de estaÇÃo ferroviÁria À museu histÓrico de … · resumo região norte do estado do paraná,...

13
1186 DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE LONDRINA: A REFUNCIONALIZAÇÃO DO EDIFÍCIO NA DÉCADA DE 1980 Priscilla Perrud Silva 1 . Orientadora: Profa. Dra. Zueleide Casagrande de Paula. RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial da cidade, coexiste uma série de edificações de caráter histórico. E entre eles, nosso objeto. Idealizado, projetado e construído entre os anos de 1946 a 1950, o edifício que hoje abriga a instituição do Museu Histórico de Londrina Padre Carlos Weiss, foi construído com o intuito de ser a nova Estação Ferroviária de uma recém-fundada cidade em rápido processo de expansão urbana. Na década de 1980, deixa a funcionalidade de Estação para se constituir como sede para o Museu Histórico. Durante este movimento de refuncionalização, o edifício passa por uma série de procedimentos, a fim de melhor adequar-se a esta nova função. Mesmo após este processo, o edifício ainda se constitui como distinção em meio ao seu atual contexto citadino, através de sua forma arquitetônica eclética. Neste trabalho, discutiremos este movimento de refuncionalização do edifício, passando de seu contexto histórico e arquitetônico de Estação Ferroviária à Museu Histórico. Para tanto, analisaremos alguns elementos constituintes desta construção, com enfoque nos elementos que permaneceram e nas modificações realizadas no prédio através da instrumentalização de imagens. Palavras chave: Estação Ferroviária; Museu Histórico; Refuncionalização. 1 Aluna do 4º ano de História (Licenciatura) da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Atualmente é estagiária do Centro de Documentação e Pesquisa Histórica (CDPH-UEL), monitora do Laboratório de Estudos da Imagem (LEDI-UEL) e bolsista PROGRAD-CDPH-UEL 2012. E-mail: [email protected].

Upload: trandat

Post on 11-Nov-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1186

DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE LONDRINA: A REFUNCIONALIZAÇÃO DO EDIFÍCIO NA DÉCADA DE 1980

Priscilla Perrud Silva1. Orientadora: Profa. Dra. Zueleide Casagrande de Paula.

RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial da cidade, coexiste uma série de edificações de caráter histórico. E entre eles, nosso objeto. Idealizado, projetado e construído entre os anos de 1946 a 1950, o edifício que hoje abriga a instituição do Museu Histórico de Londrina Padre Carlos Weiss, foi construído com o intuito de ser a nova Estação Ferroviária de uma recém-fundada cidade em rápido processo de expansão urbana. Na década de 1980, deixa a funcionalidade de Estação para se constituir como sede para o Museu Histórico. Durante este movimento de refuncionalização, o edifício passa por uma série de procedimentos, a fim de melhor adequar-se a esta nova função. Mesmo após este processo, o edifício ainda se constitui como distinção em meio ao seu atual contexto citadino, através de sua forma arquitetônica eclética. Neste trabalho, discutiremos este movimento de refuncionalização do edifício, passando de seu contexto histórico e arquitetônico de Estação Ferroviária à Museu Histórico. Para tanto, analisaremos alguns elementos constituintes desta construção, com enfoque nos elementos que permaneceram e nas modificações realizadas no prédio através da instrumentalização de imagens.

Palavras chave: Estação Ferroviária; Museu Histórico; Refuncionalização.

1 Aluna do 4º ano de História (Licenciatura) da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Atualmente é

estagiária do Centro de Documentação e Pesquisa Histórica (CDPH-UEL), monitora do Laboratório de Estudos da Imagem (LEDI-UEL) e bolsista PROGRAD-CDPH-UEL 2012. E-mail: [email protected].

