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CRESCIMENTO ECONÔMICO, COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL E DESEMPENHO TECNOLÓGICO: UMA ABORDAGEM KALDORIANA- EVOLUCIONÁRIA Tese de doutorado a ser defendida no curso de Economia Industrial e da tecnologia do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro Orientadores: Prof. Lia Hasenclever Prof. Fábio Neves Peracio de Freitas Estudante: Evaldo Henrique da Silva Agosto de 2008 Rio de Janeiro

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  • CRESCIMENTO ECONÔMICO, COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL E

    DESEMPENHO TECNOLÓGICO: UMA ABORDAGEM KALDORIANA-EVOLUCIONÁRIA

    Tese de doutorado a ser defendida no curso de Economia Industrial e da tecnologia do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro

    Orientadores: Prof. Lia Hasenclever Prof. Fábio Neves Peracio de Freitas Estudante: Evaldo Henrique da Silva

    Agosto de 2008 Rio de Janeiro

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  • EVALDO HENRIQUE DA SILVA

    CRESCIMENTO ECONÔMICO, COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL E DESEMPENHO TECNOLÓGICO: UMA ABORDAGEM KALDORIANA-

    EVOLUCIONÁRIA Rio de Janeira, 18 de Agosto de 2008

    ______________________________________ Profª Drª Lia Hasenclever (presidente)

    ______________________________________ Prof. Dr. Fábio Neves Peracio de Freitas

    ______________________________________ Profª Drª Esther Dweck

    ______________________________________ Prof. Dr. João Alberto De Negri

    ______________________________________ Prof. Dr. Gilberto de Assis Libânio

  • SUMÁRIO

    INTRODUÇÃO

    1

    1) Contextualização teórica e justificativas da pesquisa

    11

    1.1) Abordagens macrofundamentadas: os modelos kaldorianos de crescimento econômico liderado pelas exportações

    12

    1.2) Abordagens microfundamentadas: os modelos evolucionários de crescimento econômico

    20

    1.3)

    Os projetos de síntese entre as abordagens kaldorianas e evolucionárias

    32

    1.4) Considerações finais

    44

    2) As microfundamentações teóricas do modelo de simulação 46 2.1) Paradigma tecnológico, trajetória tecnológica e regime

    tecnológico 47

    2.2) Inovações tecnológicas e competitividade industrial 59 2.3) Regime tecnológico, crescimento industrial e desempenho

    inovativo

    77

    3) As referências empíricas das equações de competitividade do modelo de simulação

    92

    3.1) Estudos internacionais da competitividade: as abordagens das vantagens construídas

    93

    3.2) Estudos brasileiros da competitividade industrial 111 3.3) Taxonomias industriais baseadas no conteúdo tecnológico dos

    produtos 126

    3.4) Considerações finais 146

    4) As hipóteses, os grupos taxonômicos e as equações matemáticas do modelo de simulação

    148

    4.1) A definição dos grupos taxonômicos da matriz de insumo-produto do modelo de simulação

    149

    4.2) Hipóteses e os fatores determinantes da competitividade de cada grupo taxonômico

    162

  • 4.3) A macrofundamentação teórica e as equações matriciais do modelo de simulação

    181

    4.4) Valores iniciais das variáveis e dos parâmetros do modelo de simulação

    190

    5) Definição dos cenários, execução do exercício de simulação e análise dos resultados

    199

    5.1) Definição dos cenários 201 5.2) Propriedades e trajetórias macroeconômicas do modelo 204 5.3) Propriedades e trajetórias microeconômicas (setoriais) do modelo 216 5.4) Sensibilidade do modelo em relação aos valores ad hoc

    235

    CONCLUSÕES

    244

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 259

  • RESUMO O estudo das interações entre o crescimento econômico, as inovações tecnológicas e o crescimento econômico é um tema recorrente na literatura econômica. Neste artigo é apresentado um modelo de simulação que sintetiza as abordagens kaldorianas e evolucionárias. O crescimento da produção industrial é liderado pelas exportações frente à hipótese de que o consumo, os investimentos e as importações são endogenamente determinados pelo valor da produção. Os setores industriais, por sua vez, foram agregados de acordo com as características do regime de aprendizagem tecnológica (ou regime tecnológico), o que permitiu a formação de três grupos taxonômicos industriais, mais um grupo constituído pelos setores de serviços, para os quais não foi apresentada uma proposta taxonômica. Com esses agrupamentos foi elaborado um modelo de simulação do tipo insumo-produto, cuja dinâmica emerge do crescimento das exportações mundiais e da evolução do market share das exportações e das importações. Essa evolução depende do nível de competitividade da indústria nacional. Os fatores determinantes deste nível foram identificados de acordo com o regime tecnológico prevalecente em cada grupo setorial. Para alguns grupos setoriais, estes fatores são determinados exogenamente, mas em um dos grupos ocorre o mecanismo de causação circular e cumulativa entre a produção industrial e a competitividade externa. Foram analisados apenas três cenários, cujos resultados produziram insights teóricos e empíricos incoadunáveis com os modelos ortodoxos e heterodoxos. Entre eles está a constatação de que as séries históricas das taxas de crescimento, de investimento e do grau de utilização da capacidade produtiva do conjunto de setores da economia são estacionárias, porém não correlacionadas e muito menos cointegradas. Por outro lado, ficou constatado que os indicadores do nível de competitividade da indústria nacional podem ser afetados pelas políticas macroeconômicas e que os resultados das políticas macroeconômicas podem ser afetados pelas políticas setoriais de competitividade.

