
possam persistir no ciclo de produção. Os produtos que resultam desta fase muitas
vezes são enviados e testados por alguns consumidores, previamente identificados
como representativos do público-alvo em questão, de forma a detectar algumas
falhas ainda não determinadas.
O produto diz-se lançado quando fica disponível para a sua distribuição em
larga escala.
4.2: Apresentação do caso em estudo: Desenvolvimento de um sistema
protótipo para aquisição e análise do movimento mandibular 3D
4.2.1: Introdução
No caso concreto deste trabalho, o processo de desenvolvimento de um novo
produto começou com a identificação de uma oportunidade: a ideia do
desenvolvimento de um sistema para a aquisição e análise do movimento
mandibular 3D surgiu durante uma conversa com um médico dentista. Assim, foi
durante essa conversa que começaram a ser delineadas as primeiras “necessidades
do cliente”.
Para obter uma oclusão satisfatória é necessário simular correctamente as
articulações temporomandibulares, posicionar correctamente os modelos dentários
produzidos e, usando articuladores apropriados, reproduzir fielmente os
movimentos mandibulares envolvidos do paciente em análise. Para tal, é necessário
conhecer os dados pessoais do referido paciente: o ângulo de Bennett e a
inclinação condilia (ver o segundo capítulo desta Dissertação). Apesar de serem
Isa Cristina Teixeira Santos 54
Introdução ao Desenvolvimento de Produto e Apresentação do Caso em Estudo
importantes, usualmente estes valores são pouco utilizados porque a maioria dos
médicos dentistas possuem nos seus consultórios articuladores simples que usam
valores médios, e assim não podem ser devidamente personalizados ao paciente em
questão.
Para os médicos dentistas é importante conhecer tanto a relação cêntrica16
como os movimentos retruídos. A relação cêntrica merece consideração por ser
facilmente reproduzida nos articuladores, e os movimentos retruídos são essenciais
para calcular os ângulos necessários para montar nos articuladores os modelos dos
maxilares produzidos para um dado paciente.
De um modo geral, o conhecimento da trajectória da mandíbula não é
importante, mas assume um papel de destaque na determinação das relações
oclusais nos desdentados.
Durante a referida conversa com o médico dentista, o facto do equipamento
médico ser bastante dispendioso foi muitas vezes referido, sendo apontado como
um dos motivos principais pelos quais a maioria dos profissionais da área possuírem
equipamento o mais simples possível. Um outro aspecto salientado, foi a
necessidade do equipamento a usar ser cómodo para o paciente e fácil de utilizar
pelo seu operador, para que nenhum destes se sentisse tenso aquando da sua
utilização.
Conhecidas as “necessidades do cliente”, estudou-se a articulação
temporomandibular (segundo capítulo desta Dissertação) e identificaram-se alguns
dos sistemas existentes para a aquisição do movimento mandibular 3D (terceiro
capítulo), só então foram definidas as “especificações do produto” pretendido; ou
seja, as características que o produto a desenvolver deveria cumprir: o sistema
deveria registar a trajectória 3D da mandíbula (do ponto incisivo), permitir
visualizar e analisar graficamente os resultados da aquisição do movimento
envolvido, e fornecer as coordenadas do ponto incisivo em cada instante do
movimento. Finalmente, o produto deveria ser cómodo para o paciente, fácil de
utilizar e ter um preço o mais baixo possível.
16 A relação cêntrica corresponde à trajectória de abertura e de fecho, sem translação das
cabeças da mandíbula na qual os côndilos estão na posição mais superior e medial na fossa mandibular.
Isa Cristina Teixeira Santos 55
Introdução ao Desenvolvimento de Produto e Apresentação do Caso em Estudo
4.2.2: Desenvolvimento do sistema protótipo
O conceito de um produto corresponde a uma descrição aproximada da
tecnologia, do modo de funcionamento e da forma. O processo de geração de
conceitos começa com as necessidades do cliente alvo e as especificações de
produto pretendido e termina com um conjunto de conceitos que os satisfazem,
dentro desse conjunto é seleccionado o conceito a desenvolver.
Neste caso, começou-se por escolher o princípio de funcionamento do sistema
de aquisição a desenvolver, por a sua estrutura de suporte depender fortemente da
tecnologia considerada.
Primeiramente, ponderou-se num sistema de ultra-sons baseado no tempo de
voo; isto é, no tempo que um impulso de ultra-sons demora desde a sua emissão
até à recepção de forma a determinar-se a distância 1D envolvida. Assim, seriam
necessários pelo menos três transmissores e três receptores montados em suportes
adequados, sendo um destes suportes solidário com a mandíbula. O suporte móvel,
mesmo sendo leve, devido às dimensões físicas que deveria ter (impostas pelos
sensores), poderia distrair o paciente aquando do processo de medição. No
entanto, este sistema seria de fácil utilização e a exactidão obtida estaria
dependente da qualidade dos sensores usados.
O movimento mandibular também podia ser registado recorrendo a câmaras de
vídeo. Assim, por exemplo, duas câmaras montadas adequadamente registariam a
trajectória 3D de várias marcas colocadas na face do paciente. Esta seria uma
solução fácil e cómoda para o paciente, mas difícil para o operador porque existem
vários factores externos que interferem na calibração das câmaras e no pós-
processamento dos dados adquiridos; como por exemplo, condições de iluminação,
distâncias envolvidas, fundos complexos, etc.
Seguidamente, os LVDT’s (“linear variable differential transducer”) foram
também considerados, mas foram rapidamente excluídos por um dos seus
constituintes ter de ser solidário com o movimento pretendido. Também se
ponderou a possibilidade de usar alguns sistemas mecânicos de medição, mas todos
eles se mostraram demasiado complicados de usar.
Os sensores electromagnéticos registam campos magnéticos. Actualmente, são
utilizados nas mais variadas aplicações reais devido ao seu tamanho reduzido,
Isa Cristina Teixeira Santos 56
Introdução ao Desenvolvimento de Produto e Apresentação do Caso em Estudo
consumo diminuto e preço relativamente baixo. Este foi o tipo de sensores
escolhido para registar o movimento mandibular 3D pretendido, porque permite
efectuar as medições envolvidas sem contacto (logo sem interferir no movimento) e
conceber um sistema de aquisição leve, cómodo para o paciente e fácil de operar
pelo médico dentista.
O campo magnético a ser medido pelos sensores é criado por um pequeno íman
que o médico dentista deverá colar na mandíbula do paciente (junto ao ponto
incisivo).
Escolhida a tecnologia a adoptar, foi necessário definir a estrutura de suporte
para o sistema de aquisição. Existiam duas hipóteses: idealizar um novo arco facial
para suportar os sensores ou realizar o redesign de um já existente.
Ao conceber uma nova estrutura, ter-se-ia maior liberdade na escolha das
formas, mas ao mesmo tempo criar-se-ia mais um equipamento a ser
obrigatoriamente adquirido pelos médicos dentistas. Por outro lado, do ponto de
vista do desenvolvimento de produto, adaptar um arco facial pareceu ser uma
solução mais vantajosa, porque possibilitaria reduzir o tempo de investigação e de
desenvolvimento. Já do ponto de vista dos utilizadores, como de um modo geral, os
dentistas possuem arcos faciais nos seus consultórios e já estão familiarizados com
os mesmos, acrescentar-se-ia apenas uma nova função a um equipamento usual.
Tal solução também seria benéfica, em termos económicos, porque estes
profissionais apenas teriam de comprar os componentes referentes ao sistema de
aquisição.
