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Departamento de História CULTURAS HISTÓRICAS, CULTURAS ESCOLARES E PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL: PERSPECTIVAS DE ANÁLISE E DIÁLOGOS NO ENSINO DE HISTÓRIA Aluno: Davi Campino da Fonseca Orientador(a): Juçara da Silva Barbosa de Mello Introdução O estudo que vem sendo realizado diz respeito ao tema do patrimônio (histórico e cultural) e seus possíveis diálogos com o ensino de história na contemporaneidade. A partir da constatação de uma progressiva valorização e intensa proliferação de patrimônios, buscou-se identificar as relações estabelecidas entre este fenômeno recente com a história, a memória e o ensino de história. Estudos e reflexões acerca das mudanças nos modos de conceber e sentir o tempo vem contribuindo para o esclarecimento das relações entre esses domínios. Apesar da confirmação do entrelaçamento de tais domínios, a demarcação de suas especificidades se coloca como requisito fundamental para compreensão dos processos através dos quais se constituem o mundo social. Objetivos O patrimônio cultural e artístico brasileiro aparece como alvo de preocupação na legislação nacional, sobretudo na Constituição do país, patamar máximo normatizador e fim último para as demais normas internas, quanto a necessidade da preservação de tais bens. O texto expresso na carta magna nacional expõe os princípios e as bases da política nacional em relação a este conjunto de bens e é determinante enquanto norteador de como a regulamentação deste setor deverá ser feito nas esferas federal, estadual e municipal, através da legislação infraconstitucional, tanto de forma independente quanto convergente para o fim da proteção. Partindo-se desse princípio está a reflexão acerca dos sentidos e significações atribuídos ao conceito de patrimônio através dos tempos que é parte dos fundamentos da pesquisa, uma vez que na legislação desta temática podem-se observar mudanças de paradigmas em relação ao que é patrimônio e a sua importância histórico-social. Movimento dado em paralelo à verificação do lugar que o tema do patrimônio histórico e cultural ocupa no projeto político e pedagógico e nos Parâmetros Curriculares Nacionais de História (PCNs). Por uma outra chave de análise buscou-se diagnosticar a leitura que os professores possuem sobre a temática do patrimônio histórico e cultural, possíveis relações estabelecidas com conteúdos do currículo escolar de História, e ainda se são e como são vislumbradas as articulações com os temas da memória e da construção de identidades no contexto das aulas. Metodologia A primeira parte do projeto se deu com leituras e discussões concernentes às análises propostas à pesquisa. O projeto político e pedagógico das escolas, com a investigação acerca das condições de sua formulação, planos de curso e planejamentos anuais ou semestrais dos professores de História; entrevistas com os professores; juntamente com o professor, realização de atividades lúdicas com os alunos, envolvendo fotografias de família, objetos e relatos sobre a história familiar e da comunidade e, em menor medida, de leitura e escrita visando diagnosticar aspectos de seu universo cultural.

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Departamento de História

CULTURAS HISTÓRICAS, CULTURAS ESCOLARES E PATRIMÔNI O HISTÓRICO E CULTURAL: PERSPECTIVAS DE ANÁLISE E DIÁ LOGOS

NO ENSINO DE HISTÓRIAAluno: Davi Campino da Fonseca

Orientador(a): Juçara da Silva Barbosa de Mello

IntroduçãoO estudo que vem sendo realizado diz respeito ao tema do patrimônio (histórico e cultural) e

seus possíveis diálogos com o ensino de história na contemporaneidade. A partir da constatação de uma progressiva valorização e intensa proliferação de patrimônios, buscou-se identificar as relações estabelecidas entre este fenômeno recente com a história, a memória e o ensino de história. Estudos e reflexões acerca das mudanças nos modos de conceber e sentir o tempo vem contribuindo para o esclarecimento das relações entre esses domínios. Apesar da confirmação do entrelaçamento de tais domínios, a demarcação de suas especificidades se coloca como requisito fundamental para compreensão dos processos através dos quais se constituem o mundo social.

