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TEMA 70 R.TEMA S.Paulo nº 42 jan.2003 P.74-93 Autor e Texto Author - Text Zenaide Bassi Ribeiro Soares * * Doutora em Comunicação e Artes. Diretora da Revista TEMA. BRAZILIAN CULTURE: POPULAR ARTISTIC EXPRESSIONS OF BRAZIL CUL CUL CUL CUL CULTURA BRASILEIRA TURA BRASILEIRA TURA BRASILEIRA TURA BRASILEIRA TURA BRASILEIRA: EXPRES : EXPRES : EXPRES : EXPRES : EXPRESSÕES SÕES SÕES SÕES SÕES ARTÍSTICAS POPULARES DO BRASIL ARTÍSTICAS POPULARES DO BRASIL ARTÍSTICAS POPULARES DO BRASIL ARTÍSTICAS POPULARES DO BRASIL ARTÍSTICAS POPULARES DO BRASIL Este trabalho trata da elaboração cultural, no Brasil, a partir da colônia, mostrando o vigor das artes populares, especialmente o carnaval, e seu conteúdo crítico. PALAVRAS-CHAVE RESUMO ABSTRACT KEY WORDS This work approaches of the cultural elaboration, in Brazil, starting from the colonial period, showing the energy of the popular artistic expressions, especially carnival, and their critical messages. Povos. Música. Dança. Carnaval. Cultura brasileira. People. Music. Dance. Carnival. Brazilian culture.

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TEMA 70

R.TEMA S.Paulo nº 42 jan.2003 P.74-93

Autor e TextoAuthor - Text

Zenaide Bassi Ribeiro Soares*

* Doutora em Comunicação e Artes. Diretora da Revista TEMA.

BRAZILIAN CULTURE: POPULAR ARTISTIC EXPRESSIONS OF BRAZIL

CULCULCULCULCULTURA BRASILEIRATURA BRASILEIRATURA BRASILEIRATURA BRASILEIRATURA BRASILEIRA: EXPRES: EXPRES: EXPRES: EXPRES: EXPRESSÕESSÕESSÕESSÕESSÕESARTÍSTICAS POPULARES DO BRASILARTÍSTICAS POPULARES DO BRASILARTÍSTICAS POPULARES DO BRASILARTÍSTICAS POPULARES DO BRASILARTÍSTICAS POPULARES DO BRASIL

Este trabalho trata da elaboração cultural, no Brasil, a partir da colônia, mostrando ovigor das artes populares, especialmente o carnaval, e seu conteúdo crítico.

PALAVRAS-CHAVE

RESUMO

ABSTRACT

KEY WORDS

This work approaches of the cultural elaboration, in Brazil, starting from the colonialperiod, showing the energy of the popular artistic expressions, especially carnival, andtheir critical messages.

Povos. Música. Dança. Carnaval. Cultura brasileira.

People. Music. Dance. Carnival. Brazilian culture.

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Zenaide Bassi Ribeiro Soares

O

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“Quero meu Brasil jogando limpo,dando um xeque-mate na corrupção,um xeque na impunidadee a bateria sacudindo a multidão”

Xeque-mate Gaviões da Fiel Torcida

Campeã do Carnaval Paulista de 2002

processo de elaboração cultural brasileiro é marcado, emsuas origens, pelo encontro dos três grupos que, nos

primórdios da colonização, aqui entraram em contato: o indí-gena, o português e o africano. Cada um desses grupos traziauma cultura heterogênea, que apresentava variados níveis. Seusvalores e expressões culturais aqui se mesclaram, sob a influ-ência do meio e os imperativos da nova sociedade que se for-mava, originando uma produção nova marcada pelosincretismo em suas formas, linhas, cores, sons, ritmos, temas,expressão vocal, postura e movimento.

Conforme transcorria o processo de ocupação econômi-ca da terra, determinados grupos marcavam de forma maisacentuada seus traços culturais e até o tipo físico de seus habi-tantes, como ocorreu, por exemplo, no Piauí. O elemento bási-

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co, porém, em todo o processo transculturativo era o lusitano,dada sua condição de dominador, dispondo da força e do bene-fício de uma tecnologia muito mais complexa.

