da coluna policial à coluna social: flagrantes do urbenauta

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Da coluna policial à coluna social: flagrantes do urbenauta Zequinha em dois contextos da metropolização de Curitiba. Camila Jansen de Mello de Santana UFPR/UEPG Resumo: Tomando como objeto de pesquisa as ilustrações do personagem Zequinha, que circularam em Curitiba no formato de embalagem das Balas Zequinha, entre os anos 1929 e 1967, retornando no formato de figurinha entre os anos 1979 e 1983, circulando então, por todo o estado do Paraná, pretendemos problematizar o processo de construção do cidadão ideal paranaense. Considerando que toda imagem é fruto de seu tempo, do contexto no qual é criada, entendemos as duzentas cenas iniciais do personagem, criadas entre os anos 1929 e 1941, como ilustrações de atividades e situações diversas, que representam a sociedade curitibana do período. As situações vividas por Zequinha nos invólucros das balas correspondem a atividades cotidianas de cuidados de si, como a higiene pessoal, de sociabilidades, como a realização de atividades esportivas, de lazer, além de ações que representem situações violentas ou imorais, como quando Zequinha suicida-se, é atropelado, arromba um cofre. Essas ações representavam o dia a dia da cidade de Curitiba, como verificamos ao acessar os periódicos daquele contexto. Contudo, a transformação percebida nas ilustrações de Zequinha, assim como no seu suporte, entre o primeiro período de circulação, 1929-1967, e o segundo, 1979-1983, denotam uma mudança intensa da representação da sociedade curitibana e paranaense. Nesta segunda coleção de duzentas figurinhas, temos o desaparecimento de ações violentas ou imorais, encontramos a exaltação de atitudes cidadãs e nos deparamos com um personagem-modelo de cidadania. Ao analisar as imagens do personagem, levantamos como hipótese de trabalho a interpretação de que essas mudanças nas ilustrações de Zequinha seriam um sintoma de transformações na sociedade curitibana real, que teriam modificado seus parâmetros morais e culturais ao longo de algumas décadas, almejando um novo padrão de comportamento, tido como mais civilizado. Apoiando-nos nos estudos de Baxandall, Didi-Huberman, e Norbert Elias, buscaremos desenvolver nossa hipótese de estudo, que terá, como fontes a serem analisadas, as imagens de Zequinha e reportagens de periódicos dos contextos abordados. Palavras-chave: Balas Zéquinha; Processo Civilizador; Curitiba Financiamento: Capes O século XX incia-se com um continente europeu em forte desenvolvimento devido à Segunda Revolução Industrial 1 , que promovera intensas transformações 1 A este respeito, ver HOBSBAWM, Eric J. Era dos Impérios. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.

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Page 1: Da coluna policial à coluna social: flagrantes do urbenauta

Da coluna policial à coluna social: flagrantes do urbenauta Zequinha em dois

contextos da metropolização de Curitiba.

Camila Jansen de Mello de Santana

UFPR/UEPG

Resumo: Tomando como objeto de pesquisa as ilustrações do personagem Zequinha, que circularam em Curitiba no formato de embalagem das Balas Zequinha, entre os anos 1929 e 1967, retornando no formato de figurinha entre os anos 1979 e 1983, circulando então, por todo o estado do Paraná, pretendemos problematizar o processo de construção do cidadão ideal paranaense. Considerando que toda imagem é fruto de seu tempo, do contexto no qual é criada, entendemos as duzentas cenas iniciais do personagem, criadas entre os anos 1929 e 1941, como ilustrações de atividades e situações diversas, que representam a sociedade curitibana do período. As situações vividas por Zequinha nos invólucros das balas correspondem a atividades cotidianas de cuidados de si, como a higiene pessoal, de sociabilidades, como a realização de atividades esportivas, de lazer, além de ações que representem situações violentas ou imorais, como quando Zequinha suicida-se, é atropelado, arromba um cofre. Essas ações representavam o dia a dia da cidade de Curitiba, como verificamos ao acessar os periódicos daquele contexto. Contudo, a transformação percebida nas ilustrações de Zequinha, assim como no seu suporte, entre o primeiro período de circulação, 1929-1967, e o segundo, 1979-1983, denotam uma mudança intensa da representação da sociedade curitibana e paranaense. Nesta segunda coleção de duzentas figurinhas, temos o desaparecimento de ações violentas ou imorais, encontramos a exaltação de atitudes cidadãs e nos deparamos com um personagem-modelo de cidadania. Ao analisar as imagens do personagem, levantamos como hipótese de trabalho a interpretação de que essas mudanças nas ilustrações de Zequinha seriam um sintoma de transformações na sociedade curitibana real, que teriam modificado seus parâmetros morais e culturais ao longo de algumas décadas, almejando um novo padrão de comportamento, tido como mais civilizado. Apoiando-nos nos estudos de Baxandall, Didi-Huberman, e Norbert Elias, buscaremos desenvolver nossa hipótese de estudo, que terá, como fontes a serem analisadas, as imagens de Zequinha e reportagens de periódicos dos contextos abordados. Palavras-chave: Balas Zéquinha; Processo Civilizador; Curitiba Financiamento: Capes

