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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS CEJURPS CAMPUS ITAJAÍ CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA - NPJ SETOR DE MONOGRAFIA DEPOSITÁRIO INFIEL NO PROCESSO DE EXECUCÃO À LUZ DO ATUAL ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL AUGUSTO ZANCHETTA SILVA Itajaí (SC), Junho de 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS

CAMPUS ITAJAÍ

CURSO DE DIREITO

NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA - NPJ

SETOR DE MONOGRAFIA

DEPOSITÁRIO INFIEL NO PROCESSO DE EXECUCÃO À LUZ

DO ATUAL ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL

AUGUSTO ZANCHETTA SILVA

Itajaí (SC), Junho de 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS

CAMPUS ITAJAÍ

CURSO DE DIREITO

NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA - NPJ

SETOR DE MONOGRAFIA

DEPOSITÁRIO INFIEL NO PROCESSO DE EXECUCÃO À LUZ

DO ATUAL ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL

AUGUSTO ZANCHETTA SILVA

Monografia submetida à

Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI, como requisito parcial à

obtenção do grau de Bacharel em

Direito.

Orientador: Professor Gilson Amilton Sgrott

Itajaí (SC), Junho de 2010

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AGRADECIMENTO

Em especial ao meu pai Washington, minha

mãe Sueli e meu irmão Washington Junior,

por me proporcionar um sonho de vida, a

graduação no curso;

Ao Professor Gilson Sgrott, pela orientação

devida e paciência, pelo apoio, pela revisão

e contribuições teóricas, o que possibilitou a

elaboração deste trabalho;

À Universidade do Vale de Itajaí, pela

oportunidade e apoio concedido;

Aos meus amigos reconhecidos, em especial,

Carlos Búrigo, Jhonata Neves e Thiago Iba

pelo apoio e solidariedade ao longo dessa

caminhada, e a todos os professores pela

contribuição à minha formação acadêmica.

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DEDICATÓRIA

Este trabalho dedico aos meus pais,

Washington e Sueli.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total

responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho,

isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de

Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer

responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí (SC), 10 de junho de 2010

Augusto Zanchetta Silva

Graduando

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade

do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Augusto Zanchetta

Silva, sob o título DEPOSITÁRIO INFIEL NO PROCESSO DE EXECUCÃO À LUZ

DO ATUAL ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL, foi submetida em 10 de junho

de 2010 à banca examinadora composta pelos seguintes professores:

Gilson Amilton Sgrott, orientador e presidente da banca, e aprovada com

a nota [Nota] ([nota Extenso]).

Itajaí (SC), 10 de junho de 2010

Gilson Amilton Sgrott

Orientador e Presidente da Banca

Gilson Amilton Sgrott

Coordenação da Monografia

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SUMÁRIO

RESUMO ......................................................................................... VIII

INTRODUÇÃO .................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 4

PROCESSO DE EXECUÇÃO ............................................................... 4

1.1 VIAS DE EXECUÇÃO ........................................................................................ 4

1.2 O PROCESSO JUDICIAL ................................................................................... 6

1.3 PROCESSO DE CONHECIMENTO E PROCESSO DE EXECUÇÃO .................... 7

1.3.1 DIFERENÇAS ENTRE A EXECUÇÃO FORÇADA E O PROCESSO DE CONHECIMENTO. .......... 8 1.3.1.1 Realização da sanção: fim da execução forçada ............................................ 13 1.3.1.2 Espécies de sanções realizáveis por via de execução forçada ..................... 14 1.3.1.3 Execução forçada, cumprimento voluntário da obrigação e outras medidas de realização dos direitos subjetivos .......................................................................... 16 1.3.1.4 Meios de execução ............................................................................................ 18 1.3.1.5 Autonomia do processo de execução ............................................................. 20 1.3.1.6 Cumprimento da sentença e processo de execução ...................................... 21 1.3.1.7 Novos rumos da execução de sentença .......................................................... 23 1.3.1.8 A reforma da execução do título extrajudicial ................................................. 24 1.3.1.9 Direito intertemporal ......................................................................................... 25

CAPÍTULO 2 .................................................................................... 27

O DEPOSITÁRIO ............................................................................... 27

2.1 O DEPOSITÁRIO COMO AUXILIAR DE JUSTIÇA ............................................ 27

2.2 DIFERENÇA ENTRE DEPOSITÁRIO E ADMINISTRADOR .................................. 29

2.3 ESPÉCIES DE DEPOSITÁRIOS .......................................................................... 31

2.3.1 DEPÓSITO CONTRATUAL ..................................................................................... 33

2.3.2 DEPÓSITO JUDICIAL .......................................................................................... 34

2.3.3 NOMEAÇÃO ................................................................................................... 35

2.3.4 REMUNERAÇÃO DO DEPOSITÁRIO ........................................................................ 37

2.3.5 SUSPEIÇÃO E IMPEDIMENTOS .............................................................................. 38

2.3.6 RESPONSABILIDADE DO DEPOSITÁRIO ................................................................... 40

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CAPÍTULO 3 .................................................................................... 43

A PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL NO PROCESSO DE EXECUÇÃO À LUZ DO ATUAL ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL ........................................................................ 43

3.1 BASE CONSTITUCIONAL ................................................................................ 43

3.1.1 PARIDADE ENTRE OS TRATADOS INTERNACIONAIS E O DIREITO INTERNO ...................... 45

3.1.2 RELAÇÃO DE STATUS CONSTITUCIONAL AOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS

HUMANOS ................................................................................................................ 47

3.2 CONSTRUÇÃO JURISPRUNDENCIAL, PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL

FEDERAL ................................................................................................................ 49

3.3 EDIÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE 25 E SEUS REFLEXOS ............................. 54

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................ 57

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ................................................ 59

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RESUMO

O interesse pela pesquisa do tema abordado no

presente trabalho, surgiu em virtude da divergência existente durante um

longo período no ordenamento jurídico brasileiro, em face da

constitucionalidade ou inconstitucionalidade da prisão civil do depositário

infiel.

Durante esse período de controvérsias, o

entendimento doutrinário, bem como o entendimento do Supremo

Tribunal Federal, e demais órgãos, travaram fortes embates. A doutrina

majoritária sempre entendeu ser inconstitucional a decretação da prisão

civil do depositário infiel.

A respeito do posicionamento do Supremo Tribunal

Federal, através da pesquisa, foi detectado que durante um bom tempo

admitia-se a medida coercitiva, porém com a adesão do Brasil aos

tratados internacionais de direitos humanos, essa visão foi alterada.

A partir da dessa adesão a Corte Suprema entendeu

por aplicar as disposições de tratados internacionais, em especial da

Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH), conhecida como

Pacto de São José da Costa Rica, para não mais possibilitar a prisão civil

do depositário infiel. Em que pese todas as normas sobre a questão

referirem-se à impossibilidade da prisão por dívida, em decorrência de

obrigações de natureza civil, a Corte Constitucional aplicou o mesmo

entendimento à figura do depositário judicial, não obstante a existência

de significativa diferença entre este e o depositário civil.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto e está

fundamentada na pesquisa que objetivou, com base em legislação

vigente, em doutrina e no entendimento jurisprudencial, determinar e

expressar o entendimento atual quanto à constitucionalidade ou

inconstitucionalidade da prisão civil do depositário infiel.

Trata-se do Depositário Infiel no Processo de Execução

à Luz do Atual Entendimento Jurisprudencial.

O seu objetivo institucional é produzir uma monografia

jurídica para obtenção de grau de bacharel em Direito, pela Universidade

do Vale do Itajaí – UNIVALI, e o objetivo investigatório é demonstrar os

aspectos relevantes acerca da citada teoria.

Para tanto, principia–se, no primeiro capítulo, será

abordado o processo de execução, como destaque, discorrendo sobre

vias de execução, processo de conhecimento e processo de execução e

suas diferenças, espécies de sanções realizáveis por via de execução

forçada, bem como meios de execução.

Já no segundo capítulo, será abordado como foco o

depositário, tratando da figura do depositário como auxiliar de justiça,

diferença entre depositário e administrador, espécies de depositário,

como ocorre sua nomeação e remuneração, suspeições e impedimentos,

bem como a responsabilidade do depositário.

No terceiro capítulo e último momento, tratando sobre

a prisão civil do depositário infiel no processo de execução à luz do atual

entendimento jurisprudencial, destacando base constitucional, paridade

com tratados internacionais de direitos humanos, relação de status

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constitucional dos tratados internacionais de direitos humanos, construção

jurisprudencial apresentando precedentes do supremo e a edição da

súmula vinculante n. 25 e seus reflexos.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das

reflexões sobre o Depositário Infiel no Processo de Execução à Luz do Atual

Entendimento Jurisprudencial.

Para a presente monografia foram levantadas as

seguintes hipóteses:

A decretação da prisão civil do depositário infiel seria

inconstitucional, seja qual for sua modalidade de depósito.

Há na jurisprudência medidas alternativas para o caso

de o depositário ser considerado infiel.

Com base nestas questões foram elaboradas as

seguintes hipóteses:

a ) Com a solidificação de entendimento, em sessão

Plenária realizada na data de 16.12.2009, a Suprema Corte editou a

respectiva Súmula Vinculante de n. 25: “É ilícita a prisão civil de depositário

infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”. Assim, resta por ser

inconstitucional a medida prisional do depositário infiel.

b ) De todo o estudo realizado, através de pesquisas

doutrinárias e jurisprudencial, não foi possível identificar meios alternativos

consolidados para o caso de o depositário ser considerado infiel. Todavia,

abre-se a questão de que o depositário infiel na qualidade de auxiliar de

justiça poderá incorrer em crime de peculato, ai parece ser a melhor

alternativa encontrada na referida pesquisa.

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Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na

Fase de Investigação1 foi utilizado o Método Indutivo2, na Fase de

Tratamento de Dados o Método Cartesiano3, e, o Relatório dos Resultados

expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Técnicas do Referente4, da Categoria5, do Conceito Operacional6 e da

Pesquisa Bibliográfica7.

Ainda, registra-se que as categorias fundamentais para

a monografia, bem como os seus conceitos operacionais serão

apresentados no decorrer da monografia.

1 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido[...]. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. 10 ed. Florianópolis: OAB-SC editora, 2007. p. 101.

2 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 104.

3 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

4 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 62.

5 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 31.

6 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 45.

7 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 239.

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CAPÍTULO 1

PROCESSO DE EXECUÇÃO

1.1 VIAS DE EXECUÇÃO

Quando o Estado atua no exercício da jurisdição, o faz

de forma substitutiva. Assim, atuando no lugar dos particulares, quando

estes não encontram um modo pacífico de solucionar seus próprios

problemas, o Estado é invocado, através do meio judicial, para dar a

solução ao caso concreto, à lide.

Ocorre que, mesmo depois de alcançado a solução

judicial, mesmo reconhecido o direito do autor, a parte ré pode resistir em

cumprir com o que foi determinado judicialmente. Diante desta situação

da insatisfação da parte autora, que já tem seu direito assegurado e

garantido, há que se oferecer meio para que este não fique apenas com

uma sentença em mãos, dando sim, cumprimento ao que lhe fora

assegurado. Assim, novamente buscando do Estado através do poder

judiciário é que alcançara a solução de seu percalço.

Assim explica o doutrinador Wambier8:

A sentença com eficácia condenatória proferida em

processo judicial civil, em regra, deixa de ser executada em

processo autônomo. Sua execução passa a ocorrer dentro

do próprio processo em que ela foi proferida. Na mesma

relação processual, passa a haver uma frase de execução,

posterior à fase conhecimento.

8 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil v. 2. 9 ed. São Paulo: Revista

dos Tribunais. 2006/2007, p. 281.

