da história compostelana à primeira crónica portuguesa
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MIRANDA, José Carlos Ribeiro e OLIVEIRA, António Resende de, Da História Compostelana à Primeira Crónica Portuguesa: O discurso historiográfico sobre a
formação do Reino de Portugal.
Ao longo dos séculos XII e XIII foram produzidos textos de natureza
historiográfica em Leão e Castela, nas quais podemos encontrar as figuras dos
fundadores do Reino de Portugal – D. Henrique, D. Teresa e D. Afonso Henriques.
São do séc. XII a Primeira Crónica de Sahagún, a Historia Compostelana e a
Chronica Adefonsi Imperatoris e, do séc. XIII o Liber Regum, Chronicon Mundi e a
Primeira Crónica Portuguesa, produzida em Portugal já enquanto reino. Até à morte
de Afonso Henriques existiam alguns relatos pouco elaborados que se foram
preservando e acrescentando no Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra.
As três crónicas leonesas foram produzidas ao longo do Caminho de Santiago.
Nelas podemos encontrar referências aos condes portucalenses e ao primeiro rei
português no que respeita à sua no que respeita à sua presença na Galiza e em Leão e
também relativamente aos movimentos que levariam à independência do território
português. Os condes são retratados de forma diferente nestas crónicas uma vez que,
sendo a Primeira Crónica de Sahagún e a Historia Compostelana de origem
monástica e episcopal e a Chronica Adefonsi Imperatoris pertencente à longa tradição
historiográfica leonesa, apresentam pontos de vista diferentes tendo em conta os seus
interesses.
Na Primeira Crónica de Sahagún (cujo cronista, anónimo, seria provavelmente
monge no mosteiro da região), os capítulos 18 e 19 tratam o tema do casamento de
Urraca com Afonso I de Aragão. Segundo o cronista, este casamento trouxe uma séria
de desgraças, sendo também considerado mau presságio a oposição do arcebispo de
Toledo ao casamento e a queda de uma forte geada nesse ano que destruiu a produção
vinícola. No capítulo 20 são relatados os primeiros sete anos do reinado de D. Urraca,
sendo marcados pela revolta de Pedro Froilaz na Galiza, a expedição punitiva de
Afonso de Aragão, construção da muralha de Sahagún e saque da cidade pelos
aragoneses.
O conde D. Henrique aparece destacado por esta altura, ocasião de uma primeira
separação de Urraca e Afonso I, uma vez que aparece como aliado ora de um, ora de
outro. O grande valor militar de D. Henrique explica a sua importância para as duas
facções, assim como o havia sido anteriormente para Afonso VI, o que se pode atestar
pelo seu casamento com a filha ilegítima deste rei, D. Teresa, e a doação que lhe foi
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feita, pelo mesmo, de Coimbra e Portugal. No entanto, um desentendimento entre o
rei e o conde terá levado este último a partir para França de modo a reunir um
exército com o intuito de tomar o Reino de Leão.
Os dois últimos anos da vida de D. Henrique terão sido muito conturbados; o
conde ter-se-á unido a Afonso de Aragão, sendo essa união muito vantajosa a nível
militar. Afonso de Aragão vence o rei mouro de Saragoça e Urraca em Candespina
em Outubro de 1110.
Depois da batalha de Candespina, D. Henrique é aliciado para mudar para o lado
de D. Urraca com a promessa da chefia do exército e divisão do reino. O conde aceita
e, em finais de 1110, inicia-se uma fase nova da vida do conde; o cerco a Afonso no
castelo de Peñafiel, para onde se tinha retirado quando soube que D. Henrique lhe
retirara o apoio, terá sido o ponto de partida para uma união de onde o conde esperava
tirar dividendos pela sua astúcia militar.
Após este episódio, D. Henrique e Urraca, pressionados por D. Teresa, reúnem-se
em Palência com o objectivo de firmar o pacto que haviam feito: a D. Henrique
“entre todas las otras cosas […] cayó Çamora, que es ciudad mui abastada, e eso
mismo el castillo, del nombre del rio, llamado Çeya, el qual luego fue entregado en
mano del conde.” Porém, D. Urraca estava em vias de reconciliação com Afonso de
Aragão e ordenara que não entregassem Zamora ao conde.
No final, D. Henrique irá combater contra D. Urraca e Afonso juntamente com
“todos los condes e nobles de la tierra” (nobreza do reino). O conflito dá-se em
Carrión. Terão sido estes os acontecimentos segundo a Primeira Crónica de Sahagún.
Por outro lado, na Historia Compostelana, são poucas as referências a D.
Henrique; aparece apenas uma vez: na Primavera ou Verão de 1111, Pedro Froilaz ia
ao encontro de D. Urraca com um exército para a ajudar a combater Afonso de
Aragão, mas fica a saber que os monarcas estavam novamente juntos e procura
aconselhamento com D. Henrique.
Em termo de conclusão, podemos verificar que nestas duas crónicas, D. Henrique
destaca-se pela sua força militar, prudência e ambição política, embora deva dar-se
maior relevo às suas capacidades militares – daí as atenções que recebia quer de D.
Urraca, quer de D. Afonso. Mas, no que respeita à prudência, esta ter-lhe-á faltado
um pouco quando, no final do reinado de Afonso VI, se desentenderam devido a ver
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cair por terra as suas expectativas relativamente ao alargamento das fronteiras do
Condado Portucalense: Afonso VI deixava o reino da Galiza Afonso Raimundes, não
sendo assim possível alargar o condado para norte, uma possibilidade acordada no
Pacto Sucessório celebrado entre D. Henrique e D. Raimundo.
Quanto às suas ambições políticas, há um exagero do cronista de Sahagún, pois um
subalterno não teria autoridade para exigir uma divisão do reino; teria de contentar-se
com menos ou, então, quando o cronista refere que D. Henrique partira para França
para reunir um exército para enfrentar o sogro.
Há uma contradição de documentos com a qual se deve ter cuidado, assim como
com a imagem cronística do conde, no que respeita ao enquadramento da acção de D.
Henrique. Tomando como exemplo o cerco de Carrión, a Primeira Crónica de
Sahagún diz que D. Urraca não cumpre o prometido ao conde (divisão do reino); na
Historia Compostelana, Urraca reúne um exército castelhano-leonês e cerca Afonso
de Aragão em Carrión após um conflito em Astorga; não há referências a D.
Henrique. Há poucas posssibilidades de o conde ter participado no cerco a Carrión se
este se deu a seguir ao inverno de 1111-1112, pois D. Henrique terá morrido em
Astorga na Primavera de 1112 na sequência dos ferimentos de que foi vítima em
combate, durante o cerco à cidade.
Centremo-nos agora em D. Teresa. Na Primeira Crónica de Sahagún, Teresa
aparece no contexto do cerco a Peñafiel por D. Henrique e rainha Urraca; terá sido D.
Teresa a responsável pela celeridade da concretização do pacto entre o marido e a
irmã: a condessa portucalense insistiu junto de D. Henrique para que se firmasse o
pacto antes da investida contra Afonso de Aragão.
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