desafios dos catadores de caranguejos na reserva extrativista marinha maracanã, pará, brasil

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Jackson de Freitas Figueiredo, Suezilde da Conceição Amaral Ribeiro, AltemNascimento Pontes, Letícia Magalhães da Silva

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    DESAFIOS DOS CATADORES DE CARANGUEJOS NA RESERVA EXTRATIVISTA MARINHA MARACAN, PAR, BRASIL

    Jackson de Freitas Figueiredo, Suezilde da Conceio Amaral Ribeiro, Altem Nascimento Pontes, Letcia Magalhes da Silva4

    1. Discente do Programa de Ps-Graduao em Cincias Ambientais da Universidade do Estado do Par, Belm, Brasil ([email protected])

    2. Docente do Programa de Ps-Graduao em Cincias Ambientais da Universidade do Estado do Par

    3. Docente do Programa de Ps-Graduao em Cincias Ambientais da Universidade do Estado do Par

    4. Mestre em Cincias Ambientais pela Universidade do Estado do Par

    Recebido em: 12/04/2014 Aprovado em: 27/05/2014 Publicado em: 01/07/2014

    RESUMO Partindo do contexto unidades de conservao, mais precisamente das reservas extrativistas (RESEX), objetivou-se neste trabalho realizar a construo do perfil socioambiental na RESEX de Maracan-PA, como espao passvel de aes antrpicas, bem como, verificar o processo de coleta (catao) de caranguejos Ucides cordatus pelos catadores, identificando se h outras atividades realizadas pelos moradores que retiram seu sustento da Reserva e classific-las em atividades comerciais e/ou de subsistncia. Assim, o diagnstico socioambiental, oriundo do levantamento socioeconmico dos usurios e da biometria do caranguejo-u, pode ser ferramenta fundamental de controle social e monitoramento da biodiversidade. A coleta da amostra de 100 (cem) caranguejos foi realizada pelo mtodo do braceamento. Imersos em caixa trmica com gelo, aferiram-se as medidas largura da carapaa (LC), comprimento da carapaa (CC) e peso do animal (PA). Calculada a estatstica descritiva biomtrica dos cem exemplares de U, assim como, das variveis do perfil socioeconmico de vinte catadores, identificou-se: sinais de poluio ambiental; o perfil dos catadores masculino/feminino e adultos/crianas. As medidas biomtricas confirmaram a legislao do IBAMA (2003), o que contrastou com o resultado obtido em questionrio. Os resultados da pesquisa indicaram que, apesar da existncia de um plano de gesto da RESEX, falta um melhor funcionamento e aplicao do mesmo, mais interao com a comunidade no sentido de instru-la e inform-la sobre a educao ambiental como forma de reduzir os impactos ambientais de natureza antrpica nesta RESEX. PALAVRAS-CHAVE: Biometria, caranguejo-u, Perfil Socioambiental, reservas extrativistas, unidades de conservao.

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    CHALLENGES OF CRABS SCAVENGERS IN MARINE EXTRACTIVE RESERVE OF MARACAN, PAR, BRAZIL

    ABSTRACT Based on the context of conservation units, more precisely extractive reserves (RESEX), this study aimed to carry out the construction of socio-environmental profile in RESEX of Maracan-PA as a space open to human actions, and determining the process collection (scavenging) of crabs Ucides cordatus by scavengers, identifying whether there are other activities conducted by residents who derive their livelihood from the reserve and classify them into commercial and subsistence activities. Thus, the socio-environmental diagnosis, deriving from socio-economic survey of users and the biometrics of the land crab, can be a fundamental tool of social control and monitoring biodiversity. Sample collection of one hundred (100) crabs was performed by the method of braceamento. Immersed in a cooler with ice, studies that analyzed the measurements width (CW), carapace length (CL), bodyweight (PA). Calculated descriptive statistics. Biometric hundred samples of U, as well as the variables of the socioeconomic twenty pickers, were identified: signs of environmental pollution, the profile of scavengers male/female, adults/children; biometric measurements confirmed the legislation of IBAMA (2003), which contrasted the results obtained in questionnaire. We conclude that, despite the existence of a Management Plan RESEX, lacking better functioning and application of the same, more interaction with the community to instruct her and let her know on environmental education as a way to reduce the environmental impacts of anthropogenic nature RESEX this. KEYWORDS: Protected areas, extractive reserves, Environmental Profile, Biometrics, Crab u