De entre os vários arcos faciais existentes no mercado o escolhido foi o Arcus
da empresa alemã Kavo. Como o referido arco foi originalmente concebido para
fazer apenas medições estáticas, o primeiro passo na adaptação para a nova função
da aquisição do movimento 3D foi o redesign das peças que poderiam dificultar a
medição dinâmica ou mesmo magoar o paciente.
Para mais facilmente manusear os sensores electromagnéticos foram
desenvolvidas placas de circuito impresso, e para as suster no arco facial foi
desenvolvido um suporte dedicado para os mesmos.
A materialização de protótipos surge como uma etapa natural do processo de
desenvolvimento de um produto. Um modelo físico permite aferir de forma
palpável as características de um produto e confrontá-las com as idealizadas,
Isa Cristina Teixeira Santos 57
Introdução ao Desenvolvimento de Produto e Apresentação do Caso em Estudo
permitindo assim corrigir eventuais erros de projecto numa fase inicial sem causar
grandes prejuízos. Assim sendo, recorreu-se à prototipagem rápida para produzir as
novas peças. Os modelos obtidos por estereolitografia foram posteriormente
utilizados nos testes experimentais.
Terminado o redesign do arco facial, foi desenvolvida uma interface gráfica
para a análise do movimento adquirido recorrendo à ferramenta LabVIEW da
National Instruments [www.ni.com/labview/]. Procurou-se desenvolver uma
interface gráfica intuitiva na qual o médico dentista pudesse registar comodamente
todas as informações relevantes para o diagnóstico das disfunções
temporomandibulares. Também se considerou, na referida interface, a
possibilidade de o operador imprimir em papel, ou guardar em formato digital, a
informação recolhida durante cada exame na forma de um relatório.
Finalmente, ponderou-se a comercialização do sistema protótipo.
4.3: Resumo
O “desenvolvimento de um produto” pode ser definido como o conjunto de
actividades necessárias para a produção de um dado produto. Neste conjunto de
actividades, inclui-se a detecção de uma oportunidade de mercado, o
desenvolvimento de conceitos, a análise económica, a concepção de desenhos
técnicos e modelos, a elaboração de protótipos e planos de produção, a produção
de algumas unidades do produto, o teste e ensaio, a produção em larga escala, o
processo de marketing e finalmente a sua distribuição e venda.
Como o desenvolvimento do produto é uma actividade interdisciplinar que
requer a participação de (quase) todos os membros de uma empresa, é conveniente
utilizar processos bem estruturados para facilitar a produção de produtos de
qualidade superior.
Neste trabalho, procurou-se percorrer todos os referidos passos de modo a que
nenhum pormenor fosse esquecido. Assim, o processo de desenvolvimento do
sistema protótipo para a aquisição e análise do movimento mandibular 3D começou
com a identificação de uma necessidade, em seguida foram definidas as
Isa Cristina Teixeira Santos 58
Introdução ao Desenvolvimento de Produto e Apresentação do Caso em Estudo
especificações do produto. A esta fase inicial seguiu-se o desenvolvimento dos
conceitos, o projecto e a realização de protótipos.
Isa Cristina Teixeira Santos 59
5. Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para
Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
5.1: Sensores electromagnéticos
Quando um elemento condutor de corrente é colocado num campo magnético
surge uma tensão perpendicular tanto à corrente como ao campo magnético. Este
princípio é conhecido como efeito de Hall, e é baseado nele que os sensores
electromagnéticos registam a posição do elemento magnético, [Honeywell, 2005].
A Figura 5.1 ilustra o princípio de funcionamento do efeito de Hall.
Considerando, um fino filme de material semicondutor (elemento Hall) por onde
passa corrente, na ausência de um campo magnético a distribuição da corrente é
uniforme e não existe qualquer diferença de potencial. Pelo contrário, na presença
de um campo magnético, uma força Lorentz é exercida na corrente perturbando a
distribuição desta e criando uma diferença de potencial (tensão VH) aos terminais
proporcional à intensidade do campo magnético em questão.
a) b)
Figura 5.1: Efeito de Hall: a) sem campo magnético; b) com campo magnético (imagens de [Honeywell, 2005]).
Actualmente, os sensores electromagnéticos baseados no efeito de Hall são
utilizados nas mais variadas aplicações devido ao seu tamanho reduzido, consumo
diminuto, longo período de vida, elevada velocidade de operação, alta
repetibilidade e baixo custo; o facto de não ter peças móveis também representa
uma grande vantagem em muitos casos de aplicação. Contudo, nesta aplicação os
sensores do tipo GMR, “Giant Magneto Resistive”, são preferíveis por terem uma
maior sensibilidade e o sinal de saída ser de valor superior.
A Figura 5.2 ilustra o efeito GMR. Nesta figura, A representa uma camada não
magnética condutora, B duas camadas magnéticas, C a corrente eléctrica e D um
campo magnético. Na ausência de um campo magnético, Figura 5.2a), o momento
Isa Cristina Teixeira Santos 63
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
magnético provocado pelas camadas B oferece uma grande resistência à passagem
da corrente; o mesmo não acontece quando se aplica um campo magnético, nessa
altura o momento criado pelas camadas B é vencido e a resistência eléctrica
diminui consideravelmente, Figura 5.2b).
a) b)
Figura 5.2: Efeito GMR, “Giant Magneto Resistive”: A – Camada condutora; B – Camadas magnéticas; C – Corrente eléctrica; D – Campo magnético (imagens adaptadas de [NVE, 2005]).
Apesar de no mercado existirem elementos sensores electromagnéticos que por
si só registam a posição 3D (isto é, com três eixos de sensibilidade), foram
utilizados sensores com apenas um eixo de sensibilidade. Neste trabalho, os
referidos sensores 3D teriam sido preferíveis pois, ao contrário da utilização de três
sensores individuais, permitiriam conceber um suporte mais simples e facilitariam o
tratamento dos resultados obtidos. No entanto, não foi possível encontrar no
mercado unidades deste tipo de sensores para efectuar ensaios experimentais em
tempo útil.
Os sensores seleccionados para este trabalho foram os da NVE Corporation
(USA) com a referência AA002-02, Figura 5.3, cujas características estão resumidas
na Tabela 5.1, [NVE, 2002]. Os referidos sensores apresentam-se sob a forma de
integrados de montagem superficial, e são caracterizados pela sua elevada
sensibilidade a campos magnéticos, excelente estabilidade térmica, baixo consumo
(cerca de 5 mA) e tamanho reduzido (dimensões: 5,99 x 4,90 x 1,55 mm).
Apresentam o mesmo valor da saída tanto na direcção positiva como na negativa do
eixo de sensibilidade (output omnipolar) e a saída é analógica. A gama de operação
Isa Cristina Teixeira Santos 64
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
linear é alargada e funcionam com tensões reduzidas. Os testes experimentais por
nós realizados mostraram que são insensíveis a interferências electrónicas.
a) b)
Figura 5.3: a) Sensores AA002-02 da NVE Corporation (USA) usados; b) Esquema do sensor (imagem de [NVE, 2002]).
Tabela 5.1: Características dos sensores AA002-02 da NVE Corporation (dados de [NVE, 2002]).