ObjetivosO patrimônio cultural e artístico brasileiro aparece como alvo de preocupação na legislação

nacional, sobretudo na Constituição do país, patamar máximo normatizador e fim último para as demais normas internas, quanto a necessidade da preservação de tais bens. O texto expresso na carta magna nacional expõe os princípios e as bases da política nacional em relação a este conjunto de bens e é determinante enquanto norteador de como a regulamentação deste setor deverá ser feito nas esferas federal, estadual e municipal, através da legislação infraconstitucional, tanto de forma independente quanto convergente para o fim da proteção.

Partindo-se desse princípio está a reflexão acerca dos sentidos e significações atribuídos ao conceito de patrimônio através dos tempos que é parte dos fundamentos da pesquisa, uma vez que na legislação desta temática podem-se observar mudanças de paradigmas em relação ao que é patrimônio e a sua importância histórico-social. Movimento dado em paralelo à verificação do lugar que o tema do patrimônio histórico e cultural ocupa no projeto político e pedagógico e nos Parâmetros Curriculares Nacionais de História (PCNs).

Por uma outra chave de análise buscou-se diagnosticar a leitura que os professores possuem sobre a temática do patrimônio histórico e cultural, possíveis relações estabelecidas com conteúdos do currículo escolar de História, e ainda se são e como são vislumbradas as articulações com os temas da memória e da construção de identidades no contexto das aulas.

MetodologiaA primeira parte do projeto se deu com leituras e discussões concernentes às análises

propostas à pesquisa.O projeto político e pedagógico das escolas, com a investigação acerca das condições de sua

formulação, planos de curso e planejamentos anuais ou semestrais dos professores de História; entrevistas com os professores; juntamente com o professor, realização de atividades lúdicas com os alunos, envolvendo fotografias de família, objetos e relatos sobre a história familiar e da comunidade e, em menor medida, de leitura e escrita visando diagnosticar aspectos de seu universo cultural.

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Estão sendo realizadas, paralelamente aos procedimentos acima, leituras sistemáticas dos Parâmetros Curriculares Nacionais de História, dos ensinos fundamental e médio, bem como de recente literatura dedicada ao tema, o que também será feito no que tange ao patrimônio histórico e cultural. Sobre este último tópico estão sendo analisados o processo histórico de transformações em sua concepção e em suas utilizações, a implementação de políticas públicas voltadas à valorização e preservação de bens patrimoniais e os conflitos de interesses que subjazem a tais políticas.

O cruzamento das informações resultantes desses procedimentos de pesquisa, ainda em curso, permitirá a definição dos fundamentos teóricos e empíricos necessários à elaboração de propostas para inserção da educação patrimonial no projeto político pedagógico, visando sua adoção de acordo com as reais condições existentes, tanto no que diz respeito à consideração das referências culturais de alunos e professores, quanto aos recursos materiais disponíveis.

A metodologia utilizada para a reflexão acerca do conceito de patrimônio vem se traduzindo pela leitura de textos teóricos escritos por autores de renome na área, dentre os quais o francês Dominique Poulot, Françoise Choay ,Cecília Londres, entre outros. De modo semelhante, ou seja, por meio da leitura e do debate, vem sendo realizadas as análises dos Parâmetros Curriculares Nacionais e do Projeto Politico e Pedagógico.

Para chegar ao diagnóstico a respeito da leitura que professores do ensino básico possuem sobre a temática do patrimônio, e de suas utilizações no ensino de história, vem sendo realizados encontros (seminários), nos quais tais professores vêm sendo provocados a refletir e expressar verbalmente e por meio de respostas objetivas a um questionário previamente preparado para este fim.

