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1 Mod.016_01 DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE (VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL) Considerando que a Entidade Reguladora da Saúde (ERS), nos termos do n.º 1 do artigo 4.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto exerce funções de regulação, de supervisão e de promoção e defesa da concorrência respeitantes às atividades económicas na área da saúde nos setores privado, público, cooperativo e social; Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo 5.º dos seus Estatutos, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto; Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos no artigo 10.º dos seus Estatutos, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto; Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos no artigo 19.º dos seus Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto; Visto o processo registado sob o n.º ERS/012/14;

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1 Mod.016_01

DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA

ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE

(VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL)

Considerando que a Entidade Reguladora da Saúde (ERS), nos termos do n.º 1 do

artigo 4.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de

agosto exerce funções de regulação, de supervisão e de promoção e defesa da

concorrência respeitantes às atividades económicas na área da saúde nos setores

privado, público, cooperativo e social;

Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo

5.º dos seus Estatutos, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto;

Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde

estabelecidos no artigo 10.º dos seus Estatutos, aprovados pelo Decreto-Lei n.º

126/2014, de 22 de agosto;

Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde

estabelecidos no artigo 19.º dos seus Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei

n.º 126/2014, de 22 de agosto;

Visto o processo registado sob o n.º ERS/012/14;

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I. DO PROCESSO

I.1. Origem do processo

1. A ERS tomou conhecimento a 4 de fevereiro de 2014, das notícias veiculadas

pelos meios de comunicação social, relativas à transferência do utente H. do

Centro Hospitalar Trás-os-Montes e Alto Douro, E.P.E (CHTMAD) – Hospital de

Chaves para o Centro Hospitalar de Lisboa Norte, E.P.E. (CHLN) – Hospital Sta.

Maria.

2. Concretamente, nas referidas notícias era divulgado que:

(i) na sequência de acidente de viação do qual terá resultado neurotrauma, o

supracitado utente requeria a prestação de cuidados de saúde por uma

equipa de neurocirurgia, especialidade não disponível no CHTMAD – Hospital

de Chaves;

(ii) encetados contactos com várias unidades hospitalares da região norte e

centro, nenhuma terá aceite receber o utente em questão, o qual, por decisão

do Centro de Orientação de Doentes Urgentes (CODU), foi transferido para o

CHLN - Hospital de Sta. Maria.

I.2. Diligências

3. Em sede de diligências para apuramento dos factos, realizaram-se as seguintes

diligências de obtenção de prova, as quais se consideraram oportunas no sentido

de serem prestados os esclarecimentos que melhor pudessem enquadrar os

acontecimentos noticiados:

(i) pedido de informação ao CHTMAD, por ofício de 4 de fevereiro de 2014,

respondido em 13 de fevereiro de 2014;

(ii) pedido de informação ao INEM, por ofício de 11 de fevereiro de 2014,

respondido em 21 de março de 2014;

(iii) pedido de informação ao Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra,

E.P.E. (CHUC), por ofício de 13 de março, respondido em 10 de abril de

2014;

(iv) pedido de informação ao CHLN, por ofício de 13 de março, respondido

em 27 de março de 2014;

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(v) pedido de informação ao Centro Hospitalar S. João, E.P.E. (CHSJ), por

ofício de 13 de março, respondido em 31 de março de 2014;

(vi) pedido de informação ao Centro Hospitalar do Porto, E.P.E. (CHP), por

ofício de 13 de março, respondido em 31 de março de 2014;

(vii) pedido de informação ao Hospital de Braga (HB), por ofício de 13 de

março, respondido em 27 de março de 2014;

(viii) insistência ao pedido de informação formulado ao CHLN, por ofício de 8

de agosto, respondido em 18 de agosto de 2014;

(ix) pedido de parecer clínico a consultor da ERS em 8 de agosto de 2014.

II. DOS FACTOS

II.1 A resposta do CHTMAD

4. Na sequência do pedido de informação formulado pela ERS, no âmbito do qual foi

solicitado ao CHTMAD que:

(i) Explicitasse “[…] de forma fundamentada, se possível acompanhada de

elementos documentais, a situação descrita nas referidas notícias.”;

(ii) Se pronunciasse sobre “[…] a (in)existência da especialidade de

neurocirurgia no universo das unidades hospitalares que integram o

CHTMAD, E.P.E..”;

(iii) Se pronunciasse sobre “[…] a existência de protocolo de referenciação

para a especialidade de neurocirurgia no contexto de atendimento em serviço

de urgência.”;

(iv) Identificasse “[…] as unidades hospitalares contactadas no processo de

operacionalização da transferência do utente, descriminando o motivos de

recusa por cada uma aduzidos.”.

5. Veio aquele prestador, em resposta rececionada pela ERS em 13 de fevereiro de

2014, referir que “[…] o utente H. […] deu entrada no Serviço de Urgência do

Hospital de Chaves, vítima de acidente de viação, trazido pela VMER.”

6. Acrescentado ter o mesmo sido observado pela especialidade de cirurgia geral e

anestesiologia, tendo igualmente sido submetido à realização dos necessários

meios complementares de diagnóstico (MCDT´s).

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7. Após a concretização da observação clínica e compilados os resultados dos

MCDT´s realizados, e “[…] atenta a inexistência da especialidade de neurocirurgia

no universo das unidades hospitalares que o integram o CHTMAD, E.P.E. […] e

sendo o Hospital Geral de Santo António (HGSA-CHP) o […] hospital de referência

para a especialidade de neurocirurgia, foi estabelecido contacto com esta Unidade

de Saúde para avaliação/discussão do caso clínico […] e transferência do mesmo.”

8. Nesse contexto, terá sido contactado o neurologista de serviço do HGSA-CHP que,

após visionamento das imagens do TAC Crânio Encefálico, “[…] via medline”, terá

identificado “[…] neurotrauma com necessidade de avaliação por Neurocirurgia,

tendo […] num primeiro momento, dito […] que aceitava o doente, mas no contacto

seguinte, [comunicou] que não havia vaga nos Cuidados Intensivos

Neurocirúrgicos.”

9. Perante a “[…] recusa de aceitação do doente pelo HGSA [terão sido efetuados]

contactos com os […] hospitais que dispõem de valência de neurocirurgia.”

10. Concretamente, na sua resposta, o CHTMAD refere ter efetuado contactos com:

(i) O CHSJ, esclarecendo a propósito que o “[…] o neurocirurgião de

urgência [referiu] não ser possível a aceitação do doente por falta de

vaga.”

(ii) O HB, cujo cirurgião de urgência terá referido “[…] não ser possível a

aceitação do doente por falta de vaga.”.

(iii) O CHUC, no qual não terá sido possível contactar diretamente o

neurocirurgião de urgência por se encontrar a operar, pelo que o contacto

foi “[…] diferido para uma enfermeira, a qual, depois de falar com a

equipa médica de neurocirurgia, informou não haver vaga nos Cuidados

Intensivos.”

11. Nessa sequência, o CHTAMD terá voltado a contactar o HGSA-CHP, o qual estaria

já a efetuar contactos com outros hospitais no sentido da resolução da situação,

indicando “[…] a existência de vaga em Cuidados Intensivos de Neurocirurgia no

Hospital de Santa Maria – Lisboa.”

12. Na posse dessa informação, terá sido contactado o CODU para requisição de

transporte do doente para o CHLN – Hospital de Sta. Maria.

13. Após constatação da inviabilidade de transporte via helicóptero, atentas as

condições atmosféricas, terá sido decidido o transporte via terrestre, pela Viatura

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Médica de Emergência (VMER) de Chaves, tendo o utente tido alta da Unidade de

Chaves “[…] com estabilidade hemodinâmica e neurológica.”.

14. Nesse contexto, concluí o CHTMAD na resposta formulada que “[…] na

transferência inter-hospitalar do doente crítico [H.] foi cumprida a

Política/Norma/Procedimento N.º 035 do CHTMAD, E.P.E., que descreve os

procedimentos de transferência de doentes para outras Unidades de Saúde […]

em conformidade com as Recomendações para o Transporte de Doentes Críticos

– 2008, da Ordem dos Médicos e da Sociedade Portuguesa de Cuidados

Intensivos.” 1

II.2 A resposta do INEM

15. Revelou-se igualmente necessário solicitar ao INEM, por ofício de 11 de fevereiro

de 2014, o envio dos seguintes elementos informativos:

(i) identificação do concreto meio de socorro utilizado para realização de

assistência no local do acidente e subsequente transporte para o

CHTMAD, E.P.E – Hospital de Chaves;

(ii) informação sobre o diagnóstico realizado à chegada ao local do acidente;

(iii) hora de chegada ao local do acidente e hora de chegada ao CHTMAD,

E.P.E – Hospital de Chaves;

(iv) hora da receção de informação sobre a necessidade de transferência para

outra unidade hospitalar mais diferenciada, atendendo ao estado clínico do

utente;

(v) indicação das data(s) e hora(s) do(s) contacto(s) efetuados e das

unidades hospitalares contactadas para a referida transferência do

CHTMAD, E.P.E – Hospital de Chaves, bem como de toda a informação

trocada nesse âmbito;

1 Foram integrados nos autos, cópia do relatório resumo de episódio de urgência, do diário

clínico, dos relatórios dos serviços de imagiologia, dos registos das chamadas telefónicas

encetadas com vista à operacionalização da transferência, do procedimento interno de

transferência de doentes para outas unidades de saúde, da recomendação para transporte de

doentes críticos da sociedade portuguesa de cuidados intensivos, cujo teor se dá por

integralmente reproduzido.

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(vi) confirmação de que nenhuma das unidades hospitalares contactadas

aceitou a transferência do utente (com indicação da justificação então

transmitida);

(vii) esclarecimento sobre se todas as unidades hospitalares envolvidas e/ou

contactadas aferiram da capacidade de resposta das respetivas salas de

emergência;

(viii) identificação do profissional de saúde, por nome, categoria profissional e

funções, responsável pela decisão de alta do utente no CHTMAD, E.P.E –

Hospital de Chaves e consequente transferência para outra unidade

hospitalar;

(ix) identificação do profissional de saúde, por nome, categoria profissional e

funções, do CHTMAD, E.P.E – Hospital de Chaves que efectuou os

contactos com o CODU para solicitação, início e gestão da transferência

do utente para outra unidade hospitalar;

(x) indicação do concreto meio de socorro utilizado para realização da

transferência entre o CHTMAD, E.P.E e aquele que veio a ser o hospital de

destino, isto é, o CHLN, E.P.E.;

(xi) clarificação sobre se no momento da transferência já era conhecida

unidade hospitalar de destino do utente;

(xii) confirmação da impossibilidade de recurso de realização de transporte por

via aérea e de toda a informação trocada nesse âmbito;

(xiii) esclarecimento sobre o motivo pelo qual a transferência iniciada por via

terrestre terá sido interrompida e substituída por meio aéreo;

(xiv) identificação do profissional de saúde, por nome, categoria profissional e

funções, que acompanhou o utente no decurso do transporte.

16. Em resposta rececionada a 21 de fevereiro de 2014, veio o INEM remeter

documentos dos quais é possível retirar a descrição de todos os contactos

estabelecidos para operacionalização da assistência prestada ao utente em causa,

os quais se consubstanciam nas fichas de ocorrência I140103218, I140103336 e

I140103400, com hora inicial do evento pelas 03:10:202 do dia 01-02-2014 e fecho

às 12:29 do mesmo dia.

2 Não obstante na resposta formulada o INEM esclareça que a hora efetiva de chegada ao local

do acidente tenha sido 02h22m, porquanto o respetivo arquivo informático apresentará uma

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17. Concretamente, na resposta formulada ao pedido de esclarecimento formulado

pela ERS, esclarece o INEM que no âmbito do atendimento pré-hospitalar:

“[…]

i. para o local do acidente o […] CODU acionou a […] VMER de Chaves, a

[…] AEM de Chaves, os […] BV Flavienses e os […] [BV] Vidago;

ii. [a vítima] foi assistido/transportado pela AEM Chaves e pela VMER

Chaves;

iii. A VMER de Chaves, pelas 03h04m informou o CODU que já transportou

uma vítima com um TCE grave […];

18. No âmbito da mesma resposta, é esclarecido que já no âmbito do atendimento

hospitalar:

i. foi recebido um “[…] pedido do Hospital de Chaves para um transporte

secundário (para o hospital Stº António – Porto) […] pelas 04h04m […];

ii. informaram […] que a vítima fez TAC cerebral que foi avaliado pela

Neurocirurgia do [HGSA-CHP] que receberá o doente […];

iii. o médico do CODU informou que ia verificar condições para o Helicóptero

efetuar o transporte […];

iv. pelas 04h20m o Médico do CODU ligou para hospital Chaves a informar

que vão fazer o transporte por via terrestre (AEM e VMER) pois o

helicóptero não tinha condições atmosféricas para o transporte aéreo;

v. neste contacto a Médica do CHTMAD informou que recebeu uma chamada

do [HGSA-CHP] a informar que este não recebia o doente porque não

tinham vaga nos cuidados intensivos e mais informou que o Hospital São

João também não tinha vaga de cuidados intensivos;

vi. o Médico do CODU cancelou o acionamento dos meios (AEM e VMER) e

informou a Médica do Hospital de Chaves que teria que procurar vaga;

vii. pelas 05h10m o CODU recebeu nova chamada da Médica do Hospital de

Chaves informando que já tinha contactado todos os Hospitais do Norte e

até Coimbra e teve resposta negativa. Informou ainda que [o médico do

HGSA-CHP] conseguiu vaga no Hospital Stª Maria em Lisboa;

diferença horária de 60 m, conforme informação secundada pelo gestor do programa

informático junta ao processo.

