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DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL COMISSÃO DE TRABALHO, DE ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇO PÚBLICO EVENTO: Seminário N°: 001328/01 DATA: 13/11/01 INÍCIO: 9h37min TÉRMINO: 14h56min DURAÇÃO: 5h19min TEMPO DE GRAVAÇÃO: 5h30min PÁGINAS: 117 QUARTOS: 33 REVISORES: ROBINSON, PAULO DOMINGOS, ANTONIO MORGADO, LIA, MONICA, CONCEIÇÃO, ELIANA, MARLÚCIA, CLÁUDIA CASTRO SUPERVISÃO: SEM SUPERVISÃO CONCATENAÇÃO: LÍVIA COSTA DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO ALMIR PAZZIANOTTO PINTO - Ministro-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho IVES GANDRA DA SILVA MARTINS FILHO - Ministro do Tribunal Superior do Trabalho LUIS CARLOS MORO - Representante do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar GELSON DE AZEVEDO - Ministro do Tribunal Superior do Trabalho REGINA BUTRUS - Presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho ROBERTO CALDAS - Representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil HUGO CAVALCANTI MELO FILHO - Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho SUMÁRIO: Debate acerca da legislação trabalhista no Brasil e no mundo — flexibilização das relações de trabalho, e do Projeto de Lei nº 5.483/01, do Poder Executivo, que altera a redação do art. 618 da Consolidação das Leis do Trabalho — CLT, estabelecendo a prevalência das condições de trabalho ajustadas mediante convenção ou acordo coletivo sobre o disposto em lei. Protestos contra a saída dos Ministros do Tribunal Superior do Trabalho Ives Gandra da Silva Martins Filho e Gelson de Azevedo antes do término da reunião. OBSERVAÇÕES Seminário realizado com a participação das Comissões de Direitos Humanos e Relações Exteriores e de Defesa Nacional. Há oradores não identificados.

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Page 1: DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO … · Inicialmente, tinha concedido a palavra ao Ministro Ives Gandra. Com a chegada do Sr. Ministro Almir Pazzianotto, Presidente

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

COMISSÃO DE TRABALHO, DE ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇO PÚBLICO

EVENTO: Seminário N°: 001328/01 DATA: 13/11/01

INÍCIO: 9h37min TÉRMINO: 14h56min DURAÇÃO: 5h19min

TEMPO DE GRAVAÇÃO: 5h30min PÁGINAS: 117 QUARTOS: 33

REVISORES: ROBINSON, PAULO DOMINGOS, ANTONIO MORGADO, LIA, MONICA, CONCEIÇÃO, ELIANA, MARLÚCIA, CLÁUDIA CASTRO

SUPERVISÃO: SEM SUPERVISÃO

CONCATENAÇÃO: LÍVIA COSTA

DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO

ALMIR PAZZIANOTTO PINTO - Ministro-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho

IVES GANDRA DA SILVA MARTINS FILHO - Ministro do Tribunal Superior do Trabalho

LUIS CARLOS MORO - Representante do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar

GELSON DE AZEVEDO - Ministro do Tribunal Superior do Trabalho

REGINA BUTRUS - Presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho

ROBERTO CALDAS - Representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil

HUGO CAVALCANTI MELO FILHO - Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho

SUMÁRIO: Debate acerca da legislação trabalhista no Brasil e no mundo — flexibilização das relações de trabalho, e do Projeto de Lei nº 5.483/01, do Poder Executivo, que altera a redação do art. 618 da Consolidação das Leis do Trabalho — CLT, estabelecendo a prevalência das condições de trabalho ajustadas mediante convenção ou acordo coletivo sobre o disposto em lei. Protestos contra a saída dos Ministros do Tribunal Superior do Trabalho Ives Gandra da Silva Martins Filho e Gelson de Azevedo antes do término da reunião.

OBSERVAÇÕES

Seminário realizado com a participação das Comissões de Direitos Humanos e Relações Exteriores e de Defesa Nacional.

Há oradores não identificados.

Page 2: DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO … · Inicialmente, tinha concedido a palavra ao Ministro Ives Gandra. Com a chegada do Sr. Ministro Almir Pazzianotto, Presidente

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Vamos dar início ao seminário que debaterá a flexibilização das leis do trabalho, especialmente o Projeto de Lei nº 5.483, de 2001.

As Comissões de Trabalho, Administração e Serviço Público, de Direitos Humanos e de Relações Exteriores e de Defesa Nacional tomaram a iniciativa de realizar este seminário.

O requerimento, de autoria da Deputada Vanessa Grazziotin e do Deputado Paulo Paim, foi deliberado e acordado de ser realizado na última quarta-feira.

Quero anunciar a presença dos ilustres convidados, que farão suas exposições e que já se encontram presentes: Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, do Tribunal Superior do Trabalho; Ministro Gelson de Azevedo, do Tribunal Superior do Trabalho; Dr. Hugo Cavalcanti Melo Filho, Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho; Dr. Roberto Caldas, representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; Dra. Regina Butrus, Presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho; Dr. Luis Carlos Moro, representante do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar.

Informo ao plenário que o Ministro Almir Pazzianotto Pinto, Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, também confirmou sua presença. No entanto, houve um choque de horários, já que S.Exa. está participando de palestra neste momento no Senado Federal, mas tão logo a termine, estará presente neste seminário.

Esclareço aos ilustres convidados, aos Srs. Parlamentares, às senhoras e aos senhores que esta reunião está sendo gravada para posterior transcrição. Por isso solicito que, quando for o caso, falem ao microfone para declinar seus nomes.

Para melhor ordenamento dos nossos trabalhos, vamos adotar os seguintes critérios: cada orador terá o prazo máximo de 10 minutos para sua exposição; somente após o término das exposições dos sete convidados é que passaremos aos debates; os autores dos requerimentos, Deputada Vanessa Grazziotin e Deputado Paulo Paim, terão o tempo máximo de 10 minutos cada um para suas interpelações; e os demais Parlamentares terão o tempo de, no máximo, 3 minutos; para responder a cada interpelação, cada orador terá também o mesmo tempo.

Para podermos manter equilíbrio entre as posições e as opiniões dos expositores, vamos adotar o seguinte critério: falará um favor e outro contra, entre os que fazem parte da relação encaminhada à Mesa pelas Lideranças das Oposições e do Governo.

Portanto, vamos iniciar nossa palestra ouvindo o Sr. Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra da Silva Martins Filho.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM - Sr. Presidente, quero informar a esta Mesa que está havendo reações muito fortes nas ruas hoje por parte dos trabalhadores contra esse projeto de lei. Devo dizer que é um projeto complexo e polêmico. Fui informado, há pouco, que a Delegacia Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul foi ocupada pelas centrais sindicais e pelas confederações. (Palmas.)

Por enquanto, a intenção dos trabalhadores não é sair daquela Delegacia, fato que, sucessivamente, deverá ocorrer em outros Estados, se não for retirada a urgência urgentíssima a esse projeto de lei.

O SR. DEPUTADO PEDRO HENRY - Sr. Presidente, peço a palavra para uma questão de ordem.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Tem a palavra V.Exa., Deputado.

O SR. DEPUTADO PEDRO HENRY - Quero pedir a V.Exa. que recomende à assistência, respaldado pelo nosso Regimento, não se manifestar neste seminário. (Apupos no plenário.)

E também que V.Exa. recomendasse...

O SR. DEPUTADO PROFESSOR LUIZINHO - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Quero registrar a presença do Ministro Almir Pazzianotto Pinto, Presidente do Tribunal Superior do Trabalho.

Antes de conceder a palavra ao Deputado Professor Luizinho, devo alertar e recomendar à platéia e ao Plenário, que, regimentalmente, estão impedidos — e V.Sas. sabem disso — de se manifestarem, tanto favorável quanto contrariamente às posições dos Srs. Parlamentares e dos Srs. Expositores. Houve um acordo, um entendimento mantido com o Deputados Paulo Paim, Professor Luizinho, enfim, com os Líderes dos partidos de Oposição e dos partidos de Governo, para que neste seminário pudéssemos ouvir as opiniões tanto dos que desejam, que são favoráveis, que defendem a aprovação deste projeto de lei, quanto daqueles que têm críticas em relação ao projeto de lei ora em discussão.

Portanto, para que possamos enriquecer o debate, respeitando o entendimento havido entre Parlamentares membros desta Comissão, é que faço apelo no sentido de que possamos cumprir o combinado, cumprir o Regimento Interno para o bom andamento dos trabalhos e para que esta Presidência não tenha que tomar medidas mais severas, mais drásticas, em prejuízo exclusivamente do debate. Não permitirei, em hipótese alguma, a repetição de fatos que já ocorreram em outras oportunidades.

Agradeço a colaboração e a compreensão de todos os senhores. O prejuízo será exatamente daqueles que querem debater e avançar no processo de discussão de matéria polêmica e que por isso mesmo proporciona clima de tensão.

Com a palavra o Deputado Professor Luizinho.

O SR. DEPUTADO PROFESSOR LUIZINHO - Sr. Presidente, é fundamental que V.Exa. tenha aquiescido e propiciado o acordo que permitiu a realização deste seminário. Ele é da máxima importância, porque irá proporcionar reflexões sobre esse polêmico projeto. Este seminário é fundamental. Quero também parabenizar as centrais sindicais e todo o movimento sindical que estão fazendo suas manifestações em todo o País.

Quero informar ao Deputado Pedro Henry que estão presentes aqui aqueles que querem participar do debate. Eles não criarão nenhum obstáculo para que V.Exa. tenha o prazer de sugerir a suspensão deste seminário. Não achei boa a manifestação de V.Exa., porque não houve nenhum ato que motivasse a acalorada forma como o público se manifestou, o que acontece diariamente, às vezes com palmas ou com vaias, na nossa vida Parlamentar — e já estamos acostumados a isso.

O seminário irá se realizar a contento. Ele será fundamental, porque, casado com as manifestações que vêm ocorrendo em todo o País, nos dará um novo rumo hoje.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Obrigado, Deputado Professor Luizinho.

Com a palavra a Deputada Vanessa Grazziotin.

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, senhoras e senhores, para não perdermos tempo, temos que iniciar imediatamente o seminário.

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Apenas quero reforçar o que disse o Deputado Professor Luizinho. Primeiro, não estamos participando de uma reunião ordinária da Comissão, mas, sim, de um seminário que é aberto ao público. Portanto, na minha opinião não há que se buscar a rigidez do Regimento Interno. Há, sim, que se buscar o respeito a todos que aqui estão.

Quero solicitar a V.Exa., antes de conceder a palavra aos nossos expositores, que declare aberta a lista de inscrições, permitindo a manifestação das pessoas e dos representantes de entidades presentes.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - A lista de oradores para o debate está aberta.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM - Sr. Presidente, na verdade o que iria dizer já foi afirmado, com muita precisão, pela Deputada Vanessa Grazziotin. Entendo que os companheiros que comparecem, com o maior interesse, a este seminário querem ver suas posições externadas aqui. E a melhor forma de eles participarem será através desse encaminhamento solicitado pela Deputada Vanessa Grazziotin e com a concordância de V.Exa. Ou seja, os presidentes das centrais sindicais e das confederações teriam direito à inscrição para formularem questionamentos aos expositores.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Perfeito. Vamos dar início aos debates.

O SR. DEPUTADO PEDRO HENRY - Sr. Presidente, apenas um esclarecimento. Este seminário foi moldado dessa maneira? Quero, inclusive, que V.Exa. pergunte isso aos Deputados Paulo Paim e Vanessa Grazziotin. Entendo que este seminário permite a participação e o debate entre os convidados presentes e apenas os Parlamentares.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Vamos dar início ao nosso seminário.

Inicialmente, tinha concedido a palavra ao Ministro Ives Gandra. Com a chegada do Sr. Ministro Almir Pazzianotto, Presidente do Tribunal Superior do Trabalho e com a concordância de V.Exa., passo então a palavra a S.Exa., que disporá de dez minutos para sua exposição.

O SR. ALMIR PAZZIANOTTO PINTO - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros, Srs. Procuradores, Srs. Advogados, Srs. Dirigentes Sindicais, minhas senhoras e meus senhores, pretendo imprimir a minha exposição caráter exclusivamente técnico, sem emitir juízo de valor, por entender que a deliberação cabe ao Congresso Nacional. Essa deliberação deve estar lastreada nas melhores informações, nas informações mais autorizadas, até para que não ocorra um grave equívoco, como sucedeu, por exemplo, quando o Congresso Nacional aprovou a introdução de um parágrafo único no art. 442 da CLT, dispondo sobre cooperativas de trabalho.

O Congresso aprovou esse dispositivo acolhendo proposta de um nobre Deputado, mas o fez, sem dúvida nenhuma, e os fatos estão aí a comprovar, de maneira inoportuna.

Aquele parágrafo único ao invés de ser uma solução transformou-se numa tormentosa e interminável fonte de problemas que se refletem em centenas de reclamações trabalhistas, sobrecarregando ainda mais Varas do Trabalho, Tribunais Regionais do Trabalho e o Tribunal Superior do Trabalho.

O Congresso, obviamente, não é infalível, nem nós, no Judiciário, somos infalíveis, tampouco o Poder Executivo e os dirigentes sindicais. Somos todos falíveis, razão pela qual devemos nos munir de todas as informações para que não se perpetre um erro.

Entrando no assunto que provocou o convite para meu comparecimento, quero registrar que estamos no terreno no direito coletivo do trabalho. O projeto de lei do Poder Executivo altera dispositivo que pertence ao âmbito do direito coletivo.

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Nas relações de trabalho, há possibilidade de duas negociações: a individual, regida diretamente pelo art. 468, que cuida das negociações individuais, destinadas a alterar o contrato na sua vigência, o que é até corriqueiro.

É comum que, na vigência do contrato, as partes ajustarem mudanças, disciplinadas pelo art. 468, que diz:

Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia."

O empregado que, mesmo havendo negociado uma alteração, se sinta posteriormente prejudicado, poderá acionar a Justiça do Trabalho. E ela tem competência para restabelecer a situação anterior, desde que convencida de que houve direta ou indiretamente prejuízo ao empregado. Mas isso é no campo individual.

Soube até que, originalmente, o Projeto do Ministério do Trabalho previa a possibilidade de alteração do art. 468.

Não estamos neste terreno. Como disse, estamos no terreno do coletivo, ou seja, no capítulo das negociações. Aqui é importante frisar o que a Constituição Federal, aprovada em 1988, estabelece no art. 7º, inciso XXVI. Entre os direitos fundamentais dos trabalhadores rurais e urbanos encontra-se o do reconhecimento às convenções e aos acordos coletivos de trabalho. A Constituição valorizou as convenções e os acordos coletivos, dizendo que eles são reconhecidos. Abro um parênteses para dizer o seguinte: com uma constância que os dirigentes sindicais conhecem, o TST examina cláusulas de acordos e convenções coletivas. É muito comum nos Tribunais Regionais e no TST examinarmos cláusulas de convenções e acordos coletivos, não por iniciativa própria, mas mediante provocação do Ministério Público do Trabalho. Isto é, há um fiscal, instituído pela Constituição e disciplinado pela Lei Orgânica do Ministério Público, seja para os dissídios coletivos, seja para os acordos e convenções coletivas. Nós, no TST, estamos aqui navegando em águas muito conhecidas, porque constantemente estamos examinando e reexaminando cláusulas de acordos e convenções coletivas, celebrados por sindicatos, que foram impugnadas em ações anulatórias provocadas pelo Ministério Público do Trabalho.

Como é que se chega a uma negociação coletiva? Há uma confusão entre nós, a meu ver injustificável, e aqueles que supõem que a negociação coletiva aborda matérias trazidas à discussão pelas direções sindicais. Não é verdade. Na prática isso até pode acontecer, mas juridicamente não é possível. Por quê? Porque a lei, já há bastante tempo, condiciona qualquer negociação coletiva a determinado rito, a um ritual que precisa ser examinado, que precisa ser obedecido, para que aquela matéria de caráter coletivo seja colocada em mesa de negociações.

O que diz a lei? Eu me prendo a lei. A minha função assim exige que eu o faça. Eu me prendo permanentemente ao texto da lei. Como juiz sou obrigado a cumprir a lei. Eu não fabrico leis. E ela diz: "Os sindicatos só poderão celebrar convenções ou acordos coletivos de trabalho por deliberação de assembléia geral especialmente convocada para esse fim, consoante o disposto nos respectivos estatutos." Isto é, qualquer que seja a matéria, ou ela surgiu naturalmente de um anseio dos trabalhadores, ou ela foi fruto de uma deliberação da liderança sindical, mas teve que ser submetida aos trabalhadores, por meio de assembléia geral especialmente convocada.

A lei diz mais: "A validade da assembléia dependerá do comparecimento e votação, em primeira convocação, de dois terços dos associados da entidade, se se tratar de convenção; se for uma

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convenção intersindical — os senhores sabem perfeitamente do que estou falando —, convoca-se a assembléia, mas a sua instalação e validade dependerão da presença de dois terços dos associados em primeira convocação, ou de dois terços dos interessados, se se tratar de acordo coletivo; em segunda convocação, de um terço."

Qual é a diferença entre convenção e acordo? Os senhores sabem qual é a diferença, mas eu vou relembrá-los. A convenção é intersindical, sindicato patronal e sindicato de trabalhadores. O acordo é celebrado entre empresa e sindicato. Por exemplo, no caso da PETROBRAS é acordo coletivo; no caso dos metalúrgicos de São Paulo, normalmente é uma convenção intersindical; no caso do Banco do Brasil, é acordo coletivo; no caso da FEBRABAN e os sindicatos de São Paulo, é convenção coletiva.

Acordo ou convenção dependem de convocação de assembléia e de quorum. Em tudo prevalece a vontade da maioria, como também no Congresso Nacional. Esta Casa necessita de quorum e a aprovação dá-se sempre por maioria. Aqui também há quorum, como há quorum numa assembléia de acionistas de uma S.A., ou no caso dos sindicatos, por exigência expressa de lei.

A assembléia fixa a pauta, que constará da ata. Digamos que se tenha apenas um tema em discussão. A empresa trabalha em turnos ininterruptos de revezamento, jornada portanto de seis horas na forma do dispositivo constitucional. Mas diz o mesmo dispositivo que o horário nas empresas que trabalham em turno de revezamento, embora seja de seis horas, pode ser alterado mediante acordo ou convenção coletiva.

Logo, se o tema for esse, ele constará da pauta da ata para ser deliberado. É isso que será levado à mesa de negociações. O que se leva a uma mesa de negociações é a vontade dos trabalhadores, reproduzida numa assembléia geral, a ser realizada na forma da lei e concretizada em documentos escritos.

Suponhamos que, numa determinada empresa — vamos esquecer o projeto, porque já havia acordos e convenções antes da apresentação do projeto — surja uma proposta, por exemplo, sugerindo a abolição do controle do horário de trabalho. De acordo com a lei, toda empresa com mais de dez empregados precisa ter um sistema permanente de controle de horário, que pode ser: mecânico, eletrônico ou até manual.

No Banco do Brasil, até há pouco tempo, o controle era manual. Com a exigência dos trabalhadores, instituiu-se o ponto eletrônico — exigência transformada em decisão normativa pelo TST.

Voltando ao exemplo anterior, digamos que em uma empresa se pretenda a abolição do ponto. Os trabalhadores apresentam essa proposta para a direção sindical, realiza-se a assembléia, fixa-se a matéria da negociação, leva-se a matéria ao empregador e celebra-se o acordo coletivo dizendo que não mais se aplicará a lei, porque os trabalhadores e o empregador concordaram em abolir o cartão de ponto. Resolveram instituir um sistema baseado mais na boa-fé e na confiança.

Já houve caso idêntico no Tribunal. Empregadores e o sindicato do Estado do Espírito Santo, em uma fábrica do setor químico — se não me falha a memória —, resolveram abolir o ponto. O Ministério Público do Trabalho impugnou argüindo a nulidade do acordo por ser aparentemente contra a lei. A matéria foi a julgamento. O Tribunal Regional do Trabalho do Espírito Santo anulou a cláusula, entendendo-a contra a lei. A ação anulatória havia sido proposta pelo Ministério Público do Trabalho. O TST, examinando o recurso ordinário, impetrado por uma das partes, que sustentava a validade do acordo, manteve a cláusula sob os seguintes argumentos: nós, da Justiça do Trabalho, estamos sempre estimulando as negociações coletivas. Ora, é impossível uma negociação coletiva destinada a repetir o que está na lei. Não há a menor necessidade de se negociar para se confirmar o que está na lei. A negociação coletiva se realiza para quê? Ou para preencher um vácuo da lei ou para adaptar a lei a necessidades locais, para proceder a adaptação da lei a uma realidade, a uma

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necessidade, a uma exigência local. Ademais, o acordo tem vigência limitada no tempo. Se o resultado não for benéfico para os trabalhadores, é óbvio que no ano seguinte, isto é, cumprido o prazo de duração, o acordo não será renovado, porque os trabalhadores perceberam que o acordo não lhes dizia respeito.

Há poucos dias, aconteceu no TST outro julgamento muito interessante. Todos os dirigentes sindicais, especialmente os rurais, conhecem a cláusula das horas in tinere. Para informação dos Srs. Deputados que não conhecem essa cláusula — mas acredito que todos tenham conhecimento —, as horas in tinere resultam de uma criação da jurisprudência. A lei nunca mencionou horas in tinere. A jurisprudência criou as horas in tinere e determinou que seja remunerado o período em que o trabalhador se desloca da sua residência ou de um determinado local até a empresa em veículo fornecido pelo empregador. Essa solução passou a encontrar algumas dificuldades de ordem prática, decorrentes da medição do período: uma hora e quinze minutos, uma hora e doze minutos, quarenta e cinco minutos; até que, em determinadas regiões, os sindicatos celebraram um acordo estabelecendo que, qualquer que seja a duração do trajeto, o empregador paga uma hora a título de hora in tinere. Essa cláusula várias vezes foi impugnada, porque resulta de uma estimativa e não de uma aferição. Mas a Justiça do Trabalho vem mantendo a validade desse acordo coletivo, por considerá-lo uma solução prática para um problema complexo.

Outro caso recentemente julgado pelo TST: uma empresa de ônibus interestadual, em um percurso que leva doze horas, passou a colocar dois motoristas no ônibus. Aparentemente, o motorista que não estava dirigindo estaria à disposição do empregador. Para evitar uma sucessão de processos trabalhistas, empresa e sindicato, mediante acordo coletivo, estabeleceram que as horas em que o motorista reserva permanecesse no ônibus não seriam remuneradas. Remunera-se apenas o horário daquele que está dirigindo e não daquele que está descansando, mas que assumirá na metade do caminho. A Procuradoria, mais uma vez, impugnou a cláusula, através de ação anulatória, dizendo que se ele está dentro do ônibus, ele está à disposição do empregador. Logo, precisa ser remunerado. Mas não era essa a vontade das partes. A vontade das partes era resolver o problema, encarando de frente a peculiaridade daquele trabalho e evitar processos trabalhistas.

Como se vê, há um campo imenso a ser explorado no terreno das negociações coletivas.

Recentemente, em 1998, a OIT aprovou resolução, subscrita pelos países filiados, que estabelece quatro pontos fundamentais para os trabalhadores: primeiro, a livre organização sindical, acompanhado do direito à livre negociação; segundo, o combate a toda e qualquer forma de trabalho forçado; terceiro, o banimento do trabalho infantil; quarto, a proibição de qualquer espécie de discriminação nos locais de trabalho. Como se percebe, a OIT valoriza muito a negociação coletiva.

Um célebre jurista escreveu que é impossível para o Direito prever todas as espécies de conflitos. O Direito, na verdade, limita-se à instituição de regras de caráter geral, o que, aliás, é bastante difícil no Brasil, dado o tamanho do nosso território e à diversidade de situações. A meu ver, é preciso valorizar mais as negociações, sobretudo as coletivas, desde que se observem as exigências da lei quanto à validade das assembléias. Com alguns dirigentes sindicais que eu tenho conversado sobre essa matéria, percebi que o temor maior em relação a esse projeto consistiria na manipulação de direitos fundamentais por sindicatos pequenos e inexpressivos, incapazes, portanto, de resistirem à pressão patronal.

Até compreendo esse argumento. Ocorre que o movimento sindical brasileiro é extremamente fragmentado. Há um número muito maior de sindicatos, e sobretudo pequenos, do que a razão recomendaria, mas isso não invalida a tese da negociação, porque a reformulação do movimento sindical é tarefa do próprio movimento sindical. Essa é uma tarefa à qual o movimento sindical precisa se dedicar, e com grande afinco.