Propriedade Mínimo Máximo Unidade
Tensão de entrada < 1 ± 25 Volts
Frequência de operação DC > 1 MHz
Temperatura de funcionamento -50 125 ºC
Offset da ponte eléctrica - 4 + 4 mV/V
Não – linearidade 2 % (unipolar)
Histerese 4 % (unipolar)
Ao afirmar que estes sensores possuem apenas um eixo de sensibilidade
pretende-se dizer que são sensíveis apenas numa dada direcção no plano do
circuito impresso. Deste modo, para se proceder à aquisição tridimensional da
trajectória da mandíbula é necessário utilizar três sensores montados
perpendicularmente entre si. A Figura 5.4 ilustra duas das configurações
íman/sensor possíveis para registar a posição linear.
Como já foi referido, como os sensores considerados neste trabalho são de
dimensões muito reduzidas, para facilitar as suas ligações eléctricas, o seu
manuseamento e montagem no suporte dedicado foram desenvolvidas placas de
circuito impresso específicas. Assim, foram usadas duas placas para ser possível
alinhar e dispor os três sensores perpendicularmente entre si. Os sensores foram
posicionados de modo a ficarem o mais perto possível do ponto incisivo durante o
movimento a registar, Figura 5.5.
Isa Cristina Teixeira Santos 65
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Figura 5.4: Configurações possíveis do íman/sensor usado
(imagens adaptadas de [Honeywell, 2005]).
Figura 5.5: Modelação 3D da montagem dos sensores usados e das
placas de circuito impresso desenvolvidas.
5.2: Íman
A variação do campo magnético é provocada, neste trabalho, por um pequeno
íman colado na mandíbula do paciente junto ao ponto incisivo. Para colar o íman
pode-se utilizar silicone de mordida ou cimentos de endurecimento rápido; deixa-
se ao cuidado do operador a escolha da melhor solução.
Durante os testes efectuados aos sensores verificou-se que a intensidade e a
orientação do campo magnético influenciavam os resultados obtidos; assim sendo,
para evitar que ocorressem erros durante a medição, ao seleccionar o íman teve-se
o cuidado de escolher um que fosse fácil de colar sempre com a mesma orientação.
A Figura 5.6 mostra o íman utilizado; trata-se de um cilindro com 5 mm de
altura e 5 mm de diâmetro, que deverá ser colado nas gengivas do paciente com a
Isa Cristina Teixeira Santos 66
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
base do cilindro paralela aos dentes. O campo magnético gerado pelo referido íman
é de 760 Gauss.
Figura 5.6: Íman usado na aquisição do
movimento mandibular.
O aspecto do magnete seleccionado não é muito atractivo devido à sua cor e
textura rugosa, teria sido preferível utilizar um íman como o da Figura 5.7, que é
revestido a teflon mas tal não aconteceu porque o campo magnético deste é de
apenas 120 Gauss.
Figura 5.7: Íman revestido a teflon (diâmetro: 5 mm; altura: 11 mm).
5.3: Arco Facial Arcus
Os arcos faciais são instrumentos utilizados em Medicina Dentária para registar
a relação da maxila com o eixo de rotação da mandíbula. Ao definirem um plano de
referência usando três pontos, permitem determinar uma relação semelhante
àquela que vai ser estabelecida entre os moldes dos dentes de um certo paciente
com o eixo de rotação do articulador usado para simular o movimento mandibular
do mesmo.
Isa Cristina Teixeira Santos 67
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
O arco facial escolhido para suporte do sistema de aquisição desenvolvido foi o
arco facial Arcus da empresa alemã Kavo, [www.kavo.com], Figura 5.8.
Figura 5.8: Arco facial Arcus da Kavo usado neste trabalho como estrutura principal de
suporte do sistema de aquisição mandibular (duas vistas).
Este arco foi escolhido por se tratar de um modelo recente e ser compatível
com vários articuladores. Nesta escolha, também pesou o facto da transferência
das relações para o articulador ser fácil, e da precisão dos pontos anatómicos de
referência estar garantida pelo uso de auriculares adequados, Figura 5.9.
a) b) c)
Figura 5.9: a) Exemplo de utilização do arco facial Arcus da Kavo; b) Pormenor do auricular; c) Pormenor da glabela (imagens de [www.kavo.com]).
A utilização deste arco é simples: o operador coloca as peças auriculares no
canal auditivo externo (ouvidos), Figura 5.9b), e ajusta o ponteiro à glabela, Figura
5.9c). Para limpar o arco facial basta passar um toalhete embebido em álcool.
Antes de iniciar a adaptação do arco facial à sua nova função, procedeu-se à
modelação dos seus componentes, recorrendo-se ao programa de modelação
paramétrico 3D Autodesk Inventor Professional, Figura 5.10, [Costa, 2004].
Isa Cristina Teixeira Santos 68
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Figura 5.10: Modelação 3D realizado neste trabalho do arco facial Arcus usando o programa
Autodesk Inventor Professional (duas vistas).
5.4: Redesign efectuado
Dos vários elementos que constituem o arco facial adoptado como estrutura de
suporte principal, apenas foi necessário, de forma a o adaptar para a sua nova
função, redesenhar as peças auriculares, Figura 5.11. A parte terminal destas peças
é pouco arredonda, para se adaptar facilmente ao ouvido aquando a realização de
medições estáticas; no entanto, numa medição dinâmica esta forma poderá magoar
o côndilo do paciente a examinar.
Figura 5.11: Um dos auriculares originais do arco facial Arcus da Kavo (duas vistas).
As dimensões gerais das peças originais assim como o modo de encaixe foram
mantidos. No entanto, a forma original algo austera foi substituída por uma mais
orgânica, para proporcionar aos pacientes uma sensação de maior conforto, e a
parte terminal do auricular original foi substituída por uma esfera, de forma a não
Isa Cristina Teixeira Santos 69
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
magoar os pacientes aquando da realização dos movimentos durante o processo de
aquisição, Figura 5.12.
É de notar que as novas peças desenvolvidas são mais fáceis de limpar;
enquanto que os auriculares originais possuem algumas cavidades onde a sujidade
se pode alojar, nas novas peças desenvolvidas tal não acontece.
a) b)
c) d)
Figura 5.12: a) Modelação 3D obtida para o auricular original; b), c) e d) Redesign obtido para a mesma peça.
5.5: Sistema de suporte para os sensores
Ao desenvolver o sistema do suporte dos sensores electromagnéticos teve-se
em atenção que este iria ser fixo ao arco facial, que deveria acomodar as duas
placas de circuito impresso desenvolvidas para os mesmos e que os deveria
posicionar de modo a que ficassem devidamente alinhados com o íman a ser colado
junto aos incisivos inferiores.
Isa Cristina Teixeira Santos 70
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Como já referido, aquando do redesign das peças auriculares originais do arco
facial da Kavo optou-se por uma forma orgânica para proporcionar aos pacientes
uma sensação visual de maior conforto. No caso do suporte dos sensores, este tipo
de formas revelou ser também o mais apropriado para satisfazer as necessidades
funcionais do suporte. A Figura 5.13 mostra a modelação paramétrica do suporte
dos sensores desenvolvido.
Figura 5.13: Modelação 3D do suporte dos sensores desenvolvido (quatro vistas).
Isa Cristina Teixeira Santos 71
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
As placas de circuito impresso, desenvolvidas neste trabalho para os sensores
electromagnéticos, são encaixadas na caixa do suporte respectivo por ligeira
pressão, e o acesso às mesmas é realizado através de uma tampa deslizante, Figura
5.14.
A referida tampa apresenta um orifício para a passagem de um led que tem a
função de indicar se o sistema de aquisição está ligado ou não.
a) b) c)
Figura 5.14: a) Montagem das placas de circuito dos sensores no dispositivo de suporte respectivo; b) e c) Sistema de abertura/fecho por tampa deslizante.
