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CURRÍCULO, IDENTIDADE E DIFERENÇA: ARTICULAÇÕES EM TORNO DAS NOVAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA ELIZABETH MACEDO UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 2011-2014

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CURRÍCULO , IDENTIDADE E DIFERENÇA : ARTICULAÇÕES EM TORNO DAS NOVAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

ELIZABETH MACEDO

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

2011-2014

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Currículo, Identidade e Diferença: Articulações em torno das DCN para o Ensino Fundamental

2

ÍNDICE

Resumo das metas atingidas em 3 anos ............................................................................... 3

Resumo do projeto ............................................................................................................... 4

Antecedentes, justificativa e objetivo do estudo .................................................................. 5

Política de currículo como momento instituinte de sentidos ............................................... 10

Identidade sob rasura ........................................................................................................... 15

Marcos Teórico-Metodológicos: desconstruir hegemonias ................................................. 20

Viabilidade e Inserção Institucional .................................................................................... 25

Equipe e plano de atividades ............................................................................................... 26

Cronograma ......................................................................................................................... 29

Referências Bibliográficas ................................................................................................... 30

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RESUMO DAS METAS ATINGIDAS EM 3 ANOS (MARÇO 2008 A JULHO 2010) Foram elaborados os conceitos de currículo como enunciação e de política curricular, assim

como estudados os espaços burocráticos como arenas de negociação política. A produção da

coordenadora do projeto conta com 7 artigos em periódicos (6 qualis A) e 10 capítulos

publicados em livros no Brasil e no exterior. No prelo, há 2 artigos em revistas qualis A, 4

capítulos (1 em Portugal e 3 nos EUA) e 1 livro. Além dessa produção, há artigos, capítulos e

trabalhos completos em anais produzidos por membros da equipe. Foram defendidas 2 teses e 2

dissertações diretamente vinculadas ao projeto e orientados 4 estágios pós-doutorais.

Associaram-se a este projeto um convênio com Portugal (CAPES/GRICES) e um Procad

(UERJ/UFMT/UFPB). Foram publicados, também, textos de divulgação, especialmente

vinculados ao Projeto Prioridades (FAPERJ).

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RESUMO DO PROJETO

Construo este projeto com a noção de currículo como enunciação da cultura com a qual venho

operando em projetos anteriores, a partir da qual defino a política curricular como o movimento

de articulação hegemônica na direção da fixação de sentidos. Para tanto, dialogo,

preferencialmente, com autores como H.Bhabha, S.Hall, E.Laclau e C.Mouffe, assim como com

a filosofia derridiana — importante referência para todos eles. Apoiada em conclusões de

pesquisas anteriores, meu objetivo, neste estudo, é compreender os processos de articulação

política que têm hegemonizado a percepção do currículo como projeção de identidades,

destacando a centralidade que as discussões sobre conhecimento científico vêm assumindo

em tais projeções. Entendendo que o estudo das formas de funcionamento de diferentes

articulações hegemônicas permite o aprofundamento teórico sobre políticas curriculares, trabalho

com as recentes políticas nacionais de produção de novas Diretrizes Curriculares Nacionais

Gerais para a Educação Básica (DCN), com foco no ensino fundamental. A opção por tratar a

temática da identidade em políticas contemporâneas me obriga a tematizar o fato de que elas se

inserem em um contexto de questionamento das fixações identitárias. Em tal contexto, as

identidades não podem mais ser vistas como expressão de entes positivos e previamente

constituídos, mas como uma relação imaginária entre sujeitos que se constituem na própria

prática de identificação, que nunca será completa. Sendo assim, busco entender os

deslocamentos que a hegemonia da idéia de currículo como formador de identidades vêm

sofrendo tendo em vista a ampliação das demandas da diferença, evitando a insustentável

premissa de que as políticas são imunes ao questionamento da fixidez.

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ANTECEDENTES, JUSTIFICATIVA E OBJETIVO DO ESTUDO

Nos últimos dez anos, tenho me dedicado ao estudo das políticas curriculares para o

ensino fundamental no Brasil, problematizando as formas como vêm, especialmente a partir dos

anos 1990, incorporando a temática diferença. Parto do princípio de que a globalização e a

ampliação da utilização dos princípios de mercado, mais fortemente sentidos a partir da segunda

metade do século passado, fizeram as sociedades contemporâneas ressurgir como multiculturais,

termo entendido na acepção de Hall (2003) como qualificativo1. Estou, com isso, aceitando a

argumentação do autor de que a globalização é estruturalmente desigual, mantendo um sistema

assimétrico entre países e dentre os grupos no interior de um mesmo país2. Adoto, igualmente,

sua interpretação de que os princípios de mercado, embora apresentados de forma abstrata —

“sem considerar o envolvimento cultural, político, social e institucional que os mercados sempre

requerem” (p.57) — não escondem o fato de que o desenvolvimento econômico é vivido

diferentemente por todo o mundo. Em resumo, tenho assentado meus trabalhos na perspectiva de

que a multiculturalidade das sociedades contemporâneas é produto de uma globalização que,

desigual, não pode “controlar ou saturar tudo dentro de sua órbita” (p.59). Uma globalização

ambivalente que explicita a inadequação das narrativas homegeneizadoras da modernidade e

abre caminho para que irrompam os particularismos3.

É no contexto do questionamento das narrativas homogeneizadoras que as políticas

curriculares brasileiras introduziram, especialmente a partir dos anos 90, a preocupação com algo

que, a despeito dos diferentes nomes que vem assumindo nas políticas, chamo aqui

genericamente de diversidade cultural. Desde 2002, venho me debruçando sobre os textos

curriculares gerados em âmbito nacional e municipal do Rio de Janeiro (Macedo, 2002 e 2008),

assim como sobre aqueles produzidos no contexto escolar (Macedo, 2005a). Operando com

autores pós-coloniais, especialmente H. Bhabha, procurei, inicialmente, perceber como os textos

curriculares, como enunciações híbridas, buscavam fixar a “construção ideológica da alteridade”

(Bhabha, 2003, p.105), embasando “práticas discursivas e políticas da hierarquização cultural”

(ibid, p.107). Tal trajetória me levou à teoria da hegemonia como formulada por E.Laclau e

1 O autor salienta que este termo só pode ser usado “sob rasura” (p.51), na medida em que à descrição da sociedade como multicultural tem correspondido também um uso do termo como doutrina política para “governar ou administrar problemas de diversidade e multiplicidade gerados pelas sociedades multiculturais” (p.52). 2 Sem esquecer o efeito do fim da Guerra Fria no acirramento dessas assimetrias. 3 Não quero aqui negar o fato de que o questionamento das narrativas homogeneizadoras surgiu em diferentes contextos, reduzindo-o ao fenômeno (econômico) da globalização.

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C.Mouffe (2004), com a qual venho trabalhando no sentido de entender as articulações que

propiciam a construção dos textos curriculares por intermédio de sobredeterminações de

sentidos.

Na teoria do discurso de Laclau e Mouffe (2004), a unidade de qualquer formação

discursiva é garantida pela presença de um significante nodal capaz de criar cadeias de

equivalências que atravessam a lógica diferencial dos sistemas de significação. Isso implica a

contenção dos excessos de sentido que constituem a linguagem e, consequentemente, trata-se de

um ato de poder que fecha, contigencialmente, os sistemas de significação. A compreensão dos

processos (de luta) pelos quais os sentidos são fixados na construção de cada discurso específico

parte, portanto, da identificação dos significantes nodais, cujos sentidos flutuam de modo a

ampliar suas possibilidades de agir como articulador. No caso dos textos curriculares que vim

analisando ao longo das recentes pesquisas, o termo qualidade da educação pareceu-me um de

seus mais fortes articuladores. Tem sido em torno da defesa de uma educação de qualidade que

as propostas curriculares se justificam, ainda que o significado dessa qualidade esteja em disputa.

Tornava-se relevante, portanto, entender como a qualidade da educação vinha hibridizando

fragmentos discursivos vários, constituindo cadeias de equivalências entre demandas distintas, o

que tem sido o foco dos estudos do grupo de pesquisa (Macedo, 2006a, 2006b, 2008, 2009;

Barreiros, 2009; Pontes, 2010; Ramos, 2010; Agostinho, 2007).

