danise vivian - a educaÇÃo de jovens e adultos e a economia solidÁria

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  • A EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS E A ECONOMIA SOLIDRIA Danise Vivian - UFRGS [email protected] Resumo: A investigao das possveis relaes entre dois eixos temticos: educao de jovens e adultos (EJA) e economia solidria o que direciona o meu trabalho de Dissertao de Mestrado em Educao, na tentativa de refletir sobre o papel da EJA na formao para a gerao de trabalho e renda. Este artigo, portanto, explora um recorte desta pesquisa descrevendo a sua constituio e a ateno para as questes da crescente produo do desemprego e das prticas pedaggicas da EJA que podem estar fundamentando um novo vnculo entre a educao e o trabalho numa perspectiva mais conscientizadora e humana. Palavras-chave: educao de jovens e adultos; economia solidria; desemprego.

    INTRODUO

    Este artigo aborda algumas questes que tenho investigado em minha Dissertao de

    Mestrado em Educao com a tentativa de refletir sobre as possveis aproximaes entre dois

    eixos investigativos: a educao de jovens e adultos e a economia solidria. Para situar o

    leitor, descreverei, brevemente, o estudo que venho investigando. O trabalho busca

    compreender o papel da educao de jovens e adultos na formao em economia solidria,

    uma formao para uma alternativa de gerao de trabalho e renda. A investigao, em

    andamento, procura analisar as prticas pedaggicas que evidenciam um novo vnculo entre a

    educao e o trabalho, de forma a promover uma educao mais humana e comprometida com

    uma prtica emancipatria e com um projeto democrtico de sociedade. Neste sentido, a

    pesquisa aborda tambm a questo do desemprego estrutural que tem levado setores populares

    a resistir e a desenvolver formas alternativas de gerao de trabalho e renda.

    A investigao tem se desenvolvido atravs de observaes e entrevistas semi-

    estruturadas em uma escola municipal de educao de jovens e adultos de uma cidade

    integrante da regio metropolitana de Porto Alegre que incorpora no currculo a gerao de

    trabalho e renda. O estudo desta experincia em questo merece ateno pela possibilidade de

    construo de um novo vnculo entre a educao e o trabalho, de conceber o trabalho como

    princpio educativo capaz de resgatar a dignidade do sujeito e a educao de jovens e adultos

    como possibilidade de conexo destes dois eixos. Uma situao que pode estar ao mesmo

    tempo contribuindo para a diminuio do desemprego e da desvalorizao do trabalhador e

    criando possibilidade de construir as relaes sociais pautadas no respeito, igualdade,

    solidariedade e democratizao. Bases estas que caminham no sentido de desenvolver um

    projeto popular, uma sociedade diferente. Uma vinculao que parece ultrapassar os limites

  • tericos da EJA como modalidade escolar que contempla uma dvida social com os sujeitos

    que no tiveram acesso educao na idade prpria, apresentando um caminho que se articula

    na tentativa da incluso social, econmica e cultural.

    Especificamente, neste artigo, desenvolvo uma breve anlise dos eixos investigativos

    que orientam esse estudo em andamento e fao um exerccio de reflexo sobre a aproximao

    entre a EJA e a economia solidria.

    A CRESCENTE PRODUO DO DESEMPREGO

    O atual contexto do capitalismo tem originado uma grande produo do desemprego.

    So muitos sujeitos fora do mercado formal de trabalho assalariado, que no conseguem

    vender a sua fora de trabalho. Esse fato decorrente de um sistema de produo que se

    configura pela busca incessante do lucro, em uma sociedade que se define pelo poder do

    dinheiro. Sistema este que declarou homens e mulheres como figuras fundamentais para a

    transformao de matrias em mercadorias, explorando a funo do trabalho de forma

    alienante e desvinculada do processo educacional de pensar, para no correr o risco de se

    transgredir a ordem do determinismo neoliberal, pois a sociedade deve se sujeitar s

    exigncias do mercado sem questionar os seus mtodos (MSZROS, 2005).

    Nesse cenrio, estes sujeitos, portanto, tornaram-se figuras centrais e perifricas do

    mesmo sistema: ao mesmo tempo em que so fundamentais para o desenvolvimento e

    manuteno desse, so tambm explorados e deixados de lado quanto ao seu reconhecimento.