    SUMMARY The study of interactions between economic growth, technological innovation and economic growth is a recurring theme in the economic literature. In this article is presented a simulation model that combines the kaldorian and evolutionary approaches. The growth of industrial production is led by exports because of the assumption that consumption, investment and imports are endogenous; this is, determined by the value of production. The industries in turn have been aggregated according to the characteristics of the technological learning (or technological regime), which allowed the formation of three industrial taxonomic groups, another group made up of the sectors of services to which was not presented a proposal taxonomic. With these groups has drawn up a simulation model of the type input-output, which emerges from the dynamic growth of world exports and the time path of the market share of exports and imports. This evolution depends on the level of competitiveness of domestic industry. The determining factors of this level were identified according to the rules prevailing in each group technology sector. For some industry groups, these factors are exogenous, but in one of the groups there is the mechanism of feedback loop between industrial production and external competitiveness. We analyzed only three scenarios, whose results yielded insights theoretical and empirical incompatible with orthodox and heterodox models. Among them is the observation that the series of historical growth rates, investment and the degree of utilization of productive capacity of all sectors of the economy are stationary, but not correlated and much less cointegraded. Moreover, it was noted that indicators of the level of competitiveness of domestic industry may be affected by macroeconomic policies and that the results of macroeconomic policies may be affected by the policies of sectoral competitiveness.

  • INTRODUÇÃO

    a) O problema e sua importância

    As interações entre o crescimento econômico, as mudanças tecnológicas e

    a concorrência capitalista é um fenômeno que intriga os economistas há muito

    tempo. Nas obras dos economistas clássicos já é possível observar a

    preocupação desses autores quanto ao papel da concorrência capitalista e da

    mudança tecnológica na determinação do crescimento econômico. Sendo um

    tema tão antigo, não seria exagero afirmar que existe um imenso estoque de

    conhecimento acumulado sobre este tema. Mas, apesar de ser uma das áreas de

    pesquisa mais antiga no campo da ciência econômica, a construção de modelos

    de crescimento econômico afiliados à abordagem keynesiana, isto é, de modelos

    de crescimento econômico elaborados sob a égide do principio da demanda

    efetiva, é uma atividade relativamente nova. Pode-se afirmar que a análise do

    papel da concorrência capitalista e das mudanças tecnológicas na determinação

    de longo prazo dos componentes autônomos da demanda agregada é um objeto

    de pesquisa que ainda vagueia nas fronteiras das ciências econômicas.

    Existe uma vasta literatura associada às pesquisas teóricas e empíricas

    voltadas para o estudo das relações entre concorrência e mudança tecnológica.

    Mas, no que diz respeito ao papel das mudanças tecnológicas na determinação

    de longo prazo da demanda setorial e/ou agregada, as pesquisas científicas não

    conseguiram avançar muito além da produção de controvérsias. Hoje, o que há

    de mais sólido neste campo são os modelos de crescimento econômico liderado

    pelas exportações. Esses modelos têm atraído a atenção de autores tanto das

    abordagens ortodoxas (ou mainstream) quanto das abordagens heterodoxas

    (pós-keynesianas e evolucionárias). No primeiro caso, o eixo principal das

    pesquisas corresponde à hipótese de que o comércio exterior é um canal

    importante para a produção e/ou o acesso às novas tecnologias. Esses modelos,

    obviamente, estão fundamentados na teoria do equilíbrio geral, o que os tornam

    inadequadas no que diz respeito à construção de um modelo de simulação das

    interações entre o crescimento econômico, a competitividade e as mudanças

    1

  • tecnológicas baseado no princípio da demanda efetiva, que é o objetivo principal

    desta tese.

    Na atualidade, as linhas de pesquisa que têm recebido uma atenção cada

    vez maior no campo das teorias heterodoxas do crescimento econômico são as

    abordagens kaldorianas e evolucionárias. Ambas fornecem subsídios para o

    entendimento das interações entre o crescimento econômico, o desempenho

    tecnológico das firmas e a competitividade industrial e produzem insights teóricos

    e empíricos suficientemente relevantes para torná-las um programa de pesquisa

    tão importantes quanto aos das abordagens ortodoxas.

    Qualquer esforço de pesquisa para entender o fenômeno do crescimento a

    partir das mudanças tecnológicas e da competitividade industrial encontrará na

    abordagem kaldoriana ou evolucionária um arcabouço teórico bem consolidado.

    Qualquer que seja a abordagem escolhida, o projeto de pesquisa certamente irá

    produzir insights teóricos e/ou empíricos relevantes e contribuir para o

    fortalecimento dessas abordagens. Em tese, o esforço de unir essas abordagens

    seria talvez menos relevante do que um estudo aplicado de uma dessas

    abordagens.

    A questão que motivou a realização desta pesquisa é a seguinte: qualquer

    modelo teórico é uma abstração da realidade, feita com hipóteses e conceitos. No

    geral, atingem os seus propósitos, mas também estão sujeitos a confrontos com

    outros modelos teóricos. Isso, obviamente, ocorre com os modelos kaldorianos e

    evolucionários. O ponto nevrálgico desta pesquisa reside na observação de que

    os pontos tidos como os mais comprometedores dos modelos kaldorianos é

    justamente os pontos mais sólidos dos modelos evolucionários e vice-versa. Quer

    dizer, são duas abordagens heterodoxas que têm no principio da demanda efetiva

    um ponto de confluência e cujas contribuições são mutuamente enriquecedoras.

    Se assim for, a integração entre essas abordagens certamente irá gerar insights

    teóricos e empíricos que jamais poderiam ser extraídos com reformulações e

    aplicações de cada uma delas isoladamente. Esta é a questão crucial.

    Dependendo dos resultados desta pesquisa, pode-se chegar à conclusão de que

    a junção das teorias kaldorianas e evolucionarias abre um novo campo de

    pesquisa dentro do pensamento heterodoxo, com o qual se espera chegar a

    resultados inéditos em termos do entendimento das relações de causalidade entre

    2

  • o crescimento econômico, a competitividade industrial e o desempenho

    tecnológico das firmas.

    b) Objetivos e metodologia da tese

    O objetivo geral desta tese é elaborar um modelo de crescimento

    econômico no qual estejam integrados os elementos teóricos fundamentais dos

    modelos kaldorianos de crescimento liderado pelas exportações e dos modelos

    evolucionários de dinâmica industrial, para analisar as interações entre as

    mudanças tecnológicas, a competitividade externa e o crescimento econômico no

    contexto da economia brasileira. Mais especificamente, pretende-se analisar os

    efeitos das mudanças no nível de competitividade da indústria nacional sobre o

    crescimento da economia brasileira e os impactos desse crescimento sobre o

    desempenho tecnológico e competitivo da indústria nacional, seguindo as

    perspectivas kaldorianas e evolucionárias simultaneamente.

