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1 Mod.016_01 DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE (VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL) Considerando que a Entidade Reguladora da Saúde nos termos do n.º 1 do artigo 4.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto exerce funções de regulação, de supervisão e de promoção e defesa da concorrência respeitantes às atividades económicas na área da saúde nos setores privado, público, cooperativo e social; Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo 5.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto; Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos no artigo 10.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto; Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos no artigo 19.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto; Visto o processo registado sob o n. º ERS/001/2015;

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1 Mod.016_01

DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA

ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE

(VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL)

Considerando que a Entidade Reguladora da Saúde nos termos do n.º 1 do artigo 4.º dos

Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto exerce

funções de regulação, de supervisão e de promoção e defesa da concorrência respeitantes

às atividades económicas na área da saúde nos setores privado, público, cooperativo e

social;

Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo 5.º

dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto;

Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde

estabelecidos no artigo 10.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º

126/2014, de 22 de agosto;

Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos

no artigo 19.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de

agosto;

Visto o processo registado sob o n.º ERS/001/2015;

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I. DO PROCESSO

I.1. Origem do processo

1. Em 17 de novembro de 2014, a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) tomou

conhecimento de uma exposição, reencaminhada pela Inspeção Geral das Atividades

em Saúde (IGAS) subscrita por M., através da qual alegou que a Medicambra –

Prestação de Serviços Médicos, Lda. (Medicambra), entidade registada no SRER da

ERS sob o n.º 10366, com sede na Avenida Camilo Tavares de Matos, n.º 510, 1.º

andar, Vale de Cambra, “[…] assume [alegadamente] a qualidade de entidade

convencionada do Serviço Nacional de Saúde de forma não autorizada, na valência de

meios complementares de diagnóstico de cardiologia”.

2. A análise preliminar da referida exposição deu origem ao processo de avaliação n.º

AV/309/14, e posteriormente o Conselho de Administração da ERS, por despacho de 9

de janeiro de 2015, ordenou a abertura de processo de inquérito registado sob o n.º

ERS/001/2015.

I.2. Diligências realizadas

3. No âmbito da investigação desenvolvida pela ERS, realizaram-se, entre outras, as

diligências consubstanciadas em:

(i) Pesquisa no Sistema de Registo de Estabelecimentos Regulados

(doravante SRER) da ERS;

(ii) Pesquisa da informação disponibilizada nos sítios eletrónicos pela

Administração Regional de Saúde do Centro, I.P. (ARS Centro) e

Administração Regional do Norte, I.P. (ARS Norte);

(iii) Deslocação de funcionários da ERS, realizada no dia 9 de dezembro de

2014, às instalações do prestador Medicambra, sitas na Avenida Camilo

Tavares de Matos, n.º 510, 1.º andar, Vale de Cambra.

II. DOS FACTOS

II.1. Da exposição

4. Em 17 de novembro de 2014, a ERS tomou conhecimento de uma exposição,

reencaminhada pela Inspeção Geral das Atividades em Saúde (IGAS) subscrita por M.,

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através da qual vem “[…] dar conhecimento da situação em que uma clínica médica em

Vale de Cambra assume [alegadamente] a qualidade de entidade convencionada do

Serviço Nacional de Saúde de forma não autorizada, na valência de meios

complementares de diagnóstico de cardiologia”.

5. Mais menciona o exponente que este prestador “[…] através de um simples

telefonema, agenda e realiza exames cardiológicos: electrocardiograma,

ecocardiograma e Holter. Da mesma forma que se o utente se deslocar ao local com

uma credencial, é cobrada a respetiva taxa moderadora, retida a credencial e realizado

o exame.”.

6. Mais adianta, a titulo de exemplo, que tal comportamento “[…] foi comprovado através

da realização de electrocardiogramas ao Sr. M.P. e à Sra. B. […]” – cfr. cópias das

credenciais e dos exames referidos remetidos em anexo à exposição.

7. Refira-se ademais que a ERS recebeu, em 19 de dezembro de 2014, um ofício da ARS

Centro, nos termos do qual vem informar ter recebido a mesma exposição, subscrita

por M., referida supra, relativa à entidade Medicambra, onde o exponente “[…] relata

que aquela entidade não tem convenção com [SNS], mas aceita as requisições

emitidas no âmbito do SNS, como se se tratasse de uma entidade no convencionada”.

8. Ainda, o exponente reencaminhou a sua exposição para a ERS, a qual foi rececionada

a 20 de janeiro de 2015 por esta entidade.

9. Da documentação remetida, consta a informação da ARS Centro, de que “[…]

procedeu ao encaminhamento da mesma para a [ERS], atendendo às específicas

competências da mesma no âmbito da concorrência e regulação das entidades

prestadoras de cuidados de saúde.”.

II.2. Das diligências instrutórias realizadas

II.2.1. Pesquisa de informação pública

10. No âmbito das averiguações preliminares realizadas com vista à verificação da

denúncia, procedeu-se à consulta do SRER da ERS, bem como à consulta na página

das entidades convencionadas para a área de cardiologia nos websites da ARS Norte,

em www.arsnorte.min-saude.pt, e da ARS Centro, em www.arscentro.min-saude.pt.

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11. Da pesquisa no SRER da ERS apurou-se que a Medicambra com NIPC 503 804 215,

está registada no SRER da ERS sob o n.º 10366 (suspenso1).

12. Ora, sucede que, da pesquisa no SRER da ERS, apurou-se que, relativamente ao

estabelecimento Medicambra, vem mencionado que apenas detém

“Acordos/Convenções” com o SNS, em “Análises clínicas e patologia clinica” – cfr.

cópia da informação extraída do registo no SRER da ERS, datada de 19 de fevereiro

de 2015, e junta aos autos.

13. E da consulta da informação disponibilizada, quer pela ARSN, quer pela ARS Centro,

foi possível apurar que a Medicambra não integra a listagem de entidades

convencionadas com o SNS no âmbito da valência de cardiologia disponibilizadas

pelas referidas ARS, não sendo detentora de convenção para o efeito – cfr. listagens

extraídas dos sítios eletrónicos destas ARS, juntas aos autos.

14. Também não integra a listagem das ARS Centro e ARS Norte de entidades

convencionadas com o SNS no âmbito da valência de análises clínicas.

II.2.2. Diligência de deslocação ao local

15. Posteriormente, ainda no âmbito da investigação desenvolvida pela ERS, no dia 9 de

dezembro de 2014, foi efetuada uma deslocação às instalações do prestador, e a

diligência realizada consistiu em dois técnicos da ERS terem acedido às referidas

instalações e terem-se dirigido ao balcão de atendimento e solicitado à funcionária que

prestou o atendimento para averiguar da possibilidade de realização de MCDT´s do

foro cardiológico, na qualidade de utente do SNS.