Para o projeto atualmente em desenvolvimento, propus a hipótese tentativa de que as

cadeias de equivalência em torno da qualidade têm forte acento universalista, a despeito de as

políticas curriculares explicitarem a preocupação com a diferença. Indo um pouco mais além,

pretendi defender que o fortalecimento das posições universalistas tinha a ampliação social de

demandas da diferença como exterior constitutivo que o estabilizava. Nesse sentido, as políticas

estariam operando para manter a dicotomia centro/margem que tornaria, mais do que possível,

necessária a expulsão de tudo o que não é assente ao sistema de significação, ou seja, da

diferença em si. No desenvolvimento da pesquisa, alguns significantes que preenchiam os

sentidos de qualidade se mostraram também eles flutuantes. Assim, as lutas para o

preenchimento dos sentidos de educação de qualidade apontavam para outros significantes em

disputa, adiando esse preenchimento. A formação do cidadão, do trabalhador, do sujeito local no

mundo global, do consumidor são exemplos de sentidos flutuantes com os quais a idéia de uma

educação de qualidade foi preenchida. Em diferentes textos (Macedo, 2008, 2009, no prelo(a);

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Leite e Macedo, no prelo), busquei entender os processos de flutuação e condensação provisórios

que hegemonizavam alguns desses sentidos em detrimento de outros.

No decorrer dessas análises, instigou-me a percepção de que as cadeias em disputa

tendo em vista o preenchimento da idéia de qualidade partilhavam a referência a uma identidade

projetada. Como primeira hipótese para entender a estreita vinculação entre currículo e projeto

de identidade, aventei o fato de que é próprio do texto político ser normativo com vistas a propor

ou a persuadir seu público alvo de algo. Os textos políticos teriam, por sua natureza, a pretensão

de criar leituras preferenciais (Hall, 2003) que endereçam os sujeitos (Ellsworth, 1997), ainda

que eles sejam, como salienta Ball (1994), paradoxais em seu desejo de controle. Nesse sentido,

interpelariam os sujeitos, tentando posicioná-los em lugares simbólicos como sujeitos sociais de

discursos particulares.

Ao mesmo tempo em que comecei a operar com essa hipótese, percebi que a metáfora

do currículo como projeção da identidade ultrapassava os limites dos textos curriculares de

natureza política, subsidiando boa parte da teoria curricular ocidental. Se os vínculos mais

diretos entre currículo e identidade projetada são compreensíveis e esperados no que Pinar et al.

(1995) denominaram texto institucionalizado4, não são menos visíveis em parte considerável da

teoria crítica e mesmo na teorização de matiz pós-estrutural. Na primeira, estudos do campo da

educação e trabalho (Frigotto, 2007, 2009; Kuenzer, 2006) têm realçado a função da escola na

formação do trabalhador, assim como as perspectivas curriculares voltam-se para a formação do

cidadão crítico (Duarte, 2006; Saviani, 2008). No que respeita aos estudos pós-estruturais do

currículo, em texto seminal, Silva (1999a) o define como práticas culturais de significação que

têm como “um de seus efeitos mais importantes (...) a produção de identidades sociais” (p.25).

Essa conclusão é consolidada no próprio título de obra didática do autor (Silva, 1999b), qual

seja, “Documentos de Identidade”. Esses poucos exemplos, apesar de não esgotarem os sentidos

atribuídos ao termo currículo na teoria curricular contemporânea, são suficientes para indicar a

projeção da identidade como uma importante metáfora, talvez um significante bem mais efetivo

na articulação dos textos curriculares do que aqueles que utilizei nos últimos projetos

4 Aqui não me refiro especificamente ao Brasil, mas ao que parecemos partilhar em termos internacionais como campo de conhecimentos e de práticas. Claro que me exponho em supor um campo do currículo internacional, mas há indícios que julgo suficientes para me arriscar nessa interpretação (ver, por exemplo, os textos reunidos em Pinar, 2003). Especialmente no que concerne ao desenvolvimento curricular, acordos oficiais e diretrizes de organismos internacionais complementam os intercâmbios dos pesquisadores. Não me deterei nela posto que não se trata de algo central para minha argumentação neste projeto.

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desenvolvidos. Em texto inicial, discutido na International Association for the Advancement of

Curriculum Studies (Macedo, no prelo(b)), defendi a posição que sustenta este projeto de que há

um deslizamento entre discursos acadêmico-científicos e políticos5 no campo do currículo e que

a projeção da identidade tem articulado os sentidos de currículo em ambos os textos.

Dois outros aspectos merecem destaque no que respeita às identidades projetadas

como significante nodal. Na atual pesquisa, percebi que esse significante tem sido

preferencialmente preenchido por identidades historicamente apresentadas como universais, tais

como, por exemplo, o cidadão. Ainda que as cadeias de significações em que um significante é

instalado “não possam ser situadas como origens claras ou objetivos últimos” (Butler, 1993,

p.219), toda citação de um significante é uma prática de iteração que explicita que “o significante

político é a sedimentação de signficantes anteriores” (p.220). Nesse sentido, o significante

cidadania, embora reconstruído, traz fortes rastros de uma identidade plenamente constituída,

articulando-os com as demandas particularistas da diferença (Macedo, no prelo(a)). Com tal

articulação, as novas significações tornam-se mais facilmente hegemonizáveis no atual contexto

histórico, mas continuam a operar num quadro essencialista no que tange à identidade (Macedo,

no prelo(a)).

O segundo aspecto relevante aponta para o papel da escola na produção das

identidades projetadas: fundamentalmente, o de garantir o domínio de conteúdos ou, mais

especificamente, dos saberes socialmente acumulados (Duarte, 2006; Saviani, 2008) ou dos

“conteúdos formais das disciplinas científicas” (Moreira, 2004, p.40). Sem entrar aqui nas

cadeias de significação em que se enredam tais significantes, desejo, neste momento, apenas

ressaltar que a vinculação entre projeto identidade e conteúdo opera com a retórica da falta. A

não identidade, no exemplo que venho usando a não cidadania, se estabelece no plano individual

e a identidade do sujeito é representada como algo que lhe é externo e que pode ser por ele

adquirida.

Tais conclusões parciais encontram-se na base deste projeto cujo objetivo é

compreender os processos de articulação política que têm hegemonizado a percepção do

currículo como projeção de identidades, destacando a centralidade que as discussões sobre

5 Entendo os discursos científico-político e acadêmico como expressão de formações discursivas distintas na

acepção atribuida por Foucault (1997)— “um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço e que definem em cada época dada e para cada área social e econômica, geográfica ou lingüística dada as condições do exercício da função enunciativa” (p.35).

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conhecimento científico vêm assumindo em tais projeções. Mantendo a perspectiva, com a

qual trabalho nos últimos projetos, de que o estudo das formas de funcionamento de diferentes

articulações hegemônicas permite o aprofundamento teórico sobre políticas curriculares, escolho

um caso específico para análise. Tal escolha recai sobre as recentes políticas nacionais que

levaram à publicação, em julho de 2010, de novas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para

a Educação Básica (DCN), com foco no ensino fundamental. Trata-se de uma escolha

intencional para a qual considerei, principalmente, o fato de as diretrizes definirem currículo

“como o conjunto de valores e práticas que proporcionam a produção, a socialização de

significados no espaço social e contribuem intensamente para a construção de identidades

socioculturais dos educandos” (Resolução 046, artigo 13, Brasil, 2010b) e explicitarem a

importância do conhecimento nessa construção.

Entendo que a tarefa de desconstruir as hegemonias dos discursos que articulam as

políticas curriculares — com destaque aqui para as DCN — em torno da idéia de um projeto de

identidade é um compromisso fundamental de projetos que, como este, têm a diferença como

foco. A fantasia homogeneizadora presente nessa metáfora aponta para vinculações mais

profundas, sustentadas em perspectivas realistas, que buscam domesticar a diferença como

projeto do mesmo. A definição do que se espera do outro de antemão visa impedir que ele seja

outro em sua plenitude. Claro que, como lembra Derrida (1989), embora a educação só possa ser

assim chamada se permitir ao outro ser um Outro singular, ela não pode prescindir, para se dar

como tal, do reconhecimento desse outro. Isso significa que algum princípio da identidade

enquanto reconhecimento é necessário, mas esse princípio não pode buscar sufocar o sujeito,

retirando-lhe a capacidade de criação, como entendo que a hegemonização da idéia de que o

currículo projeta identidades pode propiciar.