    INTRODUO A problemtica que envolve a apropriao do espao deve causar

    preocupao e interesse na maioria dos estudiosos que se atm a estudar o espao apropriado pelo homem. No momento em que as territorialidades conflitantes emergem, a partir das apropriaes, apresentam-se indcios de que as formas de gesto territorial ordenamentos territoriais devem levar em considerao a diversidade de interesses sociais, econmicos, ambientais e culturais da sociedade (SILVA, 2010 citado por CRUZ et al., 2012, p. 79).

    As formas de apropriao do espao e do uso dos recursos naturais devem ser conhecidas e estudadas para que seja possvel o uso racional e efetivo da gesto do territrio. No caso das unidades de conservao (UCs), muitas vezes os gestores no possuem informaes suficientes para subsidiar o processo de tomada de deciso. Nesse sentido, ARAJO (2007) ressalta que os ecossistemas so muito complexos e dinmicos, limitando nossa compreenso sobre eles.

    COELHO et al. (2009) afirmam que as unidades de conservao quase sempre so vistas como objetos dados, reas naturais, e no como objetos criados (concebidos, inventados, disputados). Os autores salientam que, sendo estas, objeto de investigao em construo, requerem que sejam reveladas as relaes entre grupos sociais (tradicionais ou no) e recursos, bem como os processos de mudanas sociais, ambientais e territoriais.

    Neste contexto das UCs, insere-se a reserva extrativista marinha Maracan, no municpio de Maracan, no estado do Par. Trata-se de uma unidade de conservao federal do Brasil categorizada como reserva extrativista e criada pelo

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    Decreto Presidencial de 13 de dezembro de 2002, totalizando uma rea de 30.018 hectares.

    A RESEX de Maracan foi criada com os objetivos de assegurar o uso sustentvel e a conservao dos recursos naturais renovveis, protegendo os meios de vida e a cultura da populao extrativista local (MARTINS et al., 2012). Este uso e apropriao do espao ocorrem por diversos membros da populao local, tanto tradicionais como no tradicionais, e de vrias maneiras, destacando-se a atividade pesqueira, a ao de marisqueiros e a agricultura.

    De acordo com o conselho nacional das populaes extrativistas (CNS), foram criadas at o ano de 2009, cinquenta e trs RESEX federais na Amaznia, sendo vinte delas somente no estado do Par, das quais, nove so RESEX marinhas, ou seja, espaos onde as atividades esto voltadas predominantemente para a pesca (MEIRELES, 2011), com destaque para os catadores de caranguejos.

    A espcie de caranguejo explorada ou catada pelos extrativistas de Maracan o u Ucides cordatus (Linnaeus, 1763), o segundo maior crustceo encontrado no manguezal, constituindo a espcie mais explorada para o consumo humano (OLMOS; SILVA, 2003). De acordo com PAIVA (1997), este caranguejo representa um dos mais importantes recursos das regies estuarinas da costa brasileira, passvel de ser explorado com relativa intensidade sem entrar em situao de sobrepesca.

    O objetivo do presente trabalho foi fazer o levantamento do perfil socioambiental na RESEX de Maracan-PA, como espao passvel de aes antrpicas, bem como, verificar o processo de coleta (catao) do caranguejo pelos catadores, identificando se h outras atividades realizadas pelos moradores que retiram seu sustento da RESEX. Alm disso, foi feita a biometria de uma amostra de caranguejos para verificar se estes foram coletados dentro das normas previstas pelo IBAMA.

    REA DE ESTUDO Caracterizao da rea

    O municpio de Maracan, localizado no Nordeste paraense, pertence zona fisiogrfica do Salgado (Figura 1). Os municpios limtrofes so: Magalhes Barata e Marapanim, a oeste; Igarap-au, ao sul; e Salinpolis, a leste (IBGE, 2010).

    A rea de estudo, explorada por catadores de caranguejos do municpio, parte integrante da RESEX e possui como coordenadas geogrficas aproximadas os seguintes pontos: 052.3788 S e 4724.5030 W. A a ssociao dos usurios da reserva extrativista marinha de Maracan (AUREMAR), com sede no prprio municpio, presidida por uma moradora local (Figura 2).

