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Convivendo com as Águas A gestão das águas no Brasil SUMÁRIO 1. Introdução: nós e a água 1.1 A água no Brasil 2. Usos múltiplos e conflitos de interesse no uso da água 2.1 Principais usos e valores da água 3. A Lei Federal das Águas 9.433 4. O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos 3.3. As atribuições do Conselho Nacional de Recursos Hídricos - CNRH, da Agência Nacional de Águas - ANA, dos Comitês de Bacias Hidrográficas e das Agências de Água 5. Bacia hidrográfica 5.1. Por que a bacia hidrográfica como Unidade de Planejamento e Gestão das Águas? 5.2. Ações de controle e preservação ambiental na sua bacia hidrográfica / município / cidade 6. O Comitê de Bacia Hidrográfica: objetivos, atribuições legais, estrutura básica 6.1. Atribuições da Agência de Águas do Comitê de Bacia (Lei Federal 9.433) 7. Instrumentos de gestão dos recursos hídricos 8. O que é Plano de Bacia? 9. Referências bibliográficas 10. Sugestões de leitura 11. O Autor: Cláudio Bueno Guerra

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Convivendo com as Águas

A gestão das águas no Brasil

SUMÁRIO

1. Introdução: nós e a água1.1 A água no Brasil

2. Usos múltiplos e conflitos de interesse no uso da água2.1 Principais usos e valores da água3. A Lei Federal das Águas 9.433 4. O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos 3.3. As atribuições do Conselho Nacional de Recursos Hídricos - CNRH, da Agência Nacional de Águas - ANA, dos Comitês de Bacias Hidrográficas e das Agências de Água

5. Bacia hidrográfica5.1. Por que a bacia hidrográfica como Unidade de Planejamento e Gestão das Águas?

5.2. Ações de controle e preservação ambiental na sua bacia hidrográfica / município / cidade

6. O Comitê de Bacia Hidrográfica: objetivos, atribuições legais, estrutura básica

6.1. Atribuições da Agência de Águas do Comitê de Bacia (Lei Federal 9.433)

7. Instrumentos de gestão dos recursos hídricos

8. O que é Plano de Bacia?

9. Referências bibliográficas

10. Sugestões de leitura

11. O Autor: Cláudio Bueno Guerra

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1. Introdução: nós e as águas

Nós, os humanos, somos seres aquáticos, não só por vivermos nossos primeiros nove meses num meio líquido e por nosso organismo conter aproximadamente de 60 a 70% de água. Vivemos no único planeta do nosso sistema solar comprovadamente a conter água, e com que abundância! Cerca de 2/3 da superfície da Terra é coberta por este líquido essencial à nossa vida. Mas poucos se lembram que 97% dessa água é salina. Temos apenas 3% de água doce, dos quais em torno de 2% estão nas calotas polares. Resta, assim, somente cerca de 1% de água doce no estado líquido, o que dá uma idéia da necessidade e responsabilidade que temos de preservar e administrar muito bem tal recurso natural.

A água não é apenas fundamental para nossa sobrevivência, alimentação e qualidade de vida. Ela se tornou também vital para nosso desenvolvimento econômico e social, se constituindo hoje em uma das matérias-primas mais importantes do mundo. Sem ela, a produção industrial, a de alimentos, a geração de eletricidade e a prestação de serviços não seriam possíveis.

Há séculos vivemos a cultura da abundância da água em certas regiões do planeta, que paradoxalmente convive com o drama da escassez em várias outras. Nas últimas décadas do século XX, ocorreu um fantástico crescimento econômico, progresso tecnológico e a consolidação das grandes metrópoles. O crescimento populacional nos levou a casa dos seis bilhões de habitantes, o que gerou um fenômeno novo: o aumento espetacular no consumo de água, o qual está nos pressionando à sua extração excessiva, isto é, estamos extraindo água dos lençóis subterrâneos com uma rapidez maior do que sua capacidade de recarga pelas chuvas.

“Os problemas de água e saneamento no mundo de hoje não são mais de natureza técnica e sim de natureza política e educacional” (Agenda 21).

É importante lembrar que, de 1900 a 1997, a população da Terra dobrou, enquanto o consumo de água cresceu sete vezes. O consumo humano de água dobra a cada 21 anos, embora o volume total disponível continue praticamente o mesmo. 36 países do mundo já têm menos água disponível do que necessitam. A continuar o quadro atual, até o ano 2020, teremos 76 países nessa situação.

Segundo dados da ONU, os maiores consumidores de água do planeta atualmente são: agricultura / irrigação (69%), indústria (23%) e uso doméstico (8%).

Além da agricultura / irrigação, a urbanização e o crescimento populacional vêm ampliando muito a demanda pela água. Conforme a população rural, tradicionalmente dependente da água da mina ou da cisterna, muda-se para os centros urbanos, o consumo de água residencial pode facilmente triplicar. Por outro lado, à medida que as pessoas ascendem na pirâmide social e passam a consumir mais cereais, carnes, bebidas, laticínios, etc., consomem também mais grãos. O consumo cada vez maior de grãos por pessoa implica no maior no consumo de água.

Fonte: O Estado das Águas no Brasil; 1999Washington Novaes, 2005

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Consumo de água para fins industriais e agrícolas (valores médios aproximados)

1 Kg de Aço ............................ 600 litros

1Kg de Polpa/celulose ............. 500 litros

1 Kg de milho ....................... 1.400 litros

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Os dados da ONU, 2003, mostrados a seguir, nos dão uma idéia do grave cenário da água no mundo:

- 20% da população do planeta ainda não têm acesso à água potável (1,2 bilhão de pessoas).

- 50% da população do planeta não tem vaso sanitário em casa (3 bilhões de pessoas).

- Nos países da África, o consumo familiar diário é de apenas 150 litros. Milhões dessas famílias ainda têm que carregar a água a grandes distâncias.

- A metade da população dos países pobres sofre de alguma doença relacionada à água; cerca de 30 mil crianças morrem a cada dia no mundo, na sua maioria, vítimas de falta de cuidados básicos, desnutrição, diarréias e outras doenças veiculadas à água.

