departamento de taquigrafia, revisÃo e redaÇÃo … · temos, sobre o problema de fidelidade...
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CÂMARA DOS DEPUTADOS
DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
NÚCLEO DE REVISÃO DE COMISSÕES
TEXTO COM REDAÇÃO FINAL
COMISSÃO ESPECIAL - REFORMAS POLÍTICASEVENTO: Audiência pública N°: 000563/01 DATA: 19/06/01INÍCIO: 10:10 TÉRMINO: 14:17 DURAÇÃO: 4:07:00TEMPO DE GRAVAÇÃO: 4:18 PÁGINAS: 108 QUARTOS: 26REVISORES: DEBORA, LIA, IRMA, MARLÚCIA, PATRÍCIA MACIELSUPERVISÃO: DANIEL, ESTEVAM, J. CARLOS, MARIA LUÍZACONCATENAÇÃO: NEUSINHA
DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃONELSON JOBIM – Presidente do Tribunal Superior Eleitoral
SUMÁRIO: Reforma da legislação eleitoral.
OBSERVAÇÕES
CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reformas PolíticasNúmero: 000563/01 Data: 19/06/01
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Bom dia, senhoras e
senhores!
Havendo número regimental, declaro aberto os trabalhos da 5ª reunião
ordinária da Comissão Especial Destinada ao Estudo das Reformas Políticas.
Tendo em vista a distribuição de cópias da ata da reunião anterior a todos os
membros presentes, indago da necessidade de sua leitura. (Pausa.)
Dispensada a leitura.
A ata está em discussão. (Pausa.)
Não havendo quem queira discuti-la, passamos a votação.
Os Deputados que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
A ata está aprovada.
Comunico que, por indicação do Líder do Bloco PDT/PPS, o Deputado Márcio
Bittar passou a integrar esta Comissão em substituição ao Deputado João Herrmann
Neto.
Ordem do dia:
Na pauta da presente reunião consta audiência pública com o Exmo. Sr.
Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Ministro Nelson Jobim.
Antes de iniciarmos a nossa audiência, gostaria de externar ao Exmo. Sr.
Ministro a nossa satisfação em tê-lo nesta Casa, mais especificamente nesta
Comissão, que trata de assuntos sobre os quais V.Exa. é uma autoridade das mais
distintas e respeitadas do País, notadamente agora, como representante maior da
Justiça Eleitoral.
Esclareço que, nos termos regimentais, adotaremos os seguintes critérios: o
convidado disporá de até vinte minutos para fazer a sua exposição inicial, não
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podendo ser aparteado; no período destinado aos debates, os Srs. Deputados que
quiserem interpelar o expositor deverão fazê-lo pelo prazo de até três minutos, tendo
o convidado igual tempo para responder; aos Deputados são facultadas a réplica e a
tréplica, também pelo prazo de até três minutos.
Neste momento, passo a palavra ao Exmo. Sr. Ministro Nelson Jobim.
O SR. NELSON JOBIM – Sr. Presidente, Sr. Relator, Sras. e Srs. Deputados,
foi com satisfação que atendi ao convite feito pelo eminente Presidente desta
Comissão Especial Destinada ao Estudo das Reformas Políticas, Deputado Olavo
Calheiros, que tem como Relator o Deputado João Almeida, para conversar sobre a
temática relativa às eleições.
Eu dividiria esse assunto em dois blocos. No primeiro, faria um exame sobre a
urna eletrônica, sobre a votação eletrônica, informatizada; no segundo, faria uma
análise sobre algumas perspectivas da reforma política propriamente dita. Eu, então,
examinaria alguns temas tópicos sobre o sistema de representação proporcional que
temos, sobre o problema de fidelidade partidária, coligação partidária, candidatura
nata; enfim, alguns temas que têm aparecido no Tribunal e que são vitais na
discussão sobre a reforma política.
Com relação à urna eletrônica, tivemos, no ano de 2000, a realização de
eleições nos 5.561 Municípios do País. Utilizou-se um total de 353.735 urnas
eletrônicas para votação e justificativa eleitoral. O número de votantes foi de
109.823.421 eleitores em aproximadamente 2.500 zonas centrais ou totalizadoras.
Tivemos cerca de 300 mil candidatos, sendo que destes aproximadamente 60 mil,
entre Prefeitos e Vereadores, foram eleitos. Isso tudo determinou o envolvimento da
Justiça Eleitoral no País com 10 mil técnicos e 1.950 mesários, sendo que 650 eram
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técnicos de informática dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Tribunal Superior
Eleitoral.
Alguns problemas ocorreram nas eleições. Tivemos problemas em seis
Municípios. Por exemplo, em alguns deles, os eleitores afirmavam que digitavam o
número de um candidato e aparecia a fotografia de outro. O Tribunal Eleitoral tomou
providências no sentido de comparecer aos locais para verificar tal problema.
Surgiram também situações curiosas, como o de um eleitor digitar o número do
candidato e não reconhecer a fotografia que tinha sido enviada ao Tribunal Eleitoral.
Houve o caso de um padre que se candidatou a prefeito, e ele aparecia na foto de
gravata, cabelo penteado. Ora, na verdade, aquela não era a sua imagem do dia-a-
dia. Então, houve problemas dessa natureza, mas todos eles foram solucionados e
não houve maiores dificuldades.
A questão básica que está sendo discutida em relação à urna eletrônica é a
desconfiança, a suspeição em determinadas situações. O núcleo do problema
estaria na seguinte situação. Digita-se o número do candidato. O sistema da urna
eletrônica é não de conservação do voto, mas de contabilização do voto. Na urna
tradicional, se lançava o voto e, depois, ele era contabilizado. No caso da urna
eletrônica, a contabilização é imediata. O número do candidato é digitado e
imediatamente ele é contabilizado; não fica nenhum vestígio entre a digitação e a
contabilização, só o resultado. Então, não há nenhuma memória na urna eletrônica
entre o digitar e o contabilizar – a contabilização é direta.
Levantou-se a possibilidade — mas não a demonstraram, o caso não ocorreu
— de que o programa que alimenta a urna pudesse ter um delta qualquer que
fizesse com que, por exemplo, quando se digitasse o número 135 o voto seria
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contabilizado para o candidato 153. A questão era saber como isso poderia ser
identificado. Para resolver esse problema, foram oferecidas algumas sugestões.
Tramita no Senado um projeto de lei, do Senador Roberto Requião, que
pretende solucionar esse problema por meio da impressão do voto. Assim, por
exemplo, digita-se o número 135 e, acoplada à urna, haveria uma impressora para
imprimir o voto. Dessa forma, o eleitor compararia o voto impresso com o voto
digitado. Se os dois votos fossem coincidentes, o eleitor apertaria um dispositivo
para contabilizar o voto na urna eletrônica e, ao mesmo tempo, o voto impresso
seria lançado em uma urna tradicional. Terminada a eleição, far-se-ia a apuração.
Assim, em torno de 3% dos casos, seriam apuradas as urnas tradicionais. Em
seguida, seria feita uma comparação entre o resultado da urna tradicional e o da
urna eletrônica. Se houver uma discordância nessa comparação, os votos daquela
urna seriam recontados e teriam que ser apurados mais votos.
Bem, qual é o problema que surge? O projeto inicial apresentava o seguinte
desenho: o voto seria impresso, o eleitor examinaria esse voto de papel, o fecharia e
o depositaria na urna tradicional. Pois bem. Em um debate de que participei no
plenário do Senado, demonstrei que aquela fórmula possibilitaria a volta do “voto
marmita”. De que forma? Ora, se digitaria o voto, esse voto seria impresso e se diria
ao Presidente da Mesa que o voto estava errado. Aí, o eleitor digitaria e imprimiria
de novo o voto, pegaria uma das folhas impressas e levaria consigo, entregando-o
na saída, retomando aquele velho sistema conhecido. Além desse “voto marmita”,
teríamos a possibilidade daquele “voto carreirinha”. Enfim, os senhores conhecem
toda a história. Ou seja, essa possibilidade poderia fazer retornar o sistema
tradicional.
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Em vista disso, o Senador Romeu Tuma elaborou um substitutivo
estabelecendo que o eleitor não teria acesso a esse voto impresso. Seria um
sistema em que o voto seria impresso embaixo de uma placa de vidro e não se teria
a possibilidade de se tocar no voto; ele somente seria encaminhado. O substitutivo
do Senador Romeu Tuma estabelece ainda que, se o eleitor votar no nº 135 e não
coincidir o voto impresso com o voto digitado, ele anula o voto e vota novamente. Se
essa divergência entre o voto impresso e o digitado persistir na segunda tentativa, o
fato é comunicado à Mesa. A Mesa examina, submete a urna a um exame de
técnicos, retoma a votação e as coisas continuariam assim.
O problema que existe em relação a essa fórmula, que é insolúvel dentro do
sistema, é o seguinte: o voto é secreto; ninguém poderá conferir a divergência
informada pelo eleitor. Se o eleitor disser que o voto lançado na urna não coincide
com o voto impresso, essa afirmação não pode ser conferida por ninguém. Nessa
hipótese, teríamos a seguinte situação: qualquer pessoa que desejar implodir o
sistema eleitoral implode; basta haver um eleitor em cada urna, em um conjunto de
sessões eleitorais, que afirme a divergência. Aí sai da eleição a urna eletrônica e
teríamos que retomar a votação tradicional, ou seja, um sistema regressivo. A
proposta conduz a um sistema regressivo e abre um impasse para essa situação.
O que estou sugerindo, e que gostaríamos de já submeter ao Senado
Federal, seria submeter todo o sistema — não a urna propriamente dita, mas todo o
sistema — a um laudo, a um exame técnico de auditoria externa. No caso
específico, poderíamos, tendo em vista a experiência do Senado Federal — e vamos
deixar bem claro que o sistema de votação eletrônica do Senado Federal não tem
nada a ver com o sistema eletrônico eleitoral —, poderíamos convidar a
Universidade de Campinas para fazer uma análise global do sistema, examinar
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determinados aspectos e sugerir eventuais alterações e modificações tendo em vista
a segurança. Teríamos três espaços de segurança: antes da eleição, durante a
eleição e após a eleição. Seriam os três universos de tratamento do tema.
Dentro desse conjunto de universos de tratamento do tema, em relação a
todo esse conjunto, teríamos condições de estabelecer, como providências
anteriores à eleição, a apresentação completa do sistema de votação, do anteprojeto
do sistema, e a discussão desse anteprojeto com os partidos políticos.
Aqui abro um parêntese. Creio que é importante a criação de uma comissão
permanente de acompanhamento do processo eleitoral. Não diria uma comissão
permanente de acompanhamento da eleição, porque seria uma comissão que só
teria trabalho de dois em dois anos.
Na Câmara dos Deputados, há um projeto do Deputado José Dirceu para a
criação de uma comissão de acompanhamento de eleições. Esse projeto
circunscreve essa comissão à composição dos partidos políticos; ou seja, seria uma
comissão composta pelos partidos. A meu ver, no meu sentir, e digo isso para os
senhores examinarem, a inconveniência de uma comissão dessa natureza, que
tivesse uma composição estrita de partidos políticos, é que ela não estaria
enganchada em nada; seria uma comissão que ficaria no ar. Não se tem uma
estrutura dessa comissão. Então, a sugestão que faria, e já transmiti isso ao
Deputado José Dirceu, seria uma Comissão Permanente do Congresso Nacional,
composta de Deputados e Senadores, indicados na forma regimental, que faria o
acompanhamento do processo eleitoral. Qual é a vantagem? A vantagem é que
seria uma Comissão Permanente ancorada na estrutura do Congresso Nacional.
Com uma comissão de partidos políticos, sabemos o que vai acontecer, e a
experiência é clara: alguns partidos participarão efetivamente dessa comissão e
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outros não, porque não se teria uma estrutura mandatória de responsabilização
individual de partidos.
Evidentemente, essa comissão não excluiria o acompanhamento feito
diretamente pelos partidos. Esse é outro problema. Ou seja, além do
acompanhamento dos partidos políticos, que já existe, seria criada uma Comissão
Permanente do Congresso Nacional para este objetivo, composta de Deputados e
Senadores. Essa comissão teria sua estrutura, teria o fundamento técnico, enfim, da
estrutura do Congresso Nacional, com possibilidade de uma interlocução direta com
o Tribunal Eleitoral.
Além do sistema de eleição, teríamos uma série de sugestões a fazer em
relação a lacres, a assinaturas digitais, a formas pelas quais se pode cercar o
sistema de segurança e de transparência.
Quero deixar bem claro que, da minha perspectiva individual, daquilo que
conheço e examinei do sistema, tenho a convicção de que o sistema é seguro. Mas
isso não basta. É preciso que a convicção nasça dos senhores a partir do sistema e
não a partir da confiabilidade que os senhores tenham ou não no Presidente do
Tribunal. Isso é irrelevante. No caso, as pessoas são irrelevantes. Precisamos criar
um mecanismo para estabelecer isso.
Teríamos, então, uma discussão sobre o anteprojeto do sistema de eleição,
uma discussão sobre o sistema e os lacres, a autenticação dos flashcard e da
votação de carga, e ainda teríamos o lacre da urna eletrônica e testes de
amostragem. No dia da eleição, poderíamos ter a extração de um conjunto de urnas,
que seriam escolhidas aleatoriamente pelos partidos, para se fazer um teste, no
sentido de se verificar se todo o sistema que foi produzido no Tribunal Eleitoral e que
foi testado por todos os senhores permanece internamente na urna. Teríamos ainda
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a assinatura digital para impedir a violação dos sistemas que foram inseridos nas
urnas eletrônicas. Como sistema pós-eleição, teríamos ainda uma análise geral de
geradores de mídia. Ou seja, há uma série de providências que podem ser tomadas
para cercar de segurança aquilo que, no meu entender, já é seguro, mas sobre o
qual é necessário ter transparência. Agora, sugeriria que essa discussão se fizesse
exatamente depois de termos o laudo externo sobre o sistema. Com base nesse
laudo externo, agregaríamos a forma de discutir essa transparência, porque é algo
realmente técnico.
O que temos que deixar bem claro é o seguinte: não há possibilidade de
convivência do sistema tradicional com o sistema eletrônico. Esse é o ponto
fundamental.
Outra coisa que também pode ser discutida é o seguinte. Anteriormente
tínhamos o quê? Lançava-se o voto na urna e, depois, apurava-se esse voto. Com a
apuração do voto, remanescia a cédula única e, com a cédula única, se tinha a
memória do voto individual de cada eleitor, não individualizado, mas se sabia que
naquela urna os 250 votos tinham uma composição – digamos, alianças feitas pelo
eleitor na elaboração do voto. Tínhamos essa memória, mas isso desapareceu
porque, com a contabilização direta, o que se tem no final é o boletim de urna com o
resultado geral do voto de cada um; e não se sabe quais foram as montagens que
os eleitores fizeram. É possível estabelecer um sistema, no programa da urna
eletrônica, em que fique esta memória, ou seja, que, ao final da eleição, além do
boletim de urna, se tenha a possibilidade de obter a informação de como o
eleitorado daquela urna compôs os votos.
Lembro-me de que, depois de todas as eleições de que participei, uma das
coisas que fazia era verificar exatamente as articulações feitas pelo eleitor na
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composição do voto. Principalmente quando o voto era para Deputado Federal e
Deputado Estadual, verificava que tipo de aliança o eleitor estava fazendo em
determinadas regiões. Tinha-se, então, o comportamento do eleitor na composição
de voto. Isso pode ser feito e é uma questão a ser examinada.
Então quero dizer aos senhores que, sobre a urna eletrônica, temos esta
situação: ou queremos um sistema eletrônico ou não queremos. Se queremos um
sistema eletrônico, precisamos decidir quais os requisitos de confiabilidade,
transparência e segurança desse sistema. Agora, ao tentar aferir o sistema
eletrônico com o sistema tradicional, só teremos problemas e nenhuma solução.
Essa é uma questão que cabe ao Congresso Nacional decidir: se se retorna ao
sistema primitivo ou não. Qualquer comparação que se quiser fazer entre a
impressão do voto e sua digitação vai gerar um problema insolúvel, salvo se os
senhores, reformando a Constituição, estabelecerem que não será secreto o voto
quando o eleitor manifestar uma divergência entre o voto impresso e o voto digitado.
Daí, então, rompe-se o segredo do voto para esse efeito e se impede a implosão do
processo eleitoral.
Há alguns outros temas que temos de discutir com os senhores, partidos e
Congresso, especificamente com relação à eleição de 2002, quando vamos ter o
seguinte quadro.
Tivemos 109.821.136 eleitores no ano 2000. As projeções do Tribunal
Superior Eleitoral indicam um aumento do eleitorado da ordem de 4,5%,
considerando o comportamento dos anos anteriores. Poderá haver ainda um
incremento no tocante à qualificação de menores de 18 e maiores de 16 anos, que é
o voto facultativo. Se houver esse incremento, ele percentual poderá aumentar. Mas
a variação da curva dos anos anteriores estabelece uma base de 4,5%. Então,
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teríamos um total de 114.723.308 eleitores, divididos por esse universo de 5.561
Municípios brasileiros.
Quais são os problemas que teremos nessa votação? Temos dois temas para
votação do ano de 2002.
Primeiro, quero lembrar aos senhores que a legislação estabeleceu que, na
formulação do voto na urna eletrônica, primeiro vota-se nos candidatos
proporcionais e, depois, nos candidatos majoritários. A legislação não estabeleceu
uma ordem de votação interna dos proporcionais e dos majoritários. Só diz que os
proporcionais antecederão os majoritários. Ficou, portanto, para o Tribunal Superior
Eleitoral decidir qual a ordem que se estabeleceria entre eles.
Na eleição de 2002, vamos ter um problema a ser resolvido com o
Congresso, que é o voto para Senadores. Teremos dois votos para Senador. Na
eleição de 1998, não houve uma informatização global – somente nas capitais e em
algumas cidades do País. Na de 2002 vamos ter uma ampliação global.
Enfim, o que vamos ter? Em primeiro lugar, o voto dos dois Senadores terá
que ser um voto simultâneo. O que significa isso? Não pode o eleitor votar, lançar o
primeiro voto de Senador, confirmar esse voto e, depois, lançar o segundo voto. E
por quê? Porque a urna tem que comparar o primeiro lançamento com o segundo, já
que não pode permitir que o eleitor vote duas vezes em um mesmo Senador. Então,
quais são as idéias? Vamos nos reunir com os partidos políticos e apresentar as
várias alternativas técnicas. Uma delas seria, terminada a votação para Deputado
Federal, ao se passar para a votação para Senador, a tela abre-se em dois espaços:
um para o primeiro voto e outro para o segundo voto. O eleitor digita o primeiro voto,
e a máquina passa imediatamente para o segundo voto. Se ele repetir no segundo
voto o primeiro, a urna rejeita. Se o eleitor confirmar o segundo voto igual ao
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primeiro, esse segundo voto será considerado nulo, que era o sistema anterior. Se
ele digita corretamente, confirma o voto, este será computado.
Então, há necessidade de termos essa fórmula, que vou submeter aos
partidos, para discutir as melhores técnicas. Há uma série de técnicas.
Outra situação também é saber o seguinte. Na eleição majoritária, quem será
votado primeiro? Os Senadores, o Governador ou o Presidente da República? O
Senador fica por último? O Senador antecede? Qual é a conveniência? Nas eleições
anteriores, o Senador ficava por último, mas era um Senador só. É recomendável
que, quando chegarmos no momento da votação majoritária, tenhamos a votação de
Senador antecedendo a votação do Governador e do Presidente? E depois do
Senador, vota-se em quem? No Presidente ou no Governador?
Essas decisões eram tomadas pelo Tribunal Eleitoral a partir de perspectivas
exclusivamente técnicas, mas entendo que essa é uma escolha política. Sendo uma
escolha política, quero discutir essa matéria com os partidos e com o Congresso,
para os senhores escolherem, politicamente, o que é mais conveniente. O que
compete a nós, do Tribunal Superior Eleitoral, é mostrar as alternativas técnicas
possíveis. A escolha entre as alternativas é uma questão política.
Lembro-me de que, quando se discutiu a ordem de votação, o Deputado João
Almeida, Relator na época, colocou-se a favor da votação dos proporcionais antes
dos majoritários porque, na verdade, na campanha eleitoral, o grande objetivo, a
grande perspectiva partidária é a votação majoritária e não a proporcional, e poderia
haver um abandono, um desleixo de votos em relação aos proporcionais. Daí por
que os proporcionais antecederam. E essa lógica aplicar-se-ia também na relação
majoritária: Senadores, Governador e Presidente?! Os senhores é que têm de
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resolver o problema e o Tribunal, então, estabelecerá, a partir do entendimento que
for estabelecido pelos partidos políticos, qual a melhor ordem.
Essa não é uma questão técnica, repito; é uma questão política de
conveniência. Não cabe, portanto, ao Tribunal emitir um juízo político de
conveniência. Compete aos senhores, e nós obedeceremos.
O segundo problema existente é que teríamos seis votos nessa eleição de
2002: para Deputado Estadual, Deputado Federal, dois Senadores, Governador e
Presidente. A partir da experiência e do levantamento estatístico das últimas
eleições, o tempo de votação para seis votos estaria em torno de 75 segundos. Se
tivermos 75 segundos entre abrir a urna e concluir o voto, nas sessões eleitorais
com mais de quinhentos eleitores, não teríamos condições de terminar a eleição às
17h, porque o tempo não permite — e 75 segundos é o tempo entre abrir a urna e
fechar o voto; não está computado aqui o tempo de identificação do eleitor etc.
Uma solução alternativa que vamos propor, e sobre a qual já estamos
trabalhando tecnicamente, é procurar fazer aquilo que se fazia nas urnas antigas.
Ou seja, quando existia um grande número de eleitores, havia duas ou três cabines
indevassáveis e apenas uma urna. No caso, teríamos dois terminais: o terminal da
urna propriamente dita e um terminal alimentador da urna, que seria um terminal
secundário, o que viabilizaria que dois eleitores pudessem votar ao mesmo tempo.
Não há problema técnico; é o que chamamos de “terminal burro”, porque a sua única
função seria alimentar a base de dados do terminal principal. Assim se resolveria o
problema. Com isso, temos um outro problema, que vamos resolver: teremos de
aumentar o número de urnas. Serão necessárias 405 mil urnas, não as 353 mil
urnas de que dispomos, para os terminais secundários.
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Como serão seis votos, não é conveniente a justificativa de voto, ou seja, a
justificação do eleitor na própria seção eleitoral, para evitar o conflito de filas. Então,
vamos criar postos específicos para a justificação. Com isso, se retira da seção
eleitoral os eleitores que estariam lá apenas para isso, diminuindo o afluxo de
pessoas.
Quero lembrar, e os senhores sabem disso, que a lógica da presença do
eleitor na seção eleitoral é diversa, completamente diversa, considerando-se a
localização das cidades e das regiões do País. Há determinados Estados em que a
concentração de eleitores se dá pela manhã; em outros, a concentração de eleitores
se dá à tarde; e, em outros, a concentração se dá ao meio-dia. Portanto, não adianta
se pensar num fluxo regular durante todo o período, porque temos concentrações
diversas. Eu determinei o levantamento dessas concentrações, cujo resultado é o
que estabelecerá a lógica da distribuição dos terminais secundários. Daí por que o
Tribunal ter necessidade da fabricação e aquisição de mais de 51 mil urnas para
atender à demanda de 2002.
Há outro problema que os senhores terão que resolver, uma questão legal
que precisa ser discutida. O que temos hoje? O eleitor comparece à sua seção,
apresenta seu título de eleitor, o Presidente da Mesa digita o número do eleitor no
terminal de abertura, e a urna é aberta. O que há na mesa? Na folha de votação
constam os nomes do eleitores que podem votar naquela urna e os números dos
seus títulos. O que se passa? Se o cidadão aparece sem o título, mas se identifica e
é identificado pela Mesa, ele pode votar, porque os dados necessários à abertura da
urna estão com o Presidente, que digita o número do título e abre a urna. O
problema que os senhores terão de examinar é que, se é possível alguém sem título
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de eleitor votar, é possível também que o Presidente da Mesa vote por aqueles que
não comparecerem.
