damásio evangelista de jesus - prescrição penal - 17º edição - ano 2008

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DAMÁSIO E. DE JESUS Editora Saraiva

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D A M Á S I O E. DE J E S U S

EditoraSaraiva

' ~ s- rj J "í D A M Á S I O E. DE J E S U S

1 7 9 e d i ç ã o

Tema dos mais apaixonantes é o da prescrição penal. O homem comum, quando simplesmente não o ignora, fica perplexo ao tomar conhecimento de suo existência; a vítima do delito sente-se humi­lhada e ofendida pelo que julga ser uma forma de desídia e incompetência da auto­ridade pública; os juristas tanto a defendem como a atacam.

Cesare Beccaria advertia quan­to às repercussões do crime — cometido, provado e não punido — sobre a cons­ciência social, opinando que "quando se trata desses crimes atrozes, cuja memória subsiste por muito tempo entre os homens (...) não deve haver nenhuma prescrição em favor do criminoso que se subtrai ao castigo mediante a fuga".

O professor Damásio E. de Jesus, posicionando-se segundo o prisma réc- nico-jurídico do instituto, lapidarmente o define como "o perda do poder-dever de punir do Estado pelo não-exercício da pretensão punitiva ou da pretensão exe- curóría durante certo tempo". Daí a estru­turação do livro com base nos conceitos fundamentais de punibilidade, prescrição, prescrição de pretensão punitiva e prescri­ção da pretensão execuróría. Essa com­pleição lógica da obra, ademais, avança por todo o âmbito positivo do instituto, cuidando o ilustre autor da prescrição na legislação especial e do delicadíssimo e atual problema da prescrição retroativa, cujos parâmetros de compreensão e de aplicação vêm, pela vez primeira, deli­neados de modo exato na bibliografia

P r e s c r i ç ã o P e n a l

J.M.MVIMUIA JUKIDICA j;H)A.

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OBRAS DO AUTOR

Código de Processo Penal anotado, Saraiva.

Código Penal anotado, Saraiva.

Crimes de corrupção ativa e tráfico de influência nas transações comerciais internacionais, Saraiva.

Crimes de porte de arma de fogo e assemelhados-, anotações à parte crimi­nal da Lei n. 9.437, de 20 de fevereiro de 1997, Saraiva.

Crimes de trânsito, Saraiva.

Decisões anotadas do Supremo Tribunal Federal em matéria criminal, Saraiva.

Direito penal, 1s volume, Saraiva.

Direito penal, 2S volume, Saraiva.

Direito penal, 3a volume, Saraiva.

Direito penal, 4- volume, Saraiva.

Imputação objetiva, Saraiva.

Lei Antitóxicos anotada, Saraiva.

Lei das Contravenções Penais anotada, Saraiva.

Lei dos Juizados Especiais Criminais anotada, Saraiva.

Novas questões criminais, Saraiva.

Novíssimas questões criminais, Saraiva.

O novo sistema penal, Saraiva.

Penas alternativas, Saraiva.

Prescrição penal, Saraiva.

Questões criminais, Saraiva.

Temas de direito criminal, 1S série, Saraiva.

Temas de direito criminal, 2- série, Saraiva.

Temas de direito criminal, 3- série, Saraiva.

Teoria do domínio do fato no concurso de pessoas, Saraiva.

Tráfico internacional de mulheres e crianças — Brasil, Saraiva.

D A M Á S I O E. DE JESUS

P r e s c r iç ã o P enal

1 7a ed ição

2008

Editora\^J|P Saraiva

ISBN 978-85-02-06242-9

D ados In te rn a c io n a is de C a ta lo gaçã o na P ub licação (C IP) (C âm ara B ras ile ira do L ivro , SP, B rasil)

Jesus, D am ásio E. deP rescriçã o penal / D am ásio E. de Jesus. — 17.

ed. — S ão P aulo : S ara iva , 2008.

1. P rescriçã o penal 2. P rescriçã o pena l - B ras il I. T ítu lo .

07 -0170 C D U -343.291

índ ice pa ra ca tá logo s is tem á tico :

1. P rescriçã o : D ire ito penal 343.291

Data de fechamento da edição: 30-10-2007.

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ABREVIATURAS

AC rim — Apelação CriminalAB­ Agravo em ExecuçãoA I— Agravo de Instrumento

APMP — Associação Paulista do Ministério PúblicoAPn — Ação PenalAR — Agravo Regimental

ARAI — Agravo Regimental no Agravo de InstrumentoCE — Código EleitoralCF — Constituição FederalCP — Código Penal

CPM — Código Penal MilitarCPP — Código de Processo PenalDJU — Diário da Justiça da União

EDEDREsp — Embargos de Declaração nos Embargos de Divergência em Recurso Especial

EI — Embargos InfringentesHC — Habeas CorpusInq. — Inquérito

7577 — Jurisprudência do Superior Tribunal de Jus­tiça

JTACrimSP — Julgados do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo

JTJ — Jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo

v

LCP — Lei das Contravenções Penais m. v. — maioria de votos

RCrim — Recurso Criminal RDPen — Revista de Direito Penal

RECrim — Recurso Extraordinário Criminal REsp— Recurso Especial

R F — Revista Forense RG — Registro Geral

RHC — Recurso de Habeas Corpus RJDTACrimSP— Revista de Julgados e Doutrina do Tribunal

de Alçada Criminal de São Paulo RJTJSP— Revista de Jurisprudência do Tribunal de

Justiça de São Paulo RSTJ — Revista do Superior Tribunal de Justiça

RT — Revista dos Tribunais RTJ — Revista Trimestral de Jurisprudência

RvCrim — Revisão CriminalSTF — Supremo Tribunal Federal STJ — Superior Tribunal de Justiça

TACrimSP — Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo TAMG — Tribunal de Alçada de Minas Gerais

TFR — Tribunal Federal de Recursos TJSP — Tribunal de Justiça de São Paulo TRF — Tribunal Regional Federal

v. un. — votação unânime

VI

ÍNDICE GERAL

Abreviaturas....................................................................... V

CAPÍTULO I

DA PUNIBILIDADE

1. O PODER PUNITIVO DO ESTADO..................... 12. PUNIBILIDADE, PRETENSÃO PUNITIVA E

PRETENSÃO EXECUTÓRIA................................ 23. CONDIÇÕES OBJETIVAS DE PUNIBILIDADE. 54. CAUSAS EXTINTIVAS DA PUNIBILIDADE.... 7

a) Elenco.................................................................... 7b) Classificação......................................................... 8c) Momento de ocorrência........................................ 9d) Efeitos.................................................................... 10

CAPÍTULO II

DA PRESCRIÇÃO

1. CONCEITO............................................................... 172. NATUREZA JURÍDICA.......................................... 173. FUNDAMENTOS..................................................... 184. PRESCRIÇÃO CIVIL E PENAL............................ 20

VII

5. PRESCRIÇÃO, DECADÊNCIA E PEREMPÇÃO 216. ESPÉCIES.................................................................. 217. PRESCRIÇÃO, CRIME E CULPABILIDADE..... 22

CAPÍTULO III

DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA

1. CONCEITO............................................................... 232. IMPRESCRITIBILIDADE...................................... 253. EFEITOS.................................................................... 26

a) Extinção da punibilidade................................... 26b) Certidão dos livros do Juízo e folha de antece­

dentes .................................................................... 264. OPORTUNIDADE DE DECLARAÇÃO................ 275. EXAME DO M ÉRITO............................................. 276. PRAZOS E FORMA DE CONTAGEM................. 297. CONTAGEM DO ANO PRESCRICIONAL.......... 328. PERÍODOS PRESCRICIONAIS............................. 349. PRESCRIÇÃO SUPERVENIENTE À SENTEN­

ÇA CONDENATÓRIA............................................. 3910. DESCLASSIFICAÇÃO............................................ 4811. TERMOS INICIAIS................................................. 5012. CAUSAS DE AUMENTO E DE DIMINUIÇÃO

DA PENA................................................................... 5413. AGRAVANTES E ATENUANTES......................... 5614. CONCURSO DE CRIMES E DE NORMAS......... 5615. CRIMES COMPLEXOS E CONEXOS................. 6016. CRIMES ACESSÓRIOS........................................... 62

VIII

17. IMUNIDADE PARLAMENTAR PROCESSUAL. 6318. SANÇÃO COMPLEXA........................................... 6319. MULTA...................................................................... 6420. IDADE DO AGENTE (MENORIDADE RELA­

TIVA E MAIORIDADE SENIL)............................. 6521. CAUSAS SUSPENSIVAS....................................... 68

a) Conceito............................................................... 68

b) Questões prejudiciais.......................................... 69c) Cumprimento de pena no estrangeiro............... 70d) Imunidade parlamentar processual penal......... 70e) Suspensão condicional do processo .................. 71f) Suspensão do processo ....................................... 72

22. CAUSAS INTERRUPTIVAS .................................. 76a) Conceito............................................................... 76b) Recebimento da denúncia ou queixa ................. 77c) Pronúncia e sua confirmação............................. 80d) Sentença condenatória recorrível..................... 82

23. “SURSIS” ................................................................... 87

CAPÍTULO IV

DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA

1. CONCEITO............................................................... 882. IMPRESCRITIBILIDADE...................................... 893. PRAZOS E FORMA DE CONTAGEM................. 894. MEDIDA DE SEGURANÇA.................................. 915. REINCIDÊNCIA...................................................... 94

IX

6. EFEITOS.................................................................... 967. CONCURSO DE CRIMES...................................... 978. MULTA...................................................................... 1009. IDADE DO CONDENADO.................................... 101

10. TERMOS INICIAIS................................................. 10211. SUSPENSÃO............................................................. 10512. CAUSAS INTERRUPTIVAS .................................. 106

CAPÍTULO V

DA PRESCRIÇÃO NA LEGISLAÇÃO ESPECIAL

1. ABUSO DE AUTORIDADE................................... 1112. CRIMES CONTRA A SEGURANÇA NACIONAL 1123. CONTRAVENÇÕES................................................ 1124. CRIMES CONTRA A ECONOMIA POPULAR... 1135. CRIMES ELEITORAIS............................................ 1146. CRIMES FALIMENTARES.................................... 1147. CRIMES DE IMPRENSA....................................... 1178. CRIMES MILITARES.............................................. 1189. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLES­

C EN TE...................................................................... 119

CAPÍTULO VI

DA PRESCRIÇÃO RETROATIVA

1. ORIGEM DO INSTITUTO. A SÚMULA 146 DO STF.............................................................................. 120

X

2. O ANTEPROJETO DE CP. O CP DE 1969. A LEIN. 6.016/73................................................................. 124

3. A REFORMA PENAL DE 1977 (LEI N. 6.416/77) 126

4. A REFORMA PENAL DE 1984 ............................. 127

5. NATUREZA JURÍDICA.......................................... 127

6. CONFLITO INTERTEMPORAL DE LEIS ........... 128

7. COMO SE CONTA O PRAZO PRESCRICIONAL 131

8. FIXAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL.......... 135a) Causas de aumento e de diminuição de pena,

agravantes e atenuantes..................................... 135b) Menoridade relativa............................................ 135c) Reincidência........................................................ 136d) M ulta .................................................................... 137

9. PRESSUPOSTOS DE APLICAÇÃO E APELA­ÇÃO DO R É U ........................................................... 137a) Exigência de uma decisão condenatória de pri­

meiro ou segundo grau ....................................... 137b) Quando é aplicado o perdão judicial................ 138c) Necessidade de que a sentença condenatória te­

nha transitado em julgado para a acusação ouque tenha sido improvido seu recurso............... 139

d) Não-exigência de recurso do réu....................... 139e) Desnecessidade de que o réu tenha sido intima­

do da sentença condenatória.............................. 140

10. TERMOS INICIAIS E FINAIS................................ 141a) Pode ser considerado o prazo prescricional re­

troativo entre a data da consumação do crime

XI

e a do recebimento da denúncia ou entre esta e a da publicação da sentença condenatória .... 141

b) Não pode ser considerado o prazo prescricio-nal retroativo entre a data do recebimento da denúncia e a do acórdão confirmatório da sen­tença condenatória ou que reduziu a pena....... 142

c) Condenado o réu em segunda instância, o prazodeve ser considerado entre a data do fato e a do recebimento da denúncia ou entre a desta e a da publicação, na sessão de julgamento, do acórdão condenatório........................................ 143

d) Nos processos da competência do Júri pode serconsiderado o prazo entre a data do fato e a do recebimento da denúncia ou entre esta e a pro­núncia ou entre esta e a sua confirmação pelo Tribunal ou entre a pronúncia ou sua confirma­ção e a data em que éproferida a sentença con­denatória na sessão de julgamento................... 143

11. OPORTUNIDADE DE DECLARAÇÃO............... 144a) No regime do § 2° do art. 110 do CP a prescri­

ção retroativa não pode ser declarada em pri­meira instância.................................................... 144

b) Impossibilidade de ser declarada a prescriçãoretroativa antes da sentença condenatória (a denominada “prescrição antecipada ” ou “por perspectiva ”) ....................................................... 145

c) Impossibilidade de ser reconhecida a prescrição retroativa na própria sentença condenatória.... 146

d) Apreciação do mérito.......................................... 146e) Pena reduzida em segunda instância................. 147

XII

f) Reconhecimento de ofício................................... 147g) Reconhecimento em embargos de declaração... 148h) Aplicação em embargos infringentes................ 148í) Condenação em segunda instância................... 148

j) Aplicação em revisão criminal........................... 148

/) Aplicação em “habeas corpus” ........................ 149

m) Aplicação em agravo em execução................... 149

n) Processos da competência originária dos Tri­bunais ................................................................... 149

12. CONCURSO DE CRIMES...................................... 150a) Concurso material............................................... 150

b) Concurso formal e crime continuado................ 150

13. EFEITOS.................................................................... 152

a) Extinção da pretensão punitiva .......................... 152

b) Medidas de segurança......................................... 153c) Efeitos secundários da sentença condenatória 154

1. Introdução.................................................... 1542. Custas............................................................ 154

3. Lançamento do nome do réu no rol dos cul­pados e folha de antecedentes.................... 154

4. Reincidência................................................. 155

5. “Sursis” ......................................................... 155

6. Livramento condicional.............................. 155

7. Prisão preventiva......................................... 156

8. Fiança............................................................ 1569. Reparação do dano...................................... 156

XIII

10. Confisco....................................................... 15711. Restituição de coisas apreendidas.............. 15712. Seqüestro...................................................... 15713. Outros efeitos............................................... 158

d) Extensão ao co-réu.............................................. 159e) Revisão criminal.................................................. 159

14. CAUSAS INTERRUPTIVAS.................................. 159a) O prazo prescricional retroativo se interrompe

na data da publicação da sentença condenatória 160b) Momento da publicação da sentença condena­

tória ...................................................................... 160c) Prazo anterior à data do recebimento da denún­

cia ......................................................................... 161d) Aditamento da denúncia..................................... 161e) Hipótese de sentença absolutória com recurso

da acusação.......................................................... 162j) Sentença condenatória anulada........................ 162g) Comunicabilidade............................................... 162

15. RECURSO DA ACUSAÇÃO.................................. 163a) Introdução............................................................ 163b) Somente impede a prescrição retroativa o recur­

so da acusação que visa à agravação da pena privativa de liberdade.......................................... 164

c) Recurso do assistente da acusação................... 165d) Recurso do querelante......................................... 165e) Recurso da acusação que na petição somente

indica a pretensão de impedir a prescrição re­troativa ................................................................. 166

XIV

f) Fragilidade das razões do recurso da acusação 166g) Aplicação de multa .............................................. 167h) Agravação da m ulta ............................................ 167i) Cassação do “sursis”......................................... 167j) Desclassificação.................................................. 167l) Medida de segurança........................................... 168

m) Pena restritiva de direitos................................... 168n) Aumento da pena em face do concurso formal 168o) Aumento da pena em face da continuação......... 169p) Recurso da acusação que restringe na petição

a agravação da pena de modo a não alterar oprazo prescricional.............................................. 169

q) Recurso da acusação contra a concessão doperdão judicial..................................................... 170

r) “Reformatio inpejus”........................................ 170s) Qualidade da p en a .............................................. 172t) Reconhecimento do concurso material............. 172u) Prazo da prescrição da pretensão punitiva já

decorrido.............................................................. 17316. LEGISLAÇÃO ESPECIAL..................................... 173

a) Abuso de autoridade............................................ 173b) Crimes falimentares............................................ 174c) Crimes de imprensa............................................. 174

17. IMPRESCRITIBILIDADE...................................... 175

XV

Capítulo I DA PUNIBILIDADE

1. O PODER PUNITIVO DO ESTADO

A norma penal incriminadora cria para o Estado, seu úni­co titular, o direito de punir abstrato. Passa a ter o direito de exigir que os cidadãos não cometam o fato nela descrito. De sua parte, estes têm a obrigação de não realizar a infração pe­nal determinada. Assim, tratando-se, por exemplo, de crime de furto, a norma agendi contida no art. 155 do CP delimita o âmbito de atividade humana, proibindo a prática do fato tipi­camente descrito, sob efeito de sujeição às sanções penais cominadas no preceito secundário. E o Estado tem o direito de exigir que ninguém subtraia, para si ou para outrem, coisa alheia móvel.

Cometida a infração penal, o direito de punir, que era abstrato, passa a ser concreto. Antes o Estado tinha o direito de exigir a abstenção da prática criminosa. Realizado o fato delituoso, a relação entre o Estado e o delinqüente, que antes era de simples obediência penal, consubstanciada no preceito primário da lei incriminadora, tem seu suporte legal no pre­ceito secundário, que comina a sanção, denominando-se rela­ção jurídico-punitiva. Esse jus puniendi concreto, verdadeiro

1

poder-dever de punir, e não simples faculdade de punir, esta­belece uma relação real, de natureza jurídico-penal, entre o Estado e o sujeito ativo do crime. De um lado, determina-se ao sujeito o dever de submeter-se à sanção penal, evitando obstaculizar os meios de sua aplicação; de outro, deve o Esta­do exercer seu poder de punir, impondo a sanção penal res­pectiva e realizando sua execução.

Transitando em julgado a sentença condenatória, o po­der-dever de punir do Estado adquire a feição de ju s executionis. Tem ele o dever, e por isso possui poderes, de exe­cutar a sanção imposta pelo Juiz na sentença.

O jus punitionis concreto e o jus executionis, entretanto, não podem ser exercidos diretamente pelo Estado-Administra­ção. Não cabe ao Poder Executivo, por intermédio de coação direta, aplicar a sanção penal e executá-la. Eles são realizados por intermédio da jurisdição. A sanção penal não pode ser aplicada sem processo; nem executada. Como ensina José Frederico Marques, “o direito de punir é um direito de coação indireta, pelo que a sanctio juris da norma penal só se aplica mediante o processo”1. E, como o jus executionis é um pro­longamento do direito de punir concreto, a efetiva execução da sanção penal também depende de ordem judicial determi­nada por autoridade competente.

2. PUNIBILIDADE, PRETENSÃO PUNITIVA E PRETENSÃO EXECUTÓRIA

Com a prática do delito, como vimos, surge a relação ju- rídico-punitiva, de natureza concreta (direito de punir con-

1. Tratado de direito penal, São Paulo, Saraiva, 1956, v. 1, p. 120.

ereto), estabelecida entre o Estado e o delinqüente, que se de­nomina punibilidade. Ela é, na lição de Antolisei, a possibili­dade jurídica de imposição da sanção penal2. Não faz parte do crime. Este é um fato típico e antijurídico. Nem a culpabilida­de é seu elemento ou característica, funcionando como pres­suposto de aplicação da sanção penal, elo entre o delito e o delinqüente a quem se reconheceu o juízo de censurabilidade.

A punibilidade é conseqüência jurídica da prática do de­lito. Por tratar-se de efeito jurídico e não de elemento ou re­quisito do crime, sua ausência, salvo as exceções da anistia e da abolitio criminis, não apaga a infração penal. E o sistema de nosso CP. Assim, quando retrata as causas de exclusão da antijuridicidade, como a legítima defesa, por exemplo, empre­ga a expressão “não há crime” (art. 23). Prova de que a ilicitude configura uma característica ou requisito do delito. Quando disciplina as causas de exclusão da culpabilidade, como a inimputabilidade por doença mental, por exemplo, usa a ex­pressão “é isento de pena” (CP, art. 26, caput), demonstrando que a culpabilidade constitui condição de imposição da pena na sentença. No art. 107, entretanto, não diz o CP que não há crime ou que o agente está isento de pena, mas que se extin­gue a punibilidade. Circunstância a indicar que o conceito de punibilidade é mais amplo que o de pena.

Cometido o delito e nascendo a punibilidade, surge o tema da pretensão punitiva. Pretensão, na lição de Carnelutti, é a exigência de subordinação de um interesse alheio ao inte­resse próprio3. Pretensão punitiva é a exigência de que o po- der-dever de punir do Estado subordine o direito de liberdade

2. Manual de derecho penal, trad. Juan dei Rosai e Ángel Torio, Buenos Aires, UTEHA, 1960, p. 531, n. 235.

3. lstituzioni dei nuovo processo civile italiano, 1951, v. 1, p. 7.

3

do cidadão4. Se a pretensão punitiva do Estado é a exigência de punição, e se a punibilidade, que é a possibilidade jurídica de imposição da sanção penal, surge do direito concreto de punir, confundem-se os conceitos de punibilidade e de preten­são punitiva5.

Tendo em vista que o poder-dever de punir não admite coação direta, a pretensão punitiva deve ser deduzida em Juízo mediante processo regular. E, transitando em julgado a sen­tença condenatória, o poder-dever do Estado, agora já no sen­tido de jus executionis, ainda se manifesta pela pretensão pu­nitiva. Quer dizer que se fala em pretensão punitiva desde o momento da prática do crime até o instante do cumprimento total da sanção penal, salvo causa extintiva intercorrente. Como o jus executionis nada mais é que um prolongamento do jus punitionis concreto, a pretensão punitiva, surgida com a prática do delito, aparece com a punibilidade e subsiste en­quanto ela sobrevive. Daí dizer-se que também na fase da exe­cução da sanção penal se trata de exercício da pretensão puni­tiva. Com maior rigor técnico, entretanto, cremos que com a prática do crime surge a pretensão punitiva; transitando em julgado a sentença condenatória, a pretensão executória.

Praticada a infração penal, surge para o Estado o direito de deduzir em Juízo a pretensão punitiva. E o faz por inter­médio da acusação, promovida pelo próprio Estado-Adminis­tração ou pelo particular, podendo valer-se do inquérito poli­cial, peça informativa da ação penal. Tem ele o direito de in­vocar o Estado-Judiciário no sentido de aplicar o direito pe­nal objetivo a um fato considerado típico e antijurídico, co­

4. José Frederico Marques, Tratado, cit., v. 3, p. 322, n. 1.5. José Frederico Marques, Tratado, cit., v. 3, p. 322, n. 1.

4

metido por um sujeito culpável. Adquire o poder-dever de pro­cessar o delinqüente e, considerada procedente a pretensão punitiva, de impor a sanção penal previamente cominada.

Transitando em julgado a sentença condenatória, surge a pretensão executória, pelo que o Estado adquire o direito de executar a sanção imposta pelo Poder Judiciário.

Demonstração gráfica:

C

--------------------PP

C = crimeTJSC = trânsito em julgado da sentença condenatória EPE = extinção da pretensão executória pelo cumprimento da

pena ou por outra causa qualquer PP = pretensão punitiva PE = pretensão executória

A pretensão punitiva (PP) surge na data do crime (C) e pode ser exercida até o dia anterior ao trânsito em julgado da sentença condenatória (TJSC). A pretensão executória (PE) nasce com o trânsito em julgado da sentença condenatória (TJSC) e se extingue pela incidência de alguma eventual cau­sa (EPE = extinção da pretensão executória), como o cumpri­mento da pena, a prescrição, a anistia etc. (CP, art. 107).

3. CONDIÇÕES OBJETIVAS DE PUNIBILIDADE

A possibilidade jurídica da aplicação da sanção penal

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TJSC EPE

PE

pode estar subordinada a eventuais causas extrínsecas ao fato delituoso. São as chamadas condições objetivas de punibili­dade. Quando incidentes, excluem até a mera possibilidade jurídica de o sujeito vir a ser perseguido criminalmente. Rece­bem a qualificação de objetivas porque se situam fora do fato cometido pelo sujeito. E sendo o dolo, segundo a moderna conceituação, elemento do tipo, essas condições, como é lógi­co, também se encontram fora do elemento subjetivo do delito.

No CP, são condições objetivas de punibilidade, no tema da aplicação de nossa lei penal a delito cometido no estran­geiro, os requisitos de “ser o fato punível também no país em que foi praticado” (art. 7e, § 22, b) e “estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição” (c). Nas duas hipóteses, as circunstâncias de o fato cometido pelo brasileiro, que entre nós é típico, ser atípico ou não no estrangeiro, e ser daqueles em relação aos quais é autorizada a extradição, situam-se fora do crime realizado e não são abrangidas pelo dolo. Como explica Antolisei, são aconteci­mentos totalmente independentes da atividade do culpado e não guardam com ela nenhum nexo de causalidade6.

Assim, em determinados casos não basta, para que surja a punibilidade, que o sujeito culpado cometa um fato típico e antijurídico. Muitas vezes o direito de punir concreto só pode ser exercido pelo Estado quando presentes certas condições. Elas se interpõem entre o preceito primário, que prevê a regra de proibição, e o preceito secundário, que comina a sanção, de modo que a imposição desta subordina sua possibilidade à presença daquelas.

Distinguem-se, quanto ao efeito de sua ausência, as con­dições de procedibilidade das condições objetivas de punibili-

6. Manual, cit., p. 533, n. 236.

dade. Exemplo daquelas é a requisição do Ministro da Justiça, funcionando como requisito da persecução penal em determi­nados casos (CP, arts. 7Q, § 3S, b, e 145, parágrafo único). Se o Juiz, quando da sentença, percebe ausente uma condição de procedibilidade, deve anular a ação penal. Suponha-se que verifique, na hipótese do art. 145, parágrafo único, do CP, que a ação penal foi iniciada sem a requisição ministerial. Fica impedida a apreciação da procedência da pretensão punitiva, devendo anular a ação penal. Suponha-se que, em outro exem­plo, perceba o Juiz que o fato cometido pelo réu brasileiro no estrangeiro, típico perante nossa legislação, é atípico no país alienígena. Está faltando uma condição para a existência da punibilidade. E se esta inexiste, deve ser julgada improcedente a pretensão punitiva, absolvendo-se o acusado.

4. CAUSAS EXTINTIVAS DA PUNIBILIDADE

a) Elenco

Assim como existem causas que excluem a tipicidade, a antijuridicidade e a culpabilidade, há as que extinguem a puni­bilidade. Estão previstas no art. 107 do CP. São elas:

I — a morte do agente;II — a anistia;III — a graça;IV — o indulto;V — a abolitio criminis\VI — a prescrição;VII — a decadência;VIII — a perempção;IX — a renúncia do direito de queixa e de representação;

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X — o perdão do ofendido;XI — a retratação;XII — o perdão judicial.0 rol de causas extintivas da punibilidade do art. 107 do

CP não é taxativo, mas meramente exemplificativo. Citam-se os casos dos arts. 82 (extinção da pena suspensa quando do término do período de prova do sursis), 90 (extinção da pena suspensa ao término de vigência do livramento condicional) e 236, parágrafo único, do CP (morte do ofendido no delito de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento ma­trimonial), dentre outros.

b) Classificação

As causas que extinguem a punibilidade podem consti­tuir fatos ou atos jurídicos. Daí sua classificação em:

Io) causas extintivas da punibilidade que advêm de fatos jurídicos',

2o) causas extintivas da punibilidade que advêm de atos jurídicos.

Quando a causa provém de um fato humano ou natural, fala-se em fato jurídico', quando provém de um comportamen­to humano tendente à extinção da punibilidade, cuida-se de ato jurídico.

Constituem fatos jurídicos extintivos da punibilidade:1 — a morte do agente;II — a morte do sujeito passivo no delito de induzi­

mento a erro essencial e ocultação de impedimento (CP, art. 236, parágrafo único);

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III — a prescrição;IV — a decadência;V — a perempção; eVI — a abolitio criminis.

São atos jurídicos extintivos da punibilidade:I — a retratação do agente;II — a anistia;III — a graça;IV — o indulto;V — a renúncia;VI — o perdão do ofendido; eVII — o perdão judicial7.

c) Momento de ocorrência

As causas que extinguem a punibilidade podem ocorrer antes ou depois do trânsito em julgado da sentença condena­tória. Assim:

Ia) morte do agente: pode ocorrer antes ou depois da sentença condenatória irrecorrível;

2a) anistia: antes da sentença final (anistia própria) ou após transitar em julgado a sentença condenatória (anistia im­própria);

3a) graça: depois do trânsito em julgado da sentença condenatória;

7. José Frederico Marques, Tratado, cit., v. 3, p. 401, n. 2.

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4a) indulto: depois do trânsito em julgado da sentença condenatória8;

5 a) lei nova extintiva da incriminação (abolitio criminis): antes ou depois do trânsito em julgado da sentença conde­natória;

6a) prescrição: antes de transitar em julgado a sentença final ou depois de tornar-se irrecorrível a condenação;

7a) decadência: antes de iniciada a ação penal privada ou pública condicionada à representação (decadência do direito de queixa ou de representação);

8a) perempção: durante a ação penal exclusivamente pri­vada;

9a) renúncia do direito de queixa: antes de iniciada a ação penal exclusivamente privada;

10a) perdão do ofendido: depois de iniciada a ação pe­nal exclusivamente privada até o trânsito em julgado da sen­tença condenatória;

11a) perdão judicial: por ocasião da sentença condenató­ria;

12a) retratação do agente: até a sentença final.

d) Efeitos

O momento de incidência da causa extintiva da puni­bilidade, advenha de ato ou fato jurídico, tem relevância no

8. Nossos Tribunais, entretanto, têm admitido o indulto na pendência de apelação do réu, desde que a sentença já tenha transitado em julgado para a acusação (nesse sentido: RT, 507:461).

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campo da reincidência e de outros efeitos da sentença condenatória. Se a causa extintiva da punibilidade incidir so­bre a pretensão punitiva, ocorrendo antes de transitar em jul­gado a sentença condenatória, vindo o sujeito a cometer novo delito, não deverá ser considerado reincidente. E, no terreno da reparação do dano, não haverá sentença condenatória irrecorrível para ser executada no juízo cível (CPP, art. 63).

Demonstração gráfica:

IP D PSC TJSC

B

C = crimeIP = inquérito policial D = denúnciaPSC = publicação da sentença condenatória TJSC = trânsito em julgado da sentença condenatória A -*-► B = lapso temporal entre a data da prática do crime e

o trânsito em julgado da sentença condenatória

Ocorrendo a causa extintiva da punibilidade em qualquer momento entre os pontos A e B , i. e., entre a data do crime e o trânsito em julgado da sentença condenatória, vindo o sujeito a cometer novo delito, qualquer que seja o instante de sua rea­lização, não será reincidente. Isso porque estará faltando a an­terior sentença condenatória com trânsito em julgado, que

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constitui o pressuposto da reincidência (CP, art. 63). Sob o outro aspecto, ausente a condenação irrecorrível, não poderá o interessado valer-se do disposto no art. 63 do CPP, que per­mite a execução da sentença condenatória, no juízo cível, para efeito de reparação do dano.

Demonstração gráfica:

C D CEP TJSC NC

C = crime D = denúnciaCEP = causa extintiva da punibilidadeTJSC = trânsito em julgado da sentença condenatóriaNC = novo crime

Suponha-se que, cometido o crime (C) e iniciada a ação penal mediante denúncia (D), venha o sujeito a ser favorecido por uma causa extintiva da punibilidade {CEP) antes de tran­sitar em julgado a sentença condenatória (TJSC). Vindo a co­meter novo delito (NC), não poderá ser considerado reinciden­te. A extinção da punibilidade no momento indicado, i. e., an­tes de transitar em julgado a sentença condenatória, faz com que o Estado perca a pretensão punitiva, excluindo a possibi­lidade de haver sentença condenatória irrecorrível. E sem esta não pode haver reincidência, nos termos do art. 63 do CP Da mesma forma, não havendo sentença condenatória com trân-

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sito em julgado, não pode ser exercido o disposto no art. 63 do CPP (execução da sentença condenatória irrecorrível para efeito de reparação do dano).

Ocorrendo a causa extintiva da punibilidade depois do trânsito em julgado da sentença condenatória, vindo o sujeito a cometer novo delito, será em regra considerado reincidente. E poderá ser executada a decisão condenatória, no juízo cível, para efeito de reparação do dano.

Demonstração gráfica:

C D TJSC CEP NC|--------------1------------------------------- 1------_ ! ----------1--------

A ---------------------------- „— ►

C = crime D = denúnciaTJSC = trânsito em julgado da sentença condenatória NC = novo crimeCEP = causa extintiva da punibilidade

A partir do ponto A, vindo o sujeito a cometer novo cri­me, será considerado reincidente, ainda que antes dele tenha sido favorecido por alguma causa extintiva da punibilidade (CEP). Há três exceções:

Ia) a anistia;2a) a abolitio criminis\ e3a) a temporariedade do efeito de a sentença conde­

natória irrecorrível gerar a reincidência (CP, art. 6 4 ,1).A anistia (CP, art. 107, II, I a figura) e a abolitio criminis

(CP, arts. 2o, caput, e 107, III) apagam os efeitos penais da

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prática do crime e rescindem a sentença condenatória. De modo que, favorecido por elas, vindo o sujeito a cometer novo delito, não será considerado reincidente. Elas, entretanto, não extinguem os efeitos civis da sentença condenatória irrecor- rível, de maneira que esta pode ser executada no juízo cível no que tange à reparação do dano.

Demonstração gráfica:

c D TJSC AA NC|--------------1-------------------- 1-------------------1-------------------- 1

C = crime

D = denúnciaTJSC = trânsito em julgado da sentença condenatória

AA = anistia ou abolitio criminis

NC = novo crimeSuponha-se que, cometido o crime (C) e iniciado o pro­

cesso mediante denúncia (D), venha o sujeito a ser beneficia­do pela anistia ou abolitio criminis (AA) depois do trânsito em julgado da sentença condenatória (TJSC). Vindo a cometer novo delito (NC), não será reincidente.

A terceira exceção diz respeito ao tempo precário que tem a sentença condenatória de gerar o efeito da reincidência. De acordo com o disposto no art. 64, I, do CP, a sentença condenatória perde o efeito de ensejar a reincidência quando o novo delito é cometido cinco anos depois do cumprimento da pena ou de sua extinção por outra causa. Nessa hipótese, o sujeito não será reincidente, valendo a sentença condenatória irrecorrível anterior, entretanto, para efeito de apreciação de

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seus antecedentes (CP, art. 59, caput)9.Demonstração gráfica:

C TJSC CEP NC

A -«— 5 anos — ► B

C = crimeTJSC = trânsito em julgado da sentença condenatória CEP = causa extintiva da punibilidade NC = novo crime

Suponha-se que o sujeito, condenado irrecorrivelmente (TJSC) pela prática de um crime (C), venha a ser favorecido por eventual causa extintiva da punibilidade (CEP). Se vier a cometer novo crime (NC) dentro do período A B, i. e., den­tro do prazo de cinco anos contados da extinção da punibilidade, será considerado reincidente. Se, entretanto, vier a cometer o novo crime depois do lapso de cinco anos, não será reincidente.

Assim, os efeitos da extinção da punibilidade operam ex tunc (para o passado) ou ex nunc (no sentido do futuro). De modo geral, as causas que extinguem a punibilidade só alcan­çam o poder-dever de punir do Estado, não se estendendo ao crime e à sentença condenatória irrecorrível. É o que aconte­ce, por exemplo, com o casamento do agente com a vítima em alguns crimes contra os costumes, quando realizado (o matrimônio) após a condenação irrecorrível. Em face da extinção da punibilidade, desaparece somente a pretensão

9. Sobre o tema, vide nosso O novo sistema penal, São Paulo, Sarai­va, 1977, p. 80.

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executória do Estado, subsistindo o delito sexual e a sentença condenatória, capaz de gerar alguns efeitos, como a reincidên­cia. Em certos casos, contudo, a incidência da causa extintiva da punibilidade apaga o delito e os efeitos principais e secun­dários da sentença condenatória. É o que ocorre nas hipóteses da anistia e da abolitio criminis.

Quando a causa extintiva projeta suas conseqüências para o futuro, o efeito se diz ex nunc. E o que acontece com a maio­ria dos atos e fatos extintivos da punibilidade. Quando o efei­to se projeta no sentido do passado, denomina-se ex tunc. É o caso da anistia e da abolitio criminis.

