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II CONINTER Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades Belo Horizonte, de 8 a 11 de outubro de 2013 DAS MIGRAÇÕES DO CAMPO A FAVELIZAÇÃO METROPOLITANA: PRÁTICAS E CONSTITUIÇÕES RELIGIOSAS NA FAVELA DO MUTIRÃO EM BAYEUX FLORES FILHO, JOSÉ H. (1). 1. UMESP SP. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião. [email protected] RESUMO O texto fala sobre a importância das migrações de indivíduos e famílias pobres que migraram do campo para a região metropolitana de João Pessoa na Paraíba, constituindo com isso comunidades pobres ou aglomerados subnormais. Nesta migração os indivíduos levaram consigo sua cultura e sua religiosidade que se constitui de grande importância para a criação de uma estrutura social coesa na periferia. Em sua grande maioria o cristianismo católico e protestante. Contudo, o número de igrejas protestantes pentecostais aparece em maior número nas favelas. Mas também se encontram as vertentes com caracteres muito singulares da religião afro-brasileira como, por exemplo, a jurema. Assim como também o espiritismo. O texto discute a relação entre migração e a formação das favelas. Discute os conceitos de favela e periferia, bem como sobre a importância da constituição religiosa na coesão de grupos de indivíduos desses aglomerados subnormais. Delimitamos o nosso estudo a comunidade do Mutirão em Bayeux cidade satélite de João Pessoa, por possuir em seu histórico informações relevantes que se assemelham as problemáticas encontradas em toda região metropolitana de João Pessoa. Para a realização do trabalho se fez necessário a pesquisa de campo e o levantamento de dados sobre a população da favela do Mutirão através de bibliografia adequada e atualizada. Palavras-chave: Religiosidade. Migração. Favela.

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II CONINTER – Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades

Belo Horizonte, de 8 a 11 de outubro de 2013

DAS MIGRAÇÕES DO CAMPO A FAVELIZAÇÃO METROPOLITANA: PRÁTICAS E CONSTITUIÇÕES RELIGIOSAS NA FAVELA DO

MUTIRÃO EM BAYEUX

FLORES FILHO, JOSÉ H. (1).

1. UMESP – SP. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião. [email protected]

RESUMO

O texto fala sobre a importância das migrações de indivíduos e famílias pobres que migraram do campo para a região metropolitana de João Pessoa na Paraíba, constituindo com isso comunidades pobres ou aglomerados subnormais. Nesta migração os indivíduos levaram consigo sua cultura e sua religiosidade que se constitui de grande importância para a criação de uma estrutura social coesa na periferia. Em sua grande maioria o cristianismo católico e protestante. Contudo, o número de igrejas protestantes pentecostais aparece em maior número nas favelas. Mas também se encontram as vertentes com caracteres muito singulares da religião afro-brasileira como, por exemplo, a jurema. Assim como também o espiritismo. O texto discute a relação entre migração e a formação das favelas. Discute os conceitos de favela e periferia, bem como sobre a importância da constituição religiosa na coesão de grupos de indivíduos desses aglomerados subnormais. Delimitamos o nosso estudo a comunidade do Mutirão em Bayeux cidade satélite de João Pessoa, por possuir em seu histórico informações relevantes que se assemelham as problemáticas encontradas em toda região metropolitana de João Pessoa. Para a realização do trabalho se fez necessário a pesquisa de campo e o levantamento de dados sobre a população da favela do Mutirão através de bibliografia adequada e atualizada.

Palavras-chave: Religiosidade. Migração. Favela.

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INTRODUÇÃO

A cidade de Nossa Senhora das Neves, atual João Pessoa, foi fundada em 1585. João

Pessoa é a capital da Paraíba e localiza-se no Nordeste do Brasil no lado mais oriental das

Américas. Segundo José Otávio A. Mello (1994, p. 24-25): “Devido à importância estratégica,

a Paraíba fora convertida em capitania real, isto é, diretamente subordinada a coroa, o que

propiciou o emprego de recursos oficiais”. Foi criada a capitania da Paraíba que se tornou

importante na época colonial com a pacificação dos índios Potiguaras. Com isso, se tornou

possível a coroa portuguesa avançar nas terras do Norte e conquistar terras onde hoje é Rio

Grande do Norte, Ceará e Maranhão1. Desde a sua colonização a Paraíba foi palco do trânsito

de várias etnias. A etnia autóctone protagonizado pelos Tupis, os quais se dividiam em dois

grandes grupos, os potiguaras e tabajaras 2 . E etnias alóctones como os europeus

portugueses, franceses, holandeses e também, negros escravizados provindos da África.