    O processo de reestruturao produtiva, observado a partir de meados da dcada de 80,

    tem apontado efeitos na reconfigurao tecnolgica e organizacional dos processos

    produtivos. Esses fatos acabam comprometendo os vnculos de emprego/trabalho e

    acentuando a lgica destrutiva na relao entre homem e natureza. Alguns pontos podem ser

    apresentados para ratificar as modificaes no sistema de produo capitalista que vem

    fragmentando e reduzindo a classe trabalhadora como: incorporao da cincia e inovao

    tecnolgica nos processos produtivos, produo global e flexvel, nova forma organizacional

    toyotismo, qualidade total, globalizao do capital financeiro...

    A partir de todas essas mudanas, o que se percebe que o desemprego aumenta de

    volume e diversifica a sua forma, alm de atingir desigualmente os indivduos segundo as

    suas caractersticas de sexo, escolarizao, idade, raa... O desemprego, logo, alm de

    involuntrio passa a ser fortemente seletivo. O mercado de trabalho atual assume novos

    traos. Por exemplo, a conquista de um novo emprego no revela uma situao de

  • comodidade, porque desaparece a idia de sada definitiva da condio de desemprego. Ou

    seja, j no h mais a garantia de futura promoo e estabilidade dentro dos cargos ocupados

    (GUIMARES, 2002).

    O vnculo empregatcio, ento, encontra-se fragilizado. Conforme Guimares (2002),

    o aparecimento desta nova categoria - desempregados de longa durao - revela uma ruptura

    do nexo entre emprego e desemprego. O fato de se estar desempregado j no mais

    simplesmente a contradio da atividade remunerada. Tiriba (2004) ratifica que as estatsticas

    no consideram como desempregados aqueles sujeitos que no esto procura de emprego,

    ou que trabalham informalmente. Por isso, afirma que h de se questionar estas estatsticas

    sobre a questo do emprego e desemprego, pois elas [...] ao totalizar a realidade humano-social desconsideram a complexidade das relaes econmicas, ofuscando outros mundos nos quais a fora de trabalho no se configura como uma mercadoria. Sinalizamos que a economia global no se resume economia capitalista e que, tampouco a economia popular se configura como refgio dos desempregados (TIRIBA, 2004, p. 76).

    O fato que a questo do desemprego estrutural e muitos sujeitos encontram-se fora

    do mercado de trabalho, definidos como perdedores. Segundo Singer

    A concentrao do capital tem como contrapartida a formao de uma classe cada vez mais numerosa de perdedores, qual seja, de pessoas que no tem meio prprio de produo e que se sustentam vendendo sua capacidade de trabalho aos capitalistas (ou ao Estado). Os capitalistas dependem dos trabalhadores assalariados para que seus capitais produtivos sejam acionados e assim valorizados, assim como os assalariados dependem dos capitalistas (e do Estado) para ser empregados e poder ganhar o sustento prprio e de seus dependentes (SINGER, 2005, p. 14).

    No capitalismo, se no se dono dos meios de produo necessrio vender a sua

    fora de trabalho para conseguir sobreviver. Justamente esta a caracterstica deste sistema: a

    concentrao dos meios de produo em poucas mos, a livre competio e o esforo dos

    trabalhadores para um mesmo fim, o de potencializar os lucros dos donos das empresas

    (SINGER, 2005). Alia-se a esta situao a questo do desemprego estrutural; e a gerao de

    trabalho e renda como alternativa de superao deste cenrio.

    A ECONOMIA SOLIDRIA COMO ALTERNATIVA

    Para Singer (2005), a Economia Solidria apresenta-se como alternativa capaz de

    superar o capitalismo (mas que no necessariamente representa essa inteno) e retomar a

  • questo do trabalho como prtica inerente do ser humano e no como tarefa alienante. Desse

    modo, a Economia Solidria uma alternativa precarizao do emprego ou a excluso deste

    no quadro que se configura a partir da reestruturao capitalista, principalmente, pelo fato da

    insero da robtica e da computao nos meios de produo (RIBEIRO, 2002). Ainda, De

    um lado coloca-se como uma via para a superao das relaes sociais de produo

    capitalista; de outro, mantm-se presa destas relaes pela necessidade de relacionar-se com o

    mercado, no qual vende e compra seus produtos (RIBEIRO, 2002, p. 93).

    A Economia Solidria um termo que engloba diversas perspectivas que se

    aproximam em uma inteno comum: a alternativa de desenvolvimento sustentvel.

    Conforme Tiriba (1998, p. 189), muitas denominaes so utilizadas para representar

    diferentes experincias econmicas populares, como: Economia popular, economia solidria,

    economia de solidariedade e trabalho, associativa, informal, subterrnea, invisvel,

    submersa..., mas todas refletindo iniciativas de base comunitria, popular. Iniciativas que se

    traduzem como atividades e programas de gerao de trabalho e renda e como possibilidade

    de superar a excluso econmica e social.