16. Nessa sequência, e em resposta, a funcionária que procedeu ao atendimento

confirmou “[…] a realização dos exames Eletrocardiograma (ECG), Ecocardiograma e

Holter, a beneficiários do SNS, mediante apresentação da competente credencial”.

17. Acrescentando que “[…] aos utentes isentos nada seria cobrado e aos demais os

preços praticados seriam de (…)€ no caso do ECG, (…) € para eletrocardiograma e

(…)€ no caso do Holter, […] particularmente, indicou a possibilidade de agendamento

de Ecocardiograma para o dia 22 de dezembro de 2014”. - cfr. Memorando de

diligência de deslocação ao local, de 9 de dezembro de 2014, junto em anexo.

1 De acordo com a informação constante do SRER da ERS, consultada a 20 de março de 2015, o

processo de atualização do registo na ERS da entidade está suspenso, por alguns dados se

encontrarem incompletos ou necessitarem de correção.

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III. DO DIREITO

III.1. Das atribuições e competências da ERS

18. De acordo com o n.º 1 do artigo 4.º e o n.º 1 do artigo 5.º, ambos dos Estatutos da ERS

aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, 22 de agosto, a ERS tem por missão a

regulação, supervisão, e a promoção e defesa da concorrência, respeitantes às

atividades económicas na área da saúde dos setores privados, público, cooperativo e

social, e, em concreto, da atividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados de

saúde.

19. Sendo que estão sujeitos à regulação da ERS, nos termos do n.º 2 do artigo 4.º dos

mesmos Estatutos, todos os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde, do

sector público, privado, cooperativo e social, independentemente da sua natureza

jurídica;

20. Tal sendo o caso da Medicambra, entidade prestadora de cuidados de saúde registada

no SRER da ERS sob o n.º 10366, com NIPC 503 804 215 e com sede na Avenida

Camilo Tavares de Matos, n.º 510, 1.º andar, Vale de Cambra.

21. As atribuições da ERS, de acordo como disposto nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo

5.º dos Estatutos da ERS, compreendem a supervisão da atividade e funcionamento

dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde, no que respeita à garantia

dos direitos relativos ao acesso aos cuidados de saúde, à prestação de cuidados de

saúde de qualidade, bem como dos demais direitos dos utentes, e ainda, à legalidade e

transparência das relações económicas entre os diversos operadores, entidades

financiadoras e utentes.

22. Ademais, constituem objetivos da ERS, nos termos do disposto nas alíneas b), c) e e)

do artigo 10.º do mencionado diploma, assegurar o cumprimento dos critérios de

acesso aos cuidados de saúde, garantir os direitos e interesses legítimos dos utentes e

zelar pela legalidade e transparência das relações económicas entre todos os agentes

do sistema.

23. Competindo-lhe, na execução dos preditos objetivos, e conforme resulta do artigo 12.º

e 15.º dos Estatutos, zelar pelo respeito da liberdade de escolha nos estabelecimentos

prestadores de cuidados de saúde, incluindo o direito à informação, e também analisar

as relações económicas nos vários segmentos da economia da saúde, tendo em vista

o fomento da transparência, da eficiência e da equidade do sector, bem como a defesa

do interesse público e dos interesses dos utentes.

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24. Bem como, é ainda objetivo da ERS, promover e defender a concorrência nos

segmentos abertos ao mercado, em colaboração com a Autoridade da Concorrência na

prossecução das suas atribuições relativas a este setor, nos termos da alínea f) do

artigo 10.º dos Estatutos.

25. Para tanto, a ERS pode assegurar tais incumbências mediante o exercício dos seus

poderes de supervisão, no caso mediante a emissão de ordens e instruções, bem

como recomendações ou advertências individuais, sempre que tal seja necessário,

sobre quaisquer matérias relacionadas com os objetivos da sua atividade reguladora,

incluindo a imposição de medidas de conduta e a adoção das providências necessárias

à reparação dos direitos e interesses legítimos dos utentes – cfr. alínea b) do artigo

19.º dos Estatutos da ERS.

26. Recorde-se que na exposição apresentada suscitava-se como questão essencial,

saber se a entidade visada nos autos seria detentora de convenção com o SNS para a

prestação de cuidados de saúde na área de MCDT de cardiologia, e em caso de

resposta negativa, se se encontraria a atender utentes beneficiários do SNS, sem ser

detentora da referida convenção para o efeito.

III.2. Do enquadramento legal da prestação de cuidados de saúde

III.2.1. Da prestação de cuidados de saúde aos utentes do SNS

27. O n.º 4 da Base I da Lei de Bases da Saúde (LBS), aprovada pela Lei n.º 48/90, de 24

de agosto, estabelece que “os cuidados de saúde são prestados por serviços e

estabelecimentos do Estado ou, sob fiscalização deste, por outros entes públicos ou

por entidades privadas, sem ou com fins lucrativos”, e nos termos do n.º 2 da Base IV

da mesma LBS, “para efetivação do direito à proteção da saúde, o Estado atua através

de serviços próprios, celebra acordos com entidades privadas para a prestação de

cuidados e apoia e fiscaliza a restante atividade privada na área da saúde”.

28. E nessa medida, os prestadores de cuidados de saúde, tendo celebrado acordo com o

SNS para a prestação de cuidados de saúde em regime de complementaridade,

integram a rede nacional de prestação de cuidados de saúde – cfr. n.º 3 e 4 da Base

XII da LBS.

29. Assim, o acesso dos utentes beneficiários do SNS à Rede Nacional de Prestação de

Cuidados de Saúde é também assegurado através de estabelecimentos privados, com

ou sem fins lucrativos, com os quais tenham sido celebradas convenções ou acordos

destinados a esse fim.

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30. Em tais casos de contratação com entidades privadas ou do setor social, os cuidados

de saúde são prestados ao abrigo de acordos específicos, por intermédio dos quais o

Estado incumbe essas entidades da missão de interesse público inerente à prestação

de cuidados de saúde no âmbito do SNS, passando essas instituições a fazer parte do

conjunto de operadores, públicos e privados, que garantem a imposição constitucional

de prestação de cuidados públicos de saúde2.

31. Por outro lado, “o Estatuto [do SNS] aplica-se às instituições e serviços que constituem

o Serviço Nacional de Saúde e às entidades particulares e profissionais em regime

liberal integradas na rede nacional de prestação de cuidados de saúde, quando

articuladas com o Serviço Nacional de Saúde.” – cfr. artigo 2.º do Estatuto do SNS,

aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de janeiro.