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viii. [pelas 05h13m] o Médico do CODU contactou o Diretor Regional do Norte

do INEM informando que o Hospital de Chaves pretendia efetuar o

transporte para Lisboa mas que o Helicóptero não tinha condições

atmosféricas, e que o [HGSA-CHP], e os restantes Hospitais do Norte e

até Coimbra não tinham vaga.

ix. o Diretor Regional do Norte [do INEM] informou que se o doente não

necessita de cuidados de neurocirurgia a unidade de cuidados intensivos

polivalente de referência é Vila Real, se necessita de neurocirurgia deverá

ir para o [HGSA-CHP], se não for aceite é preciso saber porquê;

x. [pelas 05h15m] o Médico do CODU ligou para a neurocirurgia do [HGSA-

CHP] e informou o […] (neurocirurgião do Hospital St. António) que

recebeu um pedido de transferência do Hospital de Chaves para o Hospital

de Stª Maria e precisa saber o porquê de não ter recebido no [HGSA-

CHP]. O neurocirurgião respondeu que o doente necessita de cuidados

intensivos mas não tem vaga;

xi. o Médico do CODU pediu para que ficasse registado na chamada que o

Hospital de St.º António não recebia o doente;

xii. […] O Neurocirurgião informou que não tem vaga para o doente, nem

nenhum hospital do Norte e que o médico do CODU deve acionar os meios

para levar o doente para o Hospital Stª Maria (Lisboa) onde ele arranjou

vaga.”.

19. Também pelo CODU, é esclarecido que no que toca ao transporte inter-hospitalar:

i. inicialmente a vítima foi transportada pela AEM e VMER de Chaves e

posteriormente (a partir de Torres Novas) pelo Helicóptero INEM de Lisboa;

ii. o transporte não foi desde início realizado por via aérea devido às

condições meteorológicas adversas que se faziam sentir. Assim que as

condições meteorológicas permitiram a utilização da via aérea, esta foi a

utilizada por ser a mais rápida que o transporte por via terrestre;

20. Ainda, sob a epígrafe Relatório Transporte Secundário Chaves, é remetido um

resumo das gravações relativas ao evento em questão.

21. Do referido relatório consta que, na sequência da informação da médica do

Hospital de Chaves da recusa de transferência pelo HGSA-CHP, e na sequência

das instruções formuladas pelo diretor regional do CODU, o médico regulador do

INEM contactou o serviço de neurocirurgia do HGSA-CHP, ficando registado que:

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“[…]

i. Médico regulador quer saber porque não é recebido no [HSA] e se o doente

precisa de cuidados de NC [neurocirurgia]. O neurocirurgião responde que

necessita de NC mas que não tem vaga, o doente apresenta TCE com […],

precisando de cuidados intensivos. Médico regulador pergunta se não

precisa de ser operado é respondido que não […];

22. Em complemento à resposta formulada entendeu o INEM ser oportuno o envio de

CD, contendo a gravação das chamadas telefónicas realizadas entre os vários

meios de socorro acionados, e bem assim, entre as entidades hospitalares

intervenientes no processo de prestação de cuidados e transferência inter-

hospitalar que veio a ter lugar;

23. Da audição do referido CD foi elaborado memorando de registo e transcrição,

junto aos autos cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

24. Concretamente, no que ao contacto efetuado pelo médico regulador do CODU

para o HGSA-CHP diz respeito, é possível extrair da referida transcrição que:

“[…]

ii. o CODU […] contacta o HGSA […] questionando da desnecessidade do

utente ser observado por especialidade de neurocirurgia/neurologia,

obtendo a confirmação pelo referido médico do HGSA de que o utente

precisava de uma vaga de CIV´s .

iii. Nessa sequência o médico do CODU afirma “quero que fique registado que

o hospital de referência [HGSA-CHP] não recebe o doente”. O [médico do

HGSA-CHP] afirma que o doente ”precisa de cuidados intensivos”, “não

precisa de ser avaliado pela especialidade.

II.3 A resposta do CHP

25. Na sequência do pedido de informação formulado pela ERS, no âmbito do qual foi

solicitado que:

1) Se pronunciem, de forma fundamentada, sobre a situação descrita nas

referidas notícias.

2) Confirmação da receção de contacto do CHTMAD, E.P.E., solicitando

vaga para transferência do utente em causa, descriminando os pontos

listados infra:

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i. Data e hora da realização do contacto;

ii. Identificação do profissional responsável pela realização do

contacto por nome, categoria profissional e funções;

iii. Identificação do profissional responsável pela recessão do

contacto por nome, categoria profissional e funções;

iv. Tipo de vaga solicitada, por referência à especialidade respetiva;

v. Diligências internamente desencadeadas para confirmação da

disponibilidade de vaga;

vi. Confirmação da avaliação da TAC realizada pelo utente no

CHTMAD, E.P.E. e diagnóstico produzido, com identificação do

profissional responsável pelo mesmo, por nome, categoria

profissional e funções;

vii. Confirmação da aceitação da transferência, com indicação do

profissional responsável pela sua validação, por nome, categoria

profissional e funções;

viii. Confirmação da alteração da aceitação da transferência, com

indicação do profissional responsável pela sua validação, por

nome, categoria profissional e funções;

ix. Justificação aduzida para a recusa da transferência e identificação

do profissional responsável pela validação dessa mesma recusa.

3) Descriminação das diligências encetadas após recusa da transferência,

com vista à operacionalização da mesma para outra instituição, com

indicação:

i. Instituições hospitalares contactadas, com referência a data, hora

do contacto e interlocutores em cada uma delas, identificados por

nome, categoria profissional e funções;

ii. Tipo de vaga solicitada, por referência ao serviço respetivo;

iii. Motivos aduzidos para a recusa da transferência por cada uma das

instituições;

4) Descriminação do número de camas existentes no serviço de

neurocirurgia e no serviço de cuidados intensivos;

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5) Descriminação da taxa de ocupação dos serviços referidos no número

anterior, à data da ocorrência dos factos;

6) Identificação da equipa de urgência, à data dos factos, por nome,

categoria profissional, número de cédula profissional e funções.

26. Veio o CHP informar que:

“[…]

i. Confirma-se […] que a decisão de transferir o doente em causa para o

[HSM] foi assumida pelo CODU;

ii. Foi dado parecer técnico por neurocirurgia, após informação clínica do

Hospital de Chaves e confirmado pelas imagens visionadas, que se tratava

de uma […], que mandatava o internamento em cuidados intensivos.

iii. É verdade que no momento do contacto não existia vaga de cuidados

intensivos no CHP; nestas circunstâncias em situações extremas compete

ao CODU a reavaliação regional da situação;

iv. O CODU do Porto, não tomou a decisão de […] transferir formalmente o

doente […] para o [CHP], por este se tratar da unidade Hospitalar final de

Linha para neurotrauma da região Trás-os-Montes e Alto Douro;

v. Não existido envolvimento do CODU durante o processo de transferência

do doente, o médico que recpcionou a chamada do Hospital de Chaves, de

forma totalmente diligente, tentou ajudar a resolver a transferência do

doente, efectivando telefonemas para os diversos hospitais com

capacidade para o receber;

vi. Acresce que quando é encontrada uma vaga, e o CODU é contactado para

efectuar o transporte, nem neste momento a decisão de transferir o doente

é tomada formalmente; apesar de poder ter existido intenção de o fazer por

parte do CODU, este organismo não cumpriu o habitualmente estabelecido,

que é o contacto formal com a hierarquia do Hospital, designadamente o

Chefe de Equipa. Deste modo, as diligências efectuadas pelo médico do

CHP, a um nível de decisão mais baixo, foram sempre com intenção de

resolver o problema do doente.

vii. Foi solicitada vaga de cuidados intensivos, tendo sido contactado o Serviço

de Cuidados Intensivos, que no momento não tinha vaga (situação que

carece de reavaliação regional pelo CODU). Inicialmente foi aceite a

transferência […] que posteriormente, por não formalização de acordo com

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os trâmites habituais pelo CODU, acabou por não confirmar essa aceitação.

Esta não-aceitação da transferência prendeu-se com a não formalização

por parte do CODU, que por esse motivo não desencadeou o plano de

contingência habitualmente instituído nestas circunstâncias, supervisionado

pelo Chefe de Equipa.

viii. Entre as 2h00 e as 5h00 foram contactados vários hospitais da região

norte, centro e sul […] pedindo vaga de cuidados intensivos em hospitais

com capacidade de tratar doentes neurocríticos, tendo-se apenas

encontrado no [HSM]. As recusas prenderam-se com a falta de vagas de

cuidados intensivos.”

II.4 A resposta do CHSJ

27. Na sequência do pedido de informação formulado pela ERS, no âmbito do qual foi

solicitado que:

“[...]

1) Se pronunciem, de forma fundamentada, sobre a situação descrita nas

referidas notícias.

2) Confirmação da receção de contacto solicitando vaga para transferência

do utente em causa, descriminando os pontos listados infra:

i. Data e hora da realização do contacto;

ii. Instituição responsável pelo contacto;

iii. Identificação do profissional responsável pela realização do contacto

por nome, categoria profissional e funções;

iv. Identificação do profissional responsável pela recessão do contacto

por nome, categoria profissional e funções;

v. Tipo de vaga solicitada, por referência à especialidade respetiva;

vi. Diligências internamente desencadeadas para confirmação da

disponibilidade de vaga;

vii. Justificação aduzida para a recusa da transferência e identificação do

profissional responsável pela validação dessa mesma recusa.

3) Descriminação do número de camas existentes no serviço de

neurocirurgia e no serviço de cuidados intensivos;

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4) Descriminação da taxa de ocupação dos serviços referidos no número

anterior à data da ocorrência dos factos;

5) Identificação da equipa de urgência à data dos factos, por nome, categoria

profissional, número de cédula profissional e funções.

28. Foi rececionada resposta a 31 de março de 2014, dando conta que, após audição

dos profissionais envolvidos foi apurado que:

“[…]

i. [o médico neurocirurgião de serviço na Urgência] foi contactado por um

médico do Hospital de Chaves que perguntava se existiam vagas de

cuidados intensivos para um jovem com TCE. Este jovem tinha sido

referido previamente, pelo mesmo médico do Hospital de Chaves, ao

médico neurocirurgião do Centro Hospitalar do Porto, que inicialmente

aceitou, mas que, pouco depois, informou não poder receber o doente por

não haver vagas de cuidados intensivos nesse Centro Hospitalar;

ii. [o médico referido em i] informou que sabia não haver vagas de cuidados

intensivos no [CHSJ], uma vez que o médico intensivista da Sala de

Emergência […] o tinha informado de tal previamente, aquando do

internamento de um doente do nosso Hospital;

iii. […] pouco após este contacto de Chaves recebeu um telefonema do colega

neurocirurgião do Centro Hospitalar do Porto que igualmente perguntava

sobre a existência de camas intensivas vagas no CHSJ, tendo dado

resposta similar à fornecida ao colega de Chaves.

iv. Nenhum dos elementos inquiridos recebeu qualquer contacto do [CODU].”

II.5 A resposta do Hospital de Braga

29. Na sequência do pedido de informação formulado pela ERS, no âmbito do qual foi

solicitado ao que:

1) Se pronunciem, de forma fundamentada, sobre a situação descrita nas

referidas notícias.

2) Confirmação da receção de contacto solicitando vaga para transferência

do utente em causa, descriminando os pontos listados infra:

i. Data e hora da realização do contacto;

14 Mod.016_01

ii. Instituição responsável pelo contacto;

iii. Identificação do profissional responsável pela realização do contacto por

nome, categoria profissional e funções;

iv. Identificação do profissional responsável pela recessão do contacto por

nome, categoria profissional e funções;

v. Tipo de vaga solicitada, por referência à especialidade respetiva;

vi. Diligências internamente desencadeadas para confirmação da

disponibilidade de vaga;

vii. Justificação aduzida para a recusa da transferência e identificação do

profissional responsável pela validação dessa mesma recusa.

3) Descriminação do número de camas existentes no serviço de

neurocirurgia e no serviço de cuidados intensivos;

4) Descriminação da taxa de ocupação dos serviços referidos no número

anterior à data da ocorrência dos factos;

5) Identificação da equipa de urgência à data dos factos, por nome, categoria

profissional, número de cédula profissional e funções.

30. Foi rececionada a 27 de março de 2014 a resposta do Hospital de Braga

informando que:

“[…]

i. O [HB] recebeu uma chamada telefónica proveniente do Hospital de

Chaves […] a chamada foi recebida no número geral […] e foi encaminhada

para o número disponível para situações urgentes no âmbito da

Especialidade de Neurocirurgia […];

ii. De acordo com a situação descrita pela médica do Hospital de Chaves, o

que se pretendia era uma vaga na Unidade de Cuidados Intensivos

Polivalente para apoio a um doente de neurotrauma com necessidade de

suporte ventilatório;

iii. Foi verificado junto dos médicos que se encontravam a prestar funções na

UCIP […] a disponibilidade de vagas daquela Unidade, no momento do

contacto;

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iv. A justificação para a não aceitação da transferência ficou a dever-se ao

seguinte: a UCIP do [HB] tem uma lotação praticada de 12 camas e, no

momento do contacto, tinha 11 camas fisicamente ocupadas. A restante

cama tinha sido devidamente reservada para doente que se encontrava em

Cuidados Intermédios Médicos com pedido de transferência já formulado;

v. […] o serviço de urgência do Hospital de Chaves foi informado que a UCIP

do [HB] não dispunha de vagas para receber o Utente, na data pretendida,

não tendo o [HB] recebido qualquer contacto adicional sobre o assunto

[…].”