Para fixar o suporte dos sensores aproveitou-se um encaixe já existente no
arco facial. Assim, no suporte dos sensores foi desenvolvido um sistema de encaixe
adequado para evitar a translação e a rotação do mesmo relativamente ao arco
facial, Figura 5.15.
Figura 5.15: Pormenor da fixação do suporte desenvolvido para os
sensores electromagnéticos ao arco facial da Kavo.
Isa Cristina Teixeira Santos 72
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Na parte terminal do suporte dos sensores criou-se uma zona para a transição
entre os cabos que ligam os sensores ao cabo que faz a ligação ao computador,
Figura 5.16. Foram utilizados condutores de reduzido diâmetro de modo a tornar o
suporte ainda mais leve.
O cabo de ligação ao computador é soldado directamente aos sensores; no
entanto, era preferível criar um alojamento para um conector de modo a que o fio
e o suporte para os sensores fossem independentes facilitando assim o
manuseamento do sistema desenvolvido.
a) b)
Figura 5.16: a) Pormenor da parte terminal do suporte dos sensores; b) Pormenor da ligação dos cabos dos sensores.
5.6: Protótipos desenvolvidos
O processo de estereolitografia17 foi o escolhido neste trabalho para
materializar os protótipos desenvolvidos.
Os quatro ficheiros (suporte dos sensores, tampa deste suporte e os dois
auriculares, direito e esquerdo), concebidos com o programa paramétrico de
modelação 3D Autodesk Inventor Professional, foram convertidos em ficheiros no
formato *.STL, utilizando a resolução máxima permitida pelo referido programa. Os
modelos foram então produzidos com uma resina epoxy e sujeitos a um tratamento
de cura.
17 A estereolitografia consiste na fabricação de objectos por adição sucessiva de camadas. Os objectos
são construídos por fotopolimerização de uma resina epoxy usando um feixe laser de raios ultravioleta [Alves, 2001].
Isa Cristina Teixeira Santos 73
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
As Figura 5.17 e Figura 5.18 mostram os primeiros protótipos obtidos. Ao
analisar as peças auriculares verificou-se que a inclinação da parte terminal não
era a mais adequada, e que seriam mais confortáveis se a esfera fosse ligeiramente
maior.
Quanto ao suporte para os sensores verificou-se que a caixa era demasiado
pequena, que a localização do furo para o led incluído no sistema sensor era
inadequada e que, como já foi referido, era necessário um sistema de encaixe
adequado.
Figura 5.17: Primeira versão dos auriculares desenvolvidos.
Figura 5.18: Primeira versão do suporte desenvolvido para os sensores.
Os erros detectados nos primeiros protótipos foram posteriormente corrigidos.
A Figura 5.19 mostra os segundos protótipos materializados. Por seu lado, a Figura
Isa Cristina Teixeira Santos 74
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
5.20 apresenta as peças auriculares desenvolvidas e a sua montagem no arco facial.
Já a Figura 5.21 mostra vários pormenores do suporte dos sensores; e a Figura 5.22
mostra as placas de circuito impresso montadas no respectivo suporte dos sensores.
Figura 5.19: Segunda versão do suporte dos sensores e dos auriculares concebidos neste trabalho
usando o método de estereolitografia (duas vistas).
a) b)
Figura 5.20: a) Segunda versão dos auriculares desenvolvidos; b) Montagem do novo auricular no arco facial Arcus da Kavo.
Para a produção do protótipo desenvolvido em grandes séries tanto o acetal
(POM) como a poliamida (PA, nylon) apresentam propriedades adequadas, [Ashby,
2002], pois ambos são resistentes, rígidos e fáceis de moldar.
Já para produzir uma pequena série, aconselha-se o uso de moldes flexíveis em
silicone. A forma curva do suporte dos sensores pode representar uma dificuldade
em relação à saída da peça do molde, mas esse problema pode ser facilmente
resolvido usando machos fusíveis ou um tubo de latão pré montado. O suporte dos
Isa Cristina Teixeira Santos 75
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
sensores também pode ser produzido sem as curvas consideradas, e receber a
forma final desejada por conformação.
a) b) c)
Figura 5.21: a) Segunda versão do suporte dos sensores desenvolvido; b) Pormenor da fixação das placas de circuito impresso dos sensores; c) Pormenor de fixação ao arco facial Arcus da Kavo.
Figura 5.22: Montagem dos sensores na segunda versão do suporte
desenvolvido para os mesmos.
Para a produção de grandes séries por injecção, os planos de apartação do
suporte dos sensores deverão ser cuidadosamente escolhidos, de modo a facilitar a
retirada da peça do molde sem alterar a forma. O ideal seria dividir o suporte dos
sensores ao meio, eliminando a tampa utilizada para aceder aos sensores, Figura
5.23.
Isa Cristina Teixeira Santos 76
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Figura 5.23: Sugestão para o plano de apartação do suporte desenvolvido para
os sensores (duas vistas).
O sistema de aquisição a montar no arco facial pesa no total cerca de 200 g.
Apesar deste valor poder ser considerado elevado, é aceitável uma vez que as
peças não vão estar solidárias com o movimento; ou seja, o paciente não terá
qualquer impedimento durante os vários movimentos a realizar.
5.7: Montagem electrónica desenvolvida
Como já referido, para registar o movimento mandibular 3D foram utilizados
neste trabalho sensores electromagnéticos, e para visualizar os resultados
adquiridos foi criada uma interface gráfica descrita na próxima secção.
Para a aquisição do sinal dos sensores foi utilizada uma placa de aquisição com
uma ligação USB (designada por DAQ). A placa de aquisição utilizada foi a NI USB-
6008 da National Instruments, Figura 5.24, [NI, 2005]. Trata-se duma placa de
aquisição que foi concebida a pensar num trabalho tipicamente académico: é
compacta (dimensões com conectores: 818 x 851 x 231 mm; peso: 84 g), simples de
usar, tem um preço acessível, e inclui um programa computacional para fazer
facilmente a aquisição dos sinais (NI-DAQmx Base).
Isa Cristina Teixeira Santos 77
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
A NI USB-6008 dispõe de oito canais analógicos diferenciais (AI), dois canais de
saída analógicos (AO), 12 canais entrada/saída digitais (DIO), um contador de 32 bit
e uma porta de saída USB para ligação ao computador. Tem também uma saída
com 5 V e 200 mA, que pode ser utilizada como fonte de alimentação para
componentes externos. A Tabela 5.2 resume algumas das características principais
da placa de aquisição referida.
Figura 5.24: NI USB-6008 da National Instruments: 1 - Indicador da orientação dos conectores; 2 - Conectores; 3 - Etiquetas; 4 - Cabo USB (imagem de [NI, 2005]).
Tabela 5.2: Características da placa de aquisição NI USB-6008 da National Instruments (dados de [NI, 2005]).
Resolução Diferencial: 12 bits Single-ended: 11 bits 0,488 mV
Exactidão 1,53 mV a ±1 14,7 mV a ±20
Velocidade máxima de leitura do sinal 10 kS/s
Ganho programável de entrada Diferencial: 1, 2, 4, 5, 8, 10, 16, 20 Single-ended: 1
Ao montar a placa de aquisição optou-se pela montagem diferencial por
eliminar o ruído, permitir ganhos maiores e a resolução obtida ser superior. No
entanto, esta montagem tem a desvantagem de reduzir para metade o número de
canais disponíveis na placa; mas nesta aplicação, esse facto não foi relevante pois
são usados apenas três canais.