Embora pudesse ser considerado como subúrbio da capital, o distrito de Santa Rita

denominado de Barreiras, atual Bayeux, foi criado em 1944. Seu povoamento se teve por

intenso transito dos colonizadores e comerciantes que deixavam o interior e a capital e se

fixavam as margens do caminho deste povoado. Segundo o Dicionário Corográfico do estado

da Paraíba de Coriolano Medeiros (1950, p. 32):

Grande povoamento pertencente ao município de Santa Rita e ao da capital,

ligando-se a esta por uma ponte sobre o rio Sanhauá. Ocupa a península

formada pelos rios, Paraíba ao N, e do Meio, Marés e Sanhauá L e S. O nome

da povoação veio do engenho Barreiros, que ali existiu e na invasão

holandesa pertenceu a Domingos Carreiro.

O nome Bayeux foi uma sugestão do paraibano Assis Chateaubriand em

homenagem a cidade francesa de Bayeux, quando na segunda guerra

mundial foi a primeira cidade a ser ocupada no território Francês pelas forças

aliadas3. Posteriormente, a Bayeux brasileira foi desmembrada do município

de Santa Rita e emancipada em 1959.

1

Fonte: Site do Instituto histórico e Geográfico Paraibano: http://www.ihgp.net/aconquistadaparaiba.htm -

Acessado em 28/10/2012.

2 Fonte: Entre a Cruz e a Jurema: a resistência indígena à evangelização católica no litoral da Paraíba. Luiz

Francisco da Silva Junior – FIP. Texto disponível em:

http://www.anpuhpb.org/anais_xiii_eeph/textos/ST%2006%20-%20Luiz%20Francisco%20da%20Silva%20Junior

%20TC.PDF - Acessado em 28/10/2012.

3 Fonte do IBGE: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/link.php?uf=pb – Acessado em 28/10/2012.

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Nas configurações atuais João Pessoa possui de acordo com os dados do censo

2010 4 uma população de 723.715 mil habitantes, um território de 211,474 km² e uma

densidade demográfica de 3. 421,30 habitantes por km². A cidade de Bayeux é fronteiriça de

João Pessoa em seu lado Oeste, localiza-se entre João Pessoa e Santa Rita. Possui pequeno

território de 31.973 km². Contudo, Bayeux possui uma densidade demográfica bastante

significativa com 3.118, 76 habitantes por km² com uma população de 99.716. Ou seja, sua

densidade demográfica se aproxima da capital João Pessoa. Fato este que nos chamou

atenção.

De acordo com o censo 2010, João Pessoa possui um total de moradores em situação

conhecida como favela e chamadas pelo IBGE de “aglomerados subnormais” 91.351

habitantes. Bayeux possui um total de 7.835 habitantes morando em favelas.

Em referência as religiões, podem ser encontradas, a maioria católica, em segundo as

pentecostais e demais denominações protestantes. E em seguida grupos espíritas e cultos

afro-brasileiros heterogêneos 5 . Em sua maioria a umbanda ou o candomblé com forte

influência sincrética indígena que se torna difícil definir se o culto se caracteriza umbandista

ou candomblecista. Tendo a Jurema um importante papel no culto de características

Umbandistas na Paraíba 6 . Todas essas religiões com uma representatividade bastante

marcante em cada uma das etnias. Algumas religiões mais presentes em um grupo do que em

outros. A migração de pessoas pobres provindas do campo não apenas para a região

periférica da capital, mas em toda a Região Metropolitana de João Pessoa, também contribuiu

para a formação e configuração do atual quadro sociocultural religioso periférico destas

cidades.

João Pessoa é marcada pela presença da mata atlântica em uma expressiva extensão

encontrada no entorno da Universidade Federal da Paraíba chamada mata do buraquinho que

foi transformada no ano de 2000 no jardim botânico Benjamin Maranhão7. Bayeux também

possui uma expressiva presença de mata atlântica chamada mata do Xenxém. E uma

4 Ibidem.

5 Ver “Chica Baiana Passeando em Terra Alheia”: presença da mina

maranhense em terreiros de João Pessoa” deAntônio Giovanni Boaes Gonçalves. Disponível em:

http://www.xiconlab.eventos.dype.com.br/resources/anais/3/1306930076_ARQUIVO_CHICABAIANA.pdf -

Acessado em 06/11/2012.

6 Ver o trabalho de Sandro Guimarães de Salles intitulado: À sombra da Jurema: a tradição dos mestres juremeiros

na Umbanda de Alhandra. Revista ANTHROPOLÓGICAS, ano 8, volume 15(1): 99-122(2004)

7 Fonte: Folha de São Paulo. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/turismo/noticias/ult338u4932.shtml

- Acessado em 06/11/2012.

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expressiva presença de manguezal devido à presença dos rios Paraíba e Sanhauá que

ambos se encontram com o Oceano Atlântico via município de Cabedelo.

O conceito e as alternativas mais usuais do tão estigmatizado, ou não, termo favela

Com o crescimento populacional nas cidades devido às migrações, cresceram em conjunto

problemas de ordem social. Em busca de melhores condições de vida, famílias pobres

migraram para a região da grande João Pessoa. E se instalaram nas periferias desta região,

constituindo em instalações precárias e formação de bolsões de pobreza. Com isso,

problemas de infraestrutura e de ordem socioeducativa são deficiências que ainda

hodiernamente são observados nestes bairros e seus bolsões de pobreza.