1.1 A água no Brasil

(Fontes: Secretaria de Recursos Hídricos MMA, 1996; Banco Mundial, 1996; FIBGE 2000)

Embora abrigue de 10% a 12% de toda a água doce disponível do planeta, o Brasil também já vive a crise hídrica. Apesar da abundância em certas regiões, convivemos com a escassez de água em outras. Mas não estamos falando apenas do semi-árido nordestino. Regiões metropolitanas como as de São Paulo e Recife, por exemplo, já convivem rotineiramente com o racionamento de água, especialmente no período mais seco do ano.

A ocupação de nosso território não parece guardar relação direta com a disponibilidade hídrica, conforme mostrado no quadro abaixo:

REGIÃO POPULAÇÃO DO PAÍS ÁGUA DOCE DISPONÍVEL DO PAÍS

Norte 7 % 70 %

Centro Oeste 7 % 15 %

Sudeste 43 % 6 %

Nordeste 28 % 3 %

Sul 15 % 6 %

Em pleno Século XXI, mais de 40 milhões de brasileiros não têm acesso aos serviços de água e quase 90 milhões não têm suas residências ligadas à rede coletora de esgoto. A falta de saneamento básico tem desdobramentos graves, como por exemplo, altos índices de mortalidade infantil e a proliferação de doenças. De acordo com o Ministério da Saúde, 67% dos casos de internação hospitalar no Brasil estão relacionados, de alguma forma, a doenças veiculadas pela água.

Outro aspecto preocupante é o desperdício de água (perdas) desde a captação até o uso final nas residências e indústrias. A média brasileira de desperdício é da ordem de 40%, o que é considerado um índice muito elevado.

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2. Usos múltiplos e conflitos de interesse no uso da água

A mesma água de um poço artesiano ou de um rio serve à indústria, agricultura, pecuária, abastecimento humano de uma cidade, pesca, lazer, navegação, mas funciona também como receptora dos rejeitos dessas diversas atividades econômicas. Este é o chamado uso múltiplo da água, isto é, ela serve, ao mesmo tempo, a diferentes usuários.

Entretanto, a atividade humana não só consome água em quantidades muito diferentes, o que depende do tipo de nossa atividade. Todos nós jogamos na água nossos efluentes e rejeitos, cujo efeito danoso vai variar em função da sua quantidade e da sua capacidade poluidora. Uma indústria de laticínios não consome muita água, mas a carga orgânica de seus efluentes polui a água 40 vezes mais que o esgoto doméstico. A produção de suínos não consume muita água, mas polui 100 vezes mais que o esgoto doméstico.

2.1 Principais usos e valores da água

USOS VALOR

- Doméstico- Público- Vida animal terrestre- Vida aquática

- Industrial - Irrigação- Pesca- Geração de eletricidade - Navegação - Receptor de resíduos

- Recreação (natação; pesca esportiva)- Estética

A questão da água tem dois enfoques: o da quantidade e o da qualidade.

A quantidade de água está relacionada a fontes “produtoras” de água: reservatórios naturais e artificiais, regime de chuvas, captação para usos diversos, etc.O cenário atual dos recursos hídricos mostra que, mesmo nas regiões onde há abundância de água, vem ocorrendo muito desperdício no seu uso, o que nos tem levado à escassez.

“A qualidade da água é um conjunto de características ou atributos, bons ou maus, que condicionam sua aceitabilidade para certos usos específicos” (Lamb, 1992).

Requisitos básicos para uma água ser considerada potável e de boa qualidade (Lamb, 1992): 1. Ter a cor clara.2. Estar livre de organismos patogênicos. 3. Estar livre de compostos que afetem o seu cheiro ou seu sabor. 4. Conter baixas concentrações de elementos ou compostos que são tóxicos ou que possam afetar a saúde das pessoas, mesmo a longo prazo, como chumbo, mercúrio etc.

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Social eambiental

Econômico

Cultural

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5. Conter baixo índice de salinidade (baixas concentrações de Sódio e Cloro - Na e Cl).6. Não ser corrosiva.

A ignorância e a falta de cuidados têm provocado a queda na qualidade da água. Este é o caso, por exemplo, dos efeitos da má administração do lixo urbano e da falta de tratamento dos esgotos domésticos e industriais. Segundo a ONU, para cada US$1,0 investido hoje na prevenção e no saneamento básico, vamos economizar US$4,0 no atendimento do serviço de saúde pública no futuro.

A água é um recurso natural que guarda uma estreita relação de dependência com a maneira com que os outros recursos naturais são manejados, especialmente os solos e a cobertura vegetal. A qualidade da água bruta, isto é, em seu estado natural, é influenciada por vários fatores, tais como: regime de chuvas, topografia da região, cobertura vegetal, características, forma de ocupação e de usos dos seus solos numa determinada região e também pelos rejeitos e descargas (sem tratamentos) das diferentes atividades econômicas ali desenvolvidas (mineração, garimpo, indústrias, propriedades rurais).

Um aspecto relevante que precisa ser mais discutido e entendido melhor, principalmente pelo cidadão comum, é que a questão da qualidade x quantidade da água envolve não apenas aspectos técnicos, mas também aqueles econômicos, sociais, políticos, jurídicos e até éticos.

Os conflitos de interesses econômicos e sociais no uso de uma mesma água por diferentes consumidores (pequenos, médios e grandes) é uma realidade indiscutível. Parece lógico concluir que administrar recursos hídricos é administrar conflitos de interesses. Esta administração só terá sucesso se todos os segmentos sociais envolvidos (órgãos públicos, empresas, cooperativas rurais, entidades da sociedade civil, etc.) abraçarem a causa da gestão compartilhada das águas, onde através da negociação social todos passarão a cuidar desse bem público que interessa a todos.

Bombear a água, tratá-la e distribuí-la para a população não significa que ela esteja sendo administrada de forma correta. Fazer o tratamento e a distribuição da água é uma coisa, administrar os recursos hídricos é muito diferente.