Page 2: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1187

O presente artigo é fruto dos estudos realizados no âmbito do

subprojeto de pesquisa intitulado: “O Museu Histórico de Londrina: O edifício e

suas linguagens arquitetônicas e artísticas” 2. Este trabalho teve como objetivo

o estudo das linguagens arquitetônicas mescladas em meio à plasticidade da

Arquitetura Eclética que constitui o edifício que hoje abriga o Museu Histórico

de Londrina Padre Carlos Weiss. Esta proposta esteve situada dentro do

domínio do projeto de pesquisa ao qual estava vinculada, intitulado: “Questões

Urbanas, Questões de Urbanização: História, Imagens, Traçados e

Representações” 3. Desse modo, nosso trabalho se configurou em uma

pequena parcela de um estudo mais abrangente, que buscou contemplar a

cidade de Londrina-PR, sua História e seus assuntos. Atualmente, a pesquisa

realizada através do subprojeto vem sendo desenvolvida como Trabalho de

Conclusão de Curso (TCC) para o curso de História (Licenciatura) da

Universidade Estadual de Londrina (UEL).

Os pressupostos teórico-metodológicos a partir dos quais esta

análise é orientada, se fundamenta primeiramente nos trabalhos do historiador

francês Michel de Certeau (1996; 2000) acerca do movimento de produção

historiográfica. Possuindo também como base seus estudos sobre o cotidiano

urbano, com o entendimento de que, um dado elemento do urbano (no caso o

edifício do Museu Histórico de Londrina) se remete a uma determinada forma

de urbanização, considerando-se que este mesmo elemento também, de certa

forma, comporta a totalidade citadina. Buscamos explicitar essa forma de

raciocínio através da análise do papel da Estação Ferroviária na construção da

cidade de Londrina, tendo como base sua ação como marco urbano

arquitetônico histórico, segundo a visão do urbanista americano Kevin Lynch

(1996). E, a fim de fundamentar sua análise dentro do eixo da História da Arte

e da Arquitetura, nos utilizamos dos escritos do historiador italiano Giulio Carlo

Argan (1998), compreendendo assim a cidade como uma grande obra de arte,

2 Subprojeto de pesquisa realizado entre 2010 e 2011, sendo, durante todo este período, contemplado

com uma Bolsa de Inclusão Social da Fundação Araucária-PR. 3 Projeto de pesquisa coordenado pela Profa. Dra. Zueleide Casagrande de Paula (Universidade Estadual

de Londrina - UEL), também orientadora do subprojeto de pesquisa e atualmente do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) intitulado: “O Museu Histórico de Londrina: O Edifício e suas Linguagens Arquitetônicas e Artísticas 1946-1986”.

Page 3: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1188

fruto do processo criativo em constante movimento, o que se aplica também

aos seus elementos, no caso, nosso objeto. Em relação a nossa metodologia,

nos propomos a realizar este estudo através dos “testemunhos históricos”

indicados por Peter Burke (2004) expressos na arquitetura do Museu Histórico

de Londrina, assim, fomos buscar o diálogo com as linguagens constituintes do

edifício documentadas em fotografias, plantas, mapas, entre outros

documentos.

Na área conhecida como Centro Histórico e Comercial, está

localizada a maioria das principais edificações de caráter histórico da cidade de

Londrina-PR, por esta área ter sido o núcleo inicial da urbanização. Situado na

Rua Benjamin Constant, número 900, o prédio é cercado por outros elementos

urbanos característicos. À sua frente se encontram a Praça Rocha Pombo e

em seguida a antiga Estação Rodoviária da cidade, atualmente sede do Museu

de Arte de Londrina. À sua esquerda existe uma viela que dá acesso ao

Planetário. A avenida que passa atrás do quarteirão do prédio é a Avenida

Leste-Oeste, uma das principais vias de tráfego rápido da cidade. E finalmente,

à sua direita se encontra o frenético movimento produzido pelo Terminal

Central de ônibus de Londrina. Em meio a todos estes variados discursos

urbanos, em sua maioria caracterizada por sua fala arquitetônica de cunho

modernista, o edifício em questão se estabelece enquanto uma linguagem

diferente, única, por conta de suas instâncias urbanas, históricas,

arquitetônicas e artísticas, o que contribuiu para que se estabelecesse como

nosso objeto de pesquisa.