O século XX incia-se com um continente europeu em forte desenvolvimento

devido à Segunda Revolução Industrial1, que promovera intensas transformações

1 A este respeito, ver HOBSBAWM, Eric J. Era dos Impérios. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.

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técnico-científicas no velho continente, trazendo impacto em várias áreas,

desde a ordem e as hierarquias sociais até as noções de tempo e espaço das pessoas, seus modos de perceber os objetos ao seu redor, de reagir a estímulos luminosos, a maneira de organizar suas afeições e de sentir a proximidade ou o alheamento de outros seres humanos. […] num processo dramático de transformação de seus hábitos cotidianos, suas convicções, seus modos de percepção e até seus reflexos instintivos.

Esse processo de intensas mudanças não se restringiu à Europa, mas fez-se

sentir em outros continentes e países, inclusive no Brasil, que aparecia como

consumidor dos produtos industrializados externos numa economia capitalista global

que se desenvolvia. Porém, não eram apenas os produtos industrializados que o

Brasil importava, mas também os hábitos, costumes, cultura dos países europeus,

pois esses mercados industrializados buscaram “transformar o modo de vida das

sociedades tradicionais, de modo a instilar-lhes os hábitos e práticas de produção e

consumo conformes ao novo padrão da economia de base científico-tecnológica”2,

conquistando mercado consumidor para seus artigos industrializados.

As intensas transformações pelas quais o Brasil passou na busca por se

aproximar dos parâmetros europeus de desenvolvimento, progresso e civilização

podem ser percebidos através da análise de diferentes fontes. Neste artigo,

pretendemos abordar esse processo de busca por um padrão civilizatório baseado

na experiência europeia, através de um estudo regional. Para a análise desse

contexto de início do século XX, pretendemos abordar as figurinhas das Balas

Zéquinha, que foram criadas em Curitiba no fim da década de 1920, como fonte que

nos permite perceber um processo e um discurso civilizatório que o Paraná sofria

em busca de um parâmetro de desenvolvimento europeu.

A Belle Époque europeia é comumente datada entre os anos de 1870 e 1914,

quando irrompe a Primeira Guerra Mundial. Já a Belle époque brasileira, “abrange o

período da guerra europeia, durante o qual ampliam-se as exportações para as

HOBSBAWM, Eric. J. Era dos Extremos: o breve século XX. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. SEVCENKO, Nicolau. (Org.). História da Vida Privada no Brasil. Vol. 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

2 SEVCENKO, Nicolau. Introdução. O prelúdio republicano, astúcias da ordem e ilusões do progresso. In: _____________ (Org.). História da Vida Privada no Brasil. Vol. 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. PP. 12-13.

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nações beligerantes, desenvolvendo-se ademais novas indústrias para substituir

parte do que antes se importava. Esse período abrangeria grosso modo de 1900 a

1920 (...)”3. As Balas Zéquinha são resultado deste período de ingresso do Brasil na

economia industrializada global.

Criados pel'A Brandina, uma fábrica de doces de propriedade dos irmãos

Sobania, quatro irmãos de origem polonesa, os caramelos de açúcar vendidos em

formato de balas começaram a fazer sucesso no ano de 19294, momento em que

esses doces passaram a ser embrulhados com papeis ilustrados com 30 diferentes

situações vividas por um personagem denominado Zéquinha.5

Zéquinha era representado como um homem de meia idade, talvez nos seus

40 anos, já parcialmente calvo e magro. Criado “como motivação para vendas de

balas dos irmãos Sobania”6, Zéquinha fora desenvolvido para ser um chamariz para

os consumidores enquanto, simultaneamente, aumentava os lucros da empresa

curitibana.