É evidente que eu não tenho solução para esse problema, e preocupo-me, porque continuo

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entendendo que a questão da fragmentação do movimento sindical é tarefa que precisa ser solucionada dentro das próprias organizações sindicais.

Nós, do TST, a partir de 1990, firmamos jurisprudência, em matéria coletiva, que não é bem recebida pelo movimento sindical. No que consiste essa posição do TST? Essa posição, na verdade, é uma garantia para os próprios trabalhadores; é uma posição que oferece segurança para os próprios trabalhadores. Examinamos a documentação relativa às assembléias e, verificando a inexistência de quorum, ou pelo menos a inexistência de comparecimento expressivo dos interessados, julgamos que a diretoria não havia recebido autorização para negociar aquela pauta. Estamos presos ao texto da lei. A lei exige quorum, a meu ver, sabiamente, porque a diretoria não pode levar à mesa de negociação o seu pensamento, mas as reivindicações dos trabalhadores. A outra posição assumida pelo TST, corretíssima, é não admitir dissídios de natureza econômica, exclusivamente, sem que se esgotem as possibilidades de solução pela via da negociação.

Muitas vezes, somos criticados porque estamos valorizando a ação sindical e respeitando o pensamento dos trabalhadores interessados na negociação. Nós procuramos valorizar o pensamento dos trabalhadores. Dias atrás, estávamos com um processo em julgamento. Os senhores sabem que a instituição de banco de horas depende de negociação coletiva. Não se institui banco de horas, como não se institui participação nos lucros, por decisão normativa da Justiça do Trabalho. São matérias típicas e exclusivas de negociação. Os trabalhadores de determinada empresa do interior de São Paulo desejaram negociar com o empregador um banco de horas. O sindicato condicionou a abertura das negociações à aprovação da assembléia. De 550 empregados, compareceram à assembléia, se não me falha a memória, cerca de 500 empregados. A maioria mais do que absoluta aprovou a instituição de um banco de horas. Depois disso, o sindicato se recusou a assinar o acordo. Vejam as dificuldades enfrentadas pela Justiça do Trabalho, quando se vê compelida a entrar em terreno que deveria ser exclusivamente reservado às negociações!

Assistindo ao debate, vejo aqui vários advogados militantes no Tribunal Superior do Trabalho. Vários! Aliás, todos ligados a sindicatos profissionais. Esses advogados conhecem o zelo do TST em matéria de dissídio coletivo e negociações coletivas. Nosso maior empenho é fazer com que prevaleça o interesse do trabalhador, no sentido de que ele é o autor da pauta. A pauta não é da diretoria, mas dos trabalhadores. Eles é que devem definir a pauta. A diretoria é um mero canal de comunicação.

No sistema hospitalar brasileiro há uma cláusula tradicionalíssima, das doze horas por trinta e seis. O sistema hospitalar brasileiro, na rede privada, funciona à base de doze horas por trinta e seis. Essa é uma cláusula cujo início de vigência se perde no tempo. Creio que esse sistema existia antes mesmo da existência das negociações. A cláusula é manifestamente, rigorosamente contra a lei, porque a lei não prevê jornada dessa dilatação e com esse intervalo. No entanto, ela satisfez de tal maneira às necessidades do setor, que vem sendo preservada.

Procurei me circunscrever aos aspectos meramente técnicos e jurídicos da questão. A decisão, evidentemente, compete ao Congresso Nacional, que a tomará, como acontece também nas assembléias de trabalhadores, por maioria de votos.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Obrigado, Ministro Almir Pazzianotto, por suas considerações e participação neste seminário.

Vamos ouvir, em seguida, o Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, Dr. Hugo Cavalcanti Melo Filho. S.Sa. disporá de dez minutos para fazer sua exposição.

O SR. HUGO CAVALCANTI MELO FILHO – Exmo. Sr. Deputado Freire Júnior, Presidente

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desta Comissão, demais integrantes da Mesa, Sras. e Srs. Parlamentares, Srs. Sindicalistas, trabalhadores, advogados, magistrados, membros do Ministério Público, inicialmente, gostaria de agradecer à Comissão o convite formulado à ANAMATRA para comparecer a este importante seminário, que trata da flexibilização dos direitos do trabalho no mundo e no Brasil. Procurarei me limitar ao tempo concedido pela Mesa para a minha exposição e peço permissão a V.Exas. para iniciá-la lendo um pequeno trecho de matéria publicada na revista Época, desta semana, que diz o seguinte:

Volks anuncia a demissão de 3 mil empregados em São Bernardo do Campo.

Três mil cartas de demissão começaram a chegar às residências de funcionários da Volkswagen na quinta-feira. Todos os 16 mil empregados da fábrica de São Bernardo do Campo, a maior da empresa, estavam em licença remunerada por três dias. A montadora decidiu demitir depois da negativa dos metalúrgicos em aceitar uma redução de jornada de trabalho e dos salários em 15%. A proposta incluía demissão de até 6% do pessoal por ano e a contratação de novos funcionários com salários 30% menores.

É nesse ambiente de liberdade "hobbesiano" que o Governo pretende fazer aprovar medida que altera a Consolidação das Leis do Trabalho, para fazer prevalecer as condições que forem negociadas entre os atores sociais sobre a matéria legislada na Consolidação das Leis do Trabalho.

E é dentro dessa perspectiva que pretendo desenvolver a minha fala. O ideal seria que nós recuperássemos, sob o ponto de vista histórico, as razões que determinaram o surgimento do Direito do Trabalho, mas o tempo, evidentemente, não permitirá que isso aconteça. De modo que será suficiente dizer que o Direito do Trabalho surgiu para se contrapor às ideologias liberais que apareceram na Europa, a partir da Revolução Francesa de 1789, notadamente em contraposição ao individualismo jurídico, que colocava a autonomia da vontade sobre todas as coisas e, principalmente, sobre a idéia de não interveniência estatal nas relações privadas. O Direito do Trabalho surge como uma intervenção do Estado, pelo reconhecimento das desigualdades efetivas e materiais, sob o ponto de vista político e econômico, que os dogmas liberais promoveram, notadamente após a implantação do capitalismo industrial, possibilitado pelas revoluções industriais. O Direito do Trabalho surge nesse ambiente, como forma de limitação do poder econômico. Em uma palavra, como forma de tutela do trabalhador, sem sombra de dúvida, a parte hipossuficiente na relação subordinada de trabalho. Depois, ele vai sofrer ampliação significativa até o final da 2ªGuerra Mundial. A partir daí, por uma série de fatores de ordem histórica, política e econômica, o Direito do Trabalho começa a experimentar um processo de decadência em todos os lugares, porque haverá, a partir do início da década de 60, a quebra do modelo fordista, baseado na grande empresa, na empresa vertical, na produção e no consumo de massa, e, principalmente, no Estado do bem-estar social. Isso tudo deixa de existir por força da necessidade e do acirramento da competência internacional, e o novo modelo produtivo de descentralização flexível toma seu lugar. Esse novo modelo, associado a fatores políticos, como o fim da União Soviética, que constituía contraponto ao ideário liberal, proporciona o retorno dos dogmas liberais, agora apresentado como pensamento único, como querem alguns, ou, pelo menos, como pensamento hegemônico em âmbito mundial.

O pensamento hegemônico liberal exige condições de trabalho compatíveis com a modernidade econômica e com o mercado. Portanto, esse pensamento exige providências no sentido de flexibilização de direitos tradicionalmente assegurados aos trabalhadores. É a partir daí que pretendo examinar a situação brasileira.

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Não constitui novidade alguma flexibilização de direitos dos trabalhadores no Brasil. Muito pelo contrário, já existe flexibilização absoluta no Brasil, e sempre houve, no tocante à constituição e desconstituição das relações de trabalho, porque aqui o empregador admite e dispensa seus empregados livremente, com amparo na legislação. Uma tímida garantia que existia, a partir da Consolidação das Leis do Trabalho, que era a estabilidade decenal, como o próprio nome já indica, exigia do trabalhador a permanência no mesmo emprego por dez anos, o que, convenhamos, não é nada fácil de se conseguir. E essa precária garantia de emprego, contra a vontade do patrão, foi mitigada, significativamente, com a introdução do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, em meados da década de 60. A partir daí, todo o processo de mudança da legislação no Brasil foi pautado pela flexibilização dos direitos do trabalho, com uma tendência à precarização do trabalho.

Apenas para citar alguns exemplos, já na Constituição de 1988, foi instituída a possibilidade de redução de salário e compensação de jornada, através de negociação coletiva. Posteriormente, no Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, uma série de medidas foram adotadas no sentido de reduzir ou flexibilizar essas garantias, como, por exemplo, ampliação das hipóteses de contratação a prazo, fixação ou criação do banco de horas, com vasta possibilidade de compensação de jornada e possibilidade de suspensão temporária do contrato de trabalho. Mais recentemente, tivemos a equiparação do trabalhador rural ao trabalhador urbano, sob o ponto de vista de prescrição trabalhista, e a denúncia da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho. Agora, o Governo propõe aos Srs. Parlamentares alteração legislativa pela qual se pretende que os fatores negociados pelas categorias patronal e profissional prevaleçam sobre o legislado na Consolidação das Leis do Trabalho e demais leis trabalhistas.

Alguns aspectos têm que ser considerados quanto a essa proposta. O primeiro, e talvez o mais importante, seria o açodamento com que ele vem sendo discutido e trazido à consideração de V.Exas. Sinceramente, os juízes do trabalho brasileiros não conseguem vislumbrar razão para que esse projeto tramite em regime de urgência.

Muito pelo contrário, a urgência desse projeto vai eivá-lo definitivamente de ilegitimidade, porque não houve o necessário debate por todos os segmentos sociais envolvidos na questão. Os trabalhadores estão, todo os dias, dando mostras de que precisam discutir a matéria, que querem debater a questão, que são contra a votação em regime de urgência e, mesmo assim, o Governo Federal não retira a proposta de urgência para o projeto.

Urgente, Srs. Parlamentares, é a regulamentação do art. 7º, inciso I, para se garantir efetivamente segurança contra a dispensa arbitrária e sem justa causa, mas o Governo nunca encaminhou ao Congresso Nacional projeto nesse sentido. (Palmas.) Urgente é regulamentar o inciso XXVII do art. 7º da Constituição, que garante proteção contra a automação. A mesma notícia da revista Época dá conta de que na linha de montagem de São Bernardo da Volkswagem vai aumentar de cinqüenta para trinta o número de robôs, o que vai eliminar mão-de-obra humana. No entanto, o Governo não encaminha ao Congresso Nacional nenhum projeto de lei tendente a regulamentar a matéria, para efetivamente proteger o trabalhar contra a automação.

Que urgência há em se estabelecer a prevalência absoluta do que for negociado pelas partes sobre o que está fixado na lei? Essa prevalência já existe — sempre existiu —, desde que seja para beneficiar o trabalhador. A liberdade de negociação é absoluta, desde que seja para estabelecer direitos mais amplos do que aqueles que já estão fixados na lei. Se isso já existe há muito tempo, não se pode negar que o propósito do projeto é estabelecer a possibilidade de negociação para prejudicar, porque já existe a possibilidade de negociação para beneficiar.

Então, Srs. Deputados, a urgência é para que se estabeleçam critérios segundo os quais haverá possibilidade de negociação, com prejuízo para o trabalhador. Por que razão? Para atender a que interesses, pergunto eu e perguntam os juízes do trabalho? Eu quero dizer a V.Exas. que os juízes do trabalho são, em sua maioria esmagadora, contrários a essa alteração. Do mesmo modo, os

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advogados e membros do Ministério Público. Pensamos que é um dado interessantes o fato de que toda a comunidade jurídica brasileira vinculada ao Direito do Trabalho esteja contra essa alteração. É um elemento que deve ser considerado. Esse é o nosso métier. Conhecemos a matéria, lidamos no dia-a-dia com ela e sabemos que na atual situação, em que não existe pleno emprego e garantia contra dispensa, em que o empregador admite e dispensa a seu bel-prazer, em que não existem sindicatos fortalecidos, em que proliferam sindicatos não representativos das categorias que pretendem representar, alteração dessa natureza constituirá a pá de cal no Direito do Trabalho brasileiro, já tão flexibilizado ao longo do tempo.

Como o tempo de que disponho já se encerra, embora ainda quisesse estender minha oração para outros aspectos igualmente relevantes, quero deixar a V.Exas. o apelo dos juízes do trabalho, ao qual sei que se irmanam os advogados e membros do Ministério Público do Brasil, no sentido de que esta Casa não admita, ao menos, o debate açodado da matéria, ou, melhor, que não se faça o necessário debate sobre matéria tão importante. É preciso que todos os segmentos da sociedade brasileira envolvidos na questão sejam efetivamente consultados. Hoje, a coluna Informe JB anuncia que, se por acaso não houver hoje a votação da matéria nesta Comissão, e se por algum motivo essa votação for retardada, o Governo resolverá o problema por medida provisória. É um absurdo a utilização de instrumentos imediatos, para introdução imediata na ordem legal de uma alteração dessa magnitude. Penso que os Srs. Deputados deveriam refletir detidamente sobre a questão e trazer a esta Casa a participação popular, dos trabalhadores, dos líderes empresariais, porque, certamente, boa parte das lideranças empresariais também não concordam com essa alteração. O projeto que ora se apresenta, objeto deste debate, necessita de profunda consulta à sociedade brasileira, necessita de ampla discussão dos segmentos sociais e Srs. Parlamentares, porque, como todos sabemos, quando o Estado se exonera das relações entre as pessoas, quando o Estado se demite da sua obrigação protetiva das partes mais fracas nas relações, a exploração se instala. Nessa liberdade "hobbesiana", em que tudo pode ser feito em nome da possibilidade de negociação, a ausência da lei e a liberdade escravizam, enquanto que a presença do Estado, com a legislação protetiva do trabalhador, mais necessária hoje do que há 150 anos, liberta efetivamente.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Muito obrigado, Dr. Hugo Cavalcanti Melo Filho.

Passamos, agora, a ouvir S.Exa. o Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, do Tribunal Superior do Trabalho. S.Exa. dispõe de dez minutos para suas considerações.

O SR. IVES GANDRA DA SILVA MARTINS FILHO - Sr. Presidente, Deputado Freire Júnior, demais participantes desta Mesa, Sras. e Srs. Parlamentares, senhoras e senhores, minha fala, como a do Ministro Almir Pazzianotto, será mais técnica, mas garanto aos senhores que também será mais rápida.

O enfoque jurídico que acho ser fundamental para esta questão é o da constitucionalidade do projeto de lei. A alteração do art. 618 da CLT nada mais é do que a concretização legal de algo que já existe a nível constitucional, que é o princípio da flexibilização. Ele se encontra previsto em três incisos básicos do art. 7º, os incisos VI, XIII e XIV. O próprio Inciso XXVI, ao prestigiar a negociação coletiva e permitir a flexibilização de salário e de jornada de trabalho, está efetivamente dando a conformação aos direitos do trabalhador já a nível constitucional, com a possibilidade da prevalência do negociado sobre o legislado. Ou seja, o projeto de lei não traz algo de novo, em termos de introdução de um princípio diferente, para o ordenamento jurídico brasileiro.

E mais: o art. 7º, ao admitir a flexibilização de direitos trabalhistas, por negociação coletiva, claramente mostra que esse dispositivo não é uma cláusula pétrea da Constituição Federal. Por isso, o art. 60, § 4º, inciso IV, ao estabelecer que os direitos e garantias individuais não podem ser objetos de discussão em Constituição, numa revisão da mesma, não trata dos direitos sociais. Por isso, todos

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os incisos do art. 7º estão no dispositivo próprio, no capítulo próprio dos direitos sociais. Ou seja, aquilo que as próprias partes podem negociar, o Constituinte também o pode, só que, nesse caso concreto, não estamos em reforma constitucional, mas em sede legal. E, em sede legal, tal como foi redigido o dispositivo, eu diria, está de bom tamanho, porque diz que as condições de trabalho ajustadas mediante convenção ou acordo coletivo prevalecem sobre o disposto em lei desde que não contrariem a Constituição Federal e as normas de segurança e saúde do trabalho. Ou seja, não se está alterando a Constituição Federal. E mais: se os próprios dispositivos básicos do Direito do Trabalho — salário e jornada de trabalho — são flexibilizáveis, a maior parte dos demais direitos trabalhistas derivam desses dois dispositivos.

Portanto, do ponto de vista constitucional, o projeto não padece de inconstitucionalidade, o que possibilita sua aprovação nas Comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público e de Constituição e Justiça e de Redação e no Congresso Nacional.

Como disse o Ministro Almir Pazzianotto, a questão em torno do art. 618 está num contexto mais amplo, o da negociação coletiva. Temos de partir para um modelo de valorização da negociação coletiva, de valorização dos sindicatos, que já foi aprovado pela Câmara dos Deputados e está em discussão no Senado Federal, com a reforma do Judiciário.

O que prevê o art. 115 da Constituição Federal, tal como alterado pela reforma do Judiciário? A redução do poder normativo da Justiça do Trabalho. A própria Câmara dos Deputados entendeu que se deveria prestigiar a negociação coletiva mais do que sentenças impostas pela Justiça do Trabalho em termos de solução dos conflitos trabalhistas.

Muitas vezes, na discussão dos direitos fundamentais do trabalhador, o legislador se defronta com impasses tais, como o que estamos vendo, em que a solução encontrada acaba por não atender ao que se esperava, e a questão volta ao Judiciário para que resolva o problema não solucionado pelo Legislativo. Isso demonstra que as partes têm mais condições de estabelecer o que é melhor para patrões e empregados.

Se sucumbirmos ao argumento de que o sindicalismo brasileiro não é suficientemente forte para permitir flexibilização, viveremos, nos próximos sessenta anos, como nos últimos sessenta anos; ou seja, de um contexto geral, em que sempre se invoca a fraqueza dos sindicatos para que haja um poder normativo forte da Justiça do Trabalho, para que haja uma legislação que seja quase esgotante de todas as normas que podem reger as condições de trabalho. Temos de valorizar outros instrumentos que não sejam unicamente a lei para a defesa e o resguardo dos direitos do trabalhador.

Quero lembrar o papel fundamental desenvolvido pelo Ministério Público do Trabalho, que, através de ações civis públicas, ao defender a ordem jurídica que o sustenta, tem defendido interesses coletivos ainda não positivados. Ou seja, muitas vezes, quando a lei ainda não está perfeitamente delineada, o Ministério Público faz essa defesa por meio de ação civil pública. É importante ressaltar isso.

O então Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga, dizia que, quando a sociedade estiver de tal forma organizada nas suas associações de defesa de interesses difusos, quando os sindicatos estiverem de tal forma organizados para a defesa dos trabalhadores, o Ministério Público terá a maior alegria de se retirar da atuação maior, como órgão agente, para poder atuar mais como órgão interveniente, porque a sociedade estará à altura de se defender e cuidar diretamente dos seus interesses, não precisando da tutela do Estado, quer seja o Estado legislador, quer seja o Estado juiz, quer seja o Estado Ministério Público.

Portanto, tal como apresentado, o projeto é constitucional, merecendo apreciação serena e técnica da Câmara dos Deputados e do Congresso Nacional.

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Era o que eu tinha a dizer. (Apupos.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Obrigado, Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, pela colaboração.

Concedo a palavra ao Dr. Luis Carlos Moro, representante do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar. S.Sa. dispõe de dez minutos.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

Por questão de justiça, tive o cuidado de controlar o tempo do Ministro Almir Pazzianotto.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Não se preocupe, Deputado Paulo Paim. Anotamos os períodos de tempo utilizados. Não concederei a nenhum orador menos tempo do que ao Ministro Almir Pazzianotto.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM - S.Exa. falou durante trinta e três minutos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Não sei, vou fazer a conta, está anotado aqui. Tenho mais facilidade do que V.Exa. de fazer esse controle porque o relógio está na minha frente.

Tem a palavra o Dr. Luis Carlos Moro.

O SR. LUIS CARLOS MORO - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros, representantes do Ministério Público, colegas advogados, dirigentes sindicais, senhoras e senhores, tenho a honra de falar hoje pelo DIAP.

Sou advogado trabalhista e Presidente da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas. Minha manifestação está respaldada por vinte e sete associações regionais de advogados trabalhistas e pelo Congresso Nacional de Advogados Trabalhistas realizado recentemente na Bahia, em que a posição da nossa classe foi unânime, independentemente da defesa de interesses patronais ou obreiros. (Palmas.) Eu mesmo milito, em boa parcela, em favor de interesses patronais, mas isso não me retira o dever de consciência, nem tampouco a representação da vontade da classe dos advogados trabalhistas.

Não podemos nos conformar com a propositura de legislação que modifica não um dispositivo da Consolidação das Leis do Trabalho, mas as bases que fundamentam o Direito do Trabalho, num regime de urgência urgentíssima, absolutamente injustificado ou, pior do que isso, justificado por questões meramente casuísticas e uma agenda eleitoral que impede o trasladar da discussão dessa matéria para o ano eleitoral, quando, do ponto de vista eleitoral, o prejuízo da discussão seria muito grave.

Parece-me que esse aspecto, em primeiro lugar, clama pela falta de razoabilidade da discussão e pelo açodamento. Não se trata de matéria que possa ser discutida com essa brevidade, com essa rapidez, que a matéria nem na amplitude e certamente nem na complexidade. nos cinja a um seminário que, mesmo representativo, certamente não esgotará

Eu gostaria de contribuir propondo, em primeiro lugar, a reposição da linguagem. Estamos falando de flexibilização dos direitos trabalhistas e de projeto que estabelece a prevalência do negociado sobre o legislado. Parece-me que certas expressões que atenuam o assunto em discussão não são exatamente próprias e verdadeiras. Eu gostaria de ousar um pouco mais: há certa hipocrisia nesses termos: flexibilização da legislação trabalhista e prevalência do negociado sobre o legislado.

Do ponto de vista legal, o negociado historicamente sempre prevaleceu sobre o legislado, na medida

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em que a preposição "sobre" significa algo que está acima, para além da lei, adiante da lei. O que se pretende, na verdade, é a prevalência do negociado contra o legislado, contra a lei, contra os patamares mínimos que a legislação estabelece. (Palmas.) Basta a troca da preposição para que recaia sobre o nosso espírito a verdadeira ignomínia que representa projeto dessa natureza. Ele autoriza os atores sociais atuarem contra a lei; ele que permite aos atores sociais disporem de teatro, do palco e da platéia; é um projeto que autoriza os atores sociais a promoverem ilicitudes, dando vezo de licitude às suas vontades ilícitas.

Ora, em Direito Civil — e para começar a discussão não precisamos recorrer à protetividade do Direito do Trabalho —, isso é ato jurídico nulo por falta de objeto lícito. Não precisamos recorrer a teorias modernas de Direito. Se consultarmos o Código de Napoleão, que é o que há de mais atrasado em Direito, chegaremos à conclusão de que há manifesta intenção de se promover a ilicitude. É nítido nas justificativas do projeto —não vou estabelecer crítica pessoal alguma, não há nenhuma idiossincrasia de ordem pessoal —, em alguns trechos do voto do ilustre Relator. Revelam eles que o pressuposto básico da lei é a destruição dos mínimos patamares legislativos e autorização para que os atores sociais dispensem os mínimos patamares legais.

É importante estabelecermos, como princípio da discussão, que não estamos tratando de novidade no âmbito da negociação coletiva. Continuará acontecendo o mesmo. O projeto está promovendo a ilicitude, autorizando o trato ilícito.

Não consigo conceber por que determinadas categorias sociais devam merecer tutela estatal e por que outras, que tradicionalmente sempre as tiveram, vão deixar de tê-la. Não entendo que o consumidor seja tratado como cidadão superior ao trabalhador. Não entendo como o Direito do Consumidor estabelece critérios de proteção ao cidadão, consumidor, ao passo que a legislação trabalhista caminha no sentido contrário. Por quê? Será que o trabalhador é menos merecedor de direitos do que o consumidor? Será que o consumidor, por se inserir no mercado como ente promotor do desenvolvimento é mais digno de direito do que o trabalhador? Parece-me que não.

Parece-me que os argumentos, inclusive de natureza técnica, que promovem esse projeto devem ser observados com alguma cautela, até os que dizem respeito à constitucionalidade.

