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Anais II Simpósio Gênero e Políticas Públicas ISSN2177-8248 Universidade Estadual de Londrina, 18 e 19 de agosto de 2011. GT7- Gênero e Trabalho Coordenação: Cássia Maria Carloto Políticas laborais de igualdade de gênero: o Programa Pró-Equidade de Gênero no Brasil Débora de Fina Gonzalez Introdução A consolidação da participação feminina no mercado de trabalho coloca em pauta relevantes questionamentos acerca das desigualdades de gênero que, percebidas em distintas esferas das relações sociais, aparecem de maneira expressiva nas relações laborais. As assimetrias referem-se a diferenças no acesso, permanência e ascensão profissional de homens e mulheres. Muitas destas condições relacionam-se à permanência de uma divisão sexual do trabalho, na qual as mulheres aparecem como principais responsáveis pelos afazeres domésticos e cuidados com a família. Assim, elas acumulam as exigências do trabalho assalariado ao trabalho reprodutivo, o que muitas vezes representa obstáculos à inserção e permanência no mercado de trabalho. Atualmente, a questão da igualdade de gênero no mercado de trabalho é um importante foco das agendas internacionais. Dentre as políticas desenvolvidas no Brasil, o Programa Pró-Equidade de Gênero destaca-se como uma iniciativa voltada à maior responsabilização do Estado, das empresas e dos/as trabalhadores/as na construção de condições mais igualitárias entre homens e mulheres no mercado de trabalho 1 . Neste contexto, a análise do Programa, das medidas adotadas em sua implementação, bem como dos resultados alcançados, permite diagnosticar os possíveis avanços em relação à diminuição das desigualdades de gênero no mercado de trabalho e a importância da participação de cada um dos atores sociais envolvidos neste processo. Busca- Mestranda no Departamento de Ciências Sociais na Educação Faculdade de Educação FE/UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas); email:[email protected]. 1 O Programa Pró-Equidade de Gênero, diante de uma realidade social fortemente marcada por desigualdades raciais, que se sobrepõem às desigualdades de gênero, incorporou a perspectiva de raça em sua proposta de maior equidade no mercado de trabalho, passando a designar-se „Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça‟,a partir de sua 4ª edição (2011).

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Anais II Simpósio Gênero e Políticas Públicas ISSN2177-8248

Universidade Estadual de Londrina, 18 e 19 de agosto de 2011.

GT7- Gênero e Trabalho – Coordenação: Cássia Maria Carloto

Políticas laborais de igualdade de gênero: o Programa Pró-Equidade de Gênero no Brasil

Débora de Fina Gonzalez

Introdução

A consolidação da participação feminina no mercado de trabalho coloca em

pauta relevantes questionamentos acerca das desigualdades de gênero que, percebidas em

distintas esferas das relações sociais, aparecem de maneira expressiva nas relações laborais.

As assimetrias referem-se a diferenças no acesso, permanência e ascensão profissional de

homens e mulheres.

Muitas destas condições relacionam-se à permanência de uma divisão

sexual do trabalho, na qual as mulheres aparecem como principais responsáveis pelos afazeres

domésticos e cuidados com a família. Assim, elas acumulam as exigências do trabalho

assalariado ao trabalho reprodutivo, o que muitas vezes representa obstáculos à inserção e

permanência no mercado de trabalho.

Atualmente, a questão da igualdade de gênero no mercado de trabalho é um

importante foco das agendas internacionais. Dentre as políticas desenvolvidas no Brasil, o

Programa Pró-Equidade de Gênero destaca-se como uma iniciativa voltada à maior

responsabilização do Estado, das empresas e dos/as trabalhadores/as na construção de

condições mais igualitárias entre homens e mulheres no mercado de trabalho1.

Neste contexto, a análise do Programa, das medidas adotadas em sua

implementação, bem como dos resultados alcançados, permite diagnosticar os possíveis

avanços em relação à diminuição das desigualdades de gênero no mercado de trabalho e a

importância da participação de cada um dos atores sociais envolvidos neste processo. Busca-

Mestranda no Departamento de Ciências Sociais na Educação – Faculdade de Educação – FE/UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas); email:[email protected].

1 O Programa Pró-Equidade de Gênero, diante de uma realidade social fortemente marcada por desigualdades

raciais, que se sobrepõem às desigualdades de gênero, incorporou a perspectiva de raça em sua proposta de

maior equidade no mercado de trabalho, passando a designar-se „Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça‟,a

partir de sua 4ª edição (2011).