Vamos admitir a seguinte hipótese. Num determinado momento da tarde, às
16h, o Deputado Vivaldo Barbosa comparece e verifica que, numa determinada
seção eleitoral, ainda não votaram 50 eleitores. O Deputado Vivaldo Barbosa sai
naquela sua visita tradicional, de beija-mão para o eleitor, que todos nós já fizemos
— é claro que se faz! —, depois ele vai àquela seção e verifica que, das 16h30min
às 16h45min, votaram 50 eleitores. O que pode ter acontecido? O Presidente da
urna, em conluio com os membros e fiscais da Mesa — e é claro que, nesse caso, é
preciso haver conluio —, poderá abrir a urna e votar pelos cinqüenta que não se
apresentaram, porque ele tem os dados necessários para abrir a urna.
Alguém pode perguntar: e quando chega o eleitor? O Presidente da Mesa é
esperto. Como ele faz? Se ele tem um crédito de 30 votos, ele vota por 25. Quando
o Haroldo Lima chega para votar, já votaram por ele, mas como ele não vai conferir
a abertura da urna, eles abrem com o número do título de um eleitor qualquer que
não tenha comparecido. Assim, o Haroldo vota no lugar dele, e está resolvido o
problema!
Qual é a solução? Há uma única solução, e ela tem preço. Nenhuma solução
que se dê para um problema não tem preço, e esta tem um preço. A solução
possível seria que, na folha de votação, não constasse a totalidade dos números do
título de eleitor. Se são dez ou oito números, na folha constariam os quatro últimos
números; os outros quatro estariam no título. Resultado: só se abre a urna com o
título, ou o seu número. No caso, nós estaríamos dificultando o acesso ao número,
que só seria possível com a apresentação do título.
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Nesse caso, teríamos a seguinte situação: quem não tem título, não vota.
Nessa hipótese, se o cidadão comparece à sua seção eleitoral sem o título, mas
apresenta um documento, ele pode justificar o voto para evitar o problema da multa.
Então, seria criado um sistema de justificação da presença do eleitor. Ele teria
certificado da sua presença, assinaria a folha de eleição, mas não votaria. Isso
significa que só vota quem tem título.
A questão é saber: os senhores desejam isso ou não? Quem tem que decidir
isso são os senhores. Se quem não tem título puder votar, nós precisamos ter um
mecanismo de ciência da Mesa para poder abrir a urna. O risco existe, que é aquele
já citado. Essa é também uma opção política, de conveniência, e vou submeter aos
senhores as alternativas possíveis, lembrando bem que a opção para evitar o
acesso à urna pela Mesa tem um preço, que é: não vota quem não apresentar o
título. Agora, se a opção for outra, teremos que encontrar mecanismos, e
mecanismos externos, de reforço de fiscalização, para manter essa inviolabilidade.
Em relação à urna eletrônica, essa é uma temática que, volto a repetir, nós
discutiremos longamente tão logo tenhamos esse laudo. Porém, sugeriria que,
desde logo, os senhores analisassem algo que é externo ao problema do sistema de
segurança da urna, que é a criação dessa comissão de acompanhamento das
eleições. Mas, insisto, não seguindo o modelo do projeto do Deputado José Dirceu.
Que haja, sim, a criação de uma comissão encravada no Congresso Nacional,
organizada por Deputados e Senadores, com a participação dos partidos. A forma
da sua composição é uma questão a ser discutida, mas seria uma Comissão
Permanente que seria a interface do Tribunal Superior Eleitoral com o Congresso
Nacional e com os partidos.
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Por que estou sugerindo isso? Volto a repetir: sugiro a criação de uma
comissão dentro do Congresso porque ela estaria ancorada numa instituição
permanente. Se fizermos uma comissão exclusivamente de partidos políticos, sem
uma âncora no Congresso Nacional, teremos algo sem interlocução, sem local nem
estrutura para a sua manutenção. É claro que isso não exclui a fiscalização e a
participação dos partidos já existentes, mas agregar-se-ia essa comissão
permanente de acompanhamento.
Eu enfrentaria agora, rapidamente, alguns temas específicos que os senhores
terão que examinar em relação à reforma eleitoral. Iniciaria examinando o problema
da representação proporcional, e vou abordá-lo a partir de experiência própria.
Nosso sistema eleitoral é um sistema de voto uninominal, e isto veio do
Império. Examinando toda a legislação eleitoral e todos os sistemas eleitorais
conhecidos no Brasil, o primeiro que tivemos foi em 1921, com a votação para os
Deputados brasileiros às Cortes portuguesas. A votação era em três turnos: os
cidadãos ativos elegiam os eleitores de paróquias; estes elegiam os eleitores das
Províncias; e o Colégio de Províncias elegia os Deputados. Foi assim até chegarmos
a 1881, com o voto direto, da Lei Saraiva. Mas este era um sistema majoritário, com
distritos eleitorais, consideradas as Províncias. Em 1855, tivemos um sistema
distrital majoritário, instituído pelo Marquês de Paraná. Hermeto Carneiro Leão
alterou o sistema, mas o voto era sempre uninominal.
Quero chamar a atenção dos senhores para um ponto importante. Os
senhores sabem muito bem que o 15 de Novembro republicano foi um golpe de
Estado, não uma revolução. Foi um golpe de Estado em que o Marechal Deodoro e
o Exército pretendiam derrubar o gabinete liberal do Visconde de Ouro Preto. Eles
não queriam derrubar o Imperador; a queda do Imperador veio no processo político
CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reformas PolíticasNúmero: 000563/01 Data: 19/06/01
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do 15 de Novembro. Deve-se isso, fundamentalmente, a Silveira Martins e a Lopes
Trovão, que fizeram uma campanha na Câmara Municipal do Rio de Janeiro.
O que aconteceu? Os republicanos receberam a República de presente do
golpe militar. Houve intrigas feitas por Benjamin Constant ao Marechal Deodoro; o
Marechal Deodoro recebe uma informação falsa de que o Imperador nomearia como
Presidente do Gabinete Silveira Martins, enquanto ele, Deodoro, queria o Saraiva
porque este era interessante ao Exército. Enfim, complicações de bastidores do Rio
de Janeiro. Isso deu na queda do Império.
A República não tinha apoio popular. Havia uma disputa entre as elites
republicanas, que se organizaram em partidos políticos em 1890. Aí, o que
acontece? Eles tinham que convocar uma assembléia nacional constituinte
republicana. Mas como eles iam fazer isso baseados em um sistema eleitoral a partir
do qual, seguramente, seriam vitoriosos os monarquistas? O que fizeram? Como sói
acontecer, a velha família mineira das Barbacenas, que circulava pelo País há
duzentos anos... Em 1890, discute-se entre os republicanos a organização do
processo eleitoral para a convocação da assembléia republicana. O que fazem os
republicanos? Eles abandonam o sistema eleitoral uninominal, pelo qual o eleitor
votava em um candidato, e criam o sistema de listas partidárias, isso para conseguir
a consistência do Partido Republicano. Assim, em 1890, o eleitor deixou de votar
nos candidatos uninominalmente, o que vinha da tradição, e passaram a votar em
listas de partidos, para assegurar a consistência da representação republicana na
assembléia constituinte — Regulamento Alvim, de 1890.
Pois bem. Essa eleição pelo sistema de listas fortaleceu enormemente o
Partido Republicano, reduzindo as estruturas dos Partidos Liberal e Monarquista,
que não tinham estruturas partidárias propriamente ditas – eram reuniões em torno
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de pessoas. Portanto, como o eleitor deixou de votar em pessoas e passou a votar
em listas partidárias, fortaleceu-se o Partido Republicano, que ganhou as eleições e
fez a Constituição Republicana de 1891. Só que não era possível manter esse
sistema, porque era um processo de exclusão, e os Partidos Monarquista e Liberal
tinham que se organizar em torno dessa situação.
Estoura a Revolução Federalista de 1891, liderada por Silveira Martins contra
Júlio de Castilhos, e aí se convoca a eleição com a Lei nº 35, voltando-se ao sistema
uninominal. E por quê? Para assegurar a inclusão, no processo republicano, dos ex-
monarquistas.
Vejam o seguinte, e dou esta informação entre parênteses: foi Campos
Salles, Ministro da Justiça de Deodoro da Fonseca, quem sugeriu que, por lei, se
atribuísse ao Supremo Tribunal Federal o controle da constitucionalidade das leis,
porque havia a possibilidade, depois da Constituição Republicana de 1891, de criar-
se, pelo resultado eleitoral com base no voto uninominal que retornou, um maioria
congressual monarquista votando legislação infraconstitucional. Portanto, ter-se-ia
um conflito entre a Constituição Republicana e um Congresso com maioria de
monarquistas, ou seja, um conflito entre a legislação infraconstitucional e a
Constituição Republicana. O que fizeram, inteligentemente, os republicanos?
Entregaram o controle da constitucionalidade das leis para os tribunais, porque
estes, para assegurarem a manutenção do espírito republicano, declaravam
inconstitucionais as leis produzidas por maiorias monarquistas. Esse foi, digamos, o
processo político-histórico.
Em 1932, Silveira Martins e Assis Brasil elaboram o projeto do código eleitoral
instituindo o sistema proporcional, mas não abandona o voto uninominal.
Estabelece-se o sistema proporcional e, num primeiro momento — e vejam a
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curiosidade, para entendermos o processo de transição —, o Código Assis Brasil
estabelece o quociente eleitoral, que sabemos bem o que é. Porém, o quociente
eleitoral poderia ser alcançado por candidatos individualmente considerados
independentemente dos partidos. Se um candidato tivesse uma votação igual ou
superior ao quociente, estava eleito, independentemente de o partido não ter
conquistado vagas. Aí foi criada uma figura chamada eleição de dois turnos. Não
vou examinar o sistema eleitoral, mas vou dizer o seguinte: na transição do sistema
majoritário da Primeira República para o sistema proporcional, manteve-se o voto
uninominal como forma de ligação entre um sistema e outro e não se entrou num
sistema de listas partidárias.
Agora, qual é a situação hoje? Minha exposição não tem o objetivo de ofender
ninguém, é uma exposição meramente analítica de uma realidade política,
independentemente daquilo que Marco Maciel chamaria de “fulanização”. O que
temos hoje? Temos a apuração do quociente eleitoral, em que se somam os votos
válidos e estes são divididos pelos lugares a preencher – os senhores sabem disso.
Vamos admitir a hipótese de que esta divisão... Vou tentar rememorar a minha
eleição, em 1986, em que o quociente eleitoral no Rio Grande do Sul era de 160 mil
votos. Dividiu-se o total de eleitores que compareceram à eleição — naquela época
ainda se incluíam os votos em branco; hoje não mais —, dividiu-se pelos lugares a
preencher no Rio Grande do Sul, 31 vagas; portanto, 160 mil votos eram o quociente
eleitoral. Depois, toma-se o número de votos válidos dados aos candidatos do
partido, divide-se esse número pelo quociente eleitoral e temos o quociente
partidário. Se os candidatos do partido fizeram 1 milhão e 600 mil votos, divididos
pelos 160 mil, o partido conseguiu, das 31 vagas, 10 vagas. Quem são os eleitos?
Os 10 mais votados da legenda.
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Qual é a lógica desse sistema? O que a lógica desse sistema induz? Primeira
afirmação: um partido, para ganhar a eleição proporcional, precisa conquistar o
maior número de vagas; para conquistar o maior número de vagas, precisa ter o
maior número de votos válidos na sua legenda; para ter o maior número de votos
válidos na sua legenda, precisa ter um número de candidatos que produzam
individualmente votos, já que o eleitor vota no candidato.
Lembrem-se de que isso é um orgulho para o eleitorado; lembrem-se de que
esta é uma permuta que se faz ao eleitor: você vota em que partido? Ele responde:
eu não voto em partido, eu voto em homens e em mulheres. E diz isso com orgulho.
Não é verdade? Isso significa que o eleitor está votando no candidato, o partido
sabe disso. Então, o partido vai buscar os candidatos que produzam votos.
Fiz uma tipologia há alguns anos, a partir das experiência que tive, a qual se
dividia da seguinte forma: primeiro, examina-se os virtuais candidatos do partido
num Estado federado; faz-se uma análise e verifica-se a consistência dos virtuais
candidatos da sua legenda com as categorias profissionais organizadas no Estado.
No Rio Grande do Sul, os partidos, sabendo, por exemplo, que a Polícia Militar
gaúcha, a Brigada Militar, tem uma organização, uma capilaridade, um conjunto de
pretensões em termos de representação, saem atrás de candidatos que possam
capitalizar e cooptar os votos daquela categoria profissional para si, que serão
somados aos dos demais candidatos. Então, lá temos candidatos das polícias
militares e civis. Houve uma época que tínhamos os candidatos dos fiscais de renda.
Houve um momento, na década de 70, em que os auditores de renda tinham uma
organização capilar muito forte, assim como os presidentes dos sindicatos dos
professores etc., e esses eram chamados pelos partidos para obterem os votos e
representarem as respectivas categorias profissionais.
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Depois de examinado o conjunto de categorias profissionais organizadas no
Estado, não na União, tem-se um outro tipo de candidato, chamado por mim de
“candidato de aparelho”. São aqueles que têm acesso ao eleitor, têm uma
comunicação com o eleitor pela mídia eletrônica, mas não eram todos os candidatos
os escolhidos. Na época tínhamos o futebol, a Copa do Mundo... Quando o Brasil
estava em alta no futebol, quem foram os candidatos mais escolhidos?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Ministro Jobim, queria
pedir licença a V.Exa. para saudar a chegada do Senador Roberto Requião a esta
Comissão e convidá-lo para fazer parte da nossa Mesa.
Informo, ainda, que o Senador Roberto Requião é Presidente da
Subcomissão de Reforma Política do Senado Federal.
O SR. NELSON JOBIM – Continuando, teríamos um segundo conjunto de
candidatos, que seriam os candidatos da mídia eletrônica. Houve uma época em
que os cronistas esportivos no Rio Grande do Sul eram candidatos; alguns deram
certo e abandonaram a crônica esportiva, outros, não, e voltaram à crônica
esportiva. Lembro do exemplo de Ibsen Pinheiro, que veio da crônica esportiva.
Outro candidato de mídia foi o Deputado Antonio Britto, que veio em outra
circunstância. Tivemos o Deputado Adroaldo Streck, que veio do rádio, o Deputado
Mendes Ribeiro, enfim. Mendes Ribeiro e outros não vieram da crônica esportiva;
vieram de um outro tipo de aparelho, que também é considerado mídia eletrônica,
mas posterior – ou seja, são os candidatos que vieram de programas
assistencialistas e os candidatos de programas de segurança pública, tendo em
vista os problemas que a população enfrentava.
Tivemos, ainda na década de 70, os partidos atrás dos pastores evangélicos
como candidatos. Os pastores evangélicos tinham tribuna, organização e
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capilaridade. Hoje os pastores evangélicos mudaram os critérios, se consolidaram
inclusive com o próprio partido político que estão assumindo. Ou seja, houve uma
mudança de perspectiva do perfil. Estou falando do perfil inicial.
O terceiro tipo de candidato, além dos candidatos de categorias e os
candidatos de aparelho, são os candidatos regionais, que são aqueles eleitos para
resolver problemas da região, como construção de escolas, asfaltamento de rua, de
estrada; enfim, candidatos que têm uma destinação básica: levar verbas públicas
para investimento na sua região eleitoral.
O quarto tipo de candidato é o candidato do partido político propriamente
ditos, que, para se eleger, depende da capacidade desses outros candidatos de
levantarem a legenda.
Ora, isso nos leva, em primeiro lugar, à pergunta: um candidato que é
escolhido pelo partido porque ele é líder de uma categoria profissional, e a categoria
profissional vota nele, é fiel a quem? A sua fidelidade é ao partido que lhe deu
legenda ou à categoria profissional que o elegeu? O candidato de aparelho, o
candidato que se elege através desses aparelhos a que eu referi, é fiel a quem? Fiel
a sua personalidade, que lhe produz votos, ou ao partido? No caso do Rio Grande
do Sul, em 1986, eu tenho ciência própria de um candidato (o qual inclusive
viabilizou a minha eleição, já que à época eu fui o 16.º da legenda do PMDB), que foi
convidado a ser candidato e que recebeu uma carta do presidente do partido
autorizando-o a ter posições próprias, independentes do partido. O Deputado
Mendes Ribeiro Filho sabe bem a que meu refiro. Foi o caso do seu pai, do
Deputado Mendes Ribeiro, que fez 330 mil votos à época, e eu inclusive me elegi
exatamente por essa circunstância.
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Os senhores observem bem que temos que examinar essa questão da
representação partidária levando em conta que o nosso sistema eleitoral, no quadro
em que está montado, faz com que os partidos dependam dos candidatos e não os
candidatos dos partidos. E mais: a disputa eleitoral é uma disputa interna do partido:
quem pode me derrotar é o meu colega de partido, e não o candidato de outro
partido.
Eu não tinha problema nenhum nas eleições de que participei em ter relações
extraordinariamente tranqüilas, em Santa Maria da Boca do Monte, com Tarso
Genro, com Paulo Paim, porque eles não tinham problema comigo. Agora, eu tinha
problemas com Antonio Britto, com Ibsen Pinheiro, com todos os candidatos do meu
partido, porque eles me derrotariam. Lembrem-se do horror que era comparecer
num comício eleitoral em um Município qualquer e o diretório municipal dizer: “Você
não sobe no palanque, você não fala”, e arrancavam a propaganda eleitoral que
eventualmente você tivesse colocado em algum local da cidade. Não era assim?!
Porque a disputa é interna. É ele quem vai me derrotar e não o outro.
Ora, isso mostra que nós temos um sistema eleitoral que tem que ser posto
sobre a mesa para se saber se ele não induz a organizações e massas partidárias
corretas.
Observem bem: os partidos acabam estabelecendo situações curiosíssimas e
técnicas distintas. Há um partido que os senhores conhecem que resolve o problema
das divergências internas pela criação de tendências partidárias. Se estabeleceu um
guarda-chuva onde convivem as tendências, que têm voz interna. Há outros que não
têm esse mecanismo, e as pessoas circulam de um partido para outro, levando
consigo seus votos. O candidato que representa uma categoria profissional que se
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desloca de um partido para outro leva os seus votos, já que o eleitor não vota no
candidato.
Os senhores precisam examinar esse problema para saber se querem ter
indivíduos que representem a Nação ou se querem ter partidos organizados. Isso
passa pelo seguinte problema – e encaixo esse tema na questão da fidelidade
partidária: como é que os senhores vão enfrentar o problema da fidelidade partidária
em relação a essa questão? Como é que se faz isso? Como vão tentar resolver esse
problema da fidelidade? Vão estabelecer externamente uma fidelidade partidária,
tendo em vista um sistema que induz uma fidelidade ao eleitor e não ao partido?
Como é que faz? Ou seja, se não resolverem esse problema, os senhores vão,
digamos, agravar um sistema que tem distorções.
A questão é saber: interessam os indivíduos? E por que é assim? Porque,
evidentemente, nós temos um problema. Nas eleições majoritárias, que são eleições
plebiscitárias, os candidatos é que produzem votos; as eleições proporcionais são
vistas como trânsito para as eleições majoritárias. Portanto, esse problema os
senhores terão que examinar.
Eu quero dizer claramente que, em relação à fidelidade partidária, que é um
tema que tocaria rapidamente, nós temos as questões que os senhores estão
enfrentando, como o problema da filiação partidária.
Se os senhores quiserem, no caso da representação proporcional... Quero
dizer que sou proporcionalista radical, e disso não abro mão. Poderia pensar,
eventualmente, em sistemas distritais mistos, mas sempre com o cálculo de
proporcionalidade na conquista dos votos, que é o sistema correto. O sistema
majoritário é um sistema excludente: exclui os derrotados. Ou seja, quem perde,
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perde tudo, e quem ganha, leva tudo. No caso, temos que estabelecer o sistema
proporcional.
Agora, o sistema para fortalecer partidos é o sistema de lista. Qual é o preço?
O preço é que se desloca a disputa eleitoral para dentro do partido; ou seja, a
disputa é na ordem de colocação da lista do partido. Se a votação for por lista
fechada, a disputa vai ser interna, e aí vai surgir um conflito que também decorre do
processo da individualidade, que é o conflito entre a nomenclatura do partido e os
políticos do partido, que às vezes não controlam a nomenclatura do partido. A
nomenclatura é controlada por um conjunto de personagens que não representa o
conjunto dos candidatos ou dos Parlamentares.
Essa é uma opção que os senhores terão que fazer. Agora, mantido o voto
uninominal, os senhores vão ficar sempre dependendo dos partidos dos candidatos
e não os candidatos dos partidos. Para fortalecer, teriam que ser encontrados
mecanismos alternativos dessa natureza.
Querem ver uma coisa? É claro, nítido e posto em jogo o conflito entre a
máquina partidária, a nomenclatura partidária e os candidatos decorrentes do voto
nominal. É a velha a discussão no Brasil sobre a candidatura nata. Os senhores
acham que a candidatura nata é filha do quê? Ela é decorrente do voto uninominal,
da individualidade dos personagens eleitos, e da máquina partidária que pretende
submeter o indivíduo ao princípio partidário. Como o cidadão não depende do
partido mas dos seus eleitores, ele estabelece a sua individualidade e conflita com a
máquina partidária. Aí, o que surge? As várias soluções, que começaram em mil e
novecentos e tanto, em relação às candidaturas natas. A experiência da candidatura
nata no Brasil começou em 1974, quando os Parlamentares eleitos são candidatos
natos do partido.
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Eu quero advertir os senhores em relação rapidamente a esse assunto: a lei
anterior – e aqui vem o ponto fundamental na análise desse tema -, de 1993, a Lei
n.º 8.713, previa a candidatura nata, mas com a seguinte redação:
(...) aos que na data da publicação desta lei forem
detetores de mandato Deputado Federal, Estadual ou
Distrital...
Não estão incluídos os Senadores. Os majoritários não estão incluídos na
candidatura nata.
...é assegurado o registro para o mesmo cargo pelo
partido a que sejam filiados na data da convenção
independentemente de escolha nesta, salvo deliberação
em contrário do órgão de ligação nacional do partido.”
Esta era a redação da Lei nº 8.713, de 1993. A lei atual excluiu a última parte.
A Lei 9.504 diz o seguinte:
“Art. 8.º
.............................
§ 1.º (...) é assegurado o registro de candidatura
para o mesmo cargo pelo partido a que estejam filiados.
Na lei anterior havia o veto do partido, ou seja, se invertia o ônus. O Deputado
ia à convenção para ser vetado, para ser derrubado. O partido derrubava. Não tinha
candidatura nata, dependendo da confirmação. No caso, ele tem candidatura nata
direta.
Quero dizer aos senhores que a manutenção da regra da candidatura nata
sem a possibilidade de passar pelo crivo de partidos apresenta problemas, por uma
razão simples. Em 1994, o Partido Liberal entrou com a Ação Direta de
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Inconstitucionalidade nº 1.068 contra a lei da época, a Lei nº 8.713, de 1993, e o
Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, entendeu que a lei não era
inconstitucional, porque assegurava ao partido a possibilidade de negar a
candidatura ao candidato nato. A lei de 1988 suprimiu esse texto. O Supremo
Tribunal Federal não teve oportunidade de examinar esse problema em relação à
nova lei. Impetraram recurso extraordinário num conflito ocorrido na Paraíba, e, ao
final, antes do julgamento, houve um acordo e desistiram do recurso em que seria
examinado o problema.
