da resistÊncia À conquista da terra: as formas de ... · fonte de dados o banco de dados da luta...

89
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA INSTITUTO DE GEOGRAFIA CURSO DE GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA - BACHARELADO DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE MANIFESTAÇÕES DE LUTA PELA TERRA EM MINAS GERAIS FABIANA BORGES VICTOR UBERLÂNDIA-MG 2014

Upload: ngohanh

Post on 28-Dec-2018

220 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA INSTITUTO DE GEOGRAFIA

CURSO DE GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA - BACHARELADO

DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE MANIFESTAÇÕES DE LUTA PELA TERRA EM MINAS GERAIS

FABIANA BORGES VICTOR

UBERLÂNDIA-MG 2014

Page 2: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

FABIANA BORGES VICTOR

DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE MANIFESTAÇÕES DE LUTA PELA TERRA EM MINAS GERAIS

Monografia apresentada ao Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia como requisito à obtenção do título de Bacharel em Geografia. Orientador: Prof. Dr. João Cleps Junior

UBERLÂNDIA-MG 2014

Page 3: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

FABIANA BORGES VICTOR

DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE

MANIFESTAÇÕES DE LUTA PELA TERRA EM MINAS GERAIS

Uberlândia, 29 agosto de 2014.

Banca Examinadora:

____________________________________________________________

Prof. Dr. João Cleps Junior (Orientador) - UFU

____________________________________________________________

Prof. Dr. Marcelo Cervo Chelotti - UFU

____________________________________________________________

Ms. Natália Lorena Campos - UFU

Page 4: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

Aos meus queridos pais Que me deram a vida,

Que me deram colo, abraços, carinho, amor.... E acima de tudo,

Ensinaram-me a viver.

Page 5: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

AGRADECIMENTOS

Tudo que construímos ao longo da vida tem a participação de pessoas queridas, que

muito nos ajudam mesmo sem saber. Obrigada a Deus pelo que me é concedido.

Agradeço ao meu orientador João Cleps Jr. A aprendizagem foi e continua sendo

única, fundamental para minha formação profissional e também pessoal, me ajudando nas

escolhas e confiando em nosso trabalho.

Família! Agradeço à minha mãe Sirlene, por estar presente sempre que precisei, e

mesmo quando estava longe, eu sabia que tinha seu apoio, me dando bons conselhos que me

ajudaram a trilhar o caminho. Ao meu pai Sirlaine, que dedicou às filhas todo o seu amor.

Você se foi muito cedo, deixou saudades eternas, mas guardo na lembrança todos os

ensinamentos e os momentos felizes. Agradeço aos meus pais pelo colo, abraços, críticas,

pelo intenso amor e carinho com que cuidaram de nós.

Fernanda, minha querida irmã. Obrigada pelas extensas conversas madrugada adentro,

pelos abraços apertados nos momentos mais difíceis, e nos melhores momentos

principalmente. Você diversas vezes foi meu exemplo, minha inspiração, sendo essa pessoa

forte e decidida a quem admiro tanto. Obrigada por cuidar de mim enquanto crescia. Breno

Victor, você me mostrou que o amor é muito maior do que eu pensava, você é uma criança

incrível, inteligente, engraçado, e sei que vai muito longe. Conte comigo para tudo.

Aos meus tios-padrinhos também agradeço muito. Silma e Célio, vocês são peças

fundamentais em minha vida, pessoal e profissional, fazendo parte de todas as minhas

conquistas. Muito aprendi durante nosso tempo juntos, e ainda tenho a aprender. Respeito e

admiro vocês. Vovós e vovôs, Tia Siméa, Padrinho Nire, Madrinha Guite, Lud, Naia, Neno,

Antônio, Suellen, Madrinha Solange, Padrinho Valdivino, Tia Leisinha, Gisele, Tio Nei, Tio

Neidinho, penso em vocês com o maior carinho que existe dentro de mim, e sou imensamente

feliz em fazer parte dessa família que só tem pessoas ímpares.

Natália Pereira, obrigada! Por ser essa pessoa gentil, educada, solidária, severa quando

precisa e acima de tudo, tão engraçada. Espero que continuemos a falar tantas besteiras,

afinal, os dias ficam bem mais interessantes assim. Você é responsável por muitos

ensinamentos, principalmente nas tentativas e acertos na hora de desenhar o futuro. E nunca

se esqueça, “sempre haverá sanduíche de queijo”. E também ao meu pequeno-grande amigo

Victor Pereira, com quem divido momentos de diversão, e quem ajuda a cuidar dos

bagunceiros Darwin e Scoob. Ao Natanael e Ivanilda, obrigada, sei que construímos uma

relação de amizade e respeito.

Page 6: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

Participando do Laboratório de Geografia Agrária, fiz importantes amizades, e os

trabalhos diários se tornaram mais ricos e interessantes com a contribuição de cada um. Em

especial ao Ricardo Luis, querido amigo pra vida toda. As ajudas na graduação foram

fundamentais, e as conversas então nem se fala. Quero continuar essa amizade “até sempre”. Ao

Thiago Rosa, te pergunto onde arranjamos tantas piadinhas que só a gente entende. Espero que

continuemos com essa imaginação, fundamental até mesmo durante as aulas e trabalhos de

campo. Sua amizade faz a diferença em minha vida. Não poderia me esquecer do Geraldo, Daise,

Jéssica, Raquel, Genaro, Ricardo Leite, Márcia, obrigada pelas conversas e estudos.

Aos amigos da graduação, Daniele Araújo, Gilson, Dércio, William, amizades valiosas

que continuaram fora da sala de aula. E também aos amigos de outros momentos, que fazem

parte da minha vida há um tempo, em especial ao Pedro e César, Daniele Borges, Ana e Lara.

Agradeço pelo companheirismo que conquistamos.

Natália Lorena Campos, tenho a agradecer duplamente. Primeiro, pela bela amizade

construída ao longo desses anos, conversando sobre tantas coisas e às vezes sobre coisas sem

sentido. Pelos conselhos trocados, mas que nem sempre foram seguidos. Mesmo assim a vida

nos ensina.

Agradeço aos professores da graduação e em especial do LAGEA, João, Geisa,

Marcelo e Vera.

Ao Prof. Dr. Marcelo Cervo Chelotti, obrigada pela participação na defesa deste

trabalho, e pelas contribuições desde o início da graduação, nas aulas e encontros do

laboratório. À Ms. Natália Campos (segunda vez) por ter gentilmente aceito meu convite em

participar da banca, tenho certeza que dará importantes contribuições, isso justifica a escolha.

Não poderia me esquecer da ajuda das secretárias do Instituto de Geografia, Mizmar e

Cynara. Os alunos às vezes “dão trabalho”, mas vocês sempre nos auxiliam, e nunca deixam

de lado a educação e gentileza no atendimento.

À PROEX (UFU) e CNPq, pelo auxílio às pesquisas que desenvolvemos na academia.

Enfim, agradeço a todos e por tudo!

Page 7: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

RESUMO

O trabalho aqui apresentado versa sobre as manifestações de luta pela terra, empreendidas pelos movimentos sociais no estado de Minas Gerais no início do século XXI, tendo como fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal é elaborar uma tipologia a partir das formas de ação, das reivindicações levadas à discussão e ao conhecimento do Estado e da população, e por fim dos espaços apropriados pelos movimentos. Entendida como dimensão da questão agrária atual, a manifestação se configura em fundamental estratégia de ação e reação diante dos problemas enfrentados pela população do campo, que percebe as possibilidades de mudança a partir das contestações ao modelo de desenvolvimento vigente, pautado principalmente no agronegócio e na concentrada estrutura fundiária. Nessa estrutura dominante, por sua vez, são identificados os conflitos no campo, marcados diversas vezes por intensa violência nas disputas territoriais, políticas e econômicas. Por meio do presente estudo, buscamos contribuir para o debate das transformações do campo e da realidade agrária a partir das manifestações no processo de luta pela terra. Palavras-chave: Manifestações. Luta pela terra. DATALUTA. Minas Gerais.

Page 8: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Reportagem Jornal O Tempo 71

Figura 2 - Reportagem Página do MST 74

Figura 3 - Reportagem Página do MAB 75

Figura 4 - Reportagem Radioagência NP 76

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Minas Gerais - Participação dos movimentos sociais em ocupações de terra,

1990-2012 39

Gráfico 2 - Brasil - Assassinatos e julgamentos, 1985-2013 43

Gráfico 3 - Minas Gerais - Número de ocupações de terras por ano, 1990-2012 48

Gráfico 4 - Minas Gerais - Assentamentos rurais criados por ano, 1986-2012 50

Gráfico 5 - Minas Gerais - Relação do número de manifestações e pessoas envolvidas,

2000-2012 53

LISTA DE MAPAS

Mapa 1 - Minas Gerais, ocupações por município, 1990-2012 47

Mapa 2 - Minas Gerais - Assentamentos rurais por município, 1986-2012 51

Mapa 3 - Minas Gerais - Manifestações por município, 2000-2012 54

Mapa 4 - Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Concentração em espaço público,

2000-2012 61

Mapa 5 - Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Ocupação de prédio público,

2000-2012 62

Mapa 6 - Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Bloqueio de rodovia, 2000-2012 63

Mapa 7 - Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Temática, 2000-2012 64

Mapa 8 - Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Caminhada, marcha e romaria,

2000-2012 66

Mapa 9 - Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Acampamento, 2000-2012 67

Page 9: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

Mapa 10 - Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Ocupação de agência bancária,

2000-2012 68

Mapa 11 - Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Ocupação de prédio privado,

2000-2012 69

LISTA DE ORGANOGRAMA

Organograma 1 - Estrutura do Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA 30

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Fontes consultadas DATALUTA-MG – 2014 32

Quadro 2 - Brasil - Assassinatos e julgamentos, 1985-2013 42

Quadro 3 - Minas Gerais - Assentamentos rurais criados por período de Governo 50

Quadro 4 - Tipos de manifestações identificados pela CPT 57

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Minas Gerais - Número de ocupações por mesorregiões, 1990-2012 46

Tabela 2 - Formas de obtenção dos assentamentos rurais, 1986-2012 51

Tabela 3 - Minas Gerais - Manifestações por mesorregião, 2000-2012 52

Tabela 4 - Minas Gerais - Tipos de manifestações, 2000-2012 59

Page 10: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ALMG – Assembleia Legislativa de Minas Gerais ANOTER – Associação Nacional dos Órgãos Estaduais de Terras CEDEFES – Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura CPT – Comissão Pastoral da Terra DATALUTA – Banco de Dados da Luta pela Terra FHC – Fernando Henrique Cardoso GECA – Grupo de Estudos em Geografia Agrária, Conservação da Biodiversidade e Pantanal GEOLUTAS – Laboratório de Geografia das Lutas no Campo e na Cidade GETEC – Grupo de Estudo sobre Trabalho, Espaço e Campesinato IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária ITER – Instituto de Terras do Estado de Minas Gerais LABERUR – Laboratório de Estudos Rurais e Urbanos LABET – Laboratório de Estudos Territoriais LAGEA – Laboratório de Geografia Agrária LCP – Liga dos Camponeses Pobres LOC – Liga Operária Camponesa MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário MLST – Movimento de Libertação dos Sem Terra MPA – Movimento Dos Pequenos Agricultores MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra NEAG – Núcleo de Estudos Agrários NERA – Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária OCCA – Observatório dos Conflitos no Campo PA – Projeto de Assentamento PE – Projeto de Assentamento Estadual PNRA – Plano Nacional de Reforma Agrária PRB – Projeto de Reassentamento de Atingidos por Barragens PROEX – Pró-Reitora de Extensão, Cultura e Assuntos Estudantis SNCR – Sistema Nacional de Cadastro Rural UDR – União Democrática Ruralista UFU – Universidade Federal de Uberlândia UNESP – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” UNIOESTE – Universidade Estadual do Oeste do Paraná

Page 11: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 12 1. “A LIBERDADE DA TERRA É ASSUNTO DE TODOS”: atualidades da questão agrária e o contexto das lutas no campo ........................................................................... 16

1.1. A Questão Agrária brasileira: debates e apontamentos ainda necessários .............. 16 1.2. As contradições no campo e as disputas territoriais .............................................. 23 1.3. Banco de Dados da Luta pela Terra: metodologia de pesquisa da questão agrária ............................................................................................................... 28

2. “TERRA NÃO SE GANHA, TERRA SE CONQUISTA”: as estratégias de ação promovidas pelos movimentos sociais ...................................................................... 34

2.1. Dinâmicas e ações dos movimentos sociais: as categorias de análise em debate ... 34 2.2. Os movimentos sociais de luta pela terra .............................................................. 38 2.3. A luta pela terra e os conflitos no campo em Minas Gerais ................................... 40

3. DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: as manifestações e suas variadas formas ................................................................................................................................. 56

3.1. Os tipos de manifestações realizadas pelos movimentos sociais ............................ 56 3.2. O conteúdo das manifestações e as reivindicações materializadas ......................... 71 3.3. O papel da mídia na divulgação e interpretação dos fatos ..................................... 77

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 82 5. REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 85

Page 12: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

12

INTRODUÇÃO

Uma estrutura agrária menos concentrada, justa distribuição das terras e melhores

condições de vida e trabalho. Esse tem sido historicamente o objetivo e processo das lutas

camponesas no Brasil, que tem como justificativa fundamental da luta a conquista do direito à

terra de trabalho. Por um lado está o camponês, sem o lugar de cultivar e reproduzir seus

modos de vida e trabalho junto à família, e do outro, os grandes proprietários representando o

agronegócio que concentra a terra e controla a produção, fazendo da terra uma mercadoria, e

não a fonte de reprodução da vida humana.

Trata-se de um cenário complexo, que reflete as condições e contradições

socioeconômicas da população, não só do campo, mas sim na sua totalidade, rural e urbana.

Pois é do campo que provém o alimento destinado às casas, escolas, hospitais, instituições etc,

e a produção de alimentos versus produtos para exportação, por exemplo, é uma das

discussões pertinentes na análise da questão agrária. Compreender as dimensões dessa

temática e da luta pela terra permite desvendar os diferentes significados e sujeitos envolvidos

na disputa por dois modelos de desenvolvimento, o modelo hegemônico ditado pelas regras

financeiras de um comércio mundial, e em contrapartida uma proposta que visa destinar as

terras aos que dela necessitam para viver e trabalhar, promovendo assim uma redução das

desigualdades sociais impostas.

Se então essa realidade é colocada, cabe discutir as ações e reações apresentadas,

sejam por aqueles atingidos diretamente pelo problema, trabalhadores rurais, sem-terra,

pequenos produtores, entre outros, inseridos nos movimentos sociais, seja pelos demais que se

identificam e apoiam a causa. Considerando as manifestações de luta pela terra, promovidas

pelos movimentos sociais, uma das formas de ação neste contexto, tornam-se o objeto de

estudo do presente trabalho.

Nesta temática, temos a importante contribuição do Banco de Dados da Luta pela

Terra – DATALUTA1, que pesquisa e fornece os dados referentes à questão agrária brasileira,

servindo de subsídio a pesquisadores e no desenvolvimento de estudos que possibilitam

compreender e até mesmo propor soluções aos problemas inerentes ao campo.

O objetivo principal deste trabalho é o estudo da territorialização e das dinâmicas da

luta pela terra e questão agrária no estado de Minas Gerais, a partir das manifestações e seus

1 O Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA é um projeto de pesquisa e extensão com o objetivo de coletar, sistematizar e realizar estudos e pesquisas nas temáticas da questão agrária e da Reforma Agrária no Brasil.

Page 13: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

13

conteúdos promovidas pelos movimentos sociais, considerando os dados a partir do ano 2000.

Desse modo, busca-se contribuir para o debate e compreensão das transformações ocorridas

no campo a partir do processo de luta pela terra, especificamente segundo as manifestações,

tendo como recorte espacial o estado de Minas Gerais. Compreender a questão agrária no

Brasil atual e como se estruturam os movimentos sociais e suas estratégias de luta é no que se

baseia este estudo.

A modernização da agricultura, a partir de 1950, se configura como fator fundamental

na mudança da estrutura do campo no Brasil, e para Minas Gerais as transformações também

foram acentuadas, principalmente devido às suas características físicas como, por exemplo,

topografia plana que facilita o uso de maquinários. O agronegócio se constitui atualmente

como uma das principais atividades econômicas, recebendo consideráveis incentivos

financeiros, e insere o estado de Minas Gerais na economia nacional e também internacional,

visto que a maior parcela da produção é voltada para exportação. Tais fatores geram a

desigual estrutura fundiária que expropria o camponês.

Do mesmo modo, foi nos anos 1950 e 1960 que as lutas no campo foram

intensificadas com a criação das ligas camponesas e o surgimento dos primeiros movimentos

sociais, fazendo com que a luta pela terra e os conflitos no campo apresentasse um

significativo aumento. O Estado também exerce papel fundamental nesta configuração como

principal articulador pelo desenvolvimento do agronegócio, tornando-se imprescindível

entender as ações dos governos estaduais e federal, tanto no âmbito do agronegócio quanto

para os sujeitos que trabalham na terra.

No contexto da reforma agrária brasileira, Minas Gerais apresenta um significativo

número de movimentos envolvidos nos conflitos e ocupações de terras, compreendendo

atualmente mais de vinte organizações em todo o estado. A partir dos dados do DATALUTA

é possível identificar e espacializar a ação dos movimentos sociais no estado mineiro e, por

outro lado, compreender a problemática agrária e a intensificação dos conflitos no campo.

Decorrente de pesquisas realizadas durante a graduação, o trabalho ora apresentado

discute alguns resultados obtidos a partir de projetos desenvolvidos no Laboratório de

Geografia Agrária - LAGEA, do Instituto de Geografia da Universidade Federal de

Uberlândia - UFU. A partir do ingresso no referido laboratório no início de 2010, a atuação

como colaboradora no projeto Agricultura Familiar como base para o Desenvolvimento

Territorial Local e Sustentável: avaliando experiências de projetos de Reforma Agrária no

Triângulo Mineiro, apoiado pela Pró-Reitoria de Extensão, Cultura e Assuntos Estudantis

(PROEX/UFU), permitiu o contato inicial com as temáticas da reforma agrária e

Page 14: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

14

assentamentos rurais. O projeto teve como principal objetivo a reflexão sobre as políticas

públicas de desenvolvimento rural e intercâmbio interinstitucional por meio de estudos de

experiências locais sobre as formas de organização dos assentamentos rurais e visando o

fortalecimento da agricultura familiar nos projetos de reforma agrária.

Também em 2010, os estudos foram desenvolvidos na pesquisa Territorialização do

Capital e Luta pela Terra em Minas Gerais: Uma Pesquisa sobre os Movimentos

Socioterritoriais do Triângulo Mineiro, sendo um projeto de extensão financiado também

pela PROEX/UFU, atuando assim como bolsista. Buscou-se de modo geral a elaboração de

banco de dados sobre a Reforma Agrária e desenvolvimento de metodologia de referência

para os estudos da questão agrária e dos movimentos socioterritoriais em Minas Gerais,

articularmente na região do Triângulo Mineiro.

Já em 2011, a continuidade dos estudos e debates se deu a partir do projeto de

Iniciação Científica Geografia dos Conflitos no Campo em Minas Gerais: pesquisas,

metodologias e estudos a partir do Banco de Dados da Luta pela Terra – DATALUTA,

financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico - CNPq, atuando também

como bolsista. Neste projeto, desenvolvemos estudos sobre os conflitos no campo em Minas

Gerais por meio da sistematização e utilização de metodologias para elaboração e análise dos

dados básicos da reforma agrária a partir do DATALUTA, com base nas categorias

ocupações, manifestações, assentamentos rurais, movimentos socioterritoriais e estrutura

fundiária.

E por fim, em 2012 e 2013, foi desenvolvido o projeto de Iniciação Científica Questão

Agrária, Território e Agronegócio em Minas Gerais: as disputas territoriais na produção de

agroenergia no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, por meio de bolsa do CNPq. A pesquisa

objetivou compreender o movimento de expansão do agronegócio voltado para a produção de

agroenergia em Minas Gerais e Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba e suas implicações sobre a

reprodução familiar/camponesa através de pesquisas em áreas e projetos de Reforma Agrária.

Diante desta breve apresentação, os projetos desenvolvidos na graduação demonstram os

caminhos trilhados para se chegar à elaboração da presente pesquisa.

O trabalho está estruturado em três fases, delimitando cada um dos capítulos, tendo

como recorte espacial o estado de Minas Gerais. Num primeiro momento, abordamos a

discussão da questão agrária na atualidade, conflitos no campo e disputas territoriais,

debatendo os conceitos na compreensão dos elementos históricos e também das novas

características que delineiam a temática. Ainda neste primeiro tópico, apresentamos a

metodologia da pesquisa DATALUTA, fonte de informações neste trabalho.

Page 15: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

15

Na fase seguinte, apresentada como o segundo capítulo, a primeira discussão se dá em

torno das categorias de análise utilizadas pelo DATALUTA, a saber, assentamentos,

ocupações, estrutura fundiária, movimentos socioterritoriais e manifestações, entendendo-as

como dimensões da luta pela terra. Para o segundo subitem, são tratados os números dos

conflitos no campo mineiro, a partir das categorias de análise, construindo assim a

espacialização das ações em todo o estado. Seguidamente são apresentados os movimentos

sociais mais atuantes em Minas.

O terceiro momento diz respeito especificamente às manifestações e seus conteúdos,

trabalhando assim os tipos identificados, o teor de cada ação e a quem são direcionadas as

reivindicações. Em corroboração a essa análise, são utilizadas reportagens que exemplificam

as manifestações, permitindo ao mesmo tempo uma discussão quanto ao papel da mídia na

veiculação dos fatos, e como esta cumpre tal função. Posteriormente, e como etapa que

finaliza o trabalho, são pontuadas as considerações finais que visam também dar continuidade

à pesquisa em futuros estudos.