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se, ainda, apreender as principais causas da persistência das desigualdades entre homens e

mulheres no mercado de trabalho e os possíveis focos de ação para uma efetiva mudança.

1. A questão de gênero no mercado de trabalho

A entrada massiva das mulheres na vida pública e, particularmente, no

mercado de trabalho, representou avanços significativos no sentido da constituição de uma

maior autonomia feminina. Este movimento, que ganha força a partir da década de 1970,

trouxe para o debate social o questionamento e a possibilidade de rompimento com uma

lógica - alocada na dominação patriarcal - através da qual se limitava a esfera feminina ao

âmbito privado e doméstico.

O acesso ao emprego assalariado aparece como elemento fundamental na

busca da independência econômica, política e social das mulheres. Porém, a participação no

mercado de trabalho não elimina as desigualdades entre homens e mulheres. Este, muitas

vezes, apresenta-se como mais um âmbito de reprodução das relações hierárquicas e de

dominação entre os sexos. Freqüentemente a inserção das mulheres no trabalho assalariado é

caracterizada por discriminações, desigualdades salariais e pela desqualificação das

ocupações nas quais se inserem.

As relações assimétricas criadas no âmbito do mercado de trabalho podem

ser diagnosticadas nos mais variados níveis: de hierarquia, de qualificação, das oportunidades,

da carreira e do salário, que aparecem marcadamente diferenciados de acordo com o sexo. A

inserção e o acesso desigual aparecem relacionados a construções - históricas e culturais - de

práticas tidas como „femininas‟ e „masculinas‟.

Neste sentido, as ocupações em que se inserem as mulheres no trabalho

assalariado aparecem, num primeiro momento, como uma extensão do trabalho realizado no

âmbito doméstico, relacionadas a capacidades ou habilidades identificadas como „femininas‟

(na qual são priorizados atributos como delicadeza, destreza, habilidade manual, paciência,

etc.).

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Por outro lado, o trabalho realizado pelos homens é associado a um

conhecimento teórico formalizado, adquirido através da formação profissional, enquanto as

mulheres o desenvolvem de acordo com um conhecimento (inato) não formalizado adquirido

pela prática na esfera doméstica. Esta “desqualificação” do trabalho feminino relaciona-se a

uma “construção social do gênero que inclui também as qualidades de gênero desenvolvidas

socialmente através da educação e do trabalho.”Souza-Lobo(1985, p.59).

À desvalorização profissional, associam-se fatores como as expressivas

desigualdades salariais entre homens e mulheres em diversos setores do mercado de trabalho,

e a sobre-representação feminina nas ocupações de maior vulnerabilidade social e

precariedade das condições de trabalho.

A permanência da responsabilidade feminina pela esfera familiar e pelos

afazeres domésticos revela-se fator determinante a ser considerado nesta conjuntura, na

medida em que incide diretamente nas possibilidades de acesso e profissionalização das

mulheres.

De fato, a atribuição destas responsabilidades como essencialmente

femininas produzem efeitos diretos na trajetória ocupacional das mulheres, e apresentam-se

como entraves para a inserção em cargos de maior responsabilidade e ocupações melhor

remuneradas. A conservação do emprego e a possibilidade de ascensão profissional de

algumas mulheres aparecem, neste contexto, mediadas pela necessidade de serem substituídas

em suas funções familiares por outras mulheres. (SOUZA-LOBO,1990)

O caráter paradoxal da participação feminina na esfera produtiva inscreve-

se, por um lado, como parte de um projeto de constituição de uma maior autonomia frente às

relações de opressão e dominação de gênero. Por outro lado, a permanência dos papéis sociais

de gênero evidencia que os custos da reprodução social incidem majoritariamente sobre as

mulheres, o que traz como conseqüência a sobrecarga e a dupla jornada de trabalho.

Uma análise da constituição setorial do mercado de trabalho brasileiro sob a

perspectiva de gênero revela que as mulheres se concentram majoritariamente em atividades

do setor terciário, na prestação de serviços - domésticos e sociais - e em atividades dos setores

de educação e saúde, ocupando cargos menos valorizados e de menor prestígio social,

relacionados freqüentemente às atribuições construídas socialmente como femininas.

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Apesar da permanência destas tendências ao longo das décadas, podem ser

diagnosticadas sensíveis – porém importantes e significativas - alterações, no que diz respeito

ao aumento constante das taxas de participação e ocupação das mulheres no mercado de

trabalho, à contínua entrada das mulheres em setores anteriormente masculinizados, e à

diminuição da diferença entre os salários masculinos e femininos.