Do meu ponto de vista pessoal, há graves defeitos em relação a esse texto,
porque a Constituição Federal assegura autonomia aos partidos políticos e a lei lhes
retira essa autonomia na escolha dos candidatos. No sistema anterior havia uma
preferência do Parlamentar, mas o partido podia negar. Pelo sistema atual o partido
não pode negar, é imposta ao partido uma candidatura. Isso mostra um conflito entre
o indivíduo que tem voto próprio, que independe do partido, com a máquina
partidária. A candidatura nata é um produto espúrio dessa situação. Os senhores
teriam de examinar isso, porque haverá problemas. No momento em que surgirem,
tenho sérias dúvidas sobre a constitucionalidade desse texto.
Coligações partidárias. O Projeto de Lei nº 1.562, do Senado, proíbe as
coligações partidárias proporcionais e mantém as coligações partidárias majoritárias.
Em 1987/88, quando se discutiu o problema na Constituinte, as coligações
partidárias eram absolutamente necessárias porque representavam a saída de um
processo de bipartidarismo imperial determinado pelos militares – ARENA e MDB,
que abrigavam várias tendências. Esgotado o processo militar, começaram a se
formar legendas partidárias, cuja afirmação dependia das coligações. Logo, as
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coligações eram rigorosamente bem-vindas. Depois, os partidos começaram a se
consolidar, e, hoje as coligações partidárias são colocadas em dúvida.
Quero dizer, com toda tranqüilidade, que em matéria eleitoral não temos
princípios absolutos, mas conveniências históricas. Agora se discute a extinção das
coligações proporcionais. Por quê? Por uma razão simples: alguns partidos menores
coligam-se com partidos maiores, lançam um só candidato, concentram os votos do
candidato e aproveitam o coeficiente partidário da coligação para eleger seu
candidato, e, depois, a coligação desaparece porque é uma estritamente eleitoral. E
temos de lembrar que as coligações partidárias, nas eleições majoritárias, são
celebradas para fazer eleição, não para fazer governo. A experiência que temos é a
distinção fundamental entre coligações para dar eleição e coligações para dar
administração. Terminada a eleição, começa-se a discussão sobre qual é a
coligação que dará administração, que não é necessariamente a que deu eleição.
Isso nas eleições majoritárias. Nas proporcionais, é a manutenção de determinados
partidos que, para obterem o coeficiente eleitoral, mantém situações dessa forma.
V.Exas. têm de resolver se o pluripartidarismo brasileiro se mantém com essa
estruturação, ou não. A forma estabelecida pelo Senado é a extinção pura das
coligações. A extinção pura das coligações sacrificará uma série de legendas
partidárias hoje existentes, não tenho dúvida disso. Se os senhores querem
estabelecer um mecanismo de transição para assegurar maior tempo para que
essas pequenas organizações partidárias tenham consistência — estou me referindo
às organizações partidárias com perfil histórico, não às que surgiram pelas
circunstâncias —, poderiam estabelecer técnicas, que certa feita discuti com o
Deputado Haroldo Lima, de frentes ou federação de partidos. Outra fórmula seria a
que o Senador Roberto Freire discutiu há muito tempo: a possibilidade da
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participação dos partidos que não atingiram o coeficiente eleitoral nas sobras. Outra
forma de abrir um espaço. Hoje V.Exas. sabem que, preenchidas as vagas, as
sobras são ocupadas pelos partidos que atingiram coeficiente eleitoral. Podem
pensar, fazer uma série de especulações, examinar a possibilidade de partir por
essa linha.
Outra situação para a qual chamo a atenção de V.Exas. é tormentosa e diz
respeito ao financiamento de campanhas. O Projeto de Lei nº 353, do Senado,
estabelece uma dotação orçamentária de R$7 por eleitor. Desses valores,
considerando o eleitorado de 2000, que é 110 milhões, em números redondos,
resultariam uma dotação orçamentária para financiamento dos partidos políticos de
R$769 milhões. No ano 2002, para um eleitorado de 114 milhões, teríamos uma
dotação orçamentária da ordem de R$804 milhões. A divisão estabelecida no projeto
do Senado é de 1% para todos os partidos, independentemente de qualquer tipo de
situação. E então se cria um problema: se V.Exas. aprovarem esse sistema de
participação de 1%, temos absoluta certeza de que serão criados partidos para
recebimento de dotação orçamentária, e nada mais. Hoje, criam-se partidos por
causa do fundo partidário e para negociar o tempo de eleição. Isso precisa ser
colocado na mesa, com clareza, para se discutir o problema. Pode haver estímulo à
criação de legendas partidárias somente para se usufruir dos resultados
orçamentários, ou V.Exas. acham que não?!
Noventa e nove por cento para os partidos com representação na proporção
das bancadas. V.Exa. têm de prestar atenção na proporção das bancadas existentes
no Congresso e criarem uma fórmula de cálculo. A questão é saber o seguinte: com
isso, está se aceitando o quê? Excluir o financiamento que não o público das
campanhas eleitorais? Se é verdade essa situação, quais os mecanismos de
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impedimento do financiamento individual de campanhas? E vamos discutir outra
coisa. Participei de eleição, assim como V.Exas., e sabemos que o financiamento
oficial de campanha de partido político, no mais das vezes, centraliza-se na eleição
majoritária. Os Deputados é que têm de encontrar financiamentos para suas
próprias campanhas. Não é verdade?! É evidente. Precisamos ser transparentes.
Nunca vi, com a minha experiência, partido financiar eleição de Deputado ou de
Vereador; vi partido financiar eleição de Senador, Presidente, Governador e Prefeito.
E o que acontece? Os Deputados ficam atirados a sair em busca de financiamentos,
através dos mecanismos que conhecemos. A questão é saber se isso impede ou
fortalece a nomenclatura do partido.
Imaginem que a distribuição se dará pela representação partidária. A
pergunta é: representação partidária à época da campanha, quando da eleição, da
abertura da sessão legislativa, da legislatura ou da diplomação dos candidatos? Se
quando da diplomação dos candidatos, V.Exas. estarão impedindo que o
Parlamentar, com o deslocamento de um partido para outro, leve consigo a cota que
representaria na divisão do orçamento. Contudo, admitamos a seguinte hipótese. Ao
término de uma legislatura, um partido tem apenas um Deputado, devido a uma
série de problemas internos, apesar de ter elegido cem Deputados. Ele vai ter
financiamento de campanha eleitoral com base nos cem candidatos ou em um
candidato que não tem mais representação no Congresso?
Lembrem-se de que, no sistema de fidelidade partidária que V.Exas. estão
pretendendo lançar, em que se discute a questão da fidelidade, temos várias
fórmulas que nos levam a uma situação curiosa. O cálculo considerava a bancada
do partido até determinado momento antes da eleição; depois, antecipou-se isso
para a instalação da legislatura, inclusive para a formação das Comissões. O que
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aconteceu? Os deslocamentos partidários se deram entre a diplomação e a posse.
Reduzido o tempo, hoje os deslocamentos partidários mais sensíveis, digamos, se
dão entre a diplomação do eleito e a posse, pois esse tempo não está abrangido no
problema relativo ao cômputo, porque o candidato se desloca do partido para outra
situação.
Para encerrar, quero chamar a atenção de V.Exas. para algumas questões
claramente pontuais, as quais V.Exas. devem examinar.
Foi muito ovacionada a lei de iniciativa popular que criou o art. 41-A, que
introduziu a figura da captação do sufrágio para efeito da não-diplomação ou para a
cassação de registro ou diploma de candidato. Para que V.Exas. se lembrem, passo
a ler o texto da lei:
Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus
incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta
lei, o candidato que doar, oferecer, prometer ou entregar
ao eleitor, com fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem
pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou
função pública, desde o registro da candidatura até o fim
da eleição.
Como está, esse texto viabiliza o abuso do poder econômico e faz
desaparecer do Tribunal Eleitoral um problema em relação ao abuso do poder
econômico e político, porque a legislação sobre tal abuso sempre fazia depender de
que este tivesse influenciado o resultado da eleição. O que acontecia?
Recentemente, após as eleições gerais, fiz uma análise sobre o resultado de uma
eleição em que teria havido abuso real, mostrando que não havia possibilidade de
aquele abuso ter repercutido no resultado da eleição. Com isso, abria-se o espaço
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para a legitimação do abuso, desde que não houvesse influência na eleição. A
previsão da captação de sufrágio derruba essa possibilidade, porque a lei diz o
seguinte: “(...) doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor, com o fim de obter-lhe
o voto (...)”. Trata-se de obter o voto do eleitor, ainda que esse voto não tenha sido
relevante para a eleição do candidato; considera-se a obtenção do voto.
Contudo, há um erro técnico exatamente decorrente do desconhecimento dos
elaboradores da lei. Quando é vedada a captação do voto? Desde o registro da
candidatura até o dia da eleição; ou seja, toda captação de votos que se tenha
realizado desde o momento da escolha da candidatura na convenção até o registro
não é captação de sufrágio. E o que uma mente de má-fé faria? Levaria o registro do
candidato, alguém impugnaria esse registro, que só se legitimaria depois da eleição.
Logo, ele poderia captar sufrágio durante toda a eleição.
O Tribunal Eleitoral já examinou esse problema, já discutimos o assunto.
Neste caso, deu-se a seguinte interpretação no Tribunal Eleitoral: quando se diz
“desde o registro da candidatura”, não se quer dizer “desde o deferimento do
registro”, mas “desde o pedido do registro”. O pedido do registro, pela lei, deve ser
feito no dia 5 de julho, antes da eleição, e a data de escolha na convenção, entre 10
e 30 de junho. Entretanto, ainda teríamos um período entre a escolha do candidato e
o pedido de registro mínimo de 35 dias em que o candidato poderia captar sufrágio.
V.Exas. têm que examinar se querem ou não que a captação do sufrágio seja
algo eficaz. Para tanto, V.Exas. teriam que mudar essa data, fixando-a a partir da
escolha na convenção, que me parece a data mais consistente, ou, no mínimo, a
partir da formulação do pedido de registro. Deixar constar “desde o registro da
candidatura” significa transferir para a Justiça Eleitoral a possibilidade de ter que dar
uma interpretação, como fizemos, forçada: desde o pedido do registro.
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Caso contrário, o que se poderia fazer? Por exemplo, eu lançaria o pedido de
registro, o Deputado Virgílio Guimarães impugnaria a minha candidatura e eu
prolongaria a decisão, porque poderia candidatar-me não obstante estar sendo
discutido o meu registro. Durante toda a eleição eu captaria sufrágio à vontade, e o
registro só seria definido depois da eleição. Isso é uma maluquice!
(Intervenção inaudível.)
O SR. NELSON JOBIM – Também se pode estabelecer dessa forma,
determinando que o substituído contamina o substituto. Mas aí surge um problema:
caso se casse o registro antes da eleição, há a possibilidade de se indicar outro
candidato. Ter-se-ia que examinar caso a caso.
Há outra situação que eu gostaria de que os senhores examinassem, que diz
respeito à dupla filiação. Na Justiça Eleitoral está havendo uma confusão imensa
quanto a divergências em relação à dupla filiação.
O art. 22 da Lei dos Partidos Políticos estabelece que quem se filiar a outro
partido deve fazer a comunicação ao partido e ao juiz da sua respectiva zona
eleitoral para cancelar sua anterior filiação. Se não o fizer no dia imediato ao da
nova filiação, fica configurada a dupla filiação, sendo ambas consideradas nulas.
Vamos deixar bem claro a seguinte hipótese: a eleição se realiza, perde-se a
eleição. O que faz o partido político que perde a eleição? Prorroga a disputa eleitoral
na Justiça Eleitoral. Ele chama os seus advogados e pergunta: “Onde podemos
impugnar a candidatura desse cidadão?” O Deputado José Antonio Almeida sabe
disso, pois vive na Justiça Eleitoral. O âmbito da Justiça Eleitoral é um
prolongamento, com tapete, da disputa eleitoral, com ou sem razão. Lá se
encontram ações de qualquer tipo, porque tudo aquilo se prolonga na Justiça
Eleitoral.
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Com relação à dupla filiação, as eleições para Prefeito e Vereador foram
curiosas. O que aconteceu? Havia divergência. Observem que a lei, no art. 19, § 1º,
estabelece que o partido político tem que enviar, na primeira semana dos meses de
maio e dezembro de cada ano, aos juízes eleitorais, para arquivo, publicação e
cumprimento dos prazos de filiação partidária, e para efeito de candidatura a cargos
eletivos, a relação dos nomes. Portanto, o partido político manda a relação dos
filiados para a Justiça Eleitoral. Essa obrigação se dá nos meses de maio e
dezembro. Diz o § 1º do art. 19 o seguinte:
Se a relação não é remetida nos prazos
mencionados neste artigo, permanece inalterada a filiação
de todos os eleitores, constante da relação remetida
anteriormente.
Para a Justiça Eleitoral, quem são os candidatos filiados, se não for remetida
a lista? Os candidatos da lista anterior. O outro artigo considera dupla filiação a
pessoa que não comunicar em vinte e quatro horas. Portanto, o que aconteceu
várias vezes? Alguns partidos de boa-fé e outros de má-fé mandavam a lista — e
desorganizadamente, porque não há como se exigir que um partido num Município
tenha uma organização para tirar da lista alguém que comunicou a desfiliação —
dizendo quem é filiado ao partido. Depois, outro partido também manda uma lista
dizendo que aquele cidadão é filiado àquele outro partido. O resultado é a
impugnação por duplo registro. E essa impugnação só se dá, evidentemente, se ele
for eleito, caso contrário isso não interessa, porque é uma forma de se ganhar a
eleição pelo “tapete”.
Alguns tribunais passaram a entender ser relevante a lista do partido, e não a
comunicação no dia subseqüente. Por quê? Porque às vezes o sujeito se filiou em
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1980 ao MDB, depois, resolveu filiar-se ao PSDB ou ao PDT e não se lembra mais
da existência dessa filiação antiga no antigo MDB, porque o PMDB herdou os
registros de filiação do PMDB, e surge imensa confusão. É fundamental que V. Exa.
a resolvam. O parágrafo único do art. 22 quer acabar com a saída de partido. Ou
seja, se o filiado sai, tem de comunicar com 24 horas de antecedência. Busca-se
criar dificuldade para evitar a troca de partido. Mas ficou um buraco no art. 19, que
abriu a possibilidade desse registro. E o que vai acontecer ? A Justiça Eleitoral de
cada Estado decidindo de forma diferente, cada Tribunal Eleitoral, dependendo da
composição, decidindo de um jeito e os Ministros, de outro, porque os dois
argumentos são legítimos.
Então, quero deixar bem claro a V.Exas. o seguinte: as questões eleitorais
não podem ser submetidas à decisão interpretativa final de juiz. Porque a decisão do
juiz é depois do jogo jogado, depois da urna apurada, depois da eleição definida e
da festa cantada. E, aí, como pode a Justiça Eleitoral cassar o registro de
candidatura de um Prefeito que se elegeu com 75% dos votos? E, às vezes, o que
acontece? Recebemos o recurso, verificamos que o candidato recebeu 75% ou
80% dos votos, mas há uma coisa formal na lei que impede o registro. E temos de
retirá-lo, julgá-lo e fazer nova eleição. Nessa nova eleição, o candidato vai
candidatar-se de novo e aí o eleitorado vai lhe dar 95% dos votos. Custa dinheiro
para o partido, custa dinheiro para todos, e o resultado é o mesmo.
Portanto, precisamos que essas regras sejam absolutamente claras, para que
isso não fique na idiossincrasia interpretativa dos Tribunais. Se tivermos de
interpretar, interpretaremos, não há problema. Repito, interpretaremos. Agora, como
se faz isso? Temos casos complicados, decisões recentes complicadas, que têm
gerado problemas. V.Exas. se referiram a problemas ocorridos nos Estados de
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Goiás, Espírito Santo, Rio de Janeiro com candidatos que fizeram 75% dos votos e
acabaram tendo os diplomas cassados, por circunstâncias de disputas
interpretativas inclusive.
Portanto, as coisas precisam ficar claras. Ou seja, a responsabilidade da
Justiça Eleitoral é muito pela conseqüência. E não se pode confundir essa decisão
com decisão política e transferi-la para um Tribunal não-político, Judiciário e
magistrado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, perdoem-me essa exposição confusa,
problemática, em que misturei experiências legislativa, eleitoral, advocatícia, do
Poder Executivo, de juiz para exatamente tentar debater essas questões eleitorais.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. DEPUTADO NEIVA MOREIRA – Sr. Presidente, peço a palavra pela
ordem.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Tem V.Exa. a palavra.
O SR. DEPUTADO NEIVA MOREIRA – Sr. Presidente, a dissertação do Sr.
Ministro Nelson Jobim encerra valiosa contribuição sobre o rol dos problemas que
devemos nos defrontar daqui para o futuro, se quisermos uma lei eleitoral
democrática e transparente.
Sr. Presidente, seria muito interessante que V.Exa. distribuísse aos membros
desta Comissão essa parte de enumeração de problemas, de dúvidas, de
questionamentos. Abreviaria muito nosso trabalho, quando tivermos de analisar o
conjunto desse emaranhado de legislação eleitoral para fazermos um código que
possa realmente atender às necessidades e também às conveniências políticas do
País.
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O SR. NELSON AZEVEDO JOBIM – Nobre Deputado Neiva Moreira, tomei a
providência de fazer isso por tópicos. Farei chegar esses tópicos aos gabinetes dos
membros da Comissão e do Relator. Quero deixar bem claro que são tópicos em
que se estabelecem os problemas, a legislação e as situações que daí emergem.
O SR. DEPUTADO NEIVA MOREIRA – Sr. Presidente, muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Quero dizer ao nobre
Deputado Neiva Moreira que a nossa Comissão tem se empenhado nesse sentido e,
sem dúvida nenhuma, esta Presidência fará chegar ao gabinete de S.Exa. os
assuntos que aqui forem tratados.
Quero dizer ao Ministro Nelson Azevedo Jobim que, utilizando-se de toda sua
experiência, S.Exa. fez brilhante exposição.
Passo a palavra ao nobre Relator, Deputado José Antonio Almeida.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ANTONIO ALMEIDA – Sr. Presidente, neste
primeiro momento, quero apenas cumprimentar o Sr. Ministro Nelson Azevedo Jobim
pela importante contribuição que trouxe à Comissão. Já sabíamos que ia ser assim,
pela extraordinária experiência de S. Exa., Parlamentar que foi nesta Casa sempre
dedicado, com interesse e foco nas questões eleitorais e partidárias. V.Exa., Sr.
Ministro, também viveu experiência no Poder Executivo, no Ministério da Justiça,
para onde também resvalam essas questões, com as demandas vindas da base. E
vive hoje experiências no Supremo Tribunal Federal e no Tribunal Superior Eleitoral.
De modo que, sem dúvida nenhuma, reúne as melhores condições para dar valiosa
contribuição e fazer um trabalho colaborativo com esta Comissão.
Sr. Presidente, vou fazer minhas considerações no final. Sei que os nobres
Deputados estão ansiosos por terem a oportunidade de trocar algumas idéias com o
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Sr. Ministro. Portanto, limitar-me-ei a comentar o que os membros desta Comissão
não abordarem durante suas intervenções.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Obrigado, Sr. Relator.
Sr. Deputados, vamos passar à lista de inscrição. (Pausa.)
Quero comunicar a esta Comissão que se o Senador Roberto Requião
entender usar da palavra será para nós grande contribuição.
Indago ao Sr. Senador Roberto Requião se gostaria de usar a palavra neste
momento?
O SR. SENADOR ROBERTO REQUIÃO – Sr. Presidente, estou
simplesmente aqui como espectador de todo esse processo.
Temos muita coisa para mudar na legislação eleitoral. Hoje, a impressão que
tenho é a de que, a partir do momento em que alguém se registra como candidato,
passa a ser tratado como um contraventor. fundamentalmente em função de a
legislação ser muito pouca definidora dos tipos delituosos. Uma legislação indefinida
deixa ao sabor do Juiz a possibilidade de flexibilizar para um lado ou para o outro o
julgamento. Esses problemas se magnificam, principalmente quando há atrito entre
um partido político ou um candidato ao Governo e a Justiça Eleitoral. É o caso do
Estado do Paraná. Por exemplo: este ano o PMDB do nosso Estado teve suspensas
suas inserções no rádio e na televisão, no primeiro e no segundo semestre, por
motivo absolutamente injustificado.
Outros problemas comuns são as infrações eleitorais de propaganda
indevida. Quando alguém dá uma entrevista numa rádio, o radialista pergunta se é
candidato; se a pessoa disser que não é, está saindo do jogo; se disser que é, surge
a famosa multa de 20 mil UFIRs, uma multa inflexível. Por menos ouvintes que a
rádio tenha ou mais insignificante que ela seja. É um absurdo total. No caso do
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Estado do Paraná, com determinada composição do Tribunal Regional Eleitoral,
todas essas multas caíram.
No meu caso pessoal, tive, em conseqüência de entrevistas que dei a rádios,
136 denúncias. Umas 120 foram arquivadas liminarmente, em função de
determinada composição do Tribunal Regional Eleitoral. E as denúncias eram muitos
engenhosas: não se tratava mais de dizer que eu era candidato, mas considerar a
crítica ao Governo do Estado como o início de campanha eleitoral. Como a
propaganda se divide em duas partes, a tese era a seguinte: primeiro, desqualifica-
se o adversário; depois, faz-se a divulgação das próprias propostas. Quando o
Tribunal mudou a composição e passou a aceitar essa tese da propaganda negativa,
as denúncias deixaram de subir para o Tribunal Superior Eleitoral, porque o TSE só
examina divergências jurisprudencial e infração constitucional. O Sr. Ministro Costa
Leite, em determinado momento, ultrapassou esses limites, dado o absurdo da
medida. Mas o Tribunal acabou consagrando o entendimento de que não se
examinava a matéria de prova provavelmente porque o número de agravos que
subiriam seria fantástico. Pessoalmente, tenho oito condenações, porque critiquei o
Governo do Estado, sem falar em candidatura Elas se esgotaram no Tribunal do
Paraná, que tinha um conflito comigo em razão de uma negativa de conceder
aumento salarial aos juízes. Ora, quem abriu essa possibilidade? Fomos nós, ao
estabelecer um texto legal extraordinariamente pouco definido, não fechando os
tipos delituosos.
Apreciei muito o Ministro Jobim ter deixado claro que se não fecharmos, no
tipo delituoso, exatamente o que queremos dizer, isso vai dar azo a uma série de
interpretações de juízes singulares e de Tribunais, cada uma diferente da outra. E,
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às vezes, como no caso do Paraná, no mesmo Tribunal, bastando que em
determinado momento sua composição seja modificada.
O Senado tem discutido muito esses assuntos. Estamos trabalhando com o
TSE e com a Câmara Federal também. Tenho mantido contatos com o Deputado
João Almeida sobre a questão da votação eletrônica. A propósito, apresentei projeto
de lei propondo a comprovação do voto através da sua impressão, idéia hoje
seguida por diversos Estados americanos. O Ministro Jobim não concorda comigo.
Mas o problema é resolvermos a discordância por aquilo que der melhor qualidade e
credibilidade ao processo eleitoral. Pessoalmente sustei a votação desse projeto,
pedindo sua volta à Comissão de Constituição e Justiça, para que pudéssemos
discuti-lo em profundidade. Estou convencido da procedência projeto. A objeção do
Ministro Jobim é a seguinte: S.Exa. diz que, em determinadas circunstâncias, um
cidadão poderia fazer um ataque destrutivo à urna. Ou seja, digita o voto, o voto
aparece impresso no visor e ele diz o voto que eu digitou não é o que está impresso.
Como o voto é secreto, ninguém poderia conferir se ele está de fato fazendo uma
afirmação correta ou se pretende apenas tumultuar o sistema.