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Capítulo II DA PRESCRIÇÃO

1. CONCEITO

Prescrição penal é a perda do poder-dever de punir do Estado pelo não-exercício da pretensão punitiva ou da preten­são executória durante certo tempo. Ela se diferencia da deca­dência e da perempção, que também constituem causas extintivas da punibilidade. A prescrição atinge em primeiro lugar o direito de punir do Estado e, em conseqüência, extin­gue o direito de ação; a perempção e a decadência, ao contrá­rio, alcançam primeiro o direito de ação e, por efeito, o Esta­do perde a pretensão punitiva1.

2. NATUREZA JURÍDICA

Parte da doutrina entende que a prescrição é instituto de direito processual penal, uma vez que constitui obstáculo ao início ou prosseguimento da persecução criminal. Em face

1. José Frederico Marques, Tratado, cit., v. 3, p. 412.

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dela subsiste o direito de punir do Estado, não atingido pelo decurso de tempo.

Em sentido diverso, alguns doutrinadores a consideram de caráter penal, de direito material, extinguindo o poder-de- ver de punir do Estado.

Em posição intermediária, há o entendimento de que pos­sui caráter misto, constituindo instituto ao mesmo tempo de direito penal e de direito processual penal.

Entendemos que a prescrição constitui matéria de direito penal, não de direito processual penal. Esse é o sistema de nos­sa legislação, que a inclui entre as causas extintivas da punibilidade, disciplinando-a em várias disposições do CP (arts. 107, IV, Ia figura, e 108 a 118). Os efeitos processuais que gera, como explica Oscar Vera Barros, “não são mais que uma conse­qüência da extinção do poder punitivo do Estado no caso con­creto”. E se a pretensão punitiva, entendida em sentido amplo, constitui matéria de direito penal, arremata o autor, “o cancela­mento dessa pretensão deve participar da mesma natureza”2.

Em suma, a prescrição constitui causa extintiva da punibilidade, de natureza penal e não processual penal.

3. FUNDAMENTOS

A prescrição, em face de nossa legislação penal, tem tríplice fundamento:

2. La prescripción penal en el Código Penal, Buenos Aires, EBA, 1960, p. 44. Sobre o tema: Fábio Guedes de Paula Machado, Prescrição penal {prescrição funcionalista), São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000; Rubens Rodrigues, Prescrição da pretensão punitiva e executória, São Paulo, Edições da APMA, 2000.

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P ) o decurso do tempo (teoria do esquecimento do fato);2e) a correção do condenado; e3e) a negligência da autoridade3.Pelo transcurso do tempo, considera-se a inexistência do

interesse estatal em apurar um fato ocorrido há muitos anos, ou de ser punido seu autor. A prevenção genérica e específica advindas da resposta penal, pelo passar dos anos, perdem sua eficácia.

Sob outro aspecto, a prática de novo delito pelo conde­nado demonstra não se ter emendado. Ao contrário, se ao pri­meiro crime não se segue outro, presume-se a correção do au­tor. Assim, o transcurso do tempo sem a reiteração criminosa faz presumir sua reintegração social, desaparecendo a razão para a punição da primeira infração penal. Esse fundamento está contido em nosso CP, que prevê a interrupção da prescri­ção da pretensão executória pela reincidência (art. 117, VI).

O prazo prescricional pode ser interrompido pela reali­zação de certos atos processuais, como o recebimento da de­núncia ou queixa (CP, art. 117, I), pela pronúncia (II), pela decisão confirmatória da pronúncia (III) e pela publicação da sentença condenatória recorrível (IV). Cuidando-se de prescri­ção da pretensão executória, o lapso pode ser interrompido pelo início ou continuação do cumprimento da pena (V). Nos­so sistema contempla a inércia da autoridade pública, no exer­cício do jus persequendi in juditio ou do jus executionis, com a punição do decurso do prazo prescricional. É um castigo à negligência da autoridade. E isso está bem demonstrado na reforma penal de 1977, por intermédio da Lei n. 6.416, que introduziu em nossa legislação a prescrição retroativa, punindo

3. Vide sobre o tema: Soler, Derecho penal argentino, Buenos Aires, TEA, 1970, v. 2, p. 450, n. V; Vera Barros, La prescripción, cit., p. 23.

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a mora na tramitação do processo criminal com a extinção da pretensão executória da pena principal (CP, art. 110, § 22)4.

4. PRESCRIÇÃO CIVIL E PENAL

A prescrição civil se diferencia da prescrição penal nos seguintes pontos:

1Q) a prescrição civil é aquisitiva e extintiva, no sentido de que por ela os direitos são adquiridos e as obrigações, ex­tintas; a prescrição penal é sempre extintiva do poder-dever de punir do Estado;

2S) a prescrição penal se relaciona com interesses que importam ao direito público; a prescrição civil está relaciona­da a interesses privados. Como dizia Carrara, a prescrição pe­nal é regida por princípios de ordem pública primária; a pres­crição civil, por princípios de ordem pública secundária5;

32) a prescrição civil está determinada em favor do pos­suidor (prescrição aquisitiva) ou do devedor (prescrição libe- ratória); a prescrição penal não é ordenada em favor do agente ou do condenado, mas em face do interesse da sociedade;

4e) os efeitos da prescrição, na esfera civil, podem ser renunciados pelo interessado; a prescrição penal, de ordem pública, não pode ter seus efeitos renunciados pelo autor da infração penal;

4. Na reforma penal de 1984 (Lei n. 7.209, de 11-7-1984), como se verá, a prescrição retroativa atinge a pretensão punitiva.

5. Programa do curso de direito criminal; parte geral, trad. José Luiz Vicente de Azevedo Franceschini e J. R. Prestes Barra, São Paulo, Saraiva, 1956, v. l ,p . 394, § 575.

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52) na esfera civil, a prescrição não corre contra quem não pode agir; no campo criminal, não importa qual a razão do não-exercício da pretensão punitiva ou executória, se fuga do agente, inércia da autoridade, autoria ignorada etc. O prazo prescricional, em regra, tem seguimento6.

5. PRESCRIÇÃO, DECADÊNCIA E PEREMPÇÃO

Na prescrição, a pretensão do Estado é extinta diretamen­te. Em face disso, o direito de ação é atingido por conseqüên­cia. Na decadência, ao contrário, em primeiro lugar é extinto o direito de ação e, por via indireta, é atingida a punibilidade.

Na perempção (CP, art. 107, IV, última figura), o decur­so do prazo faz com que o querelante perca o direito de acio­nar o réu. Por conseqüência, extingue-se o direito de punir (a pretensão punitiva). Na prescrição, como ficou assinalado, o direito de punir é atingido em primeiro lugar. Além disso, a perempção só é cabível uma vez iniciada a ação penal priva­da, enquanto a prescrição pode ocorrer antes ou depois do iní­cio da ação penal de qualquer espécie.

6. ESPÉCIES

Existem duas espécies de prescrição diante de nossa atual legislação penal:

Ia) prescrição da pretensão punitiva; e

6. Vide desenvolvimento das distinções citadas em Vera Barros, La prescripción, cit., p. 46 e s.

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2a) prescrição da pretensão executória.A prescrição da pretensão punitiva, que ocorre antes de

transitar em julgado a sentença final, está regulada no art. 109 do CP.

A prescrição da pretensão executória, que tem seu prazo em curso após o trânsito em julgado da sentença condenatória, tem disciplina no art. 110, caput, do mesmo estatuto.

A prescrição retroativa está determinada no § 2S do art. 110. É forma de prescrição da pretensão punitiva.

7. PRESCRIÇÃO, CRIME E CULPABILIDADE

A prescrição somente extingue a pretensão punitiva ou executória, deixando intangíveis a tipicidade e a antijuridici- dade do fato. Da mesma forma, ela não exclui o juízo de cul­pabilidade. Em face dela, o fato subsiste típico e ilícito, de autoria de um sujeito eventualmente culpado. A possibilidade jurídica de aplicação da sanção (a punibilidade), entretanto, extingue-se pelo decurso do tempo.

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Capítulo III DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA

1. CONCEITO

Na prescrição da pretensão punitiva, impropriamente de­nominada “prescrição da ação”, a passagem do tempo sem o seu exercício faz com que o Estado perca o poder-dever de punir no que tange à pretensão (punitiva) de o Poder Judiciá­rio apreciar a lide surgida com a prática da infração penal e aplicar a sanção respectiva. Titular do direito concreto de pu­nir, o Estado o exerce por intermédio da ação penal, que tem por objeto direto a exigência de julgamento da própria preten­são punitiva e por objeto mediato a aplicação da sanção penal. Com o decurso do tempo sem o seu exercício, o Estado vê extinta a punibilidade e, por conseqüência, perde o direito de ver satisfeitos aqueles dois objetos do processo.

Demonstração gráfica:C SF

C = crimeSF = sentença finalPPP = prescrição da pretensão punitiva

Com a prática do crime (ponto C) surge a pretensão pu­nitiva. O Estado, entretanto, não tem o direito de exercer inde­finidamente essa pretensão. Seu exercício está limitado no tempo. Há certo prazo para isso. Esse lapso começa na data da prática do crime (C) e vai até a sentença final (SF) (salvo a exceção do art. 110 do CP). Significa que o Poder Judiciário tem um tempo fixado para apreciar a lide. Não o fazendo den­tro do prazo legalmente fixado, o Estado perde a pretensão punitiva.

Mas não é só a prestação jurisdicional que deve ser en­tregue dentro de certo lapso temporal. O início da persecução criminal por intermédio do inquérito policial e o começo da ação penal também estão condicionados ao decurso do tempo. Depois de determinado período temporal o inquérito policial não pode ser instaurado nem a ação penal iniciada.

Demonstração gráfica:

C IP IAP SFI------1-------- 1------------- ,A ---------------- ► B------------------------ - C ------------------------------------ - D

C = crimeIP = inquérito policial IAP = início da ação penal SF = sentença final

Cometido o crime (Q , a partir da data de sua consuma­

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ção, o Estado tem certo período temporal para instaurar o in­quérito policial {IP), lapso marcado no gráfico no seguimento A — ► B. Se, dentro do prazo A — ► B não foi instaurado o inquérito policial, tendo ocorrido a prescrição da pretensão pu­nitiva, o procedimento policial fica impedido. Da mesma for­ma, cometido o crime, o Estado tem fixado no tempo o perío­do dentro do qual pode iniciar a ação penal (IAP), sob pena de, não o fazendo, ver extinta a punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva (lapso de A a C). Por último, iniciada a ação penal (IAP), a sentença final deve ser proferida dentro de certo tempo (C a D), sob pena de ocorrer a prescrição da pre­tensão punitiva.

2. IMPRESCRITIBILIDADE

A CF de 1988, em seu art. 5Q, criou dois casos em que a pretensão punitiva não é atingida pela prescrição:

1Q) Crimes de racismo (inciso XLII), definidos na Lei n. 7.716, de 5 de janeiro de 1989, com as alterações da Lei n. 9.459, de 15 de maio de 1997.

2S) “Ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático” (inciso XLIV). São delitos definidos na Lei de Segurança Nacional (Lei n. 7.170, de 14-12-1983).

Em relação aos delitos cometidos antes da vigência da nova Carta, cremos que não tem aplicação o princípio da imprescritibilidade. O art. 5e, XL, diz que “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. Os incisos XLII e XLIX, embora situados na CF, contêm normas penais. Por isso, prejudiciais ao agente, não têm efeito retroativo. Não obstante seja discutível o tema, não vemos como possa a Car­ta Magna desobedecer ao seu próprio mandamento.

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3. EFEITOS

a) Extinção da punibilidade

A prescrição da pretensão punitiva tem efeito extintivo da punibilidade (CP, art. 107, IV, \~ figura). O Estado perde o direito de invocar o Poder Judiciário no sentido de aplicar o direito penal objetivo no caso concreto, extinguindo-se a pos­sibilidade jurídica de cominação da sanção penal. Diante dis­so, no caso de sua incidência, declarada a extinção da punibilidade, o Juiz deve ordenar o encerramento do proces­so. Existindo inquérito policial, seu prosseguimento constitui constrangimento ilegal (STF, RHC 63.180, RTJ, 124:916). Havendo sentença condenatória, ela deixa de existir. Nesse sentido: TACrimSP, ACrim 815.209, RJDTACrimSP, 20:139.

b) Certidão dos livros do Juízo e folha de antecedentes

Extinta a punibilidade pela prescrição da pretensão puni­tiva, por aplicação analógica do art. 748 do CPP, a eventual condenação anterior não deve ser mencionada na folha de an­tecedentes do réu, nem em certidão extraída dos livros do Juízo, salvo quando requisitadas por juiz criminal1.

1. Decidiu o STF que “a extinção da punibilidade” pela prescrição da pretensão punitiva “acarreta a proibição de fornecimento de certidões e de menção do fato na folha de antecedentes, salvo requisição de juiz criminal, tal como acontece na reabilitação (CPP, art. 748)” (2- Turma, em 14-4-1982, Rei. Min. Décio Miranda, RTJ, 707:745). Há, entretanto, de­cisão do Pretório Excelso no sentido de que, extinta a punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva, permanece o nome do réu no rol dos culpados, onde será feita, apenas, a respectiva averbação (RTJ, 705:153), posição que acreditamos incorreta.

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4. OPORTUNIDADE DE DECLARAÇÃO

A prescrição da pretensão punitiva, matéria de ordem pública, deve ser reconhecida em qualquer fase do inquérito policial ou da ação penal, de ofício, nos termos do art. 61, caput, do CPP, pelo Juiz ou pelo Tribunal2. Este pode declará- la em grau de habeas corpus (STJ, HC 2.510, 5a Turma, DJU,2 maio 1994, p. 10014), apelação, recurso em sentido estrito, embargos de declaração, embargos infringentes, revisão e agravo em execução. O Juiz, entretanto, após proferir a sen­tença condenatória, não pode reconhecê-la, uma vez esgotada sua jurisdição.

Ela é irrenunciável (TACrimSP, RvCrim 189.006, RT, 667:288 e 289).

5. EXAME DO MÉRITO

A incidência da prescrição da pretensão punitiva impede a apreciação do mérito da imputação3. Suponha-se que o su­jeito cometa determinado crime, vindo a ser denunciado. Quando o Juiz vai proferir a sentença verifica que a partir do recebimento da denúncia já ocorreu o prazo prescricional da pretensão punitiva.

2. RT, 510:303, 595:370, 596:341 e 599:387.3. STF, HC 63.765, 2à Turma, em 4-4-1986, v. un„ Rei. Min. Fran­

cisco Rezek, DJU, 18 abr. 1986, p. 5990 (RTJ, 118:934); HC 65.211, Ia Turma, em 11-3-1988, Rei. Min. Sydney Sanches, DJU, 8 abr. 1988, p.

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Demonstração gráfica:

C RD ppp SI------------------------ 1-------------------------1------------------------ 1

A ------- PPPP-------- - B

C = crime

RD = recebimento da denúncia

PPP = prescrição da pretensão punitiva

S = sentença

PPPP = prazo prescricional da pretensão punitiva

O Juiz verifica que entre a data do recebimento da de­núncia (RD) e a em que pretende condenar o réu, ou absolvê- lo (5), já decorreu o prazo prescricional da pretensão punitiva (PPPP), i. e., já ocorreu a prescrição da pretensão punitiva (PPP). Nesse caso, não pode apreciar a procedência da acusa­ção, ficando impedida a decisão de absolvição ou de condena­ção. Deve declarar a extinção da punibilidade, encerrando-se a ação penal.

O mesmo acontece na hipótese de o Tribunal verificar já ter decorrido o lapso prescricional. Suponha-se que, no exem­plo dado, o Juiz, não percebendo o transcurso do prazo de pres­

7471; RTJ, 740:488; RT, 630:366; STJ, AR no AI 242, 6â Turma, DJU, 21 nov. 1989, p. 17576; RSTJ, 6:75; TJSP, ACrim 124.924, RJTJSP, 143:214. E não há ofensa ao princípio do art. 5a, XXXV, da CF, segundo o qual alei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (STJ, ARAI 242 ,6a Turma, DJU, 21 nov. 1989, p. \1516\RSTJ, 6:15).

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crição, venha a condenar o réu e este interponha recurso de apelação.

Demonstração gráfica:

RD PPP SC RR SJT|--------------------------1-------------- 1----------- 1----------------------- 1A --------PPPP------- - B

RD = recebimento da denúnciaPPP = prescrição da pretensão punitivaSC = sentença condenatóriaRR = recurso do réuSJT = sessão de julgamento do TribunalPPPP = prazo prescricional da pretensão punitiva

Condenado o réu (SC), este apela (RR). No julgamento (SJT), percebem os membros do Tribunal que entre a data do recebimento da denúncia (RD) e a da publicação da sentença condenatória (SC) já havia decorrido o prazo prescricional da pretensão punitiva (PPPP). O Tribunal, sem entrar no exame do mérito, deve desde logo declarar extinta a punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva (PPP).

6. PRAZOS E FORMA DE CONTAGEM

Os prazos de prescrição variam de acordo com a quanti­dade da pena abstrata ou concreta. Pena abstrata é a cominada no preceito secundário da norma incriminadora. Assim, no

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homicídio simples, sanção abstrata é a reclusão, de seis a vin­te anos. Pena concreta é a imposta pelo Juiz na sentença. Se, em um crime de lesão corporal leve, a sentença condenatória impõe ao réu detenção de três meses, esta é a pena concreta.

Tratando-se de prescrição da pretensão punitiva, leva-se em consideração o máximo da pena punitiva de liberdade cominada em abstrato (CP, art. 109, caput) com desprezo da pena de multa, quando cominada cumulativa ou alternativa­mente. Cuidando-se de prescrição da pretensão executória, é regulada pela pena imposta (CP, art. 110, caput)4.

Esses prazos são os seguintes, nos termos do art. 109 doCP:

Máximo da pena privativa de liberdade Prazo prescricional

1. + de 12 anos = 20 anos

2. + de 8 a 12 anos = 16 anos

3. + de 4 a 8 anos = 12 anos

4. + de 2 a 4 anos = 8 anos

5. de 1 a 2 anos = 4 anos

6. menos de 1 ano = 2 anos

Exemplos:

C (CP, art. 129, caput) 4 anos

1 ano 2 anos 3 anosA ---------------------------------------- PPPP----------------------------------------B

IPPP

4. A multa tem outra disciplina (CP, art. 114).

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C = data do crimePPP = prescrição da pretensão punitivaPPPP = prazo prescricional da pretensão punitivaA—B = período em que está em curso a PPP

Imagine-se que o sujeito tenha cometido um crime de lesão corporal leve (CP, art. 129, caput), a que o legislador comina a pena de detenção de três meses a um ano. Para saber qual o prazo prescricional da pretensão punitiva (PPPP), de­vemos inserir o máximo da pena privativa de liberdade (um ano) em um dos incisos do art. 109 do CP. Vamos encontrar no item V o prazo de quatro anos. Significa que o prazo para o Estado perder a pretensão punitiva, a partir da data do crime (C), é de quatro anos.

SC TJSC 1 anoPPE

2 anos+ ----h -

PPPEHB

T(CP, art. 129, caput)

3 meses de detenção

C = crime (lesão corporal leve, CP, art. 129, caput)P = início do processo criminalSC = sentença condenatória, impondo ao réu a pena de três

meses de detenção TJSC = trânsito em julgado da sentença condenatória PPE = prescrição da pretensão executória PPPE = prazo prescricional da pretensão executória A—B = prazo durante o qual está em curso a prescrição da

pretensão executória (PPPE)

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Suponha-se que o sujeito, processado por crime de lesão corporal leve (C), venha a ser condenado (SC) a três meses de detenção. Transitando em julgado a sentença condenatória (TJSC), começa a correr o prazo prescricional da pretensão executória (PPPE). Para saber qual é devemos adequar a pena imposta na sentença a um dos incisos do art. 109 do CP. No n.VI encontramos o prazo de dois anos, uma vez que a pena im posta é inferior a um ano. Significa que o p razo prescricional da pretensão executória é de dois anos. Assim, a partir do ponto A, em que a condenação penal se tornou irrecorrível (TJSC), o Estado tem o prazo de dois anos para iniciar a execução da pena de três meses de detenção. Não o fazendo dentro desse período ocorre a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão executória (PPE).

O prazo prescricional deve ser considerado em face do fa­to narrado na peça de acusação e não pela capitulação legal5.

De acordo com o art. 109, parágrafo único, do CP, “apli- cam-se às penas restritivas de direito os mesmos prazos pre­vistos para as privativas de liberdade”. Ex.: o Juiz impõe ao réu pena restritiva de direito. Ele apela, não havendo recurso da acusação. O prazo prescricional da pretensão punitiva, na modalidade superveniente (CP, art. 110, § l 2), é regulado pela pena privativa de liberdade imposta antes da substituição (CP, art. 44, caput).

7. CONTAGEM DO ANO PRESCRICIONAL

Para a contagem do ano em matéria penal devemos con­

5. STF, HC 56.671, DJU, 30 jun. 1978, p. 4846; TJSP, HC 142.847, JTJ, 144-30A-, STJ, RHC 4.673, 6a Turma, DJU, 11 mar. 1996, p. 6663.

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siderar dois princípios determinados no art. 10 do estatuto re­pressivo:

l 2) o dia do começo inclui-se no cômputo do prazo6;2a) contam-se os anos pelo calendário comum.De acordo com a primeira regra, qualquer que seja a fra­

ção do primeiro dia a ser contado, deve ela ser considerada como um dia por inteiro. Suponha-se que o prazo prescricional deva ser contado a partir do dia l 2 de setembro, data da con­sumação de um furto. Verifica-se que o crime foi cometido às23 horas. Na verdade, nesse primeiro dia o curso prescricional percorreu apenas uma hora. Essa hora, entretanto, vale como um dia por inteiro. O dia do começo inclui-se no prazo, como preceitua o primeiro princípio, pouco importando a hora da realização do fato. Nesse sentido: TACrimSP, ACrim 568.835, RJDTACrimSP, 7:142; STJ, REsp 188.681, 6â Turma, Rei. Min. Vicente Leal, RT, 785:511.

Nos termos do segundo princípio, o ano deve ser conta­do de acordo com o calendário comum, entre nós o gregoriano. Significa que o direito penal não possui um calendário especi­al. Nosso calendário é o comum, de todos os dias. E o ano não tem 365 ou 366 dias. O ano em matéria penal tem exatamente quantos dias existem no calendário comum, sejam 365 ou 366. Assim, no campo penal o ano não tem um número fixo de dias, mas quantos dias, nos termos do calendário gregoriano, tem determinado ano. Nesse sentido: STJ, REsp 188.681, 6- Tur­ma, Rei. Min. Vicente Leal, RT, 785:511.

Os anos devem ser contados de acordo com o seguinte princípio: apanha-se o dia do começo do prazo, vai-se ao mes­mo dia, do mesmo mês, do ano subseqüente, terminando às24 horas do dia anterior.

6. RT, 612:291.

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Exemplo:Suponha-se um prazo prescricional da pretensão puniti­

va em caso de crime de calúnia simples consumado no dia 3- 4-2002, às 18 horas. O máximo da pena privativa de liberdade é de dois anos (CP, art. 138, caput). Logo, o lapso prescricional da pretensão punitiva, nos termos do art. 109, V, do CP, é de quatro anos.

C (CP, art. 138, caput)Pena máxima = 2 anos

|------------------ 1------------------ 1------------------ 1_1 ano 2 anos 3 anos

2-4-20063-4-2002 às 24 horas

C = crime (calúnia simples, CP, art. 138, caput)PPP = prescrição da pretensão punitiva

Como vimos, é irrelevante, no tema, a hora da consuma­ção do crime. Consumado no dia 3-4-2002, devemos ir ao mes­mo dia, do mesmo mês, do ano respectivo subseqüente (3-4- 2006), terminando os quatro anos no dia anterior (2-4-2006), às 24 horas.

O prazo não se suspende por férias, feriados ou domingos.

8. PERÍODOS PRESCRICIONAIS

Os prazos prescricionais da pretensão punitiva podem decorrer durante os seguintes períodos:

Io) entre a data da consumação do crime e a do recebi­mento da denúncia ou queixa;

PPPt

4 anos ------- 1

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2o) entre a data do recebimento da denúncia ou queixa e a da publicação da sentença final;

3o) a partir da publicação da sentença condenatória. Tratando-se de crime da competência do Júri, os lapsos

prescricionais são os seguintes:Io) entre a data do fato e a do recebimento da denúncia;2o) entre a data do recebimento da denúncia e a da pu­

blicação da pronúncia;3o) entre a pronúncia e sua confirmação;4o) entre a pronúncia ou sua confirmação e a sentença

final;5o) a partir da sentença condenatória7.Exemplos:Prescrição da pretensão punitiva entre a data da consu­

mação do delito e a do recebimento da denúncia:

C 1 2 3 4 5 6 7 8 anos RDI-----1-----1-----1-----1-----1-----1-----1-----1------------------------ 1

PPP18-8-2002 J|------------------------------------------------------------ 1

A ______________ 8 a n o s_______________ B (17-8-2010)

C = crime de apropriação indébita simples, descrito no art. 168, caput, do CP: pena privativa de liberdade, reclusão, de um a quatro anos

7. Tendo em vista a quantidade abstrata das penas, consideradas no máximo, são raros os casos de prescrição da pretensão punitiva em delitos da competência do Júri.

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RD = eventual recebimento da denúncia PPP = prescrição da pretensão punitiva A— B = período prescricional

Suponha-se que o sujeito, no dia 18-8-2002, cometa um crime de apropriação indébita simples, definido no art. 168, caput, do CP. A pena é de reclusão, de um a quatro anos, além de multa. No caso, o prazo prescricional da pretensão punitiva é de oito anos, nos termos do art. 109, IV, do mesmo estatuto. De modo que no ponto B, em 17-8-2010, às 24 horas, decorre o prazo prescricional da pretensão punitiva (PPP), extinguin- do-se a punibilidade. Posteriormente a essa data não pode ser instaurado o inquérito policial nem recebida eventual denún­cia. Se oferecida, deve ser rejeitada (CPP, art. 43, II). O mesmo ocorre em caso de crime de ação penal privada, em que a ação penal tem início mediante queixa.

Prescrição da pretensão punitiva com decurso do prazo a partir da data do recebimento da denúncia ou queixa:

3-10-2002C RD (4-10-2000) la n o 2 anos SCI---------------- 1------------------ 1-----------------1------------------- 1|----- 2 meses |— ------------------------------------------------------ 1

A B PPP C

C = crime de ameaça, descrito no art. 147 do CP. Pena: deten­ção, de um a seis meses

RD = recebimento da denúncia (4-10-2000)SC = eventual sentença condenatória PPP = prescrição da pretensão punitiva

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Suponha-se que um sujeito seja processado por crime de ameaça, definido no art. 147 do CP, cuja pena máxima é de seis meses de detenção. Nesse caso, o prazo prescricional é de dois anos (CP, art. 109, VI). Recebida a denúncia no dia 4-10- 2000 (RD), a prescrição da pretensão punitiva ocorre no dia 3- 10-2002, entre os pontos B e C. De modo que a partir dessa data, extinta a punibilidade, deve ser encerrado o processo sem julgamento do mérito da imputação.

Exemplo de prescrição da pretensão punitiva superve­niente à sentença condenatória:

Ch-

RDH —

12- 12-2000

tPSC

— I--------------------

pppt

11- 12-2002

TJMP --- 1----

RR

CP, art. 129, caput

1 ano--- I B2 anos

3 meses de detenção

C = crime de lesão corporal leve (CP, art. 129, caput)RD = recebimento da denúnciaPSC = publicação da sentença condenatóriaTJMP = trânsito em julgado para o Ministério PúblicoRR = recurso do réuA—B = prazo prescricional da pretensão punitiva (PPP)

Processado por lesão corporal leve, o réu vem a ser con-

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denado a três meses de detenção, publicada a sentença em 12- 12-2000 (PSC). Transitando em julgado a decisão para o Mi­nistério Público (TJMP) ou sendo improvida a sua apelação e apelando o réu (RR)8, deve ser aplicado o disposto no art. 110, § Io, do CP: o prazo prescricional, a partir da publicação da sentença, é regulado pela pena imposta. Como esta é inferior a um ano, o lapso prescricional é de dois anos. De modo que o Estado vê extinta a pretensão punitiva no ponto B, em 11-12- 2002. Significa que a partir do ponto B o Estado não pode mais julgar, agora em grau de apelação, o mérito da imputação. Em conseqüência, sem entrar no mérito, o Tribunal deve declarar a extinção da punibilidade9.

Exemplo de períodos prescricionais da pretensão puniti­va em crime da competência do Júri:

2 anos de detenção

C (CP, arts. 123 e t12,11) RD P PSC TJMP|-----------------1-------------------- 1---------------------1----------- 1--------------------1

A B D E F

C = crime (tentativa de infanticídio)RD = recebimento da denúncia P = pronúnciaPSC = publicação da sentença condenatóriaTJMP = trânsito em julgado para o Ministério Público

8. O apelo do réu não é imprescindível.9. Quando, entretanto, o apelo é da acusação, o Tribunal, em primeiro

lugar, examina o mérito. Improvido o recurso, reconhece a prescrição da pretensão punitiva. O mesmo ocorre quando, embora provido o recurso, não há alteração do prazo prescricional.

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Imagine-se uma tentativa de infanticídio cometida no ponto A. A pena do crime consumado é de detenção, de dois a seis anos. A redução da tentativa, para fins de prescrição, é de um terço. De modo que o máximo da pena abstrata, no caso, é de quatro anos de detenção. A prescrição, nos termos do art. 109, IV, do CP, é de oito anos. Assim, a partir do ponto A e no sentido do B corre prazo de oito anos. Da mesma forma, corre o mesmo prazo entre os pontos B (RD = recebimento da de­núncia) e D (pronúncia) e entre os pontos D e E (PSC = publi­cação da sentença condenatória). Suponha-se que a ré venha a ser condenada no ponto E a dois anos de detenção, transitan­do em julgado a decisão para o Ministério Público. Aplica-se o disposto no art. 110, § 1Q, do CP: a prescrição, a partir da publicação da sentença condenatória, passa a ser regulada pela pena imposta. Como esta é de dois anos, o prazo é de quatro anos, nos termos do art. 109, V, do CP. Diante disso, a partir da publicação da sentença condenatória passa a correr prazo prescricional da pretensão punitiva (de quatro anos).

É possível que o prazo prescricional tenha ocorrido em mais de um período. Ex.: o Juiz, ao tempo da decisão, verifica que o prazo prescricional da pretensão punitiva já decorreu, quer entre a data do fato e a do recebimento da denúncia, quer entre esta data e a da sentença. Nesse caso, aproveita o pri­meiro período, sendo irrelevante a consideração do segundo.

9. PRESCRIÇÃO SUPERVENIENTE À SENTENÇA CONDENATÓRIA

Nos termos do art. 109 do CP, a prescrição, antes de tran­sitar em julgado a sentença final, é regulada pelo máximo da pena privativa de liberdade. A disposição disciplina a deno­

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minada “prescrição da pretensão punitiva” ou da ação. O pra­zo prescricional, antes de a sentença transitar em julgado, não é fixado pela pena judicial, mas pelo máximo da pena legal. Assim, se se trata de crime de lesão corporal leve, em que o máximo da pena é de um ano de detenção, o lapso prescri­cional, a partir do qual o Estado perde o poder-dever de pro­cessar e punir o delinqüente, opera-se em quatro anos.

A contagem do prazo prescricional da pretensão punitiva é regulada por dois princípios:

l 2) em regra, é o máximo da pena privativa de liberdade que comanda a fixação do período prescricional;

2e) excepcionalmente, a prescrição não é regulada pelo máximo da pena de reclusão ou de detenção, mas sim pela pena imposta na sentença condenatória (reclusão ou detenção definitivas ou intercorrentes, i. e., aplicadas antes de substi­tuídas por restritivas de direitos, nos termos do art. 44 do CP).

No primeiro caso, aplica-se o disposto no art. 109, caput, do CP: “a prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime”.

No segundo, a prescrição é disciplinada pelo disposto no art. 110, § l 2.

O art. 109, caput, disciplinando a prescrição da preten­são punitiva, determina que a contagem do prazo é regulada pelo máximo da pena detentiva, salvo o disposto no art. 110, § l 2. Desta forma, em regra a prescrição da pretensão punitiva (da ação) é regulada pelo máximo da pena detentiva. Há, con­tudo, exceção: a prevista no art. 110, § l 2, que reza: “A pres­crição, depois da sentença condenatória com trânsito em jul­gado para a acusação, ou depois de improvido seu recurso,

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regula-se pela pena aplicada”10. Esta hipótese corresponde em substância à do antigo parágrafo único do art. 110, que legal­mente subordinava sua incidência ao recurso exclusivo do réu e não ao trânsito em julgado da condenação para a acusação ou ao improvimento de seu recurso.

Exemplo:

PSC (3 meses de detenção) PH-------- 1--------------------------------- 1

A TJMP -*--------- 2 a n o s--------- «- B

C = crime de lesão corporal leve (CP, art. 129, caput)RD = recebimento da denúncia PSC = publicação da sentença condenatória TJMP = trânsito em julgado da sentença condenatória para o

Ministério Público P = prescriçãoA—B = período prescricional

Suponha-se que, seis meses após o recebimento da de­núncia, o réu venha a ser condenado a três meses de detenção, transitando em julgado a sentença para o Ministério Público. Dois anos e meio após a publicação da sentença condenatória o réu ainda não foi intimado. Deve ser aplicado o § 12 do art. 110: não tendo havido recurso da acusação, o prazo prescri-

10. A expressão “sentença condenatória” é empregada no sentido de “decisão”, não havendo diferença entre aquela e o “acórdão condenatório” (AT, 550:431).

C RD

CP, art. 129, caput

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cional, a partir da publicação da sentença, é regulado pela pena imposta. Como era inferior a um ano, o lapso prescricional é de dois anos, já decorridos a partir da publicação da condenação.

A hipótese do § Io do art. 110, considerado isoladamen­te, i. e., sem ligação com o que se contém no § 2o, constitui forma de prescrição da pretensão punitiva. A antiga hipótese do parágrafo único do art. 110, referente à prescrição sobrevinda à condenação sem recurso da acusação, corres­ponde hoje ao disposto no § Io, considerado isoladamente.

Assim, na hipótese do réu condenado a três meses de de­tenção com sentença transitada em julgado para a acusação, vin­do o Tribunal a julgar sua eventual apelação depois de dois anos contados a partir da publicação da decisão condenatória, apli­cado exclusivamente o § Io do art. 110, teremos a incidência da extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva (da ação). Não subsistem a sentença nem seus efeitos principais e acessórios. E o Tribunal não precisa apreciar o mérito, fican­do prejudicada a apelação11. Nesse sentido: STJ, REsp 65.129, 5â Turma, j. 24-3-1998, DJU, l 2jun. 1998, p. 158.