Portanto, o que vimos é que precisamos administrar nossas águas como nunca fizemos antes. Devemos investir em recuperação e proteção das nascentes, plantios de matas ciliares, aumento das áreas com a cobertura vegetal adequada para melhorar a realimentação dos lençóis freáticos. Especialmente nas regiões de baixa disponibilidade hídrica precisamos “produzir mais água”, não apenas construindo pequenas barragens, mas também fazendo a “colheita das chuvas” de forma inteligente, através de sistemas de coletores de águas, não deixando a “água correr”.

Precisamos também reduzir a erosão, combater as perdas e o desperdício de água, manejar de forma adequada os solos, punir o desmatamento, incentivar o reflorestamento, melhorar o controle ambiental em várias fontes poluidoras, estabelecer novas relações com as comunidades envolvidas (áreas de produção e consumidores), implantar um sistema de tarifação transparente, adotar uma postura madura diante das situações de conflito pelo uso da água, etc.

3. A Lei Federal 9.433 (Lei das Águas)

A partir de outubro de 1988, a Constituição Federal do Brasil passou a considerar todos os corpos d’água como de domínio público. Desde 1997, temos uma Lei das Águas, a Lei Federal 9.433, cujo objetivo geral é a utilização racional e integrada dos recursos

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hídricos para assegurar a esta e as próximas gerações a disponibilidade da água com boa qualidade, dentro dos princípios do desenvolvimento sustentável.

Estes são marcos na nossa história e que terão influências diretas na mudança de atitudes e comportamentos da nossa sociedade em relação à administração das águas.

Felizmente, nos últimos anos, já se percebe no nosso país, mesmo que lentamente, evidências fortes na direção de tais mudanças. Estamos num período de transição, passando de uma visão só voltada para o fornecimento e o consumo para um enfoque mais abrangente, interdisciplinar, e onde os aspectos éticos e o compromisso com as próximas gerações cada dia mais passam a ser considerados como prioritários.

As diretrizes gerais de ação da Lei 9.433 incluem a integração da gestão dos recursos hídricos com a gestão ambiental; adequação às peculiaridades regionais de cada bacia; articulação dos planejamentos regionais, estaduais e federais; articulação e parcerias entre Poder Público, usuários e comunidades locais.

É nesse contexto que de acordo com a Lei Federal 9.433, o Comitê de Bacia Hidrográfica desempenhará papel fundamental neste novo modelo de gestão das águas, garantindo um modelo capaz de cumprir essas diretrizes gerais, conforme veremos mais adiante.

O primeiro grande desafio é tornar os agentes sociais, econômicos, políticos, a imprensa; enfim, a sociedade em geral, familiarizada com os objetivos, princípios, instrumentos e instituições desse novo modelo.

As estratégias para esta gestão compartilhada de nossas águas, em função de seus usos múltiplos, passam por uma maior disseminação da informação e do conhecimento, ações conjuntas e planejadas, negociação e estabelecimento de parcerias entre os vários segmentos sociais envolvidos. É preciso mediar os conflitos entre o interesse público e privado e para isto precisamos melhorar a estrutura institucional (organização, orientação, fiscalização etc.).

Nossos desafios, num país continental como o Brasil, nesta e nas próximas décadas, são muitos e em várias frentes: política, econômica e social. É preciso mudar valores, mentalidades e atitudes para que possamos administrar racionalmente este bem público. A tarefa não é fácil, e ela não cabe apenas aos governos, mas a toda a sociedade e, certamente, envolverá várias gerações.

Os fundamentos da Lei das Águas são:- A água é um bem de domínio público.- A água é um recurso natural limitado e dotado de um valor econômico. - Em situações de escassez, a prioridade da água é para o consumo humano e dessedentação de animais. - A gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas.- A bacia hidrográfica é a unidade territorial para a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos. - A gestão dos recursos hídricos deve ser integrada com os outros recursos naturais, descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades locais.

4. O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos

Além de definir os princípios e as diretrizes do novo modelo de gestão de nossas águas, a Lei Federal 9.433 criou um Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos

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(SINGREH), dentro do qual surge a importante figura do Comitê de Bacia Hidrográfica, cujas funções e competências serão detalhadas mais adiante.

Dentre os objetivos do SINGREH estão: coordenar a gestão integrada das águas (Estados e União); arbitrar administrativamente os conflitos de uso; implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos; planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a recuperação dos recursos hídricos em todo o território brasileiro.

São chamados entes do SINGREH os seguintes órgãos e instituições:

CNRH (Conselho Nacional de Recursos Hídricos): Órgão consultivo e deliberativo integrante da estrutura regimental do Ministério do Meio Ambiente, o CNRH é a instância máxima do SINGREH. Ele é presidido pelo Ministro do Meio Ambiente e seu braço executivo é a Secretaria Nacional de Recursos Hídricos (SNRH).

Seu plenário é composto por representantes do Governo Federal, dos CERH, dos usuários de recursos hídricos, de entidades da sociedade civil e tem também várias Câmaras Técnicas para tratar de temas específicos.

Competem ao CNRH tarefas da maior importância, como: promover a articulação dos planejamentos nacionais, regionais e estaduais dos recursos hídricos num país continental como o Brasil; aprovar propostas de instituição dos Comitês de Bacias Hidrográficas de rios federais e encaminhá-las para a sanção do Presidente da República; analisar propostas de alteração da legislação pertinente a recursos hídricos e à Política Nacional de Recursos Hídricos; estabelecer critérios para a outorga de direito de uso dos recursos hídricos e para a implantação do Sistema de Cobrança por seu uso; arbitrar, em última instância, os conflitos existentes entre Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos.