Page 16: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

16

1. “A LIBERDADE DA TERRA É ASSUNTO DE TODOS”2: atualidades da questão

agrária e o contexto das lutas no campo

O primeiro capítulo pretende situar as discussões acerca da questão agrária no Brasil,

especialmente no estado de Minas Gerais. Claramente se faz fundamental o resgate histórico,

visto que, o que temos hoje são resultados e consequências desse longo processo de

concentração fundiária e desigualdades sociais no campo.

A principal fonte de dados é a pesquisa DATALUTA. Os resultados das pesquisas, por

meio de relatórios, têm sido usados para apresentar e discutir a atuação dos movimentos

sociais, analisando os processos de territorialização e espacialização dos sujeitos que lutam

pela terra em Minas Gerais, assim como o contexto da estrutura fundiária e as ocupações de

terras nos diferentes estados brasileiros. Sendo assim, o DATALUTA e seus produtos

permitem a interpretação da histórica concentração fundiária brasileira, fundamentada nos

interesses políticos elitistas, que levam à miséria milhares de trabalhadores do campo, e

possibilitam um desenvolvimento parcial com base no agronegócio. Contribuem também na

análise das ações governamentais e seus esforços em garantir o acesso à terra.

1.1. A Questão Agrária brasileira: debates e apontamentos ainda necessários

Muito se fala e se discute acerca da questão agrária brasileira. Trata-se de um tema que

desvenda o cenário, passado e presente, do campo no Brasil, revelando suas principais

características e elementos, permitindo assim o debate, que com certeza ainda não se findou.

A questão agrária, como afirmam diversos autores, seria um assunto resolvido se as condições

de trabalho e de vida daqueles que vivem no campo, e da terra tiram seu sustento e de sua

família, atingissem um grau adequado econômica e socialmente, retirando-os da miséria ou

das condições de subsistência, passando a usufruir dos meios de produção e dos lucros do seu

próprio trabalho.

Entretanto, não é esse o cenário com o qual nos deparamos. Temos no Brasil agrário

uma concentração de terras herdada da época da colonização, uma realidade que pouco foi

modificada no decorrer da História, sendo essa estrutura concentrada uma das raízes do Brasil

quanto a ocupação do território.

2 Trecho do poema A fala da terra, de Pedro Tierra, disponível em http://www.mcpbrasil.org.br/o-mcp/poemas/item/189-pedro-tierra-a-fala-da-terra. Acesso em jul. 2014.

Page 17: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

17

Sendo a questão agrária brasileira a problemática que fundamenta a presente pesquisa

científica, embasamo-nos em importantes concepções. Prado Jr (1979) debate a questão

agrária a partir da perspectiva da “relação de efeito e causa entre a miséria da população rural

brasileira e o tipo da estrutura agrária do País, cujo traço essencial consiste na acentuada

concentração da propriedade fundiária” (p. 18). A valorização humana é colocada em ênfase

para o autor, pela qual se deve pensar a melhor condição social do trabalhador rural e

camponês a partir do acesso à terra, considerando as desigualdades e contradições. Como bem

afirma, os problemas agrários, como qualquer outro problema social e econômico, são antes

de tudo humanos.

Guimarães (1981) aponta uma dualidade em nossa estrutura agrária, dividida

fundamentalmente em dois setores representativos de duas classes antagônicas, cujos conflitos

de interesses definem toda a nossa história. Nesse sentido, apontamos a contradição do

desenvolvimento econômico no Brasil, que atende as necessidades dos grandes proprietários

por um lado, porém não é eficiente para o todo, onde a classe não latifundiária, do trabalhador

rural e pequenos proprietários, acaba prejudicada.

Stédile (2005) traz também contribuições na análise da questão agrária e a concebe

“como o conjunto de interpretações e análises da realidade agrária, que procura explicar

como se organiza a posse, a propriedade, o uso e a utilização das terras na sociedade

brasileira” (p. 16). A partir de Graziano da Silva (1990), a discussão sobre a questão agrária

apresenta-se relevante devido ao fato de ser agravada pela expansão das relações capitalistas

de produção no campo, trazendo impactos negativos para a população rural.

Pela análise crítica da Geografia, a questão agrária é entendida como o conjunto de

problemas quanto ao desenvolvimento da agropecuária e das lutas de resistência dos

trabalhadores, problemas esses que são intrínsecos ao processo desigual e contraditório das

relações capitalistas de produção (FERNANDES, 2001). Trata, desse modo, das

consequências geradas pelo desenvolvimento do capitalismo no campo, que entendemos ser o

responsável pelas expropriações, explorações e subordinações em favor da manutenção da

alta produtividade e da concentração da terra e da renda. São as contradições do campo

brasileiro que definem essa concepção da questão.

Numa perspectiva mais atual sobre o assunto, que engloba novos elementos e desafios

para o debate, Paulino (2006) afirma que a questão agrária não está circunscrita apenas à produção agrícola, mas também aos impactos que se acham inscritos nas diversas dimensões organizativas da sociedade. Ao preconizar um regime de coerção sobre os

Page 18: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

18

trabalhadores, vinculando suas possibilidades de reprodução às conveniências de um empreendimento instável, primordialmente voltado à satisfação de necessidades externas ao povo brasileiro, o modelo agro-exportador lança seus desagregadores tentáculos às demais esferas produtivas, que o tem reproduzido, seja pelo fato de haver oferta de trabalho em excesso, seja pela cultura espoliativa disseminada no circuito patronal, em muitos casos camuflada por roupagens modernas (PAULINO, 2006, p. 69).

Desse modo, tem-se as consequências do modelo agrícola vigente no Brasil, que

interfere não apenas na economia, mas sim em todas as esferas da sociedade, política, social,

econômica e por que não, cultural. Estes são os resultados do modo de produção capitalista

que visa o desenvolvimento, entretanto, um desenvolvimento desigual. O latifúndio e a

superexploração do trabalho são cristalizados como pilares fundamentais da vida econômica e

social no campo, devido ao predomínio de grandes empresas agrícolas que organizam sua

atividade produtiva com base no controle de vastas extensões de terra e no amplo contingente

de mão de obra barata, produzindo mercadorias em larga escala a partir do regime de

monocultura. Prossegue o autor, Herança não resolvida da economia colonial, tal padrão de organização da agricultura tem revelado surpreendente capacidade de resistir à força do tempo e de opor-se a qualquer iniciativa de democratização do mundo rural. A estabilidade da estrutura fundiária na história brasileira – expressa na inabalável rigidez do índice de Gini – deixa patente a perfeita simbiose entre modernização técnica e latifúndio. A baixa renda do trabalho no campo evidencia a estreita correlação entre agronegócio e superexploração (SAMPAIO JR, 2013, p. 190).

Segundo o Censo Agropecuário 2006 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística -

IBGE, a evolução do Índice de Gini, utilizado para medir as desigualdades na distribuição do uso

da terra, registra que em 1985 o Brasil apresentou 0,857; em 1995 praticamente manteve com

0,856 e, em 2006, registrou-se 0,872. Ou seja, no intervalo de 21 anos a concentração da

propriedade de terras praticamente manteve as características, sustentando assim a desigualdade.

Por isso a “inabalável rigidez do índice de Gini”. Mesmo havendo uma expansão das áreas de

culturas e das fronteiras agrícolas, as terras continuaram e continuam nas mãos de poucos.

O estado de Minas Gerais apresenta processo semelhante. O mesmo levantamento do

IBGE, por Unidades da Federação, registra uma variação de 0,77 em 1985; 0,772 em 1995; e

em 2006 o valor é de 0,795, não apresentando alteração nessa estrutura. Em princípio,

destacamos que esse contexto de concentração é um dos principais entraves ao

desenvolvimento econômico e social da população em geral, tanto rural quanto urbana, já que

o campo e a cidade são interdependentes.

Page 19: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

19

A questão agrária em pleno século XXI não se restringe às disputas políticas, como

parte de um problema social não resolvido, a pobreza rural. Além disso, há nos últimos anos

um expansivo interesse por commodities agrícolas e não agrícolas, ou seja, interesse crescente

por terras (SAUER, 2013). O que o autor destaca como “corrida mundial por terras” recoloca

em pauta temas como a importância do espaço, lugares e territórios. Como especifica o autor,

Seja devido à demanda crescente por alimentos, seja pelas preocupações em torno das mudanças climáticas – e seus impactos sobre a produção agrícola–, a questão agrária voltou à pauta política mundial inclusive nos debates internacionais; por exemplo, no âmbito da FAO (2012) e na recente aprovação das diretrizes voluntárias sobre a terra e os recursos florestais. Certamente, essa reedição não se dá nos mesmos termos do debate clássico, mas há uma preocupação, implícita ou explícita, com a terra e o território, inclusive sobre a importância da produção familiar camponesa em relação não só à segurança, mas também à soberania alimentar (SAUER, 2013, p. 168).

Ressaltam-se os elementos que se inserem ao entendimento da questão agrária. Essas

disputas territoriais, que em princípio revelava os conflitos entre o latifúndio e o agronegócio

versus o camponês, toma novos contornos, com a inserção do debate pela corrida por terras,

em especial as brasileiras. Entendendo que a questão agrária sempre esteve em pauta de

discussão no país, devido ao cenário que se manteve no decorrer dos anos, esse interesse das

empresas estrangeiras intensifica os conflitos e contradições do campo, já que no embate,

soma forças ao agronegócio.

Valendo-nos da leitura de Gomes (2004, p. 51), O meio rural, especificamente, vem passando, nas últimas décadas, por transformações significativas, abrangendo novas dinâmicas que vêm ocorrendo em nível planetário. Isso significa que a agricultura, como parte integrante do processo produtivo, não está imune aos efeitos dessas mudanças; ao contrário, vem sendo altamente atingida, em diversas de suas fases, pela mundialização do capital.

É seguindo tal raciocínio que entendemos a substituição da agricultura, sendo esta

compreendida como a produção de alimentos, pela produção de mercadorias para o mercado

mundial, a qual mantém a predominância de extensas áreas de monocultura voltadas para

exportação. Por sua vez, o monocultivo é mais uma das características do desenvolvimento

capitalista no campo, desigual e contraditório.

Exige-se, com sua devida importância, uma análise da atuação do Estado com vistas a

promover alterações nesse contexto, pela qual a principal ferramenta, defendemos, seria uma

política pública de competência do Estado, a reforma agrária. A partir da leitura de Fernandes

Page 20: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

20

(2010), entendemos que quem apropria do poder do Estado é a classe ruralista, e são vários

deles que criam e votam as leis no Congresso Nacional, daí a justificava do Brasil ser um dos

países onde há um elevado índice de concentração de terras. Temos que O Estado tem tratado a questão agrária só com políticas conjunturais, conforme o poder de mobilização dos movimentos camponeses. A razão dessa atitude deve-se ao controle político do Estado pelos ruralistas, que têm impedido o desenvolvimento da agricultura camponesa no Brasil. Esse monopólio político determinou as condições para que a modernização da agricultura mantivesse a estrutura fundiária concentrada (FERNANDES, 2010, p.162).

Para Ribeiro e Cleps Jr (2011),

os agentes propulsores do modelo do agronegócio se aproximam do aparelho de Estado, ou seja, vê-se o peso de sua representação política nos seus poderes constitutivos (Executivo, Legislativo, Judiciário) [...]Nesses termos, a luta política dos movimentos camponeses frente ao modelo de desenvolvimento do agronegócio se traduz, em certo nível, num embate entre atores da sociedade civil organizada versus agentes políticos que controlam o Estado, que direcionam as políticas agrícolas e agrárias por meio dos organismos estatais, que fazem a gestão de recursos públicos e controlam a agenda legislativa sobre temas relativos à agricultura brasileira (RIBEIRO; CLEPS JR, 2011, p. 86-87).

A discussão quanto aos movimentos sociais que atuam contra o monopólio das terras e

a favor da redistribuição dessa riqueza, bem como suas estratégias de ação, será melhor

abordada mais adiante neste trabalho. No entanto, já de início recorremos ao assunto para

mais uma vez compreendermos os principais atores do contexto, e os agentes administrativos

que controlam essa concentração fundiária. Analisando as ações do Estado, temos que é

explícito quem ou qual grupo é beneficiado por políticas públicas, declaradamente o

agronegócio e seus representantes, os latifundiários. Os grandes proprietários detém o poder

político sobre a atuação do Estado, a própria história nos confirma tal afirmativa, em que o

grande capital e as grandes propriedades fundiárias se fizeram vitoriosas.

Exemplo disso foi à época do I Plano Nacional de Reforma Agrária, elaborado na

segunda metade da década de 1980, período da Nova República. Segundo Medeiros (2003), a

direção da proposta do PNRA, ao longo de 1985, revelou a força dos proprietários de terra,

contrariando aqueles que os consideravam fragilizados devido ao crescimento urbano-

industrial, e o que se manifestou com isso foi a complexidade do embate de forças que se

desenvolvia no interior das diferentes instâncias do Estado. Ainda segundo a autora,

Page 21: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

21

Entre os que se posicionavam contra a reforma agrária, a mais vigorosa reação à proposta foi a dos representantes dos proprietários de terra, que, um mês após seu anúncio, fizeram um congresso nacional em Brasília para discutir o plano apresentado pelo governo. Desse encontro nasceu uma nova organização de representação de seus interesses: a União Democrática Ruralista (UDR). Esta entidade, centrando seus esforços na crítica à proposta, também estimulava os seus associados a usarem a força no combate às ocupações de terra (MEDEIROS, 2003, p. 36).

Essa nova organização, em pouco tempo, ganhou visibilidade e importância no cenário

nacional, com grande influência nos espaços políticos. Nos tempos atuais, a influência e

representatividade da Bancada Ruralista ainda se mantêm, defendendo fundamentalmente o

princípio da preservação do direito de propriedade, e se necessário com o uso da força. Como

nos disse Oliveira (1994, p. 89), “a UDR nasceu para manter esta estrutura concentrada da

terra, defendendo seus proprietários: os latifundiários”. Em consequência, intensifica-se a

violência no campo, tornando-a uma das ferramentas que mantém a concentração da

propriedade fundiária no país.

Havemos de ressaltar, ainda, que a questão agrária toma mais elementos na

contemporaneidade ao identificarmos a importância que se tem voltada para os aspectos

ambientais. Não só o Brasil como o mundo por completo, se vê diante de situações críticas

causadas pela degradação ao meio ambiente. Dos estudos quanto às condições climáticas

advindas do mau uso proporcionado pela sociedade, aos questionamentos se haverá alimentos

suficientes para a população mundial, que alcançará proporções preocupantes, todos são

temas de debates que visam definir o melhor caminho a seguir. Logo, a discussão em torno da

agricultura se mantém na pauta, já que se deve pensar tanto na produção para o sustento,

quanto no adequado uso dos recursos naturais, e principalmente os cuidados, por exemplo, no

excessivo uso de agrotóxicos. Este último fator está intimamente envolvido com a questão

agrária e faz parte da pauta reivindicatória da luta pela terra, visto que o agronegócio contraria

os ideais da agricultura familiar, é o caso do uso intensivo de agrotóxicos.

A questão agrária caminha hoje junto com a questão ambiental. Tanto no Brasil como em Minas, as regiões de maior concentração de recursos naturais (água, terra, minério e biodiversidade) têm se tornado alvos de disputas políticas, econômicas e territoriais entre o agronegócio e a agricultura camponesa e familiar. (CLEPS JR, 2012, p. 02).

Uma das dimensões dessas disputas é referente à produção de agrocombustíveis,

expressiva no cerrado mineiro onde é identificada a recente expansão das agroindústrias

canavieiras, como é o caso do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. Essa atividade direcionou o

Page 22: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

22

interesse dos investidores, nacionais e estrangeiros, devido aos incentivos do uso do etanol

como combustível, tanto pelo Governo Federal quanto pelos governos estaduais.

Pautado no discurso ambiental, a produção de agrocombustíveis através da cana-de-açúcar é contraditório. Por um lado, temos o “combustível verde”, menos poluente. Porém, seu modo de produção vai totalmente ao avesso do que seria sustentável, baseado na monocultura extensiva. A cultura canavieira necessita de terras férteis e com disponibilidade hídrica para o seu desenvolvimento, principalmente com relação ao desenvolvimento das variedades de cana mais produtivas, com isso, a terra também precisa ser produtiva. Nesse sentido, presenciamos outras disputas territoriais que vão além do acesso à terra e a expropriação camponesa. Estamos diante de uma disputa pelo acesso às melhores terras que contemplem todo o aparato necessário para a cultura canavieira: terras férteis e água (CAMPOS, 2014, p. 103-104).

Por esta razão, a questão agrária atual envolve ao mesmo tempo os critérios que

abrangem a produção e a produtividade, de grande interesse do agronegócio. A disputa é em

torno do acesso e controle da terra, dos recursos naturais disponíveis, das características

físicas adequadas ao plantio e ao uso de maquinário, entre diversos outros fatores que acirram

o embate.

Diante dessa concentração, tem-se como resposta a luta pela terra, a partir dos

movimentos sociais do campo e suas estratégias de luta, iniciada nas décadas passadas. Se

colocamos aqui que a questão agrária é um debate ainda não superado, defendemos que a

solução é a reforma agrária, entendendo-a como uma necessária reforma de base, capaz de

reestruturar a economia brasileira a partir de uma adequada distribuição de terras àqueles que

da terra vivem e dela sustentam a família. Mas não só a economia sofreria alterações, e sim a

população brasileira teria resultados positivos em âmbito social, cultural e político. A reforma

agrária, quando efetiva, é o movimento que contrapõe a concentração de riquezas e visa

melhores condições de vida e trabalho.

Esse contingente que alimenta a luta por terra, traduz seus anseios de uma vida digna

na bandeira reforma agrária, que vem ganhando novos significados ao longo do tempo ao

incorporar novos valores e novos temas, não se tratando mais apenas de uma demanda por

terra. Na atualidade, é o tema da reprodução da vida que se impõe, pela ameaça representada pelo controle de produção de sementes por grandes grupos econômicos. Nesse quadro, a questão agrária se associa ao debate sobre a soberania alimentar, colocando em pauta a preservação de determinados produtos e hábitos alimentares como componentes importantes da cultura dos diferentes grupos sociais, seu direito à produção de sementes etc. e à

Page 23: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

23

qualidade dos alimentos colocados à disposição para consumo. Não por acaso, na conjunção desses elementos o tema da reforma agrária tem sido cada vez mais articulado, do debate político, ao das opções em torno de formas de desenvolvimento, tornando-o uma questão relevante não apenas para o vasto contingente dos que demandam terra, mas também para o conjunto da sociedade (MEDEIROS, 2003, p. 94).

É neste contexto da realidade agrária brasileira, entendida como a questão agrária, que

se apresenta a importância da análise das manifestações de luta pela terra, especificamente no

estado de Minas Gerais. Sendo estas ações políticas que geram diversas reivindicações,

procurando denunciar falhas do governo no assentamento das famílias e na proposta de

políticas públicas destinadas ao campo e sua população, bem como denunciando as inúmeras

faces do capitalismo que expropria e explora o camponês e o trabalhador rural para expansão

do agronegócio. A manifestação se revela como fundamental estratégia que possibilita a

continuidade da luta pela terra e na terra, em favor da reforma agrária e contra a concentração

de terras consequente principalmente pelo agronegócio.

Em pleno século XXI, a sociedade civil tomou coragem para se posicionar frente ao

Estado e às elites dominantes. O que temos hoje no Brasil é uma iniciativa de “basta” para as

desigualdades impostas à maioria da população, parcela esta composta de trabalhadores

urbanos, do campo, estudantes, homens, mulheres, crianças, que se veem diante de estruturas

esmagadoras dos direitos de vida e de trabalho. Se por anos assistimos a uma apatia ou

mesmo lentidão quanto às ações do Estado frente a tais condições, agora, o que o povo quer é

não mais esperar, é não mais se calar e aguardar passivamente. Esse mesmo povo se torna

sujeito ativo, que vai em busca de um outro desenvolvimento, e que ganha maior visibilidade

a cada dia, talvez por representar de fato uma ameaça aos interesses dominantes. Não aqui

negando as importantes ações e organizações sociais das décadas passadas, mas reafirmando o

quão necessária é a participação da sociedade visando mudanças à própria realidade em que

está inserida. É nesta perspectiva que se baseia a importante análise das manifestações de luta

pela terra.

1.2. As contradições no campo e as disputas territoriais

O estado de Minas Gerais é expressivo na compreensão da luta pela terra e na questão

agrária brasileira, visto sua extensão territorial, diversidade geográfica e, sobretudo,

caracterizado como um estado historicamente agrícola e controlado pelos latifundiários. Em

razão destas características, Minas se tornou palco de diversas manifestações, principalmente

Page 24: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

24

diante o avanço do agronegócio e das extensas monoculturas. Por concentrar importantes

recursos naturais, o estado mineiro configura um cenário de disputas, não só territoriais, mas

também políticas e econômicas.

Além disso, possui posição geográfica estratégica no território brasileiro, próximo aos

grandes centros políticos e econômicos, como São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, bem como

uma importante malha rodoviária, essencial para o escoamento da produção, seja do estado ou

como trajeto de outras regiões. Logo, estes são elementos que configuram e atraem os

interesses das grandes empresas e capitais para instalação e produção na região.

Os geógrafos, bem como pesquisadores de outras ciências humanas, em seus estudos

têm dado a devida importância às disputas territoriais, tornando-as tema de profundos debates.

Isso, entendemos, porque dentre os vários fatores, temos o território como conquista, como

palco e objeto de conflito, e majoritariamente sinônimo de poder. É nesta perspectiva que se

compreende a disputa territorial dentro da questão agrária, na qual de um lado temos o

agronegócio e sua infindável corrida por terras, e do outro a agricultura familiar, camponesa,

do pequeno produtor, que não foram contemplados nesse desenvolvimento do campo.