Foi firmada uma parceira com o Instituto de Educação Carmela Dutra. A escola está localizada no Bairro de Madureira, no Rio de Janeiro, e possui, ela mesma, um enorme potencial para patrimonialização, uma vez que está em funcionamento há mais de meio século, trabalhando na formação de professores do primeiro segmento. Até o momento foram realizadas quatro oficinas com os professores que irão coordenar a pesquisa dos alunos na inventariação do patrimônio já institucionalizado do bairro, como breves exemplos: Mercadão de Madureira, o Jongo da Serrinha e a capela de São José da Pedra; e daqueles que a comunidade escolar entende e apreende com potencial para tal.

Ilustração 1: Reunião na PUC.

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Implementações e Resultados ParciaisAtualmente, o projeto está sendo dividido em duas partes: uma teórica, com a discussão dos

textos de Daher, Simmel e Poulot, em que se discute o conceito de razão patrimonial, e seus aspectos financeiros e sociais, suas definições e sua imposição (Poulot, 2009), a valoração das cidades e os sentimentos de apatia por parte da população aos monumentos (Simmel, 2005), e quais os modelos e conceitos que influenciaram a visão patrimonial brasileira, e nos faz pensar sobre o dilema: Tudo é patrimônio? E há um limite para isso? (Daher, 2012) e a outra de conteúdo prático, considerando-se a relação sempre recíproca entre esses domínios. Ainda quanto a primeira parte, deu-se continuidade ao contínuo aprofundamento da compreensão do que é o patrimônio e a melhor abordagem para introduzir o tema em sala de aula para os alunos.

Enquanto a parte prática consiste em visitas de campo junto aos acervos do IPHAN, hemeroteca da Biblioteca Nacional, para pesquisa documental; entrevistas com moradores. Outra ação executada é o comparecimento a seminários relativos ao tema, como a ANPUH, onde foi apresentado o trabalho “DA EDUCAÇÃO EM HISTÓRIA E PATRIMÔNIO”, no qual é discutido alguns pontos sobre a legislação brasileira com relação a salvaguarda do patrimônio nacional. O seminário ocorreu em agosto de 2014. Também houve a participação do XI encontro regional do Sudeste de História oral, sediado na UFF entre os dias 08 a 10 de julho de 2015, onde além de participar dos debates e do minicurso intitulado “Educação, memória e patrimônio imaterial: projetos de história oral em escolas e instituições”, também foi apresentado o trabalho “Culturas históricas, culturas escolares e patrimônio histórico e cultural: perspectivas de análise e diálogos no ensino de história”, por mim, Davi Campino, em parceria com a colega de pesquisa Thaís Sangineto de Carvalho.

Além disso, houve também a visita ao Quilombo Santa Rita do Bracuí em outubro, ainda em 2014, onde tivemos contato com a história oral, ouvindo relatos de remanescentes quilombolas sobre suas origens e lutas pelo reconhecimento e valorização de seu patrimônio cultural e, ainda, interagindo em rituais de memória, como a prática do jongo.

Ilustração 2: XI encontro regional do Sudeste de História oral, dia 09/07/2015 na UFF, da direita para a esquerda, Thaís Sangineto de Carvalho , ex-aluna PUC e voluntária no projeto, e eu, Bolsista do PIBic.

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Houve continuidade do trabalho desenvolvido no Instituto de Educação Carmela Dutra, com a implementação do projeto de montagem de um laboratório de História, Memória e Patrimônio cultural e a participação na Semana da Normalista, evento promovido anualmente pela instituição de ensino, ocasião em que se trabalhou diretamente com o corpo discente, o que é pertinente a essa pesquisa.

Conclusões ParciaisAtualmente estamos terminando o segundo ano da pesquisa. Iniciamos o primeiro ano a

partir do questionamento em relação ao tema do patrimônio cultural e o local ocupado, por ele, nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), e pela análise do Projeto Politico e Pedagógico de uma

Ilustração 3: Visita ao Quilombo Santa Rita do Bracuí, momento de arregimentação para o Jongo.