Mas para podermos entender melhor a situação das populações de aglomerados subnormais

e sua formação faremos uma espécie de retrospectiva histórica e conceitual de uma situação

tão complexa como é a questão da pobreza e sub-humanidades presentes nas cidades. E que

isso constitui as mazelas da nossa sociedade, não apenas da moderna, diga-se de

passagem, mas um problema tão antigo quanto à origem das cidades. Mas que se reconfigura

com suas peculiaridades e agravantes em cada época, e que atualmente possui

singularidades próprias da modernidade capitalista, que continuam gerando contradições,

paradoxos sociais e egotismo institucional exacerbado.

No século XIX ocorreram dois importantes eventos a nível nacional que foram importantes

para a geração do que entendemos hoje como segregação. A primeira foi a Lei de Terras de

1850, que promoveu à separação dos que tinham condições de acesso a propriedade da

terra, como mercadoria e os não proprietários. E em 1888 a abolição da escravatura.

Uma classificação social dicotômica da condição humana no Brasil daquela época

expressava a importância dos escravos no trabalho mercantil. Tal classificação era entre os

chamados “homens livres” que se dividiam entre pobres em sua grande maioria e ricos, e,

escravos ou cativos, a grande gama de negros presos a ferro e sob açoites importados a força

pelo tráfico humano. Maria Sylvia de C. Franco (1997, p 14) aponta sobre a problemática que

gerou a importação de mão de obra escrava e estrangeira:

[...] uma das mais importantes implicações da escravidão é que o sistema

mercantil se expandiu condicionado a uma fonte externa de suprimento de

trabalho, e isso não por razões de uma perene carência interna (efetiva de

início) de uma população livre que poderia ser virtualmente ser transformada

em mão-de-obra. Essa situação deu origem uma formação sui generis de

homens livres e expropriados, que não foram integrados à produção

mercantil - destituídos de propriedade dos meios de produção, mas não de

sua posse (p. 14).

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O agravamento de uma situação de pobreza social gerada pelo sistema mercantil escravista

desde a sua implantação no Brasil até o seu desfecho com a abolição, os “homens livres”

pobres não eram considerados capazes de exercer funções de mão de obra para o trabalho

mercantil. E viviam marginalizados, sem direitos de cidadão, sem propriedade e sem trabalho

e discriminados. Com o desfecho da lei de terras privadas e a abolição da escravatura a

situação toma um rumo decisivo para a fixação e a conceituação do que entendemos hoje

como segregação social, espacial e racial.

Com estas ocorrências, juntam-se aos “homens livres” pobres grandes levas de ex-escravos,

recém-libertos, que semelhantes aqueles, não tinham qualificação nem educação para o

trabalho mercantil (CARRIL, 2006). A condição social de “homens livres” pobres se

assemelhava aos ex-escravos, que naquele momento engrossava a multidão de miseráveis

sociais. A condição de negação a simples condição de cidadão os faziam expropriados e

espoliados sociais pela elite agrícola daquela época constituída pelos senhores de engenho e

latifundiários. Em ocasião do Congresso Agrícola do Recife em 1878, a situação dos “homens

livres” pobres são apontadas pelo congressista (Congresso Agrícola, 1978: 91):

[...] Esses indivíduos, que não são para desprezar-se, nem adquirem raízes

no solo nem espírito de família e levam uma vida quase nômade, contraindo

hábitos de ociosidade, dissipação, imoralidade e anarquia, que os levam

facilmente ao crime, donde não raro saem impunes, graças à intercessão do

novo senhorio... As coisas têm chegado a tal ponto, que para muitos homens

pobres a única linha divisória entre o livre e o escravo é que este é obrigado a

trabalhar e aquele não.

Pode-se observar nas palavras do congressista uma clara comparação com a situação

precária e sub-humana dos “homens livres” pobres e dos escravos. Onde a única diferença

entre eles estaria na obrigatoriedade do trabalho. Neste interim Lourdes Carril (2006, p.58)

escreve que:

Por sua vez, a abolição não representou a inserção do ex-escravo como

trabalhador assalariado, nem o reproduziu como trabalhador, uma vez que

ele teve de competir em condição desigual com o imigrante para integrar as

novas bases da acumulação do capital. Não havendo lugar na sociedade

para o ex-trabalhador escravo, a reprodução dos seus meios de vida ficou

condicionada às formas de superexploração, e as opções de moradia foram

os cortiços e as favelas, já que não tinha a possibilidade de produzir seus

meios de subsistência, nem sua moradia.