Tendo até aqui apresentado de forma sucinta os aportes teóricos que sustentam a

construção do objeto do estudo, amplio, no restante do projeto, alguns focos que me parecem

centrais. Inicio conceituando política curricular como momento instituinte de sentidos em

articulação com a noção de currículo como enunciação, já desenvolvida em projeto anterior

(Macedo, 2008) e com a qual opero em diferentes textos (Macedo, 2006a, 2006b, 2009, no

prelo(c)). Em seguida, trato, brevemente, a noção de identidade como conceito sob rasura por sua

6 Esta resolução, de 13 de julho de 2010, define as diretrizes curriculares nacionais gerais para a educação básica, com base no parecer CNE/CEB 07/2010, aprovado em 7 de abril de 2010 e publicado no D.O. de 9 de julho do mesmo ano.

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centralidade neste projeto. Por fim, passo à discussão teórico-metodológica, momento em que

explicitarei tanto o método de análise discursiva quanto o corpus de análise da pesquisa.

POLÍTICA DE CURRÍCULO COMO MOMENTO INSTITUINTE DE SE NTIDOS7

Um dos principais desafios com o qual vimos trabalhando no grupo de pesquisa

“Currículo: sujeitos, conhecimento e cultura” é tratar a política de currículo como instituinte de

sentidos em contraposição à idéia de que são atos de força emanados de um poder central

abstrato. Temos defendido que as políticas, mesmo quando assinadas pelo Estado, são

produzidas por sujeitos que constituem uma comunidade política que, segundo Taylor et al.

(1997), envolve tanto burocratas do Estado como acadêmicos, consultores e diferentes grupos de

interesse. Isso implica entender que a política articula um conjunto de sentidos, hibridizando

discursos circulantes, iterando fragmentos de sentidos partilhados por sujeitos que se constituem

nesse processo de articulação. Esse é o movimento que estudos no campo das políticas

educacionais vêm realizando com o suporte da teoria do discurso (Alba, 2003; Burgos Buenfil,

2004; Lopes, 2008a, 2008b, 2010; Lapping, 2007; Leite e Macedo, no prelo e Macedo, 2009, no prelo(a)).

Há algumas armadilhas na compreensão de que a política envolve criação de sentidos

ao mesmo tempo em que (re)itera fragmentos de sentidos partilhados. A mais aguda se alicerça

em posturas realistas que transformam os fragmentos em parte de um algo que, em sua origem,

constituía um todo orgânico. É como se o discurso híbrido que produzimos hoje fosse formado

por fragmentos cruzados de discursos puros reificados. A segunda armadilha a evitar é a tentação

de romantizar o processo político de negociação — diluindo o poder nele envolvido — ou seu

corolário realista (articulado, portanto, com a primeira armadilha), qual seja, a denúncia de que

os fragmentos (re)iterados não detêm o mesmo poder de se legitimar. Subjaz a essas armadilhas,

a percepção do momento instituinte como patchwork.

Tenho fugido de tais armadilhas buscando teorizar o próprio currículo como

instituinte de sentidos num espaço marcado por constrangimentos discursivos incapazes de total

controle (Hall, 2003). Ao invés de currículo como substantivo, como coisa (mesmo que

patchwork), currículo como verbo — como propôs Pinar (2004) com o conceito de currere —,

7 Essa idéia vem sendo desenvolvida em meus dois últimos projetos de pesquisa, de modo que esta seção, ainda que

recupere brevemente um ou outro aspecto desenvolvido nesses projetos necessário à construção da argumentação, não fará referência àquilo que já foi abordado nesses projetos e se encontra desenvolvido em textos publicados em seu âmbito.

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Currículo, Identidade e Diferença: Articulações em torno das DCN para o Ensino Fundamental

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um verbo que só tem gerúndio. É nesse sentido que tenho operado com a noção de currículo

como enunciação8, aproximando currículo, cultura e linguagem numa abordagem que poderia ser

nomeada como pós-estrutural.

Como enunciação, o currículo opera na ambivalência porque está marcado pela

separação entre o Eu enunciado e o Eu da enunciação, o que cria um terceiro espaço. Segundo

Bhabha (2003), esse espaço, “embora em si irrepresentável, constitui as condições discursivas da

enunciação que garantem que o significado e os símbolos da cultura não tenham unidade ou

fixidez primordial e que até os mesmos signos possam ser apropriados, traduzidos, re-

historicizados e lidos de outro modo” (p.68). Como toda enunciação, o currículo reitera traços de

sentidos supostamente partilhados, como “estratégia de representação da autoridade” (p.65), sem

que seus sentidos sejam transparentes ou miméticos. É híbrido porque obrigado a negociar, de

forma agonística e incompleta, seus sentidos com o outro. Hibridiza objetos impossíveis que

criamos por intermédio de uma pretensa diferenciação. Conhecimentos acumulados, culturas

vividas, expectativas de futuro — todos eles também híbridos em sua própria constituição — são

nomeados como entidades controláveis. No entanto, nessa zona de fronteira, tudo o que existe

são, como define Appadurai (2001), fluxos culturais que vamos estancando. O currículo é,

portanto, o diferimento, a fuga, a différance. Institui sentidos provisórios ao articular tradição —

a dimensão pedagógica — a um projeto que, com sua mera existência, nega o já dito (Bhabha,

2003). É, portanto, político.

Nesse sentido, talvez fosse ocioso falar em política curricular, ela é o próprio existir

do currículo como enunciação. Ainda assim, tenho nomeado política curricular o processo de

articulação em torno do poder de significar9 que fixa sentidos preferenciais provisórios em

formações históricas e culturais muito específicas (Hall, 2003). Um processo que poderia ser

descrito como uma signifiXação10, para a qual torna-se necessário excluir um conjunto de outras

possibilidades de significar inscritas na própria prática de atribuição de sentidos como différance.

8 Esta concepção vem sendo trabalhada em meus dois últimos projetos e lá se encontram suas primeiras formulações (www.curriculo-uerj.pro.br), também presentes nos textos Macedo (2009) e Macedo (2006a). Versão mais elaborada se encontra em texto elaborado no âmbito do projeto Curriculum Studies in Brazil, coordenado por W.Pinar (Macedo, no prelo(c)). 9 O mesmo poderia ser feito por intermédio de outros muitos e variados textos curriculares, inclusive os produzidos na prática das escolas. 10 Neologismo de Arnaldo Antunes, que me foi apresentado pela colega Miriam Leite.

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12

Na perpsectiva pós-estrutural11 que venho assumindo e que embasa a idéia de

currículo como enunciação, não é simples discutir a possibilidade mesma de signifiXar. Isso só

se torna possível com o recurso a algo que estanque a proliferação de sentidos possíveis pelo

eterno diferir, um algo que, para evitar recair no realismo, não pode ter nenhuma positividade12.

É nesse sentido que Laclau e Mouffe (2004) têm construido sua teoria da hegemonia para

entender os processos articulatórios que operam na fixação provisória da estrutura. A partir

desses autores, a política curricular poderia ser redefinida como o movimento de articulação

hegemônica na direção da signifiXação de sentidos13.

Conforme já destaquei na seção anterior, a signifiXação é produzida pelo fechamento

contingente da estrutura em torno de um ponto nodal, que Laclau (2008) tem definido como a

objetivação de um vazio. Os pontos nodais são significantes “puros” que atuam no processo de

fixação nodal, o que, em perspectivas essencialistas, seria a essência. A partir do momento em

que surge um ponto nodal, a lógica da diferença que constitui toda estrutura é atravessada por

uma lógica da equivalência, e ambas guardam entre si uma relação de indecidibilidade. Em suas

discussões mais recentes, Laclau (2008) tem defendido que a lógica da equivalência é possível

porque uma demanda excede o que pode ser representado dentro da ordem simbólica, o

equivalente ao Real lacaiano, ou porque há um conjunto de demandas insatisfeitas que passam a

compartilhar a insatisfação. Depende, portanto, de um exterior (constitutivo) que é

“incomensurável com o interior e, ao mesmo tempo é condição para o seu surgimento (Mouffe,

2003, p.29). Algo que é suplementar ao sistema, uma negatividade radical cujo sentido é dado

pela expansão das equivalências que ela mesma propicia.