A flexibilização trabalhista não vem de hoje. Teve início na década de 60, conforme explanou o Juiz Hugo Cavalcanti Melo Filho, Presidente da ANAMATRA. Contudo, ela adquiriu contornos expressivos na Constituição de 1988, que estabeleceu, no seu art. 7º, ampla relação de direitos trabalhistas. Há nela três incisos em que o legislador Constituinte diz expressamente que os acordos coletivos podem avançar, além ou contra o que estabelece a legislação básica. Esses três incisos dizem respeito à jornada de trabalho, aos salários, ao princípio da irredutibilidade dos salários e aos turnos ininterruptos de revezamento. Nos três casos o legislador apresentou a mesma expressão: ".salvo o disposto em acordo ou convenção coletiva". Se esse princípio fosse aplicável aos demais direitos trabalhistas previstos na Lei, o Constituinte não teria necessidade de estabelecer a ressalva item por item. Bastaria que se estabelecesse o princípio da negociação coletiva com possibilidade de prevalência sobre a lei.

Isso foi repelido pelo Constituinte. As ressalvas são expressas e autorizadoras especificamente naqueles casos. Seu silêncio não significa permissão para que lei posterior agregue a ressalva da negociação coletiva para reduzir direito. O silêncio é eloqüente, diz que nos direitos não se mexe, há o limite mínimo constitucional".

O silêncio nos diz que há direitos básicos mínimos que não são apenas direitos trabalhistas, que vão além e se sujeitam a princípios jurídicos de ordem constitucional; e mais, sujeitam-se a princípios jurídicos de ordem pública internacional. São direitos fundamentais, são direitos humanos, direitos de terceira geração dos direitos humanos, que não podem ser tangidos por projetos de lei infraconstitucionais, contra a Constituição e promotores da ilegalidade entre as partes.

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Quero contar aos senhores episódio, para que possamos trasladar esse projeto para a esfera de Direito Público comum, Direito Penal. Sou advogado na cidade de São Paulo e fui assaltado em oito oportunidades. Numa das últimas, recebi três distintos convivas no meu automóvel, que nos incitaram a fazer um city tour por caixas bancários eletrônicos. Durante o trajeto, tivemos oportunidade de conversar. Durante aquele ato criminoso, eu lembrava, por incrível que possa parecer, o seguinte: "A Constituição me assegura o direito à integridade física, a Constituição me assegura o direito à vida, a Constituição me assegura o direito à intangibilidade do meu patrimônio; no entanto, nada disso agora é efetivo. Estou diante de uma circunstância em que tenho que negociar, porque a legislação não me vale." Dessa forma, naquela ocasião fiz uma negociação. Negociei a minha vida, e cheguei à conclusão de que ela vale muito pouco. Seiscentos reais custou a minha vida.

Os seiscentos reais, além de salvarem minha vida, constituíram-se o princípio básico que estamos discutindo por intermédio desse projeto de lei: o princípio da prevalência do negociado sobre o legislado. A despeito de eu ter direito à vida, ao patrimônio, à intangibilidade física, negociei e prometi àqueles cinco convivas que não iria procurar os agentes públicos, que não chamaria a polícia, que não procuraria a interveniência estatal, em troca da prevalência do que estávamos negociando. Então, pergunto: essa negociação ilícita é válida, ela merece receber do Congresso Nacional amparo legislativo? Será que isso é possível? (Palmas.)

Digo mais: como advogado de empresas e de pequenos empresários, agora sob uma ótica absolutamente distinta do que habitualmente vemos, sei que o pequeno empregador sofrerá brutalmente, porque ele não detém poder negocial suficiente para fazer frente ao poder negocial de grandes empresas, como a Volkswagen. Isso estabelece sistema concorrencial ilícito, inconstitucional, porque não é fundado no princípio da igualdade. Mesmo os interesses patronais estarão sob risco, na medida em que o grande empresário estabelece um acordo que lhe proporcione custos baixos, atuando com mão de ferro, e o pequeno empresário não tem mão de ferro para estabelecer o mesmo tipo de negociação. É também pelo interesse da pequena empresa, pelo interesse do pequeno empresário nacional, que é o grande empregador neste País, que esse projeto não pode ser aprovado. Mais do que isso: o Direito do Trabalho é também direito de ordem pública, proibitivo. Determina, por exemplo, que não se pode fazer horas extras; ou como o Ministro Almir Pazzianotto afirmou, que não se pode trabalhar além do limite; que crianças não podem trabalhar em determinadas condições; que mulheres não podem ser submetidas a determinados esforços físicos. Enfim, por ser Direito do Trabalho, é basicamente Direito proibitivo. Os poucos direitos que restassem ficariam sob risco em função deste projeto. Trata-se de algo extremamente perigoso.

Há muitos grotões brasileiros que ainda ostentam a indignidade do trabalho forçado, do trabalho escravo. Ontem, na Comissão do Controle de Direitos Sociais do Conselho Federal da OAB, estivemos com o Frei Henri des Roziers, um frei francês que se radicou em Marabá, no Pará. Ele nos revelou ser prática comum na região do Bico do Papagaio, no sul do Pará, no norte do Mato Grosso, no oeste do Maranhão, a exploração do trabalho escravo.

Portanto, se estamos ainda nesse grau da civilização brasileira, como conferir a esses atores sociais a possibilidade de atuar contra a lei? Não há a menor possibilidade de que isso se suceda.

O Ministério do Trabalho, muito recentemente, foi objeto, literalmente, de um chamamento à atenção pelo Poder Judiciário, porque não há sequer previsão legal para posse e exercício de fiscais do trabalho aprovados desde 1998. O Executivo abdicou da sua função fiscalizadora e quer trasladar isso para o controle social. Mas o controle social, lamentalvemente, não é capaz. Seria ideal que houvesse possibilidade de estabelecer um "endocontrole", a exemplo do que o Ministro Almir Pazzianotto dizia sobre as regras de validade das assembléias promovidas pelos sindicatos. E é verdade. Do ponto de vista legal, em princípio, a negociação coletiva deve refletir o que se sucedeu na assembléia, mas, como prova, estão aqui os próprios Ministros a revelar que enormidade de processos não são julgados, são extintos, ou são julgados sem exame de mérito, justamente em razão

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de irregularidades nas assembléias. Se isso for trasladado para o ambiente criado por este projeto, ao invés de desafogamento do Judiciário trabalhista, vamos ter o efeito inverso, ou seja, milhares ou milhões de empregados questionarão a validade de suas assembléias, pois estarão elas dispondo de direitos indisponíveis. Repito: a Justiça do Trabalho, ao invés de desafogada, será brutalmente afogada com ações anulatórias de assembléias que disporão sobre direitos indisponíveis.

É algo em que se deve pensar, também sob o ponto de vista do "endocontrole", do controle interno da Justiça do Trabalho, para que não ocorra esse efeito.

O controle judicial, o controle público das relações do trabalho, é condição sine qua non para que não se instale a barbárie. O Direito do Trabalho há de ser, inicialmente, direito. Na medida em que for convertido em negócio, deixa de ser direito. Deixaremos, ao instituir este projeto, ao aprová-lo, de ter no Brasil o Direito do Trabalho para termos "negócio do trabalho", negócio fundado em regime de forças, onde o mais forte, sem dúvida alguma, independentemente de que lado esteja, prevalecerá sobre o mais fraco. É isso o que nós, advogados, juízes e representantes do Ministério Público, estamos tentando fazer, ou seja, estamos dando nossa parcela de contribuição para requestar, solicitar, pedir a atenção dos Srs. Deputados, a fim de que não aprovem este projeto de lei, em benefício do processo civilizatório do nosso País.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Muito obrigado, Dr. Luis Carlos Moro, por suas considerações, abordagens e participação neste seminário.

Passamos a ouvir agora o quinto expositor, Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Gelson de Azevedo, pelo tempo de dez minutos.

O SR. GELSON DE AZEVEDO – Ilustre Deputado Freire Júnior, ao cumprimentá-lo também cumprimento todas as autoridades presentes, líderes sindicais e trabalhadores que prestigiam esta honrada Comissão.

O meu pronunciamento, como não poderia deixar de ser, fará uma abordagem exclusivamente técnica, pertinente à inconstitucionalidade ou constitucionalidade, legalidade ou ilegalidade do projeto. Portanto, registro que não farei nenhuma abordagem pertinente à oportunidade, conveniência ou urgência da análise desse projeto, critérios para os quais o Congresso Nacional é, evidentemente, soberano.

Dentro desta abordagem técnica, farei referência a dispositivos constitucionais e a dispositivos que não são constitucionais, mas que integram a legislação brasileira, dentro do que chamam de interpretação sistemática.

Num segundo momento, abordarei as objeções, também jurídicas, relativas a princípios do Direito do Trabalho e opostas ao entendimento do que tem sido chamado de prevalência do negociado sobre o legislado.

Farei uma citação relativamente rápida, porque isso já foi feito tanto pelo Ministro Almir Pazzianotto Pinto como pelo Ministro Ives Gandra, dos dispositivos constitucionais, ressaltando apenas alguns aspectos que reputo relevantes.

O primeiro dispositivo constitucional que, parece-me, dá respaldo a esse projeto, repito, na sua característica eminentemente jurídica, é o art. 7º, inciso XXVI, da Constituição Federal, que estipula como direito dos trabalhadores o reconhecimento de acordos e convenções coletivas.

Salientaria apenas que esta disposição não se dirige, à toda evidência, por razões de ordem lógica, a

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trabalhadores e empregadores que venham assinar acordos ou convenções coletivos. A razão é muito simples: a obrigação que vincula as partes signatárias dos contratos já decorre da lei civil. O chamado, e a expressão aqui é latina, perdoem-me, pacta sunt servanda, ou seja, a obrigação daqueles que assinam os contratos decorre da manifestação de vontade que integrou aquele instrumento utilizado para criar direitos e obrigações recíprocos.

Chamo a atenção de V.Exas. também para o fato de que temos hoje, com vigência desde 1993, a Convenção nº 154 da Organização Internacional do Trabalho, que determina às autoridades nacionais a tomada de medidas que favoreçam, facilitem e prestigiem a negociação coletiva. A conjunção desses dois elementos me leva a concluir — e a opinião evidentemente é pessoal — que disposições tais quais as contidas nesse projeto cumprem apenas uma determinação constitucional. Citaria também, e já foram referidos aqui, os incisos VI, XIII e XIV da Constituição, que, prestigiando-se a negociação coletiva, dá-se a ela a possibilidade de disposição sobre as maiores garantias que são atribuídas aos trabalhadores, aquelas pertinentes a salário e carga horária de trabalho.

Parece-me razoável, dentro do contexto anteriormente referido, inferir também que, se os trabalhadores podem dispor, por manifestação de vontade coletiva, das garantias maiores que lhe são atribuídas pela Constituição, que são salário e carga horária de trabalho, poderiam evidentemente também, por força do que se dispõe o art. 7, inciso XXVI, dispor de garantias menores. E quando falo em garantias menores, anuncio que daqui a pouco falarei sobre essas garantias que estão à disposição dos trabalhadores em função deste projeto de lei, que não são as garantias maiores, não são os patamares mínimos assegurados pela legislação, porque estes estão na Constituição Federal. E esses patamares não são abrangidos evidentemente pelo texto do projeto. Mas vou abordar essa questão daqui a pouco.

No estudo que fiz a respeito do tema negociado e legislado, que me levou a assumir essa idéia, encontrei em ações anulatórias, promovidas pelo Ministério Público do Trabalho, em decisões dos Tribunais Regionais, nas quais se recusavam aquelas Cortes à homologação de determinadas cláusulas dispostas em acordos e convenções e em decisões de Varas do Trabalho, em que o Juiz deixava de aplicar a disposição coletiva em favor da disposição legal, resumidamente três argumentos básicos. Claro que as formas de expressão são variadas, mas continham, na sua essência, determinadas idéias vinculadas a princípios basilares do Direito do Trabalho, os quais, também já deixo antever, não vou deixar de observar ou deixar de prestigiar. Vou fazer releitura e observações dentro dos parâmetros objetos de nosso encontro.

O primeiro óbice que se tem levantado em relação à prevalência do negociado sobre o legislado está referido no tocante ao princípio de Direito do Trabalho que se enuncia como irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, ou seja, diz-se que os direitos trabalhistas, ao lado de se consagrarem em função da pessoa dos trabalhadores, trazem no seu bojo, na sua essência maior, um interesse da sociedade nessa proteção. De tal forma, esse direito não pertenceria exclusivamente ao trabalhador e, por essa razão, não poderia o trabalhador dele dispor. Faço aqui uma ou duas distinções relativas à aplicação desse princípio que, repito, prestigio. Não vou excluí-lo, jamais afirmaria que os direitos trabalhistas serão renunciáveis. Mantenho, portanto, o princípio da irrenunciabilidade. Apenas entendo que, no caso em foco, não se trata de renúncia de direito e tampouco se trata de renúncia de direitos vinculados a patamares mínimos de garantia, porque esses, repito, estão na Constituição Federal. E esses direitos contidos na Constituição Federal não são objetos do projeto. Ora, irrenunciabilidade não pode ser confundida com intransacionabilidade. Se assim fosse, os milhares e talvez milhões de acordos coletivos celebrados, sob a orientação de Juiz de Trabalho, não seriam factíveis, não teriam nenhuma legitimidade. Ou seja, o trabalhador não pode renunciar, mas nada o impede de transacionar. Isto significa que pode o trabalhador, sim — posteriormente analiso o aspecto pertinente à manifestação de vontade que não será individual e, sim, coletiva — transacionar direitos que lhes são próprios.

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Num segundo aspecto, os direitos que ele vai transacionar, em primeiro lugar, não são aqueles assegurados como patamares mínimos pela Constituição Federal. Segundo, não são direitos que digam respeito à sua saúde física ou mental, ou seja, direitos pertinentes à segurança do trabalhador e à saúde física e mental do trabalhador não são e jamais serão negociáveis nem transacionáveis. Significa dizer que se trata de direitos eminentemente patrimoniais. São valores minimamente estabelecidos e que nada impede, no meu modesto entendimento, sejam negociados. Não se negocia o que está na Constituição; negocia-se minimamente o que está na lei. E nos vários exemplos já referidos, aos quais eu poderia acrescer inúmeros outros objetos de longa pesquisa, se verá, não se tratam de direitos que constituam garantias que não possam ser, por vontade coletiva, negociáveis.

O primeiro tema de que tenho notícia — sou um Ministro relativamente novo na Casa, embora já com três anos e meio de magistratura no Tribunal Superior do Trabalho, mais um ano e meio como Juiz de Tribunal Regional convocado, —, o primeiro debate que trouxe esse critério à discussão foi pertinente à hora noturna, sobre cláusula objeto de ação anulatória do Ministério Público, no sentido de estabelecer que a hora noturna, ao invés de ter 52 minutos e 30 segundos, passaria a ser computada como 60 minutos, dentro de um contexto de negociação coletiva em que outras vantagens foram oferecidas em troca. O critério que se estabelecia não era pertinentemente a patamar mínimo de garantia de saúde física ou mental do trabalhador.

Portanto, no tocante à irrenunciabilidade, não a confundo, preservo-a, mas não a confundo com irrenunciabilidade e permito-a, tratando-se de direitos patrimoniais. Um exemplo que para mim tem sido significativo, e já solicitei cópia dessa negociação, resultou na troca da segunda parcela do 13ºsalário pela garantia ao emprego durante seis meses. Pressionado o empregador financeiramente, por razões de ordem econômica, cujo mérito não vou discutir — depois vou ver se isso pode ou não viciar a manifestação de vontade dos trabalhadores —, pelo ônus da segunda parcela do 13º salário, negociou com os trabalhadores a troca desse valor financeiro, objeto de pagamento de dívida bancária contraída pela empresa, — não vou entrar no mérito, mas depois vou referir também ao vício de vontade em relação a isso — que eles teriam garantia de emprego contra despedida arbitrária, sem justa causa, por um período de seis meses. E os trabalhadores aceitaram.

Ora, metade do 13º salário se evidencia, no meu entendimento, como parcela de natureza eminentemente patrimonial. Então me pergunto: não poderia esse trabalhador, recebendo a segunda parcela como patamar de garantia atribuída pela legislação — no caso específico da Constituição, nem isso poderia ser negociado, no meu entendimento, à luz desse projeto, mas estou levando a uma vantagem constitucionalmente assegurada —, não poderia o trabalhador livremente dispor, ir ao mercado comprar um terreno, pagar uma prestação, pagar o seu aluguel? Poderia ele dispor como quisesse. Comprar um presente para um filho? Depois de ter recebido, entendo que poderia fazer. Por que não poderia ele comprar uma outra coisa que não estava à sua disposição como garantia, que é a garantia de seis meses de trabalho, cujo valor a ser recebido transcende em doze vezes o valor da 2ª parcela do 13º salário? Dentro dessa perspectiva, a cujo exemplo refiro, situa-se apenas exemplo de 13º salário que não é negociável, porque está na Constituição, mas que se caracteriza como direito patrimonial, que não é evidentemente garantia de patamar mínimo, não diz respeito nem à saúde física e mental nem a interesse diretamente vinculado a terceiro, como Fundo de Garantia, férias e outras vantagens já referidas.

O segundo princípio que se estabelece como óbice a essa manifestação de vontade é o de que se , viciada a vontade do trabalhador e, portanto, anulável o ato jurídico daí decorrente quando essa manifestação de vontade se faz em prejuízo do trabalhador. Então, poderíamos intuir, e aqui foi referido, que essa negociação seria, digamos assim, ou teria o sentido de prejudicar o trabalhador. Não vou entrar nesse mérito, mas, de qualquer forma, refiro-me também neste caso à circunstância pertinente ao princípio do chamado vício presumido de consentimento. Ora, esse princípio tem sido secularmente aplicável às relações individuais de trabalho e não às relações coletivas de trabalho. Não posso presumir, poderei provar o vício. Não posso, portanto, antecipadamente presumir que a manifestação de vontade de uma categoria profissional, extraída de uma assembléia geral — e agora

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vou observar a fiscalização, o controle externo que se faz em relação a essas assembléias —, democraticamente realizada, possa ser, a priori, viciada. Ela poderá ser viciada, porque, levada a entendimento enganoso. E volto ao exemplo, no sentido de que o empregador tenha levado os trabalhadores e a categoria a erro, quando disse que estava em péssima situação financeira ou que utilizaria o valor em troca da estabilidade no emprego, ao pagamento de dívida bancária e, sim, fazê-lo em função de benefício pessoal próprio do seu sócio. Não posso presumir, mas isso não me impede de, sabendo-me enganado, ou seja, sabendo-se a categoria profissional que manifestou a sua vontade dentro de uma assembléia geral, sentindo-se e sabendo-se enganada, possa vir a pretender a anulação dessa manifestação de vontade. Já há previsão infraconstitucional nesse sentido. O Código Civil estabelece, dentre os vícios de manifestação de vontade que maculam a validade do ato jurídico, dentre outras, a previsão para vício de vontade: erro, dolo, coação, simulação, e assim por diante.

Portanto, não posso aplicar o princípio do vício presumido de consentimento, porque não posso presumir a priori, portanto, vício de consentimento decorrente de assembléia geral, como tenho, por outro lado, a segurança de, tendo sido enganado, tendo sido coagido, vir, pelos instrumentos que a lei já nos assegura, pelo antigo e antiquíssimo Código Civil, de anulação desse mesmo ato jurídico. Não bastasse isso — e aqui já foi referido — o Ministério Público, na sua nobre missão de fiscalizar a lei ou de agente da lei, está atento. E são inúmeras as ações anulatórias promovidas pelo Ministério Público em relação a determinadas cláusulas em que se antevê ou se presume a existência de algum vício, de alguma ilegalidade, de alguma inconstitucionalidade, o que leva, por sua vez, a outro controle, o controle judiciário dessa mesma cláusula quando analisa a ação anulatória. O tribunal vai além: antes de analisar meritoriamente as cláusulas, quando chamado, em recursos ordinários ou em competência originária, a analisar acordos celebrados dentro de ações coletivas, como disse o Ministro Almir Pazzianotto, dispõe-se a analisar, em defesa da higidez da manifestação de vontade, os elementos intrínsecos pertinentes ao quorum, à veracidade, à lisura da assembléia de onde partiu a manifestação de vontade.

Portanto, por vício de consentimento presumido, não vejo a menor possibilidade de impedirmos ou eivarmos de ilicitude ou ilegalidade o projeto desde logo.

Um terceiro princípio fundamental extraído, que de certa forma perpassou o que já foi dito, diz respeito ao chamado Princípio da Norma mais Benéfica. Segundo esse princípio, havendo duas normas a regular a mesma relação de trabalho, deverá o operador do Direito optar pela mais favorável ao trabalhador. Então, muitos juízes do trabalho — estou dando apenas como exemplo —, deixavam de aplicar a norma coletiva, em que se estabelecia a hora noturna de 60 minutos, na medida em que, havendo norma legal que a estabelece como de 52 minutos e 30 segundos, sendo essa última a mais favorável ao trabalhador, por princípio também tranqüilo — que não discuto nem rejeito — de que dentre as duas normas se optará pela mais favorável ao trabalhador, em favor da norma legal.

Perdoem-me os ilustres trabalhadores presentes e todos aqueles aqui representados, mas nessa circunstância, tratando-se de manifestação coletiva, de vontade extraída de uma assembléia geral, a opção pela norma mais benéfica, na circunstância referida, parece-me ofensiva aos trabalhadores. Isso estaria dizendo aos trabalhadores que eles não têm condições de, coletivamente, em assembléia geral, sob a fiscalização e controle do Ministério Público, evidentemente, subseqüente à cláusula dali extraída; subseqüente a uma fiscalização eventual que possa ocorrer pela Justiça do Trabalho, de dispor sobre sete minutos e trinta segundos do seu patrimônio em troca de algum outro benefício. Devo, aqui sim, presumir que, num acordo coletivo, com dez, vinte, trinta ou cinqüenta cláusulas, os trabalhadores apenas têm perdido vantagens. Não me parece razoável também esse raciocínio.

Por último, diz-se que há, ou poderá haver em grande parte, circunstância que posso até entender como extremamente razoável, uma debilidade de determinados sindicatos em, de maneira livre, democrática e consciente, extrair uma vontade que possa se sobrepor a determinadas circunstâncias

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legais. Isso é verdade. Seria, de certa forma, cinismo se disséssemos o contrário. Mas, a par dessa realidade, enumerei aqui inúmeros outros mecanismos legais que permitiriam, se fosse o caso, tanto o controle dessa debilidade quanto a recuperação dessa manifestação de vontade que tenha sido obtida por fraqueza, ou seja, por coação, por simulação, por dolo, seja lá como for. Então, há mecanismos que a lei prevê para os casos desses sindicatos mais fracos, o que não impediria, dentro dessas circunstâncias, que os sindicatos mais fortes, que as centrais sindicais, mais sabedoras do que nós da fraqueza desse ou daquele sindicato, o que me parece até uma obrigação sindical, viessem em apoio a esses sindicatos menores objetivando a adequação de normas legais a uma realidade ao lado da lei, numa aparente contraposição da lei, que, afinal, parece-me, é o objetivo.

Aqui menciono todos os exemplos — não vou citá-los, evidentemente, em função da exigüidade de tempo — em que, no Tribunal Superior do Trabalho, houve manifestação favorável à semelhança dessa sobre hora noturna de 60 minutos e não de 53 minutos e 30 segundos. Houve manifestação no sentido de que aquela norma "contrária" — entre aspas — à legislação se adotou a partir da impossibilidade de a lei regulamentar de forma adequada e específica todas as situações possíveis de vida, no sentido de se adequar a lei a uma realidade que não se conforma com a lei.

A complexidade desses cálculos de hora noturna é fantástica. Citou-se aqui hora in tinerepadronizada. Demonstrou-se — e aqui trago uma notícia complementar ao que foi referido pelo Ministro Almir Pazzianotto — matematicamente que, quando a empresa concorda em pagar uma hora extra para todos os trabalhadores, indistintamente, para todos os transportados, independentemente do tempo de viagem, do momento em que subiram ou que desceram do ônibus, o custo é o dobro do que ela teria com eventuais reclamatórias trabalhistas, o senhor sabe, inibidas, em grande parte, pela constância da relação de emprego e pela dificuldade de prova. Ou seja, a empresa passou a pagar muito mais. Claro que, administrativamente, no que se refere a prepostos, testemunhas, horas de advogado, ela passou realmente a pagar menos, mas, na realidade, houve uma distribuição eqüitativa, digamos assim, e havia trabalhadores que não teriam direito à hora extra porque o trajeto percorrido por eles, desde o momento que subiram no ônibus até o local de trabalho, já era servido por transporte coletivo público em horário compatível.