Isa Cristina Teixeira Santos 78
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Apesar da placa de aquisição, como já referido, poder funcionar como fonte de
alimentação para os sensores usados, optou-se por utilizar uma fonte externa. Esta
decisão justifica-se pelo facto do sinal de saída dos sensores ser proporcional à
tensão de alimentação. Assim, a fonte de alimentação escolhida foi a RS7694 da RS
Amidata (www.rs-portugal.com) com duas saídas: +15 e -15V, Figura 5.25. Esta
fonte permite aumentar o sinal de saída dos sensores em três vezes.
Figura 5.25: Fonte de alimentação usada na alimentação do
sistema (imagem de [www.rs-portugal.com]).
Para tornar o sistema desenvolvido o mais prático possível, tanto a fonte de
alimentação como a placa de aquisição foram montadas numa caixa adequada. A
fonte de alimentação foi aparafusada, e por questões de segurança, foi ainda
incluído um fusível de protecção. A placa de aquisição teve de ser colada à caixa
por não ter um sistema de fixação; utilizou-se velcro para que caso fosse
necessário ser desmontada o processo fosse simples. Instalou-se também um botão
para ligar e desligar o sistema de aquisição. A Figura 5.26 mostra a caixa
desenvolvida com todos os componentes referidos.
5.8: Interface gráfica desenvolvida
Para facilitar a aquisição e a análise do movimento mandibular 3D foi
desenvolvida uma interface gráfica dedicada recorrendo à ferramenta LabVIEW da
National Instruments, Figura 5.27, [National, 2005].
Para correr a aplicação é necessário um computador com o sistema operativo
Windows XP e o programa Microsoft Office Word; não é necessário ter o programa
LabVIEW instalado porque a interface corre como uma aplicação autónoma. Caso
Isa Cristina Teixeira Santos 79
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
seja do agrado do operador, poderá ser criado um atalho no Ambiente de Trabalho
para a referida interface.
Figura 5.26: Caixa desenvolvida para alimentação dos sensores electromagnéticos
e aquisição por um computador pessoal dos seus sinais.
Na parte superior da interface desenvolvida deverão ser preenchidos os dados
pessoais do paciente a examinar: o nome, a idade, o sexo e os dentes em falta,
Figura 5.27. Os campos relativos ao “nome” e à “idade” foram criados usando
caixas de texto. Já para indicar o sexo do paciente foi utilizado um “radio
buttons”; para o campo intitulado “Dentes em Falta” foi criada uma sub-rotina
onde são utilizados vários “dialog radio buttons” para que o operador possa indicar,
recorrendo ao grafismo usualmente utilizado pelos médicos dentistas, quais os
dentes que o paciente já não tem.
Na parte inferior da aplicação foram criados botões para controlar a aquisição
do movimento e os gráficos para visualizar e analisar os resultados, Figura 5.27.
O botão “Começar” dá início à medição, enquanto que o botão “Parar” pára a
aquisição, Figura 5.27. Enquanto a medição decorre o paciente pode mover
livremente a boca; mais adiante será apresentada uma sequência para sistematizar
a aquisição.
Isa Cristina Teixeira Santos 80
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Figura 5.27: Interface gráfica desenvolvida neste trabalho recorrendo à ferramenta LabVIEW: em cima surgem os campos relativos aos dados pessoais do paciente, enquanto que na parte
de baixo surgem os botões de controlo e os gráficos dos resultados obtidos.
Terminada a aquisição, os resultados são apresentados em quatro gráficos.
Para melhor organizar a informação foi utilizado um “Tab Control”. Em primeiro
plano, é apresentado o gráfico do movimento a 3D que o operador pode rodar,
aproximar ou afastar usando os botões do rato. “Atrás” deste gráfico, são
apresentadas as projecções do movimento nos planos sagital, frontal e horizontal,
Figura 5.28.
Se os resultados obtidos não forem satisfatórios, o operador pode repetir a
aquisição voltando a clicar no botão “Começar”. Pelo contrário, se os resultados
forem aceitáveis pode-se criar um relatório clicando no botão “Relatório”. Quando
isso acontece, surge uma janela na qual se deve indicar o nome do ficheiro a criar
assim como a sua localização, Figura 5.29; em seguida, é aberto um documento
Word com o relatório da medição, Figura 5.30. O operador pode então optar por
imprimir o relatório ou guarda-lo.
Para criar o relatório utilizou-se no desenvolvimento da interface o “Report
Generation Toolkit”. Assim, foi criado um “modelo de documento” em Microsoft
Word com marcadores relativos aos vários campos a preencher, e no LabVIEW
Isa Cristina Teixeira Santos 81
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
foram definidas as ligações entre estes marcadores e os respectivos campos da
interface gráfica.
Para terminar a aplicação, pressiona-se o botão “Fechar”, Figura 5.27.
Figura 5.28: Interface gráfica desenvolvida: projecção da trajectória no plano sagital.
5.9: Conversão da Tensão em Coordenadas Cartesianas
Os sensores electromagnéticos registam campos magnéticos e exprimem-nos
como uma diferença de potencial na sua saída. Para conhecer a trajectória do
íman, colocado na boca do paciente, é então necessário converter a tensão de
saída dos sensores usados em distância.
Ao simular a aquisição do movimento verificou-se que ao mover o íman numa
dada direcção a tensão variava simultaneamente nos três sensores; ou seja, a cada
posição no espaço (coordenadas cartesianas x, y e z) correspondia um conjunto de
três tensões (tensão segundo cada sensor na direcção x, y e z).
Isa Cristina Teixeira Santos 82
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Figura 5.29: Interface gráfica desenvolvida: localização do relatório da medição obtida.
Figura 5.30: Exemplo de um relatório obtido com a interface desenvolvida.
Isa Cristina Teixeira Santos 83
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Como, de um modo geral, o movimento mandibular não excede os limites
definidos por um paralelepípedo com 70 mm de altura, 40 mm de comprimento e
40 mm de profundidade, registou-se o valor da tensão para uma grelha de pontos
dentro desse volume espacial, para posteriormente se determinar a relação entre a
tensão e a distância 3D.
Assim, mantendo o suporte dos sensores fixo, movimentou-se o íman com o
controlador de movimento Newport Motion Controller Model MM4000, Figura 5.31,
e os valores da tensão foram registados semiautomaticamente18 recorrendo a uma
interface criada durante este trabalho para o efeito em LabVIEW, Figura 5.33. O
“zero” do sistema de coordenadas foi definido junto do led do sistema do suporte
para os sensores electromagnéticos, Figura 5.32, e o íman moveu-se globalmente
40 mm para trás, 20 mm para a direita, 20 mm para a esquerda e 70 mm para
baixo, tendo sido registados cerca de 800 pontos, Figura 5.34. Nesta figura, nos
eixos 1 (segundo xx) e 2 (segundo zz) o incremento foi de 5 mm, enquanto que no
eixo 3 (segundo yy) foi feito um incremento de 10 mm seguido de dois incrementos
de 5 mm e dois incrementos de 10 mm.
Figura 5.31: Montagem utilizada na aquisição experimental dos pontos 3D usada
para calibrar o sistema desenvolvido.