11 A abordagem pós-estrutural implica ver a estrutura como desestruturada—aberta e descentrada. Essa noção, embora pareça paradoxal, só o é no âmbito de uma geometria euclidiana que pensa o espaço como tridimensional. Na geometria não euclidiana, não podem ser atribuidas ao espaço propriedades fixas, ele não é externo às coisas, mas um dos aspectos das relações entre elas. Ele é constituido de um número infinito de dimensões. Numa representação icônica do conceito, pode-se fazer uso do exemplo do cubismo, em que o espaço é multidimensional, com várias dimensões espaciais interagindo, e condensa diferentes momento da percepção. 12 Se se pensa a estrutura estancada por uma positividade, tem-se uma estrutura estruturada como a definida pelo estruturalismo. 13 Não farei, neste projeto, uma descrição detalhada da teoria do discurso como perspectiva que permite à análise das políticas de currículo, o que constitui parte do projeto anterior (Macedo, 2008), disponível em www.curriculo-uerj.pro.br, e se encontra em outros textos já publicados (Macedo, 2009 e Lopes, 2008a).

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13

Uma signifiXação perfeita seria aquela estabelecida em torno de um ponto nodal que

pudesse articular todas as demandas, um significante totalmente vazio14 capaz de representar a

totalidade. No entanto, como a diferença é constitutiva do sistema e não pode ser eliminada, a

dimensão de antagonismo social é inerradicável. Quanto mais um significante se esvaziar de

sentidos, mais facilmente ele pode assumir a função de representação da totalidade que lhe é

incomensurável, no entanto ele jamais pode deixar de ser uma particularidade. A estrutura não

se constitui como ordem subjetiva ou o simbólico é sempre interrompido pelo Real, de modo

que não é possível falar em signifiXação, mas em signifiXações parciais e contingentes.

A busca por hegemonizar posições a que chamamos política poderia ser descrita como

a tentativa de transformar as signifXações contingentes e parciais em signifiXação universal.

Ainda que uma total hegemonia seja impossível, há estratégias discursivas que permitem uma

hegemonia mais efetiva e duradoura. Há momentos políticos em que se torna possível esvaziar

de tal forma os significantes nodais — de modo a que representem a totalidade — que a

incomensurabilidade entre essa totalidade e a particularidade do significante é obscurecida. Os

discursos míticos (Laclau, 2006) são exemplos em que a particularidade de um significante que

pretende representar a totalidade se confunde de tal forma com ela que seu caráter particular é

praticamente apagado. Eles operam em torno de significantes vazios e sua força está relacionada

à intensidade com que os sujeitos experimentam sentimentos como falta e desordem, à

universalidade e à expansão das cadeias de equivalências que ele propicia. Tais discursos

emergem, assim, para compensar a completude perdida, oferecendo um princípio

(re)organizador para o sistema deslocado e tornando a crise inteligível. Propiciam a

sobredeterminação de demandas dispersas por meio da identificação, de modo que, embora a

objetividade da estrutura continue não podendo ser prevista ou regulada, uma unidade precária e

contingente é criada por condensação. São uma ordem de representação das origens, guardando

aproximações com o conceito de imaginário de Lacan, entendido como horizontes de

inteligibilidade ou, na acepção de Howarth (2000) e Çelik (2000), como uma transformação dos

mitos quando o momento de representação da própria completude se amplia enormemente.

A análise política e histórica de como determinados discursos se transformam em mitos

(ou imaginários) e estabilizam a estrutura deslocada tem sido o objeto de diferentes estudos que

14 Um significante vazio é um “ponto dentro do sistema de significação que é constitutivamente irrepresentável; que, nesse sentido permanece vazio, mas é um vazio que pode ser significado porque é um vazio dentro da significação” (Laclau, 2008, p.136)

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14

se apóiam na teoria do discurso (Howarth, Noval e Stavrakakis, 2000). Tais estudos têm buscado

perceber os caminhos pelos quais determinados significantes centram os sistemas sociais,

constituindo equivalências entre diferentes posições de sujeito e, com isso, reduzindo o

antagonismo social. Envolvem desde hegemonias fracas — em que o antagonismo segue bem

visível, apesar das articulações — a discursos míticos ou imaginários, nos quais o significante

particular assume quase totalmente o lugar do universal, enfraquecendo o antagonismo.

Os discursos que se apresentaram, ao longo dos séculos, como capazes de estabilizar a

estrutura deslocada são vários. Segundo Laclau (1996), a Modernidade mesma operou no

sentido da total eliminação do particular. Uma eliminação visível tanto no etnocentrismo da

expansão imperialista que se apresentava como “função universal da civilização” (p.50) quanto

no privilégio do proletariado15. Além de discursos como os da Modernidade, que se

hegemonizaram como imaginários, muitos outros, articulados em torno de pontos nodais menos

efetivos na tarefa de centração do sistema, vêm buscando, em lutas cotidianas, se universalizar.

As políticas curriculares não são outra coisa senão discursos que visam hegemonizar

posições de sujeito, mascarando o seu caráter particular como forma de apresentá-las como

universais. Sua força é tão maior quanto mais consigam aglutinar, em torno de si, posições de

sujeito diferenciadas. Para tanto, se organizam em torno de significantes com alto potencial de

flutuação a tal ponto que possam chegar a pleitear se esvaziar totalmente. Embora haja alguma

controvérsia sobre o papel das articulações passadas na hegemonia de certos significantes, vou

operar neste projeto, como nos anteriores, com a premissa de que os significantes participam de

cadeias de equivalência em função de seus usos anteriores. Tal premissa se alicerça sobre o

conceito de iterabilidade de Derrida (1988), um princípio de repetição não essencialista,

postulando que todo significante é uma sedimentação de significantes passados, mobilizando

tanto promessas fantasmáticas quanto o novo a cada citação. Esse novo é também estabelecido

com o recurso a convenções passadas investidas do poder de significar o futuro (Butler, 1993).

Assim é que termos como sujeito emancipado, sujeito autônomo, cidadão, trabalhador, que

participam de inúmeras redes que envolvem discursos do imaginário Moderno, ganham força em

virtude desse passado.

15 Aqui cumpre ressaltar que o autor mostra também como a lógica da encarnação, incompatível com a primazia da razão, é reintroduzida no pensamento Moderno, na medida em que a Europa ou a classe operária encarnam uma universalidade.

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15

A força do mito Moderno vem, no entanto, erodindo. As particularidades emergem do

universal e explicitam o antagonismo social adormecido pelo mito. Nas políticas curriculares,

isso não implica que significantes como sujeito emancipado, sujeito autônomo, cidadão,

trabalhador desapareçam, mas apenas que seu caráter particular ganha relevo e que a luta por

hegemonizá-los torna-se mais dura. A metáfora de que o currículo produz identidades continua

presente como significante flutuante (vazio?) em torno do qual se pretende fechar tais políticas,

mas a disputa em torno do significado de identidade passa a estar na ordem do dia. Uma disputa

na qual a força dos discursos fortemente hegemônicos da Modernidade permanece tentando

evitar a proliferação de sentidos, conforme tenho tratado em diferentes textos que abordam a

formação do cidadão nacional e do trabalhador mundial como articuladores do discurso

curricular (Macedo, 2006a, 2006b, 2008, 2009, no prelo(a)).

O enfraquecimento dos mitos explicita o descentramento da estrutura e libera a

proliferação, parcialmente estancada, de sentidos. O antagonismo social retorna a cena de onde

se tentava, sem sucesso absoluto, eliminá-lo. Isso explicita o fato de que a construção de

discursos particulares que se hegemonizam requer uma dimensão de sutura da estrutura, a que

Laclau (1998) denomina de o “momento do sujeito” (p.112). Um sujeito que, interno à estrutura

deslocada, não pode ter sua identidade por ela determinada nem dela apartada. Um sujeito que já

não poderá sentir-se como idêntico a si ou a qualquer sujeito universal. Parece, assim, que o

termo identidade só poderia ser usado sob rasura (Derrida, 2001), um termo que já não significa

aquilo que significava, mas sem o qual não se pode pensar o novo. Passo, então, a explorá-lo

brevemente, na medida em que permanece no centro das políticas curriculares que busco

analisar neste projeto.

IDENTIDADE SOB RASURA

A questão da identidade se põe, neste projeto, em duas facetas articuladas: o sujeito

como aquele que produz política e como aquele que é projetado por seus endereçamentos. Em

ambas, a possibilidade de pensar um sujeito centrado e uno parece esvair-se com o

esmorecimento da Modernidade como imaginário.