    Para realizar este objetivo, fez-se uma resenha bibliográfica dos modelos

    kaldorianos e evolucionários. O objetivo desta resenha foi demonstrar que os

    pontos fracos de uma abordagem são justamente os pontos fortes da outra

    abordagem. Nesta resenha é apresentada também uma análise de alguns

    trabalhos que resultaram da tentativa de unir essas duas abordagens. A

    conclusão desta análise é de que o modelo do tipo insumo-produto, com o

    crescimento da produção setorial liderado pelas exportações e com as indústrias

    separadas de acordo com o regime de acumulação tecnológico, é o caminho mais

    promissor para realizar esta fusão. Para tanto, foi necessária a análise do

    conceito de regime tecnológico e de suas implicações em termos da dinâmica

    tecnológica de cada indústria e a elaboração de um conceito de competitividade

    industrial compatível com a noção de que o esforço tecnológico das firmas é a

    fonte criadora de vantagens competitivas. A relevância do conceito de regime

    tecnológico na determinação da competitividade externa foi analisada com base

    em alguns estudos empíricos da competitividade internacional e da indústria

    brasileira.

    3

  • De acordo com essas análises, a elaboração desta tese obedeceu a uma

    seqüência de objetivos e procedimentos metodológicos, a qual pode ser resumida

    nos seguintes termos:

    i) Desenvolver um conceito de competitividade industrial compatível com os

    propósitos desta pesquisa. Mas especificamente, desenvolver um

    conceito de competitividade derivado da hipótese de que a atividade

    tecnológica é o principal fator da competitividade externa.

    ii) Elaborar uma taxonomia industrial que permita a classificação dos setores

    industrial conforme as características dos fatores que regem a atividade

    inovativa dentro das firmas.

    iii) Definir as variáveis relevantes na determinação da competitividade externa

    de cada grupo taxonômico.

    iv) Elaborar um modelo de determinação da produção industrial que leve em

    conta as especificidades industriais em termos de acumulação

    tecnológica e de fatores da competitividade, os encadeamentos

    industriais e a hipótese de que as exportações são o principal motor do

    crescimento econômico.

    v) Fazer um estudo aplicado deste modelo usando como referência a

    economia brasileira

    vi) Fazer uma análise dos estudos empíricos da competitividade que possam

    fornecer subsídios para a definição das variáveis e dos valores dos

    parâmetros que irão integrar as equações de competitividade de cada

    grupo taxonômico. Concomitantemente, fazer o levantamento empírico

    da matriz de insumo-produto da economia brasileira e dos valores das

    variáveis que integram as equações de competitividade e que não

    foram contemplados nos estudos empíricos da competitividade. Nesta

    pesquisa, o ano de 2003 será o ano de referência da sua

    contextualização empírica.

    vii) Analisar as interações entre as mudanças no nível de competitividade de

    cada grupo taxonômico e o crescimento da produção setorial e total.

    Para a realização deste objetivo, será medido o nível de

    competitividade de cada grupo taxonômico tomando-se por base as

    variáveis que integram os fatores e as equações da competitividade de

    4

  • cada um destes grupos. Neste caso, será avaliado os impactos micro e

    macroeconômicos das mudanças tecnológicas que reduzem ou

    eliminam o gap tecnológico de cada um dos grupos taxonômicos.

    Em vista destes propósitos, foi construído um modelo matemático

    constituído de um sistema de equações lineares e não lineares, parte delas

    contendo valores autoregressivos, parâmetros de ajustamento e efeitos de

    realimentação circular (feedback loop), o que inviabiliza o uso do exercício de

    matemática para a interpretação dos resultados produzidos por este modelo.

    Então, foi empregada a técnica de simulação numérica.

    Para a execução do exercício de simulação, foram definidos cenários

    representativos do impacto de algumas mudanças exógenas de natureza micro e

    macroeconômica sobre o nível de competitividade de cada grupo taxonômico e

    sobre alguns indicadores micro e macroeconômicos relevantes, inclusive sobre os

    próprios indicadores de competitividade destes grupos taxonômicos. Algumas

    destas mudanças agem diretamente sobre os gaps tecnológicos, enquanto outras

    agem diretamente sobre a produção setorial e, indiretamente, sobre os gaps

    tecnológicos e sobre fatores da competitividade.

    c) A estrutura da tese e a síntese dos resultados

    Para se alcançar estes objetivos esta tese foi dividida em cinco capítulos.

    No Capítulo 1 foram realizadas análises de algumas referências dos modelos

    kaldorianos e evolucionários de crescimento econômico convencionais e de

    algumas tentativas ou projetos de síntese dessas abordagens. Na análise dos

    modelos convencionais foram destacados os elementos teóricos fundamentais

    desses modelos e apontadas suas respectivas limitações no sentido de mostrar

    que as lacunas teóricas de uma abordagem é o ponto forte da outra abordagem.

    Com relação aos projetos de síntese, a pesquisa bibliográfica indicou que eles

    são muito raros e ainda não é possível identificar um consenso sobre o caminho

    metodológico desta síntese. Das que foram analisados, observou-se que existe a

    aplicação de modelos unissetoriais e multissetoriais. Por definição, nos modelos

    de um único setor os autores adotaram aprioristicamente e implicitamente o

    5

  • pressuposto de que existe um regime de acumulação tecnológico dominante. No

    modelo multissetorial não foi possível identificar quais regimes estavam

    imperando em cada setor, pois as mudanças tecnológicas foram introduzidas de

    modo ad hoc no modelo. O ponto-chave desse modelo é o enfoque sobre os

    encadeamentos industriais. De acordo com os resultados desse modelo, esses

    encadeamentos afetam sobremaneira as interações entre as mudanças

    tecnológicas e o crescimento econômico. Com base nestas análises chegou-se a

    conclusão de que o uso de modelos do tipo insumo-produto, com o crescimento

    da produção setorial liderada pelas exportações e cujas determinações dos níveis

    de competitividade industrial estão associadas ao conceito de regime tecnológico,

    é um caminho promissor para a realização desta síntese.