11. O STF, entretanto, tinha orientação diversa. No RE 104.500 do Plenário, em 15-5-1985, Rei. o Min. Néri da Silveira, com apoio no parecer da Procuradoria-Geral da República, da lavra de Francisco de Assis Toledo, ficou assentado que, na reforma penal de 1984, nos termos dos §§ l2 e 2a do art. 110 do CP, a prescrição superveniente à condenação nem sempre con­duz à extinção da pretensão punitiva. Consta do acórdão: “Inexistindo trân­sito em julgado da sentença condenatória para a defesa, justifica-se o enten­dimento de ocorrer, aí, a prescrição da ação penal. Dar-se-á, entretanto, a prescrição da pretensão executória se o apelo da defesa versar, tão-só, sobreo quantitativo da pena, porque, então, se verificará a hipótese do caput do art. 110 do CP, quanto à procedência da ação penal” (RT, 598:433 e 434). Assim, nos termos do pronunciamento do Pretório Excelso, cumpre distin­guir: Ia) se a apelação da defesa visa à absolvição, o decurso do prazo, contado da publicação da sentença condenatória, tendo transitado em jul-

42

O disposto no art. 110, § Io, do CP, prevê, como primei­ra condição de ocorrência da prescrição da pretensão puniti­va, na espécie superveniente à sentença condenatória, que te­nha transitado em julgado para a acusação (Ministério Públi­co, assistente da acusação ou querelante). O recurso impedi-

I gado para a acusação ou improvido seu recurso, opera a prescrição dapretensão punitiva (da ação), aplicando-se o art. 110, § l 2, do CP; 2e) se, entretanto, nas mesmas condições, o apelo pretende a redução da pena, cuida-se de prescrição da pretensão executória, aplicando-se o caput do art. 110 (a chamada prescrição da condenação). A razão da distinção é a seguinte: No primeiro caso, insurgindo-se a defesa contra a decisão que julgou procedente a pretensão punitiva, inexiste “sentença condenatória com trânsito em julgado”. Não pode, pois, o decurso do tempo atingir a “pretensão executória”. Na segunda hipótese, contudo, de acordo com a decisão do Pretório Excelso, a apelação não visa ao mérito, mas à redução da pena. Significa que a defesa, resignada com a procedência da preten­são punitiva, deseja discutir somente a quantidade da resposta penal. D i­ante disso, nos termos do acórdão, há uma sentença condenatória com trânsito em julgado. Quer dizer, a sentença, como pronunciamento condenatório, transitou em julgado. Resta para o Tribunal a questão da quantidade da pena. E se há uma “condenação” transitada em julgado, formou-se a coisa julgada material no tocante à procedência da pretensão punitiva. Não é caso, pois, de “prescrição da pretensão punitiva”. Daí apli- car-se, de acordo com a Suprema Corte, o caput do art. 110: o decurso do prazo, a partir do trânsito em julgado da condenação, atinge a pretensão executória. De modo que, apelando a defesa, sem o obstáculo do recurso da acusação, a partir da data da publicação da sentença condenatória o decurso do prazo opera: l e) a prescrição da pretensão punitiva, se o apelo visa à absolvição (CP, art. 110, § l e); 22) a prescrição da pretensão executória, se a apelação visa à redução da pena (CP, art. 110, caput). Esse entendimento também foi adotado pela Ia Turma do CTF no RECrim 104.503 (RTJ, 136:256). Nós, entretanto, entendemos que a chamada pres­crição superveniente é forma de “prescrição da pretensão punitiva”, sem distinção quanto à finalidade do eventual recurso da defesa. Nesse senti­do: STF, HC 67.461, RT, 644:311.

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tivo do princípio prescricional é o apelo da acusação que visa à agravação da pena privativa de liberdade. De modo que não im­pede a prescrição a apelação que, deixando de buscar o agrava­mento da pena detentiva, vise, v. g., a cassação do sursis, a im­posição de medida de segurança, agravação da pena de multa etc. Nesse sentido: STJ, REsp 112.431, 5â Turma, rei. Min. Gilson Dipp, DJU, 2 out. 2000, p. 178; STJ, ROHC 10.905, 5â Turma, rei. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU, 4 mar. 2002, p. 271.

Havendo recurso da acusação visando ao agravamento da pena, a partir da publicação da sentença condenatória corre prazo prescricional da pretensão punitiva regulado pela pena abstrata. Cuida-se de apelação, interposta pela acusação, da sentença condenatória. Não impede a prescrição superveniente eventual interposição de recurso extraordinário ou especial (STJ, RHC 4.080, 6a Turma, DJU, 19 dez. 1994, p. 35331).

A segunda condição de aplicação do § l e do art. 110 do CP é o improvimento do recurso da acusação. De modo que, improvido o apelo que visou ao agravamento da pena, pode ser reconhecida a prescrição da pretensão punitiva. Em primei­ro lugar, o Tribunal aprecia o recurso; após, declara extinta a punibilidade. Havendo recurso de ambas as partes, improvido o apelo da acusação, o Tribunal declara a extinção da punibilidade pela PPP, prejudicado o apelo do réu.

O provimento do apelo da acusação, que visou ao agra­vamento da pena, impede a aplicação do § 1Q?

Entendemos que o provimento do recurso da acusação somente impede o reconhecimento da PPP quando venha a alterar o prazo prescricional. Suponha-se que, condenado o réu a três meses de detenção, venha o Tribunal, em face de recur­so da acusação, a elevar a pena a quatro meses. Não havendo alteração no prazo prescricional, pode ser aplicado o § 1Q. Se qualquer que seja a pena inferior a um ano o prazo é sempre de dois anos, não é justo que a agravação de um mês impeça

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o princípio que se funda, inclusive, na desídia da autoridade12.O prazo prescricional superveniente à condenação não é

interrompido pelo acórdão confirmatório nem pela interpo- sição de embargos infringentes. De maneira que a prescrição da pretensão punitiva, na ausência de recurso da acusação, pode ser declarada quando decorrido o prazo respectivo entre a data da publicação da sentença condenatória e o termo ad quem, não se interrompendo pelo acórdão que julga a apela­ção ou os embargos infringentes, nem pela interposição de re­curso extraordinário ou especial pela acusação13.

Concedido o perdão judicial em sentença que para nós é condenatória (CP, art. 120), não havendo recurso da acusação pode ocorrer a prescrição superveniente, contado o prazo a partir da data da publicação. Embora não haja aplicação de pena, seria estranho que, na hipótese, não ocorresse a prescri­ção. Se, quando imposta a pena, é possível a incidência do § l e do art. 110, seria injusto que não tivesse aplicação quando o Juiz não impõe sanção alguma14. Havendo recurso da acu­

12. O STF decidiu nesse sentido (RECrim 103.842, Ia Turma, em 10-2-1987, v. un., Rei. Min. Sydney Sanches, DJU, 13 mar. 1987, p. 3883; RTJ, 727:212).

13. RECrim 113.403, 2a Turma do STF, em 14-8-1987, DJU, 25 set. 1987, p. 20417; RECrim 113.323, Plenário do STF, em l2-7-1987, v. un„ Rei. Min. Célio Borja, DJU, 25 set. 1987, p. 20416 e 20417; RTJ, 725:365; RECrim 114.480, 2a Turma do STF, em 9-2-1980, Rei. Min. Célio Borja, DJU, l 2 mar. 1988, p. 4748; RTJ, 135:339. A interposição de recurso espe­cial não interrompe o curso do prazo prescricional superveniente (REsp 4.150, 5a Turma do STJ, RT, 670:354).

14. No sentido do texto: ACrim 324.743, 8a Câm. do TACrimSP, em 12-4-1984, v. un., Rei. o então Juiz Canguçu de Almeida, JTACSP, 80:550.O STF, apreciando a reforma penal de 1984 (CP, arts. 107, IX, e 120), entendeu que é condenatória a sentença que concede o perdão judicial (RECrim 105.788-SP, 2a Turma, em 18-6-1985, v. un., Rei. Min. Cordeiro Guerra, DJU, 2 ago. 1985, p. 12056; RTJ, 773:1406 e 777:309 e 842). O

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sação, se improvido, não há impedimento à incidência do prin­cípio extintivo. Da mesma forma quando provido, mas sem alteração do prazo prescricional. Deve ser considerado o pra­zo em face do mínimo abstrato da pena privativa de liberdade cominada ao delito.

O § l e não exige recurso do réu, ao contrário do antigo parágrafo único do art. 110 do CP. Entre as duas normas, a nova disposição é mais benéfica. Em face disso, tem efeito retroativo. Assim, aos fatos cometidos antes da reforma de maio de 1977 não se exige recurso do réu para a aplicação da prescrição superveniente à condenação, o que desde há muito tem sido reconhecido pela jurisprudência.

Se imposta pena de multa na sentença condenatória, sen­do ela a única abstratamente cominada, não é preciso aplicar- se o disposto no § l 2 do art. 110. Incide o art. 109 do CP, c/c os arts. 114 e 117, IV (prescrição da pretensão punitiva em face da pena abstrata). Na multa o prazo é sempre de dois anos. Assim, interrompido o prazo pela sentença condenatória recorrível, recomeça a ser contado o biênio. Dois anos depois ocorre a prescrição pela pena abstrata, prescindível a aplica­ção do § 1Q do art. 11015.

Se imposta medida de segurança ao semi-responsável (CP, art. 26, parágrafo único), pode ser declarada a prescrição intercorrente, regulada pela pena substituída ou, se não pre­

STJ, entretanto, de acordo com a sua Súmula 18, entende que a sentença que aplica o perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo nenhum efeito condenatório.

15. Assim decidiu o STF (RECrim 101.196-SP, 1-Turma, em 6-4-1984, v. un., Rei. Min. Néri da Silveira, DJU, 25 maio 1984, p. 8235; RTJ, 777:841; RECrim 102.227-SP, IaTurma, em 8-5-1984, v. un., Rei. Min. Soares Munoz, DJU, 25 maio 1984, p. 8237; RTJ, 770:439).

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vista na sentença, pelo mínimo abstrato da pena cominada ao delito cometido pelo réu. Se quando é aplicada pena é cabível tal modalidade de prescrição, seria injusta a proibição quando imposta medida de segurança, uma vez que ambas são san­ções penais. Nesse sentido: TACrimSP, ACrim 725.299, RJDTACrimSP, 27:262.

Suponha-se que somente o réu, tendo sido condenado a um ano de detenção, apele. Contados da publicação da senten­ça condenatória, mais de dois anos depois o recurso é julgado, vindo o Tribunal a reduzir a pena a oito meses de detenção. Deve ser aplicado o disposto no § Io do art. 110 do CP, decla- rando-se a extinção da punibilidade pela prescrição da preten­são punitiva, considerado o biênio entre a publicação da sen­tença condenatória e a sessão de julgamento da apelação.

Se o Tribunal não conhece da revisão criminal, restabe­lecendo o prazo para a apelação do réu, pode ser aplicado o art. 110, § I o, do CP, contando-se o prazo a partir da data da publicação da sentença condenatória16.

Absolvido o réu em primeiro grau e condenado no Tri­bunal, a partir da data do acórdão proferido em sessão passa a correr o prazo prescricional superveniente à condenação, des­de que não transite em julgado, caso em que teria início a pres­crição da pretensão executória.

No concurso formal, segundo nosso entendimento, pode ser aplicado o § Io ao acréscimo da pena. Caso contrário, a hipótese seria mais gravosa que o concurso material.

O disposto no art. 110, § Io, do CP não pode ser aplica­do pelo Juiz de primeiro grau.

16. No sentido do texto: RvCrim 119.462, A° Grupo do TACrimSP, em 26-5-1983, m. v., relator o Juiz Carmona Morales; TACrimSP, HC 375.332, 16a Câm. Rei. Juiz Lopes de Oliveira, RT, 794:606.

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10. DESCLASSIFICAÇÃO

Se o Juiz, na sentença, não aceitando a qualificação jurí­dica do crime im posta na denúncia, desclassifica a infração para outra, o prazo prescricional da pretensão punitiva deve ser regulado pela pena máxima com inada a esta, desprezando- se a capitulação legal da acusação.

Imagine-se que o Promotor de Justiça ofereça denúncia contra o réu por lesão corporal qualificada pelo perigo de vida (CP, art. 129, § I o, II). A pena máxima é de cinco anos de re­clusão. O prazo prescricional da pretensão punitiva é, então, de doze anos (CP, art. 109, III).

RD SFH ---------------------------------------- 1

12 anos 12 anos

C = crime

RD = recebimento da denúncia

SF = sentença final

A partir da consumação do delito está correndo prazo prescricional de doze anos (entre os pontos A cB ). Recebida a denúncia antes dos doze anos, começa, no ponto B, a correr outra vez prazo de doze anos, no sentido do ponto C (sentença eventual). Imagine-se que o Juiz, quando da prolação da sen­tença, verifique a inexistência de prova pericial a respeito do

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perigo de vida e desclassifique o delito para lesão corporal leve.

Exemplo:

RD SF

A 4 anos B — 3 meses — C

I Ilesão corporal grave

lesão corporal leve

RD = recebimento da denúncia

SF = sentença final

A— B = prazo prescricional da pretensão punitiva

A— C = período entre a data do recebimento da denúncia e a da sentença final

Operada a desclassificação de tipo mais grave (lesão cor­poral de natureza grave) para figura típica de menor gravida­de (lesão corporal leve), o máximo da pena abstrata cominada a esta é que devia, desde o início, regular o prazo prescricional da pretensão punitiva. A pena máxima da lesão corporal leve é de um ano de detenção. A prescrição decorre em quatro anos (CP, art. 109, V). Esse prazo, no exemplo, já havia decorrido entre a data do recebimento da denúncia (RD) e a sentença final (SF): o Juiz desclassificou o delito quatro anos e três meses depois do recebimento da denúncia. De maneira que no ponto B o Estado já havia perdido a pretensão punitiva. O

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Juiz, após a desclassificação, deve declarar extinta a punibi­lidade pela prescrição da pretensão punitiva17. Em breve fun­damentação, esclarecendo que em face da inexistência do lau­do pericial só podia subsistir a imputação de lesão corporal leve, deve decretar a extinção da punibilidade18.

O mesmo ocorre quando a desclassificação é feita pelo Tribunal.

11. TERMOS INICIAIS

A prescrição da pretensão punitiva, de acordo com o art. 111 do CP, começa a correr:

a) do dia em que o crime se consumou;b) no caso de tentativa, do dia em que cessou o compor­

tamento delituoso;c) nos crimes permanentes, do dia em que cessou a per­

manência;d) nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de

assentamento do registro civil, da data em que o fato se tornou conhecido.

O primeiro termo inicial é a data da consumação do deli­to (n. I).

Nos delitos materiais, sejam comissivos ou omissivos impróprios, o prazo prescricional tem início na data da pro­

17. RTJ, 116:710.18. Vide sobre o tema: José Frederico Marques, Tratado, cit., v. 3,

p. 414. N o sentido do texto: ACrim 3 0 8 .9 0 1 ,1- Câm. do TACrimSP, em 3-11-1982, v. un., Rei. o então Juiz Djalma Lofrano; TJSP, HC 74.280, RJTJSP, 117:481.

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dução do resultado, ainda que em outra tenha sido realizada a conduta.

Exemplo:

F M|--------------------------------- ,-----------------------------------------13-1-2003 2-5-2003

F = fato

M = morte da vítima

PPP = prescrição da pretensão punitiva

A —► B = sentido do percurso da PPP

Suponha-se que o sujeito, no dia 3-1-2003, com inten­ção de matar, desfira golpes de punhal na vítima, que só vem a morrer em 2 de maio. A prescrição não começa a correr em 3 de janeiro, mas em 2 de maio.

Nos delitos omissivos a consumação ocorre na data da conduta negativa, momento em que começa a correr o prazo prescricional.

Nos de mera conduta, como a violação de domicílio (CP, art. 150), a prescrição tem seu termo a quo na data do compor­tamento. No caso, na data da entrada ou permanência ilícita.

No delito culposo de resultado, a prescrição tem início no dia de sua produção. Nos culposos de mera conduta, sejam omissivos ou comissivos, na data do comportamento.

Nos delitos preterdolosos, na data de produção do resul­tado.

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Na tentativa, no dia de realização do último ato execu- tório (CP, art. 111, II).

No delito permanente a prescrição somente tem início na data da cessação do comportamento delituoso (CP, art. 111,III)19. Se este persiste após o início da persecução criminal, o prazo prescricional não começa a correr. Para o TACrimSP, o termo inicial, não cessada a permanência, corresponde ao dia em que o Estado inicia a repressão penal através da instaura­ção do inquérito policial ou do processo (HC 172.556, RT, 634:298).

No crime habitual o prazo tem início na data do último ato delituoso20.

No delito continuado, a prescrição tem início na data da realização de cada crime, considerado isoladamente (CP, art. 119).

Exemplo:

A B C D|------------------ 1-------------------1-------------------h_

12 furto 2e 3Q 4a

TIPPP TIPPP TIPPP etc.

TIPPP = termos iniciais da prescrição da pretensão punitiva A, B etc. = datas das práticas dos diversos furtos

19. O STF entendeu que no crime de quadrilha ou bando, de natureza permanente, o prazo prescricional tem início na data da prática do primeiro delito e não na data de sua organização (RTJ, 116:515) e que a data do recebimento da denúncia constitui o termo inicial (HC 71.368, Ia Turma, RT, 718:512).

20. RT, 608:343.

E5S

TIPPP

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Suponha-se que o sujeito, em dias seguidos, dentro de pe­queno lapso temporal, subtraia bens da mesma vítima, havendo entre os fatos os requisitos da continuação (CP, art. 71, caput).

A prescrição deve ser regulada em relação a cada delito parcelar, considerado isoladamente. Assim, cada crime tem sua pena regulando o respectivo prazo prescricional, desprezado o acréscimo de um sexto a dois terços. Dessa forma, no exem­plo dado, cada um dos cinco furtos tem seu termo inicial de prescrição nos pontos A, B etc.

Nos crimes de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, a prescrição tem início na data em que o fato se tornou conhecido de qualquer autorida­de pública (CP, art. 111, IV)21. Assim, o termo inicial não se fixa na data do matrimônio incriminado, na bigamia, nem na data da falsificação ou alteração, mas sim naquela em que a autoridade pública toma ciência do fato (Juiz de Direito, Pro­motor de Justiça, Delegado de Polícia etc.). Justifica-se o prin­cípio. São crimes em que o sujeito cerca-se de cuidados para encobrir a sua ocorrência. Se a prescrição tivesse curso a par­tir de sua consumação, a maioria de seus autores ficaria impu­ne. Não se exige que o prazo tenha início no dia em que for­malmente a autoridade pública teve conhecimento do fato delituoso, como, v. g., por intermédio de notitia criminis dire­ta. É suficiente o conhecimento presumido do fato por parte da autoridade com fundamento em sua notoriedade ou no uso ostensivo do documento falso22.

21. STF, RHC 52.663, DJU , 8 jan. 1975, p. 69; RTJ, 55:754 e 77:695; RT, 410:396: STF, RECrim 113.763, PTurma, DJU, 18 ago. 1989, p. 13230; RTJ, 131:329: STJ, HC 498, 5â Turma, JSTJ, 23:222 e 229.

22. STF, RTJ, <55:240. Contra, exigindo a notitia criminis à autorida­de policial, RTJ, 77:697 e 55:754.

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O inciso IV, configurando exceção à regra do termo ini­cial da prescrição, não pode ser aplicado a outras hipóteses, como o registro de estrangeiro, a transcrição imobiliária etc.23.

Tratando-se de crime condicionado, i. e., subordinado a uma condição objetiva de punibilidade, a prescrição começa a correr do dia da verificação da condição. Isso porque a preten­são punitiva depende de tal requisito. Daí não poder prescre­ver antes de sua ocorrência. Nesse sentido, o CP italiano é expresso (art. 158).

Estando a ação penal dependente de uma condição de procedibilidade, a prescrição começa a correr dos termos do art. 111, não dependendo de sua verificação.

É possível que não se apure a data da consumação do crime, fazendo a denúncia referência somente ao ano de sua prática. Nesse caso, é razoável o entendimento de que o ter­mo inicial se dá no dia l s de janeiro24. Se a denúncia se refere ao mês, não especificando o dia, conta-se o prazo prescricional a partir do dia 1Q. Deve ser adotada solução que não prejudi­que o réu (TACrimSP, ACrim 822.527, RJDTACrimSP, 25:104).

12. CAUSAS DE AUMENTO E DE DIMINUIÇÃO DA PENA

As causas de aumento e de diminuição da pena, previs­tas na Parte Geral ou na Parte Especial do CP, alteram o prazo

23. TFR, RCrim 607, DJU, 16 abr. 1980, p. 2458; STJ, EDEDREsp 15.340, 3a Seção, DJU, 22 nov. 1993, p. 24889 (falsidade de registro de adoção).

24. RT, 608:353.

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prescricional da pretensão punitiva. Suponha-se que o sujeito cometa um furto simples (CP, art. 155, caput). O prazo prescricional da pretensão punitiva é de oito anos (CP, art. 109, IV). Se, entretanto, incidir a circunstância do repouso noturno (§ l 2), em que a pena é aumentada de um terço, o prazo passa a ser de doze anos (CP, art. 109, III)25.

Ocorrendo causa de aumento de quantidade variável (ex.: de um terço até metade), incide a que mais agrava a pena (no caso: metade).

O mesmo ocorre com as causas de diminuição da pena. No auto-aborto consumado (CP, art. 124, 1- parte), em que a pena privativa de liberdade é de um a três anos de reclusão, o prazo prescricional da pretensão punitiva é de oito anos (CP, art. 109, IV). Cuidando-se de tentativa, entretanto, para efeito de prescrição a pena deve ser reduzida de um terço (CP, art. 14, parágrafo único), perfazendo o máximo abstrato de dois anos. Diante disso, o prazo prescricional antes do trânsito em julga­do da sentença final é de quatro anos (CP, art. 109, V). Assim, ocorrendo causa de diminuição de quantidade variável (ex.: de um terço a dois terços), incide a que menos diminui (no caso: um terço). Nesse sentido: STJ, RHC 125, RSTJ, 4:1358.

Não interfere no quantum do prazo prescricional o au­mento de pena previsto no concurso formal de crimes e no delito continuado (CP, arts. 70 e 71). Se o acréscimo penal incidisse, as hipóteses, tratadas com benignidade pelo estatu­to penal, uma vez que determina a atenuação da sanção, se­riam mais prejudiciais que o concurso material, em que são somadas, não havendo nenhum aumento. Assim, para efeito de prescrição devem ser desprezados os aumentos de um sex­to até metade e de um sexto a dois terços da pena previstos naqueles dois dispositivos.

25. RTJ, 95:1050.

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13. AGRAVANTES E ATENUANTES

As circunstâncias legais genéricas, sejam agravantes (CP, arts. 61 e 62) ou atenuantes (art. 65), não são consideradas na fixação do prazo prescricional da pretensão punitiva. Assim, v. g., nenhum efeito tem a reincidência no cômputo do lapso extintivo, sendo inaplicável o disposto no art. 110, caput, par­te final, incidente exclusivamente sobre a prescrição da pre­tensão executória (vide Capítulo IV, item 5). Nesse sentido: TACrimSP, HC 375.332, 16- Câm., rei. Juiz Lopes de Olivei­ra, RT, 794:606.

Há uma exceção: a menoridade relativa e a idade avan­çada do agente (CP, art. 65, I). Neste caso, o prazo prescri­cional é reduzido de metade (CP, art. 115).

14. CONCURSO DE CRIMES E DE NORMAS

Há três formas de concurso de crimes:I a) concurso material (CP, art. 69);2~) concurso formal (CP, art. 70); e3a) crime continuado (CP, art. 71).Nas três espécies cada delito parcelar tem seu prazo

prescricional próprio, considerado isoladamente (CP, art. 119).No concurso material, para efeito de prescrição da preten­

são punitiva, as penas não são somadas. Cada crime, conside­rados os termos iniciais próprios, tem seu respectivo prazo26.

26. STF, RTJ, 109:539 e 120:82; TAPR, ACrim 33.657, RT, 665:321: Luiz Vidal da Fonseca, Do erro na execução com desígnios autônomos e prescrição, RT, 794:505.

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Exemplo:

CS 1 ano 2 anos 3 anos 4 anos

A B

I I ICP, arts. 146, caput, e 163, caput

PPP no tocante ao crime de dano

PPP em relação ao crime de constrangimento ilegal

CS = data da prática dos delitosA = prazo prescricional da pretensão punitiva (PPPP) em re­

lação ao delito mais leve (dano simples)B = data em que ocorre a prescrição da pretensão punitiva

(PPP) em relação ao crime mais grave (constrangimento ilegal simples)

Suponha-se que o sujeito cometa dois delitos em concur­so material: dano simples (CP, art. 163, caput) e constrangi­mento ilegal simples (CP, art. 146, caput). A pena máxima abs­trata do dano simples é de seis meses de detenção; a do cons­trangimento ilegal simples, de um ano. Essas penas não de­vem ser somadas. Cada uma regula o prazo prescricional do crime respectivo. Assim, em relação ao dano simples, como a pena é inferior a um ano, o lapso prescricional decorre em dois anos (CP, art. 109, VI), iniciando-se na data do delito e termi­nando no ponto A. No tocante ao crime de constrangimento ilegal simples, como a pena é igual a um ano, o prazo prescricional da pretensão punitiva (PPPP) decorre em quatro anos (CP, art. 109, V), começando na data do delito e termi­nando no ponto B.

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No concurso formal, para efeito de prescrição da preten­são punitiva, cada delito componente conserva sua autonomia, desprezando-se a causa de aumento de pena prevista no art. 70 do CP27.

Exemplo:

CS 4 anos 12 anos|-1-1-1-1-,-1-1-1-1-1-1-1

A B C

1 I ICP, arts. 130, PPP (contágio) PPP (estupro)caput, e 213,caput

CS = crimes de estupro e perigo de contágio venéreo PPP = prescrição da pretensão punitiva

Imagine-se que o sujeito, com uma só conduta, realize dois crimes: estupro simples (CP, art. 213, caput) e perigo de contágio venéreo simples (CP, art. 130, caput). Cada um dos dois delitos tem seu prazo prescricional isolado. As penas abs­tratas não são somadas. A pena máxima do perigo de contágio venéreo simples, em sua forma abstrata, é de um ano de de­tenção. Logo, o prazo prescricional da pretensão punitiva (PPP) é de quatro anos (CP, art. 109, V), iniciando-se na data do crime (A) e seguindo até o ponto B. E na pena máxima abstrata de um ano não incide o aumento de um sexto até

27. RTJ, 96:1019; RT, 547:420, 569 :339 e 577:414; JTACrimSP, 97:409.

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metade previsto no art. 70 do CP. No tocante ao estupro, a pena máxima abstrata é de oito anos de reclusão, desprezando-se o aumento de um sexto até metade do concurso formal (disposi­tivo citado). Nesse caso, o prazo prescricional da pretensão pu­nitiva (PPPP) é de doze anos (CP, art. 109, III), iniciando-se na data do crime e seguindo até o ponto C.

No crime continuado, o prazo prescricional da pretensão punitiva é regulado pelo máximo da pena detentiva de cada delito parcelar, considerado isoladamente, desprezando-se o acréscimo penal cominado no art. 71 do CP28.

Exemplo:

A B C D E

5-4 15-4 20-4

Um sujeito, em continuação, em período inferior a um mês, comete vários furtos. Suponha-se que o primeiro no dia 5 de abril (A); o terceiro, em 15 de abril (C); o último (E), em20 de abril. Para efeito da prescrição da pretensão punitiva, cada crime, seja A, C ou E, tem seu próprio prazo extintivo da punibilidade. As penas abstratas não são somadas. Em relação ao primeiro crime o prazo tem início em 5 de abril; no tocante ao terceiro, em 15 de abril, e assim sucessivamente. E, em re­lação a cada pena, não incide a causa de aumento prevista no art. 71 do CP.

No conflito aparente de normas, a prescrição da preten­são punitiva referente ao fato criminoso específico, principal e ao crime-fim abrange a infração penal genérica (princípio da especialidade), o crime subsidiário (princípio da subsidia-

28. STF, RTJ, 50 :551 e 96:1018.

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riedade) e o delito-meio (princípio da consunção). Nesse sen­tido, tratando de crime-meio e crime-fim: TJSP, ACrim 135.521, RT, 713:329.

15. CRIMES COMPLEXOS E CONEXOS

Nos termos do art. 108, l â parte, do CP, aplicável à espé­cie, há duas regras a respeito da prescrição çla pretensão puni­tiva no tocante ao delito complexo:

Ia) A prescrição da pretensão punitiva no tocante a cri­me que funciona como elemento típico de outro não se esten­de a este.

O princípio se refere à primeira espécie de crime comple­xo, em que uma figura típica, de menor gravidade objetiva, in­tegra, como elementar, a descrição de outra, de maior gravida­de. Nesse caso, a eventual prescrição da pretensão punitiva em relação ao delito menor não alcança a pretensão estatal emer­gente da prática da infração maior. Exemplo: o sujeito comete crime de extorsão mediante seqüestro (CP, art. 159), em que o delito de seqüestro ou cárcere privado (CP, art. 148) funciona como elementar. Eventual decurso de prazo prescricional que alcançaria a infração de menor gravidade, o seqüestro ou cár­cere privado, não se estende à extorsão mediante seqüestro (crime mais grave). A prescrição é regulada pelo máximo da pena detentiva cominada ao delito mais grave.

2~) A prescrição da pretensão punitiva em relação a cri­me que funciona como circunstância qualificadora de outro não se estende a este.

A regra se relaciona com a segunda forma de crime com­plexo, em que um tipo penal funciona como qualificadora de outro. Nesse caso, a eventual prescrição da pretensão punitiva

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no tocante ao crime que participa do tipo como qualificadora não alcança o delito maior. Exemplo: imagine-se que o sujeito cometa um crime de furto qualificado pelo rompimento de obstáculo à subtração da coisa (CP, art. 155, § 42,1), em que o delito de dano (CP, art. 163) qualifica o fato. A eventual pres­crição da pretensão punitiva em relação ao dano, pelo decurso do prazo respectivo, não alcança o delito de maior gravidade, qual seja o furto qualificado pelo dano. De modo que o prazo prescricional é regulado pelo máximo abstrato da pena priva­tiva de liberdade cominada ao delito mais grave.

Nos crimes conexos, a pena de cada infração regula o prazo prescricional respectivo, considerada isoladamente (CP, art. 108, 2â parte). Assim, se o sujeito, para cometer um es­telionato, pratica um homicídio (conexão teleológica), a even­tual prescrição no tocante ao delito-fim (estelionato) não cau­sa nenhum efeito no prazo prescricional em relação ao ho­micídio (delito-meio).

No caso de conexão material (real, penal) de crimes, ob­jetos do mesmo processo, a interrupção da prescrição em rela­ção a um deles estende-se aos demais. Assim, as causas interruptivas da prescrição, cuidando-se de conexão, são co­municáveis entre os delitos (CP, art. 117, § l 2, 2- parte). Nes­se sentido: TACrimSP, ACrim 440.973, JTACrimSP, 92:237.

Exemplo: um sujeito é processado, em uma só ação pe­nal, por dois delitos (estelionato e apropriação indébita). E condenado pelo estelionato; absolvido da imputação de apro­priação indébita. A sentença condenatória recorrível proferida em relação ao estelionato, além de interromper o prazo pres­cricional a respeito desse delito, interrompe o lapso extintivo no tocante à apropriação indébita.

Outro exemplo: réu processado por homicídio e lesão corporal, em conexão. A pronúncia no tocante ao homicídio

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interrompe o prazo prescricional relativo à lesão corporal.E se uma das infrações for contravenção?É aplicável o art. 117, § Ia, 2â parte, nos termos do art.

I2 da LCP, que determina a incidência das regras gerais do CP às contravenções. Ex.: réu pronunciado por homicídio e vias de fato (dois sujeitos passivos). A pronúncia em relação ao homicídio estende seu efeito interruptivo da prescrição à con­travenção (e vice-versa).

É necessário que a conexão entre os delitos seja a real, de natureza penal, e não a formal, de conteúdo processual penal.

Quando um crime é qualificado pela conexão, a eventual prescrição da pretensão punitiva no tocante ao delito de me­nor gravidade não impede, quanto aos outros, o reconhecimen­to da qualificadora resultante da conexão (CP, art. 108, parte final). Suponha-se que o sujeito, para estuprar a ofendida, mateo seu marido. Responde por dois crimes: estupro e homicídio qualificado pela conexão teleológica (CP, art. 121, § 2e, V). A eventual extinção da punibilidade pela prescrição da pre­tensão punitiva no tocante ao estupro não impede a qualifica­dora do homicídio.

16. CRIMES ACESSÓRIOS

Existem delitos, denominados acessórios, que não exis­tem por si sós, subordinando-se a práticas delituosas anterio­res. Exemplos: receptação, favorecimento real e pessoal. Eles funcionam com certos delitos chamados pressupostos. Assim, a receptação pressupõe um delito anterior, que pode ser o fur­to. Nesse caso, a eventual prescrição da pretensão punitiva em relação ao furto não se estende à receptação. Aplica-se o dis­

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posto no art. 108, parte, do CP, que reza: “A extinção da punibilidade de crime que é pressuposto de outro” “não se es­tende a este”.

17. IMUNIDADE PARLAMENTAR PROCESSUAL

Os Senadores e Deputados Federais, pelos delitos que não são de opinião (CF, art. 53, caput, com redação da Emenda Constitucional n. 35, de 20-12-2001), podem livremente ser processados, tendo sido extinta a licença de sua Casa. A Câ­mara Federal ou o Senado, contudo, podem sustar o andamen­to da ação penal, ficando suspenso o curso da prescrição da pre­tensão punitiva (CP, art. 109) (art. 53, § 5Q, com redação da Emenda Constitucional n. 35/2001)29. De modo que, encerrado ou extinto o mandato por qualquer motivo, a ação penal pode ter prosseguimento, desde que ainda presente a punibilidade.

Quanto aos Deputados Estaduais, incidem os mesmos princípios.

18. SANÇÃO COMPLEXA

Fala-se em sanção complexa nas hipóteses em que são impostas penas cumulativas, como detenção e multa, reclusão e multa etc. Nesses casos, a pena mais leve, que é a multa, segue a sorte da pena mais grave (CP, art. 118). Assim, tratan­do-se de furto, em que o legislador comina pena de reclusão e multa (CP, art. 155, caput), o prazo prescricional da pretensão punitiva é regulado pela pena mais grave (a detentiva).

29. Veja o tema nas causas suspensivas da prescrição.

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19. MULTA

0 art. 114 do CP, de acordo com a Lei n. 9.268, de l 2-4-1996, passou a ter a seguinte redação:

“A prescrição da pena de multa ocorrerá:1 — em dois anos, quando a multa for a única cominada

ou aplicada;II — no mesmo prazo estabelecido para a prescrição da

pena privativa de liberdade, quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada”.

A redação antiga rezava que a prescrição decorria em dois anos quando a pena de multa era a única cominada, a única aplicada ou a que ainda não tinha sido cumprida. Previa os seguintes casos, ocorrendo a prescrição, quer da pretensão pu­nitiva, quer da pretensão executória, sempre em dois anos: l 2) multa como única sanção abstratamente cominada, como em algumas hipóteses de contravenção; 22) multa como única san­ção imposta na sentença condenatória; 32) pena de multa que ainda não havia sido cumprida (pena detentiva cumprida; mul­ta ainda não paga).

A lei nova prevê quatro casos de prescrição da pretensão punitiva da multa:

l e) multa como única pena abstratamente cominada: prescrição em dois anos (inciso I, 1~ parte);

2e) multa como única pena imposta na sentença conde­natória: prescrição em dois anos (inciso I, 2~ parte). O princí­pio somente incide sobre a prescrição da pretensão punitiva interrompida pela sentença que só impôs multa (CP, art. 117,IV) e a prescrição superveniente à sentença condenatória (CP, art. 110, § l e). Inexiste prescrição da pretensão executória pe­nal da multa, uma vez que, transitando em julgado a sentença condenatória, o seu valor deve ser inscrito como dívida ativa da Fazenda Pública, deixando “a execução” de apresentar na­tureza penal. Assim, a prescrição obedece ao art. 144, caput, do CTN e não ao Código Penal;

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3S) multa cominada alternativamente com pena privati­va de liberdade: prazo igual ao estabelecido para a prescrição da pretensão relativa à pena detentiva (inciso II);

4Q) m ulta com inada cum ulativam ente com pena detentiva: prazo igual ao da pena privativa de liberdade (inci­so II). De notar-se que as hipóteses de cumulação ou altemação abstrata da pena pecuniária com a detentiva, no tocante à pres­crição da pretensão punitiva, já estavam disciplinadas no art. 118 do CP: “As penas mais leves prescrevem com as mais gra­ves”. Penas mais leves são a multa e as restritivas de direitos. De modo que a inovação era desnecessária, uma vez que a Lei n. 9.268/96 não revogou o art. 118 do CP.

20. IDADE DO AGENTE (MENORIDADE RELATIVA E MAIORIDADE SENIL)

Quando o criminoso era, ao tempo da realização da con­duta, menor de vinte e um anos de idade, sendo maior de de­zoito (menoridade relativa), ou maior de setenta anos (maiori­dade senil) ao tempo da sentença ou acórdão condenatório, o prazo prescricional da pretensão punitiva é reduzido de meta­de (CP, art. 115). Sobre essa causa de redução do lapso extintivo da pretensão estatal nenhuma influência tem a eman­cipação civil ou o casamento do agente.

O sujeito é menor de vinte e um anos de idade até o dia anterior à data de seu aniversário. De modo que, cometendo o delito no dia em que completa os vinte e um anos, já é conside­rado maior. Da mesma forma, é maior de setenta anos a partir do primeiro momento do dia em que completa essa idade30.

30. RT, 676:308. Tem-se entendido aplicável a redução do prazo quan­do o condenado completa essa idade na pendência de apelação sua (TJSP, RT, 674:282; TACrimSP, EI 801.695, RJDTACrimSP, 26:203).

