defesa plenário do juri

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  • Abro um parntesis aqui, para preconizar que, a defesa do ru aqui presente, neste

    momento feita aos senhores jurados, que assim, como os demais aqui presentes, so

    seres humanos.

    E como seres humanos, suscetveis paixes, emoes e sentimentos, como qualquer

    outro ser humano.

    Quadra registrar que, nem os juzes, desembargadores, ministros do STJ E STF, so

    imunes s paixes, emoes, sentimentos, como seres humanos que so.

    Falando em sentimentos, quero brevemente prelecionar acerca de um sentimento em

    particular, presente em todos os seres humanos. Alguns em pouca, outros, porm, em

    grande proporo: medo.

    A Psicloga clnica Luciana Oliveira dos Santos1, preleciona que, em um sentido estrito

    do termo, o medo concebido como uma emoo-choque devido percepo de perigo

    presente e urgente que ameaa a preservao de todo indivduo.

    Para mencionada Psicloga, diferentemente do sentimento do medo, sentido pelos

    povos antigos, temos a experincia de medo do indivduo hoje. Uma experincia

    individualizada, singularizada. o chamado medo contemporneo2.

    Referida psicloga citando Sigmund Freud (mdico neurologista, que viveu entre os anos

    de 1856 a 1939, mais conhecido por ser o pai da Psicanlise), afirma que o medo

    contemporneo, enquanto mal-estar, atinge como um todo, populaes urbanas

    principalmente, sem levar em conta a classe e a posio social, expressando-se atravs

    de fenmenos como stress, depresso, episdios psicossomticos, etc.3

    1 Luciana Oliveira dos Santos. O Medo Contemporneo. Acesso em: 13/07/2015. Disponvel em: http://www.scielo.br/pdf/pcp/v23n2/v23n2a08.pdf. 2 Ibidem 3 Ibidem

  • Desaguando indubitavelmente na sndrome do pnico, a qual Freud denominava

    Neurose de Angstia, em sua obra A Neurastenia e a Neurose de Angstia, publicada em

    18954.

    O professor do departamento de Cincias Sociais da Universidade Federal da Paraba

    Mauro Guilherme Pinheiro Koury, em seu artigo Medos urbanos e mdia: o imaginrio

    sobre juventude e violncia no Brasil atual, afirma existir uma indstria do medo no

    Brasil atual, atravs da relao entre juventude e violncia, com suas proposies

    levantadas pela mdia brasileira no imaginrio nacional5.

    O novel jurista RANGEL, discursando acerca do medo contemporneo, patrocinado pela

    mdia, afirma que:

    No Brasil, determinadas capitais como Rio de Janeiro e So Paulo,

    protagonizam cenas de violncia, para o mundo todo por meio da

    mdia, o que por si s, causa certo impacto no turismo e,

    consequentemente, na economia, pois se difunde o medo de que

    esses lugares so instveis e perigosos para qualquer empreitada

    de mercado, moradia, investimento econmico6...

    Abro um parntesis aqui, somente para discorrer acerca de nosso querido Estado, tido

    como e 2 mais violento do Brasil, conforme menciona o stio na internet

    www.g1.globo.com, utilizando como parmetro o Mapa da Violncia de 20147.

    4 Freud, S., La Neurastenia y la Neurosis de Angustia (Sobre la Justificacin de Separar de la Neurastenia Cierto Complejo de Sntomas a Ttulo de "Neurosis de Angustia") in: SCARPATO, Artur Thiago. Sndrome do Pnico: uma Abordagem Psicofsica. Revista Hermes, So Paulo, nmero 3, 1998. 5 Mauro Guilherme Pinheiro Koury. Medos urbanos e mdia: o imaginrio sobre juventude e violncia no Brasil atual. Disponvel em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-69922011000300003&script=sci_arttext. Acesso em: 13/07/2015. 6 RANGEL, Paulo. Tribunal do Jri: viso lingustica, histrica, social e jurdica. 4 ed. ver. e atual. at 2 de julho de 2012. So Paulo: Atlas, 2012. 7 ES tem queda de homicdios, mas o 2 mais violento, diz pesquisa. Disponvel em: http://g1.globo.com/espirito-santo/noticia/2014/05/es-tem-queda-de-homicidios-mas-e-o-2-mais-violento-diz-pesquisa.html. Acesso em: 14/07/2015.