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    FIGURA 1: localizao geogrfica da rea de estudo (com adaptaes) Fonte: MMA/IBAMA/CNPT, 2000.

    FIGURA 2: Sede da Associao dos Usurios da Reserva Extrativista Marinha de Maracan-PA (AUREMAR).

    Fonte: Autores.

    MATERIAL E MTODOS Para o desenvolvimento deste trabalho, foi realizada uma campanha no municpio de Maracan-PA, no ms de setembro de 2013, para a coleta das amostras e aplicao de questionrios com os moradores locais. Foi encomendada aos catadores uma amostra de 100 caranguejos para a realizao da biometria, a fim de verificar se a legislao sobre o caranguejo-u est sendo cumprida. Para isso, os catadores foram orientados que essa coleta deveria ser realizada de acordo com o cotidiano deles, ou seja, deveriam realiz-la no mesmo horrio e nas mesmas condies meteorolgicas de costume. O objetivo desta orientao era evitar que eles fizessem uma pr-seleo dos animais (coletando apenas os exemplares de grande porte). Os exemplares foram coletados pelo mtodo do braceamento, durante dois dias.

    Os caranguejos coletados foram acondicionados em sacas de nilon e levados para uma pia inoxidvel para limpeza. Aps esta etapa, os animais foram

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    mergulhados em gelo para choque trmico e para que no se estressassem (Figura 3), o que poderia provocar sofrimento aos animais e interferir no resultado.

    FIGURA 3: Acondicionamento do caranguejo em gelo. Fonte: Autores.

    As medidas lineares de comprimento e largura foram realizadas com auxlio de um paqumetro com sensibilidade de 0,01 mm e a medida de peso em balana analtica, com sensibilidade de 0,01 g. Alm disso, utilizou-se caixa trmica com gelo, escova e bacia plstica para lavagem dos caranguejos (Figura 4), a fim de remover a sujeira e tambm mat-los sem a necessidade de enfiar nenhum objeto pontiagudo no crustceo.

    FIGURA 4: Medidas biomtricas: A) Comprimento da carapaa (CC); B) Largura da carapaa (LC) Fonte: Autores.

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    Em relao aos questionrios, foram eleitas 20 famlias de catadores de caranguejo, com nico critrio de que as mesmas residissem no interior da reserva. As perguntas eram semiestruturadas, contendo questes abertas e fechadas. As entrevistas tambm foram realizadas no ms de setembro, na prpria residncia do catador, o qual era previamente informado sobre o objetivo e a importncia do estudo. Tal procedimento foi adotado para evitar qualquer insegurana ou desconfiana que pudesse promover a ocultao de dados, ou mesmo a recusa da entrevista.

    As perguntas com carter socioeconmico buscavam traar o perfil dos moradores, bem como verificar a qualidade de vida dos mesmos e se contribuam para a conservao dos recursos naturais com aes de correto manejo e educao ambiental.

    RESULTADOS E DISCUSSO Os entrevistados possuam idade mdia de 32 anos, sendo 92% do sexo

    masculino. A maioria deles no possua o ensino fundamental completo (75%), enquanto os demais tinham o ensino fundamental completo e/ou no concluram o ensino mdio (25%). A mdia de filhos variava de dois a sete filhos por casal (Tabela 1). A comercializao era feita, em geral, com os atravessadores que compram a maioria do produto in natura a preos baixos, em mdia R$ 0,50 a unidade do caranguejo.

    Os atravessadores so os que mais lucram com esse negcio. Esses, no priorizam o consumo local j que a maior parte da produo direcionada para outros lugares, como Belm e cidades vizinhas que negociam os caranguejos dispostos em montantes (centos). O preo do caranguejo variou com o tipo de comprador (Tabela 1), ocorrendo uma menor variao para o atravessador e maior para a comunidade e turistas.

    O tempo de profisso como catador de caranguejo, para a maioria dos entrevistados, desde a infncia, com 82% dos respondentes sobrevivendo deste recurso como principal fonte de renda, que em mdia era de R$ 660,00 por ms.

