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CRIAÇÃO DE ESTUDOS PARA VIOLÃO A PARTIR DA INTERAÇÃO
COLABORATIVA ENTRE INTÉRPRETE E COMPOSITOR
Reginaldo Pereira de Almeida1, Acácio T. C. Piedade
2
1 Acadêmico do Curso de Música (bacharelado) - bolsista PROBIC/UDESC
2 Orientador, Departamento de Música – [email protected]
Palavras-chave: Composição. Estudos/Violão. Colaboração Intérprete-Compositor.
As atividades aqui realizadas no âmbito do projeto de pesquisa A Poética da
Criação Musical: desdobramentos, pesquisa e produção em Composição, do Prof.
Acácio Piedade, buscam analisar as possibilidades composicionais geradas a partir de
um processo colaborativo de criação musical estabelecido entre compositor e
intérprete1, bem como mostrar os resultados musicais
2 advindos desta colaboração.
Nos interessa documentar este processo visto que, como foi destacado por
DOMENICI (2010), a referida colaboração, apesar de comum, é ainda pouco
teorizada, sendo escasso o registro detalhado dos passos dados dentro destas relações
com fins de produção musical3. Esta pesquisa, portanto, gera uma reflexão teórica, a
qual está sendo formatada para um artigo a ser publicado, e também um conjunto de
composições musicais inéditas, as quais serão estreadas, gerando assim uma
complementaridade entre produção científica e artística.
Destaca-se a bilateralidade das contribuições alcançadas por meio deste processo
relacional entre compositor e intérprete, o que tem atraído a atenção tanto de
instrumentistas como de compositores que anseiam incrementar sua linguagem
musical e ampliar o escopo de sua escrita instrumental. Com esta colaboração se
efetiva uma dupla alimentação: de um lado, o compositor se aproxima dos
idiomatismos, das possibilidades técnicas e efeitos especiais no instrumento,
colhendo-os como materiais para suas composições; de outro lado, o intérprete se vê
desafiado a propor soluções técnicas às idéias trazidas pelo compositor,
principalmente quando estas proposições estão distantes da abordagem técnica
tradicional (APRO, 2004).
Cremos que os Estudos para instrumento constituem o gênero ideal para a
realização desta colaboração. O intérprete, competente no domínio de seu instrumento,
e estando habilitado a descrever os desafios técnicos que comportam seu repertório,
pode, através deles, instigar o compositor a adotá-los como elementos motivadores ou
inspiradores para a elaboração de novos estudos. Adotamos esta dinâmica e
apontamos aqui os principais passos sobre os quais se desenvolveu este trabalho:
1. o intérprete demonstra trechos musicais em seu repertório que
mereceriam um estudo dedicado.
1 Compositor e intérprete que neste caso serão, respectivamente, o orientador da pesquisa, Prof. Acácio
Piedade, e o orientando, Reginaldo Pereira, violonista. 2 Os resultados musicais serão Estudos para Violão.
3 Entre os trabalhos destacamos LOBO (2016); PALOPOLI (2014); RAMOS (2013) e SILVA (2016).
2. o compositor anota os motivos e elementos técnicos apontados pelo
intérprete.
3. tendo este material em mãos, em sessão individual o compositor
organiza e esboça um estudo dedicado a um ou alguns dos problemas
técnicos apontados pelo intérprete.
4. o intérprete faz leituras destes esboços, em sessão conjunta,
apontando questões sobre os elementos sonoros, técnicos e notacionais do
esboço.
5. o compositor, em sessão individual, conclui a primeira versão da
peça e envia ao intérprete.
6. o intérprete, em sessão individual, estuda esta versão.
7. em sessão conjunta, o intérprete executa a versão para o compositor
e, em seguida, ambos discutem se os trabalhos para este estudo estão
concluídos.
8. o compositor, em sessão individual, conclui e edita a partitura.
Os pontos 1, 2 e 3 podem ser substituídos quando o compositor traz uma idéia
independente de uma sugestão do intérprete. Este foi o caso do Estudo I , que se
desenvolve a partir de um ostinato em sete tempos. Este ostinato é executado durante
toda esta peça, que dura cerca de dois minutos. Ao mesmo tempo, um contraponto a
duas vozes é estabelecido em uma camada independente. Por isso o compositor
decidiu escrever a partitura com dois pentagramas. Veja-se a figura abaixo:
Exemplo 1: primeiros seis compassos do Estudo I, de Acácio Piedade.
O Estudo II surge a partir de uma proposta do intérprete. Na Fantasia Nr. 7 de
John Dowland (1563-1626), ele destacou um trecho polifônico (c. 25-26) onde ocorre
sustentação de três vozes, cada nota devendo soar até o seu final. No Estudo II, que
dura cerca de três minutos, após uma introdução de sete compassos, uma polifonia a
três vozes sustentadas é estendida ao longo do braço do violão.
Exemplo 3: início do Estudo II, de Acácio Piedade.
Estes dois estudos, que fazem parte de um conjunto de cinco estudos que estão em
fase de preparação, resultam da dinâmica de sessões conjuntas e individuais acima
descrita. Com essa prática, compositor e intérprete podem rapidamente contribuir para
o desenvolvimento do corpus de estudos para o instrumento. Ao mesmo tempo, e é
isso que esta pesquisa propõe, podem estabelecer uma reflexão sobre esta colaboração,
contribuindo para os recentes trabalhos acadêmicos nessa temática, principalmente
sobre a música do século XXI (CARDASSI, 2016; RAY, 2016).
REFERÊNCIAS
APRO, Flávio. 12 estudos para violão de Francisco Mignone: reflexões sobre
contribuições técnicas ao repertório violonístico e subsídios para a realização de
passagens “problemáticas”. Universidade Estadual Paulista - UNESP - (dissertação
de Mestrado): São Paulo, 2004.
CARDASSI, Luciane. Time and place within a performer-composer
collaboration. Ensaios sobre a música do século XX e XXI: composição,
performance e projetos colaborativos. EDUFRN: Natal, 2016, pp.76-100.
DOMENICI, Catarina Leite. O intérprete em colaboração com o compositor: uma
pesquisa autoetnográfica. Anais do XX Congresso da ANPPOM (2010), pp.
1142-1147)
LÔBO, Rodrigo de A. E. Compositor e intérprete: Reflexões sobre colaboração e
processo criativo em Caminho Anacoluto II - quasi-Vanitas de Maurício Onofre.
Universidade Federal da Paraíba - UFPB - (dissertação de mestrado): João Pessoa,
2016.
PALOPOLI, Cibele. Colaboração intérprete-compositor: o contato de Luciano
Berio com intérpretes flautistas e a composição da Sequenza I para flauta solo. Anais do III SIMPOM (2014), pp. 663-671.
RAMOS, Pamela Daiany dos Santos. A colaboração compositor-intérprete na
construção de uma interpretação para a peça Round About Debussy de Flávio
Oliveira. Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRS - (dissertação de
mestrado): Porto Alegre, 2013.
RAY, Sonia. Colaborações compositor-performer no século XXI: uma ideia de
trajetória e algumas perspectivas. Ensaios sobre a música do século XX e XXI:
composição, performance e projetos colaborativos. EDUFRN: Natal, 2016,
pp.76-100..123-132.
SILVA, Alexandre Reche. Colaboração compositor-intérprete no contexto de
pós-graduação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Ensaios sobre a
música do século XX e XXI: composição, performance e projetos colaborativos.
EDUFRN: Natal, 2016, pp.76-100..254-281.