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14 Dezembro 2009 A Odontologia moderna, apesar de todos os seus avanços, ainda apresenta alguns procedimen- tos que demandam cuidados específi- cos para aumentar a sua longevidade e diminuir a possibilidade do surgimento de efeitos colaterais. As lesões cervicais de classe V são tratadas de formas distintas em função de sua etiologia. O diagnóstico oclusal, hábitos parafuncionais, qualidade de substrato amelo-dentinário, distúrbios gastro-esofágicos, técnica de higieniza- ção mal conduzida, falhas em restaura- ções anteriores, hábitos alimentares e lesões cariosas são exemplos da neces- sidade de integração multidisciplinar durante o processo de diagnóstico para a eleição do tratamento correto. A dificuldade do cirurgião-dentista em interpretar esta interação gera em alguns procedimentos clínicos, resulta- dos aquém do esperado em termos es- téticos, funcionais e sintomatológicos. A característica principal do subs- trato dentinário em lesões não cariosas é a esclerose intertubular que dificulta a ação do ácido fosfórico para criar as retenções mecânicas e os depósitos mi- nerais intertubulares ácido resistentes que diminuem a área de hibridização diminuindo a incidência de tags. Este comportamento tem influência decisiva no sucesso clínico restaurador quando se trabalha exclusivamente na depen- dência do sistema adesivo. Outro fator importante na manu- tenção das restaurações de classe V é o ajuste oclusal que tem por objetivo di- minuir as forças conduzidas pela coroa até a região cervical onde estas são dis- sipadas. Da mesma forma que são ge- rados processos inflamatórios cervicais que propiciam reabsorções ósseas por estas forças, a zona de hibridização das restaurações desta região também sofre uma perda de eficiência. Sendo assim, o ajuste oclusal após reabilitação cervi- cal direta é um grande aliado na busca da longevidade. Os cimentos de ionômero de vidro foram introduzidos no mercado odon- tológico em 1975 com um grande apelo comercial baseado na liberação de íons de flúor. Com o avanço nas pesquisas, descobriram-se outras vantagens e uti- lizações deste material que, com a evo- lução obtida, apresenta excelentes pro- priedades para uso solo ou em técnicas combinadas com outros materiais. Uma delas foi a excelente adesão química en- tre os cimentos de ionômero de vidro e o substrato dentinário sem a utilização de ataque ácido. Posteriormente verificou-se a se- melhança do coeficiente de expansão térmica com a dentina, contração de polimerização menor que a da resina composta e uma excelente compatibili- dade com tecidos pulpar e periodontal. Uso combinado de ionômero de vidro e resina composta em restaurações classe V Tratamento restaurador cervical utilizando como base o ionômero de vidro fotopolimerizável em cápsula e posterior realização das técnicas adesiva e aplicação de resina composta BRASIL Clínica Marcelo Rodrigues Alves Professor do Curso de Especialização em Dentística Restauradora da ABCD- DF. Ministrador convidado dos cursos de especialização FORP-USP, UFU e UNIC. Clínica Particular em Ribeirão Preto/SP. [email protected] Figura 1 - Paciente sexo masculino, 44 anos, portador de bruxismo com severa retração gengival e lesão cervical

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14 • Dezembro 2009

A Odontologia moderna, apesar

de todos os seus avanços, ainda

apresenta alguns procedimen-

tos que demandam cuidados específi-

cos para aumentar a sua longevidade e

diminuir a possibilidade do surgimento

de efeitos colaterais.

As lesões cervicais de classe V são

tratadas de formas distintas em função

de sua etiologia. O diagnóstico oclusal,

hábitos parafuncionais, qualidade de

substrato amelo-dentinário, distúrbios

gastro-esofágicos, técnica de higieniza-

ção mal conduzida, falhas em restaura-

ções anteriores, hábitos alimentares e

lesões cariosas são exemplos da neces-

sidade de integração multidisciplinar

durante o processo de diagnóstico para

a eleição do tratamento correto.

A dificuldade do cirurgião-dentista

em interpretar esta interação gera em

alguns procedimentos clínicos, resulta-

dos aquém do esperado em termos es-

téticos, funcionais e sintomatológicos.

A característica principal do subs-

trato dentinário em lesões não cariosas

é a esclerose intertubular que dificulta

a ação do ácido fosfórico para criar as

retenções mecânicas e os depósitos mi-

nerais intertubulares ácido resistentes

que diminuem a área de hibridização

diminuindo a incidência de tags. Este

comportamento tem influência decisiva

no sucesso clínico restaurador quando

se trabalha exclusivamente na depen-

dência do sistema adesivo.

Outro fator importante na manu-

tenção das restaurações de classe V é o

ajuste oclusal que tem por objetivo di-

minuir as forças conduzidas pela coroa

até a região cervical onde estas são dis-

sipadas. Da mesma forma que são ge-

rados processos inflamatórios cervicais

que propiciam reabsorções ósseas por

estas forças, a zona de hibridização das

restaurações desta região também sofre

uma perda de eficiência. Sendo assim,

o ajuste oclusal após reabilitação cervi-

cal direta é um grande aliado na busca

da longevidade.

Os cimentos de ionômero de vidro

foram introduzidos no mercado odon-

tológico em 1975 com um grande apelo

comercial baseado na liberação de íons

de flúor. Com o avanço nas pesquisas,

descobriram-se outras vantagens e uti-

lizações deste material que, com a evo-

lução obtida, apresenta excelentes pro-

priedades para uso solo ou em técnicas

combinadas com outros materiais. Uma

delas foi a excelente adesão química en-

tre os cimentos de ionômero de vidro e

o substrato dentinário sem a utilização

de ataque ácido.