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Tratando-se de crime continuado, há jurisprudência no sentido de que, se o sujeito iniciou a série de delitos parcela- res antes dos vinte e um anos de idade e a terminou depois, incide a redução do prazo prescricional31. Cremos, entretanto, que a questão deve ser posta em outros termos. Cuidando-se de espécie de concurso de crimes, cada delito parcelar da con­tinuação tem o seu próprio prazo prescricional. Assim, a redu­ção só ocorre no tocante aos delitos praticados antes dos vinte e um anos de idade do agente. Nesse sentido, adotando nossa posição: STF, HC 72.690, I a Turma, Rei. Min. Moreira Alves, DJU, 15 mar. 1996, p. 7203.

A menoridade e a idade senil são circunstâncias de caráter pessoal e, por isso, incomunicáveis no concurso de pessoas (CP, art. 30). Suponha-se um furto qualificado por dois sujeitos, sendo um deles menor de vinte e um anos de idade. Extinta a punibilidade pela prescrição, reduzido o prazo em face da meno­ridade, o outro réu prossegue respondendo pelo tipo qualificado.

A prova da idade se faz, nos termos do art. 155 do CPP, pela certidão de nascimento, não bastando o RG ou a simples alegação não contestada pela acusação32.

31. RJTJSP, 71:354. Contra: RT, 526:368.32. É a posição da jurisprudência, inclusive do STF e o STJ (STF, RT,

508:456 ,518:318,526:387,547:420,567:406 e 549:431: RTJ, 78:221,79:14, 85:1047 e 92:1305; STJ, REsp 1.856, 5a Turma, DJU, 28 maio 1990, p. 4738; REsp 2.924, 6 a Turma, JSTJ, 77:223; STF, HC 68.466, Rei. Min. Celso de Mello, DJU, 8 mar. 1991, p. 2204; RTJ, 775:1284; HC 73.338, Ia Turma, Rei. Min. Celso de Mello, DJU, 19 dez. 1996, p. 51766). Súmula 74 do STJ: “Para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil”. No mesmo sentido, quanto à maioridade senil: STJ, RHC 3.013,5aTurma, DJU, 25 out. 1993, p. 22503 e 22504. Contra: RT, 559:318, 567:343, 677:381 e 648:246. No sentido de que a interpretação do art. 155 do CPP não pode ser muito rígida, admitindo, quando impossível a demonstração da idade nos termos da lei civil, a prova mediante a apresenta­ção da carteira de trabalho: TJSP, ACrim 68.631, Rei. Des. Dante Busana, RT, 648:246. Vide sobre o assunto a nota jurisprudencial no capítulo da prescrição retroativa, no item “menoridade relativa”.

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Segundo nosso entendimento, o art. 115 do CP não foi ab-rogado ou derrogado pelo art. 52 do novo CC, que baixou a maioridade para 18 anos33. Como ensinava Aníbal Bruno, apre­ciando a capacidade penal relativa do agente, “de 18 a 21 anos incompletos, a lei não lhe reconhece uma maturidade mental concluída e, embora o considere imputável, concede-lhe, em caso de fato definido na lei como crime, a atenuante da meno- ridade. A essa razão de imputabilidade deficiente, embora não propriamente ausente ou diminuída a ponto de justificar a ex­clusão da pena ou a sua sensível redução, vem juntar-se o in­teresse da ordem jurídica em que se poupe o menor à ação perversora da prisão, encurtando-lhe quanto possível o perío­do do seu internamento”34. Como decidiu o TJSP, o delinqüen­te menor não está em condições iguais às do delinqüente adulto para suportar o rigor da condenação (RT, 427:379). Rogério Greco observa que, “em várias de suas passagens, o Código Penal se preocupa em dar um tratamento diferenciado aos agentes em razão da idade deles. Cuida de modo especial da­queles que, ao tempo da ação ou omissão, eram menores de21 anos, uma vez que ainda não estão completamente amadu­recidos e vivem uma das fases mais complicadas do desenvol­vimento humano, que é a adolescência. Estão, na verdade, numa fase de mudança, saindo da adolescência e ingressando na fase adulta”35. Em face disso, i. e., em razão de sua “imatu­

33. Vide nosso Código Penal anotado; nota ao art. 115, São Paulo, Saraiva.

34. Comentários ao Código Penal, Rio de Janeiro, Forense, 1969, v. 2, p. 135.

35. Curso de direito penal, parte geral, Rio de Janeiro, Impetus, 2002, p. 561.

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ridade”, necessitam de “tratamento especial”36. No sentido do fundamento da “imaturidade”: Heleno Cláudio Fragoso37, Gui­lherme de Souza Nucci38, o que vem sendo adotado pelas le­gislações modernas. Por essas razões, o art. 115 do CP não foi alterado pelo art. 52 do novo CC. Subsiste.

21. CAUSAS SUSPENSIVAS

a) Conceito

É possível que o prazo prescricional não tenha curso du­rante certo período, como se tivesse um intervalo, recomeçan­do a correr quando de seu término. É o que se chama “suspen­são da prescrição”. Caracteriza-se pela circunstância de, ces­sada a causa suspensiva, recomeçar a ter curso o prazo prescricional aproveitando o lapso anteriormente decorrido.

Exemplo:1 ano 2 anos

I----- 1 ano e 1/2 ------1

A ------------- PPPP ----------- B --------- C S---------- C _ 1 ano — D

A—B = prazo prescricional da pretensão punitiva (PPPP)CS = causa suspensiva

36. Cezar Roberto Bitencourt, Código Penal comentado, São Paulo, Saraiva, 2002, p. 229.

37. Lições de direito penai, nova parte geral, Rio de Janeiro, Forense, 1985, p. 356, n. 339.

3 8. Código Penal comentado, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000, p. 252, n. 78.

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B—C = tempo de suspensão do prazo prescricional

Suponha-se que durante dois anos esteja em curso o pra­zo prescricional da pretensão punitiva (PPPP), de A a B. No ponto B incide a causa suspensiva (CS). Imagine-se que per­maneça suspenso o prazo prescricional durante um ano e meio (de B a C). Terminado esse período de ano e meio, i. e., cessa­do o efeito da causa impeditiva (suspensiva), o prazo recomeça a correr no ponto C no sentido do ponto D, aproveitando-se os dois anos anteriores. De modo que, quando chegarmos ao pon­to D, devem ser computados três anos de prescrição, con­siderando-se o lapso de um ano entre os pontos Ce D.

0 CP disciplina as causas suspensivas da prescrição da pretensão punitiva no art. 116: “Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre:

1 - enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o conhecimento da existência do crime;

II - enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro”.A enumeração legal é taxativa, não admitindo ampliação.

Assim, não constituem causas suspensivas da prescrição o in­cidente de insanidade mental do acusado (CPP, arts. 149 e s.)39, o processo administrativo, encontrando-se sobrestada a ação penal40 e os embargos de declaração (STJ, HC 2.802, 5à Tur­ma, DJU, 14 nov. 1994, p. 30963).

b) Questões prejudiciais

A primeira hipótese cuida das questões prejudiciais, obri­gatórias ou facultativas, disciplinadas nos arts. 92 a 94 do CPP.

39. TACrimSP, RT, 575:398 e 399.40. Vide art. 1.525 do CC.

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Exemplo: imagine-se que o réu, processado por apropriação indébita (CP, art. 168), alegue na defesa prévia que o objeto material lhe pertencia ao tempo do fato, questão que está sendo discutida, em ação própria, na esfera civil. O Juiz criminal deve suspender o andamento da ação penal até que seja decidida a questão civil, de que depende a existência da apropriação indébita. Durante o prazo da suspensão não corre a prescrição da pretensão punitiva. Suponha-se que ao tempo do despacho que determinou o sobrestamento do processo criminal tivésse­mos o decurso de dez meses a partir da data do recebimento da denúncia. Cessada a causa suspensiva e prosseguindo a ação penal os seus trâmites, o prazo prescricional recomeça a correr, computando-se aqueles dez meses anteriormente decorridos.

Nos crimes contra a honra, a oposição da exceção da ver­dade não constitui causa suspensiva da prescrição, uma vez que não se trata de prejudicial civil e sim penal. Não há preju­diciais penais. Nesse sentido: TACrimSP, ACrim 595.343, RJDTACrimSP, 5:80.

c) Cumprimento de pena no estrangeiro

O segundo caso cuida do cumprimento de pena no es­trangeiro, circunstância que impede o decurso do prazo prescricional. Não pode ser extraditado o sujeito que está cum­prindo pena no estrangeiro. Por essa razão, no Brasil não é justo que corra lapso prescricional extintivo da pretensão pu­nitiva. Se, contudo, o agente cumpre pena, por outro motivo, no Brasil, o curso prescricional não fica impedido.

d) Imunidade parlamentar processual penal

Os Deputados Federais e Senadores respondem criminal- mente por delitos que não sejam de opinião. Nesses casos, não

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há exclusão funcional de pena (imunidade parlamentar mate­rial). O fato constitui delito e é punível seu autor. Os parla­mentares, entretanto, por medida de utilidade pública, têm prerrogativa: quanto aos referidos crimes, aqueles não alcan­çados pela indenidade material, embora possam ser livremen­te processados, mesmo sem licença de sua Casa, a esta atri- bui-se a iniciativa de suspender o andamento da ação penal, nos termos do art. 53, §§ 32 e 42, com redação da Emenda Constitucional n. 35, de 20-12-2001. Nessa hipótese, recebida a denúncia por crime praticado após a diplomação, o STF de­verá dar ciência à Casa respectiva, que, mediante pedido de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a sentença final, sustar o andamen­to da ação penal (§ 32). O pedido de sustação será apreciado pelo Senado ou pela Câmara Federal no prazo improrrogável de quarenta e cinco dias, a partir de seu recebimento pela Mesa Diretora (§ 42). Sustado o processo, fica suspenso o prazo prescricional da pretensão punitiva enquanto durar o mandato do parlamentar (§ 52). Terminado o exercício do mandato e cessado o efeito da causa suspensiva da prescrição, a ação pe­nal e a prescrição da pretensão punitiva retomam seu curso, se não ocorre causa de extinção da punibilidade, levando-se em conta o período anterior decorrido.

e) Suspensão condicional do processo

A Lei n. 9 .099, de 26-9-1995, que in stitu iu os Juizados Especiais Crim inais, criou mais uma causa suspensiva da prescrição: não corre o curso da prescrição da pretensão punitiva durante a suspensão condicional do processo (art. 89, § 6S).

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f) Suspensão do processo

A Lei n. 9.271, de 17-4-1996, deu nova redação ao art. 366 do CPP, determinando o caput: “Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, poden­do o juiz determinar a produção antecipada das provas consi­deradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312” (do CPP).

O legislador criou mais uma causa suspensiva (ou impe­ditiva) da prescrição. Sobrestado o processo, o prazo pres­cricional cessa o seu curso até o comparecimento do acusado, data em que novamente recomeça a correr (art. 366, § 2a), computando-se o tempo anterior. Assim, cessada a suspensão, a prescrição prossegue, levando-se em conta, no cálculo, o tempo anteriormente decorrido. Suponha-se que um ano após o recebimento da denúncia, causa interruptiva do prazo prescricional (CP, art. 117,1), o processo venha a ser suspenso. Dois anos depois, comparecendo o réu, a ação penal tem se­guimento. O ano anterior à suspensão deve ser computado, prosseguindo o decurso do tempo prescricional. O termo final do prazo de suspensão é a data de comparecimento do acusa­do, pessoalmente ou por intermédio de defensor, e não a do despacho judicial que determina o prosseguimento do feito, se posterior.

O legislador simplesmente determina que o decurso do tempo prescricional fica suspenso. Não limita o prazo. Sobre o tema, há várias correntes: l â) a lei não fixou limite, de modo que o termo final do prazo suspensivo ocorre na data em que o réu comparece em juízo, qualquer que seja o tempo decorrido (Alberto Silva Franco, Suspensão do processo e suspensão da prescrição, Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Crimi­nais, São Paulo, 42:2, jun. 1996); 2â) deve ser considerado o máximo abstrato da pena privativa de liberdade cominada à in-

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fração penal. Nesse sentido: Fernando da Costa Tourinho Neto, Citação. Revelia. Suspensão do processo e da prescrição (CPP, art. 366), Revista do Ministério Público, Rio de Janeiro, 6:59, jul./dez. 1997; Edson Alfredo Smaniotto, Revelia e prescrição, Enfoque Jurídico, Suplemento do Informe TRF I a Região, 3:9; 3â) leva-se em conta o mínimo abstrato da pena privativa de li­berdade cominada; 4-) tem-se em vista o limite máximo do pra­zo prescricional previsto em nossa legislação, que é de vinte anos (CP, art. 109, I); 5-) o limite temporal da suspensão é o mesmo da prescrição (CP, art. 109), em atenção ao mínimo abs­trato da pena privativa de liberdade; 6a) o limite extremo supe­rior da suspensão da prescrição é o mesmo do art. 109 do CP, regulado pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada à infração penal; 7â) o processo pode ficar suspenso até trinta anos, limite máximo do cumprimento da pena privativa de li­berdade (CP, art. 75, caput).

Entendemos que o prazo de suspensão da prescrição não pode ser eterno. Permitindo-se a suspensão da prescrição sem limite temporal, esta, não comparecendo o réu em juízo, ja­mais ocorreria, encerrando-se o processo somente com a sua morte, causa extintiva da punibilidade (CP, art. 107,1). Não se trata, como se tem afirmado, de haver o legislador, aceita a tese da eternidade, criado indevidamente mais uma causa de imprescritibilidade. As hipóteses em que se proíbe a prescri­ção encontram-se constitucionalmente previstas em enuncia- ção taxativa (CF, art. 5e, XLII e XLIV), não admitindo em nenhum momento o decurso do prazo extintivo da pretensão punitiva. No caso em tela, entretanto, a prescrição começa a correr a partir da data do fato, interrompendo-se pelo recebi­mento da denúncia ou queixa e suspendendo-se em face da revelia. Não se pode, pois, falar em “imprescritibilidade”. Tra­ta-se de mera causa impeditiva ou suspensiva da prescrição. Se, em face do crime, o Estado perde, pelo decurso do tempo, a pretensão punitiva, não é lógico que, diante da revelia, pudesse

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exercê-la indefinidamente. Por isso, entendemos que o limite da suspensão do curso prescricional corresponde aos prazos do art. 109 do CP, considerando-se o máximo da pena privativa de li­berdade imposta abstratamente. Nesse sentido: Fernando da Costa Tourinho Neto, Citação. Revelia. Suspensão do processo e da prescrição (CPP, art. 366), Revista do Ministério Público, Rio de Janeiro, 6:59, jul./dez. 1997. Assim, p. ex., suspensa ação penal por crime de lesão corporal leve (CP, art. 129, ca­put), o impedimento do curso prescricional tem o termo máxi­mo de quatro anos (CP, art. 109, V), i. e., o prazo prescricional da pretensão punitiva só pode ficar suspenso até quatro anos. Nesse limite, recomeça a ser contado o lapso extintivo, que é de quatro anos, considerada a pena máxima abstrata, compu­tando-se o tempo anterior à suspensão. Cremos constituir um critério justo. Se, para permitir a perda da punibilidade pela prescrição, o legislador entendeu adequados os prazos do art. 109, da mesma forma devem ser apreciados como justos na disciplina da suspensão do prazo extintivo da pretensão puni­tiva. Nesse sentido, adotando nossa tese: STJ, RHC 7.052, 5a Turma, Rei. Min. Félix Fischer, DJU, 18 maio 1998, p. 114; Revista Jurídica, Porto Alegre, Síntese, 249:100, jul. 1998.

Terminado o prazo de suspensão da prescrição, recome­ça a correr, levando-se em conta o máximo abstrato da pena privativa de liberdade e o tempo anteriormente decorrido. A ação penal, entretanto, continua suspensa.

Se cominada abstratamente somente pena de multa, como em algumas contravenções, considera-se o prazo de dois anos (CP, art. 114, I). Assim, a prescrição pode ficar suspensa até dois anos. Encerrado o biênio, recomeça a ser contado o perí­odo prescricional, também de dois anos, computando-se o tem­po anterior à suspensão.

A norma do art. 366, caput, do CPP, na parte em que determina a suspensão do processo, tem natureza processual

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penal, uma vez que disciplina o “desenvolvimento do pro­cesso” (Manzini, Trattato di diritto processuale penale, v. 1, p. 68 e 69). Quando, entretanto, prevê a suspensão do prazo prescricional, é de direito penal material. Temos, então, uma disposição mista, impondo princípios de direito substantivo e processual. Quando isso ocorre, prevalece a natureza pe­nal. E assim convém, uma vez que a suspensão do processo gera, fatalmente, o impedimento do decurso prescricional. O juiz, nos termos da nova legislação, sobrestando o processo, provoca automaticamente a suspensão do lapso prescricional, proibindo que o feito se dirija à extinção da punibilidade. Não se pode, pois, dissociar as duas formas de suspensão, a do processo e a da prescrição, para se conferir à lei incidên­cia imediata no que tange ao sobrestamento da ação penal (CPP, art. 2a) e efeito irretroativo na parte em que impõe a suspensão da prescrição (CP, art. 22, parágrafo único). A sus­pensão do prazo prescricional em face do sobrestamento da ação penal era desconhecida em nossa legislação. Logo, o art. 366, nesse ponto, é mais gravoso que o ordenamento legal anterior (novatio legis in pejus). Deve ser, por isso, irretroativo por inteiro, não se aplicando às infrações penais cometidas antes da vigência da lei (CF, art. 5Q, XL; CP, art. 2a, parágrafo único). De modo que, praticada infração penal a partir da vigência da Lei n. 9.271/96 (17-6-1996), se o réu, citado por edital, não comparecer ao interrogatório, deixan­do de constituir defensor, ficarão suspensos o processo e a prescrição da pretensão punitiva. As infrações penais anteri­ores, entretanto, não são atingidas pela lei nova. Nesse senti­do: STJ, HC 5.546, 6a Turma, DJU, 16 jun. 1997, p. 27403; RHC 6.406, 6a Turma, DJU, 23 jun. 1997, p. 29194; HC 5.677, 6- Turma, DJU, 23 jun. 1997, p. 29191; RHC 6.372, 6a Turma, DJU, 30 jun. 1997, p. 31083; REsp 129.084, 6a Turma, DJU, 8 set. 1997, p. 42636; RHC 6.353, 5a Turma,

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DJU, 29 set. 1997, p. 48236; RHC 6.520, 5â Turma, DJU, 29 set. 1997, p. 48237; REsp 129.083, 5à Turma, DJU, 6 out.1997, p. 50035. O conteúdo processual penal da norma, em­bora mista, impede que seja aplicada aos processos findos. Nesse sentido, analisando os arts. 88 e 91 da Lei n. 9.099/ 95: Ada Pellegrini Grinover, Direito intertemporal e âmbito de eficácia da Lei dos Juizados Especiais Criminais, Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, São Paulo, 35:4 e 5, nov. 1995.

22. CAUSAS INTERRUPTIVAS

a) Conceito

Enquanto na suspensão da prescrição o período decorrido antes de sua incidência não fica cancelado, como se fosse um parêntese em seu percurso, as causas interruptivas tomam sem efeito temporal o lapso anteriormente percorrido. Em face disso, novo prazo recomeça a correr, por inteiro (CP, art. 117, § 2°).

Exemplo:

TI CIP

A -------------- 3 anos -------------- B -------------- 4 anos --------------- C

TI = termo inicial do prazo prescricional CIP = causa interruptiva da prescrição

Suponha-se que no ponto A tenha início prazo pres­cricional de quatro anos. Três anos depois, no ponto B, ocorre

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uma causa interruptiva. O prazo anteriormente decorrido, de três anos, é cancelado, iniciando-se outra vez, no ponto B, ou­tro prazo de quatro anos, na direção do ponto C. Assim, inter­rompendo-se a prescrição, na mesma data inicia-se o mesmo prazo, considerado por inteiro.

Na suspensão da prescrição não há deslocamento do ter­mo inicial, uma vez que o lapso anterior é computado. Na inter­rupção, entretanto, desloca-se o termo a quo para a data da ocor­rência da causa que aniquila o tempo anterior. O novo prazo tem início, pois, na mesma data da ocorrência da causa interruptiva, nos termos do art. 10 do CP (incluído o dia do começo).

Nos termos do art. 117 do CP são causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva:

Ia) o recebimento da denúncia ou da queixa;2a) a pronúncia;3a) a decisão confirmatória da pronúncia; e4a) a sentença condenatória recorrível.A disposição é taxativa, não admitindo ampliação41.

b) Recebimento da denúncia ou queixa

O primeiro obstáculo interruptivo é o recebimento da denúncia ou da queixa, não seu oferecimento pelo Ministério Público ou querelante.

41. Decidiu o STF que a decisão no pedido de extradição não consti­tuí causa interruptiva da prescrição (HC 60.802-BA, Plenário, em 20-4- 1983, v. un., Rei. Min. Djaci Falcão, DJU, 3 jun. 1983, p. 7879; RTJ, 107:150). O elenco do art. 117 é exaustivo (STF, HC 69.798, 2- Turma, Rei. Min. Marco Aurélio, RT, 699:424). Nem os embargos de declaração (STJ, HC 2.802, 5â Turma, DJU, 14 nov. 1994, p. 30963; TACrimSP, ACrim 786.009, RT, 772:424).

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Exemplo:

BA 1 ano RD 2 anos

2 anos|------------------- 1------ - --------1

1 ano E

C = data do crimeRD = recebimento da denúncia

Imagine-se que o sujeito, no ponto A, tenha cometido um delito de ameaça (CP, art. 147), a que o legislador comina a pena máxima abstrata inferior a um ano de detenção. O prazo prescricional da pretensão punitiva é de dois anos (CP, art. 109, VI). A partir do ponto A, data da consumação do crime, está correndo o prazo de dois anos, findos os quais o Estado perde a pretensão punitiva (no ponto B). Ocorre, entretanto, que um ano e meio depois da consumação do crime, no ponto D, a denúncia vem a ser recebida (RD). A prescrição ficou inter­rompida, cancelado o tempo anteriormente decorrido (um ano e meio). Diante disso, na mesma data do recebimento da de­núncia, no ponto D, recomeça a ser contado outra vez o prazo de dois anos, no sentido do ponto E.

A interrupção ocorre na data da publicação do despacho que recebe a denúncia ou a queixa, i. e., no dia em que o es­crivão recebe o processo com a decisão42.

42. No sentido do texto: TJSP, RT, 298:300. Contra, em termos de que a causa interruptiva ocorre na data do despacho e não na em que é publicado: STF, RT, 472:410.

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O recebimento de denúncia posteriormente anulada não interrompe o prazo prescricional. Nesse sentido: STJ, REsp 13.461, 5a Turma, DJU, 4 nov. 1991, p. 15696, RT, 684:382; STF, HC 69.047, Ia Turma, DJU, 24 abr. 1992, p. 5377, RTJ, 141:192. Oferecida nova denúncia, é de seu recebimento que se conta o prazo prescricional. A ratificação ou retificação de seus termos eqüivale a uma nova denúncia (STJ, RHC 6.488, 6a Turma, j. 11-12-1997, DJU, 23 mar. 1998, p. 169.

Anulada a ação penal em face de incompetência do Juízo e oferecida nova denúncia, é na data do recebimento desta que se interrompe o prazo prescricional43.

Se a denúncia ou a queixa vem a ser recebida pelo Tribunal em processo de sua competência originária ou diante de recurso em sentido estrito da rejeição em primeiro grau, o prazo prescri­cional é interrompido na data da sessão de julgamento. Havendo embargos infringentes, o acórdão que os julga, mantendo o re­cebimento da denúncia ou queixa, não tem efeito interruptivo. A interrupção ocorre quando do julgamento do recurso em sen­tido estrito, i. e., quando do recebimento das peças referidas44.

43. Inq. 159, Plenário do STF, em 12-11-1986, DJU, 5 dez. 1986, p. 24079; RTJ, 724:403; HC 64.290,2a Turma do STF, em 18-12-1986, DJU, 20 fev. 1987, p. 2179; RT, 620:400 e RTJ, 120:622. Entendeu o STF, antes da CF de 1988, que, processado o réu no juízo singular e eleito Deputado Federal, o anterior recebimento da denúncia, diante da incompetência absoluta, provo­cando a nulidade ou ineficácia dos atos decisórios, toma inaplicável o art. 117, I, do CP, i. e., o anterior recebimento da denúncia perde o efeito interruptivo da prescrição (RT, 615:353). Essa interpretação é discutível, uma vez que a incompetência absoluta surgiu em face de causa superveniente (a eleição do réu como Deputado Federal). A situação é diferente daquela em que, desde o início da ação penal, o juízo era absolutamente incompetente.

44. RHC 65.676, l âTurma do STF, em 15-12-1987, v. un., Rei. Min. Octavio Gallotti, DJU, 26 fev. 1988, p. 3193; REsp 11.195, 5a Turma do STJ, DJU, 16 set. 1991, p. 12645.

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Se a denúncia é aditada para correção de irregularidades, nos termos do art. 569 do CPP, sem descrição de fato novo, não há interrupção da prescrição.

Havendo descrição de fato crim inoso novo, seu recebi­mento tem efeito in terruptivo. N esse sentido: TACrimSP, ACrim 518.273, RJDTACrimSP, 4:132. De ver-se, entretanto, que a interrupção só diz respeito ao fato novo contido no adi­tamento, não em relação ao descrito na denúncia.

Não há interrupção do prazo prescricional na hipótese de o juiz receber aditamento do M inistério Público, nos termos do art. 384, parágrafo único, do CPP, para efeito de alterar sim­plesmente a capitulação legal do fato para form a mais severa­mente apenada (TACrimSP, HC 227.304, RT, 693:351).

Havendo aditamento da denúncia para inclusão de co- autor ou partícipe do crime, aplica-se o art. 117, § 1-, l â parte. O recebimento da denúncia contra o prim eiro co-autor ou par­tícipe interrompe o prazo prescricional, estendendo seu efeito ao outro. De modo que o recebim ento do aditam ento não tem efeito interruptivo (nesse sen tido : STF, H C 67.888, RT, 055:384; TACrimSP, RvCrim 223.730, RT, 693:350). Contra, no sentido interruptivo: TACrimSP, ACrim 516.193, RJDTA­CrimSP, 2:128; ACrim 518.273, RJDTACrimSP, 4 :132.

Na ação penal por crim e contra a honra (CPP, art. 519), a interrupção da prescrição não ocorre com o despacho que de­termina a intimação das partes para a audiência de reconcilia­ção e sim quando, frustrada esta, a denúncia vem a ser recebi­da (STF, HC 70.592, l â Turma, DJU, 17 mar. 1995, p. 5789).

c) Pronúncia e sua confirmação

A pronúncia tam bém interrom pe o prazo prescricional (CP, art. 117, II). Nos processos da com petência do Júri (CPP,

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art. 74, § l e), “se o Juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dan­do os motivos do seu convencimento” (CPP, art. 408, caput). A decisão, que remete o réu a julgamento pelo Tribunal do Júri, tem efeito interruptivo da prescrição na data de sua pu­blicação (CPP, art. 389), i. e., na data em que o juiz entrega os autos ao escrivão. Nesse sentido: STF, HC 73.242, 2a Turma, DJU, 24 maio 1996, p. 17413 e 17414. Sendo pronunciado por tentativa de homicídio e vindo a vítima a falecer, nova pro­núncia deve ser proferida. Neste caso, a primeira deve ser con­siderada inexistente, produzindo apenas a segunda efeito interruptivo da prescrição (TJSP, RvCrim 139.149, JTJ, 750:311 e RT, 708:296). Vindo o réu a ser absolvido no julga­mento popular, ainda assim a pronúncia anterior conserva esse efeito45. Se o réu é impronunciado (CPP, art. 409) ou absolvi­do sumariamente (CPP, art. 411), vindo a ser pronunciado pelo Tribunal em face de recurso oficial ou voluntário, o acórdão que o pronuncia também interrompe a prescrição.

Havendo desclassificação na fase da pronúncia (CPP, art. 408, § 4S), há dois princípios:

Ia) se o Juiz desclassificar o crime para outro, da com­petência do Júri, pronunciando o réu, a decisão interrompe a prescrição46. Exemplo: de homicídio para infanticídio;

2S) se o Juiz desclassificar o crime para outro, da com­petência do Juiz singular (CPP, art. 410), tal decisão não tem efeito interruptivo da prescrição. Nesse sentido: TJSP, ACrim 90.491, RJTJSP, 752:498; TACrimSP, ACrim 922.809, RT, 725:595.

45. RT, 513:421.46. HC 61.491,2a Turma do STF, em 3-2-1984, v. un., Rei. Min. Djaci

Falcão, DJU, 24 fev. 1984, p. 2204.

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Da mesma forma, se o Júri desclassifica o delito para outro, da competência do Juiz singular, entendemos que a pro­núncia, imprópria para o rito processual do crime desclassifi­cando, não tem efeito interruptivo da prescrição47. O STJ, po­rém, na Súmula 191, adotou posição contrária: “A pronúncia é causa interruptiva da prescrição, ainda que o Tribunal do Júri venha a desclassificar o crime”.

O acórdão confirmatório da pronúncia também tem efei­to de interromper o lapso prescricional (CP, art. 117, III). Ocor­re quando improvido o recurso em sentido estrito interposto pela defesa (CPP, art. 581, IV). O momento interruptivo ocor­re na data do julgamento do recurso.

d) Sentença condenatória recorrível

A sentença condenatória recorrível também possui efeito de interromper o prazo prescricional da pretensão punitiva (CP, art. 117, IV), ainda que parcialmente reformada pelo Tribunal (STF, HC 70.949, I a Turma, DJU, 17 jun. 1994, p. 15709). Isso ocorre na data em que o escrivão recebe o processo, com a sentença, do Juiz, i. e., na data de sua publicação (CPP, art. 389),

47. TACrimSP, ACrim 522.665, JTACrimSP, 97:311; TARS, ACrim 296036924,4â Câm., j. 13-11-1996, RT, 739:694. Para o STF, entretanto, tal desclassificação não impede o efeito interruptivo da pronúncia (HC 61.491, 2a Turma, em 3-2-1984, v. un., Rei. Min. Djaci Falcão, DJU, 24 fev. 1984, p. 2204; RHC 63.166-RJ, Ia Turma, em 16-8-1985, m. v., Rei. Min. Néri da Silveira, DJU, 27 set. 1985, p. 16610 e 16611; RTJ, 124:969). No mesmo sentido: TJSP, RECrim 70.192, RT. 650:264; STJ, RHC 666, RT. 660:245, e JSTJ, 18:233; STJ, REsp 11.813, 5a Turma, DJU, 7 out. 1991, p. 13980; STJ, RHC 2.871, 6a Turma, DJU, 11 out. 1993, p. 21342. No sentido da nossa posição: JTACrimSP, 68:411 e 92:303; TJSP, HC 74.280, RJTJSP, 777:487 e 774:301.

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independentemente do registro e outras diligências48. No mes­mo sentido: STJ, HC 9.311, 5a Turma, DJU, 28 fev. 2000, p. 95. Assim, se o escrivão, recebendo a sentença e a lançando nos autos, somente dias depois efetua as diligências de regis­tro, intimação etc., certificando posteriormente que publicou a decisão, vale, para efeito interruptivo, aquela data inicial.

Havendo embargos de declaração (CPP, art. 382), a deci­são que esclarece a dúvida ou contradição não interrompe o prazo prescricional.

Vindo a sentença condenatória a ser reformada pelo Tri­bunal em grau de recurso, absolvendo o réu, ela conserva seu efeito interruptivo da prescrição. Pode ocorrer interposição de recurso especial ou extraordinário do acórdão absolutório. Ele não tem efeito de interromper a prescrição, de modo que o lap­so continua a correr tendo como termo inicial a data da publi­cação da sentença condenatória.

Anulada, a sentença condenatória perde o efeito interrup­tivo. Nesse sentido: STJ, RHC 6.488,6a Turma, j. 11-12-1997, DJU, 23 mar. 1998, p. 169. E como a nova sentença não poderá aplicar pena mais grave que a imposta na anterior, uma vez proibida a reformatio in pejus indireta, a prescrição da preten­são punitiva, em seus períodos entre a consumação do crime e o recebimento da denúncia ou entre esta data e a publicação da nova sentença, deve ser regulada pelo quantum da primeira pena (da sentença anulada). Este é agora o máximo que poderá ser imposto. Lógico, então, que se aplique àqueles períodos pres-

48. HC 52.118, 2- Turma do STF, DJU, 20 set. 1974, p. 6803; STJ, REsp 9.484, 5â Turma, DJU, 4 nov. 1991, p. 15695. Vide RJTJSP, 106:512 e 136:410. Inexistindo termo de publicação e ignorando-se a data em que o escrivão recebeu a decisão; prevalece a data do registro da sentença (TACrimSP, ACrim 509.139, RJDTACrimSP, 2:129).

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cricionais49. Por isso, ela pode ser desde logo declarada no pró­prio acórdão que anulou a sentença. Há, contudo, divergência jurisprudencial a respeito do momento em que a prescrição pode ser declarada: se no próprio acórdão anulatório ou na nova sentença50.

Confirmada pelo Tribunal a sentença condenatória, o acórdão não tem efeito de interromper o prazo prescricional51. Ao contrário do acórdão que mantém a pronúncia, ao que mantém a condenação não se aplica o disposto no art. 117, IV, do CP.

O acórdão que, em recurso da acusação, agrava a pena, não interrompe o prazo prescricional. Trata-se de acórdão con- firmatório e não condenatório52.

49. STF, l â Turma, em 26-11-1985, DJU, 14 fev. 1986, p. 1207 e 1208; RTJ, 116:955.

50. Veja estudo a respeito do item Reformado in pejus no tema da prescrição retroativa.

51. RT, 544:384; JTACrimSP, 100:66; RJDTACrimSP, 14:154; STF, HC 68.321, DJU, 8 fev. 1991, p. 743; TJSP, HC 91.762, RJTJSP, 725:557; STJ, REsp 9.158, 5a Turma, DJU, 10 jun. 1991, p. 7857; REsp 10.187, 6a Turma, RT, 679:415; TACrimSP, EI 625.085, RT, 686:344; STJ, AR 15.844, 6a Turma, RT, 688:311-, STF, HC 71.007, 2a Turma, DJU, 6 maio 1994, p. 10471. Pouco importa se por unanimidade ou maioria (RT, 705:308). Não há também interrupção no caso de substituição da pena detentiva por multa (RDJTACrimSP, 5:34) ou redução da pena (STF, HC 7 1 .3 1 3 ,2a Turma, DJU, 16 set. 1994, p. 24279).

52. Há posição contrária, no sentido de que o acórdão agravador da pena interrompe o lapso prescricional (TACrimSP, ACrim 448.149, RT, 636:301; EI 448.149, JTACrimSP, 97:367; STF, HC 67.944, Ia Turma, DJU, 20 mar. 1992, p. 3321, RT, 689:422 e RTJ, 737:690; STJ, RHC 5.456, 5a Turma, DJU, l ajul. 1996, p. 24060), como também o que confere nova tipificação ao fato (STJ, RHC 5.456, 5a Turma, DJU, l e jul. 1996, p. 24060).

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Se a condenação surge em segundo grau, em face de re­curso voluntário da acusação, ou oficial, o acórdão condena- tório interrompe a prescrição na data do julgamento, pouco im­portando se unânime ou, não-unânime, sujeito a embargos infringentes (RT, 705:308). Assim, absolvido em primeira ins­tância e condenado o réu no Tribunal, interrompe-se a pres­crição na data da sessão em que houve o julgamento. O CP emprega a expressão “sentença condenatória” no sentido de “decisão”, não havendo, pois, diferença entre aquela e “acór­dão condenatório”53.

Condenado o réu por contravenção e, em face de recurso da acusação, desclassificada pelo Tribunal para crime, a sen­tença condenatória guarda o efeito interruptivo da prescrição.

Submetido o réu a novo julgamento em face de protesto (CPP, art. 607), a sentença condenatória anterior mantém seu efeito interruptivo da prescrição.

A interposição de recurso extraordinário ou especial não interrompe a prescrição da pretensão punitiva54.

Se o Juiz aplica o perdão judicial, sendo condenatória a sentença concessiva, interrompe-se o prazo da prescrição55. De ver-se, entretanto, que não há interrupção para a posição que

53. STF, RT, 580 :431 e 617:406; STJ, REsp 9.158, 5a Turma, DJU, lOjan. 1991, p. 7857; STJ, REsp 117.081,62Turma, j. 24-6-1997, p. 37922. Havendo adiamento, interrompe-se o prazo na data da última sessão (TACrimSP, RCrim 488.685, JTACrimSP, 94:522).