Sendo uma importante categoria de análise da ciência geográfica, o território é

também um elemento fundamental na pesquisa. Suas concepções, trabalhadas por diferentes

perspectivas, permitem o entendimento quanto aos processos e agentes que se colocam num

embate em defesa de seus interesses, as forças e estratégias, as desigualdades sociais, as

contradições e os desdobramentos da apropriação do espaço, e qual parcela detém de uma

maior atenção do Estado.

Conforme Raffestin (1993), o território é o resultado de uma ação dirigida por um ator,

que estabelece relações ao se apropriar de um espaço e territorializá-lo. O território é uma

produção a partir do espaço, envolvendo relações num campo de poder. Assim, o território é o

espaço contido de produções, modificado, transformado por aqueles que nele estão inseridos,

criando um sistema de relações entre si. Para o autor, o território revela relações marcadas

pelo poder, enfatizando assim o aspecto político-administrativo. Não se pode conceber o

território se não levar em consideração o poder, exercido por um indivíduo ou por um grupo e

presente em todas as relações sociais. Nesta concepção, o território existe a partir das relações

de dominação e subordinação, sem estes elementos não há definição.

Rogério Haesbaert aborda, em sua compreensão, a classificação de três lógicas

principais para conceituar território: jurídico-política, cultural e econômica. O primeiro

aspecto abarca o território como um espaço delimitado sobre o qual se exerce um poder, em

especial do Estado.

Page 25: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

25

Território, no nosso ponto de vista, é tido como um espaço geográfico dominado e/ou apropriado, cujas práticas sociais são focalizadas enquanto relações de poder, como se estivéssemos olhando para o espaço focando nosso olhar sobre as relações de poder, mas poder num sentido amplo e que envolve os mais diferentes sujeitos sociais, um poder que vem tanto de cima para baixo quanto de baixo para cima (HAESBAERT, 2012, p. 5).

As relações de poder são identificadas em diferentes níveis, caracterizando, por

exemplo, macroterritórios ou microterritórios, e em distintas dimensões, em sentido político

como no caso do poder estatal, ou econômico no caso da gestão do território pelas grandes

empresas. Já a lógica cultural que compõe a noção de território para o autor, esta privilegia

questões simbólicas e mais subjetivas, sendo o território produzido pela apropriação através

da identidade social sobre o espaço. O terceiro e último aspecto abordado pelo autor, o

econômico, tem o território como produto do choque entre classes e da relação capital-

trabalho (HAESBAERT, 2004).

Conforme Cleps Jr (2010, p. 37), “os interesses conflitantes sobre o uso e a ocupação

de um mesmo território geram as disputas territoriais. Compreender as transformações

territoriais no processo de desenvolvimento da agricultura contemporânea é questão central

das pesquisas”. Uma das dimensões da questão agrária é o processo de disputa territorial, que

se caracteriza no embate entre os dois principais modelos de desenvolvimento no campo, o

agronegócio e o campesinato.

Ariovaldo U. de Oliveira destaca que a lógica contraditória do capital monopolista ao

mesmo tempo constrói e destrói formações territoriais, ou faz com que frações de uma mesma

formação territorial conheçam processos desiguais de valorização. Para o autor, o território é

entendido como produto concreto da luta de classes imposta pela sociedade capitalista, esta

que por sua vez está assentada em três classes sociais fundamentais: proletário, burguesia e

proprietários de terra (OLIVEIRA, 1999). A sociedade, ao produzir e reproduzir sua

existência trava essa incessante luta de classes que traz como produto, segundo essa

concepção, o território.

Uma das características que revelam os interesses conflitantes e as contradições no

campo diz respeito às formas de produção da agricultura empresarial versus a agricultura

camponesa. A agricultura empresarial é intensamente ligada ao capital. Não existe produção

sem um elevado investimento em insumos, como fertilizantes, compra de sementes

selecionadas no caso, por exemplo, da soja e do milho, ou mudas como a cana-de-açúcar,

eucalipto e o pinus, entre outros. É, ainda, um território homogêneo, onde não há diversidade

na produção e a quantidade de pessoas que trabalham no processo produtivo é pequena,

Page 26: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

26

comparada à alta produção obtida, visto principalmente que estes não usufruem dos lucros do

próprio trabalho.

Por sua vez, a agricultura camponesa tem como base a reprodução da família. O

território camponês é diversificado não somente em termos de cultivos, como também no

envolvimento de pessoas, pois geralmente toda família é comprometida com o processo

produtivo. Essa distinção entre o padrão camponês e os padrões empresarial e capitalista de produção é essencial para a compreensão das dinâmicas de desenvolvimento rural. Enquanto empresários e capitalistas geram crescimento no plano de suas unidades de produção, mas com estagnação ou decréscimo do volume total de valor agregado em nível local e regional, o progresso construído pelo camponês reverte-se também em progresso para a comunidade e para a região (PLOEG, 2009, p. 21).

A diferenciação entre os modos de apropriação do espaço caracterizam a

territorialização, tanto do agronegócio quanto da agricultura camponesa. Cada um apresenta

uma forma diferente de usar e ocupar o território, e é nesse embate que se enfrentam em busca

de seus interesses. No processo de luta pela terra os sujeitos almejam a terra de trabalho, já na

apropriação pela agricultura capitalista, é a terra de negócio o interesse.

Quando é criado um assentamento, a partir da luta e resistência promovida pelos

movimentos sociais, essa luta pela fração do território capitalista promove a construção de

outro território, de outras possibilidades que abarquem o desenvolvimento do grupo, do

coletivo, econômico e socialmente. Como bem sinaliza Fabrini, No processo de enfrentamento entre agricultura camponesa e capitalista, os assentamentos de reforma agrária destacam-se como importante território camponês (fração do território) em que as novas e antigas sociabilidades são reavivadas e recriadas com a conquista da terra. Nos assentamentos, ergue-se um conjunto de saberes e conhecimentos secularmente acumulados, ou seja, saberes que estavam sendo erodidos e perdidos com a expulsão e expropriação dos camponeses e que são recriados e recuperados como estratégias de existência pela resistência dos camponeses (FABRINI, 2010, p. 82).

Os diferentes graus de desenvolvimento presentes no campo, representados pelo

agronegócio, latifúndio e campesinato, originam as disputas territoriais, marcadas por intensa

conflitividade. Visivelmente o agronegócio possui os recursos e investimentos necessários

para garantir seu domínio e predominância, enquanto que a luta pela terra permanece no

enfrentamento em busca da conquista de seu território.

Nas análises quanto ao território e os tipos identificados por Fernandes (2008),

Page 27: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

27

Os territórios do campesinato e os territórios do agronegócio são organizados de formas distintas, a partir de diferentes relações sociais. Um exemplo importante é que, enquanto o agronegócio organiza seu território para produção de mercadorias, o grupo de camponeses organiza seu território, primeiro, para sua existência, precisando desenvolver todas as dimensões de vida. Esta diferença se expressa na paisagem e pode ser observada nas distintas formas de organização dos dois territórios. A paisagem do território do agronegócio é homogênea, enquanto que a paisagem do território camponês é heterogênea. A composição uniforme e geométrica da monocultura se caracteriza pela pouca presença de pessoas no território, porque sua área está ocupada por mercadorias, que predomina na paisagem. A mercadoria é a expressão do território do agronegócio. A diversidade dos elementos que compõem a paisagem do território camponês é caracterizada pela grande presença de pessoas no território, porque é neste e deste espaço que constroem suas existências, produzindo alimentos. Homens, mulheres, jovens, meninos e meninas, moradias, produção de mercadorias, culturas e infra-estrutura social, entre outros, são os componentes da paisagem dos territórios camponeses (FERNANDES, 2008, p. 285-286).

No estado de Minas Gerais, a produção canavieira, expressiva no Cerrado mineiro, se

enquadra como um exemplo do tipo de território do agronegócio, ao lado de outras

monoculturas como soja, café e milho. No cenário econômico, a região se estrutura como uma

das maiores na produção de derivados da cana-de-açúcar do interior do país. Essa paisagem

homogênea representada pela monocultura é caracterizada também pela mecanização do

processo produtivo a partir da modernização da agricultura, revelando mais uma vez as

alterações das relações de trabalho e do uso da terra, que promove consequentemente a

destruição das tradições culturais presentes no meio rural.

Os próprios movimentos sociais esclarecem o que e a quem se deve combater para

uma efetiva democratização da terra. Os movimentos sociais, como aqueles vinculados à Via Campesina, por exemplo, elegeram o agronegócio como o principal “inimigo” da reforma agrária a ser combatido no campo. O agronegócio é entendido pelos movimentos camponeses como a principal expressão das relações capitalistas no campo do século XXI, ou seja, entendem que o latifúndio e a acumulação rentista estão deixando de exercer papel central no campo brasileiro (FABRINI, 2010, p. 65).

Se antes o inimigo da Reforma Agrária era principalmente o latifúndio tradicional,

improdutivo, agora soma-se as grandes empresas multinacionais, que consideram o camponês

como ameaça e atraso ao desenvolvimento do campo e do país. O que na verdade propõem é

um desenvolvimento desigual, característica principal do capitalismo, pelo qual se explora e

viola os direitos dos trabalhadores.

Page 28: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

28

Diante desses fatores, os movimentos sociais de luta pela terra promovem o projeto

contrário aos interesses do capital. Resistem por meio das ocupações de terras, acampamentos

e manifestações, reclamando por seus direitos e conquistando, como resultado da luta, os

assentamentos de reforma agrária. É devido às lutas dos movimentos, mais do que às políticas

públicas, que foram e são implantados os milhares de assentamentos de reforma agrária em

todo o país, e no estado de Minas Gerais essa realidade também procede, como veremos nos

capítulos seguintes.

1.3. Projeto Banco de Dados da Luta pela Terra: metodologia de pesquisa da questão

agrária

A pesquisa DATALUTA é um projeto interinstitucional de extensão e pesquisa

(iniciação científica e pós-graduação) implantado pelo Núcleo de Estudos, Pesquisas e

Projetos de Reforma Agrária - NERA da FCT/UNESP, no ano de 1998 com vistas a registrar

os números da questão agrária brasileira e contribuir com a organização dos dados de modo a

compreender melhor o problema e disponibilizá-los para implementação de políticas públicas,

subsidiando cada vez mais os estudos de pesquisadores e interessados pela temática.

Em 2005 foram iniciadas as atividades no LAGEA da Universidade Federal de

Uberlândia, a partir da cooperação com o NERA/UNESP, passando a coletar e sistematizar os

dados da questão agrária em Minas Gerais.

Atualmente (2014), a Rede DATALUTA é constituída, além do NERA de Presidente

Prudente-SP e do LAGEA de Uberlândia-MG, pelos grupos de pesquisas e instituições a

seguir: Laboratório de Geografia das Lutas no Campo e na Cidade - GEOLUTAS da

Universidade Estadual do Oeste do Paraná - UNIOESTE (Marechal Cândido Rondon);

Laboratório de Estudos Rurais e Urbanos - LABERUR da Universidade Federal de Sergipe;

Núcleo de Estudos Agrários - NEAG da Universidade Federal do Rio Grande do Sul;

Observatório dos Conflitos no Campo - OCCA da Universidade Federal do Espírito Santo;

Grupo de Estudos em Geografia Agrária, Conservação da Biodiversidade e Pantanal - GECA

da Universidade Federal de Mato Grosso; Grupo de Estudo sobre Trabalho, Espaço e

Campesinato - GETEC da Universidade Federal da Paraíba; e por último e mais recente

ingresso na pesquisa, o Laboratório de Estudos Territoriais - LABET da Universidade Federal

de Mato Grosso do Sul.

Em Minas Gerais, três instâncias documentam as ações dos movimentos de luta pela

terra, sendo a Comissão Pastoral da Terra – CPT, Ouvidoria Agrária, do Ministério do

Page 29: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

29

Desenvolvimento Agrário – MDA e Pesquisa DATALUTA. Estas são as principais

referências para estudiosos e interessados em compreender o movimento da questão agrária

no Brasil. Em nível estadual, apenas o DATALUTA-MG3 trabalha com a sistematização de

dados, consistindo em referência para pesquisadores, governo e entidades vinculadas à luta

pela terra. Desse modo, o desenvolvimento do projeto envolve grande esforço de coleta e

análise de informações que se encontram não apenas dispersas, mas também sob formatos e

estruturas diferenciados (banco de dados, delimitação espacial).

A criação e desenvolvimento de um banco de dados se fizeram necessários diante da

falta de sistematização, dificuldades de acesso e dispersão de informações, principalmente

referentes aos dados sobre as ocupações de terras, assentamentos rurais e movimentos sociais

de luta pela terra em Minas Gerais, o que configurava uma dificuldade para os pesquisadores

da questão agrária. Desse modo, a pesquisa busca facilitar o acesso às informações, as

consultas e as pesquisas.

Além da sistematização dos dados e sua divulgação, o desenvolvimento do projeto

possibilita parcerias e articulações com as instituições ligadas à temática da reforma agrária,

dentre elas o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, que dispõe

dados sobre os PAs – Projetos de Assentamentos no estado de Minas Gerais; a CPT, também

fonte de pesquisa e dados quanto às ações dos movimentos sociais do campo, entre outros. O

objetivo geral do DATALUTA consiste em elaborar um banco de dados sobre a Reforma

Agrária e desenvolver uma metodologia de referência para os estudos da questão agrária e dos

movimentos sociais do campo em Minas Gerais.

Dentre os objetivos específicos do projeto, que é desenvolvido há quase uma década,

destacamos o levantamento diário dos dados referentes às ocupações de terra e manifestações

no estado de Minas Gerais, por meio da mídia nacional, estadual e local, e dos movimentos

socioterritoriais; levantamento anual dos projetos de assentamentos de reforma agrária criados

pelo INCRA e pelo Instituto de Terras do Estado de Minas Gerais - ITER-MG; elaboração e

envio mensal dos registros de ocupações para o NERA, para conferência e envio à CPT

Nacional; recebimento mensal dos registros de manifestações da Rede DATALUTA, que

também são conferidos e encaminhados à CPT Nacional; elaboração do relatório anual de

Minas Gerais para disponibilização ao público por meio das páginas eletrônicas do LAGEA e

do NERA; elaboração de CD’s com os dados de ocupações e manifestações de Minas Gerais e

3 Para fins da organização e apresentação dos dados do Projeto DATALUTA-MG, adotou-se como critério de delimitação regional da pesquisa, a divisão elaborada pelo IBGE (1990), que apresenta o Estado de Minas Gerais dividido em 12 Mesorregiões e 66 Microrregiões Geográficas.

Page 30: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

30

as referidas reportagens veiculadas pela mídia; confecção de mapas e representações

cartográficas para a espacialização dos dados obtidos, a fim de compor relatórios e artigos

científicos elaborados pelos pesquisadores.

É também objetivo do projeto a organização de grupos de estudos com docentes e

discentes, a fim de promover debates acerca da questão agrária, discutindo as principais

políticas públicas voltadas para o campo, bem como as ações dos movimentos sociais e seus

desdobramentos em nível estadual e nacional; além da participação em reunião anual da Rede

DATALUTA, envolvendo participantes de cada estado que compõem o projeto, com vistas a

apresentar os resultados dos trabalhos dos pesquisadores, e discutir os avanços no

desenvolvimento das pesquisas.

A metodologia da pesquisa DATALUTA é composta por um conjunto de procedimentos

que compreende as fontes, as escalas e as categorias assentamentos, ocupações, movimentos

socioterritoriais, estrutura fundiária e manifestações, conforme demonstra o organograma a seguir.

Organograma 1: Estrutura do Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA

DATALUTA – BANCO DE DADOS DA LUTA PELA TERRA

VERSÕES ASSENTAMENTOS OCUPAÇÕES

ESTRUTURA FUNDIÁRIA

MOVIMENTOS SOCIOTERRITORIAIS MANIFESTAÇÕES

FONTES INCRA - ANOTER CPT -

DATALUTA SNCR CPT - DATALUTA CPT - DATALUTA

Fonte: DATALUTA, 2014.

Na sistematização das informações, os dados são organizados e representados em três

escalas geográficas: nacional, estadual (Minas Gerais) e microrregional (Triângulo Mineiro),

correlacionadas às versões conforme o organograma apresentado. Essa organização dos dados

subsidia uma análise de como a luta pela terra vem se espacializando pelo estado mineiro e

Brasil como um todo. Os resultados são divulgados com a publicação do Relatório

DATALUTA Minas Gerais e Brasil.

A composição dos dados de assentamentos rurais tem como fontes o INCRA e a

Associação Nacional dos Órgãos Estaduais de Terras - ANOTER. Os dados de assentamentos

rurais no Brasil estão sistematizados desde 1985; os de ocupações desde 1988 e de

movimentos socioterritoriais desde 2000. Para a elaboração de mapas, gráficos e tabelas nas

diversas versões, os dados pesquisados são digitados em programas apropriados como, por

exemplo, os aplicativos Excel, Philcarto e Coreldraw.

Page 31: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

31

Por sua vez, os dados de ocupações, famílias e movimentos socioterritoriais são

organizados a partir das fontes CPT e DATALUTA. Como fontes utilizamos dados extraídos

de diários nacionais e regionais que compõem os acervos dos grupos de pesquisa. Os registros

das ocupações no DATALUTA seguem uma ordem específica, na qual são utilizadas fontes

primárias e secundárias. A CPT registra as informações colhidas em jornais de circulação

local, estadual e nacional, boletins e publicações de diversas instituições: movimentos sociais,

sindicatos, partidos, órgãos governamentais, igrejas, declarações e cartas assinadas, boletins

de ocorrência, além das informações pesquisadas pelas regionais da CPT.

Conforme a metodologia, os dados das fontes distintas são organizados em uma única

tabela, possibilitando a conferência e confrontação dos dados apresentados por cada uma. Estas,

muitas vezes, fornecem a mesma informação, ou seja, existem diversos casos onde se registra

determinada ocupação, que também é registrada pelo agente pastoral da CPT, ficando assim

assinalada a mesma ocupação em duas fontes distintas. Como o DATALUTA é composto da

conexão das diversas fontes, a mesma informação poderá aparecer em duplicidade, por isso é

imprescindível a confrontação dos dados. Os dados das respectivas fontes, reunidos nas

chamadas bases gerais que englobam os dados de todos os estados envolvidos, são armazenados

para elaboração de diferentes tipos de relatórios e artigos científicos.

A versão estrutura fundiária do DATALUTA é um banco de dados formado a partir

das áreas cadastradas no SNCR (Sistema Nacional de Cadastro Rural/INCRA) reunindo

informações dos imóveis rurais e áreas de posse do Brasil dos anos 1992, 1998, 2003, 2010,

2011 e 2012.

Os dados referentes às manifestações sociais, objeto do presente estudo, estão sendo

registrados no banco de dados a partir do ano de 2009. Manifestação é definida como atos

públicos em um ou vários locais com a participação de organizações sociais, camponesas e do

agronegócio que explicitem as conflitualidades da questão agrária. Como exemplos, são

registrados em planilhas, juntamente com o arquivamento da matéria de origem (fontes) os

seguintes tipos de manifestações: ocupações em prédio público, marcha, romaria, Grito dos

Excluídos, formação de acampamento, ocupação de prédio privado, bloqueio de rodovia,

eventos, greve, protestos, destruição de acampamento, reintegração de posse, expulsão, entre

outras.

A partir dessa nova categoria, os pesquisadores perceberam o quão importante se faz a

análise das formas de manifestações dos movimentos sociais do campo. Assim, presenciamos

constantemente, à medida que são divulgados pelos meios de comunicação, os diversos

movimentos mobilizando milhares de pessoas rumo à luta pela reforma agrária, pela educação

Page 32: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

32

no campo, por melhorias nos assentamentos, por apoio àqueles que conquistaram uma fração

do território, pelos direitos do trabalhador rural, e consequentemente tomando a visibilidade

necessária à causa. Todos esses elementos caracterizam a dinâmica da luta pela terra e seus

desdobramentos.

O quadro a seguir relaciona os jornais e informes online por meio dos quais a pesquisa

é realizada.

Quadro 1: Fontes consultadas DATALUTA-MG – 2014

FONTE LOCAL/ ABRANGÊNCIA ENDEREÇO/ LINK

1 A Gazeta News Muriaé http://www.agazetanews.com.br 2 Agência Brasil de Fato Nacional http://www.brasildefato.com.br/

3 Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva – CEDEFES Nacional http://www.cedefes.org.br/

4 Clica Brasília Nacional http://www.clicabrasilia.com.br

5 Confederação dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG Nacional http://www.contag.org.br/

6 Coordenação Nacional de Lutas - CONLUTAS Nacional http://www.conlutas.org.br/ 7 Correio Cidadania Nacional http://www.correiocidadania.com.br/ 8 Estado de Minas Estadual http://www.em.com.br/

9 Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado de Minas Gerais - FETAEMG Estadual http://www.fetaemg.org.br/

10 Folha de São Paulo on line Nacional http://www.folha.uol.com.br/ 11 G1 Nacional http://g1.globo.com/ 12 Jornal Correio de Uberlândia Uberlândia http://www.jornalcorreio.com.br/ 13 Movimento dos Atingidos por Barragens - MAB Nacional http://www.mabnacional.org.br/

14 Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST Nacional http://www.mst.org.br/

15 O Norte de Minas Montes Claros http://www.onorte.net/ 16 O Tempo Nacional http://www.otempo.com.br/ 17 Radioagência NP Nacional http://www.radioagencianp.com.br/ 18 Resistência Camponesa Nacional http://www.resistenciacamponesa.com/ FONTE: DATALUTA, 2014.