Neste sentido, o „Programa Pró-Equidade de Gênero‟ aparece como uma das

medidas institucionais direcionadas à diminuição das desigualdades entre homens e mulheres

no âmbito das relações de trabalho. Desenvolvido desde o ano de 2005, o programa

apresentou alguns resultados positivos na gestão e nas relações de trabalho no interior das

empresas participantes. Assim, uma análise de como estas medidas estão sendo

implementadas e quais os reflexos efetivos nas práticas sociais pode apresentar instrumentos

para identificação das persistências e obstáculos, e dos possíveis avanços no sentido de uma

maior igualdade nas relações de gênero.

2. Panorama da situação das mulheres no mercado de trabalho brasileiro

Os dados nacionais acompanham um movimento global de expansão

contínua da participação das mulheres no mercado de trabalho assalariado. A tendência de

crescimento da participação feminina no mercado de trabalho torna-se expressiva e contínua a

partir de meados da década de 1970. Este fator mostra-se relevante na medida em que

representa uma reconfiguração na composição da força de trabalho, de acordo com o gênero,

e coloca o espaço do trabalho produtivo enquanto lugar de atuação social de homens e

mulheres.

Atualmente, as mulheres representam 44,4% do total dos assalariados no

Brasil (Pnad/IBGE, 2009)2. Os dados recentes explicitam, ainda, que as condições desiguais

de acesso e oportunidades aparecem fortemente relacionadas aos determinantes de gênero e

raça. Como exemplo, uma análise da proporção na categoria „empregadores‟, explicita uma

2 As informações apresentadas nesta seção estão baseadas nos dados da Pesquisa Nacional de Amostra por

Domicílio (Pnad), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgada em 2009.

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configuração excludente, na qual mais da metade desta categoria (50,3%) é ocupada por

homens brancos. As mulheres negras, por sua vez, representam apenas 6,7% do total de

empregadores/as, concentrando-se na „produção para o próprio consumo‟, provavelmente em

atividades com baixos índices de proteção social e maior vulnerabilidade.

A desigualdade percebida na distribuição das ocupações é um dos fatores

que demonstram a clara segmentação do mercado de trabalho brasileiro pelas desigualdades

de gênero e raça, que revelam a permanência de traços característicos de um modelo de

organização social escravocrata e patriarcal, ainda presentes na realidade atual.

Por outro lado, a renda feminina compõe, atualmente, quase a metade do

total dos rendimentos familiares e, ainda nesta tendência, destaca-se o aumento do número de

mulheres que se apresentam enquanto chefes de família, principalmente em famílias

monoparentais. Mesmo diante de reconfigurações expressivas na estrutura social e

econômica, os rendimentos salariais das mulheres permanecem inferiores quando comparados

aos salários masculinos, em quase todas as ocupações.

É importante destacar que há uma tendência de diminuição destas

diferenças, que aparece relacionada a fatores como um maior nível de escolarização entre as

mulheres, à entrada destas em ocupações consideradas masculinas, ao aumento da presença

feminina em diferentes especialidades, atividades e áreas profissionais, e ao aumento do

número de mulheres que ocupam cargos de chefia e gerência.

A maior escolarização e profissionalização revelam um investimento ativo

das mulheres que se reflete na conquista de novos postos. Assim, apesar de concentrarem-se

majoritariamente em atividades relacionadas à prestação de serviços, secretariado, educação e

saúde, aos poucos as mulheres se fazem mais presentes em ocupações tradicionalmente

„masculinas‟, de maior prestígio social, melhores remunerações e condições de trabalho.

No entanto, as trajetórias de ascensão profissional se dão de maneiras

diferenciadas para homens e mulheres. Estas enfrentam ainda discriminações de gênero nos

locais de trabalho e muitas vezes são vítimas de preconceitos e descrédito com relação a suas

capacitações, necessitando comprovar continuamente sua competência e legitimidade

profissional.

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A estes conflitos soma-se a dificuldade da maior disponibilidade de tempo e

dedicação aos cargos de maior responsabilidade e prestígio nas empresas. Neste sentido, as

responsabilidades familiares aparecem como entraves à ascensão profissional das mulheres.

Diante desta configuração, percebe-se no Brasil, principalmente a partir de

2004, o desenvolvimento de programas e políticas públicas direcionadas à maior equidade

salarial e à igualdade de oportunidades no mercado de trabalho. Alinhadas a políticas

internacionais de combate às desigualdades, estas medidas passam a influenciar, de alguma

maneira, na diminuição das desigualdades salariais e em melhores condições de acesso e

permanência no mercado de trabalho.