54. STF, Plenário, RECrim 104.500, 15-5-1985, RTJ, 128:279; RECrim 101.478, 2a Turma, em 21-3-1985, DJU, 28 jun. 1985, p. 10681; RTJ, 776:1100; RECrim 104.983, DJU, 28 jun. 1985, p. 10684; RECrim 113.403, 2- Turma, em 14-8-1987, DJU, 29 set. 1987, p. 20417; RECrim 104.961, 2a Turma, em 25-9-1987, v. un., Rei. Min. Célio Borja, DJU, 30 out. 1987, p. 23811 e 23812; RTJ, 724:1138; RTJ, 776:329.

55. STF, RECrim 104.969, 2a Turma, em 20-8-1985, v. un„ Rei. Min. Francisco Rezek, DJU, 6 set. 1985, p. 14876; RTJ, 776:329 e RT, 620:310.

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entende não possuir a sentença que o aplica caráter condena- tório56. Assim, para o STJ, a sentença que aplica o perdão ju ­dicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsis­tindo nenhum efeito condenatório (Súmula 18).

Havendo embargos infringentes, o acórdão que mantém a condenação não tem efeito interruptivo57.

No concurso de pessoas (CP, arts. 29 e 30), seja co-auto­ria ou participação, o efeito interruptivo da prescrição da pre­tensão punitiva em relação a um dos participantes se estende aos demais, salvo a reincidência e o início ou a continuação do cumprimento da pena (CP, art. 117, § l 2, l â parte).

Exemplo: dois sujeitos, em co-autoria, cometem um de­lito de furto. Um é condenado; o outro, absolvido. A sentença condenatória estende seu efeito interruptivo da prescrição ao réu absolvido. Nesse sentido: STF, HC 71.552, 2- Turma, DJU, 18 ago. 1995, p. 24896. Razão: evitar que a absolvição precá­ria, em face de eventual recurso provido da acusação, venha a acarretar tratamento diferenciado (STF, HC 71.552, 2- Turma, Rei. Min. Marco Aurélio, DJU, 18 ago. 1995, p. 24896).

Outro exemplo: homicídio cometido por dois sujeitos, em co-autoria. Processados, um é pronunciado; o outro, impronun- ciado. O Promotor de Justiça recorre. A pronúncia interrompe o prazo prescricional em relação ao réu impronunciado.

Quanto ao efeito da interrupção da prescrição nos delitos conexos, remetemos o leitor ao tema da prescrição da preten­são punitiva e crimes conexos (Capítulo III, n. 15).

56. Nesse sentido: TACrimSP, ACrim 581.921, RT, 660:300; ACrim 643.667; RJDTACrimSP, 77:138.

57. RT, 529:355; STF, HC 68.321, DJU, 8 fev. 1991, p. 743, RTJ, 134:1208; TJSP, EI 116.906, JTJ, 757:398.

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23. “SURSIS”

O art. 112, I, do CP, dispõe que, revogado o sursis, ini- cia-se o prazo prescricional na data em que transita em julga­do a decisão revocatória. Refere-se à prescrição da pretensão executória. Significa que ela não corre durante o período de prova da medida. De ver-se que na reforma penal de 1984 o período de prova do sursis só pode ter início depois do trânsi­to em julgado da sentença condenatória (Lei de Execução Pe­nal, art. 160). Dessa forma, não há mais lugar à hipótese que existia na legislação anterior, em que, encontrando-se em pe­ríodo de prova, o réu apelava, correndo prazo prescricional da pretensão punitiva. Nesse sentido: STJ, HC 1.215, 5â Turma, RT, 697:362.

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Capítulo IV DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA

1. CONCEITO

Com o trânsito em julgado da sentença condenatória, o direito de punir concreto se transforma em jus executionis: o Estado adquire o poder-dever de impor concretamente a san­ção imposta ao autor da infração penal pelo Poder Judiciário. Pelo decurso do tempo o Estado perde esse poder-dever, i. e., perde o direito de exercer a pretensão executória. Daí falar-se em prescrição da pretensão executória, impropriamente cha­mada de “prescrição da pena” e “prescrição da condenação”.

Demonstração gráfica:

C D TJSC PPE|--------------------------------- 1-------------------------------- 1------------------------------------------ 1

A -----------------------------► BC = crime D = denúnciaTJSC = trânsito em julgado da sentença condenatória PPE = prescrição da pretensão executória

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A — ► B = período durante o qual está correndo o prazo prescricional da pretensão executória

Transitando em julgado a sentença condenatória (TJSC) o Estado adquire o direito de executar a sanção penal. O exer­cício desse direito, entretanto, não pode existir indefinidamen­te. Está limitado no tempo (A — ► B). Se não iniciar a execu­ção da sanção penal dentro de certo período (de A a B), perde esse direito pela prescrição da pretensão executória (PPE).

Ela é irrenunciável (TACrimSP, RvCrim 189.006, RT, 567:288 e 289).

2. IMPRESCRITIBILIDADE

A CF de 1988, em seu art. 52, contém dois casos em que a pretensão executória não é alcançada pelo decurso do prazo prescricional:

l s) crimes de racismo (inciso XLII), definidos na Lei n. 7.716, de 5 de janeiro de 1989, com as alterações da Lei n. 9.459, de 15 de maio de 1997;

2S) “ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático” (inciso XLIX), descritos na Lei de Segurança Nacional (Lei n. 7.170, de 14-12-1983).

Sobre o tema dos crimes cometidos antes da Carta Mag­na, com referência à retroatividade ou irretroatividade dos no­vos preceitos, vide o item 2 do Capítulo III desta obra.

3. PRAZOS E FORMA DE CONTAGEM

Enquanto na prescrição da pretensão punitiva o prazo é de­terminado pelo máximo da pena privativa de liberdade comina-

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do em abstrato, na prescrição da pretensão executória é regula­do pela pena imposta na sentença condenatória (reclusão, de­tenção, prisão simples, multa etc.), variando de acordo com a tabela estabelecida no art. 109 do CP. Assim, a prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, é disciplinada exclusi­vamente pela pena privativa de liberdade. Cuidando-se, entre­tanto, de prescrição da pretensão executória, não há exclusivi­dade de nenhuma espécie de pena: o prazo prescricional varia de acordo com a espécie e quantidade dàl^enãlrnposta pek)luiz na sentença condenatória. Não há correspondência entre a pena imposta e os prazos prescricionais. Assim, uma pena de um ano de detenção tem um prazo prescricional de quatro anos e não de um ano (STF, HC 71.083, Rei. Min. Marco Aurélio, RTJ, 153:659). Na pena imposta não devem ser desconsideradas even­tuais agravantes e causas de aumento eventualmente reconhe­cidas, salvo os casos dos arts. 70 e 71 do CP, como veremos.

Reduzida a pena em face de indulto, deve ser considera­do o quantum restante para efeito da contagem do prazo prescricional executório. Nesse sentido: STF, Extradição n. 689, Plenário, DJU, 28 abr. 2000, p. 72.

Havendo substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, aquela é que comanda o lapso prescri­cional da pretensão executória (CP, art. 109, parágrafo único).

Exemplo:

A -----------------PPPP----------------- B ----------------- PPPE----------------- C

*-----------------8 anos-----------------«-j-»----------------- 4 anos

| SCCP, art. 244 \

1 ano de

detenção

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PPPP = prazo prescricional da pretensão punitiva PPPE = prazo prescricional da pretensão executória SC = sentença condenatória A — B = período da PPP B C = período da PPE

Um sujeito comete delito de abandono material (CP, art. 244), a que o legislador comina a pena de detenção, de um a quatro anos, e multa. Como o máximo da pena privativa de liberdade é de quatro anos, o prazo prescricional antes de a sentença final transitar em julgado, i. e., o prazo da prescrição da pretensão punitiva (PPPP) é de oito anos (CP, art. 109, IV), ocorrendo a partir de seus termos iniciais (ponto A; CP, art. 111). Processado, vem a ser condenado, no ponto B (SC = sen­tença condenatória), a um ano de detenção. Transitando em julgado a sentença condenatória no ponto B, inicia-se o prazo prescricional da pretensão executória (PPPE). Como a pena é igual a um ano, o prazo de prescrição é de quatro anos, nos termos do art. 109, V, do CP. De modo que, se o Estado, até o ponto C, não iniciar a execução da pena de um ano de deten­ção, não mais poderá fazê-lo uma vez extinta a pretensão executória.

4. MEDIDA DE SEGURANÇA

Se imposta medida de segurança ao semi-responsável (CP, arts. 26, parágrafo único, e 98), não há falar em prescri­ção da pretensão executória, uma vez que a prescrição só incide sobre a pena. O CP, antes da reforma de 1984, resolvia

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expressamente a questão pela “extinção da medida de segu­rança pelo decurso do tempo”, nos termos do art. 87, caput: “Extingue-se a medida de segurança não executada pelo prazo de cinco anos, contados do cumprimento da pena, se o conde­nado, nesse período, não comete novo crime”. A reforma, en­tretanto, silenciou sobre o tema. Não é justo que a pretensão executória, tratando-se de pena, extinga-se pela prescrição e, cuidando-se, contudo, de medida de segurança, também espé­cie, com a pena, de sanção penal, não se extinga pelo decurso do tempo. A solução está em permitir-se que também a medi­da de segurança se extinga pelo decurso do tempo, levando-se em consideração a pena dosada pelo Juiz antes da substitui­ção (art. 98) e os prazos do art. 109. Nesse sentido: TACrimSP, ACrim 795.765, RJDTACrimSP, 5:155 e 22:316. Se o juiz apli­cou a medida de segurança substitutiva sem dosar a pena, de aplicar-se o prazo prescricional do mínimo abstrato cominado ao delito cometido pelo condenado. Ex.: réu, semi-responsá- vel, que cometeu lesão corporal leve. O juiz fixa a pena em dois meses (três meses com redução de um terço, nos termos do art. 26, parágrafo único). Após, substitui a pena pela medi­da de segurança. Para efeito da extinção da pretensão executória, considera-se a pena imposta. Se não a tivesse im­posto, o mínimo abstrato cominado à lesão corporal leve.

E se imposta medida de segurança ao inimputável, nos termos dos arts. 26, caput, e 97 do CP?

Como ficou consignado, não se pode falar em prescrição da pretensão executória, tendo em vista que ela pressupõe con­denação e aplicação de pena. Nesse sentido: STJ, REsp 2.021, 5â Turma, DJU, 4 jun. 1990, p. 5065. O CP, antes da reforma de 1984, também resolvia expressamente o problema em seu art. 78, § 2e: “A execução da medida de segurança não é ini­

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ciada sem verificação da periculosidade, se da data da senten­ça decorreram dez anos”. A reforma, aqui também, silenciou sobre o assunto. Não é justo que o réu absolvido, a quem foi imposta medida de segurança, permaneça indefinidamente su­jeito à pretensão executória. Nesse caso, segundo nosso en­tendimento, decorrido o prazo mínimo de duração da medida de segurança fixado na sentença, contado de seu trânsito em julgado, não pode ter início a execução sem que se averígüe, mediante perícia médica, a persistência do estado perigoso que ensejou a sua aplicação (CP, art. 97, §§ l 2 e 22, por analogia). Nesse sentido: STJ, REsp 2.021, DJU, 4 jun. 1990, p. 5065.

Os prazos da prescrição da pretensão executória são os seguintes:

Condenação à pena privativa de liberdade

Prazo prescricional

1. + de 12 anos = 20 anos

2. + de 8 a 12 anos = 16 anos

3. + de 4 a 8 anos = 12 anos

4. + de 2 a 4 anos = 8 anos

5. de 1 a 2 anos = 4 anos

6. menos de 1 ano = 2 anos

No caso de evasão do condenado ou de revogação do li­vramento condicional, a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena (CP, art. 113). Esse dispositivo não é aplicável à prescrição da pretensão punitiva (STJ, HC 2.793, 5- Turma, DJU, 12 set. 1994, p. 23772).

Não é admissível, na contagem do prazo prescricional da pretensão executória, pretender-se a incidência do princí­

pio da detração penal, em termos de dedução do tempo de pri­são provisória1. Nesse sentido: STJ, REsp 116.208, 5a Turma, DJU, 18 out. 1999, p. 250.

Quando concedido o perdão judicial não há falar-se em prescrição da pretensão executória2.

Quanto ao critério de contagem do ano prescricional, vide item 7 do Capítulo III desta obra.

5. REINCIDÊNCIA

Nos termos do art. 110, caput, parte final, do CP, cuidan­do-se de condenado reincidente, o prazo prescricional de pre­tensão executória é aumentado de um terço. Para saber qual o lapso prescricional é preciso considerar a pena imposta na sen­tença, adequá-la a um dos incisos do art. 109 do CP e, sobre o período encontrado, acrescer um terço.

Exemplo: um réu, reincidente, vem a ser condenado a quatro anos de reclusão. Incide o disposto no art. 109, IV, do CP: o prazo prescricional é de oito anos. Por ser reincidente, há o acréscimo de um terço, alcançando o total de dez anos e oito meses.

O aumento do prazo prescricional pressupõe que a sen­tença condenatória tenha reconhecido a reincidência.

Exemplo: um sujeito vem a ser condenado definitiva­mente pela prática de um furto. Dois anos depois comete um

1. STF, RTJ, 45:313; RHC 50.877, DJU, 18 maio 1973, p. 3338; RTJ, 65:348, 76:711; STF, HC 71.799, 2â Turma, DJU, 19 maio 1995, p. 13995; RT, 498\273: STF, HC 69.865, Ia Turma, Rei. Min. Celso de Mello, RTJ, 150:515. Contra: TJSP, RJTJSP, 79:427; RT, 456:398 e 484:324; TJSP, HC 201.290, RT, 666:308.

2. RTJ, 777:780; TACrimSP, HC 167.794, JTACrimSP, 95:391.

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roubo. Condenado por esse delito e reconhecida a reincidência na sentença, o prazo prescricional da pretensão executória, no to­cante ao roubo, é acrescido de um terço. Não considerada a rein­cidência na sentença, não incide o aumento do lapso prescricional, ainda que descoberta em momento posterior. Suponha-se que, proferida a sentença condenatória, tendo reconhecido a primariedade do réu, tempos depois, já transitada em julgado para a acusação, junte o Promotor de Justiça certidão comprobatória de que, ao tempo da condenação, era reincidente. Não incide o acréscimo prescricional. Nesse sentido: STJ, RHC 6.611, 5a Tur­ma, Rei. Min. José Arnaldo, j. 12-8-1997, RT, 747:626.

Não aumenta o prazo prescricional a denominada reinci­dência futura, quando o novo delito é praticado após a senten­ça condenatória em relação à qual se pretende o acréscimo.

Exemplo: transitada em julgado a sentença condenatória, o sujeito vem a cometer novo crime. E reincidente. Entretanto, o prazo prescricional da pretensão executória relacionado com o primeiro crime não pode ser aumentado de um terço. Nesta hi­pótese, o efeito da prática do novo crime será interromper o pra­zo prescricional no tocante ao delito anterior (CP, art. 117, VI).

O acréscimo do prazo pela reincidência só é aplicável à prescrição da pretensão executória e sobre a pena privativa de liberdade. Assim, não incide sobre o prazo prescricional da pretensão punitiva (CP, art. 109). Nesse sentido, a Súmula 220 do STJ: “A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva”. No mesmo sentido: TACrimSP, HC 375.332, 16â Câm., rei. Juiz Lopes de Oliveira, RT, 794:606.

O princípio agravador se encontra no art. 110 do CP, que disciplina a prescrição da pretensão executória. Em face dis­so, por ser prejudicial ao réu, não pode ser ampliada sua inci­dência, vedada, pois, sua extensão ao art. 109 do CP (prescri­ção da pretensão punitiva). Nesse sentido: TJSP, ACrim 61.392, RT, 631:292; TACrimSP, ACrim 609.999, RT, 662:300;

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STF, HC 69.044, 2a Turma, DJU, 10 abr. 1992, p. 4798; RTJ, 140:906; TAMG, ACrim 120.179, RT, 687:331 e 333; STJ, REsp 34.031, DJU, 28 jun. 1993, p. 12899. Contra: STJ, REsp 46, 5a Turma, DJU, 21 ago. 1989, p. 13331; RT, 652:341; REsp 6.814, 6a Turma, DJU, 3 fev. 1992, p. 476/7; STF, RHC 65.332, RTJ, 123:984; TACrimSP, HC 231.852, RT, 695:320; TACrimSP, HC 238.148, 3a Câm., RJDTACrimSP, 77:188.

Para a consideração da reincidência pouco importa a es­pécie de pena imposta em razão do crime anterior (detentiva da liberdade, restritiva de direitos ou multa)3.

6. EFEITOS

A declaração da extinção da punibilidade pela prescri­ção da pretensão executória impede a execução das penas e da medida de segurança (CP, art. 96, parágrafo único), subsistin­do as conseqüências de ordem secundária da sentença condenatória, como o lançamento do nome do réu no rol dos culpados, pagamento das custas processuais, reincidência (sal­vo o disposto no art. 64, I) etc.4. Assim, embora incidente a prescrição da pretensão executória, a sentença condenatória pode ser executada no juízo cível para efeito de reparação do dano (CPP, art. 63). Se o condenado efetuou a prestação de fiança, seu valor, não obstante a extinção da punibilidade, fica

3. RHC 65.332, 2- Turma do STF, em 18-8-1987, v. un., Rei. Min. Aldir Passarinho, DJU, 4 set. 1987, p. 18287, JTACrimSP, 95:403; TACrimSP, JTACrimSP, 97:131.

4. HC 60.990, 2à Turma do STF, em 14-6-1983, DJU, 26 ago. 1983, p. 12713; TACrimSP, MS 267.014, RJDTACrimSP, 25:437.

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sujeito ao pagamento das custas e reparação do dano (CPP, art. 336 e parágrafo único).

Extinta a punibilidade pela prescrição da pretensão exe­cutória, a extradição se torna inexeqüível5.

7. CONCURSO DE CRIMES

No concurso m aterial reconhecido na sentença condenatória, a pena de cada infração penal regula o respecti­vo prazo prescricional, considerado isoladamente (CP, art. 119). Convém, em face disso, que o Juiz especifique na sen­tença a pena de cada delito. Assim, vindo o réu a ser condena­do, pela prática de um roubo simples e de um estupro simples, a penas de quatro anos de reclusão (além da multa) e seis anos de reclusão, respectivamente, considerado o concurso materi­al, surgem dois prazos prescricionais da pretensão executória: o do crime de roubo e o do delito de estupro. As penas, por­tanto, não podem ser somadas6.

No concurso formal, a pena imposta regula o respectivo prazo prescricional, cumprindo ser desprezado o acréscimo (CP, art. 70)7.

Exemplo: o réu é condenado a um ano e dois meses de detenção pela prática de dois homicídios culposos em concur­so formal. A sanção final resulta da aplicação da pena de um dos delitos, um ano de detenção, mais o acréscimo de um sex­to (dois meses). Para efeito da prescrição da pretensão

5. Plenário do STF, HC 60.802, em 20-4-1983, v. un„ Rei. Min. Djaci Falcão, DJU, 3 jun. 1983, p. 7879; RTJ, 707:150.

6. STF, RTJ, 709:539.7. RT, 508:314 e 577:335.

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executória, leva-se em conta a pena de um ano de detenção, devendo ser desprezados os dois meses. Se não fosse assim o sujeito seria prejudicado. Suponha-se que, ao invés de concur­so formal, se tratasse de concurso material. As penas não seri­am somadas, nem sobre uma delas haveria acréscimo. Não é justo, pois, que, cuidando-se de concurso formal, a solução seja mais severa que a ordenada para o concurso material.

O acréscimo da pena resultante da configuração do con­curso formal não pode ser desvinculado para efeito de, no to­cante a ele, ser declarada a extinção da punibilidade pela pres­crição da pretensão executória, de acordo com o STF.

Exemplo:

TJSC 1 ano 2 anos 3 anos

A

I1 ano e 2 meses de detenção

TJSC = trânsito em julgado da sentença condenatória PPPE = prazo prescricional da pretensão executória

Um réu é condenado, em concurso formal, por dois ho­micídios culposos, a um ano e dois meses de detenção. Um ano de detenção em face de um dos delitos; dois meses de acréscimo (um sexto; CP, art. 70). A sentença condenatória transita em julgado no ponto A (TJSC). Como, para efeito de prescrição, deve ser desprezado o acréscimo, subsiste, regu­lando o prazo prescricional, a pena de um ano de detenção, decorrendo em quatro anos (CP, art. 109, V). De maneira que,

4 anos

C

JPPPE

se o Estado não iniciar a execução da pena dentro desse lapso, até o ponto C, perde a pretensão executória. Em relação ao acréscimo de dois meses de detenção, ele não pode ser desvinculado para efeito de prescrição, nos termos do enten­dimento do primitivo Pretório Excelso. Significa: não se pode pretender que ele, considerado isoladamente, regule seu res­pectivo prazo prescricional. Como é inferior a um ano, o pra­zo prescricional seria de dois anos. Não é admissível a conta­gem desses dois anos entre os pontos A e B. De modo que o acréscimo, por si só, é imprescritível8. Convenhamos, entre­tanto, que, conforme a hipótese, tal solução não se mostra jus­ta, como no caso de condenação a um ano e dois meses de detenção por homicídio culposo e lesão corporal culposa, em concurso formal. Melhor seria, então, para o réu, que fosse considerado o concurso material, não o formal.

Tratando-se de concurso formal imperfeito (CP, art. 70, 2- parte), cada crime tem o seu próprio prazo prescricional (CP, art. 119).

No tocante ao delito continuado, incide a Súmula 497 do STF: “Quando se tratar de crime continuado, a prescrição re- gula-se pela imposta na sentença, não se computando o acrés­cimo decorrente da continuação”. Pensamos que é preciso se­parar as penas resultantes da continuação, distribuindo-as pe­los delitos parcelares, incidindo a prescrição da pretensão executória em relação a cada um, considerado isoladamente, sem o acréscimo legal, de acordo com o art. 119 do CP. Con­vém, pois, que o Juiz especifique as penas dos crimes. Nesse

8. Decidiu o STF: “na prescrição da pena em concreto resultante de concurso formal não há que separar o acréscimo se não se verificou a pres­crição relativamente a um dos crimes isoladamente considerado” (HC 58.391,Ia Turma, em 2-12-1980, v. un., Rei. Min. Soares Munoz, DJU, 19 dez. 1980, p. 10941-2).

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sentido, tratando genericamente do consenso de crimes: TARS, ACrim 293.155.040, RT, 709:371.

Quanto ao acréscimo resultante da continuação, enten­deu o STF que ele não pode ser desvinculado para efeito de incidência da prescrição da pretensão executória9. Conforme deixamos consignado em relação à hipótese do concurso for­mal, pensamos que, de acordo com o caso concreto, é justo que o acréscimo seja desvinculado para efeito da prescrição da pretensão executória.

8. MULTA

O art. 51 do CP, alterado pela Lei n. 9.268, de l 9-4-1996, tem a seguinte redação: “Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, apli- cando-se-lhe as normas da legislação relativas à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição”.

Nos termos da lei nova, transitada em julgado a sentença condenatória, o valor da pena de multa deve ser inscrito como dívida ativa em favor da Fazenda Pública. A execução não se procede mais nos termos dos arts. 164 e s. da LEP. Devendo ser promovida pela Fazenda Pública, deixa de ser atribuição do Ministério Público, passando a ter caráter extrapenal a sua exe­

9. HC 65.734, 2- Turma, em 12-2-1988, v. un., Rei. Min. Aldir Passa­rinho, DJU, 25 mar. 1988, p. 6374 e 6375. Ementa: “Não há cabida para a pretensão ajuizada, que visa a obter que a prescrição incida sobre o acrésci­mo da pena decorrente da continuidade delitiva, considerando-se isolada­mente tal acréscimo” (RTJ, 725:1085). No mesmo sentido: STF, HC 71.277,Ia Turma, DJU, 3jun. 1994, p. 13855.

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cução. Nesse sentido, na doutrina: Paulo Henrique Moura Lei­te, O lapso prescricional e a legitimidade ativa para a execução da multa penal após o advento da Lei n. 9.268/96, Revista Jurí­dica, Porto Alegre, 267:32 e s., jan. 2000. Note-se que a multa permanece com sua natureza penal, subsistindo os efeitos pe­nais da sentença condenatória que a impôs. A execução é que se procede em termos extrapenais. Em face disso, a obrigação de seu pagamento não se transmite aos herdeiros do condenado.

De modo que não existe mais prescrição da pretensão executória no tocante à multa. Nesse sentido, na doutrina: Pau­lo Henrique Moura Leite, O lapso prescricional e a legitimi­dade ativa para a execução da multa penal após o advento da Lei n. 9.268/96, Revista Jurídica, Porto Alegre, 267:32 e s., jan. 2000.

As causas suspensivas e interruptivas da prescrição refe­ridas na disposição não são as do CP (arts. 116, parágrafo úni­co, e 117, V e VI), mas sim as da legislação tributária.

Legislação tributária referida na disposição: Lei n. 6.830/ 80 e CTN. Prazo prescricional: 5 anos (art. 174, caput, do CTN). Causas suspensivas: arts. 151 do CTN e 2°, § 3e, e 40 da Lei n. 6.830/80. Causas interruptivas: art. 174, parágrafo único, do CTN.

9. IDADE DO CONDENADO

Nos termos do art. 115 do CP, que não foi alterado pelo art. 52 do novo CC, que baixou a maioridade para 18 anos, os prazos prescricionais da pretensão executória são reduzidos de metade quando o condenado era, ao tempo do delito, menor de vinte e um anos de idade ou maior de setenta na data da sentença. De aplicar-se a teoria da atividade, favorecendo o agente quando era, ao tempo da realização da conduta, de ida­

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de exigida pelo tipo penal. Assim, tratando-se de crime mate­rial, se o sujeito realiza o comportamento quando menor de vinte e um anos de idade, produzindo-se o evento depois des­sa faixa etária, deve ser favorecido pela redução do prazo prescricional.

Tratando-se de crime continuado, praticados os delitos parcelares antes e depois dos vinte e um anos de idade do su­jeito, aplicada uma só pena em face da ficção jurídica de um só delito, é razoável o entendimento da redução do prazo pres­cricional10.

Trata-se de circunstância de natureza pessoal e, por isso, incomunicável no concurso de pessoas.

A idade é comprovada pela certidão de nascimento, não valendo a simples alegação de menoridade não contestada pela acusação nem o RG. Nos termos da Súmula 74 do STF, a pro­va da menoridade se faz por documento hábil.

10. TERMOS INICIAIS

Nos termos do art. 112 do CP, a prescrição da pretensão executória tem início:

1Q) no dia em que transita em julgado a sentença condenatória para a acusação;

29) no caso do livramento condicional ou do sursis revo­gado, na data em que transita em julgado a decisão revocatória;

32) no dia em que se interrompe a execução da pena, sal­vo quando o tempo da interrupção deva ser computado.

10. Vide notas jurisprudenciais sobre o tema nos itens “idade do agen­te”, no capítulo da prescrição da pretensão punitiva, e “menoridade relati­va”, no capítulo da prescrição retroativa.

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O inciso I da disposição citada menciona como primeiro marco da prescrição da pretensão executória o dia em que tran­sita em julgado a sentença condenatória para a acusação. Lite­ralmente, a decisão de condenação somente transita em julga­do quando não cabe mais recurso para nenhuma das partes, acusação e defesa. Assim, uma primeira interpretação leva à conclusão de que somente com eça a correr o prazo prescricional referido quando, não cabendo mais recurso da sentença condenatória, realmente surge a pretensão executória. Entretanto, a jurisprudência, apreciando o texto do primitivo CP de 1940, decidiu que a expressão “do dia em que passa em julgado a sentença condenatória” se referia à acusação, pres­cindindo-se até de intimação ao réu. Daí a reforma penal de 1984 haver acrescentado ao texto a expressão “para a acusa­ção”. Dessa forma, transitando a decisão em julgado para a acusação (Promotor de Justiça, querelante e assistente da acu­sação), é dessa data que se conta o lapso prescricional, ainda que não tenha sido intimado o réu. Isso, entretanto, depende de uma condição: que a sentença também tenha transitado em julgado para a defesa. Ocorrendo esse requisito, a contagem se faz da data do trânsito em julgado para a acusação11.

Devemos, então, distinguir:l 2) momento em que surge o título penal executório, a

partir do que se pode considerar a prescrição da pretensão executória: trânsito em julgado da sentença condenatória para acusação e defesa;

22) termo inicial da contagem do prazo da prescrição da pretensão executória: data em que a sentença condenatória transita em julgado para a acusação (CP, art. 112, I). Nesse sentido: TACrimSP, AE 566.041, RT, 645:309.

11. Nesse sentido: STJ, HC 4.073, 52 Turma, DJU , 14 nov. 1994, p. 30964.

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Exemplo:

SC IA TJSCA IR PPE|------------1---------- 1-----------1----------1_A B C D E| |-----------------2 anos ------------------ 1

2 meses de detenção

SC = sentença condenatóriaIA = intimação da sentença condenatória à acusação TJSCA = trânsito em julgado da sentença condenatória para a

acusação IR = intimação do réu PPE = prescrição da pretensão executória

O réu, no ponto A, é condenado a dois meses de deten­ção. Dias depois, no ponto B, a acusação é intimada (IA) e não apela. Transita em julgado a sentença condenatória para a acu­sação no ponto C (TJSCA). Meses depois, no ponto D, o réu é intimado (IR). O prazo prescricional da pretensão executória tem início no ponto C. Como a pena é inferior a um ano, o prazo é de dois anos (CP, art. 109, VI), transcorrendo entre os pontos C e E, não se interrompendo ou suspendendo pela intimação do réu (D).

Não corre prazo prescricional da pretensão executória durante o sursis e o livramento condicional. Como constituem formas de execução da pena, isso demonstra que o Estado se encontra atento, impedindo o decurso do prazo prescricional. Nesse sentido: STF, HC 68.608, RT, 676:384 e RTJ, 136:664.

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Revogada a medida, nos termos do inciso I, tem início, na data do trânsito em julgado da decisão revocatória, o prazo pres­cricional, devendo ser regulado pela quantidade da pena suspensa (sursis) ou pelo restante (livramento condicional; CP, arts. 88 e 113).

Na hipótese do art. 161 da LEP, em que o sursis é torna­do sem efeito em face do não-comparecimento do condenado à audiência admonitória, não é aplicável a segunda parte do inciso I e sim a primeira: o prazo se inicia a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação. Não se trata de caso de “revogação” da medida, que não se encontra em seu período de prova, mas sim de insubsistência de sua aplicação.

Quando a execução da pena é interrompida pela fuga do condenado, nesta data se inicia o prazo prescricional da pre­tensão executória, regulado pelo restante (art. 112, II, Ia par­te). Quando a execução é interrompida pela superveniência de doença mental ou internação do condenado em hospital (CP, arts. 41 e 42), aplicando-se o princípio da detração penal (art. 42), não corre o prazo prescricional da pretensão executória (CP, art. 112, II, 2a parte).

11. SUSPENSÃO

A prescrição da pretensão executória não corre, ficando suspensa12, durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo (CP, art. 116, parágrafo único). Enquanto a

12. Vide o conceito de causas suspensivas da prescrição no item 21 do Capítulo III.

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prescrição da pretensão punitiva, nos termos do art. 116, II, do CP, não corre durante o tempo em que o sujeito “cumpre pena no estrangeiro”, no que concerne à prescrição após o trân­sito em julgado da sentença condenatória, a disposição con­tém conceito mais amplo, referindo-se a período durante o qual “está preso por outro motivo”, i. e., por motivo que não seja o cumprimento de pena no estrangeiro, como prisão preventiva, em flagrante, em decorrência de pronúncia ou de sentença con­denatória penal, ficando afastadas as prisões de natureza ex- trapenal.

12. CAUSAS INTERRUPTIVAS

De acordo com o art. 117, V e VI, do CP, o curso da pres­crição da pretensão executória interrompe-se pelo início ou continuação do cumprimento da pena e pela reincidência13.

Iniciado o prazo prescricional com o trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação (CP, art. 112,1), des­de que também tenha transitado em julgado para a defesa, ele se interrompe com o começo do cumprimento da pena. Se o fundamento da prescrição da condenação está na inércia do Estado durante o período em que não exerce a pretensão executória, iniciada a execução da sanção penal não há lugar para o decurso do lapso extintivo. Vindo a fugir o condenado, na data da fuga tem início novo prazo prescricional (CP, art. 112, II, 1a- parte), regulado pelo restante da pena (CP, art. 113). Recapturado, novamente se interrompe o prazo:

13. Vide o conceito de causas interruptivas da prescrição no item 22 do Capítulo III.

Exemplo:

IPPPE RC

1 ano — ^t

SC TJSCA ICP FC 2 anos

A B — 6 meses — C — 6 meses — D E F

I I1 ano de reclusão

INPPPE

SC = sentença condenatóriaTJSCA = trânsito em julgado da sentença condenatória para a

acusaçãoICP = início do cumprimento da penaIPPPE = interrupção do prazo prescricional da pretensão

executóriaFC = fuga do condenadoINPPPE = início de novo prazo prescricional da pretensão

executória RC = recaptura do condenado

Condenado o réu, no ponto A, a um ano de reclusão, não tendo apelado a defesa, a sentença condenatória (SC), no ponto B, transita em julgado para a acusação (TJSCA). Como a pena é de um ano, inicia-se no ponto B prazo pres­cricional da pretensão executória de quatro anos (CP, art. 110, c/c o art. 109, V). Seis meses depois, no ponto C, o condena­do é detido, iniciando-se o cumprimento da pena (ICP). In- terrompe-se o lapso prescricional da pretensão executória (IPPPE). O prazo prescricional, que era de quatro anos, foi interrompido seis meses depois de seu início. Seis meses

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depois do início do cumprimento da pena o condenado foge, no ponto D (FC). Fugindo, inicia-se novo prazo prescricio­nal da pretensão executória (INPPPE) no ponto D, regulado pelo restante da pena. Como restam seis meses, o prazo pres­cricional é de dois anos (CP, arts. 109, VI, e 113). Esses dois anos vão do ponto D ao ponto F. Ocorre, entretanto, que o foragido é recapturado antes desses dois anos, no ponto E. Recapturado, interrompe-se outra vez o prazo prescricional da pretensão executória.

O início do cumprimento da pena, como causa inter­ruptiva, só incide sobre a prescrição da pretensão executória. Assim, não interrompe a prescrição da pretensão punitiva em determinada ação penal a circunstância de o condenado iniciaro cumprimento de pena em razão do outro processo14.

De observar-se que essas duas causas interruptivas da prescrição somente incidem sobre a pretensão executória em relação à pena imposta em determinado processo, não em re­lação a qualquer ação penal.

Anulada a certidão do trânsito em julgado da sentença condenatória em relação à qual ocorreu o início do cumpri­mento da pena, este perde o efeito interruptivo15.

A reincidência interrompe também o prazo prescricional da pretensão executória (CP, art. 117, VI). Essa causa interruptiva é inaplicável à prescrição da pretensão punitiva16. E, nos termos do art. 117, § 2Q, do CP, interrompida a prescri­ção, na espécie, “todo o prazo começa a correr, novamente, do dia da interrupção”.

14. RT, 572:471, 530:431 e 540:418.15. JTACSP, 70:59.16. RT, 464319 s RTJ, 50:553.

108

A reincidência que interrompe o prazo da prescrição da pretensão executória não se confunde com a que aumenta o lapso de um terço (art. 110, caput, parte final). A forma interruptiva é a denominada “reincidência futura”, a que surge após o trânsito em julgado da sentença condenatória. Já a rein­cidência que aumenta o prazo prescricional é a reconhecida na sentença condenatória. Assim, em curso a prescrição da pretensão executória, a prática de novo delito o interrompe, mas não aumenta o prazo.

Discute-se a respeito do momento em que a reincidência interrompe o prazo prescricional. Há, sobre o tema, duas orien­tações:

I a) o prazo prescricional da pretensão executória (da pena, da condenação) é interrompido na data da prática do novo crime17;

2-) o lapso prescricional da pretensão executória é inter­rompido na data em que transita em julgado a sentença condenatória proferida em face da prática do novo delito.