Diariamente, os pesquisadores envolvidos no projeto fazem o levantamento dos dados

em jornais nacionais (Folha de São Paulo, Clica Brasília, Estado de Minas e Correio

Cidadania) e regionais (Norte Net, O Tempo, Jornal Correio e A Gazeta News). O principal

propósito é realizar uma pesquisa que possa abranger todo o estado mineiro, e para tanto,

utilizamos a divisão mesorregional de Minas Gerais. Para cada mesorregião estabelecemos

um jornal como fonte de pesquisa. Entretanto, por vezes encontramos dificuldades em definir

a fonte, uma vez que a questão agrária nem sempre está em pauta de discussão pela mídia.

Torna-se necessário periodicamente realizar uma conferência, e se preciso substituir por outra

Page 33: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

33

fonte que veicula mais informações. Essa constante análise deve ser feita, permitindo uma

pesquisa de confiança e qualidade.

O Relatório DATALUTA MG e o Relatório DATALUTA BRASIL, enquanto

produtos do projeto, são construídos com base em todos os dados obtidos pelos pesquisadores

durante o ano de trabalho, composto de tabelas, gráficos e mapas. No final de cada ano, são

elaborados tabelas, gráficos e mapas que possam melhor representar a espacialização da luta

pela terra, bem como as transformações conquistadas referentes às questões do campo.

Page 34: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

34

2. “TERRA NÃO SE GANHA, TERRA SE CONQUISTA”4: as estratégias de ação

promovidas pelos movimentos sociais

Nesta segunda abordagem discutimos o cenário do campo mineiro, a partir da

atuação dos movimentos sociais de luta pela terra e pela reforma agrária, considerando

principalmente a metodologia do Projeto DATALUTA e suas categorias de pesquisa que

subsidiam a análise, bem como os dados abordados pela CPT. Nesse processo, a fração

do território é conquistada por meio das diversas estratégias de luta, representadas pelas

ocupações, manifestações e também pelas organizações sociais envolvidas.

2.1. Dinâmicas e ações dos movimentos sociais: as categorias de análise em debate

Como exposto anteriormente, a pesquisa DATALUTA aborda cinco categorias de

análise na compreensão da luta pela terra, a saber, assentamentos, ocupações, estrutura

fundiária, movimentos socioterritoriais e manifestações. Cada uma é discutida considerando a

relevância para o estudo, entendendo-as como dimensões da questão agrária, tanto em Minas

Gerais como nos demais estados brasileiros que compõem a rede de pesquisa.

O assentamento rural é o principal instrumento legal que possibilita o acesso e

permanência na terra, seja pelos diferentes tipos de assentamentos que se tem no Brasil.

Conforme a Portaria nº 080, de 24/4/2002 do MDA, o assentamento é definido como

Unidade Territorial obtida pelo Programa de Reforma Agrária do governo federal ou, em parceria com estados ou com municípios, mediante desapropriação; arrecadação de terras públicas; aquisição direta; doação; reversão ao patrimônio público, ou por financiamento de créditos fundiários, para receber, em suas várias etapas, indivíduos selecionados pelos programas de acesso à terra (BRASIL, 2002, s/p).

Além da concepção de unidade territorial, o assentamento possui significados mais

complexos. É nesta fração do território, conquistada na luta pela reforma agrária, que se

recriam as relações sociais do campo, onde também há o desafio de se manter na terra e dela

tirar o próprio sustento. Com a criação do assentamento, é concretizado o processo de

territorialização daqueles que lutam pela redistribuição de terra. No entendimento aqui

defendido, o assentamento se configura como instrumento de combate ao desenvolvimento 4 Retirado do livro A geografia das lutas no campo, de Ariovaldo U. de Oliveira, 1994, ao discutir sobre a formação e atuação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra na luta pela terra.

Page 35: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

35

desigual até agora imposto no campo, e que está em permanente disputa contra o capital,

especificamente contra o agronegócio.

Para além da conquista da terra, com a criação do assentamento rural a luta não se

finda. Pelo contrário, outra batalha se inicia pela permanência e manutenção do assentamento,

evitando que o capital avance nesse território.

Deve-se salientar que com a conquista do assentamento rural inicia-se uma nova luta, agora não mais para ter o acesso a terra, mas pela permanência nela. Os camponeses buscam a partir de então, fazer do assentamento um território que garante a reprodução do seu modo de vida e trabalho. Essa conscientização tem guiado as táticas de vários movimentos socioterritoriais, tem-se entendido que a luta não pode parar na conquista do assentamento rural, mas prosseguir na busca pela reprodução do campesinato enquanto classe social. Devem ser buscadas melhores condições de vida (educação, saúde, lazer, saneamento básico, energia elétrica) e trabalho (estradas para escoamento da produção, preços mínimos para os produtos, créditos produtivos etc.). Os assentados não podem ser alheios aos efeitos causados pelas políticas que têm sido implantadas no campo, mas ao contrário, devem conhecê-las para se posicionarem enquanto classe social que quer permanecer na terra (COCA, 2011, p. 21).

Desse modo, se compreende que a luta pela terra e pela reforma agrária é um processo

contínuo, permanente, sendo o acesso à fração do território a primeira conquista, devendo os

assentados dar continuidade ao processo. Para a reprodução social dos agora assentados, é

necessário, além da terra, outras medidas fundamentais, como recursos para a produção,

escolas no campo, segurança, entre outros fatores indispensáveis no cotidiano.

Cabe salientar que os tipos de assentamentos criados no estado de Minas Gerais a

partir de 1986, segundo dados do INCRA e DATALUTA, são o Projeto de Assentamento

Federal (PA), Projeto de Assentamento Estadual (PE) e Projeto de Reassentamento de

atingidos por Barragens (PRB). O PA é o principal tipo com o maior número de

assentamentos no estado mineiro.

Quanto à categoria analítica ocupações no DATALUTA, estas são obtidas a partir do

levantamento da CPT e dos grupos de pesquisa estaduais que integram o respectivo projeto. É

entendida como a principal estratégia de luta pelos movimentos no combate ao latifúndio e ao

agronegócio. Os assentamentos, logo, são obtidos principalmente como consequência das

ocupações de terras.

Primeiro, é preciso dizer que a ocupação é uma ação decorrente de necessidades e expectativas, que inaugura questões, cria fatos e descortina situações. Evidente que esse conjunto de elementos modifica a realidade,

Page 36: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

36

aumentando o fluxo das relações sociais. São os trabalhadores desafiando o Estado, que sempre representou os interesses da burguesia agrária e dos capitalistas em geral. Por essa razão, o Estado só apresenta políticas para atenuar os processos de expropriação e exploração, sob intensa pressão dos trabalhadores. A ocupação é, então, parte de um movimento de resistência a esses processos, na defesa dos interesses dos trabalhadores, que é a desapropriação do latifúndio, o assentamento das famílias, a produção e reprodução do trabalho familiar, a cooperação, a criação de políticas agrícolas voltadas para o desenvolvimento da agricultura camponesa, a geração de políticas públicas destinadas aos direitos básicos da cidadania (FERNANDES, p. 61-62).

Logo verificamos o quão importante é a ocupação de terra como dimensão da questão

agrária. Tida como uma ação antes de tudo política, a ocupação acontece a partir da necessidade

dos trabalhadores, que se reúnem e constroem coletivamente o propósito. Nessa construção são

fundamentais diversos fatores, como por exemplo, a definição da área, devendo ser enquadrada

nos critérios de propriedade improdutiva que não cumpre a função social da terra. Ainda

segundo o autor, a lógica da ocupação é constituída pela indignação e revolta, necessidade e

interesse, consciência e identidade, experiência e resistência, concepção de terra de trabalho

contra a terra de negócio, movimento e superação (FERNANDES, 2000).

A categoria de pesquisa estrutura fundiária tem como fonte o SNCR, um sistema de

gestão federal vinculado ao INCRA, que dispõe de informações sobre os imóveis rurais do

Brasil e de seus proprietários. Esse sistema possui o levantamento da classificação dos

imóveis rurais por tamanho, conformando assim a estrutura fundiária, que por sua vez revela

o contexto da distribuição de terras e permite calcular o Índice de Gini. É por meio dessa

categoria que se analisa a evolução das propriedades rurais, classificadas por tamanho em

hectares, sendo agrupadas pelo DATALUTA em pequenas, médias e grandes. Se os dados

apresentam que a estrutura fundiária não se alterou nos decorrer dos anos, isso confirma a

noção de manutenção da concentração da terra.

Já para a categoria movimentos socioterritoriais, os dados também são sistematizados

pela CPT e DATALUTA e abordam sobre as organizações sociais que atuam na luta pela

terra. O conceito de movimento socioterritorial foi cunhado por Fernandes (2000), em debate

também com Jean-Yves Martin, buscando construir a ideia de movimento social como

categoria geográfica, entendendo que o conceito carece de teorias dentro da Geografia, visto

que para estudá-los nos debruçamos em referências de historiadores, sociólogos e cientistas

políticos, entre outros. Para o autor, a Geografia tem se preocupado, nos últimos anos, com

estudos sobre os movimentos sociais, e então precisa conceitualizá-los fundamentado nos

processos geográficos, nos espaços e territórios que constroem.

Page 37: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

37

Assim, são denominados movimentos socioterritoriais aqueles que têm o território

como trunfo, que se organizam e dimensionam-se a partir desse referencial. Segundo o autor,

Um movimento socioterritorial como o MST tem como um de seus principais objetivos a conquista da terra de trabalho. E os realiza por meio de uma ação denominada ocupação da terra. A ocupação é um processo socioespacial e político complexo que precisa ser entendido como forma de luta popular de resistência do campesinato, para sua recriação e criação. A ocupação desenvolve-se nos processos de espacialização e territorialização, quando são criadas e recriadas as experiências de resistência dos sem-terra (FERNANDES, 2000, p. 61).

Os movimentos de luta pela terra, compreendidos como socioterritorial, almejam uma

fração do território, que é dominado pelo capital por meio do agronegócio e dos latifúndios.

Assim, na ação propriamente dita com a formação do acampamento na área ocupada, ocorre o

processo de espacialização do movimento que a promove. Com a conquista do território

efetivada em assentamento, tem-se a territorialização. Lembrando que o período entre uma

ocupação e a criação do assentamento se arrasta por anos, não é um processo rápido. Por isso,

nas estratégias de ação tão importante quanto ocupar, é também resistir para assim

territorializar.

E por último, tão relevante quanto as demais dimensões até aqui apresentadas, é a

categoria manifestações, objeto deste estudo. É conceituada como as “ações coletivas dos

trabalhadores e trabalhadoras que reivindicam diferentes políticas públicas e ou repudiam

políticas governamentais ou exigem o cumprimento de acordos e promessas” (CPT, 2013).

As ações políticas se constituem na reivindicação dos direitos de homens, mulheres e

crianças do campo, sendo este complexo e repleto de contradições no âmbito do

desenvolvimento capitalista.

Manifestação também é apreendida como atos públicos em um ou vários locais com a

participação de organizações sociais, camponesas e do agronegócio. São caracterizadas por

passeatas, ocupações de prédios públicos e privados, bloqueio de rodovias, formação de

acampamentos em praças, protestos, entre outros.

É necessária uma diversidade de estratégias que possibilitam a continuidade do

processo, e as várias formas de luta

[...] acontecem em separado ou simultaneamente com ocupações de terra. São as marchas ou caminhadas, as ocupações de prédios públicos e as manifestações defronte as agências bancárias. Esses atos intensificam as lutas e aumentam o poder de pressão dos trabalhadores nas negociações com

Page 38: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

38

os diferentes órgãos do governo. Igualmente, expõem suas realidades, recebendo apoio e críticas da opinião pública e de diversos setores da sociedade. As caminhadas e marchas são formas de manifestação política produzidas na espacialização e produtoras de espacialidades (FERNANDES, 2000, p.73).

A manifestação é construída como um ato político, que denuncia interesses

particulares e privilegia questões coletivas. Diante distintas formas de desigualdades

explícitas na realidade brasileira, seja no campo, ou mesmo em outras instâncias, como nas

periferias das cidades ou nas questões trabalhistas, cabe ao indivíduo, numa construção

coletiva, buscar estratégias de luta e embate de forças, e a manifestação se constitui

exatamente nessa estratégia.

Por meio destas ações dos trabalhadores podemos compreender as formas de resistência aos processos de expropriação, expulsão e exclusão. Pode-se analisar, igualmente, a disputa política por projetos de desenvolvimento rural. A amplitude dessa luta é conhecida pelas diversas manifestações cotidianas dos sem-terra, desde o trabalho de base às ocupações de terra; do enfrentamento aos latifundiários às diversas formas de violência contra os sem-terra; dos acampamentos e dos protestos com ocupações de prédios públicos às intermináveis negociações com o governo; do assentamento à demanda por política agrícola, na formação da consciência de outros direitos básicos, como educação, saúde etc. (FERNANDES, 2001, p. 37).

As demandas constituintes das reivindicações são, em geral, por crédito,

incentivos à pequena produção, assistência técnica, renegociação de dívidas, ou são

denúncias contra o agronegócio e as violências sofridas, entre outros. Enfim, por

diversos objetivos é que os integrantes das organizações e movimentos saem às ruas e se

mostram à sociedade.

2.2. Os movimentos sociais de luta pela terra

O debate quanto às organizações sociais, que contestam a ordem territorial imposta,

exige importante discussão para a compreensão da luta pela terra. Com base nos dados

sistematizados pelo DATALUTA, são registradas as atuações dos principais movimentos

sociais no estado mineiro.

Considerando as ocupações de terra, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem

Terra - MST é a organização mais expressiva no estado, atuando em todas as mesorregiões

mineiras, com o maior número de ações, registrando 47% do total. Apenas na mesorregião

Page 39: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

39

Central Mineira não foram identificadas ações do referido movimento, segundo a fonte

DATALUTA. A segunda principal organização responsável pelas ocupações de terra é a

Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG, sem atuação apenas

nas mesorregiões Oeste de Minas e Zona da Mata.

O Movimento de Libertação do Sem Terra - MLST, uma organização nacional, tem

atuação significativa na região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, tão expressivo quanto o

MST. Segundo Freitas (2013), problemas entre as lideranças fizeram com que o MLST se

dividisse, surgindo então outros movimentos. No final do ano 2000, o MLST regional Triângulo Mineiro rompe com a direção nacional, passando a ser denominado de MLST de Luta. [...] Já no ano de 2002, o MLST de Luta se une a outros dois movimentos, o Movimento de Luta Socialista - MLS e o Movimento de Trabalhadores - MT, e passa a constituir o Movimento Terra, Trabalho e Liberdade – MTL, tendo uma atuação expressiva na região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (FREITAS, 2013, p. 46-47).

No Norte de Minas Gerais, além do MST e da CONTAG, as organizações Liga

Operária Camponesa - LOC e Liga dos Camponeses Pobres - LCP também se destacam.

Freitas (2013) ainda sinaliza que a LCP tem caráter mais combativo, defendendo a revolução

agrária, e não a reforma agrária. Esse movimento também atua no Triângulo Mineiro, porém

menos significativo. O gráfico 1 sintetiza uma melhor visualização quanto a atuação dos

referidos movimentos identificados pelo DATALUTA e CPT.

Gráfico 1: Minas Gerais - Participação dos movimentos sociais em ocupações de terra,

1990-2012

MST47%

CONTAG20%

MLST8%

LCP4%

LOC4%

MTL3%

OUTROS14%

FONTE: DATALUTA, 2013. Org.: VICTOR, F. B., 2014.

Page 40: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

40

O que é apresentado como outros no gráfico corresponde aos movimentos com poucas

atuações no estado, muitas vezes representando apenas uma região. Dentre eles citamos os

Quilombolas no Noroeste e Norte de Minas, em territórios de populações tradicionais.

Também o Vazanteiros em Movimento e os Geraizeiros no Vale do Rio Doce e Norte de

Minas Gerais, na batalha para manter seus territórios.

Nas análises da atuação dos movimentos nas manifestações de luta pela terra, também

são identificados importantes organizações. O MST mais uma vez se destaca com maior

atuação nas mesorregiões Metropolitana de Belo Horizonte, Jequitinhonha, Noroeste de

Minas, Norte de Minas, Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba e Vale do Rio Doce. Já o

Movimento dos Atingidos por Barragens - MAB tem maior expressão na região metropolitana

mineira, Norte de Minas e Zona da Mata. O destaque para o Triângulo Mineiro/Alto

Paranaíba se configura nas ações do MLST, que anteriormente foi sinalizado também nas

ocupações de terras.

Mais uma vez ressalta-se a concentração das ações na capital mineira, também entre

outros movimentos, como por exemplo, CONTAG, CPT, Via Campesina. As reivindicações

dos sujeitos do campo são discutidas principalmente onde se concentram importantes órgãos

públicos, pois é por meio das políticas públicas que se pretendem os resultados.

2.3. A luta pela terra e os conflitos no campo em Minas Gerais

Por meio das ações coletivas, os movimentos sociais do campo criam atos políticos.

Não é apenas o movimento que se envolve pelo desejo de realização da reforma agrária, mas

também a sociedade civil é inserida no contexto, mesmo que de um modo passivo, por

exemplo, por meio da mídia quando noticia a situação dessas famílias em processo de

resistência e conquista da terra. Quanto às ações do Estado, por sua vez, observamos a

lentidão com que são conduzidos os procedimentos de desapropriação de uma área e a

burocracia enfrentada na criação dos assentamentos.

Assim, torna-se importante as ações dos movimentos sociais, que é a representação

concreta destes atores para a realização da democratização do acesso à terra. Como bem

observado, a pressão promovida por estes que lutam no campo pelo seu desenvolvimento

econômico e social, impulsiona a efetivação dos assentamentos.

Se até aqui afirmamos a histórica concentração de terras no desenvolvimento

brasileiro, em consonância se destacam os conflitos sociais no campo, que não são exclusivos

da contemporaneidade, mas sim marcas do processo de uso e ocupação do território. A luta

Page 41: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

41

pela terra, que se intensificou na década de 1950 e no regime militar, teve sua voz abafada

pela política ditatorial, ressurge na redemocratização do país pós 1985 e vem desenhando

novos contornos de estratégias e resistências. Acampamentos e assentamentos são novas formas de luta de quem já lutou ou de quem resolveu lutar pelo direito à terra livre e ao trabalho liberto. A terra que permite aos trabalhadores - donos do tempo que o capital roubou e construtores do território coletivo que o espaço do capital não conseguiu reter à bala ou por pressão - reporem-se/reproduzirem-se, no seio do território da reprodução geral capitalista (OLIVEIRA, 1994, p. 18).

Essa luta sempre foi marcada por intensa violência que até hoje não apresenta solução.

O número de mortos no campo vem crescendo, e hoje se tem registrado notícias sobre

assassinatos de trabalhadores rurais, assentados, líderes sindicais ou de movimentos sociais,

índios, agentes pastorais, entre outros. Por um pedaço de terra e por um outro

desenvolvimento, muitos brasileiros perderam a vida.

No estado de Minas Gerais, dois episódios de repercussão nacional ilustram os casos

de violência no campo. O primeiro ocorreu em 28 de janeiro de 2004, conhecido como

Chacina de Unaí, município localizado no Noroeste de Minas Gerais, em que quatro

funcionários do Ministério do Trabalho, sendo três auditores fiscais e um motorista, foram

assassinados a tiros quando fiscalizavam as condições de trabalho e moradia de colhedores de

feijão em fazendas da região. “Em função da tragédia, a data 28 de janeiro tornou-se o Dia

Nacional de Combate ao Trabalho Escravo” (CLEPS JR, 2012, p. 7). As propriedades rurais,

principalmente dos fazendeiros considerados mandantes do crime, frequentemente eram alvos

de fiscalização, e os auditores sofriam ameaças constantes. Somente nove anos após o fato é

que houve o julgamento, levados a júri e condenados apenas os executores do crime

(AFONSO, 2013).

A Chacina de Felisburgo é outro caso de violência que se enquadra nos conflitos no

campo. No município mineiro de Felisburgo, mesorregião do Jequitinhonha, em 20 de

novembro de 2004 cinco trabalhadores rurais sem-terra, militantes do MST, foram

assassinados. O crime aconteceu no acampamento Terra Prometida, Fazenda Nova Alegria.

“O réu confesso do massacre, além de participar diretamente da ação, contratou 16 pistoleiros

para atacar as 230 famílias do acampamento” (CLEPS JR, 2012, p. 7). Além dos assassinatos,

outros sem-terra ficaram feridos pelos tiros; barracos e pertences foram perdidos no incêndio

causado pelos acusados. Segundo o movimento, parte das terras da fazenda é devoluta e

grilada pela família do mandante do crime, o que justifica a ocupação da área.

Page 42: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

42

Dos acusados do crime de Felisburgo, quatro foram condenados no final de 2013,

entre eles o fazendeiro e mandante do crime, que recorre em liberdade, o que demonstra que a

condenação não é certeza de punição. A condenação atinge um número muito pequeno de

mandantes dos crimes em relação ao total de assassinatos no campo, contudo, a maioria

desses condenados nunca cumprirá as penas atrás das grades. Não importa o tamanho da pena recebida. A Lei lhes garante o direito de recorrer das condenações em liberdade. O fazendeiro Adriano Chafik, por exemplo, condenado a 115 anos de prisão, por ser o mandante da chacina de Felisburgo, vai continuar em liberdade até o STF julgar seu último recurso. [...]É importante observar que, a grande maioria dos poucos julgamentos realizados em que um mandante de crime sentou no banco dos réus, ocorreu naqueles casos em que o assassinato provocou uma grande repercussão nacional e até internacional. Nas centenas de casos em que não se conseguiu dar visibilidade para o fato e provocar pressão sobre o Judiciário e o próprio Estado, os processos permanecem nas gavetas dos fóruns e os crimes acabam prescrevendo, acobertados pelo manto da impunidade (AFONSO, 2013, p. 117).