Grupos imigrados - grandes contingentes, sobretudo a par-tir do século XIX, que incluíam alemães, italianos, russos, polo-neses, sírios, libaneses - e mais recentemente japoneses - trou-xeram novos elementos ao nosso processo de elaboração cul-tural. Desse intenso relacionamento, e de acordo com as con-dições geo-econômico-sociais das diferentes regiões do Bra-sil, as manifestações culturais foram adquirindo formas regio-nais de apresentação bem diversas entre si, como as do va-queiro encourado do Piauí ou do vaqueiro gaúcho, no sul; comoas danças aos pares em Porto Alegre, antigo Porto dos Casais,ou a dança solitária dos catireiros paulistas - só homenspalmeando e sapateando ao som da viola, nas antigas rotassertanejas dos bandeirantes.

Nenhum dos grupos formadores do povo brasileiro era“puro”. Os portugueses apresentavam-se como descendentesde um grupo étnico de origem desconhecida e que vivia naregião atualmente ocupada por Portugal. Através de invasõessucessivas foi esse povo cruzando-se com os celtas, os roma-nos, os árabes. No século XVI, grandes contigentes de escra-vos negros entraram em Portugal, ao mesmo tempo que o fluxomigratório de vários países ocorria de forma intensa.

Os primeiros brancos vindos para o Brasil aqui se ligaramsexualmente às indígenas, já que somente em 1551 chegaramas primeiras mulheres portuguesas.

Habitantes brancos do Brasil, em seus primeiros tempos,eram os degredados. E quem eram os degredados? Eram aque-les que, em Portugal, descriam de Deus ou dirigiam injúrias aossantos; os que resistiam às autoridades, os jogadores, os men-tirosos e desocupados. Os assassinos ficavam em Portugal, va-lendo-se do direito de homízio nos valhacoutos.

Com os portugueses vieram os romances, os recortados,xácaras e reisados. As trovas, as festas do ciclo do Natal, asdanças de São Gonçalo, cantigas de roda e de ninar.

Os religiosos, vindos para a missão da catequese, logo

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imaginaram que seria fácil induzir os índios a aceitarem a dou-trina cristã, mas logo se decepcionaram, observando que “porqualquer cousa leve a tornam a deixar e muitos fogem para osertão depois de batizados e instruídos na doutrina Christã”,segundo informa Gandavo. Por causa disso, os jesuítas não sepreocuparam mais em implantar a fé nos adultos, tratando de“em especial plantá-la em seus filhos”.

Mil e uma técnicas usaram os padres para impor o cristi-anismo aos indígenas: danças, músicas, dramatização, mode-lagem em barro, tudo foi usado como recurso motivador dacatequese. Por outro lado, foi o branco impregnando-se de tra-ços culturais indígenas, como a crença em sacis, boitatás ecurupiras. O próprio Anchieta referia-se aos demônios curupirasque, nos matos, açoitavam, machucavam e matavam os índios;e ainda invocava, para o fato, o testemunho de “nossos Irmãosque viram algumas vezes, os mortos por eles”.

Do legado cultural do índio, além da crença em figurasmitológicas, habitantes das matas e das águas, vivificadas noscontos populares e nas modas de viola, restaram instrumentosmusicais como o chocalho, os bastões de ritmo, a dança comoauxiliar da magia ou danças guerreiras, fúnebres ou

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propiciatórias. Mário de Andrade considera, além de outroselementos, o movimento oratório da melodia, o canto nasalizadocomo de origem indígena. A música dessa origem é classifica-da por Batista Siqueira como “unitônica”.

A presença cultural indígena imprimiu-se em determina-dos gestos, costumes e posturas dos neo-brasileiros. Marcoutécnicas agrícolas e hábitos alimentares. Mas sua influência namúsica brasileira é pequena, em virtude da atuação dos jesuí-tas e do aniquilamento pela escravidão. Não só na música foipequena a influência. Gilberto Freyre, falando sobre os padrõesde valores impostos pelos jesuítas aos selvícolas, que levaramao abastardamento de sua cultura, afirma que “o que se salvoudos indígenas do Brasil foi a despeito da influência jesuíta; pelogosto dos padres não teria subsistido à conquista portuguesasenão aquela parte mole e vaga da cultura ameríndia por elesinteligentemente adaptada à teologia de Roma e à moral euro-péia. Nem podia ser outra a sua orientação de bons e severossoldados da Igreja; tocados mais que quaisquer outros da vo-cação catequista e imperialista. O imperialismo econômico daEuropa burguesa antecipou-se no religioso dos padres S.J, noardor europeizante dos grandes missionários católicos dosséculos XVI e XVII, depois substituídos pelos presbiterianos emetodistas - estes ainda mais duros que os jesuítas. Com a se-gregação dos indígenas em grandes aldeias, parece-nos te-rem os jesuítas desenvolvido no seio das populações aborígenasuma das conseqüências letais mais profundas. Era todo o rit-mo de vida social que se alterava nos índios. Os povos acostu-mados à vida dispersa e nômade sempre se degradam quan-do forçados à grande concentração e à sedentariedade absoluta”.