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A questão da propriedade era uma solução para os ricos detentores dos latifúndios e um

grave problema para os pobres e ex-escravos, que a pesar de livres, suas liberdades era

patrocinada pelas misérias criada pela sociedade mercantil. E esta, a misérias era a prisão

dos marginalizados. As moradias dos superexplorados e marginalizados se configuravam em

cortiços e favelas. O eixo paradigmático que representa as favelas é a ausência. Ou seja, a

definição de favela seria na perspectiva daquilo que não teria ou pelo que não seria (SILVA et

al, 2009). Segue abaixo uma definição, ou melhor, uma descrição do que são esses espaços

urbanos tão problemáticos quanto estigmatizados:

[...] é apreendido, em geral, como um espaço destituído de infraestrutura

urbana – sem água, luz, esgoto, coleta de lixo; sem arruamento; globalmente

miserável; sem ordem; sem lei; sem regras; sem moral. Em fim, expressão do

caos. Outro elemento peculiar da representação usual das favelas é sua

homogeneização. Presentes em diferentes sítios gráficos – em planícies, em

morros, às margens de rios e lagoas – e reunindo algumas centenas de

moradores até alguns milhares, possuindo diferentes equipamentos e

mobiliários urbanos, sendo constituídas por casas e/ou apartamentos, com

diferentes níveis de violência e presença do poder público, com variadas

características socioambientais, as favelas constituem-se como territórios

que se exprimem em paisagens consideravelmente diversificadas (SILVA et

al, 2009, p. 16).

Nesse universo de espaços irregulares, outros termos são utilizados como alternativa para

favela. Como comunidade, aglomerados subnormais, loteamentos irregulares e clandestinos -

e nestes, se incluem os cortiços e conjuntos habitacionais “desgovernados” -, assentamentos

precários e terrenos favelizados. Como também, os fenômenos dos prédios invadidos, ou

ocupados, também podem entrar nesse rol quando se refere comumente a favelas. Contudo

Silva et al (2009) admite que favela seja um espaço complexo e marcado por forte

estigmatização. Mas que a diversidade das dinâmicas sociais e das formas, bem como as

econômicas e culturais são importantes características para se definir favela dentro de

parâmetros mais abrangentes que orientem uma definição mais precisa.

No alcance do que já discorremos sobre as problemáticas geradas no espaço urbano,

chegamos a uma situação em que as fronteiras tanto espaciais, socioculturais, raciais e

semânticas se intercruzam, ou se repelem para formar-se uma designação própria para

entendermos do que estamos falando na verdade. Refiro-me as distinções dos termos

subúrbio, periurbano e periferia em estreita relação com o centro da urbe. Tais concepções

tocam em questões sociais históricas e muito atuais como o é a questão da segregação.

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A URBE: O SUBÚRBIO, O PERIURBANO E A PERIFERIA

Neste compósito semântico, de significações urbanas temos o subúrbio, o periurbano e

periferia. A periferia em oposição ao centro é o lugar que fica as margens do centro, o entorno.

Geralmente lugar onde se localizam as populações mais pobres. Alguns estudiosos da

sociologia preferem utilizar um desses termos ao invés de outros. E, ou, contrastá-los. Mas

suas definições são idênticas e em algum ponto se tocam. José de Souza Martins (2008), por

exemplo, prefere o termo subúrbio a periferia. O que ele chama este de “concepção ideológica

de um neopopulismo”; “produto mais de ignorância do que de conhecimento”; “armadilha

ideológica política”.

Para Martins (2008), subúrbio se define como sendo um suavizador das descontinuidades

bruscas da espacialidade, um atenuador de contrastes entre a cidade e a roça, bairro rural e a

fazenda. Um lugar aonde se encontra, ou se encontrava alguns elementos do campo. Um

lugar de nostalgia de um campo que não é campo, mas o faz lembrar. Já o periurbano se

localizaria para além dos subúrbios de uma determinada cidade. Neste espaço as atividades

rurais e urbanas se misturam. Seus limites ficam imprecisos; seu povoamento é disperso; a

atividade agrícola é instável e a atividade industrial e de serviços pode-se se implantar8 (essa

descrição se assemelha com o que José de Souza Martins (2008) identifica como subúrbio).

A periferia seria uma vitória da renda da terra sobre a urbe. O termo periferia para Martins

(2008) seria uma ocupação antiurbana de um solo urbano; a designação de espaços pela

urbanização patológica. Destarte, os termos subúrbio e periferia são postos,

supracitadamente, como dicotômicas e contrários. Algo que gravita mais no plano semântico

de suas significações supostamente originais da cidade, do que no plano sociogeográfico e

histórico do desenvolvimento da urbe. Que leva em consideração toda uma problemática

social de classes, elites, pobreza, segregação social, espacial e racial desta relação humana

de trabalho, moradia, vida e bem estar e organização espacial urbanística da cidade. Ou seja,

é muito mais complexo que uma definição e divisão espacial.