As imagens de Zéquinha foram encomendadas pela fábrica de doces à

Impressora Paranaense, principal empresa do ramo gráfico existente à época em

Curitiba. As ilustrações do personagem eram impressas litograficamente, em papeis

que eram utilizados para envolver as balas. Tendo em seu quadro de funcionários

imigrantes alemães e seus descendentes, as embalagens teriam sido desenhadas

por dois desenhistas-litógrafos: Alberto Thiele e Paulo Carlos Rohrbach7.

Zéquinha foi, inicialmente, representado em um total de 30 diferentes

atividades. Devido ao sucesso do personagem e à procura pelas Balas Zéquinha, as

situações vividas por ele passaram para um total de 50, depois 100 e, finalmente,

200 representações diferentes.8

3 Ibidem. 4 Há duas datas nas quais se localiza o surgimento das Balas Zéquinha. Em algumas fontes aponta-

se o surgimento de Zéquinha em 1928, como por exemplo XAVIER, Valêncio. 'Zequinha' é romance contado em balas. O Estado de São Paulo, São Paulo, Caderno 2, P. D7, 20 jul.1996. Outras fontes trazem o ano de 1929 como aquele em que Zequinha foi criado: GUETHS, Malgue Mania que entrou para a história. Folha de Londrina, 04jul.2007. Zequinha, um personagem querido mas sem história. Gazeta do Povo, Curitiba, de 26 set. 1993.

5 Zequinha, um personagem querido mas sem história. Gazeta do Povo, Curitiba, de 26 set. 1993. 6 MILLARCH, Aramis. A volta de Zequinha para ajudar as nossas finanças. O Estado do Paraná,

Curitiba, 16set.1979. 7 MILLARCH, Aramis. O padrasto de Zequinha. Seção Tabloide. O estado do Paraná. 31 out. 1979. 8 XAVIER, Valêncio. Desembrulhando as balas Zéquinha. Boletim Informativo da Fundação Cultural

de Curitiba, agosto de 1974. Vol. 1.

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Zéquinha era sintoma de uma sociedade que vivia uma explosão de

consumo, tanto de produtos nacionais como importados, num contexto de economia

capitalista que se desenvolvia globalmente. Nesse período, as embalagens dos

produtos industrializados viraram um chamariz para os consumidores, que, através

dos invólucros dos produtos, conheciam a mercadoria e se identificavam com ela.

Como demonstra José Humberto Boguszewski, “para chamar a atenção e convencer

os novos consumidores, os produtos alimentícios passaram a ser acondicionados

em embalagens ilustradas onde se aplicavam rótulos atraentes.”9

Luís Fernando Lopes Pereira afirma que “na virada do século, menos de 20%

da população curitibana era alfabetizada”10, o que levava as imagens a ter um maior

poder de alcance e comunicação do que os textos. Além de permitirem que uma

gama maior da população fosse capaz de interpretar a informação que se objetivava

transmitir, Marilda Queluz afirma, em estudo sobre as caricaturas das revistas que

circulavam em Curitiba no início do século XX, que “o humor visual criou

oportunidades aos habitantes das grandes cidades para verem e serem vistos nos

espaços públicos como nas ruas, nas avenidas, nos bondes, nos teatros, nas salas

dos cinematógrafos, pontos de encontro de entretenimentos.”11

Soma-se a isso o fato de Zequinha ser um personagem imaginário pois,

segundo Sloterdjek “lo que entra en la imaginación no puede venir de outro sitio más

que de algún lugar por ahí, de fuera, de un descampado que no tiene por qué ser

precisamente un más allá.”12 As imagens de Zequinha representariam, portanto,

situações reais, visto que “retratavam os hábitos dos curitibanos das décadas de 20,

30 e 4013. Valêncio Xavier, responsável pelo primeiro estudo a respeito das Balas

Zéquinha, confirma essa representação da vida cotidiana de Curitiba nas ilustrações

9 BOGUSZEWSKI, José Humberto. A primeira impressão é a que fica: imagens, imaginário e cultura

da alimentação no Paraná (1884-1940). 2012, 172 f. Tese (Doutorado em História) – Departamento de História. Universidade Federal do Paraná, Curitiba. P. 4-5

10 PEREIRA, Luís Fernando Lopes. Apud KAMINSKI, Rosane. A presença das imagens nas revistas curitibanas entre 1900-1920. R. Cient./FAP, Curitiba, v.5, p.149-170, jan./jun. 2010.