32. Princípio este que foi reiterado pelo Decreto-Lei n.º 139/2013, de 9 de outubro, que

aprovou o Regime de Celebração de Convenções, que estabelece, na alínea a) do n.º

1 do artigo 2.º a “Equidade no acesso dos utentes aos cuidados de saúde”, sendo que,

nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º do mesmo diploma é referido que a

contratação de convenções deve obedecer ao princípio da “complementaridade,

destinando-se a sua celebração a colmatar as necessidades do SNS quando este, de

forma permanente ou esporádica, não tem capacidade para as suprir”.

III.2.2. Do quadro legal relativo ao direito dos utentes à informação

33. Diga-se, de modo genérico, que os clausulados-tipo que aprovaram os contratos de

convenção com o SNS impedem a utilização de convenções fora dos locais

convencionados, e por entidades diferentes daquela que outorgou a convenção em

causa, devendo a norma de adesão de cada entidade fazer referência explícita às

instalações que serão abrangidas pela referida convenção.

34. Ora, um prestador, ao arrogar-se de qualidade – aqui, da qualidade de entidade

convencionada – da qual não dispõe, tal comportamento será suscetível de constituir

violação dos interesses legítimos dos utentes, designadamente o interesse

fundamental da transparência nas relações com os utentes, instrumental do direito à

2 A este respeito, importa recordar o estudo já publicado pela ERS, no ano de 2006, sob o tema do

modelo de celebração das convenções do SNS e no qual é retratado o estado da contratação de prestadores do setor privado e social.

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informação e do direito à liberdade de escolha – cfr. Base XIV da Lei de Bases da

Saúde, e atualmente o disposto na Lei n.º 15/2014, de 21 de março3.

35. Com efeito, o direito fundamental dos utentes de cuidados de saúde à informação, bem

como os princípios da verdade e transparência relevarão, fundamentalmente, em três

momentos distintos:

(i) antes da escolha do prestador (garantindo-se, nomeadamente, pela via da

informação e transparência, o exercício da liberdade de escolha nas unidades de

saúde privadas/sociais, que à ERS cumpre garantir);

(ii) durante a prestação do concreto cuidado de saúde (veja-se o que prevê a alínea

e) do n.º 1 da Base XIV da Lei n.º 48/90, de 24 de agosto, para efeitos de

consentimento informado e esclarecimento quanto a alternativas de tratamento e

evolução do estado clínico); e

(iii) depois de cessada a relação contratual com o prestador (quando tal seja

necessário para o exercício de direitos ou interesses legítimos de ambas as

partes).

36. Assim, a informação quanto à concreta entidade prestadora, responsável pela

prestação dos cuidados, bem como quanto existência ou inexistência, conteúdo e/ou

extensão de eventuais convenções e/ou acordos não pode, por isso, deixar de ser

completa, verdadeira e inteligível.

37. A informação disponibilizada ao público deverá, pois, ser suficiente para o dotar dos

instrumentos necessários ao exercício da liberdade de escolha nas unidades de saúde

privadas, situando-se necessariamente em momento anterior àquele em que o

concreto utente orientou já a sua escolha para um determinado prestador.

38. Isto é, a informação errónea do utente quanto à existência de convenções é apta a

distorcer o exercício da própria liberdade de escolha dos utentes;

39. Tal como pode facilitar situações de lesões de direitos e interesses financeiros dos

utentes.

40. Sob pena de ao fazê-lo se encontrar esta entidade a violar os direitos e interesses

legítimos dos utentes ao consentimento informado e esclarecido (alíneas b) e e) do n.º

1 da Base XIV da Lei de Bases da Saúde) normativo atualmente reforçado pelo

disposto no artigo 7.º da Lei n.º 15/2014, de 21 de março e, consequentemente, de

3 Veja-se concretamente, no âmbito de convenções celebradas com setor privado, as deliberações

emitidas no âmbito dos processos de inquérito n.ºs ERS/005/09, ERS/123/11 e ERS/040/12 e ERS/036/13 cujas decisões se encontram publicadas no site da ERS, em www.ers.pt.

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escolher livremente o agente prestador de cuidados de saúde (alínea a) do n.º 1 da

Base XIV da Lei de Bases da Saúde e n.º 1 do artigo 2.º da referida Lei n.º 15/2014 de

21 de março); e

41. Bem como a não respeitar a legalidade e transparência que deve pautar as relações

económicas entre prestadores de cuidados de saúde e utentes.

III.3. Do respeito pela sã concorrência entre prestadores convencionados com o SNS

42. Por outro lado, este comportamento pode ainda impactar com o respeito da

concorrência nas atividades abertas ao mercado sujeitas à sua jurisdição, que à ERS

incumbe velar, nos termos da alínea b) do artigo 16.º dos Estatutos da ERS

43. Efetivamente, até à aprovação do Decreto-Lei n.º 139/2013, de 9 de outubro, o regime

de contratação com o SNS assentou na adesão dos prestadores interessados aos

requisitos constantes do clausulado tipo de cada convenção.

44. Mas como se pôde constatar no estudo da ERS intitulado Avaliação do Modelo de

Celebração de Convenções pelo SNS de 20064, após a publicação e entrada em vigor

do Decreto-Lei n.º 97/98, de 18 de abril5, apenas tinham sido publicados três

clausulados tipo, nas áreas de Cirurgia, Diálise e SIGIC – Sistema Integrado de Gestão

de Inscritos para Cirurgia.

45. Assim, com exceção destas áreas, as demais convenções em vigor não foram

celebradas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 97/98, de 18 de abril, mas tiveram por base

clausulados tipo e legislação publicados em meados da década de oitenta, o que

significa, na prática, que o acesso às convenções se acha encerrado, salvo situações

excecionais – como seja o período em que por força do previsto no Decreto-Lei n.º

112/97, de 10 de maio foi possível às ARS celebrar novas convenções.

46. Assim, e sem prejuízo das alterações agora perspetivadas por força da entrada em

vigor no novo regime jurídico das convenções, certo é que o universo de entidades

convencionadas é dominado por entidades que já se encontram no mercado há muito

tempo, sendo reduzido o número de entidades com convenções recentes.

4 Disponível em www.ers.pt

5 Entretanto revogado pelo Decreto-Lei n.º 139/2013, de 9 de outubro, que estabeleceu o novo

Regime Jurídico das Convenções.