II.6 A resposta do CHUC

31. Na sequência do pedido de informação formulado pela ERS, no âmbito do qual foi

solicitado que:

“[...]

1) Se pronunciem, de forma fundamentada, sobre a situação descrita nas

referidas notícias.

2) Confirmação da receção de contacto solicitando vaga para transferência do

utente em causa, descriminando os pontos listados infra:

i. Data e hora da realização do contacto;

ii. Instituição responsável pelo contacto;

iii. Identificação do profissional responsável pela realização do contacto por

nome, categoria profissional e funções;

iv. Identificação do profissional responsável pela recessão do contacto por

nome, categoria profissional e funções;

v. Tipo de vaga solicitada, por referência à especialidade respetiva;

vi. Diligências internamente desencadeadas para confirmação da

disponibilidade de vaga;

vii. Justificação aduzida para a recusa da transferência e identificação do

profissional responsável pela validação dessa mesma recusa.

3) Descriminação do número de camas existentes no serviço de neurocirurgia e

no serviço de cuidados intensivos;

16 Mod.016_01

4) Descriminação da taxa de ocupação dos serviços referidos no número anterior

à data da ocorrência dos factos;

5) Identificação da equipa de urgência à data dos factos, por nome, categoria

profissional, número de cédula profissional e funções.”.

32. Veio o CHUC, por meio de resposta rececionada a 10 de abril de 2014 informar

que:

“[…]

i. a informação que possuímos é apenas baseada em notícias divulgadas na

imprensa e aponta para a necessidade de observação pela especialidade

de Neurocirurgia mas não para um tratamento cirúrgico das lesões

resultantes;

ii. confirma-se a receção de contacto inquirindo apenas sobre existência de

vaga no Serviço de Neurocirugia;

iii. […] não existiam camas disponíveis no Serviço de Neurocirurgia […] de

qualquer modo, […] este doente não seria internado no Serviço de

Neurocirurgia;

iv. […] [foi] referido que não havia vaga no Serviço mas que deveria ser

contactado o Serviço de Medicina Intensiva […] porque no CHUC, este tipo

de doente não é internado no Serviço de Neurocirurgia, mas sim no de

Medicina Intensiva;

v. […] não seria a falta de cama no Serviço que impediria a sua transferência

para observação e orientação pela equipa de Neurocirurgia de serviço à

urgência no polo HUC;

vi. nunca houve recusa da Neurocirurgia do CHUC em receber o doente. O

contacto feito apenas inquiria se a Neurocirurgia tinha vagas;”.

II.7 A resposta do CHLN

33. Na sequência do pedido de informação formulado pela ERS, no âmbito do qual foi

solicitado que:

“[...]

1) Se pronunciem, de forma fundamentada, sobre a situação descrita nas

referidas notícias.

17 Mod.016_01

2) Confirmação da receção de contacto solicitando vaga para transferência

do utente em causa, descriminando os pontos listados infra:

i. Data e hora da realização do contacto;

ii. Instituição responsável pelo contacto;

iii. Identificação do profissional responsável pela realização do

contacto por nome, categoria profissional e funções;

iv. Identificação do profissional responsável pela recessão do

contacto por nome, categoria profissional e funções;

v. Tipo de vaga solicitada, por referência à especialidade respetiva;

vi. Diligências internamente desencadeadas para confirmação da

disponibilidade de vaga;

vii. Identificação do profissional responsável pela validação da

transferência;

viii. Identificação do serviço no qual a vaga se insere;

3) Descrevam o diagnóstico do utente à chegada e procedimentos

desenvolvidos no decurso do respetivo internamento, com referência à

data de alta e instituição hospitalar de destino;

4) Descriminem o número de camas existentes no serviço de neurocirurgia e

no serviço de cuidados intensivos;

5) Descriminem da taxa de ocupação dos serviços referidos no número

anterior à data da ocorrência dos factos;

6) Identifiquem da equipa de urgência à data dos factos, por nome, categoria

profissional e funções.

34. Foi rececionada resposta a 27 de março de 2014, sendo que com relevância para

os autos apenas cumpre ressaltar o envio de relatório elaborado pelo Serviço de

Neurocirurgia do qual se retira que:

“[…]

i. […] por falta de vagas de ventilador no Hospital de Santo António e

restantes Centros Hospitalares com valência Neurocirúrgica da zona Norte

e Centro do País, foi transferido para o Hospital de Santa Maria.”.

18 Mod.016_01

35. Subsequentemente, por ofício rececionado a 18 de agosto de 2014, em resposta à

insistência por resposta completa ao pedido de informação formulado pela ERS e

bem assim em sede de esclarecimentos adicionais sobre:

“[…]

Identificação da entidade a quem foi ou será endereçada a faturação dos

cuidados prestados ao utente H. no âmbito do episódio de internamento

ocorrido no período de 01/02/2014 a 17/02/2014, atenta a origem do

utente.

36. Veio o CHLN, por ofício rececionado a 21 de fevereiro responder, em suma, que o

contacto solicitando vaga para transferência do utente em causa ocorreu pelas

05:00 horas, por meio de contacto encetado pelo HGSA-CHP, tendo como

interlocutores “[…] o médico de urgência de neurocirurgia escalado [no HGSA-

CHP]” e o “[…] interno complementar de neurocirurgia do [CHLN], tendo sido

pedida uma “[...] vaga em Unidade de Cuidados Intensivos de Neurocirurgia”.

37. Na sequência do contacto recebido “[…] o médico que recebeu o telefonema […],

confirmou a existência de vagas na UCIN (Unidade de Cuidados Intensivos de

Neurocirurgia), contactou o Neurocirurgião de prevenção, […], que aceitou de

imediato a transferência do doente.

38. Depois de obtida a autorização para a transferência foi contactado o HGSA-CHP,

informando “[…] da viabilidade da transferência imediata do doente do Hospital

Distrital de Chaves para o CHLN […]”.

39. “[…] A facturação dos cuidados assistenciais prestados ao utente H. no âmbito do

episódio de internamento […]” foi endereçada a uma companhia de seguros ao

abrigo de apólice contratada no âmbito de responsabilidade civil automóvel.

II.8 O pedido de parecer clínico

40. No âmbito das diligências instrutórias encetadas no presente processo de inquérito

entendeu-se pertinente a submissão da apreciação dos factos apurados por meio

da pronúncia dos diferentes prestadores auscultados a parecer clínico;

41. Assim, por parecer emitido a 10 de setembro de 2014, foi avaliado que:

“[…]

Tal como para o Acidente Vascular Cerebral, enfarte agudo do miocárdio e a

sépsis, também no caso do Trauma existe um conjunto de atitudes que, se

19 Mod.016_01

realizadas numa fase precoce, reduzem as complicações que lhe estão

associadas.

Conforme recomendação da DGS todas as Unidades Hospitalares com Serviço de

Urgência devem implementar um conjunto de normas para cumprimento dessas

atitudes.

No caso em apreço, ficam evidentes lacunas no cumprimento nomeadamente na

definição do Coordenador da Equipa de trauma o que ultrapassaria certamente a

dificuldade de comunicação entre unidades hospitalares como neste caso.

A realização da avaliação primária que deve ocorrer até 20 minutos após o trauma

julga-se ter decorrido em conformidade.

Na avaliação secundária deverá ser feito um planeamento de nível de cuidados

que inclui tratamento definitivo. Perante a inexistência de avaliação presencial por

Neurocirurgia julga-se não estar completa esta avaliação que de acordo com Rede

de Referenciação deveria ter sido efectuada no CHP.

O CODU munido destas directivas da DGS deveria ter planeado a transferência

para CHP independentemente das respostas que ia recebendo do mesmo.

Aqui após determinação de tratamento a instituir deveria ser atribuído o nível de

internamento (enfermaria, cuidos intermédio ou cuidados intensivos) dando término

agora à avaliação secundária.

A partir deste momento e constatada a ausência de vagas na Unidade CHP o

CODU deveria ter cumprido a missão de Centro de Orientação de Doente

Urgentes, isto é, diligenciar a obtenção de uma vaga de cuidados intensivos para

doente e em caso de se revelar como única alternativa o helitransporte, agilizar no

sentido da sua efectivação.

Conhecedor das normas da DGS questiona-se o facto de ter delegado na colega a

responsabilidade na procura de vaga após recusa do CHP. Acresce que o CODU

se conformou com a indicação de inexistência de vaga no CHP e existência de

vaga no hospital de Santa Maria não garantindo a aplicação das normas da DGS

relativamente á avaliação secundaria do politraumatizado não acautelando

eventuais risco de transporte tão demorado.

Ainda que num plano transitório, o doente deveria ter sido transferido para CHP,

terminado a avaliação secundária até 1 hora após trauma nesse hospital. Após

esta avaliação deveria proceder-se à integração do doente numa vaga com as

características inerentes ao doente em questão.”

20 Mod.016_01

III. DO DIREITO

III.1. Das atribuições e competências da ERS

42. De acordo com o n.º 1 do artigo 5.º dos Estatutos da ERS, esta tem por missão

“[…] a regulação da atividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados de

saúde.

43. Ainda, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 5.º dos seus Estatutos, as

atribuições da ERS compreendem “[…] a supervisão da atividade e funcionamento

dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde no que respeita:

[…] b) À garantia dos direitos relativos ao acesso aos cuidados de saúde, à

prestação de cuidados de saúde de qualidade, bem como dos demais

direitos dos utentes;

c) À legalidade e transparência das relações económicas entre os diversos

operadores, entidades financiadoras e utentes.”.

44. Sendo que estão sujeitos à regulação da ERS, nos termos do n.º 2 do artigo 4.º

dos seus Estatutos “[...] todos os estabelecimentos prestadores de cuidados de

saúde, do setor público, privado, cooperativo e social, independentemente da sua

natureza jurídica, nomeadamente hospitais, clínicas, centros de saúde,

consultórios, laboratórios de análises clinicas, equipamentos ou unidades de

telemedicina, unidades móveis de saúde e termas.”;

45. O que é o caso dos vários prestadores identificados, que detêm a qualidade de

estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde e se encontram

presentemente inscritos no SRER da ERS sob os n.º17656 (CHTMAD), n.º19061

(CHP), n.º 20296 (CHSJ) n.º 17737 (HB) n.º 18707 (CHLN).

46. No que se refere ao objetivo regulatório previsto na alínea b) do artigo 10.º dos

Estatutos da ERS, de assegurar o cumprimento dos critérios de acesso aos

cuidados de saúde, a alínea a) do artigo 12.º do mesmo diploma legislativo

estabelece ser incumbência da ERS “ assegurar o direito de acesso universal e

equitativo à prestação de cuidados de saúde nos serviços e estabelecimentos do

Serviço Nacional de Saúde (SNS), nos estabelecimentos publicamente

financiados, bem como nos estabelecimentos contratados para a prestação de

cuidados no âmbito de sistemas ou subsistemas públicos de saúde ou

21 Mod.016_01

equiparados, acrescentando a alínea b) do mesmo artigo o dever de “prevenir e

punir as práticas de rejeição e discriminação infundadas de utentes nos serviços e

estabelecimentos do SNS, nos estabelecimentos publicamente financiados, bem

como nos estabelecimentos contratados para a prestação de cuidados no âmbito

de sistemas ou subsistemas públicos de saúde ou equiparados”;

47. Podendo fazê-lo mediante o exercício dos seus poderes de supervisão

consubstanciado no dever de “zelar pela aplicação das leis e regulamentos e

demais normas aplicáveis às atividades sujeitas à sua regulação, no âmbito das

suas atribuições”, bem como na emissão de ordens e instruções, bem como

recomendações ou advertências individuais, sempre que tal seja necessário, sobre

quaisquer matérias relacionadas com os objetivos da sua atividade reguladora,

incluindo a imposição de medidas de conduta e a adoção das providências

necessárias à reparação dos direitos e interesses legítimos dos utentes – cfr. al. a)

e b) do artigo 19.º dos Estatutos da ERS.

48. E, no que concretamente respeita à obrigação de assegurar o cumprimento dos

critérios de acesso aos cuidados de saúde, se é certo que a violação do direito de

acesso, como direito complexo, pode surgir sob diferentes formas, ou ser originada

por diferentes causas, é igualmente certo que uma das suas violações mais

gravosas e últimas se consubstancia na rejeição infundada de pacientes;

49. É também competência da ERS, prevenir e punir as práticas de rejeição e

discriminação infundadas de utentes nos serviços e estabelecimentos do SNS, nos

estabelecimentos publicamente financiados, bem como nos estabelecimentos

contratados para a prestação de cuidados no âmbito de sistemas ou subsistemas

públicos de saúde ou equiparados.