    No Capítulo 2 foram analisados os conceitos de paradigma tecnológico, de

    trajetória tecnológica, de rotina tecnológica, de regime tecnológico e de

    capacidade tecnológica. O objetivo dessas análises foi o de construir um conceito

    de competitividade industrial coerente com a hipótese de que o desempenho

    tecnológico é o principal fator determinante da competitividade industrial. Um dos

    produtos dessas análises consistiu na formulação de um conceito de firma que se

    resume na tese de que a firma é uma unidade institucional que gravita em torno

    de um núcleo de competências (business core) e que nesse núcleo está inserida

    a capacidade tecnológica, sendo os gastos com P&D uma das principais fontes

    geradoras desta capacidade. De acordo com essas análises, foi admitida a

    hipótese de que a formação desse núcleo ocorre ao longo do desenvolvimento de

    uma trajetória tecnológica, a qual emerge do paradigma tecnológico e evolui de

    acordo com regime de acumulação tecnológica específico desse paradigma.

    Na última seção desse capítulo é apresentado um modelo teórico que

    quantifica as relações de determinação entre as características do regime

    tecnológico e o montante de gastos com P&D realizados pelas firmas que atuam

    dentro de um mesmo cenário competitivo, o qual foi definido como sendo a

    trajetória tecnológica. De acordo com esse modelo, esses gastos são uma

    variável endógena, sendo afetados pelas características do regime tecnológico

    prevalecentes em cada indústria. De acordo com essas análises, chegou-se a

    conclusão de que existem ao menos quatro combinações possíveis das

    características do regime tecnológico – baixo grau de apropriabilidade, baixo grau

    e de complexidade da base de conhecimento, combinado com alto grau de

    6

  • oportunidades tecnológicas; alto grau de apropriabilidade combinado com baixo

    grau de complexidade e de oportunidades tecnológicas; etc. – sendo que em cada

    uma dessas combinações existe um conjunto específico de fatores que afetam o

    desempenho tecnológico das firmas e das indústrias. Essas combinações

    formaram as bases teóricas da taxonomia usada na definição dos agregados

    setoriais do modelo de simulação elaborado nesta pesquisa.

    O Capítulo 3 foi dedicado às análises de alguns estudos da

    competitividade, os quais serviram de referência empírica desta pesquisa. Na

    primeira seção deste capítulo foram analisados alguns estudos internacionais da

    competitividade baseados na abordagem das vantagens construídas. Essas

    análises forneceram alguns subsídios para a elaboração das equações de

    competitividade usadas no modelo de simulação. No entanto, ficou demonstrado

    que esses estudos apresentam algumas limitações frente aos propósitos desta

    pesquisa, pois em suas formulações quantitativas não se levou em conta o

    princípio de Fisher (equação replicadora) e o conceito de regime tecnológico e,

    além do mais, os seus resultados não são consensuais sobre os fatores mais

    relevantes na determinação da competitividade de cada setor industrial. A análise

    de alguns estudos da competitividade da indústria brasileira foi apresentada na

    seção 2 desse capítulo. Alguns desses estudos são de natureza qualitativa e

    apresentam uma riqueza de detalhes sobre os fatores que afetam a

    competitividade externa dos agrupamentos setoriais da indústria brasileira, mas

    não quantificam as relações de causa e efeito que irão definir os termos das

    equações de competitividade de cada grupo setorial. Outros estudos são de

    natureza quantitativa e enfocam os fatores da competitividade no âmbito das

    firmas. Os insights empíricos mais relevantes para os propósitos desta pesquisa

    foram produzidos pelo compartilhamento das evidências empíricas extraídas

    desses estudos.

    A última seção do Capitulo 3 foi dedicada à análise de algumas taxonomias

    industriais tradicionalmente usadas nos estudos da competitividade internacional.

    Observou-se que entre essas taxonomias também não existe um consenso sobre

    os setores que devem integrar cada grupo taxonômico, salvo os setores que

    normalmente são intitulados de alta tecnologia. Além do mais, a maior parte delas

    não utiliza o conceito de regime tecnológico na definição dos critérios de

    agrupamento. Com essa análise, ficou demonstrado que apenas uma dessas

    7

  • taxonomias emprega este conceito na definição de alguns dos seus critérios de

    agregação. Por causa disso, essa taxonomia foi escolhida para a análise do fluxo

    de comércio exterior, cujos resultados empíricos foram apresentados nessa

    seção. Esses resultados sugerem que o conceito de regime tecnológico é, de fato,

    um elemento importante na análise da dinâmica do market share das indústrias

    nacionais nas exportações mundiais. Com esses resultados ficou demonstrado

    que, do ponto de vista desse conceito, existem ao menos três grupos setoriais

    formados de acordo com as especificidades dos fatores da competitividade.

    No Capítulo 4 é desenvolvida a estrutura matemática e as hipóteses do

    modelo de simulação. Na primeira seção desse capítulo é realizada uma análise

    empírica para verificar se as tendências do fluxo de comércio exterior da indústria

    brasileira coadunam com as tendências observadas no plano mundial quando são

    aplicadas as mesmas especificações setoriais usadas anteriormente. Observou-

    se que na indústria brasileira são reproduzidas as mesmas três tendências que

    foram observadas no plano mundial.

    Unindo todos esses resultados empíricos, chegou-se a conclusão de que a

    indústria brasileira pode ser dividida em três agrupamentos setoriais. Os setores

    de serviço formaram um grupo a parte devido à carência de estudos teóricos e

    empíricos a respeito da competitividade internacional desses setores. Assim

    sendo, a matriz de insumo-produto do modelo de simulação ficou constituída de

    quatro grupos setoriais, cada qual com um conjunto particular de fatores que

    afetam a competitividade externa. O primeiro grupo foi intitulado de setores

    “baseados no conhecimento externo” (Grupo I); o segundo, de setores “baseados

    no conhecimento tácito e específico” (Grupo II); o terceiro, de setores “baseados

    nas ciências” (Grupo III); o quarto, de setores de serviços (Grupo IV). A partir das

    análises teóricas e empíricas desenvolvidas anteriormente, foram definidos os

    conjuntos de variáveis que afetam a competitividade de cada um desses grupos.