Os dados revelam um movimento contínuo, ainda que pouco expressivo, de

diminuição das diferenças salariais entre homens e mulheres desde 2004. Em 2008, o

rendimento médio das mulheres correspondia a 70,8% da média masculina, o que explicita,

ainda, uma grande desigualdade a ser superada.

Neste sentido, ao considerar os representativos avanços da crescente

participação das mulheres no mercado de trabalho, é necessária uma análise atenta das

condições e ocupações na qual se dá esta inserção. As relações estabelecidas através das

atividades assalariadas podem – como observado - revelar-se um lugar de reprodução de

hierarquias e discriminações também presentes em outras esferas sociais.

3. O Programa Pró-Equidade de Gênero:

O Programa Pró-Equidade de Gênero insere-se como uma das ações

previstas nos I e II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM). É desenvolvido

pela Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres (SPM), em parceria com a Organização

Internacional do Trabalho (OIT) e a Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para as

Mulheres (Unifem/ONUMulheres).

O Programa se desenvolve em âmbito nacional desde 2005 e realizou-se em

três edições, com a duração de doze meses. A quarta edição do Programa inicia-se em 2011.

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Direcionado a empresas públicas e privadas, o Programa tem como principal finalidade atuar

na conscientização e sensibilização de empregadores/as e trabalhadores/as acerca das questões

de gênero que perpassam as relações de trabalho.

No sentido de promover a equidade, dirige-se ao desenvolvimento de novas

concepções na cultura organizacional e na gestão de pessoas no interior das empresas, com o

objetivo de “contribuir para a eliminação de todas as formas de discriminação no acesso,

remuneração, ascensão e permanência no emprego.”(OIT/SPM, 2010. p23)

A adesão ao Programa é voluntária, realizada mediante o preenchimento de

uma „ficha-perfil‟, na qual são agregadas informações do quadro institucional e

organizacional da empresa. A partir de um diagnóstico dos dados levantados, elabora-se em

cada empresa um plano de ação direcionado à equidade de gênero e raça no âmbito das

relações de trabalho. Após discutido e pactuado com o Comitê Pró-Equidade de Gênero3, o

plano é desenvolvido pelas empresas e, ao final, avaliado pelo Comitê.

As empresas que cumprem os objetivos e compromissos assumidos recebem

o Selo Pró-Equidade de Gênero, que tem a validade de um ano sendo que as instituições

podem se cadastrar na edição seguinte do programa.

Na primeira edição do Programa (2005-2006), participaram 16 empresas

públicas, das quais 11 adquiriram o Selo Pró-Equidade. A segunda edição (2007-2008) teve a

participação de 36 empresas públicas e privadas, e premiou 23 instituições, das quais 10

haviam adquirido o Selo na primeira edição. Já a terceira edição teve a adesão de 81

empresas do setor público e privado, com 58 empresas premiadas, das quais 9 adquiriram a

certificação desde a primeira edição, 13 desde a segunda, e 36 a receberam pela primeira vez.

Estes dados permitem diagnosticar a continuidade da participação de parte

expressiva das empresas no Programa ao longo das três edições, além de uma adesão cada vez

maior das empresas a esta iniciativa, revelada pelo crescente número de participantes. O

Programa propõe a inserção da temática da igualdade de gênero nas relações de trabalho

dentro das empresas, e inclui-se numa agenda – nacional e global - que pauta a importância da

re-divisão das responsabilidades sociais entre as empresas, o Estado e os demais setores.

3 O Comitê Pró-Equidade de Gênero é responsável pela coordenação do Programa, e integrado por

representantes da Secretaria de Políticas para as Mulheres(SPM), Ministério do Planejamento, Orçamento e

Gestão(MPOG), Ministério Público do Trabalho(MPT), Ministério Público do Emprego(MTE), Organização

Internacional do Trabalho(OIT), Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher – ONU

Mulheres(UNIFEM), e Conselho Nacional dos Direitos da Mulher(CNDM).

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Os principais resultados apresentados nestas três edições se referem ao

desenvolvimento de atividades de sensibilização à temática, através de espaços de reflexão,

capacitação e formação de gestores/as; desenvolvimento de estratégias de combate a práticas

de discriminação; levantamento de informações; e inclusão de cláusulas de gênero nas pautas

de negociação e acordos coletivos de trabalho. Além disso, o Programa prevê a construção de

um Banco de Boas Práticas, que permite a troca de informações e experiências entre as

empresas.