ANA (Agência Nacional das Águas): Criada em julho de 2000, através da Lei Federal 9.984, a ANA é a entidade reguladora da utilização dos rios de domínio da União e que funciona como uma autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente (MMA). A ANA é uma agência gestora dos recursos hídricos e não uma agência reguladora comum da prestação de serviços públicos de água e seus preços.As principais competências e atribuições legais da ANA na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos são: - Supervisionar, controlar e avaliar as ações e atividades decorrentes do cumprimento da legislação federal sobre recursos hídricos.- Participar da elaboração do Plano Nacional de Recursos Hídricos.- Prestar apoio à elaboração dos planos de recursos hídricos e supervisionar sua implementação.- Outorgar o direito de uso dos Recursos Hídricos.- Fiscalizar os usos dos Recursos Hídricos.- Elaborar estudos técnicos para subsidiar a definição dos valores a serem cobrados pelo uso dos Recursos Hídricos.- Implementar, em articulação com os Comitê da Bacias, a cobrança pelo uso dos Recursos Hídricos- Planejar e promover ações destinadas a prevenir ou minimizar os efeitos de secas e inundações.- Definir e fiscalizar as condições de operação de reservatórios de águas.

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- Promover a coordenação das atividades no âmbito da rede hidrometeorológica nacional.- Organizar, implantar e gerir o Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos em todo o país.- Propor ao CNRH o estabelecimento de incentivos à conservação qualitativa e quantitativa dos Recursos Hídricos.- Estimular e prestar assistência técnica e organizacional na criação e consolidação dos Comitês de Bacias Hidrográficas e seus órgãos executivos, as Agências de Águas.Comitês de Bacias Hidrográficas: Órgãos deliberativos, normativos e de políticas públicas regionais de recursos hídricos. Os Comitês são formados por representantes dos poderes públicos (executivo, legislativo, judiciário), usuários e entidades da sociedade civil.

Agências de Água: Têm a mesma área de atuação de um ou mais Comitês de Bacias Hidrográficas. São os órgãos executivos desses Comitês, responsáveis, entre outras coisas, pela cobrança pelo uso da água e aplicação dos recursos arrecadados..CERH (Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos): Têm atuação semelhante a do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, só que no âmbito dos estados.

Órgãos gestores (instituições públicas federal, estaduais ou municipais cujas competências se relacionem com a gestão dos recursos hídricos): São criados e regidos por leis específicas nas suas áreas de atuação. No caso da bacia do rio Doce, além do órgão federal, a ANA, existem os órgãos gestores de Minas Gerais (Instituto Mineiro de Gestão das Águas, o IGAM) e do Espírito Santo (Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, o IEMA)

A seguir apresentamos um esquema didático, com as principais leis, órgãos, instituições e a relação funcional entre eles com a finalidade apenas de dar uma idéia de conjunto do SINGREH e também da sua complexidade.

REFERENCIAL JURÍDICO REFERENCIAL INSTITUCIONAL

AGENDA 21 (1992) LEI FEDERAL 9.433 (1997) Resoluções CNRH

Leis estaduais13.199/MG (1999)

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Ministério do Meio

Ambiente(MMA)(1994) CNRH

(1998)ANA

(2000)

CERH

CONAMA(1980)

SEMAD/MGSEAMA/ES

SNRH

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Resoluções CERH5.818 /ES (1997)

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AGÊNCIAS DE ÁGUAS

IGAM/MGIEMA/ES

COMITÊS DE BACIAS

HIDROGRÁFICAS

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5. Bacia hidrográfica

As chuvas alimentam as nascentes e as águas que brotam vão pelo solo até formar os ribeirões, que seguem para as partes mais baixas dos terrenos até encontrar um outro curso d’água, e assim sucessivamente até chegarem a um rio principal, cujas águas seguem para o mar. No mar, as águas evaporam em grande quantidade, formando as chuvas. Assim, o ciclo hidrológico recomeça. O conjunto de todas as águas que correm para um mesmo curso principal é chamado de rede hídrica. A área ocupada por esta rede é chamada de bacia hidrográfica.

Mas, quando falamos numa bacia hidrográfica, estamos nos referindo não somente aos afluentes e coleções de água que direta e indiretamente vão lançar suas águas naquele rio, mas também o seu meio biótico (vegetação, flora, fauna, etc.) e socioeconômico (cidades, população, infraestrutura, saúde, educação, atividades econômicas, etc.). Uma bacia hidrográfica deve ser vista como um sistema, integrando não só o conjunto dos corpos d'água que são seus formadores, como também uma grande diversidade de ambientes físicos, socioeconômicos e culturais, onde se desenvolvem diferentes atividades econômicas e sociais. Essas atividades exercem uma influência direta na vegetação, solo, na biodiversidade em geral e na qualidade das águas de seu rio formador. Este passa a ser um canal para onde convergem os rejeitos de todas as atividades econômicas e humanas ali desenvolvidas.

Assim, podemos conceituar bacia hidrográfica como um sistema aquático e terrestre, geograficamente definido, e composto por sistemas físicos, biológicos, econômicos e sociais.

5.1. Bacia hidrográfica como unidade de planejamento

Conforme explicado no item anterior, a Lei 9.433 estabelece que a bacia hidrográfica é a unidade territorial para a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos. O sistema bacia hidrográfica precisa, portanto, ser entendido dentro da sua dinâmica, sua sinergia e sua complexidade. Administrar uma bacia hidrográfica significa, inicialmente, identificar seus elementos ativos (físicos, econômicos, sociais, culturais etc.), compreender suas inter-relações e a partir daí tentar explicar o que está acontecendo com o todo, isto é, tendo uma visão de conjunto daquele sistema.

O sistema bacia hidrográfica oferece inúmeras vantagens ao ser considerado como uma Unidade de Planejamento e Gestão dos Recursos Hídricos. Entre as principais, citamos:

- As relações entre a região das cabeceiras e da foz do rio principal se tornam mais visíveis, o que facilita o entendimento da bacia hidrográfica como um todo, isto é, como um sistema.

- As relações entre águas superficiais, águas subterrâneas, quantidade e qualidade da água na bacia são mais facilmente percebidas e reconhecidas. Desta forma, medidas preventivas podem ser tomadas com a antecedência necessária.

- Cria-se a possibilidade de se quantificar os efeitos acumulativos de várias atividades econômicas naquela bacia, uma vez que todos os seus rejeitos convergem para um mesmo curso d’água, o rio principal.