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Atualmente, com as alterações e inovações do

Código de Processo Civil, apresenta-se duas formas para alcançar tal

solução, em busca da chamada execução forçada. Uma delas é a do

cumprimento de sentença encontrado no Livro I, Título VIII, Capítulo X e a

outra forma é a do processo de execução encontrado no Livro II, ambos

no Código de Processo Civil.

A primeira nada mais é do que a continuação do

processo após a decisão e transcorrido o transito em julgado da sentença.

Amaral Santos9 explica o caminho a ser traçado para se chegar à fase de

cumprimento de sentença:

O condenado cumpre, voluntariamente, ou não o

mandamento condenatório, isto é, satisfaz,

voluntariamente, ou deixa de satisfazer a obrigação – de

dar, fazer ou não fazer – cujo cumprimento lhe foi imposto

pela sentença. No primeiro caso satisfaz o direito do credor;

no segundo caberá ao credor provocar novamente o

órgão judiciário, o Estado, para que, coativamente, execute

a sentença, tornando efetiva a regra sancionadora. Na

sentença condenatória está o título em que se funda o

credor para provocar o órgão judiciário. Título judicial.

A segunda, processo de execução, nas palavras de

Montenegro Filho10:

[...] a execução é o instrumento processual posto à

disposição do credor para exigir o adimplemento forçado

da obrigação através da retirada de bens do patrimônio do

devedor ou do responsável (no modelo da execução por

quantia certa contra devedor solvente), suficientes para a

plena satisfação do exeqüente, operando-se no benefício

deste e independentemente da vontade do executado – e

9 AMARAL SANTOS, Moacyr. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. 22 ed. São Paulo:

Saraiva. 2008, p. 234. 10 MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de Direito Processual Civil. Teoria dos Recursos em

Espécie e Processo de Execução. 4 ed. São Paulo: Atlas S.A, 2007, p. 229.

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mesmo contra sua vontade – conforme entendimento

doutrinário unânime.

Considera-se desta forma que a real intenção do

legislador foi na verdade criar um único procedimento, o que acarretou o

aglutinamento do processo de cognição com o de execução, criando o

que chamamos de processo sincrético, o sincretismo processual, retirando

o caráter absoluto de processo autônomo, existente anterior à reforma,

em relação ao processo de conhecimento.

1.2 O PROCESSO JUDICIAL

É lógica a diferença entre o processo de atuação do

Poder Jurisdicional e o processo de conduta geral do homem, todavia,

ainda sim se pode observar alguma igualdade no modo de operar.

O homem, por instinto ao conhecer um determinado

fato, munido do estado de vontade, age. Certo que nem sempre com a

razão. Quase que de modo similar, o órgão judicial, quando acionado,

diante da lide, primeiro conhece os fatos e os direitos a ele pertinentes,

para que em um segundo momento decida, aqui buscando sempre a

certeza.

Nesse sentido coaduna o doutrinador de Theodoro

Junior11:

Há, pois, no processo judicial a atividade de conhecimento

e a de execução, formando os dois grandes capítulos de

sistemática jurídica de pacificação social, sob o império da

11 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. 42 ed. Rio de

Janeiro: Forense, 2008, p. 122.

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ordem jurídica, cujo objetivo maior é a eliminação da lides

ou litígios nos relacionamento humano, para tornar possível

a vida em sociedade.

Seguindo essa linha, pode-se afirmar que quase todos

os processos obedecerão a essa seqüência lógica. Todavia, ressaltam-se

as palavras de Amaral Santos12:

E ainda há aqueles em que a lei reconhece a existência de

uma sanção para a hipótese do inadimplemento da

obrigação. São títulos executivos extrajudiciais, os quais, por

declaração expressa ou presunção legal, atribuem ao

credor certeza de direito bastante para mover o órgão

judiciário a tornar efetiva a regra sancionadora, quando o

devedor deixa de cumprir a obrigação.

Desta forma, fica evidente há existência de casos em

que a certeza sobre o direito perseguido já esta segurada, através dos

chamados títulos executivos extrajudiciais, que por possuírem tal certeza

dispensam o processo de conhecimento, passando a utilizar já de primeiro

plano a execução forçada.

1.3 PROCESSO DE CONHECIMENTO E PROCESSO DE EXECUÇÃO

É sabido que conhecer e executar são atividades que

estarão sempre conectadas, todavia há que se fazer à ressalva quanto ao

título executivo extrajudicial, este é a exceção à regra, uma vez que

possui expressa autorização legal.

A respeito do tema, explica o doutrinador Theodoro

Junior13:

12 AMARAL SANTOS, Moacyr. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. 22 ed. São Paulo:

Saraiva. 2008, p. 234.

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[...] a obrigatoriedade da conexão entre conhecer e

executar, contudo, não exclui a possibilidade de admitir-se

o conhecimento do direito subjetivo do credor operado em

vias extraprocessuais. Assim é que existem procedimentos,

fora do campo do processo judicial, que geram título

executivo equivalente à sentença condenatória.

Entretanto, mesmo com a permissão dada ao credor,

em ter em seu benefício à execução forçada através de título executivo

extrajudicial, não excluirá a hipótese de eventuais discussões dentro do

processo, uma vez que a parte devedora poderá se insurgir quanto ao

crédito da parte credora através dos embargos à execução.

Através desta defesa, percebe-se que sobre o

processo de execução também incide o princípio do contraditório.

Todavia, de modo mais limitado, uma vez que a parte devedora, por

exemplo, não poderá discutir a existência ou inexistência do direito que já

se encontra assegurado pelo título extrajudicial.

Assim, munido deste título executivo, a parte credora

poderá fazer valer-se da execução forçada, em tese, obtendo o resultado

de sua pretensão de maneira mais célere, uma vez que já existe certeza,

liquidez e exigibilidade no título manejado.

1.3.1 Diferenças entre a execução forçada e o processo de

conhecimento.

No decorrer do estudo sobre as diferenças entre

ambos os procedimentos, observaremos que embora haja suas

13 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. 42 ed. Rio de

Janeiro: Forense, 2008, p. 123.

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diferenças, um é complemento do outro. Todavia, antes de adentrarmos

as diferenças existentes, passamos a analisar conceitualmente cada um.

Para Frederico Marques14, a execução forçada é:

A execução forçada é um processo – o chamado processo

de execução – pelo que é constituída por um conjunto de

atos praticados pelo litigante, o juiz e respectivos auxiliares,

a fim de ser dado a cada um o que é seu. O órgão

judiciário nele atua jurisdicionalmente, a fim de compor o

litígio, que resultou de ter ficado insatisfeita uma pretensão.

Seguindo a mesma linha de pensamento, para Amaral

Santos15:

E aí se tem a execução forçada, ou, simplesmente,

execução, que é o processo pelo qual o Estado, por

intermédio do órgão jurisdicional, e tendo por base um título

extrajudicial, empregando medidas coativas, efetiva e

realiza a sanção. Pelo processo de execução, por meio de

tais medidas, o Estado visa a alcançar, contra a vontade do

executado, a satisfação do direito do credor.

Quanto ao processo de conhecimento, conceitua

Wambier16:

O processo de conhecimento é aquele em que a parte

realiza afirmação de direito, demonstrando sua pretensão

de vê-lo reconhecido pelo Poder Judiciário, mediante a

formulação de um pedido, cuja solução será ou no sentido

positivo ou no sentido negativo, conforme esse pleito da

parte seja resolvido por sentença de procedência ou de

improcedência.

14 FREDERICO MARQUES, José. Manual de Direito Processual Civil. 9 ed. São Paulo:

Millennium, 2003, p. 1. 15 AMARAL SANTOS, Moacyr. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. 22 ed. São Paulo:

Saraiva. 2008, p. 234. 16 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil. Teoria Geral do Processo e

Processo de Conhecimento. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 115.

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10

No processo de conhecimento, o magistrado analisa o

caso, realizando uma ampla cognição para descobrir a regra a ser

aplicada em questão, atividade lógica, por outro lado, no processo de

execução, o magistrado aplica as medidas práticas necessárias para

efetivar o direito da regra aplicada, atividade material.

Dando maior magnitude quanto ao tema, de acordo

com Montenegro Filho17:

[...] na jurisdição de conhecimento, preocupa-se o

representante do Poder Judiciário com a certificação do

direito, ou seja, com a declaração da titularidade do bem

material envolvido no litígio, atestando se a ratio está com o

autor ou se, em sentido contrario, pende em favor do réu. A

jurisdição de conhecimento envolve-se com a busca da

verdade formal, sabido que a moderna processualística

abandona a preocupação com a busca cega pela

verdade real, contentando-se com o juízo de probabilidade

da existência do direito afirmado pelo autor.

Pode acontecer que no decorrer do processo, o

magistrado se depare com a verdade real, assim estaremos de frente com

a situação ideal, uma vez que o juiz poderá aplicar com exatidão o direito

perseguido pelo o autor. Todavia, caso não se depare com a verdade

real, poderá prestar a tutela jurisdicional, bastando que possua um juízo de

aproximação em favor de uma das partes.

Como já mencionado anteriormente a atuação do

Estado no processo de execução é uma atuação de caráter substituto.

Desta forma, apenas quando aquele que foi obrigado a cumprir

determinada ordem não o faz voluntariamente é que haverá intervenção

do órgão judicial.

17 MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de Direito Processual Civil. Teoria dos Recursos em

Espécie e Processo de Execução. 4 ed. São Paulo: Atlas S.A, 2007, p. 225.

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11

Excetuando as execuções de títulos extrajudiciais,

antes da Lei n. 11.232, de 22 de dezembro de 2005, que passou a vigorar a

partir do mês de junho de 2006, após a sentença na ação cognitiva, a

parte tinha que impetrar com uma nova ação, quando o devedor não

cumpria voluntariamente com o determinado em sentença, formando-se

um segundo procedimento, o processo de execução. Desta forma,

exigindo-se pagamento de custas, nova distribuição, citação do devedor,

prazo para defesa, toda ritualística processual que atrasa

consideravelmente o direito perseguido.

Quando entrou em vigor a Lei supracitada, alterou-se o

procedimento adotado. Não mais se fez necessário a impetração de

processo de execução autônomo para buscar a pretensão após a

sentença de mérito. Na atual processualística, a jurisdição executiva

passou a ser uma fase posterior a fase de conhecimento.

É evidente que na utilização do antigo procedimento o

tempo utilizado para se alcançar o direito perquirido era demais

demasiado. Assim explica categoricamente o doutrinador Montenegro

Filho18:

A moderna processualística já não mais consegue conviver

com os retardos injustificados do processo, apoiando-se no

esperado convívio com um processo de resultados. Em vista

disso, e como indicado em outras passagens da obra, hoje

se constata que o Estado não se desincumbe da função

jurisdicional quando elimina o conflito de interesses de forma

tardia, mas apenas quando espanca o conflito no menor

espaço de tempo possível, o que não é tarefa singela, em

vista dos princípios que norteiam o processo civil,

sobrelevando ressaltar o princípio do contraditório e da

ampla defesa.

18 MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de Direito Processual Civil. Teoria dos Recursos em

Espécie e Processo de Execução. 4 ed. São Paulo: Atlas S.A, 2007, p. 228.

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12

Assim, quando a obrigação não for adimplida

voluntariamente pelo devedor, o magistrado de modo coercitivo inicia a

fase de cumprimento de sentença. Cabe frisar, que tal fase não exclui da

parte devedora os meios de defesa sobre questões que surgem no

decorrer do processo.