De seus escombros, se ergue um sujeito multicêntrico, pluri-identitário, que tem

mantido, em várias manifestações, a idéia de uma identidade plenamente constituida. Uma não,

várias, o que pode redundar no entendimento de cada identidade como um universal em si,

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independente de qualquer mediação com outras identidades. Defende-se, assim, a pura diferença

alicerçada, no entanto, no mesmo princípio que sustentou as identidades universais, qual seja, a

exclusão da diferença. Tal alternativa, num contexto marcado por relações de poder em que a

harmonia entre identidades particulares precisa ser descartada, implica conflito entre tais

identidades e, consequentemente, a necessidade de regras para deliberar sobre tais conflitos. A

menos que assumam uma postura romântica totalmente relativista, as identidades particulares

precisariam buscar legitimar sua particularidade num contexto normativo que estará, dessa

forma, sendo legitimado. Reeditariam, assim, o marco universal (Laclau, 1996).

Não basta, portanto, defender que não há identidades universais ou que toda identidade

se define em contraposição a outras identidades. É preciso ir além, evitando o realismo que

postula a correspondência entre a identidade e um “algo real e específico” que os grupos

partilham. De nada adianta pluralizar este algo ou defini-lo como histórico ou cultural, se se

mantem a perspectiva de que o ato de nomear é apenas uma representação deste algo constituído

antes do processo de representação. Ao contrário, “o jogo da identidade, longe de expressar um

choque de entes positivos, objetivos, plenamente constituídos previamente ao conflito mútuo,

exprime ao mesmo tempo a relação imaginária que se estabelece entre os contendores e a

relação identificatória pela qual o que se é está presente/ausente no outro” (Burity, s/d, p.2). Não

seria, portanto, possível falar em identidade como algo puro e constituído, razão pela qual o

termo identificação tem sido, muitas vezes, preferido na medida em que poderia melhor

explicitar o caráter descentrado da subjetividade16. Nesse sentido, a identidade seria, nas

palavras de Burity (s/d), “um momento instável da prática de identificação” (p.3).

Na primeira de nossas facetas, a produção de fixações provisórias de sentidos (ou de

políticas), como mencionado, só se torna possível pela intervenção do sujeito. O descentramento

da estrutura social, que vem se tornando evidente, exige que se formule uma nova teoria da

decisão, que não pode mais ser reputada a um sujeito previamente constituído nem derivada de

regras criadas pela estrutura. A indecidibilidade habita a estrutura, de modo que qualquer

decisão é um ato de loucura (Derrida, 1992) que busca constituir uma ordem objetiva sem

nenhum fundamento externo que a sustente. Na decisão, a estrutura descentrada é suplementada

por intervenções contingentes que constituem os sujeitos, de modo que o sujeito que decide é

16

Hall (2003) chama a atenção para o fato de que o conceito de identificação pode ser tão enganador quanto o de identidade e que não há uma “carreira semântica preestabelecida” (p.17) que ligue o conceito a um núcleo estável do Eu que se desenvolve sem sobressaltos.

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17

constituido no momento da decisão. Uma decisão ético-política. Aqui é importante realçar que

não se trata de substituir o fechamento objetivo da estrutura por um fechamento subjetivo que

reintroduziria a separação entre estrutura e sujeito que quero evitar. Esse sujeito que decide é

interno à estrutura deslocada — cujo deslocamento não é um enfraquecimento mas uma

ausência radical — e sua incorporação à ordem simbólica demanda identificações sempre

contingentes.

Decidir é fixar sentidos e excluir possibilidade, é a “estabilização de algo

essencialmente caótico” (Mouffe, 2003, p.147). O sujeito procura um significante que possa

expressá-lo dentro da ordem simbólica. Com sua decisão, ele tenta criar a ordem objetiva que

falta à estrutura, mas a ordem simbólica é reiteramente interrompida pelo Real que introduz

perturbações que resistem à totalização (Zizek, 2000). A estrutura permanecerá eternamente

deslocada e o sujeito nunca encontrará um signidicante através do qual possa se expressar.

Assim, o ato de simbolização falha e produz a falta que é precisamente o sujeito: um efeito

retroativo da impossibilidade de sua própria representação (Torfing, 1999). A incorporação do

sujeito à ordem simbólica pode gerar apenas subjetividades concretas criadas por atos de

identificação contingentes. As políticas são, portanto, produzidas por sujeitos, sempre habitados

pela falta, que se constituem no processo de articulação com vista a hegemonizar posições

particulares.

A segunda faceta a ser considerada em relação ao presente projeto refere-se à

identidade como objeto das políticas, ou seja, como forma de as políticas interpelarem os

sujeitos. Alicerçada nas pesquisas que vimos desenvolvendo (Macedo, 2005, 2008), parto do

princípio de que as recentes políticas curriculares no Brasil têm operado majoritariamente com a

concepção de identidade como unidade consolidada, referindo-se, com frequência, a identidades

homogêneas, ainda que plurais. Ao mesmo tempo em que tomo esta afirmativa como verdadeira,

entendo que ela precisa ser problematizada num contexto em que crescem as demandas sociais

pela diferença e em que as concepções realistas são questionadas no plano teórico.

No sentido de perceber o currículo como processo de representação que busca, de

forma ambivalente, construir identidades fixadas, retomo o diálogo com a teoria pós-colonial de

Bhabha (2003). Isso implica, como fiz em Macedo (2006a), conceber o currículo como espaço

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18

de fronteira habitado por diferentes culturas em relação pós-colonial17. A relação “colonial” com

a qual opero neste projeto é a que se estabelece entre a identidade projetada pelo currículo e

aquele estereótipo criado para definir o sujeito antes do processo de identificação que o currículo

pretende promover. Com isso, são as políticas curriculares (dentre outros discursos circulantes)

que criam o Eu e o Outro como realidade social, ambos como identidades estereotipadas e

contrapostas de forma antitética. Assim, o Outro, sujeito de toda a negatividade, é usado para

justificar os processos de subjetivação propostos pelo currículo.

Meu objetivo aqui não é, no entanto, reeditar polarizações do tipo senhor/escravo.

Defendo que os deslocamentos simbólicos operados por múltiplas relações de poder são muitos

e impedem polarizações deste tipo (que só fazem sentido numa perspectiva realista). Minha

pretensão é, ao contrário, entender os processos de identificação tornados possíveis pelas

tentativas de fixação identitárias operadas pelas políticas curriculares. Isso permitiria, ao invés

de simplesmentemente descartar tais fixações como autoritárias, deslocá-las e, com isso,

entender sua produtividade. É esse o caminho que Bhabha (2003) trilha ao estudar o estereótipo

colonial em termos de fetichismo e imaginário e que julgo pode ser interessante para a análise da

pretensão das políticas de fixar identidades.

A definição do estereótipo como fetiche permite que Bhabha (2003) articule de forma

não redutora dominação/prazer, ansiedade/defesa. Apoiando-se em Freud, o autor define o

fetichismo como “um ‘jogo’ ou vacilação entre a afirmação arcaica da totalidade/similaridade

(...) e a ansiedade associada com a falta e a diferença” (p.116). Um jogo entre a metáfora e a

metonímia, entre o mascaramento e o registro da falta, entre, nos termos de Laclau,

equivalência e diferença. Um jogo entre identidades particulares não plenamente realizadas e sua

representação em contexto universal.

O segundo exercício de Bhabha (2003) para compreender o funcionamento do

estereótipo é o de colocá-lo “dentro de seu campo de identificação” (p.119), definido como o

esquema lacaniano do imaginário. Nesse quadro, o estereótipo seria constituido pelas duas

formas de identificação associadas ao imaginário lacaniano, quais sejam o narcisismo e a

agressividade. A imagem do estereótipo enquanto identidade está sempre ameaçada pela falta.

17

Uso aqui a terminologia pós-colonial por ser essa a forma como vêm sendo tratados os autores que buscam analisar as trocas culturais depois de findo o colonialismo político. Trata-se de uma forma de diferenciar a perspectiva híbrida com que entendem o colonialismo dos modelos mais unilaterais de transferência ou mesmo das leituras culturalistas que enfatizavam as resistências das culturas colonizadas. De qualquer forma, entendo, como Bhabha (1999), que o discurso dito pós-colonial expressa a resistência a todas as formas de globalismos.

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19

Articulando o estereótipo como fetiche e como imaginário, Bhabha (2003) postula que há uma

ligação entre a metáfora e o objeto de escolha narcísica, assim como entre a metonímia e a fase

agressiva do imaginário.