Do mesmo modo que o primeiro, este segundo caso constata a lentidão e impunidade

dos crimes cometidos no campo em desfavor das famílias que se colocam no embate contra as

forças latifundiárias. Constata-se, em diversos casos, que os interesses daqueles que chefiam

os crimes no campo, fazendeiros ou empresários do agronegócio, são determinantes nas

decisões judiciais, graças ao poder econômico e influência política que mantêm. Esse cenário

faz com que a sociedade desacredite nas competências do poder judiciário brasileiro, e se

torna mais um fator que leva os movimentos sociais às ruas e à mídia para pressionar e exigir

do Estado a devida justiça e punição.

Por meio do Caderno Conflitos no Campo Brasil 2013 (CPT), publicação anual que

traz o balanço dos conflitos, foram divulgados os números dos assassinatos e julgamentos

advindos dos crimes no campo em todo Brasil, praticados por pistoleiros e fazendeiros,

responsáveis por este cenário de violência. Fica evidente que a impunidade ainda se mantém

em praticamente todos os estados brasileiros, conforme indica o quadro a seguir.

Quadro 2: Brasil - Assassinatos e julgamentos, 1985-2013

REGIÃO CASOS VÍTIMAS CASOS JULGADOS

MANDANTES CONDENADOS

MANDANTES ABSOLVIDOS

EXECUTORES CONDENADOS

EXECUTORES ABSOLVIDOS

NORTE 564 839 32 19 5 26 22 NORDESTE 385 424 21 1 1 14 12 CENTRO-OESTE 128 181 12 1 2 12 3 SUDESTE 125 157 33 2 5 28 18 SUL 66 77 8 3 1 5 3 TOTAL 1.268 1.678 106 26 14 85 58

Fonte: Cadernos Conflitos no Campo 2013 (CPT). Org.: VICTOR, F. B., 2014.

Page 43: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

43

Segundo os dados, as regiões Norte e Nordeste apresentam os maiores registros de

crimes cometidos no campo, como também o maior número de vítimas, envolvendo conflitos

por terra, água e conflitos trabalhistas. Em contrapartida, apenas 8% dos casos foram levados

a júri. Essa porcentagem dos casos julgados permanece aproximada para as demais regiões,

com exceção apenas da região Sudeste, que nesse período teve 26% dos seus casos julgados.

No total de casos de assassinatos no Brasil, englobando todos os estados, apenas 8% foram

resolvidos. O gráfico 2 traz de modo ilustrativo essa quantificação.

Gráfico 2: Brasil - Assassinatos e julgamentos, 1985-2013

Fonte: Cadernos Conflitos no Campo 2013 (CPT). Org.: VICTOR, F. B., 2014.

O gráfico corrobora na compreensão da discrepância entre o número de casos

registrados e o número de casos julgados. Muitos crimes cometidos ficaram e ainda ficam não

solucionados, sem investigação e consequente punição. Essa impunidade, mais uma vez, é

fator preponderante na continuidade da violência do campo, pois de certo modo oferece

“livre-arbítrio” para os pistoleiros, latifundiários e o agronegócio continuarem a “eliminar” o

que consideram empecilho aos seus interesses financeiros e ao desenvolvimento capitalista

que propõem ao campo. Numa ocupação de terra promovida pelo movimento social, de uma

fazenda improdutiva, é comum que o fazendeiro rebata com violência contra os ocupantes,

caracterizando assim o quão conflituosa é tal realidade.

Segundo os dados da CPT, no estado de Minas Gerais foram registrados 68 casos de

assassinatos no período 1985-2013, com 89 vítimas e 25 casos levados a júri, 37% do total.

Entre os mandantes julgados, 2 foram condenados e 3 absolvidos, e dentre os executores, 24

Page 44: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

44

foram condenados e 15 absolvidos. Sendo que, para a região Sudeste, o estado mineiro é o

que mais registrou casos de assassinatos no campo, representando 54% do total regional, e foi

o único dos quatro estados a ter mandantes de crimes condenados.

Os movimentos sociais, atuando na luta pela terra, promovem como estratégia de ação

ocupações de terras, acampamentos, marchas, caminhadas, ocupações de prédios públicos,

eventos estes que tendem a reunir a atenção da sociedade para a causa. São estes dados que

oferecem a noção da atualidade da luta pela terra.

O processo de modernização da agricultura implementada no campo, por meio dos

planos de desenvolvimento, por exemplo na ocupação do cerrado mineiro, é marcado por uma

intensa exclusão social e subordinação daqueles que vivem da terra, sejam camponeses ou

trabalhadores rurais, desenhando assim um cenário que exigiu desses sujeitos a inserção na

luta para a conquista e retomada da terra através das ações coletivas.

Esse cenário do campo e sua tomada por grandes empresas e pelo agronegócio é

expresso nos estudos recentes de Campos (2014), ao discutir a expansão da produção

canavieira no Cerrado mineiro. Segundo o estudo, foi a partir da década de 1990 e durante a

década de 2000 que o número de usinas de cana-de-açúcar aumentou rapidamente. Em 2013,

o estado de Minas Gerais concentrava 49 agroindústrias canavieiras em operação, sendo que

28 delas se localizam na mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba.

Valendo-nos do exemplo dessa mesorregião,

O processo de expansão da monocultura canavieira no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba envolve uma série de questões relacionadas aos impactos sociais, políticos, econômicos e ambientais. A expansão dos cultivos e da indústria da cana-de-açúcar gera consequências negativas, como a expulsão dos trabalhadores do campo, migrações, concentração fundiária, impactos ambientais dentre outras questões. O avanço dessa cultura promove também uma concentração da produção e uma concentração de terras nas mãos de usinas e grandes fornecedores, o que pode ocasionar prejuízos à agricultura camponesa. Além das questões citadas, temos a questão trabalhista, como a condição dos trabalhadores no plantio e colheita da cana, trabalho precário e ainda ameaçado frente à mecanização das colheitas, o que acarretará em possíveis ausências de postos de trabalho (CAMPOS, 2014, p. 19).

No estado mineiro, a produção canavieira é uma das mais destacadas atividades

econômicas, que insere o estado no cenário nacional. Essa é a agricultura que vem sofrendo

modificações no decorrer dos anos, territorializando-se com novas técnicas e processos de

produção, e cada vez mais utiliza maiores extensões de terras para a monocultura,

Page 45: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

45

desterritorializa o camponês e o agricultor familiar, transforma os modos de vida e

homogeneíza a paisagem.

Dentre as principais frentes de atuação dos movimentos que lutam pela reforma

agrária, no estado de Minas Gerais as ocupações de terras se mantêm como estratégia mais

comum de ação e pressão contra as grandes propriedades e a exclusão. Aliado às ocupações,

as manifestações da luta pela terra também adquiriram fundamental importância no processo.

Dentre os principais movimentos sociais atuantes na luta pelo acesso à terra, o MST

expressa claramente o contexto de confronto e resistência. O MST usa as mais diferentes formas de luta, que vão desde caminhadas, passeatas, longas marchas, manifestações na cidade, audiências coletivas, ocupações de terra e de prédios públicos. Não temos uma única forma de luta, pois desde que sejam massivas podem ter eficácia. O que temos notado é que as formas mais eficazes têm sido as ocupações de latifúndios e dos prédios do Incra, quando a burocracia interna do órgão emperra as desapropriações ou a liberação de dinheiro. Tanto que só vem a público que eles não estão liberando o dinheiro, ou que tal desapropriação está parada, quando ocupamos o Incra. [...] Acontece que tratamos com problemas reais, pois o pessoal precisa de dinheiro para fazer a plantação. Então, temos que utilizar todas as formas de pressão para garantir que o governo de fato acelere essas medidas (STÉDILE, 1997, p. 88).

São as estratégias de ação dos movimentos sociais do campo que mantêm a reforma

agrária em pauta de discussão. As ocupações de terras e manifestações apontam os principais

problemas que exigem imediatas soluções, como por exemplo a demora da assistência técnica

e o assentamento de famílias.

Em suas análises da luta pela terra promovida pelo MST, Fernandes destaca que A ocupação, como forma de luta e acesso à terra, não é um fato novo, é um contínuo na história do campesinato brasileiro. Desde o princípio de sua formação, os camponeses em seu processo de criação e recriação ocuparam terra. A ocupação tem sido historicamente seu principal meio de acesso à terra. Estima-se que perto de 85% dos assentamentos no Brasil foram criados a partir de ocupações de terra. Nas últimas duas décadas ocorreram ocupações em quase todos os estados do Brasil (FERNANDES, 2010, p. 174).

A ocupação é a forma mais importante de luta contra a concentração fundiária e de

acesso à terra, além de pressionar o governo para que efetive a distribuição de terras, tornando

viável a reforma agrária. Estas estratégias demonstram que o desenvolvimento do capitalismo

não conseguiu extinguir o campesinato, mas sim deu força para os movimentos sociais se

fortalecerem e se organizarem contra o sistema a partir de suas fragilidades. São essas ações

que fazem compreender as formas de resistência frente aos processos de expropriação e

Page 46: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

46

exclusão. Como bem afirma o autor, é visível a disputa política por projetos de

desenvolvimento rural.

E quanto à segunda forma de atuação, tão importante quanto a ocupação,

Além das ocupações de terra, o MST tem organizado marchas, ocupações de prédios públicos, greves de fome, passeatas e manifestações em frente às agências públicas e bancárias. Esses atos intensificam as lutas e aumentam o poder de pressão dos trabalhadores nas negociações com os diferentes órgãos do governo. Para o MST, a mobilização pela terra é uma luta popular heterogênea, construída na práxis (FERNANDES, 2010, p. 180).

O modo de atuação na luta pela terra se baseia, então, nessas principais frentes. A

ocupação da terra concretiza a territorialização do movimento quando resulta no

assentamento. As manifestações buscam agilizar o processo, seja na desapropriação da terra

ocupada, seja no atendimento às demandas dos assentados, que necessitam do apoio técnico

para sua produção e reprodução.

Tabela 1: Minas Gerais - Número de ocupações por mesorregiões, 1990-2012

MESORREGIÕES Nº DE OCUPAÇÕES N° DE FAMÍLIAS Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba 231 22.970

Norte de Minas 184 16.558 Noroeste de Minas 109 10.254 Vale do Rio Doce 51 7.231

Jequitinhonha 31 3.412 Metropolitana de Belo Horizonte 30 3.866

Sul/Sudoeste de Minas 16 1.361 Vale do Mucuri 7 1.003 Oeste de Minas 6 455 Central Mineira 4 160 Zona da Mata 3 117

N.I. 1 40 * Não identificado o município da ocupação. Fonte: DATALUTA, 2013. Org.: VICTOR, F. B., 2014.

Conforme a tabela, as mesorregiões Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, Norte de

Minas e Noroeste de Minas concentram o maior número de ocupações no estado, totalizando

524 ações com a participação de 49.782 famílias, ou seja, 78% das ações em todo o estado

nesse período da pesquisa. Isso se explica devido à estrutura fundiária dessas regiões, com a

terra concentrada para o agronegócio, em contraposição à agricultura familiar. O mapa 1

representa a espacialização das ocupações de terra no estado mineiro.

Page 47: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

47

Mapa 1: Minas Gerais, ocupações por município, 1990-2012

Fonte: Relatório DATALUTA 2012. Org. FREITAS, R. L., 2013.

Conforme observado no mapa, o número de ocupações de terras é diretamente

proporcional ao índice de concentração da estrutura fundiária, neste caso considerando a

escala da mesorregião. Segundo os estudos de Freitas (2013),

As mesorregiões que apresentam maiores concentrações de terras são: Norte de Minas (microrregiões de Januária, Janaúba, Pirapora, Grão Mogol, Salinas e Bocaiuva); Noroeste de Minas (a concentração da propriedade é forte na microrregião de Paracatu); Vale do Jequitinhonha (microrregiões de Diamantina e Capelinha); região Metropolitana de Belo Horizonte (Sete Lagoas e Belo Horizonte); Vale do Mucuri (Teófilo Otoni) e Central Mineira (Curvelo) (FREITAS, 2013, p. 60).

Segundo o autor, o Índice de Gini5 nessas microrregiões apresentam concentrações

que variam entre 0,701 a 0,900, revelando então altos valores. Entendendo que os

5 Índice de Gini é um indicador utilizado para medir os níveis de desigualdade na distribuição de terras, consistindo em um número de 0 a 1, quanto mais próximo de 1, mais concentrada é a terra.

Page 48: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

48

movimentos promovem as ocupações em regiões que possuem terras concentradas, justifica-

se dessa maneira o destaque das referidas mesorregiões. O Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba,

possui a economia fortemente influenciada pelo agronegócio, por exemplo, na produção da

cana-de-açúcar, como indicado acima, conformada então como palco de luta por meio das

ocupações de terras. O contexto das ocupações de terras também pode ser analisado a partir

dos registros anuais, conforme o Gráfico 3, o que permite do mesmo modo entender a atuação

dos movimentos de luta pela terra por período de governo.

Gráfico 3: Minas Gerais - Número de ocupações de terras por ano, 1990-2012

20

24 4

8

31

17

65

58

19

58

39

61

55

49

57

47

17

2723

1614

0

10

20

30

40

50

60

70

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

Fonte: DATALUTA, 2013. Org. VICTOR, F. B., 2013.

O gráfico revela que a luta pela terra no estado mineiro, representada aqui pelas

ocupações de terras, foi intensificada a partir de 1996, no início do Governo Fernando

Henrique Cardoso, permanecendo num patamar elevado diante os demais anos até 2007, e

perfez nesse período 556 ações e 81% do total de 688 ocupações de terras no estado. Destaca-

se os municípios de Uberlândia, mesorregião Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, e Unaí,

Noroeste de Minas, com os maiores registros de ocupações de terras no estado, 53 e 32,

respectivamente, no total do período pesquisado. Dentre os movimentos atuantes, o MST é o

de maior representatividade no estado mineiro. Com essas ocupações referentes ao período de

FHC e a pressão dos movimentos sociais, foi efetivado considerável número de

assentamentos rurais, o que será mais detalhado nas páginas seguintes.

Page 49: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

49

Lembrando que os anos de 1995 e 1996 são emblemáticos na luta pela terra, em que

ocorreram o Massacre de Corumbiara6 (Rondônia) e o Massacre de Eldorado dos Carajás7 (sul

do Pará), respectivamente, e resultou no assassinato de dezenas de camponeses e

trabalhadores sem-terra que lutavam nessas regiões. Esses dois atos violentos foram fatores

decisivos que levaram os movimentos sociais a permanecerem e intensificarem as

mobilizações pela reforma agrária em todo território nacional, inclusive em Minas Gerais. Em

contrapartida, o Governo continuou respondendo com violência.

Outra medida da gestão federal nas mãos do Governo FHC foi a criação da Reforma

Agrária de Mercado, apoiado financeiramente pelo Banco Mundial, uma estratégia para

controlar as pressões e os movimentos sociais, que tornou a terra produto a ser comercializado

através de financiamentos, aprofundando ainda mais o modelo neoliberal e reduzindo o papel

do Estado. Esse modelo de reforma agrária é regido pelas regras do mercado8.

Nos mandatos seguintes, do Governo Lula (2003-2010), as ocupações foram mantidas

na estratégia da luta, acompanhando o índice em nível nacional. O governo sustentou os

incentivos ao agronegócio perante vultosos financiamentos, e à contramão do

desenvolvimento social, foram pouco significativas as políticas voltadas para atender as

demandas dos sujeitos do campo.

Entendendo que o assentamento rural é a territorialização da luta pela terra e dos

movimentos sociais, é analisado o contexto dos assentamentos rurais em Minas Gerais. No

período 1986-2012 estudado pelo DATALUTA, foram criados 391 assentamentos, conforme

ilustra o gráfico a seguir.

6 Mesquita (2002) traz estudos aprofundados quanto ao crime de Corumbiara. 7 Ver Eric Nepomuceno (2007). 8 Sobre a Reforma Agrária de Mercado em Minas Gerais, ver SILVA (2011) e FREITAS (2013).

Page 50: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

50

Gráfico 4: Minas Gerais - Assentamentos rurais criados por ano, 1986-2012

4 3 3 30

48

0 1

9

26

3431 30

27

13 13

7

15

71

13

23

5

22

12

6 8

0

10

20

30

40

50

60

70

80

1986

1987

1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

Fonte: INCRA/DATALUTA, 2013. Org. VICTOR, F. B., 2013.

Desse total, é possível compreender a criação dos assentamentos rurais por gestão

federal, a partir do Governo Sarney até o presente, elaborando assim um comparativo das

ações do Estado frente à pressão política promovida na luta pela reforma agrária, conforme

apresento no quadro abaixo.

Quadro 3: Minas Gerais - Assentamentos rurais criados por período de Governo

GOVERNOS PROJETOS CRIADOS FAMÍLIAS ASSENTADAS ÁREA (ha) SARNEY (1986-1989) 13 1.075 77.462

COLLOR-ITAMAR (1990-1994) 13 729 33.599 FHC-1 (1995-1998) 100 5.739 272.586 FHC-2 (1999-2002) 83 4.319 267.349

LULA-1 (2003-2006) 106 4.679 221.398 LULA-2 (2007-2010) 62 2.412 105.159 DILMA (2011-2012) 14 623 43.510

TOTAL 391 19.576 1.021.063 Fonte: INCRA/DATALUTA, 2013. Org. VICTOR, F. B., 2013.

Dentre as formas de obtenção de terras, em Minas são identificadas a desapropriação

(78%), reconhecimento (14%), compra (6%), doação (1,5%) e transferência (0,5%). A

desapropriação é a principal forma defendida pelos movimentos que atuam na luta em todo

território nacional, entendendo-a como instrumento que de fato altera a estrutura de

concentração da terra. A tabela a seguir ilustra as formas de obtenção registradas no estado.

Page 51: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

51

Tabela 2: Minas Gerais - Formas de obtenção dos assentamentos rurais, 1986-2012

Políticas de obtenção Assentamentos Famílias Área Desapropriação 305 15.615 807.271 Reconhecimento 54 1.952 147.221

Compra 24 1.174 38.887 Doação 6 800 27.240

Transferência 2 35 444 FONTE: INCRA/DATALUTA, 2013. Org.: VICTOR, F. B., 2014.

O reconhecimento como a segunda forma de obtenção de terras em Minas Gerais se

refere principalmente ao tipo PRB, registrados nas mesorregiões Jequitinhonha, Norte de

Minas e Vale do Rio Doce. Resultam principalmente da construção de hidrelétricas que

alagam extensas áreas e expulsam populações de suas propriedades, e um exemplo são as

áreas de remanescentes quilombolas. Entretanto, essa forma de obtenção não altera a estrutura

fundiária, pois essas populações desalojadas são realocadas em outras áreas de domínio da

União (FREITAS, 2013). O mapa 2 traz a espacialização da luta pela terra representada pelos

assentamentos rurais.

Mapa 2: Minas Gerais - Assentamentos rurais por município, 1986-2012

Fonte: Relatório DATALUTA 2012. Org. FREITAS, R. L., 2013.

Page 52: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

52

Nota-se que nas mesorregiões que concentram as ocupações de terras, conforme o

primeiro mapa aqui apresentado, é também onde foram criados o maior número de

assentamentos rurais, conformando assim a ideia de que a ocupação é de fato uma eficaz

estratégia na luta pela reforma agrária. Com base nos dados do INCRA, em números as

mesorregiões Noroeste de Minas, Norte de Minas e Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba somam

306 (78%) do total de assentamentos rurais mineiros, com 16.615 (84%) famílias assentadas e

uma área de 887.129 ha (86%), corroborando assim com a representação cartográfica.

Já para os registros das manifestações em Minas Gerais, apresentamos a Tabela 5 e o

Gráfico 4.

Tabela 3: Minas Gerais - Manifestações por mesorregião, 2000-2012

MESORREGIÕES N° DE MANIFESTAÇÕES Nº DE PESSOAS Metropolitana de Belo Horizonte 208 81.977

Norte de Minas 83 81.569 Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba 74 41.239

Zona da Mata 59 42.460 Vale do Rio Doce 42 26.125

Jequitinhonha 29 15.410 Noroeste de Minas 26 8.350

Vale do Mucuri 8 25.470 Sul/Sudoeste de Minas 7 2.344

Central Mineira 3 1.130 Oeste de Minas 3 3.280

N.I.* 3 720 Campo das Vertentes 2 300

* Não identificado o município de ocorrência. Fonte: DATALUTA, 2013. Org.: VICTOR, F. B., 2014.

No período em análise no estado de Minas Gerais foram registradas 547

manifestações, com a participação de 330.374 pessoas que vivenciam a realidade do campo.

Como bem demonstrado, a mesorregião Metropolitana de Belo Horizonte concentra 38% do

total de ações do período, registrando 208 manifestações. As regiões Norte de Minas e

Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba também apresentam número expressivo no registro de

ações, destacando-as assim como na análise das ocupações de terras, demonstrando desse

modo a atuação dos movimentos sociais. O gráfico seguinte ilustra o registro de

manifestações e o número de pessoas participantes.

Page 53: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

53

Gráfico 5: Minas Gerais - Relação do número de manifestações e pessoas envolvidas,

2000-2012

7.249

31.160

24.78027.880

35.190

16.506 16.963

33.270

19.550 19.033

24.983

45.165

28.645

20

34

1622

55

34

25

44

20

33

64

80

100

0

5.000

10.000

15.000

20.000

25.000

30.000

35.000

40.000

45.000

50.000

0

20

40

60

80

100

120

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

Nº d

e pe

ssoa

s

Nº d

e m

anife

staç

ões

Nº DE FAMÍLIAS Nº DE MANIFESTAÇÕES

Fonte: DATALUTA, 2013. Org.: VICTOR, F. B. 2014.

A principal justificativa para a concentração de ações na região Metropolitana de Belo

Horizonte é quanto à localização dos órgãos públicos com sedes na capital mineira, como por

exemplo, INCRA-MG, Governo Estadual e Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Estes

órgãos oficiais e seus representantes são os principais envolvidos nas negociações e

audiências reivindicadas pelos movimentos, que ocorrem na capital do Estado. A luta pela

terra representada pelas manifestações é espacializada no seguinte mapa.