- Possibilita a integração entre a ocupação e uso da terra daquela bacia com a administração integrada dos recursos hídricos, caracterizando-se melhor os conflitos entre as atividades socioeconômicas ali desenvolvidas e o seu meio ambiente. Assim, qualquer investimento ou alocação de recursos (financeiros, humanos, materiais, etc.) na bacia deve

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levar em consideração suas consequências econômicas, sociais e ambientais. Desta forma, podemos confrontar demandas e disponibilidades hídricas, o que é essencial para o balanço hídrico dentro daquela bacia hidrográfica.

- A administração regionalizada por bacia hidrográfica favorece a participação das comunidades locais, maximiza a canalização de esforços de vários segmentos sociais da região, além de facilitar a implantação de projetos sustentáveis que aumentarão a disponibilidade e a qualidade das águas na bacia.

Mas também existem dificuldades em se considerar a bacia hidrográfica como a unidade de planejamento:

- Faltam informação e conhecimento sobre a “cultura de bacia hidrográfica” nos gestores públicos, tomadores de decisões dos usuários e nos cidadãos em geral.

- Nossa divisão político-administrativa atual, (saúde, educação, extensão rural, controle ambiental, etc.) ignora a existência das bacias hidrográficas, bem como os programas de desenvolvimento (infraestrutura, produção agrícola, etc.).

- Os dados estatísticos devem ser rearranjados levando-se em conta aquele espaço geográfico e não apenas o município. O caso mais complexo é quando o território de um município abrange duas bacias hidrográficas diferentes, o que é muito comum de acontecer.

6. O Comitê de Bacia Hidrográfica

O novo modelo de administrar nossos recursos hídricos, além de ter a bacia hidrográfica como unidade de planejamento, estabelece a descentralização e a participação dos diversos segmentos da sociedade no processo de tomada de decisões. A instância responsável pela gestão no âmbito da bacia hidrográfica é o comitê de bacia hidrográfica.

Um comitê de bacia hidrográfica é uma assembléia regional, ou um parlamento regional das águas, formado por representantes dos diferentes segmentos sociais (prefeituras, órgãos públicos estaduais e federais, indústrias, empresas, organizações da sociedade civil etc.) e que têm a atribuição legal de administrar os recursos hídricos naquela região. Ele é o canal de discussão, de busca de convergências e de intervenções para melhorar a qualidade do meio ambiente naquela bacia.

Um aspecto importante na organização e funcionamento de um Comitê é o da representatividade dos diferentes segmentos sociais envolvidos, conforme estabelecido no texto da lei federal e estadual. Outro ponto a considerar é o da distribuição geográfica de tal representatividade. Espera-se que na assembléia geral do comitê haja membros das várias regiões da bacia hidrográfica: do alto, do médio e do baixo, devendo-se evitar a concentração de representantes de uma mesma região, geralmente aquela mais forte economicamente da bacia.

Como numa cooperativa, os membros do Comitê ou “parlamentares da água” se reúnem periodicamente para analisar, discutir e deliberar sobre os problemas regionais, acompanhar e controlar as ações realizadas sob a responsabilidade da sua Agência de Água. O trabalho deles não é remunerado.

O órgão executivo do Comitê é a sua Agência de Águas, que terá uma personalidade jurídica. Ela será formada por um corpo técnico remunerado, responsável pela execução das ações detalhadas no Plano Diretor, prestação de contas do dinheiro arrecadado e por sua aplicação em obras e atividades naquela bacia hidrográfica.

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Entretanto, segundo a Lei 9.433, a Agência de Águas só poderá ser criada se o referido Comitê já estiver constituído e houver “viabilidade financeira assegurada pela cobrança dos recursos hídricos em sua área de atuação”.

“O futuro é um processo de construção permanente”. Um Comitê de Bacia Hidrográfica é o futuro.

A situação de nossos recursos hídricos é tão grave hoje que o Comitê da Bacia Hidrográfica se tornou na grande possibilidade de mudanças no cenário ambiental, através da canalização de esforços e estabelecimentos de parcerias entre os diferentes segmentos envolvidos.

Entretanto, mesmo considerando que a Lei 9.433 representa um avanço, não devemos nos esquecer que administrar recursos hídricos significa administrar conflitos de interesse econômicos, sociais, políticos e culturais em torno do uso atual e futuro das águas. Por isso, é importante que cada cidadão participe das discussões em torno da organização, criação e funcionamento do comitê de sua bacia hidrográfica.

O comitê de bacia hidrográfica é um espaço democrático e uma possibilidade concreta de se descentralizar o processo de tomada de decisões e participação das comunidades locais na questão ambiental. Mas não nos iludamos. O comitê é também um espaço de confronto e de negociações difíceis para a solução dos problemas hídricos e ambientais de uma bacia. Além disso, é importante lembrar que a organização, implementação e funcionamento de um comitê de bacia é um processo político-administrativo lento, que passa por várias etapas da burocracia governamental e aperfeiçoamento. Tudo é novo para todos, a começar de um complexo conjunto de leis, resoluções, princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos de gestão.

São elementos fundamentais no processo de negociações na solução dos problemas: transparência; credibilidade; competência para negociar; responsabilidade e compromisso social no cumprimento das metas estabelecidas.

6.1 Composição básica da Assembléia Geral de um Comitê de Bacia Hidrográfica

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PODER PÚBLICOMunicipalEstadualFederal

Gestão das águas

SOCIEDADE CIVIL

SETOR PRODUTIVO

(usuários da água)

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O número de representantes de cada setor bem como os critérios para sua indicação são estabelecidos nos regimentos dos comitês, sendo que a representação dos poderes executivos da União, Estados, Distrito Federal e Municípios não pode ultrapassar a metade do total de membros.

Os rios que correm por mais de um estado ou cujas águas passam também por outro país são considerados de domínio da União. Nesses casos, o comitê da bacia é instituído pelo Presidente da República, como aconteceu com o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CBH-Doce), criado em 2002. Os rios que nascem e deságuam dentro de um mesmo estado são considerados de domínio estadual (o caso do Piranga, Piracicaba, Santo Antônio, Suaçuí Grande, Caratinga e Manhuaçu, de domínio do estado de Minas Gerais; Guandu, Santa Maria do Doce e São José, de domínio do estado do Espírito Santo). Os comitês nas respectivas bacias hidrográficas foram instituídos pelos governadores dos estados.