Centro e periferia não se restringiram apenas a conceitos de espacialidade geográfica. Ou

seja, periferia como o entorno do centro, da cidade. Mas uma designação de relatividade com

a pobreza construída historicamente, que empurravam os indivíduos pobres para as margens

do centro ou regiões afastadas dos centros de poder e da elite, como era afirmada pela

sociologia urbana (TORRES et al, 2003). Nessa linha de pensamento sociológico se via um

espaço urbano homocêntrico, que partia do centro a periferia (ROLNICK, 1997). Contudo, os

8 In Infopédia. Porto Editora. Porto. 2003-2008. Disponível em http://www.infopedia.pt/$%c3%a1rea%20

periurbana. Consultado em 2008-03-12.

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novos empreendimentos veio a por em xeque tal conceito, devido aos grandes

empreendimento de habitação de luxo e infraestrutura a se estabelecer nas periferias das

cidades. Em muitas vezes tendo como forte impulso o refúgio ao adensamento populacional e

a violência dos grandes centros.

Bem, com as bases conceituais fundamentadas partimos agora para o nosso estudo da

periferia da Grande João Pessoa, mas propriamente a comunidade do Mutirão em Bayeux.

As migrações como fator importante para a configuração das periferias da região

metropolitana de João Pessoa

A atual configuração da região metropolitana de João Pessoa criada pela Lei Complementar

Estadual n° 90/2009, de 23 de setembro de 2009 abarcam doze cidades: João Pessoa,

Bayeux, Cabedelo, Lucena, Santa Rita, Pedras de Fogo, Cruz do Espírito Santo, Rio Tinto,

Conde, Alhandra, Caaporã, Pitimbu9.

Figura: 1 – Mapa da Paraíba, em destaque a região metropolitana de João Pessoa

Mapa da Paraíba adaptado pelo autor. Em destaque a Região metropolitana de João Pessoa com seus

doze municípios. Fonte: www.mapasparacolorir.via12.com

9 http://www.cbtu.gov.br/planos/acoeseprogramas/planosdeacao/planodeacao2012_joaopessoa.pdf

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Figura 2 – Mapa de Bayeux

Fonte: Google maps

O interior do estado da Paraíba se configurava nas décadas de 1970 a 1980 em uma

população em sua maioria pobre, analfabeta e sem propriedade. Grande parte dos pobres

viviam em moradias das fazendas em que trabalhavam, ou eram posseiros. Tais famílias em

sua maioria, muitas delas com numerosos filhos, sobreviviam daquilo que plantavam através

de arrendamento da terra em fazendas em troca de sua força de trabalho. Os filhos ainda

pequenos se constituíam em força de trabalho ainda criança, para ajudar na subsistência da

família.

Nessa configuração social do homem pobre do campo na Paraíba nas décadas supracitadas,

o acesso à escola era difícil, na verdade era escassa. E quando tinha era de até a primeira

fase do ensino fundamental – na época chamava-se primário, cujo ano era de primeira a

quarta série. A escola era tida, na mentalidade dos pobres, como um capricho dos ricos, um

artigo de luxo. Não se tinha tempo para a escola, porque trabalhar para por comida na mesa

era prioridade para as famílias pobres. Com isso, a educação limitada e escassa, precária, a

vida dura no campo com o sistema de trabalho arrendatário e como se chama na região “o

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trabalho alugado10” e muito mal pago fazia com que famílias inteiras não vissem perspectivas

de vida futuras para sua família. É quando entram em cena as migrações.

As cidades eram enxergadas como o “Summus bonus” da vida pelos camponeses pobres,

ainda perfigurado como matuto, figura curiosa e estranha, sem modos da “Civita urbe”, mas

com as maneiras e perspicácia da fortaleza e a valentia do campo, do mato. Não era para se

estranhar essa visão porque a cidade oferecia comodidade, melhor acesso ao trabalho, à

saúde, a escola e a Igreja com sacerdotes, pois padres e pastores era coisa muito rara nos

rincões dos sertões. E que a religiosidade era algo marcadamente característico de tal povo.

Na verdade era o que norteava suas vidas e que se fez presente na constituição de suas vidas

nessa jornada migratória e de adaptação na cidade, periferia e favelas.

Na João Pessoa do Século XIX o centro era dos ricos, dos abastados. Os migrantes que

recorriam às cidades e construíam suas barracadas de palha e taipas nas proximidades do

centro da cidade se depararam com incursões de leis que inibiam, coibiam e até destruíam

construções tidas como insalubres para o padrão de higiene da cidade. Foi o caso da “lei de

posturas” editado em 1830 pela câmara municipal. Era uma espécie de conjunto de normas e

regulamentações modernizantes. Que dizia, por exemplo:

O movimento que incita todas as cidades a submeter-se às exigências da

higiene moderna, sob pressão enérgica da opinião pública, é irresistível. [...]

A morada pode ser comparada a um organismo vivo, si as leis que regem a

natureza que nos envolve e que vive de ar, de luz, e d’água são respeitadas.

As casas insalubres, as casas de taipas, as cobertas de folhagens,

receptáculo de insetos e outros, sacrificam esses elementos11

.

Tidas como focos de doenças e insalubridades, as habitações precárias dos pobres eram

coibidas dentro do raio de cobertura modernizantes da cidade. Ou seja, o centro da cidade.