11 QUELUZ, Marilda. Traços Urbanos: A Caricatura em Curitiba no início do século XX. São Paulo, 2002. Tese de Doutorado em Comunicação e Semiótica, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP. P. 25.

12 SLOTERDIJK, Peter. Esferas I. Burbujas Microsferología. Madrid: Siruela, 2003. Trad.: Isidoro Reguera. P. 38.

13 A respeito ver: Zequinha, um personagem querido mas sem história. Gazeta do Povo, Curitiba, de 26 set. 1993 e XAVIER, Valêncio. Desembrulhando as balas Zéquinha. Boletim Informativo da Fundação Cultural de Curitiba, agosto de 1974. Vol. 1

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do personagem: “Observar as 200 figurinhas das Balas Zequinha é descobrir

predileções constantes dos curitibanos e relembrar costumes e preferências hoje

desaparecidas, ou quase.”14

As imagens das Balas Zéquinha apresentadas abaixo representam atividades

comuns e reais. Nelas, encontramos o personagem em ações cotidianas, como

quando demonstra preocupação com seu asseio, ao tomar banho e arrumar-se.

Assim como qualquer cidadão, Zéquinha também trabalha, neste caso como

encanador, contudo, na coleção de embalagens ele é representado em uma grande

diversidade de ofícios, assim como também viaja para diversos lugares, como o Rio

de Janeiro, onde, inclusive, conhece Getúlio Vargas.

As ilustrações da fileira inferior nos dão uma demonstração da vida pessoal

de Zéquinha, que assim como outros inúmeros indivíduos, recebe visitas, noiva, se

casa e, após o falecimento da esposa, torna-se viúvo. No entanto, algumas ações

realizadas pelo personagem nos causam, atualmente, certa estranheza, pois

ultrapassa padrões que, hoje, são considerados violentos ou imorais.

Figura 1: Imagens das Balas Zéquinha. Acima, temos as representações de Zéquinha “Tomando Banho” (nº 1), “Encanador” (nº 194), “No Rio” (nº 81), “Arrumando-se” (nº 138). Abaixo, Zéquinha é “Visitado” (nº 164), “Noivo” (nº 67), “Casado” (nº117) e “Viúvo” (nº 130).

14 XAVIER, Valêncio. Desembrulhando as balas Zéquinha. Boletim Informativo da Fundação Cultural

de Curitiba, agosto de 1974. Vol. 1. p. 4.

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As imagens abaixo nos permitem visualizar algumas das situações de perigo

e tensão enfrentadas por Zéquinha, pois mostram momentos em que talvez,

Zéquinha tenha entrado em desespero, arriscando a própria vida ou desistindo dela,

ao enforcar-se, pendurando-se numa árvore, ou ao apontar um revólver contra a

própria cabeça, suicidando-se. As outras imagens retratam o personagem como

gatuno, ao tentar arrombar um cofre e, talvez como consequência deste ato, sendo

condenado pela justiça ao sair algemado do tribunal.

Figura 2: Acima: Situações de tensão e violência vividas por Zéquinha, nas quais o personagem enfrenta emoções intensas, de ansiedade, nervosismo, desespero. Nestas, Zéquinha é representado “Suicidando-se” (nº 134), “Enforcado” (nº137). O personagem ainda age como um “Gatuno” (nº 53), ao tentar arrombar um cofre, ação que resulta na sua prisão e julgamento, ocasião em que é “Condenado” (nº 73).