Numa primeira fase, experimentou-se o “algoritmo do ponto mais próximo”
para relacionar a tensão dada pelos sensores com as coordenadas cartesianas 3D:
calculou-se a soma quadrada das diferenças segundo cada um dos três eixos entre 18 Para cada ponto foram inseridas manualmente as coordenadas 3D, ao pressionar o botão “Medir” visível
na Figura 5.33 eram guardados os valores da tensão correspondentes.
Isa Cristina Teixeira Santos 84
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
os valores da tensão a determinar e os valores da tensão determinados
experimentalmente para cada ponto de calibração e procurou-se o mínimo; a este
mínimo corresponderiam as coordenadas do ponto a determinar. No entanto, este
algoritmo é válido apenas para os pontos que tinham sido considerados
experimentalmente; ou seja, para se obter resultados satisfatórios, ter-se-ia de
efectuar um varrimento com avanços muito reduzidos porque não é possível
realizar interpolações entre os pontos de calibração.
Figura 5.32: Pormenor do “zero” do sistema de coordenadas 3D
usado para calibrar o sistema desenvolvido.
Figura 5.33: Interface desenvolvida durante este trabalho para a aquisição dos pontos 3D necessários para a calibração do sistema.
Por sua vez, as redes neuronais são constituídas por elementos de
processamento simples (neurões) interligados que têm a capacidade de aprender a
partir de dados. São inspiradas no sistema nervoso biológico e, como tal, são
determinadas pelas ligações entre os seus elementos. Estas redes podem ser
Isa Cristina Teixeira Santos 85
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
treinadas de modo a executar uma determinada função ajustando os valores das
ligações (pesos) entre os seus elementos. Geralmente, parte-se de determinados
valores de entrada (inputs) que levam a determinados valores de saída (targets); os
pesos são ajustados até que o erro na comparação entre as entradas e saídas seja
mínimo, [Marques, 1999; Demuth, 2005].
Figura 5.34: Pontos 3D adquiridos 3D para calibrar o sistema desenvolvido:
Eixo 1 – segundo xx; Eixo 2 – segundo zz; Eixo 3 – segundo yy.
Neste caso foi utilizada uma rede neuronal de base radial. De acordo com
Marques, [Marques, 1999], este tipo de redes têm um treino rápido e permitem
interpretar a contribuição de cada unidade para o comportamento global da rede
porque cada camada só é activa numa zona limitada do espaço de entrada.
As redes de base radiais são constituídas por duas camadas: uma camada
escondida, composta por neurões cuja função de transferência é do tipo
exponencial, Figura 5.35a), ligada a uma camada de saída linear, Figura 5.35b). A
Figura 5.36 mostra a arquitectura da rede utilizada neste trabalho.
Todos os cálculos referentes à rede neuronal utilizada foram executados no
programa MatLab [Demuth, 2005] com o comando “newrb”; os parâmetros
utilizados estão indicados na Tabela 5.3.
O valor ideal para o erro é zero, mas neste caso foi definido um valor superior
essencialmente porque os pontos registados serem insuficientes numa das
direcções, Figura 5.34. Assim sendo, os resultados obtidos com esta rede neuronal
não apresentam elevada exactidão; para os melhorar seria necessário considerar
mais pontos experimentais, isto é, usar uma amostragem espacial mais fina.
Isa Cristina Teixeira Santos 86
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
a) b)
Figura 5.35: Funções de transferência: a) Função de transferência dos neurões da camada escondida; b) Função de transferência dos neurões da
camada de saída (imagens de [Demuth, 2005]).
Figura 5.36: Arquitectura da rede de base radial utilizada: R - número de entradas; S1 - número de neurões na camada escondida; S2 - número de
neurões na camada de saída (imagem adaptada de [Demuth, 2005]).
Tabela 5.3: Parâmetros do comando “newrb” utilizado para construir a rede neuronal radial utilizada neste trabalho.
newrb(P,T,GOAL,SPREAD)
P Entradas (Inputs)
T Saídas (Targets)
Goal Erro 100 000
Spread Exponencial da função de transferência 0.005
Finalmente, a rede obtida foi traduzida numa expressão matemática e foi
implementada na interface gráfica através de uma sub-rotina criada em LabVIEW.
5.10: Utilização do sistema
Para utilizar o sistema protótipo desenvolvido neste trabalho para a aquisição e
análise do movimento mandibular 3D, Figura 5.37, o operador deverá começar por
Isa Cristina Teixeira Santos 87
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
colocar a caixa próximo do computador pessoal e estes relativamente perto do
paciente. Em seguida, deverá ligar a ficha a uma tomada AC de 220V e o cabo USB
ao computador, Figura 5.38. Posto isto, o operador deve substituir as peças
auriculares originais do arco facial pelas novas peças auriculares desenvolvidas
neste trabalho, Figura 5.39, e montar o suporte para os sensores.
Figura 5.37: Sistema protótipo desenvolvido para a aquisição e análise do
movimento mandibular 3D.
Neste momento e caso o computador pessoal ainda esteja desligado, o
operador pode ligar o computador, iniciar a aplicação computacional desenvolvida
para a aquisição e análise do movimento mandibular 3D e preencher os campos
relativos aos dados pessoais do paciente em causa: o nome, a idade, o sexo e os
dentes em falta.
O operador pode então “colar” o íman no interior da boca do paciente, com
silicone de mordida ou com cimentos de endurecimento rápido, e “montar” o arco
facial, Figura 5.40.
Isa Cristina Teixeira Santos 88
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Figura 5.38: Preparação do sistema protótipo desenvolvido para a aquisição e
análise do movimento mandibular 3D.
Figura 5.39: Preparação do arco facial: substituição das peças auriculares.
a) b) c)
Figura 5.40: a) Colocação do arco facial no paciente; b) Pormenor da peça auricular desenvolvida neste trabalho; c) Sistema pronto para a aquisição do movimento.
Isa Cristina Teixeira Santos 89
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Para que o movimento adquirido seja o mais natural possível e não hajam
interferências com os músculos mastigatórios, é conveniente que o médico
dentista/operador explique ao paciente a sequência de movimentos a realizar e só
depois proceda à sua aquisição. Sugere-se a seguinte sequência de operação:
1. fechar a boca na posição normal com os dentes a contactar na posição
correcta;
2. fazer pressão (note-se que ao fazer pressão há um pequeno movimento
natural para cima e para trás);
3. abrir a boca;
4. fechar a boca;
5. abrir a boca normalmente;
6. fechar a boca com os dentes numa posição avançada;
7. deslizar para trás;
8. mover o máximo para o lado direito;
9. mover o máximo para o lado esquerdo.
Depois do paciente compreender a sequência de movimentos a realizar, o
operador pode então iniciar a aquisição do movimento, premindo no botão
“Começar” da interface desenvolvida. Terminada a sequência de movimentos, o
botão “Parar” da mesma interface deverá ser premido. O operador pode de seguida
analisar o movimento adquirido e, se os resultados forem satisfatórios pode criar
um relatório do exame premindo o botão “Relatório” da interface desenvolvida. Ao
premir no referido botão surge uma janela de diálogo onde se deve indicar o nome
e a localização do ficheiro Microsoft Word a criar. Depois disto, o referido ficheiro
é criado e surge em primeiro plano no monitor do computador. O operador pode
então optar por imprimir em papel os resultados ou guardar o ficheiro numa dada
unidade de gravação de dados.
Terminada a aquisição, o sistema pode ser desmontado.
É conveniente que as peças auriculares sejam limpas, com um lenço embebido
em álcool, e que o íman seja esterilizado.