Tendo eles como única opção as margens e periferias da cidade, e isso inclui o litoral praiano

lugar habitado por caiçaras, que na época não era muito apreciado, como hoje o é pelos ricos

e turistas. E nisso os pobres constituídos de operários, prostitutas, cabeceiros, estivadores,

10

Trabalho pago pelo dia de trabalho ao trabalhador rural pelos donos de terras e fazendeiros em plantações. Na

época, nos anos 1970 e 1980 as plantações de Sisal (Agave) e abacaxi, mandioca eram as mais expressivas no

estado. Tendo o agave sido responsável pela implantação de grandes fábricas de cordas e derivados do produto

em Bayeux como: a BRASCORDA, SISAL, FIBRASA Tais fábricas tiveram sua parcela de contribuição

povoamento da cidade. Mas que entraram em decadência nos anos 1990 com a desvalorização do Sisal para

exportação.

11 Saneamento da Capital: Estudos e Opiniões. Almanach Administrativo Histórico e Commércial do Estado da

Parahyba para 1911. Coleção Paraibana: Biblioteca Central UFPB.

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arrumadores e mendigos eram vistos como uma ameaça à transmissão de doenças, a ordem

e a moral e que por isso sofrem um processo de espoliação e segregação urbana

(NASCIMENTO, 2012). Isso no século XIX. Segundo Ana C. A. Nascimento (2012) os pobres

que tiveram suas casas demolidas passaram a viver uma nova realidade, submetidos ao

controle do estado e as intervenções higiênicas encontravam na periferia lugar apropriado

para erigira seus casebres.

Segundo Doralice S. Maia (1994, p. 132) “Tem-se então, em João Pessoa, uma

representação da urbanização brasileira, onde a partir da década de 1970 a população passa

a residir predominantemente nas cidades, elevando o número de favelas, decorrente

principalmente de uma expulsão do campo”. Na década de 1970 à abertura de grandes

avenidas que dão acesso as áreas distantes do centro, juntamente com a construção de

grandes conjuntos habitacionais começa a população pobre a se deslocar para as áreas de

favela e periferias. E no final desta mesma década (1970), a FIPLAN (Sistema Integrado de

Planejamento, Contabilidade e Finanças) contabilizava 16 favelas em João Pessoa

(NASCIMENTO, 2012).

Nos anos 1980, já configurado a dicotomia entre centro e periferias da Região Metropolitana

de João Pessoa e todas as suas problemáticas sócio espaciais, foi no governo do então

governador do estado da Paraíba Wilson Braga (1983-1986) que, segundo Nascimento

(2012) o problema da favelização se agravou ainda mais. Neste governo, foi criada a

Fundação de Ação Social do Trabalho, que tinha como objetivo ações no plano habitacional,

para suprir as necessidades habitacionais das populações sempre crescentes de migrantes

na Região metropolitana, em especial.

O problema é que esse empreendimento do governo foi realizado sem os devidos cuidados e

planejamentos adequados, ou foram negligenciados, pois os materiais utilizados de má

qualidade, áreas muito afastadas dos grandes centros, bem como a falta de infraestrutura

nestes locais como água, luz e muito menos saneamento básico, criava na realidade uma

“favelização metropolitana”. Essas obras eram construídas em um sistema comunitário

mútuo, um mutirão. E foi por este nome que foi batizado esta ação habitacional do governo na

época.

“Todo Povo no grande mutirão” assim dizia o slogan da canção que propagandeava no rádio e

na televisão o governo e sua ação habitacional. O governo fornecia o terreno, os materiais de

construção, a comida durante o dia de trabalho (almoço) e os futuros moradores forneciam a

força de mão de obra, construindo suas próprias casas. E foi por este nome que o bairro

nomeado de Mário Andreazza, foi “batizado” popularmente como “favela do mutirão”. Nome

este que perdura até hoje na população.

Posteriormente foi construído outro loteamento a leste do Mutirão, o “Comercial Norte”. Este

espaço foi posto a venda e dividido em quatro loteamentos o Planalto I, Planalto II, Sonho

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verde e Panorâmico. Posteriormente surgiram como projeto do governo do estado os

conjuntos Mariz e Niná Caitano, e também o conjunto dos vigilantes (FARIAS, 2009). Este por

ter sido comercializado, possui um pouco de organização, mas com problemas idênticos a do

Mutirão, como o de capital humano e também de infraestrutura. Destarte, tanto o Mutirão

Quanto o Comercial Norte estão no mesmo cabedal problemático.

Figura 3 - Mapa do ZEIS (Zona especiais de Interesse Social)

A figura 3 mostra o

código de Zonas

Especiais de Bayeux

criada pela Lei

Complementar nº 02

de 27 de março de

2007. Nelas são

demarcadas cinco áreas: Dom Manoel, Jesus de Nazaré, Herbert de Souza e uma área sem

denominação. Contudo, segundo Farias (2009) existem mais três áreas de aglomerados subnormais

que não aparecem na ZEIS, comunidade Nova Esperança, Aratú e Comunidade Unida.