    Os fatores que afetam a competitividade do primeiro grupo são: o custo de

    transporte, o tamanho das firmas e o custo da mão-de-obra unitário; do segundo

    grupo são: a eficiência do sistema de entrega de produtos no exterior, o tamanho

    do mercado interno (demanda intermediária mais demanda final no mercado

    interno), a eficiência do sistema de normalização técnica da produção e do

    consumo e os custo da mão-de-obra unitário; no terceiro grupo são: os gastos

    públicos com C&T, os subsídios ao P&D e as transferências de tecnologia. Em

    8

  • relação aos setores de serviços adotou-se a hipótese ad hoc que o nível de

    competitividade desse grupo equipara-se à média mundial desse nível.

    A partir dessas formulações foram identificados os grupos de setores que

    apresentam gaps tecnológicos referentes ao ano de 2003. Somente os grupos de

    setores baseados em conhecimentos tácitos e específicos e conhecimentos

    científicos apresentaram gaps tecnológicos em 2003. A partir dessa constatação

    foram definidos cinco cenários relativos aos efeitos das mudanças exógenas que

    afetam positivamente esses gaps. O Cenário 1 foi usado de referência

    (benchmark) para os demais cenários, pois ele representa uma situação em que

    não ocorrem mudanças exógenas que afetam esses gaps. Os Cenários 2 e 3

    tratam de mudanças exógenas que afetam diretamente os gaps do segundo e do

    terceiro grupo de setores, eliminando-os. Os cenários 4 e 5 tratam de mudanças

    exógenas que afetam indiretamente o gap tecnológico do segundo grupo de

    setores. São mudanças de natureza macroeconômica – aumento da propensão a

    investir e da propensão a consumir, respectivamente – as quais afetam

    diretamente a produção setorial e, indiretamente, o gap tecnológico do segundo

    grupo, pois a formação desse gap está relacionada ao tamanho do mercado

    interno.

    A execução do exercício de simulação com esses cenários produziu

    resultados que dificilmente poderiam se extraídos dos modelos kaldorianos e

    evolucionários convencionais. A conclusão fundamental desta pesquisa é de que

    existe uma diversidade de fatores que podem explicar as relações de causalidade

    entre o crescimento, a competitividade e desempenho tecnológico dos setores

    produtivos da economia, estabelecendo uma dinâmica de crescimento cujas

    propriedades micro e macroeconômicas são específicas de cada economia e de

    cada contexto histórico. Em outros termos, chegou-se a conclusão de que as

    estruturas macroeconômicas são endogenamente determinadas e sujeitas a

    processos evolutivos, tal como ocorre com as estruturas microeconômicas. Nessa

    perspectiva, a noção kaldoriana de elasticidades-preço e renda exógenas e

    estruturalmente determinadas perde significado. Por outro lado, a concepção

    evolucionária de que o crescimento econômico é um subproduto da dinâmica

    microeconômica deve ser revisada tendo em vista o reconhecimento de que

    alguns “fatos estilizados” do crescimento econômico são específicos da dinâmica

    macroeconômica de cada país e que esses fatos são de fundamental importância

    9

  • para a compreensão da dinâmica microeconômica prevalecente em cada

    economia.

    10

  • CAPÍTULO 1

    Contextualização teórica e justificativas da pesquisa

    As abordagens kaldorianas e evolucionarias são duas linhas de pesquisa

    que fornecem subsídios para o estudo das interações entre o crescimento

    econômico, a competitividade e os esforços tecnológicos das firmas na visão

    heterodoxa. O enfoque agregativo da abordagem kaldoriana fez da

    competitividade das exportações e das importações um dos pontos-chave dos

    seus modelos teóricos. Mas, nesta linha de pesquisa não se desenvolve um

    estudo aprofundado da dinâmica da tecnológica. A variável proxy da atividade

    tecnológica é incorporada no modelo via elasticidades-renda das exportações e

    das importações. A suposição de que essas variáveis são exógenas e constante

    no longo prazo é um ponto controvertido, cujo debate aponta uma agenda de

    pesquisa que síntese as abordagens kaldorianas e evolucionarias.

    As abordagens evolucionárias seguem uma direção oposta às da

    abordagem kaldorina, pois o seu enfoque recai justamente nas hipóteses e

    princípios que regem a atividade inovativa dentro das firmas. Essencialmente, um

    dos objetivos que perpassa todos os modelos evolucionários de crescimento

    econômico que serão analisados é a demonstração de que o crescimento

    econômico é um produto emergente de uma dinâmica microeconômica

    fundamentada nos rendimentos crescentes e demanda de mercado

    endogenamente determinadas, resultantes da atividade tecnológica desenvolvida

    de modo permanente no âmbito da firma.

    Uma breve analise destas duas abordagens, que será apresentada nesta

    seção, mostra que a abordagem kaldoriana tem mais consistência perante os

    “fatos estilizados” da macroeconomia do crescimento e que a abordagem

    evolucionaria se adere melhor aos “fatos estilizados” da dinâmica tecnológica. Se

    se admite a hipótese de que a competitividade externa é regida pela a atividade

    tecnológica e que o crescimento econômico é regido pela o competitividade da

    industria nacional no mercado externa, fica clara, portanto, que uma síntese entre

    estas abordagens é altamente promissora em termos da formulação de modelos

    11

  • de crescimento econômico compatíveis capaz de reproduzir os fatos estilizados

    do crescimento econômico a partir de hipóteses compatíveis com os fartos

    estilizados da dinâmica tecnológica.