Foi no momento em que se desenvolveram no país a agri-cultura e a mineração que se fez necessário o elemento negro.O indígena, vivendo numa sociedade comunal, sustentando-seda coleta, caça e pesca, não possuía qualificações para atuardentro do cenário econômico, que se transformava, moldadoem padrões europeus. As populações africanas, porém, já es-tavam habituadas à agricultura e conheciam, inclusive, a es-cravidão dentro de algumas tribos. O indígena seria aproveita-

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do parcialmente na expansão da pecuária nordestina, prepon-derando, através de cruzamentos com outros grupos étnicosaté estabelecer, nessa zona, um tipo antropológico relativamen-te uniforme, como ocorreu, por exemplo, no Piauí.

Os grupos negros que vieram para o Brasil foram, segun-do Nina Rodrigues e Arthur Ramos, os sudaneses e os bantos.Os primeiros, originários da região norte do Golfo da Guiné,apresentavam grupos islamizados, como os haussás, os tapas,os mandingas, os fulás - e grupos não islamizados, como osnagôs, os gêges, os achantis.

Os bantos eram oriundos do litoral oeste da África e deMoçambique, e marcaram fortemente a cultura brasileira.

Nem todos os negros vindos para o Brasil conheciam aescravidão na África e a pretensa docilidade e submissão docativo é fartamente desmentida pelas constantes insurreiçõese lutas individuais. Edson Carneiro ressalta a capoeira, inicial-mente como diversão do negro angolano, transformando-sedepois em sua arma e que “se revelou a sua melhor maneira dese afirmar individualmente na sociedade e de sobreviver”. Afir-ma que a “luta de Angola” é uma diversão que propicia grandesatisfação interior, que afaga a vaidade dos contendores, queos transformam em heróis perante os assistentes, constituin-do-se numa exaltação do indivíduo. E adverte que se pode fa-cilmente calcular como esta exaltação do indivíduo devia estarem oposição ao regime escravista.

Os nagôs trouxeram Iemanjá para os candomblés da Bahia,além de Exu, lfá e outras divindades, hoje tão populares no paíscomo os santos do catolicismo.

Com os escravos vieram técnicas de briga, feitiços de amor,segredos de cozinha e modismos lingüísticos. O negro influenciouprofundamente na formação de danças e cantos. Trouxe, também,instrumentos musicais que se incorporaram em nossa orquestrapopular. Mas o negro, além de sua força de trabalho, trouxe desta-que social para o seu senhor. Possuir escravos conferia prestígio,indicava capacidade de produzir para atender à demanda domercado externo, que se alargava.

O estabelecimento da escravidão veio subverter, em suas

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bases, o regime de trabalho até então dominante, cindindo a soci-edade colonial em duas classes fundamentais e antagônicas: umaconstituída pelos senhores de escravos, ligados economicamen-te - em face do monopólio comercial - à Metrópole; outra constitu-ída pela massa escrava, inteiramente despojada de bens materi-ais, que formava a população do Brasil-Colônia.

Nas relações entre senhores e escravos logo se definiramos papéis: cabia ao branco a autoridade e ao negro a submis-são, a obediência, a fidelidade. As expectativas, porém, nemsempre eram cumpridas. Ao esforço de dominação, opunha onegro sua resistência cultural, mantendo-se fiel às tradiçõesde seu grupo de origem; aos maus tratos recebidos, reagia comfugas, crimes, levantes.

Antonil recomendou aos senhores que não negassem to-talmente aos negros os seus folguedos, “único alívio de seu ca-tiveiro”, sugerindo que não estranhassem “o criarem seus reis,cantar e bailar por algumas horas, honestamente, em algunsdias do ano”. Ao mesmo tempo, desaprovou o tratamento crueldispensado aos escravos, dizendo, a respeito dos fujões, quese fossem apanhados, poderiam praticar o suicídio antes deserem açoitados ou que “algum parente tome à sua conta avingança, ou com feitiço ou com veneno”.