A fixidez dos estereótipos que justifica a pretensão do currículo de formar identidades

é, portanto, uma crença dividida. O mascaramento metafórico nunca poderá ser completo porque

encontra-se inscrito em uma falta, sem cuja ocultação não há fixação. O espelho sempre devolve

a imagem do outro alienante ao sujeito. É essa dificuldade que torna necessária a eterna

repetição do estereótipo que, no entanto, nunca poderá ser apenas repetição. As fixações

identitárias que operam nas políticas curriculares precisam, portanto, ser constantemente

reiteradas — cidadão, trabalhador, sujeito autônomo, consumidor — como forma de reiterar o

Outro como aquele que não é nenhuma destas coisas. O que está sendo negando com o

estereótipo, no entanto, é o jogo da diferença em prol de um ato de reconhecimento, este

também constantemente negado por sua re-apresentação.

Embora ambivalentes, as fixações identitárias continuam a operar, buscando

universalizar a representação de identidades particulares não plenamente realizadas. São o

espectro da sistematicidade impossível que segue “perseguindo a estrutura como a presença de

sua ausência” (Laclau, 1998, p.116). A importância de que os mecanismos de controle sobre os

processos de representação, entre eles o currículo, vêm se revestindo na atualidade é função do

fato de a representação vir se constituindo um terreno primário de construção identitária. Com a

proliferação e a circulação de muitos pontos de identificação, a ausência de completude

estrutural — que permitiria falar em identidade plenamente constituida, sem o espectro do outro

— explicita o quanto a representação constitui aquilo que representa. Ou, o papel crucial da

fantasia colonial “nas cenas cotidianas de subjetivação” (Bhabha, 2003, p.125).

A criação de identidades pela representação é, no entanto, apenas um espectro de

sistematicidade, porque a representação segue sendo um suplemento precário e incompleto.

Toda identidade está bloqueada por uma impossibilidade, o outro que impede que a identidade

se concilie consigo mesma, aquilo com o que o sujeito se identifica é o “reverso da sua carência

original” (p.117). Portanto, os atos de identificação criam um outro tipo de identidade que é, ao

mesmo tempo, conteúdo particular e a encarnação da completude ausente do sujeito. Assim,

como o objeto encarnado, mesmo que necessário, é impossível, “não há uma medida comum

entre [ele e] o corpo encarnante” (p.117). O sujeito, como sujeito da falta e da identificação,

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20

nunca poderá ser constituido em identidade completa, a não ser por processos de representação

que suplementam essa falta na identidade do representado e dão origem a identidades híbridas.

Nesse sentido, a identidade como interpelação também precisará ser vista como produzindo

identificações que constroem os sujeitos “como sujeitos suscetíveis de ‘[se] dizer’” (Hall, 2003b,

p.20).

É nesse contexto que a indagação central deste projeto se move buscando entender os

deslocamentos que vêm sofrendo a hegemonia da idéia de currículo como formador de

identidades. Deslocamentos que, em alguns casos, mantem a projeção de uma identidade

consolidada, mas o fazem por meio de articulações que envolvem as demandas pela diferença

(Macedo, no prelo(a)). Não pretendo, portanto, trabalhar com a premissa de que as políticas têm

sido impermeáveis aos questionamentos sobre a fixidez identitária, que, por anacrônica, me

parece insustentável. Ao contrário, quero entender quais os movimentos que, por vezes, parecem

manter antigas hegemonias, mas que se alicerçam em outras muitas articulações.

MARCOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS : DESCONSTRUIR HEGEMONIAS

Conforme já explicitado, proponho, neste projeto, compreender os processos de

articulação política em torno da constituição das DCN, enfatizando a construção de cadeias de

equivalência em torno da idéia de projeção de identidade e sua vinculação com as discussões

sobre conhecimento. No quadro da teoria do discurso, como desenvolvida por Laclau e Mouffe

(2004), opero com a idéia de que é próprio da política “ter regras, convenções e estabilizações de

poder” (Derrida, 1996, p.83), o que, por outro lado, explicita o fato de que as convenções, as

instituições e os consensos são instáveis e caóticos. Apenas, por isso, precisam ser estabilizados

e, também apenas por isso, podem ser desconstruídos.

Do ponto de vista metodológico, operarei com a análise de discurso, entendendo

discurso como “um sistema de práticas de sentido que forma as identidades dos sujeitos e os

objetos” (Howarth e Stavrakakis, 2000, p. 3 e 4) e sua análise como a prática de analisar um

conjunto de signos considerando-os formas discursivas ou textos. Nesse sentido, todo o material

empírico será tratado como texto, na acepção de Derrida (2008) de que “não há nada fora do

texto” (p.11): tudo o que podemos conhecer no mundo tem uma estrutura textual, porque não há

nada que não esteja capturado por uma rede de diferenças e referências.

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21

Em relação aos “métodos” usados nessa análise, a principal referência será às lógicas

da equivalência e da diferença (Laclau e Mouffe, 2004), sem deixar de considerar outras

importantes contribuições a elas articuladas, como a desconstrução (Derrida, 2008) e aspectos da

teoria lacaniana. Trata-se de uma articulação que tem limites, na medida em que as lógicas da

equivalência e da diferença deslizaram de formulações mais pós-estruturais ligadas ao

pensamento de Derrida para uma matriz mais lacaniana. Embora tanto Lacan quanto Derrida

operem com a idéia de que a estrutura é aberta e nunca poderá ser totalmente fechada, a

estruturalidade dessa abertura é compreendida de forma diversa (Smith, 1998). Enquanto Derrida

defende que “a estrutura busca espacializar um campo semântico, (...) objetiva atingir efeitos

totalizadores” (Smith, 1998, p. 79), na teoria lacaniana é o Real que interrompe qualquer

estrutura, o que implica aceitar a existência de “uma lei invariante que opera uniformemente em

todo regime discursivo (Butler, 1993, p.205). Apesar das dificuldades de aproximação dessas

posições, explicitada por Zizek (2000) na oposição entre o sujeito pós-estrutural como excesso e

o sujeito lacaniano como falta, Burity (s/d) defende a articulação considerando a posição do

autor como “preciosista” (p.16). Argumenta que não há excesso ou “riqueza” (p.16) na posição

pós-estrutural porque a noção de posições de sujeito “é ao mesmo tempo busca de suplementação

desta falta (fantasia identificatória) [a falta constitutiva] e fracasso da identificação” (p. 16). É no

seio dessa polêmica que localizo meu desejo de trabalhar com o conjunto dessas contribuições.

Além de uma possível ajuda no entendimento das lógicas da equivalência e da

diferença, o pensamento lacaniano será ainda importante no que diz respeito aos conceitos de

metáfora e metonímia (Lacan, 1994). Em sua análise das lógicas da diferença e da equivalência,

Laclau (2006) defende que os processos de fixação de sentidos em torno de pontos nodais são

metafóricos, na medida em que condensam sentidos em um significante que substitui um

conjunto de outros que lhe são equivalentes. Tal significante, no entanto, somente será

hegemônico quando for capaz de transformar seu caráter particular em universal, num salto

metonímico diretamente vinculado ao processo metafórico. Tais conceitos serão, portanto, úteis

para o entendimento das operações discursivas, podendo levar a uma articulação entre a fixação

das representações (e das identidades) e a noção lacaniana de imaginário18.

18

Bhabha (2003) defende a importância de articulação entre o tropos do fetichismo (metáfora e metonínia) e as formas de identificação disponíveis no imaginário (narcísica e agressiva) ao estudar o sujeito colonial e o estereótipo como tentativa de fixá-lo. Ainda não me é possível, neste momento, articular essa discussão ao foco central deste projeto, mas entendo que se trata de uma articulação que pode vir a ser promissora.

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22

A seleção do material empírico é direcionada pelo caso selecionado, qual seja, a

construção política das recentes DCN para a Educação Fundamental. É sabido que o processo de

gestação de documentos dessa natureza é longo e se dá em diferentes instâncias. Ball (1994), ao

analisar as políticas educacionais, chama a atenção para a existência de cinco contextos inter-

relacionados de produção de políticas — influência, produção de texto, prática, resultados/efeitos

e estratégia política — nos quais diferentes atores buscam hegemonizar posições. No caso das

DCN, tomarei como marco inicial19 das articulações políticas visando à sua construção o Projeto

Currículo em movimento”20 (CEM). Tal projeto foi uma iniciativa do Ministério da Educação,

descrita como um conjunto de ações com o objetivo de

formular uma proposta curricular nacional que [viesse] a compor a base nacional comum do currículo da educação básica e que [pudesse] subsidiar e orientar os sistemas de avaliação nacional, a produção de material didático, a formação de professores, a prática docente, na perspectiva da garantia do direito de todos e de cada um aprender” (MEC/SEB, s/d, slide 35).