A última edição incluiu um total de 281.884 trabalhadores/as, dos/as quais

64,9% (183.047) homens e 35,1% (98.837) mulheres. Dentre o total de 173 diretores/as,

apenas 9,8% eram mulheres, e dos/as 12.079 gerentes, 17,4% eram mulheres. Estes números

explicitam desigualdades quanto ao acesso e inserção de homens e mulheres nas empresas, e

evidenciam a diferenciação quanto aos níveis de ocupação e, consequentemente, quanto às

hierarquias, diferenças de rendimentos e oportunidades de acesso a qualificação e ascensão

profissional.

Os cargos de maior responsabilidade e prestígio são ocupados

majoritariamente pelos homens, o que implica numa nítida diferenciação salarial entre

homens e mulheres. Este quadro revela uma divisão desigual de poder entre os sexos no

interior das empresas, o que de fato pode ser constatado em todos os setores do mercado de

trabalho. Neste sentido, uma das metas do Programa é contribuir para a ampliação do acesso

das mulheres a cargos de direção e gerência nas empresas participantes.

Como resultado, algumas empresas incluíram em seus planejamentos o

aumento do percentual de mulheres em cargos gerenciais e de chefia e implementaram

instrumentos para garantir condições de igualdade no acesso a atividades de capacitação e

treinamento. Outras empresas operaram na revisão das normas internas para ascensão

profissional e salarial, aumentaram o número de mulheres em postos de trabalho antes

exclusivamente masculinos, e/ou alteraram critérios de admissão.

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Conclusão

Apesar de abarcar uma parcela reduzida da População Economicamente

Ativa (PEA) nacional, e direcionar-se ao mercado de trabalho formal - onde há melhores

condições de trabalho e garantias aos/às trabalhadores/as, e o nível de proteção social e

escolaridade são mais elevados -, o Programa representa uma iniciativa de comprometimento

do governo e das empresas com relação à promoção de condições equitativas nas relações de

trabalho, e um reconhecimento social das desigualdades de oportunidades entre homens e

mulheres no mundo do trabalho.

Inserido numa estratégia de ampliação dos espaços de diálogo entre Estado,

empregadores/as e trabalhadores/as, o Programa contribui para colocar o debate das

desigualdades de gênero na esfera pública, enquanto problemática social de interesse e

responsabilidade de todos os atores envolvidos.

A constatação da permanência de significativas desigualdades entre os sexos

no que se refere às oportunidades de acesso, capacitação profissional, discriminações e níveis

de ocupação, revela a importância da aplicação e desenvolvimento de estratégias de

conscientização e ações afirmativas direcionadas à atuação das mulheres no mercado de

trabalho.

O levantamento dos dados evidencia disparidades nos diversos setores e

coloca a necessidade de uma re-articulação de determinadas práticas sociais que perpetuam

uma lógica de hierarquização entre os sexos.

Evidencia-se que o processo de consolidação da presença feminina na esfera

pública e, particularmente, no mercado de trabalho, não foi acompanhado de uma re-divisão

das tarefas relacionadas ao âmbito reprodutivo. Historicamente realizado pelas mulheres, de

maneira gratuita, invisível e desvalorizada, o trabalho reprodutivo – que inclui os afazeres

domésticos e os cuidados com filhos/as e familiares – permanece em grande parte como

responsabilidade feminina.

Este é um elemento estruturante na configuração das desigualdades de

acesso e oportunidades entre os sexos, uma vez que as mulheres continuam as principais

responsáveis pelos custos da reprodução social, acumulando as responsabilidades do trabalho

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assalariado e das tarefas domésticas. Muitas vezes a inserção no mercado de trabalho se dá de

maneira precária, condicionada à conciliação com as responsabilidades familiares.

A dificuldade de conciliação entre o trabalho profissional remunerado e o

trabalho reprodutivo coloca a necessidade de uma re-divisão destas atividades entre homens e

mulheres, e entre sociedade civil e Estado.

Neste sentido, o Programa Pró-Equidade de Gênero é uma das medidas

direcionadas à promoção da igualdade de gênero no mercado de trabalho no Brasil. Os cinco

anos de seu desenvolvimento revelam uma maior responsabilização social do Estado e das

empresas com relação às desigualdades de acesso e oportunidades no mercado de trabalho.

Não obstante, além da articulação a outros programas e políticas públicas, é

necessária uma rearticulação dos papéis sociais de gênero na qual se baseia a atual divisão do

trabalho, estruturante das relações desiguais e assimétricas entre homens e mulheres no

mercado de trabalho e na sociedade atual.

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