Isa Cristina Teixeira Santos 90
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
5.11: Estimativa dos custos de produção
Foi feita uma estimativa dos custos para a produção do sistema protótipo
desenvolvido neste trabalho. Os resultados são apresentados na Tabela 5.4.
Cada vez mais as empresas optam por produzir pequenas séries recorrendo a
técnicas de prototipagem rápida, por ajudar a reduzir o tempo de desenvolvimento
até à entrada no mercado e o custo de produção das ferramentas e dos dispositivos
associados. Tal como já foi referido, para produzir uma pequena série das duas
peças auriculares e do suporte dos sensores, com a respectiva tampa, seria
preferível utilizar moldes flexíveis em silicone; neste caso, a produção de 25
conjuntos em resina de poliuretano custa aproximadamente 2.750 €.
O preço unitário dos sensores AA002-02 da NVE Corporation é de 5,53 €. O
custo das duas placas de circuito impresso ronda os 3 €. A placa de aquisição NI
USB-6008 custa 145 €, enquanto que os respectivos conectores custam cerca de
25 €. A fonte de alimentação custa 75 €. O preço do íman ronda os 5 €. Já o preço
da caixa plástica na qual, é montada a placa de aquisição e a fonte de
alimentação, ronda os 8 € mas aumenta caso seja metálica. Nos cabos, no led, no
fusível e no interruptor gasta-se ao todo aproximadamente 8 €.
É importante referir que os preços indicados não incluem IVA nem custos de
transporte, e podem ser negociados de modo a obter descontos de quantidade ou
de pronto pagamento. Também se deve salientar que caso se pretenda uma placa
de aquisição com maior resolução o custo aumentará.
Para montar o sistema são precisas 5 horas. Se se considerar que em Portugal o
custo do trabalho de bancada ronda os 0,15€/min, para montar um sistema
protótipo gasta-se 45 €.
O custo do desenvolvimento e os custos fixos não foram estimados por
dependerem de quem desenvolve e produz o sistema.
Isa Cristina Teixeira Santos 91
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Tabela 5.4: Estimativa dos custos para produzir o sistema protótipo desenvolvido para a aquisição e análise do movimento mandibular 3D.
Quantidade Designação Preço
1 Suporte dos sensores e auriculares 110,00 €
3 Sensores AA002-02 NVE Corporation 16,60 €
2 Placas de circuito impresso 3,00 €
1 Placa de aquisição NI USB-6008 e conectores 170,00 €
1 Fonte de alimentação RS7694 ±15 V 75,00 €
1 Íman 5,00 €
1 Caixa 8,00 €
Material eléctrico 8,00 €
Mão-de-obra (5 horas, trabalho de bancada) 45,00 €
Total (material + mão-de-obra) 440,60 €
5.12: Comercialização do produto
Em Portugal, é o Infarmed, [www.infarmed.pt], que define as regras a que
devem obedecer o fabrico, a comercialização e a entrada em serviço de
dispositivos médicos e respectivos acessórios.
Segundo o Decreto-Lei nº 273/95 de 23 de Outubro e a Portaria nº 136/96 de 3
de Maio, o sistema protótipo desenvolvido neste trabalho é classificado como um
dispositivo médico activo para diagnóstico e pertence à classe IIa19.
Para a comercialização do sistema protótipo, é requerido um “Certificado de
Conformidade”, que deverá ser emitido por um organismo dentre os vários
nomeados pelas autoridades competentes dos Estados Membros e publicados no
Jornal Oficial das Comunidades. O fabricante também pode escolher o
“procedimento de avaliação da conformidade”, entre os vários previstos no n.º 4
do Decreto-lei n.º 30/20003, de 14 de Fevereiro.
Os dispositivos médicos só poderão ser colocados no Mercado Europeu se
apresentarem a marcação “CE” como prova da sua conformidade com os requisitos
essenciais que lhe são aplicáveis. A referida marcação tem um grafismo próprio e
deve estar aposta pelo fabricante de forma legível, visível e indelével, Figura 5.41. 19 Na Portaria nº 136/96 de 3 de Maio os dispositivos são classificados em classes I, IIa, IIb e III, tendo em
conta a vulnerabilidade do corpo humano, bem como os potenciais riscos decorrentes da sua concepção técnica e do seu fabrico.
Isa Cristina Teixeira Santos 92
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Os dispositivos com funções de medição, como no presente caso, devem
apresentar, para além da marcação “CE”, um código constituído por quatro dígitos
que corresponde ao número de identificação do Organismo Notificado escolhido
pelo fabricante para a sua avaliação da conformidade.
Figura 5.41: Marcação “CE” que deverá ser aposta no dispositivo desenvolvido
(imagem da Portaria nº 136/96 de 3 de Maio).
O sistema protótipo foi concebido de modo a que a sua utilização não
comprometesse o estado clínico e a segurança dos pacientes, nem a segurança e a
saúde dos operadores. As formas escolhidas dificilmente causarão ferimentos e as
correntes eléctricas envolvidas não representam riscos em caso de avaria. Foram
incluídos sinais luminosos que informam, tanto o paciente como o operador, se o
sistema está em funcionamento.
A limpeza dos vários componentes é fácil. No entanto, o íman precisa de
especial atenção por ser esterilizado. Este deve ser acondicionado numa
embalagem descartável, de forma a estar estéril aquando da sua colocação no
mercado, e a manter este estado nas condições previstas de armazenamento e
transporte, até que seja violada ou aberta a protecção que assegura a sua
esterilidade. No folheto de instruções que deverá acompanhar o dispositivo
deverão ser fornecidas indicações sobre qual o procedimento correcto para a
esterilização do íman usado.
Ao ser comercializado o sistema deverá ser acompanhado das informações
necessárias para a sua utilização em completa segurança e para a identificação do
fabricante, tendo em conta a formação e os conhecimentos dos potenciais
utilizadores. Estas informações devem ser redigidas em língua portuguesa, sem
prejuízo de poderem também ser redigidas noutras línguas.
Isa Cristina Teixeira Santos 93
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Na rotulagem e no folheto de instruções deverá constar informação sobre o
nome ou a designação comercial, e o endereço do fabricante e o ano de fabrico.
Também devem constar informações para que o utilizador possa identificar o
dispositivo e o conteúdo da embalagem, assim como as instruções necessárias em
caso de danificação da embalagem. Devem ser fornecidas informações sobre os
processos de reutilização adequados, incluindo a limpeza, desinfecção,
acondicionamento.
5.13: Resumo
Os sensores electromagnéticos registam a posição de um dado elemento
magnético. Neste trabalho, para a aquisição do movimento mandibular 3D, foram
utilizados três sensores deste tipo para registar a trajectória de um pequeno íman
colocado na boca de um paciente.
Um arco facial comum em Medicina Dentária foi adaptado para servir como
estrutura principal do sistema protótipo e foi desenvolvido um suporte específico
para os sensores.
Para garantir o maior conforto possível do paciente durante a medição algumas
peças do arco facial foram redesenhadas.
Posteriormente, protótipos foram materializados, recorrendo à
estereolitografia, permitindo assim corrigir atempadamente alguns erros.
Para alimentar o sistema de aquisição de dados do protótipo desenvolvido foi
utilizada uma fonte de alimentação dedicada, e para adquirir o sinal foi utilizada
uma placa de aquisição de dados. Estes componentes foram montados numa caixa
adequada para tornar o sistema desenvolvido prático.