O MUTIRÃO EM BAYEUX E A RELIGIOSIDADE DO POVO COMO

IMPORTANTE FATOR NA SUA CONSTITUIÇÃO DA FAVELA DO

MUTIRÃO. O PAPEL DAS CEBS

Francisco Vieira de Assis (Chicão) 77 anos. Migrou de Pombal, no sertão paraibano no início

da década de 1980. Lá trabalhava na agricultura. Plantava pra comer, o que segundo ele “até

pra isso era difícil”. A história de sua vida é apenas uma entre muitas histórias de famílias

inteiras que migraram do campo a região metropolitana de João Pessoa. E conta muito da

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história compartilhada por muitas famílias migrantes do campo, que fugiram da seca do sertão

Paraibano, das precariedades do campo e se estabelecerão no Mutirão. Segundo ele:

O motivo de eu sair de lá é falta de inverno. Muita seca. Agente trabalhava

muito, no final não tinha resultado quase nada. Agente sofria muito. Eu tinha a

quarta série. A dificuldade de educação era grande. Tinha 38 anos; já

constituído família; tinha sete filhos. Na época não tinha casa pra morar, vivia

nas terras dos outros. Fui jogado porque não quis obedecer algumas regras

do patrão. Depois deixei a família desamparada morando em lugar que não

era apropriado e fui procurar trabalho na construção, primeiro como servente

de pedreiro em Sousa mais ou menos em setenta e oito/setenta e nove. O

oficio de pedreiro eu aprendi fazendo; olhando; não fiz curso, não fiz coisa

nenhuma. É como aprender violão, eu aprendi a tocar violão vendo os outros

tocar... Fui pra Bahia trabalhar, não deu certo. Voltei e fui pra João Pessoa e

comecei a trabalhar nas construções.

Naquela época quando veio às pessoas do interior “praqui”, imigração;

chamo de imigração né, aquela seca; mais ou menos em oitenta e um, oitenta

dois... Eu mesmo vim em oitenta e três. E fui trabalhar em construção no José

Américo (bairro de João Pessoa). Foi quando esse povão veio e não tinha

casa pra morar e o ganho era muito pouco não dava pra pagar aluguel e a

maioria ia se virando morando debaixo de ponte... Foi quando houve um

movimento grande pedindo casa pra morar. Tinha muito a participação da

Igreja. Foi no tempo de Dom José Maria Pires (Arcebispo da Paraíba na

época). No tempo das CEBS, foi nesse tempo que aconteceu isso. O Clóvis

Bezerra (o então governador do estado) já tinha doado o terreno (aonde é

hoje o bairro do Mutirão em Bayeux) e entrou o governo de Wilson Braga e

fez um projeto, mutirão. E era mutirão mesmo. Por exemplo, pra você ganhar

uma casa você tinha que trabalhar 780 horas. Quem fiscalizava era a

FUNSAT (Fundação Social do Trabalho).

Toda quinta – feira agente se reunia, tinha uma missa por mês, agente

planejava tanto a missa como as celebrações; todo domingo agente fazia

uma celebração em frente das casas, e planejava a luta pela água, pela luz...,

tudo em fim. Não tinha médico, não tinha posto médico, não tinha nada. [...]

As CEBS eram nós, pessoas, era o seguinte, através das irmãs (Freiras), foi

formando uma comunidade, chegava a umas sessenta pessoas mais ou

menos e escolhido os representantes, eu era o animador oficial, tinham

outros animadores. [...] Quando era pra fazer um movimento nós se juntava,

pedia dinheiro ao sindicato, a Igreja. [...] Ninguém sabia que tinha direito a

coisa nenhuma. E as CEBS berrava, não tinha medo, ia pras ruas, fazia

manifestação (Informação verbal).

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A religião católica, que no caso na época nas periferias se configuravam nas CEBS e se

baseava na teologia da libertação, tendo as lutas sociais muito presentes em suas práticas, foi

muito importante no processo de desenvolvimento do conjunto habitacional favelizado.

Favelizado porque além das famílias pobres, vivendo em casas precárias de material barato,

o lugar era totalmente carente de infraestrutura. Mas assim como seu Chicão, muitas famílias

provindas do interior do estado, fugiram das dificuldades da seca, da escassez e miséria e

colocaram o pé na estrada rumo a capital ou uma das cidades da região metropolitana de

João Pessoa. As migrações iniciaram seu crescimento vertiginoso na década de 1970

mantendo o ritmo de crescimento nas décadas de 1980 e 1990. Quando começou a perder o

ritmo, como podemos observar no gráfico sobre a evolução da densidade demográfica da

cidade de Bayeux:

Figura 4 - Gráfico do crescimento populacional de Bayeux

Fonte: Gráfico elaborado a partir dos dados do Censo do IBGE.