  • Segundo o stio na internet exame.com.br, o Estado do Esprito Santo, o Estado mais

    violento para as mulheres viverem8.

    Discurso, alis, que agrada o IRMP, em sua tese de acusao. Todavia, senhores, no

    posso utilizar destes discursos, como esfarrapada desculpa, para sair condenando

    quem quer que seja, sem utilizar critrios mnimos de ponderao. Sem ao menos se

    atentar para o conjunto de provas que instruem os autos.

    Afirmar sem provar, falcia. Pois, alegar e no provar o mesmo que nada alegar.

    Quem afirma isso a jurisprudncia senhores.

    Como exemplo, cito aqui um julgado de nosso Tribunal de Justia capixaba, tendo como

    relator, o eminente desembargador Carlos Henrique Rios do Amaral, ao relatar seu voto

    em uma brilhante deciso. Seno vejamos, verbis:

    APELAAO CVEL N 024.039.005.749. RELATOR: DES. CARLOS

    HENRIQUE RIOS DO AMARAL. ACRDAO APELAAO CVEL

    SUPOSTA PRESSAO PARA FAZER ACORDO. AUSNCIA DE PROVA.

    [...] No h prova nos autos que garantam a afirmao da

    recorrente. Existe um nexo ntimo entre o nus de provar e o

    nus de alegar, de modo que ...alegar e no provar, o mesmo

    que nada alegar. Negado provimento ao recurso9.

    Fernando Homem de Mello, em brilhante ensinamento acerca do tema, assevera que,

    o dever de produzir as provas necessrias comprovao da existncia e da veracidade

    de determinado fato, vem a ser o nus da prova (do latim onus probandi, dever de

    provar)10

    8 Os estados em que a mulher corre mais perigo - ES o pior. Acesso em: 14/07/2015. Disponvel em: http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/espirito-santo-e-o-estado-brasileiro-que-mais-mata-mulheres. 9 TJ-ES - AC: 24039005749 ES 24039005749. Relator: CARLOS HENRIQUE RIOS DO AMARAL. Data de Julgamento: 26/06/2007. PRIMEIRA CMARA CVEL. Data de Publicao: 27/08/2007 10 FILHO, Fernando Homem de Mello Lacerda. PROVA - BREVSSIMO COMENTRIO. Acesso em: 14/07/2015. Disponvel em: http://www.advogado.adv.br/artigos/2000/homemdemello/prova.htm.

  • Este nus da prova, incumbe ao autor da Ao Penal, in casu, o IRMP, que deve

    fundamentar e bem embasar suas provas, para que no haja o mnimo resqucio de

    dvidas no julgador. Pois aqui, no Processo Penal, vige a mxima: na dvida, deve o

    julgador decidir a favor do ru, pelo princpio in dubio pro reo.

    Juarez Pereira e Dora Pereira, em importante lio acerca deste tema, afirmam que:

    Sendo o acusado presumivelmente inocente e cabendo o nus

    probatrio ao acusador, necessrio, para a imposio de uma

    sentena condenatria, que se prove, alm de qualquer dvida

    razovel, a culpa do acusado. Subsistindo dvida, tem-se que a

    acusao no se desincumbiu do nus que lhe cabe, restando

    inafastvel a absolvio do ru, j que, sem demonstrao cabal

    de sua culpa, prevalece a inocncia presumida. Nesta acepo,

    pode-se dizer que a presuno de inocncia confunde-se com o in

    dubio pro reo11. (sem grifos no original)

    Importante mencionar que, quando apontamos 1 (um) dedo para acusar algum: 1

    (um) dedo, aponto para o prximo, 3 (trs) dedos aponto para mim mesmo, e 1 (um)

    dedo, aponto para cima, para os cus, que na dico do Salmista Davi, em Salmos,

    captulo 33, versculos 13 e 14 a morada, habitao de Deus.