A primeira posição é a correta. Se, nos termos do art. 63 do CP, dá-se a reincidência quando o sujeito, tendo contra si sentença condenatória irrecorrível, comete novo delito, tem- se de interpretar o art. 117, VI, em termos de que, cometido o novo crime, se encontra interrompido o prazo prescricional. A reincidência ocorre na data em que o sujeito comete o novo delito, não quando transita em julgado a nova sentença18. Esta reconhece a recidiva, não a cria. O efeito interruptivo da rein­cidência, entretanto, deve ficar condicionado ao trânsito em

17. RT, 590:379; RJDTACrimSP, 7:210.18. RHC 61.245, 2a Turma do STF, em 30-9-1983, v. un., Rei. Min.

Francisco Rezek, DJU, 21 out. 1983, p. 16303; RTJ, 107:988.

109

julgado na nova sentença condenatória. Se o réu vem a ser absolvido, desaparecida a reincidência, fica extinto o efeito interruptivo no tocante à pretensão executória incidente sobre0 primeiro delito.

A reincidência que interrompe o prazo da prescrição da pretensão executória é a que surge em decorrência da prática de um crim e após o trânsito em ju lgado da sentença condenatória para a acusação e defesa e não só para a acusa­ção. Assim, o termo a quo a partir do qual pode ocorrer a rein­cidência não é o do art. 112,1, do CP (data do trânsito em jul­gado da sentença condenatória para a acusação) e sim o do art. 110, caput (data em que surge o título penal executório).

No concurso de pessoas, seja co-autoria ou participação, salvo a reincidência, que é pessoal e incomunicável (CP, art.30), e o início ou continuação do cumprimento da pena, a in­terrupção da prescrição da pretensão executória em relação a um dos participantes se estende aos demais (CP, art. 117, § l 2,1 - parte). Exemplo: pronunciados dois co-autores de homicí­dio, um só deles recorre em sentido estrito. O acórdão confir- matório da pronúncia também interrompe o prazo prescricional em relação ao réu que não recorreu.

Nos delitos conexos, desde que sejam objeto do mesmo processo, estende-se aos demais a interrupção da prescrição relativa a qualquer deles (CP, art. 117, § l 2, 2- parte).

110

Capítulo V DA PRESCRIÇÃO NA LEGISLAÇÃO ESPECIAL

1. ABUSO DE AUTORIDADE

Nos termos do art. 6Q, § 3Q, da Lei n. 4.898, de 9-12-1965, que define os delitos de abuso de autoridade (arts. 32 e 4Q), as penas consistem em:

“a) multa;b) detenção por dez dias a seis meses;c) perda do cargo e a inabilitação para o exercício de

qualquer outra função pública por prazo até três anos”.Essas penas podem ser aplicadas autônoma ou cumulati­

vamente (§ 49 do mesmo artigo).Como a lei especial não faz referência ao tema da prescri­

ção, de aplicar-se os princípios do CP (art. 12). Assim, no tocante à prescrição da pretensão punitiva, o prazo é regulado pelo máxi­mo da pena privativa de liberdade. Como é inferior a um ano (seis meses) decorre em dois anos (CP, art. 109, VI). Nesse sentido: TJSP, ACrim 102.589, RJTJSP, 134:402; RT, 728:620; STJ, REsp 153.820, 5a Turma, j. 7-4-1998, DJU, 11 maio 1998, p. 143;

111

STJ, REsp 263.328, 6a Turma, Rei. Min. Hamilton Carvalhido, RT, 796:518.

Se imposta detenção na sentença, de incidir o disposto no art. 110 do CP, variando o prazo prescricional da pretensão executória de acordo com a quantidade da pena aplicada. Como a pena detentiva é inferior a um ano, o prazo prescri­cional da pretensão executória é de dois anos (CP, arts. 110 e 109, VI). Se imposta pena funcional (perda do cargo e inabili- tação funcional), ocorre também a prescrição da pretensão executória. O prazo prescricional é de dois anos. Como as dis­posições especiais não cuidam da prescrição, de incidir o me­nor prazo do art. 109 do CP (n. VI).

2. CRIMES CONTRA A SEGURANÇA NACIONAL

O art. 6Q, IV, da Lei de Segurança Nacional (Lei n. 7.170, de 14-12-1983), determina a extinção da punibilidade pela prescrição.

Nos termos do art. 7S da Lei de Segurança Nacional, em sua aplicação deve ser observado, no que couber, o disposto na Parte Geral do CPM. Assim, em se tratando de crime contra a Segurança Nacional, a prescrição da pretensão punitiva é regu­lada pelo máximo da pena privativa de liberdade abstratamen­te cominada (CPM, art. 125), enquanto a prescrição da preten­são executória tem seus prazos determinados pela pena impos­ta na sentença condenatória (art. 126 do mesmo estatuto).

3. CONTRAVENÇÕES

A LCP (Dec.-lei n. 3.688, de 3-10-1941) não dispõe a respeito da prescrição. Por isso, de aplicar-se os princípios

112

gerais a respeito do tema previsto no CP (LCP, art. I a e CP, art. 12). Em relação à prescrição da pretensão punitiva, o prazo é regulado pelo máximo da pena privativa de liberda­de (CP, art. 109). Se abstratamente cominada somente a multa, o prazo é de dois anos (art. 114). No tocante à pres­crição da pretensão executória, o lapso extintivo é determi­nado pela pena imposta na sentença condenatória. Se apli­cada pena de prisão simples, o prazo varia segundo sua quantidade.

4. CRIMES CONTRA A ECONOMIA POPULAR

Os crimes contra as relações de consumo e a economia popular se encontram descritos nas Leis n. 1.521, de 26-12- 1951, n. 4.591, de 16-12-1964, e n. 6.435, de 15-7-1977, De- creto-lei n. 73, de 21-11-1966, Lei n. 8.078, de 11-9-1990 (Có­digo de Defesa do Consumidor), e Lei n. 8.137, de 27-12- 1990. Seus dispositivos não cuidam do tema da prescrição. Em face disso, devem ser aplicados os princípios contidos no CP. A prescrição da pretensão punitiva é regulada pelo máximo da pena privativa de liberdade abstratamente cominada. A pres­crição da pretensão executória tem seus prazos determinados pela quantidade da pena imposta na sentença. Se se trata de cominação abstrata de multa, o prazo é de dois anos (CP, arts. 114 e 109, VI)1.

1. De ver-se que nos termos do art. 2e da Lei n. 7.209/84, que alte­rou a Parte Geral do CP, devem ser canceladas na legislação especial, de que faz parte a lei que define os crimes contra a economia popular, as referências a valores de multa, substituindo-se a expressão “multa de...” por “multa”.

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5. CRIMES ELEITORAIS

O Código Eleitoral (Lei n. 4.737, de 15-7-1965) define delitos nos arts. 289 a 354, deixando de cuidar da prescrição. No art. 287, entretanto, afirma a incidência das regras gerais do CP, em consonância com o que dispõe o art. 12 deste (vide art. 287 do CE). Diante disso, são aplicáveis aos delitos elei­torais todos os princípios atinentes à prescrição contidos em nosso estatuto penal comum. Nesse sentido: STF, Inq. 794-3, Plenário, rei. Ministro Celso de Mello, RT, 710:360. O mes­mo ocorre em relação à Lei n. 6.091, de 15-7-1974, que tam­bém define delitos eleitorais.

6. CRIMES FALIMENTARES

Nos termos do art. 182, caput, da Lei de Falências (Lei n.11.101, de 9-2-2005, que entrou em vigor no dia 9-6-2005), “a prescrição dos crimes previstos nesta Lei reger-se-á pelas disposições do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal, começando a correr do dia da decretação da falência, da concessão da recuperação judicial ou da homologação do plano de recuperação extrajudicial”.

Assim, nos delitos falimentares, o prazo prescricional da pretensão punitiva e da pretensão executória varia conforme seja a quantidade da pena abstrata ou imposta na sentença condenatória, nos termos dos arts. 109 e s. do CP.

Sob a égide da antiga Lei de Falências, a prescrição de crime falimentar operava-se em dois anos, contados da data em que transitasse em julgado a sentença de encerramento da falência ou que julgasse cumprida a concordata (art. 199, caput, do Dec.-lei n. 7.661, de 21-6-1945).

Quanto à forma da contagem do prazo extintivo da pretensão executória, ao tempo do Decreto-lei n. 7.661, não

114

havia discrepância na doutrina e na jurisprudência: era sempre de dois anos, contados a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação, nos termos do art. 112,1, do CP. Divergiam, entretanto, no tocante à contagem do lapso prescricional da pretensão punitiva (da ação). Havia três posições a respeito do assunto:

Ia) O biênio devia ser considerado a partir do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência, de acordo com o parágrafo único do art. 199 da antiga Lei de Falências.

É dever do falido realizar atividades no sentido do pronto término da falência, buscando evitar prejuízo aos credores. Assim, transitando em julgado a sentença de encerramento, iniciar-se-ia a contagem do biênio, não sendo justo que com sua negligência conseguisse a extinção da punibilidade.

2a) O biênio tinha início na data do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência; se, contudo, o procedimento falimentar não terminasse dois anos depois da declaração da quebra (antiga Lei de Falências, art. 132, § l s), ocorreria a prescrição quatro anos depois da decretação da falência.

Segundo essa orientação, a regra era de contar-se o biênio da data do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência (Lei de Falências, art. 199, parágrafo único). Poderia acontecer, entretanto, que o processo de falência não terminasse dentro do prazo do art. 132, § l2, da antiga lei (“salvo caso de força maior, devidamente provado, o processo de falência deverá estar encerrado dois anos depois do dia da declaração”). Quando isso ocorria (era a regra), os dois anos deveriam ser contados do término do biênio a partir da declaração da quebra. Significa que o biênio previsto no parágrafo único do art. 199 da anterior Lei de Falências deveria ser considerado a partir do término do biênio previsto no § l s do art. 132 da mesma lei. O prazo total era, então, de quatro anos: dois anos da declaração da falência até o encerramento fictício; mais dois anos a contar da data do encerramento fictício. Era o que constava da Súmula 147 do STF: “a prescrição de crime falimentar

115

começa a correr da data em que deveria estar encerrada a falência, ou do trânsito em julgado da sentença que a encerrar ou que julgar cumprida a concordata”.

3a) O prazo extintivo de dois anos se iniciava na data do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência; se a falência não terminasse dentro do prazo legal, o biênio se iniciaria na data em que deveria estar encerrada; se a denúncia fosse recebida antes dos dois anos a partir da declaração da quebra, a data do recebimento constituía o termo inicial do prazo; se a denúncia fosse recebida depois dos dois anos a contar da declaração da falência, o recebimento constituía causa interruptiva da prescrição.

Tratava-se de uma variante da posição anterior. A regra era a mesma: o biênio tinha início na data em que transitasse em julgado a sentença de encerramento da falência. Não terminando no prazo legal, os dois anos deveriam ser considerados a partir do encerramento fictício. Poderia ocorrer, contudo, que o recebimento da denúncia se desse antes dos dois anos contados a partir da declaração da quebra. Nesse caso, o termo inicial do biênio recuaria à data do recebimento. E, se o recebimento da denúncia acontecesse depois dos dois anos contados da declaração da falência e antes dos outros dois anos considerados a partir da data em que deveria estar encerrada, ele constituiria causa interruptiva da prescrição, que estava correndo desde a data do encerramento ficto (CP, art. 117,1).

É de ver que, no confronto entre as regras constantes do art. 199, caput, do Decreto-lei n. 7.661, de 21-6-1945, e do art. 182, caput, da Lei n. 11.101, de 9-2-2005, a última constitui novatio legis in pejus, justamente porque são maiores seus prazos prescricionais. Por essa razão, não se aplica a fatos ocorridos antes de sua entrada em vigor (CF, art. 52, XL), os quais continuam regidos pela antiga Lei de Falências.

Por derradeiro, as causas interruptivas da prescrição aplicáveis aos delitos falimentares são aquelas previstas no art.

116

117 do CP2 (Súmula 592 do STF) e a constante do art. 182, parágrafo único, da Lei n. 11.101/2005 (“A decretação da falência do devedor interrompe a prescrição cuja contagem tenha iniciado com a concessão da recuperação judicial ou com a homologação do plano de recuperação extrajudicial”).

7. CRIMES DE IMPRENSA

O art. 41, caput, da Lei de Imprensa (Lei n. 5.250, de 9- 2-1976), dispõe que a prescrição da pretensão punitiva ocorre em “dois anos após a data da publicação ou transmissão incriminada”, e a da pretensão executória, “no dobro do prazo em que for fixada” a pena.

Assim, o prazo prescricional, antes de transitar em jul­gado a sentença final, qualquer que seja a quantidade da pena abstrata, decorre em dois anos, contados a partir da data da publicação ou transmissão incriminada. Nesse sentido: STF, Inq. 484, despacho do Min. Celso de Mello, RTJ, 142:689. No caso de periódicos que não indiquem data, o biênio tem início no último dia do mês ou do período a que corresponder a pu­blicação (art. 41, § 32).

No que tange à prescrição da pretensão executória, o pra­zo, contado em dobro, varia de acordo com a quantidade da pena. Dessa forma, condenado o réu a seis meses de detenção, o lapso prescricional é de um ano.

As causas interruptivas do art. 117 do CP são aplicáveis à prescrição em relação aos delitos de imprensa3.

2. RECrim 106.377, Ia Turma do STF, 29-10-1985, DJU, 22 nov. 1985, p. 21342; RTJ, 776:367; RT, 596:324,599:313,607:308, 602:443 e 644:262.

3. RT, 441:411 e 510:461; JTACrimSP, 8:234, 30:64, 56:249, 4 8350 e 607:324; RTJ, 46:611, 48339, 49333 , 55:203, 67:579, 75:96, 777:79 e 756:664; STJ, RHC 31, JSTJ, 2:211; REsp 2.663, 6a Turma, DJU, 6 ago. 1990, p. 7352; RHC 611, DJU, 6 ago. 1990, p. 7345; STJ, HC 4.424, 5a

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A notificação para pedir explicações, com base no art. 25 da Lei n. 5.250/67, não interrompe a prescrição (STF, Inq. 613, Plenário, DJU, 8 abr. 1994, p. 7240).

O art. 41, § l 9, determina que “o direito de queixa ou de representação prescreverá se não for exercido dentro de três meses da data da publicação ou transmissão” (grifo nosso). A expressão “prescreverá” foi empregada impropriamente. O le­gislador não quis referir-se à prescrição, mas à decadência do direito de queixa ou de representação. Nesse sentido: STF, HC 68.608, RTJ, 136:664.

8. CRIMES MILITARES

De acordo com o art. 124 do CPM (Dec.-lei n. 1.001, de 21-10-1969), “a prescrição refere-se à ação ou à execução da pena”. A fórmula não é feliz. Como explica José Frederico Marques, antes de transitar em julgado a sentença final, o que prescreve é o “direito de punir no que diz respeito à pretensão de aplicar o preceito sancionador ainda abstrato”; transitando em julgado a sentença condenatória, o que prescreve é o “di­reito de aplicar a sanção constante, in concreto, no título pe­nal executório”4. Daí falar em “prescrição da pretensão puniti­va” e “prescrição da pretensão executória”. Não obstante po­der correr a prescrição antes ou durante a ação penal, a ex­

Turma, DJU, 3 abr. 1995, p. 8138. Contra: RF, 143:369; RT, 498:320, 574:311,575:391,617:304 e 624:661; JTACrimSP, 45:140 e 218; STJ, APn19, Corte Especial, RT, 707:360. A doutrina se manifesta no sentido do efeito interruptivo: José Frederico Marques, Curso de direito penal, São Paulo, Saraiva, 1956, v. 3, p. 423; Magalhães Noronha, Direito penal, 20. ed., São Paulo, Saraiva, 1982, v. 1, p. 424 e 425, n. 243; Rodrigues Porto, Da prescrição penal, São Paulo, 1972, p. 131, n. 80.

4. Tratado, cit., v. 3, p. 412 e 414, n. 1 e 2.

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pressão empregada pelo CPM dá a entender que a prescrição atinge a própria ação penal, o que é incorreto.

A prescrição da pretensão punitiva é regulada, em regra, pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao deli­to (art. 125, caput). Excepcionalmente, sobrevindo sentença condenatória com apelo exclusivo do réu, o prazo prescri­cional, da data de sua publicação em diante, é disciplinado pela quantidade da pena im posta (art. 125, § l s, l â parte, correspondendo à hipótese do atual § l 2 do art. 110 do CP).

A prescrição retroativa foi adotada expressamente, con­dicionando-se à existência de recurso exclusivo do réu, de­vendo “ser logo declarada, sem prejuízo do andamento do recurso se, entre a última causa interruptiva do curso da pres­crição (§ 52) e a sentença, já decorreu tempo suficiente” (§ l s, 2- parte).

A prescrição da pretensão executória é regulada pela quan­tidade da pena imposta na sentença condenatória (art. 126).

Se imposta pena de morte, o prazo é de trinta anos (art. 125,1).

Cuidando-se de tentativa de crime punido com a morte, esta corresponde à reclusão por trinta anos (art. 81, § 3Q). De maneira que, para efeito de prescrição, deve-se tomar em con­ta a pena de trinta anos com a diminuição de um terço, ocor­rendo em vinte anos (art. 125, II).

9. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Cuida de infrações infanto-juvenis e não de infrações pe­nais, sendo inaplicável o instituto da prescrição penal (STJ, RO em HC 9.736, 5a Turma, Rei. Min. Gilson Dipp, RT, 800:552).

Capítulo VI DA PRESCRIÇÃO RETROATIVA

1. ORIGEM DO INSTITUTO. A SÚMULA 146 DO STF

O tema da possibilidade de a pena concretizada na sen­tença, desde que impossível de ser agravada, regular o prazo prescricional anterior à data de sua publicação, sempre gerou discussão na doutrina e na jurisprudência brasileiras. Como lembra Nilson Vital Naves, já na vigência do Decreto n. 4.780, de 27-12-1923, divergiam os estudiosos a respeito da retroa- tividade da pena imposta na sentença condenatória no sentido de permitir a extinção da punibilidade pela prescrição da pre­tensão punitiva (da ação). Veja-se, por exemplo, o HC 28.638, em que o STF, por maioria de votos, concedeu a ordem admi­tindo o efeito retroativo da pena concreta no que tange à conta­gem do prazo prescricional anterior à sentença condenatória1.

1. O Supremo Tribunal Federal e o princípio da prescrição pela pena em concreto, Justitia, São Paulo, 1975, 88:285.

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Com a entrada em vigor do CP de 1940, o Pretório Excelso, em sessão plenária de 12-6-1946, por unanimidade de votos, no HC 29.370, decidiu que o antigo parágrafo único do art. 110, pela sua situação topográfica, poderia levar a su­por cuidar de hipótese de prescrição da pretensão executória (da condenação ou da execução). Entretanto, como disse o Min. Castro Nunes, “se o art. 109, depois de assentar o princí­pio de que a prescrição da ação é a que ocorre antes do trânsi­to em julgado da sentença final, admite uma exceção, a do parágrafo único do art. 110”..., “parece claro que a exceção se refere à prescrição do procedimento penal... A razão do dispo­sitivo legal é óbvia: se pelo recurso do réu não seria possível uma reformatio in pejus, a fixação da pena se torna definitiva, retroagindo para beneficiá-lo, como se fora a pena cominada na lei”2.

No final de 1947, contudo, o STF se orientou em sentido contrário, inadmitindo a retroatividade prescricional da pena concreta. No HC 29.922 ficou decidido que o antigo parágra­fo único do art. 110 do CP regia a denominada prescrição superveniente à sentença condenatória, não possuindo efeito de reger o prazo extintivo anterior à sua publicação3. Essa ori­entação foi mantida até o final de 19504.

Dividiram-se as opiniões no STF a partir de 1951. De um lado a corrente liderada por Nélson Hungria; de outro, a do Min. Luiz Gallotti. Argumentava Hungria no sentido de que

2. DJ, 19 mar. 1948; citação de Nilson Vital Naves, O Supremo Tribu­nal Federal, Justitia, 88:285.

3. RF, 775:204; citação de Nilson Vital Naves, O Supremo Tribunal Federal, Justitia, 88:285.

4. RT, 182:413', citação de Nilson Vital Naves, O Supremo Tribunal Federal, Justitia, 88:285.

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“a pena concretizada, na ausência de recurso do Ministério Público, é a única a que, no caso, correspondia ab initio o di­reito de punir por parte do Estado, de modo que a mais ele­mentar Justiça impõe o aproveitamento do tempo decorrido entre a última causa interruptiva e a sentença condenatória”. Assim, para ele, “se entre a última causa interruptiva e a sen­tença condenatória já decorreu tempo suficiente para a pres­crição da pena in concreto, a sentença não é causa interruptiva, pois não se interrompe aquilo que já cessou ou que já se con­sumou”. Para o Min. Luiz Gallotti, contudo, “a nossa lei é ex­pressa ao atribuir efeito interruptivo à sentença condenatória recorrível (art. 117, IV) e, por igual, no dizer que, em regra, a prescrição interrompida recomeça a correr por inteiro (art. 117, § 22), a tomar claro que ficou inutilizado, para tal fim, o prazo que fluiu anteriormente”. Diante disso, a partir da sentença condenatória, o prazo prescricional, na ausência de recurso da acusação, passaria a ser regido pela pena imposta e não pela pena abstrata, como ocorria anteriormente5. Era vencedora a corrente defendida pelo Min. Luiz Gallotti, de modo que o Pretório Excelso, por maioria, entendia que a pena imposta na sentença condenatória, havendo apelação somente do réu, pas­sava a reger o prazo prescricional a partir da data de sua publi­cação, não tendo efeito retroativo.

Essa posição permaneceu até fins de 1959, quando então as duas posições passaram a ter igualdade de votos, dependen­do a decisão, como informa Nilson Vital Naves, “da composi­ção do Tribunal no momento do julgamento”6.

A partir de 1960, contudo, com a alteração no quadro de

5. RT, 277:574 e 220:519; RTJ, 72:208; citações de Nilson Vital Na­ves, O Supremo Tribunal Federal, Justitia, &S:285.

6. O Supremo Tribunal Federal, Justitia, 88:287.

Ministros, a tese favorável à retroatividade da pena concreta passou novamente a ser vencedora. E em 1964 foi editada a Súmula 146, consagrando a prescrição retroativa: ^AjyescrL— ção da ação penal regula-se pela pena concretizada na septen- . ça^quandq não há recurso da acusação”. Inicialmente, o Pretório Excelso reconhecia todas as conseqüências lógicas do princípio sumular, permitindo a contagem do prazo entre a data do fato e a do recebimento da denúncia, não exigindo recurso do réu e o aplicando em caso de condenação em segundo grau. Em 1970, entretanto, teve início movimento no sentido de res­tringir o seu alcance, exigindo-se os seguintes requisitos para a sua aplicação: sentença condenatória de primeiro grau; exis- tência de apelação da defesa e inexistência de recurso da acu- saçao e contagem do prazo somente entre a data do recebimen­to da denúncia e a publicação da sentença condenatória. Sobre a restrição, disse o Min. Luiz Gallotti: “Como entendo que a Súmula é errada, e tenho que me submeter a ela, não amplio o erro — fico no erro, mas não vou além dele”7. A prescrição retroativa não podia incidir nos seguintes casos: existência de apelação da acusação, provida ou improvida; inexistência de recurso do réu; prazo entre a data do fato e a do recebimento da denúncia; absolvição em primeira instância e condenação no Tribunal e pena atenuada em segundo grau. Essa orientação restritiva, segundo informação de Nilson Vital Naves, vigorou com certa tranqüilidade até final de 1974, quando o Pretório Excelso, com dois novos Ministros (Leitão de Abreu e Cordei­ro Guerra), reviveu os debates sobre o tema e se inclinou no sentido liberal, não aceitando, entretanto, todas as conseqüên­cias lógicas do princípio retroativo.

7. RTJ, 59:893; citação de Nilson Vital Naves, O Supremo Tribunal Federal, Justitia, 88:290.

123

2. O ANTEPROJETO DE CP. O CP DE 1969. A LEIN . 6.016/73

Em 1963, um ano antes da edição da Súmula 146 do STF, foi publicado o Anteprojeto de CP, que, no art. 110, § 1Q, com a indicação marginal “superveniência de sentença condenatória de que somente o réu recorre”, adotava expressamente a pres­crição retroativa: “Sobrevindo sentença condenatória, de que somente o réu tenha recorrido, a prescrição passa a regular-se pela penã" imposta, e deve ser logo declarada, sem prejuízo do andamento do recurso, se, entre a última causa interruptiva do curso da prescrição (§ 52) e a sentença, já decorreu tempo su­ficiente”.

O Decreto-lei n. 1.004, que instituiu o CP de 1969, não adotou o princípio retroativo no tocante à pena imposta na sen­tença sem recurso da acusação. O art. 111, § l 9, com a indica­ção marginal “superveniência de sentença condenatória de que somente o réu recorre”, impedia o efeito retroativo: “A pres­crição, depois da sentença condenatória de que somente o réu tenha recorrido, regula-se também, daí por diante, pela pena imposta e verifica-se nos mesmos prazos” (grifo nosso). A expressão daí por diante indicava que a pena imposta na sen­tença, havendo apelação somente do réu, passava a regular o prazo prescricional superveniente à data de sua publicação, vedado o efeito retroativo. Recorrendo somente o réu e não havendo, em face disso, possibilidade de ser agravada a pena, da sentença em diante ela passava a reger a prescrição. Assim, a sentença condenatória cumpria sua função de causa inter­ruptiva do prazo prescricional, permitindo que após ela reco­meçasse a correr outro lapso, agora não mais regulado pela pena abstrata, mas concreta. Sobre o tema, explicava a Expo­sição de Motivos: “Em matéria de prescrição, o Projeto expres­

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samente elimina a prescrição pela pena em concreto, estabele­cendo que, depois da sentença condenatória de que somente o réu tenha recorrido, ela se regula também, daí por diante, pela pena imposta. Termina-se, assim, com a teoria brasileira da prescrição pela pena em concreto, que é tecnicamente insus­tentável e que compromete gravemente a eficiência e a serie­dade da repressão” (n. 37).

Surgiu então o Projeto de lei n. 1.457, de 1973, do Poder Executivo, apresentando emendas ao CP de 1969. O § l 2 do art. 111 teve sua indicação marginal alterada para “super- veniência de sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação”. Rezava o texto: “A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusa­ção, regula-se, também, pela pena imposta e verifica-se nos mesmos prazos”. Na Exposição de Motivos do Projeto, o en­tão Min. Alfredo Buzaid esclarecia que, com fundamento na doutrina de Nélson Hungria e acatando o princípio contido na Súmula 146 do STF, a disposição adotava o princípio sumular retroativo. Para isso, havia suprimido a expressão “daí por di­ante”, não mais exigindo recurso exclusivo do réu, mas trânsi­to em julgado da sentença condenatória para a acusação. Esta­va aceito o princípio de que a pena concretizada na sentença, sem possibilidade de agravação em face da inexistência de re­curso da acusação, era a sanção ab initio justa para a resposta penal, revelando-se a sanção abstrata muito severa e injusta para regular o lapso prescricional.

No final de 1973 surgiu a Lei n. 6.016, de 31 de dezem­bro, fruto do Projeto de lei n. 1.457/73, que introduziu modifi­cações no CP de 1969. O art. 111, § l 2, mantinha a mesma redação anterior, admitindo, segundo o Min. Alfredo Buzaid, a prescrição retroativa.

125

3. A REFORMA PENAL DE 1977 (LEI N. 6.416/77)

Em março de 1977, a Presidência da República, pela Mensagem n. 37/77, enviou ao Congresso Nacional o Projeto de lei n. 2, alterando dispositivos do CP de 1940. Dentre as modificações, como esclareceu o Min. Armando Falcão, pas­sou a disciplinar-se “o prazo da prescrição posterior à senten­ça condenatória, eliminando uma elástica interpretação que vinha sendo causa de impunidade, não só quanto à pena prin­cipal, como também à acessória, com indesejáveis efeitos ju- rídico-sociais”8. Do Projeto de lei n. 2 surgiu a Lei n. 6.416, de 24-5-1977, que alterou o regime da prescrição em nossa legislação penal. O art. 110 do CP, com as modificações, pas­sou a ter a seguinte redação:

“A prescrição, depois de transitar em julgado a sentença condenatória, regula-se pela pena imposta e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente.

\ § 1Q A prescrição, depois da sentença condenatória comí trânsito em julgado para a acusação, regula-se, também, pela

J pena aplicada e verifica-se nos mesmos prazos.§ 2~ A prescrição, de que trata o parágrafo anterior, im­

porta, tão-somente, em renúncia do Estado à pretensão executória da pena principal, não podendo, em qualquer hipó­tese, ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia”.

De forma complicada e confusa estava consagrada em nosso CP a tese da prescrição retroativa, genuína e incompa­

8. Exposição de Motivos do Projeto, n. 15.

' 126

rável criação brasileira, desconhecida na doutrina e na legisla­ção estrangeiras.

J Com o advento da inovação de 1977, passou nossa legis- (j lação penal a prever três espécies de prescrição:

Ia) prescrição da pretensão punitiva (CP, art. 109);2~) prescrição da pretensão executória (CP, art. 110,

caput)\ e\ 3~) prescrição retroativa (CP, art. 110, § 22).

4. A REFORMA PENAL DE 1984

A Lei n. 7.209, de 11-7-1984, que deu nova redação à Parte Geral do CP de 1940, passou a reger a prescrição retroa­tiva nos §§ l 2 e 2e do art. 110:

“§ l 2 A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada.

§ 22 A prescrição, de que trata o parágrafo anterior, pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denún­cia ou da queixa”.

Nos termos do novo sistema penal, duas são as espécies de prescrição em nossa legislação:

1-) prescrição da pretensão punitiva: arts. 109 e 110, §§ l 2 e 2Q; e

2~) prescrição da pretensão executória: art. 110, caput.

5. NATUREZA JURÍDICA

A denominada prescrição retroativa, da maneira como foi disciplinada na reforma penal de 1984, constitui forma da pres-

crição da pretensão punitiva (da ação)9. Tem por fundamento a inércia da autoridade pública, punindo-a com a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva quando não ultima o processo criminal nos prazos legais10.

O art. 109, caput, disciplinando a prescrição da pretensão punitiva, diz que, em regra, o prazo é considerado em face da pena abstrata, excepcionando dois casos em que se leva em conta a pena concreta, precisamente a prescrição superveniente e a prescrição retroativa (§ § 12 e 2Q do art. 110)^Daí configurara, prescrição retroativa forma da prescriçãoda pretensão punitiva.

6. CONFLITO INTERTEMPORAL DE LEIS

O art. 110, § 22, do CP, com redação da Lei n. 6.416/77, havia incorporado o conteúdo da Súmula 146 do STF, restrin­gindo o alcance da prescrição retroativa em dois pontos:

l 2) o texto limitava a contagem do prazo extintivo da

9. RECrim 105.019, 2a Turma do STF, em 21-5-1985, v. un., Rei. Min. Aldir Passarinho, DJU , 29 nov. 1985, p. 21922; RTJ, 118:219- RT, 613:311-, STF, HC 68.924, DJU, 13 dez. 1991, p. 18355; RTJ, 738:815; TACrimSP, RECrim 575.497, RT, 648:306; STJ, ARAI 242, RSTJ, 6:11.

10. A 2- Turma do STF, entretanto, adotando a posição tomada pelo Plenário no tocante à prescrição superveniente à sentença condenatória (vide nota 11 do Capítulo III, n. 9, desta obra), entendeu que nem sempre a prescrição retroativa atinge a pretensão punitiva. Fez distinções: se a apelação da defesa visa à absolvição, não havendo sentença condenatória com trânsito em julgado, a hipótese é de prescrição da pretensão punitiva; se, porém, a defesa, não se rebelando contra a condenação, pretende a redução da pena, a prescrição incide sobre a pretensão executória (RECrim 104.985, em 18-9-1987, v. un., Rei. Min. Célio Borja, DJU, 9 out. 1987; no mesmo sentido: STF, RECrim 104.599, RTJ, 127:219). Para nós, como ficou consignado no estudo do art. 110, § l 2, do CP, há prescrição da pretensão punitiva nas duas hipóteses.

128

punibilidade entre a data do recebimento da denúncia e a da publicação da sentença condenatória;

29) só permitia que a extinção da punibilidade atingisse a pretensão executória da pena principal, subsistindo os ou­tros efeitos da sentença condenatória.

O antigo parágrafo único do art. 110 do CP, em que se assentava a Súmula 146, não impedia a contagem do prazo anterior à denúncia. Tanto é que o STF, em certo período, ad­mitia a consideração desse prazo1'. O texto do § 22 do art. 110, contudo, não permitia fosse levado em conta o tempo a partir da data do fato.

Incidente a Súmula 146, a sentença condenatória perdia total validade, salvo a eficácia de fixar a quantidade da pena para efeitos prescricionais retroativos. Assim, desapareciam todos os efeitos da sentença condenatória, principais ou aces­sórios. De acordo com o texto de 1977, entretanto, só era ex­tinta a pretensão executória das penas principais, subsistindo a sentença condenatória, as primitivas penas acessórias, as medidas de segurança e as conseqüências secundárias da con­denação.

Certo ou errado o seu conteúdo, a Súmula 146 tinha as­sento legal no antigo parágrafo único do art. 110 do CP, tanto que todos os acórdãos do Pretório Excelso a ela faziam e fa­zem referência. Era então aquele dispositivo que permitia a incidência da prescrição retroativa.

11. Era tranqüila a jurisprudência do Pretório Excelso em termos de não admitir, em relação aos fatos cometidos ao tempo da Súmula 146, a consideração do prazo prescricional retroativo anterior à data do recebi­mento da denúncia (RTJ, 83:610, 96:610 e 1401 e 97:421). De ver-se, en­tretanto, que tal restrição não vinga diante do novo texto do § 2° do art. 110 do CP, parte final, em que se admite a contagem do prazo a partir do fato (RT, 598:441 e 595:360).

129

Comparando-se as duas disposições, a do antigo parágra­fo único com a do § 22 do art. 110 do CP, na reforma penal de 1977, via-se que aquele, em face das duas restrições da lei nova supramencionadas, era mais favorável ao réu. Diante disso, no conflito intertemporal de leis, prevalecia a ultra-atividade da disposição anterior. Em conseqüência, a Súmula 146 e o anti­go parágrafo único do art. 110 do CP continuavam a regular os fatos ocorridos antes de 25-5-1977, data em que entrou em vigor a Lei n. 6.416. Não se tratava, que fique bem assinalado, de comparar a Súmula 146 com o anterior § 2° do art. 110 do CP. Cuidava-se de comparar duas disposições: uma, a do anti­go parágrafo único, em que se assentava a Súmula 146, que permitia, com variação de entendimento na jurisprudência, os efeitos da prescrição retroativa; outra, a do anterior § 22 do art. 110 do CP, que, adotando expressamente o princípio sumular, não permitia a sua aplicação com todas as conse­qüências da adoção da tese sumular, as quais a legislação anti­ga não impedia12.

Com o advento da Lei n. 7.209, de 11-7-1984, que reformulou a Parte Geral do CP, a prescrição retroativa, como ficou consignado, retomou ao seu destino de forma de pres­crição da pretensão punitiva. Assim, no conflito intertemporal de leis (redação do § 2- do art. 110 do CP nos termos das Leis

12. O Grupo de Trabalho da Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo, designado para apreciar a Lei n. 6.416/77, chegou à seguinte con­clusão: “A interpretação do antigo parágrafo único do art. 110 do CP, ob­jeto da Súmula n2 146 do STF, por ser mais favorável ao réu (Const. Fede­ral, art. 153, § 16), aplica-se às infrações cometidas antes da vigência da Lei n9 6.416/77” (entendimento original de Dante Busana; Justitia, 99:525). É a posição tranqüila da jurisprudência (RT, 503:282; RJTJSP, 46:215 e 49:301; JTACrimSP, 48:381 e 50:369, 378 e 389; STF, DJU, 18 nov. 1977, p. 88233). Sobre os efeitos amplos da Súmula 146: RT, 391:323; RDPen, 6:138.

130

ns. 6.416/77 e 7.209/84), deve prevalecer o efeito retroativo da posterior, mais benéfica que a anterior.

Tratando-se de crime permanente, parte cometida ao tem­po da anterior redação do § 2a do art. 110 do CP e parte sob a vigência do novo texto, advindo da reforma penal de 1984, deve incidir a lei nova, mais benéfica.

Cuidando-se de crime habitual, realizado parcialmente sob a vigência do antigo § 22 do art. 110 do CP, e parte sob a lei nova, menos gravosa, de aplicar-se esta, desde que os atos cometidos durante a norma posterior sejam em número sufici­ente para a configuração da habitualidade.

