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Auto da Barca do Inferno Questões de Diálogos 9, Porto Editora Cena 7 (Alcoviteira) – p. 122 – 124 Educação literária e Leitura 1. Palavra derivada por sufixação: alcova + -eira. Por sua vez, a palavra alcova é de origem árabe (al-qubbâ, «tenda»). Atualmente, significa: 1. pequeno quarto interior de dormir 2. quarto de casal 3. figurado: abrigo; refúgio in Infopédia [Consult. 20-12-2012] 2.1. Cf. vv. 499-513 Objetos: “Seiscentos virgos postiços” (v. 499); “alguns furtos alheos” (v. 504); “casa movediça” (v. 507); “um estrado de cortiça” (v. 508); Conceitos: “três arcas de feitiços” (v. 500); “três almários de mentir” (v. 502); “cinco cofres de enleos” (v. 503); “dez coxins de embair” (v. 509); Os elementos cénicos que traz consigo mostram-nos que, para além de intermediária entre as prostitutas e os seus clientes (“essas moças que vendia.” (v. 511)), Brízida Vaz dedicava-se também à feitiçaria, à mentira. 2.2. Pelas características da personagem e pela carga que transporta, poderíamos aventar a hipótese de ela pretender continuar a sua atividade no outro mundo. 3. A Alcoviteira entende que já suportou, em vida, muitos tormentos, que já foi suficientemente castigada com açoites, pela justiça, e considera-se tão perfeita como os apóstolos, os anjos e os mártires; como tal, merece o Céu (cf. vv. 518-521 e 539-541). Para além disso, argumenta que servia o clero, criando “as meninas / pera os cónegos da Sé.” (vv. 534-535) e que salvou muitas “cachopas”, arranjando-lhes “dono” (vv. 542-547). 4. Converter, salvar e perder-se são palavras dos textos religiosos que, na boca da Alcoviteira, adquirem outros sentidos. Ela atraiu (“converteu”) muitas raparigas para a prostituição, tirou-as (“salvas”) de uma vida de pobreza e todas tiveram sucesso/clientes (“nenhüa se perdeu”). 5. Quando se dirige ao Anjo, a Alcoviteira escolhe meticulosamente palavras e expressões carinhosas, procurando lisonjear o barqueiro do Céu, para tentar convencê-lo a deixá-la entrar na sua barca. Cf., por exemplo, v. 526 (“Barqueiro, mano, meus olhos”), v. 531 (“Anjo de Deus, minha rosa”), vv. 537--538 (“meu amor, minhas boninas, /olhos de perlinhas finas!”). 6.1. Referimo-nos aos versos 534-535: “a que criava as meninas / pera os cónegos da Sé.”, nos quais Gil Vicente, uma vez mais, critica a depravação do clero. Curiosidade:

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Auto da Barca do InfernoCena da Alcoviteira

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Auto da Barca do InfernoQuestes de Dilogos 9, Porto EditoraCena 7 (Alcoviteira) p. 122 124

Educao literria e Leitura

1. Palavra derivada por sufixao: alcova + -eira. Por sua vez, a palavra alcova de origem rabe (al-qubb,tenda). Atualmente, significa:1. pequeno quarto interior de dormir2. quarto de casal3. figurado: abrigo; refgioin Infopdia [Consult. 20-12-2012]2.1. Cf. vv. 499-513Objetos: Seiscentos virgos postios (v. 499); alguns furtos alheos (v. 504); casa movedia (v. 507); um estrado de cortia (v. 508); Conceitos: trs arcas de feitios (v. 500); trs almrios de mentir (v. 502); cinco cofres de enleos (v. 503); dez coxins de embair (v. 509); Os elementos cnicos que traz consigo mostram-nos que, para alm de intermediria entre as prostitutas e os seus clientes (essas moas que vendia. (v. 511)), Brzida Vaz dedicava-se tambm feitiaria, mentira.2.2. Pelas caractersticas da personagem e pela carga que transporta, poderamos aventar a hiptese de ela pretender continuar a sua atividade no outro mundo.3. A Alcoviteira entende que j suportou, em vida, muitos tormentos, que j foi suficientemente castigada com aoites, pela justia, e considera-se to perfeita como os apstolos, os anjos e os mrtires; como tal, merece o Cu (cf. vv. 518-521 e 539-541). Para alm disso, argumenta que servia o clero, criando as meninas / pera os cnegos da S. (vv. 534-535) e que salvou muitas cachopas, arranjando-lhes dono (vv. 542-547).4. Converter, salvar e perder-se so palavras dos textos religiosos que, na boca da Alcoviteira, adquirem outros sentidos. Ela atraiu (converteu) muitas raparigas para a prostituio, tirou-as (salvas) de uma vida de pobreza e todas tiveram sucesso/clientes (nenha se perdeu).5. Quando se dirige ao Anjo, a Alcoviteira escolhe meticulosamente palavras e expresses carinhosas, procurando lisonjear o barqueiro do Cu, para tentar convenc-lo a deix-la entrar na sua barca. Cf., por exemplo, v. 526 (Barqueiro, mano, meus olhos), v. 531 (Anjo de Deus, minha rosa), vv. 537--538 (meu amor, minhas boninas, /olhos de perlinhas finas!).6.1. Referimo-nos aos versos 534-535: a que criava as meninas / pera os cnegos da S., nos quais Gil Vicente, uma vez mais, critica a depravao do clero.

Curiosidade:Os prostbulos movedios, de armar e desarmar, poderiam servir o duplo objetivo de se deslocarem para onde houvesse mais clientela e de mudar de lugar quando as donas eram incomodadas pela Justia.