Durante o regime escravista, a fuga passou a ser um dos me-canismos de protesto mais utilizados pelos negros. Para capturaro fujão, os senhores recorriam ao capitão-do-mato. Este costuma-

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va esgueirar-se pelos campos, à beira das estradas ou no meiodos canaviais ou do cafezal, a fim de ouvir as conversas dos cati-vos, na esperança de surpreender alguma informação sobre osnegros fugidos ou comentários desairosos ao fazendeiro. É fácilimaginar a intensidade do antagonismo surgido entre o persegui-dor e o cativo. Esta dramática questão reapareceu, registrada numbatuque estudado por Afonso Dias, em Tietê. Conta o folcloristaque alguns negros mais espertos, pressentindo a aproximação doscapitães-do-mato, cantarolavam trovas sob o tema “Tatu Pombi-nho”, sinal de alerta aos companheiros descuidados:

“Eu quero cantá um pocoLinha do tatu-pombinhoDe dia mora no matoDe noite ali no caminho”

Fica claro, nesses versos, que tatu-pombinho é o capitão-do-mato que durante o dia se esconde na vegetação e de noite apare-ce, vigilante, nas estradas e senzalas.

Nos versos seguintes, novo tipo de alerta:

“Eu quero cantá um pocoLinha do tatu-pombinhoDe dia cachorro pegaCaça que anda sozinha”

Nos versos apresentados, entende-se que o cachorro é o ca-pitão-do-mato e o negro fugitivo é a caça, ficando insinuado que operigo é grande para quem foge sozinho, podendo ser capturadocomo se estivesse exposto à luz do dia.

O ódio do negro ao capitão-do-mato, seu desejo de matá-lo,estraçalhar seu corpo e secar ao sol sua carne, como charque, ficabem claro na estrofe seguinte, registrada no batuque:

“Eu quero cantá um pocoLinha do tatu-pombinhoDa carne faço trassaioDo couro faço toicinho”

Cabe lembrar que era costume nas antigas fazendas, quan-

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do havia matança de porcos, pendurar ao sol grandes pedaços detoucinho salgado. Este era o sonho do cativo: arrancar a pele docapitão-do-mato, retalhar suas carnes e pendurar os pedaços emvarais.

Esse ódio e desejo de vingança fica bem evidente na quadraseguinte:

“Eu quero cantá um poucoLinha do tatu-pombinhoEu bebo a ninhada inteiraE toco fogo no ninho”

Aqui o cativo se compara ao lagarto, quando encontra umaninhada de ovos. Quer dizer que gostaria de matar o capitão-do-mato, toda sua família e ainda queimar-Ihe a casa.

O ódio ao capitão-do-mato e ao cativeiro foi ultrapassando aárea escrava, estendendo-se a grandes parcelas da população bra-sileira. A campanha abolicionista ganhava cada vez mais expres-são. Nos meios urbanos, a prisão de escravos levava populares avaiarem os capturadores. Trovas andavam de boca em boca satiri-zando capitães-do-mato e nas festas do entrudo - infância do car-naval - saíam blocos fantasiados de perseguidores e perseguidos.

A extinção do cativeiro chegou, atirando o negro em novasituação, para a qual não estava preparado: disputar no mercadode trabalho, com o branco, brasileiro ou imigrante, que se achavamelhor qualificado nas diversas profissões urbanas, dominandotécnicas que o ex-cativo desconhecia. Este fato provocou mudan-ça em algumas das funções de certas manifestações artísticas dosnegros. Umas deixavam de ser tribuna de onde expressavam suaoposição e seu ódio ao sistema escravista. Outras deixavam deser forma de defesa pessoal, adquirindo características lúdicas,como ocorreu com a pernada carioca e a capoeira. Algumas fo-ram perdendo seus aspectos rituais mágicos, passando por umprocesso de laicização. Adquiriam, entretanto, novas funções, comoa de ajustar o negro ao novo status. Funcionando como reforço dosentimento de coesão grupal, suavizará a passagem para seu novolugar na sociedade, dando-Ihe condições psicológicas para en-frentar as dificuldades impostas por uma sociedade onde indica-

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dores econômicos, de raça e cor apresentam fundamental impor-tância na estratificação social.

Nos batuques - que era como os brancos classificavam qual-quer atividade musical dos negros, com base na percussão - os gru-pos conseguiam manter e preservar sua unidade. Além disso, des-de os primeiros tempos da colonização, no nordeste, os “homens-de-cor” (como era eufemisticamente descrito o negro) haviam sidoadmitidos no restrito espaço das irmandades religiosas e desfila-vam nas procissões com estandartes de São Jorge (Ogum), Cosmee Damião (Ibeji), cantando e gingando, a ponto de escandalizar al-guns cronistas da época, como Froger, que ficou indignado ao ob-servar “bandos mascarados, músicos e dançarinos que com postu-ra lúbrica perturbavam sobremaneira a ordem da santa cerimônia”.