7. COMO SE CONTA O PRAZO PRESCRICIONAL

Desde que transitada em julgado para a acusação ou improvido o seu recurso, verifica-se o quantum da pena im­posta na sentença condenatória. A seguir, ajusta-se tal prazo num dos incisos do art. 109 do CP. Encontrado o respectivo período prescricional, procura-se encaixá-lo entre dois pólos: a data da consumação do crime e a do recebimento da denún­cia ou da queixa ou a data do recebimento da denúncia ou da queixa e a da publicação da sentença condenatória13. Se o pra­zo prescricional couber, contado retroativamente, entre a data em que a sentença condenatória foi publicada e a em que hou­ve o recebimento da denúncia, ou entre a desta e a da consu­mação do crime, caberá a extinção da punibilidade, nos ter­mos do § 2S do art. 110 do CP.

13. É importante, pois, a exata fixação da data da publicação da sen­tença condenatória, como veremos em outro item.

131

Exemplo: processado por lesão corporal leve (CP, art. 129, caput), o sujeito vem afinal a ser condenado ao mínimo legal, três meses de detenção. A sentença condenatória tran­sita em julgado para a acusação. Apelando ou não o réu, pode ser averiguado se ocorreu a extinção da punibilidade pela prescrição retroativa. Suponha-se que a denúncia tenha sido recebida em 4-4-2000, vindo a ser publicada a sentença em 10-5-2002.

2-1-2000 RD 1 ano 2 anos PSC TJSCMP---------1------1-------1-------1------- 1_A B PR ---------- * C ----------- D E

1 I I4-4-2000 3-4-2002 10-5-2002

A = data do crime de lesão corporal leve (2-1 -2000)RD = data do recebimento da denúnciaPSC = data da publicação da sentença condenatóriaTJSCMP = data do trânsito em julgado da sentença conde­

natória para o Ministério PúblicoPR = prescrição retroativa

A partir da data do cometimento do crime estava correndo um prazo prescricional da pretensão punitiva, regulado pelo máximo da pena abstrata. Como esta é de um ano de detenção (CP, art. 129, caput), tal prazo era de quatro anos (CP, art. 109, V). Passados três meses da data do fato a denúncia foi recebida (4-4-2000). Interrompeu-se o prazo prescricional de quatro anos (CP, art. 117,1). E a partir da data em que a denúncia foi recebi­da outro prazo de quatro anos começou a correr (CP, art. 117, § 2o). Pouco mais de dois anos, porém, contados do recebimento da denúncia, foi publicada a sentença condenatória (10-5-2002).

132

Houve nova interrupção do prazo prescricional de quatro anos. No maBV&tU£L.em que transitou em julgado a sentença condenatória para o Ministério Público, ou foi improvido o seu recurso, surgiu a possibilidade de ser verificada a ocorrência da prescriçãorètroativa.^fci ela realmente ocorreu, condenado o réu a três meses de detenção, como restou assinalado, o prazo prescricional é de dois anos. E decorreu o biênio entre a data do recebimento da denúncia (4-4-2000) e a da publicação da sen­tença condenatória (10-5-2002). Significa que a extinção da punibilidade, pela prescrição retroativa, nos moldes do § 2° do art. 110 do CP, ocorreu no dia 3-4-2002, dois anos depois do recebimento da denúncia. De modo que a sentença condenatória, quando foi publicada, um mês depois, não tinha capacidade de gerar o efeito da pretensão punitiva, extinta diante do preceito legal. Isso não ocorreria se a sentença condenatória tivesse sido publicada até 2-4-2002. Esse prazo, entre os pontos B e C, que antes era regulado pela pena abstrata, transitando em julgado a sentença condenatória para a acusação, ou sendo improvido o seu recurso, passou a ser disciplinado pela pena concreta14.

É possível que o prazo prescricional tenha decorrido nos dois períodos. Ex.: prazo de dois anos decorridos, quer entre a data da consumação do crime e a do recebimento da denún­cia, quer entre esta e a da publicação da sentença condenatória. Nesse caso, considera-se o primeiro período, sendo irrelevante levar-se em conta o segundo.

Tendo sido aplicada pena restritiva de direitos na senten­ça condenatória, o prazo prescricional é regulado pelo seu

14. Isso lembra a história do sacerdote que na missa de sábado à noite anunciou aos fiéis que a procissão do dia seguinte seria às quatro horas da tarde, salvo se viesse a chover à tarde, caso em que ela seria realizada às nove horas da manhã.

133

quantum, que corresponde ao da pena privativa de liberdade (CP, arts. 55 e 109, parágrafo único).

A prescrição retroativa difere da prescrição superveniente à sentença condenatória. Na retroativa, devemos considerar o prazo da data da publicação da sentença condenatória para trás, até a data do recebimento da denúncia ou da queixa; ou entre esta data e a da consumação do crime. Na superveniente, con­tamos o prazo da sentença condenatória para frente.

Demonstração gráfica:

A -------------------- B ------------------ C --------------------------------D

|-------------------------- 1------------------------ 1---------------------- 1-----------CC RD PSC TJSCA ou IRA

CC = data da consumação do crimeRD = data do recebimento da denúncia (ou da queixa)PSC = publicação da sentença condenatória TJSCA = trânsito em julgado da sentença condenatória para a

acusaçãoIRA = improvimento do recurso da acusação

— a intgrcorrente (CP, art. 110, § l 2) pode ocor­rer do ponto “C” em diante, i. e., a partir da publicação da sen­tença condenatória. Ao contrário, a prescrição retroativa pode ter seu curso esgotado entre o recebimento da denúncia (ou da queixa) e a publicação da sentença condenatória; ou entre a consumação do crime e a data do recebimento da denúncia. A primeira ocorre depois da sentença. Por isso se denomina “superveniente”. A outra, a retroativa, ocorre antes da senten­ça. Por isso se chama “retroativa”.

134 ^ A

8. FIXAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL

a) Causas de aumento e de diminuição de pena, agravantes e atenuantes

As causas de aumento ou de diminuição da pena, previs­tas na Parte Geral ou na Parte Especial do CP, quando consi­deradas na sentença condenatória, são levadas em conta para a contagem do prazo prescricional retroativo15. Assim, supo­nha-se que a sentença, condenando o réu por tentativa de estu­pro simples (CP, art. 213, caput), tenha fixado a pena-base no mínimo legal (seis anos de reclusão) e a reduza de um terço, perfazendo o total de quatro anos. O prazo prescricional retro­ativo deve ser considerado em face da causa de diminuição, sendo regulado pela pena de quatro anos de reclusão. Assim, ocorre em oito anos (art. 109, IV) e não em doze anos (art.109, III). Não incide, entretanto, o acréscimo de pena previsto para o concurso formal e crime continuado (CP, arts. 70 e 71), como veremos oportunamente. Nesse sentido: STJ, ROHC 9.131, 5a Turma, DJU, 21 fev. 2000, p. 140.

Como se leva em conta a pena total imposta na sentença, são consideradas as circunstâncias agravantes e atenuantes (CP, arts. 61, 62 e 65). São também consideradas as causas de dimi­nuição da pena aplicadas na sentença, como a da tentativa. Nesse sentido: STJ, ROHC 9.131, 5â Turma, DJU, 21 fev. 2000, p. 140.

b) Menoridade relativa

A menoridade relativa16, para produzir o efeito previsto no art. 115 do CP, permitindo a redução do prazo pres-

15. STF, RTJ 79:443 e 95:1050; RT, 596:448.16. Sujeito menor de 21 anos ao tempo da prática do crime, desde

que nessa data tenha alcançado a maioridade penal.

135

cricional pela metade, requer comprovação por intermédio do registro de nascimento, ainda que não tenha sido contestada pela acusação. Para outros efeitos, como para a atenuação genérica da pena (CP, art. 65, I, l â parte) ou nomeação de curador no processo criminal (CPP, art. 262), não se exige a comprovação da menoridade por meio de documento (certi­dão de nascimento). Para o efeito do reconhecimento da pres­crição, contudo, levando-se em conta seu efeito extintivo da punibilidade, de incidir a restrição do art. 155 do CPP, pelo que a simples inexistência de contestação por parte da acu­sação não leva à consideração da menoridade, não se pres­cindindo da certidão de nascimento17. É o que vem entenden­do a jurisprudência18.

Segundo nosso entendimento, o art. 115 do CP não foi al­terado pelo art. 5a do CC, que baixou a maioridade para 18 anos.

c) Reincidência

A reincidência não aumenta o prazo prescricional retroa­tivo, sendo inaplicável o disposto no art. 110, caput, parte fi­nal, do CP, que determina o acréscimo temporal de um terço.

17. Sobre o tema, vide nosso Código de Processo Penal, cit., p. 114, com fundamentação e registro doutrinário; vide também RT, 617:353.

18. STF, RHC 56.865-SP, 2â Turma, em 23-3-1979, v. un., Rei. Min. Leitão de Abreu, DJU, 19abr. 1979, p. 3065; RECrim 93.113-SP, PTurma, em 7-10-1980, m. v., Rei. Min. Soares Munoz, DJU, 6 fev. 1981, p. 515; RTJ, 92:978. Não basta o RG (STF, RTJ, 85:1047). Nos termos da Súmula 74 do STF, a prova da menoridade se faz por documento hábil. Vide posição de Dante Busana, Juiz do TACrimSP, em JTACrimSP, 24:158 (no sentido restrito do texto).

136

Assim, mesmo que o Juiz, na sentença condenatória, reconhe­ça a reincidência, o prazo prescricional, para efeito do precei­to do § 22 da mesma disposição, é regulado pela pena concre­ta, que, em tese, já reconheceu a recidiva, sem o aumento de terça parte. A jurisprudência é quase unânime nesse ponto19. Nesse sentido: STJ, HC 10.133, 5â Turma, DJU, 13 dez. 1999, p. 181; TACrimSP, HC 375.332, 16a Câm., rei. Juiz Lopes de Oliveira, RT, 794:606.

d) Multa

Quando imposta somente pena de multa na sentença condenatória, transitando em julgado a decisão para a acusa­ção, ou sendo improvido o seu recurso, o prazo prescricional retroativo é regulado pelo disposto no art. 114 do CP, ocorren­do em dois anos. Conta-se o prazo entre a data da consuma­ção do crime e a do recebimento da denúncia ou entre esta e a da publicação da sentença condenatória.

9. PRESSUPOSTOS DE APLICAÇÃO E APELAÇÃO DO RÉU

a) Exigência de uma decisão condenatória de primeiro ou se­gundo grau

Para que incida a prescrição retroativa é imprescindível a existência de uma sentença condenatória. Nesse sentido:

19. RT, 428:298, 597:291 e 600:302; JTACrimSP, 20:131, 22:62, 28:317,43:371 e 90:167. Contra: JTACrimSP, 48:319; STJ, REsp 46, RSTJ, 4:1481. No sentido do texto, cuidando da prescrição na hipótese de conde­nação a multa: Rodrigues Porto, Da prescrição penal, 2. ed., São Paulo, 1977, p. 141, n. 76, in fine.

137

STF, RHC 66.913, RT, 639:389. No mesmo sentido: RT, 658:333 e 667:328. Assim, ela descabe quando a decisão é absolutória ou meramente declaratória da extinção da punibi­lidade, sem condenar o réu. Nesse sentido, abordando hipóte­se de sentença absolutória que impôs medida de segurança: STF, HC 68.783, P Turma, Rei. Min. Moreira Alves, DJU, 11 out. 1991, p. 14250; RTJ, 138:204. É admissível também quan­do, absolvido o réu em primeira instância, vem a ser condena­do no Tribunal, em face de recurso oficial ou da acusação.

b) Quando é aplicado o perdão judicial

O princípio retroativo também incide quando se trata de sentença concessiva de perdão judicial. Pressupondo con­denatória a sentença, há oportunidade de ser aplicada a pres­crição retroativa, nos termos do regime do § 2Q do art. 110 do CP. Inexistia ao tempo da reforma penal de 1977. Isso porque o anterior sistema indicava o efeito de essa espécie de prescri­ção atingir a pretensão executória da pena principal. E no per­dão judicial não há aplicação de pena. Hoje a hipótese existe, uma vez que a prescrição retroativa importa a extinção da pu­nibilidade pela prescrição da pretensão punitiva. Nesse caso, deve ser considerado o mínimo abstrato da pena privativa de liberdade cominada ao delito20.

Não há falar-se em prescrição, na espécie, para os que ado­tam a tese de que a sentença que concede o perdão judicial é absolutória ou declaratória da extinção da punibilidade. Se não há sentença condenatória, não pode ser aplicado o § 22 do art.

20. RT, 614:320; STF, RECrim 104.961, 2a Turma, em 30-10-1987, DJU, 30 out. 1987, p. 23811 e 23812; RT, 624:417 e RTJ, 724:1138; TACrimSP, ACrim 452.347, RT, 620:310.

138

110 do CP, que a pressupõe. Assim, para o STJ, a sentença que aplica o perdão judicial é declaratória da extinção da punibilida­de, não subsistindo nenhum efeito condenatório (Súmula 18).

c) Necessidade de que a sentença condenatória tenha transi­tado em julgado para a acusação ou que tenha sido improvido seu recurso

Nos termos do § 29 do art. 110 do CP, a prescrição retroa­tiva é aplicável no caso “do parágrafo anterior”. E o § l 9 cuida de estabelecer princípio incidente somente depois que a senten­ça condenatória transita em julgado para a acusação ou que tenha sido improvida a sua apelação. Logo, é imprescindível para a aplicação do princípio retroativo que não caiba mais re­curso da acusação (Ministério Público, querelante e assistente, se for o caso), ou que ele tenha sido improvido. Assim, enquan­to couber recurso da acusação, ou durante sua tramitação, des­de que interposto visando à agravação da pena, conforme vere­mos em item posterior, não será possível a declaração da extin­ção da punibilidade. Entretanto, mesmo que provido, de modo a não alterar o prazo prescricional, não fica impedido o princí­pio retroativo. Nesse sentido: TRF/4a Reg., ACrim 96.04.65479, 2a Turma, Rei. Juiz Vilson Darós, RT, 763:105 e 708. Só há impedimento quando vem a ser provido de maneira a alterar o lapso prescricional, tornando impossível a extinção da punibi­lidade. Nesse sentido: TRF/48 Reg., ACrim 96.04.65479, 2a Turma, Rei. Juiz Vilson Darós, RT, 763:105 e 708.

d) Não-exigência de recurso do réu

A exigência de apelação do réu para efeito de reconheci­mento da prescrição retroativa correspondeu a uma primeira fase

de interpretação do antigo parágrafo único do art. 110 do CP e da antiga Súmula 146 por parte do primitivo S T F 1. Hoje, para a aplicação do disposto no art. 110, § 2Q, do CP, é prescindível que o réu tenha apelado. Enquanto o antigo dispositivo (art. 110, parágrafo único) previa o apelo do réu como condição da extinção da punibilidade, e ainda assim o STF, em posição poste­rior àquela primeira, e que ainda perdura, não exigia o recurso, com base na Súmula 146, o novo texto (§ 2e) apenas exige que tenha transitado em julgado a condenação para a acusação ou que tenha sido improvido o seu recurso. Daí o entendimento tranqüi­lo da desnecessidade de recurso de apelação do condenado.

e) Desnecessidade de que o réu tenha sido intimado da sen­tença condenatória

Para que seja declarada a extinção da punibilidade pela prescrição retroativa, nos moldes do § 2~ do art. 110 do CP, não se exige tenha o réu sido intimado da sentença condenató­ria, bastando que ela tenha transitado em julgado para a acu­sação ou que esta tenha interposto apelação visando a outro fim que não a agravação da pena22, ou que tenha sido improvi­do o seu apelo.

Exemplo:

C RD 1 ano 2 anos PSC TJSCMP IR

CP, art. 129, caput Pena:3 meses

21. Sobre o assunto, vide nosso Questões criminais, São Paulo, Sa­raiva, 1978, p. 218 e 236.

22. No sentido do texto: RT, 375:290 e JTACrimSP, 22:315. Embora tratando de fatos ocorridos ao tempo da Súmula 146 do STF, os princípios são perfeitamente aplicáveis ao regime do § 2° do art. 110 do CP.

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C = crime de lesão corporal leve (CP, art. 129, caput)RD = recebimento da denúnciaPSC = publicação da sentença condenatóriaTJSCMP = trânsito em julgado da sentença condenatória para

o Ministério Público IR = intimação do réu em andamento

Verifica-se que entre a data do recebimento da denúncia (RD) e a da publicação da sentença condenatória (PSC) media­ram mais de dois anos, prazo suficiente para, tendo transitado em julgado a sentença para a acusação ou improvido o seu apelo, permitir a extinção da punibilidade. Como a pena é in­ferior a um ano (3 meses de detenção), o prazo extintivo é de dois anos (CP, art. 109, VI), cabível entre os pólos inicial e final. Irrelevante que a diligência de intimação da sentença condenatória ao réu (IR) ainda esteja em andamento quando da declaração da prescrição retroativa.

10. TERMOS INICIAIS E FINAIS

a) Pode ser considerado o prazo prescricional retroativo en­tre a data da consumação do crime e a do recebimento da denúncia ou entre esta e a da publicação da sentença condenatória

No regime do art. 110, § 22, do CP, por disposição ex­pressa do texto, pode ser considerado o prazo entre a data do fato e a do recebimento da denúncia ou entre esta e a da publi­cação da sentença condenatória.

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Exemplo:

C 1 ano 2 anos RD PSC— 6 meses —

I----------------h -

art. 129, caput Pena:3 meses

de detenção

C = data do crime de lesão corporal leveRD = recebimento da denúnciaPSC = publicação da sentença condenatória

Processado o réu por delito de lesão corporal leve, vem a ser condenado a três meses de detenção. A sentença condena­tória transitou em julgado para a acusação e mediaram mais de dois anos entre a data do fato (C) e a do recebimento da denúncia (RD). Pode ser reconhecida a prescrição retroativa. Isso porque o CP expressamente determina que o prazo “pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denún­cia ou da queixa” (CP, art. 110, § 2e, parte final).

Da mesma forma, o prazo pode ser contado entre a data do recebimento da denúncia ou queixa e a da publicação da sentença condenatória.

b) Não pode ser considerado o prazo prescricional retroativo entre a data do recebimento da denúncia e a do acórdão confirmatório da sentença condenatória ou que reduziu a pena

Condenado o réu em primeiro grau, ele apela e o Tribunal reduzapena. O prazo da prescrição retroativa, regulado pela pena reduzida (e não pela pena imposta na sentença), só pode ser contado entre a data do fato e a do recebimento da denúncia ou

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entre a desta e a da publicação da sentença condenatória, veda­da a data do acórdão como termo final. O fundamento está em que a sentença condenatória constitui causa interruptiva da prescrição (CP, art. 117, IV)23. O mesmo ocorre quando o Tri­bunal mantém a pena imposta em primeira instância.

c) Condenado o réu em segunda instância, o prazo deve ser considerado entre a data do fato e a do recebimento da denúncia ou entre a desta e a da publicação, na sessão de julgamento, do acórdão condenatório

Absolvido o réu em primeira instância e havendo recur­so de ofício ou da acusação, vindo a ser condenado pelo Tri­bunal, o prazo prescricional retroativo deve ser considerado entre a data do recebimento da denúncia e a da sessão de jul­gamento, em que é publicado o acórdão condenatório (primi­tivo STF, RTJ, 95:1058). Hoje não há impedimento a que tam­bém seja reconhecido entre a consumação do crime e a data do recebimento da denúncia (CP, art. 110, § 2S, parte final).

d) Nos processos da competência do Júri pode ser considera­do o prazo entre a data do fato e a do recebimento da de­núncia ou entre esta e a pronúncia ou entre esta e a sua confirmação pelo Tribunal ou entre a pronúncia ou sua confirmação e a data em que é proferida a sentença condenatória na sessão de julgamento

Tratando-se de ação penal da competência do Tribunal do Júri, o prazo prescricional retroativo, em regra, deve ser

23. No sentido do texto: STF, HC 55.481-SP, 2a Turma, em 30-8-1977, v. un., Rei. Min. Moreira Alves, DJU, 7 out. 1977, p. 6913; HC 61.128, 2a Turma, em 21-10-1983, v. un., Rei. Min. Moreira Alves, DJU, 16 dez. 1983, p. 20118; STF, HC 68.523, 2a Turma, RTJ, 737:722.

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considerado entre a data do julgamento condenatório e a da última causa interruptiva (pronúncia ou sua confirmação). Nada impede, contudo, que o mesmo prazo seja contado entre a data do fato e a do recebimento da denúncia ou entre esta e a pronúncia ou entre esta e sua confirmação pelo Tribunal24.

11. OPORTUNIDADE DE DECLARAÇÃO

a) No regime do § 2~ do art. 110 do CP a prescrição retroati­va não pode ser declarada em primeira instância

Nos termos da lei nova, proferida a sentença condena­tória, o Juiz não pode declarar a extinção da punibilidade pela prescrição retroativa. Isso porque, constituindo ela modalida­de de prescrição da pretensão punitiva (da ação), julgada esta procedente na sentença condenatória, não pode ser julgada, posteriormente, improcedente. Não pode o Juiz, esgotada sua jurisdição, reconhecer que ao tempo da condenação, na verda­de, não havia mais a pretensão punitiva do Estado. Se assim o fizer estará reformando a própria decisão, o que é proibido25. No regime anterior, entretanto, como a prescrição retroativa,

24. Apreciando hipótese da Súmula 146, o STF aplicou princípio que se adapta ao disposto no § 2° do art. 110 do CP: “decorridos mais de quatro anos entre a data da sentença de pronúncia e a da condenação a dois anos de reclusão, da qual somente recorreu o réu, sem causa suspensiva ou interruptiva da prescrição, verifica-se esta”, i. e., verifica-se a prescrição retroativa (HC 57.631-RJ, Ia Turma, em 15-4-1980, v. un., Rei. Min. Thompson Flores, DJU, 23 maio 1980, p. 3731). Vide RT, 611:353.

25. No sentido do texto: Rodrigues Porto, Da prescrição penal, cit., p. 215-6; TACrimSP, HC 160.546, JTACrimSP, 94:455; RT, 767:718. Con­tra: TACrimSP, AE 535.665, RT, 639:316; RECrim 528.735, RT, 633:312 e JTACrimSP, 98:365; ACrim 517.633, RJDTACrimSP, 2:118; ACrim 522.663, RJDTACrimSP, 2:43.

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nos teniios do que dispunha o § 29 do art. 110 do CP, na refor­ma penal de 1977, constituía causa extintiva da pretensão executória, não da punitiva, nada impedia que o Juiz, após a sentença condenatória, desde que transitada em julgado para a acusação, declarasse a extinção da punibilidade. Reconhecida a procedência da pretensão punitiva na sentença, o Juiz estaria apenas declarando extinta a pretensão executória das penas principais. Não estaria rescindindo a própria sentença.

De observar-se que o art. 66, II, da LEP, determina a com­petência do ju iz da execução para “declarar extinta a punibilidade”. Cuidando-se de prescrição, entretanto, cremos que ele não pode declarar a prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa, pois estaria desconstituindo a sen­tença do jüiz do mesmo grau de jurisdição. Assim, sua com­petência se restringe à declaração da extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão executória (CP, art. 110, caput). Nesse sentido: TACrimSP, HC 160.546, JTACrimSP, 94:455. Contra: TACrimSP, ACrim 517.633, JTACrimSP, 97:298.

b) Impossibilidade de ser declarada a prescrição retroativa antes da sentença condenatória (a denominada “prescri­ção antecipada ” ou “por perspectiva ”)

A declaração da extinção da punibilidade pela prescri­ção retroativa pressupõe a existência de uma sentença conde­natória. Em face disso, não pode ser reconhecida antes da condenação26.

26. No sentido do texto: JTACrimSP, 43:118 e 45:408; JTJ, 153:273; TACrimSP, ACrim 682.807, RT, 688:323; TACrimSP, ACrim 703.071, RJDTACrimSP, 74:127; TJSC, ACrim 28.576, RT, 695:380; RJDTACrimSP, 78:184, 185, 186, 189 e 191; 20:190, 201, 213 e 243; STJ, HC 4.707, 5a Turma, DJU, 11 set. 1995, p. 28840; TJSP, RCrim 198.847, JTJ, 779:268; RT, 734:742; JTJ, 782:280; STJ, RHC 6.567, DJU, 22 set. 1997, p. 46560; TACrimSP, RCrim 1.171.049, 4a Câm., Rei. Juiz Devienne Ferraz, RT,

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c) Impossibilidade de ser reconhecida a prescrição retroativa na própria sentença condenatória

Exigindo-se que a decisão tenha transitado em julgado para a acusação ou que tenha sido improvido o seu recurso (CP, art. 110, §§ l 2 e 22), não é admissível que o Juiz, na pró­pria sentença condenatória, declare a extinção da punibilidade pela prescrição retroativa27.

d) Apreciação do mérito

No regime da Súmula 146 do STF, que se assentava no antigo parágrafo único do art. 110 do CP, o tema da prescrição retroativa constituía preliminar de mérito. Sem entrar no mé­rito, o Tribunal podia reconhecê-la, uma vez que extinguia a pretensão punitiva (da ação). No regime da reforma penal de 1977, permitindo-se somente a extinção da pretensão execu­tória das penas principais, a questão da prescrição retroativa deixou de ser preliminar capaz de impedir a análise do mérito. Em primeiro lugar o Tribunal apreciava o mérito. Mantida a sentença condenatória, passava a apreciar a incidência do art.110, § 22, do CP.

Retomando o sistema penal, na reforma de 1984, ao re­gime da prescrição da pretensão punitiva, a prescrição retroa­tiva impede o exame do mérito28. Assim, havendo recurso da

775:622; STJ, RHC 12.055, 5â Turma, Rei. Min. Arnaldo da Fonseca, DJU, 13 maio 2002, p. 210. No mesmo sentido, na doutrina: Luiz Vicente Cemicchiaro, Questões penais, Belo Horizonte, Del Rey, 1998, p. 194 (Pres­crição antecipada).

27. No sentido do texto: TACrimSP, JTACrimSP, 43:150; TAMG, RHC 702, RT, 628:356; TAMG, ACrim 120.179, RT, 687:331.

28. No sentido do texto: RT, 603:407, 604:386 e 642:328.

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defesa, o princípio retroativo impede o seu exame. No caso de recurso da acusação visando ao agravamento da pena, em pri­meiro lugar o Tribunal aprecia a sua procedência. Improvido, declara a extinção da punibilidade. Da mesma forma, quando provido de modo a não alterar o prazo prescricional.

E se réu e acusação apelam, o primeiro pretendendo a absolvição; a segunda, a agravação da pena?

O Tribunal, em primeiro lugar, julga o apelo da defesa, en­frentando o mérito, absolvendo o réu ou mantendo a condena­ção. Se absolvido, fica prejudicado o apelo da acusação; manti­da a condenação, passa a julgar o recurso da Justiça Pública, do assistente ou do querelante. Improvido, ou provido de forma a não alterar o prazo extintivo, aplica-se o princípio retroativo.

e) Pena reduzida em segunda instância

Condenado o réu em primeiro grau e havendo apelação da defesa ou da acusação e reduzida a pena pelo Tribunal, pode este declarar a extinção da punibilidade pela prescrição retroa­tiva29. A pena que regula o prazo é a reduzida, contado entre a data do fato e a do recebimento da denúncia ou entre esta e a da publicação da sentença condenatória, vedada a contagem entre o primeiro termo e a data do acórdão.

f) Reconhecimento de ofício

A prescrição retroativa pode ser reconhecida pelo Tribunal, de ofício, desde que presentes seus pressupos­

29. RECrim 105.019, 2- Turma do STF, em 21-5-1985, v. un., Rei. Min. Aldir Passarinho, DJU , 29 nov. 1985, p. 21922; RTJ, 118:219.

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tos30. Seu não-reconhecimento constitui constrangim en­to ilegal31.

g) Reconhecimento em embargos de declaração

Havendo embargos de declaração de acórdão do Tribu­nal, pode ser reconhecida por este. O Juiz, entretanto, não a pode reconhecer em embargos de declaração.

h) Aplicação em embargos infringentes

Havendo acórdão não-unânime desfavorável ao réu, nada impede que a prescrição retroativa venha a ser declarada em grau de embargos infringentes32.

i) Condenação em segunda instância

Absolvido o réu em primeiro grau e vindo a ser condenado no Tribunal, em face de recurso oficial ou da acusação, pode ser declarada a extinção da punibilidade pela prescrição retroativa33.

j) Aplicação em revisão criminal

Nada impede que a prescrição retroativa, presentes seus

30. No sentido de que pode ser reconhecida de ofício pelo Tribunal: TACrimSP, JTACrimSP, 30 :362 e 50:341.

31. RT, 400:219.

32. STF, HC 56.309, DJU, 15 set. 1978, p. 6887 (caso de redução da pena em EI).

33. RTJ, 95:1092 e 772:713; RT, 595:314.

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pressupostos de aplicação, seja reconhecida em grau de revi­são criminal34.

/) Aplicação em “habeas corpus"

A prescrição retroativa pode ser reconhecida em grau de habeas corpus35, ainda que a sentença condenatória tenha tran­sitado em julgado para a acusação e defesa36.

m) Aplicação em agravo em execução

O Tribunal pode aplicar o princípio retroativo em grau de agravo em execução, previsto no art. 197 da LEP37.

n) Processos da competência originária dos Tribunais

Nas ações penais de sua competência originária, nada impede que, vindo a condenar o réu, possa o Tribunal esta­dual declarar a extinção da punibilidade pela prescrição re­troativa, não constituindo obstáculo a eventualidade de in- terposição de recurso especial ou extraordinário, que não tem efeito suspensivo.

34. No sentido do texto: TACrimSP, JTACrimSP, 6:8,27:191,35:135 e 45:54; RJTJSP, 43:389; RT, 546:361 e 670:338.

35. TACrim, JTACrimSP, 33:15, 36:319 e 47:93; TJSP, HC 85.052, RT, 648:288; STF, DJU, 21 mar. 1975, p. 1716.

36. RT, 375:195; TJSP, HC 85.052, RT, 648:288; STF, HC 64.071, l 2 Turma, em 8-5-1987, DJU, 12 jun. 1987, p. 11858; RTJ, 124:1000.

31. AE 479.729, 4a Câm. do TACrimSP, em 12-8-1987, v. un., Rei. Juiz Alberto Marino.

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12. CONCURSO DE CRIMES

a) Concurso material

No concurso material (CP, art. 69), cada infração penal tem seu prazo prescricional retroativo considerado isoladamente (CP, art. 119). Nesse sentido: STF, HC 68.942, DJU, 13 dez. 1991, p. 18355; STJ, RHC 9.131, 5a Turma, DJU, 21 fev. 2000, p. 140. Assim, apreciando-se a parte conclusiva da sentença con­denatória, deve-se verificar qual a pena imposta a cada infra­ção, a qual irá regular o prazo extintivo. Suponha-se que dois anos e meio depois da data do recebimento da denúncia, pro­cessado por furto e lesão corporal leve, venha o réu a ser conde­nado a um ano de reclusão pelo furto e a três meses de detenção pelo delito mais leve. Presentes seus pressupostos, de ser apli­cado o princípio retroativo no tocante ao crime de lesão corpo­ral leve. Como a pena é inferior a um ano o prazo prescricional é de dois (CP, art. 109, VI), verificados entre o recebimento da denúncia e a data da publicação da sentença condenatória.

No concurso real, como se viu, para efeito da prescrição retroativa, as penas não são somadas, devendo cada uma ser tomada isoladamente.

b) Concurso formal e crime continuado

Cuidando-se de concurso formal de crimes (CP, art. 70), leva-se em consideração a pena imposta na sentença condena­tória, sem o acréscimo legal (CP, art. 119). Nesse sentido: STJ, RHC 9.131, 5a Turma, DJU, 21 fev. 2000, p. 140.

Imagine-se que o sujeito, processado por vários crimes de dano qualificado (CP, art. 163, parágrafo único), venha a ser condenado a um ano de detenção: pena-base fixada em oito meses de detenção, com acréscimo de metade. Para efeito da

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prescrição retroativa deve ser considerada a pena de oito me­ses de detenção, ocorrendo o prazo extintivo em dois anos. Se fosse levado em conta o acréscimo, o prazo prescricional re­troativo seria de quatro anos.

Da mesma forma, no crime continuado, para aplicação do princípio retroativo, deve ser considerada a pena imposta na sentença, sem o acréscimo legal (CP, arts. 71 e 119). Incide a Súmula 497 do primitivo STF, que determina: “Quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decor­rente da continuação”. Assim, desvinculada a pena de cada crime, levando-se em conta uma delas, se iguais, ou a mais grave, se diversas, despreza-se o aumento.

Há entendimento no sentido de ser impossível a desvincu­lação do acréscimo para, sobre ele, fazer recair a prescrição re­troativa. Suponha-se que o sujeito, processado por vários deli­tos em continuação ou em concurso formal, venha a ser conde­nado, dois anos e seis meses depois da data do recebimento da denúncia, a um ano e dois meses de detenção: um ano em rela­ção a um dos delitos; dois meses de acréscimo. Poder-se-ia su­por possível separar os dois meses de detenção da pena-base, para efeito de declarar extinta a pretensão punitiva no tocante a eles, uma vez fnediados mais de dois anos entre o recebimento da denúncia e a data da publicação da sentença condenatória. Isso, contudo, dizem, não é admissível. E a tese contrária pro­duziria conseqüências em outros setores do campo criminal, como a reparação do dano38. De ver-se, entretanto, que confor­me a hipótese não se pode deixar de permitir a desvinculação do acréscimo, sob pena de tomar a espécie, regida pelo concur­so formal ou pelo nexo de continuação, em hipótese mais gra-

38. No sentido do texto: STF, RT, 547:420; HC 65.734,2a Turma, em 12-2-1988, Rei. Min. Aldir Passarinho, DJU, 25 mar. 1988, p. 6374 e 6375;

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f

vosa do que se fosse concurso material (CP, art. 119). Imagine- se que o sujeito cometa, em concurso formal ou ligados pela continuação, dois delitos apenados no mínimo, respectivamen­te, com um ano de detenção e dois meses de detenção. Aplica­do o mínimo do acréscimo, a pena seria de um ano e dois me­ses de detenção. Suponha-se que tenham decorrido mais de dois anos entre a data do recebimento da denúncia e a da publicação da sentença condenatória, sem recurso da acusação. Nos termos da lição restritiva, seria impossível desvincular-se o acréscimo (dois meses de detenção), claramente imposto em razão do de­lito de menor gravidade, para efeito da prescrição retroativa. Me­lhor seria, então, para o réu, que tivesse sido condenado em face do concurso material, caso em que a prescrição retroativa al­cançaria a pretensão punitiva referente ao menor delito. Nesse sentido: TACrimSP, ACrim 649.471, RJDTACrimSP, 72:110.

13. EFEITOS

a) Extinção da pretensão punitiva

Nos termos dos arts. 109 e 110, § 2Q, do CP, a prescrição retroativa importa a perda da pretensão punitiva do Estado39.

Os efeitos da condenação podem ser principais e acessó­rios40. Principais, os concernentes à imposição das penas de reclusão, detenção, prisão simples, restritivas de direitos, multa

RTJ, 125:1085; Rodrigues Porto, Da prescrição criminal, 2. ed., São Paulo, p. 136; TACrimSP, ACrim 462.307, JTACrimSP, 95:259.

39. RECrim 105.019,2a Turma do STF, 21-5-1985, DJU, 29 nov. 1985, p. 21922; RTJ, 118:219.

40. Sobre o tema dos efeitos principais e acessórios da sentença condenatória, vide nosso Direito penal, cit., p. 611-2.

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e medidas de segurança. Além desses, como veremos, existem outros, denominados reflexos ou secundários.

No regime da reforma penal de 1984, a prescrição retroa­tiva extingue a pretensão punitiva, rescinde a sentença con­denatória e exclui seus efeitos principais e secundários41. Como se trata de forma de prescrição da pretensão punitiva, o decurso do prazo, incidindo em período anterior à publicação da sentença condenatória, extingue o poder-dever de punir do Estado. De forma que no momento em que o Juiz profere a decisão não há mais o jus puniendi. Assim, a aplicação da pres­crição retroativa rescinde a sentença condenatória, que só tem valor em termos de fixação da quantidade da pena privativa da liberdade, não subsistindo em nenhum de seus efeitos princi­pais e secundários. Se o réu, dois anos após ser favorecido pela prescrição retroativa, vier a praticar outro delito, não será con­siderado reincidente por ausência de seu pressuposto, qual seja a condenação anterior.

b) Medidas de segurança

Se imposta somente medida de segurança ao semi-respon- sável (CP, art. 26, parágrafo único), pode ser aplicado o princí­pio retroativo, regulado pela pena substituída. Se não prevista na sentença, pelo mínimo abstrato cominado ao delito pratica­do pelo réu. Se quando é aplicada pena é cabível a prescrição retroativa, seria injusta a proibição quando imposta a medida de segurança, uma vez que ambas são sanções penais (vide, sobre o assunto, RJTJSP, 106:348; na mesma revista, 709:487, che­gou-se a aplicar a prescrição retroativa em face de sentença absolutória que havia imposto medida de segurança). Há, en­tretanto, posição contrária, recomendando, em qualquer hipó­

41. RT, 595:360; TACrim, RECrim 575.497, RT, 648:307; STJ, ARAI 242, RSTJ, 6:77.

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tese (condenação ou absolvição), que seja considerado o má­ximo abstrato legal (TJSP, HC 76.006, RT, 641:330).