    Uma breve analise dos modelos kaldorianos e evolucionários do

    crescimento econômico é apresentada nas seções 3.1 e 3.2, respectivamente. Na

    seção 3.3 são analisados algumas tentativas de síntese, com a qual pretendemos

    justificar a escolha de um modelo de simulação do tipo insumo-produto aberto

    para analise das interações entre o crescimento econômico, a competitividade

    industrial e o esforço tecnológico das firmas.

    1.1) Abordagens macrofundamentadas: os modelos kaldorianos de crescimento econômico liderado pelas exportações

    Por definição, as análises teóricas das determinações de longo prazo dos

    componentes autônomos da demanda agregada é o ponto central dos modelos

    de crescimento econômico elaborados sob a égide do princípio da demanda. São

    muitas as linhas de pesquisa que versam sobre o crescimento econômico na

    perspectiva keynesiana. Por colocar em evidência o papel das exportações na

    determinação do crescimento econômico, a linha kaldoriana põe em cena os

    estudos da competitividade internacional como um dos principais eixos das

    analises das interações sobre o crescimento econômico, as mudanças

    tecnológicas e a competitividade industrial. É natural, portanto, a escolha desta

    linha de pesquisa como uma das referências teóricas para os objetivos desta

    pesquisa. Existe também razoes de natureza teórica que motivaram a escolha por

    esta linha de pesquisa. A mais importante, trata-se da hipótese da hipótese aceita

    por muitos autores que seguem a linha kaldoriana de que as tendências de longo

    prazo do consumo e dos investimentos são induzidas pela tendência de longo

    prazo da renda nacional. Isto é, trata-se da hipótese de cointegração entre as

    séries históricas do consumo, do investimento e da renda nacional.

    Não é propósito desta pesquisa a elaborar uma resenha dos estudos

    empíricos desta hipótese. O mais importante é que essa hipótese servirá de

    ferramenta teórica para que o modelo de simulação dê mais nitidez ao papel do

    desempenho tecnológico das firmas e da competitividade industrial na

    12

  • determinação do crescimento econômico e ao feedback loop entre o crescimento

    da produção industrial e a competitividade externa. Nada impede que o modelo de

    simulação seja estendido para incluir as tendências dos gastos autônomos que

    não as exportações. Essa é uma complexidade adicional que não será

    contemplada nesta pesquisa.

    Uma formulação relativamente simples que serve de base para os modelos

    kaldorianos de crescimento econômico é apresentada nos seguintes termos:

    (1.1)

    Fazendo as devidas manipulações algébricas:

    (1.2)

    Em que: Y = produto nacional; C = gastos de consumo das famílias; I =

    investimentos; G = gasto de consumo do governo; X = exportações; M =

    importações; = renda líquida do governo.

    Supondo que os gastos de investimento sejam iguais ao total da poupança do

    setor privado e que os gastos do governo sejam iguais ao total de arrecadação

    líquida, então ficam válidas as seguintes relações:

    Em que: = poupança do setor privado

    Com isso, chega-se à equação fundamental dos modelos kaldorianos de

    crescimento liderado pelas exportações:

    (1.3)

    13

  • As determinações macroeconômicas de cada uma destas variáveis são

    normalmente expressas nos seguintes termos1:

    (1.4)

    Em que: = nível de preços internos; = nível de preços externos; E = taxa de

    câmbio; Z = renda mundial.

    (1.5)

    Em que: Y = renda nacional.

    Tomando-se base as equações (1.3), (1.4) e (1.5), o modelo acima pode ser

    reescrito numa formulação dinâmica de acordo com as seguintes equações:

    (1.6)

    (1.7)

    (1.8)

    Em que: x = taxa de crescimento do quantum das exportações; m = taxa de

    crescimento do quantum das importações; pd = taxa de crescimento dos preços

    domésticos; pf = taxa de crescimento dos preços externos; y = taxa de

    crescimento do produto nacional; e = taxa de crescimento do câmbio

    Substituindo (1.6) e (1.7) em (1.8) obtém-se a equação fundamental do

    modelo de crescimento econômico liderado pelas exportações:

    (1.9)

    A noção de competitividade de preço e qualidade na dimensão

    macroeconômica está explicitamente incorporada na equação (1.9). Segundo

    1 Dixon e Thirlwall (1975), Thirlwall (1979) e McCombie e Thirlwall (1994)

    14

  • McCombie e Thirlwall (1994), a elasticidade-renda das exportações e das

    importações são uma proxy do nível de competitividade da indústria nacional.

    Segundo os autores, elas refletem a capacidade dessas indústrias de gerar novas

    tecnologias ligadas à diferenciação de produtos (mais qualidade e/ou mais

    variedades) para competir no mercado externo e interno. Quanto maior essa

    capacidade, maior a elasticidade-renda das exportações e menores a

    elasticidade-renda das importações. Por outro lado, a trajetória do nível de preço

    interno em relação aos preços externos reflete os ganhos relativos de

    produtividade da mão-de-obra, enquanto que a evolução do câmbio capta os

    efeitos das mudanças conjunturais sobre a competitividade externa.

    O argumento de McCombie e Thirlwall (1994) em favor do uso das

    elasticidades-renda das exportações e importação como proxy do nível de

    competitividade no campo da qualidade e da variedade de produtos é

    teoricamente válido, mas deixa em aberto a questão sobre os determinantes da

    capacidade inovativa das firmas. A esse respeito, as melhores contribuições

    encontram-se nas obras de Kaldor (1968, 1970), com as quais o autor fundou as

    raízes da teoria estruturalista do comércio exterior. Segundo o autor, a formação

    da capacidade inovativa de cada país está diretamente relacionado ao seu grau

    de industrialização. É na indústria que a divisão do trabalho se aprofunda o

    suficiente para que a produção do conhecimento se torne uma atividade tão

    importante como qualquer outra dentro da cadeia produtiva. Desse modo, o

    desenvolvimento industrial estaria associado ao deslocamento da produção em

    direção aos produtos de maior intensidade tecnológica, o que aumenta a

    competitividade da indústria nacional.