Ocorre, no entanto, que o atual processo eleitoral permite essa mesma
prática. Eu posso digitar o voto e dizer ao Presidente da Mesa que o que apareceu
na tela não foi o que eu digitei. E como o Presidente da Mesa não pode conferir,
temos aí idêntico impasse. Mas estamos discutindo o assunto, e acordamos, no
Senado, com a participação do Ministro, que tentaríamos, nessa primeira eleição,
introduzir algumas modificações que talvez não fossem as definitivas — aquilo que
nós no Senado, por unanimidade, estamos desejando, que é a impressão do voto, e
uma série de outras medidas que tornariam a eleição mais clara.
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A crítica básica é que não podemos fazer com que o eleitor se adapte à
máquina; temos de fazer a máquina se adaptar ao eleitor. E o eleitor médio brasileiro
não é especialista em informática. O voto garante a soberania do povo. Mas se o
eleitor não tem confiança de que o voto que digitou foi o voto que a máquina
contabilizou; se ele não pode proceder a uma auditoria posterior desse voto —
auditoria que está prevista na legislação eleitoral, pois a conferência, a segunda
apuração, pode ser solicitada ao juiz, o que a máquina praticamente impede — não
temos um voto confiável para o eleitor, mas apenas um voto confiável para o grupo
de técnicos do Tribunal e dos partidos que jamais terão uma assessoria técnica para
fazer uma auditoria consistente em 350 mil máquinas de votar. Mas penso que
estamos em bom caminho. As Comissões da Câmara dos Deputados e do Senado e
o TSE estão solicitando, em conjunto, uma auditoria à UNICAMP. Queremos fazer
isso juntos para não dispersar esforços.
Por outro lado, providências urgem quanto à legislação eleitoral. Há uma
proposta de minha autoria, aprovada por unanimidade no Senado, que resolve, de
certa forma, o problema da fidelidade partidária à moda do nosso velho Guerreiro
Ramos, na sua famosa obra “Redução Sociológica”. Não se muda um sistema
abruptamente, porque a confusão é muito grande e jamais teremos resultado
satisfatório. O Senado está propondo listas duplas. Uma lista fechada, hierarquizada
pela convenção partidária, e outra, que elegeria 50% dos candidatos, aberta, eleita
também pela convenção partidária. Os votos seriam contabilizados, para fim de
eleição e de totalização de coeficiente eleitoral, na lista fechada. Isso impediria que
candidatos fizessem uma campanha paralelamente à do partido, porque a vaga que
eles pretendem vai depender da consistência do voto na legenda.
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Ao mesmo tempo, rejeitamos, na discussão dessa proposta, o voto distrital,
que consagraria, de uma vez por todas, a meu ver, o sistema cubano, transformando
as Assembléias e o Congresso Nacional em uma espécie de convenção nacional de
presidentes de associações de bairro, despolitizando e tirando a conotação
ideológica do processo. Teríamos só os Deputados de resultados, que se
comprometeriam com a obtenção de alguns benefícios para sua comunidade e
deixariam completamente de lado as questões nacionais. Privatização do setor
energia elétrica, o que se faz com a PETROBRAS, com o Banco do Brasil, a política
do Banco Central, tudo isso passaria a ser negociado com uma verba orçamentária
para uma creche ou para a construção de uma escola técnica. Não seria bom para o
País a despolitização.
O fundamental, no entanto, é resolvermos de uma vez por todas, em uma ou
duas etapas, a questão da votação eletrônica. Ou temos a comprovação ou temos
um sistema que nos dê mais segurança, e deixamos uma fórmula definitiva, não
para esta, mas para a outra eleição. E a discriminação da atividade do parlamentar.
É realmente terrível que, em determinado momento, uma crítica feita ao Governo do
Estado possa ser contabilizada como propaganda eleitoral e implique multa, que se
transforma em uma multa irrevogável, porque o TSE, que fica mais longe das
questões provincianas, não examina a fundo o processo, simplesmente porque não
o caso não configura divergência jurisprudência de Tribunais ou tema de natureza
constitucional.
Esse dispositivo que permite esse tipo de avaliação e tantos outros que
criminalizam a participação do candidato no processo eleitoral devem ser varridos do
processo.
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Essas medidas já foram aprovadas pelo Senado e têm como Relator, na
Câmara dos Deputados, o Deputado Osmar Serraglio, do Paraná — a
descriminação do processo eleitoral e a criação das duas listas de votação. Isso
seria o fundamental para o curto prazo.
A outra panacéia com que se acena, aprovada por unanimidade no Senado
— se pudesse fazer uma recomendação a V.Exas. seria no sentido de revogá-la —,
é essa bobagem monumental do financiamento público de campanha, na forma em
que foi proposto.
O SR. DEPUTADO BONIFÁCIO DE ANDRADA - Senador, como são as duas
listas?
O SR. SENADOR ROBERTO REQUIÃO - Uma lista é hierarquizada pelo
partido, na convenção, fechada. Vota-se no partido e elege pela ordem. E a
segunda, uma lista aberta, da qual os candidatos participam pela ordem da sua
própria votação.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES - O eleitor dá dois votos?
O SR. SENADOR ROBERTO REQUIÃO - Dois votos.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES - Pode ser em lista de partidos
diferente ou do mesmo partido?
O SR. SENADOR ROBERTO REQUIÃO - Do mesmo partido.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Senhores, é um prazer
muito grande para esta Comissão ouvir a experiência do Senador Roberto Requião.
Entretanto, não vamos permitir apartes, porque prolongaria demais a exposição.
Temos uma lista enorme de inscritos para participar desse debate e devemos seguir
a ordem de inscrição.
Volto a palavra Ao Senador Roberto Requião.
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O SR. SENADOR ROBERTO REQUIÃO – Concluindo, o fundamental é
examinarmos, também com cuidado, essa história do financiamento público de
campanha. Se o financiamento público fosse uma espécie de INSS eleitoral,
garantindo para cada candidato uma enfermaria política, ou seja, o mínimo para que
ele disputasse, seria razoável.
Mas, quando elaboramos uma lei que vai de encontro aos costumes, o
resultado é terrível! É como a famosa Lei Seca nos Estados Unidos, proibindo o
consumo da bebida, que criou as máfias, e a Lei Seca na Rússia, que criou as
organizações criminosas que sobreviveram ao fim da própria lei.
Como está posta a questão, um Vereador, em São Paulo teria, vamos dizer
dois mil reais para fazer a sua campanha. É algo absoluta e rigorosamente
insuficiente para uma campanha eleitoral em São Paulo. Esgotado o recurso público
de dois mil reais, se a mulher dele colocar uma faixa na frente de casa dizendo:
"Vote no Chico Fonseca para Vereador de São Paulo", ela estará colocando o
Vereador sob o crivo da legislação e do juiz por crime de propaganda irregular. Isso
é uma coisa absolutamente doida. E, por outro lado, aumentaria a força dos órgãos
de comunicação, porque um jornal nacional promove ou liquida um Deputado, um
candidato a Deputado, a Governador ou a Presidente, sem que isso se configure
propaganda eleitoral.
Então, ao tempo em que estaríamos tirando a possibilidade da iniciativa
pessoal na arrecadação de recursos à engenhosidade na campanha, nós
estaríamos magnificando a influência da mídia organizada, do monopólio da
comunicação. Mas isso passou no Senado como essas legislações de pânico, muito
mais, me perdoem os Senadores, pelo desejo de fazer uma demagogia para a
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opinião pública, do que de raciocinar com profundidade sobre as conseqüências de
um financiamento insuficiente e absurdo.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Agradecemos a
participação de V.Exa., como sempre produtiva, em nossa reunião.
Tendo em vista o adiantado da hora e a enorme lista de inscrição, peço que
as interpelações sejam feitas em bloco, para que possamos agilizar o nosso trabalho
e ganhar tempo. Estão inscritos para falar no primeiro bloco os Deputados José
Antonio Almeida, Mauro Benevides e Geraldo Magela.
Portanto, passo a palavra ao Deputado José Antonio Almeida.
O SR. DEPUTADO JOSÉ ANTONIO ALMEIDA – Sr. Presidente, Sr. Relator,
Sr. Senador Roberto Requião, eminente Ministro Nelson Jobim. V.Exa., como já foi
dito nesta Casa, sempre transmite luz quando traz informações para as Comissões
da Casa, e não poderia ser diferente neste momento. V.Exa. aliou a experiência
parlamentar, a experiência de advogado, de Ministro da Justiça e de Juiz que está
vivendo agora e trouxe informações concretas e preciosas para o nosso debate.
Vou abordar de maneira objetiva — até como advogado costumo cumprir os
prazos e vou cumprir este de três minutos —, em primeiro lugar, a questão da urna
eletrônica e, depois, a questão da reforma eleitoral propriamente dita.
Quanto à urna eletrônica, existe uma solução que já constou do texto legal, da
Lei nº 9.100, que regulou a eleição municipal de 1996, quando se utilizou pela
primeira vez a urna eletrônica nos Municípios com mais de 100 mil eleitores. Essa
regra está no art. 18 da Lei nº 9.100, § 7º, que diz: "A máquina de votar" — o termo
não era urna eletrônica, era máquina de votar — "imprimirá cada voto, assegurado o
sigilo e a possibilidade de conferência posterior para efeito de recontagem." Ou seja,
não é preciso haver, por parte do eleitor, a verificação se aquilo que ele está
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colocando lá corresponde ao que está impresso, até porque ele não toma
conhecimento; mas a recontagem é possível naqueles casos em que houver — e a
lei atual estabelece quais são os casos, e a lei anterior já estabelecia — a chamada
recontagem obrigatória – art. 88 da lei. É aquela questão dos totais destoantes, e
coisa semelhante, que faz com que haja a possibilidade de recontagem.
Essa recontagem hoje só é possível com o sistema tradicional, onde a
votação for tradicional. No momento em que se universaliza a urna eletrônica, não
há mais essa possibilidade. Então, se votarmos isto na norma, haveria a
possibilidade de se ter efetivamente a impressão.
O que acontecia em 1996? Acontecia o seguinte: a pessoa digitava o voto e
havia uma urna de plástico acoplada à urna eletrônica onde se recebia a impressão
dos votos. Os votos ficavam lá registados, e aí era possível, perfeitamente, naqueles
casos em que a lei permitia a recontagem, se fazer a recontagem. Acho que isso
resolveria essa questão da segurança, sem prejuízo das demais colocações. Acho
muito adequada a perícia que o Ministro está sugerindo juntamente com o Senado.
Com relação à reforma eleitoral, saúdo a posição do Ministro. Para mim,
todos os sistemas que estão sendo propostos, inclusive o do Senador Roberto
Requião, o de listas fechada e aberta, não são uma solução melhor do que o
sistema proporcional. O sistema proporcional permite a participação das minorias, na
sua própria gênese. Ele surgiu para permitir que a maioria representasse a maioria,
mas não representasse o todo.
Portanto, a maioria representa a maioria, não o todo. Existem votos que são
da minoria e que devem ter representação proporcional à própria minoria.
Então, acho que esse sistema proporcional ainda é melhor, com todas as
distorções que existem. Como o Ministro abordou muito bem, temos um sistema que
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privilegia indivíduos e não partidos. Mas, com todas essas distorções, parece-me
que ele é preferível.
Eu apenas adotaria um aperfeiçoamento do sistema proporcional, no sentido
— e o Ministro até falou nisso — de não se excluir das sobras aqueles que não
atingirem o quociente eleitoral. Isso é uma distorção do próprio sistema proporcional.
Porque, na realidade, pelo objetivo de dar participação às minorias, haveria, com a
participação daqueles que não atingiram o quociente eleitoral, a possibilidade de
participarem no momento de definição das sobras. Isso seria um aperfeiçoamento
do sistema proporcional.
O financiamento público tem vantagens e desvantagens, como tudo que se
fizer aqui, mas não se pode desconhecer que a situação do financiamento como
está hoje é também de discussão. O artigo no jornal Folha de S.Paulo de hoje, do
sociólogo Emir Sader, com o titulo “Corrupção Nova e Velha”, fala da corrupção
nova a partir do financiamento eleitoral de interesses que estariam de acordo com a
lei, mas privilegiando no governo interesses privados.
Quanto às coligações proporcionais e majoritárias, não me parece que
tenhamos que acabar com uma e manter outras. Ou se acaba com as duas, ou se
mantém as duas. Porque assim como há coalizão para governar — embora o
Ministro diga que não, existe coalizão para governar, existem governos que dividem
suas funções em razão daqueles que participaram da eleição e também atende aos
que não participaram —, existe também a figura dos blocos parlamentares, que
temos na Casa, que permite perfeitamente a situação relacionada com a
possibilidade de manutenção de partidos que tenham posições comuns, com relação
a uma situação anterior.
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Então, o que quero dizer é que se poderia chegar a uma alternativa — até
apresentei projeto de lei nesse sentido —, alternativa que está na Lei nº 9.100, art.
6º, que só admitia as coligações se estas fossem ao mesmo tempo celebradas para
eleições majoritárias e proporcionais; ou seja, haveria a possibilidade de, com isso,
reduzir uma coligação proporcional, a chamada coligação sem cabeça, que a lei hoje
permite e que é realmente uma distorção.
Eram estas as considerações que queria fazer.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Concedo a palavra ao Sr.
Deputado Mauro Benevides.
O SR. DEPUTADO MAURO BENEVIDES – Sr. Ministro Nelson Jobim,
praticamente irei enfocar aqueles itens que, constando da exposição de V.Exa.,
foram abordados sob outra ótica pelo Deputado José Antonio Almeida. Aliás, S.Exa.,
representante do Maranhão, ainda nesse impacto dos chamados apagões, disse
que V.Exa. chegava, e o fez com muita justeza, e trazia luz a este debate
extremamente importante para o Congresso Nacional.
No que diz respeito às urnas eletrônicas, as alterações sugeridas em relação
à escolha de dois Senadores, pergunto: as modificações dessa sistemática vão
depender de diploma legal ou podem ser feitas pelo TSE, utilizando o poder
normativo atribuído àquela Corte? Se for através de lei, estamos diante de um prazo
inexorável para aprovação dessa matéria, o espaço de um ano. Essas alterações
emanariam do poder normativo do TSE, ou teria que ser através do diploma legal?
O tema coligações partidárias, também abordado pelo Deputado José Antonio
Almeida na última reunião nesta Comissão, foi exatamente aquele que despertou um
debate mais acirrado, com a brilhante participação do Líder do PCdoB, Deputado
Haroldo Lima.
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Naquela ocasião, mesmo superficialmente, indagamos a S.Exa. e aos
Parlamentares presentes se a alternativa da Federação dos Partidos, emanação do
Direito uruguaio, não garantiria a preservação dos pequenos partidos.
No que diz respeito ao financiamento público de campanha, o Tribunal
Superior Eleitoral, no caso de prevalecer esse diploma legal, já estaria se
preparando para instrumentalizar as Corregedorias Regionais nos TREs para uma
fiscalização na aplicação desses recursos, a fim de que os candidatos não
demandassem novamente aquelas fontes tradicionais que tinham sua base na
iniciativa privada?
São essas as três indagações.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Com a palavra o
Deputado Geraldo Magela.
O SR. DEPUTADO GERALDO MAGELA – Sr. Ministro Nelson Jobim, quero
reiterar a saudação à presença de V.Exa. bem como reconhecer as contribuições
que tem trazido a esta Comissão.
Gostaria de fazer uma observação muito rápida e uma pergunta apenas, já
que quanto a muitas as questões V.Exa. já respondeu.
Fui um dos maiores entusiastas da urna eletrônica. Como Presidente da
Câmara Legislativa do Distrito Federal, quando se começou a debater este assunto,
de fato, apoiei todas as iniciativas que o TSE fazia naquele momento para a
instalação das urnas eletrônicas. Confesso a V.Exa. que hoje sou um dos que tem
mais dúvida sobre a segurança da urna eletrônica. Parece-me, pelas eleições em
que essa urna foi usada, que é possível perceber que diminuiu sensivelmente a
possibilidade da fraude; mas temos ainda muitas dúvidas sobre a segurança. Há um
estudo sendo feito por uma associação dos funcionários das Assembléias
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Legislativas, e o pessoal da área de informática tem muitas críticas quanto à
segurança da urna eletrônica. Como o Ministro está pedindo auditoria à UNICAMP,
sugiro a V.Exa. que também ouça outros técnicos, especialmente da referida
associação, que considero da maior importância, pois podem nos ajudar e ao TSE
nessa reflexão.
Ministro Nelson Jobim, V.Exa., enquanto Parlamentar, foi Relator da reforma
constitucional, na qual se debateu a instituição do voto facultativo no Brasil. Sou
defensor do voto facultativo. Apresentei uma emenda constitucional e estou
convencido de que, por emenda constitucional, não teremos o instituto do voto
facultativo, pelo menos nos próximos anos. Estou propondo a realização de um
plebiscito para a decisão soberana da população sobre este tema. Gostaria de ouvir
a opinião de V.Exa. sobre o assunto.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Concedo a palavra ao Sr.
Ministro Nelson Jobim.
O SR. NELSON JOBIM – Sr. Presidente, agradeço as considerações dos Srs.
Deputados.
Passarei ao exame do problema.
Deputado José Antonio Almeida, a questão da fórmula de 1996 não resolve o
problema do Senador Requião, porque era para conferir só o resultado. O Senador
Requião desconfia que poderia digitar 135 e ser contabilizado 140 ou não sei o quê.
Então, não resolve, porque era só para conferir o resultado.
O problema da urna é mais ou menos o que aconteceu com todos nós – e o
Deputado Geraldo Magela, ex-bancário, sabe muito bem disso. Quando se
introduziram as máquinas de somar (salvo as bancárias, havia até aquelas
máquinas Olivetti que se puxava), o que acontecia? Somava-se tudo, lançavam-se
CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reformas PolíticasNúmero: 000563/01 Data: 19/06/01
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as parcelas somadas, depois arrancava-se o pedaço de papel, conferiam-se as
parcelas. Não se colocava em dúvida o resultado da soma; conferia-se o lançamento
das parcelas. Quando esse tipo de máquina de digitar foi substituída pelas digitais,
não se tinha mais a memória das parcelas, só o resultado final, porque era a
contabilização direta sem a conservação das parcelas. O que fazíamos?
Somávamos duas, três vezes para conferir o resultado. O problema é discutirmos
mecanismos de transparência em relação a isso. A dúvida apresentada pelo
Senador Requião é de que poderia haver uma alteração do programa individual na
urna em que a digitação 135 desse 153, por exemplo. Esse é o problema que a urna
de 1996 não resolve, porque não era a contabilização, mas o lançamento da
parcela. É o que queremos discutir para estabelecer.
Deputado Geraldo Magela, a dúvida está exatamente nisso. Tivemos apenas
seis casos, nas eleições municipais, de problemas em relação à urna, porque ela
tem um problema. O resultado da urna eletrônica tem um problema psicológico que
induz ao conflito. Quando tínhamos apuração tradicional, o gato subia para o
telhado, começava apurar, ia chegando e fazíamos o discurso da vitória e o da
derrota; o Virgílio já se preparava para a derrota e o outro, para a vitória. Alguns já
davam a derrota antes e todo mundo abandonava a apuração, ia para a praia – isso
em 1982. A urna é morte súbita! Apurou, e em cinco minutos se tem o resultado. E
aí vem a reação, como aconteceu principalmente no Pará, onde havia pretensões de
eleitorais de resultado positivo: houve invasão de urna, quebraram urna. Temos de
conviver com isso.
Pessoalmente, na análise que fiz, tenho segurança em relação à questão da
ONU. Quero também a visualização que almeja o Deputado Geraldo Magela. As
coisas têm de ser ditas. Daí por que estou pedindo ao TSE que nos visite para
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entender in loco como funciona o esquema e, a partir daí, estabelecer mecanismos
suplementares de segurança, decorrentes dessa auditoria que faríamos.
O Deputado José Antônio pergunta sobre o sistema proporcional. Há uma
confusão quando se fala no sistema distrital misto e no proporcional. O sistema
distrital misto é proporcional — é o sistema alemão. Nele o número de vagas
conquistadas leva em conta o primeiro voto do eleitor.
A fórmula a que se referiu o Senador Requião é de transição mista. Esta além
de manter o voto de lista, também mantém o voto nominal e divide as vagas. Só não
as divide em distritos eleitorais.
Temos o sistema distrital representado pelos Estados. Os Estados são o
distrito eleitoral brasileiro. Tanto é verdade que os partidos nacionais, na maioria das
vezes, são confederações de partidos regionais. Os grandes partidos nacionais têm
idiossincrasias locais que influenciam na decisão nacional. Por quê? Porque no local
eleitoral não há voto nacional, mas regional. Temos de discutir muito o assunto.
Esse negócio de fazer reforma eleitoral a partir da academia não dá certo. Devemos
partir da realidade concreta de V.Exas. por uma razão simples: ninguém vai votar
um sistema eleitoral que represente suicídio para si mesmo. Se não tivermos clara a
regra de que ninguém ou partido algum vai aceitar alteração que importe na sua
destruição, temos de ter presente a necessidade de uma grande composição e um
enorme entendimento por meio da lucidez do Congresso Nacional. Este deve
produzir alterações progressivas dentro de um processo de atualização que lhe
conduza à consistência dos partidos. Proponho as coligações.
Já discuti o assunto há alguns anos com o Deputado Haroldo Lima. A frente
partidária é um mecanismo de transição de um sistema de proibição de coligação.
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Sabemos perfeitamente que a proibição de coligação não interessa, por exemplo, ao
PCdoB.
Se V.Exas. compararem os votos do PCdoB com os resultados eleitorais vão
identificar que parte de suas vagas são conquistadas por meio das coligações. Em
1987, o Partido dos Trabalhadores não queria a extinção de coligações. Hoje, o
discurso é diferente. A consolidação do partido é outra. Não há princípios absolutos
em questão eleitoral, mas conveniências em termos do procedimento e da situação
política que se tem no momento.
Vou responder ao questionamento do Deputado Geraldo Magela sobre o voto
facultativo. Não discuto o voto facultativo ou o voto obrigatório a partir de critérios
que não os históricos. Não tenho preconceitos históricos em relação a voto
facultativo ou obrigatório. Alguns dirão que a instituição do voto facultativo
viabilizaria o acesso do eleitor à massa dos militantes e não à do grande público que
não quer votar, vota por obrigação. Devemos examinar se queremos a participação
obrigatória de toda a população. Hoje o índice de abstenção é muito baixo, da ordem
9%, sem levarmos em conta os não computados por falta de comunicação, de
morte, por exemplo. Continuo teoricamente favorável ao voto facultativo. Sou
contrário à sua instituição agora. V.Exa. vai cobrar num plebiscito a opção pelo voto
facultativo no sistema obrigatório. Ou seja, o cidadão vai ser obrigado a votar no
plebiscito que lhe vai perguntar se ele está dispensado de votar. Veja que é uma
situação curiosa.
O Deputado Mauro Benevides perguntou-me sobre o financiamento público
de campanha. O Tribunal Superior Eleitoral tem condições de estabelecer os
mecanismos de distribuição. O mecanismo terá de ser autofiscalizado por intermédio
dos partidos políticos. É necessário haver prestação de contas. Temos infra-
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estrutura para prestá-la. Com a fiscalização poderemos saber o destino da quantia
distribuída para tal partido. O partido deverá dizer onde investiu o dinheiro. A
questão, contudo, não é essa. Temos de saber se vão continuar existindo os
acessos a mecanismos externos de financiamento público de campanha.
Creio ter respondido os questionamentos dos Srs. Parlamentares.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Pois não, Sr. Ministro.
Com a palavra o Deputado Haroldo Lima.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Sr. Presidente, V.Exa. pode
anunciar qual é o meu bloco, por favor?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – É o dos Deputados
Custódio Mattos e José Dirceu.
Com a palavra o Deputado Haroldo Lima.
O SR. DEPUTADO HAROLDO LIMA – Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.
Ministro Nelson Jobim, é sempre positivo e proveitoso ouvi-lo. O Deputado José
Antonio Almeida já formulou ao Ministro uma pergunta e V.Exa. já a respondeu.
Mostrou-nos inclusive sua visão a respeito de diversas questões que contribuíram
para o debate ora em curso.