Com buzinas, flautas e atabaques, os negros produziam umritmo, genericamente chamado de batuque, que foi se incorporandona incipiente vida urbana brasileira dos primeiros séculos. Nos diassantificados e domingos dançavam e brincavam nas ruas e praças.Muitos brancos pobres aderiam a esses grupos, para se divertirem.

Os Autos dos Congos ou Congadas em muitas áreas foram,aos poucos, perdendo a parte falada, juntando muitas tribos ou “na-ções” ao cortejo. Daí nasceram os Maracatus, que mais tarde de-ram origem às sociedades carnavalescas no Recife.

Grandes contingentes de europeus - italianos, espanhóis, fran-ceses - trouxeram importantes elementos ao processo de elabora-ção cultural. Para se ter idéia da força dessa contribuição basta aten-

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tar para o fato de que muitas das mais populares cantigas-de-rodabrasileiras são francesas. As rodas foram traduzidas ou deforma-das, nelas observando-se a preocupação de conservar o som e nãoo sentido das palavras:

“Ah mon beau chateau Ma tant’ tire, lire, lireAh rnon beau chateauMa tant’ tire, lire, lo”

“- Bom dia, minha senhoriaManda o tiro-tiro-lá- Que é você que deseja?Manda o tiro-tiro-lá!”

“Ou est la Marguerite?Oh gai, Oh gai, Oh gai!Ou est la Marguerite?Oh gai, franc cavalier!”

“Onde está a Margarida?Olê-olê-oláOnde está MargaridaOlê, seus cavalheiros!”

“A main droit y a-t-un rosierA main droit y a-t-un rosierQui porte rose au mois de mai,Qui porte rose au mois de maiEntrez en danse, joli rosierEntrez en danse, joli rosier!”

A mão direitaTem uma roseiraQue dá flor na primaveraQue dá flor na primaveraEntrai na rodaÓ linda roseiraE abraçaiA mais faceiraE abraçaiA mais faceira

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A pesquisadora Elza Dellier Gomes estudou sete rodas fran-cesas e suas inúmeras versões brasileiras, abrangendo caracte-rísticas musicais, letra, enredo e maneira de brincar. Conta que asmelodias, provavelmente, foram assimiladas por crianças brasilei-ras educadas em colégios de freiras ou missionários franceses. Asletras, deturpadas, não guardam necessariamente correspondên-cia com o original, sendo, porém, preservado o som. Assim, o estri-bilho girofle, girofla aparece no Brasil como jerumfrê, jerumfrá;“Oh gai”, tornou-se “olê”.

“J’irai au bois seulettegirofle, giroflaJ’irai au bois seuletteL’amour m’y compt’ra

“Vamos passear no jardim celeste Jerumfrê, jerumfrá Vamos passear no jardim celeste Eu já vou me encontrar”.

Elza Dellier adverte que “não só de língua para língua se dá adeturpação para alcançar a identidade do som, mas, também, amesma coisa se observa dentro da mesma língua”.

No caso das cantigas de roda, Marisa Lira chama a atençãopara o fato de que a ausência do instrumento musical é supridapela própria criança, que se torna um instrumento vivo, marcandoo ritmo com palmas ou com batidas do pé, além de usar o recursoda silabação tautológica para aumentar o verso e preencher a li-nha melódica. Usa, também, a repetição para vocalizar a melodiasem letra, tipo, lá, lá, lá, ê, ê, ê, le-,le-,tô,tô. Em 1553, Jean de Leryregistrou, no Rio de Janeiro, um canto dos índios tamoios, todoconstruído com repetições, semelhantes aos cantos infantis.

Oneyda Alvarenga estudou o caiapó, dando-lhe a classifica-ção de “dança de inspiração ameríndia”. Os índios Caiapós per-tenciam ao grupo Jê. No entanto, Arion Rodrigues, analisando al-gumas antigas estrofes, usadas no caiapó pesquisado, em SãoPaulo, observou vocábulos de origem tupi-guarani - o que o fez

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levantar a hipótese de que, originariamente, era um drama do tea-tro de catequese dos jesuítas, representado por índios tupis.

Mas a escassez de registros sobre a produção musical e co-reográfica dos índios reflete, conforme já foi assinalado por Gilber-to Freyre, o próprio aniquilamento da cultura indígena, promovidopelos padres jesuítas e pela escravidão.