As tensões eram parte importante do convívio social no Brasil do início do

século XX, pois estavam em disputa novos direitos, novas formas de sociabilidade, a

ocupação e utilização dos espaços públicos. As transformações vivenciadas pelo

Brasil, que buscava “acertar os ponteiros brasileiros com o relógio global”15

intensificou desigualdades já existentes em nossa sociedade, pois tornaram “tanto a

participação no contexto do espaço público quanto o gozo da privacidade, privilégio

de poucos”16. Contudo, as mesmas inovações técnicas que aproximam o Brasil dos

modelos de desenvolvimento representados pela Europa, intensificando privilégios

de grupos específicos da sociedade brasileira, possibilitam uma maior visibilidade

15 SEVCENKO. Nicolau. Op. Cit. P. 27. 16 SEVCENKO, Nicolau. Op.Cit. P. 30.

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destes pelos meios de comunicação e publicidade, os transformam em “foco das

tensões e polarizam os jogos das dramatizações e negociações entre os diferentes

níveis sociais.”17

Essas tensões estavam estampadas cotidianamente nos jornais, em

manchetes que alertavam que Os ladrões continuam na empreitada18, ou ao

destacar ter havido uma Tentativa de suicídio19, atitude que era reportada com certa

frequência, visto que poucos dias depois ocorre um ato Lamentável: um moço tenta

por termo à existência, desfechando um tiro no ouvido.20 Embora alguns não tenham

sucesso em suas tentativas, outros consegue o desfecho desejado, com quando um

rapaz Pereceu afogado21.

A tensão não estava apenas nas representações de situações cotidianas

ilustradas com o personagem, mas fazia-se presente no processo de formação da

coleção completa das imagens das Balas Zequinha. As embalagens dos doces

conquistaram tanto sucesso que se tornaram o produto a ser comercializado, já que

as balas, consideradas ruins, eram frequentemente jogadas fora. Colecionar as

ilustrações do personagem foi, segundo Carlos Henrique Tullio, cineasta que dirigiu

o documentário “Zequinha Grande Gala”, recuperando a história do personagem,

uma febre, em todos os estágios do personagem. Encontrei pessoas que até choraram quando falaram da importância das figurinhas para elas. A infância de muitas pessoas está retratada nessas balas. Muitas brincadeiras estavam envolvidas com o Zequinha, como o bafo e o jogo do tique. Nunca imaginei uma emoção tão forte. Isso mostra a força violenta que o personagem tem no inconsciente coletivo dos paranaenses', opina22

O colecionismo, o se auto-reconhecer nas imagens de Zéquinha, formam

portanto, um sentido de identificação, de pertencimento, fortalecido pelas interações

possíveis nos jogos de tique e bafo, que une a população em torno de momentos de

lazer e disputa, nos quais compartilham-se objetivos, regras, hábitos.

No entanto, o lazer não é apenas elemento que corrobora um processo de

17 SEVCENKO, Nicolau. Ibidem. 18 Os ladrões continuam na empreitada. Gazeta do Povo, Curitiba, 7 jan. 1928. 19 Tentativa de suicídio. Gazeta do Povo, Curitiba, 7 jan. 1928. 20 Lamentável: um moço tenta por termo à existência, desfechando um tiro no ouvido. Gazeta do Povo, Curitiba, 2 fev. 1928. 21 Pereceu afogado. Gazeta do Povo, Curitiba, Notas Policiaes, 11 jan. 1928. 22 CARVALHO, Joyce. “Documentário sobre balas “Zequinha”. O Estado do Paraná, 24fev.05. P. 20.

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identificação, de partilha de objetivos e construção de imaginários. O lazer, segundo

Elias, é importante ferramenta para regular as pulsões, exercer controle sobre as

emoções, fortalecer vínculos sociais e relegar a violência/excitação a momentos

específicos, em sociedades que estão em processo civilizador ou que já se

encontram em “um nível relativamente avançado de civilização”, Elias afirma que,

Enquanto, nestas sociedades, as rotinas públicas ou privadas da vida exigem que as pessoas mantenham um perfeito domínio sobre os seus estados de espírito e sobre os seus impulsos, afectos e emoções, as ocupações de lazer e de algumas formas reminiscentes da sua realidade exterior autorizam-nas, de um modo geral, a fluir mais livremente num quadro imaginário especialmente criado por estas actividades. […] Enquanto a excitação é bastante reprimida na ocupação daquilo que se encara habitualmente como as actividades sérias da vida — excepto a excitação sexual, que está mais estritamente confinada à privacidade —, muitas ocupações de lazer fornecem um quadro imaginário que se destina a autorizar o excitamento, ao representar, de alguma forma, o que tern origem em muitas situações da vida real, embora sem os seus perigos e riscos. Filmes, danças, pinturas, jogos de cartas, corridas de cavalos, óperas, histórias policiais e jogos de futebol — estas e muitas outras actividades de lazer pertencem a esta categoria.23