Na minha opinião são muito positivas as opiniões de V.Exa., em especial a
que acabou de expor. Segundo V.Exa., não há princípios absolutos em termos de
reação eleitoral, mas conveniências e necessidades.
Estou de pleno acordo com o que disse V.Exa. A sua opinião remete-nos a
questões concretas que devem ser analisadas não à luz de supostos princípios
absolutos, verdades estabelecidas, mas particularmente à luz do ângulo histórico
com o qual começou a expor suas idéias. Falou V.Exa. da trajetória histórica que
estamos seguindo no Brasil. Estamos construindo uma Nação nova a partir de
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diversas situações anteriores que criaram raízes e debilidades. Estas precisam ser
superadas no curso do processo, sem haver resistências ou receios de enfrentar os
problemas e de mudá-los, mas também sem haver a pretensão de truncá-los e de
assim pretensamente caminharmos para soluções artificiais.
Nesse sentido pareceu-me importante a apreciação que fez sobre a
excludência artificial de partidos políticos. Esta decorreria da adaptação ou da
absorção de alguns supostos princípios. Segundo V.Exa., Ministro, o sistema distrital
é, por sua natureza, excludente. Ponderou V.Exa. — fazendo uma formulação muito
própria, mas que tem parentesco com uma interessante feita por Tancredo Neves —
que fizéssemos uma espécie de congresso eleito pelo voto distrital. E sugeriu ainda
uma associação nacional de presidentes de associações de bairros, ou coisa
semelhante.
Tancredo Neves, ainda falando sobre isso, disse que iríamos ter uma porção
de coletores, chefes de cartórios e vigários eleitos para o Congresso Nacional. Isso
diminuiria o significado político, a visão de conjunto dos problemas nacionais que o
Congresso Nacional precisa efetivamente ter.
Gostaria de ouvir a opinião de V.Exa. sobre a cláusula de barreira, ou
cláusula de desempenho, ou seja qual o nome que se use para isso. Fizemos
também uma adaptação com ela e assumimos a cláusula de barreira de 5%. Fiz um
estudo sobre o assunto e constatei que diversos países do mundo já observam a
cláusula de barreira, mas de tipos diferenciados: na Alemanha, 5%; no México, 2%;
na Bolívia, 3%; na Itália, 4%.
O SR. NELSON JOBIM – Quando houve a reunificação alemã, a Suprema
Corte daquele país estabeleceu que para os partidos originários da Alemanha
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Oriental as cláusulas de barreira tinham de ser mais baixas — isso para sua
consolidação.
O SR. DEPUTADO HAROLDO LIMA – É, exatamente, uma certa transição.
Como vê V.Exa o fato de termos no Brasil uma cláusula de barreira de transição
inferior a 5%, a maior existente no mundo? Nós, que não tínhamos cláusula de
barreira, já começamos por cima. Por que não 2%, 3%? Tenho projeto de lei
estabelecendo cláusula de barreira de 2%, a despeito de achar que ela seria
discutível. O próprio quociente eleitoral já seria uma cláusula de barreira
suficientemente onerosa para os partidos menores.
Vejo que o financiamento público cria, além do que expôs V.Exa., um outro
problema quase político perante o povo brasileiro. Este trabalha com a idéia
simplista — às vezes equivocada — de que estão querendo levar dinheiro do
contribuinte ou do Governo. Os brasileiros não vêem o financiamento público das
campanhas eleitorais como a arma de que a democracia dispõe para se prevenir
dos financiamentos privados das campanhas eleitorais. O financiamento público
seria uma maneira de retirar as eleições do negócio privado. Estas então passariam
a ser um negócio público. Para isso, é preciso haver salvaguardas, para que o
próprio povo entenda que não é uma negociata a mais que se está pretendendo
fazer.
Como V.Exa. examinaria a hipótese de determinado partido receber um
financiamento à luz do número de votos ou de Deputados eleitos nas eleições
passadas? Vamos supor que a data fosse a da eleição passada e não a do período
pré-eleitoral. Um partido que elegeu cem Deputados nas eleições passadas
receberia uma quota correspondente a esse número. Vamos supor que esse partido
vá às eleições e só eleja cinqüenta Deputados. Não seria o caso de o partido
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devolver o financiamento correspondente aos cinqüenta que ele não elegeu? Outro
exemplo: um partido recebe um financiamento em decorrência dos cinqüenta
Deputados que tinha, ou, no caso do PCdoB, em decorrência dos dez Deputados
que elegeu na eleição passada, vamos supor que eleja agora vinte Deputados, não
seria ocaso de receber uma compensação pelos dez a mais que elegeu, sem que
tenha tido financiamento?
Sr. Ministro, nesse estudo que fiz do projeto de lei em curso, introduzi um
artigo que prevê isso. Imagino ter retirado essa cláusula de alguma experiência
internacional. Lamentavelmente não estou conseguindo lembrar qual era, mas acho
que já existem experiências internacionais nesse sentido.
Está em curso a criação de frentes de partidos, inclusive levando em conta
outras opiniões. Na época da elaboração dessa proposta, incorporei algumas
sugestões do nobre Ministro. Apresentamos uma proposta de projeto de lei que está
em tramitação nesta Comissão, assinada não apenas por mim, mas também pelos
Deputados Bonifácio de Andrada, José Genoíno, Miro Teixeira, Luiza Erundina,
Valdemar Costa Neto, Aldo Rebelo e Zaire Rezende. Refiro-me à proposta da
formação de frentes de partidos.
. O SR. NELSON JOBIM – Qual era o número do PL?
O SR. DEPUTADO HAROLDO LIMA - É o PL nº 1.203.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Deputado Custódio
Mattos, tem V.Exa. a palavra por três minutos.
O SR. DEPUTADO CUSTÓDIO MATTOS – Cumprimento o Ministro pelo
brilho da exposição. Fico perplexo — deve haver alguma coisa errada no meu modo
de pensar — ao ver a leniência com que o Parlamento e as lideranças nacionais
vêem a reforma política. Abstraídos os grandes problemas conjunturais, não vejo
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nada tão impeditivo ao desenvolvimento do Brasil como Nação do que nosso
anacrônico, obsoleto e irracional sistema partidário e eleitoral.
Minha experiência Parlamentar levou-me à conclusão de que nosso sistema
não é bom. Os Parlamentares são injustamente desmoralizados pela sociedade
brasileira. A visão distorcida que a maioria dos cidadãos têm do Parlamento deve-se
à fragilidade e à irracionalidade do sistema eleitoral e partidário.
Nosso sistema de eleição parlamentar proporcional é baseado na culminação
da estupidez com a vaidade. No passado havia esse mesmo sistema, mas também
existia outro muito mais permissivo de administração. Ele permitia que os candidatos
entrassem com baixíssima probabilidade de eleição, mas tivessem alguma
participação posterior no sistema, por intermédio de pequenos empregos e de
participação na gestão pública. Hoje, pelas correções por que esse sistema passou,
ganhando mais impessoalidade e profissionalismo, não é mais possível que tal
participação posterior aconteça. Então, temos um sistema em que entram numa
eleição sessenta, setenta pessoas, quando a probabilidade, numa Câmara de
Vereadores, numa bancada, é a da eleição de dois ou três. Quer dizer, desses
setenta, oitenta que entram, sessenta, cinqüenta não têm nenhuma possibilidade de
se eleger. É zero essa probabilidade. E, como não têm vida partidária intensa,
também por ideologia normalmente essas pessoas entram.
Vou dar prova cabal disso. Se pegarmos o meu partido, o PSDB, em Minas
Gerais, na última eleição tínhamos o Governador do Estado, candidato à reeleição, e
tivemos, em campanha para Deputado Federal, 21 candidatos. Não conseguimos
candidatos, tal o nível de deterioração dessa regra, da irracionalidade dessa regra,
adicionada aos fatos que o Ministro e outras pessoas mencionam, da
desmoralização dos partidos, da competição interna a que ela induz etc.
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Então, o que me deixa perplexo é como não se vê a urgência, a absoluta
necessidade de se fazer um esforço para questionar essa situação. O Parlamento,
isoladamente, pouco pode fazer, pelas razões que o Ministro mencionou de todos
termos sido eleitos num sistema — e a contestação desse sistema de certa forma
significar uma ameaça —, de não haver movimento na sociedade e, inclusive, de o
Executivo não se dispor a fazer um programa de reestruturação da sociedade
brasileira. O Governo Federal não dá mais importância a essa questão da reforma
política, e sou extremamente cético quanto ao fato de que consigamos fazer algum
progresso significativo nessa área, nesta Legislatura. Baseado nessa premissa,
solicito ao Ministro que se pronuncie a respeito.
É verdade que há extrema improbabilidade de fazermos reformas
fundamentais no sistema político brasileiro? À luz de sua experiência parlamentar,
jurídica e de Ministro, além da inteligência de V.Exa., qual é a reforma mais viável,
que pode introduzir algo mais significativo para corrigir esses defeitos que
mencionei?
Como num passe de mágica, nesses últimos dias ressuscitou-se uma
discussão, que considero extremamente interessante. Querem propor, ainda nesta
Legislatura, que o próximo Congresso Nacional tenha o poder revisional da
Constituição Federal limitado a determinados temas. Salvo engano, a proposta
original é do Deputado Miro Teixeira, mas alguns disseram que foi apoiada pelos
partidos do Governo. Essa seria uma solução prática para resolvermos o impasse
das reformas política e tributária. Talvez essa fosse a forma brasileira de superar
esse impasse. Peço ao Ministro que fale sobre a análise constitucional e jurídica
dessa proposta. Quais as complicações institucionais e jurídicas da proposta?
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Deputada Nair Xavier
Lobo, V.Exa. tem a palavra por três minutos.
A SRA. DEPUTADA NAIR XAVIER LOBO - Sr. Presidente, Sr. Relator, Sr.
Ministro, parabenizo o Ministro Jobim pela sempre brilhante intervenção e pela
inteligência que sempre demonstra nos momentos em que freqüenta o debate nesta
Casa.
Infelizmente não pude ouvir toda a exposição de V.Exa., Ministro, porque
cheguei quase ao final da sua intervenção. Contudo, estou aqui a tempo de
cumprimentá-lo. Concordo com o colega que me antecedeu. Estamos vivendo um
momento histórico no qual a sociedade tem plena consciência de que o Brasil
evoluiu muito economicamente, mas não evoluiu social e politicamente.
Para haver financiamento de campanha tem de haver amadurecimento
político. Para a sociedade é muito importante a ética e a transparência do processo
político. Portanto, esta Casa discute com muita preocupação o financiamento público
da campanha. Os escândalos que acontecem na classe política, na maioria das
vezes, têm relação com o financiamento de campanha, com o dinheiro nela usado.
Sr. Ministro, o financiamento público de campanha é muito bem vindo para a
sociedade. Contudo, ele não pode representar um engodo. Outro dia ouvi aqui —
não me lembro de quem, se do Relator ou de algum outro Parlamentar da Comissão
— que ele sempre receberia acréscimo do dinheiro dos candidatos, no caso dos
ricos empresários ou de seus parceiros.
Gostaria de saber o que V.Exa. pensa a respeito disso. Qual o modelo mais
próximo do ideal? Somos falíveis, afinal somos seres humanos. Estamos neste
momento lutando por um modelo que satisfaça a sociedade.
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Poderíamos adotar um modelo misto, no qual cada candidato pudesse
receber recursos dos segmentos da sociedade e mostrá-los ao seu eleitor. Enfim,
queremos um processo muito transparente.
Ouvi dizer certa vez que há três tipos de Parlamentares nesta Casa. O
primeiro deles é o despachante, que cuida de levar recursos às suas bases — e o
faz com grande avidez para sustentar os pleitos dos seus Prefeitos, levando para lá
as creches, as fontes, enfim, os recursos do Governo Federal de que eles
necessitam tanto, o que é legítimo. Outra classe de Parlamentares é formada por
aqueles que a sociedade manda para cá para representar seus segmentos — igreja,
polícia, empresários e até bandidos, que nós cuidamos de expurgar. Esses são os
chamados representantes dos diversos segmentos. Quem deu esse conceito definiu
a terceira categoria como a dos nacionalistas, composta pelo chamado alto clero.
São eles que decidem as questões nacionais, participam dos debates, das
mudanças estruturais e da questão conceitual.
O eleitor pode preferir a sua categoria de representante. É bom que sejam
aqui representados os segmentos, a Maioria, as Minorias, mas o eleitor deve ter o
direito de saber, ao definir seu voto, de onde vem o dinheiro daquele que ele escolhe
como seu representante.
Cito como exemplo um fato da minha campanha política. Sou considerada a
madrinha da Polícia Rodoviária Federal no País. É legítimo que receba dinheiro, na
minha campanha, dos policiais rodoviários federais, porque os defendo.
O SR. DEPUTADO NELSON MARCHEZAN – E eles têm?
A SRA. DEPUTADA NAIR XAVIER LOBO – Sim, se juntarem, têm. Na minha
campanha, Deputado, recebi deles uma contribuição imensamente significativa, que
eles entenderam ser uma propaganda política eficiente: colocaram o slogan da
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minha campanha numa caixa de fósforo e distribuíram nas estradas. É legítimo isso.
Sinto-me imensamente orgulhosa de ter recebido recursos da Polícia Rodoviária
Federal para a minha campanha. Defendo-os, brigo pela GOE, como briguei para
que eles tivessem um plano de carreira, hoje justo e legítimo, afinal eles são os
guardiões das nossas estradas.
Entre os que fazem campanha política há os que, num primeiro momento,
participam do pleito, apresentando seu nome para representar o País e têm dentro
do seu partido os recursos públicos de campanha e ainda não têm nenhum
segmento colaborando com sua entrada na política. Há aqueles que podem
sobressair-se, porque têm prestígio dentro do próprio partido e, por isso, contam
com partes e com quotas de recursos públicos, o que seria imensamente
transparente, amealhando mais recursos para aqueles que para cá querem mandá-
los. Este é o caso de uma contribuição como a que citei.
Quero ouvir a opinião do Ministro. Queremos contar com a lucidez, a
experiência e o brilhantismo de V.Exa. Precisamos saber qual é o modelo ideal para
o atual momento da política brasileira, que contemple a sociedade com a ética e a
transparência dos financiamentos de campanha.
Não ouvi toda a palestra de V.Exa., que pode, porventura, ter tratado desse
modelo. Se isso tiver acontecido, peço desculpas ao Sr. Relator e aos colegas.
Gostaria muito de ouvir de V.Exa. qual é o modelo ideal de financiamento de
campanha. Para mim, é este o ponto mais importante.
O que V.Exa. pensa a respeito da morte dos pequenos partidos? O fim das
coligações é a morte dos pequenos partidos. O Brasil pode conviver neste momento
com cinco, seis partidos políticos? Isso é bom para a evolução e a maturidade
política do País? Trata-se da questão do fim das coligações ou da sobrevivência das
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coligações e da permissão da existência de muitos partidos que às vezes são
chamados partidos de aluguel, são mal-entendidos ou interpretados erradamente. E,
como existe uma celeuma muito grande, queria entender na essência o pensamento
de V.Exa. sobre a morte dos pequenos partidos.
Parabenizo o Presidente e o Relator desta Comissão e meus colegas pelo
trabalho. Esta Comissão cuida de um dos momentos mais importantes nesta casa: a
evolução política, o melhor modelo que providencia ética e transparência na política
do Brasil.
Era o que tinha a dizer.
O SR. NELSON JOBIM – Em 1987, a Assembléia Nacional Constituinte
discutia a cláusula de barreira. Votou contra ela o Senador Virgílio Távora. Lembra-
se? Aquele velho coronel do Ceará, ligado ao sistema anterior do Governador — o
que chamaríamos de elite nordestina oligárquica —, disse-me que não era possível
estabelecermos uma guilhotina imediata em termos de partidos. Referia-se
exatamente ao PCdoB e ao PT. Era um momento de consolidação.
É necessário falarmos em cláusula de desempenho para evitar — e nossa
experiência nos mostra isso — os chamados partidos de aluguel.
Precisamos de transições. Não podemos ser maximalistas no processo de
reforma. Reformas políticas viáveis são minimalistas. Elas vão nos empurrando para
um caminho que vai sendo corrigido e ajustado. O problema básico é que, às vezes,
chamamos grandes cientistas políticos para analisar o assunto. Eles, às vezes
analisam-no de maneira distorcida, desvinculado-o do real processo político. Por que
fazem assim? Porque não conviveram dentro dele, não estiveram no Município, no
comitê eleitoral e nas discussões.
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Por que sou favorável à cláusula de barreira? Temos duas escolhas: quanto
mais representativo for o Parlamento, no sentido de ter o maior número possível de
representantes dos diversos segmentos, proporcionalmente considerada a
sociedade, menos capacidade decisória terá ele. Quanto mais representativo, mais
extraordinariamente difícil é a formação de vontades majoritárias para a aprovação
de legislação. Quando existe um Parlamento fortemente representativo, com todo
tipo de segmento, há dificuldade de se formar a vontade majoritária para definir
determinado texto legal. E aí o que acontece? O preço do alto nível de
representatividade é um baixo nível de poder decisório. E o nível de poder decisório
leva a quê? Leva àquilo a que o Senador Roberto Requião se referiu, leva à
ambigüidade do texto legal.
Reunimo-nos várias vezes nesta Casa com o Dr. Ulysses Guimarães.
Perguntava sempre a S.Exa. qual era o texto razoável. De posse dele, examinava-o.
A partir daquele exame, eu trabalhava no sentido de deixar o texto mais ambíguo.
Meu objetivo era viabilizar a aprovação da norma. Com isso, transfere-se para o
aplicador da regra o preenchimento daquilo que o Congresso Nacional não soube
definir.
É o que disse o Senador Roberto Requião. A ambigüidade do texto da
campanha eleitoral leva por exemplo alguém que está sendo entrevistado na rádio a
se atrapalhar. Julguei lá do Tribunal Eleitoral, por exemplo, o caso da candidata à
Prefeitura de Fortaleza, Deputada Estadual Patrícia Gomes.
Ela havia sido entrevistada na rádio antes do início da campanha eleitoral e
lhe perguntaram: “É candidata?” Ela respondeu que sim. O Tribunal aplicou-lhe uma
multa, por isso. Entenderam o problema da definição das regras?
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Deputado Haroldo Lima, lembro-me, na Assembléia Nacional Constituinte,
daquela discussão sobre repouso semanal remunerado. A Esquerda queria repouso
semanal remunerado obrigatoriamente aos domingos. Era ícone para os sindicatos a
palavra domingo. V.Exa. lembra-se disso, não é? Na época, o Centrão queria como
redação repouso semanal remunerado na forma de convenção coletiva de trabalho.
Tanto a Esquerda quanto o Centrão não tinham votos para aprovar nem um texto
nem outro. Tentamos votar, mas não conseguíamos. Seria ridículo se o texto do art.
7º não tivesse repouso semanal remunerado. Aí entrei na negociação política.
Resultado: tornamos ambíguo o texto que acabou sendo aprovado: “repouso
remunerado preferencialmente aos domingos”. Ficou “domingo”, que era ícone da
Esquerda, e também “preferencialmente”, que é um advérbio de modo que
utilizávamos muito para efeito de reduzir a força obrigatória do texto.
Produzi esse texto num acordo que fizemos em 1987. Depois, o Supremo
Tribunal Federal julgou-o inconstitucional. Estávamos discutindo o negócio dos
comerciários. V.Exa. lembra-se disso, não é? Eu disse o seguinte: “Olha, pode ser
aos domingos, mas tem de haver uma regra em que se assegure a preferência do
domingo”. E foi o que se produziu. Ou seja, o processo político é de negociação, não
de exclusão. Só se exclui quem não é necessário para o processo decisório.
Fui favorável à cláusula de barreira por causa da questão de se ter
capacidade decisória. Esse é o preço do voto universal. O sufrágio universal e o
âmbito da participação eleitoral determinou maior representatividade do Parlamento.
Maior representatividade significa menos capacidade decisória. É fundamental a
cláusula de barreira. Agora, concordo plenamente com V.Exa. no sentido de que tem
de ser uma cláusula de transição. Não vejo nenhuma dificuldade em se começar
com 2%, contanto que a própria lei estabeleça um horizonte histórico.
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Vamos deixar clara a situação para o Deputado Haroldo Lima. Se não
estabelecermos um horizonte histórico, o partido não vai ter condutas partidárias que
lhe possam assegurar o cumprimento de uma barreira futura. Ele vai continuar
sempre isolado, eventualmente na sua inviabilização histórica. Se houver um
horizonte histórico estabelecendo, suponhamos, dois anos, até chegar a cinco, um
partido que quiser permanecer vai ter de adotar comportamento de alianças, de
formação de frentes — e aí a frente se casa com esse problema —, para lá adiante,
quando se chegar aos 5%, na necessidade de 5%, avaliar que tipo de estruturação
partidária há. Se não houver essa perspectiva histórica, ele vai continuar sempre
negando a cláusula de barreira.
Os senhores têm de decidir: querem um Parlamento com um mínimo de
capacidade decisória ou uma estrutura representativa plenária sem ela? A transição
que propus é razoável e necessária: ter no próprio texto um espectro de decisão,
porque assim, por exemplo, o PCdoB concorreria, fazendo 2%. E aí terá de ser
examinado todo o trabalho dos quatro anos anteriores à próxima eleição,
exatamente para assegurar que fosse alcançado o percentual estabelecido.
Isso não existe atualmente, porque não há necessidade. Hoje, qual é a
solução? É a coligação. Uma coligação em que nos atrelamos ao resultado eleitoral
de legenda do partido coligado. Não é essa a técnica? Sabemos perfeitamente que
é assim.
Respondo agora a pergunta feita pela Deputada Nair Xavier Lobo. S.Exa.
quer saber sobre o financiamento público de campanha. Trata-se de assunto
complicado. A idéia de S.Exa. é a seguinte: no sistema de restituição, se o partido
tem 50 Deputados nesta Legislatura, na eleição de 2000 recebe o correspondente a
50, disputa a eleição e reduz o número em 25. Ele teria de restituir 25. Essa
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restituição de 25 seria transferível ao eventual partido que tinha 25 e fez 50. Seria
esse o sistema de compensação. A questão é saber como cobrar esse valor
consumido no partido, já que este não tem patrimônio. Executa-se a bandeira do
PCdoB? Executa-se a sede do partido? Ou cobra-se dos velhos históricos do
partido? Trata-se de assunto complicado. E vai criar uma cizânia de crédito entre
partidos. Isso vai dar uma confusão muito grande. Não excluo isso. Os mecanismos
— não é tanto a tese — são complicados. Terminada a eleição, pressupõe-se que
se gastou tudo. O que fazer? Cobra-se de quem? E aí vai acontecer o seguinte: o
partido, pressionado, vai sair atrás de quê? De dinheiro privado para pagar a dívida
— aí complicou tudo. E qual a pena que terá para o partido que não pagou? Se o
partido que elegeu 25 e tinha recebido por 50 não restituiu nada, na próxima eleição
será descontado o valor? Se desconta do valor, para onde está sendo empurrando o
partido? Para as mãos do financiamento privado. Ou V.Exas. acham que eles vão
fazer campanha sem financiamento? Vão fazer com financiamento. Temos de ter
técnica para empurrar os partidos para a lucidez e a transparência e não para a
ilegalidade. As técnicas radicais acabam guiando os partidos e os candidatos para a
ilegalidade. É isso que justifica, por exemplo, as regras do estado de sítio na
Constituição. Por que ele se encontra dentro da Constituição? Porque, havendo
situações que o explicavam, e não estando ele previsto, os executivos o
decretavam. Então, ele foi regularizado, regulamentado, para evitar que as pessoas
fossem jogadas na ilegalidade.