50. Sendo estabelecido na alínea b) do n.º 2 do artigo 61.º dos Estatutos da ERS, que

“Constitui contraordenação, punível com coima de 1000 EUR a 3740,98 EUR ou

de 1500 EUR a 44 891,81 EUR, consoante o infrator seja pessoa singular ou

coletiva:

[…]

b) A violação das regras relativas ao acesso aos cuidados de saúde:

i) A violação da igualdade e universalidade no acesso ao SNS, prevista

na alínea a) do artigo 12.º;

ii) A violação de regras estabelecidas em lei ou regulamentação e que

visem garantir e conformar o acesso dos utentes aos cuidados de saúde, bem

22 Mod.016_01

como práticas de rejeição ou discriminação infundadas, em estabelecimentos

públicos, publicamente financiados, ou contratados para a prestação de

cuidados no âmbito de sistemas e subsistemas públicos de saúde ou

equiparados, nos termos do disposto nas alíneas a) e b) do artigo 12.º”.

III.2. As Redes de Referenciação Hospitalar (RRH) como regras de acesso do

utente aos cuidados de saúde do Serviço Nacional de Saúde

51. O direito à proteção da saúde, consagrado no art. 64.º da Constituição da

República Portuguesa (CRP), impõe o acesso dos cidadãos aos cuidados de

saúde no âmbito de um Serviço Nacional de Saúde (SNS), e com respeito pelos

princípios fundamentais plasmados naquele preceito constitucional,

designadamente a universalidade, generalidade e gratuitidade tendencial.

52. Por sua vez, a Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei n.º 48/90, de 24 de

agosto (LBS), em concretização da imposição constitucional contida no referido

preceito, estabelece no n.º 4 da sua Base I que “os cuidados de saúde são

prestados por serviços e estabelecimentos do Estado ou, sob fiscalização deste,

por outros entes públicos ou por entidades privadas, sem ou com fins lucrativos”;

53. Neste âmbito, os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde identificados

nos autos integram, assim, o conjunto das “instituições e serviços oficiais

prestadores de cuidados de saúde dependentes do Ministério da Saúde”, isto é,

pertencem ao SNS, tal como definido pelo n.º 2 da Base XII da Lei de Bases da

Saúde, e cujo Estatuto foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de janeiro.

54. Acresce que, conforme resulta da alínea b) da Base XXIV da LBS, os cidadãos

têm o direito a que lhes sejam prestados integradamente todos os cuidados de

saúde, não só os hospitalares, mas também os primários, os continuados ou até os

paliativos;

55. Uma forma de manifestação do princípio da generalidade no âmbito do SNS

prende-se com a necessidade de se garantir uma correta referenciação de

cuidados de saúde entre os diversos estabelecimentos nele integrados.

56. As RRH são pois essenciais ao cumprimento da característica de generalidade do

SNS, constituindo um sistema integrado e hierarquizado que visa satisfazer, de

forma concertada, as necessidades de assistência hospitalar no diagnóstico, de

formação, de investigação, de colaboração interdisciplinar e de garantia de

qualidade no âmbito de determinada especialidade.

23 Mod.016_01

57. Por outro lado, o funcionamento e as imposições adjacentes a cada uma das RRH

consubstanciam regras que, necessariamente, se manifestam no direito de acesso

do utente aos cuidados de saúde como consagrado na Constituição e na lei. O

deficiente funcionamento de uma RRH impacta negativamente com o direito de

acesso do utente aos cuidados de saúde, produzindo um efetivo não acesso (ou

um acesso tardio ou inadequado) aos cuidados de saúde necessários.

58. Nesse âmbito, considerando que que as regras respeitantes a cada uma das RRH

aprovadas constituem regras de acesso, nos termos e para os efeitos dos

Estatutos da ERS, devem as mesmas, ser garantidas pela ERS e, caso aplicável, o

seu incumprimento ser sancionado ao abrigo dos poderes que lhe foram atribuídos

pelas alínea a) e b) do artigo 12.º e alínea b) do n.º 2 do artigo 61.º de tal diploma.

59. Ora, a cada estabelecimento hospitalar que integra a rede devem ser atribuídos

uma área geográfica e populacional de influência e um papel específico na área

assistencial, tendo em conta a sua articulação, nomeadamente no âmbito de uma

rede de referenciação, quer com as unidades de cuidados primários, quer com os

demais estabelecimentos hospitalares.

60. Efetivamente, a atual organização do SNS assenta numa identificação clara e

inequívoca da cadeia (vertical) de atribuições, competências e responsabilidades,

para que o SNS seja, não somente de iure mas também de facto, um conjunto de

instituições e de serviços oficiais prestadores de cuidados de saúde organizado e

hierarquizado.

61. Nesse sentido, cada instituição deve conhecer, sem dúvida ou incerteza, o que

concretamente a si compete – e por tanto o que de si é esperado – para contribuir

para a garantia constitucional da prestação de cuidados de saúde nas melhores

condições de acesso, qualidade e segurança3.

62. Nesse sentido, interessa que os prestadores de cuidados de saúde que concorrem

para o funcionamento de cada uma das redes, não só se articulem entre si, desde

3 Nesse âmbito, os contratos programa surgem como instrumentos detidos quer pelas ARS,

quer pelos prestadores de cuidados de saúde, para a operacionalização das suas concretas

responsabilidades. Neles são definidos os objetivos do plano de atividades de cada um dos

estabelecimentos hospitalares e a subsequente contratualização com o Estado, mediante o

pagamento de contrapartidas financeiras em função da produção contratada e dos resultados

obtidos, devendo cada um dos prestadores garantir o cumprimento das suas obrigações para

garantirem, obviamente e in fine, o dever de garantir o acesso dos utentes aos cuidados de

saúde. Assim, os contratos programa devem garantir os meios necessários ao cumprimento

pelos hospitais contratantes, das regras determinadas por cada uma das RRH das quais os

mesmos fazem parte integrante.

24 Mod.016_01

os cuidados primários até aos diferenciados, em função dos recursos de que

dispõem, e consideradas as condicionantes de cada uma das regiões e da

valência a que respeitam, mas também se complementem, com a finalidade de

aproveitarem os recursos de que cada um é possuidor.

63. Na verdade, a referenciação de doentes deve ser assegurada para outras

unidades hospitalares integradas no SNS quer quando a valência médica em que

as prestações de saúde se qualificam não se inclua no respetivo perfil assistencial,

de acordo com as redes de referenciação em vigor, quer quando se verifique a

inexistência ou insuficiência de capacidade técnica, seja ela pontual ou

permanente.

64. Mas daqui resulta não só a obrigatoriedade das unidades hospitalares

referenciarem os utentes, mas também a obrigatoriedade de uma unidade

hospitalar de referência aceitar receber os utentes transferidos de outros hospitais.

65. Tal obrigação de aceitação verifica-se naquelas situações em que as unidades

referenciadoras de utentes não disponham de nível de referenciação adequado e

ou de capacidade técnica.

66. E tanto não deixa de resultar na revisão das Redes de Referenciação Hospitalar

projetada pela Portaria n.º 82/2014, de 10 de abril, que veio estabelecer os critérios

que permitem categorizar os serviços e estabelecimentos do SNS mas não

determinou quais as valências concretas que cada unidade hospitalar deverá

disponibilizar, e principalmente pela Portaria n.º 123-A/2014, de 19 de junho, que

estabeleceu os critérios de criação e revisão das Redes Nacionais de

Especialidades Hospitalares e de Referenciação, bem como as áreas que as

mesmas devem abranger;

67. Estando ali salientado que “a existência de mecanismos de referenciação deve

estar baseada numa cobertura territorial adequada às necessidades das

populações, tendo em conta a demografia e a acessibilidade geográfica, de forma

a garantir um atendimento de doentes que assegure o cumprimento de tempos

mínimos de resposta garantidos”;

68. E ainda, que as Redes deverão obedecer a determinados princípios, entre eles,

permitir a programação do trânsito dos utentes, garantindo a orientação correta

para o centro indicado, definir um quadro de responsabilização dos hospitais face à

resposta esperada e contratualizada;

25 Mod.016_01

69. Princípios estes que não divergem, em essência, do vindo de expor sobre as RRH

enquanto regras de acesso no âmbito do SNS.

III.2.1 A auto-suficiência regional

70. A organização do sistema de saúde baseia-se na divisão do território nacional

em regiões de saúde que “são dotadas de meios de acção bastante para

satisfazer autonomamente as necessidade correntes de saúde dos seus

habitantes, podendo, quando necessário, ser estabelecidos acordos inter-

regionais para a utilização de determinados recursos” – cfr. n.º 1 e 2 da Base

XVIII da LBS;

71. Consequentemente, o SNS detém uma organização de caráter regional, sendo

administrado por cada uma das ARS, competentes por cada uma das regiões

administrativamente organizadas.

72. As ARS desempenham um papel fundamental na estruturação e organização da

resposta do SNS nas áreas sob sua influência e, in extremis, na definição dos

pontos de oferta da rede hospitalar e das próprias RRH.

73. A este respeito, note-se ademais que tem tipicamente sido incumbência das

ARS “garantir à população da respectiva área geográfica de intervenção o

acesso à prestação de cuidados de saúde, adequando os recursos disponíveis

às necessidades e cumprir e fazer cumprir políticas e programas de saúde na

sua área de intervenção”4.

74. E é para cumprimento de tal atribuição fundamental que as ARS são dotadas de

um extenso elenco de atribuições, entre outras, assegurar, na respetiva área

geográfica, a prossecução das atribuições do Ministério da Saúde, assegurar a

adequada articulação entre os serviços prestadores de cuidados de saúde de

modo a garantir o cumprimento da rede de referenciação e elaborar a carta de

instalações e equipamentos das respetivas regiões de saúde5.

75. Nessa medida, importa assumir que qualquer rede que determine regras

concretas e claras de referenciação e/ou transferência de utentes e que per si

necessariamente concretizem o direito e o concomitante dever de referenciação

dos prestadores de cuidados de saúde nela integrados, tenha garantida a

4 Cfr. n.º 1 do artigo 3.º da Lei Orgânica das ARS, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 22/2012, de

30 de janeiro.

5 Cfr. n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 22/2012, de 30 de janeiro.

26 Mod.016_01

participação das entidades competentes a nível regional, pois que, só assim,

poderão aquelas garantir o efetivo exercício do direito à proteção à saúde dos

utentes e a verificação de cada uma das características essenciais do SNS,

designadamente aquelas da universalidade e generalidade.

76. Do exposto resulta então que a organização do SNS assenta no princípio da

auto-suficiência regional, e que constitui, ademais, decorrência direta da opção

constitucionalmente consagrada no que se refere à imposição de uma

organização regionalizada e descentralizada do serviço nacional de saúde.

77. Sendo certo também que conforme já defendido pela ERS6 as RRH atualmente

existentes7 se consubstanciam em meras linhas orientadoras, que estabelecem

requisitos e critérios apresentados como desejáveis mas reconhecidos como

inexistentes;

78. Constatação esta ainda não totalmente alterada, apesar do recente impulso ao

processo de revisão das Redes de Referenciação Hospitalar, supra referido;

79. O qual, também se adiante, em nada parece anular o reconhecimento da

necessidade reforçada de cada uma das ARS, por si e em concertação de

esforços, se organizar, estruturar, publicitar e ordenar para cumprimento, pelos

estabelecimentos do SNS das suas áreas geográficas, as RRH ou outras redes

e regras julgadas necessárias ao cumprimento do carácter da universalidade e

generalidade do SNS8.

III.2.2 Cuidados Hospitalares Urgentes ao Utente Traumatizado

80. Considerando que a assistência ao utente visado ocorreu na sequência de um

acidente de viação por via do qual ocorreu um traumatismo craneo-encefálico

grave, assume-se como necessário proceder à análise dos procedimentos

vigentes em matéria dos cuidados hospitalares urgentes ao doente traumatizado.

81. Assim, cumpre invocar Circular Normativa da DGS n.º 07/DQS/DQCO, de

31/03/2010, a qual versa sobre a Organização dos Cuidados Hospitalares

6 Cfr. Parecer e Recomendação da ERS de 2009, publicados no sítio eletrónico da ERS, em

www.ers.pt

7 Elaboradas no seio da Direcção-Geral da Saúde (DGS) e/ou da ACSS.

8 Na Recomendação da ERS de 2009, fora já recomendada pela ERS a “todas as ARS para

definirem, publicitarem e ordenarem para cumprimento por parte dos estabelecimentos

prestadores de cuidados de saúde envolvidos, as RRH que se apresentem como necessárias

nas suas áreas de influência.”.

27 Mod.016_01

Urgentes ao Doente Traumatizado, estando dirigida a todas as unidades do

SNS.

82. Com efeito, é reconhecido na referida circular que o trauma é “uma importante

causa de mortalidade […] e que […] tal como para o Acidente Vascular Cerebral,

o Enfarte Agudo do Miocárdio e a Sépsis [todos com vias verdes já instituídas]

também para o Trauma existe um conjunto de atitudes que, se realizadas numa

fase precoce da doença, reduzem as complicações e a mortalidade que lhe

estão associadas.”

83. A norma instituída destina-se assim a “[…] todas as Unidades de Saúde com

Serviço de Urgência […]”determinando para o efeito que:

[…]

i. No SUB (Serviço de Urgência Básico), existe, em cada momento, um

coordenador da equipa de trauma nomeado para o efeito;

ii. Num SUMC (Serviço de Urgência Médico-Cirúrgica), existe, em cada

momento, um coordenador da equipa de trauma, nomeado para o

efeito, e que a integra;

iii. Num SUP (Serviço de Urgência Polivalente), existe, a cada momento,

um coordenador da equipa de trauma nomeado para o efeito e a

respectiva equipa de trauma, necessária para a abordagem do doente

traumatizado.”- sublinhado nosso.