Então, não houve uma intenção aqui. O que se viu no momento, à semelhança da hora noturna, foi a dificuldade de cálculo. Se o trabalhador trabalhasse das 22h às 5h — e falo em trabalhador urbano, seria muito fácil o cálculo, mas a maioria começa às 19h e sabe-se Deus a que horas vai terminar. No tocante à hora in tinere, seria preciso um conferente em cada ônibus para se saber quantos minutos o trabalhador viajou, e assim sucessivamente.

Essas são as razões pelas quais, do ponto de vista eminentemente técnico, não vejo nenhuma inconstitucionalidade, nenhuma ilegalidade, no projeto que foi assim apresentado.

Era o que tinha a dizer. Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Agradeço ao Ministro Gelson de Azevedo as considerações e participação neste seminário.

Passo a palavra à próxima expositora, Dra. Regina Butrus, Presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, que disporá de dez minutos.

A SRA. REGINA BUTRUS – Exmo. Deputado Freire Júnior, Presidente desta Comissão, na pessoa de quem cumprimento os membros da Mesa; Srs. Parlamentares, membros do Ministério Público, Magistrados, advogados, sindicalistas, trabalhadores, assessores parlamentares, jornalistas, como membro do Ministério Público, instituição destinada à defesa da sociedade, abordarei alguns aspectos da ordem social a partir das questões técnicas e jurídicas já trazidas aqui pelos expositores.

Gostaria de iniciar a minha exposição reproduzindo a fala do Presidente Fernando Henrique Cardoso

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ao redefinir o papel do Estado como um ser ecológico em sua recente entrevista ao jornal espanhol El País:

"O Estado deve ocupar-se da vida. A vida, as pessoas, a saúde, a educação, a segurança, o meio ambiente. O mercado não se ocupa disso. Nunca se ocupou nem vai ocupar-se. O Estado deve ser o gestor da vida e o mercado, o gestor dos bens. E a vida tem que prevalecer sobre os bens".

A economia internacional globalizada, apesar de sua fantástica capacidade produtiva, está criando uma realidade nova, globalizadora, muito preocupante: a de um mundo novo de desempregados, de desiludidos, de desesperançados e de excluídos decorrentes da política de redução do papel do Estado na busca prevalente do interesse particular do lucro sem qualquer preocupação com a vida, que é a razão principal do Estado.

O Constituinte brasileiro assegurou a prevalência do social em detrimento do mero interesse particular. A coexistência dos interesses estatais, governamentais e sociais nem sempre se faz possível, despontando o Estado e o Governo como reincidentes violadores dos direitos sociais O Ministério Público tem a missão de incorporar ao sistema de justiça a parcela excluída da sociedade, missão que nem mesmo a atuação de grupos da sociedade civil poderia cumprir inteiramente.

O Ministério Público tem ajuizado, sim, ações anulatórias, como já foi aqui mencionado pelos ilustres expositores que me antecederam. Importante é notar que o Ministério Público não é fiscal das convenções e acordos coletivos firmados e celebrados pelas categorias profissionais e patronais. Então, como chega essa questão ao conhecimento do Ministério Público? Diversas vezes porque os próprios trabalhadores se sentem prejudicados pelas cláusulas inseridas nas convenções e nos acordos coletivos. Muitas vezes, a entidade sindical profissional tem que ceder em causas sociais relevantes para o trabalhador para poder incluir, nos instrumentos coletivos, cláusulas meramente salariais. A questão é trazida ao Ministério Público, que está aí como instituição defensora da ordem jurídica, defensora da sociedade como um todo. Mas não se pode, pela existência da instituição, deixar de pensar na questão que está sendo trazida pelo projeto, agora encampado pelo Governo Federal, do negociado sobre o legislado.

Recentemente, o Ministério Público ajuizou ação anulatória visando abolir de um instrumento coletivo uma cláusula que, de maneira indireta, retirava a garantia de estabilidade da gestante, prevista na Constituição Federal. Essa garantia constitucional veio a ser confirmada pelo Supremo Tribunal Federal — Relator, Ministro Sepúlveda Pertence — ao decidir que o direito ao negociado não pode violar os direitos legais irrenunciáveis dos trabalhadores, ou seja, que acordos e convenções coletivas de trabalho não podem restringir direitos irrenunciáveis dos trabalhadores.

Não se pode admitir que manifestações volitivas se sobreponham a direitos que a própria Constituição entendeu como indisponíveis e inderrogáveis pela vontade da parte. A flexibilização das normas coletivas não pode servir de amparo para mascarar a supressão de direitos já incorporados ao patrimônio dos trabalhadores.

O Projeto de Lei nº 5.483, de 2001, pretende a prevalência do negociado sobre o legislado sem antes assegurar as salvaguardas necessárias a que efetivamente haja uma negociação segura, sem submissão do trabalho ao mero interesse particular do lucro, do capital; sem preocupação com a vida ou com o social, que é papel exclusivo do Estado.

O Projeto de Lei nº 5.483, de 2001, não altera o conteúdo em si das relações de trabalho. Altera, sim, a forma de constituição das fontes do trabalho; altera o eixo de rotação da normatividade que incide sobre as relações de trabalho, de um sistema que privilegia as leis — a legislação estatal — para um

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sistema que privilegia a negociação coletiva.

Qualquer proposta séria de mudar essas regras implicaria em ter como pressuposto só retirar a lei do cenário após estabelecer contrapartidas legais que equilibrem as forças entre empregado e empregador de modo a garantir uma negociação legítima de igual para igual. A proposta do Governo, inserida no Projeto de Lei nº 5.483, de 2001, limita-se a propor a retirada da lei do cenário sem criar as contrapartidas equilibradoras. Não é assegurado previamente aos trabalhadores o equilíbrio de forças necessário a uma real negociação. A livre negociação inexiste e arrisca a sobrevivência do próprio capitalismo.

Há um fato que define quem fica com a maior força, com a maior fatia, a força e o poder. A negociação é uma ficção se não houver como pressuposto o equilíbrio de forças. Quando não há esse equilíbrio, o mais poderoso dita as condições que mais lhe interessam. No mundo real do trabalho, não existe o equilíbrio de forças. O poder dos patrões é imensamente superior ao dos empregados. Assim, não há negociação sem que esse desnível de forças seja contrabalançado. É preciso verificar se os atores da negociação coletiva estão preparados para assumir seu papel.

É certo que os países mais desenvolvidos são exatamente aqueles onde a negociação coletiva constituiu ou constitui o eixo principal do Direito do Trabalho. Nos Estados Unidos, diversamente do que acontece em nosso País, o Direito do Trabalho nasceu e se criou na base da negociação. Não existe no Brasil uma tradição de sindicalismo autônomo, reivindicativo e de ação ordenada por projetos e organismos sindicais centrais.

A eficácia de qualquer incentivo público à negociação coletiva está condicionada à superação em definitivo do nosso sistema sindical corporativista, que se traduz pela unidade sindical imposta pela Constituição, pelo monopólio legal da representação dos interesses e dos direitos dos trabalhadores, dos empregadores não filiados voluntariamente e pelo poder normativo da Justiça do Trabalho.

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal restringiu ao número de sete os dirigentes dos sindicatos. Essa redução significa que apenas sete membros da diretoria do sindicato gozam de estabilidade no emprego. Embora sem qualquer crítica à decisão, que partiu do pressuposto que havia abuso por setores do movimento sindical, torna-se impossível ter um sindicato combativo com um número tão pequeno de dirigentes sindicais protegidos da pressão do empregador, principalmente se for levado em conta que algumas categorias possuem milhares de trabalhadores nas suas bases de atuação.

É difícil qualificar como positiva a alteração proposta pelo Governo, já que ela transfere a responsabilidade para uma negociação onde as partes estão em patamares desiguais.

O regime de urgência imprimida ao Projeto de Lei nº 5.483, de 2001, não se coaduna com a seriedade que a crise econômica exige de todos aqueles que têm responsabilidade pública.

O Poder Legislativo, ao dizer "não" ao Projeto de Lei nº 5.483, de 2001, estará dizendo "não" à ampliação do desemprego, à terceirização, à precarização do trabalho e à violação dos direitos sindicais.

Os adeptos do projeto não podem se esquecer que o capitalismo mesmo sentiu o prejuízo do laissez-faire, laissez-passer e criou o Direito do Trabalho não por benevolência, mas para evitar o conflito direto, para evitar a solução violenta do conflito social. Lembrem-se, senhores, que as pessoas expulsas do emprego não vão para o exterior fazer compras, não deixam o País; elas ficam por aqui, na periferia, na marginalidade, vivendo na miséria, e encontram a violência como meio de obter alguma solução para os seus problemas.

A Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, preocupada com as conseqüências dessa alteração legislativa, conjuga esforço com a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do

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Trabalho e a Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas na tentativa de sensibilizar os Srs. Parlamentares para a necessidade de ver rechaçado ou melhor estudado o Projeto de Lei nº 5.483, de 2001.

Muito obrigada. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Antes de passar a palavra ao próximo orador, comunico que os Srs. Ministros do Tribunal Superior de Trabalho Ives Gandra da Silva Martins Filho e Gelson de Azevedo, em função de sessão plenária daquela Corte que se iniciará às 13 h, terão que se retirar, pelo que pedem escusas e lamentam profundamente, pois gostariam de participar do debate. Esta Presidência concorda e agradece a participação de S.Exas.

O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA - Sr. Presidente, não me foi possível chegar a tempo por problemas do vôo do Rio de Janeiro para cá. Pude apenas assistir à exposição do ilustre Ministro Gelson de Azevedo. Mas antes que os Srs. Ministros se retirem, gostaria de fazer considerações a respeito do pronunciamento de S.Exa. Não ouvi os expositores que o antecederam, mas gostaria muito, e é o meu dever, de fazer considerações a respeito de sua visão de ausência de inconstitucionalidade nesse projeto.

Há, realmente, considerações contrárias, e seria desagradável e deselegante para o debate parlamentar fazê-las na ausência dos Sr. Ministro, no entanto, a situação me imporá o dever de fazê-lo. Gostaria que o Presidente fizesse chegar ao Sr. Ministro, com todo respeito, as observações que terei que desenvolver em sentido contrário a sua exposição sobre a inconstitucionalidade desse projeto.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Por solicitação de V.Exa., esta Presidência fará chegar aos gabinetes dos Ministros suas ponderações.

O SR. DEPUTADO PROFESSOR LUIZINHO - Sr. Presidente, as entidades...

O SR. DEPUTADO JAIR MENEGUELLI - Sr. Presidente, os dois expositores que são a favor do projeto falam, vão embora, e nós não podemos discutir? Então, não tivessem vindo.

(Tumulto no plenário.)

O SR. DEPUTADO JAIR MENEGUELLI - Desculpe-me, Sr. Presidente, mas não deviam ter vindo.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Vamos ouvir o próximo expositor, Dr. Roberto Caldas, representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

O SR. DEPUTADO ALDO ARANTES - Pela ordem, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Tem a palavra V.Exa.

O SR. DEPUTADO ALDO ARANTES - Sr. Presidente, na verdade, nos impuseram um monólogo. Entendo que essa discussão é de grande relevância para a Comissão e para a Casa. Os expositores, quando aqui vêm, manifestam sua opinião, mas devem também ouvir o Congresso Nacional, que vai votar.

(Manifestação de aprovação no plenário.)

Considero que a atitude não só do Presidente do TST, como dos outros Ministros, é de desrespeito a esta Comissão e ao Parlamento brasileiro. Se eles foram convidados para uma mesa de debates,

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teriam que prever sua participação. É inaceitável que eles venham, manifestem suas opiniões e não ouçam os Parlamentares acerca de uma questão de tal relevância para os trabalhadores e para o povo brasileiro.

(Manifestação de aprovação no plenário.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Peço à platéia que não se manifeste, conforme previamente acordado com todos os presentes e os líderes partidários.

Deputado Jair Meneguelli, tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO JAIR MENEGUELLI - Sr. Presidente, é lamentável. Se os Srs. Ministros sabiam que não podiam ficar até o final do seminário, o melhor seria que não tivessem vindo. Já que o fizeram, gostaria de pedir encarecidamente e, se for o caso, discutimos e votamos a questão, que se retire da ata os pronunciamentos de S.Exas., que os mesmos sejam invalidados. Para nós, esses pronunciamentos não existiram, uma vez que não podemos nos contrapor aos seus argumentos. Repito: peço que se retire da ata os pronunciamentos dos três Ministros que aqui estiveram.

O SR. DEPUTADO PROFESSOR LUIZINHO - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - O Deputado Professor Luizinho tem a palavra.

O SR. DEPUTADO PROFESSOR LUIZINHO - Sr. Presidente, solicitei a palavra a V.Exa. porque gostaria de falar na presença dos Ministros, já que não gostaria de fazê-lo na sua ausência. Alguns Ministros — e não me parece ser a opinião da Corte — nos deram a impressão de que vieram militar a favor e não fazer uma análise técnica do projeto; que querem fazer a militância de um texto que parece terem escrito juntos. Essa foi a impressão que tivemos. Agora, S.Exas. se retiram e não nos dão a menor chance de diálogo.

Portanto, queria manifestar nosso um repúdio, Sr. Presidente. Gostaria de ter dito isso a eles.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Deputado Paulo Paim, V.Exa. tem a palavra.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM - Companheiros que estão no plenário, sindicalistas principalmente, este é um momento em que todos estamos sendo movidos um pouco pela emoção. Sabemos o que significa para um trabalhador, depois de 60 anos, perder todos os seus direitos. Mas lembro a todos que os depoimentos dos três Ministros, na verdade, atestaram que o projeto é inviável. S.Exas. ficaram tão encabulados, tão envergonhados, que falaram e foram embora. Não tiveram a coragem de sustentar o debate. (Muito bem. Aplausos.)

Gostaria que os Parlamentares que aqui estão entendessem esta fuga dos Ministros como uma mostra de que também eles estão envergonhados. Vi isso na expressão de cada um. O Ministro Pazzianotto diversificou para lá, para cá e não disse coisa com coisa. Nenhum deles tinha condições de sustentar o debate, seja com o Plenário seja com os painelistas aqui convidados. Essa fuga dos três Ministros, que aqui vieram para defender o projeto, deixa claro que projeto não tem sustentação técnica, jurídica nem moral.

Devido ao quadro, gostaria que retomássemos o debate aproveitando os quatro painelistas que, com certeza absoluta, darão uma maior contribuição para que derrubemos de uma vez por todas esse projeto hoje à tarde. Duvido que, depois da exposição dos Ministros, tenhamos um Deputado que vote a favor desse projeto.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Deputado Pedro Celso, faça suas considerações.

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O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Sr. Presidente, considero que o acordo feito na semana passada foi descumprido. Este seminário está prejudicado. Não me sinto em condições de votar esse projeto à tarde porque o debate não foi feito. O seminário não foi concluído.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Ainda não foi concluído. Vamos ouvir o último orador.

O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO - Sr. Presidente, sinto-me descompromissado com o acordo firmado na semana passada a partir da atitude deselegante dos Ministros. Não me sinto obrigado a cumprir o acordo firmado na semana passada porque ele foi descumprido com a saída dos três Ministros.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Deputado Pedro Celso, essa é uma questão que deveríamos debater entre os Parlamentares...

O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Não há condições de se votar o projeto à tarde. Essa é minha posição.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – ... em uma reunião na sala da Presidência depois de encerrado o seminário.

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Tem V.Exa. a palavra.

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN – Gostaria de cumprir a determinação de V.Exa. no sentido de encaminhar, na próxima reunião dos Deputados da Comissão, a análise da proposta do Deputado Jair Meneguelli.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior)– Perfeito. Vamos apreciar isso.

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN – Não podemos acatar, de forma passiva, tamanho desrespeito, principalmente do Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, que aqui falou por mais de 35 minutos e, ao terminar, se retirou. Não é possível. Não é essa a atitude que merecem não só os sindicalistas, como os Parlamentares que aqui se encontram. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Vamos continuar nosso seminário.

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN – Devemos analisar a possibilidade de não permitir que seja incluída nos Anais, nas notas taquigráficas, nenhuma das palavras proferidas pelos três Ministros que aqui estiveram.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Vamos continuar nosso seminário ouvindo o último orador inscrito.

(Não identificado) - Sr. Presidente, é preciso resolver a questão de ordem do Deputado Jair Meneguelli.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Não há questão de ordem. Há um requerimento de S.Exa., e essa não é uma reunião deliberativa. Levarei o requerimento a uma reunião deliberativa desta Comissão.

Não darei mais a palavra a nenhum Parlamentar. Vamos ouvir o último expositor. Cabe a esta Presidência registrar que foi seu pedido ser o último a fazer suas considerações.

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Com a palavra o Dr. Roberto Caldas, representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

O SR. ROBERTO CALDAS – Sr. Deputado Freire Júnior, Presidente desta notável e importante Co missão; caros membros da Mesa, agora um tanto quanto esvaziada; Sras. e Srs. Deputados, sindicalistas, advogados, procuradores, juízes, sem dúvida, esta assentada é de fundamental importância para o respeito, para o futuro do direito do trabalhador no Brasil. Não resta nenhuma dúvida de que há, nessa proposta apressada, urgente, uma inconstitucionalidade absoluta. (Palmas.)É nesse sentido, reto e direto, que se manifesta a OAB perante V.Exas. e a sociedade brasileira.

O Presidente Rubens Approbato Machado incumbiu-me dessa grave e importante missão, mas disse-me que gostaria muito de estar presente neste debate pela importância crucial que tem. Disse-me ainda que, se outra oportunidade houver, aqui estará.

A convocação foi feita com muito pouco tempo. O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil reúne-se uma vez ao mês, o que está acontecendo exatamente nesse momento, tratando também de questões de grande importância. Por essa razão, o Presidente da OAB não pôde estar presente, e certamente estaria representando muito melhor não apenas os advogados brasileiros como a sociedade. Está em nosso estatuto a defesa da ordem democrática acima de qualquer coisa. Portanto, acato as manifestações emanadas pelo Presidente Rubens Approbato.

Dividirei minha manifestação em dois momentos, e serei breve. Primeiro, em nome do Conselho Federal da OAB, da nossa Comissão Nacional de Direitos Sociais, que ontem já deliberou unanimemente, manifesto a inconstitucionalidade dessa proposição legislativa. (Palmas.)

Não nos escusaremos do debate técnico, do debate sobre a urgência nem sobre a oportunidade. Para nossa felicidade, quero crer que nenhum dos três eminentes expositores defendeu a urgência, a oportunidade e o mérito. É importantíssimo notar isso. A defesa foi tão-somente do aspecto formal de inconstitucionalidade, com o que, com o devido respeito e as devidas desculpas, discordamos direta e integralmente. O projeto é inconstitucional, o que teremos oportunidade de demonstrar.

Temos a impressão de que há uma unanimidade pelo menos na representação da comunidade jurídica. É importante verificar a representatividade dessa mesa, em que estão a Associação Nacional dos Juízes do Trabalho, a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, o DIAP, o Presidente da Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas — ou seja, as três esferas —, e a Ordem dos Advogados do Brasil, que representa, além dos advogados trabalhistas, todo seu universo. Toda essa representação é contrária a essa proposição legislativa.

Diminuiríamos muito o debate se ficássemos apenas na formalidade da lei. Não estaríamos percebendo a realidade deste País continente, que é extremamente diversificada. Como já definiu Belluzzo, somos uma "Belíndia": numa parte somos Bélgica e, na outra, somos Índia. Não é porque estamos aqui na Bélgica, no centro do poder, no Congresso Nacional, que temos o direito de esquecer os trabalhadores que, neste momento, estão sendo escravizados em nosso País. É em nome deles que este Congresso Nacional fala e legisla.

É em nome deles que a OAB também milita. E milita, em primeiro lugar, não na defesa de interesses corporativistas, mas em favor da sociedade. E se na sociedade há um conflito entre o fraco e o forte, o pobre e o rico, certamente ficará com os primeiros.

Nosso País, com diferenças abissais de distribuição de renda e de oportunidades, tem de resgatar a dignidade dos irmãos que mais necessitam. Não é novidade no movimento sindical brasileiro, muito menos na OAB, a discussão sobre o contrato coletivo de trabalho e a negociação coletiva como instrumento preferencial de resolução dos conflitos. Isso não é novidade. Há até um livro, que para nós foi um marco, do Dr. José Francisco Siqueira Neto, assessor da CUT e do Sindicato dos

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Metalúrgicos do ABC, que defende a negociação coletiva em outro patamar de entendimentos, com atores devidamente equilibrados, com um sindicalismo autônomo, forte e fundamentalmente livre, sem as peias da limitação do número de dirigentes sindicais, com efetiva segurança no emprego e, de fato, liberdade e autonomia sindical. A Convenção 87 da OIT, a velha Convenção 87, de mais de 50 anos, é respeitada no País, embora não tenha sido aprovada pelo Congresso Nacional. Ela significa o mínimo em termos de liberdade e organização sindical. Certamente hoje não teríamos condições de aprovar a Convenção 87 porque os atores não parecem devidamente preparados pela legislação repressiva que tivemos ao longo dos anos. Haveria então grande debate para aprovar a própria Convenção 87.

Só haveria jeito de implantar o regime de negociação no País em duas condições básicas: com sindicatos fortes e uma legislação mínima de sustento. Mesmo assim teríamos de nos preocupar muito com as exceções que necessariamente deveriam ser feitas para aquelas categorias sem condições de se organizar porque o Brasil ainda não alcançou graus mínimos, básicos de educação para nosso cidadão.

Bem lembrou o Juiz Hugo Melo Filho que sequer a Convenção 158 da OIT, que dá garantias ao trabalhador contra a demissão imotivada, com termos muito frágeis, tênues, o Governo Federal manteve em nossa legislação. Como então pensar em desproteger, retirar uma legislação mínima? Quero lembrar que hoje estamos aqui na condição de defensores de uma legislação repressiva, Sras. e Srs. Deputados! Uma legislação que evidentemente há muito tempo é criticada também pela comunidade jurídica. Hoje a estamos defendendo porque ela é o mínimo! É o mínimo do mínimo.

Portanto, se assim não for, teremos da noite para o dia, nessa urgência que se quer imprimir, o estabelecimento do caos. O caos que nos parece correr com uma urgência porque esse projeto não poderia ser debatido, salvo engano, no próximo ano, porque é ano eleitoral. Indaga-se: por que não debatê-lo no ano eleitoral? Não será esse o ano em que a sociedade estará, sim, com os olhos voltados para o debates legislativos? Ou tememos pela condução e pelo direcionamento dos debates?

Parece-nos que essa urgência agora pedida tem caráter evidentemente inibidor do debate e claramente antidemocrático. (Palmas.)

No mês passado tivemos oportunidade de realizar na Bahia o XXIII Congresso Nacional dos Advogados Trabalhistas, sob a Presidência do Dr. Luís Carlos Moro, que rechaçou em exame aprofundado esse projeto. Os advogados brasileiros do Trabalho deram seu recado contrariamente a esse projeto.

Nesse momento passo à segunda etapa de minha manifestação, lendo uma pequena parte do discurso do Presidente da OAB, Dr. Rubens Approbato Machado, feito na semana passada, no dia 8, em congresso realizado no Rio Grande do Sul, em Cachoeira do Sul, em que enfrenta diretamente essa questão, inclusive a constitucionalidade.

Lerei o discurso uma vez que o convidado inicial para essa mesa era o Dr. Rubens Approbato. Não quero ser infiel aos termos literais de sua palavra.

Diz o Dr. Approbato:

No que tange à flexibilização da legislação trabalhista, traz ela, no que concerne às relações individuais de trabalho, um desvirtuamento que poderá fazer retornar aos períodos anteriores às conquistas dos trabalhadores, sujeitando-os, em pleno século XXI, a condições subumanas de trabalho. Merece profunda reflexão o recente

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Projeto de Lei 5.483, de 2001, que altera a redação do artigo 618 da CLT. E ao se indagar se essa proposta é boa ou ruim esclarece o jurista antes citado que o problema é o de se saber se os atores da negociação coletiva estão ou não preparados para assumir esse papel. Responde com a advertência de que o Brasil tem um sistema arcaico de organização sindical com unicidade sindical, apenas um sindicato por categoria ou por base territorial, e com a ausência de garantias sindicais efetivas. Aí está o cerne do problema. Para negociar além ou fora dos parâmetros legais impõe-se a existência de sindicatos fortes, com dirigentes preparados para evitar fraudes, negociatas, peleguismos e outras pragas que afetam os sindicalismos e as relações trabalhistas. O ilustre advogado trabalhista e Conselheiro da Seccional Paulista da OAB, João José Sady, em entrevista concedida ao site do consultor jurídico na Internet, ressalta os equívocos do projeto, afirmando que ‘não se pode aceitar que o Governo apresente um projeto de tamanha importância para as relações trabalhistas baseado no desconhecimento da própria Constituição porque estará vendendo gato por lebre’.