Ainda conforme Elias, esse universo do lazer é o espaço criado, nas

sociedades em processo civilizatório ou já consideradas civilizadas, para a busca

segura da excitação. Essa busca da excitação no lazer e simultâneo controle das

emoções nas esferas de trabalho e tempo livre sem lazer, ocorre, de acordo com

Elias, através de atividades miméticas, que criam, no lazer e desporto, ações,

movimentos, interações que se assemelham, imitam momentos reais de violência.

Contudo, na esfera do lazer, essa violência se desenvolve de forma segura, através

de regras e códigos partilhados pelos participantes. Nesta direção, as situações

miméticas teriam, para Elias, o sentido de criar afinidades entre “os sentimentos

dinamizados numa situação imaginária de uma actividade humana de lazer” e “os

que são desencadeados em situações reais da vida”. É através desse sentido

mimético que as atividades de lazer cumpririam com a função de permitir a

expressão de pulsões e ser espaço da busca por excitação, como por exemplo,

os espectadores de um jogo de futebol podem saborear a excitação mimética de um confronto entre duas equipas, evoluindo de um lado para outro no terreno de jogo, sabendo que nenhum mal acontecerá aos

23 ELIAS, Norbert ; Dunning, Eric. A busca da excitação. Lisboa: DIFEL, 1992, P. 70-71.

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jogadores nem a si mesmos. Tal como na vida real, podem agitar-se entre esperanças de sucesso e medos de derrota; e, nesse caso, activam-se sentimentos muito fortes, num quadro imaginário, e a sua manifestação aberta na companhia de muitas outras pessoas pode ser a mais agradável e libertadora de todas.24

No caso das embalagens das Balas Zéquinha, a disputa pelas imagens que

não se possuía, promovia momentos de ansiedade, tensão e excitação com a

disputa das embalagens, perda de invólucros para o concorrente e, o momento

principal de liberação das tensões, a conquista das figurinhas desejadas.

Nesta direção, as embalagens das Balas Zéquinha apresentam as paixões

em dois momentos: na disputa das embalagens através dos jogos de tique e bafo, e

nas próprias situações vividas pelo personagem, visto que em algumas das cenas

nas quais Zéquinha é representado há momentos de violência, tensão, choque, que

ilustram situações reais, reportadas nos periódicos da época.

Considerando o exposto, teríamos a sociedade curitibana das décadas de

1920, 30 e 40 – anos nos quais a coleção completa de 200 ilustrações das Balas

Zequinha foi desenvolvida – passando por um processo civilizador, no qual novas

atividades de lazer, como o colecionismo e disputa das ilustrações com Zequinha,

criariam momentos de tensão controlados, necessários numa sociedade que se

desenvolve, progride, civiliza-se.

Nesta direção, é importante verificarmos como o mesmo personagem é

reapresentado à população entre os anos 1979 e 1983. Se as imagens de Zequinha

mostravam uma sociedade que vivia um processo civilizador, como este mesmo

personagem seria representado cinquenta anos após seu surgimento? No ano de

1979 o governo do estado do Paraná lançou uma campanha de arrecadação de ICM

(Imposto sobre a Comercialização de Mercadorias) que tinha, como garoto

propaganda, o Zéquinha. Nesta nova apresentação, o personagem, apropriado e

redesenhado pela empresa P.A.Z., aparece com traços mais modernos em duzentas

novas situações.

Embora alguns dos temas das ilutrações se repitam, o Zequinha do governo

do estado é muito diferente de seu original. Nesta nova coleção, as ilustrações não

são mais as embalagens de balas, mas sim figurinhas autocolantes, acompanhadas

24 ELIAS; DUNNING. Op.Cit. P. 71-72.

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de um álbum. Outra novidade é que as ilustrações, que antes podiam ser adquiridas

em vários estabelecimentos que revendiam as balas, agora são adquiridas através

da troca, em postos autorizados, de notas fiscais por pacotes com os cromos.