Na observação do gráfico o crescimento populacional em Bayeux, galopando em torno do

dobro percentual, em média, teve como maior responsável às migrações. E como

consequência disso, maior periferização ou favelização da região metropolitana de João

Pessoa. O Mutirão em Bayeux é apenas um dos casos. De acordo com o SIAB (Sistema de

Informação de Atenção Básica) O mutirão contava em 2008 com 11.166 moradores com

3.982 domicílios pesquisados. Nessa conjuntura de alta densidade demográfica crescente o

Mutirão surgiu com graves carências de capital humano e de investimentos neste setor, e

também de infra estrutura e equipamentos urbanos como escolas, posto de saúde, creche

entre outros. E que com isso o papel da religião foi relevante para manter coesa seus

moradores e enfrentar as duras lutas pela sobrevivência no cotidiano. O reflexo disso pode

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refletir na grande quantidade de templos e centros religiosos encontrados atualmente no

Mutirão.

A CONSTITUIÇÃO RELIGIOSA DA FAVELA DO MUTIRÃO EM

BAYEUX

Fruto de toda essa disposição religiosa da população do Mutirão é notável o número de igrejas

e templos religiosos. Mesmo com toda a luta social de protestos e reinvindicações

impulsionada pela Igreja Católica através das CEBs no Mutirão, a primeira igreja a ser

construída foi a Igreja Assembleia de Deus. Logo em seguida foi construída a Paróquia de

São João Batista aos fundos da Igreja Assembleia de Deus. Depois foram surgindo outras

igrejas tanto católicas quanto protestantes, sendo que as protestantes são a de maior número

e o seguimento de maior responsabilidade pelo aumento deste número são as pentecostais.

No Comercial Norte conta-se um número de 25 igrejas protestantes, cinco igrejas católicas,

um centro espírita, quatro terreiros de tradição afro-brasileira 12 . O número de igrejas

protestantes é a mais numerosa, tendo a Assembleia de Deus, uma pentecostal, em maior

número do seguimento.

Já no Mutirão propriamente dito os números de centros religiosos ainda é de maior número,

pode-se explicar por ser este o primeiro assentamento populacional. Segue abaixo a discrição

destes centros religiosos e as respectivas ruas em que se encontram:

Igreja congregação Assembleia de Deus (R. Benjamin Maranhão); Igreja Batista do Sétimo

Dia (R. Paulo Afonso); Igreja Batista (R. Rua Larga); Igreja Batista Filadélfia (Av. Genival

Guedes); Igreja Batista Canaã (Av. Genival Guedes); Igreja Deus é Amor (Av. Genival

Guedes); Igreja Universal do Reino de Deus (Av. Genival Guedes); Igreja Mundial do Poder de

Deus (Av. Genival Guedes); Igreja Assembleia de Deus Ministério de Madureira (Av. Genival

Guedes); Igreja Assembleia de Deus (Av. Genival Guedes); Assembleia de Deus Arca de Noé

deus Proverá (R,. Dos Anjos); Assembleia de Deus (Vila Comunitária); Centro de Umbanda

(R. Joaquim Constâncio); Centro de Umbanda (Ayrton sena); Igreja Católica (R. São Vicente

de Paula); Igreja Pentecostal das Mulheres Guerreiras; (R. Bom Jesus); Igreja Adventista do

Sétimo dia (R. São Francisco); Comunidade Evangélica Cristã – Missão Internacional (R.

Lorival Caetano); Igreja Assembleia de Deus – O decreto (R. Maria Auxiliadora); Igreja

Católica São João Batista (R. Antônio Gomes); Igreja Católica (R. Do Leprosário).

Conclusão

12 Dados obtidos a partir da “Cartilha Social do Comercial Norte” elaborada pelo Serviço Pastoral do Migrante do

Nordeste (SPM NE).

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É notável como a religião se constitui importante para a população pobre da favela do Mutirão

em Bayeux. Isso deste o assentamento até os dias atuais. Podem-se verificar pelo grande

número de centros religiosos, se sobressaindo às igrejas protestantes com maior número. Só

em uma única avenida, a Genival Guedes existem sete igrejas protestantes e duas delas são

da Assembleia de Deus. Sendo esta denominação pentecostal em maior quantidade com seis

unidades. Pode-se concluir que a disposição religiosa dos moradores pobres da favela do

Mutirão em Bayeux é bastante expressiva desde a sua fundação. E os ajudam a dar um

sentido para suas vidas e cotidiano na favela. Nesta, os centros comunitários estão

impregnados de religiosidade e todas as lutas sociais por moradia e melhoria na favela,

surgiram a partir do centro comunitário em parceria com as igrejas tanto católicas como

protestantes. As CEBs atualmente extintas, tiveram sua grande parcela de contribuição

através de mobilizações populares em reinvindicações em busca de melhorias e infraestrutura

para a comunidade. Pode-se perceber atualmente que o papel do sentido da religião na vida

de seus moradores pobres está em sua maioria, sob domínio das igrejas protestantes. Sendo

as pentecostais as de maior influencia e número.

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