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47. E sublinhe-se que tanto é tão mais importante quanto o acesso à prestação de

cuidados de saúde é conformado por enquadramentos prévios do mesmo em função

(das qualidades) dos concretos utentes que buscam a satisfação das suas

necessidades de cuidados de saúde.

48. Ou seja, a qualidade (por exemplo, utente do SNS ou beneficiário de um subsistema)

em que um determinado utente busca a satisfação das suas necessidades condiciona,

de forma relevante, o acesso aos cuidados de saúde.

49. Concretizando, a liberdade de escolha dos utentes será primeiramente orientada para

o conjunto de entidades prestadoras que, em face de determinados requisitos (por

exemplo, detenção de convenções ou acordos), garantem àqueles o acesso segundo

tais enquadramentos.

50. Assim, o utente portador de uma credencial buscará a satisfação das suas

necessidades de cuidados de saúde no conjunto das entidades convencionadas com o

SNS na valência e local/região relevante.

51. Dito de outra forma, tais entidades convencionadas com o SNS na valência e

local/região relevante concorrem entre si para a prestação de cuidados de saúde ao

utente em questão.

52. É assim que se compreende, então, que as fortes restrições no acesso às convenções

não somente protegem aqueles que já possuem convenções;

53. Como prejudicam, claramente, aqueles que não logram aceder às mesmas.

54. E tanto tem, aliás, tornado francamente apetecíveis algumas formas de “acesso” às

convenções, designadamente de terceiros, ou “extensões subjetivas fáticas” das

convenções existentes;

55. Porquanto tanto significa o acesso a um sector e mercado altamente protegido; ou

56. Aumento de dimensão num sector e mercado altamente protegido de tensões

concorrenciais.

57. Ora, quando um prestador publicita, relativamente às suas instalações, que possui

“Acordo” com o SNS;

58. É adulterado e falseado o jogo concorrencial pré-existente;

59. Seja relativamente àqueles que não possuem convenção e que, consequentemente,

não acedem a tal sector e mercado;

60. Seja, ainda, relativamente aos outros prestadores convencionados;

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61. Em face de todo o exposto, considera-se oportuno garantir que o prestador tampouco

promova a publicitação de atos ou exames, como sejam in casu na valência de MFR,

cuja realização nas suas instalações não se encontra autorizada,

III.4. Da competência das Administrações Regionais de Saúde

62. Nos termos do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 22/2012, de 30 de janeiro, que

aprovou a nova Lei Orgânica das ARS, constitui incumbência das ARS “garantir à

população da respetiva área geográfica de intervenção o acesso à prestação de

cuidados de saúde de qualidade, adequando os recursos disponíveis às necessidades

e cumprir e fazer cumprir políticas e programas de saúde na sua área de intervenção”.

63. E é para cumprimento de tal atribuição fundamental que as ARS são dotadas de um

extenso elenco de atribuições e identificadas, entre outras, no n.º 2 do artigo 3.º do

Decreto-Lei n.º 22/2012, de 30 de janeiro;

64. Competindo-lhes, em concreto, “[…] afetar, de acordo com as orientações definidas

pela Administração Central do Sistema de Saúde, I.P., recursos financeiros às

instituições e serviços prestadores de cuidados de saúde integrados ou financiados

pelos Serviço Nacional de Saúde e a entidades de natureza privada com ou sem fins

lucrativos, que prestem cuidados de saúde […]”;

65. Bem como “[…] Negociar, celebrar e acompanhar, de acordo com as orientações

definidas a nível nacional, os contratos, protocolos e convenções de âmbito regional,

bem como efetuar a respetiva avaliação e revisão, no âmbito da prestação de cuidados

de saúde […]” – cfr. alíneas i) e l) do referido dispositivo.

66. Acresce que, nos termos do disposto no número 1 do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º

139/2013, de 9 de outubro, que aprovou, como visto o novo Regime Jurídico das

Convenções,

“[a]s administrações regionais de saúde devem, em articulação com os

serviços de saúde, avaliar, de forma sistemática, a qualidade e

acessibilidade dos cuidados prestados pelas entidades convencionadas e

zelar pelo integral cumprimento das convenções.

[a]s ARS sob coordenação da ACSS, I.P. e em articulação com a Inspeção

Geral das Atividades em Saúde, devem confirmar, de forma sistemática, a

prestação dos cuidados faturados e correspondentes efeitos financeiros.

[...e, para tanto]

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as ARS efetuam as auditorias necessárias, sem prejuízo das competências

legalmente atribuídas a outras entidades”

67. Este diploma impõe assim ao Estado, mais precisamente às Administrações Regionais

de Saúde, um dever de acompanhamento e controlo da atividade de prestação de

cuidados de saúde exercida pelas instituições detentoras de convenção;

68. Ora, o SNS detém uma organização de carácter regional, sendo administrado por cada

uma das ARS, competentes por cada uma das regiões administrativamente

organizadas;

69. Sendo nesta medida que desempenham um papel fundamental na estruturação e

organização da resposta do SNS nas áreas sob suas influências;

70. Neste enquadramento, atento o exposto, deve competir a cada uma das ARS, em cada

região de saúde, assegurar a gestão de convenções, onde se inclui, então, a

acompanhamento da atividade das entidades convencionadas com o SNS.

III.5. Análise da situação concreta

71. Conforme acima se expôs, na denúncia acima descrita suscitavam-se as seguintes

questões essenciais:

(i) Saber se a entidade visada nos autos seria detentora de convenção com o

SNS para a prestação de cuidados de saúde, no âmbito dos exames

cardiológicos; e,

(ii) Tal não se confirmando, saber se essa mesma entidade atende utentes

beneficiários do SNS, arrogando deter a qualidade de prestador

convencionado, quando não é detentor de convenção com o SNS para a

prestação de cuidados de saúde, no âmbito dos exames cardiológicos;

72. Assim enquadrada a questão, importará averiguar se ocorre in casu, uma eventual

utilização indevida de convenções celebradas com o SNS, uma vez que tal utilização

indevida será, desde logo, apta a violar a liberdade de escolha dos utentes, induzindo

estes últimos, a recorrerem ao referido prestador com base numa qualidade, in casu de

convencionado do SNS, que na realidade, poderá não possuir;

73. Bem como a violar a sã concorrência entre prestadores, ao possibilitar ao prestador em

questão concorrer pela prestação de serviços convencionados aos utentes do SNS

quando, na realidade, não possuirá o requisito (convenção) exigido para tanto.

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74. Neste contexto, a análise da situação concreta será efetuada, tendo em consideração

cada uma destas questões.