Nesse mesmo noticiário, há informação de que na avaliação dos advogados trabalhistas o projeto do Governo propõe um desmonte dos direitos dos trabalhadores e que a maioria das vantagens será direcionada para a empresa e enfraquecerá durante as negociações com os empregadores.

Pulo algumas partes, caminhando para a conclusão.

Diz o Dr. Approbato:

A luta dos advogados contra essas leis e esses projetos de lei não é corporativa ou pela manutenção do mercado do trabalho, mas fundamenta-se na defesa da cidadania, uma vez que se alicerça no impedimento do desequilíbrio entre as relações trabalhistas, podendo acender o estopim da insurreição social.

Como é sabido, a OAB tem se engajado na mobilização cívica institucional, trabalhando pelo desenvolvimento do País em todos os seus aspectos nos campos político, ético, social, econômico, setoriais e regionais, procurando, em todos eles, envolver os advogados. Mas não podemos deixar de lado as questões mais diretas que se ligam aos interesses, às metas e à missão que cabem à classe dos advogados.

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Convoco todos para as nossas lutas. As batalhas são duras, e cada vez mais desafiantes.

Conclui dizendo:

Mas a determinação, a coragem, a nossa disposição e sobretudo a nossa união haverão de nos garantir a vitória. Nunca se vence o perigo sem perigo. Este lema há de nos inspirar.

Concluiu, assim, o seu discurso (Palmas.) o Dr. Approbato. E dessa forma caminho para o encerramento da nossa manifestação.

Ontem, na Comissão Nacional de Direitos Sociais da OAB, tivemos a oportunidade, como aqui já foi referido, de receber a visita do Frei Henri des Roziers, um grande lutador pelos direitos dos mais excluídos no sul do Pará. Ele levou um trecho do programa Fantástico, da Rede Globo, de duas ou três semanas atrás. Era um trecho longo, de 14 minutos, que cuidava exatamente do trabalho escravo no Brasil, especialmente no Pará, Maranhão e Mato Grosso. O vídeo é impressionante. Algumas dos senhores talvez o tenham visto.

Ali vimos esse Brasil, entre aspas, "Índia". Vimos que o Grupo Móvel do Ministério do Trabalho, acompanhado da Polícia Federal, desbaratava ali uma verdadeira quadrilha de fazendeiros que aprisiona trabalhadores e os escraviza. Foi a primeira vez que alguns daqueles indivíduos tiveram a oportunidade de tirar seu primeiro documento: a carteira de trabalho. Aliás, não era o primeiro documento. Era a primeira fotografia que alguns deles tiravam na vida. Era a primeira vez que algum deles assinava com o dedão.

É com este País que nos devemos preocupar neste momento. Da mesma maneira, temos o sindicalismo forte, aqui hoje representado, mas e o trabalhador que sequer sindicalizado é, que sequer sindicato tem? E os sindicatos fracos, os sindicatos da Índia, de Bangladesh, sabe-se lá de onde — melhor dizendo, os sindicatos do Brasil mesmo? Esses terão alguma condição de negociar, de evitar a fraude, de ler os termos do contrato coletivo de trabalho? A OAB entende que não.

Não podemos, Sras. e Srs. Deputados, continuar a nos constituir em um País de ilegalidade, em que o Judiciário é fraco. E é fraco porque ainda não atende sequer aquilo que o trabalhador pleiteia quando vai a juízo. No Direito do Trabalho, quando o trabalhador reclama já começa perdendo, porque algumas vezes tem de pagar custas e honorários dos advogados, o que já é uma parcela do seu ganho. Muitas vezes ele tem, pela primeira vez, de pagar Imposto de Renda, porque juntou o ganho de todo um período que deixou de ser pago. E não temos uma legislação que o proteja neste momento. Pela primeira vez ele paga imposto de renda, e os seus ganhos são reduzidos a 50%.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Dr. Roberto Caldas, permita-me interromper V.Sa. para fazer o convite ao Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, Deputado Nelson Pellegrino, que se encontra presente, para tomar assento à Mesa e participar conosco deste seminário. (Palmas.)

O SR. ROBERTO CALDAS – Li uma vez uma entrevista de um dirigente sindical muito conhecido, o Vicentinho. Ele resumiu bem em uma frase o que pode ser a negociação entre partes desiguais. Dizia o Vicentinho que o tipo de negociação que se quer apresentar a nós é a negociação do pescoço com a guilhotina. Acho que essa frase resume muito bem a negociação com partes em desequilíbrio. Se temos parte do sindicalismo preparada, a maior parte não está.

Sras. e Srs. Deputados, finalizo enfrentando a questão da constitucionalidade. Temos muita segurança de que o Supremo Tribunal Federal não aceitaria, por evidente inconstitucionalidade, uma

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legislação que modificasse, com esse texto, o art. 618 da CLT.

Não nos impressiona o argumento do eminente Ministro Ives Gandra Filho de que o próprio artigo ressalva que não se pode fazer negociação contra a Constituição, porque isso é óbvio. É o óbvio gritante. Nada, nenhuma lei, nenhuma negociação pode ser feita contra a Constituição. O dispositivo dizer isso é chover no molhado. Não garante absolutamente nada. Não representa nada.

Devemos nos preocupar com a primeira parte do texto, que quer trazer a lei para um mundo sub-reptício, onde ela será respeitada se for conveniente, se não houver fraude numa negociação, falsificação de documento ou de atos, que nós, que militamos na Justiça do Trabalho, vemos todos os dias. Portanto, preocupamo-nos, sim, quando se quer alterar uma lei com a realidade fática vivenciada no nosso País. O realismo jurídico vem desde o início do século, e os juristas falam que não há lei sem a sua aplicação prática, e é essa aplicação que nós queremos cuidar.

Nós estaríamos aqui a jogar no ralo 60 anos de tentativa de uma legislação que garanta um mínimo, um equilíbrio na sociedade, melhor distribuição de renda e um salário mínimo mais digno ou menos indigno. Com simplismos não chegaremos a uma solução.

Por último, lembro uma decisão do Supremo Tribunal Federal muito recente, até para comprovar a nossa tese de que o STF julgaria inconstitucional esse decreto e a OAB certamente entraria com uma ADIN. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal decidiu que um acordo feito no Rio Grande do Sul, que diminuía o prazo de licença-gestante, era inconstitucional. Portanto, por não estar naquele rol das três exceções estabelecidas pela Constituição, aquele acordo era inconstitucional.

Estamos aqui discutindo a constitucionalidade ou não da lei. Queremos frisar que, por unanimidade, nossa Comissão de Direitos Sociais da OAB entendeu que o projeto é inconstitucional.

Sras. e Srs. Deputados, está nas mãos de V.Exas. estabelecer um marco no Direito do Trabalho, um marco muito claro para nós entre um direito que se pretende construir e a barbárie que se pretende implantar e destruir.

Muito obrigado. (Palmas.)

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN – Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Antes de iniciar o debate, seguindo a relação de Parlamentares inscritos, passo a palavra ao Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, o brilhante Deputado Nelson Pellegrino.

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN – Em seguida gostaria de fazer uso da palavra, pela ordem, Sr. Presidente.

O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, sindicalistas, trabalhadores, demais autoridades da Mesa e participantes deste seminário, em primeiro lugar elogio o Deputado Freire Júnior pela iniciativa de atender a sugestão dos Deputados Paulo Paim e Vanessa Grazziotin. Propuseram S.Exas. o debate da proposta de flexibilização das relações do trabalho, enviada a esta Casa pelo Governo, nas duas Comissões: a do Trabalho, de Administração e Serviço Público e de Direitos Humanos. Nós, da Comissão de Direitos Humanos, entendemos que o direito ao trabalho é também um direito humano, principalmente o direito ao trabalho em condições dignas para a pessoa vender sua força de trabalho. Quando o Deputado Paulo Paim trouxe à nossa Comissão a proposta de nos associarmos a este seminário, aderimos ao pedido de pronto, porque consideramos que esse é tema de fundamental importância.

Recentemente, o Presidente Fernando Henrique Cardoso discursou na ONU sobre a necessidade da

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globalização solidária, tecendo críticas a essa globalização selvagem que o mundo vive hoje. Sabemos muito bem que nessa estratégia de globalização selvagem está, sem dúvida alguma, a desregulamentação e a flexibilização dos direitos do trabalho para permitir que a livre lei de mercado possa estabelecer o processo de compra e venda do trabalho.

Sabemos que nos primórdios do capitalismo o liberalismo econômico era a ideologia que pontuava a livre relação entre trabalho e capital. Naquele período os trabalhadores chegavam a exercer jornada de 16 horas por dia, e até crianças faziam jornada de 14 horas, sem os benefícios que foram conquistados ao longo de mais de cem anos de luta da classe trabalhadora, que custou inclusive a vida de muitos.

Nossa atual Constituição é considerada cidadã. Contempla os direitos sociais, protege o trabalho e a organização sindical. Numa conjuntura de recessão mundial e de avanços das conquistas do capital sobre o trabalho, num País que tem um exército industrial de reserva de 12 milhões de trabalhadores, mesmo com toda uma proteção instituída num capítulo constitucional, é inadmissível que o trabalhador brasileiro ainda seja submetido a diversas formas de burla da legislação trabalhista e dos dispositivos constitucionais. É inadmissível que o Governo apresente ao Congresso Nacional neste momento proposta que contradiz seu discurso, porque só faz aprofundar essa globalização selvagem a que o Brasil foi submetido.

A nossa Comissão parabeniza os Deputados Paulo Paim e Vanessa Grazziotin por trazerem mais uma vez esse debate para a Câmara dos Deputados. Disse ao Deputado Freire Júnior, que concordou com nossa posição, que essa matéria não pode passar de forma açodada por esta Casa, porque são os direitos de milhões de trabalhadores que estão em jogo.

Não concordamos, de forma alguma, com a urgência que o Governo quer dar à matéria. Ela tem de tramitar com toda a tranqüilidade, a fim de que este Congresso soberanamente possa decidir se esse é o caminho que queremos adotar. Acredito que não seja esse. O caminho que queremos trilhar é o do fortalecimento das relações entre trabalho e capital, protegendo o primeiro para que o Brasil possa crescer cada vez mais.

Não compactuamos com a idéia de que o Custo Brasil nessa competição globalizada tenha de ser resolvido por intermédio da supressão dos direitos do trabalhador. Ele tem que ser resolvido a partir da modernização do nosso parque industrial, da tecnologia da infra-estrutura, do investimento em ciência e tecnologia e da simplificação do sistema tributário, desonerando o setor produtivo. Queremos não apenas produzir, mas buscar mercados exteriores e com eles concorrer. Não é suprimindo os direitos dos trabalhadores que resolveremos o problema do Custo Brasil. Essa é a visão profundamente equivocada que infelizmente o Governo brasileiro insiste em adotar.

Portanto, quero dizer-lhes — e não apenas como Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Parlamentar, mas como advogado trabalhista, uma vez que minha vida profissional está pontuada por esse tipo de prática — que estaremos vigilantes em relação ao trabalho. Este, que é um direito fundamental do ser humano, tem de ser exercido com as garantias necessárias. A venda da força do trabalho deve ser praticada no mercado em condições dignas.

Parabenizo os Deputados Paulo Paim e Vanessa Grazziotin por terem proposto tão importante discussão. Este seminário é fundamental para entendermos que o caminho proposto não é o da flexibilidade regulamentar, mas o da busca da eficiência na modernização tecnológica, infra-estrutura, simplificação e desoneração da produção para que o Brasil cresça com justiça social. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Obrigado Deputado Nelson Pellegrino.

Com a palavra a nobre Deputada Vanessa Grazziotin.

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A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN – Primeiramente, agradeço ao Deputado Nelson Pellegrino as palavras. Quero dizer que se não fosse o esforço desta Comissão certamente não estaríamos reunidos neste seminário. Aproveito o momento para registrar a permanente presença do Deputado José Múcio. Infelizmente, outros Parlamentares não têm a mesma persistência e força de S.Exa.

Tenho conhecimento de que há número significativo de representantes de entidades e de Parlamentares inscritos para falar. Como não se trata de audiência pública, mas de um seminário, todos terão os mesmo direitos — Deputados e convidados — de se pronunciar. Ninguém será privilegiado. Como este é um seminário, esperamos dar oportunidade aos representantes das mais diferentes entidades. Então, sugiro a V.Exa. — eu e o Deputado Paulo Paim já fizemos acordo com os autores do requerimento deste seminário em que abrimos mão inclusive de falar primeiramente —que iniciemos com as entidades fazendo o revezamento: duas entidades, um Parlamentar. Acho que assim democratizaremos mais o debate e não correremos o risco de concluir o seminário sem que nenhum representante se possa manifestar. É a sugestão que faço a V.Exa. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Muito bem. Vamos então buscar entendimento para o procedimento do debate. Inicialmente esta Presidência — e já havia comunicado ao Deputado Paulo Paim — dará a palavra aos Parlamentares e, em seguida, aos senhores líderes trabalhistas que nos honram com a presenças.

Há duas questões que precisam ser acertadas. Primeiro, o horário. São 12h 48 min; logo, precisaríamos estabelecer prazo para encerramento do seminário, posto que está marcada reunião deliberativa da Comissão para as 15 horas. O tempo de cada orador — Parlamentar ou representante de entidades — deve ser estabelecido. Não há, por parte da Presidência, óbice algum para fazê-lo, pelo contrário, acho que essa proposta pode enriquecer os diversos enfoques apresentados pelos Parlamentares e líderes sindicais. Dessa forma, sugeriria 5 minutos tanto para os Parlamentares como para os representantes das entidades.

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN – Inclusive os autores concordam com os 5 minutos também, ou seja, abrimos mão dos 10 minutos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Os outros Parlamentares estão de acordo com o prazo de 5 minutos e o horário de encerramento às 14h15min?

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM – Como há inúmeros inscritos, pediria que falassem três entidades e um Parlamentar.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Há sete Parlamentares e oito entidades inscritos.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM – Proponho encerrarmos às 15 horas.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Mas, a reunião está marcada para as 15 horas.

Quero convidar os membros da Comissão para uma reunião prévia na sala da Presidência, antes de iniciar a reunião deliberativa às 15 horas. Portanto, proponho alguma flexibilidade. A princípio, encerraríamos às 14 horas ou 14h15min. Poderíamos, contudo, estender o tempo por mais 15 minutos, de forma a não prejudicar nenhum Parlamentar ou entidade.

Antes de conceder a palavra à primeira liderança sindical, esta Presidência em função da amizade e admiração que tem pelo grande Constituinte, Deputado João Paulo, que Minas Gerais emprestou ao Congresso Nacional e ao País, passa a palavra a S.Exa.

O SR. DEPUTADO JOÃO PAULO – Quero agradecer ao Deputado Freire Júnior a consideração e

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cumprimentar os demais membros da Mesa.

Como fui Deputado eleito pelo movimento sindical, sinto-me muito à vontade para falar sobre a matéria. Tenho esperança de que esta Casa comece a voltar sua atenção para os interesses da maioria do povo brasileiro. Infelizmente, ao longo desses mais de cem anos de República, não tivemos sequer um projeto de Governo voltado para a maioria. É evidente que as conseqüências dessa prática de Governo de privilegiar os interesses da elite nos levaram à profunda desigualdade social, econômica e, sobretudo, política. Hoje, este País não dá às entidades sindicais a possibilidade de alcançar a estatura política que lhes cabe no cenário político nacional. E eu vou citar um exemplo muito expressivo dessas desigualdades, da ineficiência das instituições diante do poder econômico e da eficiência das instituições em violar direitos dos trabalhadores coonestando ações de empresários.

Quando Constituinte nesta Casa, envidamos todo o nosso esforço a fim de aprovar o art. 7º, que trata dos Direitos Sociais, na Constituição Federal. Uma noite fui chamado ao gabinete do ex-Deputado Antonio Britto e quando lá cheguei eu me encontrei com o Sr. Johanpetter Gerdau, Diretor-Presidente do Grupo Gerdau. Discutimos o sistema de revezamento de seis horas e chegamos a um acordo, e o Sr. Johanpetter disse-me — o Deputado Antonio Britto é testemunha disso — que se passar o dispositivo constitucional eu não o acatarei. E de fato ele não aplicou o turno de seis horas em nenhuma de suas empresas até hoje. Infelizmente, não são apenas esse tipo de atitude de empresários que constatamos em nosso cenário.

Recentemente a USIMINAS impôs a dois mil e quinhentos trabalhadores, sob ameaça de dispensa, a desfiliação ao sindicato. A Acesita, vizinha da USIMINAS, desacata acintosamente dispositivo constitucional do revezamento retornando a uma situação pretérita com jornada acima da prevista na Constituição e não acontece nada. O sindicato recorre à Justiça, que decide por falta de legitimidade ativa do sindicato para propor a ação. Então, hoje, os salários regrediram de 70 para 30% do PIB. Logo, estamos diante da repressão velada e eficiente de todas as instituições e dos empresários aos trabalhadores.

E agora assistimos pela televisão à invocação da Rede Globo: que doemos alimentos para mais de cinqüenta milhões de brasileiros, dentre esses evidentemente os assalariados. Então, é neste contexto de profunda desigualdade que situo não só os Ministros do TST que aqui estiveram, mas principalmente o Ministro Almir Pazzianotto e o Presidente Fernando Henrique Cardoso, que conheço muito antes de ser Presidente.

Relembro episódio, em 1980, em que o Deputado Jair Meneguelli — ele não está aqui — estava preso, juntamente com toda a diretoria do sindicato de São Bernardo do Campo, e eu fui destacado pelo movimento sindical de Minas Gerais para dar uma contribuição aos companheiros do ABC em greve há dezenove dias. A custo, reunimos a comissão de greve e os dois principais elementos da diretoria do sindicato que se encontravam soltos estavam no gabinete do então Deputado Estadual Almir Pazzianotto e pediram-me que solicitasse sua presença. Eu fui. E ao bater a porta, Fernando Henrique Cardoso abriu-a, e puxando-me para o fim do corredor disse-me "João Paulo precisamos de sua colaboração; está fechado o Estádio de Vila Euclides e a Assembléia de Trabalhadores está convocada para a Praça da Matriz de São Bernardo do Campo, e essa assembléia não pode ser realizada lá". Eu perguntei o por quê e ele me disse: "Eu conversei com o Golbery e ele me disse que vai correr sangue." Então, ao entrar no gabinete do Almir Pazzianotto ficou claro que ele e Fernando Henrique Cardoso eram elementos destacados pelo Governo militar para desestabilizar a greve do ABC e pressionar os dois companheiros que estavam fazendo com que eles ligassem para Dom Cláudio Hummes, então Bispo do ABC, hoje Bispo de São Paulo — Dom Cláudio é testemunha disso —, para que fosse à televisão e dispersasse a Assembléia de Trabalhadores de São Bernardo do Campo.

Então, com o conhecimento dessas pessoas aqui no Congresso Nacional, como vou debater o Plano Real? O Plano Real, de início, representava arrocho salarial por um ano, e os preços foram

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aumentando em 45%.

Depois do debate com o Ministro Rubem Ricupero, no Senado Federal, chegando à Câmara dos Deputados, o Deputado Delfim Neto, rindo até as orelhas, me disse: "Pois é, o seu guru de Esquerda, Fernando Henrique, fez o que a ditadura militar não conseguiu." Nós só conseguimos fazê-lo por seis meses, com todo o poder que tínhamos, ele conseguiu por um ano. Agora, temos esse dispositivo de lei, o de nº 5.483, que vem na seqüência de inúmeras e sérias agressões desferidas pelo Governo Fernando Henrique contra os trabalhadores brasileiros.

Os senhores podem verificar o que estou dizendo lendo o boletim do DIAP no qual constam as medidas tomadas pelo Governo contra os trabalhadores não só por sua própria pena, mas através dos Poderes Legislativo e Judiciário. Na minha visão de leigo — não sou advogado —, essa é a subversão absoluta do ordenamento jurídico brasileiro enquanto o BIRD coloca o Brasil em situação de altíssimo risco.

E o que virá daqui para frente, uma vez que o empenho do Governo é segurar essa situação até a eleição? Depois da eleição, o risco que está submerso virá à tona. E o Governo fornece instrumentos para o empresariado fazer a maldade que o governo argentino não se preparou para fazer. Aqui o Governo defere ação contra os trabalhadores de forma mais competente. A perversão que ele podia fazer contra os servidores públicos já o fez pela metade. Os empresários não terão somente a prerrogativa da dispensa sem justa causa, o que, do ponto de vista jurídico, na minha opinião, é o único ato jurídico que dispensa motivação. Ele poderá ainda, como fez a desfiliação de sindicato e forçou vários acordos, inclusive na minha região, com prepotência e ameaça de desemprego, fazer dos contratos coletivos de trabalho o pior instrumento para reduzir direitos e espoliar a classe trabalhadora.

Para mim, o Tribunal Superior do Trabalho, no que toca ao direito coletivo — é pena que os Ministros não estejam aqui para ouvir —, não tem autoridade para discutir esta matéria, porque é a catedral da injustiça contra o trabalhador brasileiro. (Palmas.)

Eu assisti a julgamentos, Sr. Presidente, Deputado Freire Júnior, que são aberrações, uma vergonha.

Ao julgarem dissídio coletivo da minha categoria os Ministros diziam: "Esta cláusula não podemos deferir porque a lei já a defere." Numa outra situação: "Esta outra não podemos deferir, porque a lei indefere." Então eles não concediam porque a lei deferia, mas quando a lei indeferia, eles também não concediam. E assim matavam o direito coletivo.

É evidente que esses Ministros vêm aqui em conluio com o governo americano, que tem procedido de acordo principalmente com os especuladores financeiros. (Palmas.) Obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Muito obrigado, Deputado João Paulo.

O SR. DEPUTADO PEDRO HENRY – Sr. Presidente, peço a palavra para uma questão de ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO PEDRO HENRY - Sr. Presidente, eu gostaria de registrar, uma vez que esta reunião está sendo gravada, que eu me retirei por alguns minutos para tratar de assunto fora da Comissão. Peço a V.Exa. que fique registrada minha participação nesta reunião desde o início.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Esta Presidência é testemunha.

O SR. DEPUTADO PEDRO HENRY – Portanto, não fugi e não me estou furtando a nenhuma discussão. Foi mencionado pela Deputada Vanessa Grazziotin, durante minha ausência, que eu teria

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saído daqui...

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN - Sr. Presidente, esta questão de ordem não procede .

O SR. DEPUTADO PEDRO HENRY – Quero informar a V.Exa. que estou presente.

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN – Eu não citei nome de nenhum Deputado. Isso não procede.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Não foi citado nome de nenhum Parlamentar. Está registrada a presença do Parlamentar.

Vamos ouvir agora o Sr. João Felício, Presidente da Central Única dos Trabalhadores. V.Sa. dispõe de cinco minutos.

O SR. JOÃO FELÍCIO - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, colegas do Judiciário que aqui estão desde o início do debate, infelizmente gostaríamos muito que os Srs. Deputados que têm a intenção de votar favoravelmente a este projeto permanecessem na Casa, mas infelizmente isso não está ocorrendo. Gostaríamos também que os Ministros do TST, que se retiraram do debate, estivessem presentes.

Confesso aos senhores que nunca tinha tido a oportunidade de ouvir, como ouvi hoje, os Ministros do TST. Lembrei-me imediatamente do que os empresários costumam fazer conosco nas negociações. Quando uma negociação chega a um impasse, eles fazem o que os Ministros fizeram aqui hoje: retiram-se da sala, batendo a porta na nossa cara, e, às vezes, chamam a Polícia. Aqui, a única coisa que não fizeram foi chamar a Polícia, mas bateram a porta na nossa cara e se retiraram do debate. Isso é muito ruim para tão importante Corte do Trabalho do País! (Palmas.)

Estava ouvindo com muita atenção a manifestação do Sr. Ministro do TST, Ives Gandra, que eu não conhecia pessoalmente. A conclusão que eu posso tirar é que, como há realmente parcela considerável do movimento sindical frágil, e a fragilidade é evidente, ele quis dizer: "Vamos cortar as pernas de vocês, cortar os membros, arrancar o coração. Quem sabe, sem os membros, sem o coração e sem o sangue vocês conseguem se fortalecer no futuro." Se a lei existe justamente para proteger o mais frágil, não se pode simplesmente raciocinar de maneira inversa, e a Justiça aconselhar o mais frágil: "Vá se fortalecer, vá se organizar melhor, para melhor defender seus direitos." Este é o recado do Ministro do Tribunal Superior do Trabalho ao defender — tão bem defendido, na lógica deles — o projeto do Governo.