A primeira Estação Ferroviária de Londrina foi inaugurada em

28 de julho de 19354. Era uma edificação relativamente simples, com um piso

de concreto como área de plataforma em formato retangular e uma cobertura

simples com o nome da cidade escrito em letras grandes, como pode se

observar na Figura 1:

4 Sobre o contexto da ferrovia em relação à parcela norte do estado do Paraná e à constituição da

cidade de Londrina ver: ADUM, 1991; ARIAS NETO, 1998; TOMAZI, 1997. E sobre o contexto da Estação Ferroviária em relação à ferrovia e à cidade de Londrina ver: SILVA, 2011; OLIVEIRA, 1995.

Page 4: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1189

Figura 1: A Primeira Estação Ferroviária de Londrina5.

Na década de 1940, com o progressivo desenvolvimento

urbano, se instaura uma nova demanda de serviços que a primeira Estação

Ferroviária não conseguia comportar de maneira adequada devido as suas

limitadas instalações. Por esta razão, em 1946 se idealiza a proposta de

construção de uma nova Estação Ferroviária para a cidade que viesse a

suprimir satisfatoriamente as necessidades de demanda. Contudo, além desta

função prática, ela também deveria exercer uma função de representação,

representando a mentalidade da elite londrinense, impressionando seus

visitantes como um grande “portal de entrada” (REGO, 2009, p.126; YAMAKI,

2003), tornando-se símbolo do status que a cidade reivindicou para si. Assim,

foi concebido um projeto arquitetônico de características monumentais6. Os

meios de representação também se davam através dos materiais de

construção de alta qualidade empregados, além de suas amplas e inovadoras

instalações de serviço (água, esgoto, luz, entre outras). Essa

representatividade suplantava o domínio da infraestrutura e adentrava na forma

arquitetônica da edificação, em sua plasticidade oriunda do Ecletismo (PAULA,

2010), muito apreciado pelas elites locais da época. O resultado pode ser

observado na Figura 2:

5 Autoria: José Juliani, 1935. Acervo fotográfico digitalizado do Centro de Pesquisa e Documentação

Histórica (CDPH-UEL). 6 A edificação em si ocupa nada menos que 2.297 metros quadrados, distribuídos em três pavimentos

horizontais, sendo o principal pavimento dividido em dois andares. Já a área da plataforma conta com 109 metros de comprimento por 6 metros de largura.

Page 5: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1190

Figura 2: A segunda Estação Ferroviária de Londrina, site do Museu Histórico.

Assim, em 21 de setembro de 1945, foi aberto o edital de

concorrência para a construção da segunda Estação Ferroviária de Londrina,

mas nenhuma proposta foi apresentada. O encerramento do edital de

concorrência foi transferido para o dia 31 de outubro de 1945, e finalmente em

13 de novembro de 1945 aforam julgadas as propostas de concorrência. As

propostas concorrentes foram as das construtoras: Firma Thá e Filhos Ltda.,

Predial Construtora de Londrina e da Empresa Construção Brasil Ltda.7, sendo

a Firma Thá e Filhos Ltda. de Curitiba a vencedora8, com um projeto avaliado

em Cr$ 1.550,00. O contrato de construção foi então assinado em 13 de

dezembro de 19459. Oficialmente, a autoria do projeto arquitetônico foi

reconhecida como sendo de Euro Brandão, que se supõe ter sido na época

projetista da RVPSC10.

7 BROETO, 1981.

8Condições Gerais do Edital de Concorrência para a Construção de uma Estação em Londrina. Ministério

da Viação e Obras Públicas – Rede de Viação Paraná-Santa Catarina. Curitiba, 22 de agosto de 1945. Acervo do Museu Histórico de Londrina Padre Carlos Weiss. 9 BROETO, 1981.