84. Sendo que a norma estipula os critérios de abordagem clínica a serem

implementados em momentos temporais distintos, a saber:

[…]

i. realização de avaliação primária e estabilização inicial (em <20 minutos);

ii. realização de avaliação secundária (em < 1 hora)”.

85. E que, entre os procedimentos a observar aquando da realização da avaliação

secundária constam:

“[…]

i. Formulação de um plano de actuação, para tratamento definitivo e

identificação do destino final do doente;

ii. Nível de internamento: unidade intensiva, unidade intermédia ou

enfermaria;

28 Mod.016_01

iii. Transferência externa;

86. Determinando a norma que a sua aplicação, e consequente concretização em

todo o universo dos Serviços de Urgência, deverá ocorrer até final de 2011.

87. De notar, que em sede dos trabalhos desenvolvidos no âmbito do Relatório da

Comissão de Reavaliação da Rede Nacional de Emergência e Urgência9 a

menção à referida circular normativa consta sob a epígrafe Via Verde do

Trauma;

88. Sendo que, conceptualmente, as vias verdes, juntamente com as redes de

referenciação, são consideradas um elemento essencial na melhoria das

garantias do direito de acesso.

89. Por essa razão, a necessidade de implementação destes Sistemas de Resposta

Rápida (Vias Verdes) foi recentemente reforçada pela publicação do Despacho

n.º 10319/2014, de 25 de julho, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º

153, de 11 de agosto de 2014, o qual definiu, para além de uma Rede de

Referenciação genérica de Urgência e Emergência, as Redes de Referenciação

específicas para as quatro Vias Verdes;

90. Com alusão específica à definição de Centros de Trauma e à Via Verde

Trauma10.

91. De todo o modo, atendendo às regras e práticas já em uso, é desde já assumida

a especificidade deste tipo de cuidados em termos de referenciação, por

privilegiar o fator tempo em detrimento das distâncias quilométricas e dos

critérios tradicionais de áreas de influência geográfica dos hospitais;

92. As Vias Verdes pré-hospitalares, deverão ser acionadas pelo utente através do

número nacional de emergência (112) e envolvem diretamente o INEM, “no

diagnóstico, eventual tratamento pré-hospitalar e adequado encaminhamento

para os Hospitais com as melhores condições de confirmação diagnóstico e

tratamento subsequente e com disponibilidade logística para a recepção dos

doentes”;

9 Publicado em http://www.portaldasaude.pt/NR/rdonlyres/0323CC90-45A4-40E4-AA7A-

7ACBC8BF6C75/0/ReavaliacaoRedeNacionalEmergenciaUrgancia.pdf.

10 Por não se encontrar em vigor à data dos factos, a referência ao presente despacho ocorre

necessariamente a título de enquadramento e referência de orientação futura quanto à matéria

em análise.

29 Mod.016_01

93. As Vias Verdes intra-hospitalares serão da responsabilidade de cada Hospital,

“para o diagnóstico expedito e tratamento rápido das duas situações clínicas,

quando o doente procura diretamente o Hospital, por sua iniciativa ou por meios

diferentes do INEM”;

94. E com efeito, por via do Despacho n.º 14041/2012, de 23 de outubro11, para

promover a correta referenciação dos doentes urgentes e ou emergentes, que lhe

compete, o INEM dispõe dos CODU, cujas atribuições são reguladas no referido

Despacho, e aos quais compete12:

“[…]

f) Coordenar a decisão sobre referenciação primária e secundária de todos os

doentes urgentes e ou emergentes na rede nacional de Serviços de

Urgência e ou Cuidados Intensivos, em particular a referenciação das Vias

Verdes;”

95. Tanto ocorre por força da competência atribuída ao INEM, de promover,

coordenar, assegurar e monitorizar a orientação dos doentes urgentes das vias

verdes instituídas pelos programas nacionais;

96. E resulta igualmente do mesmo Despacho n.º 10319/2014, que determina a

estrutura do Sistema Integrado de Emergência Médica (SIEM), e onde é destacada

a competência do INEM em termos de orientação dos doentes nas Redes de SU,

redes de referenciação específicas de urgência e Vias Verdes existentes13 14.

11

Publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 209, de 29 de outubro de 2012.

12 Cfr. n.º 2 do Despacho n.º 14041/2012, de 23 de outubro.

13 Cfr. artigo 18.º do Despacho n.º 10319/2014, de 25 de julho.

14 Destaque-se, com relevo para os autos, que o INEM é um instituto público, dotado de

autonomia administrativa e financeira e património próprio, a quem cabe a definir, organizar,

coordenar, participar e avaliar as atividades e o funcionamento do Sistema Integrado de

Emergência Médica (SIEM), assegurando a sua articulação com os serviços de urgência e ou

emergência nos estabelecimentos de saúde, nomeadamente no que respeita a: “[...] a)

Prestação de cuidados de emergência médica em ambiente pré-hospitalar, nas suas vertentes

medicalizados e não medicalizados, e respectiva articulação com os serviços de

urgência/emergência; b) Referenciação e transporte de urgência/emergência; c) Recepção

hospitalar e tratamento urgente/emergente”. Compete-lhe igualmente Promover a resposta

integrada ao doente urgente/emergente; Promover a correcta referenciação do doente

urgente/emergente e Promover a adequação do transporte inter-hospitalar do doente

urgente/emergente” – cfr. n.º 2 e 3 do artigo 3.º da Lei Orgânica do INEM, aprovada pelo

Decreto-Lei n.º 34/2012, de 14 de fevereiro.

Por outro lado, estas competências destinam-se a Coordenar a atividade de transporte inter-

hospitalar do doente urgente/emergente, realizado pelos meios de emergência do INEM, I.P e

30 Mod.016_01

III.3. Da análise da situação concreta

97. Do que resulta da análise dos factos, o utente sofreu um acidente de viação, tendo

sido, por via de determinação do INEM, objeto de referenciação primária para a

Unidade de Chaves do CHTMAD.

98. Na sequência da avaliação e da prestação de cuidados de estabilização ao utente,

foi decidido pela equipa médica de escala ao serviço de urgência daquela unidade

hospitalar, a necessidade do utente ser transferido para efeitos de avaliação

presencial pela especialidade de neurocirurgia, para o que foi contactado o

hospital de referência, in casu o HGSA-CHP;

99. Tendo esta unidade recusado receber o utente por alegada indisponibilidade de

vagas;

100. Perante idêntica manifestação de indisponibilidade do HB, do CHSJ e CHUC,

foi determinada a transferência do utente para o CHLN;

101. O que ocorreu por via de transporte inter-hospitalar realizado com recurso a

VMER do INEM, atenta a impossibilidade de transporte por via de helicóptero, pelo

facto das necessárias condições atmosféricas não se encontrarem reunidas.

102. Refira-se preliminarmente, que não compete à ERS avaliar a bondade dos

concretos cuidados de saúde prestados in casu, nem tão pouco avaliar da sua

oportunidade e pertinência clínica face às legis artis determinadas;

103. O objeto de análise dos presentes autos estará então delimitado à averiguação

do comportamento das entidades intervenientes e co-responsáveis no desfecho

produzido;

104. Porquanto já compete à ERS verificar se os protocolos ou procedimentos

existentes e/ou empregues no caso concreto são consentâneos com a

salvaguarda do direito de acesso que ao utente H. cumpria garantir e com a

prestação integrada, geral e universal dos cuidados de saúde que

necessariamente lhe subjazem.

Promover, coordenar, assegurar e monitorizar a orientação dos doentes urgentes das vias

verdes instituídas pelos programas nacionais.” - Cfr. art.º 4.º dos Estatutos do INEM, aprovados

pela Portaria n.º 158/2012 de 22 de maio.

31 Mod.016_01

105. Nessa medida, os factos serão analisados sob o prisma de uma (eventual)

violação do direito de acesso aos cuidados de saúde do utente em causa.

106. Ainda, a presente análise abrangerá necessariamente a avaliação da existência

e adequabilidade dos procedimentos dirigidos à referenciação e encaminhamento

de utentes em situação similar;

107. Quer na perspetiva dos diferentes prestadores de cuidados de saúde

envolvidos;

108. Quer na perspetiva das demais entidades intervenientes.

109. Assim, preliminarmente à análise de que se cuidará, cumpre refletir sobre a

natureza das unidades hospitalares em presença, especificamente sobre as

características dos serviços de urgência em causa.

110. Com efeito, eram à data aplicáveis o Despacho n.º 727/200715, de 15 de janeiro

e o Despacho n.º 5414/2008, de 28 de janeiro, que definiam e classificavam os

serviços de urgência que constituem os pontos da rede de Referenciação de

Urgência/Emergência, estabelecendo a existência de uma rede articulada de

serviços de urgência com três níveis de hierarquização (urgência polivalente,

urgência médico-cirúrgica, urgência básica) correspondentes a capacidades

diferenciadas de resposta para necessidades distintas.

111. Pelo que, por via da supra referida classificação o SU da unidade de Chaves do

CHTMAD corresponde a uma SUMC, o SU do HGSA-CHP e o SU do HSM-CHLN

correspondem a uma SUP16 17;

15

Revogado por via da publicação do Despacho n.º 10319/2014, de 11 de agosto, o qual

apresenta os níveis de responsabilidade dos Serviços de Urgência atualmente aplicáveis.

16 Cfr. classificação vigente à data dos factos a qual se mantém por via do mesmo Despacho

n.º 5414/2008, de 28 de janeiro.

17 Sendo que por via da recém publicada Portaria n.º 82/2014, de 10 de abril, aquelas unidades

hospitalares são classificadas como hospitais do Grupo II e III, respetivamente. Ademais,

estabelece aquela Portaria que “[…] as instituições do grupo II estabelecem relações de

referenciação com as instituições do grupo III para áreas em que não tenham capacidade

técnica ou recursos disponíveis.”.

Para um enquadramento das qualificações em vigor e aplicáveis à data dos factos e até à

entrada em vigor da referida Portaria, veja-se o “Estudo para a Carta Hospitalar –

Especialidades de Medicina Interna, Cirurgia Geral, Neurologia, Pediatria, Obstetrícia e

Infeciologia”, publicado em www.ers.pt.

32 Mod.016_01

112. Ora, a classificação de cada um dos serviços de urgência envolvidos não foi

substancialmente alterada face ao enquadramento supra, e cumpre por isso

analisar as respetivas atuações no processo de atendimento do utente H..

113. Ora, atentando nos factos constantes no processo, relativamente às diligências

adotadas pelo CHTAMD para operacionalização da transferência do utente, uma

vez identificada a necessidade da sua observação por uma equipa de

neurocirurgia cumpre considerar:

i. o contacto estabelecido com o HGSA-CHP não se processou de acordo com

a rede de contactos preconizada pela circular normativa da DGS que define a

organização dos cuidados hospitalares urgentes ao doente traumatizado, cuja

implementação se presume plenamente operacional após 2011;

ii. com efeito, em nenhum dos esclarecimentos prestados é referida qualquer

identificação do coordenador da equipa de trauma nem de idêntica condição

do interlocutor elegido para contacto, inexistindo mesmo nos registos de

suporte às diligências telefónicas encetadas, qualquer menção à articulação

estabelecida entre as duas equipas de trauma em presença e respetivos

coordenadores;

iii. o que permite desde logo questionar se a rede de contactos que permite

executar aquela circular normativa foi, in casu, desrespeitada ou

simplesmente não foi seguida atenta a sua inexistência.

114. Por outro lado, e uma vez conhecida a recusa do HGSA-CHP em receber o

utente, cumpre destacar que nos contactos subsequentemente estabelecidos, uma

vez mais inexiste registo da identificação dos diferentes, e muitos, (eventuais)

coordenadores de equipas de trauma contactados, mais uma vez no sentido do

não seguimento da norma vigente.

115. Ademais, e uma vez mais tendo presente a recusa de aceitação do HGSA-CHP

e ainda atentando no disposto na já invocada circular normativa é de notar que:

i. a segunda etapa de avaliação preconizada naquele normativo não se

encontrava concluída, porquanto não estava assegurado um plano de

atuação para tratamento definitivo e identificação do destino final do

doente;

ii. donde se infere que nunca o CHTMAD deveria ter procedido à transferência

do doente sem obter junto do CODU as orientações necessárias para

33 Mod.016_01

assegurar o término da avaliação do utente, assegurando uma correta

referenciação secundária do mesmo;

iii. até porque tais orientações do CODU eram por este devidas, à luz das já

referidas competências de coordenação do transporte inter-hospitalar do

doente urgente/emergente;

iv. ao agir de forma isolada, não coordenada com o contexto regional em que

se insere, e ao não reportar à entidade coordenadora as dificuldades

encontradas na obtenção de vaga pugnando pela obtenção de uma solução

regionalmente integrada;

v. pois só assim lograria uma atuação partilhada, de acordo com uma correta

delimitação de competências, a saber, as do CHTMAD e as do INEM;

vi. permitiu o CHTMAD que o utente fosse transferido para uma unidade

localizada a cerca de 400 km de distância com recurso a VMER;

vii. tal implicando a ocorrência de uma quebra na integração da prestação dos

cuidados prestados, porquanto, in limine, sempre os interesses do utente, na

perspetiva de espera pela conclusão do término da avaliação secundária,

poderiam ser melhor acautelados no serviço de urgência da unidade de

Chaves do CHTMAD, que como já visto corresponde a um SUMC, do que

numa VMER a percorrer a distância que se impunha até ao CHLN.;

viii. o que resulta patente no parecer clínico junto aos autos, no sentido de “[…]

Ainda que num plano transitório, o doente deveria ter sido transferido para

CHP, terminado a avaliação secundária até á 1 horas após trauma nesse

hospital Após esta avaliação deveria proceder-se à integração do doente

numa vaga com as características inerente ao doente em questão”.