O interesse de funcionar como norma, de intervir em todo o sistema, desde o marco

legal ao controle das práticas docentes é, portanto, explícito. Em relação ao marco legal, a

intervenção proposta foi definida no próprio título do documento — “Subsídios para diretrizes

curriculares nacionais específicas da educação básica” (MEC, 2009) —, assim como em sua

descrição: uma “proposta elaborada pela Secretaria de Educação Básica para a atualização das

Diretrizes Curriculares Nacionais específicas da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e do

Ensino Médio” (p.14). Assim, o processo de revisão das DCN pelo CNE foi apresentado como

algo que deveria ser “subsidiado” (p.14) pela União21, o que acabou se concretizando no Parecer

CNE/SEB 7 (Brasil, 2010a).

Além dos documentos “oficiais” produzidos no âmbito do MEC ou do CNE, entendo

que muitos outros textos circulam no processo de construção das DCN. Dentre tais textos,

destacarei os discursos teóricos do campo do currículo (pedagógicos) tendo em vista o escopo

deste projeto e o fato desses textos serem freqüentemente esquecidos nas análises das políticas

19

Não pretendo com essa afirmativa defender que há um momento inaugural da política, mas apenas delimitar meu objeto de estudo. 20

Estou trabalhando com uma concepção ampliada do movimento incluindo os documentos mais diretamente ligados ao projeto e outros que o precederam, mas que nele são reiterados. 21

Trata-se de objetivo semelhante ao dos parâmetros curriculares nacionais, frustrado à época por decisão do CNE em função da pressão do campo acadêmico, especialmente dos estudiosos ligados ao currículo (Faculdade Educação, UFRGS, 1996; Moreira, 1996).

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23

educacionais22. Nesse sentido, completam os textos analisados, discursos teóricos produzidos no

campo do currículo que foram apropriados, explicitamente ou não, seja pelas DCN seja no

desenvolvimento do CEM. Entendo que, em função do deslizamento já citado entre discursos

teóricos e políticos no campo do currículo, esses textos terão, em sua maioria, qualidades

operacionais de textos políticos a despeito de produzidos no âmbito da academia. Esse lócus de

produção, no entanto, lhe garante um maior poder no processo hegemônico posto que lhes

empresta a legitimidade típica dos textos acadêmico-científicos.

A tarefa de seleção de tais textos, embora não seja simples e não possa ser prevista em

detalhes antes do contato com o conjunto do material empírico, é facilitada por uma

característica peculiar do CEM. Diferentemente de outras políticas curriculares “oficiais”, em

que as atividades de consultoria acadêmica geram documentos com autoria coletiva, assinados

pelo Ministério da Educação, parte considerável do que tem sido produzido no CEM é

constituída por documentos assinados. Alguns desses textos, como os cadernos denominados

“Indagações Curriculares”23, além de assinados, guardam muitas aproximações com textos

produzidos por seus autores no âmbito de sua trajetória acadêmica. Ao mesmo tempo, textos

produzidos pelos pesquisadores-consultores foram apresentados em eventos científicos da área e

estes também farão parte do corpus de análise.

A decisão por trabalhar as atuais DCN não implica, portanto, uma seleção restrita dos

textos que comporão o corpus de análise. Ao contrário, optarei, como venho fazendo em outros

projetos, por uma perspectiva inclusiva, na qual será considerado um conjunto de textos com a

pretensão de criar um mapa de discursos em interação e, assim, evitar a idéia de que há um único

discurso político hegemônico em uma dada configuração histórica. A ampliação das fontes

facilita a exploração dos jogos de linguagem envolvidos na luta hegemônica, permitindo que os

discursos dialoguem entre si. Nela, os textos

em sua totalidade e variedade não formam nem um compósito nem um texto exemplar, mas uma estranha contenda, uma confrontação, uma relação de poder, uma batalha entre discursos e através dos discursos. Mais ainda, não se pode descrever [a interseção entre os discursos] como uma única batalha,

22 É comum que os estudos em política curricular centrem-se nos discursos econômicos e políticos que circulam no contexto de influência, descuidando-se da circularidade dos discursos pedagógicos. 23 O material é constituído por 5 cadernos com autoria explicitada: Lima (2007), Arroyo (2007), Moreira e Candau (2007), Gomes (2007) e Fernandes e Freitas (2007).

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porque vários combates separados são travados ao mesmo tempo e intersectam uns com os outros (Foucault, 1975, p.54).

Apesar de, como tem ocorrido em meus outros projetos, o corpus de análise poder ser

ampliado como resposta às questões que forem surgindo durante as análises, passo a uma

descrição sucinta de alguns textos que constituem uma primeira aproximação do objeto:

1. Textos base da política: esses textos incluem basicamente os documentos

produzidos no âmbito do CNE e do MEC no que se refere às recentes DCN.

Englobam o Parecer CNE/CEB 07/10 (Brasil, 2010a) e a Resolução nº 4 do

CNE/CEB (Brasil, 2010b), que versam sobre as diretrizes nacionais gerais para a

educação básica; as gravações/ atas das Sessões em que foram discutidas no âmbito

do CNE; o documento “Subsídios para Diretrizes Curriculares Específicas da

Educação Básica” (MEC, 2009); e a coleção intitulada “Indagações Curriculares”

(nota 24).

2. Outros textos produzidos no âmbito do Estado: além dos textos base, as políticas

produzem um conjunto de outros textos como forma de ampliar sua hegemonia.

Dentre tais textos, pode-se destacar: os textos de propaganda; as notícias veiculadas

na mídia impressa e na rede (www.portal.mec.gov.br); as entrevistas publicadas

com formuladores e membros do governo; o material produzido para professores e

aquele disponibilizado em veículos de divulgação (MEC, 2009); os textos que

circularam quando das discussões com educadores (MEC/SEB, s/d).

3. Textos políticos circulantes nos meios acadêmico-científicos: trata-se dos textos

produzidos no âmbito da acadêmica, ou para ela levados na forma de textos

apresentados em eventos ou publicados em veículos científicos (Veiga-Neto e

Nogueira, 2010). Englobam, especialmente, mas não apenas, a produção de autores

do campo do currículo envolvidos na produção dos documentos curriculares, entre

eles: A.F.Moreira, A.Veiga-Neto, L.Santos, E.S.Barreto, V.Candau. Na medida em

que outras contrinuições, de autores nacionais ou estrangeiras, sejam percebidas nos

documentos, seus textos serão incluidos no corpus de análise, a exemplo do que

tenho feito com a Pedagogia Histórico-Crítica.

4. Entrevistas com formuladores e gestores: de forma complementar, poderão ser

realizadas entrevistas com membros do CNE e do MEC diretamente envolvidos na

formulação da política, assim como com consultores que atuaram no projeto CEM.

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Caso ocorram, as entrevistas serão tratadas como enunciações curriculares

construídas especialmente para a pesquisa. Ainda que todos os demais textos sejam

lidos tendo por base questões colocadas pela pesquisa, entendo que, no caso das

entrevistas, haveria uma diferença, na medida em que a própria produção do texto

seria direcionada pelas questões. De modo geral, as entrevistas teriam por objetivo

re-construir a complexidade dos jogos ideológicos que se estabeleceram no

cotidiano da elaboração dos textos a partir de uma versão, também ideologizada,

das representações dos entrevistados. A seleção dos entrevistados seria realizada

durante a pesquisa, privilegiando-se informantes-chave para o foco do trabalho.

VIABILIDADE E INSERÇÃO INSTITUCIONAL

Este projeto será desenvolvido, como os anteriores, no Programa de Pós-graduação em

Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, na linha de pesquisa denominada

“Currículo: sujeitos, conhecimento e cultura” (www.curriculo-uerj.pro.br). Esta linha se

caracteriza por articular pesquisas no campo do currículo, com destaque para as discussões sobre

políticas e práticas curriculares como processos culturais híbridos, que incluem questões da

diferença, do discurso, do conhecimento, das tecnologias e dos sujeitos educativos. Essas

discussões se dão na interface com os discursos sócio-históricos, pedagógicos e, mais

propriamente, com o pensamento curricular.