6.2 Atribuições de um Comitê de Bacia Hidrográfica

Como em uma cooperativa ou associação, um comitê tem uma Assembléia Geral, que escolhe uma Diretoria e que realizará seu trabalho em sintonia com o seu Regimento Interno e a legislação federal e estadual específica. Conforme já mencionado, as principais ferramentas de trabalho do comitê são os Instrumentos de Gestão, principalmente o seu Plano de Recursos Hídricos. De acordo com a Lei Federal 9.433, a Lei Estadual-MG 13.199 e a Lei Estadual – ES 5.818, são as seguintes as principais competências de um comitê de bacia hidrográfica:

- Promover o debate das questões relacionadas com os recursos hídricos e articular a atuação de órgãos e entidades intervenientes;

- Arbitrar, em primeira instância, os conflitos relacionados aos usos dos recursos hídricos;

- Aprovar o Plano de Recursos Hídricos da bacia;

- Aprovar o plano de aplicação dos recursos financeiros arrecadados com a cobrança pelo uso dos recursos hídricos na bacia;

- Aprovar a outorga dos direitos de usos de recursos hídricos para empreendimentos de grande porte e ou potencial poluidor;

- Estabelecer critérios e normas e aprovar os valores propostos para a cobrança pelo uso dos recursos hídricos na bacia;

- Definir, de acordo com critérios e normas estabelecidas, o rateio de custos das obras de uso múltiplo, de interesse comum ou coletivo, relacionados com os recursos hídricos;

- Deliberar sobre propostas para o enquadramento dos corpos d’água, em classes de usos preponderantes, com o apoio de audiências públicas, assegurando o uso prioritário para o abastecimento público (consumo humano);

- Aprovar o orçamento anual da Agência de Água da Bacia na sua área de atuação, com observância da legislação e das normas aplicáveis e em vigor;

- Aprovar o regime contábil da Agência de Água da Bacia, e seu respectivo plano de contas, observando a legislação e as normas aplicáveis;

- Deliberar sobre a contratação de obras e serviços em prol da bacia, a ser celebrada diretamente pela respectiva Agência, observada a legislação licitatória aplicável;

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- Aprovar a celebração de convênios com órgãos, entidades e instituições públicas e privadas, nacionais e internacionais, de interesse da bacia hidrográfica.

6.3 Atribuições da Agência de Águas do Comitê de Bacia (Lei Federal 9.433)

- Prestar o apoio técnico e administrativo ao Comitê da Bacia.

- Atualizar ou elaborar o Plano Diretor dos Recursos Hídricos da Bacia e submetê-lo ao Comitê para sua aprovação.

- Promover o monitoramento sistemático da quantidade e da qualidade da água.

- Elaborar relatórios anuais sobre a situação dos recursos hídricos na bacia.

- Manter o balanço atualizado da disponibilidade dos recursos hídricos da bacia, bem como o cadastro de usos e usuários.

- Efetuar a cobrança pelo uso dos recursos hídricos.

- Manter e operar instrumentos técnicos e de apoio ao gerenciamento da bacia hidrográfica.

- Proporcionar apoio técnico e financeiro aos planos e programas de obras e serviços na bacia, conforme decididos pelo Comitê.

- Promover os estudos necessários para a correta gestão dos recursos hídricos na Bacia.

Como o Comitê e sua agência de águas vão trabalhar? Os principais pilares da administração do Comitê de Bacia serão os instrumentos de gestão dos recursos hídricos, definidos no Cap. IV da Lei Federal 9.433.

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PLANO DIRETOR DAS AÇOES

ASSEMBLÉIA GERAL

REGIMENTO INTERNO

APARATO JURÍDICO

INSTRUMENTOS DE

GESTÃO

DIRETORIA

COMITÊ DE BACIA

HIDROGRÁFICA

AGÊNCIA DE ÁGUA

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7. Instrumentos de gestão dos recursos hídricos

A Lei 9.433 e as leis estaduais de recursos hídricos (no Espírito Santo, a Lei 5.818 e em Minas Gerais a Lei 13.1999) criaram ferramentas de trabalho para os comitês de bacias. São os chamados instrumentos de gestão. Entre eles estão a outorga pelo Poder Público dos direitos de uso da água e um sistema de cobranças. O princípio usado para a cobrança pelo uso da água é do usuário/poluidor- pagador, desenvolvido com sucesso na Europa, especialmente na França. Assim, quem consumir mais água e/ou poluir mais a água, vai pagar mais. Por lei, os valores arrecadados com a cobrança pelo uso dos recursos hídricos serão aplicados, prioritariamente, na bacia hidrográfica em que foram gerados.

Nessa apostila vamos comentar apenas os instrumentos previstos na Lei Federal das Águas, lembrando que os estados possuem outros instrumentos além desses.

- Sistema de informações sobre os recursos hídricos: é um sistema de coleta, tratamento, armazenamento e recuperação de informações sobre recursos hídricos e fatores intervenientes em sua gestão. Ou seja, visa o conhecimento do maior volume possível de dados sobre uma determinada bacia hidrográfica para facilitar a tomada de decisões dos comitês e órgãos gestores. Segundo a lei, a obtenção e produção de dados e informações deve ser descentralizada, mas a coordenação do trabalho deve ser unificada no sistema. O acesso aos dados e informações é garantido à toda a sociedade.

- Enquadramentos dos corpos de água: O enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderantes da água, visa assegurar às águas qualidade compatível com os usos mais exigentes a que forem destinadas e diminuir os custos de combate à poluição das águas, mediante ações preventivas permanentes. As classes de corpos de água são estabelecidas pela legislação ambiental. O enquadramento é feito através de participação da sociedade.