    TABELA 1: Estatstica descritiva das variveis numricas sobre o perfil socioeconmico de 20 catadores de caranguejo do municpio de Maracan-PA e caractersticas sobre a captura do caranguejo (CNSLOC = consumidor local; ATV = atravessadores; CMCV = comerciantes de cidades vizinhas; TUR = turistas).

    QUALIDADES ANALISADAS MNIMO MXIMO MDIA DESVIO PADRO Idade 17 52 32,35 11,95 Nmero de Filhos 2 7 3,2 1,360 Renda mensal 350 950 660,5 168,6 Tempo profisso 6 45 22,65 14,28 Frequncia de catao/semana 3 5 3,7 0,970 Quantidade capturada 100 225 141,5 31,20

    Preo de venda em dzia (R$) CNSLOC 6,00 7,50

    ATV 3,00 4,00 CMCV 4,50 6,00 TUR 8,00 12,00

    Fonte: Autores.

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    Cerca de 80% dos entrevistados no utilizam o caranguejo como alimento, mas apenas a comercializao que feita com os animais ainda vivos, pois os mortos so dados aos porcos como alimento. Segundo um estudo socioeconmico do MMA/IBAMA/CNPT (2000), 72,3% dos catadores brasileiros usam o mtodo do gancho/anzol (vergalho em forma de anzol na ponta de uma vara de madeira), e 26,9% utilizam unicamente o brao tcnica utilizada de forma tradicional que consiste enfiar o brao na toca at alcanar o caranguejo, puxando-o para fora (mtodo do braceamento). Na RESEX de Maracan, cerca de 90% dos catadores utiliza o mtodo do braceamento.

    Na RESEX de Maracan a frequncia de cata do caranguejo nos manguezais de trs a cinco vezes/semana, com mdia de extrao aproximada de doze dzias/dia (141,5/dia). Segundo os catadores, o tamanho comercial do caranguejo-u em Maracan varia entre grande e mdio, o que de acordo com o resultado da biometria realizada, estes tamanhos encontram-se entre 60 e 83 mm, com mdia de 72 mm de largura de carapaa (Tabela 2).

    Dos catadores entrevistados em Maracan, a maioria disse conhecer o perodo do defeso estipulado pela portaria do IBAMA para o caranguejo-u, embora poucos tenham respondido corretamente a esta pergunta. Os caranguejos pequenos e as fmeas so os mais protegidos pelo IBAMA, que probe tanto a pesca dos caranguejos fmea quanto dos caranguejos pequenos.

    Na RESEX de Maracan existem populaes extrativistas tradicionais, cuja subsistncia baseia-se no extrativismo com a retirada de caranguejos do mangue e, complementarmente, na agricultura de subsistncia com destaque para a mandioca utilizada principalmente na produo de farinha, e na criao de animais de pequeno porte, como por exemplo, a cabra, o porco, a galinha caipira e o pato.

    Quanto presena do gnero feminino na RESEX de Maracan, estas so caracterizadas como cnjuges ou companheiras de pescadores que complementam a renda familiar com suas atividades de pesca. As mulheres, que alm da dedicao aos trabalhos domsticos, tambm participam da pesca, aparecem em todas as comunidades. Na pesca do caranguejo, a participao feminina fica exclusivamente por conta do beneficiamento do crustceo, que assim que so trazidos do mangue pelos catadores, so lavados e cozidos no fundo do quintal de cada catador.

    Os caranguejos so cozidos base de lenha, para posterior retirada da carne (massa ou polpa) que vendida a quilo (Figura 5). De acordo com dados obtidos nas entrevistas, para formar um quilo de massa so necessrios trinta unidades de caranguejos ou de cem a cento e vinte patas do mesmo. E o quilo comercializado a um valor de R$ 20,00.

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    FIGURA 5: Mulheres no beneficiamento do caranguejo-u.

    O beneficiamento acontece no interior das prprias residncias, que em geral, so de alvenaria, porm, sem nenhuma espcie de acabamento estrutural, como reboco nas paredes ou revestimentos em cermicas nos pisos ou paredes. Em algumas comunidades, estas casas no possuem sequer pias ou sanitrios.

    A limpeza do pessoal e equipamentos empregados nesta atividade realizada antes e aps o processamento. Estes equipamentos so compostos por instrumentos bem rudimentares e de embalagens reaproveitveis. So exemplos, o pedao de madeira cilndrico utilizado para quebrar o casco dos caranguejos, os recipientes de produtos alimentcios, bacias, cestos artesanais feitos de palhas, entre outros. De acordo com alguns moradores, toda a produo comercializada, na sua grande maioria, em cidades vizinhas, feiras e restaurantes da cidade de Belm.