O financiamento misto resolve o problema dos candidatos proporcionais. Os
candidatos majoritários seriam atendidos, ao que tudo indica, pelo financiamento
público. O problema estaria nos candidatos proporcionais a que a Deputada se
referiu. Continuaria esse problema, talvez como mecanismo de transição para
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entender como isso se viabilizaria. Mas o que aconteceria? Continuaríamos tendo,
em relação aos financiamentos privados, aquilo que temos hoje. Tem-se um
financiamento privado transparente e um que não aparece, o caixa dois. O problema
não é esse. O problema é saber como se evitar o caixa dois. O que se está
querendo é que tudo seja financiado por dotações orçamentárias para excluí-lo. O
financiamento por dotações orçamentárias não vai excluir o caixa dois. Tem de
haver outra fórmula técnica para não haver a exclusão. Um partido recebe 5 milhões
de reais. O que ele vai fazer com esse dinheiro? Vai aplicar na candidatura para
Prefeito, Governador e Presidente da República. Quem financiará os Deputados?
Ou V.Exas. acham que eles vão fazer campanha sem financiamento? Proibindo a
doação, não estaremos empurrando o Deputado para a ilegalidade?
A SRA. DEPUTADA NAIR XAVIER LOBO - E qual seria a sugestão de
V.Exa.?
O SR. NELSON JOBIM – Não tenho. Podíamos discutir essa matéria, mas
não tem nada de absoluto no processo. Mecanismo de transição devem ser
estabelecidos.
O SR. DEPUTADO NELSON MARCHEZAN – V.Exa. disse que o
financiamento público não exclui o privado?
O SR. NELSON JOBIM – Claro que não. O PSDB do Rio Grande do Sul
recebe seus recursos, vai fazer campanha em Santa Maria. Recebeu mil reais para
fazer campanha em Santa Maria. Se alguém resolve ajudá-lo, vai recusar?
O SR. DEPUTADO NELSON MARCHEZAN – Como V.Exa. não diria...
O SR. NELSON JOBIM – Claro. Por quê? Porque vai ter de fazer campanha.
Então, não é assim que se resolve o problema achando que uma guilhotina vai
resolver. Não vai resolve nada. Querem ver uma coisa?
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Em relação à questão levantada pelo Deputado Custódio Mattos, quero
lembrar o seguinte: havia substancial mudança no desenho do Estado brasileiro. O
critério, a redução do tamanho do Estado brasileiro de 1988 até 2000 é
impressionante. Os levantamentos que andei fazendo me dão conta, por exemplo,
que nossas empresas públicas, que eram o universo do clientelismo, do emprego da
máquina partidária, foram reduzidas entre 1991 e 1988 para 121, sendo 97 não-
financeiras. Em 1991, tivemos um gasto, em relação ao gasto público de pessoal no
setor empresarial do Estado, de 19,7%. A despesa com empresa pública hoje
representa 8,9%. Tenho um levantamento curioso. Havia emendas ao Orçamento
que eram mecanismos para atender os chamados Deputados regionais. As
emendas ao Orçamento, de 1988 para hoje, que eram de 11 bilhões, foram
reduzidas para 4 bilhões. Houve uma redução de 40% para 14%. O curioso de tudo
é que a maior parte das emendas orçamentárias no levantamento que estou
terminando — ainda não o terminei — são destinadas aos Municípios. Por quê?
Porque de 1988 para cá houve enorme descentralização para as ações municipais
com uma redução dos espaços nos Governos dos Estados.
Não é menor o número de emendas de dotações orçamentárias para os
Governos Estaduais em relação aos Municipais. Por que isso? Porque começa a
aparecer na distorção do sistema eleitoral brasileiro, como grande eleitor, o Prefeito
Municipal, e não mais o Governador, tendo em vista essa mudança de espectro em
relação à transferência. Se V.Exas. examinarem as transferências da União, em
termos de transferências do IPI, dos Fundos de Participação, enfim, de Imposto de
Renda, podem observar — e isso é o mais curioso — que nessas transferências
tivemos uma redução de 73% em relação à evolução. O crescimento foi dos
Municípios. Por quê? Por causa da descentralização. O crescimento aparece numa
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redução dos quadros da União. O número de funcionários dos quadros da União foi
reduzido e o número de funcionários municipais aumentou. Por quê? Por causa do
SUS, etc. houve um deslocamento, o que dá um perfil diferente para o Parlamentar
que aqui vem para o atendimento regional.
E, por último, Deputado Custódio Mattos, vou falar sobre o problema da
Constituinte restrita sustentada pelo Deputado Miro Teixeira e outros, para tentar
enfrentar a reforma tributária, um problema curioso. Se fizermos um levantamento
sem emoções, poderemos verificar que, historicamente, o Centro, o Sul e o Sudeste
tributaram as poupanças consumidas do Norte e Nordeste desde o Império. Houve
uma brutal transferência de renda dos Estados do Norte e do Nordeste para os
Estados do Sul e do Sudeste. O Centro-Oeste estaria na parte intermediária. O que
era isso? É a grande discussão sobre o problema dos impostos sobre consumo. O
ICM foi instituído no Brasil como imposto sobre a produção e não sobre o consumo.
O Estado da produção arrecada o tributo e não o Estado do destino. Tentou-se
estabelecer em 1988 uma tentativa de assegurar rendas dos Estados consumidores
para os Estados produtores, que é a diferença de alíquota na circulação intra-
estadual norte e sul. Hoje a alíquota norte e sul está na base de 12% — a média é
17%. Isso consegue assegurar aos Estados do Norte e do Nordeste a aquisição de
bens de consumo do Sul e do Sudeste.
Toda vez que se tentou fazer reforma tributária no sentido de estabelecer que
quem recebe o tributo é o Estado que produz a riqueza consumida, tivemos uma
objeção do Sul e do Sudeste. Os senhores examinem o orçamento do Estado de
São Paulo e o do Rio Grande do Sul e verifiquem quanto representa o ICMS na
arrecadação das operações interestaduais.
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E o que acontece? Essa diferenciação de alíquota estabeleceu mecanismos
de falsificação de notas, em que há trânsito de notas. E aí temos claramente a
guerra fiscal. Os senhores, saindo do Distrito Federal e chegando a Goiás, vão
verificar logo em seguida que há enormes depósitos de óleo e de combustíveis,
tendo em vista a alíquota zero na circulação interestadual de gasolina. As grandes
empresas consumidoras acabam comprando de outros Estados, mas não são
compras reais, porque compram aqui.
Não vai ser por intermédio de miniconstituintes que se vai tentar fazer a
reforma. O problema da miniconstituinte está vinculado a uma coisa curiosa no País,
que é aquela distinção jurídica entre Poder Constituinte Originário e Poder
Constituinte Derivado, com a qual a história política brasileira não se ajusta.
Vejam bem: o Imperador D. Pedro, antes da Independência, convoca uma
Assembléia Constituinte Geral do Brasil, reino unido com Portugal. Em 7 de
setembro, declara a Independência, instala a Assembléia Constituinte em 1822.
Depois vem a luta com os Andradas — Antônio Carlos, José Bonifácio e Martim
Francisco. Conflito com o Imperador. O Imperador dissolve a Assembléia
Constituinte e cria uma Assembléia própria, com a Constituição de 1824.
Vem a República em 1891. Elegem-se Deputados Federais e Senadores,
fazem a Constituição e se os mantêm como Deputados e Senadores. Em 1934, a
mesma coisa. Em 1946, quem fez a Constituição? Foram os Deputados e
Senadores eleitos na convocação feita por Getúlio Vargas em fevereiro de 1945.
Antes do golpe que o derrubou, em outubro de 1945, Getúlio já tinha decidido
convocar eleições gerais para instalação do Congresso, para elaborar nova
Constituição. Elegem-se os Deputados, assume como Presidente da República o
Presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares, e ele outorga por ato
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próprio poderes constituintes ao Congresso eleito com base nos textos eleitorais de
1945. Faz-se a Constituição de 1946.
Em 1967, o Congresso Nacional recebe uma mensagem do Governo Castello
Branco para votar uma Constituição, em sessão bicameral, em trinta dias. O que
aconteceu? Próximo à meia-noite, o Senador Áureo de Moura Andrade mandou
desligar o relógio. Desligou-se o relógio do Congresso Nacional, votou-se até às 4h
da manhã. Quando ele determinou ao Paulo Afonso mandar ligar o relógio, este
disse que não seria possível porque o ponteiro iria pular. Então, fecharam a sessão
e foram embora. No dia seguinte, o Paulo Afonso e o Diretor-Geral da Câmara à
época ligaram o relógio, que deu um pulo e foi para o horário certo.
Eleições de 1986: os Deputados e Senadores foram convocados para votar a
Assembléia Constituinte de 1987? Os Deputados e Senadores foram convocados
para essa função pelos Deputados e Senadores de 1982, presentes os Senadores
de 1978. Ou seja, a Assembléia Constituinte “Originária”, entre aspas, de 1986 foi
convocada pelo Poder Constituinte Derivado de 1985, que votou a emenda
constitucional convocatória.
Essa distinção jurídica entre Poder Constituinte Originário e Poder
Constituinte Derivado surgiu com a Revolução Francesa, com a palavra do abade
Sieyés, exatamente quando, fracassada a conciliação de Lafayette, foi iniciado o
terror com os jacobinos de Robespierre, Marat, Danton, Camille Demoulins. Neste
caso, surgiu um fenômeno histórico para justificá-lo, mas não temos esse fenômeno
histórico.
Não vejo problemas jurídicos em relação a isso, embora nossos juristas vão
dizer que há problemas jurídicos em relação às convocações da Assembléia
Constituinte, nada mais, nada menos do que se fez em 1985. Em 1985, houve
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exatamente isso. E lembrem-se de que Flávio Bierrembach era o Relator da
Comissão Especial para convocação da Assembléia Constituinte e a queria
exclusiva, que era o projeto da OAB. Lembram-se disso? Foi derrotado por
Tancredo Neves. O Dr. Tancredo, que se movimentou junto com o Dr. Ulysses e
com o Presidente Sarney para estabelecer uma convocação de uma Assembléia
Constituinte que fosse congressual. Isso foi uma decisão política vitoriosa na época.
É difícil raciocinar, Deputado Custódio Mattos, com categorias político-
históricas que se transformaram em categorias jurídicas oriundas de outros Estados,
cujo processo histórico é outro. Não tivemos ruptura. O nosso processo sempre foi
de conciliação. No momento em que chegávamos à ruptura, era feita uma
negociação. Isso aconteceu com Getúlio Vargas.
Em 1945, cai Getúlio; vem o regime constitucional. Quem é o Presidente da
República? O Ministro da Guerra do antigo ditador. Quem foram os Governadores
dos Estados? Os antigos interventores, como Benedito Valadores. No Rio Grande
do Sul, foi meu avô, que era oposição ao Getúlio, mas tinha uma conciliação com ele
no processo eleitoral, apoiado pelo Partido Comunista.
Esse processo, Deputado Custódio, dá-nos a seguinte noção: vamos
trabalhar a partir da história que temos, e não da história que importamos. Se você
disser isso na Academia, vão ficar horrorizados porque nosso processo histórico
julga dessa forma.
Agora, quando, em 1986, discutimos a elaboração da Constituição, o que
tínhamos? Uma grande discussão que passava pelo entendimento. Conseguiram-se
avanços extraordinários na Constituição de 1988 sobre direitos e garantias
individuais e sobre modelagem. No que diz respeito ao modelo de Estado,
reproduzimos basicamente o modelo anterior. Não houve grandes modificações em
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relação ao modelo anterior. As discussões que se estabeleceram foram aquelas
velhas discussões que não foram resolvidas: a das pretensões dos Estados do Sul e
do Sudeste no sentido de aumentar a representação em relação dos Estados do
Norte e do Nordeste. O acordo feito para a criação de Tocantins foi algo
curiosíssimo.
Goiás concordou com a criação daquele Estado, desde que não fosse
reduzida a bancada de Tocantins. V.Exa. lembra-se disto. Concordamos que se
fizesse isso, desde que a União não tivesse de pagar por isso, já que o antigo
Governador, Íris Rezende, queria cobrar de Tocantins os ônus e os investimentos lá
feitos — e cobrar do contribuinte brasileiro. Isso tudo se resolveu. Agora, a
convocação de uma Assembléia restrita ou não é um problema a ser decidido. O
processo histórico nós temos, modelos históricos também.
Por último, quanto à reforma mais viável, digo que essa coisa de reforma mais
viável ou menos viável é o tipo da pergunta a posteriori, e não a priori. A priori,
seria — diria de uma forma muito clara — o achismo. Cansei de achar. Já estou um
pouco mais velho para isso. Já achei muito que se tinha de fazer isso ou aquilo.
Vamos fazer o que é possível, porque este é o débito da nossa geração. Acontece
que, às vezes, queremos ser o herói da nossa geração. Sendo heróis da nossa
geração, só queremos marcar posições e não queremos mudar.
Se os senhores quiserem marcar posições, façam os discursos mais radicais
no sentido da mudança. Não vai acontecer nada, mas ficará registrado nas suas
biografias o fato de terem feito o discurso, sem o compromisso histórico com o
avanço. O compromisso histórico com o avanço está manifesto inclusive numa
posição moderna do Deputado Haroldo Lima, que está concedendo algo que, em
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1986, era impensável para o Partido Comunista do Brasil: a discussão da cláusula
de barreira.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – O próximo bloco será
composto pelos Deputados Saulo Pedrosa, Vivaldo Barbosa e Virgílio Guimarães.
Com a palavra o Deputado Saulo Pedrosa.
O SR. DEPUTADO SAULO PEDROSA – Louvo a atitude do Presidente desta
Comissão de convidar o Ministro Nelson Jobim para aqui transmitir sua experiência,
especialmente passando-nos a impressão de advogado do diabo quando suscita
uma série de questões para nossa reflexão na reforma política. Gostaria de me ater
à questão da ordem dos candidatos na votação eletrônica, para ouvir de S.Exa. a
procedência ou não da minha observação, uma vez que essa ordem, ao que me
parece, é mais uma vaidade do legislador e não corresponde à noção de
importância que o eleitor tem da ordem dos candidatos.
Digo isso porque, na eleição de 1998, quis até divulgar propaganda no meu
Município mostrando para o eleitor, visualmente, como seria a votação eletrônica, a
fim de que, quando se defrontasse com os eletrônicos, sentisse que tudo estava
mais ou menos de acordo com a propaganda política. Primeiro, estava o nome do
Deputado Estadual, depois o do Deputado Federal, e assim sucessivamente. Na
época, o Prefeito não permitiu que se fizesse essa propaganda. Foi preciso fazer
propaganda de muro, colocando-se primeiro o Presidente, depois o Governador, em
seguida o Deputado Federal e por último o Deputado Estadual. Isso, no meu
entendimento, gerou transtorno para o eleitor e causou alguns problemas,
apontados no resultado da votação eletrônica.
Sob a ótica do eleitor, ele primeiro quer votar no candidato mais importante.
Em Barreiras, na eleição municipal, por exemplo, o eleitor vai votar no candidato de
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nº 45, que é do meu partido. Ele vota primeiro no de nº 45, pensando que vai votar
no Prefeito. O que acontece? Anula o voto do Vereador, e isso conta para a legenda.
Por isso, o resultado final, na minha avaliação, foi um grande voto de legenda, com
diminuição dos votos para candidatos a Vereadores ou mesmo a Deputados.
Gostaria de ouvir o comentário do Ministro sobre a procedência ou não dessa
minha avaliação.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Deputado Vivaldo
Barbosa, tem V.Exa. a palavra.
O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Sr. Presidente, Srs. Deputados,
Sr. Ministro Nelson Jobim, é evidente que o convívio e a luta comum, que geraram
amizade muito intensa, fazem com que o diálogo não se torne ortodoxo, do ponto de
vista da relação Poder Judiciário/Poder Legislativo.
Gostaria muito de poder comentar as diversas questões que V.Exa., com o
brilho da sua exposição, nos trouxe hoje. Registro apenas a coincidência de
algumas lutas antigas comuns e da apreciação crítica do processo político eleitoral
brasileiro. Quero, apesar de não ter tempo, polemizar um pouco em relação a essa
última questão, do poder constituinte brasileiro e da miniconstituinte.
É evidente, Ministro, que a independência, qualquer que tenha sido a forma
da Constituição daí derivada, tem o poder constituinte. A República teve um poder
constituinte, não importando qual tenha sido a forma de elaboração da Constituição.
A Revolução de 1930 também carregou um poder constituinte, bem como o próprio
término do Estado Novo e o Golpe de 1964. A nossa Constituição — trabalhamos
nela na nossa Constituinte também —, que pôs fim ao regime militar e autoritário,
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carregou um poder constituinte iniludível, embora as formas não tivessem esse corte
categórico cristalino que V.Exa. invocou.
Quero exatamente aproveitar a presença do Ministro para discutir o problema
da urna eletrônica. Aqui, infelizmente, não encontrei as coincidências encontradas
nas outras questões eleitorais. Primeiramente, o Ministro trouxe-nos certo terror, que
paira sobre nós. Assim como o Senador Roberto Requião esteve aqui hoje, fui ao
debate de V.Exa. no Senado. Fiquei um pouco impressionado, no diálogo com o
Senador sobre a questão da urna eletrônica, quando se propôs uma conversa no
Tribunal Superior Eleitoral, ao ver V.Exa. dirigir-se a ele e dizer: “Eu o receberei
amavelmente, vamos tomar um cafezinho, mas leve os técnicos. Quem vai decidir as
questões são os técnicos". Realmente fiquei muito chocado com isso. A
Magistratura, o Congresso e o partido político não têm mais a ver com a lisura do
processo eleitoral. São os técnicos que vão discutir a questão.
Ministro, V.Exa., em entrevista que deu outro dia — e trouxe hoje sua
proposta de fazer isso em conjunto com o Senado —, disse que a questão da urna
eletrônica, diante desse rumoroso caso do Senado, ia ser resolvida por um laudo
dos técnicos da UNICAMP. A Magistratura e os partidos estão de fora. Os técnicos
da UNICAMP vão sacramentar o processo eleitoral brasileiro, e nós vamos nos
curvar ao seu gênio. Eles governarão um pouco a democracia.
Apelo a V.Exa. para que dialogue com os partidos sobre todos os impasses,
os problemas e deixe os técnicos tomando cafezinho. Depois eles poderão
implementar as decisões que venhamos a tomar.
V.Exa. também desconsiderou o rumoroso caso do Senado. Uma coisa nada
tem a ver com a outra. V.Exa. disse que o que aconteceu no Senado não tem a ver
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com a urna eletrônica. De acordo com o parecer dos técnicos da UNICAMP sobre o
painel do Senado, ele é suscetível a violação e adulteração.
O chefe do Serviço de Informática do TSE — não sei se ainda é o mesmo —,
que no ano passado esteve na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e
Informática, disse-nos clara e textualmente: “O fato sobre a impressão do voto que
estava ali não significa nada. Posso mostrar o João, imprimir o voto para o João e
registrar o voto para a Maria”. Em matéria de informática, ele diz: “Um voto dado a
João pode ser computado como dado a Maria”. É evidente que sabemos disso, mas
trememos com isso.
Uma das razões da Revolução de 1930 — é um tema muito caro para aquela
região de onde procede V.Exa. — foi o fato de não mais se poder deixar os mapas
eleitorais nas mãos das oligarquias daquele período. O Brasil não se consolidaria
como república avançada com aquele processo eleitoral chamado bico-de-pena.
Agora, é o bico-da-técnica. Vamos acatar essa decisão e nos submeter a ela?
O regime militar já nos tirou a cabine indevassável. Realmente, Ministro,
nunca me conformei com isso. No mundo inteiro há aquela cortininha, e o TSE
justifica que não tem dinheiro para colocá-la, isolando o cidadão naquela hora, mas
tem milhões para as urnas eletrônicas. Não conseguimos restabelecer a cabine
indevassável, necessária para a reflexão do eleitor, e agora temos o voto invisível.
Não se vê o voto, não se sabe o que acontece com ele. Apura-se rapidamente — é
a apuração mais rápida do mundo, mais eletrônica do mundo —, e em poucas horas
temos o resultado. Acabou tudo, ficou tudo invisível, não há nem mais Magistratura
para mostrar as provas. Não há prova, aquilo desapareceu por completo.
As regras que a lei atual determina para a urna eletrônica são muito singelas.
O art. 59 tem três parágrafos; os arts. 60, 61, 62, um parágrafo único. V.Exa. fez um
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clamor hoje: “Por favor, dêem-nos regras jurídicas. Não deixem os juízes decidirem,
porque eles decidem depois do jogo jogado”.
É preciso que estabeleçamos regras jurídicas para funcionamento da urna
eletrônica. Nesse caso, infelizmente, não serão os juizes, mas os técnicos que
preencherão esse vazio. O juiz já seria, como V.Exa. disse, o menos indicado. Veja
como a Suprema Corte americana arbitrou a eleição americana — a maior potência
do país —, depois do jogo jogado. Os técnicos é que preencherão o imenso vazio
legislativo, e isso não podemos tolerar.
Deixo um apelo a V.Exa. no sentido de que possamos dialogar com os
partidos políticos. Depois, vamos criar as regras e as ordens para serem executadas
pelos técnicos. Vamos tentar fazer disso um processo passível de fiscalização, de
transparência, com regras definidas, e procurar manter o voto vivo, uma coisa
espetacular, emocionante. Ainda mais quando votamos em nós mesmos, fazemos
isso com muita emoção. Aliás, é especial sempre, desde o primeiro voto que damos.
É emocionante colocar um voto na urna. Vamos manter a urna eletrônica, mas
também a visibilidade do voto, para que possa haver conferência e provas, Ministro,
a fim de que a Magistratura possa decidir em cima de análise concreta, factual. Do
jeito que está, desaparece tudo, fica tudo invisível, e a verdade eleitoral ficará
efetivamente questionada. A questão do painel eletrônico do Senado Federal foi
uma advertência séria para nós. Lá, também o voto era invisível. Lá também
desaparecia tudo, não haveria problema algum, até que ele aconteceu.
Peço a V.Exa. que reflita sobre o assunto. Há propostas que fizemos a esse
respeito. Talvez V.Exa. diga que eu sou o único dos interventores a levantar essa
questão. A Oposição não está unida na próxima eleição, nem na urna eletrônica.
Estamos muitos separados. Um Deputado do PT chegou aqui e realmente fez a
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glorificação da urna eletrônica. Estamos separados em relação a isso. Mas,
especialmente agora em que temos oportunidade de inaugurar regras que nos dêem
tranqüilidade e a felicidade de contar com V.Exa. exercendo essa função, temos
condição de aperfeiçoar o processo eleitoral, em memória dos nossos
antepassados, porque valeu a pena fazer uma revolução para defender a lisura do
processo eleitoral.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Obrigado Deputado
Vivaldo Barbosa.
Concedo a palavra ao nobre Deputado Virgílio Guimarães por três minutos.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Sr. Presidente, Ministro Nelson
Jobim, até me inscrevi para discutir outro assunto, mas, diante da provocação do
Deputado Vivaldo Barbosa, não deixarei de falar sobre a questão da urna, mesmo
porque há algumas propostas em relação a isso.
A urna eletrônica veio para ficar, porque é um enorme avanço em todos os
sentidos. Ela é vulnerável? Claro que pode ser. Mas temos de lembrar que o voto no
papel era muito mais vulnerável, até no que se refere à possibilidade ou não de
haver a verificação, porque o partido que não estivesse ao lado da urna durante o
fechamento, em cada uma das milhares e milhares de seções existentes no Estado,
perdia a oportunidade. Já vivi isso. Já perdi uma eleição estadual por 0,26% de
votos e constatei que, entre quatorze candidatos, havia sete que faziam campanha,
que só colocavam aqueles video home, que havia na época, em 1994. Mas nos
Municípios em que não havia fiscalização, fiquei em último lugar — décimo quarto,
décimo terceiro. E não pude fiscalizar, porque só quando saiu o relatório é que vi
que isso havia acontecido.