Ainda, em análise as diferenças entre os

procedimentos de conhecimento e execução, principalmente a garantia

de defesa no processo de execução, assevera o doutrinador Theodoro

Junior19:

Não é exato, afirmar o caráter não contraditório do

processo de execução. Não é de sua índole colocar em

contraditório o direito material já acertado no título

executivo. Não pode, todavia, fugir do contraditório

relacionado com a pretensão e prática dos atos executivos,

mesmo porque, por garantia constitucional, nenhum

processo, seja de que natureza for, poderá se desenvolver

sem o respeito ao contraditório e ampla defesa (CF, art. 5,

inc. LV).

Do que foi exposto neste item, fica evidenciado o

sincretismo da processualística atual, muito embora processo de

conhecimento e processo de execução possuam finalidades diferentes,

ao mesmo tempo possuem finalidades complementares, proporcionando

no conjunto da obra uma visão unitária da função jurisdicional.

19 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 124.

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13

1.3.1.1 Realização da sanção: fim da execução forçada

Quando o credor possui em mãos o título executivo,

tem consigo a prova de seu direito, exigindo-se assim a prestação

imediata do Estado. Todavia, quando há o inadimplemento do devedor,

resistindo a cumprir com sua obrigação, manifesta-se a necessidade da

realização da coação.

Bem relacionado quanto ao assunto Frederico

Marques20 distingue as atuações do Estado quanto à existência de título e

a inadimplência do devedor:

A existência de título executivo (nulla executio sine titulo) é o

que torna a prestação imediatamente exigível pelos meios

coativos da execução forçada, enquanto o

inadimplemento do devedor é que faz necessária a

coação estatal, criando situação de fato que vai levar o

Estado, no exercício da função jurisdicional, a tornar efetiva

a prestação.

A existência de um título, seja ele extrajudicial ou

judicial, faz com que nasça a relação jurídica entre determinados sujeitos,

aplicando-se as regras jurídicas existentes. Theodoro Junior21, de forma

clara explica a relação jurídica:

As regras jurídicas são de incidência obrigatória ou coativa.

Sob seu império nascem direitos subjetivos de determinadas

pessoas a que correspondem obrigações e deveres de

outras. Esse vínculo entre pessoas que dá a umas o poder

de exigir e a outras a sujeição a ter de realizar certas

prestações, é o que se denomina relação jurídica.

20 FREDERICO MARQUES, José. Manual de Direito Processual Civil. p. 2. 21 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 125.

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14

Quando falamos em coação de ordem jurídica,

devemos falar no sistema especial que se manifesta através das sanções.

Estas sanções são aplicadas quando uma norma é desobedecida e ao

mesmo tempo violado o direito subjetivo do credor. Nessa situação, o

Estado, uma vez acionado, intervirá para sanar a ordem jurídica violada,

atribuindo os direitos e deveres de cada parte, mesmo que contrária à

vontade destas.

Para entendermos melhor o que é sanção, Theodoro

Junior22 conceitua da seguinte maneira:

A sanção, no plano patrimonial, que é o que interessa à

execução forçada, traduz-se em medidas praticas que o

próprio ordenamento jurídico traça para que o Estado

possa invadir a esfera de autonomia do indivíduo e fazer

cumprir efetivamente a regra de direito.

As sanções na área civil apresentam o caráter

reparatório. Tem como principal função recompensar a parte que sofreu o

dano e/ou prejuízo causado injustamente pela parte contrária. Sempre

buscando a satisfação daquele que sofreu um mal injustificado.

1.3.1.2 Espécies de sanções realizáveis por via de execução forçada

Como já estudado, é através da execução forçada

que o credor vai ter uma resposta mais objetiva quando ao seu ensejo.

Quando o Estado, acionado pelo credor, intervém no patrimônio da parte

credora, o faz com sua vontade de sancionar.

22 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 125.

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15

Theodoro Júnior 23 coaduna com o assunto da seguinte

forma:

Através de execução forçada, o Estado intervém no

patrimônio do devedor para tornar efetiva a vontade

sancionatória, realizando, à custa do devedor, sem ou até

contra a vontade deste, o direito do credor.

Interessante observar tamanha a grandeza desta

vontade sancionatória do Estado, que até mesmo quando a parte

devedora se insurge, ainda haverá a busca pela satisfação. Sempre

objetivando, na medida do possível, o resultado mais favorável em vista

da regra jurídica descumprida pela parte devedora.

Em grande parte, a atuação da sanção será através

de penhora, com a conseqüente retirada de bens da parte devedora

para que através deste patrimônio seja possível realizar o pagamento da

dívida obtida contra o credor do crédito. Todavia, há situações em que

um determinado sujeito tem em seus domínios algo que não é de seu

direito, assim, quando este se insurge em devolver a coisa em questão, a

atuação da sanção, neste caso, terá como foco a retirada desta coisa e

a entrega ao seu legítimo dono.

Percebe-se assim, duas formas de atuação

sancionatória do Estado, na execução forçada. Theodoro Júnior24 as

exemplificas como execução específica ou como execução da

obrigação subsidiária da seguinte maneira:

Na execução específica realiza o órgão executivo a

prestação devida, como, por exemplo, quando entrega ao

credor a própria coisa devida ou a quantia que

corresponde, precisamente, ao título de crédito. Na

23 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 125. 24 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 126.

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16

execução de obrigação subsidiária, o Estado expropria

bens do devedor inadimplente e com o produto deles

propicia ao credor um valor equivalente ao desfalque

patrimonial derivado do inadimplemento da obrigação

originária.

Muito embora existam esses dois modos de atuação

do estado para aplicação da sanção, ambos têm a mesma finalidade,

qual seja, a busca pela satisfação do crédito de direito do credor. Pode

ser através da reparação do prejuízo causado ou através da entrega da

coisa devida.

1.3.1.3 Execução forçada, cumprimento voluntário da obrigação e

outras medidas de realização dos direitos subjetivos

Assevera o doutrinador Frederico Marques25:

O inadimplemento é tão-só pressuposto prático da

execução, por introduzir situação de fato que compele o

credor a pedir a tutela jurisdicional, para coagir o devedor a

cumprir a prestação contida no título executivo.

Sendo assim, quando o devedor torna-se inadimplente,

bem como quando descumpre com sua obrigação, haverá a chamada

execução forçada. Todavia, pode ocorrer que a parte devedora de

modo voluntário e antes de perder os seus bens pague o débito,

impedindo a perda dos mesmos.

Assim estabelece o artigo 651 do Código de Processo

Civil:

25 FREDERICO MARQUES, José. Manual de Direito Processual Civil. p. 2.

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17

Art. 651. Antes de adjudicados ou alienados os bens, pode

o executado, a todo tempo, remir a execução, pagando o

consignando a importância atualizada da dívida, mais juros,

custas e honorários advocatícios.

Sendo assim, estará a parte devedora, de modo

voluntário se esquivando de sofrer as medidas coativas da execução

forçada. De outro modo, pode ocorrer que os atos de execução forçada

sejam realizados somente depois da citação inicial, no devido curso da

ação executiva, ou depois de transcorrido o transito em julgado da

sentença em ação cognitiva.

Quanto ao tema, o doutrinador Theodoro Júnior26, faz

as seguintes ponderações:

Por execução forçada, outrossim, considera-se o conteúdo

do processo de execução, que consiste na realização,

material e efetiva, da vontade da lei através da função

jurisdicional do Estado. Providências executivas tomam-se

de ordinária no processo de execução, cujo único objetivo

é realmente a satisfação compulsória do direito do credor

atestado no título executivo. Ocorre, porém, execução

forçada também no cumprimento de sentença, quando a

satisfação do direito violado é imediatamente promovida

por atos processuais realizados em seqüência à

condenação, dentro, portanto, do próprio processo em que

se efetuou o acertamento do direito controvertido entre as

partes (art. 475-I, caput).

Percebe-se que a execução forçada possui como

escopo uma atuação diferente das demais medidas utilizadas pelo

devedor, uma vez que possui como principal característica a atuação

jurisdicional através de atos processuais visando à satisfação do crédito

exeqüendo.

26 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 126.

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18

Coaduna com o assunto o doutrinado Theodoro

Júnior27:

O adimplemento pelo próprio devedor é ato diverso da

execução, porque traduz conduta espontânea. A

autodefesa, hoje quase que totalmente eliminada da esfera

patrimonial do direito, só subsiste, em caráter excepcional,

em casos expressos como a do desforço imediato para

repelir os atentados à posse (Código Civil de 1916, art. 502;

CC de 2002, art. 1.210, § 1º). É procedimento diverso da

execução forçada porque representa emprego de força

privada na tutela do direito subjetivo em vias de ser lesado.

E, finalmente, as “execuções administrativas” ou “privadas”,

também excepcionais, não representam execução forçada

porque estranhas à atividade jurisdicional e não isentas de

posterior revisão em demandas judiciais.

Feitas as devidas anotações, resta clara a diferença

entre a atuação da execução forçada em relação ao cumprimento

voluntário e as outras medidas de realização dos direitos subjetivos

expostos na citação supra mencionada.

1.3.1.4 Meios de execução

Quando falamos em meios de execução, estamos

construindo a análise dos modos que o Estado se serve para disciplinar e

manter a ordem na esfera jurídica. Atualmente, como forma de sanção,

podemos classificar dois meios de execução, os de coação e os de sub-

rogação.

27 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 127.

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19

Theodoro Júnior28 elucida meios de coação da

seguinte forma:

Entre os meios de coação, citam-se a multa e a prisão, que

se apresentam como instrumentos intimidativos, de força

indireta no esforço de obter o respeito às normas jurídicas.

Não são medidas próprias do processo de execução, a não

ser em feitio acessório ou secundário.

Assim, percebendo ser do Estado o poder de coação,

este tem de exercê-lo de algum modo e é por intermédio do juiz que será

exercido tal poder, até onde o título executivo possibilitar.

Por terem a característica de força indireta, estes meios

de coação servem de utilidade para não incorrer em fraudes no processo

de execução, evitando assim, um desperdício desnecessário de tempo

para alcançar o direito do credor.

De outro norte, os meios de sub-rogação, como já

estudado no presente trabalho de conclusão de curso, é quando o Estado

atua como substituto da parte devedora, utilizando-se de sua

colaboração ou até mesmo contra sua vontade, a busca pela satisfação

do crédito da parte credora.

Segundo o doutrinador Theodoro Júnior29:

Não se deve, outrossim, confundir a execução com o

cumprimento da obrigação pelo próprio devedor, muito

embora, em linguagem comum, seja usual a sinonímia entre

adimplemento e execução.

Visto assim, afirma-se que quando houver invasão de

forma coercitiva na esfera patrimonial do devedor, haverá a execução

28

THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 127. 29

THEODORO JUNIOR, Humberto. Processo de Execução. 22 ed. São Paulo: Universitária

de Direito, 2004, p. 47.

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20

forçada pelos meios da sub-rogação, do contrário, uma vez não agredido

o patrimônio da parte devedora, não há que se falar em execução

forçada.

1.3.1.5 Autonomia do processo de execução

O processo de cognição e o processo de execução

possuem funções diferentes, enquanto o processo de cognição busca a

solução do litígio através da verdade material, o processo de execução

busca efetivar o direito do credor através de atos processuais para

satisfazer suas pretensões.

Antes de entrar em vigor a Lei 11.232/2005, era

necessária a instauração de um processo de execução para o

cumprimento forçado da sentença. Atualmente não mais se faz

necessário. O que ocorre agora, em caso de sentença condenatória, é a

continuação do processo nos mesmo autos, chamada fase de

cumprimento de sentença. Assim cognição e execução visto como

sistema processual unitário.

Mesmo diante desta visão unitária de procedimento,

Theodoro Júnior 30 esclarece que a autonomia do processo de execução

ainda persiste sobre dois aspectos:

a) o processo de conhecimento em muitos casos se exaure,

dando satisfação completa à pretensão do litigante sem

necessidade de utilizar o mecanismo do processo de

execução (basta lembrar os casos resolvidos por meio de

sentenças declaratórias e sentenças constitutivas);

30 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 128.