Posteriormente verificou-se a se-

melhança do coeficiente de expansão

térmica com a dentina, contração de

polimerização menor que a da resina

composta e uma excelente compatibili-

dade com tecidos pulpar e periodontal.

Uso combinado de ionômero de vidro e resina composta em restaurações classe VTratamento restaurador cervical utilizando como base o ionômero de vidro fotopolimerizável

em cápsula e posterior realização das técnicas adesiva e aplicação de resina composta

Dentistr

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BRASIL

BRASIL

Clínica

Marcelo Rodrigues Alves Professor do Curso de Especialização em Dentística Restauradora da ABCD-DF. Ministrador convidado dos cursos de especialização FORP-USP, UFU e UNIC. Clínica Particular em Ribeirão Preto/SP.

[email protected]

Figura 1 - Paciente sexo masculino, 44 anos, portador de bruxismo com severa retração gengival e lesão cervical

Dentística

Dezembro 2009 • 15

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Figuras 2,3 e 4 - Condicionamento dentinário com ácido poliacrílico (RIVA Conditioner) por 10s seguido de lavagem abundante. Secagem leve com papel filtro deixando a dentina úmida

Figura 5 - Aplicação do ionômero de vidro fotopolimerizável (Riva Ligh Cure) em cápsula

Sendo assim, a capacidade de selamento

de superfície favorece o desaparecimen-

to da hipersensibilidade dentinária.

Apesar de apresentar todas estas ca-

racterísticas positivas, os cimentos de

ionômero de vidro não apresentam uma

gama de cores necessárias para se atin-

gir resultados estéticos em áreas onde a

demanda pela biomimetização dos ma-

teriais é fundamental. Nestes casos é in-

dicada a utilização de resinas compostas

associadas aos cimentos de ionômero de

vidro para utilizarmos as melhores ca-

racterísticas dos dois materiais.

RELATO DE CASOPaciente do sexo masculino, 44

anos, apresentou-se ao nosso serviço

clínico com queixa principal de hi-

persensibilidade dentinária. Ao pro-

ceder os exames clínico-radiográficos,

foi diagnosticado um quadro de lesão

não cariosa generalizada com retrações

gengivais significativas e perda de te-

cido dentinário cervical com aspecto

polido (Abfração). A etiologia combi-

nada por bruxismo noturno e técnica

de higienização incorreta. Foi proposto

o tratamento restaurador cervical com

a técnica “sanduíche” utilizando como

base o ionômero de vidro fotopolimeri-

zável em cápsula e posterior realização

das técnicas adesiva e aplicação de resi-

na composta.

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Clínica

16 • Dezembro 2009

Dentística

1. Gopikrishna V, Abarajithan M, Krithikadatta J, Kandaswamy D. Shear bond strengh evaluation of resin composite bonded to GIC using three different adhesives. Operative Dentistry 2009; 34-4: 467-712. Luo J, Billington RW, Pearson G. Kinetics of fluoride release from glass components of glass ionomers. Journal of Dentistry 2009; 37: 495-5013. Yelamanchili A, Darvell BW. Network competition in a resin modified glass ionomer cement. Dental Materials 2008; 24: 1065-94. Dowling AH, Fleming GJP. Are encapsulated anterior glass ionomer restorations better than their hand-mixed equivalents ? Journal of Dentistry 2009; 37: 133-1405. Magai E, Zhang L, Hickel R, Bossu M, Polimeni A, Fernari M. SEM and microleakage evaluation of the marginal integrity of two types of class V restorations with or without the use of a light curable material and polishing. Journal of Dentistry 2008; 36: 885-891

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Referências Bibliográficas

1 - Após isolamento relativo com afas-

tador labial e roletes de algodão sob

controle de umidade com sucção de

alta potência, foi aplicada à superfí-

cie dentinária ácido poliacrílico (Riva

Conditioner - SDI) por 10s. Após este

tempo, foi lavada a região com jato de

água e ar. A secagem foi feita utilizan-

do-se o papel filtro com o objetivo de

evitar o ressecamento excessivo.

2 - Selecionado o tipo de ionômero

mais adequado a este tipo de restau-

ração pela rapidez de aplicação e po-

limerização, aplica-se na área cervical

dos elementos dentais evitando o con-

tato com o esmalte ou com as bordas.

Procede-se a fotopolimerização por

20s em camadas de 2 mm.

3 - Para a aplicação da camada de resi-

na composta, faz-se o ataque com ácido

fosfórico a 37% por 20s em toda a área,

lembrando que o ionômero de vidro já

está polimerizado. Este é o motivo pelo

qual o material de escolha é o Riva Li-

ght Cure (SDI) em cápsulas. Lavagem

e secagem com papel filtro novamente.

4 - Aplicação do adesivo (Stae) em 3

camadas com intervalo de 40s. Após a

última camada, polimeriza-se por 20s

e aplica-se a resina composta nanohí-

brida (ICE).

5 - Polimento inicial com taças de

borracha e após 48 horas com discos

de lixa.

Figuras 6 e 7 - O Riva Light Cure. Seu conteúdo de uma cápsula foi suficiente para a aplicação nos 3 elementos

Figuras 8 e 9 - Após fotopolimerização por 40seg, aplicação de ácido fosfórico em toda a superfície por 20seg

Figuras 10, 11 e 12 - Lavagem abundante, secagem leve, hibridização adesiva (STAE) e aplicação de resina composta (ICE). Aspecto final da restauração

Figuras 13 e 14 - Polimento imediato com discos de silicone e com discos de lixa após 48 horas