10No que tange a autoria do prédio, existem algumas controvérsias. No discurso oficial, a autoria do edifício se dá como sendo de Euro Brandão (engenheiro ferroviário paranaense que já foi Ministro da Educação na década de 70), porém, tivemos conhecimento de uma entrevista em que o mesmo nega a autoria desta obra. Não tivemos contato com essa e nenhuma outra fonte que nos desse total e indiscutível comprovação de sua autoria ou de sua negação, ficando assim esta intricada questão em aberto.

Page 6: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1191

Em relação aos materiais de construção, tivemos contato com o

documento que descreve detalhadamente todos os materiais que foram

utilizados na edificação11, que sempre são referenciados como de alta

qualidade para os padrões da época, além de se evidenciar também a

exigência de esmero nos acabamentos e detalhes: “Todos os materiais a

serem empregados na construção serão de primeira qualidade e a obra deverá

ser executada com esmero e de acordo com as regras da arte de construir” 12.

Não entraremos no detalhamento dos materiais de construção que o

documento apresenta por ser uma lista muito extensa, porém, no momento em

que tratarmos da refuncionalização do prédio, iremos apresentar o antes e o

depois das modificações, inclusive na questão dos materiais de construção.

Ao visualizarmos a cópia em blue-print de sua planta principal13

percebemos que a construção foi projetada para ter uma prática organização

dos serviços fornecidos, tendo inclusive uma distinta separação entre a

fachada social, a principal, e a de serviço. Já a configuração interior do edifício

compreendia dois pavimentos sendo que no inferior foram instalados os

escritórios da agência, sala de bagagem e de encomendas, escritórios de

notas, serviço rodoviário, composição de trens, depósito de materiais e de

malas, bar e café, instalações sanitárias e sala de espera. E no andar superior

se localizavam os escritórios da 9ª residência da via permanente, os serviços

de rádio e telégrafo e mais instalações sanitárias. A construção da nova

Estação de Londrina se estendeu de 1946 até 1950, ano de sua inauguração.

Nas primeiras décadas de Londrina, a linha ferroviária cortava a

jovem cidade ao meio, na linha norte-sul. Ela separava a urbanizada e

moderna região central da região empobrecida, conhecida zona de meretrício, 11

Especificações para a construção de uma estação em Londrina. Ministério da Viação e Obras Públicas. Rede de Viação Paraná – Santa Catarina. Trecho Ourinhos-Apucarana. Curitiba, 22 de agosto de 1945. Código do Documento: C03LDA 5 DOC HIST. SS ESTAÇÃO FERROVIÁRIA DC 54 8. Acervo do Museu Histórico de Londrina Padre Carlos Weiss. 12

TIT° III das Disposições Gerais do Documento: Especificações para a construção de uma estação em

Londrina. Ministério da Viação e Obras Públicas. Rede de Viação Paraná – Santa Catarina. Trecho ourinhos-Apucarana. Curitiba, 22 de agosto de 1945. Código do Documento: C03LDA 5 DOC HIST. SS ESTAÇÃO FERROVIÁRIA DC 54 8. Acervo do Museu Histórico de Londrina Padre Carlos Weiss. 13

Planta: Estação de Londrina (cópia em blue-print). R.V.P.S.C. Departamento da Via Permanente. Trecho Ourinhos – Apucarana. Curitiba 13 de julho de 1945. Arquivo n°3-47-2-24/2. Acervo do Museu Histórico de Londrina Padre Carlos Weiss.