    Para Tiriba (1998), a questo da criao coletiva e individual de estratgias para se

    organizar contra as injustias sociais no um fato novo. Mas o que realmente novo o

    contexto generalizado de perda da centralidade do trabalho assalariado nas relaes entre o

    capital e trabalho. A Economia Solidria nesse contexto, no s uma possibilidade de gerar

    emprego e renda, como tambm representa uma oportunidade de desenvolvimento de uma

    prtica pedaggica formadora de uma sociedade mais justa e solidria.

    A sua definio como meio de produo capaz de superar o capitalismo, apresentando-

    se sob a forma de cooperativas, associaes, grupos de produo, centros comunitrios...,

    provm de alguns princpios que orientam o desenvolvimento de seu trabalho. Uma das bases

    tericas mais importantes a compreenso de que os trabalhadores tm prioridades sobre os

    lucros e, a partir desta lgica, de que as relaes sociais so pautadas pelo respeito,

    coletividade, solidariedade e democracia. Todos devem colaborar uns com os outros, pois: O

    bom desempenho e o bem estar de cada um influem no resultado dos objetivos e na renda de

    todos (CAMP, p. 09). No h discriminao por sexo, raa, religio... e, nesta forma de

    produo, todos os que dela participam tm igual poder de deciso sobre os rumos do

    trabalho. H uma propriedade coletiva dos meios sociais de produo. Desse modo, os lucros

    que so reconhecidos como sobras destinam-se a todos sendo esse fator a negao da [...]

    possibilidade de haver uma classe que viva apenas de rendimentos de seu capital, sem tomar

    parte do trabalho (SINGER, 2005, p. 14).

  • A cooperao como marca significativa da Economia Solidria, indica que todos os

    trabalhadores so responsveis por tudo na empresa, participando tanto das sobras quanto dos

    prejuzos. Essa situao demonstra-se contrria apresentada nas relaes sociais trabalhistas

    capitalistas, nas quais os trabalhadores se limitam a cumprir apenas as tarefas especficas

    delimitadas e so excludos da maior parte do montante de lucros da empresa, mas nem

    sempre dos seus prejuzos.

    Essa cooperao compreende que todos os seus envolvidos tm a mesma importncia

    e, que mesmo executando tarefas diferentes dentro do empreendimento solidrio, conhecem

    os seus processos e trabalham em torno de um objetivo comum e em busca dos mesmos

    resultados. Como no h patro e nem empregados, diz-se que se desenvolve a autogesto,

    pois todos os envolvidos com a Economia Solidria possuem os mesmos direitos e [...] todos

    so donos dos equipamentos e das ferramentas que utilizam em seu trabalho (CAMP, p. 10).

    Como descreve Andrioli (2001), o cooperativismo origina-se a partir de uma

    necessidade comum entre as pessoas na tentativa de superao conjunta de problemas

    relacionados economia. Andrioli esclarece que

    Na disputa de foras na sociedade, a cooperativa representa os interesses de seus associados. Entretanto, quando os interesses dos associados extrapolam a satisfao de necessidades imediatas e preconizam uma amplitude cada vez maior de reivindicaes no sentido de romper com a lgica da desigualdade e da concentrao da riqueza produzida, a cooperativa pode transformar-se numa fora poltica aliada a uma classe social (ANDRIOLI, 2001, p. 32).

    Nesse caso percebe-se um carter educativo na cooperao, porque necessrio ter

    clareza dos pontos que se busca superar nesta forma de organizao e, o fato de tomar

    conscincia da situao e buscar a sua resoluo inscreve-se como um processo educativo,

    uma ao social que gera conhecimento e sociabilidade. O cooperativismo e a educao so

    decorrentes da prtica social, da cultura humana, de necessidades humanas, [...] por isso, o

    cooperativismo pode oferecer elementos importantes para a educao, se considerarmos a

    cooperao como a base da sociabilidade (ANDRIOLI, 2001, p. 36). E, de forma dialgica, a

    educao pode contribuir muito para este processo quando valoriza relaes sociais mais

    humanas e compreende que a vida, os saberes populares, a cidade, podem tornar-se escolas do

    trabalho. E exatamente a que surge a possibilidade de aliar estes conhecimentos do mundo

    do trabalho e da vida com o processo educacional, neste caso, com a modalidade de educao

    de jovens e adultos.

  • EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS (EJA)

    A Educao de Jovens e Adultos que, a partir da Lei 9.394/96, se regulariza e supera o

    antigo ensino supletivo de proposio de um currculo escolar aligeirado e homogneo,

    configura-se sob a tica de um projeto educacional mais amplo (MOLL, 2004) e inovador,

    porque passa a se constituir como modalidade especfica de Educao Bsica que atende

    aqueles que tiveram negada a experincia educacional na infncia ou adolescncia pelos mais

    diversos fatores. As prticas pedaggicas desenvolvidas na EJA, em sua maioria, tambm

    sofrem modificao e passam a poder envolver ainda mais a experincia do educando como

    ponto de partida para o desenvolvimento do ensino formalizado.

    Como comenta Freire (2006, p. 15): O conceito de Educao de Adultos vai se

    movendo na direo do de Educao Popular na medida em que a realidade comea a fazer

    algumas exigncias sensibilidade e competncia cientfica dos educadores e das

    educadoras. Percebe-se que os contedos trabalhados com a populao atendida na EJA

    precisam ter relao com seu cotidiano, pois o processo educativo desenvolve-se entre

    sujeitos com diferentes trajetrias, histrias e experincias de vida. Logo,

    A prtica educativa, reconhecendo-se como prtica poltica, se recusa a deixar-se aprisonar na estreiteza burocrtica de procedimentos escolarizantes. Lidando com o processo de conhecer, a prtica educativa to interessada em possibilitar o ensino de contedos s pessoas quanto em sua conscientizao (FREIRE, 2006, p. 16).

    Partindo dessa compreenso, muitas escolas de jovens e adultos intensificam um

    planejamento voltado s experincias de vida dos estudantes, apostando em uma educao

    solidria, coletiva e transformadora, que respeita os tempos de aprendizagem de cada aluno.

    Estas aes sinalizam um avano no que diz respeito ao reconhecimento da educao

    como meio de transformao pessoal e social e de entender o educando como algum que est

    em constante busca.

    Sobressai-se nestas experincias pedaggicas a importncia do resgate das memrias e

    trajetrias dos alunos, pois como afirmam Di Pierro, Jia e Ribeiro (2000, p. 1): A educao

    de jovens e adultos um campo de prticas e reflexo que inevitavelmente transborda os

    limites da escolarizao em sentido estrito. Ter um espao que valoriza a caminhada do

    indivduo significa muito o processo de aprendizagem, alm de possibilitar ao aluno

    compreender-se como sujeito de sua prpria histria. Poder dizer quem se e dividir o que se

  • sabe traz novo significado ao trabalho desenvolvido em sala de aula, e um interesse maior em

    aprender os chamados conhecimentos formais.

    A educao de jovens e adultos reitera essa necessidade de partir do conhecimento que

    seu aluno traz da vida, pois ele possui uma caminhada, uma experincia que no pode ser

    renegada pela escola, mas a partir dela, discutida. Como comenta Moll

    [...] a educao popular [...] ganha corpo num debate que dessacraliza os saberes ditos acadmicos, buscando ressignific-los luz dos saberes da vida cotidiana. Saberes de homens e mulheres que, margem dos saberes formais, organizam e vivem a vida ensinando os seus filhos e netos, enfrentando as adversidades, produzindo culturas e afirmando identidades carregadas de tradio e criao (MOLL, 2004, p. 6).

    A experincia analisada neste estudo de Mestrado de uma escola de educao de

    jovens e adultos da rede municipal de uma cidade da regio metropolitana de Porto Alegre,

    que integrou em seu currculo a gerao de trabalho e renda, tem possibilitado a observao

    desta concepo ampliada de educao. Uma educao que extrapola os muros da escola

    como nica instituio social capaz de ensinar. Uma escola de EJA que reaviva a palavra e a

    experincia pregressa do educando como ponto de partida das aulas. exatamente nesta

    experincia ampliada de educao que tenho atentado na relao ou aproximao entre os dois

    eixos centrais de investigao do meu estudo: a EJA e a economia solidria.

    UMA REFLEXO SOBRE AS POSSVEIS APROXIMAES ENTRE A EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS E A ECONOMIA SOLIDRIA

    Como observado, o cenrio do desemprego estrutural tem excludo muitos sujeitos da

    economia capitalista mundial. Ao mesmo tempo em que isso acontece, essa situao tem

    levado os setores populares a resistir e a desenvolver formas alternativas de gerao de

    trabalho e renda para garantir a estes sujeitos desempregados sustentabilidade e

    sobrevivncia. Ou seja, os setores populares tm constitudo iniciativas econmicas como

    resposta a este cenrio. Origina-se e refora-se a a possibilidade de construo de um novo

    vnculo entre a educao e o trabalho, pois certamente, podemos traar e conceber outra

    perspectiva para o trabalho pedaggico na EJA e na educao em geral que no represente

    uma relao direta entre a conexo da educao decorrente de um novo trabalhador, formado

    a partir das mudanas do mundo do trabalho capitalista.