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21

b) o processo de execução não pressupõe,

necessariamente, uma previa definição por meio do

processo de conhecimento (os títulos executivos

extrajudiciais permitem o acesso à atividade jurisdicional

executiva, sem qualquer acertamento judicial sobre o

direito do exeqüente).

Deste modo, resta claro que pode haver a

composição de uma lide sem a necessidade do processo de execução,

bem como, a composição de um litígio ser alcançada apenas com o

processo de execução, sem a necessidade de passar por um processo

cognitivo.

Da análise, a parte autora, reconhecido seu direito em

ação cognitiva em receber determinada quantia ou receber uma coisa,

não terá necessidade de recorrer ao processo de execução. Salvo, nos

casos em que a parte vencida insurgir quanto a sua obrigação, nestas

situações o direito da parte vencedora será alcançado nos mesmos autos

onde fora proferida a sentença condenatória.

Por outro lado, a parte que tiver um título executivo

extrajudicial em mãos, terá a necessidade de manejar um processo de

execução para alcançar seu crédito.

1.3.1.6 Cumprimento da sentença e processo de execução

Assevera o doutrinador Theodoro Júnior31:

A realização material do direito do credor não é mais objeto

exclusivo do processo de execução. O processo de

conhecimento quando atinge o nível da condenação não

31 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 129.

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22

se encerra com a sentença. Prossegue, na mesma relação

processual, até alcançar a realização material da

prestação a que tem direito o credor e a que está obrigado

o devedor. O cumprimento de sentença é ato do ofício do

juiz que a profere (executio per oficium iudicis).

Sobre essa vertente é que se denomina o sincretismo

processual. Agora, quando encerrada a fase de conhecimento, da-se

continuidade no mesmo processo, buscando a satisfação da parte

credora, através da fase de cumprimento de sentença.

Todavia, quando se busca a satisfação ou realização

material do direito do credor, direito este já acertado por um título

executivo extrajudicial, será através do processo de execução. Cabe frisar

que são meios diferentes e, apesar desta diferença de procedimento,

alguns meios utilizados no processo de execução são realizados na fase

de cumprimento de sentença para com isso alcançar a solução material

da prestação.

Dito isso, simplifica-se da seguinte forma. Para os títulos

judiciais, sentenças condenatórias e títulos semelhantes caberão a fase de

cumprimento de sentença. De outro norte, para os títulos executivos

extrajudiciais, caberá a processo de execução, que independe de uma

previa analise de processo cognitivo.

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23

1.3.1.7 Novos rumos da execução de sentença

Diante de uma enorme contingência de demandas

processuais, e do afogamento do poder judiciário, ocasionou-se uma forte

tendência a alterações no âmbito legislativo. As idéias são mutáveis

conforme as necessidades atuais do poder judiciário.

Assim explica o doutrinador Theodoro Júnior32:

Em nome da instrumentalidade do Direito Processual e da

efetividade da prestação jurisdicional, encaminhou-se para

um processo unitário, em que toda a atividade de

composição do conflito se dê numa única relação

processual. Assim, o juiz que emite sentença condenatória

se encarrega de promover-lhe o cumprimento logo após o

trânsito em julgado, sem que o credor tenha de instaurar um

novo processo de execução.

Diante do aumento de demanda dentro do poder

judiciário, o que não pode ocorrer é o engessamento das normas. Estas

que eram satisfatórias em décadas passadas, todavia que para os dias

atuais não mais se fazem eficientes. Assim, feliz foi o legislador em alterar a

processualística nos casos de sentença condenatória, renovando a

execução de sentença, passando de ação de execução propriamente

dita para fase de cumprimento de sentença, permitindo assim, uma

resposta do poder judiciário mais célere.

32 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 129.

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24

1.3.1.8 A reforma da execução do título extrajudicial

Tão logo foi reformada a execução de título judicial,

vieram às mudanças/reformas da execução do título extrajudicial. Com o

advento da Lei. 11.382, de 06 de dezembro de 2006, ocorrem diversas

alterações com o objetivo de dar devida efetividade e economia

processual ao procedimento executório.

Ao reformar a execução de títulos judiciais o legislador

unificou o procedimento de conhecimento com o de execução, assim

sendo, retirando a necessidade de impetração de ação de execução de

título judicial. Desta forma, simplificando a ritualística, tornou-se mais célere

o procedimento, favorecendo as partes envolvidas uma resposta do

poder judiciário bem mais efetiva.

Da mesma forma, buscando a efetividade e economia

processual, surgiu a reforma da execução de título extrajudicial. Na visão

de Theodoro Júnior33, tal reforma teve o seguinte pretexto:

Nota-se, numa visão geral da nova execução, a abertura

para oportunidade de atuação da partes com maior

autonomia e mais significativa influência sobre os atos

executivos e a solução final do processo. Com isso,

reconhece o legislador, acompanhando o entendimento

da melhor doutrina, que as partes não são apenas

figurantes passivos da relação processual, mas agentes

ativos com poderes e deveres para uma verdadeira e

constante cooperação na busca e definição do

provimento que, afinal, pela voz do juiz, virá pôr fim ao

conflito jurídico.

Evidente a vontade do legislador em fazer do processo

de execução, com o adveio da reforma através da Lei 11.382, de

33

THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 132.

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25

06.12.2006, um meio pelo quais as partes também atuem de modo

cooperativo no decorrer do processo. Cooperação entre as partes e o

magistrado, a exemplo do exeqüente que tem iniciativa em nomear bens

à penhora, bem como a parte executada pode substituir a penhora, sem

que com a mesma prejudique os interesses da parte exequente.

1.3.1.9 Direito intertemporal

Direito Intertemporal pode-se dizer ser o ramo da

ciência jurídica que busca solucionar as questões de maior relevância a

respeito da entrada em vigor de uma nova lei e como se dará a atuação

de relações jurídicas anteriores. Toda lei instituída no ordenamento está

sujeito à chamada vacatio legis, em outras palavras vacância da lei,

tempo em que a lei leva para definitivamente vigorar na esfera jurídica.

No caso da nova lei de execução, Lei de n. 11.382, de

06.12.2006, Theodoro Junior34, explica de modo detalhado quanto a sua

entrada em vigor da seguinte forma:

Segundo a técnica legislativa preconizada pelo §1° do art.

8° da Lei Complementar n. 95/1998, acrescido pela Lei

Complementar n. 107/2001, “a contagem do prazo para

entrada em vigor das leis que estabeleçam período de

vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e

do último dia do prazo, entrando em vigor no dia

subseqüente à sua consumação integral”. Somente,

portanto, a partir de 21 de janeiro de 2007 estará vigendo a

nova disciplina executiva.

34 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de Execução

e Cumprimento da Sentença Processo Cautelar e Tutela de Urgência. p. 132.

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26

Quando uma norma processual entra em vigor, surgem

sempre as questões quanto à aplicação desta nova norma em relação a

processos anteriores à lei instituída, bem como aos processos novos. Assim,

convém mencionar e fazer uma breve ressalva de alguns fatos

interessantes, objeto de discussão após a entrada em vigor da referida

disciplina executiva, tais qual o prazo para cumprir o mandado de

citação, dispensa de penhora para manejo dos embargos bem como

regras de impenhorabilidade.

Acrescenta o doutrinador Wambier35:

Nota-se, contudo, que me tais processos executivos

instaurados antes da Lei 11.232, embora não incidam as

regras do cumprimento da sentença, podem incidir as

inovações decorrentes da Lei 11.382/2006, nos atos que

venham a ser praticados depois do início de vigência dessa

lei. A diferença reside na circunstância de que, enquanto a

Lei 11.232 extinguiu uma modalidade de processo para

certos casos, criando outra forma processual em seu lugar, a

Lei 11.382 limitou-se a dar nova disciplina (ou criar novos

atos) dentro de uma forma processual já existente.

Considera-se assim que, após a vacância da lei

executiva, passando a vigorar referida lei, deve-se observar de imediato

sua aplicação. Esta aplicação imediata vale para os processos

impetrados anterior a Lei de n. 11.382 bem como terá aplicação imediata

para os processos que surgirem. Entretanto, haverão de ser respeitados

aqueles atos executivos já realizados em razão da norma anterior.

35

WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil v. 2. 9 ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais. 2006/2007, p. 289.

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27

CAPÍTULO 2

O DEPOSITÁRIO

2.1 O DEPOSITÁRIO COMO AUXILIAR DE JUSTIÇA

Para que um determinado juízo funcione de modo

pleno, para que existam reais condições de atuação, há a necessidade

de, além do magistrado, a figura dos auxiliares de justiça. Lembrando que

estes auxiliares realizaram atos determinados pelo magistrado. Ribeiro36

assim classifica os auxiliares da justiça:

Entre eles podem ser citados o escrivão, o chefe da

secretaria, o oficial maior (que substitui o escrivão nos seus

impedimentos), o escrevente autorizado, o oficial de justiça,

o distribuidor, o contador do Juízo, o partidor, o avaliador

judicial, o depositário judicial, o porteiro dos auditórios, o

leiloeiro e outros mais. É indispensável que exista uma infra-

estrutura de órgãos jurisdicionais subalternos, para que a

relação processual atinja o seu escopo.

O art. 139 do Código de Processo Civil traz a seguinte

classificação legal a respeito do tema:

Art. 139. São auxiliares do juízo, além de outros, cujas

atribuições são determinadas pelas normas de organização

judiciária, o escrivão, o oficial de justiça, o perito, o

depositário, o administrador e o intérprete.

36 RIBEIRO, Pedro Barbosa. Curso de Direito Processual Civil. São Paulo: IOB Thomson. 2005,

p. 283.

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28

Nery Junior 37 ao trabalhar com o conceito de auxiliares

da justiça, traz, além do conceito, em seqüência lógica, as figuras que se

enquadram como auxiliar de justiça, bem como suas atribuições e

previsões legais:

São funcionários, servidores públicos ou cidadãos comuns

(investidos de múnus público), que no exercício de seus

misteres atendem às determinações do juiz, dando

seqüência a atos de vital importância para o

desenvolvimento do processo e para a garantia da infra-

estrutura necessária ao exercício da jurisdição. Dirigem a

secretaria do cartório judicial e coordenam os trabalhos de

realização dos atos processuais, respondendo pela guarda

dos autos dos processos, como é o caso dos escrivães (CPC

141); encarregam-se de transmitir às partes e às demais

pessoas interessadas, a notícia da realização e existência

de atos processuais, efetivando as diligências necessárias à

seqüência do processo, como é o caso dos oficias de

justiça (CPC 143); executam tarefas necessárias à

elucidação dos fatos que serão objeto de análise pelo juiz,

fornecendo-lhe subsídios técnicos indispensáveis à

formação de seu convencimento, como é o caso dos

peritos (CPC 145); assumem o dever de guarda, vigilância e

administração de bens constritos judicialmente, como é o

caso dos depositários e dos administradores (CPC 150);

participam dos atos processuais para tornar conhecida

manifestação de vontade exposta em língua diferente da

nacional, ou em linguagem mímica, como é o caso dos

intérpretes (CPC 151); praticam atos específicos no processo

para resolver questão atinente à administração da justiça

ou à solução de pendências processuais, como é o caso do

partidor (CPC 1023), do distribuidor (CPC 253 par.ún.), do

porteiro dos auditórios e do leiloeiro (CPC 143 IV e 688

par.ún.).

Pode-se perceber que o depositário, da mesma forma

que os outros auxiliares supracitados, possuem uma importante função

37 NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante.

8 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 617/618.