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No que se refere ao que o Deputado Vivaldo Barbosa aponta como defeito,
desvantagem da urna eletrônica, não se tem garantia também em relação à cédula,
a menos que se tenha um fiscal ao lado de cada mesa apuradora. Senão, perde-se
o prazo para impugnar aquela urna determinada.
Então, quais os aperfeiçoamentos que temos de fazer, Ministro Jobim? V.Exa.
lembrou bem. Aquela fitinha que saía da máquina de somar podia sair também como
relatório do tribunal, a respeito das urnas eletrônicas. Temos o relatório emitido
pelas mesas, mas depois só temos a totalização. Se na totalização apresentada pelo
TSE viesse o resultado, urna por urna, já haveria possibilidade dessa conferência.
Nos lugares em que ocorresse dúvida, jogar-se-ia o relatório que deu "seção tal,
tantos votos", com o boleto que sai ao final da apuração, que é o chamado Boletim
de Urna — BU. A ausência desse relatório dá-nos uma insegurança muito grande.
Até porque, acredito que, caso haja dúvida, esta não será sobre o voto. Ela pode ser
verificada na perícia feita na urna eletrônica, no programa que está ali embutido.
Isso pode ser feito. E se for o caso, impugna-se uma urna que porventura apresentar
problemas na sua programação.
Então, esse aperfeiçoamento parece-me importante, como talvez a inversão
da ordem de votação — votar primeiro nos candidatos ao Executivo. É uma
experiência que podemos fazer. Enfim, sou entusiasta da urna eletrônica e acho que
deveríamos trabalhar para o seu aperfeiçoamento, porque problemas faziam parte
também do voto no papel.
Gastei três minutos nessa questão, porque fui provocado, de certa maneira,
pelo nosso Presidente da Frente Parlamentar de Defesa do Brasil, Deputado Vivaldo
Barbosa. Permita-me discordar de S.Exa. na forma e concordar na essência; ou
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seja, é necessário procurar aperfeiçoamentos e resgatar, dentro do novo modelo,
até a possibilidade de conferência.
Na verdade, Ministro Jobim, quero discutir a questão central da sua
exposição, que é o voto no nosso sistema eleitoral. V.Exa. falou das inconveniências
do voto nominal, e eu poderia acrescentar várias outras. No afã de constituir massa
de votos, coeficiente eleitoral, os partidos procuram inclusive aceitar a inscrição de
muitas pessoas, de qualquer tipo de gente que possa trazer voto, até para completar
a lista. E isso, às vezes, causa uma imagem terrível aos políticos, porque existem
coisas as mais absurdas. E o partido é constrangido a isso.
Outras vezes, o partido é importante, mas não consegue chapa porque
alguém que analisa diz: “Bom, a competição é difícil para mim, procure outro”. Ou
seja, a fidelidade ao partido não existe na hora da inscrição. O eleitor não consegue
verificar o desempenho individual, até porque a maioria dos eleitores não votou em
alguém eleito. Fiz essa conta na Assembléia Legislativa de Minas Gerais e percebi
que pouco mais de 30% dos eleitores mineiros votaram em algum Deputado
Estadual eleito; os outros dois terços votaram em branco, ou em legenda, ou em
alguém que foi derrotado. Então, como fiscalizar alguém que você elegeu, se a
maioria sequer o elegeu? Um ano depois, a metade já esqueceu. Cai a fiscalização.
A proposta que trago, para tentar superar também os inconvenientes do voto
em lista fechada, que é a hipertrofia da burocracia partidária, da nomenclatura, como
bem denominou V.Exa, é uma espécie de voto duplo, mas que não caminha na
direção da mesma proposta do Senador Roberto Requião. Devíamos trazer a
verdade eleitoral. O eleitor, na verdade, dá dois votos: um voto para o partido ou
coligação — saiba disso ou não, seu voto é computado — e um voto para a pessoa.
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Acho que isso devia ser explicitado. O eleitor dá dois votos. Um voto seria para o
partido, na legenda ou na coligação, e que iria definir a composição, a distribuição
proporcional. Então, todos seriam obrigados a fazer campanha do partido.
O SR. NELSON JOBIM – Vinculado esse voto?
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Não. Sem vinculação.
O SR. NELSON JOBIM – Quer dizer, vota na legenda e pode votar em um
outro candidato.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – De acordo com o sistema
americano, em que qualquer eleitor pode interferir na escolha dos candidatos do
partido republicano e do partido democrata. Na maior parte dos Estados é assim.
Não haveria vinculação, Ministro, nessa minha proposta. O eleitor escolheria
o partido cuja representação quer ver e depois participaria da convenção, digamos
assim, escolhendo a ordem de cada partido. Mas aí o que ocorreria na
desvinculação? Ninguém faria campanha isolada. Até porque, se ficasse muito
isolado, fazendo a campanha individualmente, correria o risco de ver a sua legenda
fazer poucas vagas. Então, a pessoa teria necessariamente de ser mais partidária
na hora da campanha.
Inclusive, Ministro, isso poderia resolver a questão da cláusula de barreira. O
que todos querem na verdade? Preservar os partidos ideológicos, os que têm
proposição, que têm história, e evitar os partidos de aluguel. Só que o partido de
aluguel quase que tem mais força do que o ideológico, porque é uma atração muito
grande. É atraente compor uma chapa, ter um caudilho municipal, fazer uma
distribuição por várias chapas e eleger dois em uma, dois em outra. Mas se o eleitor
tiver de votar no partido, se esse tipo de partido de aluguel que hoje faz legenda,
porque faz uma chapa razoável, tiver de se credenciar através de um ação
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consciente do eleitor de votar naquele partido, ele corre o risco de ter uma boa
chapa, mas não fazer o quociente. Então, por esse lado, conseguiríamos também
separar o partido de aluguel do partido com base ideológica ou programática, que
procura consolidar-se enquanto legenda real. O de aluguel teria de consolidar-se na
consciência da cultura política daquele Município, daquele Estado, para angariar os
votos.
Seria uma solução também, Ministro, para a questão do financiamento de
campanha. Poderíamos ter o financiamento público exclusivo, sem qualquer tipo de
concessão para os candidatos majoritários e para as campanhas partidárias, e
chamaria o voto para a composição das bancadas. A disputa interna ficaria livre, ou
seja, o partido é que iria fiscalizar se alguém está praticando abuso para passar na
frente do outro. Poderia haver algumas normas também, mas a captação individual
só afetaria nesse caso a disputa pela classificação interna na lista de cada partido.
Essa é a minha sugestão. Peço-lhes que reflitam sobre isso, para não ferir
inclusive a cultura política brasileira, que é ter esse misto entre o voto nominal e a
distribuição proporcional.
Sr. Presidente, finalizando, já vejo que V.Exa. tem toda razão de levar a sério
a tarefa que lhe cabe: fiscalizar os que se excedem, sem perder a paciência.
Teria outras questões, mas não vou abordá-las. Creio que talvez esse seja o
caminho, a solução. O único inconveniente que vejo é que é difícil mudar o sistema
eleitoral. Em princípio, quem vota é quem está aqui; e quem está aqui foi eleito pelo
sistema atual. Mas ele não muda tanto, aperfeiçoa-se.
Esse gesto de desprendimento do Parlamento será uma contribuição
histórica, porque, de fato, o sistema urge mudanças. E o sistema eletrônico já
viabiliza com muito mais facilidade esses sistemas mistos do que o sistema de
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cédulas. Portanto, creio que até o sistema eletrônico, hoje, viabiliza a implantação de
um avanço como esse que ofereço à consideração de V.Exas.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Com a palavra o
Deputado Jairo Carneiro.
S.Exa. dispõe de três minutos.
O SR. DEPUTADO JAIRO CARNEIRO – Sr. Presidente, nobre Relator,
prezado Ministro, reafirmo o meu apreço e a minha admiração por V.Exa..
Vou abordar questões pontuais, sem prefixação de uma posição pessoal.
V.Exa. fez um diagnóstico provocativo muito feliz, e nessa linha de raciocínio
também quero levantar algumas questões. V.Exa., com suas interrogações, oferece
a esta Casa e a esta Comissão Especial a sua contribuição, mesmo que não sejam
as teses ou as verdades definitivas e absolutas. Mas será enriquecedor para o
trabalho da Comissão.
Há muitas interrogações sobre fidelidade partidária e tantos outros itens que
foram elencados por V.Exa. E também, se não nesta reunião, em outra
oportunidade, houve manifestações acerca de imunidade e reeleição, dois temas
que, creio, também fazem parte das discussões desta Comissão — é o que
presumo, não sendo membro dela.
Falou-se aqui sobre sistema eleitoral, sistema partidário. Creio, mesmo sem
convicção formada, que não temos no País nem sistema eleitoral, nem sistema
partidário, dentro de uma configuração conceitual que mereça respeito. Muitos
dizem — o que a mídia explora e distorce — que aqui se faz qualquer negócio. E
esse é um dos pontos negativos na visualização do julgamento da classe política,
acarretando perda de prestígio e de credibilidade e desmoralização, às vezes
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intencional, de setores que são contrários ao amadurecimento e ao fortalecimento
da democracia. Não faço coro a essas pessoas, mas precisamos ter estrutura,
arcabouço de uma legislação que deva ser permanente, para que não estejamos
fazendo uma lei a cada véspera de eleição.
Quanto à fidelidade partidária, à cláusula de barreira, ao financiamento de
campanha e a tantos outros pontos, penso que deva haver uma legislação com
princípios e regras duradouras, num país que se proponha a amadurecer e a
respeitar o jogo político na democracia.
Então, espero que as contribuições de V.Exa. e a lucidez do nobre Relator,
Deputado João Almeida, que está colhendo todos os subsídios, possam trazer a
esta Casa e ao Congresso Nacional, de modo geral, uma luz diferente da que temos
até agora, particularmente no que se refere às disputas eleitorais. Não será a
conveniência que irá decidir que a regra para a eleição de amanhã será a “a” e para
a eleição de dois anos após será a “b”. A conveniência deve acontecer dentro de um
mínimo de ética, de um pragmatismo que seja sadio. Não devemos ser joguetes
para atender ao partido que hoje é pequeno e se torna maior na eleição e que, a
partir daí, vai querer que as regras atendam ao seu interesse ou ao interesse das
forças coligadas.
Vejo com certa tristeza situações que vivemos no dia-a-dia da nossa lide
política. Na campanha para Prefeito de uma cidade temos uma coligação dos
partidos “a”, “b” e “c”. Na disputa para a Prefeitura do Município vizinho, distante
apenas 30 quilômetros, a coligação já é outra, completamente diferente. Aqueles
partidos “a”, “b” e “c”, que na primeira cidade se dizem amigos e irmãos, na segunda
cidade são inimigos, rivais. Isso é um desapreço para a atividade político-partidária.
Acho que a instância superior de deliberação de um partido, em âmbito nacional,
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tem de fixar as regras. Se elas não forem fixadas em lei, que venham nas decisões
das instâncias superiores, nacionalmente, ditando quais são os princípios que
norteiam a formação, a celebração de alianças e de coligações. O PT e o PFL não
podem fazer aliança em uma cidade e ser rivais frontais em outra. E isso acontece
no Brasil. Citei o PT por citar, mas poderia ser qualquer partido deste País. Isso,
para mim, é um desapreço para a nossa atividade. Que juízo o cidadão comum e a
mídia fazem dos políticos e dos partidos? Não existem os partidos.
As conveniências das pessoas meramente ditam que a aliança aqui vai ser de
tal modo. O partido faz uma coligação para a eleição para Governador, e o Prefeito
diz: "Sou do PTB, estou em coligação apoiando o candidato a Governador do PL,
mas vou votar no candidato do PSDB, na minha cidade, para o Governo do Estado".
Isso é uma vergonha! Precisamos de uma legislação com caráter, com padrões
básicos, que seja a espinha dorsal de um sistema.
Levantei esse ponto, mas poderia ter levantado tantos outros para a
apreciação do nobre Ministro, que muito respeito. Precisamos de um mínimo de
ética na convivência da vida pública. A meu ver, estão faltando 100% nessa
referência que faço e submeto à consideração de V.Exa., Sr. Ministro.
Sobre a candidatura nata, é preciso saber quem vai decidir se o cidadão que
hoje é Vereador, Deputado Estadual ou Federal vai poder ter a sua candidatura
assegurada ou não. Se será ao arbítrio do detentor momentâneo do domínio do
partido ou haverá motivação, fundamentação, instituindo a lei quais serão os
requisitos para que alguém seja afastado da disputa, sem evitar ou impedir a
apreciação do Poder Judiciário — se ele está sendo alvo de alguma vindita, se é um
desafeto e está sendo vitimado, penalizado, porque não faz parte do coro de quem
domina o partido naquela região. A lei tem de resguardar e defender os interesses
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legítimos do cidadão, mesmo que na atividade política não seja esse um direito
individual.
Quanto à questão de financiamento de campanhas, foi citado pelo Deputado
Vivaldo Barbosa, embora S.Exa. não tenha exteriorizado isso da tribuna, que os
percentuais devem ser assegurados na lei para as candidaturas proporcionais, se
aceito o financiamento público, não deixando também à discrição de quem comanda
o partido em um determinado Estado o destino do recurso, que pode ir apenas para
a campanha do Governador e do Senador.
Há vários caminhos, e a contribuição de V.Exa. será fundamental. Por isso,
levanto essa questão, mas lhe peço que encaminhe essas contribuições, tendo em
vista sua experiência e seu talento.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Com a palavra o último
orador inscrito, Deputado Antônio Joaquim Araújo.
S.Exa. dispõe de três minutos.
O SR. DEPUTADO ANTÔNIO JOAQUIM ARAÚJO – Sr. Presidente, Sr.
Relator. Sr. Ministro Nelson Jobim, quando se organiza uma Comissão é porque se
quer aprimorá-la, e todos estamos aqui com esse objetivo. A vinda de V.Exa. a esta
Comissão, como ocorreu também no Senado, demonstra o interesse em se
aprimorar o sistema político brasileiro.
Peço até desculpas por ter chegado atrasado. Meu vôo atrasou e não pude
chegar a tempo.
Quero tratar especificamente de um assunto comum no meu Estado, o
Maranhão. Trata-se do problema do título eleitoral. Tenho certeza de que vamos
chegar a um ponto, no futuro, em que o eleitor poderá até votar como hoje se vota
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na Câmara dos Deputados, com a impressão digital, para que não haja fraude. Mas,
hoje, o título eleitoral não assegura que quem está votando é o dono desse título.
Esses casos têm sido detectados com muita freqüência. É comum pessoas votarem
no lugar de outras que são analfabetas. Votam colocando a sua impressão digital no
lugar da do analfabeto, porque a mesa receptora não tem como averiguar se
realmente aquela impressão digital é a do dono do título.
Sr. Ministro, desejo acrescentar essas questões às suas preocupações.
Tenho percebido que V.Exa. possui uma memória fenomenal. Hoje, todo brasileiro
sabe usar o cartão magnético. Alguns aposentados até já possuem cartão
magnético. Essa seria a oportunidade de implantá-lo, pelo menos num primeiro
momento. Nessa reforma política, como ela é muito importante, há assuntos que vão
ser discutidos com maior profundidade, há situações que vão ser abordadas como
fatos transitórios. Vamos instituir aqui leis que serão usadas transitoriamente, como
foi aqui sugerido. Precisamos implantar outras leis imediatamente.
Apenas para ilustrar, quero citar que há pouco tempo não havia fotografia na
carteira de habilitação, porque ela foi retirada. Depois de uma avaliação, foi
detectado o grande erro de ela haver sido retirada, e voltou a ser estampada na
carteira, que passou a ser mais completa, até contendo outras informações. Se
inserirmos a fotografia em um cartão magnético, o presidente da mesa não precisará
estar abrindo o sistema para que possamos votar. Agora, o eleitor não sabe se ele
abriu ou não, se votou ou não, porque não tem como avaliar essa situação. Talvez o
cartão magnético pudesse ser o instrumento para proceder à abertura da urna
eletrônica.
A urna eletrônica foi uma avanço fenomenal. Estamos aqui para aprimorá-la.
Minha contribuição será no sentido de verificar se, pelo menos num primeiro
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momento, é possível introduzirmos no cartão magnético a fotografia, para que a
mesa possa detectar que aquele que está votando é realmente o dono do título.
Era essa a minha contribuição.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Passo a palavra ao nobre
Relator, Deputado João Almeida. Em seguida, ouviremos as considerações finais do
Ministro Nelson Jobim.
O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA – Sr. Presidente, optei por me expressar
ao final, e o tempo já se foi. Mas foi bom. Todos os companheiros contribuíram.
Afinal, o papel do Relator é o de ter sensibilidade para organizar a maioria. Não é o
de ficar aqui questionando, debatendo com as pessoas. Mas há alguns pontos que
não posso deixar de registrar.
Assim sendo, peço ao Ministro Jobim que se estabeleça ainda — para
tranqüilizar todos os membros da Comissão — um cronograma, que possamos
perseguir, em relação a essa decisão que tomamos conjuntamente de promover a
auditoria do sistema eleitoral por urnas eletrônicas, o sistema de recepção de votos
através de urnas eletrônicas.
Temos três etapas. A primeira é a de auditagem, que será feita pela
UNICAMP. A segunda é a da discussão dos resultados — e acho que o Deputado
Vivaldo Barbosa laborou um pouco em equívoco aí — desses relatórios e dessas
opiniões, que faremos aqui um dia, talvez, com a participação de Deputados,
Senadores, representantes dos partidos políticos e técnicos que queiram participar.
Vamos ouvir a apresentação do relatório e discuti-lo, perquiri-lo, propondo
alterações. E a terceira etapa é a da elaboração da norma legal, que pode ser
eventualmente por lei ou por resolução do Tribunal, com nossa plena aquiescência,
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depois de discutirmos. Veremos o problema processual. Então, desejo saber se
podemos, desde logo, estabelecer essas questões.
Quero prestar duas informações. O assunto de cláusula de barreira tem sido
discutido com a visão distorcida. A maioria dos países usa a cláusula de barreira
para eleição. Estamos aqui tratando de cláusula de desempenho para o
funcionamento parlamentar. É em outra etapa. Então, não podemos comparar uma
coisa com a outra.
Sobre o valor de 5%, 3% ou 4%, poderíamos ter adotado o processo de
evolução de 2% para 3% para 5%, no horizonte. Há quase dez anos, decidimos que
fixaríamos um horizonte para que as coisas acontecessem, os partidos se
acomodassem à nova realidade constitucional e democrática que estamos vivendo
no País. Naquele momento, então, estabeleceu-se o quociente de 5%. Perseguimos
esses passos por outro caminho, e aqui também não seria demais nem exótico dizer
que oito partidos superaram os 5% na eleição de 1990. Na eleição de 1994, oito
partidos superaram os 5%. Na eleição de 1998, sete partidos superaram os 5%. E
com uma qualidade: partidos que numa eleição superaram, em outras não
superaram; partidos como o PT, que antes disso não atingiram esse percentual de
forma nenhuma, tiveram a capacidade de se enraizar na população de tal forma que
conseguiram depois, seguidamente, os 5%. Partidos como o PTB, que nessa nova
versão é um partido novo, conseguiram os 5%.
Então, haveremos de distinguir sempre entre partidos que conseguem
mobilizar a população e partidos que não conseguem. E a proposta que se discute
hoje é muito nesses termos, não é em termos ideológicos, nem de grande ou de
pequeno, dos que são capazes de obter apoio popular e dos que não têm
capacidade de obtê-lo. O avanço em passos também foi testado aqui. Triste
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resultado! É da nossa cultura, Ministro. Por isso, estabelecemos esse horizonte para
chegar lá com esse valor.
O sistema de coligações foi evoluindo em dois momentos, sistematizando as
coligações, que eram aquela aberração. Depois, com a mudança dos membros da
Comissão e do Ministério, nós retrocedemos. Já estávamos num sistema de
coligação que vinculava partido coligado em âmbito nacional, podendo repetir,
vinculando a candidatura majoritária, como alguém falou aqui. Na última eleição,
mudaram o Relator — a cada eleição mudam — o Presidente, a composição,
voltando-se à esbórnia de sempre.
Como relatou o Deputado Jairo Carneiro, fala-se mal de um candidato em um
Município e se viaja dez minutos de carro até o Município vizinho para dar glórias ao
companheiro de chapa, ilustre e glorioso Deputado combatente, que foi desgraçado
no comício anterior, no Município vizinho.
Então, isso também não funcionou. Quer dizer, são coisas da nossa cultura,
que precisamos ter sempre presente quando tratamos da legislação eleitoral e
partidária.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Ministro, V.Exa. tem a
palavra.
O SR. NELSON JOBIM – Começo pelas considerações do Deputado Saulo
Pedrosa, que mostraram dissonância entre a campanha eleitoral e a ordem de
votação na urna. Na campanha eleitoral aparece como privilegiado o candidato
majoritário; depois, menos privilegiado, o candidato a Senador; em seguida, o
candidato a Deputado Federal; e menos privilegiado ainda, o candidato a Deputado
Estadual. Na urna eletrônica, dá-se o contrário: começa-se pelo Deputado Estadual
para se chegar ao Governador.
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Ora, eu não diria que é por vaidade do legislador, conforme afirmou o
Deputado, mas por uma questão técnica. Se é verdade que o eleitor pretende votar
na eleição majoritária, se seu objetivo é ela, a legislação eleitoral estabelece que
para chegar lá tem de votar na proporcional. Se votar na majoritária antes, poderá
não votar na proporcional, ou votar em branco.
São duas lógicas distintas: uma, a de produzir o voto, que é a campanha para
a majoritária; a outra, a de assegurar a votação na proporcional. É uma opção que
os senhores fizeram. Acho que é tecnicamente ajustada a essa pretensão brasileira
do voto presidencialista, ou seja, do voto plebiscitário ao candidato majoritário.
Observem bem: pelo menos parte da lógica da escolha de candidatos está
na circunstância de que o candidato majoritário é uma locomotiva em relação aos
votos proporcionais. Tanto é verdade que, nas coligações majoritárias, sempre a
disputa é em cima do partido que terá o candidato a Governador, ou a Presidente,
ou a Prefeito. Por quê? Porque eles acham — e a lógica e a história mostram isto —
que o partido que tem o candidato majoritário na coligação acaba sendo o vitorioso,
eventualmente, na coligação proporcional. Esta é a realidade. Para mudá-la,
teríamos de alterar a lógica do sistema presidencial, o que não é o caso. Dentro do
sistema presidencialista, a eleição é basicamente plebiscitária. E aí se atrela, em
cima da lógica do sistema plebiscitário, na majoritária, levando à proporcional.
Deputado Saulo Pedrosa, V.Exa. gostaria que a propaganda fosse
mostrando primeiro os candidatos proporcionais e depois o majoritário. Isso nunca
será possível, porque a propaganda visa obter votos. O que a urna eletrônica quer
assegurar, com essa ordem, é que o eleitor vote na proporcional, não importando
em quem irá votar. No outro caso o que se quer é que ele vote no candidato à
majoritária. Então, são pretensões, objetivos distintos, e essa dissonância vai existir
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sempre. Se V.Exa. inverter a ordem, pode dar o resultado contrário, ou seja, não ter
votos na proporcional, se votar depois. O eleitor vai embora ligeirinho, depois de
votar no Governador.
O Deputado Vivaldo Barbosa fez referência a um dado importante, que eu
gostaria de mencionar: a cabine indevassável. Hoje, com a urna de papelão, todo
mundo fica olhando. Além das alegações de que ficam os mesários tentando
adivinhar qual foi o voto dado — se o sujeito mexeu ou não com o braço; se votou
no nº 11, no nº 23, no nº 20; se mexeu com o braço para a direita ou para a
esquerda —, há o problema do constrangimento. Ao sentir que está sendo
observada, a pessoa erra, depois erra de novo. Outro fica inquieto na fila. Então,
cria, digamos, uma pressão psicológica externa. Temos de retomar realmente a
questão da chamada urna indevassável, a fim de que ninguém fique olhando para o
eleitor, e ele possa ter a tranqüilidade de votar, sem se sentir pressionado por
alguém que está na fila e que precisa pegar o ônibus para pescar no fim de semana
ou coisas do gênero.