75. Nessa sequência, relativamente à Medicambra, e como resultado da análise dos factos

e da diligência realizada (diligência de deslocação às instalações do prestador), foi

possível apurar que esta entidade estará a atender utentes do SNS sem ser possuidora

de Convenção com o SNS para a prestação de cuidados de saúde, no âmbito dos

exames cardiológicos.

76. Senão vejamos,

77. Resultou de diligência realizada no dia 9 de dezembro de 2014, nas instalações do

prestador que, após tentativa de agendamento para realização de eletrocardiograma e

ecocardiograma para utente do SNS, a funcionária que procedeu ao atendimento

admitiu “[…] a realização dos exames Eletrocardiograma (ECG), Ecocardiograma e

Holter, a beneficiários do SNS, mediante apresentação da competente credencial”.

78. Acrescentando que “[…] aos utentes isentos nada seria cobrado e aos demais os

preços praticados seriam de (…)€ no caso do ECG, (…) € para eletrocardiograma e

(…)€ no caso do Holter, […] particularmente, indicou a possibilidade de agendamento

de Ecocardiograma para o dia 22 de dezembro de 2014”.

79. Por outro lado, igualmente da pesquisa no SRER da ERS, apurou-se que,

relativamente ao estabelecimento Medicambra, vem mencionado que apenas detém

em “Acordos/Convenções” com o SNS, em “Análises clínicas e patologia clinica” – cfr.

cópia da informação extraída do registo no SRER da ERS, datada de 19 de fevereiro

de 2015, e junta aos autos;

80. Ora, reitere-se que, a entidade Medicambra, não integra a listagem das ARS Centro e

ARS Norte de entidades convencionadas com o SNS no âmbito da valência de

cardiologia, não sendo, por isso, detentora de convenção para o efeito;

81. Ademais, apesar da informação constante do SRER da ERS, também não integra a

listagem das ARS Centro e ARS Norte de entidades convencionadas com o SNS no

âmbito da valência de análises clínicas.

82. O que implica igualmente que esta entidade poderá estar a atender utentes do SNS

sem ser possuidora de Convenção com o SNS para a prestação de cuidados de saúde,

também no âmbito da valência de análises clínicas.

83. Pelo que não deixaram de suscitar-se preocupações regulatórias, atenta a factualidade

apurada.

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84. Desde logo porque o comportamento do prestador não corresponde à prestação de

informação totalmente clara e transparente, porquanto, uma qualquer referência,

genérica e isolada, à realização de exames cardiológicos a utentes do SNS no âmbito

de uma alegada convenção com o SNS, não se coaduna, com o dever de prestação de

informação tal como acima enunciado.

85. A Medicambra, não sendo detentora de nenhum acordo com o SNS para a realização

de exames cardiológicos, está sempre impedida de aceitar requisições dos Centros de

Saúde;

86. Bem como de cobrar, em qualquer dos casos, taxas moderadoras pela prestação de

cuidados de saúde naquela valência.

87. Acontece que, qualquer utente do SNS pode dirigir-se ao prestador “convencido” que

aquele detém uma qualidade que, afinal, não detém;

88. Tal podendo, assim, atentar contra os próprios direitos e interesses de cada um dos

utentes;

89. Assim sendo, e relembrando a inerente assimetria de informação na relação prestador-

utente, qualquer publicidade relativa a serviços de saúde deve, assim, pautar-se por

um estrito e rigoroso respeito pela transparência, veracidade, integridade e completude

da mensagem que transmita;

90. Tudo de modo a garantir que a liberdade de escolha dos utentes não venha a resultar

prejudicada;

91. E igualmente os próprios interesses do mercado, aqui considerados a da sã

concorrência entre os demais prestadores de cuidados de saúde.

92. Reiterando-se, e dando-se por integralmente reproduzido, o entendimento da ERS

sobre esta matéria, expresso em geral nas deliberações emitidas no âmbito dos

processos de inquérito n.º ERS/005/09, ERS/123/11 e ERS/040/12 e ERS/036/13,

cujas decisões se encontram publicadas no site da ERS, em www.ers.pt;

93. Destacando-se, em particular, que a atuação da ERS se tem pautado no sentido de os

prestadores:

(i) quando convencionados, apenas poderem utilizar a convenção por si detida para

a prestação de cuidados de saúde, nas instalações convencionadas, as quais

constam aliás da respetiva ficha técnica;

(ii) não permitirem a utilização por qualquer entidade terceira, seja direta ou

indiretamente e independentemente da forma para tanto utilizada, da convenção

detida com o SNS;

15 Mod.016_01

(iii) não poderem fazer uso, em qualquer situação, de convenção com o SNS, ou com

qualquer outro subsistema ou seguro de saúde, detida por uma entidade terceira;

(iv) não poderem divulgar, por qualquer meio, possuir acordos ou convenções com o

SNS para a prestação de cuidados de saúde, nem tampouco com quaisquer

outros subsistemas públicos ou privados com os quais não possuam efetivamente

acordo ou convenção;

(v) deverem cessar, de imediato, a veiculação de toda e qualquer mensagem,

independentemente do seu concreto suporte de difusão ou transmissão, em que

aluda à existência de acordo(s) com o SNS, à aceitação de credenciais do SNS

ou, genericamente, que possa induzir em erro os utentes quanto à sua inexistente

qualidade de convencionado com o SNS6.

94. Por outro lado, a ERS não deixou de informar as Administrações Regionais de Saúde,

contraparte no contrato de convenção e atentas as atribuições respetivas, quer dando

conhecimento da sua atuação, quando aplicável, quer emitindo, quando necessário,

recomendações às ARS, no sentido de garantirem que apenas as entidades

convencionadas com o SNS prestam, efetivamente, cuidados de saúde a utentes do

SNS e apresentam, posteriormente, para pagamento a essa Instituição a respetiva

faturação; de aquilatarem da concreta forma como vem sendo utilizada a convenção, e

consequentemente proceder à ponderação sobre a existência de facto dos

pressupostos físicos e materiais para uma correta detenção e utilização de convenção7.

95. Na verdade, o direito do utente à informação trata-se de um princípio que deve modelar

todo o quadro de relações atuais e potenciais entre utentes e prestadores de cuidados

de saúde.

96. Sendo que, a informação quanto à concreta entidade prestadora, responsável pela

prestação dos cuidados, bem como quanto ao conteúdo e extensão de eventuais

convenções não pode, por isso, deixar de ser completa, verdadeira e inteligível.

97. A informação disponibilizada ao público pelos prestadores deverá ser suficiente para o

dotar dos instrumentos necessários ao exercício da liberdade de escolha nas unidades

de saúde privadas, situando-se necessariamente em momento anterior àquele em que

o concreto utente orientou já a sua escolha para um determinado prestador.