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29

dentro do órgão judiciário. Devem, quando acionados pelo magistrado,

realizar os atos determinados. Agindo dessa maneira, estes auxiliares

garantem que o órgão judiciário mantenha seu pleno funcionamento,

bem como asseguram o desenvolvimento dos processos.

A palavra depositário é originária do vocábulo latim

deponere e designa pessoa a quem se entrega ou a quem se confia

alguma coisa, em depósito. Quando determinado sujeito se coloca na

posição de depositário a cumprir o compromisso assumido, configura-se

como um auxiliar da justiça.

2.2 DIFERENÇA ENTRE DEPOSITÁRIO E ADMINISTRADOR

O Código de Processo Civil, em sua Seção III, trata do

depositário e do administrador. Todavia, não faz nenhuma distinção

quanto às duas figuras, apenas demonstra suas funções e obrigações

devidamente expressas nos artigos 148, 149 e 150 do diploma

supramencionado.

Para se efetuar a distinção entre as duas figuras, se faz

necessário uma análise mais detalhada, para que assim se possa verificar

a existência de diferenças entre ambas. Ribeiro38 trata do assunto da

seguinte forma:

O depositário é aquele auxiliar da justiça que guarda,

conserva, e administra os bens depositados em Juízo,

penhorados, arrestados, seqüestrados, arrecadados etc.

Quando, na Comarca, não houver depositário público, o

juiz ou o oficial de justiça nomeia um depositário particular,

38 RIBEIRO, Pedro Barbosa. Curso de Direito Processual Civil. São Paulo: IOB Thomson. 2005,

p. 289.

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30

cargo este que pode ser exercido pelas próprias partes. Os

atos processuais que os depositários praticam são o

depósito, a guarda e a administração dos bens postos sob a

custódia do Poder Judiciário. (...) O administrador é uma

espécie de depositário que é nomeado pelo juiz para

hipótese excepcionais, como, por exemplo, o administrador

dos bens pertencentes àquele que teve a sua insolvência

decretada, na execução por quantia certa contra devedor

insolvente. Com efeito, dispõe o art. 761, I, do Diploma em

questão: “Na sentença, que declarar a insolvência, o juiz: I –

nomeará, dentre os credores, um administrador da

massa...”. Deverá, ele, a) arrecadar todos os bens do

devedor; b) representar a massa, ativa e passivamente; c)

praticar todos os atos conservatórios de direitos e ações; e

d) alienar, em praça ou leilão, os bens da massa (art. 766, I a

IV).

Diante das palavras de Ribeiro, resta evidente a

pequena diferença, todavia existente, entre depositário e administrador.

Enquanto o depositário pratica os atos de depósito, guarda e

administração de bens constritos pelo Poder Judiciário, o administrador,

em conformidade com o disposto nas alíneas do artigo 761 do Código de

Processo Civil, possui funções diversas do depositário.

Outrossim, Ribeiro menciona ser o administrador uma

espécie de depositário, que será nomeado apenas em casos

excepcionais, a exemplo da execução por quantia certa contra devedor

solvente, bem como para pagamento dos direitos do credor através do

usufruto da empresa.

Desta forma, constata-se que há diferença entre

depositário e administrador, mas parece a melhor solução chamar o

administrador de espécie de depositário, seguindo, assim, o pensamento

do doutrinador Ribeiro.

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31

2.3 ESPÉCIES DE DEPOSITÁRIOS

Em primeiro plano, cabe analisar as espécies de

depósitos, assim se faz necessário observar o que elucida o Código Civil

quanto ao assunto, uma vez que este traz expressamente duas formas de

depósito, quais sejam o depósito voluntário ou contratual e o depósito

necessário, este podendo ser classificado como aquele que se realiza em

razão de uma obrigação legal ou por acontecimento de alguma espécie

de calamidade.

Cabe frisar que é assim classificado o depósito

necessário, pelo fato de que, uma vez que um servidor público fica como

depositário, munido de atribuições de depositário, haverá o depósito legal

regido pela lei de Organização Judiciária. Por outro lado, quando o

depositário for nomeado para guardar coisa apreendida, arrestada ou

seqüestrada, haverá um contrato de depósito, entretanto de direito

público.

Nesse sentido elucida o doutrinador Santos39:

O depósito pode constituir-se contratualmente, mas

também acontece quando o depositário está com a

guarda da coisa, em desempenho de obrigação legal

(depósito de coisa penhorada, depósito de bens do espólio

pelo inventariante, etc.), ou quando a recebeu por ocasião

de alguma calamidade, com incêndio, inundação,

naufrágio ou saque. No primeiro caso, diz-se que o depósito

é voluntário (CC/2002, art. 627); nas outras hipóteses,

necessário (art. 647 do mesmo estatuto).

Essas formas de depósito são reguladas pela lei civil,

não se confundindo com a figura do depositário no processo de

39 SANTOS, Ernani Fidélis dos. Manual de Direito Processual Civil. 12 ed. São Paulo: Saraiva,

2009, p. 21.

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execução. Dito isso, feita a análise quanto ao depositário no direito civil,

passamos a diferenciá-lo do depositário no processo de execução. Assim

sendo, nas palavras do doutrinador Santos40, que diferencia da seguinte

forma:

Diversamente do depósito regulado pela lei civil, que é um

contrato pelo qual o depositário recebe coisa móvel com a

obrigação de guardá-la até que o depositante a reclame,

o depósito, de que se trata, é ato executório, e, pois, ato

processual, de direito público, pelo qual o depositário, de

nomeação dos órgãos jurisdicionais, ou de seus auxiliares,

tem o dever de guardar e conservar, e por vezes

administrar, os bens apreendidos até que o juiz mande

entregá-los a quem de direito.

Fica nítida a finalidade do depósito no processo de

execução, sendo um meio destinado à segurança da execução,

permitindo assim, a satisfação da parte credora. Para que haja essa

segurança é realizada a chamada penhora de bens do devedor. Assim,

para que fica mais claro o procedimento, é necessário entender que a

penhora representa também ato executivo, com eficácia satisfativa, onde

o Estado entra na esfera patrimonial do devedor para apreender algum

bem, com finalidade de satisfazer o crédito do credor.

Nesse sentido, uma vez constrito um determinado bem,

o órgão judicial ou algum de seus auxiliares, através do ato de nomeação

colocará como responsável pela guarda do referido bem determinado

sujeito, sujeito que terá deveres e obrigações conforme veremos adiante.

40 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. 22 ed. São Paulo:

Saraiva, 2008, p. 326.

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33

2.3.1 Depósito contratual

É o deposito que deriva de um contrato, sendo assim,

que deriva de um acordo entre as partes. Este contrato gera uma

obrigação real, uma vez que somente através da tradição que haverá o

contrato de depósito, não dependendo apenas da vontade das partes,

mas também, da entrega da coisa ao depositário.

Azevedo41 conceitua da seguinte forma o contrato de

depósito:

Contrato de depósito é guarda de uma coisa móvel,

entregue pelo depositante ao depositário, para tal

finalidade, com a obrigação deste de restituir dito objeto,

quando reclamado por aquele, ou no termo avençado.

Passamos agora a dividir o depósito contratual da

seguinte forma:

Poderá ser voluntário, conforme estabelece os artigos

627 a 646 do Código Civil, onde as partes de comum acordo pactuando,

a parte depositante tem a capacidade de escolher quem será o

depositário da coisa móvel. O depositário adquire a obrigação de

guardá-la até que a parte depositante a reclame.

Seguindo a idéia, poderá ser também necessário,

nesta não dependendo da vontade das partes contratantes, uma vez que

a coisa é entregue a pessoa desconhecida do depositante. Esta

modalidade pode ser dividida em legal, miserável.

Ainda, cabe ressaltar os casos de depósito legal do

hoteleiro ou do hospedeiro, onde os viajante/hóspedes entregam ao hotel

41

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Prisão Civil por Dívida. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2000, p. 75.

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34

suas bagagens para a guarda do mesmo, O referido depósito necessário

possui expressa previsão nos art. 647 a 652 do Código Civil vigente.

2.3.2 Depósito judicial

Depósito judicial, como já menciona a sua

nomenclatura é o depósito determinado pelo Juiz. Onde em um

determinado processo, ocorrerá a entrega da coisa a um depositário,

ficando este com os deveres de guarda e zelo da coisa. O depositário

deverá permanecer na guarda e zelo da coisa até a decisão final da

causa principal.

No caso do depósito judicial, figuram-se duas

possibilidades, uma derivada de obrigação legal, como já observado

anteriormente, quando o depositário fica na guarda da coisa, e outra nos

casos previsto no Código Civil de 2002, em seu artigo 647, inciso II, onde

menciona a caracterização do depósito judicial em casos de alguma

calamidade, como o incêndio, a inundação, o naufrágio ou o saque.

Nas palavras de Azevedo42:

O depósito necessário resulta do desempenho de uma

obrigação legal (depósito legal) ou de circunstâncias

emergenciais ou de calamidade pública como incêndio,

inundação, naufrágio ou saque (depósito miserável).

Ainda, no mesmo sentido, elucida o doutrinador Nery

Junior43:

42 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Prisão Civil por Dívida. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2000, p. 85. 43 NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante.

7 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 1024.

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É espécie de depósito não voluntário. O deposito judicial,

de onde vem a figura do depositário judicial, que é auxiliar

do juiz (CPC 148), tem lugar todas as vezes em que é

necessária a nomeação de responsável para a guarda e a

conservação de bens penhorados, arrestados, seqüestrados

ou arrecadados.

A grande diferença entre os dois tipos de depositário é

o fato de que no caso do depositário contratual este será possuidor direto

da coisa e o depositante possuidor indireto. De outra feita, no caso do

depositário judicial não terá a posse, mas a simples detenção da coisa,

que permanece aos seus domínios em nome do Estado.

Assim, cabe frisar que tal obrigação legal, trata-se de

uma imposição do órgão judiciário, uma vez que não cabe ao

depositante escolher por livre arbítrio quem será a pessoa do depositário.

2.3.3 Nomeação

Como já analisado anteriormente, a nomeação do

depositário no caso de depósito voluntário será através de contrato, de

forma avençada pelas partes existentes no contrato. De outra feita, no

caso de depósito necessário ou judicial, a nomeação do depositário será

através da imposição do órgão judiciário, sendo assim uma obrigação

derivada de lei.

No processo de execução, objeto de estudo do

primeiro capítulo, para que haja a nomeação do depositário, necessário

se faz a realização de uma penhora que será resultado de uma seqüência

técnica de apreensão e depósito da coisa. Realizada a penhora, será

formalizado um auto de penhora onde haverá de constar à nomeação

do depositário, que em regra será o devedor do processo, sem a

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36

necessidade de prévia consulta do juiz da causa. Entretanto, existem duas

exceções a qual Assis44 exemplifica da seguinte forma:

a) ao juiz compete designar o depositário no depósito-

administração (art. 666, III), motivo que, no mínimo, o

meirinho colherá a indicação informalmente junto ao órgão

judiciário;

b) deflui do art. 666, §1.°, que o próprio executado poderá

ser designado depositário, mediante expressa

concordância do exeqüente e nos “casos de difícil

remoção” (v.g., os veículos penhorados têm grande porte

ou, apesar de valiosos, encontram-se paralisados por falta

de peças), motivo por qual o oficial acatará a declaração

de vontade do exeqüente que estiver acompanhando a

diligência (retro, 226.1), ou consultá-lo-á informalmente. Por

outro lado, na penhora de imóvel a função de depositário

recaíra na pessoa do devedor (art. 659, §5.°).