É como se alguém estivesse propondo tirar o sangue do trabalhador, ao máximo, assim, quem sabe, ele cria vergonha na cara e vai encontrar outras formas de recuperar o sangue perdido pelo caminho.

Vejam, como exemplo, o que está ocorrendo agora com a Volkswagen no ABC Paulista. Não mais estamos falando de setores frágeis do movimento sindical. Estamos falando de setor altamente organizado, com inserção na base, com representação fortíssima no local de trabalho, que hoje está à mercê da sanha patronal que lhes quer impor redução da jornada de trabalho ou redução de salário. Fico imaginando o que vai acontecer nesses rincões do Brasil caso projeto desta natureza seja aprovado na Comissão de Trabalho e na Câmara dos Deputados.

Esta é a realidade, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados. O clima de cordialidade aqui apresentado entre nós não reflete a realidade lá fora. A realidade é muito diferente desse clima de cordialidade. E, às vezes, nem nesta Casa prevalece o clima de cordialidade.

Na semana passada, por exemplo, colocaram alguns leões ensandecidos para perseguir sindicalistas

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pelos corredores da Casa. Eles os agrediram e também aos Deputados. A realidade que vimos na semana passada é a que enfrentamos lá fora. E será a realidade para o Movimento Sindical Brasileiro caso projeto desta natureza seja votado.

Portanto, para nós da CUT, não basta simplesmente analisarmos as questões jurídicas. Aqui há acordo total entre assessoria jurídica da nossa Central Sindical e a bonita exposição que os companheiros juristas fizeram aqui hoje. Também temos a mesma avaliação. Precisamos, além da avaliação jurídica, analisar as questões sociais de projeto desta natureza, que são gravíssimas.

O que resta ao Movimento Sindical quando percebemos que existe parcela de Deputados da Casa favorável ao projeto, quando percebemos que o Ministro do Trabalho também é favorável ao projeto, bem como a alta Corte da Justiça do Trabalho e até o Presidente da República? Na interpretação de alguns setores de que fazem parte as autoridades deste País só nos resta a salvação divina. "Deus, socorra-nos porque os mortais não conseguem mais nos defender." Este foi o recado dado pelo TST nesta audiência pública da Comissão de Trabalho.

Portanto, Deputado Freire Júnior, Presidente da Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público, Sr. Relator, Deputado José Múcio Monteiro, acho que V.Exas., além de outros Deputados que não estão presentes, têm grande poder hoje à tarde. Acho que o poder de V.Exas. para não votar é maior do que todos imaginamos, pois sabemos como isso funciona numa terra presidencialista.

Peço a V.Exas. que não votem favoravelmente a um projeto desta natureza. Eu preferiria que o nome de V.Exa., Deputado Freire Júnior, ficasse registrado na história como o Presidente da Comissão de Trabalho que jogou na lata do lixo a maior agressão contra a classe trabalhadora brasileira. (Palmas.) E não, Deputado José Múcio, como Deputados que ajudaram a viabilizar a tremenda agressão contra a classe trabalhadora brasileira.

A realidade que enfrentamos lá fora, no processo de negociação, torno a repetir, é muito diferente da que está sendo apresentada nesta Casa. O Ministro do Trabalho, na semana passada, em vez de acusar a Volkswagen, por estar demitindo três mil pessoas, acusou a CUT e o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. É o que acontece no Brasil.

Nós, da CUT, da CGT, das confederações e demais sindicatos presentes, que representamos a maioria do Movimento Sindical Brasileiro, temos posição unânime contra esse projeto. Favorável a ele só existe um setor do Movimento Sindical Brasileiro, que sobrevive de parcerias com o Governo Federal, sobrevive de contribuições empresariais e de suculentas taxas negociais. A minoria desse setor é favorável, mas a imensa maioria do Movimento Sindical Brasileiro é contrária. Infelizmente a maioria dos Srs. Deputados presentes são contrários ao projeto. Se hoje querem cortar nossas pernas, tirar o sangue, podem ter certeza de que uma coisa não vão tirar de nós: o nosso poder e a nossa língua. (Palmas.) Ano que vem haverá eleição. A única maneira de expressarmos a nossa contrariedade em relação a esse projeto é votando. Como o Sr. George W. Bush não está encontrando Osama Bin Laden, não haverá Deputado aqui que vai conseguir se esconder em alguma toca. Pegaremos todos e penduraremos suas fotos nos postes do Brasil. (Palmas.)

V.Exas. estão cometendo um gravíssimo erro. Não é dessa maneira que se resolve o problema da classe trabalhadora brasileira. Em nome da Executiva Nacional da CUT, reiteramos o pedido ao Presidente da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público e ao Relator da matéria para retirarem esse projeto da pauta. Dessa forma, V.Exas. ganharão a respeitabilidade do movimento sindical brasileiro e da imensa maioria da classe trabalhadora do País. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Seguindo o acordo que fizemos, ouviremos a seguir a Deputada Vanessa Grazziotin e o Deputado Paulo Paim. Depois retornaremos às entidades dos trabalhadores. S.Exa. dispõe de cinco minutos.

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A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, senhoras e senhores trabalhadores, sindicalistas e convidados, gostaria de gastar esse parco tempo de que disponho lendo o trecho de um artigo. Diz ele:

"No Brasil, a situação de dois terços da população assemelha-se à dos burgos pobres que precederam a Revolução Francesa, sem direito à propriedade, sem acesso à Justiça, à mercê de grupos criminosos que estabelecem estados paralelos na ausência da autoridade pública. Uma situação que tende a se perpetuar, agravando o quadro social, caso as lideranças mais responsáveis do País não encarem de frente o desafio da redistribuição da renda e dos direitos sociais elementares. Dentro desse quadro perverso, agravado pela recessão econômica em curso, o Governo Federal tenta retirar os mínimos direitos trabalhistas através do projeto que muda a CLT".

Mais adiante, diz o texto:

"Um projeto que, ao modificar o art. 618, da CLT, pode significar a revogação, a médio prazo, de direitos essenciais, como FGTS, décimo terceiro, férias, descanso semanal remunerado e assim por diante".

O artigo conclui afirmando:

"A sociedade brasileira precisa estar atenta para exigir que seus nobres Deputados resistam a mais essa manobra destinada a revogar direitos sociais tão arduamente conquistados".

O texto que acabei de ler não foi publicado num jornal da Central Única dos Trabalhadores, da CGT, de nenhuma entidade sindical ou de qualquer partido de oposição. O artigo que acabei de ler é o editorial de hoje do jornal o Estado de Minas. Esse é um apelo dramático a todos os Parlamentares para que rejeitemos esse projeto. Penso que não há mais o que dizer. Poderíamos repetir aqui muitos argumentos, diante de tudo isso que ouvimos até agora.

Talvez o debate se estabelecesse se aqui tivessem ficado aqueles que falaram favoráveis à aprovação do projeto, apesar de todos eles terem iniciado suas falas dizendo que não iam emitir juízo de valor, apenas falariam tecnicamente. Ora, absolutamente tudo o que S.Exas. fizeram foi emitir juízo de valor favorável à aprovação desse projeto.

O debate de hoje talvez não fosse repetitivo se para cá tivesse coragem de retornar a Força Sindical, mas ela não vem porque não há um argumento sólido, contundente, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, que explique tanto a juridicidade e a constitucionalidade quanto a justeza desse projeto. Volto a repetir: nem o Ministro Francisco Dornelles conseguiu esconder esse fato na mensagem que encaminhou ao Congresso Nacional. S.Exa. disse que a partir de agora estabelecemos uma nova forma de relação de trabalho.

Os direitos são divididos em dois: os que são inegociáveis e aqueles que são negociáveis. Os negociáveis são os que não estão na Constituição Federal e quem perde com isso é o trabalhador

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brasileiro. Ninguém questiona a respeitabilidade e o reconhecimento que as leis brasileiras e a nossa Carta Magna têm em relação a acordos e convenções coletivas, disposto no art. 7º da Constituição Federal.

O Governo Federal quer ir além da negociação coletiva. Ele quer que, numa situação de extrema desigualdade, utilize-se a fachada do acordo e da negociação coletiva para tirar os mínimos direitos que têm os trabalhadores brasileiros. É isso que quer o Presidente da República. Não adianta dizer que estamos num momento maduro, que o trabalhador poderá ganhar, que novos postos serão abertos, que o trabalhador sairá da informalidade. O que vai acontecer, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, é a retirada de direitos.

Então, concluindo a minha intervenção, faço um apelo repetindo ao Deputado José Múcio Monteiro o que disse o Presidente da CUT: os olhos não estão só dirigidos ao Palácio do Planalto, mas voltados ao Congresso Nacional, e nós não podemos ser responsabilizados pela aprovação de um projeto que, além de insconstitucional, é talvez um dos mais imorais enviado pelo Executivo a esta Casa. É um golpe contra os trabalhadores. (Palmas.) Por isso, Deputado Freire Júnior, conto com a sensibilidade de V.Exa., que conduziu talvez melhor do qualquer um de nós o debate da matéria até agora, para impedir que votemos e aprovemos um projeto imoral e que vai prejudicar a maioria dos trabalhadores brasileiros.

Muito obrigada. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – O próximo orador inscrito é o Deputado Paulo Paim.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM – Sr. Presidente, como gostaria muito de ouvir as entidades, solicito a V.Exa. ficar no final da fila.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Então, chamo um outro Parlamentar.

Deputado Aldo Arantes, tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO ALDO ARANTES – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, lideranças sindicais aqui presentes, queridos companheiros, em primeiro lugar, manifesto a minha estranheza em relação à atitude adotada pelos Ministros do Tribunal do Trabalho.

Foi convocado um seminário que tinha como objetivo o diálogo, a manifestação da opinião dos expositores e também as informações prestadas pelos Parlamentares e pela representação da sociedade civil. Reafirmo que os Ministros tiveram uma atitude de desrespeito para com a Câmara dos Deputados, com os Parlamentares e com a representação da sociedade civil que aqui está.

Por outro lado, a posição dos membros da Mesa, da Associação dos Procuradores do Trabalho, da Associação dos Magistrados do Trabalho, da Associação Nacional dos Advogados do Trabalho, da OAB e das diversas entidades aqui presentes deveria indicar para o Presidente Freire Júnior e para o Deputado José Múcio Monteiro uma reflexão de que não tem lógica votar esse projeto com urgência constitucional. Somos contra o mérito, mas não é só essa a questão. Não existe razão que justifique a urgência constitucional, e este seminário trouxe essa questão à tona.

Considero um ato de irresponsabilidade e de insensibilidade política do Governo, da base governista e desta Comissão se, diante do que ocorreu hoje nesta Casa — e aqui foram argumentos, não foi conflito, agressão, jurídicos, políticos e sociais — não adotarem medidas que dêem conseqüência ao que ocorreu hoje pela manhã aqui. E qual é a conseqüência? Trabalhar com o Governo para retirar a urgência constitucional, caso não se consiga a decisão de não votar hoje, de ampliar o debate, de fazer de fato um seminário em que as forças que estão a favor desse projeto venham aqui debater e

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ouvir os argumentos contrários.

No mérito, Sr. Presidente, quero dizer que algumas exposições aqui feitas trazem luz. O problema não diz respeito apenas ao Brasil não, mas a todo o mundo.

É a tal da globalização neoliberal. É o caminho que as forças do capital adotaram para enfrentar a crise do sistema capitalista. E a lógica é a liberdade completa do capital.

Sr. Presidente, na lógica — recentemente tenho estudado muito isso —, a causa da crise do sistema capitalista é o excesso de intervenção do Estado e o excesso de demanda dos trabalhadores.

Seriam as conquistas sociais dos trabalhadores responsáveis pela crise do sistema capitalista. Assim sendo, seria necessário retirar o Estado da atividade econômica e das relações sociais para que o mercado regulasse as relações econômicas e sociais.

No entanto, hoje, em todo o mundo, mesmo os setores capitalistas já percebem a gravidade das conseqüências dessa política. E a reflexão que temos de fazer — aliás, o Sr. Fernando Henrique Cardoso apresenta esse projeto de lei e vai fazer demagogia no exterior. Parece-me profunda contradição falar em globalização solidária e querer impor aqui a norma da globalização excludente e de exploração dos trabalhadores.

Então, Sr. Presidente, por outro lado, esta matéria tem expressão concreta: os acordos firmados pelo Brasil com o Fundo Monetário Internacional, nos incisos XXXIII e XXXIV, estabelecem a flexibilização dos direitos dos trabalhadores.

Então, aqui não se trata de discurso de Esquerda, nem discurso do PCdoB nem do PT. Leiam os acordos firmados com o Fundo Monetário Internacional que coloca a chamada condicionalidade estrutural, coloca exatamente a reforma do Estado e a reforma dos direitos sociais como condição sine qua non. Mas a lógica que preside esse argumento é a necessária para reduzir os custos de produção e assegurar a competitividade.

Eu digo: não é reduzindo os direitos e o salário dos trabalhadores que vamos resolver esse problema, Sr. Presidente! Pelo contrário, o que onera a produção brasileira são as altas taxas de juros — aí está o centro do problema.

Não é retirando direitos limitados, não é reduzindo o salário já mísero — o Brasil tem um dos salários menores do mundo, inclusive da própria América Latina. Não é reduzindo os direitos dos trabalhadores que a economia brasileira vai reativar; pelo contrário, é um novo modelo econômico que não privilegia, como está fazendo agora a geração de superávites primários para pagar encargos da dívida. Mas exatamente a redução das taxas de juros poderia diminuir impostos, conseqüentemente reativação da economia para gerar empregos.

Sr. Presidente, concluindo, para dar uma certa lógica ao meu raciocínio...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Para concluir, concedo mais um minuto a V.Exa.

O SR. DEPUTADO ALDO ARANTES – Outro argumento do Governo é o de que essas medidas poderiam gerar mais empregos. É brincadeira. Já flexibilizaram, e na época eu discuti muito o tal contrato flexível, contrato temporário de trabalho. Na realidade não aumentou emprego coisa nenhuma. O aumento do emprego tem dois caminhos, só dois. Para o desemprego conjuntural, a retomada do crescimento; para o desemprego estrutural, a redução da jornada de trabalho.

Então, querem reativar a economia às custas do trabalhador. Querem reativar a economia às custas da retirada de direitos. Esse não é o caminho, Sr. Presidente. (Palmas.)

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Esse dispositivo, na verdade, enfatiza as condições de trabalho ajustadas mediante convenção, acordo coletivo, prevalecem sobre o disposto em lei. Essa formulação é inconstitucional. Já o disse a OAB, já o disse o Dr. Luis Carlos Moro. Por quê? Porque a Constituição — e eu fui Constituinte —diz claramente em quais dispositivos constitucionais se asseguram essa flexibilização. Não pode uma lei ordinária se sobrepor à Constituição. É nesse ponto que reside a inconstitucionalidade.

Se o Governo quer quebrar direitos sociais, faça emenda constitucional. Ele sabe que não tem maioria nesta Casa para aprovar emenda constitucional e quer fazê-lo através de legislação ordinária. É inconstitucional!

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Para concluir, Deputado.

O SR. DEPUTADO ALDO ARANTES – No mérito, Sr. Presidente, é a liquidação dos direitos sociais. É a lógica aqui apresentada pelo Presidente da CUT, exatamente a legislação e o papel do Estado visam garantir os direitos dos mais fracos. A lógica da retirada do Estado é a lógica da liberdade completa do capital. A lógica da liberdade completa do capital é a lógica da exploração máxima dos trabalhadores.

Nós, da Oposição, esperamos também que segmentos mais abertos da situação tenham sensibilidade e compreendam que esta é uma questão muito grave para ser discutida e aprovada a toque de caixa, como pretende o Governo.

Espero que esta Comissão tenha sensibilidade para, em ação junto ao Executivo, retirar o pedido de urgência constitucional. E se não conseguir, que tenha posição altaneira de não votar a matéria a toque de caixa, como o Governo pressiona sua base parlamentar nesta Casa.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Obrigado. De acordo com o procedimento adotado, vamos então ouvir agora os representantes de duas centrais sindicais: o Sr. Antônio Carlos dos Reis, o Salim, pela CGT e, em seguida, o Sr. José Carlos Perret Schulte, pela CNTC.

Com a palavra o Sr. Salim, por cinco minutos.

O SR. ANTÔNIO CARLOS DOS REIS (SALIM) – Nobre Deputado, Presidente desta Comissão, Srs. Deputados presentes, sindicalistas, companheiros e companheiras, primeiramente quero começar lamentando que ao líder sindical se conceda a palavra por cinco minutos, quando temos a obrigação de ficar ouvindo pessoas que não ficam para o debate — ouvindo-as atentamente —, durante longos 33 minutos, como cronometrou o Deputado Paulo Paim. E lamentavelmente não ficam para ouvir aquilo que argumentamos em favor da classe trabalhadora.

É lamentável o fato de que pessoas que vivem na Corte e que vêm para os Tribunais — e me desculpem os nobres advogados que viviam para o mundo — o poder subir-lhes a cabeça, o que faz com que tenham procedimentos distintos dos da maioria da população brasileira.

Fazem questão de ser ouvidos, mas nenhuma de ouvir os argumentos dos trabalhadores.

Parece que o trabalhador é um ser leproso, que não pode ter argumentos e não pode dialogar com este pessoal que tem um título a mais do que os simples mortais.

É lamentável que numa democracia não possamos expor aquilo que pensamos.

Ouvindo os nobres companheiros que usaram da palavra, cheguei à conclusão de que não havia necessidade alguma de se falar mais nada. Era só refletir e pensar naquilo que disse os nossos companheiros Roberto, da OAB, Hugo e Regina, se me permitem chamá-los de companheiros, porque somos todos trabalhadores e também, principalmente, o que disse o companheiro Moro a

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respeito do que é legislação.

Não precisaríamos usar da palavra e tomar o tempo dos nobres Deputados porque somente esses argumentos foram suficientes para dizer o quanto acaba com os direitos dos trabalhadores e prejudica toda a classe trabalhadora brasileira. E aí vem o Presidente do TST dizer que há necessidade inclusive de ter dois terços da categoria numa assembléia.

O nobre Ministro deveria passar uma temporada no Pará para ver como se faz assembléia, porque para se chegar até a Capital gasta-se três dias, porque é preciso usar barco. E como faz a classe trabalhadora que precisa deixar de trabalhar três dias na sua cidade para participar de assembléia? Há necessidade de dois terços numa assembléia de trabalhadores quando sabemos que em muitas e muitas empresas um terço sempre está trabalhando naquele horário e aí como fazer com os compromissos de outra parte dessa mesma categoria? É preciso refletir e analisar quando se fala isso.

Precisamos sair dos gabinetes da Esplanada dos Ministérios e ao seu redor para conhecer o sindicalismo e a classe trabalhadora. É necessário sair da Avenida Paulista em São Paulo e ir fazer estágio num sindicato ou numa central sindical para entender o que é colocar em votação pauta de reivindicação ou matéria de sindicato. Pessoas que falam dessa maneira se esqueceram completamente do que passaram e há pessoas que começaram no movimento sindical e galgaram todos os postos na sua vida política, graças ao movimento sindical. Lamentamos muito que muitas pessoas vêm para o movimento sindical e depois se voltam totalmente contra ele. (Palmas.)

Há poucos minutos ouvi o Presidente do TST dizer que a legislação teria de ser flexibilizada e, minutos depois, no plenário ao lado, no do Senado Federal, ele está dizendo que há necessidade de a lei vigorar.

Precisamos saber o que as pessoas pensam efetivamente sobre essa questão, porque aqui se flexibiliza a lei, mas no plenário ao lado é colocada como importante — precisamos saber como é esse relacionamento.

Quero dizer aos companheiros Deputados que eu fiz este jornal O Eletricitário de São Paulocitando o nome dos Parlamentares que estão a favor dos trabalhadores. E quero distribuir esses panfletos com o nome dos Deputados que apóiam a classe trabalhadora brasileira, que votaram a favor dos direitos dos trabalhadores. Eu quero distribuir isso em todo o Brasil, principalmente em suas bases eleitorais. (Palmas.) Eu quero ter o prazer de dizer a cada Deputado que ele votou com os trabalhadores, não importa de que Estado seja. Por isso, peço ao Sr. Presidente que vote de acordo com aquilo que deseja a classe trabalhadora brasileira. Sr. Relator, vote de acordo com o que pede a classe trabalhadora brasileira, porque neste País há meia dúzia de pessoas que são a favor dessa mudança. Nós sabíamos quem era o pai dessa lei e hoje aqui apareceram três tios. (Palmas.)

Eu quero ler trecho do apóstolo da democracia, Rui Barbosa, que fala de algumas questões aqui levantadas:

Tempo e Perfeição. Em trabalho de largo fôlego, alinhavado a correr, não há nódoa, lacuna, despropósito, de que se vigiem com segurança os mais capazes, ainda que especialistas sejam, e se trate da sua especialidade.

A experiência universal todos os dias nos confirma a velha parêmia de que a pressa é inimiga da perfeição. Pudera eu acrescentar que é mãe do tumulto, da incongruência, da irreflexão e do erro. Obra atropelada é obra manca, desastrada, infiel

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ao pensamento do artista, vilipendiosa ao seu nome. Improvisar, em matéria d'arte, equivale a achamboar, a achavascar, a atabalhoar. A lei de precipitação é a lei do atropelo e do ataranto, a lei do descuido e do desazo, a lei da fancaria e da aventura, a lei da inconsciência e da mediocridade. Sob a pressão da urgência ninguém produziu nunca, nem produzirá jamais coisa, que resista à prova do saber, do gosto, do tempo.

Com a lei, pela lei e dentro da lei; porque fora da lei não há salvação.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Vamos ouvir o próximo líder sindical, Sr. Schulte, Diretor-Secretário da CNTC, por cinco minutos.

O SR. JOSÉ CARLOS PERRET SCHULTE – Cumprimento o Presidente da Mesa, Deputado Freire Júnior, companheiros Luis Carlos Moro, Hugo Cavalcanti Melo Filho, Dra. Regina Butrus, Roberto Caldas e o nobre Deputado Nelson Pellegrino, como também os demais Deputados presentes, nossos companheiros sindicalistas, empresários presentes que estão apoiando a luta dos trabalhadores contra esse absurdo que está sendo proposto pelo Governo Federal para discussão nesta Casa.

Inicialmente gostaria de fazer uma observação aos Deputados. Tivemos após a discussão da semana passada o trabalho de fazer o levantamento em todos os Estados de todos os pronunciamentos dos então candidatos e hoje Deputados Federais que compõem esta Comissão, os seus pronunciamentos para se elegerem e não vimos em nenhum momento nenhum Deputado que hoje aqui se coloca a favor desse projeto dizer na televisão, em sua campanha política, que votaria contra os trabalhadores, contra a legislação trabalhista. É necessário que se tenha bem claro isso aí, o porquê de a nossa Confederação estar colocando material chamando de traidor o Deputado que está votando contra nós, trabalhadores. Essa é a forma como os trabalhadores vão agir daqui para a frente com aqueles Deputados que, porventura, não foram para a televisão dos seus Estados dizer que aqui estão votando contra os trabalhadores. Essa a reflexão para V.Exas., que são contrários.

É também necessário dizer que não estamos tratando apenas de convenções coletivas, mas nós, trabalhadores, sindicalistas e advogados, sabemos muito bem que esse projeto trata também de acordos coletivos de trabalho em que a empresa pode pressionar o trabalhador a retirar seus direitos. V.Exas. não estão mencionando isso em momento algum.

É necessário saber que o substitutivo do Deputado Múcio prevê bens plenos para essa lei, os mesmos dois anos que foi feito com a CPMF, porque esta Casa é omissa nesse ponto e segue tudo o que o Governo deseja.

Então, não resta mais nada a nós, da Confederação e comerciários, do que vir a esta Comissão, não para pedir, mas para exigir dos Deputados que cumpram as suas campanhas políticas, que cumpram aquilo prometeram, porque, na realidade, tudo o que disseram com relação ao problema do desemprego no Brasil foi que deveria haver a reforma tributária e a reforma no sistema financeiro, mas até hoje V.Exas. não discutiram isso aqui. (Palmas.)

Temos um Ministério do Trabalho que vai ao porão do sindicalismo buscar apoio de dirigentes sindicais para passar para a sociedade que estamos contra a classe trabalhadora. Cadê o sindicalista do porão para dizer que é a favor do nosso projeto? Ele não está presente, pois deve estar com o

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Presidente da República.