Page 54: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

54

Mapa 3: Minas Gerais - Manifestações por município, 2000-2012

Fonte: Relatório DATALUTA 2012. Org. FREITAS, R. L., 2013.

Tendo a ocupação de terras como a principal estratégia de luta, soma-se mais um

elemento fundamental que são as manifestações. Além de reivindicar a terra de trabalho, os

movimentos e seus integrantes, ao saírem às ruas em marchas, passeatas, bloqueios, buscam a

visibilidade da sociedade, exigem seus direitos na assistência aos assentamentos, nos incentivos

governamentais voltados para a agricultura familiar e produção de alimentos à população,

denunciam as violências cometidas contra os que se engendram na luta pela reforma agrária.

Se a capital mineira é o principal palco de ações, as regiões controladas

territorialmente pelo agronegócio, como o Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, também são

expressivas. No conflito contra o modelo agrícola vigente, as estratégias são a ocupação e a

manifestação, tendo a mídia como principal veículo de informações. Essas ações são

promovidas nas cidades, visto como espaço dinâmico onde praticamente todas as atividades

acontecem, sejam econômicas, políticas e culturais, e é nesse espaço que se obtém a

visibilidade necessária.

Page 55: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

55

Além disso, o que se tem atualmente é a união dos diferentes movimentos que lutam

por seus direitos, sejam eles urbanos ou do campo. O ano de 2013 é emblemático no

entendimento, relembrando os diversos atos promovidos em todo território nacional. As ações

envolveram movimentos que lutam por reformas urbana, agrária e políticas, em atos que

unificaram a voz dos que desejam e lutam por melhores condições de trabalho e vida. O que

repercutiu foram reivindicações por moradias, salários, educação, saúde, segurança, e isso

demonstrou que a responsabilidade da população é significativa em busca de mudanças

sociais, e a força política e de mobilização desses grupos não deve ser desconsiderada.

Page 56: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

56

3. DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: as manifestações e suas variadas

formas

Neste capítulo, procuramos desenvolver uma análise das manifestações a partir da

tipologia elaborada pelas pesquisas DATALUTA e CPT. Primeiramente, abordamos os

principais tipos de estratégias de ação no estado de Minas Gerais, baseados também na

espacialização de cada tipo por meio das representações cartográficas.

Os conteúdos materializados pelos movimentos dizem respeito ao teor de cada

manifestação, trazendo as reivindicações que pautam as ações e a quem são direcionadas. E

finalizando esta abordagem, é debatido o modo como os fatos são divulgados à sociedade pela

mídia e como esta influencia a opinião pública.

3.1. Os tipos de manifestações promovidas pelos movimentos sociais

Além da análise das manifestações como importante dimensão da luta pela terra no

estado de Minas Gerais, torna-se fundamental então o estudo dos tipos de manifestação,

buscando construir uma tipologia. A pretensão aqui é qualificar essas ações, com vistas a

entender o onde, como e o quê envolve o fenômeno.

Um trabalho de referência foi elaborado por Pereira (2012), que também compôs a

Rede DATALUTA, e teve como proposta o Estudo sobre os tipos de manifestações no campo

paulista no período 2000-2011. A partir de sua pesquisa, o autor empreendeu uma análise dos

tipos de manifestações do campo na luta pela e na terra, com base nos registros da CPT para o

estado de São Paulo, considerando a importância das manifestações como um elemento da

luta pela terra no bojo da questão agrária brasileira.

Em Minas Gerais, segundo a metodologia DATALUTA, são identificados os seguintes

tipos de manifestações: ocupação de prédio público, marcha, romaria, grito dos excluídos,

formação de acampamento, ocupação de prédio privado, bloqueio de rodovia, eventos, greve,

protestos, destruição de acampamento, reintegração de posse, expulsão e caminhada. Tais

definições foram atribuídas no início da sistematização dos dados referentes às manifestações,

e que ao longo do tempo foram percebidos outros tipos, tais como audiência pública e

bloqueio de avenida.

Isso se dá diante os fatores encontrados pelos próprios movimentos, que notam a

necessidade de incorporar novas estratégias de ação. Se anteriormente promoviam bloqueios

de rodovias, principalmente devido ao acampamento se encontrar nas margens dessa

Page 57: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

57

localização, agora também as vias urbanas são interditadas, visando assim uma maior

visibilidade.

De acordo com a metodologia da CPT, além das ações que envolvem propriamente a

questão da terra, a instituição considera os atos em favor da questão da água, do meio

ambiente ou assuntos específicos a alguma empresa ou questões trabalhistas (Quadro 4).

Desse modo, o levantamento da pastoral contempla as distintas dimensões da questão agrária,

e por isso neste trabalho, como já afirmado anteriormente, é fonte de dados.

Quadro 4: Tipos de manifestações identificados pela CPT

TIPOS DE MANIFESTAÇÕES ABRAÇO MANIFESTO

ACAMPAMENTO MARCHA AUDIÊNCIA MUTIRÃO BLOQUEIO OCUPAÇÃO DE AGÊNCIA BANCÁRIA

BLOQUEIO DE RODOVIA OCUPAÇÃO DE PRÉDIO PRIVADO CAMINHADA OCUPAÇÃO DE PRÉDIO PÚBLICO

CELEBRAÇÃO RELIGIOSA PANFLETAGEM CERCO A CONSTRUÇÕES PEDIDO DE DEMISSÃO

CONCENTRAÇÃO EM ESPAÇO PÚBLICO RETENÇÃO DE VEÍCULO ENCONTRO ROMARIA

GREVE DE FOME TEMÁTICA GREVE DE SEDE VIGÍLIA

FONTE: Base de dados CPT, 2013. Org.: VICTOR, F. B., 2014.

Conforme o quadro, no período de 2000 a 2012 em Minas Gerais foi identificado 24

tipos de manifestações envolvendo movimentos sociais que tem o campo como moradia e

trabalho. Uns mais expressivos, outros referentes a determinado evento, mas todos utilizados

para contestar e questionar o modelo de desenvolvimento até agora imposto à população,

buscando assim a possível e necessária mudança social.

Ao analisar as práticas contestadoras dos movimentos agrários no início do século

XXI, entendidas como manifestações questionadoras com potencialidade transformadora,

Feliciano (2009) afirma que

As formas encontradas pelos movimentos agrários para externalizar à sociedade suas reivindicações são diversas e criativas. O tipo de reivindicação pode definir de antemão qual a melhor maneira de contestar e sensibilizar tanto a população, como a mídia e o Estado (FELICIANO, 2009, p. 133).

Page 58: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

58

Nos casos em que ocorrem ocupações de agências bancárias, dentre os tipos

identificados pela CPT, as principais reivindicações são, por exemplo, por créditos aos

assentados ou renegociação de dívidas, e assim o banco é o principal alvo de interesse das

manifestações. Isso demonstra que o que é reivindicado determina como será realizada a ação.

Uma manifestação é uma ação antes de tudo pensada e organizada, com fins bem

determinados.

Prossegue o autor, ao exemplificar com tipos de manifestações mais originais e

emblemáticos, estratégicos para escapar de artifícios jurídicos ou administrativos capazes de

impedir os efeitos desejados.

Por exemplo, greve de fome, vigílias, jejum, celebrações religiosas, cerco/abraço a órgãos públicos, etc. Ou seja, ocupar em uma perspectiva simbólica de sensibilizar uma luta, que, muitas vezes, é interpretada como passível de ações radicais e desordeiras (FELICIANO, 2009, p. 133).

É nessa diversidade de ações que entendemos, do mesmo modo, a diversidade de

exigências e contestações que se colocam em pauta política pelos movimentos sociais. Os

diferentes tipos de manifestações revelam a realidade social que exige profundas

transformações, com vistas a tomar a maior visibilidade e sensibilidade possível da sociedade.

Em Minas Gerais, a partir do banco de dados DATALUTA, são sistematizados os

tipos de manifestações a fim de estabelecer as principais ações promovidas no estado, bem

como as regiões ou municípios em que são realizadas.

Page 59: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

59

Tabela 4: Minas Gerais - Tipos de manifestações, 2000-2012

Tipo Nº de Manifestações Nº de Pessoas Concentração em espaço público 150 38.265

Ocupação de prédio público 65 23.854 Bloqueio de rodovia 63 20.202

Temática 47 31.410 Caminhada 40 16.295

Marcha 34 16.250 Acampamento 23 8.267

Romaria 16 151.050 Ocupação de prédio privado 10 2.510

Ocupação de agência bancária 9 1.440 Cerco a construções 8 1.760

Audiência 7 815 Encontro 7 2.060

Celebração religiosa 5 1.300 Manifesto 5 2.380

Vigília 4 3.250 Abraço 2 3.600

Greve de fome 2 38 Greve de sede 1 2

Mutirão 1 150 Panfletagem 1 NI

Pedido de demissão 1 2 Retenção de veículos 1 250

Saque 1 50 Outros 44 5.174

Nota: O tipo Outros indica ações em que não foram identificados o local ou o tipo da manifestação. Fonte: Base de dados CPT, 2013. Org.: VICTOR, F. B. 2014.

São apresentados na tabela todos os tipos de manifestações identificados no estado de

Minas Gerais, com a quantidade e o número de participantes. Serão tratados neste trabalho

especificamente os dez tipos mais frequentes segundo a classificação elaborada acima, sendo

estas as estratégias mais utilizadas pelos movimentos sociais.

As manifestações identificadas como concentração em espaço público, ocupação de

prédio público e bloqueio de rodovia, juntas, somam 51% do total de ações promovidas no

estado mineiro, conforme o levantamento da CPT. Destes, 27% se trata de concentração em

espaço público, sendo desse modo o tipo mais utilizado pelos movimentos sociais na tentativa

de levar o problema ao conhecimento da população e pressionar o Estado.

Page 60: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

60

Feliciano (2009) aponta que no início do século XXI, as principais formas de

manifestação dos movimentos agrários brasileiros foram as concentrações e manifestações em

espaços públicos, a partir de

atos, paradas, gritos, levantes, protestos, comemorações, os quais tiveram a finalidade de agregar, sobretudo em espaços públicos, uma concentração de pessoas para debates, esclarecer, reivindicar e conscientizar outras, que estão de passagem, sobre questões que direta ou indiretamente afetam ou podem afetar a vida de grande parte da população (FELICIANO, 2009, p. 138-139).

Pressão e mobilização são dois elementos chave para os movimentos sociais

continuarem a luta pelos seus ideais, aliás, fundamentais nas conquistas e mudanças. A

pressão se dá pelas constantes ações promovidas dia a dia, no campo e na cidade, e demonstra

a força política das organizações mantendo o assunto em discussão, fazendo do Estado o

principal alvo. A mobilização é compreendida por meio da participação significativa de

pessoas com um objetivo comum que se engendram nos atos públicos e no embate contra a

desigualdade, e fazem principalmente a população participar desse contexto. À medida que a

sociedade percebe a existência dos problemas colocados a partir desses atos públicos, de um

grupo que decidiu lutar e resistir, espera-se a disseminação de uma conscientização coletiva.

Seguindo a ordem colocada, primeiramente explicaremos o tipo de ação envolvendo a

concentração em espaço público. Esta se refere a ações promovidas em diferentes e variadas

localidades contidas também de reivindicações distintas, na pretensão de reunir expressivo

número de pessoas com vistas ao objetivo comum. Acontecem em frente a órgãos

governamentais, empresas públicas ou particulares, praças e avenidas, não apresentando desse

modo um local específico. São exemplos dessa forma de ação no estado mineiro, conforme a

base de dados, ato contra a impunidade na Chacina de Unaí (2004, 2006, 2007, 2008 e 2010),

pela desapropriação da Fazenda Tangará (Uberlândia-MG, 2001); ato contra a poluição do

Rio São Francisco (2009), e em oposição ao agronegócio (2010); protesto por segurança e

reforma agrária (2009), protesto contra o Massacre de Felisburgo (2004 e 2012), entre outros.

É no espaço público que se obtém maior notoriedade da sociedade, e da mídia especialmente,

sendo que nele ocorre maior circulação de pessoas e bens com uma dinâmica que, se alterada,

atinge a todos. O Mapa 4 representa a espacialização das concentrações em espaço público.

Page 61: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

61

Mapa 4: Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Concentração em espaço público,

2000-2012

Fonte: DATALUTA/CPT, 2013. Org.: FREITAS, R. L.; VICTOR, F. B., 2014.

O segundo tipo mais utilizado nas manifestações é a ocupação de prédio público. De

acordo com Comerford (1999), é nas capitais dos estados que a maioria das ocupações é

realizada. Há também ocupações em centros regionais de regiões marcadas por lutas de trabalhadores rurais, ou nas sedes dos municípios onde há assentamentos ou acampamentos. De qualquer forma, as ocupações de órgãos públicos, situados na capital do Estado ou na sede dos municípios, envolvem sempre o deslocamento de um grupo relativamente grande de trabalhadores da zona rural para a cidade (COMERFORD, 1999, p. 131).

Em Minas Gerais, foram registradas ocupações em prédios do INCRA (2000, 2001,

2006, 2011), prefeituras municipais (2002, 2005, 2010), Assembleia Legislativa (2011),

Ministério Público (2012), Universidade Federal (Viçosa-MG, 2007), prédio da Receita

Federal (2005), entre outros. Esta ação se caracteriza pela ocupação, que normalmente dura

Page 62: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

62

um ou poucos dias, de órgãos representativos quanto ao assunto reivindicado, por exemplo, o

INCRA, responsável pelo assentamento das famílias e a assistência aos assentados, e pela

desapropriação de áreas; prefeitura municipal, comumente responsável pela aquisição de

alimentos da agricultura familiar em parceria com o Governo Federal9; câmara legislativa,

uma vez que vereadores e deputados devem ser também os representantes da população e de

seus interesses, para os quais são reivindicadas as políticas públicas. Nestas ocupações,

representadas pelo Mapa 5, muitas vezes o objetivo dos manifestantes é promover uma

reunião com os representantes dos órgãos públicos, a fim de definir soluções aos problemas

colocados num processo de negociação, e neste caso com a reunião realizada ou agendada,

finaliza-se a manifestação.

Mapa 5: Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Ocupação de prédio público,

2000-2012

Fonte: DATALUTA/CPT, 2013. Org.: FREITAS, R. L.; VICTOR, F. B., 2014.

9 Como acontece no município de Uberlândia, Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, em que a prefeitura fornece alimentos às instituições filantrópicas e escolas de educação básica do município, a partir dos programas de Aquisição de Alimentos - PAA e de Alimentação Escolar - PMAE. Disponível em <http://www.uberlandia.mg.gov.br/?pagina=secretariasOrgaos&s=30&pg=2070>. Acesso em jul. 2014.

Page 63: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

63

Representando 12% do total de ações no estado mineiro, o bloqueio de rodovia se

configura como fundamental estratégia. Trata-se de uma forma de protesto com intuito de

interditar a passagem de pessoas e veículos, seja em rodovias estaduais ou federais,

especialmente nas vias de maior fluxo. É um importante modo de adquirir visibilidade,

sobretudo pela mídia, uma vez que modifica a dinâmica do local onde se realiza a ação, como

por exemplo, impedindo a passagem de pessoas, produtos e serviços. Os movimentos não

objetivam, com isso, causar problemas à população, por isso observamos que estas ações

duram poucas horas. Há de se destacar que dentre este tipo configura-se também os bloqueios

de avenida, que têm o mesmo objetivo, porém concentram-se nas cidades, em especial nos

locais de intenso movimento. Normalmente nestes bloqueios os manifestantes esclarecem por

meio de panfletos quais as causas e reivindicações que motivam a determinada ação.

O Mapa 6 representa os locais onde se concentram os bloqueios de rodovia, indicados

principalmente nas mesorregiões Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, com destaque para o

município de Uberlândia, interligado por importantes rodovias estaduais e federais; Norte de

Minas Gerais, Metropolitana de Belo Horizonte e Vale do Mucuri.

Mapa 6: Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Bloqueio de rodovia, 2000-2012

Fonte: DATALUTA/CPT, 2013. Org.: FREITAS, R. L.; VICTOR, F. B., 2014.

Page 64: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

64

A manifestação do tipo temática, representada do Mapa 7, totaliza 47 ações no estado,

sendo o terceiro tipo mais expressivo no número de pessoas, com 31.410 participantes. Trata-

se de ações correspondentes à pauta dos movimentos definida previamente, tais como o Dia

do Trabalhador Rural, Grito da Terra Brasil, Dia Internacional dos Atingidos por Barragem,

Jornada Nacional de Luta, Dia Internacional da Mulher, entre outros. Conforme Pereira

(2011, p. 60), o objetivo dessas ações é mostrar à sociedade e ao governo a pauta nacional do

movimento.

Mapa 7: Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Temática, 2000-2012

Fonte: DATALUTA/CPT, 2013. Org.: FREITAS, R. L.; VICTOR, F. B., 2014.

Podemos agrupar os tipos caminhada, marcha e romaria por se constituírem de

manifestações em movimento que percorrem distâncias predeterminadas, seja dentro de um

município ou entre municípios, num processo que busca o diálogo com a população por onde

o movimento percorre. Conforme a pesquisa DATALUTA, a marcha difere da caminhada

Page 65: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

65

segundo a distância percorrida, sendo aquela definida para percursos mais longos. Exemplo

recente, registramos uma marcha com a participação de dez mil pessoas pelas ruas de Brasília

que marcou o encerramento do Encontro Nacional Unitário dos Trabalhadores e

Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas10. Para Fernandes,

A marcha é uma necessidade para expandir as possibilidades de negociação, para gerar novos fatos. Em seus ensinamentos e aprendizados, por meio de suas experiências, os sem-terra tiveram diversas referências históricas. Alguns exemplos utilizados na mística do Movimento são: a caminhada do Povo Hebreu rumo à terra prometida, na luta contra a escravidão no Egito; a caminhada de Gandhi e dos hindus rumo ao mar, na luta contra o imperialismo inglês; as marchas das revoluções mexicana e chinesa entre outras (FERNANDES, 2000, p. 79).

O processo de caminhada ou marcha sempre esteve presente na história dos diferentes

povos, que lutaram por seus direitos e pelo que acreditavam, e são nestes exemplos que os

movimentos se inspiram para criar as estratégias de ação, instituindo espaços políticos de

diálogos, denúncias e reivindicações.

A romaria diz respeito a ações mais específicas, como a Romaria das Águas e da

Terra e Romaria da Juventude, de cunho mais religioso. Quanto a este tipo, Comerford (1999)

afirma que A Igreja Católica vem promovendo, há anos, em vários Estados, caminhadas envolvendo grande número de trabalhadores rurais representando comunidades rurais do Estado em que se realiza o evento, chamadas “Romarias da Terra”, que terminam em concentrações e celebrações religiosas em locais estrategicamente escolhidos, que são marcados como locais especialmente significativos para a “luta pela terra”. Por outro lado, organizações como o MST têm promovido caminhadas de grupos de trabalhadores rurais, geralmente representando assentados e acampados, vindos de algum ponto de concentração no interior dos Estados, rumo às capitais. Geralmente essas caminhadas alcançam considerável visibilidade, ganhando destaque na imprensa (COMERFORD, 1999, p. 128).

Não por acaso que o maior número de pessoas envolvidas é registrado para o tipo

romaria, representando significativa participação e organização dos movimentos sociais e

pastorais da igreja ligadas à luta pela terra, mesmo que esta classificação não seja expressiva

na quantidade de ações no estado mineiro. Por meio do Mapa 8, evidenciamos a

espacialização desse tipo de manifestação. 10 Dados retirados da Declaração do Encontro Nacional Unitário dos Trabalhadores e Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas, disponível em < http://terradedireitos.org.br/2012/08/24/declaracao-do-encontro-nacional-unitario-dos-trabalhadores-e-trabalhadoras-e-povos-do-campo-das-aguas-e-das-florestas/>. Acesso em jul. 2014.

Page 66: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

66

Mapa 8: Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Caminhada, marcha e romaria,

2000-2012

Fonte: DATALUTA/CPT, 2013. Org.: FREITAS, R. L.; VICTOR, F. B., 2014.

O tipo acampamento, que representa 23 registros com a participação de 8.267 pessoas,

difere do acampamento formado após uma ocupação de terra, onde as famílias resistem para

conquistar o assentamento. Este tipo de manifestação, representado pelo Mapa 9, consiste na

formação de acampamento em espaços públicos ou em frente a órgãos governamentais e

empresas privadas nas cidades, por um curto período determinado pelo movimento, a fim de

pressionar as instituições e o poder público. Conforme o mapa, o município de Belo

Horizonte concentra o maior número de ações.

Um exemplo de acampamento foi registrado em 2012 pela equipe DATALUTA-MG,

no município de Uberaba, em que devido a uma reintegração de posse, 100 pessoas do MST

ficaram acampadas na Praça Pio XXII aguardando um posicionamento do INCRA.

Page 67: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

67

Mapa 9: Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Acampamento, 2000-2012

Fonte: DATALUTA/CPT, 2013. Org.: FREITAS, R. L.; VICTOR, F. B., 2014.

Outro exemplo de formação de acampamento foi tratado pelo MAB, noticiando em

2011 que Cerca de 50 famílias atingidas pelas barragens de Emboque e Granada, construídas na cidade de Abre Campo na Zona da Mata de Minas Gerais, começaram nesta terça-feira (20) um acampamento para denunciar a violação de direitos humanos na construção de barragens e reivindicar da empresa e do governo os direitos violados. As famílias acampadas reivindicam da empresa canadense Brookfield, responsável pelas duas barragens, o reassentamento das famílias prejudicadas e reativação econômica, social, ambiental e cultural, com projetos estruturantes, principalmente no distrito de Bicuíba, na área ribeirinha de Raul Soares, nas localidades de São Lourenço, Valão e no distrito de Granada. O MAB enviou ofício à empresa solicitando uma reunião e a Brookfield se comprometeu a estar no acampamento na quinta-feira (22) debatendo com os atingidos (MAB, 21/09/2011).