Ainda, quanto ao tema nomeação do depositário,

conforme lição de Assis45:

Os sistemas jurídicos adotaram soluções discrepantes,

quanto à escolha do depositário. Entre nós, o art. 666, c/c o

art. 665, IV, torna claro que incumbe ao oficial de justiça à

nomeação, sob supervisão judicial, e, ademais, o encargo

dependerá de anuência do particular eventualmente

indicado.

Da análise quanto ao tema Wambier46 assevera da

seguinte maneira:

Se o devedor ficar como depositário, ele poderá assinar o

termo de depósito na mesma oportunidade em que for

intimado da penhora. Mas nota-se que, diferentemente da

44 ASSIS, Araken de. Manual de Execução. 11 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2006/2007, p. 613-613. 45 ASSIS, Araken de. Manual de Execução. 11 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2006/2007, p. 631. 46

WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil v. 2. 9 ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais. 2006/2007, p. 286.

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37

intimação da penhora, que pode ser feita na pessoa do

advogado, a assinatura do termo de depósito terá de ser

feita diretamente na pessoa do próprio devedor ou de

representante seu (advogado ou não) munido de poderes

específicos para assumir a condição de depositário.

Por fim, quanto à nomeação do depositário no

processo de execução, cabe ressaltar que ao formalizar o auto de

penhora, o oficial deverá assiná-lo bem como recolher a devida

assinatura do depositário nomeado, caso contrário não haverá a

regularização do ato jurídica.

2.3.4 Remuneração do depositário

Ao cumprir suas funções de maneira legal, o

depositário terá direito a uma remuneração em razão de sua prestação

de serviço na qualidade de auxiliar de justiça. Assim estabelece o Código

de Processo Civil em seu art. 149 e parágrafo único:

Art. 149. O depositário ou o administrador perceberá, por

seu trabalho, remuneração que o juiz fixará, atendendo à

situação dos bens, ao tempo do serviço e às dificuldades

de sua execução.

Parágrafo Único. O juiz poderá nomear, por indicação do

depositário ou do administrador, um ou mais prepostos.

Nota-se que em seu parágrafo único, o legislador faz

menção em relação aos prepostos, todavia estes não terão direito a

remuneração, devendo ser a remuneração paga ao depositário ou

administrador que o indicou. Assim explica Nery Junior47:

47 NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante.

7 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 554.

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38

Indicados pelo depositário, não são auxiliares do juízo,

embora sejam por ele nomeados, tendo ligação direta com

o depositário, estando sob sua responsabilidade e

comando. Não têm direito a remuneração, que deve ser

paga ao depositário.

Desta forma, não há que se falar em remuneração em

favor dos prepostos indicados pelo depositário ou administrador.

Entretanto, toda vez que existir o encargo de depositário haverá a

remuneração como contrapartida em razão da prestação dos serviços

realizados no período em que se manteve na qualidade de auxiliar da

justiça. Cabe frisar que a devida remuneração será sempre fixada pelo

magistrado, quantificada na forma estabelecida no caput do artigo

supracitado.

2.3.5 Suspeição e impedimentos

Quando se fala em suspeição e impedimentos, deve-

se constatar de início que os mesmos motivos legais de impedimento e

suspeição aplicados ao magistrado, também se aplicaram aos auxiliares

da justiça, tais quais se enquadram o escrivão, chefe de secretaria,

depositário judicial, oficial de justiça, intérprete e perito entre outros.

Nessa linha, coaduna o doutrinador Santos48:

Os mesmos motivos de impedimentos e suspeição do juiz

são estendidos ao serventuário de justiça, ao perito,

assistentes técnicos e ao intérprete (art. 138, II/IV). A

expressão “serventuário” é tomada em sentido genérico,

conforme já se falou, e não na restrita e descuidada

48 SANTOS, Ernani Fidélis dos. Manual de Direito Processual Civil. 12 ed. São Paulo: Saraiva,

2007, p. 203.

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39

referencia da rubrica da Seção I do Código de Processo

Civil.

Sempre que a parte constatar algum motivo de

impedimento ou suspeição, poderá através de petição devidamente

fundamentada e instruída, sempre no primeiro momento a falar nos autos

após o conhecimento do fato impeditivo ou suspensivo, argüir sua

vontade. Cabe ressaltar que caso não o faça no primeiro momento que

lhe couber falar nos autos, ocorrerá à preclusão de seu direito em

reclamar tal fato impeditivo ou suspensivo.

Uma vez instaurado o incidente processual de

impedimento ou suspeição, será a parte argüida intimada para que, no

prazo de cinco dias, querendo, apresente provas. Após apresentadas, o

magistrado decidirá o fato. Da decisão aplicada pelo magistrado caberá

o recurso de agravo. Assim explica o doutrinador Santos49, com relação ao

caminho que segue o referido recurso:

Em princípio, cabe agravo, qualquer que seja a decisão

sobre o incidente. Mister, porém, se faz que o recorrente

demonstre interesse no recurso. Evidentemente, não o terá o

mero auxiliar de justiça, quando aceita a recusa. Isto porque

o perito, o intérprete, o administrador, o depositário, o

escrivão ad hoc e o oficial de justiça ad hoc exercem cargo

de confiança do juiz. (...) Terá interesse, porém, o

serventuário de modo geral, ou seja, aquele que ocupe

cargo efetivo na justiça, mormente quando lhe são devidas

custas. (...) A parte contrária também terá interesse, se o

impedimento ou suspeição forem declarados contra o

assistente técnico que indicou. (...) Provido o recurso do

serventuário, este se integra imediatamente ao processo,

mas sem prejuízos dos atos já praticados. Nesse caso,

poderá ele responsabilizar o argüente pelos prejuízos que

teve com seu afastamento. (...) Provido o recurso da parte

com relação ao afastamento do assistente técnico, este

49 SANTOS, Ernani Fidélis dos. Manual de Direito Processual Civil. 12 ed. São Paulo: Saraiva,

2007, p. 203.

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40

integra o processo e, se houver sentença, esta pode ser

declarada nula, para que a perícia auxiliar se faça. (...)

Tendo sido julgada improcedente a argüição e provido o

recurso da parte, o auxiliar da justiça deve imediatamente

se afastar do processo, mas os atos que tiver praticado só

serão declarados nulos se ocorreu prejuízo que, no caso do

perito, assistente técnico e intérprete, se presume.

Diante de todo o exposto, quando a parte buscar seu

direito, deve analisar de forma sucinta a real necessidade de se levantar

uma das hipóteses de impedimentos ou suspeição, e caso venha ser

argüida, a parte que o faz deve se ater aos cuidados de demonstrar o seu

interesse recursal, bem como fundamentá-la e instruí-la para ter o direito

perquirido alcançado.

2.3.6 Responsabilidade do depositário

A figura do depositário possui alguns deveres que

devem ser observados, dentre esses deveres apresenta-se o de guardar,

conservar e restituir a coisa que lhe foi dada em depósito. Nas palavras de

Azevedo50:

A obrigação de guardar a coisa é da própria essência do

contrato de depósito, sendo ela elemento fundamental,

como visto, do próprio conceito dessa contratação. O

depositário, ainda que possa servir-se de auxiliares, é

obrigado, pessoalmente, por essa guarda, só se liberando

da mesma, não havendo prazo convencionado, “por

motivo plausível”, assenta o art. 1.270 do CC.

Na citação acima transcrita, observa-se que o

doutrinador Azevedo, faz menção ao Código Civil de 1916. Atualmente a

50 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Prisão Civil por Dívida. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2000, p. 83.

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previsão para que o depositário se escuse da obrigação, está contida no

art. 635 do Código Civil vigente.

Ainda, com relação as responsabilidade do

depositário, o Código de Processo Civil, em seu art. 150, expressa que:

Art. 150. O depositário ou o administrador responde pelos

prejuízos que, por dolo ou por culpa, causar à parte,

perdendo a remuneração que lhe foi arbitrada; mas tem o

direito a haver o que legitimamente despendeu no

exercício do encargo.

No caso de a coisa ser destruída pelo depositário, este

deverá ressarcir a parte credora, que conseguirá obter seus valores

através de uma ação de indenização. Neste sentido, Assis51 faz as

seguintes ponderações:

A existência do dever indenizativo supõe culpa lato sensu

do depositário. Ele não responde por caso fortuito ou força

maior (p. ex., a coisa desapareceu em incêndio). Vigora,

pois, a regra res perit pro domino. Desaparecendo

fortuitamente a coisa penhorada, o executado se sujeitará

à segunda penhora.

Desta forma, caso o depositário causar danos ao bem

penhorado, por ação ou mesmo por omissão, incorrera em

responsabilidade civil, devendo reparar o dano que cometeu bem como

perderá o direito de remuneração, conforme art. 150 do Código de

Processo Civil, salvo quando o fato sobrevier de caso fortuito ou por força

maior, neste caso, como já analisado, a parte executada deverá se

sujeitar a uma nova penhora.

51 ASSIS, Araken de. Manual de Execução. 11 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2006/2007, p. 631.

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42

No tema responsabilidade do depositário, ainda há de

se observar também, quanto aos bens penhorados e depositados em

instituições bancárias. Conforme preconiza a lição de Assis52:

No caso de penhora de jóias, pedras e objetos preciosos,

depositados em empresa de banco, o art. 666, § 2.°, adotou

solução muito inteligente, porque exigiu do depositário a

fixação de “valor estimado de resgate” para os bens. Dessa

maneira, ocorrendo algum evento imprevisível, como o furto

dos bens na caixa forte, nenhum prejuízo maior provocará o

fato na execução, recaindo a constrição no equivalente

pecuniário.

Considera-se desta forma, que o depositário, atento as

suas responsabilidades de guardar, conservar e restituir a coisa que lhe foi

dado em depósito, não ira incorrer em qualquer tipo de sanção, todavia

caso deixe de cumprir com suas obrigações e, venha de alguma forma,

destruir ou dissipar a coisa que lhe foi confiada a depósito, poderá sofrer

processo judicial com o fito de compensar o dano que causou para a

parte credora.

52 ASSIS, Araken de. Manual de Execução. 11 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2006/2007, p. 630.

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43

CAPÍTULO 3

A PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL NO PROCESSO DE

EXECUÇÃO À LUZ DO ATUAL ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL

3.1 BASE CONSTITUCIONAL

A prisão civil por dívida no ordenamento jurídico

brasileiro é vedada pela Carta Magna, salvo em duas hipóteses, nos casos

de devedor de alimentos, bem como nos caso do depositário infiel. Assim

estabelece o artigo 5°, inciso LXVII, da Constituição da República

Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 198853:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de

qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos

estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à

vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à

propriedade, nos termos seguintes:

LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do

responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável

de obrigação alimentícia e a do depositário infiel.

Percebe-se que a prisão prevista na Carta Magna

possui o caráter civil, de fazer com que o devedor cumpra com sua

obrigação, diferente da prisão penal, que visa apenar determinado

indivíduo que cometeu infração tipificada no Código Penal vigente.

53 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, também chamada de Carta

Constitucional, Constituição Federal ou Carta Magna.

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44

Azevedo54 conceitua prisão e prisão civil da seguinte

forma:

A palavra prisão descende da francesa prision, que, por sua

vez, deriva do vocábulo latino prehensio, onis, que significa

cárcere, cadeia, prisão, penitenciária, xadrez, ato de

prender alguém, de agarrar, de segurar, capturar,

apreensão, do verbo prehendo, is, si, sum, ere (tomar,

agarrar, reter, segurar, surpreender), derivado de per, do

grego peri, com o verbo primitivo handere ou hendere, de

uma raiz que significa prender; em grego, segurar, em

anglo-saxônico, hand, mão. [...] Prisão civil, assim, é a que se

realiza no âmbito estritamente do Direito Privado,

interessando-nos, neste estudo, essencialmente, a que se

consuma em razão de dívida impaga, ou seja, de um dever

ou de uma obrigação descumprida e fundada em norma

jurídica de natureza civil. [...] Entendemos, desse modo, que

a prisão civil é o ato de constrangimento pessoal,

autorizado por lei, mediante segregação celular, do

devedor, para forçar o cumprimento de um determinado

dever ou de uma determinada obrigação.