    A crise do emprego nos leva, portanto, a refletir sobre a existncia de outros mundos

    do trabalho que no somente o assalariado. Do mesmo modo que outros processos de

  • produo existem que no somente o modo capitalista. O trabalho cooperativo, inserido na

    chamada Economia Solidria, vincula-se noo do coletivo, da solidariedade, da autogesto,

    porque, teoricamente, gerido com a participao igualitria de todos os membros, que detm

    o mesmo poder decisrio e igualdade na apropriao dos resultados do trabalho. Como

    observado, esse movimento pode revelar-se em uma ao caracterizada como contra-corrente,

    como contraditria s relaes sociais evidenciadas na sociedade, como oposio

    cooperao subordinada, e est de acordo com as bases pedaggicas construdas a partir de

    uma educao popular e emancipatria.

    Nesse sentido, uma educao que valoriza a palavra do educando e os seus saberes de

    vida e do trabalho como fundamentais no processo de formao integral e trabalha com o

    esprito de solidariedade e cooperao contribui para o que Tiriba (2004) ressaltou: a

    possibilidade de se superar o vnculo da formao do trabalhador somente para o mercado

    globalizado, assalariado, excludente e altamente competitivo. E mais, so prticas que [...]

    expressam um fazer pedaggico comprometido com a crtica concepo utilitarista da

    educao como fator de produo (TIRIBA; PICANO, 2004, p. 27). Isso contribui

    tambm para romper com a lgica de que nascemos para vender a nossa fora de trabalho

    assalariada, como se est fosse a nica forma de trabalho existente.

    Ao reduzir a categoria Trabalho a trabalho Assalariado, ao reduzir o conjunto de trabalhadores condio de empregados e desempregados, os economistas circunscrevem a produo social da vida s regras das relaes capitalistas de produo, sugerindo que o trabalho , necessariamente, uma mercadoria que deve ser posta a venda no mercado (TIRIBA, 2004, p. 80).

    Uma educao progressista em EJA, que valorize o humano em sua pluralidade, nos

    seus saberes de vida e preocupao com o coletivo do qual este educando faz parte aponta

    para um trabalho configurado sob a tica da emancipao, da compreenso da educao como

    ato permanente, dialgico, e da valorizao do sujeito como ser social. Estas bases

    contemplam uma opo, um entendimento de que a educao pode estar a servio de um

    outro mundo possvel, assim como esta uma luta da economia solidria.

    Logo, esta educao voltada para a formao integral do sujeito, que valoriza a palavra

    dos educandos e o trabalho solidrio, aponta para a perspectiva de dialogar com a hiptese de

    que [...] todo o ato educativo tem uma intencionalidade poltica que vai alm do aprendizado

    de aspectos pontuais e tem como horizonte uma opo poltica por um prottipo de ser

    humano (ARROYO, 1999, p. 29).

  • Quando se pensa nestas aes progressistas que embasam o desenvolvimento

    educacional na EJA percebe-se que muitas delas se guiam por aquilo que Oliveira (2003)

    descreve como fundamental: a escola como espao, por excelncia, da aprendizagem da

    cidadania e no somente do que est legitimado como saber pela classe dominante. A inteno

    de auxiliar na constituio da cidadania, do trabalho coletivo, da transformao da realidade,

    da conscientizao, demonstra o direcionamento ideolgico e poltico desta forma de ensino.

    Portanto, a aproximao entre os eixos investigativos: educao de jovens e adultos e

    uma alternativa de gerao de trabalho e renda reflete-se como possvel e capaz de construir

    novas bases para a educao. Essa aproximao um caminho para a transformao, ou seja,

    uma nova possibilidade de se formar uma relao entre a educao e o trabalho,

    fundamentando a economia e as relaes sociais como trajeto possvel para a construo do

    conhecimento e a superao do trabalho como mercadoria precarizada. E essa relao se

    traduz como um movimento que colabora na formao humana do sujeito, pois uma educao

    que procura desenvolver a autonomia intelectual, moral e social uma educao

    comprometida com uma prtica emancipatria e com um projeto democrtico de sociedade.

    REFERNCIAS

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