De qualquer forma, observa-se consenso entreetnomusicógrafos no que se refere à influência indígena em algu-mas danças. Assim, tem origem indígena a catira, que, segundoalguns, era tocada numa viola de três cordas de tripa a que osíndios chamavam de guararapeva. Nesse registro, porém, já sepercebe o elemento aculturado, pois a viola é um instrumento eu-ropeu, introduzido pelos portugueses. A catira é uma dança es-sencialmente masculina. Os homens dançam, palmeando esapateando, e era diversão dos bandeirantes. O cururu também éconsiderado de influência indígena, assim como as modas de en-toação frouxa, linha melódica imprecisa e ritmo batido com os pés,apenas nos intervalos do canto das modas.

Ao lado das catiras, dançadas nos sertões e nas fazendas,havia o samba rural de que fala Mário de Andrade. Os negros, prin-cipalmente de Angola, dançavam nas fazendas, e depois nos cen-tros urbanos, o samba e a capoeira, que iriam se tornar as diver-sões populares de procedência africana. Um grupo de negros for-mava roda, tendo como recurso musical um pandeiro ou um reco-reco, uma viola. Alguém solava e o grupo respondia, em coro. Umdos membros do grupo entrava na roda e dançava, requebrandoo corpo e volteando sobre si mesmo. Logo, o dançarino dava umaumbigada e saía do centro da roda, cedendo seu lugar a outro.

Com estas características, o samba é encontrado em muitospontos do país e, segundo Edson Carneiro, deve ter influído nococo, principalmente no “coco-de-bingada”, na região entrePernambuco e Paraíba.

Nessa roda-de-samba, existe a provocação, representadapela umbigada, que é dada em quem o dançarino quiser. Aumbigada permite que esta dança se torne uma diversão aberta,que ultrapassa os limites do grupo e faz com que outros venhamparticipar, entrando também na roda.

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A capoeira, que em Angola era um jogo de destreza, tornou-se principalmente nas cidades do Rio de Janeiro, Salvador e Reci-fe, a arma de defesa do negro liberto com suas rasteiras e rabos-de-arraia. Virou diversão com berimbau, pandeiro e ganzá e aca-bou dando origem ao frevo, ao mesmo tempo que contribuiu parao marabacho do Amapá.

Toda essa imensa riqueza de sons, formas e expressões cor-porais, que emana do próprio processo da vida social acabou pas-sando pelo entrudo e escoando na grande via do Carnaval. Oscortejos do maracatu, as máscaras das procissões, a destreza dacapoeira, a leveza do frevo, a malícia da umbigada, a ginga dosamba acabaram construindo uma manifestação artística de gran-des dimensões - o Carnaval - que explode em todo o país, sejacomo participação, seja como espetáculo.

O som forte dos batuques nos centros urbanos até o primeiroquartel do século XX atraía a polícia. As manifestações eram proi-bidas, como expressão de frouxidão de costumes. O samba, tidocomo caso de polícia, foi duramente reprimido, mas as camadaspopulares insistiam e afirmavam-se através de sua arte. A primei-ra gravação ocorreu em 1917, o que já revelava o reconhecimentodo gênero, embora a letra tivesse de ser alterada, por imposiçãoda censura, já que satirizava a polícia e os costumes. Com o ad-vento do rádio, aos poucos, o samba foi encontrando espaço deexpressão e difusão.

O VIGOR DO CARNAVALO VIGOR DO CARNAVALO VIGOR DO CARNAVALO VIGOR DO CARNAVALO VIGOR DO CARNAVAL

As expressões musicais populares revelam uma contínua pro-dução artística que adquire a todo instante novas e inesperadascaracterísticas e um novo sentido, muitas vezes estranho para ageração anterior.

O vigor do carnaval tem se mantido como participação oucomo espetáculo. Historicamente tem se revelado, também, umatribuna de onde o povo fala, exige, lamenta, ironiza, reivindica. Seubaixo padrão de vida, seu sonho de melhor remuneração pelo tra-balho árduo que realiza, ficaram registrados nas ruas e salões, na

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década de quarenta, neste samba de Ary Barroso:

“Trabalho como um loucoMas ganho muito poucoPor isso vivo sempre atrapalhadoFazendo faxinaComendo no “china”Está faltando um zeroNo meu ordenado”

Ainda no final da década de quarenta o carnaval registrava,ironicamente, a situação do operário da construção civil:

“Você conhece o pedreiro Valdemar?Não conhece?Mas eu vou lhe apresentar:De madrugadaToma o trem da circularFaz tanta casa e não tem casaPra morarLeva a marmitaEmbrulhada num jornalSe tem almoçoNem sempre tem jantarE o ValdemarQue é mestre no ofícioConstrói um edifícioE depois não pode entrar”.