98. Reiterando-se que, a informação errónea do utente quanto à existência de convenções

é apta a distorcer o exercício da própria liberdade de escolha dos utentes;

6 Este concreto entendimento foi, também, recentemente destacado na recomendação da ERS,

relativa a práticas publicitárias de prestadores de cuidados de saúde, publicada em www.ers.pt.

7 Veja-se, por exemplo, os ERS/054/08; ERS/092/09; ERS/052/10; ERS/031/12; ERS/038/12, bem

como os processos de inquérito ERS/003/09; ERS/005/09; ERS/097/10 e ERS/036/13.

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99. Tal como pode facilitar situações de lesões de direitos e interesses financeiros dos

utentes.

100. Assim, conforme resulta de todo o exposto, atualmente não existe nenhuma

Convenção do SNS que abranja o prestador Medicambra, que não pode prestar

cuidados de saúde na área de cardiologia a utentes do SNS, no seu estabelecimento;

101. Nem tão pouco pode prestar cuidados de saúde na área de análises clínicas a

utentes do SNS, no seu estabelecimento;

102. Sob pena de ao fazê-lo se encontrar a violar os direitos e interesses legítimos dos

utentes ao consentimento informado e esclarecido, nos termos das alíneas b) e e) do

n.º 1 da Base XIV da LBS e, consequentemente, de escolher livremente o agente

prestador de cuidados de saúde, alínea a) do n.º 1 da Base XIV da Lei de Bases da

Saúde, preceitos estes reforçados pelo disposto na Lei n.º 15/2014, de 21 de março;

103. Bem como a não respeitar a legalidade e transparência que deve pautar as

relações económicas entre prestadores de cuidados de saúde e utentes.

104. Sendo que, tais comportamentos dos prestadores impactam ainda, conforme visto,

com o respeito da concorrência nas atividades abertas ao mercado sujeitas à sua

jurisdição, que à ERS incumbe velar, nos termos dos seus Estatutos;

105. Pois quando um prestador não detentor de convenção atende utentes beneficiários

do SNS, é adulterado e falseado o jogo concorrencial pré-existente;

106. Seja relativamente àqueles que não possuem convenção e que,

consequentemente, não acedem a tal sector e mercado;

107. Seja, ainda, relativamente aos outros prestadores convencionados.

108. Recorde-se ainda que, à ERS incumbe a garantia dos direitos dos utentes,

considerados os requisitos de exercício da atividade e funcionamento dos

estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde.

109. Com efeito, os direitos dos utentes deverão ser acautelados por via do cumprimento

de requisitos legais e regulamentares inerentes ao funcionamento de um

estabelecimento prestador de cuidados de saúde.

110. É, assim, no âmbito da defesa do cumprimento dos requisitos de exercício da

atividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde tendo em vista a

garantia dos direitos e interesses legítimos dos utentes, que a ERS intervém.

111. Os utentes dos serviços de saúde que recorrem à prestação de cuidados de saúde

encontram-se, não raras vezes, numa situação de vulnerabilidade que torna ainda mais

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premente a necessidade dos cuidados de saúde serem prestados pelos meios

adequados, com prontidão, humanidade, correção técnica e respeito;

112. Ainda, incumbe à ERS proceder ao registo público dos estabelecimentos

prestadores de cuidados de saúde, bem como “[…] às suas atualizações,, e ainda

assegurar todos os atos tendentes à sua manutenção e desenvolvimento, nos termos

de regulamento por si a emitir” – cfr. n.º 1 do artigo 26º dos Estatutos da ERS.

113. Por outro lado, “As entidades responsáveis por estabelecimentos sujeitos à

regulação da ERS estão obrigadas a inscrevê-los no registo previamente ao início da

sua atividade, bem como a proceder à sua atualização, no prazo de 30 dias a contar de

qualquer alteração dos dados do registo.” – cfr. n.º 3 do mesmo dispositivo legal.

114. Do registo na ERS dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde,

resulta então a garantia para os utentes de um patamar mínimo de qualidade dos

prestadores de cuidados de saúde em exercício de atividade;

115. Razão pela qual o registo público não pode deixar de refletir a realidade do

prestador, assumindo-se como essencial ao conhecimento do universo de prestadores

em atividade, sujeitos a direitos e deveres idênticas, quer perante a ERS, quer perante

os seus utentes, independentemente da sua natureza jurídica;

116. Sob pena de se constranger, por um lado, o cabal desempenho das funções de

regulação e supervisão que cabem à ERS, e por outro lado, a tomada de decisão livre

e esclarecida por parte dos utentes em geral;

117. E nesta medida, considerando que foi possível apurar nos autos que o prestador,

apesar de se encontrar registado no SRER da ERS, a inscrição no registo encontra-se

no estado “suspenso”;

118. Assim, e recorde-se, dado que da pesquisa no SRER da ERS, apurou-se que o

estabelecimento Medicambra fez constar que detém “Acordos/Convenções” com o

SNS, em “Análises clínicas e patologia clinica”;

119. Não obstante, o prestador não integrar a listagem das ARS Centro e ARS Norte

de entidades convencionadas com o SNS no âmbito da valência de análises clínicas;

120. Também por esta razão se justifica igualmente uma intervenção regulatória no

sentido de garantir a revisão e atualização imediatas de toda a informação por si

inscrita no registo público da ERS.

121. Assim, por todo o exposto, impõe-se a intervenção regulatória da ERS no sentido

de assegurar a adequação das situações detetadas, designadamente, no que toca à

necessidade de garantia do respeito pelos direitos e legítimos interesses dos utentes,

18 Mod.016_01

em face de uma atuação, por parte do prestador, como se de entidade convencionada

se tratasse.

IV. AUDIÊNCIA DOS INTERESSADOS

122. A presente deliberação foi precedida de audiência escrita dos interessados, nos

termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 101.º do Código do

Procedimento Administrativo, aplicável ex vi do artigo 24.º dos Estatutos da ERS, tendo

para o efeito sido chamados a pronunciar-se, relativamente ao projeto de deliberação

da ERS, a Medicambra e o exponente;

123. A ERS não foi notificada da pronúncia do exponente, seja no decurso do prazo

legal para o efeito, seja até ao presente momento.