O novo Zequinha não comete erros, não age de forma incorreta, violenta ou

imoral. Zequinha é agora o cidadão ideal. Suas ações representam um indivíduo

correto, centrado, que conhece seus direitos e deveres. Zequinha não é mais

portador de uma multiplicidade de identidades, de comportamentos, não representa

todos e qualquer um. O novo Zequinha é portador de um único discurso, o

governamental, e representa uma única identidade, a do cidadão-modelo.

Essa transformação do personagem ocorre em um momento no qual a cidade

de Curitiba está vivendo grandes transformações urbanas, com a implementação de

um novo plano urbanístico, com um processo de educação da população sobre as

questões ambientais e veiculando, paulatinamente, a imagem de capital

desenvolvida, moderna, ecológica, alcunhas que atualmente ainda permanecem no

imaginário coletivo da população, não só curitibana.

Figura 3: Figurinhas do Zequinha na campanha do governo do estado do Paraná. Encontramos o personagem visitando a preferitura (nº38) e conhecendo a função do prefeito; Zequinha desfila em momentos cívicos e patrióticos (nº193); o personagem ainda é cuidadoso ao dirigir próximo a escolas, parando na faixa para que as crianças possam atravessar a rua (nº111) e aparece circulando no ônibus expresso (nº46), grande novidade do plano de mobilidade da prefeitura de Curitiba da década de 1970. Segundo Jaime Lerner, ex-prefeito de Curitiba e ex-governador do Estado do

Paraná25 “cabe aos administradores estimular sempre o amor e o respeito dos

25 Jaime Lerner foi prefeito de Curitiba por três mandatos (1971-75, 1979-84, 1989-92) e Governador

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moradores por sua cidade. A campanha de melhor alcance público para essa

questão é a que motiva as crianças a conhecerem suas cidades, os bairros e os rios

que passam perto de suas casas.”26 Este estímulo ao amor e respeito pelas cidades

levaria a atingir a cidade do futuro que, segundo Lerner, será “um símbolo de

solidariedade e identidade”.27 Ainda conforme Lerner, esta cidade do futuro seria

alcançada com

“uma programação cultural para ativar a memória da comunidade, dar grandeza aos valores das pessoas. Nem sempre são obras importantes para o patrimônio histórico ou coisa assim: às vezes é uma edificação que é referência para a cidade, uma árvore centenária, uma antiga fábrica, até um velho armazém, elementos fundamentais na formação de uma identidade.”28

Zequinha tem seu resgate ocorrendo nos anos 1970, momento no qual a

cidade de Curitiba passava por transformações intensas em suas propostas

urbanísticas. Neste processo, o resgate e reafirmação da identidade local torna-se

item relevante para que tais transformações ocorram com maior aceitação, visto que

“é comum países e regiões engajados em transformações modernizadoras

enfatizarem o valor do passado e a necessidade de cultuá-lo”29. O Zequinha das

décadas de 1970 e 1980 encaixa-se portanto, num contexto onde o personagem

serve ao resgate do imaginário e memória coletivos da população, reacendendo um

sentimento identitário e também atuando como elemento essencial de uma

campanha de arrecadação de impostos.

As práticas nas quais Zequinha estava envolto se modificam: o colecionador

perde espaço no qual exercer sua liberdade de interpretação das imagens, pois há

um narrador-legenda que orienta a possível narrativa que seria criada. Esta

orientação é fruto do interesse da imposição de um novo discurso, que para forjar o

novo cidadão-modelo, precisa anular, sobrepor-se ao cidadão-comum anteriormente

apresentado na representação que as imagens de Zequinha faziam do cotidiano

do Estado do Paraná em duas oportunidades (1995-99, 1999-2003). As propostas de Jaime Lerner e sua equipe foram responsáveis pela implantação de várias inovações técnicas e urbanísticas na cidade de Curitiba, tornando-a referência internacional em urbanização. Entre as inovações há, por exemplo, o ônibus biarticulado e a Rua das Flores representado nas figurinhas de Zequinha. 26 LERNER, Jaime. O que é ser urbanista [ou arquiteto de cidades]: memórias profissionais de Jaime Lerner. Rio de Janeiro: Recorde, 2011, p. 48. 27 LERNER, Jaime. Idem. P. 47. 28 Idem. Pp. 47-8. 29 OLIVEN, Ruben George. Cultura e identidade nacional e regional. In:Horizontes das Ciências Sociais no Brasil. ANPOCS, 2011. P. 412.