A instabilidade econômica, a inflação, a contínua desvalori-zação da moeda nacional em relação ao dólar, geravam (e conti-nuam gerando) uma inquietação popular que, no início dos anoscinqüenta, o carnaval registrou assim:

“O dólar que no câmbioDivide sempre a raiaEstá muito mais altoQue o pico do HimalaiaE a gente que precisa,

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Implora por divisa:- Tomara que caia!- Tomara que caia!

A década de cinqüenta foi, também, marcada por grandeinstabilidade política. O presidente Vargas sofreu pressões tão for-tes que acabou se suicidando. Mas com sua morte não cessaramas tentativas de golpe. A eleição de Juscelino Kubitschek geroumovimentos militares para impedir sua posse. A uma tentativa degolpe, o Ministro da Guerra, Marechal Lott, respondeu com umcontra-golpe, que acabou garantindo a posse do presidente elei-to, nos termos constitucionais. Esta questão ficou registrada nocarnaval:

“Você quis me dar um golpeMas errou a direçãoO seu golpe não abalaMinha Constituição”

O dia-a-dia sacrificado da população pobre, que vive nasfavelas do Rio de Janeiro, foi descrito, como uma pintura , numadas mais conhecidas obras da discografia carnavalesca:

“Lata d’água na cabeçaLá vai MariaLá vai MariaSobe o morro, não se cansaPela mão, leva a criançaLá vai Maria”

A precariedade das condições habitacionais tem sido lem-brada em todas as décadas:

“Aquele mundo de zincoQue é MangueiraDesperta com um apito de tremUma cabrocha, uma esteiraUm barracão de madeiraQualquer malandro em Mangueira tem”

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“Se o senhor não tá lembradoDá licença de contarÉ que a onde agora estáEsse adifício artoEra uma casa velha, um palacete asobradadoFoi aqui, seu moço, que eu, Matogrosso e o JocaConstruímos nossa maloca

Mais um dia nóis nem pode se alembráVeio os homes cas ferramentasQue o dono mandou derrubáPeguemos todas nossas coisasE fumos pro meio da ruaApreciá a demolição

Que tristeza que nóis sentiaCada talba que caía, doía no coração” .................................................................

“Ai, barracãoPendurado no morro......................................Barracão de zincoTradição, no meu país”

Em 1964 um golpe militar imergiu o país numa ditadura quesó chegaria ao fim em 1985. Nesse longo período houve muita per-seguição política e as artes foram duramente censuradas. Com ofim da ditadura militar, no Carnaval de 1986, no Rio de Janeiro, nãofaltou a cobrança:

“Me dá, me dáMe dá o que é meuForam vinte anosQue alguém comeu”.

Em 1995, assumia o governo o presidente Fernando Henrique

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Cardoso, ancorado na estabilidade monetária que chegara ao paísno início de julho de 1994, no governo Itamar Franco. FHC chegoucercado de prestígio e esperança. Essa confiança levou-o ao se-gundo mandato, pois havia promessa de que após a estabilizaçãoda moeda chegariam os empregos, com o desenvolvimento eco-nômico que andava em baixa. A situação, porém, não mudava; agrande esperança da população começava a murchar.

Em síntese, para recordar, pode-se dizer que o governo deFernando Henrique Cardoso foi marcado pela abertura desmedi-da da economia às importações, o que levou ao fechamento gene-ralizado de fábricas, aumento sem precedentes dos índices dedesemprego, redução do rendimento médio dos trabalhadores emgeral, desnacionalização da economia e estagnação do crescimen-to econômico.

Este quadro, sobretudo nos três últimos anos do segundomandato de FHC, gerava na população profundo sentimento dedesconforto e desejo de mudança, que ora se configurava clara-mente, ora se dispersava, diluindo-se diante da ausência de umpartido ou liderança que encarnasse, de forma concreta e semgerar desconfiança, a aspiração popular. Em São Paulo, em 2001,ao escolher o tema de seu desfile carnavalesco de 2002, a Gaviõesda Fiel Torcida captou essa aspiração popular, e respondeu ao SOSda sociedade assim:

“É hora da viradaVem, amorTenho fé e esperançaNo coraçãoO meu Brasil menino vai mudar!E a felicidade há de brilhar”.....................................................