    Outra questo presente em Maracan e que diz respeito a problemas ambientais o lixo. O acmulo de lixo espalhado na comunidade, no entorno da sede da AUREMAR e em parte do mangue grande. No h disposio sanitria no local acompanhada de coleta seletiva por parte do poder pblico local. So comuns esgotos a cu aberto, fossas asspticas e banheiros improvisados a poucos metros da rea do manguezal, o que provavelmente pode estar poluindo os manguezais da regio.

    Quanto s polticas pblicas direcionadas conservao ambiental no interior das unidades de conservao no Brasil, esto sendo adotadas medidas de compensao ambiental para evitar o desmatamento e poluio do meio ambiente (mangues). O governo federal lanou em setembro de 2011, o programa Bolsa Verde e Bolsa Floresta, ambos voltados para moradores de UCs. O primeiro, entretanto, inclui tambm moradores de assentamentos de reforma agrria. Sobre essa questo, VIANA (2007) destaca que essa limitao espacial reflete um fio

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    condutor comum, pois so reas de grande valor ambiental, onde predominam populaes extrativistas e agricultores familiares tradicionais.

    Segundo o MINISTRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL (2011), o Bolsa Verde que condicionado por um plano de uso e de benefcios para evitar o desmatamento, atende aos beneficiados do programa Bolsa Famlia. Apesar dessa informao oficial, no foi identificada nenhuma famlia, das entrevistadas na RESEX de Maracan, beneficiada com o programa Bolsa Verde, muito embora todas as famlias questionadas neste trabalho fizessem parte do programa Bolsa Famlia.

    Em relao aos dados de biometria, a largura da carapaa dos indivduos amostrados (largura cefalotorcica) variou de 60,00 mm a 83,00 mm, com mdia de 72,01 4,45 mm, e o comprimento variou de 44,00 mm a 60,00 mm, sendo a mdia de 51,67 3,40 mm (Tabela 2). Como os catadores capturaram apenas caranguejos machos, no se tem dados biomtricos para os caranguejos-fmeas.

    Valores aproximados foram verificados em trabalhos de MELO (2000), onde foi determinada a biometria dos caranguejos comercializados em feiras de cinco municpios do estado do Par, encontrando as seguintes mdias do comprimento da carapaa (CC): 52,9 mm em Bragana, 56,9 mm em Curu, 53,7 mm em Maracan, 57,6 mm em So Caetano de Odivelas e 59,9 mm em Soure. J SOUSA et al. (2008), no esturio do rio Pacincia, Ilha do Maranho, descreveram a largura da carapaa (LC) mnima e mxima para as fmeas de So Lus, respectivamente, 48,4 mm e 81,4 mm e para os machos, mnima de 44,1 mm e mxima de 81,6 mm.

    TABELA 2: Tabela de estatstica descritiva dos dados biomtricos do caranguejo-u da RESEX Marinha de Maracan-PA.

    Medidas Lineares Sexo Mnimo Mximo Mdia Desvio Padro CC (mm) Macho 44,00 60,00 51,67 3,40 LC (mm) Macho 60,00 83,00 72,01 4,44

    PA (g) Macho 98,00 233,0 165,7 26,98 Comprimento da carapaa (CC). Largura da carapaa (LC). Peso do animal (PA). Fonte: Autores.

    Em 2003, uma portaria do IBAMA aumentou de 45 mm para 60 mm a largura mnima da carapaa do caranguejo-u permitida para cata. Animais com medida inferior a esta no podem ser capturados, coletados, transportados, beneficiados, industrializados e comercializados durante todo o ano.

    Assim, considerando a variao do tamanho mdio dos indivduos da espcie na RESEX (72,01 mm) onde a mdia da largura da carapaa est de acordo o novo valor estabelecido (60 mm) e partindo da premissa de que os catadores levaram em considerao a orientao dada a eles de que no realizassem nenhuma pr-seleo dos animais encomendados, a catao do caranguejo ocorre de forma sustentvel e de acordo com as regras estabelecidas pela legislao e pela gesto da reserva.