116. Assim, em face de todo o vindo de expor, e embora não se revele possível

concluir no caso em análise pela existência, por parte do CHTMAD, de uma efetiva

violação do direito fundamental de acesso aos cuidados de saúde18, sempre se

dirá que existe constrangimento da continuidade desse direito.

18

Porquanto, recorde-se, foi garantida a estabilização do utente e a realização da avaliação

inicial determinada pelo cumprimento da Circular Normativa N.º 07/DQS/DQCO, obrigação que

surge agora reforçada à luz do Despacho n.º 10319/2014, de 25 de julho, o qual claramente

consigna no n.º 2 do artigo 3.º que os SUB se constituem como “[…] um nível de estabilização

inicial de situações urgentes de maior complexidade nas situações que exijam um nível de

cuidados mais diferenciado […]”, o que, por maioria de razão, se estenderá à atuação dos

SUMC.

34 Mod.016_01

117. Pois sem prejuízo da indicação transmitida pelo INEM, na lógica de

funcionamento das Redes de Referenciação, cada instituição deve conhecer, sem

dúvida ou incerteza, o que concretamente a si compete – e por tanto o que de si é

esperado – para contribuir para a garantia constitucional da prestação de cuidados

de saúde nas melhores condições de acesso, qualidade e segurança.

118. E na mesma perspetiva, deverá analisar-se o comportamento do HGSA-CHP,

assumindo a obrigatoriedade de uma unidade hospitalar de referência aceitar

receber os utentes transferidos de outros hospitais, verificando-se tal obrigação de

aceitação naquelas situações em que as unidades referenciadoras de utentes não

disponham de nível de referenciação adequado e ou de capacidade técnica.

119. Sendo certo também que o deficiente funcionamento de uma RRH impacta

negativamente com o direito de acesso do utente aos cuidados de saúde,

produzindo um efetivo de não acesso (ou um acesso tardio ou inadequado) aos

cuidados de saúde necessários.

120. Nesse contexto, a não aceitação pelo HGSA-CHP do utente em causa, assume

contornos de recusa infundada de utente do SNS, com a consequente violação do

respetivo direito de acesso.

121. Sendo que a extração da correspondente sanção apenas não colherá,

porquanto se atende ao facto da concreta recusa se enquadrar no âmbito de uma

falha sistémica, extensível à entidade emissora, recetora e coordenadora, as quais

conjuntamente não atuaram em conformidade;

122. O que somente é atenuado pelo facto dos profissionais envolvidos terem

procurado diligenciar por uma resolução da situação.

123. Ainda assim, sempre se dirá que ao não receber o utente, o HGSA-CHP, centro

de referenciação neurocirúrgico do CHTMAD, obstaculizou a que fosse completado

o ciclo de avaliação dos cuidados de que o utente H. precisava19;

Na mesma ótica, ainda por via da alínea b), do n.º 5.º do artigo 6.º do mesmo despacho, é

determinado que aos Centros de Trauma serão “[…] referenciados os doentes a incluir na Via

Verde Trauma, através da […] referenciação das unidades de atendimento de menor

diferenciação da região após avaliação inicial com estabilização de funções vitais […]”.

19 O que especialmente releva pelo facto de estarmos perante um SUP e bem assim de um

hospital de Grupo III que se recusa a receber um utente proveniente de um SUMC integrado

em hospital do Grupo II, quando, conforme já dito “[…] as instituições do grupo II estabelecem

relações de referenciação com as instituições do grupo III para áreas em que não tenham

capacidade técnica ou recursos disponíveis”.

35 Mod.016_01

124. Com efeito, ao não completar o segundo momento da avaliação imposta pela

circular normativa da DGS, não foi validada a categorização de neuro crítico que

impendia sobre o utente e com isso concluída a avaliação do plano de tratamento

que melhor se ajustava ao caso concreto;

125. Ainda que, para a realização desse tratamento, e por via da inexistência de

vagas, o utente tivesse que ser transferido para outra unidade, o que uma vez

mais, atentas as competências atribuídas, caberia ao CODU coordenar.

126. Ademais, e a este propósito cumpre considerar que a atribuição de procurar

uma vaga noutra instituição, nunca caberia ao médico interno de escala ao serviço

de urgência do HSA, mas sempre e uma vez mais ao CODU, ainda que o HGSA-

CHP reconheça a diligência dos procedimentos de contactos voluntariamente

encetados.

127. Em lógica decorrente das considerações vindas de expor, surge a constatação

de que a rede nacional de trauma não funcionou no caso presente, perdendo-se o

ganho de eficácia e de integração na prestação de cuidados que a mesma visa

constituir.

128. Para tal contribuindo a omissão verificada na assunção das atribuições de

coordenação do transporte inter-hospitalar urgente que ao CODU assistem.

129. Recorde-se, que em contacto estabelecido entre a médica assistente do

CHTMAD e o médico regulador do CODU, aquando da comunicação da recusa de

aceitação do utente pelo HGSA-CHP, a indicação transmitida por aquele médico

regulador foi a de que a referida médica teria de procurar vaga;

130. E que, conforme visto, entre o momento em que ao CODU é dado

conhecimento da indisponibilidade do HGSA_CHP em receber o utente até à

realização de contacto para confirmação dos fundamentos dessa indisponibilidade

decorreu mais de uma hora;

131. O que não se compadece com os hiatos temporais estabelecidos para a

realização de uma avaliação secundária ao utente traumatizado urgente e os

benefícios que se pretendem alcançar com a respetiva transferência.

132. E que, ademais, confirmada a indisponibilidade da existência de tal vaga a nível

regional, o CODU se limitou a contactar o HGSA-CHP confirmando a recusa e

aferindo os motivos da mesma, aceitando a vaga proposta no CHLN;

133. Donde decorre, tal como visto no parecer clínico emitido que “[…] o CODU se

conformou com a indicação de inexistência de vaga no CHP e existência de vaga

36 Mod.016_01

no hospital de Santa Maria não garantindo a aplicação das normas da DGS

relativamente á avaliação secundaria do politraumatizado não acautelando

eventuais risco de transporte tão demorado.”

134. Com isso anulando a aplicação do princípio da autossuficiência regional que as

redes de referenciação devem garantir, muito particularmente as vias verdes.

135. Por outo lado conforme já visto, é a cada uma das ARS que compete,

prosseguir e garantir, no âmbito da área geográfica sobre a qual exerce a sua

jurisdição, a adequada articulação, implementação e garantia de cumprimento das

redes de referenciação.

136. O que, à luz da factualidade constante do presente processo de inquérito, cria

sérias dúvidas sobre o estádio de implementação das regras e procedimentos

aplicáveis em matéria de cuidados hospitalares urgentes ao doente traumatizado,

concretamente, os vigentes no âmbito da já referida circular normativa20.

137. E bem assim, daqueles que vierem a ser futuramente implementados por via da

recente publicação do Despacho n.º 10319/2014, que especificamente consolida e

clarifica a constituição dos Centros de Trauma, bem como da respetiva Via Verde

Trauma.

138. Assim, a respetiva aplicação na região norte deverá ser objeto de avaliação

pela ARSN, aferindo da sua real aplicação;

139. O que particularmente releva, quando considerado o já citado reconhecimento

da necessidade de cada uma das ARS, organizar, estruturar, publicitar e ordenar

para cumprimento, pelos estabelecimentos do SNS das suas áreas geográficas, as

RRH ou outras redes e regras julgadas necessárias.

140. O que ademais e conforme já visto foi objeto de anterior recomendação da

ERS;

141. A tanto acrescendo que a ERS interveio já, junto da ARSN e em matéria de

estádio de implementação dos Sistemas de Resposta Rápida (no caso, a Via

Verde Coronária), no âmbito do processo de inquérito n.º ERS/024/1221, tendo aí

concluído, de modo paralelo, ser essencial a avaliação por parte da ARSN relativa

à efetiva implementação, impondo-se agora que o mesmo raciocínio se aplique à

avaliação da Via Verde do Trauma. 20

E, necessariamente, aqueles cuja implementação futuramente se imporá por via da aplicação

do Despacho n.º 10319/2014.

21 Publicado em www.ers.pt

37 Mod.016_01

142. Por todo o exposto, considerando que:

i. os cidadãos têm o direito a que lhes sejam prestados integradamente

todos os cuidados de saúde;

ii. o funcionamento e as imposições adjacentes a cada uma das RRH

consubstanciam regras que se manifestam no direito de acesso do utente aos

cuidados de saúde e;

iii. consequentemente, o seu deficiente funcionamento impacta

negativamente com o direito de acesso do utente aos cuidados de saúde,

produzindo um efetivo não acesso (ou um acesso tardio ou inadequado) aos

cuidados de saúde necessários;

iv. os prestadores de cuidados de saúde que concorrem para o

funcionamento de cada uma das redes de referenciação, devem não só

articular-se entre si, em função dos recursos de que dispõem, e consideradas

as condicionantes de cada uma das regiões e da valência a que respeitam,

mas também complementarem-se com a finalidade de aproveitarem os

recursos de que cada um é possuidor;

v. cada instituição deve conhecer, o que concretamente a si se exige para

contribuir para a garantia constitucional da prestação de cuidados de saúde;

vi. daí resultando a obrigatoriedade das unidades hospitalares referenciarem

os utentes, mas também a obrigatoriedade de uma unidade hospitalar de

referência aceitar receber os utentes transferidos de outros hospitais;

vii. tanto mais que as unidades hospitalares integradas no SNS se obrigam

“[…] a realizar as prestações de saúde adequadas ao estado de saúde dos

utentes, podendo referenciá-los para outras unidades de saúde”.

viii. a Rede de Referenciação Hospitalar deve ser entendida com um sistema

integrado de prestação de cuidados de saúde, assente em princípios de

racionalidade e eficiência, sendo atribuído a cada estabelecimento hospitalar

que integra uma área geográfica e populacional de influência e um

correspondente papel específico na sua área assistencial;

ix. a implementação de adequadas Redes de Referenciação e de Vias Verdes

obriga à adoção de Recomendações Clínicas práticas, à definição de circuitos

regionais, ao envolvimento imprescindível e responsável do INEM;

x. o SNS detém uma organização de carácter regional, sendo administrado

por cada uma das ARS, competentes por cada uma das regiões

38 Mod.016_01

administrativamente organizadas e pela garantia à população da respetiva

área geográfica de intervenção do acesso à prestação de cuidados de saúde

de qualidade, adequando os recursos disponíveis às necessidades em saúde;

xi. a DGS instituiu a Circular Normativa N.º 07/DQS/DQCO, de 31/03/2010,

para a Organização dos Cuidados Hospitalares Urgentes ao Doente

Traumatizado, dirigindo-a a todas as unidades do SNS;

xii. ao INEM compete promover a resposta integrada ao doente

urgente/emergente, a sua correta referenciação, garantindo a adequação do

respetivo transporte inter-hospitalar;

xiii. competência que surge agora reforçada à luz da publicação do Despacho

n.º 10319/2014, do qual igualmente emanam obrigações acrescidas para os

prestadores de cuidados de saúde e das quais as ARS não poderão

necessariamente ser apartadas, vistas as competências vindas de expor;

143. Ponderando ainda que a ERS já anteriormente recomendou às ARS a definição,

publicitação e imposição para cumprimento, por parte dos estabelecimentos

prestadores de cuidados de saúde envolvidos, das RRH que se apresentem como

necessárias nas suas áreas de influência, cumpre decidir pela necessidade da

adoção da atuação regulatória infra.

IV. AUDIÊNCIA DOS INTERESSADOS

144. A presente deliberação foi precedida de audiência escrita dos interessados, nos

termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 101.º do Código do

Procedimento Administrativo, aplicável ex vi a alínea a) do artigo 24.º dos

Estatutos da ERS, tendo para o efeito sido chamados a pronunciarem-se,

relativamente ao projeto de deliberação da ERS, o CHTMAD, o CHP, a ARS Norte,

o INEM e o utente.

145. Decorrido o prazo concedido para a referida pronúncia, em resposta às

notificações realizadas, rececionou a ERS a pronúncia do CHTMAD, do CHP, do

INEM e do utente.

146. A ERS não foi notificada de qualquer pronúncia da ARS Norte, seja no decurso

do prazo legal para o efeito, seja até o presente momento, desconhecendo-se

qualquer tomada de posição sobre a matéria.