Page 7: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1192

a Vila Matos, abaixo da linha (LEME, 2004). Mesmo na época da construção da

nova Estação Ferroviária, a cidade já havia extrapolado o ordenado

planejamento urbano inicial, tendo o crescimento urbano sido sufocado e

dividido pela ferrovia desde então. Com o contínuo “inchaço” da área ao longo

dos anos, a transposição de uma ferrovia bem no centro da cidade se tornara

inviável. Além de atrapalhar o tráfego, congestionava o fluxo do transporte

coletivo no sentido leste-oeste, além da questão dos acidentes14 que ocorriam

com a população residente abaixo da linha férrea, quando necessitava

transpassá-la para ter acesso ao restante da cidade. Neste aspecto também se

pensava que, com a retirada dos trilhos amenizaria-se o estima social

personificado no corte da linha, além da pressão da imprensa local15. Em 1966,

as autoridades começaram a planejar a mudança dos trilhos. E em 1973 é

construída a variante ferroviária16, levando-a para a área norte da cidade a fim

de contemplar as indústrias. Todas estas questões acarretaram no

desligamento das atividades na Estação Ferroviária e na remoção dos trilhos

da região central (MUSILLI, ABRAMO, 2004, p.28; OLIVEIRA, 1995).

Assim, a construção acabou alienada de sua função... O trem

de passageiros parou de trafegar em 10 de março de 1981, perdendo a

concorrência para o transporte rodoviário. A Estação Ferroviária viu seu último

trem de carga partir em 06 de novembro de 1982.

Com seu consequente abandono, o prédio da antiga Estação

Ferroviária foi cedido pela Prefeitura Municipal de Londrina em regime de

comodato como sede para o Museu Histórico de Londrina Padre Carlos Weiss

em 10 de dezembro de 198617, em uma inauguração realizada no 52º

14

Sobre os acidentes que ocorriam na época em função da presença da ferrovia no centro de Londrina, ver o acervo de processos-crime do Centro de Pesquisa e Documentação Histórica (CDPH-UEL): Acidente de Trem nº38, Acidente Ferroviário nº242, Locomotiva nº297, Acdente Ferroviário nº716, Acidente Ferroviário nº720, Acidente Ferroviário com Morte nº738, Acidente Rodoferroviário nº1234, Acidente Rodoferroviário com Morte nº1321, Acidente Ferroviário com Lesões Corporais nº1321, Acidente Rodoferroviário com Morte nº1693, Acidente Rodoferroviário nº2082, Acidente Ferroviário com Lesões Corporais nº2303, Acidente Ferroviário; Suicídio nº2509, Acidente de Trem com Lesões Corporais nº2550 e Acidente Ferroviário Resultando em Lesões Corporais nº 2609. 15

OLIVEIRA, 1995. 16

Sobre a programa da variante ferroviária ver: Londrina-Situação 79. Plano de Desenvolvimento Urbano, PDU, Londrina, 1979. Acervo do Centro de Pesquisa e Documentação Histórica (CDPH-UEL). 17

O Museu ganha um Prédio. Jornal Folha de Londrina, 10 de dezembro de 1986, p.19.

Page 8: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1193

aniversário da cidade18, exercendo o prédio esta refuncionalização que

sustenta até hoje. É importante ressaltar que a transição do edifício de Estação

Ferroviária à função de sede para o Museu Histórico foi demorada e um pouco

conflituosa, visto que o edifício havia sido prometido para a instituição do

Museu Histórico pelo então Prefeito Antônio Casemiro Belinati à diretora do

Museu na época a Professora Conceição A. D. Geraldo desde 1979, vindo a se

concretizar somente na data citada de 1986. O edifício da Estação Ferroviária

também foi solicitado pela Academia de Letras, Ciências e Artes de Londrina,

argumentando que o edifício abrigaria perfeitamente o Museu e a Academia de

Letras. Mas esta solicitação não chegou a se concretizar, devido a urgente

necessidade de espaço físico da instituição do Museu Histórico, antes instalado

em três salas do porão do colégio Hugo Simas, sob aperto e goteiras. É

interessante observar os apelos pela transferência do Museu feitos às

instituições públicas nos boletins do Museu Histórico na década de 1980, onde

sempre eram publicadas fotografias do edifício da Estação Ferroviária na parte

de trás dos boletins como apelo para agilidade do processo em questão.