Portanto, Sr. Presidente, tudo isso nos traz indignação e nos leva a dizer, veementemente, que não queremos que o projeto seja votado, pois é espúrio ao povo brasileiro, trata-se de um acordo com o FMI a fim de prejudicar os trabalhadores e retirar seus direitos. Mas não vamos abrir mão dos nossos direitos. Alguns Deputados da base governista que estão me olhando podem sorrir. Se esse projeto for votado, tenho certeza que, primeiramente, não será de forma pacífica e, segundo, vamos denunciar todos em todos os lugares. (Palmas.) E digo mais: aqueles Deputados não se elegem nem para porteiro de edifício. V.Exas. podem rir. Podem rir. Não se elegem nem para porteiro de edifício. Não podemos aturar o que está sendo feito.

Para concluir, quero dizer que Pedro Henry, José Múcio e V.Exa., Sr. Presidente, devem prestar atenção ao que foi dito pelo Movimento Sindical, sob pena de serem os algozes dos trabalhadores, os homens que derrotaram a legislação trabalhista sem nunca ter trabalhado a favor dela. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Diante do acordo firmado, os próximos oradores inscritos são o Deputado Paulo Paim, seguido do Deputado Pedro Celso.

Deputado Paulo Paim, de acordo com o combinado, V.Exa. dispõe de cinco minutos.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM – Sr. Presidente, estou nesta Comissão acompanhando os trabalhos e votando, embora tenha me afastado durante vários anos porque estive na Mesa. Percebo, assim como todos os Deputados que atuam nesta Comissão, que nunca um projeto conseguiu unir todos contra uma proposta. Gostaria de lembrar aos sindicalistas e aos Deputados — sou conhecido como o Deputado do salário mínimo — que, mesmo quando o salário mínimo foi votado nesta Comissão em mais de uma vez, nunca se viu mobilização igual.

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, sindicalistas de todo o País, muitos viajaram 36, 48, 50 horas, a maioria não veio de avião, mas queriam estar aqui neste dia para acompanhar este debate. (Palmas.) Digo isso, Sr. Presidente, claro que movido um pouco pela emoção, claro que, como filho de operário metalúrgico, sinto-me um privilegiado por estar no Congresso Nacional. Em reunião, ontem, com sindicalistas de todo o País, perguntaram-me: "O que nos resta, Paim, a não ser resistir e lutar até o último minuto?" Disse-lhes que ainda acredito na possibilidade de sensibilizar os Parlamentares.

Veja bem o que foi este seminário, Sr. Presidente. Esteve aqui representando apenas sua figura o Ministro Almir Pazzianotto, que, de forma encabulada, meio envergonhada, falou, não disse nada, pegou seu livrinho e saiu porta afora. Foi ou não foi?

(Não identificado) – Foi.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM – Depois veio o Ministro Ives Gandra. Todos sabem que a família Gandra está ligada ao empresariado nacional. S.Exa. falou muito, passou a palavra ao Gelson de Azevedo, mas não disseram nada. Chegaram a dizer que não descobriram se de fato o projeto era justo ou oportuno, mas iriam discutir apenas tecnicamente. Mas nem tecnicamente defenderam o projeto. Tanto não o fizeram que se retiraram tão envergonhados quanto Almir Pazzianotto.

Se este seminário é sério e responsável, o que acredito, duvido que um único Parlamentar que por aqui passou saiu convencido de que este projeto pode ser votado e aprovado.

Não quero falar daqueles que foram embora, mas vou pedir a este Plenário, inclusive aos Deputados da base do Governo, quanto à defesa do Dr. Hugo Cavalcanti Melo Filho, representando não a ele mesmo, mas à Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, que dêem uma salva de palmas aos Magistrados da Justiça do Trabalho. (Palmas.) Ressalto que S.Exa. não veio defender sua

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pessoa, mas a causa decidida em evento num Congresso.

Depois o Dr. Roberto Caldas falou não em nome da CUT ou da CGT, mas em nome da OAB! E dizem que o projeto é ilegal, é inconstitucional! Claro que tenho de pedir palmas à OAB! Abaixo o TST! Claro que tenho de dizer isso. (Palmas.) Ele não falou em seu nome, mas da OAB. É impossível que isso não sensibilize ninguém. Kamikaze eu não sou. Quero discutir no final o que fez o PPB: mudou quase todos os Deputados desta Comissão para ter maioria na hora do voto. Vamos conversar depois a respeito.

Parabéns à Dra. Regina, que veio falar pelo Presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho! Quem não respeita neste País os Procuradores do Trabalho por tudo que estão realizando? Parabéns aos Procuradores do Trabalho! Vamos dar uma salva de palmas a S.Exas.! (Palmas.)

Dr. Luis Carlos Moro, representando o DIAP e a Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas, a quem também peço palmas, como a todos aqui presentes. (Palmas.) Estamos orgulhosos por tê-los como nossos representantes. Lavei a alma pela forma covarde como os Ministros do TST fugiram e pela forma corajosa e altiva como vocês quatro defenderam uma tese do conjunto dos trabalhadores do País. Estou esperançoso com os depoimentos de vocês. Com certeza, o Plenário há de rever sua posição.

Sr. Presidente, para não dizerem que só falei mal do TST, por uma questão de justiça, quero dizer que, de acordo com o Sr. Francisco Fausto, Vice-Presidente do TST, esse projeto é imoral e inconstitucional. (Palmas.) O Ministro José Luciano tem a mesma posição, para quem esse projeto é imoral e ilegal. (Palmas.) Uma salva de palmas ao Ministro José Cipriciano, nordestino, recentemente empossado, para quem, no Nordeste, os coronéis vão dar de chibata nos trabalhadores se esse projeto for aprovado.

Todo mundo sabe que sou vinculado à Central Única dos Trabalhadores. Quero que se registre nos Anais da Casa o que diz José Pastore, representante máximo do capital, do empresariado, da extrema direita do País: "A CUT diz que é contra, a Força Sindical — que aqui tinha dito que em tese não era tão contra — alega que o momento é inoportuno. A CGT e a CUT, as duas, dizem que isso é um golpe contra os trabalhadores, e a própria Social Democracia informa que não gostou da idéia apresentada".

Conseguimos uma unanimidade. Todas as centrais sindicais, todas as confederações, todo o campo jurídico tem uma única posição. Será que juízes, desembargadores, advogados, estão todos errados? Será que os Parlamentares da oposição estão todos errados? Será que o conjunto do movimento sindical também está errado? A palavra do Presidente do Supremo Tribunal Federal está errada? Só estão certos quinze Parlamentares, quem sabe, que vão votar o projeto?

Queria entender que força é essa que move quinze Parlamentares a lutarem contra Deus e o diabo. Acho que até o diabo é contra esse projeto. O mais perverso não defende esse projeto. Que força é essa que leva esse grupo de Parlamentares a apoiar esse projeto? Que força estranha é essa? Fica uma dúvida no ar, Sr. Presidente. Estamos em ano pré-eleitoral, e os Deputados desta Comissão são candidatos a Deputado Estadual, Deputado Federal e Governador. Não ouvi um argumento sólido. Vejo Deputados envergonhados. Que força é essa que leva Deputados a rasgarem a CLT e a Constituição, a submeterem os trabalhadores a um regime praticamente de escravidão?

Perguntamos ao Ministro Dornelles: "De quem é esse projeto?". O Ministro não respondeu. Nenhum partido aqui representado apresentou esse projeto. Nenhum, nem o PPB, embora a gente tenha informações de que o PPB trocou uma série de Parlamentares e hoje é o partido... A informação vem da Mesa...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Espere. Líder Odelmo Leão, vou dar a palavra a

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V.Exa. Deputado Paulo Paim, peço que conclua.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM – Sr. Presidente, estou com a palavra. V.Exa. vai ter que me ouvir. Se não é verdadeira a informação da Mesa, qual o partido com mais Deputados naquela Comissão? Vamos conferir. Até o momento, não ouvi o PMDB manifestar-se a favor desse projeto, nem o PFL, apenas o PPB. Até o momento, nenhum partido da base do Governo defendeu esse projeto.

Espero estar enganado e que ao chegar à reunião de votação não esteja apenas o PPB defendendo o projeto. Se a votação não acontecer e não for lobby da maioria do PPB, eu mesmo retirarei das notas taquigráficas o que disse e pedirei as devidas desculpas, mas, enquanto isso não acontecer, mantenho minha posição. (Palmas.)

Apelo a V.Exa., Líder Odelmo Leão, para que suspenda a votação do dia de hoje porque estou encaminhando requerimento solicitando que esse debate se faça numa Comissão Geral no plenário do Congresso Nacional, com a participação dos painelistas e líderes do movimento sindical, para que se possa ouvir o conjunto da sociedade.

Ainda uma única pergunta que dirijo à Mesa: qual de vocês, em sã consciência, votaria a favor desse projeto?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Com a palavra o Líder Odelmo Leão, que foi citado, sem direito a réplica a nenhum outro Parlamentar.

O SR. DEPUTADO ODELMO LEÃO – Sr. Presidente, senhores componentes da Mesa, nobre Deputado Paulo Paim, V.Exa. bem sabe quais os titulares do PPB que ocupam esta Comissão desde o início do ano legislativo: Herculano Anghinetti, Jair Bolsonaro e Pedro Corrêa. Sabe também que nas mudanças ocorridas poucos Parlamentares de outros partidos vieram para o PPB. Em momento algum o PPB exerceu o papel de troca nesta Comissão. Manteve seus três titulares indicados, e mais, o Deputado Arnaldo Faria de Sá, suplente desta Comissão, não é mais do PPB, e ainda assim o partido o manteve na suplência. O PPB não usa esse artifício, nobre Deputado Paulo Paim.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Com a palavra o Deputado Pedro Celso, que dispõe de cinco minutos.

O SR. DEPUTADO PEDRO CELSO – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, painelistas presentes, sindicalistas, senhoras e senhores, sinto o debate prejudicado pela ausência da maioria da base governista a este seminário. Houve intenso debate semana passada, quando conseguimos garantir a realização deste seminário. Há a presença de representantes da base do Governo, mas em minoria, porque a maioria não se fez presente, o que é lamentável.

O comportamento do Tribunal Superior do Trabalho nesta Comissão foi o mais deplorável possível. O Sr. Almir Pazzianotto interveio por mais de meia hora e não conseguiu dizer absolutamente nada, tal como fizeram os outros dois Ministros.

O Deputado Paulo Paim acaba de lembrar que os Ministros do TST contrários ao projeto não estavam representados; compareceu apenas a parte favorável ao projeto, e não entraram no mérito da questão. Preferiram o argumento técnico, que não convenceu absolutamente ninguém.

Sr. Presidente, reitero o pedido do nobre Deputado Jair Meneguelli para que seja retirado das notas taquigráficas o que disseram os três Ministros do Tribunal Superior do Trabalho. As suas palavras não podem ser consideradas válidas porque eles apenas falaram, mas não ouviram. (Palmas.) Eu, por exemplo, nobre Relator, Deputado José Múcio Monteiro, tenho questionamentos, perguntas a fazer aos membros do Tribunal Superior do Trabalho e discordâncias a manifestar. Eles se limitaram a

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falar e depois retiraram-se.

Nesse sentido, o seminário ficou prejudicado, não se seguiu a deliberação que fez esta Comissão na semana passada. Mas nós lembraremos esse aspecto, com toda veemência, no momento oportuno.

Sr. Presidente, Sr. Relator, Deputado José Múcio Monteiro, que foi um bom Presidente desta Comissão, dirijo o apelo que fiz ao Deputado José Múcio Monteiro para o Deputado Freire Júnior: avaliem bem a posição que vão adotar hoje à tarde; trata-se de uma posição extremamente perigosa, que não condiz, Deputado José Múcio Monteiro, com a sua biografia, nem com a sua, Deputado Freire Júnior. O que a maioria do Governo vai fazer, hoje à tarde, é jogar na lata do lixo os 60 anos de luta da classe trabalhadora brasileira. Se V.Exas. assim agirem, assim passarão para a história deste País. O Ministro Dornelles ficará conhecido em todo esse episódio como o Ministro que enterrou a Consolidação das Leis do Trabalho numa lei de apenas um artigo. Vejam bem: apenas um artigo desta lei joga, às calendas, os 60 anos de luta da classe trabalhadora brasileira e toda a Consolidação das Leis do Trabalho deste País. V.Exas. estão diante de uma responsabilidade da qual não podem fugir.

Sr. Presidente, não podemos deixar de concordar com o que disse o Deputado Paulo Paim. Sr. Relator, causa-me estranheza, mas muita estranheza mesmo, a urgência creditada a este projeto. O Ministro Ives Gandra disse que o projeto deveria passar por uma tramitação serena. Tramitação serena, neste clima? Eu gostaria de perguntar se ele é a favor da urgência do projeto. O outro Ministro nos disse que seria preciso uma longa pesquisa. Longa pesquisa, em tão curto prazo para se votar uma matéria tão importante? A verdade é que eles não estão presentes para responder às minhas perguntas e o que quiseram dizer com "tramitação serena" e "longa pesquisa". Existem muitas contradições em tudo o que foi dito.

Na semana passada e nesta semana, o Líder Odelmo Leão passou por aqui. O nosso Líder, Deputado Walter Pinheiro, esteve aqui na semana passada. Agora, eu gostaria muito de ouvir o que tem a dizer a Liderança do PMDB. Gostaria de saber qual o posicionamento da Liderança do PFL; quero ver a expressão e a posição do Líder do Governo.

Sr. Presidente, embora eu venha do movimento sindical, nunca vi tamanha unidade do movimento contra este projeto como estamos vendo agora, contra esse abuso, essa verdadeira aberração. (Palmas.)

A Força Sindical esteve aqui e disse que é a favor do projeto, mas depois apareceu um documento por meio do qual afirmava ser contrária a ele. Nós temos notícia da dissidência da Força Sindical em Minas Gerais, que está participando do movimento de rua contra este projeto, que significa um violento retrocesso, um golpe de morte em anos e anos de luta da classe trabalhadora.

Eu admiro V.Exa., Sr. Presidente, aprendi a conhecê-lo mais ainda ao presidir esta Comissão. Não quero acreditar que V.Exa. vai passar para a história deste País como quem enterrou os direitos da classe trabalhadora brasileira, muito menos o Sr. Relator, Deputado José Múcio Monteiro. O Ministro Dornelles parece não se importar de passar para a história como o Ministro que cometeu tamanha crueldade, tamanha maldade com o movimento organizado dos trabalhadores, a classe trabalhadora brasileira. Quanto aos argumentos do Sr. Almir Pazzianotto, eles são pífios, furados e não têm consistência alguma.

Por fim, apelo para que seja retirada a urgência constitucional deste projeto. Assim, poderemos ouvir, com mais calma, o conjunto da sociedade brasileira. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Sras. e Srs. Deputados, para que não paire nenhuma dúvida com relação ao poder desta Presidência, tampouco à sua conduta, regimentalmente não há nenhum amparo para eu retirar a urgência do projeto de lei.

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Atendendo ao clamor desta mesma platéia, formada pelos mesmos Parlamentares que compõem a Comissão do Trabalho, eu, na condição de Presidente desta Comissão, e o Relator designado nos dirigimos ao Líder do Governo, ao Presidente desta Casa e ao Ministro do Trabalho. Falamos, mostramos, ponderamos e tentamos sensibilizá-lo para que retirasse a urgência e, assim, conseguíssemos aprofundar os debates. Todos foram irredutíveis.

Trata-se de uma incumbência do Governo; não cabe a mim, na condição de Presidente desta Comissão, manifestar-me. Vou cumprir o Regimento Interno, a minha responsabilidade de Presidente da Comissão, qual seja, colocar em pauta a matéria, e em pauta está colocada, votá-la, e será votada à tarde. Agindo dessa forma, estarei livre para manifestar a minha posição político-partidária, o que a minha consciência determinar.

Enquanto for Presidente desta Comissão, haverei de presidi-la e cumprir integralmente o Regimento Interno desta Casa.

Com a palavra o Ministro José Calixto por cinco minutos.

O SR. JOSÉ CALIXTO RAMOS – Sr. Presidente, nobres Deputados, companheiros dirigentes sindicais, palestrantes, senhoras e senhores, preliminarmente, embora tenha havido muitas lamentações, não sei se também devo lamentar.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Sr. Ministro Calixto, solicito a V.Exa. que troque de microfone porque o que está usando emite o som um pouco distorcido.

O SR. JOSÉ CALIXTO RAMOS – Sr. Presidente, já houve muitas lamentações, mas não sei se também devo lamentar. De qualquer forma, peço vênia a V.Exa., aos nobres Parlamentares e aos conferencistas para dizer que seria razoável, bom e até mesmo ético que pelo menos a maioria dos Parlamentares que integram esta Comissão estivessem presentes, como também seria ético que todos os palestrantes convidados também estivessem presentes, tal como estão os quatro que, pacientemente, participam desta reunião.

Muitas vezes, falou-se da fragilidade do movimento sindical brasileiro. Falou-se de sindicatos fracos, fortes, conservadorismo, peleguismo, unicidade sindical, enfim, cremos que nada disso está sendo discutido nesta Comissão. Esse é um assunto para tratarmos depois. O projeto, conforme já nos está muito claro, peca pela sua inconstitucionalidade e pela sua inoportunidade. É um projeto relativamente pequeno mas que resolve tudo segundo a intenção do Sr. Presidente da República. Um projeto que admite apenas o que está na Constituição e deixa flexível toda a legislação infraconstitucional. E o Sr. Presidente da República já tem dito reiteradas vezes que a ação principal do seu Governo, pelo menos uma delas, é banir definitivamente a Era Vargas. Ora, quem como eu já viveu um pouco mais e como tantos outros acompanharam essa importante trajetória política brasileira sabe que antes da Era Vargas predominava o coronelismo, especialmente na Região Nordeste, as oligarquias e os cartéis. Os trabalhadores, principalmente os das usinas, trocavam a sua mão-de-obra por vales para comprar mercadorias nos barracões das próprias usinas. Era assim que acontecia antes da Era Vargas.

O Governo está conseguindo paulatinamente atingir o seu objetivo, considerando que, primeiro, criou o contrato de trabalho por prazo determinado; em seguida, um contrato de contrato por tempo parcial; depois a suspensão temporária do contrato de trabalho; e por último, a terceirização, o trabalho avulso, o Banco de Horas etc. Por tudo isso, verifica-se que o Governo está atingindo o seu objetivo. Então, Sr. Presidente, o que nós da Confederação, em coro com a grande maioria da classe trabalhadora, estamos pedindo nesta oportunidade e já deixamos trabalho por escrito na audiência pública passada, é simplesmente que V.Exas., que têm a prerrogativa de votar esse projeto, o rejeitem, se ele for à votação nesta tarde.

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Para encerrar eu diria que a sua votação, se transformada em lei, vai-se retroagir a uma situação, muito bem lembrada pelo companheiro Vicentinho, que seria a negociação do pescoço com a guilhotina. Como tem dito reiteradas vezes o companheiro Ulysses Ridel, seria o mesmo que colocar a raposa para negociar dentro do galinheiro.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Muito bem. Está entendida e encerrada a palavra para V.Exa.

Passamos ao próximo orador representando a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, Sr. Guilherme. S.Sa. está presente?

Serei rigoroso quanto ao tempo, porque já são 14h17. Às 14h3 iniciará reunião da Comissão Mista de Orçamento. Já havíamos concordado que esse seminário deveria se encerrar entre 14h15 e 14h30.

Portanto, peço aos senhores a colaboração para cumprirmos rigorosamente o tempo.

Tem a palavra V.Sa. a palavra.

O SR. GUILHERME PEDRO – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, demais companheiros do movimento sindical, de início eu gostaria de dizer que a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura hoje representa 26 federações de trabalhadores rurais, 3 mil e 750 sindicatos de trabalhadores rurais por todo o Brasil, sendo o seu público de 25 milhões de trabalhadores rurais. Desse total, 5 milhões são assalariados neste País.

Eu queria falar sobre essas 5 milhões de pessoas que vão ser diretamente atingidos com esse projeto de lei, caso seja aprovado. Por quê? Vamos começar pelo Estado do Pará. Qual é o tipo de negociação que os empresários rurais do Pará, principalmente os grandes projetos, impõem sobre os trabalhadores rurais assalariados na derrubada de mato de Juquira, que é o trabalho escravo legítimo? A única maneira que eles têm para amenizar essa negociação é deixar de dar o banho de Toyota nos trabalhadores assalariados na hora de torturar gente à beira do rio para mudar, para ser mais bem representado pela própria camioneta. Eu gostaria de dizer que esse mesmo empresário, e o Sr. Presidente sabe o que estou dizendo, porque vem da Região do Norte, o trabalho escravo ocorre cotidianamente.

Uma outra questão que eu queria mencionar é o Nordeste, principalmente o Estado de Pernambuco. Como vai fazer o Deputado José Múcio, que integra o patronato da cana de Pernambuco, defendendo que a negociação valerá mais que a lei, se esse patronato não respeita nem a negociação da convenção coletiva da cana com relação à questão do transporte e dos alojamentos. Deputado José Múcio, V.Exa. deveria colocar no seu relatório que os assalariados são transportados em cima do caminhão que leva cana para as usinas. V.Exas. deveriam colocar no relatório que há negociação que diz que o alojamento tem de ser bom, e V.Exas. colocam os trabalhadores para dormir nos galpões onde são jogados os animais. E quem duvidar disso é só ligar para a DRT no Estado de Pernambuco e terá a resposta. Então alguns setores da área rural precisam repensar essa situação. Não se cumpre o que é negociado.

E eu gostaria de finalizar dizendo o seguinte: no Estado do Paraná, recentemente, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais entrou com um dissídio coletivo e o TRT da região deu um salário para a categoria bem mais alto que o salário mínimo que eles ganhavam à época. E o patronato do Paraná, do qual também faz parte o Sr. Ricardo Barros, que está aqui defendendo esse projeto de lei, recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho em Brasília. E sabem V.Exas. qual foi a decisão do TST? Proferiu sentença dizendo que não poderia conceder aumento de salário para os trabalhadores rurais, porque a categoria não é organizada e não merecia receber mais que o salário mínimo, retirando assim a decisão do TRT. Esses Ministros que aqui estavam votaram lá. Por tudo isso, nós, trabalhadores rurais, que temos como referência a carteira assinada, que prevalece como garantia dos direitos

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básicos, e que não está na Constituinte, apenas na lei, e pode ser revogada com esse projeto de lei negociado, ou seja, 5 milhões de pessoas ficarão sem aposentadoria e direitos básicos. Dessa forma, o patronato da cana de Pernambuco e o que pegou dinheiro da SUDAM, no Pará, e outros do Brasil terão competência de negociar trabalho escravo por trabalhador que anda em cima de caminhão carregando mercadoria. A CONTAG repudia esse projeto lei, juntamente com outras confederações e as centrais sindicais. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Vamos ouvir por último, o Sr. Ubiraci Dantas, Vice-Presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil.

O SR. UBIRACI DANTAS – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, queria, em primeiro lugar, fazer minhas as palavras do companheiro José Calixto Ramos, Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria por ter, de maneira clara e concreta, colocado o dedo na ferida. Quem objetivamente está empenhado em destruir o movimento sindical brasileiro — a cabeça principal no nosso País — chama-se Fernando Henrique Cardoso. Não é à toa que para falar na ONU teve de mostrar o seu discurso ao George Bush para ver se este estava de acordo. Quero dizer que quando se trata de transformar as relações trabalhistas em selvageria, tenham certeza V.Exas. de que os trabalhadores brasileiros não ficarão calados diante desse golpe. Este Governo, que tem apenas a responsabilidade de representar o nosso País, no Fundo Monetário Internacional, acabou com a aposentadoria do tempo de serviço, gastou o dinheiro dos trabalhadores do Fundo de Garantia e entregou nossas estatais estratégicas ao capital financeiro internacional, tanto que os 3 mil operários demitidos pela Volkswagen são, nada mais nada menos, fruto dessa política que destruiu a empresa nacional e que está destruindo o direito dos trabalhadores. Mas, aqui, temos pátria e resistência. Esse movimento sindical reunido, como disse o Calixto, não deixará passar em vão, porque se trata das nossas vidas, dos nossos direitos e das nossas responsabilidades com nossos filhos e famílias. Por isso, Srs. Parlamentares, é muito importante analisar qual será o compromisso de V.Exas. com a Nação e com os trabalhadores. Uma coisa é certa: o troco vem, e pode vir antes da eleição, porque o povo não agüenta mais tanta tristeza, sacanagem e safadeza contra os seus direitos, vida e família. Nós todos estamos unidos e, certamente, aqueles que estão resistindo ainda a entrar nessa luta, para que possamos chegar a um porto seguro, haverão de vir, porque a força do povo está na fábrica e nos sindicatos. Certamente, iremos conseguir reverter essa situação ruim para o Brasil e para os trabalhadores brasileiros.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Vamos ouvir agora os últimos três Parlamentares, Deputados Jair Meneguelli, Vivaldo Barbosa e Avenzoar Arruda.