39 Mod.016_01

IV.1. Da Pronúncia do CHTMAD

147. Por ofício rececionado a 6 de outubro de 2014, a ERS tomou conhecimento da

pronúncia produzida pelo CHTMAD da qual cumpre destacar:

“[…]

(i) [n]os Serviços de Urgência do CHTMAD já se encontram implementadas as

regras e procedimentos vigentes aplicáveis em matéria de cuidados

hospitalares urgentes ao doente traumatizado, concretamente, os

decorrentes da aplicação da Circular Normativa N.º 07/DQS/DQCo, de

31/03/2013 da DGS;

(ii) [o] projeto de decisão da ERS indicia uma responsabilidade do CHTMAD,

ou dos seus colaboradores, no evento em análise, o que nos parece

desadequado e erróneo, face aos factos em análise e aos comportamentos

e atitudes adotadas;

(iii) O Regulamento do Serviço de Emergência/Urgência do CHTMAD22 […]

contém as regras de organização e funcionamento dos seus três Serviços

de Emergência/Urgência;

(iv) No Artigo 7º, do Regulamento de Emergência/Urgência do CHTMAD já se

encontram previstas e regulamentadas as quatro Vias Verdes [AVC,

Coronária, Sepsis, Trauma];

(v) [a] Unidade Hospitalar de Vila Real foi a primeira unidade hospitalar de

Portugal Continental a implementar a [VVT];

(vi) […] no Regulamento de Emergência/Urgência do CHTMAD não se prevê

especificamente para as suas Unidades de Chaves e de Lamego os

procedimentos vigentes e aplicáveis em matéria de [VVT], circunstância

que se deve […] ao facto de, aquando da aprovação do […] Regulamento,

se ter entendido ser necessário testar este modelo organizativo;

(vii) [e]m relação ao SUMC da Unidade de Chaves, o Regulamento de

Emergência/Urgência do CHTMAD prevê uma “Equipa Tipo” multidisciplinar

que inclui médicos das seguintes especialidades: Cirurgia Geral, Medicina

Interna, Ortopedia, Anestesiologia e Pediatria;

22

Conforme documento junto aos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

40 Mod.016_01

(viii) Os profissionais de saúde que integram a “Equipa Tipo” do SUMC da

Unidade de Chaves têm, na sua maioria, [cursos de SAV e VMER] pelo que

cumprem os requisitos exigidos pela Circular Normativa;

(ix) No caso do SU da Unidade de Chaves o Coordenador da Equipa de

Trauma (team líder) é o Cirurgião Geral mais diferenciado de serviço na

equipa do SU (no âmbito da assistência prestada ao utente, H., era a Dr.ª

I.) ou, em situações especiais, é nomeado em cada equipa do SU o

elemento da equipa cirúrgica com mais formação/experiência em trauma;

(x) Relativamente ao [concreto] utente a avaliação secundária foi realizada no

SU da Unidade de Chaves (a realização da TAC faz parte da avaliação

secundária) e foi claramente identificada uma lesão que não podia ser

abordada nessa unidade de saúde, porque ultrapassava a capacidade dos

seus recursos, tendo sido diligenciados esforços para a sua transferência

para o [HGSA], unidade de Saúde mais adequada e mais próxima;

(xi) Atenta a recusa de aceitação do referido utente pelo HGSA […] e face à

omissão do médico regulador do CODU na assunção das suas atribuições

de coordenação do transporte inter-hospitalar urgente, foi necessário (e até

emergente) procurar uma solução que pudesse dar continuidade aos

cuidados e tratamento do utente em causa;

(xii) O transporte secundário do referido utente foi realizado com a

monitorização e acompanhamento conforme as recomendações da OM e

SPCI, não tendo havido, em momento algum, diminuição do nível de

monitorização nem do acompanhamento conforme “legis artis”;

(xiii) […] carece de fundamento a imputação ao CHTMAD do alegado

constrangimento da continuidade do direito fundamental de acesso aos

cuidados de saúde. Se algum constrangimento existiu, apenas poderá

decorrer da atuação do CODU, pois que, perante a ausência das suas

orientações, as quais eram devidas, foi o CHTMAD que diligenciou no

sentido de assegurar a continuidade dos cuidados de saúde ao utente.” –

cfr. pronúncia do CHTMAD e documentação anexa, juntos aos autos.

IV.2. Da Pronúncia do CHP

41 Mod.016_01

148. Por comunicações rececionadas a 6 e a 16 de outubro de 2014, a ERS tomou

conhecimento da pronúncia produzida pelo CHP a qual se reconduz, em suma e

no que para os autos releva, a que:

“[…]

(i) O CHP garante permanentemente o acesso a doentes traumatizados, por

contacto com o CODU, sempre cumprindo as regras estabelecidas;

(ii) O CHP e a sua Administração têm consciência que o hospital não pode

garantir o acesso em 100% dos casos porque as capacidades instaladas

têm limites;

(iii) No caso vertente tratava-se de um doente traumatizado medular, sem

indicação cirúrgica, necessitando de cuidados especializados na área do

Neuro-trauma;

(iv) No CHP, no Centro Hospitalar S. João, no Centro Hospitalar Universitário

de Coimbra não havia vagas em unidades com experiência em Neuro-

trauma;

(v) O Médico do CHP, e muito bem, tratou de encontrar uma vaga em unidade

especializada que no caso foi em Lisboa;

(vi) Estamos habituados a trabalhar em rede e a transferir regularmente

doentes entre as grandes unidades;

(vii) Se não estivesse mau tempo ninguém daria pelo caso. O helicóptero teria

saído de Macedo para Chaves e levado o doente para Lisboa;

(viii) O transporte por ambulância foi uma alternativa devido ao mau tempo;

(ix) Todo o processo deveria ter sido controlado pelo CODU e não foi;

(x) O Chefe de Equipa do CHP tem instruções claras para estas situações. No

caso vertente não foi contactado previamente pelo CODU pelo que parte do

processo passou à margem da chefia de urgência.” – cfr. pronúncia do

CHP, junta aos autos.

IV.3. Da Pronúncia do INEM

149. Por ofício rececionado a 8 de outubro de 2014, a ERS tomou conhecimento da

pronúncia produzida pelo INEM, da qual cumpre destacar:

“[…]

42 Mod.016_01

(i) […] é atribuição do INEM, […] Assegurar a prestação de cuidados de

emergência médica em ambiente pré-hospitalar e providenciar o transporte

para as unidades de saúde adequadas;

(ii) […] nos casos em que os meios de socorro se deslocam ao local da

ocorrência/acidente […] compete ao [CODU] do INEM a decisão sobre qual

a unidade de saúde adequada para onde aquela vítima deverá ser

transportada […];

(iii) Diferente é a atribuição [de] [p]romover a adequação do transporte inter-

hospitalar do doente urgente/emergente […];

(iv) […] nestes casos as unidades de saúde de origem contactam o

INEM/CODU no sentido deste disponibilizar apoio para a transferência de

determinado doente para determinada unidade de saúde adequada/de

referência, contudo já tendo procedido, previamente, ao contacto com a

unidade de saúde/médico que irá acolher o doente;

(v) Tanto mais que nos algoritmos de triagem em vigor no CODU, um dos

primeiros dados necessários para proceder/iniciar a triagem é o nome do

médico que irá acolher o doente;

(vi) Não obstante, na posse do nome e contacto do médico da unidade de

saúde de destino, o CODU efetua um contacto com este no sentido de

confirmar a referida “aceitação” do doente, só depois procedendo ao

acionamento dos meios adequados à referida transferência inter-hospitalar;

(vii) Entendemos que compete ao INEM assegurar vaga em determinada

unidade de saúde nos casos de transporte “primário”, de âmbito pré-

hospitalar;

(viii) Já no caso das transferências inter-hospitalares, tem sido entendimento

deste Instituto, e prática, ser a unidade de saúde de origem (que solicita

apoio ao INEM para a referida transferência) procurar vaga na unidade de

saúde de destino adequada/referenciada, competindo ao CODU

(previamente ao acionamento dos meios adequados ao transporte) a

confirmação da referida aceitação por parte desta última;

(ix) No caso concreto […] [o CODU], não obstante ter indicado que teria que

ser o Hospital de Chaves a procurar vaga, cumpriu com as suas

atribuições, nomeadamente confirmando a não aceitação do doente por

parte do Hospital de Santo António (e os respetivos motivos) bem como

43 Mod.016_01

confirmando/efetivando a transferência do doente para o Hospital de Santa

Maria, utilizando para tal os meios adequados;

(x) […] é entendimento do INEM que as recomendações […] do projeto de

deliberação já se encontram asseguradas, nomeadamente no que diz

respeito ás transferências inter-hospitalares, na medida em que o Instituto

já garante de forma permanente a prossecução das suas competências,

designadamente a adequação do transporte inter-hospitalar do doente

urgente/emergente, confirmando a “aceitação” do doente por parte da

unidade de saúde de destino, decidindo pela sua transferência e acionando

os meios adequados.” – cfr. pronúncia, junta aos autos.

IV.4. Da Pronúncia do utente

150. Por ofício rececionado a 22 de outubro de 201423, a ERS tomou conhecimento

da pronúncia produzida pelo utente H., da qual, no que releva para os autos

cumpre destacar:

“[…]

(i) […] é inequívoco que houve recusa expressa por parte do HGSA_CHP

através do seu profissional;

(ii) O que não ficou plenamente esclarecido […] são as razões invocadas para

essa recusa […];

(iii) Avaliada com pormenor a situação resulta […] que, se para a médica do

CHTMAD […] foi dito pelo médico neurocirurgião de urgência do HGSA-

CHP “não ser possível aceitação do doente por falta de vaga” […] já nos

contactos dirigidos pelo mesmo médico ao colega do CHLN […] dava conta

“…por falta de vagas no ventilador no [HGSA] e restantes centros

hospitalares;

(iv) Embora numa primeira análise possa parecer de pouca relevância estas

duas diferentes razões invocadas pelo médico, na verdade ela será

importante [se conjugada com a afirmação] onde o mesmo médico refere

ao seu colega médico do CODU que “o doente precisa de cuidados

intensivos”, “não precisa de ser avaliado pela especialidade, bem sabendo

este, até porque é básico e elementar no exercício da profissão, que o

23

Na sequência de pedido de prorrogação de prazo apresentado pelo utente.

44 Mod.016_01

decurso da avaliação não estava a ser feito em conformidade e que teria

sempre de findar a avaliação secundária nos termos impostos;

(v) Quanto ao CODU também teve uma atuação reprovável […] além da

omissão verificada das suas atribuições de coordenação do transporte

inter-hospitalar urgente […] no que concerne aos comportamentos relativos

à indicação transmitida pelo médico regulador de que a sua colega médica

do Hospital de Chaves teria de procurar vaga mais de uma hora depois [é]

um comportamento intencional com o sentido do “desenrasque-se” quando

a ele lhe competia tais tarefas;

(vi) […] nestes comportamentos não estão em causa só um problema de

comunicação entre as entidades e de deficiente funcionamento da RRH,

procurando enquadrar este assunto numa falha sistémica entre as

entidades envolvidas, como estatuí a proposta, deixando de lado aquilo que

o utente encara como fundamental […] estas entidades [HGSA e CODU]

através dos seus profissionais atuaram em completa desconsideração e

indiferença pela saúde e […] pela própria vida do utente;

(vii) Como pode ser apreendido por parte da ARS que o [HGSA] obstaculizou

que fosse completado o ciclo de avaliação do [utente] ou mesmo o INEM

não promoveu a resposta integrada ao doente urgente, a sua correta

referenciação, garantindo a adequação do respetivo transporte inter-

hospitalar quando na verdade ficam demonstrados nos autos factos que

revelam comportamentos ativos negligenciáveis de modo grosseiro e,

puníveis nos termos dos normativos existentes.”

IV.5. Da análise dos argumentos aduzidos

151. Cumpre analisar os elementos invocados nas pronúncias supra elencadas,

aferindo da suscetibilidade dos mesmos infirmarem a deliberação delineada.

152. Assim, num primeiro momento cumpre destacar a existência de um

denominador comum às pronúncias do CHTMAD e do INEM, já que ambas as

entidades aduzem que os procedimentos cuja adoção é preconizada pela ERS no

projeto de decisão notificado, fazem já parte da prática das respetivas instituições,

norteando por isso as ações dos seus profissionais.

45 Mod.016_01

153. Com efeito, no caso do CHTMAD, ainda que se conceda que os

procedimentos descritos no respetivo Regulamento de Emergência/Urgência

possam ter a virtuosidade de melhor documentar o entendimento vigente na

instituição sobre os cuidados hospitalares urgentes a prestar ao utente

traumatizado no âmbito da aplicação da VVT, conforme amplamente demonstrado,

os mesmos não foram de molde a obviar à situação concretamente ocorrida;

154. Impondo-se por isso assegurar a sua efetiva aplicação e progressivo

refinamento, garantindo a integração dos contributos de aprendizagem que por via

do caso vertente necessariamente ocorreram;

155. O que desde logo deverá passar pela inclusão das unidades de Chaves e

de Lamego nos procedimentos vigentes e aplicáveis em matéria de VVT,

garantindo a discriminação das especificidades que o funcionamento de tais

unidades possa importar, pugnando pela fiabilidade dos procedimentos previstos

face à particularidade do funcionamento de cada um dos SU em presença, cuja

diferente natureza não se compagina com a existência de um procedimento plural,

insuscetível de abarcar as diferentes realidades técnicas e humanas existentes;

156. Sem prejuízo de outras alterações que permitam uma total adequação ao

delineado pela ERS no projeto de deliberação.