- Outorga de direito de uso da água: O regime de outorga de direitos de uso de recursos hídricos tem como objetivo assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos de acesso à água. Não é uma licença de uso, mas um

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OUTORGA DE DIREITO DE USO DA ÁGUA

ENQUADRAMENTO DOS CORPOS D’ÁGUA SEGUNDO SEUS USOS

PRINCIPAIS

PLANO DE RECURSOS HÍDRICOS DA BACIA HIDROGRÁFICA

SISTEMA DE COBRANÇA PELO USO DOS RECURSOS

HÍDRICOS

SISTEMA DE INFORMAÇÕES SOBRE OS RECURSOS

HÍDRICOS

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documento fornecido pelo poder executivo ( dos estados ou da União) que assegura o direito de uso por um determinado tempo (no máximo 35 anos).

A outorga é necessária para utilização da água de um córrego, riacho, rio ou lago (corpo de água) ou extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo final, inclusive abastecimento público e como insumo de processo produtivo. É necessária também para lançamento de esgotos e outros resíduos líquidos na água; para construção de hidrelétricas e outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água. A outorga só não é necessária quando o uso da água fora para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural ou nos casos em que o uso for considerado insignificante.

Ao outorgar o direito de uso dos recursos hídricos o órgão gestor deve preservar os princípios legais, em especial o do uso múltiplo da água.

- Cobrança pelo Uso de Recursos Hídricos: tem o objetivo de reconhecer a água como bem econômico, conforme estabelecido pela Constituição Nacional. Visa também incentivar a racionalização do uso da água e obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos. Em cada bacia, os critérios para a cobrança são estabelecidos pelo comitê.

A cobrança atinge os mesmos usos da água sujeitos a outorga, ou seja, o consumidor doméstico não está sujeito à cobrança. Quando o consumidor paga a conta de água ele está remunerando o serviço prestado pela empresa para tratar e entregar em sua casa a água potável. Isto não é “cobrança pelo uso da água”.

Os valores arrecadados com a cobrança pelo uso da água deverão ser aplicados na bacia hidrográfica em que foram gerados. Devem ser utilizados no financiamento de estudos, programas, projetos e obras incluídos nos Planos de Recursos Hídricos ou no pagamento de despesas de implantação e custeio administrativo dos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

- Plano de Recursos: faz um planejamento das ações, define as prioridades de uso das águas e também as regras básicas da outorga e as diretrizes e critérios para sua cobrança. É uma ferramenta de trabalho fundamental do Comitê de Bacia e de sua Agência de Águas. Ele envolve aspectos econômicos, sociais, políticos e administrativos que precisam ser discutidos, pois serão determinantes nas intervenções numa bacia hidrográfica.

Normalmente a elaboração de um plano de bacia é contratada num processo de licitação pública que exige a participação da população daquela bacia nas suas diversas etapas. Ao final do processo o plano precisa ser aprovado pela Assembléia Geral do comitê de bacia hidrográfica.

A partir de 2010 a bacia do rio Doce terá seu plano de recursos hídricos. Nosso plano foi elaborado em conjunto com os planos das bacias dos nove principais formadores e afluentes (Piranga, Piracicaba, Santo Antônio, Suaçuí Grande, Caratinga, Manhuaçu, Guandu, Santa Maria do Doce e São José). O Plano Integrado de Recursos Hídricos da Bacia do Rio Doce (PIRH-Doce) é atualmente o principal instrumento de gestão em discussão na nossa bacia (veja reportagem na REVISTA ÁGUAS DO RIO DOCE edição nº 9).

8. O que é o Plano de Bacia?

O PRH – Plano de Recursos Hídricos – é um dos cinco instrumentos de gestão previstos na lei brasileira das águas, a Lei Federal 9.433, juntamente com a outorga de

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direito de uso da água, o sistema de informações, o enquadramento dos corpos d’água e a cobrança pelo uso dos recursos hídricos. Os PRHs são planos de longo prazo que devem conter, dentre outros estudos, diagnóstico da situação dos recursos hídricos em toda a bacia; prognósticos de crescimento demográfico, uso e ocupação do solo; balanço entre disponibilidades e demandas futuras e medidas a serem tomadas, programas a serem desenvolvidos e projetos a serem implantados, além de diretrizes e critérios para alocação de água e cobrança pelo uso dos recursos hídricos.

Mais do que respeitar os preceitos legais, o PRH deve traduzir, de forma clara e abrangente, os anseios e desafios da sociedade de uma bacia hidrográfica, com relação ao uso e à proteção de suas águas, cujas formas de enfrentá-los precisam se ajustar às características físicas, sociais e econômicas da bacia. Por essa razão, não existe uma receita única para a elaboração de um PRH que possa ser adotada para todas as bacias hidrográficas.

Mas, há dois princípios gerais a serem considerados:Negociação - O PRH corresponde a um novo modelo de política pública resultante de negociações entre os múltiplos atores com interesses diversos na área da bacia. Articulação - Um plano deve apresentar e ser resultado de uma sólida proposta de construção integrada. A Lei 9.433, ao confiar ao CBH sua elaboração, procurou dar um peso maior às escolhas políticas do que às técnicas. No caso da bacia do rio Doce, foram dadas condições para participação dos atores envolvidos com a gestão de águas ainda durante a elaboração do documento. As reuniões e consultas públicas possibilitaram a realização de articulações em torno das diversas demandas, conferindo maior legitimidade ao processo.

O PIRH-Doce vai definir o que fazer, quem, como, quando, onde e com que dinheiro.

O seu conteúdo é composto basicamente por:

- Diagnóstico da situação atual dos recursos hídricos na bacia.

- Análise da evolução do crescimento econômico e demográfico regional e seus possíveis desdobramentos na ocupação/uso do solo.

- Balanço entre disponibilidade e demanda atual e futura dos recursos hídricos, além da identificação dos conflitos em potencial.

- Estabelecimento de metas para racionalização do uso e melhoria da qualidade dos recursos hídricos disponíveis.

- Definição de medidas, programas e projetos necessários para alcançar as metas estabelecidas, detalhando inclusive os custos necessários.

- Estabelecimento de prioridades para outorga de direito de uso da água.

- Estabelecimento de diretrizes e critérios para a cobrança pelo uso dos recursos hídricos.