Extrai-se da etimologia da palavra prisão uma

limitação no direito de liberdade sempre sob a sujeição de alguém.

Outrossim, interessante ressaltar que não há que se falar em caráter de

pena na prisão civil, entretanto deve ser vista como meio coercitivo, para

proporcionar o efetivo cumprimento de determinada obrigação de

natureza privada.

Atualmente, quando a Constituição Federal de 1988

faz menção ao depositário infiel, está se referindo unicamente àquele

depositário do Código Civil, sem exceções. Desta forma, vedando a

ampliação dos casos passíveis ao constrangimento através de lei

ordinária.

54 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Prisão Civil por Dívida. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2000, p. 85.

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45

3.1.1 Paridade entre os tratados internacionais e o direito interno

Este subitem tem como escopo, fazer uma analise de

como a Constituição Federal de 1988 se relacionam com os tratados

internacionais de proteção aos direitos humanos.

De plano, cabe frisar que o Brasil é signatário de alguns

tratados, entre tantos, destacamos dois tratados internacionais de Direito

Humanos, tratados devidamente trabalhados pelo doutrinador Molitor55

da seguinte forma:

Convenção Americana sobre Direitos Humanos, conhecida

como Pacto de São José da Costa Rica, celebrada em 22

de novembro de 1969... Esse tratado internacional se

incorporou regularmente ao sistema de direito positivo

brasileiro, porquanto aprovado pelo Congresso Nacional,

pelo Decreto Legislativo n. 27, de 26 de maio de 1992, e em

seguida foi promulgado pelo Decreto Presidencial n. 678, de

6 de novembro de 1992, que autorizou o seu cumprimento

em nosso País. Também o Pacto Internacional sobre Direitos

Civis e Políticos, celebrado em 16 de dezembro de 1966...

ingressou formalmente em nossa ordem jurídica, pois restou

aprovado pelo decreto Legislativo n. 226, de 12 de

dezembro de 1991, tendo seu cumprimento autorizado pelo

Decreto executivo n. 592, de 6 de julho de 1992.

Pode-se dizer que a discussão em torno da

possibilidade de prisão civil do depositário infiel iniciou-se por volta do ano

de 1992, com a entrada em vigor no Brasil, por intermédio do Decreto n.

678/92, da Convenção Interamericana de Direitos Humanos - Pacto de

San José da Costa Rica - e do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e

Políticos.

55 MOLITOR, Joaquim. Prisão Civil do Depositário. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000, p. 63.

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46

O primeiro tratado conhecido com Pacto de São José

da Costa Rica estabelece em seu artigo 7°, § 7, que “Ninguém deve ser

detido por dívidas. Este princípio não faz limites aos mandados de

autoridade judiciária expedidos em razão de inadimplemento de

obrigação alimentar”. O segundo tratado, denominado como Pacto

Internacional de Direitos Civis e Políticos, estabelece em seu artigo 11 que:

“Ninguém poderá ser preso apenas por não poder cumprir com uma

obrigação contratual”.

Rezek56 assevera de modo categoricamente o

conceito de tratado:

Tratado é o acordo formal, concluído entre sujeitos de

direito internacional público, e destinado a produzir efeitos

jurídicos. A produção de efeitos jurídicos é essencial ao

tratado, que não pode ser visto senão na sua dupla

qualidade de ato jurídicoe de norma. O acordo formal

entre Estados é o ato jurídico que produz a norma, e que,

justamente por produzi-la, desencadeia efeitos de direito,

gera obrigações e prerrogativas, caracteriza enfim, na

plenitude de seus dois elementos, o tratado internacional.

Sendo assim, passando a produzir efeitos, com ingresso

das referidas Convenções Internacionais no ordenamento jurídico interno

brasileiro resultou-se forte discussão a respeito dos efeitos das garantias

neles estabelecidas frente às disposições constitucionais e legais vigentes,

questionando-se a posição hierárquica dos tratados internacionais sobre

direitos humanos em relação à pirâmide jurídica brasileira.

56 REZEK, José Francisco, Direito dos tratados, Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 21.

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47

3.1.2 Relação de status constitucional aos tratados internacionais de

direitos humanos

Inicialmente, cabe mencionar que com a entrada em

vigor da Constituição Federal de 1988, ocorreu uma forte ampliação do

que já fora estabelecido pelas Constituições anteriores. Inovou-se

consideravelmente o tema relacionado aos tratados em que a República

Federativa do Brasil faça parte, ministrando de modo mais adequado o

problema dos direitos fundamentais e sociais.

Pode-se observar essa inovação ao analisarmos o

estabelecido no art. 5°, § 2 da Carta Magna de 1988:

Art. 5° ....

§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição

não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios

por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a

República Federativa do Brasil seja parte.

Com essa amplitude, possibilitou a entrada de outros

direitos e garantias resultantes de tratados ao rol dos direitos e garantias

consagrados no artigo 5° da Constituição Federal de 1988.

A partir daí se insurgiu deveras discussões quanto ao

tema. Como exemplo, para Oliveira57:

[...] além da precisão de aplicabilidade imediata a tratados

desta natureza, a Constituição Federal de 1988, em seu

artigo 5°, § 2º, confere a estes tratados o status de emenda

constitucional.

57 OLIVEIRA, Marcelo Ribeiro de. Prisão Civil na Alienação Fiduciária em Garantia. Curitiba:

Juruá, 2000, p.60.

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48

Outros doutrinadores possuem entendimento diferente,

seguindo a linha de que os tratados ingressam em nosso ordenamento

jurídico com status de norma ordinária. Assim, estabelece o doutrinador

Molitor58:

Os tratados incorporados formalmente ao direito interno,

são normas comuns do mesmo nível hierárquico

infraconstitucional das leis ordinárias, e tem sua eficácia

regida por princípios aplicáveis às leis de caráter geral,

inclusive quanto aos critérios cronológicos.

Em que pese haja doutrinadores que sigam essa última

corrente, atualmente não há que se falar em tratados internacionais de

direitos humanos como norma comum, de nível hierárquico equiparado às

normas infraconstitucionais de leis ordinárias.

O Supremo Tribunal Federal, nos últimos anos enfrentou

o tema, e após uma construção intelectual, se manifestou no sentido de

que os tratados, uma vez que estejam enquadrados na hipótese do §3º

do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, possuem força de norma

Constitucional, quanto aos demais tratados de caráter especial, de

guarda dos direitos humanos, possuem posicionamento supralegal,

prevalecendo sobre a legislação infraconstitucional.

Pievesan59 explica o tratamento jurídico diferenciado

conferido pela Carta Magna:

Justifica-se na medida em que os tratados internacionais de

direitos humanos apresentam um caráter especial,

distinguindo-se dos tratados internacionais comuns.

Enquanto estes buscam o equilíbrio e a reciprocidade de

relações entre Estados-Partes, aqueles transcendem os

meros compromissos de direitos humanos objetivam a

58 MOLITOR, Joaquim. Prisão Civil do Depositário. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000, p. 64. 59 PIEVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 3 ed. São

Paulo: Max Limonad, 1997, p. 94.

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salvaguarda dos direitos do ser humano e não das

prerrogativas dos Estados.

Desta forma, exemplificado o caráter especial, resta

justificado o status constitucional mencionado aos tratados internacionais

de proteção aos direitos humanos.

Ainda, cabe frisar que a interpretação que, antes da

Emenda Constitucional de n.º 45/2004 era vista como implícita, em razão

do estabelecido no § 2º, artigo. 5º, após a Emenda, ficou solidificado com

o disposto no § 3º, artigo 5º. Logo, deve-se entender que o Pacto de San

José da Costa Rica, foi elevado a status constitucional com o advento da

referida Emenda, por tratar de um direito humano fundamental: o direito a

liberdade.

Desta forma, uma vez que os tratados internacionais

de direitos humanos sejam ratificados pela corte brasileira, a exemplo da

adesão do Pacto de São José da Costa Rica, que permite a prisão civil

por dívida apenas na hipótese de descumprimento inescusável de

prestação alimentícia, não é cabível a prisão civil do depositário infiel,

qualquer que seja a natureza do depósito.

3.2 CONSTRUÇÃO JURISPRUNDENCIAL, PRECEDENTES DO SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL

Neste subitem, analisaremos o posicionamento da

Corte Superior que modificou e solidificou seu entendimento quanto à

ilegalidade da prisão civil do depositário infiel.

Como já mencionado anteriormente, a discussão

quanto à influência dos tratados internacionais sobre direitos humanos e

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sua força hierárquica no ornamento jurídico brasileiro vem sendo travada

desde o ano de 1992. Recentemente, principalmente com a Emenda

45/2004, o tema teve forte repercussão no Supremo Tribunal Federal.

Com o advento da Emenda Constitucional 45/2004,

surgiu o § 3º, artigo 5º da Constituição Federal de 1988, estabelecendo

que:

Art. 5. ...

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos

humanos que forem aprovados, em cada Casa do

Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos

votos dos respectivos membros, serão equivalentes às

emendas constitucionais.

A partir dessa afirmação, com a adesão do Brasil ao

Pacto de San José da Costa Rica, que não prevê a prisão civil do

depositário infiel, entendimentos começaram a ser formar no sentido de

abolir tal medida coercitiva. Temos assim, os primeiros posicionamentos da

Suprema Corte, no Hábeas Corpus60 90.172-7 São Paulo:

EMENTA: Hábeas Corpus. 1. No caso concreto foi ajuizada

ação de execução sob o n° 612/2000 perante a 3° Vara

Cível de Santa Bárbara D`Oeste/SP em face do paciente. A

credora requereu a entrega total dos bens sob pena de

prisão. 2. A defesa alega a existência de constrangimento

ilegal em face da iminência de expedição de mandado de

prisão em desfavor do paciente. Ademais, a inicial sustenta

a ilegitimidade constitucional da prisão civil por dívida. 3.

Reiterados alguns dos argumentos expendidos em meu

voto, proferido em sessão do Plenário de 22.11.2006, no RE

n° 466.343/SP: a legitimidade da prisão civil do depositário

infiel, ressalvada a hipótese excepcional do devedor de

alimentos, está em plena discussão no Plenário deste

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Disponível em:

<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=25.NUME.%20E%20S

.FLSV.&base=baseSumulasVinculantes> Acesso em: 16 maio. 2010.

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Supremo Tribunal Federal. No julgamento do RE n°

466.343/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, que se iniciou na sessão

de 22.11.2006, esta Corte, por maioria que já conta com

sete votos, acenou para a possibilidade do reconhecimento

da inconstitucionalidade da prisão civil do alienante

fiduciário e do depositário infiel. 4. Superação da Súmula n.°

691/STF em face da configuração de patente

constrangimento ilegal, com deferimento do pedido de

medida liminar, em ordem a assegurar, ao paciente, o

direito de permanecer em liberdade até a apreciação do

mérito do HC n.° 68.584/SP pelo Superior Tribunal de Justiça.

5. Considerada a plausibilidade da orientação que está a se

firmar perante o Plenário deste STF – a qual já conta com 7

votos – ordem deferida para que sejam mantidos os efeitos

da medida liminar. (STF – HC 90.172-7/SP, 2°. Turma, Rel. Min.

Gilmar Mendez, julg. 05.06.2007, pub. DJe n. 82, 17.08.2007)

Evidente a tendência para não mais utilizar da prisão

do depositário infiel como meio coercitivo para satisfazer determinada

obrigação.