    Pescadores e/ou catadores de outras regies vm atuando naquela regio, aumentado a distncia de captura do caranguejo e a diminuio na quantidade retirada hoje. Isso ocorre devido falta ou deficincia de fiscalizao, de um plano de manejo, de educao ambiental e do respeito aos direitos dos extrativistas nativos.

    Porm, dados do relatrio de reas embargadas pelo IBAMA (MMA/IBAMA 2013) fortalecem a prtica de que para que a populao se conscientize da

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    existncia da RESEX, se faz necessria aplicao de algumas medidas punitivas descritas em legislao (Quadro 1). Fiscais do Instituto Chico Mendes da Biodiversidade (ICMBio), IBAMA e policiais do batalho de polcia ambiental do litoral paraense, realizam algumas operaes na RESEX de Maracan.

    As operaes tm como objetivo coibir o ritual da pesca predatria, a captura de animais silvestres e a ocupao irregular de reas desta UC. Durante uma destas operaes, foram aplicados autos de infrao, totalizando mais de R$ 140 mil reais em multas, apreendidas aproximadamente trs mil metros de redes utilizadas na pesca ilegal e 300 kg de pescado, doados associao de usurios da RESEX (AUREMAR). Alm disso, foram tambm apreendidas duas embarcaes e quinze pssaros nativos (ICMBio, 2013).

    Alm das apreenses e multas, foram embargados bares, pousadas e construes irregulares, ambas situadas em rea de preservao (Quadro 1). A equipe que comps a operao foi a campo para apurar e combater a prtica de ilcitos ambientais denunciadas equipe de gesto da Unidade pelas comunidades usurias. Alm disso, houve a sensibilizao da populao local sobre a importncia do uso equilibrado dos recursos naturais da regio (ICMBio, 2013).

    Quadro 1: Relatrio de reas Embargadas (com adaptaes) INICIAIS DOS NOMES DOS MORADORES

    DATA DO EMBARGO

    MUNICPIO LOCAL DA APREENSO E

    EMBARGO E. S. F. 15/09/2006 Maracan Estrada do Vale Verde

    N 08 / Ilha de Maiandeua. Vila

    Fortalezinha J. L. M. C. 02/05/2007 Maracan Rio Paracauari.

    Soure/PA. Tv. Aricur S/N

    M. L. P. X. 01/06/2009 Maracan Barraca Fenix. Ilha de Algodoal

    A. A. C. 01/06/2009 Maracan Marisca Bar. Praia de Algodoal

    D. O. M. 18/09/2009 Maracan Itaco. Maracan-PA A. S. C. 04/08/2011 Maracan Perm. s margens do rio

    Maracan, localizao central

    Fonte: MMA/IBAMA 2013,

    CONCLUSES O perfil socioambiental indicou que a partir da implementao do plano de

    gesto da RESEX de Maracan, houve certas melhorias. Acontece que a comunidade muito dividida e percebe-se atualmente que os interesses individuais/pessoais de membros da comunidade local acabam por reduzir as aes da AUREMAR. Com isso, problemas com resduos slidos, falta de condies higinico-sanitrias, degradao ambiental, e outros so comuns nesta RESEX.

    A pesquisa indicou que a maioria dos moradores da RESEX de Maracan-PA coleta o caranguejo desde a infncia, sendo que 82% dos respondentes tm na venda deste crustceo sua principal fonte de renda. Alm disso, os moradores desta RESEX complementam a renda com recursos do programa Bolsa Famlia do governo federal.

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    A biometria dos caranguejos indicou que os caranguejos esto sendo coletados com a largura mdia da carapaa igual a 72,01 mm que est bem acima do limite estabelecido pela legislao que de 60 mm, o que indica que a comunidade est respeitando o perodo de defeso estabelecido para este crustceo.

    Uma boa forma de reduzir os impactos ambientais de natureza antrpica nesta UC implantar programas de Educao Ambiental de cunho permanente. Com isso, so fortes as possibilidades de se mudar o status atual da RESEX de Maracan, pois se ampliam as possibilidades de uma maior sensibilizao ambiental da comunidade local, contribuindo assim, para o desenvolvimento sustentvel daquela UC, em termos ambientais, sociais, econmicos e culturais.

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