Ao que tudo indica, durante seu funcionamento como Estação

Ferroviária de 1950 a 1982, o edifício em si não passou por nenhuma

intervenção arquitetônica substancial. Este tipo de procedimento só ocorreu na

época de sua refuncionalização, a fim de sediar de maneira adequada o Museu

Histórico e os procedimentos feitos posteriormente, a partir da década de 1990,

foram necessários a este exercício.

O projeto arquitetônico para a refuncionalização do prédio foi

elaborado e efetivado pelos arquitetos e professores do curso de Arquitetura da

Universidade Estadual de Londrina (UEL), Jorge Marão Carnielo Miguel e

Antonio Carlos Zani19, com as obras iniciadas em fevereiro de 1986. A área

18

De Ferroviária para Museu. Jornal Folha de Londrina, s/d, s/nº. Coleção de Recortes Digitalizados do Jornal Folha de Londrina – CDPH-UEL. 19

Plantas: Museu Histórico de Londrina: Reciclagem do prédio da Antiga Estação Ferroviária de Londrina (Cortes: AA. BB. CC. DD). Prefeitura Municipal de Londrina, Agosto de 1985.; Museu Histórico de Londrina: Reciclagem do prédio da Antiga Estação Ferroviária de Londrina (Plantas). Prefeitura Municipal de Londrina, Agosto de 1985.; Museu Histórico de Londrina: Reciclagem do prédio da antiga Estação Ferroviária de Londrina (Elevações). Prefeitura Municipal de Londrina, Agosto de 1985. Acervo da Secretaria de Obras da Prefeitura Municipal de Londrina.

Page 9: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1194

externa da obra ficou a cargo da empresa Pavisolo, que inclusive foi

responsável pelo calçamento em petit pavê na fachada do edifício e a área

interior ficou a cargo da engenharia Liana Lapa Espiga da Secretaria de

Urbanismo, Obras e Viação do município, através da construtora Dinardi20.

Na Elevação Sul, foi realizado o tratamento das pedras

incrustadas, com a remoção da pintura antiga procurando manter as

características “naturais”. A superfície recebeu pintura acrílica em cor pêssego

texturizada (Sulvinil) e no auto relevo, pintura acrílica em cor telha texturizada

(Sulvinil). Na Elevação Norte, a barra de tijolos de altura de 1,50m foi mantida,

a parede acima da barra recebeu pintura em cor pêssego texturizada (Sulvinil).

Na Elevação Leste e na Oeste também foram realizados o tratamento das

pedras, nas superfícies e nos autos relevos o mesmo patrão de pintura da

Elevação Sul.

As janelas basculantes de ferro foram lixadas e recuperadas,

sendo pintadas com pintura anticorrosiva (Zarcão), com pintura de acabamento

em esmalte sintético de cor vermelha (Ref.350, Coralit). Foram substituídos

todos os vidros martelados por vidros transparentes de 4mm. Já as portas de

madeira, foram lixadas e recuperadas, recebendo pintura a óleo na cor

vermelha (Coralit) e fechaduras da linha Concept e Brasil.

A distribuição interna foi refeita, atendendo as necessidades da

nova função, no pavimento térreo foram dispostos o salão de exposições

permanentes, dividido em duas salas: a sala desenvolvimento urbano e a sala

colonização. Em seguida a sala primeiro núcleo, sanitários, um pequeno hall,

corredor de circulação e recepção, mais duas salas de exposições

permanentes denominadas “café” e “ferrovia”, salão de exposição temporária,

cantina, outro hall, sala de restauro, e por fim, auditório. No 1º andar:

sanitários, biblioteca, recepção e consultas, arquivo de fotos, copa, arquivo,

secretaria, sala de reunião, direção, um pequeno corredor de circulação, sala

de estar, sala de leitura e pesquisa, e assessoria técnica. No 2º andar: um

20

Prefeitura entrega dia 10 prédio do Museu Histórico. Jornal Folha de Londrina, 28 de novembro de 1986, p.4.