124. Já a pronúncia da Medicambra foi rececionada pela ERS no dia 16 de março de

2015, tendo o prestador declarado, relativamente ao projeto de deliberação da ERS, no

que aqui importa considerar, que,

(i) “[…] opera em Vale de Cambra, concelho onde não existe qualquer convenção

de Cardiologia”;

(ii) existem entidades com convenção em “[…] Arouca, S. João da Madeira e

Oliveira de Azeméis (cujas distâncias ao centro da cidade de Vale de Cambra

variam entre 15 e 25 Kms)”;

(iii) tem acordos com “[…] outras entidades para a especialidade de Cardiologia,

nomeadamente companhias de seguros, entidades gestoras de sinistros,

entidades gestoras de serviços e seguros de saúde, entidades patronais e

outras instituições e organizações similares”;

(iv) os exames, Electrocardiograma Ecocardiograma e Holter “[…] são realizados

por técnicos de cardiologia e/ou enfermeiros e Médicos especialistas em

cardiologia (o que, por exemplo, no caso dos Ecocardiogramas, reduz de

sobremaneira a necessidade de repetições de exames e prescrições futuras)”;

(v) muitas vezes os utentes das entidades referidas supra “[…] têm, como suporte

prescritivo dos exames a efectuar, a requisição vulgarmente conhecida por

19 Mod.016_01

"P1", ou "credencial", que configura, para qualquer efeito ou entidade, uma

prescrição de um exame ou meio complementar de diagnóstico”;

(vi) “Esse suporte, credencial ou receita, vem, frequentemente, munido de

informações clinicas importantes para o diagnóstico/interpretação do exame, ou

mesmo para a sua realização”;

(vii) “Os preços praticados pela Medicambra, nesta sede, não são os praticados

pelas entidades convencionadas em sede de convenção”;

(viii) desconhecendo “[…] alguma obrigatoriedade de fixação de preços ou tabela

de preços particulares de aplicabilidade geral no sector ou especialidade”;

(ix) não estando “[…] a Medicambra vedada de atender beneficiários do SNS

(qualidade comum a toda a população portuguesa), como aliás, não pode estar

vedada, nem vedar, o atendimento a quem quer que seja”;

(x) sendo que, “[…] não factura qualquer meio complementar de diagnóstico à ARS

Centro ou ARS Norte”, nem “[…] procede a qualquer facturação de exames ou

actos para os que não esteja convencionada, a entidades com as quais não

tenha convenção, nem a repercute a quem a procura nessa situação”;

(xi) “Da diligência efectuada decorre, apenas, que atende quem seja portador de

credencial [não permitindo] concluir que se arrogue a qualidade de prestadora

convencionada, até porque os preços praticados não são os resultantes da

tabela aplicável ao sector convencionado para essa especialidade”.

125. Mais referindo que irão apontar “[…] alternativas convencionadas a quem nos

procurar para a realização desses exames [solicitando] o fornecimento de listagem

devidamente validada pela ERS das entidades que o possam fazer em Vale de

Cambra”, para promover “[…] a indicação e marcação dos utentes que pretendam

realizar os exames de foro cardiológico, junto de entidades constantes dessa lista”.

126. E que “Os serviços administrativos da Medicambra darão cumprimento aos pontos

122. e 123. do Projecto de Deliberação, alterando a mensagem a veicular aos seus

utentes, deixando de referir expressões que possam causar confusão”.

127. Esta entidade refere por fim que, no que respeita à Patologia Clinica, a localização

em causa está devidamente registada e convencionada pela Medicina Laboratorial Dr.

Luís Aguiar Soares, SA.

128. Assim, na sequência da análise do alegado em sede de pronúncia, quanto ao

entendimento apresentado pela Medicambra de que “[…] não factura qualquer meio

20 Mod.016_01

complementar de diagnóstico à ARS Centro ou ARS Norte”, nem “[…] procede a

qualquer facturação de exames ou actos para os que não esteja convencionada, a

entidades com as quais não tenha convenção, nem a repercute a quem a procura

nessa situação”;

129. Sendo que “Da diligência efectuada decorre, apenas, que atende quem seja

portador de credencial [não permitindo] concluir que se arrogue a qualidade de

prestadora convencionada, até porque os preços praticados não são os resultantes da

tabela aplicável ao sector convencionado para essa especialidade”.

130. Recorde-se, quanto a esta questão, que no âmbito da deslocação às instalações do

prestador, foi solicitado à funcionária que prestou o atendimento, a possibilidade de

realização de MCDT´s do foro cardiológico, especificamente na qualidade de utente do

SNS.

131. Nessa sequência, e em resposta, a funcionária que procedeu ao atendimento

confirmou “[…] a realização dos exames Eletrocardiograma (ECG), Ecocardiograma e

Holter, a beneficiários do SNS, mediante apresentação da competente credencial”,

acrescentando ademais que “[…] aos utentes isentos nada seria cobrado e aos demais

os preços praticados seriam de (…)€ no caso do ECG, (…) € para eletrocardiograma e

(…)€ no caso do Holter, […]”.

132. Ora, não só a funcionária informou da possibilidade de realização dos referidos

exames a utentes na qualidade de beneficiários do SNS, como ademais explicou que

os utentes que detivessem a qualidade de isentos (qualidade especifica de utente

SNS), não pagam qualquer valor.

133. Ora, recorde-se ademais o supra exposto, quanto à inadmissibilidade dos

comportamentos verificados na Medicambra sempre que, utilize indevidamente a

qualidade de convencionada com o SNS em Cardiologia, uma vez que tal utilização

indevida será, desde logo, apta a violar a liberdade de escolha dos utentes, induzindo

estes últimos, a recorrerem ao referido prestador com base numa qualidade, in casu de

convencionado do SNS, que na realidade, não possui.

134. Bem como a violar a sã concorrência entre prestadores, ao possibilitar ao prestador

em questão concorrer pela prestação de serviços convencionados aos utentes do SNS

quando, na realidade, não possuirá o requisito (convenção) exigido para tanto.

135. Assim, os procedimentos de agendamento e marcação de exames na Medicambra,

descritos nos autos não garantem, desde logo, o dever de prestação de informação

totalmente clara e transparente, porquanto, uma qualquer referência, genérica e

21 Mod.016_01

isolada, à realização de exames cardiológicos a utentes do SNS no âmbito de uma

alegada convenção com o SNS, não se coaduna, com o dever de prestação de

informação tal como acima enunciado;

136. Certo é que, mais relevante do que assumir a alegada “cortesia”, de indicar

“alternativas convencionadas a quem nos procurar para a realização desses exames”;

137. Deverá antes o prestador garantir que informa, de forma clara, a sua não qualidade

de entidade convencionada, em qualquer contacto junto dos seus utentes;

138. Por outro lado, esclareça-se, face às considerações do prestador sobre as

entidades convencionadas na zona de Vale de Cambra, que não competirá ao mesmo

intervir nesta matéria, designadamente, porque não compete a esta entidade qualquer

reconhecimento em matéria de tutela e proteção de direitos dos utentes do SNS;

139. Nem tão pouco fundamentar a sua atuação e comportamento na convicção assim

alegada.