A Escola, vencedora do Carnaval paulista de 2002, assistiu àmultiplicação desenfreada de seu samba, através de CD’s,pirateados ou não, nas residências, automóveis, ruas, bares, es-colas e finalmente, na televisão, quando se iniciou o horário políti-co gratuito, sendo aproveitado pelos aliados de Lula, para veicularuma idéia de mudança, sinalizando que era a hora da virada.

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A campanha cautelosa de Lula procurava um discurso mo-derado, para evitar desconfianças oriundas do passado, já queperdera três eleições estigmatizado como esquerdista radical. Orealismo político exigia moderação, mas, na sua liberdade de ex-pressão, o artista carnavalesco gritava, sem censura, ao som dabateria e dos figurinos, adereços e coreografias da Gaviões, quesambava, tendo como enredo a história do tabuleiro de xadrez comseus xeque-mates. Cheia de criatividade, metaforizava uma situa-ção concreta e entrou no sambódromo saudada por uma multidãoque cantava com ela, exibindo, naquele momento, bandeiras ebalões que não eram vermelhos, mas alvinegros, como a Escola:

“Na dança das pedrasTem peão lutando pra sobreviverContra o FMI,Que com seu cavalo alado,Sempre mal intencionado,É a rainha do poder”

Assim ao iniciar-se o século XXI, novamente, no carnaval, aarte musical virava tribuna, captando e transmitindo, como ante-na, as vozes de gigantescas parcelas de um povo sem voz.

A produção artística popular revela uma unidade do interes-se prático com o estético. É parte integrante e expressão sensívelda praxis da vida, e isso tem se evidenciado, de maneira expressi-va, através de metáforas que velam e revelam, em inúmeras ex-pressões carnavalescas brasileiras.

A manifestação artística popular capta e registra o existente,construindo uma arqueologia alegórica que captura o passado,subverte o presente e delineia o futuro como uma possibilidadepoética. Nem sempre isto ocorre,porém, de maneira consciente.

Pode-se dizer que na tentativa de ganhar sua independênciainterna e externa, o autor (ou autores), anônimo ou consagrado,produz uma obra que ultrapassa a si próprio e acaba expressandouma visão de mundo, uma concepção, um sonho, um receio, uma

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aspiração socialmente construídos. A mesma coisa foi dita, emOeuvres, por Paul Valéry: toda obra é a obra de muitas coisas alémdo autor.

BIBLIOGRAFIA

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ANDRADE, Mario de. Ensaios sobre a mú-sica brasileira. São Paulo: Martins, 1962.

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CARNEIRO, Edson. Dinâmica do folclore.Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965.

FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senza-la. Rio de Janeiro: José Olympio, 1966.

GANDAVO, Pedro de Magalhães. Históriada província de Santa Cruz. São Paulo:Obelisco, 1964.

GANDAVO, Pedro de Magalhães. Trata-do da terra do Brasil. São Paulo:Obelisco, 1964.

HELLER, Agnes. O cotidiano e a história.Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

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Prêmio Teresa Martin de Literatura

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O vencedor do Prêmio Teresa Martin de Litera-tura/2000, categoria Conto é Jádson Barros Ne-ves, da cidade de Guaraí, Estado do Tocantins.Escrevendo sob o tema “Contos de Fim de Sé-culo”, Jádson competiu com 340 candidatos eteve seu conto “O homem, o pássaro, o rio” se-lecionado pelos escritores Deonísio da Silva,Elvira Vigna e Roniwalter Jatobá, queconstituiram a Comissão Julgadora.Jádson competiu com o pseudônimo de AnaTrivério. Sobre seu texto, a Comissão Julgadoraao analisar a obra, disse que o conto “bem es-crito demonstra que o autor conhece a arte daliteratura”. “Está bem escrito naqueles pilaresque sustentam a narrativa curta em seus mo-mentos decisivos”.Vale a pena conferir!

Jádson Barros Neves é o vencedordo Prêmio Teresa Martin

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Que tipo de futuro aguarda essa garotadaque está saindo da casca do ovo

para enfrentar a vida?

Depende da chance que tiverem!

E porque o futuro da juventude deste país tam-bém é um problema nosso, estamos desenvol-vendo, desde 1989, projetos de letramento, lei-tura estética, música, cineclube, ciências,informática, comunicação online e estética daimagem voltados para crianças e jovens.

Faculdades Teresa Martin

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