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9. Referências bibliográficas

ALVES, R.F.F & CARVALHO, G.B.B (org.) Experiências de gestão de recursos hídricos. Brasília: M.M.A/ANA/Pró-Água, 2001

ANA. Legislação Básica. Brasília: ANA, 2002. CÁRITAS BRASILEIRA/CPT. Água de Chuva. São Paulo : Ed.Paulinas, 2001 CNRH. Resoluções Normativas Brasília : CNRH, 2002 GUERRA, C.B (COORD.); Expedição Piracicaba 300 anos Depois; Belo

Horizonte : Ed. SEGRAC 2001, MACIEL JR, P. Zoneamento das Águas; Belo Horizonte : IGAM, 2000 MAGOSSI, L.A & BONACELA. Poluição das Águas. São Paulo: Editora

Moderna,1990 ONU (Organização das Nações Unidas); Relatório sobre o Desenvolvimento da

Água. Nova York: ONU, 2003. PAULA, J.A ET ALLI, Biodiversidade, População e Economia; Belo Horizonte:

UFMG- Projeto PADCT/CIAMB, 1997. PROJETO ÁGUAS DO RIO DOCE. Atlas Escolar da Bacia do Rio Doce Volume 1:

Nosso Território, Nossa Gente – Regiões Hidrográficas. Tarumirim: Projeto Águas do Rio Doce

REBOUÇAS& BRAGA&TUNDISI (ORG.) Águas Doces do Brasil. São Paulo: Escrituras, 1999

ROMANO FILHO, D. ET ALLI. Gente Cuidando das Águas; . Belo Horizonte: Mazza Edições, 2002.

TUNDISI, J. GALISIA. A Água no século XXI. São Paulo: IIE, 2003

10.Sugestões de leitura

ADERC .Agenda 21 da Bacia Hidrográfica do Rio Caratinga . Caratinga: ADERC, 2002.

AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS . Diagnóstico consolidado da Bacia do Rio Doce . Brasília: ANA, 2005

DEAN, WARREN. A Ferro e Fogo: A história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. São Paulo: Companhia das Letras, 1996

GUERRA, Cláudio.(org) Expedição Santo Antônio do Mato Dentro . Belo Horizonte: Escritório da Bacia do Rio Doce/Codema de Itabira/SEGRAC, 2001

MME/CPRM - COOPERAÇÃO FRANCO BRASILEIRA. Projeto Rio Doce. Belo Horizonte: MME/CPRM ,1990

PAULA, J. A. et alli. Biodiversidade, População e Economia. Belo Horizonte: Projeto PADCT/CIAMB da UFMG, 1997

PROJETO ÁGUAS DO RIO DOCE. Atlas Escolar da Bacia do Rio Doce: Nosso Território, Nossa Gente – Volume 1: Regiões Hidrográficas. Tarumirim: Projeto Águas do Rio Doce, 3. Ed. 2009

REBOUÇAS & BRAGA & TUNDISI (ORG.). Águas Doces do Brasil: Capital Ecológico, Uso e Conservação. São Paulo: Escrituras, 1999

TEIXEIRA, R. NASCIMENTO(COORD.). O Vale do Rio Doce. Rio de Janeiro: CVRD. 2002

TRIGUEIRO, André (org). Meio Ambiente no Século XXI. Rio de Janeiro: Contexto, 2003

FUNDAÇÃO BIODIVERSITAS. Biodiversidade em Minas Gerais: um Atlas para sua conservação. Belo Horizonte: SEMAD,1998

EMBRAPA. Atlas do Meio Ambiente do Brasil Brasília: Editora Terra Viva, 1996 REVISTA ÁGUAS DO RIO DOCE n.9. Tarumirim: Projeto Águas do Rio Doce, 2009 GUERRA, Cláudio (org). Expedição Piracicaba 300 Anos Depois. Belo Horizonte:

Escritório da Bacia do Rio Doce/SEGRAC, 2001

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11. O Autor: Cláudio Bueno Guerra (curriculum resumido)

Cláudio B. Guerra nasceu em Nova Era, às margens do rio Piracicaba, na bacia do rio Doce. Graduou-se em engenharia pela UFMG e é pós-graduado em Engenharia Ambiental pelo IHE-Delft, Holanda, considerado um dos principais centros de excelência na área de recursos hídricos no mundo.

Como Consultor Ambiental vem trabalhando para instituições como a UFMG, IGAM, UNICEF, UNESCO e ANA. Uma grande parte de seu trabalho foi voltada para a orientação técnica na formação dos Comitês das Bacias dos rios Caratinga, Piracicaba, Santo Antônio e também do rio Doce.

No ano 2000, exerceu o cargo de Secretário de Estado Adjunto de Meio Ambiente do Governo de Minas Gerais.

Nos últimos doze anos, ministrou diversos cursos de Capacitação Ambiental, com ênfase nos Recursos Hídricos, e participou como palestrante em dezenas de seminários, fóruns e conferências sobre Recursos Hídricos, Meio Ambiente e Cidadania, Agenda 21 e também Educação Ambiental em vários estados brasileiros. Participou também como palestrante em conferências internacionais na Holanda (1992 e 2007), Alemanha (1992), Dinamarca (1995), Costa Rica (1998) e Austrália (2007) sobre a questão ambiental e dos recursos hídricos no Brasil. Desde 1998, leciona a disciplina “Novas Abordagens em Educação Ambiental”, no curso de pós-graduação em Educação Ambiental do CEPEMG (Centro Estudos e Pesquisas Educacionais), em Belo Horizonte.É autor/coordenador de dez livros técnicos sobre a questão ambiental em Minas Gerais. Teve inúmeros artigos publicados em revistas como Ciência Hoje, Tempo e Presença, UP DATE (da UNESCO), revista do Aquatic Ecosystem Health and Management Society, Águas do Rio Doce, etc.

Em 2007, teve um reconhecimento internacional de seu trabalho ao receber homenagem da UNESCO na Holanda e ter sua experiência profissional relatada no livro daquela instituição “Water Education for a changing world”.

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