Page 68: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

68

Os atingidos pelas grandes construções da referida empresa privada se uniram num

protesto pelos seus direitos, violados aos serem expropriados. Além de reivindicar terra e o

reassentamento das famílias, exigem também que seja de responsabilidade da empresa a

reestruturação social, econômica, ambiental e cultural dos atingidos a partir de projetos.

Os últimos tipos de manifestação tratados aqui são a ocupação de prédio privado e

ocupação de agência bancária (Mapa 10). Esta classificação tem princípios comuns com o

primeiro tipo, ocupação de prédio público, porém difere quanto ao espaço, se tratando de

empresas privadas e especificamente de agências bancárias. Estas, por sua vez, são as

instituições financiadoras nos processos de créditos para produção aos assentados, e

comumente são alvos de manifestações que visam o refinanciamento de dívidas ou a liberação

de recursos para construção de casas nos assentamentos. Como afirma Pereira (2012, p. 67),

“as ações em agências bancárias são específicas para resolução de problemas financeiros e

tiveram como alvos os bancos estatais: Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal na

grande maioria das vezes”.

Mapa 10: Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Ocupação de agência bancária,

2000-2012

Fonte: DATALUTA/CPT, 2013. Org.: FREITAS, R. L.; VICTOR, F. B., 2014.

Page 69: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

69

Quanto à ocupação de prédio privado (Mapa 11), estes espaços representam os

interesses capitalistas contra os quais os movimentos declaradamente se posicionam. São

corporações que em diversos casos possuem extensas áreas de monoculturas para exportação;

construtoras de grandes projetos nas áreas rurais; ou empresas que causam a degradação

ambiental sem a devida preocupação com os recursos naturais ou com a população local,

configurando-se logo em agentes que compõem o conflito entre os dois modelos de

desenvolvimento.

Mapa 11: Minas Gerais - Tipologia das manifestações – Ocupação de prédio privado,

2000-2012

Fonte: DATALUTA/CPT, 2013. Org.: FREITAS, R. L.; VICTOR, F. B., 2014.

Desse modo, os movimentos definem variadas formas de materializar suas

reivindicações, em diferentes espaços políticos. Conforme Feliciano,

Page 70: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

70

Ao final, pode-se verificar que as reivindicações dos movimentos agrários brasileiros, no início do século XXI, estão direcionadas a duas perspectivas. Uma, para a adoção de políticas de desenvolvimento do campo, baseadas na justiça para a maioria da população: política de combate à pobreza e à fome, política de desenvolvimento do campo, política de reforma agrária, política de regularização de posse, políticas ambientais, políticas aos povos tradicionais, políticas de respeito aos direitos humanos; e outra, contra a adoção de um modelo de desenvolvimento que privilegia interesses de uma restrita parte da população e, em muitos casos, apenas de empresas transnacionais: contra a implantação de barragens, a transposição do rio São Francisco, a privatização das águas, plantio com organismos geneticamente modificados etc. (FELICIANO, 2009, p. 132-133).

As manifestações revelam então os diferentes fatores que inserem os sujeitos no

embate de forças. Fica esclarecido que não se trata apenas de terra, da conquista de uma

fração do território onde será possível a reprodução do modo de vida do campo, mas também

de melhorias sociais, econômicas e culturais. Não é possível à população viver no campo sem

as condições adequadas de moradia e trabalho, e assim percebem que é a partir da ação e da

reação, principalmente coletiva, que a mudança pode acontecer.

Estas manifestações representam importantes instrumentos estratégicos de luta, capacidade de articulação e organização dos movimentos sociais, despertando na população e nos órgãos públicos as discussões sobre o contexto social brasileiro e em especial os problemas e dificuldades no campo. A concentração fundiária, falta de políticas públicas para o meio rural, direitos não atendidos, enfim, um conjunto de fatores que exigem dos movimentos sociais a exposição de suas forças de mobilização por meio das manifestações no processo de luta pela terra. [...] Essas manifestações são oriundas da continuidade das relações conflitantes entre os camponeses, os agentes do agronegócio, antigos latifundiários e capitalistas agrários. E é justamente tornar o conflito público o objetivo central dessas ações (CLEPS JR, et al, 2014, p. 6-7).

As formas pelas quais os movimentos sociais concretizam suas práticas estão

agrupadas em uma ocupação estritamente ligada à luta por um espaço político: ocupar para

parar, nas ocupações de prédios, bancos e em frente a instituições; parar para ocupar, nos

bloqueios de rodovias e avenidas, e andar para parar e ocupar, nas marchas e caminhadas

(FELICIANO, 2009, p. 135). Os espaços para cada tipo de ação não são definidos

aleatoriamente, mas sim pensados a partir de objetivos comuns. Públicos, privados, empresas,

praças, avenidas, rodovias, cada local representa um significado específico ao ser

externalizado nestes o descontentamento com a atenção do Estado a partir das políticas

públicas e com os interesses dominantes.

Page 71: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

71

3.2. Os conteúdos das manifestações e as reivindicações materializadas

Uma das principais formas de visualizarmos os acontecimentos no campo e na cidade

é a partir da veiculação de notícias. Os fatos são divulgados por meio de jornais impressos,

televisivos, internet e outros mais veículos de comunicação, principalmente na

contemporaneidade em que a informação é tão rapidamente disseminada. Assim, cabe

também à investigação acadêmica utilizar desses meios no desenvolvimento das pesquisas,

utilizando-os como fonte de dados.

Dito isso, o banco de dados do Projeto DATALUTA, como já apresentado

anteriormente, reúne um conjunto de meios de comunicação, especialmente online, para

captar os registros referentes à luta pela terra no estado de Minas Gerais, e assim compreender

os conteúdos das ações promovidas por aqueles que estão envolvidos nesse contexto,

principalmente os movimentos sociais.

Uma primeira ilustração quanto às ações pode ser percebida a partir da reportagem do

Jornal O Tempo, versão online, que divulga uma ocupação do prédio do INCRA pelo MST na

capital Belo Horizonte, conforme figura a seguir.

Figura 1: Reportagem Jornal O Tempo

Fonte: Acervo DATALUTA 2012.

Page 72: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

72

Na referida ação, os manifestantes realizaram uma ocupação de prédio público no

município de Belo Horizonte. O protesto integrou uma articulação nacional, denominada de

Abril Vermelho, em que é lembrado o Massacre de Eldorado dos Carajás ocorrido no Pará em

17 de abril de 1996. A mesma reportagem divulga uma liberação de pedágio na Rodovia

Fernão Dias, além do bloqueio de rodovia em São Paulo. Ou seja, são noticiadas as diversas

ações promovidas pelo MST em diferentes estados simultaneamente, em protesto pelo

massacre ocorrido há 16 anos, fato esse que marcou a história da luta pela terra no Brasil.

Outra divulgação da mesma informação foi registrada pelo Portal Centro de

Documentação Eloy Ferreira da Silva - CEDEFES, que apresenta ainda um manifesto dos

trabalhadores rurais do Sul de Minas.

Nós, trabalhadores rurais Sem Terra de Minas Gerais, nesta manhã de 17 de abril, 16 anos após o covarde Massacre em Eldorado dos Carajás, ainda hoje impune, estamos mobilizados em Minas Gerais para garantir os avanços emergenciais de nossa pauta da Reforma Agrária. Em Minas Gerais, sofremos com a violência no campo, a exemplo do Massacre de Felisburgo, que vitimou cinco companheiros, sofremos com a falta de uma política de desenvolvimento dos assentamentos, não temos assistência técnica adequada, moradia, escola saúde etc. Estamos indignados, pois desde 2009 nenhuma família foi assentada em nosso estado. Temos diversos acordos não cumpridos por parte dos governos, como o convênio que permite a imediata desapropriação da antiga usina Ariadnópolis, há 14 anos ocupada por um latifúndio que simboliza o atraso do país e a vergonha de termos uma burguesia agrária que enriqueceu sem pagar os trabalhadores, destruindo a natureza e acumulando dívidas impagáveis com o Estado. Exigimos a imediata posse das fazendas decretadas improdutivas e não cumpridoras da função social, a exemplo da fazenda Fortaleza de Santana, no município de Goiana, Zona da Mata mineira. O MST não vai arredar um passo da decisão de obter conquistas para nosso povo e para sociedade. Sabemos que o estudo e a qualidade de nossa organização são extremamente importantes. Sabemos que a qualidade e a legitimidade de nossas pautas nas negociações são imprescindíveis. Diante da irresponsabilidade dos governos em garantir nosso direitos, nós trabalhadores estamos em luta, pois essa é nossa tarefa nesse momento. O conflito só se encerra com Reforma Agrária!!!! (CEDEFES, 17/04/2012).

Os trabalhadores se mostram organizados e decididos no enfrentamento contra o

latifúndio improdutivo, a violência no campo e a falta de políticas e assistências destinadas

aos assentamentos, determinados em continuar a luta e somente parar quando conquistarem

efetivamente a justa distribuição de terras.

Em outra reportagem da Página do MST, de 06 de setembro de 2011, é divulgada uma

manifestação no município de Montes Claros,

Page 73: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

73

Cerca de 600 pessoas da Via Campesina, juntamente com sindicatos, professores, juventude e Pastorais Sociais, ocuparam a frente da prefeitura de Montes Claros, em Minas Gerais, às 6h, desta segunda-feira (5/9). Com isso, para este mesmo dia conseguiram uma audiência com o prefeito do município de Montes Claros, Tadeu Leite, e o superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Carlos Calazans. Dois pontos centrais nortearam a audiência: a questão das políticas públicas para os assentamentos, principalmente no que se refere à infraestrutura, e a obtenção de novas terras na região (MST, 06/09/2011).

Atenta-se que a ocupação do espaço em frente à prefeitura foi decisiva para a posterior

realização de audiência com o prefeito do município e o representante do INCRA. Mais uma

vez, a questão da assistência aos assentados e a aquisição de terras na região foi a pauta de

discussão. Outro motivo de preocupação dos manifestantes foi a instalação de grandes

empresas de mineração no Norte de Minas, sendo realizada no mesmo dia uma audiência

pública na câmara dos vereadores para debater o assunto. Destacam-se dois pontos

importantes neste exemplo: a ação se caracteriza como conjunta, uma vez que participam

diferentes organizações que almejam objetivos comuns (Via Campesina, sindicatos,

professores), e as conquistas imediatas a partir da manifestação, dentre elas principalmente o

diálogo com as instituições (prefeitura e INCRA) envolvidas no contexto.

A partir de uma ocupação de agência bancária no município de Governador Valadares,

os manifestantes materializam suas reivindicações numa ação articulada na jornada nacional

de lutas que aconteceu em todo território nacional.

Page 74: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

74

Figura 2: Reportagem Página do MST

Fonte: Acervo DATALUTA 2011.

Não há reivindicação por si mesma, mas sim acompanhada da denúncia. Ao se

reivindicar algo, é preciso indicar as causas dos problemas aos quais os manifestantes

demandam soluções. Neste ato, os movimentos reivindicam a renegociação das dívidas da

agricultura familiar, e ao mesmo tempo expõem os privilégios destinados ao sistema agrícola

capitalista representado pelo agronegócio, que recebe diversos recursos financeiros e também

causa a degradação dos recursos naturais, fazendo com que os trabalhadores e camponeses

sintam-se prejudicados. Ressalta-se o espaço definido para o ato, uma agência bancária, por

ser este o órgão financiador de créditos aos pequenos agricultores que se manifestaram.

Exemplo de ocupação de prédio privado, um registro de 2012 relata a ação no

município de Ouro Preto, região Metropolitana de Belo Horizonte.

Page 75: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

75

Figura 3: Reportagem Página do MAB

Fonte: Acervo DATALUTA 2009.

Em ação conjunta entre MAB, MST e Assembleia Popular, os manifestantes

promoveram a ocupação de prédio da empresa privada responsável por usinas hidrelétricas na

região, empreendimento esse que, segundo os movimentos, expropriam centenas de famílias e

causam severos prejuízos ambientais e sociais. Conforme o registro, elencamos quais

reivindicações são colocadas em pauta: indenização para as famílias atingidas pela construção

da usina, título da terra para os que foram reassentados em decorrência de outro

empreendimento, protesto contra projetos previstos para a região da Zona da Mata Mineira.

Juntamente com as reivindicações, são pontuadas denúncias, tais como a geração de energia

para suprir a necessidade de empresas privadas voltadas para exportação, e os indícios de

doenças causadas por resíduos de indústrias da região.

Relembrando oito anos do Massacre de Felisburgo, em Minas Gerais, o site

Radioagencia NP registrou uma manifestação na capital mineira, onde os manifestantes

cobraram a punição dos acusados.

Page 76: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

76

Figura 4: Reportagem Radioagencia NP

Fonte: Acervo DATALUTA 2012.

Neste registro, foi identificado dois atos a partir de um mesmo tema, o Massacre de

Felisburgo. Primeiro, a realização de uma audiência pública na ALMG com a participação de

representantes dos movimentos sociais e de órgãos envolvidos, como a Secretaria de

Regularização Fundiária. Ao tempo que, na Praça Sete em Belo Horizonte, um espaço

público, manifestantes se concentraram exigindo a punição do fazendeiro suspeito de

mandante do crime de Felisburgo, responsável juntamente com outros acusados pelo

assassinato dos trabalhadores rurais. Desse modo, os dois atos denunciam e relembram a

impunidade do crime mesmo passado quase uma década do ocorrido, destacando assim a

lentidão na resolução dos conflitos.

Promovido por mulheres ligadas à Via Campesina, MST, MAB e Movimento dos

Pequenos Agricultores - MPA, foi registrado um bloqueio de rodovia na BR-050 entre os

municípios de Uberlândia e Uberaba, no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba.

A pista ficou bloqueada nos dois sentidos por mais de duas horas, o que provocou um congestionamento de veículos de cerca de seis quilômetros. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) acompanhou o protesto. De acordo com Ana Maria de Lima, uma das integrantes da manifestação, o objetivo da ação é alertar para o uso de agrotóxicos na região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba e também comemorar o Dia Internacional da Mulher (Jornal Correio de Uberlândia, 03/03/2011).

Page 77: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

77

A manifestação foi realizada após o Seminário Estadual da Via Campesina que

ocorreu durante a semana (março/2011), em que as mulheres participaram de palestras sobre a

utilização de agrotóxicos. Uma das manifestantes entrevistadas declara que “após estudar

sobre o agrotóxico, que ainda é muito utilizado na região do Triângulo Mineiro e do Alto

Paranaíba, estamos manifestando em defesa da agricultura, da terra e do meio ambiente”. A

denúncia dos riscos decorrentes da intensiva utilização de defensivos agrícolas também faz

parte das pautas de discussão pelos movimentos sociais. Neste caso são identificados dois

tipos de manifestação, um bloqueio de rodovia e ao mesmo tempo o teor temático do ato, em

comemoração ao Dia Internacional da Mulher, destacando assim a participação ativa das

trabalhadoras e camponesas na luta pela terra.

3.3. O papel da mídia na elaboração e divulgação das informações

Outro ponto de extremo interesse para a presente pesquisa é o conteúdo das

reportagens, e como estas são elaboradas e divulgadas à população. Em diversos meios de

comunicação utilizados como fonte de dados do DATALUTA é percebida a grande

parcialidade do discurso, e em alguns casos até mesmo distorcendo ou ocultando fatos.

“Grande parte das distorções propagandeadas sobre o caráter radical e subversivo das ações

dos movimentos agrários é difundida pela grande mídia. A mídia quando cobre tais

acontecimentos, mantém uma posição muito distante da imparcialidade” (FELICIANO,

2009, p. 136).

Conforme as análises de Gohn (2000), a mídia está articulada a uma rede de relações,

e esta por sua vez define os parâmetros político-ideológicos pelos quais a mídia deve retratar

os movimentos agrários. São os interesses políticos e econômicos que determinam as

considerações e as análises que configuram a apresentação das informações, num processo em

que, ao invés de informar o público sobre o acontecimento, a notícia é construída como

mensagem para formar uma opinião pública.

Colocamos como exemplo dessa posição parcial um registro ocorrido na madrugada

de 13 de outubro de 2009, no município de Prata, região do Triângulo Mineiro/Alto

Paranaíba, em que houve o conflito armado entre fazendeiro, seus empregados e integrantes

do MLST. A primeira reportagem foi divulgada em 14 de outubro pelo Portal Megaminas11,

com a manchete “Conflito entre fazendeiro e sem terra será investigado: dono de terra no 11 Extinto portal de notícias da TV Integração, afiliada Rede Globo com sede no município de Uberlândia-MG. Atualmente, as notícias regionais da emissora são veiculadas no site G1.

Page 78: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

78

município de Prata relatou momentos de terror vividos nas mãos dos sem-terra”, e assim

prossegue com a informação,

Fotos, tiradas na delegacia da cidade de Prata, no Triângulo Mineiro, mostram os donos e funcionários da fazenda São José Buracão. Em depoimento eles contaram que foram rendidos por cerca de 80 integrantes do Movimento de Libertação dos Sem-Terra (MLST), na madrugada da última segunda-feira (12). Só foram libertados, depois que um dos homens conseguiu fugir e chamar a polícia. [...] Um dia depois da ocupação, [...] neto do dono da propriedade, não esquece os momentos de terror. Levou coronhadas na cabeça e tiros de chumbinho no braço e na perna. Funcionários também afirmam que foram covardemente agredidos (Portal Megaminas, 14/10/2009).

Estes são trechos retirados da reportagem veiculada um dia depois do ocorrido na

fazenda. A ênfase da informação é a violência cometida contra o fazendeiro e aos empregados

da fazenda pelos integrantes do movimento, e pouco demonstra que os trabalhadores sem-

terra foram vitimados neste conflito, sendo que um deles também foi baleado na troca de tiros.

Nota-se que cada termo utilizado é determinado para causar uma impressão e sensação ao

leitor, neste caso ao inserir as expressões “momentos de terror” e “covardemente agredidos”,

ligando o MLST a ações criminosas e de violência.

A mesma notícia foi relatada pelo site CEDEFES12 no dia seguinte, que por sua vez

tratou do tema por meio do título “Trabalhador sem terra é baleado por jagunços em

acampamento no município do Prata-MG”,

Na madrugada de 13 de outubro, as famílias de sem-terra do MLST, acampadas há dois anos, na fazenda Buracão, no município do Prata, em Minas Gerias, foram atacadas com tiros por um grupo de jagunços. Os jagunços alojados na sede da fazenda cumpriram as ameaças que vinham fazendo e atiraram em direção às famílias, atingindo um pai de família com três balas. Levado pelo movimento para o Pronto Socorro do Hospital Municipal da Cidade do Prata (PAM ), ao invés de socorro, este trabalhador baleado foi violentamente agredido pelo médico [...] irmão do mandante que contratou os jagunços. O MLST ao perceber que o trabalhador ferido a bala, com tiros nas pernas corria risco de novas agressões, conduziu o mesmo para outro Pronto Socorro do Hospital Escola de Uberlândia, onde recebeu atendimento e alta (CEDEFES, 15/10/2009).

12 O Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva - CEDEFES é uma organização não governamental de caráter científico, cultural e comunitário, do estado de Minas Gerais, e busca promover a informação e formação cultural, e publicar temas do interesse do povo. Disponível em <http://www.cedefes.org.br/index.php?p=inst_apresentacao>. Acesso em jul. 2014.

Page 79: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

79

Fato não exposto na informação do outro jornal anteriormente citado, a violência dos

acontecimentos prosseguiu até mesmo no hospital, ao exporem a conduta inadequada do

médico agindo de modo agressivo contra a vítima baleada, e mais uma vez os integrantes

expressaram sua indignação com o ocorrido. O que fica claro neste exemplo é a tentativa de

criminalizar o movimento, fator contra o qual as mesmas organizações lutam incessantemente

ainda hoje. A mídia tem o papel fundamental neste contexto, e pode ser utilizada em benefício

ou até mesmo como uma “arma” contra os que lutam e são a favor da reforma agrária. Os

meios de comunicação social exercem forte poder de convencimento sobre a população,

influenciando até mesmo na determinação dos assuntos públicos, e por isso não basta apenas

tomar conhecimento do que é veiculado, mas sim entender os fatores reais que muitas vezes

são mascarados, sem se deixar levar pelo discurso jornalístico.

Segundo Feliciano (2009),

Atitudes de violência, repressão, coercitivas e/ou criminalizantes são as respostas dadas por uma estrutura conservadora e mantenedora de um modo dominante, o qual procura criar mitos e ordens com a finalidade de banir manifestações diferentes e/ou opostas a um outro conceito de justiça, de produção, de ocupação do território e de relações sociais, que não seja apenas pela reprodução de grupos de poder (FELICIANO, 2009, p. 135).

Não apenas a violência física e repressão servem como intimidadores às organizações

do campo. Essa estrutura dominante se utiliza também da mídia para criminalizar os

movimentos. É a reação diante das ações coletivas que questionam o modelo hegemônico, e

obviamente, a parcela dos que detêm o poder entendem tais contestações como uma ameaça à

ordem vigente, utilizando-se de diversas práticas capazes de limitar a atuação dos

movimentos.

Dissertando sobre a abordagem da questão agrária pela grande imprensa brasileira, a

partir da investigação de como os fatos são reproduzidos nos discursos jornalísticos, Seixas

(1999) afirma que

[...] a imprensa desempenha um papel duplo na abordagem da questão agrária. Ao mesmo tempo que cumpre a “função social” do jornalismo ao publicar matérias sobre o assunto, participa, em boa medida, da manutenção do sistema dominante no país, com sua estrutura política, econômica e social, pela maneira como apresenta sua abordagem. Daí, a nossa segunda hipótese é a de que os textos jornalísticos sobre a questão agrária são mais desfavoráveis aos trabalhadores e ao MST que aos proprietários rurais, tanto pela maneira como suas declarações são introduzidas, como pela forma como são denominados (SEIXAS, 1999, p. 2-3).