Quero fazer-lhe uma confissão, Deputado Vivaldo Barbosa. V.Exa. fica cada
vez mais parecido com um grande líder do Partido Republicano Rio-Grandense.
Quando V.Exa. começa a falar em voto de bico-de-pena, em voto real, lembro-me
dos velhos líderes do Partido Republicano Rio-Grandense que ainda têm herdeiros
por todo o País. Quero dizer o seguinte, Deputado Vivaldo: sempre divergimos, mas
nos tratamos muito bem. A nossa divergência diz respeito a uma decisão que tem de
ser tomada politicamente pelos Parlamentares: ou temos voto eletrônico ou não.
Tentar estabelecer um casamento acaba não funcionando.
O Deputado Virgílio Guimarães referiu-se a um problema. Temos duas coisas
distintas na votação eletrônica: uma é o voto em si, outra é a apuração do voto. O
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que a urna eletrônica não enfrenta e não resolve é a formação da vontade do eleitor.
A formação da vontade do eleitor é problema da campanha eleitoral, que antecede a
votação eletrônica. As distorções decorrentes da campanha eleitoral, o abuso do
poder econômico etc. mexem na liberdade individual de opção do eleitor,
conduzindo-o a votar equivocadamente. Enfim, são situações provocadas por
motivos espúrios. Isso está fora do voto eletrônico, porque é problema relacionado à
formação da vontade do eleitor. Diz respeito à campanha eleitoral, às
inelegibilidades, à fidelidade e a um conjunto de situações.
Já com a urna eletrônica, temos o ato de votar e de apurar. Não tivemos, nas
eleições de 2000, problemas com a apuração. Houve, sim, reações momentâneas
referentes à morte súbita, decorrente do sistema imediato de resultado. É aquilo de
que já falei. Durante o processo antigo de apuração, o gato subia no telhado, e o
Virgílio e o Nelson já preparavam o discurso da derrota. Começavam a se justificar.
Quando vinha o resultado, já tinham o discurso pronto e o jogo jogado. E alguns
abandonavam antes, como no caso de 1982, que é a crítica que se faz. Mas a
apuração resolveu “n” problemas, como o do mapismo. Lembram-se daquele
problema que V.Exas. abordaram, da divergência de linhas? A linha começava aqui
e caía, porque o mapa era muito grande. O sujeito punha o voto em cima e
apontava para baixo, que era a média. Então, íamos discutir a média do voto. Havia
urnas com média de votos destoantes, o que autorizava o problema da recontagem.
O Deputado Virgílio Guimarães fez referência ao problema do protesto, qual
seja, na urna tradicional e também na urna eletrônica, eventualmente, teria de haver
uma fiscalização. Se o protesto não é feito na hora do voto ou da apuração, já exclui
a possibilidade de discutir a reeleição, o problema da recontagem.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Eletrônica, não...
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O SR. NELSON JOBIM – Não, não.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Na hora em que eu pego no
terminal, já acende o meu sinal vermelho. “Êpa, espere aí, vamos verificar o que
houve”.
O SR. NELSON JOBIM – Não, lógico, evidente.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Lá no terminal eu já sei o que
aconteceu no grotão.
O SR. NELSON JOBIM – Não, evidente. Então, V.Exa. tem elementos para
isso. A divergência com o Deputado Vivaldo Barbosa é exatamente uma divergência
básica. O paradigma do Deputado Vivaldo Barbosa é o voto vivo. A expressão é
sua; aliás, era a expressão de Maurício Cardoso, em 1937, quando se discutiu essa
questão.
Quero lembrar que a Constituinte de 1934 não se deveu propriamente à
Revolução de 1930, mas à de 1932. Foi a Revolução de 1932 que provocou a
Constituição de 1934. Na projeção de 1930 poderia ir mais longe a manutenção do
Estado excepcional.
Pois bem. Em relação a essas pressões feitas pelo Deputado Vivaldo
Barbosa, o que o Tribunal Eleitoral pretende não é fazer com que os técnicos
decidam, não é nada disso, mas ter uma visão, através dessa leitura, dessa análise
de todo o sistema. Uma auditoria externa — no caso, da Universidade de Campinas
— deve fazer a análise de todo o sistema e demonstrar o que há no sistema e o que
podemos agregar de confiabilidade a ele. Serão postas as alternativas técnicas, mas
a decisão tem de ser dadas pelos partidos.
Quero dizer a V.Exa., a propósito, que falei com o Presidente do seu partido
recentemente. E aguardo a recuperação do eminente engenheiro para termos um
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diálogo no Rio de Janeiro — já agendei com ele — e discutir com os partidos,
colocar as cartas na mesa, por uma simples razão: a Justiça Eleitoral tem dois eixos.
Um é o jurisdicional, em que nós decidimos o conflito ocorrido na eleição — e lá
estará o Deputado José Antonio, fazendo as sustentações aos seus clientes,
partidários ou não. Ali vamos decidir como juízes, no sentido de aplicar a lei que
V.Exas. fizeram, bem ou mal. Outra coisa é a Justiça Eleitoral como agência
realizadora de eleições. Não podemos aplicar, dentro dessa agência reguladora de
eleições, o critério decisório jurisdicional. Aqui se trata de ação administrativa. Daí
porque tenho dito claramente que, quando estou discutindo esses assuntos, não é a
partir da perspectiva jurisdicional. Às vezes, é verdade, alguns colegas juízes, que
não fazem essa distinção, acabam tratando a administração da eleição como se
fosse um processo jurisdicional, e aí dá problema .
Então, quero dizer ao Deputado Vivaldo Barbosa que teremos uma longa
discussão com os partidos, com o Congresso. Insisto em que essa Comissão a que
me refiro seja do Congresso e não uma Comissão exclusiva dos partidos políticos,
porque falta ancoramento institucional para termos essa Comissão de
acompanhamento. E aí trabalharíamos no sentido de tentar dar ao processo de
2002, à eleição de 2002 a segurança e a transparência que possam assegurar um
grau de confiabilidade. E poderemos, lateralmente, discutir também o paradigma. A
discussão do Deputado Vivaldo Barbosa já é sobre o paradigma, ou seja, que
modelo de urna, que modelo de sistema. Também queremos discutir isso, mas não
posso fazê-lo, Deputado Vivaldo, para 2002. Para 2002, tenho de trabalhar em cima
do que temos no sistema, agregando a ele mecanismos de transparência e
segurança. Mas quero discutir também o paradigma. Não tenho a mínima dúvida
em relação à necessidade dessa discussão. Haverá o diálogo dos partidos.
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Disse que a urna eletrônica e o painel do Senado são distintos por uma
simples razão: na urna eletrônica, o sistema é de contabilização; no sistema do
Senado, é de memorização. Tanto é que, no voto secreto, ficou a possibilidade de
se fazerem listas, obter o resultado da lista. São sistemas distintos. Há um sistema
de contabilização, que é o sistema da urna, em que se digita e se vai direto à
contabilização; não há nenhum intermediário. E no sistema de votação do Senado
há sempre uma memória intermediária em relação aos votos dados. Foi o que
aconteceu na violação do sistema. Houve violação do conhecimento do voto secreto,
não necessariamente violação dos votos produzidos. Não foi isso que se discutiu.
Quero dizer que, sobre esse sistema, temos condições, Deputado Vivaldo
Barbosa, de discutir amplamente com os partidos, com absoluta transparência,
porque o Tribunal Eleitoral e a Justiça Eleitoral não são donos do sistema. O
sistema é para a Nação. Ela é a consumidora. Nós somos apenas gerentes na
administração desse agenciamento de eleições e como tal temos de nos comportar.
Nossa responsabilidade é advertir V.Exas. sobre as conveniências e
inconveniências. Porém, se V.Exas. decidirem que querem voltar para a urna
tradicional, nós voltaremos, e não vamos fazer nada em relação a isso, embora
pense que temos de avançar. E avançaremos, temos espaços para isso. O que não
podemos é tratar esse tema partidariamente, dizendo, por exemplo, que o PDT e o
PT, das Oposições, não estão unidos nessa questão. Não se trata de problema
partidário, mas da Nação. Ele não se define por linhas partidárias, mas sim por
linhas de procedimentos. É uma questão de processo, não é uma questão de
Oposição e Situação. É mais transparente. Por isso, estou dizendo que o Deputado
Vivaldo Barbosa é um lídimo representante do Partido Republicano Rio-Grandense.
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Deputado Virgílio Guimarães, gostaria de discutir esse sistema duplo. Tenho
algumas experiência e alguns estudos longos a respeito do tema. Há muito tempo
mexo com os sistemas eleitorais. Na verdade, hoje, talvez o maior especialista do
mundo em sistemas eleitorais seja um professor da Universidade de Heildeberg,
com quem tive vários debates durante esses dez anos. E no mundo há todas as
experiências possíveis em relação a isso. Não há grandes invenções a fazer.
Há vários problemas a serem examinados, e não podemos trabalhar em cima
da descrição do sistema. Temos de jogar o sistema para fazer projeções e
prospecções.
Quero colocar o Tribunal Eleitoral à sua disposição. Vamos nos sentar à
mesa, pegar esse sistema e jogar em cima de eleições anteriores, através de
projeções feitas por um programa de computação, e ver o que ocorre, para
sabermos onde é que estamos nos enfiando. Na verdade, os sistemas são
escolhidos não pela consistência de princípios, mas sim pelos resultados.
Gostaria de discutir muito esse tema do voto duplo. É uma caminho de
transição. V.Exa. está produzindo uma transição. Não cai na ditadura da
nomenclatura, mas habilita as individualidades dentro do partido. Essa é exatamente
a discussão que se estabelece na Espanha. Numa discussão na Universidade de
Madri, tratamos exatamente disso.
Naquele momento, eles estavam discutindo a saída do voto de lista para a
entrada do voto proporcional. Por quê? Porque o voto de lista havia dado uma brutal
autoridade à nomenclatura do partido. Os personagens que viviam o processo
eleitoral queriam derrubá-lo e voltar para o voto nominal. Aí eu mostro as nossas
divergências. Então, temos de caminhar para um ajustamento.
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Por último, Deputados Jairo Carneiro, não tenha dúvidas de que todas as
suas observações são corretas. Sabemos que as coligações nas eleições municipais
eram um desastre para nós. Lembro-me, quando Deputado Federal, que precisava
ter cuidado ao sair de um Município para outro, a fim de fazer comício para
candidato a Prefeito. Tínhamos de receber uma lista para saber de quem é que
tínhamos de falar mal. Naquele Município não se podia falar mal do partido “a”,
apenas do outro, porque as disputas eram diferentes. Às vezes, trocávamos o papel
e era um desastre absoluto. Aconteceu comigo. Troquei a folha, e foi uma confusão
infernal. Por quê? Porque as coligações são feitas para a eleição. Coliga-se tendo
em vista a eleição, não o Governo. Essa é a lógica.
Quando termina a eleição, vejam o que acontece: elege-se o Prefeito —
vamos falar no Prefeito, que é menor — , naquele imensidade de disputas e ajustes.
Aí, o Prefeito senta na cadeira. O Presidente do partido chega lá e diz: “Vamos
discutir o secretariado”. E começa a necessidade da contratação da máquina
partidária para dentro do Governo. Aí, o Prefeito, que tem responsabilidades com o
Governo, começa a romper com a coligação e com o próprio partido. Por quê?
Porque o indicado que o partido quer para a Secretaria tal, que resolve uma questão
político-partidária, não resolve o problema administrativo que ele tem de enfrentar.
Imaginem agora, com a Lei da Responsabilidade Fiscal, como é que se faz isso. Ou
seja, esse tipo de modelo está morto. Em face da transparência, em face das
condições de investimento público que temos, está morto o modelo. E, na verdade,
precisamos discutir a questão de coligações. Mas as coligações se estabelecem
dentro da lógica do sistema eleitoral que temos. Não adianta romper o sistema de
coligações sem romper o sistema que deu origem à necessidade da coligação. É a
mesma coisa que introduzir externamente uma fidelidade partidária.
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Na exposição inicial que fiz, citei que o candidato eleito no Rio Grande do Sul
pela Polícia Militar gaúcha vai ser leal à Polícia Militar gaúcha, evidentemente. E isso
aconteceu. Cria-se a fidelidade partidária autorizando que aquele candidato não seja
expulso do partido e perca o mandato, porque descumpriu diretriz do partido. Mas
não foi o partido que o elegeu, foi a categoria. O que fazer? Há uma dissonância
entre um sistema e outro. Ou seja, isso só se resolve no conjunto. Vejam, a
fidelidade não é algo externo e artificial. Tem de nascer do processo e não através
de ameaça externa, porque vai haver formas pelas quais isso seja burlado, não
tenham dúvida.
Quanto à questão da candidatura nata, Deputado Jairo Carneiro, ela é
produto do conflito da individualidade com a nomenclatura. Ou seja, explica-se a
candidatura nata pelo personagem que tem controle do voto e não do partido. Ele
assegura a sua candidatura nata e a impõe.
Lembro a V.Exas. o exemplo do Estado do Paraná. Um ex-Deputado, colega
nosso da Constituinte, era do PDS, inimigo absoluto do Senador Roberto Requião,
e, na época, do ex-Governador do PMDB, José Richa. Ele foi à sede do PMDB
regional e pediu a filiação no PMDB, mas, como era inimigo político clássico, o
PMDB regional a negou. Imediatamente, dirigiu-se a um Município do chamado
norte histórico do Paraná e registrou sua candidatura. Na convenção, então, aparece
sua filiação partidária. Ou seja, filiou-se ao partido nesse Município e teve de entrar
na lista do partido, porque era candidato nato, foi Deputado anteriormente.
O problema da candidatura nata é o conflito da individualidade. Onde é que
se produz essa individualidade? No sistema, logicamente. Convido o cidadão para
ser candidato a Deputado Federal, porque ele tem voto próprio, e depois não
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asseguro sua candidatura, porque ele tem de obedecer a mim, que não tenho voto e
sou chefe do partido? Vejam as distorções! A candidatura nata tem essa origem.
Advirto que o sistema, hoje, tem problemas de constitucionalidade. Afinal, não
assegura ao partido a possibilidade do veto ao candidato nato; e se está entrando na
autonomia interna dos partidos, o que é um problema constitucional.
O SR. DEPUTADO JAIRO CARNEIRO – Sr. Ministro, desculpe-me, mas eu
só levantei o ponto de que não deve haver poder absoluto do partido.
O SR. NELSON JOBIM – No caso, o partido teria maioria, para efeito de
negar o candidato nato. Desapareceria o problema, se nós estabelecêssemos
mecanismos que enviassem à individualidade.
Deputado Antonio Joaquim Araújo, sobre a questão do título eleitoral, não
tenha dúvida de que o caminho será esse. Ou seja, no futuro, vamos caminhar para
um sistema de identificação do eleitor compatível, se o Deputado Vivaldo Barbosa
admitir ainda a urna eletrônica. Senão, o cartão magnético não vai funcionar e
teremos de voltar ao velho título de eleitor. No entanto, creio que vamos caminhar
para essa solução.
Quando no título de eleitor deixou de constar a fotografia, isso não foi gratuito.
Tirou-se a fotografia porque, através dela, maquinava-se ou jogava-se o velho
sistema de curral, já que a fotografia era financiada pelo candidato. Ele se dirigia ao
eleitor para oferecer-lhe a fotografia. Foi por essa razão que a fotografia caiu. A
exigência da fotografia era o mecanismo pelo qual se retomava o curral, através das
ações feitas individualmente para tirar a fotografia. Qual foi o preço que se pagou? A
possibilidade teórica de alguém utilizar o título.
Lembro, por exemplo, os grandes problemas que normalmente existem na
Bahia, especificamente em Camaçari. A confusão naquela cidade, com o problema
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de eleitor que vem e que volta, é histórica. É um tema que temos de enfrentar.
Através das disponibilidades orçamentárias, vamos acabar em um sistema que
tenha a identificação absoluta do eleitor.
O último problema não resolvido seria o da formação da vontade do eleitor
estar vinculada à campanha eleitoral.
O SR. DEPUTADO ANTONIO JOAQUIM ARAÚJO – Permite-me um aparte,
Sr. Ministro?
O SR. NELSON JOBIM – Pois não.
O SR. DEPUTADO ANTONIO JOAQUIM ARAÚJO – Inclusive eu dizia ao
Deputado José Antônio que há um Município do Maranhão em que o Prefeito que se
elegeu contratou uma equipe de pessoas fora do Estado. Praticou um ato
inteligente. Como no título não consta a idade e a Mesa não pode indagar a filiação
do eleitor, ou seja, quem é o seu pai ou a sua mãe, aquelas pessoas contratadas
foram lá e votaram em nome dos eleitores. Os títulos eleitorais foram recolhidos dos
seus titulares para serem utilizados por outras pessoas na votação. No caso, não há
como provar que o título é de determinada pessoa. Isso é algo complicado.
O SR. NELSON JOBIM – Vamos tentar resolver o problema.
Também há outro assunto que mencionei no início, ou seja, a Mesa ter o
número de abertura da urna. Deve-se restringir, mas isso tem preço, como o caso da
fotografia. No momento em que se exige a presença do título, só vota quem tem
título. Se comparecer sem o título, não poderá substitui-lo pela mera identidade.
Poderá votar no sistema. Até chegarmos a um sistema de abertura de impressão
digital, que seria o momento posterior a isso, e resolvermos esse problema.
Desapareceria o título de eleitor, ficaria meramente a inscrição.
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Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, espero ter trazido algumas
informações a V.Exas. Porém, antes de encerrar minhas palavras, proponho ao Sr.
Relator e ao Sr. Presidente que nosso diálogo não se esgote nesta audiência
pública, que possamos dialogar pontualmente e sem conversa teórica. Ou seja,
vamos pontuar as questões para ver como as coisas se resolvem em cima do que
temos e não em cima de conversas acadêmicas, para tentar, então, estabelecer
fórmulas com as quais poderemos avançar não só naquilo que eu quero fazer —
vamos institucionalizar —, no que diz respeito à urna eletrônica.
Teremos de montar um cronograma imediatamente após o contato com a
universidade. Inclusive, já combinei com o Senador Roberto Requião que
trataríamos essa questão da urna eletrônica na Subcomissão Especial da Comissão
de Constituição e Justiça e de Redação, presidida pelo Deputado Osmar Serraglio.
Nós envolveríamos todo esse conjunto para fazer um exame mais apurado.
Paralelamente a isso, trarei a V.Exas. proposições pontuais viáveis. Por
exemplo, a questão da memória do voto, referida pelo Deputado Virgílio Guimarães,
já é possível.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – A intenção é fazer isso
imediatamente?
O SR. NELSON JOBIM – Sim. Inclusive já mandei fazer um estudo. Não
teríamos só a impressão do Boletim de Urna — BU, que é, nada mais, nada menos
que o resultado final, o total da urna. Quando se encerra a votação, determina-se a
apuração. O Boletim de Urna é entregue aos partidos, de forma tal que, depois, há
condições de fiscalizar a soma geral, porque o disquete vai para a central
totalizadora. Também haveria possibilidade de imprimir a composição do voto, feita
na própria urna, como se nós estivéssemos mantendo dentro da urna a composição
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do voto feito pela cédula única. Aí, teríamos condição de saber qual foi o
comportamento do eleitorado naquela urna. Haveria a memória do sistema, ou seja,
o extrato da votação e o Boletim de Urna. O boletim seria para a totalização e o
extrato para a verificação. Poder-se-ia, então, fazer uma espécie de conta dimensão.
. O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Desculpe-me. O relatório sairia
depois por urna?
O SR. NELSON JOBIM – Sim. Seria o mesmo que o do Boletim de Urna.
Seria o Boletim de Urna tal, da urna tal, e teria a composição do extrato da
movimentação.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Teríamos: Município tal,
resultado tal, da urna tal, urna por urna?
O SR. NELSON JOBIM – Lógico.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Porque é o que permite o
cruzamento.
O SR. NELSON JOBIM – Lógico.
O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Do jeito que saiu agora, tem-se
o BU, mas não há como conferir.
O SR. NELSON JOBIM – Exatamente. Confere-se o BU individualmente.
Assim, haveria condições técnicas de se fazer isso, através do acompanhamento.
Proponho ao nobre Deputado Relator uma conversa para fixar o cronograma.
Isso depende, evidentemente, do tempo necessário para fazer a avaliação do
sistema. Discutiremos as questões pontuais em relação a isso. Gostaria de fazer
isso sempre em articulação com o Senado Federal, para termos um diálogo
exclusivo. Também pretendo manter diálogo com os partidos, individualmente. Eu
não acredito muito em uma conversa plenária com os partidos políticos. Grande
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parte das conversas plenárias viram proselitismo. Por isso, pretendo conversar
individualmente com cada partido, examinando os problemas. E todo esse processo
será agora, nesse período, com as direções nacionais dos partidos.
O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Sr. Ministro, gostaria de fazer
apenas uma observação final. V.Exa. relembrou muitas situações vividas, em que
sempre foi chamado para buscar uma solução de meio-termo. Ainda ficou aquilo que
chamei, no início, de terror: ou é a urna eletrônica ou é o processo antigo. E V.Exa.
está afastando a idéia de compatibilizar uma coisa com a outra. Invocaria a
consideração de que é possível examinar os processos.
O SR. NELSON JOBIM – Posso examinar. Só que acho difícil.
O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Inclusive já tivemos na urna
eletrônica uma fase em que ela tinha a emissão de uma cédula. Só que ela ainda
não era satisfatória. Ia de uma maneira oculta. A urna podia não ser a mesma
utilizada na votação por aquele eleitor.
O SR. NELSON JOBIM – Perfeito.
O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – É preciso também considerar a
proposta, que está no nosso projeto, ou seja, fazer a apuração da urna aberta, pelo
menos 3% em cada zona eleitoral, para conferir no dia seguinte ou depois de
proclamado o resultado...
O SR. NELSON AZEVEDO JOBIM – Quero discutir um pouco isso. Não
tenho nenhum parti pris.
O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Exatamente.
O SR. NELSON JOBIM – O Deputado Vivaldo Barbosa deve apresentar um
sistema consistente. O erro da consistência é seu, não meu.
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O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Sr. Ministro, pode não alcançar,
mas fazemos força. Mas há proposta. Desejava essa abertura, no sentido de dar
uma convergência...
O SR. NELSON JOBIM – Não há dúvida nenhuma. E o nosso interesse é
exatamente estabelecer a transparência e a segurança do sistema, para que os
consumidores, que são V.Exas., tenham absoluta tranqüilidade no processo. Se
temos tranqüilidade no sistema, é preciso que seja compartilhada com todos.
O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Então, é possível ter um meio
caminho, como aquelas redações, quanto às soluções. A nossa Constituição é
sábia...
O SR. NELSON JOBIM – Deputado Vivaldo Barbosa, quando V.Exa. se
refere a esse binarismo lógico, formal entre uma coisa e outra, estou preocupado
com o que tem de ser posto na mesa. E a resposta de ser uma ou outra depende do
que é posto na mesa. Vamos discutir em termos de coisas reais e não da nossa
divergência de linguagem.
O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – O brilho de V.Exa. sempre
apontará o caminho.
O SR. NELSON AZEVEDO JOBIM – Obrigado a V.Exa.
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, agradeço a todos a oportunidade.
Peço escusas pelo tempo que tomei. Estou inteiramente à disposição para o
debate.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Agradeço ao Sr. Ministro
Nelson Jobim por, mais uma vez, ter contribuído na discussão de temas tão
importantes para a democracia brasileira.
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Não havendo mais nada a tratar, vou encerrar a presente reunião, antes,
porém, convoco reunião para o dia 26 de junho, terça-feira, com pauta a ser
definida.
Declaro encerrada a reunião.