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curitibano dos anos 1920-1940.

As transformações sofridas por Zequinha caracterizam o processo, violento,

de sobreposição de discursos, de tentativa de apagamento do leitor, de sua

capacidade interpretativa, pois que não há mais criatividade, liberdade para a

população, que agora possui um Zequinha representante dos interesses de um

grupo específico da sociedade, que objetiva criar um “discurso de verdade”30 e para

isto cerceia a liberdade do leitor/colecionador, ao apresentar a legenda, que diminui

a autonomia interpretativa do observador, ao induzir ao colecionismo puro, sem a

presença do doce. É o que afirma Valêncio Xavier ao destacar que o Zequinha mais

recente “impinge uma situação e ponto final”, onde não há participação dos

colecionadores, mas sim a criação de “rebanhos de carneirinhos”, visto que

“interessa à classe dominante gente que não questione, que goste de entrar em

filas, que goste de ser induzida ao consumismo (que obrigue os pais a gastar só

para ter a nota fiscal).”31

A importância do estudo das imagens, da arte, para o estudo da história de

um povo, de uma cultura, de uma civilização, é essencial para Burckhardt, que

ressalta, que “não há história possível sem uma morfologia das 'formas do tempo'”32

No entanto, Buckhardt faz uma ressalva:

“não há morfologia, ou análise das formas, sem uma dinâmica, ou análise das forças. Omitir isto é reduzir a morfologia […] ao estabelecimento de tipologias estéreis. É supor que as formas são reflexos de um tempo, mas antes, os restos – risíveis ou sublimes – de um conflito em ação no tempo. Ou seja, de um jogo de forças.”33

Se as imagens, ao serem analisadas, devem ser consideradas como

resultado de uma dinâmica, de um jogo de forças, dramatizações e negociações

entre diferentes grupos daquela sociedade na qual surgiram, com as ilustrações de

Zéquinha não é diferente. É nesta direção que percebemos as imagens de

Zéquinha, como sintoma de uma sociedade que vivia um embate de forças: por um

lado uma sociedade que tinha um modo de vida tradicional que se vê inserida num

30 FOUCAULT , Michel. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000. 31 Engajamento de Zéquinha em questão. Comunicação/Propaganda. Correio de Notícias. 1979. 32 DIDI-HUBERMAN, Georges. A imagem sobrevivente: história da arte e tempo dos fantasmas segundo Aby Warburg. Rio de Janeiro: Contraponto, 2013. 33 DIDI-HUBERMAN. Ibidem.

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processo de industrialização e capitalismo em aceleração que tensiona, modifica,

força mudanças no sentido de um desenvolvimento, um progresso, um processo

civilizatório que a transforma.

São forças contrárias que estão em choque. De um lado, uma Curitiba

tradicional, representada nas imagens de Zéquinha como carroceiro, salsicheiro,

motorneiro (motorista que conduz o bonde), de outro uma população que sente o

impacto desse novo modelo civilizador, onde as regras de boa conduta se sobrepõe

aos instintos, aos comportamentos humanos, porém agora vistos como imorais,

marginais. Essas imagens mostram não apenas situações que ilustram uma Curitiba

que se transforma entre as primeiras e as últimas décadas do século XX, mas um

jogo de forças, nas quais a Curitiba antiga enfrenta as mudanças que a

transformariam numa Curitiba moderna, onde o progresso e desenvolvimento têm

lugar, na qual um discurso civilizador, oriundo do governo do estado, tenta se impor.

Percebemos as ilustrações das situações vividas por Zéquinha como um

sintoma desse processo civilizatório descrito por Elias, no qual há a preocupação do

controle das paixões. É nesta direção que compreendemos a transformação das

imagens de Zéquinha, como representação de uma sociedade que, de diferentes

formas, entre as quais os jogos e o lazer, busca o controle das emoções, enquanto,

simultaneamente, disponibiliza espaços específicos para a expressão das pulsões

de forma controlada, a partir da busca da excitação.

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