Particularmente no grupo de pesquisa de mesmo nome (www.curriculo-uerj.pro.br),

coordenado por mim e por Alice Casimiro Lopes, são desenvolvidas pesquisas diretamente

associadas às investigações sobre política de currículo. Estes projetos são: 1) Discurso e

Representação na Política de Currículo: o caso do ensino médio (2003-2010), coordenado por

Alice Casimiro Lopes e desenvolvido, prioritariamente, com o uso da teoria do discurso de

Laclau e Mouffe; 2) O impacto das reformas curriculares na prática pedagógica, coordenado

por Maria de Lourdes Tura e desenvolvido com base na abordagem do ciclo de políticas de

Stephen Ball e nas discussões sobre cultura escolar e na etnografia; 3) Questões atuais sobre a

formação de professores: a política de formação de professores da Unesco e o projeto principal

de Educação (1981-2001), coordenado por Edil Paiva e desenvolvido com base na abordagem do

ciclo de políticas de Stephen Ball; 4) A diferença cultural no contexto da prática: traduções

possíveis da Multieducação, coordenado por Miriam Soares Leite e desenvolvido com base nos

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estudos culturais de Bhabha e Hall e na teoria do discurso de Laclau e Mouffe; e 5) A pesquisa

em Educação: significados, contradições e intenções do objeto a ser conhecido, coordenado por

Siomara Borba Leite, que investiga o significado atribuído pela literatura destinada à formação

do pesquisador ao processo investigativo e a cada um de seus constituintes. Associam-se, ainda,

os projetos de mestrandos, doutorandos e pós-doutorandos desenvolvidos sob a orientação dos

docentes do grupo.

A ação conjunta desses pesquisadores visa, por intermédio de estudos específicos,

aprofundar a discussão teórico-metodológica sobre a teoria do discurso aplicada ao estudo das

políticas curriculares. Paralelamente, são realizadas atividades de extensão vinculadas às

pesquisas, como por exemplo, palestras e cursos para professores das redes públicas de ensino.

Por fim, cabe destacar que o grupo conta com excelente condições de infra-estrutura,

garantidas pelo Programa de Pós-graduação e pelas verbas recebidas em editais variados pelos

diferentes projetos nele realizados. Essa infra-estrutura inclui sala de pesquisa própria, equipada

com recursos computacionais e audio-visuais atualizados, assim como biblioteca básica de textos

sobre currículo e políticas de currículo e razoável acervo de textos de periódicos. Além disso, a

biblioteca da Universidade conta com numeroso acervo de textos relacionados às pesquisas

desenvolvidas no grupo, adquiridos com verbas de pesquisa.

EQUIPE E PLANO DE ATIVIDADES

As atividades de pesquisa serão realizadas de março de 2011 a fevereiro de 2014, sendo a

equipe formada pela coordenadora da pesquisa, por pesquisadores vinculados, por bolsistas de

iniciação científica e apoio técnico e por mestrandos e doutorandos e pós-doutorandos do

Programa de Pós-graduação em Educação da UERJ.

No momento, a equipe é constituída por:

1. Elizabeth Macedo, coordenadora, professora do Programa de Pós-graduação em Educação da UERJ

2. Rita de Cássia Prazeres Frangella (doutora), professora do Programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação da Baixada Fluminense da UERJ

3. Aura Helena Ramos (doutora), professora do Programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação da Baixada Fluminense da UERJ

4. Débora Barreiros (doutora), pós-doutoranda junior edital conjunto CAPES/FAPERJ

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5. Luciana Velloso (mestre), apoio técnico, bolsista TCT FAPERJ

6. Cassandra Marina Pontes (mestre), bolsista apoio técnico CNPq.

7. Denise da Silva Braga (doutoranda), bolsista CNPq

8. Vagda Gutemberg Rocha (doutoranda), professora da Universidade Estadual da Paraíba

9. Francisca Pereira Salvino (doutoranda), professora da Universidade Estadual da Paraíba

10. Guilherme Augusto Lemos (doutorando), professor da rede estadual do Rio de Janeiro

11. Bonnie Axer (mestranda), bolsista FAPERJ

12. Bianca da Silva Brito, iniciação científica, bolsista CNPq

13. Claudia Almeida Ferreira, iniciação científica, bolsista Pibic CNPq

14. Rafael Correia Dantas, iniciação científica, bolsista Pibic UERJ

COORDENADORA Elizabeth Fernandes de Macedo UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

ATIVIDADES

• Composição da equipe de trabalho • Coordenação das reuniões da equipe • Coordenação da análise bibliográfica • Coordenação das atividades dos membros da equipe • Supervisão do trabalho de bolsistas de IC e dos pós-

graduandos • Coordenação das atividades de campo • Coordenação do levantamento dos documentos a serem

analisados • Coordenação do preparo e da realização de entrevistas • Coordenação da análise dos dados • Coordenação da elaboração do relatório

PESQUISADORES E PÓS-DOUTORANDOS

ATIVIDADES

• Co-coordenação das reuniões da equipe • Co-coordenação da análise bibliográfica • Co-coordenação das atividades dos membros da equipe • Supervisão do trabalho de bolsistas de IC e dos pós-

graduandos • Co-coordenação das atividades de campo • Co-coordenação do levantamento dos documentos a serem

analisados • Co-coordenação do preparo e da realização de entrevistas • Co-coordenação da análise dos dados • Co-coordenação da elaboração do relatório

BOLSISTAS AT

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ATIVIDADES

• Participação nas reuniões da equipe • Acompanhamento da análise bibliográfica • Elaboração de resumos referentes à bibliografia analisada • Participação da análise das informações obtidas e da

elaboração de relatórios • Organização dos processos de divulgação da pesquisa na

home-page (a ser criada) do grupo de pesquisa Currículo: sujeitos, conhecimento e cultura, da UERJ.

• Organização dos arquivos dos materiais do grupo de pesquisa Currículo: sujeitos, conhecimento e cultura, da UERJ.

• Desenvolvimento de projeto inicial de pesquisa correlacionado ao tema deste projeto

BOLSISTAS IC

ATIVIDADES

• Participação nas reuniões da equipe • Participação na leitura e na análise da bibliografia • Elaboração de resumos referentes à bibliografia analisada • Participação na análise dos documentos • Participação na realização de entrevistas • Transcrição de entrevistas • Participação na análise dos dados obtidos e na elaboração

do relatório • Participação na elaboração da home-page para divulgação

de resultados da pesquisa MESTRANDOS E

DOUTORANDOS Alunos regulares do Programa de Pós-graduação em Educação

da UERJ

ATIVIDADES

• Participação nas reuniões da equipe • Participação na leitura e na análise da bibliografia • Elaboração de resumos referentes à bibliografia analisada • Participação na seleção e na análise dos documentos • Participação no preparo e na realização de entrevistas • Participação na análise dos dados obtidos e na elaboração

do relatório • Desenvolvimento de projetos de pesquisa de Mestrado ou

Doutorado correlacionados ao tema deste projeto • Supervisão das atividades desenvolvidas pelos bolsistas de

IC e AT

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CRONOGRAMA

Duração Total: 48 meses (março de 2011 a fevereiro de 2015)

1. Aprofundamento teórico e metodológico (48 meses)

a) Aprofundamento teórico sobre o conceito de diferença e identidade/identificação: estudo da concepção de diferença em Derrida e das discussões sobre identidade e identificação de matriz psicanalítica.

b) Aprofundamento do conceito de currículo e política em abordagem pós-estrutural da teoria do discurso e a partir de Derrida

c) Aprofundamento teórico-metodológico: aprofundamento do estudo da teoria do discurso e da desconstrução com vistas ao aspecto metodológico

2. Estudo de ferramentas de análise de texto (wordsmith, Atlas) e de gêneros textuais (Meses 3 a 10)

3. Seleção do corpus de análise (Meses 6 a 18)

a) Seleção de textos de política ligados às diretrizes curriculares nacionais e ao projeto CEM: legais, de promoção, de divulgação

b) Seleção de textos acadêmico-científicos

c) Produção de textos por meio de entrevistas

4. Análise dos documentos (Meses 9 a 36)

5. Redação de textos para publicação (Meses 6 a 48)

6. Produção de página com resultados da pesquisa (Meses 12 a 48)

7. Redação do relatório (Meses 42 a 48)

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