Page 10: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1195

pequeno sanitário, corredor de circulação, zeladoria, acervo técnico, laboratório

fotográfico, e um último acervo técnico.

Como havia uma ampla variedade de pisos em todo o edifício,

estes foram “homogeneizados”, trocados por um piso de qualidade, de

cerâmica (Gail) em várias graduações de laranja, como representação da terra

roxa do norte do estado21, demarcando o percurso de visitação completa da

exposição permanente do Museu Histórico. O antigo forro de fibra-cimento foi

retirado no entorno de toda a parte externa do edifício, deixando o

madeiramento à vista, que foi lixado e recebendo aplicação de Pentox incolor.

Este processo de adequação do edifício para a instalação do

Museu Histórico teve vários percalços, como por exemplo, o roubo de materiais

de construção, a quebra dos vidros que foram trocados quase todas as noites,

além de um bando de pombos que haviam se instalado no telhado do prédio e

teimavam em não sair22. Estes e outros fatores foram responsáveis pelo atraso

das obras que estavam previstas para terminar em agosto, mas só foram

terminadas em dezembro de 1986. Além de duras críticas por parte da

imprensa que alegou que as obras estavam desfigurando a fachada da antiga

Estação Ferroviária23, e recebeu críticas também por parte dos museólogos

que alegaram não terem sido consultados em relação as especificações

técnicas de museologia para a adequação do espaço museal24. O custo total

das obras foi de Cz$ 1,8 milhões25.

Concluindo, algo com o qual nos defrontamos em meio a nossa

pesquisa é a questão de que o prédio em si ganhou o título de Museu Histórico,

confundindo-se com esta função. Esta forma de identificação do prédio se

tornou muito forte e é ampla e constantemente reproduzida. Ao se dizer o

nome do Museu Histórico de Londrina, a primeira imagem que vem à mente

21

Fonte: Prof. Jorge Marão Carnielo Miguel. 22

O Museu ganha um Prédio. Jornal Folha de Londrina, 10 de dezembro de 1986, p.19. 23

Reformas descaracterizam o prédio da antiga Ferroviária. Jornal Folha de Londrina, 25 de março de 1986, p.4. 24

Reformas na Ferroviária podem prejudicar o Museu. Folha de Londrina, 01 de abril de 1986, p.4. 25

Prefeitura entrega hoje expansão da Sercomtel e o prédio do Museu. Jornal Folha de Londrina, 10 de dezembro de 1986, p.5.

Page 11: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1196

não é de seu interior, funcionários ou de seu acervo, mas sim da fachada do

prédio e sua forma peculiar que parece simplesmente personificar a instituição.

É interessante constatar que enquanto Estação Ferroviária, o edifício não

possuía um nome ou simples apelido, o que talvez acarretou em seu “batismo”

como Museu histórico. Porém, este nome na verdade não referencia o prédio,

afinal o edifício não é o Museu:

Este me parece até o momento, o lugar deste edifício, visto que - antes estação ferroviária e hoje museu histórico - se confunde com o Museu Histórico de Londrina “Pe. Carlos Weiss” - que já esteve abrigado nos porões de um colégio - pela forma como é referenciado pelo uso das imagens de mídia e pelos inúmeros discursos que o entendem como o próprio museu. Esquecem-se seus admiradores que este é um edifício desvinculado do museu histórico, é uma edificação que o abriga no momento, mas que não lhe pertence, contudo tenha sido adquirido pela Universidade Estadual de Londrina para este fim, no entanto, isso não o protege, visto que nem mesmo sob a égide da legislação local ele foi tombado, assim sendo esta disponível para o uso do museu histórico, mas não é o Museu. (PAULA, 2010, p.15)