140. Ainda, mais se diga que o prestador, como entidade atuante no setor da saúde,

pautado por uma marcada assimetria de informação em prejuízo dos utentes de

cuidados de saúde, tem a obrigação de saber quais os seus direitos e obrigações,

enquanto entidade prestadora de cuidados de saúde privada;

141. Nessa medida, deverá ser do seu conhecimento que é no Centro de Saúde que os

utentes são informados das listas de entidades convencionadas, obrigação esta já

assegurada, em geral pelas ARS, e nos respetivos locais, pelos ACES competentes.

142. Tratando-se de um entendimento já amplamente divulgado pela ERS no seu sítio

eletrónico, em www.ers.pt, e que não devia ser desconhecido do prestador como

entidade regulada8;

143. Tal como não deverá desconhecer, de todo, a sua obrigação de garantir a

informação permanente e atualizada aos utentes, desde logo em matéria de preços

praticados.

144. Finalmente refira-se que nunca foi mencionado por esta entidade reguladora que o

prestador não pode, regra geral, aceitar atender utentes que cumulem a qualidade de

beneficiários do SNS, qualidade esta inerente a todos os utentes;

145. Cumprindo esclarecer que, não se deve confundir o dever de informação relativa a

serviços de saúde, que deve pautar-se por um estrito e rigoroso respeito pela

8 Veja-se, a título meramente exemplificativo, as deliberações emitidas nos ERS/088/07,

ERS/067/11 e ERS/001/2014, publicadas em www.ers.pt.

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transparência, veracidade, integridade e completude da mensagem que transmita, bem

como, a proibição de prestar cuidados de saúde aos utentes do SNS para a área de

exames de cardiologia, análises clínicas ou anatomia patológica, arrogando-se de

alegada qualidade de entidade convencionada com o SNS, por si não detida, com a

possibilidade de atender os utentes que a si se dirigem, que sempre se mantém;

146. Só que, em momento algum poderá o utente agir enquanto beneficiário do SNS, ou

nessa convicção.

147. Finalmente, quanto à afirmação do prestador de que, no que respeita à Patologia

Clinica, a localização em causa está devidamente registada e convencionada pela

Medicina Laboratorial Dr. Luís Aguiar Soares, SA., refira-se que, sendo este o

prestador detentor da convenção com o SNS, tal em nada altera a obrigação da

Medicambra (entidade distinta e não detentora de convenção com o SNS) de não

atender utentes do SNS, neste caso, também para as valências de análises clínicas e

anatomia patológica.

148. Assim, e em conclusão, quanto ao projeto de instrução emitido pela ERS, não

foram dados a conhecer pela Medicambra novos factos, questões e provas que nele

não tivessem sido (adequadamente) considerados;

149. Não se vislumbrando, assim, quaisquer outras diligências úteis à descoberta da

verdade que pudessem ser, ainda, realizadas.

150. A tanto acresce a conclusão de que os elementos dados a conhecer à ERS em

sede da audiência dos interessados, não parecem infirmar as conclusões já

alcançadas em sede do projeto de deliberação regularmente notificado;

151. E nesta medida justifica-se, de forma plena, a manutenção da instrução projetada

pela ERS.

V. DECISÃO

152. Tudo visto e ponderado, o Conselho de Administração da ERS delibera, nos termos

e para os efeitos do disposto nas alíneas a) e b) do artigo 19.º dos Estatutos da ERS,

aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, emitir uma ordem à

Medicambra – Prestação de Serviços Médicos, Lda., nos seguintes termos:

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a) A Medicambra – Prestação de Serviços Médicos, Lda. deve abster-se

imediatamente de prestar cuidados de saúde aos utentes do SNS para a

área de exames de cardiologia, ou anatomia patológica, arrogando-se de

alegada qualidade de entidade convencionada com o SNS, por si não

detida;

b) A Medicambra – Prestação de Serviços Médicos, Lda. deve dar

cumprimento imediato à presente ordem e deve dar conhecimento à ERS,

no prazo máximo de 5 (cinco) dias úteis após a notificação da deliberação

final, dos procedimentos adotados para cumprimento da ordem aqui emitida.

153. O Conselho de Administração da ERS delibera ainda, nos termos e para os efeitos

do disposto nas alíneas a) e b) do artigo 19.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo

Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, emitir uma instrução à Medicambra –

Prestação de Serviços Médicos, Lda., nos seguintes termos:

a) A Medicambra – Prestação de Serviços Médicos, Lda. deve providenciar

para que de qualquer mensagem publicitária por si veiculada resulte de

forma clara a sua não qualidade de entidade convencionada, bem como

deve assumir, de forma clara também, tal não qualidade em qualquer

contacto que encete junto dos seus utentes, seja ele informático e/ou

telefónico;

b) A Medicambra – Prestação de Serviços Médicos, Lda. deve garantir a

revisão e atualização imediatas de toda a informação por si inscrita no

registo público da ERS;

c) A Medicambra – Prestação de Serviços Médicos, Lda. deve dar

cumprimento imediato à presente instrução e deve dar conhecimento à

ERS, no prazo máximo de 30 (trinta) dias úteis após a notificação da

presente deliberação, dos procedimentos adotados para cumprimento da

instrução aqui emitida.

154. A ordem e instrução ora emitidas constituem decisão da ERS, sendo que a alínea

b) do n.º 1 do artigo 61.º dos seus Estatutos, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014,

de 22 de agosto, configura como contraordenação punível in casu com coima de

1000,00 EUR a 44 891,81 EUR, “[….] o desrespeito de norma ou de decisão da ERS

que, no exercício dos seus poderes regulamentares, de supervisão ou sancionatórios,

determinem qualquer obrigação ou proibição, previstos nos artigos 14.º, 16.º, 17.º, 19.º.

20.º, 22.º e 23.º”.

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155. O Conselho de Administração da ERS delibera igualmente dar conhecimento da

presente deliberação à Administração Regional de Saúde do Norte, I.P. e à

Administração Regional de Saúde do Centro, I.P.

156. A versão não confidencial da presente deliberação será publicitada no sítio oficial

da Entidade Reguladora da Saúde na Internet.

O Conselho de Administração

Porto, 25 de março de 2015.