Conforme se abstrai da Ementa supracitada, no

Recurso Extraordinário sob n° 466.343/SP, que teve como Relator o Ministro

Cezar Peluso, já constava com sete votos favoráveis para reconhecer a

inconstitucionalidade da prisão civil do alienante fiduciário e do

depositário infiel.

Assim seguiu-se o entendimento de outros Ministros no

Supremo Tribunal Federal, a exemplo de outro Hábeas Corpus61:

Ementa: PRISÃO CIVIL. Decretação em execução fiscal.

Depósito judicial. Depositário infiel. Inadmissibilidade.

Questões objeto do julgamento pendente do Plenário no RE

n.° 466.343. Inconstitucionalidade já reconhecida por nove

(9) votos. Razoabilidade jurídica quanto à tese de

61

Disponível em:

<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=25.NUME.%20E%20S

.FLSV.&base=baseSumulasVinculantes> Acesso em: 16 maio. 2010.

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constrangimento ilegal. HC não reconhecido. Ordem

concedida de ofício. O Supremo Tribunal Federal inclina-se a

reconhecer a inconstitucionalidade das normas que

autorizem decretação da prisão civil de depositário infiel,

qualquer que seja a modalidade do depósito. (STF – HC

93.435-8/MG, 2ª. Turma, Rel. Min. Cezar Peluso, julg.

16.09.2008, pub. DJe n. 211, 07/11/2008)

Ainda no mesmo sentido o Hábeas Corpus 91.950-262:

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. DEPOSITÁRIO

INFIEL. PRISÃO CIVIL. INCONSTITUCIONALIDADE. O Pleno do

Supremo Tribunal Federal iniciou o julgamento do RE n.

466.343/SP, em que se discute a constitucionalidade da

prisão civil do depositário infiel. Foram proferidos oito votos

no sentido da inconstitucionalidade, ressalvada a prisão do

sonegador de alimentos. Há, pois, maioria formada, a

justificar a concessão da ordem. Ordem concebida. (STF –

HC 91.950-2/MS, 2ª. Turma, Rel. Min. Eros Grau, julg.

07.10.2008, pub. DJe, n. 216, 14/11/2008)

Consequentemente a mesma linha de pensamento foi

abordada em outros Hábeas Corpus que serviram de precedentes para

solidificação do entendimento da Corte Suprema, a exemplo do hábeas

corpus 87.585 julgado em 26/06/2009, hábeas corpus 95967 julgado em

28/11/2008, hábeas corpus 96.687 julgado em 19/11/2008, hábeas corpus

96.582 julgado em 7/11/2008 e hábeas corpus 95.170 julgado em 4/8/2008.

Nota-se que a fundamentação dos relatores das

Ementas apresentadas, baseia-se sempre em razão do Recurso

Extraordinário n. 466.343/SP, onde a maioria dos Ministros já havia se

posicionado favorável a inconstitucionalidade da prisão civil do

62

Disponível em:

<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=25.NUME.%20E%20S

.FLSV.&base=baseSumulasVinculantes> Acesso em: 16 maio. 2010.

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depositário infiel. Dito isso, resta analisar o que estabelece a Ementa63 do

referido Recurso:

EMENTA: PRISÃO CIVIL. Depósito. Depositário Infiel.

Alienação fiduciária. Decretação da medida coercitiva.

Inadmissibilidade absoluta. Insubsistência da previsão

constitucional e das normas subalternas. Interpretação do

art. 5°, Inc. LXVII e §§ 1°, 2° e 3°, da CF, à luz do art. 7°, § 7,

da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de

San José da Costa Rica). Recurso improvido. Julgamento

conjunto do RE n° 349.703 e dos HCs n° 87.585 e n° 92.566. É

ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a

modalidade do depósito. (STF – RE 466.343-1/SP, Tribunal

Pleno, rel. Min. Cezar Peluso, julg. 03.12.2008, pub. DJe n. 104,

em 05/06/2009.)

Através do voto memorável proferido pelo Ministro

Celso de Mello no Tribunal Pleno da Suprema Corte, ficou reconhecido o

valor constitucional dos tratados internacionais de direitos humanos. Assim

o Supremo, deu fim à prisão civil do depositário infiel no Brasil, uma vez que

majoritariamente foi admitida a supralegalidade dos tratados de direitos

humanos.

Basta mencionar, que tal postura da Suprema Corte é

moderna e adequada a novos tempos, uma vez que vivemos constante

internacionalização dos direitos humanos. Atualmente, no Estado

Constitucional e pode-se dizer, humanista de direito, não cabe prisão civil

contra depositário infiel, independente de sua modalidade de depósito,

sendo judicial ou não. Restando como única aplicabilidade da prisão civil

como meio coercitivo aquela aplicada ao devedor de alimentos.

63

Disponível em:

<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=25.NUME.%20E%20S

.FLSV.&base=baseSumulasVinculantes> Acesso em: 16 maio. 2010.

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3.3 EDIÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE 25 E SEUS REFLEXOS

Conforme estudado anteriormente, foi grande a

repercussão em virtude da inconstitucionalidade da prisão civil do

depositário infiel.

O Supremo Tribunal Federal firmou seu entendimento

no sentido de que tal medida coercitiva não poderia mais ser aplicada,

seja qual fosse o tipo de depósito.

Com essa solidificação de entendimento, em sessão

Plenária realizada na data de 16.12.2009, a Suprema Corte editou a

respectiva Súmula Vinculante de n. 25: “É ilícita a prisão civil de depositário

infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”.

Gomes64 apresenta de forma concisa a referência

legislativa para a edição da Súmula supracitada:

A referência legislativa da Súmula é: a) a Constituição

Federal (art. 5º, § 2º); b) a Convenção Americana sobre

Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), art. 7º,

§ 7º; e c) o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos

(art. 11). Com a decisão proferida no RE 466.343-SP

(03.12.08), que foi agora ratificada com a Súmula

Vinculante n. 25, o Brasil ingressou, definitivamente, na

“terceira onda” evolutiva do Estado, do Direito e da Justiça,

que é a onda do internacionalismo (cf. GOMES, Luiz Flávio &

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Direito supraconstitucional: do

absolutismo ao Estado Constitucional e Humanista de

Direito. São Paulo: RT, 2010 - no prelo) ou da pós-

modernidade jurídica.

64 GOMES, Luiz Flávio. Súmula Vinculante 25 do STF: Impossível a prisão civil do depositário

infiel. Disponível em http://www.lfg.com.br - 17 de fevereiro de 2010.

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55

Devidamente fundamentada a referência legislativa

para a devida edição da Súmula Vinculante 25, trazendo assim, a certeza

de a prisão do depositário infiel é totalmente inconstitucional, como já

afirmado outras vezes.

Todavia, abre-se a questão de como deve agir o

magistrado diante da figuro do depositário infiel, já que o meio coercitivo

não mais pode ser aplicado.

Parece ser o mais adequado, uma vez caracterizada a

figura do depositário infiel, este que deve ser tratado com funcionário

público, deverá incorrer no crime de peculato. Assim, estabelece o artigo

312 do Código Penal quanto ao crime de peculato:

Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro,

valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular,

de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em

proveito próprio ou alheio:

Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

§ 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público,

embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o

subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito

próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe

proporciona a qualidade de funcionário.

Resta por fim registrar, que a decisão do Supremo

Tribunal Federal esta em consonância com o entendimento moderno

mundial. Mas de tempos que é do conhecimento geral que apenas

através do poder coercitivo é que a justiça tem seus resultados efetivos e

muitas vezes imediatos, como aconteciam nos processo de execução.

Agora, com a ausência da figura do fiel depositário,

conseqüência mais nítida será o enfraquecimento das decisões judiciais,

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56

em razão de o executado, em processo de execução, não terá receio de

ter sua liberdade cerceada.

A atenção agora deve ser redobrada, o magistrado

pode ter a cautela de analisar quem será nomeado como depositário,

buscando a idoneidade financeira do mesmo, bem como ouvir a parte

credora se concorda com a nomeação realizada. E, caso haja a figura do

depositário infiel, o magistrado deve enviar cópia de peças ao Ministério

Público, para oferecimento da denúncia, por crime de peculato.

Como tudo no direito, os reais reflexos quanto as suas

mudanças demanda tempo, dito isso, é certo que as conseqüências

positivas e negativas de tal preceito sumular só será observado com o

passar dos tempos.

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57

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os três capítulos apresentados que sintetizam o

resultado da referida pesquisa bibliográfica, de forma objetiva

demonstraram que existiram diversos entendimentos em relação à

constitucionalidade ou inconstitucionalidade da prisão civil do depositário

infiel.

No primeiro capítulo estudado, restaram demonstrado

as recentes reformas e alterações tanto no processo de execução quanto

na fase de cumprimento de sentença. E, de forma evidente, sua

aplicabilidade no momento atual.

Na continuação do trabalho, passou-se a analisar, no

segundo capítulo, a figura do depositário, este que deve ser visto como

auxiliar da justiça, uma vez que está perfeitamente sujeito as regras da

administração pública.

Em relação ao último capítulo desta monografia, a

análise ficou concentrada principalmente na busca do pensamento

predominante, sobre o tema, nas jurisprudências do Supremo Tribunal

Federal, para facilitar o entendimento de quem busca saber sobre as

decisões atuais e as tendências sobre o enfoque do assunto.

A investigação demonstrou que a posição

jurisprudencial segue firme no seu entendimento de defender, de forma

majoritária, a inconstitucionalidade das disposições que determinam a

prisão civil do depositário infiel.

Segue assim, para relembrar, o que determina o texto

da Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, LXVII: “não haverá

prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento

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voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário

infiel”. Esta disposição proíbe a prisão por dívida, admitindo-se em

somente duas exceções, conforme traz expressamente o inciso referido.

Todavia, conforme estudado, o posicionamento atual

da Suprema Corte é de que agora não há mais prisão civil por dívida no

caso de depositário infiel, seja qual for sua modalidade de depósito,

restando apenas a prisão civil por divida de obrigação alimentar.

Assim, a prisão civil do depositário infiel, passou de uma

medida coercitiva constitucional para inconstitucional, fato que foi

solidificado através da Súmula Vinculante n. 25, editada com base nos

preceitos dos direitos humanos fundamentais, uma vez que o Brasil é

signatário dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos.

Destarte, a parte final do artigo 5º, LXVII não tem mais

aplicabilidade, uma vez que permite a prisão civil. Qualquer forma de

prisão do depositário estaria violando a própria Constituição e,

conseqüentemente, o Estado Democrático de Direito.

Resta frisar, que apesar do avanço doutrinário, em

contrapartida não foi apresentado o caminho que deve ser seguido pelos

magistrados agora que não possuem como meio a medida prisional, com

o fito de fazer com que o devedor quite com suas obrigações.

O resultado da investigação relatado nesta

monografia apresenta-se como uma fotografia do momento atual, e

como um alerta aos interessados neste tema, de que a sua discussão está

longe de ser encerrada.

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REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

AMARAL SANTOS, Moacyr. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. 22

ed. São Paulo: Saraiva. 2008.

ASSIS, Araken de. Manual de Execução. 11 ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2006/2007.

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Prisão Civil por Dívida. 2 ed. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 2000.

BRASIL. Lei nº 9.987, de 07 de dezembro de 1999. Altera a legislação

tributária federal. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília,

DF, 8 dez. 1999. Disponível em<

http://www.in.gov.br/mp_leis/,asp?id=LEI%209887. Acesso em 22 dez. 1999.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Processual Penal. Hábeas Corpus.

Constrangimento ilegal. Hábeas Corpus nº 181.636-1, da 6ª Câmara Cível

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