Page 80: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

80

Assim, a imprensa que tem dentre os mais expressivos veículos informativos o jornal

Folha de São Paulo e a Revista Veja, com forte repercussão nacional, não mantém a

neutralidade como princípio jornalístico, e sim expõe suas impressões e opiniões a fim de

formar à população uma opinião pública. Isso se vê, por exemplo, ao colocar o termo invasão

de terras em detrimento de ocupação de terras, sendo o primeiro tratado pela mídia

dominante e o segundo considerado pelos movimentos sociais, pesquisadores e jornais

militantes que se colocam a favor da causa.

Numerosas vezes, a imagem de uma manifestação, uma marcha ou bloqueio de estrada é transmitida como uma ação perturbadora da ordem, atrapalhando o desenvolvimento daqueles que têm que trabalhar e não podem ser prejudicados com tal ação. É recorrente o discurso de que “ninguém é contra as manifestações, desde que não atrapalhe a rotina daqueles que tem o direito de trabalhar” (FELICIANO, 2009, p. 135).

Esse discurso é reproduzido a partir de como as notícias são levadas à sociedade,

quando a mídia veicula tais acontecimentos e deixa evidente sua parcialidade,

propagandeando reações negativas. A tentativa dos movimentos sociais por sua vez, ao

promoverem as ações coletivas, é exatamente dialogar e demonstrar que a população em

geral, e não somente os que vivem e trabalham na terra, estão envolvidos neste contexto.

Passos (2008) elaborou um importante estudo ao investigar especificamente sobre a

forma como a Revista Veja construiu no decorrer dos anos uma imagem negativa do MST,

tratando-o como uma organização terrorista e materializando o discurso de crítica e combate

aos sem-terra. A autora destaca que no discurso jornalístico proferido pela revista, os sem-

terra passam de brasileiros humildes e vítimas de um Estado omisso, e

[...] são transformados em representantes da “sub-raça brasileira” que, à margem da ordem e do progresso da civilização letrada, constituem a imagem do Brasil baderneiro e atrasado, combatido pelas forças hegemônicas que, desde a implantação da República, dizem querer um país moderno e civilizado, mesmo que apenas para uma parcela ínfima da população (PASSOS, 2008, p. 112).

Trata-se de um estudo específico a um determinado veículo de informação, de

repercussão nacional, mas serve-nos como base para compreender até onde a grande imprensa

é manipulada e manipuladora objetivando manter a ordem e o domínio da sociedade a partir

da opinião pública. Como afirma a autora do referido estudo, ao pregar a ideia de organização

baderneira, a revista se torna responsável em construir a crença na população de que o

Page 81: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

81

movimento popular só serve para causar danos e violência, sendo que na verdade, e os

próprios números são indicativos, as principais vítimas nos conflitos agrários são exatamente

aqueles que lutam pela redistribuição de terras.

O modelo hegemônico utiliza-se então da mídia como instrumento de manipulação de

massas. Chega a ponto de criar rivalidade entre sujeitos do mesmo grupo social, uma vez que

as dificuldades enfrentadas pela população do campo atingem, direta ou indiretamente, toda a

população, rural e urbana, entretanto, o discurso midiático mascara essa importante

característica.

Page 82: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

82

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma primeira afirmação que podemos definir ao fim deste trabalho é que a questão

agrária ainda é assunto a ser discutido no âmbito político e acadêmico, uma vez que o Brasil

mantém terras concentradas, desenhando o cenário de “muita terra pra pouca gente” ou

“muita gente pra pouca terra”. A primeira expressão indica que uma minoria detentora de

poder econômico e político mantém sob seu domínio extensas áreas, utilizadas para atender o

mercado mundial ou como reserva de valor. Se tratarmos da segunda expressão, dizemos que

uma considerável parcela da população almeja o acesso à terra de trabalho e se engendra na

luta, entretanto ainda não conquistou tal intento devido à citada manutenção dessa

concentração.

O estado de Minas Gerais configura um cenário de disputas, não só territoriais, mas

também políticas e econômicas, concentrando importantes recursos naturais, tais como água e

minério, fatores que atraem os interesses das grandes empresas. De um lado está o

agronegócio e o avanço das extensas monoculturas ou instalação de grandes projetos, e do

outro a agricultura camponesa.

Entendemos a luta pela terra como uma forma de mudança social, que atinge não

somente a população do campo, mas sim na sua totalidade, rural e urbana. Envolve desse

modo a produção de alimentos, as adequadas condições de vida e trabalho, os apropriados

usos dos recursos disponíveis na natureza, a diminuição dos conflitos no campo e

consequentemente da violência cometida contra trabalhadores, dentre outros diversos fatores

que caracterizam essa luta.

Destacamos a importância do levantamento de dados desenvolvido pelo Projeto

DATALUTA, referentes às ocupações de terras, manifestações, assentamentos, estrutura

fundiária e movimentos socioterritoriais, bem como pela CPT, disponibilizando os elementos

necessários para a análise, discussão e compreensão do contexto estudado, que ao mesmo

tempo complementam e exemplificam o debate teórico aplicado.

A proposta de análise das variadas formas de manifestações de luta pela terra em

Minas Gerais, tendo como recorte temporal o início do século XXI, teve por objetivo elaborar

uma tipologia das manifestações. Para tanto, foram debatidos cada tipo de estratégia realizada

pelos movimentos, buscando entender do mesmo modo as reivindicações colocadas em pauta,

a quem são direcionadas essas exigências, e por fim os espaços apropriados por cada tipo de

ação. Dito isso, é possível compreender que os principais tipos de manifestações se

Page 83: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

83

configuram nas concentrações em espaços públicos, ocupação de prédio público e bloqueio

de rodovia, perfazendo em números metade das ações em todo o estado mineiro.

Por sua vez, a capital mineira é identificada como palco principal das manifestações de

luta pela terra, a partir de dois fatores fundamentais: sedia os órgãos estaduais e federais

envolvidos na questão, ou mesmo responsáveis por políticas públicas; e exerce forte

influência política por se tratar de uma capital estadual, tomando a visibilidade necessária e

esperada pelos movimentos sociais, que buscam constantemente o diálogo com a sociedade.

Quando não realizadas na capital Belo Horizonte, as ações são direcionadas aos territórios

controlados pelo agronegócio, como é o caso da mesorregião Triângulo Mineiro/Alto

Paranaíba, ou por fim quando trata de um tema específico a uma reivindicação ou protesto,

como é o caso, por exemplo, dos atos contra a impunidade na Chacina de Unaí, exemplificado

no capítulo anterior.

Os espaços definidos para cada tipo de ação são carregados de significados, não se

tratando então de decisões aleatórias. Uma praça, entendida como espaço público, bem como

rodovias e avenidas aos serem bloqueadas, apresentam uma dinâmica capaz de oferecer maior

notoriedade à ação. Já uma instituição como o INCRA é responsável em sanar os problemas

específicos dos assentamentos rurais, sendo necessário o diálogo principalmente com seus

representantes. A agência bancária, por sua vez, representa as possibilidades de renegociação

de dívidas ou obtenção de créditos, fatores fundamentais para a produção agrícola do

assentado. E assim entendemos os distintos significados de cada espaço apropriado.

Por sua vez, o papel da mídia é fundamental neste contexto, sendo a principal fonte de

pesquisa dos registros abordados. Os meios de comunicação, especialmente os de repercussão

nacional, exercem forte influência na formação da opinião pública, e por isso são utilizados

diversas vezes pela chamada grande imprensa de modo a criminalizar os movimentos socais.

Por outro lado, cada vez mais as próprias organizações sociais percebem a necessidade de

socializar seus atos e opiniões por meio da mídia, devido também à rapidez na difusão das

informações, especialmente em jornais ou sites militantes ou apoiadores da causa.

O tipo de manifestação define a melhor maneira de questionar e contestar,

direcionando a luta. Nota-se que as ações não se restringem ao campo, mesmo que as

reivindicações sejam voltadas para este. Quanto maior a visibilidade, da mídia e do Estado, e

conscientização da sociedade para a causa da questão agrária e conflitos no campo, maiores as

possibilidades de soluções e diminuição das desigualdades impostas. Os próprios

manifestantes, por sua vez com base nos registros aqui exemplificados, relatam que ainda

falta o devido apoio técnico público aos assentamentos, na garantia dos meios de produção e

Page 84: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

84

de trabalho que permitam a permanência na terra. E assim, é por meio das manifestações que

os direitos são reivindicados. Entendendo que há um planejamento elaborado pelos

movimentos de luta pela terra nas estratégias de ações, compreendemos então que não é

apenas por uma fração do território que se manifestam. Existe, além disso, e que se faz muito

mais complexo, um processo de luta pela sobrevivência e permanência da terra conquistada.

Por fim, não cabe neste estudo esgotar a temática abordada. Pelo contrário, trata-se de

um desenvolvimento inicial pelo qual se pretende a continuidade do trabalho, com vistas a

aprofundar a discussão até aqui exposta, revelando novos elementos ou até mesmo a partir de

outras abordagens que se mostrarem necessárias, possibilitando assim o contínuo processo de

pesquisa e debate.

Page 85: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

85

5. REFERÊNCIAS AFONSO, José Batista Gonçalves. A difícil luta para punir os responsáveis pelos crimes no campo. In: Conflitos no Campo Brasil 2013. Coordenação: Antônio Canuto, Cássia Regina da Silva Luz, Flávio Lazzarin. Goiânia: CPT, 2014. p. 113-117. BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Agrário. Adota as denominações e os conceitos aplicáveis ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e sua entidade vinculada, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Portaria MDA nº 80 de 24 de abril 2002. Disponível em: < https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=184224>. Acesso em ago. 2014. CAMPOS, Natália Lorena. Redes do agronegócio canavieiro: a territorialização do Grupo Tércio Wanderley no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba – MG. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Geografia, Instituto de Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2014. 209p. CEDEFES. Trabalhador sem terra é baleado por jagunços em acampamento no município do Prata-MG. 15/10/2009. Disponível em: <http://www.cedefes.org.br/new/index.php?conteudo=materias/index&secao=2&tema=&>. Acesso em ago. 2014. CEDEFES. MST tranca rodovias e ocupa Incra em MG . 17/04/2012. Disponível em: < http://www.cedefes.org.br/afro_print.php?id=8340>. Acesso em ago. 2014. CLEPS JR, João. Questão agrária, Estado e territórios em disputa: os enfoques sobre o agronegócio e a natureza dos conflitos no campo brasileiro. In: SAQUET, M. A.; SANTOS, R. A. (org.). Geografia agrária, território e desenvolvimento. 1 ed. São Paulo: Expressão Popular, 2010, p. 35-54. CLEPS JR, João. Reforma Agrária e conflitos no campo em Minas Gerais: contribuições da pesquisa DATALUTA. In: Boletim DATALUTA, Presidente Prudente, n. 54, jun. 2012. Disponível em: <http://www2.fct.unesp.br/nera/boletimdataluta/boletim_dataluta_6_2012.pdf>. Acesso em: jun. 2014. CLEPS JR, João. et al. O contexto das lutas sociais do campo nas cidades: mapeamento das manifestações no período de 2000-2012. In: Boletim DATALUTA, Presidente Prudente, n. 77, maio de 2014. Disponível em: <http://www2.fct.unesp.br/nera/boletimdataluta/boletim_dataluta_5_2014.pdf>. Acesso em ago. 2014. COCA, Estevan Leopoldo de Freitas. Um estudo da diversidade e atualidade da reforma agrária: análise dos tipos de assentamentos do Território Cantuquiriguaçu - estado do Paraná. 231f. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Geografia, Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2011. COMERFORD, John Cunha. Fazendo a luta: sociabilidade, falas, e rituais na construção de organizações camponesas. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1999.

Page 86: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

86

CPT, COMISSÃO PASTORAL DA TERRA. Conflitos no Campo – Brasil 2013. Organização e seleção: Antônio Canuto, Cássia Regina da Silva Luz, Flávio Lazzarin – Goiânia: CPT, 2014, 198p. DATALUTA, Banco de Dados da Luta pela Terra. Relatório 2012 - Minas Gerais. LAGEA – Laboratório de Geografia Agrária – IG/UFU. Coordenação: CLEPS JUNIOR, João. Uberlândia, Minas Gerais. Novembro de 2013. Disponível em: <http://www.lagea.ig.ufu.br/rededataluta/relatorios/minas/dataluta_mg_2012.pdf>. Acesso em jul. 2014. FABRINI, João. Edmilson. O campesinato frente à expansão do agronegócio e do agrocombustível. In: SAQUET, M. A.; SANTOS, R. A.. (Org.). Geografia agrária, território e desenvolvimento. 1 ed. São Paulo: Expressão Popular, 2010, p. 55-88. FELICIANO, Carlos Alberto. Território em disputa: terras (re)tomadas (Estado, propriedade da terra e luta de classes no Pontal do Paranapanema). Tese (Doutorado), FFLCH, Universidade de São Paulo, 2009. 575 p. FERNANDES, Bernardo Mançano. Movimento social como categoria geográfica. In: Terra Livre, São Paulo, n.15, p.59-85, 2000. FERNANDES, Bernardo Mançano. Questão agrária, pesquisa e MST. São Paulo: Cortez Editora, 2001. FERNANDES, Bernardo Mançano. Entrando nos territórios do território. In: PAULINO, E. T.; FABRINI, J. E. (org.). Campesinato e territórios em disputa. São Paulo: Expressão Popular, 2008. p. 273-302. FERNANDES, Bernardo Mançano. Formação e territorialização do MST no Brasil. In: CARTER, Miguel (Org.). Combatendo a desigualdade social: o MST e a reforma agrária no Brasil. São Paulo: Editora UNESP, 2010, p. 161-197. FREITAS, Ricardo Luis de. Estratégias de luta pela terra e políticas de assentamentos rurais em Minas Gerais (1985-2012): disputas e conquistas dos movimentos sociais rurais camponeses. Monografia. Instituto de Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2013. 96p. GOMES, Renata Mainenti. Ofensiva do Capital e Transformações no Mundo Rural: a resistência camponesa e a luta pela terra no Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba. Dissertação (Mestrado). Instituto de Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, 2004. 252p. GONÇALVES, Elienai Constantino. Disputa territorial entre o movimento camponês e o agronegócio canavieiro em Teodoro Sampaio - SP. 2011. 160 f. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Geografia, Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Presidente Prudente, 2011. GOHN, Maria da Glória. Mídia, terceiro setor e o MST. Impactos sobre o futuro das cidades e do campo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

Page 87: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

87

GUIMARÃES, Alberto Passos. Quatro Séculos de Latifúndio. 5ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1981. GUIMARÃES, Letícia de Castro. Luta pela terra, cidadania e novo território em construção: o caso da Fazenda Nova Santo Inácio Ranchinho, Campo Florido-MG (1989-2001). Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Geografia, Instituto de Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2001. 169p. HAESBAERT, Rogério. Dos múltiplos territórios à multiterritorialidade. In: Anais do I Seminário Nacional sobre Múltiplas Territorialidades, Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFRGS, Curso de Geografia da ULBRA e AGB Porto Alegre, em 23 de setembro de 2004. HAESBAERT, Rogério. Territórios em disputa: desafios da lógica espacial zonal na luta política. In: Campo-Território: Revista de Geografia Agrária. Uberlândia, Edição Especial - XXI Encontro Nacional de Geografia Agrária (2012), v.9 n.18, 2014, p, 1-17. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Agropecuário 2006 – Segunda Apuração. Disponível em: <ftp://ftp.ibge.gov.br/Censos/Censo_Agropecuario_2006/Segunda_Apuracao/censoagro2006_2aapuracao.pdf>. Acesso em jul. 2014. JORNAL CORREIO DE UBERLÂNDIA. Mulheres fazem manifestação na BR-050. 03/03/2011. Disponível em: < http://www.correiodeuberlandia.com.br/cidade-e-regiao/mulheres-fazem-manifestacao-na-br-050/>. Acesso em jul. 2014. MAB Nacional. Trabalhadores ocupam siderúrgica da Novelis, em Ouro Preto. 01/05/2009. Disponível em: <http://www.mabnacional.org.br/search/noticias%20010509%20novelis>. Acesso em ago. 2014. MAB Nacional. Atingidos por barragens fazem acampamento em Minas Gerais. 21/09/2011. Disponível em: <http://www.mabnacional.org.br/noticia/atingidos-por-barragens-fazem-acampamento-em-minas-gerais>. Acesso em ago. 2014. MEDEIROS, Leonilde Servolo de. Reforma agrária no Brasil: história e atualidade da luta pela terra. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2003. MOTTA, Márcia Maria Menendes. Lei e justiça: Conflitos e grilagens em 2006 – Apontamentos iniciais. In: Conflitos no Campo Brasil 2006/CPT. Goiânia: CPT Nacional Brasil, 2007, p. 170-175. OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. A geografia das lutas no campo. 6ª ed. São Paulo: Contexto, 1994. OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino. A geografia agrária e a transformações territoriais recentes no campo brasileiro. In: CARLOS, Ana Fani Alessandri (org). Novos caminhos da geografia. São Paulo: Contexto, 1999, p. 63-137.

Page 88: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

88

O TEMPO. Integrantes do MST fazem manifestação na capital mineira. 17/04/2012. Disponível em: <http://www.otempo.com.br/cidades/integrantes-do-mst-fazem-manifesta%C3%A7%C3%A3o-na-capital-mineira-1.393093>. Acesso em jul. 2014. PÁGINA DO MST. Via Campesina ocupa Codevasf em Montes Claros, em Minas Gerais. 06/09/2011. Disponível em: < http://www.mst.org.br/Via-Campesina-ocupa-Codevasf-em-Montes-Claros-Minas-Gerais>. Acesso em jul. 2014. PÁGINA DO MST. Sem Terra ocupam Banco do Brasil em Valadares. 26/05/2010. Disponível em: <http://enff.org.br/node/9946>. Acesso em jul. 2014. PASSOS, Najla. A Revista Veja e a invenção do ‘MST Terrorista’ - Um estudo sobre a cultura da opressão no Brasil pós 11 de setembro. Dissertação (Mestrado) - Programa de Mestrado em Estudos de Linguagem do Instituto de Linguagens da Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2008. 122 p. PAULINO, Eliane Tomiasi. Por uma geografia dos camponeses. São Paulo: Unesp, 2006. PEREIRA, Danilo Valentin. Estudo sobre os tipos de manifestações no campo paulista no período 2000-2011. Monografia. Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista. Presidente Prudente, 2012. 91p. PLOEG, Jan Douwe Van Der. Sete teses sobre a agricultura camponesa. In: PETERSEN, PAULO (Org.). Agricultura familiar camponesa na construção do futuro. Rio de Janeiro: AS-PTA, 2009, p. 17-31. PORTAL MEGAMINAS. Conflito entre fazendeiro e sem terra será investigado. 14/10/2009. Disponível em: < http://megaminas.globo.com/2009/10/14/conflito-entre-fazendeiro-e-sem-terra-sera-inves>. Acesso em ago. 2014. PRADO JR, Caio. A questão agrária no Brasil. São Paulo: Brasilense, 1979. RADIOAGÊNCIA NP. 8 anos sem punição: manifestação e audiência relembram Massacre de Felisburgo. 20/11/2012. Disponível em: < http://www.radioagencianp.com.br/11236-oito-anos-sem-punicao-manifestacao-e-audiencia-relembram-massacre-de-felisburgo>. Acesso em ago. 2014. RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Tradução de Maria Cecília França. São Paulo: Ática, 1993. RIBEIRO, Raphael Medina; CLEPS JR, João. Movimentos sociais rurais e a luta política frente ao modelo de desenvolvimento do agronegócio no Brasil. In: Campo-Território: Revista de Geografia Agrária, Uberlândia, v. 6, n. 11, fev. 2011, p. 75-112. Disponível em < http://www.seer.ufu.br/index.php/campoterritorio/article/view/12110/8263>. Acesso em jul. 2014. SAMPAIO JR, Plínio de Arruda. Notas críticas sobre a atualidade e os desafios da questão agrária. In: STEDILE, João Pedro (org.). A questão agrária no Brasil: Debate sobre a situação e perspectivas da reforma agrária na década de 2000. São Paulo: Expressão Popular, 2013, p. 189-240.

Page 89: DA RESISTÊNCIA À CONQUISTA DA TERRA: AS FORMAS DE ... · fonte de dados o Banco de Dados da Luta pela Terra - DATALUTA e a Comissão Pastoral da Terra - CPT. O objetivo principal

89

SAUER, Sérgio. Reflexões esparsas sobre a questão agrária e a demanda por terra no século XXI. In: STEDILE, João Pedro (org.). A questão agrária no Brasil: Debate sobre a situação e perspectivas da reforma agrária na década de 2000. São Paulo: Expressão Popular, 2013, p. 167-187. SEIXAS, Netília Silva dos Anjos. A questão agrária na grande imprensa. Disponível em: <http://www.eca.usp.br/associa/alaic/Congreso1999/11gt/Netilia%20dos%20Anjos.rtf>. Acesso em jul. 2014. SILVA, José Graziano da. O que é Questão Agrária. 16º ed. São Paulo: Brasiliense, 1990. STEDILE, João Pedro (org.). A questão agrária no Brasil: o debate tradicional - 1500-1960. 1ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2005. STÉDILE, João Pedro. O MST e a Questão Agrária: depoimento. [27 de agosto, 1997]. São Paulo: Estudos Avançados, vol. 11, n. 31, p.69-97. Entrevista concedida a Marco Antônio Coelho e Dario Luis Borelli.