    As interações entre o crescimento econômico, as mudanças tecnológicas e

    a competitividade industrial no plano macroeconômico podem ser captadas na

    equação (1.9). No geral, os modelos kaldorianos de crescimento liderado pelas

    exportações adotam a hipótese de que as elasticidades-renda das exportações e

    importações são estruturalmente determinadas, o que implica a hipótese de que

    elas são exogenamente determinadas. Sendo assim, o mecanismo de

    realimentação circular (feedback loop) ou de causação circular e cumulativa entre

    a produção e a competitividade externa fica restrito à dinâmica dos preços

    relativos, isto é, a dinâmica da competitividade de preço. Seguindo McCombie e

    15

  • Thirlwall (1994), a incorporação deste mecanismo no modelo é feita a partir da

    seguinte formulação:

    (1.10)

    (1.11)

    Em que: r = taxa de crescimento da produtividade da mão-de-obra; τ = taxa

    de crescimento do mark up; λ = coeficiente de Verdoorn; ra = taxa de crescimento

    autônomo da produtividade da mão-de-obra.

    A equação (1.11) expressa a “lei” de Verdoorn, na qual está subentendida

    a hipótese da aprendizagem endógena (learning by doing), da tecnologia

    embutida e das economias de escala (McCombie e Thirlwall, 1994). De modo

    simples, a trajetória de y, com o efeito da realimentação circular entre a produção

    e a competitividade externa, pode ser analisada pela substituição de (1.10) e

    (1.11) em (1.9) e isolando y:

    (1.12)

    De acordo com esta equação, nota-se que a causação circular e

    cumulativa entre o crescimento econômico, as mudanças tecnológicas e a

    competitividade externa pode conduzir a economia para uma taxa de crescimento

    de equilíbrio, desde que todos esses parâmetros sejam mantidos constantes. Vale

    também notar que esta equação aponta para a complexidade das relações de

    causalidade que produzem o feedback loop entre e o crescimento da produção e

    a competitividade externa. Países com alta elasticidade-renda das importações e

    baixa elasticidade-renda das exportações não estão necessariamente

    condenados a valores baixos para y.

    O tema da complexidade ou das múltiplas determinações do crescimento

    econômico não ocupou, entretanto, a posição de objeto de análise da literatura

    kaldoriana do crescimento econômico liderado pelas exportações. As

    contribuições de Dixon e Thirlwall (1975), Thirlwall (1979, 2005), McCombie

    16

  • (1989), Mccombie e Thirlwall (1994) têm sido balizadas pela hipótese de que a

    soma dos termos da equação (1.6) e (1.7), que expressam à dinâmica de preços,

    resultam em uma tendência estacionária com média igual a zero. Sendo assim,

    no longo prazo, esses termos perdem relevância na determinação da trajetória de

    y.

    Se a soma pf + e – pd for igual a zero e se se admite a hipótese de que as

    elasticidades-preço e renda das exportações e importações são estruturalmente

    determinadas, então as equações (1.6), (1.7) e (1.8) podem ser reescritas nos

    seguintes termos:

    (1.13)

    A equação (1.13) tem sido objeto de estudos empíricos há décadas e entre

    os autores que seguem a linha kaldoriana dos modelos liderados pelas

    exportações existe a convicção de que esta equação deve ser usada como o pilar

    central dos modelos de crescimento liderado pelas exportações. Não é sem razão

    que a relação de causalidade expressa nesta equação ficou conhecida na

    literatura heterodoxa como a “lei” de Thirlwall.

    A forma estendida dos modelos derivados das equações (1.6)-(1.8) é

    obtida com a inclusão da dinâmica dos fluxos de capital externo na definição das

    condições do equilíbrio do balanço de pagamento inicialmente expressa na

    equação (1.3). Este tópico não será objeto de análise nesta pesquisa. Em

    Thirlwall (2005) encontram-se alguns argumentos em torno da hipótese de que os

    fluxos internacionais de capital no longo prazo não provocam distorções de longo

    prazo na “lei” de Thirlwall. Isso porque, segundo o autor, os esses fluxos tendem a

    acompanhar as tendências de longo prazo dos saldos comerciais. Se positivo,

    ocorre um influxo; se negativo, ocorre um afluxo. Convém lembrar, no entanto,

    que os fluxos internacionais de capital podem produzir efeitos sobre a estabilidade

    financeira das economias domésticas e, desse modo, afetar as taxas de

    crescimento de longo prazo dessas economias. No modelo de simulação que está

    sendo proposto nesta pesquisa não foram incorporadas as dinâmicas do câmbio e

    do fluxo de capital externo, tendo em vista o propósito de focalizar as análises

    sobre as interações entre as tendências de crescimento da produção, a

    competitividade externa e o desempenho tecnológico na dimensão micro e

    17

  • macroeconômica. A incorporação da dimensão financeira é vista como uma

    extensão desse modelo de simulação.

    A conotação empírica dada à equação (1.13) minimizou a importância do

    debate teórico em tornos dos mecanismos que desencadeiam o processo de

    ajustamento entre as taxas de crescimento das exportações e das importações,

    os quais foram originalmente propostos nas contribuições de Kaldor (1968, 1970).

    A formulação dessa equação não trata explicitamente desses mecanismos,

    ficando limitada aos desdobramentos lógicos da relação X = M. Obviamente, o

    processo de ajustamento deve recair sobre M, pois X é uma variável exógena.

    Vale notar que o mecanismo de preço foi excluído desse processo. Até o

    momento, não existe um teoria sobre as relações de determinação que promovem

    a tendência de ajuste entre X e M. O que prevalece é a idéia pragmática de que

    os governos serão forçados a adotarem alguma política que acelere ou

    desacelere a taxa de crescimento da economia, de modo a equilibrar as taxas de

    crescimento das importações com a das exportações, evitando assim o

    crescimento explosivo do déficit ou do superávit comercial. Subentende-se que os

    fluxos de capital internacional são pragmaticamente concebidos como um fator

    adicional que força a adoção dessas políticas, pois o crescimento explosivo do

    superávit comercial pode atuar como um atrativo para a entrada de capitais

    externos, ocorrendo o inverso perante o crescimento explosivo do déficit

    comercial.