Serei rigoroso quanto ao tempo.

O SR. DEPUTADO JAIR MENEGUELLI – Sr. Presidente, aproveito o momento para trazer meu apoio e solidariedade à Ana Marta pela denúncia nos casos de nepotismo no Paraná e em Campinas.

Lamentei a saída dos Ministros e queria novamente discorrer sobre esse tema. Sei que estamos num seminário, não numa sessão ordinária, e como não será elaborada ata, não haverá como discuti-la posteriormente. Mas volto a fazer apelo ao Presidente com base no art. 17, I, "h", do Regimento Interno, que prevê que uma das atribuições da Presidência é determinar o não-apanhamento do discurso ou aparte pela taquigrafia. Quero, com todo o respeito que lhe tenho, pedir a V.Exa. que esses discursos sejam retirados dos Anais do Congresso e considerados como não-feitos, não-ditos, não-realizados. É inadmissível alguém vir a esta Casa emitir opinião e não permitir que Parlamentares possam discutir sobre essas mesmas opiniões aqui apresentadas. Então, apelo para V.Exa. a fim de que retire os três discursos da taquigrafia dos Anais desta Casa.

Fico tolhido no debate. Não preciso fazer debate com os quatro expositores, mas apenas, como fez o

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Deputado Paulo Paim, parabenizá-los pelas exposições. Eu queria fazer o debate com quem veio falar bobagem. Aí, sim, me interessava fazê-lo. Porque, o Ministro Ives Gandra veio a esta Casa dizer que é muito legal o negociado sobre o legislado. Eu queria perguntar a S.Exa. se acha que já é o momento de terminar com o TST e estabelecermos a arbitragem para decidir sobre as greves e dialogar com o Ministro Gelson de Azevedo, que disse uma bobagem do tamanho de um bonde "Olha, se houver vinte reivindicações, eu não acredito que todas irão retirar direitos, será que uma dessas vinte não irá adicionar direitos?" Ora, para adicionar direitos, a lei já permite, não precisa desse projeto. Esse projeto está feito apenas para retirar direitos, não para discutir ganhos. É a finalidade pura e simples do projeto.

Quero também aproveitar a oportunidade e comunicar a esta Casa que as DRTs de Salvador, de Curitiba, do Rio Grande do Sul, de Sorocaba, do ABC Paulista e de São Paulo estão ocupadas pelos sindicalistas. (Palmas.) Por enquanto, são essas que temos informações.

Aliás, na DRT de São Paulo, já fizeram uma ata agora pela manhã, e o delegado substituto a assinou junto com sindicalistas pedindo retirada da urgência constitucional desse projeto. É informação do próprio delegado substituto.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Deputado Jair Meneguelli, peço a V.Exa. que conclua em um minuto.

O SR. DEPUTADO JAIR MENEGUELLI – Sr. Presidente, todos oradores dispuseram de dez minutos. V.Exa. poderia conceder-me mais seis minutos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Não, todos dispuseram de cinco minutos.

O SR. DEPUTADO JAIR MENEGUELLI – Então me dê seis.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Tudo bem, um minuto a mais para V.Exa. concluir.

O SR. DEPUTADO JAIR MENEGUELLI – Vou terminar, temos a tarde ainda para continuar discutindo, fazendo apelo ao companheiro José Múcio Monteiro que não está mais no plenário.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – S.Exa. está próximo à porta dando entrevista, o que não prejudica o trabalho.

O SR. DEPUTADO JAIR MENEGUELLI – Lamentavelmente, S.Exa. está dando entrevista. Mas faço apelo aos Deputados Pedro Henry e Odelmo Leão.

Sr. Presidente, sabe o que esse projeto pretende fazer? Esse projeto foi encomendado pela Volkswagen. É uma encomenda dela, a fim de permitir que, ao invés de estarmos discutindo como disputar o mercado, por meio da qualidade do produto e da produtividade, começaremos agora a disputar o mercado a partir do rebaixamento salarial. Ou seja, a Volkswagen quer que o sindicato assine e os trabalhadores aceitem a redução da jornada de trabalho e de 15% de seus salários.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Deputado, atenção para o tempo.

O SR. DEPUTADO JAIR MENEGUELLI – E mais, Sr. Presidente, o que a Volkswagen quer é que os trabalhadores aceitem essa redução e o sindicato assine concordando com a rotatividade daqui para frente para demitir 6% dos trabalhadores ao ano, na Volkswagen, e contratar com o salário mais baixo de 30% do que é hoje.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Peço a V.Exa. que conclua, Deputado Jair

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Meneguelli.

O SR. DEPUTADO JAIR MENEGUELLI – Portanto, não podemos aceitar esse projeto encomendado pela Volkswagen. Temos de derrotá-lo e garantir os direitos dos trabalhadores. Se quiserem lucro, tenham competência. Lucro não dá para ter com o salário dos trabalhadores.

Obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Antes de passar a palavra ao Deputado Vivaldo Barbosa, faço apelo a V.Exas, Deputados Avenzoar Arruda e Vivaldo Barbosa no tocante ao tempo, pois os Senadores e Deputados membros da Comissão do Orçamento já estão pedindo para desocupar o plenário. Já são 14 horas e 33 minutos. Vamos ainda ouvir o Deputado Vivaldo Barbosa, que disporá de cinco minutos.

O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, senhores e senhoras expositores, não ouvi o Ministro Almir Pazzianotto, pois cheguei depois. Ainda bem, porque certamente teria motivos para não continuar cultuando um apreço que tenho por muitas atitudes na sua vida.

Também não ouvi o Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho. Infelizmente não o conheço, não sei da sua trajetória. Mas ouvi o Ministro Gelson de Azevedo. Já adiantei minha posição e considerações contrárias às teses que S.Exa. aqui levantou.

O Ministro Gelson de Azevedo procurou destacar três pontos em que pretendia demonstrar que, por meio desses três pontos, não via nenhuma inconstitucionalidade no projeto. Disse que o princípio da irrenunciabilidade de direito não estava afetado nem ferido pelo projeto. Disse que nas negociações, sem dúvida alguma, o trabalhador terá direito a fazer opção por livre e espontânea vontade em negociar direitos de maneira compensatória com outras conquistas do mesmo acordo. Disse também que não haveria o chamado vício presumido de consentimento, já que se tratava de uma assembléia, de uma coletividade. E essas não esmagariam nem coagiriam ninguém.

Ora, tantas coletividades são tão coagidas ao longo da história. Tantas reuniões e assembléias de tanta natureza. São tiradas decisões contrárias aos interesses superiores daquela assembléia. Até nações na sua coletividade são coagidas e tomam decisões contrárias aos seus interesses superiores. Também o Ministro Gelson de Azevedo não viu problemas no princípio que rege o direito brasileiro de optar pela norma mais benéfica ao trabalhador não estaria ferido, porque tudo, segundo S.Exa., seria tirado de uma decisão coletiva, de uma assembléia, de um acordo negociado em que algumas cláusulas poderiam prejudicar, mas que seriam compensadas por cláusulas mais benéficas.

Ora, pena que o Ministro se esqueceu de uma coisa muito simples que diz respeito ao quotidiano das suas atribuições e da sua função: dar guarida e não levar em conta esses princípios. O Ministro esqueceu-se de que, segundo a legislação brasileira, todos os acordos estão sujeitos ao controle da sua legalidade pelo Poder Judiciário e pela Justiça do Trabalho, em decorrência da vigência da CLT, que hoje prevalece sobre qualquer acordo. Todos os acordos, assembléias e convenções estão sujeitas ao controle jurisdicional da Justiça do Trabalho brasileira.

Que pena que o Ministro se esqueceu de dizer e de enxergar que o que exatamente está em questão aqui é a derrubada do controle jurisdicional dos acordos e das assembléias. Isso é inconstitucional. Fere os princípios e as atribuições do Judiciário neste País, porque, a partir de agora, não haverá mais controle jurisdicional dos acordos coletivos e das assembléias das convenções coletivas. A partir de agora, os acordos estarão acima da lei, das atribuições do Poder Judiciário, do controle jurisdicional e da legislação do trabalho.

Mas será que o Ministro, em sã consciência, não vê que isso é inconstitucional? Será, Sr. Presidente,

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que o Ministro tem posição doutrinária, segundo S.Exa., técnica, realmente firmada a esse respeito?

E mais, Sr. Presidente, o que estamos agora verificando é que, neste projeto, o sociólogo, o Presidente nos envia essa pérola. O sociólogo Presidente quer dizer que no Brasil, somente no Brasil, nas nações de hoje, algo vai estar acima da lei.

Ora, Sr. Presidente, a evolução, o processo civilizatório e o processo constitucional, nos últimos séculos, proclamaram que nada está acima da lei. Os potentados e os procurados estão sujeitos às leis; os juízes, os Deputados, os Presidentes e até os reis estão sujeitos às leis. Mas agora o sociólogo quer proclamar que o patronato brasileiro está sobre a lei; que o patronato brasileiro, exatamente no País da hierarquia social, da crise econômica, da crise social, da injustiça, da crueldade e da covardia que enxovalham nossa história, vai estar acima da lei!

Ora, será que o Ministro Gelson de Azevedo não enxergou nisso uma brutal inconstitucionalidade? Não enxergou nisso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, senhores expositores, uma negação da prevalência do Direito, uma negação da prevalência da lei e da Constituição sobre as paixões e a ganância, que são próprias da humanidade? Será que o Ministro não viu nisso exatamente o reflexo da evolução constitucional dos povos, do processo civilizatório dos povos? Que pena! Eu queria dizer isso ao Sr. Ministro. Que pena eu não poder debater isso com S.Exa., porque é inacreditável que um integrante da magistratura superior do trabalho no Brasil não tenha enxergado nesse projeto essa brutal inconstitucionalidade, essa afronta à evolução constitucional dos povos e ao processo civilizatório.

Esperamos que os Deputados desta Comissão recobrem a razão hoje à tarde, ou no plenário, na próxima semana, e venhamos a respeitar todos aqueles que até aqui lutaram não apenas para que as conquistas e a prevalência da legislação do trabalho chegassem aonde chegaram, mas, acima de tudo, Sr. Presidente, todos aqueles que lutaram para que a lei esteja acima de todos nós. Porque a lei é essa razão coletiva, que muitas vezes é errada, injusta, ou mal aplicada, mas que certamente prevalecerá e que até aqui poderá prevalecer contra a ganância, especialmente do patronato brasileiro.

Sr. Presidente, peço licença para me dirigir ao Dr. Roberto Caldas, representante da OAB, que aqui fez defesa muito forte da aprovação da Convenção 87.

Eu gostaria de sublinhar que esse não é um pensamento unânime na Ordem dos Advogados.

Apelo aos bravos dirigentes sindicais da CUT que reflitam; pense bem, Sr. Roberto Caldas; pense bem e reflita conosco, meu caro João Felício e todos os outros dirigentes da CUT.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Deputado Vivaldo Barbosa, a Presidência faz apelo a V.Exa. para que conclua a sua fala.

O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA - Atendo ao apelo de V.Exa., Sr. Presidente, mas alerto ao Dr. Roberto Caldas e ao nossos dirigentes da CUT: se implantarem o pluralismo sindical —a esta altura da vida brasileira já estão derrogando o direito e a lei — o que acontecerá com as negociações e o processo de luta da classe trabalhadora neste País?

Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Obrigado, eminente Deputado Vivaldo Barbosa.

Por último, concedo a palavra ao Deputado Avenzoar Arruda, que disporá de cinco minutos.

O SR. DEPUTADO AVENZOAR ARRUDA - Sr. Presidente, ouvi diversas exposições e tenho acompanhado esse debate, que, diga-se de passagem, já se havia iniciado e seria pretensão que

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existisse de fato debate sobre a reforma da CLT, mas nunca com esse modelo apresentado pelo Ministro do Trabalho e no regime de urgência constitucional. Da maneira como está sendo encaminhado esse projeto, é uma violência! Falar em democracia, em acordo, livre acordo, quando não se propõe o livre acordo na instância que vai elaborar, podemos concluir que a pretensão não é benéfica. Não há nenhuma conotação de respeitar interesses, direitos, ou o Estado Democrático de Direito, quando não se abre a possibilidade de ampla negociação no foro principal do País, que é o Congresso Nacional. E não está havendo possibilidade de negociação.

É preciso dizer, inclusive — eu gostaria da atenção do Relator especialmente, Deputado José Múcio Monteiro — que o Relator tem a possibilidade de colher e acatar sugestões. Não me posso furtar a dizer que V.Exa. tem esse poder, V.Exa. sabe disso, pode fazê-lo ou não, mas sei que não pode tirar a urgência constitucional e que pretendia fazê-lo. Mas tem poder para fazer alterações no projeto, não para aprová-lo, mas para expressar um pensamento.

Já mencionei essas questões e na oportunidade vou levantar outras sobre diversas sugestões dadas. É inaceitável que não se manifeste sequer uma opinião sobre as sugestões apresentadas.

Por exemplo, no fundamento que o Ministro apresentou para justificar esse projeto há o seguinte: que em tal sindicato se pretendia alterar o prazo de vigência do acordo para três anos, mas, como o Ministério Público entendeu ser ilegal, isso foi nulo. Bem, aparentemente alguém pode dizer: "Olha, mas está vendo o autoritarismo do Ministério Público?" E eu pergunto: e agora, vamos poder fazer acordos com vigência de dez ou vinte anos, vai ser possível isso? Aí, sim, estará sendo estabelecida legislação particular para as categorias que firmaram esse acordo, porque não há mais prazo! E um dos argumentos é esse, uma questão extremamente grave.

Em relação às férias, sabem qual é o outro argumento do Ministro? Está escrito, V.Exas. leram "porque um determinado sindicato pretendeu dividir em três parcelas". Estão vendo o absurdo, senhores? Afinal de contas, a categoria queria, e o empregador também.

Pergunto, Deputado José Múcio: e se alguém pretender, por exemplo, dividir em dez parcelas? Ah, vai poder? Vai poder, efetivamente? Como fica essa situação? É um direito constitucional, mas ele pode disfarçar. Aliás, diga-se de passagem, em nossa Comissão tramita projeto que pretendia subdividir o 13º salário em doze parcelas. Legal, não é? Porque aí ele pode ser incorporado ao salário, e daqui a mais um ano, acabou-se o 13º. É um direito constitucional? É, mas ele estaria incorporado como uma parcelazinha todo o mês. Evidentemente, já sabemos como isso funciona.

Portanto, não é verdadeira a argumentação de que não estamos falando de direitos constitucionais. A questão concreta é exatamente a redução de direito da pior forma que podemos encontrar. E, Deputado José Múcio, V.Exa. como Relator tinha feito essas sugestões, e vou ouvi-lo no momento adequado para saber se incorpora ou não. Todos temos o direito de expressar nossa opinião, mas devemos ser absolutamente claros para dizer: "Olha, isso não é uma questão do Governo, é questão da base parlamentar", porque o Governo não é só o Executivo, só o Presidente ou o Ministro do Trabalho; o Governo é também sua base parlamentar. Já vi muitas vezes a base parlamentar reagir e resolver questões. É preciso deixar isso claro. E digo isso com o respeito que tenho a todos os Parlamentares da base do Governo, apenas para diferenciar.

Para concluir minha participação neste seminário, quero dizer o seguinte: como Presidente da Comissão, V.Exa. tem tido comportamento louvável, inclusive permitido o debate, este seminário, e assim por diante. Mas acho que há uma decisão que V.Exa. precisar tomar, é claro que se não votarmos aqui, o projeto vai direto para o plenário, e V.Exa. tem tido uma postura de votar todos os projetos, sem exceção, não é questão de ser este o projeto, é preciso que se diga. V.Exa. deve refletir sobre a necessidade ou não de sair desta Comissão com um parecer. Na verdade, fomos tolhidos de um debate mais profundo. Sabemos disso. Houve debate? Sim, mas em condições extremamente de confronto, não de pleno convencimento. Não podíamos fazer debate de convencimento nas

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condições que tivemos. E o debate de confronto é muito mais estabelecer posições do que propriamente fazer o convencimento, para analisarmos as graves conseqüências que esse projeto traz para a sociedade, não só para a classe trabalhadora. É uma questão de classe, sem sombra de dúvida, mas, sinceramente, isso aqui diz respeito também a relações de Estado de direito. E tenho dito que as pequenas empresas vão pagar caro se isso for estabelecido, porque aí teremos um violento processo de terceirização, com transferência de direitos e encargos para as pequenas empresas. Podem ficar certos de que isso acontecerá. Hoje alguns pequenos empresários acham que isso é muito bom, mas amanhã pagarão muito caro por essa interpretação equivocada. Acho que V.Exa. também tem essa decisão a tomar.

Temos uma decisão a tomar hoje. E não se trata de uma decisão qualquer, é extremamente delicada, séria. Precisamos saber que procedimento adotaremos, porque, do contrário, quem provocou toda essa confusão sairá de bonzinho. Expõe a sua base parlamentar, expõe a Comissão, cria todo o problema, e imaginem se no final das contas ele chegar ao plenário e tirar a urgência constitucional. É preciso ter muito cuidado para que não se coloque a Comissão de Trabalho onde querem, porque se esse projeto for aprovado, sinceramente, não haverá mais sentido a Comissão de Trabalho. Para que legislar sobre o trabalho se fazem acordo?

Nesse caso, teremos de criar outra Comissão. Talvez Comissão de Revisão de Acordo seja o nome mais adequado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Muito obrigado, Deputado Avenzoar Arruda.

Antes de encerrar o nosso seminário, o Sr. Hugo Melo deseja fazer algumas considerações, em nome de todos os que estão na Mesa.

O SR. HUGO CAVALCANTI MELO FILHO – Sr. Presidente, agradeço a V.Exa. a concessão do tempo e queria, antes de encerrar o seminário, deixar muito claro a V.Exas. que a postura e o pensamento do Ministro Almir Pazzianotto não refletem absolutamente a vontade e a intenção dos Juízes do Trabalho brasileiro. (Palmas.) Digo mais, o pensamento do Ministro Almir Pazzianotto não reflete sequer o pensamento do Tribunal Superior do Trabalho, como ficou claro no depoimento dos Ministros Francisco Fausto, Simpliciano e José Luciano. Esse é um primeiro ponto.

Muito se criticou a postura e o pensamento do Ministro Almir Pazzianotto. É preciso ficar claro que os Juízes do Trabalho não comungam com essas opiniões. Eles estão firmes e contrários à aprovação desse projeto, por uma razão muito simples, óbvia: não vimos aqui uma voz se erguer para defender esse projeto, a não ser na frieza da técnica. Os Juízes do Trabalho já estão muito longe desse período em que o Juiz só fala nos autos e de acordo com o que se apresenta nos autos para ele apreciar. Não. Nós estamos inseridos no debate político, nas questões mais importantes da sociedade, e sabemos que esse projeto só trará malefícios para o trabalhador brasileiro. E mesmo enfrentado do ponto de vista técnico, os argumentos aqui utilizados não resistem a cinco minutos de debates. Todos nós sabemos disso. Ele é inconstitucional, porque a Constituição só autorizou a flexibilizar em três pontos: jornada de trabalho, jornada especial para turnos ininterruptos e redução de salário mediante negociação coletiva. Quanto ao mais, em momento algum, a Constituição expressou essa possibilidade de negociação. Como é que agora a lei virá para dizer que se pode negociar sobre o que está legislado?

Segundo, esse projeto obviamente trará prejuízos. O Ministro Gelson disse aqui que eram direitos menores do trabalhador, garantias menores. Não estão regulados pela Constituição o 13º salário, que pode ser postergado para o fim do ano, dividido em vinte parcelas; o 13º proporcional; o adicional noturno; a duração da jornada noturna; o salário-família; a proteção ao trabalho da mulher; as férias, quanto a prazo, divisão e proporcionalidade; a proporcionalidade do aviso-prévio; a proteção contra automação; o vale-transporte, entre tantos outros. Esses são direitos menores do trabalhador? São direitos e garantias importantes, conquistados ao longo de séculos de luta dos trabalhadores.

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Então, Sr. Presidente, agradecendo a V.Exa. a boa vontade, reafirmo a posição dos Juízes do Trabalho e lamento que não tenhamos tido a oportunidade de debater as questões abordadas. Faço também um apelo aos Srs. Parlamentares da base governamental para que ouçam a voz dos Juízes do Trabalho, dos Procuradores do Trabalho, dos advogados trabalhistas, dos sindicalistas, dos trabalhadores brasileiros. Se os senhores não vão ouvir a opinião dessas pessoas diretamente envolvidas e que atuam no dia-a-dia com essa matéria, vão ouvir a opinião de quem? Do Ministro Francisco Dornelles, que quer cumprir as cláusulas fixadas em contrato com o FMI?

Então, é este o apelo que deixamos aqui, em nome dos Juízes de Trabalho e também, creio eu, em nome dos demais que participaram do debate.

Muito obrigado.(Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – Obrigado, Sr. Hugo Melo.

O Sr. Luís Carlos Moro, Presidente da Associação Nacional dos Advogados Trabalhista, deseja fazer algumas rápidas observações.

O SR. LUÍS CARLOS MORO – Aproveito a presença em plenário de V.Exa.; do Relator, Deputado José Múcio Monteiro; do Deputado Pedro Henry e dos Deputados da base governista para terminar dizendo que esse projeto é profundamente desrespeitoso para com este Parlamento. O projeto é profundamente desrespeitoso para com os Deputados da base governista. Tenho certeza de que o Governo não consultou sua base e impôs um projeto que expõe a sua base governista a uma situação vexatória diante dos trabalhadores do Brasil. Trata-se, na verdade, de um projeto que dispensa a atividade legislativa. Um projeto que retira do Poder Legislativo a sua função precípua, que é legislar sobre trabalho, transferindo para terceiros, excluindo o Poder Legislativo da sua função básica, quanto às relações do trabalho. É um apelo para que o próprio Legislativo se autoproteja e não permita essa mutilação contra a sua base governista e contra a própria função legislativa.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) - Muito obrigado, Sr. Moro.

Pela ordem, para uma rápida intervenção, concedo a palavra ao Deputado Paulo Paim.

O SR. DEPUTADO PAULO PAIM – Sr. Presidente, conversei com diversos Parlamentares e entendemos que devemos convidar V.Exa. — e V.Exa., é claro, poderá nos acompanhar ou não — a nos acompanhar até a Presidência da Câmara dos Deputados, para onde levaremos a posição dos painelistas ora presentes a este seminário. Já conversei com eles, que estão dispostos a irem lá. Inúmeros Deputados irão nos acompanhar. Faremos um pedido ao Presidente em exercício para que entre em contato com o Ministro Francisco Dornelles, o todo-poderoso, o chefão desse projeto, no sentido de que se retire a urgência constitucional e, ao mesmo tempo, que já seja aprovada hoje em plenário uma Comissão Geral para o dia 20 de novembro, Dia da Escravatura, com a participação dos mesmos painelistas, a fim de fazermos um debate com todo o Plenário da Câmara dos Deputados, pela importância e pela clareza dos nossos convidados em defenderem um ponto de vista que, no nosso entendimento, não vai ao encontro dos interesses dos trabalhadores e da sociedade.

Era o que queria dizer. Que nos desloquemos agora até o Presidente em exercício, para solicitar a S.Exa. que converse ainda hoje com o Ministro Francisco Dornelles, no sentido de evitarmos a respectiva votação.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Freire Júnior) – A Presidência nada tem a se opor, muito menos a se manifestar no mérito da proposta de V.Exa. Vamos cumprir o acordo que foi tratado na semana passada. Encerrado o seminário, passaremos à reunião de deliberação no Plenário nº 12, conforme acordado. Antes disso, porém, convido a todos os Parlamentares para uma reunião na sala da Presidência da Comissão do Trabalho.

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Antes de encerrar os trabalhos, agradeço a presença aos Srs. Parlamentares, aos convidados e demais presentes e convoco reunião ordinária para hoje, às 15 horas, no Plenário nº 12 do Anexo II.

Está encerrado o Seminário.