    Insta consignar que, o Tribunal de Justia Catarinense, em um de seus julgados, afirma

    que:

    A busca da verdade real a mola propulsora do processo penal,

    para a aplicao da lei repressiva. Se a prova dbia e

    contraditria, fruto inclusive, de incria ocorrida na formao do

    caderno administrativo12, os fatos apurados no Processo no

    11 PEREIRA, Juarez Maynart; PEREIRA, Dora Maynart. Deciso de pronncia e presuno de inocncia: in dubio pro reo ou in dubio pro societate?. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 3852, 17 jan. 2014. Disponvel em: . Acesso em: 13 jul. 2015. 12 Ou seja, falta de cuidado, zelo, ou simplesmente negligncia, na fase administrativa do processo, em suma, na conduo do inqurito policial, que sem sombra de dvidas desaguar em uma denncia ministerial falha, desde seu nascedouro, que indubitavelmente contaminar, poluir, todo o iter processual, produzindo uma deciso judicial manchada pela pecha da ilegalidade.

  • fornecem ao julgador a certeza indispensvel de estar diante da

    realidade, o que impede, sob pena de no ser justo, proclamar um

    decreto condenatrio13. (grifamos)

    Retornando ao tema: medo contemporneo RANGEL, em seu valioso ensinamento

    acerca deste intrigante assunto, rechaa a influncia que este tipo de medo, possa ter

    sobre os jurados, contaminado assim sua deciso. Seno vejamos, verbis:

    O jri, por sua vez, contaminado pelo medo urbano (leia-se medo

    contemporneo), acaba decidindo pelo medo que sente dos seus

    medos internos e inconscientes, exteriorizados na vida do outro,

    durante o julgamento. No so poucos os jurados que, aps o

    julgamento afirmam ter passado por situao idntica quela

    objeto de julgamento e que, por tal razo, sabem que aquilo foi

    dito pela acusao (ou pela defesa) verdadeiro, mesmo que a

    prova dos autos no sejam to convincentes assim.

    o famigerado princpio da intima convico (do jurado) em

    desarmonia com a Constituio da Repblica (art. 93, IX), que

    exige que toda e qualquer deciso judicial seja fundamentada,

    sob pena de nulidade, e a (deciso) do jri no pode fugir desse

    imperativo14. (grifos acrescidos)

    Em sntese, a experincia do jurado (leia-se o medo que sente, ou j sentiu) leva-o a

    decidir equivocadamente sobre a vida do outro.

    Jailson Nelson de Miranda Coutinho, assevera que:

    Quando a questo diz respeito Segurana Pblica e suas

    Polticas, no se pode responder pelo mero impulso imaginrio,

    13 TJ-SC-ACR: 399071 SC 1988.039907-1. Relator: Ernani Ribeiro. Data de Julgamento: 29/04/1991. Primeira Cmara Criminal. Data de Publicao: DJJ: 8262. Data: 31/05/91. Pg. 14. 14 RANGEL, Paulo. Tribunal do Jri: viso lingustica, histrica, social e jurdica. 4 ed. ver. e atual. at 2 de julho de 2012. So Paulo: Atlas, 2012.

  • tpico da turba enleada15 nos discursos dos meios de

    comunicao16.

    Resumindo: Ao julgar, devem os jurados, esvaziar-se dos seus medos contemporneos,

    fruto das pregaes miditicas. De suas paixes, emoes, experincias prprias, ou de

    terceiros, e com o equilbrio emocional apropriado que o momento exige, coadunado

    temperana, julgar pela razo. Jamais pela emoo.

    Para que no tenhamos decises equivocadas, manchadas pela pecha das emoes

    humanas exteriorizadas, que indubitavelmente colocar atrs das grades um inocente.

    Trazendo grave ofensa ao princpio da dignidade humana, bem como aos demais

    princpios do direito que a todos abarca, incluso quele que est neste momento

    assentado na cadeira dos rus.

    15 Ou seja, tpico da multido admirada com o discurso miditico. 16 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Segurana Pblica e o direito das vtimas. In: RBIO, David Sanchez; FLORES, Joaquim Herrera; CARVALHO, Saio de (org). Direitos humanos e globalizao: Fundamentos e Possibilidades desde a teoria critica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.