157. Por outro lado, a perspetiva defendida pelo INEM de que o mesmo “[…] já

garante de forma permanente a prossecução das suas competências,

designadamente a adequação do transporte inter-hospitalar do doente

urgente/emergente, confirmando a “aceitação” do doente por parte da unidade de

saúde de destino, decidindo pela sua transferência e acionando os meios

adequados” colide com a dinâmica dos procedimentos de coordenação empregues

no caso em apreço;

158. Pois no processo de coordenação da transferência do utente H. não só não

foi assegurado qualquer contacto com a entidade hospitalar de destino, CHLN,

porquanto, recorde-se, o médico regulador do CODU se bastou com a confirmação

junto do HGSA da não aceitação do doente em causa;

159. Como não foi o mesmo garantístico da dita atribuição de promoção da

adequação do transporte inter-hospitalar do doente urgente/emergente, ao não

pugnar pela necessidade do utente completar, no CHP-HGSA, a avaliação

secundária que a via verde do trauma impõe, com isso se perdendo o ganho de

eficácia e de integração na prestação de cuidados que a mesma visa constituir.

46 Mod.016_01

160. Igualmente relevando no já referido processo de coordenação, a

desadequação dos tempos de atuação empregues, recordando-se a propósito o

hiato de mais de uma hora para contacto com o HGSA para confirmação dos

fundamentos da não aceitação do utente, uma vez comunicada a mesma pela

interlocutora do CHTMAD.

161. Pelo que a linha argumentativa da adequação dos procedimentos

empregues, quer pelo CHTMAD quer pelo INEM, não colhe nos termos aduzidos,

por isso se mantendo a necessidade de manutenção da decisão nos termos

projetados.

162. Analisando agora as especificidades da pronúncias rececionadas, cumpre

considerar que a afirmação produzida pelo CHTMAD de que a “[…] avaliação

secundária foi realizada no SU da Unidade de Chaves (a realização da TAC faz

parte da avaliação secundária) e foi claramente identificada uma lesão que não

podia ser abordada nessa unidade de saúde”;

163. Esbarra com o estatuído na Circular Normativa N.º 07/DQS/DQCO, a qual,

a propósito da avaliação secundária determina a necessidade de “formulação de

um plano de actuação, para tratamento definitivo e identificação do destino final do

doente”;

164. O que desde logo é contrariado pelo reconhecimento, do próprio CHTMAD,

de que “[…] foi claramente identificada uma lesão que não podia ser abordada

nessa unidade de saúde, porque ultrapassava a capacidade dos seus recursos”;

165. Confirmando-se assim que a segunda etapa de avaliação do utente não

estava concluída, nem poderia estar, não estando outrossim assegurado um plano

de atuação para tratamento definitivo, carecendo ser validada a categorização de

neuro crítico do utente em causa.

166. Tudo competindo para a reiteração da imputação do constrangimento do

direito de acesso que sobre o CHTMAD impende, à luz da sua atuação isolada e

não integrada no contexto de coordenação regional em que se insere.

167. Também quanto ao argumento invocado pelo CODU de que,

diferentemente do que sucede nas transferências primárias em que lhe compete a

escolha da unidade de destino, nas transferências secundárias cabe à “[…]

unidade de saúde de origem […] procurar vaga na unidade saúde de destino

adequada/referenciada, competindo ao CODU […] a confirmação da referida

aceitação por parte desta última;

47 Mod.016_01

168. Cumpre discordar, porquanto, ainda que assim se entendesse, nunca

configuraria o caso em análise uma transferência padrão, já que toda a informação

que oportunamente foi fornecida pelo CHTMAD ao CODU deveria ter merecido um

desempenho de coordenação consentâneo com a necessidade de prestação de

cuidados urgentes àquele concreto utente, que, por via da não aceitação do

CHP_HGSA, unidade de referência do CHTMAD, não se bastava com a (habitual)

articulação do processo de transferência entre hospital de origem e de destino,

realizável por via de mera confirmação de aceitação.

169. Por outro lado, vista a perspetiva trazida aos autos pelo CHP-HGSA, de

que “[…] Estamos habituados a trabalhar em rede e a transferir regularmente

doentes entre as grandes unidades; Se não estivesse mau tempo ninguém daria

pelo caso. O helicóptero teria saído de Macedo para Chaves e levado o doente

para Lisboa”;

170. Esta afirmação merece concordância no que à perspetiva de

funcionamento em rede das unidades hospitalares diz respeito, perceção que aliás

norteou todo o projeto de decisão notificado, enformando a necessidade de

adoção dos procedimentos e medidas impostos;

171. Mas já se discorda que a recusa de aceitação do utente H. pelo

CHP_HGSA, mereça especial enfoque por via dos constrangimentos climatéricos

registados;

172. Já que de realce será antes o desvio ocorrido à obrigação de uma unidade

hospitalar de referência aceitar receber os utentes transferidos de outros hospitais

nas situações em que as unidades referenciadoras não disponham de nível de

capacidade técnica, e já não os constrangimentos ao heli-transporte daquele

utente.

173. Ainda, atentando no argumento do CHP de que “[…] O Chefe de Equipa do

CHP tem instruções claras para estas situações. No caso vertente não foi

contactado previamente pelo CODU pelo que parte do processo passou à margem

da chefia de urgência”;

174. Sempre se dirá que no contacto estabelecido entre o médico regulador do

CODU e o médico do CHP-HGSA nunca foi mencionada a necessidade de

validação de informação pelo chefe de equipa, assumindo o referido interlocutor do

CHP_HGSA a decisão de não aceitação do utente, sem qualquer pressuposto de

confirmação pelo respetivo superior hierárquico.

48 Mod.016_01

175. De todo modo, e na ótica de contacto preferencial com o chefe de equipa

defendido pelo CHP, sempre se questiona se pelo mesmo chefe de equipa, na

posse das “[…] instruções claras para estas situações”, teria sido tomada idêntica

decisão de não aceitação do utente, também ele se comprometendo com o

processo de procura de vaga noutra instituição, apesar do propalado entendimento

de que “[…] Todo o processo deveria ter sido controlado pelo CODU e não foi.”.

176. Não sendo pois credível que a fundamentação da não aceitação do utente

recaia sobre a errada escolha do interlocutor escolhido para o contacto de

coordenação da transferência daquele utente.

177. Quanto à pronúncia do utente, cumpre destacar que a mesma, no que se

refere às questões enquadráveis nas atribuições da ERS – pois são estas as

únicas sobre as quais a ERS se pode pronunciar – não colide com o sentido da

decisão projetada, por não trazer elementos factuais novos que pudessem justificar

qualquer alteração da medida da intervenção regulatória projetada;

178. Não havendo necessidade de alteração ou introdução de medidas de

diferente cariz regulatório à luz dos elementos factuais trazidos aos autos.

179. Tudo visto e ponderado, conclui-se pela insusceptibilidade dos argumentos

invocados pelas entidades respondentes em sede de audiência dos interessados,

infirmarem a decisão projetada, bem como pela desnecessidade de adoção de

novas diligências instrutórias, pelo que a decisão projetada se mantém na integra,

atenta a permanente necessidade de salvaguarda da efetividade dos

procedimentos empregues por cada uma das entidades visadas na garantia do

direito de acesso dos utentes, com especial enfoque na acuidade e tempestividade

da articulação dos cuidados hospitalares urgentes a serem prestados ao doente

traumatizado.

V. DECISÃO

180. O Conselho de Administração da ERS delibera, nos termos e para os efeitos do

preceituado na alínea a) do artigo 24.º, e da alínea b) do artigo 19.º dos Estatutos

da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, emitir uma

instrução ao Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, E.P.E. e ao Centro

Hospitalar do Porto, E.P.E. nos seguintes termos:

i. O Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, E.P.E. deve

garantir a implementação de todas as regras e procedimentos vigentes e

49 Mod.016_01

aplicáveis em matéria de cuidados hospitalares urgentes ao doente

traumatizado, concretamente, os decorrentes da aplicação da Circular

Normativa N.º 07/DQS/DQCO, de 31/03/2010 da DGS e do Despacho

n.º 10319/2014, de 25 de julho, enquanto procedimentos aptos a garantir

de forma permanente e efetiva o acesso aos cuidados de saúde que se

apresentem como necessários e adequados à satisfação das concretas

necessidades dos utentes, em tempo útil;

ii. O Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, E.P.E. deve

garantir em permanência, através da emissão e divulgação de ordens e

orientações claras e precisas, que tais regras e procedimentos sejam

corretamente seguidos e respeitados por todos profissionais de saúde

envolvidos;

iii. O Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, E.P.E. deve dar

cumprimento imediato à presente instrução, bem como dar

conhecimento à ERS, no prazo máximo de 30 dias após a notificação da

presente deliberação, dos procedimentos adotados para o efeito.

iv. O Centro Hospitalar do Porto, E.P.E deve garantir o cumprimento da

obrigação que sobre si impende de, enquanto unidade hospitalar de

referência, aceitar receber os utentes transferidos de outros hospitais,

abstendo-se de adotar qualquer comportamento passível de obstaculizar

o regular funcionamento das redes de referenciação instituídas;

v. O Centro Hospitalar do Porto, E.P.E deve garantir a implementação de

todas as regras e procedimentos vigentes e aplicáveis em matéria de

cuidados hospitalares urgentes ao doente traumatizado, concretamente,

os decorrentes da aplicação da Circular Normativa N.º 07/DQS/DQCO,

de 31/03/2010 da DGS e do Despacho n.º 10319/2014, de 25 de julho,

enquanto procedimentos aptos a garantir de forma permanente e efetiva

o acesso aos cuidados de saúde que se apresentem como necessários

e adequados à satisfação das concretas necessidades dos utentes, em

tempo útil;

vi. O Centro Hospitalar do Porto, E.P.E deve garantir em permanência,

através da emissão e divulgação de ordens e orientações claras e

precisas, que tais regras e procedimentos sejam corretamente seguidos

e respeitados por todos profissionais de saúde envolvidos;

50 Mod.016_01

vii. O Centro Hospitalar do Porto, E.P.E deve dar cumprimento imediato à

presente instrução, bem como dar conhecimento à ERS, no prazo

máximo de 30 dias após a notificação da presente deliberação, dos

procedimentos adotados para o efeito.

181. O Conselho de Administração da ERS delibera ainda nos termos e para os

efeitos do preceituado na alínea a) do artigo 24.º, e da alínea b) do artigo 19.º dos

Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto,

recomendar à Administração Regional de Saúde do Norte, I.P. o seguinte:

i. A Administração Regional de Saúde do Norte, I.P deve proceder à

avaliação do estádio de implementação das regras e procedimentos

vigentes e aplicáveis em matéria de cuidados hospitalares urgentes ao

doente traumatizado;

ii. A Administração Regional de Saúde do Norte, I.P deve proceder à

definição, clarificação e aplicação das regras, procedimentos e

protocolos vigentes em matéria de cuidados hospitalares urgentes ao

doente traumatizado, junto dos estabelecimentos prestadores de

cuidados de saúde da sua área de jurisdição, garantindo que os

mesmos sejam aptos a cumprir de forma efetiva o cumprimento do

princípio da auto suficiência regional e do direito de acesso aos cuidados

de saúde necessários e adequados à satisfação das concretas

necessidades dos utentes, em tempo útil;

iii. A Administração Regional de Saúde do Norte, I.P deve proceder à

divulgação e permanente atualização, junto dos estabelecimentos

prestadores de cuidados de saúde da sua área de jurisdição, dos

procedimentos definidos no âmbito do cumprimento da anterior alínea,

em conformidade com a posição definida para cada prestador na rede

de referenciação hospitalar em causa.

182. Mais delibera o Conselho de Administração da ERS, nos termos e para os

efeitos do disposto na alínea a) do artigo 24.º, e da alínea b) do artigo 19.º dos

Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto,

recomendar ao Instituto Nacional de Emergência Médica, I.P, o seguinte:

i. O Instituto Nacional de Emergência Médica, I.P. deve garantir, de forma

permanente, a prossecução das suas competências de promoção da

resposta integrada ao doente urgente/emergente, de promoção da

correta referenciação do doente urgente/emergente, de promoção da

51 Mod.016_01

coordenação, monitorização e orientação dos doentes urgentes em

consonância com as vias verdes instituídas pelos programas nacionais;

ii. O Instituto Nacional de Emergência Médica, I.P. deve garantir a

integração nos procedimentos adotados para operacionalização das

competências de coordenação do transporte inter-hospitalar do doente

urgente emergente, em particular a coordenação da decisão sobre a

respetiva referenciação primária e secundária, das regras e

procedimentos vigentes e aplicáveis em matéria de cuidados

hospitalares urgentes ao doente traumatizado.

183. As instruções ora emitidas constituem decisão da ERS, sendo que a alínea b)

do n.º 1 do artigo 61.º dos seus Estatutos configura como contraordenação punível

in casu com coima de 1000,00 EUR a 44 891,81 EUR, “[….] o desrespeito de

norma ou de decisão da ERS que, no exercício dos seus poderes regulamentares,

de supervisão ou sancionatórios, determinem qualquer obrigação ou proibição

[…]”.

184. O Conselho de Administração da ERS delibera igualmente dar conhecimento da

presente deliberação ao Ministério da Saúde.

185. O Conselho de Administração da ERS delibera ainda dar conhecimento da

decisão que vier a ser proferida a final, ao Centro Hospitalar S. João, E.P.E., ao

Hospital de Braga, ao Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, E.P.E. e ao

Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E., assegurando o conhecimento da atuação

regulatória determinada à luz da concreta factualidade em presença, a qual

necessariamente sustentará as atuações regulatórias futuras.

Porto, 5 de novembro de 2014.

O Conselho de Administração