Em nota sobre o prédio que atualmente abriga o Museu

Histórico de Londrina Padre Carlos Weiss, a autora observa que, apesar de

abrigar essa função devido ao seu uso pela instituição, na realidade o prédio

não é o Museu quanto propósito de construção. Não raramente esta distinção é

distorcida nas mídias e nos discursos que o colocam o edifício como o próprio

Museu. Ou seja, ele não é o Museu, apenas o abriga hoje. Fruto de seu tempo,

mesmo alienado de seu propósito inicial e das modificações realizadas, as

formas do edifício ainda testemunham sua e nossa história não só como

Estação Ferroviária, ou como sede do Museu Histórico, mas também como

produto de arte em sua vertente de arquitetura, na linguagem do Ecletismo.

Page 12: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1197

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ADUM, Sônia Maria Sperandio Lopes. Imagens do Progresso: Civilização e Barbárie em Londrina – 1930/1960. Assis, 1991. 259 p. Dissertação (Mestrado em História Social) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista. ARGAN, Giulio Carlo. História da Arte como História da Cidade. Tradução Pier Luigi Cabra. 4. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. BROETO, Lucila Maris. A Estação Ferroviária de Londrina. Londrina: 1981. BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagem. Bauru: EDUSC, 2004. CERTEAU, Michel de. A operação historiográfica. In: A escrita da História. Tradução de Maria de Lourdes Menezes. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000. CERTEAU, M. de.; GIARD, L.; MAYOL, P. Caminhadas pela cidade. In: A invenção do cotidiano. Tradução de Ephraim F. Alves e Lúcia Endlich Orth. Petrópolis: Vozes, 1996. CERTEAU, M. de.; GIARD, L.; MAYOL, P. Relatos de Espaço. In: A invenção do cotidiano. Tradução de Ephraim F. Alves e Lúcia Endlich Orth. Petrópolis: Vozes, 1996. LEME, Edson Holtz. Noites ilícitas: histórias e memórias da prostituição. 2ª Edição. Londrina: Eduel, 2009. LYNCH, Kevin. A imagem de cidade. Tradução: Jefferson Luiz Camargo. 2° edição: Martins Fontes, São Paulo, 1999. MUSILLI, C.; ABRAMO, M. A. Londrina puxa o fio da memória. Joinville: Ed. Letradágua, 2004. NETO, José Miguel Arias. O Eldorado: representações da política em Londrina 1930-1975. Londrina: EDUEL, 1998. OLIVEIRA, Leila Márcia Andrade de. Trilhos Urbanos: A Ferrovia e a Modernidade em Londrina. Londrina, 1995. Monografia (Especialização em História) – Centro de Ciências Humanas, Universidade Estadual de Londrina. PAULA, Zueleide Casagrande de. Os Marcos Urbanos em História e Memória: o Museu Histórico de Londrina “Pe. Carlos Weiss” em breve nota. Boletim Museu Histórico de Londrina. Londrina, v1, n°2, 2010. REGO, Renato Leão. As cidades plantadas: os britânicos e a construção da paisagem do norte do Paraná. 1° edição. Maringá: Edições Humanidades, 2009.

Page 13: DE ESTAÇÃO FERROVIÁRIA À MUSEU HISTÓRICO DE … · RESUMO Região norte do estado do Paraná, cidade de Londrina. No contexto urbano do denominado Centro Histórico e Comercial

1198

SILVA, Priscilla Perrud. Ferro nos Trilhos e na Estação: O Caso da Antiga Estação Ferroviária de Londrina. Anais do III Encontro Nacional de Estudos da Imagem: III ENEIMAGEM. Londrina, 2011. TOMAZI, Nelson Dácio. “Norte do Paraná”: história e fantasmagorias. Curitiba, 1997. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal do Paraná. YAMAKI, Humberto. Iconografia Londrinense. Londrina: Edições Humanidades, 2003.