Para facilitar a aquisição e a análise do movimento mandibular 3D foi
desenvolvida uma interface gráfica com a ferramenta LabVIEW da National
Instruments. Na referida interface é possível indicar os dados pessoais do paciente
e visualizar o movimento 3D e a sua projecção nos planos sagital, frontal e
horizontal.
Isa Cristina Teixeira Santos 94
Desenvolvimento de um Sistema Protótipo para Aquisição e Análise do Movimento Mandibular 3D
Na referida interface computacional, foram utilizadas redes neuronais para
converter adequadamente a tensão dada pelos sensores em coordenadas
cartesianas 3D.
Estimou-se que para produzir o sistema protótipo gastar-se-ia em material
395 €; as outras parcelas não foram calculadas por dependerem fortemente de
quem o desenvolve e o produz.
Nos vários ensaios experimentais realizados, verificou-se que o sistema
protótipo desenvolvido cumpre adequadamente a função para o qual foi
desenvolvido, ultrapassando os requisitos impostos para o seu desenvolvimento:
facilidade de utilização e baixo custo.
Assim, o sistema desenvolvido pode ser uma mais valia para todos os
profissionais da área da Medicina Dentária.
Isa Cristina Teixeira Santos 95
6. Conclusões Finais e
Perspectivas de Trabalho Futuro
Conclusões Finais e Perspectivas de Trabalho Futuro
6.1: Conclusões Finais
Com este trabalho procurou-se preencher uma lacuna existente no mercado da
Medicina Dentária desenvolvendo um novo sistema protótipo para a aquisição e
análise do movimento mandibular 3D fácil de operar, económico e cómodo para os
pacientes. Para garantir que tais objectivos fossem satisfeitos, adoptou-se um
plano de desenvolvimento de produto estruturado. Esta decisão revelou-se sensata,
pois ajudou a resolver alguns dos problemas que foram surgindo e a manter um
registo adequado de todos os passos seguidos.
Ao mesmo tempo que as “necessidades do cliente” foram identificadas, foi
realizado um estudo sobre a anatomia dentária e o movimento mandibular em
causa e foram identificados alguns dos sistemas existentes para a aquisição e
análise do movimento mandibular (segundo e terceiro capítulos desta Dissertação).
Terminado este estudo, foram definidas as “especificações do produto” desejadas.
A partir deste ponto, o processo de desenvolvimento dividiu-se em três fases: 1)
escolha da tecnologia a usar, 2) concepção da estrutura do sistema protótipo e 3)
desenvolvimento da interface computacional para a visualização e a análise dos
dados 3D adquiridos (movimento mandibular).
Para adquirir a trajectória 3D do ponto incisivo foram utilizados sensores
electromagnéticos por serem baseados numa tecnologia relativamente acessível e
permitirem conceber um sistema simples e cómodo. A variação do campo
magnético registada pelos sensores é provocada por um íman colocado
adequadamente no interior da boca do paciente.
Como estrutura base do sistema de aquisição, foi escolhido um arco facial
usual em Medicina Dentária, e adaptaram-se duas das suas peças para o tornar mais
confortável na sua nova função. Deste modo, o tempo de desenvolvimento foi
reduzido assim como os custos do sistema global; do ponto de vista dos utilizadores
também se revelou uma solução vantajosa porque, de um modo geral, os médicos
dentistas possuem já nos seus consultórios este tipo de arcos faciais. Para suportar
os sensores utilizados na aquisição dos dados 3D, foi concebido um suporte
adequado a montar no arco facial usado.
Isa Cristina Teixeira Santos 99
Conclusões Finais e Perspectivas de Trabalho Futuro
A interface gráfica desenvolvida para o sistema protótipo foi implementada
recorrendo-se à ferramenta computacional LabVIEW da National Instruments. Com
a referida interface é possível visualizar e analisar o movimento tridimensional do
ponto incisivo e a sua projecção nos três planos: sagital, horizontal e frontal. Caso
seja do interesse do médico, é também possível imprimir um relatório detalhado
com a informação pessoal do paciente e os resultados obtidos no exame.
A transformação da tensão dada pelos sensores electromagnéticos em
coordenadas cartesianas 3D foi conseguida adequadamente utilizando redes
neuronais. Os resultados obtidos não são os melhores em termos de precisão mas
poderão facilmente ser melhorados, sem aumentar os custos de produção, se a
rede criada for optimizada aumentando o número de pontos da amostragem
espacial considerada ou se forem experimentadas outros tipos de redes mais
dedicadas ao problema em questão.
A qualidade das medições obtidas pode ainda ser melhorada se o íman utilizado
for substituído por outro que tenha um campo magnético mais intenso, ou se a
resolução da placa de aquisição for superior. É de salientar que a segunda opção
acarreta um significativo aumento do preço do sistema global.
O dispositivo K7 Evaluation System da Myotronics resumidamente apresentado
no terceiro capítulo desta Dissertação é, tal como o sistema protótipo desenvolvido
neste trabalho, um sistema para a aquisição do movimento mandibular 3D baseado
na variação de um campo magnético. Comparando os dois sistemas, constata-se
que o protótipo desenvolvido é mais pequeno e tem um design mais agradável e,
como se adapta a um arco facial, poderá ser comercializado a um preço bastante
mais acessível.
Deste modo, o sistema desenvolvido pode representar uma mais valia para
todos os profissionais da área da Medicina Dentária.
6.2: Perspectivas de Trabalho Futuro
Com o intuito de aumentar a comodidade do paciente, o sistema desenvolvido
poderá evoluir no sentido de transmitir o sinal dos sensores sem recorrer a fios
eléctricos; por exemplo, recorrendo-se à tecnologia wireless, cada vez mais usual.
Isa Cristina Teixeira Santos 100
Conclusões Finais e Perspectivas de Trabalho Futuro
Se tal acontecer, a forma do suporte dos sensores desenvolvido terá de ser
adaptada.
Também seria interessante estudar a possibilidade de adaptar o sistema
protótipo desenvolvido a outros arcos faciais.
No futuro, seria uma mais valia considerável calcular, a partir dos dados
obtidos pelo sistema protótipo desenvolvido, todos os parâmetros necessários para
montar os moldes dos dentes de um paciente em estudo num dado articulador.
Outra melhoria a considerar futuramente no sistema desenvolvido seria a
possibilidade de abrir e guardar os registos das medições efectuadas para
posteriormente ser possível realizar análises estatísticas dos resultados obtidos,
quer para um mesmo paciente, por exemplo ao longo do tempo ou antes e depois
de um dado procedimento médico, quer em determinadas classes de pacientes.
Ainda ao nível da interface computacional desenvolvida seria interessante criar
uma versão da mesma em Inglês.
Para converter a tensão em coordenadas cartesianas 3D foram utilizadas redes
neuronais; seria interessante fazer uma comparação entre diferentes tipos de redes
e perceber qual a influência da amostragem do espaço 3D considerado nos
resultados obtidos.
As redes neuronais também poderiam ser implementadas em hardware para
tornar a conversão consideravelmente mais rápida.
No sentido de comercializar o sistema protótipo desenvolvido, seria importante
criar os manuais do sistema e estudar o processo para a produção em grandes
séries.
Uma outra possibilidade de utilização do sistema protótipo desenvolvido,
poderá passar pela utilização da informação recolhida em procedimentos
computacionais de animação de mandíbulas, e na sua reprodução “real”
recorrendo-se a articuladores totalmente robotizados.
Isa Cristina Teixeira Santos 101
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Anexo A. Programação em LabVIEW
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