Ilustração 4: Semana da Normalista Outubro de 2014.

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das escolas visitadas à época e os desdobramentos através da leitura e debate de bibliografia pertinente; levantamento em órgãos públicos, como IPHAN E INEPAC, de bens patrimoniais (materiais e imateriais) que pudessem ter alcance no âmbito das comunidades escolares pesquisadas.

Também foram organizados seminários nas escolas com as quais foram feitas parcerias. Foi firmada uma parceria com um grupo de professores do Instituto de Educação Carmela Dutra, com os quais temos tido encontros em que buscamos pensar sobre o patrimônio já institucionalizado ou sobre referências culturais da comunidade do bairro de Madureira e adjacências. O que se apurou é que ainda há uma ideia de que o patrimônio é formado apenas por monumentos e construções, o patrimônio como “pedra e cal”.

Depois de iniciadas as pesquisas com o corpo docente da escola, passamos para o corpo de alunos, verificamos o desconhecimento do assunto por parte dos mesmos. Adotamos como estratégia a elaboração de um laboratório de pesquisa patrimonial, que contará com a participação de alguns alunos, de duas formas: Primeiro na posição de pesquisadores, avaliando os itens que já foram patrimonializados como sendo de alguma relevância para a comunidade e nos indicando o que deveria constar nessa lista, mas ainda não foi contemplado. E por último como propagadores da pesquisa no ambiente sócio escolar.

Necessário se faz ressaltar que nutro grande interesse nos temas abordados nesta pesquisa (identidade, patrimônio e o bairro de Madureira), pois se coadunam com minha pretensão acadêmica de estudo do baile charme do Viaduto Negrão de Lima como formador de identidade, espaço de memória e resistência.

Parte do referencial inicial para este projeto é a música, meio pelo qual o sujeito formula e expressa a sua individualidade, uma vez que a letra pode narrar a sua história de vida, seus ideais, sonhos e crenças. Tanto a música, quanto a dança, podem influenciar sobre os comportamentos e situações da vida cotidiana, e assim, na construção da identidade do indivíduo; podendo ser dividida em duas formas, a primeira, a música e/ou na dança na identidade; e a segunda, a identidade na música e/ou na dança.

Ilustração 5: Última reunião na PUC em 2014.

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Referências

1 - ABREU, Martha. Cultura imaterial e patrimônio histórico nacional. In: ABREU, Martha; SOIHET, Rachel; GOTINJO, Rebeca (orgs.). Cultura política e leituras do passado: historiografia e ensino de história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007, p. 351- 370.

2 - BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais (5ª a 8ª). Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC, 1998.

3 - BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais (Ensino Médio). Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Brasília: MEC, 2000.

4 - CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. 3ª edição, São Paulo, Estação Liberdade , 2006.

5 - DAHER, Andrea. Objeto cultural e bem patrimonial. Revista do Patrimônio Histórico e

artístico nacional. Brasília, vol. 34, 2012, pp. 113 -129.

6 - HARTOG, François. Presentismo pleno ou padrão?. Regimes de historicidade: presentismo e

experiências do tempo. S/ ed, s/ local, Ed. Autêntica, s/ ano.

7 - HUYSSEN, Andreas. Seduzidos pela memória: arquitetura, monumentos, mídia. 2. ed. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2004.

8 – NORA, Pierre. Between Memory and History: Les Lieux de Mémoire. Representations, California, Vol. 26., 7/ 24, Primavera, 1989.

9 - POULOT, D. Cultura, História, valores patrimoniais e museus. Varia História , Belo Horizonte, vol.27 no.46, 471/ 480, jul./dez. 2011.

10 - ______. Uma história do patrimônio no ocidente, séculos XVIII-XXI. 1ª Ed., São Paulo, Estação Liberdade, 2009.

11 - SIMMEL, Georg. As grandes cidades e a vida do espírito (1903), Mana