O STF, no HC 68.783, entendeu inaplicável o princípio retroativo quando imposta medida de segurança na hipótese do art. 26, caput, do CP ( l â Turma, RTJ, 138:204).

c) Efeitos secundários da sentença condenatória

1. Introdução

No regime da Lei n. 7.209/84, extinta a punibilidade pela prescrição retroativa, não subsiste a sentença condenatória para nenhum efeito, principal ou acessório. Como é forma de pres­crição da pretensão punitiva (da ação), a sentença condenató­ria só tem eficácia para a fixação da quantidade da pena que regula o prazo prescricional. Nesse sentido: TACrimSP, RvCrim 189.006, RT, 661:288.

2. Custas

Nos termos dos princípios da sucumbência e da causalida­de, o réu favorecido pela prescrição retroativa, no regime do § 22 do art. 110 do CP, fica responsável pelo pagamento das custas42.

3. Lançamento do nome do réu no rol dos culpados e folha de antecedentes

Extinta a punibilidade pela prescrição retroativa não sub­siste o lançamento do nome do réu no rol dos culpados e fica

42. Sobre o tema, abordando a Súmula 146, vide nosso Código de Processo Penal, cit., p. 67; RTJ, 69:800; RT, 578:380.

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proibido o fornecimento de certidão positiva e menção do fato criminoso na folha de antecedentes, salvo requisição judicial43.

4. Reincidência

No regime da Lei n. 7.209/84, o réu, favorecido pelo prin­cípio retroativo, vindo a cometer novo delito, não será consi­derado reincidente44.

5. “Sursis”

Réu favorecido pela prescrição retroativa, no regime novo, vindo a cometer novo delito, pode obter sursis.

A prescrição retroativa, como ficou consignado, importa a extinção da pretensão punitiva, não subsistindo os efeitos reflexos da sentença condenatória, dentre os quais se inclui o de impedir o sursis.

É possível que o condenado, durante a vigência do sursis, venha a ser condenado por delito doloso e favorecido pela pres­crição retroativa. Inaplicável o art. 81 ,1, do CP, uma vez que a prescrição retroativa rescinde a sentença condenatória, não devendo ser revogada a medida.

6. Livramento condicional

O réu favorecido pela prescrição retroativa, no regime do

43. Rol dos culpados: primitivo TFR, RvCrim 434, DJU, 13 nov. 1986, p. 21986; STF, RT, 644:317 e 630; TACrimSP, RT, 648:306. Proibição de fornecimento de certidão positiva e de menção do fato criminoso na folha de antecedentes: STF, RECrim 92.945, RTJ, 101:745.

44. RT, 515:455.

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1§ 2Q do art. 110 do CP, vindo a cometer novo delito, poderá obter livramento condicional desde que cumprido mais de um terço da pena (CP, art. 8 3 ,1).

Se, durante a vigência da medida, vier a ser condenado pela prática de crime, não deverá nem poderá ser revogada (CP, arts. 86 e 87), incidente a prescrição retroativa no tocante ao segundo delito.

7. Prisão preventiva

Nos termos do art. 313, III, do CPP, é admitida a prisão preventiva em relação aos crimes dolosos quando o sujeito já foi condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, salvo se incidente o caso do art. 6 4 ,1, do CP. As­sim, favorecido pela prescrição retroativa no tocante ao pri­meiro delito doloso, vindo a cometer outro crime da mesma natureza, não será cabível a prisão preventiva.

8. Fiança

De acordo com o disposto no art. 323, III, do CPP, não deve ser concedida a fiança dos delitos dolosos punidos com pena privativa de liberdade, se o sujeito já foi condenado por outro crime doloso em sentença transitada em julgado. E se, em relação à condenação anterior, incidiu a prescrição retroa­tiva? E admitida a fiança?

Sim, uma vez que a prescrição retroativa, no regime novo, faz desaparecer a anterior sentença condenatória irrecorrível.

9. Reparação do dano

A prescrição retroativa, no tocante a crime cometido du­rante a vigência do antigo parágrafo único do art. 110 do CP

156

(Súmula 146), impedia a execução da sentença condenatória para efeito de reparação do dano (CPP, art. 63; CP, art. 7 4 ,1). Da mesma forma, no regime atual, levando-se em conta que não subsistem os efeitos secundários da condenação penal irre­corrível, a incidência do princípio retroativo impede que ve­nha a sentença condenatória a ser executada para fim de repa­ração do dano emergente do delito (RT, 648:306; STJ, ARAI 242, RSTJ, 6:11).

10. Confisco

Nos termos do art. 91, II, do CP, constitui efeito da con­denação a perda, em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé:

a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção consti­tua fato ilícito;

b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.

No regime do § 2o do art. 110 do CP, a extinção da punibilidade pela prescrição retroativa impede o confisco.

11. Restituição de coisas apreendidas

As coisas apreendidas, nos termos dos arts. 118 e s. do CPP, podem ser restituídas ao seu proprietário no caso de o condenado vir a ser favorecido pela prescrição retroativa.

12. Seqüestro

De acordo com o art. 125 do CPP, caberá o seqüestro dos bens imóveis, adquiridos pelo indiciado com os proventos da

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1

infração, ainda que já tenham sido transferidos a terceiro. O se­qüestro dos bens móveis está previsto no art. 132 do mesmo estatuto.

A prescrição retroativa, nos termos do § 2- do art. 110 do CP, extingue os efeitos do seqüestro, uma vez que o art. 131, III, do estatuto processual penal determina o levantamen­to do seqüestro “se for julgada extinta a punibilidade”45.

13. Outros efeitos

Há outras conseqüências da sentença condenatória, de natureza secundária, que são extintas pela prescrição retroati­va, no regime novo. Dentre elas podem ser citadas:

a) aumento do prazo da prescrição da pretensão executória (CP, art. 110, caput, parte final);

b) suspensão do curso da prescrição da pretensão executória enquanto o condenado permanece preso por outro motivo (CP, art. 116, parágrafo único);

c) revogação da reabilitação (CP, art. 95);d) influência na exceção da verdade em relação ao cri­

me de calúnia (CP, art. 138, § 3e, I e III);e) impedimento de privilégio em relação a determinados

delitos (CP, arts. 155, § 22, 171, § 2e, e 180, § 3Q, Ia parte);f) aumento da pena do crime de porte de arma (art. 10,

§ 32, IV, da Lei n. 9.437, de 20 de fevereiro de 1997); eg) constituir elementar da infração descrita no art. 25

da LCP.

45. RT, 604:363.

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1

d) Extensão ao co-réu

Suponha-se que, transitando em julgado a sentença conde­natória para a acusação, um dos réus condenados apele. O Tribu­nal, aplicando o disposto no art. 110, § 22, do CP, pode estender o princípio da prescrição retroativa ao outro réu condenado, que não apelou. A jurisprudência, nesse sentido, é tranqüila46.

e) Revisão criminal

No regime da reforma penal de 1984, como o princípio retroativo importa a extinção da punibilidade no tocante à pre­tensão punitiva, favorecido pela prescrição retroativa, o bene­ficiado não pode se valer da revisão criminal47. No sistema do § 22 do art. 110 do CP, nos termos da Lei n. 6.416/77, contu­do, como a prescrição retroativa só atingia a pretensão executória, subsistindo a sentença condenatória, dela era ad­missível a revisão criminal.

14. CAUSAS INTERRUPTIVAS

As causas interruptivas da prescrição se encontram ar­roladas no art. 117 do CP. Tratando-se de prescrição retroati­

46. TACrimSP, JTACrimSP, 19:222,33:406,37:340,38:320,45:291, 46:268 e 45:209 e 407; STF, RTJ, 68:875. Esses acórdãos tratam de casos da Súmula 146. O princípio, contudo, é aplicável à nova legislação. Contra: TACrimSP, JTACrimSP, 35:109.

47. STF, RECrim 85.072-SP, 2a Turma, em 5-11-1976, v. un., Rei. Min Moreira Alves, DJU, 18 fev. 1977, p. 889; RTJ, 80:966. No mesmo sentido: RT, 440:367, 447:436, 444:395 e 485:290. Contra: RT, 546:374; STF, RTJ, 55:297 e 63:55.

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va, alguns princípios devem ser expostos, e vêm a seguir enu­merados:

a) O prazo prescricional retroativo se interrompe na data da publicação da sentença condenatória

Um dos períodos retroativos pode ser considerado entre a data do recebimento da denúncia e a da publicação da sen­tença condenatória. Esta, nos termos do art. 117, IV, do CP, constitui causa interruptiva do período extintivo.

Suponha-se que entre a data do recebimento da denúncia e a da publicação da sentença tenham mediado um ano, onze meses e quinze dias, sendo a pena inferior a um ano. Não ocor­reu a prescrição retroativa, uma vez que a sentença condena­tória interrompeu o prazo extintivo48.

O mesmo efeito tem o acórdão condenatório (absolvição em primeiro grau e condenação no Tribunal). O acórdão, entretanto, que mantém a sentença condenatória ou confirma a condenação em sede de embargos infringentes, não tem o mesmo efeito.

b) Momento da publicação da sentença condenatória

A sentença condenatória se tem por publicada quando é entregue pelo Juiz ao escrivão, no cartório49, nos termos do art. 389 do CPP. Não se deve confundir intimação da sentença condenatória com sua publicação50. O que interrompe o prazo prescricional, evitando a incidência do princípio retroativo, é a publicação, que se dá no momento em que o escrivão recebe

48. RT, 609:447.49. STF, RTJ, 57:658, 77:850 e 95:1058.50. RT, 600:350.

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a sentença do Juiz, independentemente do registro e de outras diligências. Caso contrário, a data impeditiva da extinção da punibilidade ficaria com seu termo fixado de acordo com a vontade do escrivão, o que a lei não pretende51. De modo que a prescrição retroativa pode ocorrer antes de o réu vir a ser intimado da sentença condenatória.

Quando a condenação do réu se dá na superior instância, o termo ad quem do prazo prescricional ocorre na data do jul­gamento em sessão.

c) Prazo anterior à data do recebimento da denúncia

No regime da reforma penal de 1977, não se podendo contar o lapso anterior à data do recebimento da denúncia (an­tiga redação do § 2- do art. 110 do CP), esta deixava de ser causa interruptiva (CP, art. 117,1), passando a constituir o ter­mo a quo do prazo. O mesmo não ocorre no regime novo, que admite a consideração do prazo anterior ao recebimento da denúncia ou queixa.

d) Aditamento da denúncia

Tratando-se de prescrição retroativa, o recebimento do aditamento da denúncia não interrompe o prazo prescricional nem constitui seu termo a quo52. Exceção feita à hipótese em que o aditamento narra fato criminoso novo. Neste caso, a data

51. STF, RTJ, 58:783; STJ, RHC 664, 5a Turma, DJU, 20 ago. 1990, p. 7971-2. VideRF, 772:198.

52. No sentido do texto: RT, 476:390 e 546:347; Rodrigues Porto, Da prescrição, cit., p. 205.

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do despacho do recebimento do aditamento constitui o termo inicial do prazo prescricional retroativo, mas tão-somente em relação ao delito posteriormente descrito. Assim, nenhum efei­to possui no tocante ao impedimento de curso da prescrição retroativa o aditamento da denúncia que, nos termos do art. 569 do CPP, lhe acrescenta circunstâncias modais (de tempo e lugar), retifica a qualificação legal do fato, a inclusão de no­vos acusados, o agravamento da lesão corporal etc.53.

e) Hipótese de sentença absolutória com recurso da acusação

A sentença absolutória não constitui causa interruptiva da prescrição. Se o acusador recorre e o réu vem a ser conde­nado no Tribunal, o prazo prescricional retroativo deve ser considerado entre a data do acórdão e a do recebimento da denúncia ou entre esta e a da consumação do crime. E pode ser declarada pelo próprio Tribunal no mesmo acórdão conde- natório, independentemente de recurso extraordinário.

f) Sentença condenatória anulada

A sentença condenatória anulada não impede a prescrição retroativa, uma vez que não constitui causa interruptiva ou impeditiva54. De modo que, proferida outra em seu lugar, a data da publicação desta é que consistirá no termo ad quem do lapso extintivo.

g) Comunicabilidade

Nos termos do § 12 do art. 117 do CP, no concurso de agentes, salvo o caso da reincidência e do início ou continua­

53. RT, 476:390.

54. Rodrigues Porto, Da prescrição, cit., p. 115, 280 e 281.

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ção do cumprimento da pena, a interrupção da prescrição pro­duz efeito em relação a todos os concorrentes.

Suponha-se que dois réus sejam processados por lesão corporal leve, em co-autoria. Um ano e meio depois do rece­bimento da denúncia um vem a ser condenado; o outro, absol­vido. O Ministério Público apela da sentença visando à con­denação do absolvido. O Tribunal o condena dois anos e meio após a data do recebimento da denúncia. Pode o Tribunal apli­car a prescrição retroativa em relação ao réu condenado em segundo grau, contando o prazo de dois anos, em face da pena inferior a um ano, entre o recebimento da denúncia e a data da sessão do julgamento?

Não pode, tendo em vista que a sentença condenatória proferida em relação a um dos réus tem efeito interruptivo da prescrição, estendendo-se ao absolvido.

15. RECURSO DA ACUSAÇÃO

a) Introdução

O CP, no § 2S do art. 110, disciplinando a prescrição re­troativa, reporta-se à hipótese “de que trata o parágrafo ante­rior”. E o § l 9 cuida da “prescrição, depois da sentença con­denatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso”. Em face disso, constitui pressu­posto da incidência da prescrição retroativa, como vimos, que a sentença condenatória tenha transitado em julgado para a acusação ou que tenha sido improvido o seu recurso. Ocorre que, se a acusação apelou da sentença condenatória visando à agravação da pena privativa de liberdade, o prazo prescricional, a partir da publicação da sentença (CP, art. 117, IV), conti­nuou a ser regulado pelo máximo da pena privativa de liberda­de. Impossível, por isso, a aplicação do princípio retroativo enquanto pender a possibilidade de agravação da pena, pois ainda não se sabe o quantum da exacerbação. Se, entretanto, a acusação não apelou, a pena imposta na sentença se torna o

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máximo a que está sujeito o réu. Daí entender-se que era essa a pena que, desde a prática do fato, devia reger o lapso prescricional. E aí se encontra um dos fundamentos do princí­pio retroativo (princípio da pena justa).

b) Somente impede a prescrição retroativa o recurso da acu­sação que visa à agravação da pena privativa de liberdade

Como inexiste a reformatio in pejus, somente quando há recurso da acusação é que a pena imposta na sentença pode ser majorada, e isso quando o apelo vise expressamente a esse efeito. Em face disso, não impede a prescrição retroativa, como veremos nos itens subseqüentes, o apelo da acusação que vise a fim diverso que o da agravação da pena privativa de liberda­de imposta na sentença condenatória, como, v. g., o que pre­tende alterar a qualidade da pena (detenção para reclusão, multa para o mínimo de detenção). Nesse sentido: STJ, REsp 148.610, 5a Turma, Rei. Min. Gilson Dipp, DJU, 25 set. 2000, p. 127; STJ, REsp 187.826, 5a Turma, Rei. Min. Gilson Dipp, DJU, 25 set. 2000, p. 128; STJ, REsp 139.874, 5a Turma, Rei. Min. Gilson Dipp, DJU, 15 abr. 2002, p. 244.

Havendo recurso da acusação pretendendo o agravamen­to da pena privativa de liberdade imposta na sentença condenatória fica em princípio vedada a aplicação da prescri­ção retroativa.

Não conhecido o apelo, o Tribunal, de ofício, declara a extinção da punibilidade. Da mesma forma, improvido o re­curso, fica livre o caminho para a apreciação da prescrição re­troativa.

E se o apelo vem a ser provido, agravando-se a pena pri­vativa de liberdade?

Podem ocorrer duas hipóteses:Ia) O agravamento da pena privativa de liberdade, efeti­

vamente imposta ou que serve de base para a sua substituição

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pela restritiva de direitos, altera o prazo prescricional. Suponha- se que o prazo da prescrição retroativa seja de dois anos; agra­vada a pena, de quatro, não decorridos entre os pólos de conta­gem. Nesse caso, como é evidente, fica impedida a declaração da prescrição retroativa. Nesse sentido: STF, HC 64.303, RTJ, 127:650; TRF/53 Reg., HC 98.05.01046, RT, 763:709.

2~) O agravamento da pena não altera o prazo prescri­cional retroativo. Ex.: elevação da pena detentiva, de três para quatro meses. Não fica impedido o princípio retroativo. Se um dos fundamentos da prescrição retroativa é a morosidade da justiça criminal; se, qualquer que seja a pena inferior a um ano, o prazo extintivo é de dois anos, não é justo que a agravação de um mês na pena impeça seu reconhecimento55.

c) Recurso do assistente da acusação

A expressão “acusação” empregada no § l 2 do art. 110 do CP não indica somente o Ministério Público, abrangendo o assistente da acusação56.

d) Recurso do querelante

Como ficou assentado, o art. 110 do CP, em seu § l e, ao empregar a expressão “recurso da acusação”, não pretendeu

55. A 2a Turma do STF, entretanto, no RECrim 108.424, de São Pau­lo, em 14-3-1986, por v. un., Rei. o Min. Francisco Rezek, entendeu que, provido o recurso do Ministério Público, ainda que não alterando o prazo extintivo, fica impedida a prescrição retroativa (RTJ, 720:398).

56. STF, RTJ, 94:132; TACrimSP, JTACrimSP, 37:298 e 42:163. A Jurisprudência, hoje, admite tranqüilamente, o apelo do assistente da acusa­ção que visa à agravação da pena. Sobre o tema, vide nosso Código de Processo Penal anotado, cit., nota ao art. 598.

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indicar com exclusividade a figura do Ministério Público, de­vendo também incluir-se o querelante.

é) Recurso da acusação que na petição somente indica a pre­tensão de impedir a prescrição retroativa

É possível que a acusação (Ministério Público, querelan­te ou assistente), na petição da apelação, somente diga que o recurso visa a impedir a prescrição retroativa, silenciando so­bre a pretensão de agravação da pena privativa de liberdade. Se isso ocorre, não fica impedida a prescrição retroativa. O comportamento da acusação, silenciando na petição a respeito da pena imposta na sentença, significa que esta está satisfeita com sua quantidade. Dessa forma, a sentença condenatória, no tocante à quantidade da pena, transitou em julgado para a acu­sação. E isso constitui um dos pressupostos do princípio re­troativo57.

f) Fragilidade das razões do recurso da acusação

A circunstância de serem fracos os argumentos contidos nas razões da apelação da acusação, permitindo o entendimen­to de que recorreu somente para evitar a prescrição retroativa, não impede seu conhecimento e efeitos quanto à prescrição retroativa58.

57. TACrimSP, JTACrimSP, 36:321, 45:408 e 47:357; STF, HC 699.570, 2à Turma, RT, 710:2,11 e 378.

58. STF, RECrim 96.354-SP, 2- Turma, em 20-4-1982, v. un., Rei. Min. Décio Miranda, DJU, 14 maio 1982, p. 4570.

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g) Aplicação de multa

Se a acusação, satisfeita com a quantidade da pena pri­vativa de liberdade, apela visando à aplicação da multa, omiti­da na sentença condenatória, não fica impedida a prescrição retroativa.

h) Agravação da multa

Se a acusação apela visando à agravação da pena de mul­ta, satisfeita com a quantidade da pena privativa de liberdade, pode ser declarada a extinção da punibilidade pela prescrição retroativa59.

i) Cassação do “sursis ”

Suponha-se que o Juiz condene o réu e lhe imponha o sursis. A acusação, contentando-se com a quantidade da pena privativa de liberdade imposta, apela pretendendo a cassação da medida. Não fica impedida a prescrição retroativa60.

j) Desclassificação

Se o recurso da acusação, contentando-se com a quanti­dade da pena privativa de liberdade imposta na sentença con­denatória, visa somente à desclassificação para outra figura tí­

59. STF, RECrim 88.019-SP, 2ã Turma, em 28-4-1978, v. un., Rei. Min. Cordeiro Guerra, DJU, 29 maio 1978, p. 3723, JTACrimSP, 9/:324.

60. STF, RTJ, 66:382, RECrim 88.095, l â Turma, em 9-5-1978, DJU, 29 maio 1978, p. 3732; RTJ, 87:338.

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pica, não fica impedida a prescrição retroativa. Suponha-se que o Juiz, na sentença condenatória, aplique ao réu a pena de ten­tativa de furto privilegiado. O Promotor de Justiça apela, sa­tisfeito com a quantidade da pena imposta, rebelando-se so­mente no tocante à qualificação legal do crime, que pretende seja, v. g., simples e não privilegiado. Pode ser declarada a prescrição retroativa61.

/) Medida de segurança

Não impede a prescrição retroativa o recurso da acusa­ção que, sem pretender a agravação da pena privativa de liber­dade, visa à imposição de medida de segurança em substitui­ção à sanção detentiva.

m) Pena restritiva de direitos

Não impede a extinção da punibilidade pela prescrição retroativa o recurso da acusação que, sem pretender a agrava­ção da pena privativa de liberdade, visa à imposição de pena restritiva de direitos substitutiva62.

n ) Aumento da pena em face do concurso formal

Suponha-se que o Juiz, na sentença condenatória, omita o aumento previsto pelo CP em face do concurso formal de

61. O STF decidiu caso análogo, adotando o princípio exposto no texto (RECrim 88.095, Ia Turma, em 9-5-1978, v. un., Rei. Min. Soares Munoz, DJU, 29 maio 1978, p. 3732; RTJ, 87:338 e 95:687).

62. TACrimSP, JTACrimSP, 28:215 (cuida de pena acessória, poden­do o princípio ser aplicado à restritiva de direitos).

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delitos. Apelando a acusação visando à agravação omitida, fica impedida a prescrição retroativa? Não, uma vez que o aumen­to do art. 70 do CP não deve ser computado para efeito de con­tagem do prazo prescricional63. O mesmo ocorre quando a acu­sação não fica satisfeita com o quantum do aumento.

o) Aumento da pena em face da continuação

Pode ocorrer que o Juiz, na sentença condenatória, omita o aumento de pena previsto no crime continuado (CP, art. 71). Recorrendo a acusação visando à agravação da pena em face do nexo de continuidade entre crimes, não fica impedida a prescrição retroativa. Isso porque a causa de aumento de pena do crime continuado não incide sobre o prazo prescricional, como vimos em itens anteriores64.

p) Recurso da acusação que restringe na petição a agrava­ção da pena de modo a não alterar o prazo prescricional

Imagine que decorram dois anos e meio entre a data do recebimento da denúncia, por crime de lesão corporal leve, e a da publicação da sentença condenatória, que impõe ao réu pena de três meses de detenção, omitindo o Juiz a agravação gené­rica da reincidência. O Promotor de Justiça apela e, na petição do recurso, restringindo sua extensão, expõe a pretensão de que

63. TACrimSP, JTACrimSP, 47:355; ACrim 283.145, T Câm. do TACrim SP, em 9-6-1983, v. un., Rei. o então Juiz Djalma Lofrano.

64. STF, HC 59.097-SP, Ia Turma, em 2-2-1982, v. un., Rei. Min. Néri da Silveira, DJU, 19 mar. 1982, p. 2232; RECrim 97.600-SP, 2a Tur­ma, em 19-4-1983, v. un., Rei. Min. Décio Miranda, DJU, 20 maio 1983, p. 7058; RTJ, 109:1108.

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a pena venha a ser agravada de quinze dias pela reincidência. Seja a pena de três meses ou quatro meses e quinze dias de detenção, o prazo prescricional é o mesmo: dois anos, nos ter­mos do art. 109, VI, do CP. Nessa hipótese, o apelo da Justiça Pública não contém a possibilidade de agravação da pena de modo a alterar o prazo prescricional. Em face disso, não im­pede a prescrição retroativa.

q) Recurso da acusação contra a concessão do perdão judicial

Pressupondo a adoção da tese de que a sentença conces­siva do perdão judicial é condenatória, há falar-se em prescri­ção retroativa quando o recurso da acusação visa à efetiva apli­cação da pena?

Sim, desde que improvido o recurso ou provido de modo a não alterar o prazo prescricional. No primeiro caso, impro- vida a apelação, leva-se em conta o mínimo na pena privativa de liberdade cominada65. Na segunda hipótese, considera-se a pena imposta pelo Tribunal. De ver-se que para o STJ a sen­tença que aplica o perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo nenhum efeito condenatório (Súmula 18).

r) “Reformatio in pejus ”

Anulada a primeira sentença condenatória em recurso exclusivo da defesa, a apelação da acusação visando à agrava-

65. RECrim 104.961, 2- Turma do STF, em 25-9-1987, DJU, 30 out. 1987; RTJ, 724:1138.

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ção da pena imposta na segunda, em face do princípio que veda a reformatio in pejus, é insuscetível de impedir a prescrição retroativa66.

Suponha-se que o réu, processado por lesão corporal leve, venha a ser condenado, um ano e seis meses após a data do recebimento da denúncia, a três meses de detenção, transitan­do em julgado a sentença para a acusação. Em apelo exclusi­vo do réu, o Tribunal anula a sentença condenatória. Outra vem a ser proferida dois anos e dois meses depois da data do rece­bimento da denúncia, impondo a mesma pena. O Ministério Público recorre pretendendo a agravação da pena. Como, di­ante do princípio que veda a reformatio in pejus61, a pena im­posta na segunda sentença não pode ser superior à da primei­ra, o recurso da acusação jamais terá efeito de permitir deten­ção superior a três meses. Diante disso, não pode impedir a prescrição retroativa, contado o biênio entre a data do fato e a do recebimento da denúncia ou entre esta e a da publicação da segunda sentença condenatória68.

Há divergência, contudo, a respeito do momento em que a prescrição retroativa pode ser declarada. A l â Turma do STF entendeu que quando da anulação da primeira sentença condenatória não é possível, desde logo, aplicar-se o princí­pio retroativo. Isso só poderá ocorrer em face da nova senten­ça69. Em sentido contrário, a 2a Turma afirmou o princípio de

66. RT, 607:416.67. Sobre o assunto, vide nosso Código de Processo Penal anotado,

cit., p. 362, nota ao art. 617.68. STF, RTJ, 84:105 e 96:611; STF, HC 69.558, Ia Turma, DJU, 2

out. 1992, p. 16845.69. HC 61.272-SP, em 11-11-1983, v. un., Rei. Min. Néri da Silveira,

DJU, l s jun. 1984, p. 8726; RTJ, 92 :111 e 112:1037. Posteriormente, entre -

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que o Tribunal, no próprio acórdão que anula a primeira sen­tença condenatória, pode declarar a extinção da punibilidade pela forma retroativa70.

s) Qualidade da pena

Não impede a prescrição retroativa o recurso da acusação que visa a alteração da qualidade da pena, v. g., de detenção para reclusão ou de multa para detenção. Nesse sentido: STJ, REsp 90.176, 6a Turma, j. 7-4-1998, DJU, 4 maio 1998, p. 213.

0 Reconhecimento do concurso material

Não impede a prescrição retroativa o apelo da acusação que pretende o reconhecimento do concurso material de cri­mes. Isso porque as penas, para esse efeito, não são soma­das, cada uma regulando o seu próprio prazo prescricional (CP, art. 119). Diante disso, não tendo o recurso da acusação

tanto, no RECrim 104.664, em 8-8-1986, a mesma Turma anulou a senten­ça condenatória e, considerando a pena nela aplicada insuscetível de ser agravada em nova decisão, aplicou desde logo a prescrição retroativa, con­tando o prazo da denúncia em diante (DJU, 12 set. 1986). No mesmo senti­do: HC 67.755, Ia Turma, Rei. Min. Celso de Mello, RTJ, 142:411-, HC 70.396, IaTurma, DJU, 10 jun. 1994, p. 14782. A 5âTurma do STJ, no HC67, em 16-10-1989, seguiu a orientação da Ia Turma do STF (DJU, 5 fev. 1990, p. 458: RT, 657:330). No mesmo sentido: STJ, REsp 7 .956,5aTurma,Rei. Min. Assis Toledo, DJU, 18 mar. 1991, p. 2806; STJ, HC 3.997, 6a Turma, Rei. Min. Assis Toledo, DJU, 29 abr. 1996, p. 13425. Vide JTACrimSP,92:231.

70. STF, RECrim 106.846-SP, 10-12-1985, v. un., Rei. Min. Aldir Passarinho, DJU, 28 fev. 1986, p. 2353; RTJ, 118:155-, HC 65.224, em 14- 8-1987, v. un., DJU, 25 set. 1987, p. 20413; RTJ, 136:160. No mesmo sen­tido: STF, 70.866, 2a Turma, DJU, 29 abr. 1994, p. 9717.

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o efeito de agravação da pena, não fica impedido o princípio retroativo.

u) Prazo da prescrição da pretensão punitiva já decorrido

Se já decorreu antes da sentença condenatória o prazo da prescrição da pretensão punitiva (CP, art. 109), o recur­so da acusação visando à agravação da pena não tem efeito impeditivo. O Tribunal, sem apreciar o mérito, deve decla­rar a extinção da punibilidade, prejudicado o recurso acusatório.

16. LEGISLAÇÃO ESPECIAL

a) Abuso de autoridade

Inexiste prescrição retroativa quando a sentença conde­natória se firma em fato definido na Lei n. 4.898, de 9-12- 1965. Isso porque a pena privativa de liberdade cominada é de detenção, de dez dias a seis meses (art. 6S, § 3a, b). Como o máximo da pena privativa de liberdade é inferior a um ano, a prescrição ocorre em dois anos (CP, art. 109, VI). Ora, de­corridos mais de dois anos entre a data do fato e a do recebi­mento da denúncia ou entre esta e a da publicação da senten­ça condenatória, tenha imposto detenção, ainda que no má­ximo (alínea b), multa (alínea a), perda do cargo ou inabili- tação para o exercício de função pública (alínea c), não há falar-se em prescrição retroativa, uma vez já incidente a pres­crição da pretensão punitiva (CP, art. 109). E certo que a pena de interdição tem seu prazo máximo de três anos (alínea c). Essa quantidade da pena, entretanto, não altera o lapso

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prescricional. Se a prescrição ocorre em dois anos quando imposta pena mais grave, que é a detenção, por coerência, quando cominada a mais leve, a interdição, o prazo não pode ser maior.

b) Crimes falimentares11

Ao tempo da vigência do Decreto-lei n. 7.661, de 21-6- 1945 (antiga Lei de Falências), não se podia falar em prescri­ção retroativa em relação aos delitos falimentares, uma vez que o prazo prescricional da pretensão punitiva era sempre de dois anos. Assim, qualquer que fosse a quantidade da pena imposta na sentença condenatória, se houvessem decorrido dois anos ou mais entre sua publicação e a data do recebimento da de­núncia ou entre esta e a data em que deveria estar encerrada a falência, o caso era de prescrição da pretensão punitiva em abs­trato (CP, art. 109) e não retroativa (CP, art. 110, § 22)72.

Atualmente, por força do art. 182, caput, da nova Lei de Falências (Lei n. 11.101, de 9-2-2005), é possível falar em prescrição retroativa nos crimes falitários, pois a eles se apli­cam as disposições do CP a respeito de prescrição.

c) Crimes de imprensa

Não há prescrição retroativa em relação aos delitos des­critos na Lei de Imprensa (Lei n. 5.250, de 2-2-1967), levan­do-se em consideração que o prazo prescricional da pretensão

71. Sobre a prescrição nos delitos falimentares, vide nosso Direito penal, cit., p. 737.

72. No sentido do texto: Rodrigues Porto, Da prescrição, cit., p. 169, n. 85; RT, 462:328; JTACrimSP, 24:411. Contra: TJSP, ACrim 58.591, RJTJSP, 772:484.

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punitiva é sempre de dois anos (art. 41, caput). Assim, se de­correram dois anos ou mais entre a data do fato e a do recebi­mento da denúncia ou entre esta e a da publicação da sentença condenatória, é dispensável o princípio retroativo, cuidando- se de hipótese de prescrição da pretensão punitiva (CP, art. 109)73. Suponha-se o caso do réu condenado a um mês de de­tenção por delito de injúria (art. 22 da lei especial), tendo tran­sitado em julgado a sentença para a acusação (ou improvido seu recurso). Verifica-se a ocorrência de mais de dois anos en­tre o início da ação penal e a data da publicação da sentença. Como a pena é inferior a um ano, o prazo prescricional retro­ativo seria de dois anos. Prescindível, porém, é a aplicação do princípio retroativo, incidindo a prescrição da pretensão puni­tiva comum (art. 41, caput).

17. IMPRESCRITIBILIDADE

A CF de 1988, em seu art. 5o, criou dois casos em que não é aplicável a prescrição retroativa:

73. No sentido do texto: Rodrigues Porto, Da prescrição, cit., p. 170; STF, RTJ, 73:96,117:19 e 137:759; RT, 606:406; STF, HC 67.046, 2a Tur­ma, DJU, 21 abr. 1989, p. 5856; RTJ, 131:603; HC 67.047, IaTurma, DJU, 5 maio 1989, p. 7160; RT, 648:336; STJ, HC 4.412, 5a Turma, DJU, 16 dez. 1996, p. 50890. Há posição jurisprudencial no sentido de que é possível a prescrição retroativa em relação aos delitos de imprensa, considerando-se o prazo prescricional em face do dobro da quantidade da pena imposta (RT, 428:362 e 465:312). Assim, condenado o réu a seis meses de detenção, a prescrição retroativa teria ocorrido em um ano. A orientação é insustentá­vel. A contagem da pena em dobro só é permitida na prescrição da preten­são executória (Lei de Imprensa, art. 41, caput). Como a prescrição retroa­tiva não é regulada na lei especial, de aplicar-se o princípio do CP, nos termos do art. 12. Além disso, esse princípio, na prática, leva a absurdos. Imagine-se que o réu, por delito de injúria tentado, venha a ser condenado a dez dias de detenção. A incidir o princípio que criticamos, a prescrição re­troativa ocorreria em vinte dias, o que não pode ter sido contemplado na vontade da lei.

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I9) crime de racismo (inciso XLII); e2e) infrações de “grupos armados, civis ou militares,

contra a ordem constitucional e o Estado Democrático” (inci­so XLIV).

Sobre os dois temas, de aplicar-se o que dissemos no estudo da prescrição da pretensão punitiva (Capítulo III, item 2).

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penal, consoante uma visão científica per­feitamente ajustada às necessidades da prática e às elaborações da jurisprudência.

No seu moderno e influente Di­reito p e n a l— parte geral, o professor Da- másio E. de Jesus já dissera, com peculiar precisão, que, "com a prática do delito, o direito de punir do Estado, que era abs­trato, transforma-se em concreto, forman­do-se a relação jurídico-puniriva. Surge o conflito de interesses entre o direito de punir do Estado e o direito de liberdade do agente". O Estado é, em realidade, o titular da pretensão punitiva, que se con­verte em pretensão executória, quando transita em julgado a sentença de conde­nação.

Atenta, porém, contra a razão prática social, a aplicação tardia da pena, quando menos porque, em si mesma, consoante escreveu Vincenzo Manzini, "a vontade implacável de punir, se pode ser concebida como um ato de psicologia individual inferior, não é passível de com­preensão como fato de psicologia coletiva (...) quando o tempo alterou as condições em que é normalmente exercitado o po­der público de punir", de modo a tornar sem finalidade tal exercício.

O Professor Damásio E. de Jesus, neste livro, ministra o contribuição que dele se esperava sobre o equacionamen- to justo dessas exigências em contraste, dando prosseguimento à sua obra de ci­ência penal efetivamente condicionada pelo pressuposto (que é também a finali­dade) do lavor dos juristas: a conservação ou mesmo o estabelecimento da convi­vência social pacífica.

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