    Este ponto tem sido objeto de um longo debate que se iniciou desde a

    época em que Thirlwall publicou o seu modelo de crescimento econômico

    restringido pelo balanço de pagamento. Existe também outro ponto controvertido

    na “lei” de Thirlwall que gerou um caloroso debate entre os defensores e os

    críticos dessa “lei”. Estamos nos referindo à hipótese de que as elasticidades-

    renda das exportações e das importações são variáveis exógenas e se matem

    relativamente estáveis no longo prazo.

    Uma resenha dos artigos que foram produzidos em torno deste debate

    não faz parte dos propósitos desta pesquisa. O fato é que a hipótese de

    elasticidade-renda das importações (assim como as elasticidades-renda e preço

    das exportações e a elasticidade-preço das importações) mantém-se constante

    no longo prazo é uma hipótese forte. Mas, a julgar pelo fluxo de publicação de

    artigos acadêmicos voltados para os estudos teóricos e empíricos da “lei” de

    18

  • Thirlwall, esta hipótese não reduziu o grau de aceitabilidade desta lei2. Na

    verdade, uma parte destes estudos tem sido dedicada à reformulação desta “lei” e

    os seus resultados têm apontado para a validação desta “lei” dentro de um

    escopo temporal que se poderia chamar de “médio prazo”, o qual, de acordo com

    estes estudos, giraria em torno de cinco a dez anos. A outra parte destes estudos

    se dedica a avaliar o papel desta “lei” nas interações econômicas que produzem

    as flutuações cíclicas. Neste caso, é dado destaque à forma estendida do modelo

    de crescimento liderado pelas exportações para incorporar os fluxos de capital

    externo. Nessa linha de pesquisa a “lei” de Thirlwall é introduzida como um fator

    de simplificação do modelo quanto aos determinantes do produto nacional.

    Não resta dúvida de que as reformulações e aplicações da “lei” de

    Thirlwall têm contribuído sobremaneira para que os modelos heterodoxos de

    crescimento econômico se consolidem como uma linha pesquisa alternativa frente

    às abordagens mainstream. O tema desta pesquisa resulta, inclusive, desses

    esforços de aprimoramento dos modelos heterodoxos. Não obstante, convém

    notar que esses esforços acabaram por minimizar as proposições originais de

    Kaldor em relação às interações entre o crescimento econômico, as mudanças

    tecnológicas e a competitividade externa.

    Os objetivos desta pesquisa vão de encontro à necessidade de

    reformulação das proposições originais de Kaldor sobre essas interações. O

    mecanismo de causação circular e cumulativa entre a produção e a

    competitividade externa não deve ficar limitado à dinâmica dos preços relativos. É

    necessário estendê-lo para a competitividade de qualidade, o que implica a

    transformação dos parâmetros relativos às elasticidades de renda e de preço das

    exportações e importações em uma variável endógena do modelo. Logicamente,

    isto implica uma mudança radical nas formulações teóricas e metodológicas

    ligadas aos testes empíricos da “lei” de Thirlwall., o que requer uma reformulação

    completa do arcabouço teórico dos modelos de crescimento liderado pelas

    exportações. O próprio conceito de competitividade, até então definido em termos

    dos diferenciais de elasticidades-renda das exportações e importações, deverá

    2 Ver Bértola et al. (2002), Jayme (2001), Nakabashi (2003), Fonseca Neto e Teixeira (2004), Barbosa Filho (2001), entre outros. Para outros países, ver Perraton e Turner (1999), Leon-Ledesma (1999), Perraton (2003) entre outros.

    19

  • ser substituído no sentido de captar os diversos fatores que podem afetar essas

    elasticidades.

    Se for admitida a hipótese de que a tecnologia é o determinante crucial

    da competitividade de preço e de qualidade, então se torna tentadora a idéia de

    inserir no modelo de crescimento liderado pelas exportações os elementos

    teóricos ligados à dinâmica das mudanças tecnológicas. Neste campo, o que há

    de mais sólido é encontrado nas abordagens evolucionárias. Nessas abordagens

    têm-se o reconhecimento de que os princípios que regem essa dinâmica podem

    variar de indústria para indústria, o que limita o uso de modelos agregativos. Quer

    dizer, a estrutura unissetorial que é normalmente usado nos modelos kaldorianos

    de crescimento econômico liderado pelas exportações devem ser transformadas

    em estruturas do tipo multissetorial ou de insumo-produto para que se possa levar

    em conta o papel da diversidade industrial em termos de dinâmica tecnológica ou

    de padrões de mudança tecnológica na determinação da competitividade externa.

    Somente no caso em que se admite a hipótese de que existe um padrão de

    mudança tecnológica dominante é que se pode trabalhar com uma equação

    agregada dos determinantes da competitividade externa.

    A evolução do contexto teórico que marcou a consolidação dos modelos

    evolucionários de crescimento econômico seguiu uma trajetória distinta a dos

    modelos kaldorianos, mas tendo em comum a rejeição dos postulados teóricos

    das teorias mainstream. Os modelos evolucionários foram elaborados com o

    objetivo de demonstrar que o crescimento econômico estável deve ser

    teoricamente concebido como um produto emergente de uma dinâmica

    microeconômica marcada pelos rendimentos crescentes e demanda de mercado

    endogenamente determinada, vindos da intensa atividade tecnológica das firmas.

    O objetivo da próxima seção é analisar alguns desses modelos e mostrar

    que, apesar desses modelos serem compatíveis com os “fatos estilizados” da

    dinâmica tecnológica, os seus fundamentos macroeconômica são muito

    superficiais em termos do debate que se desenrola em torno dos modelos

    heterodoxos de crescimento econômico.

    20

  • 1.2) As abordagens microfundamentadas: os modelos evolucionários de crescimento econômico

    A consolidação do paradigma neoclássico no campo da teoria do

    crescimento econômico se deve à solução criativa, proposta por Solow (1956), de

    extrair da hipótese de rendimentos decrescentes dos fatores de produção uma

    explicação teoricamente consistente para esses “fatos estilizados” da

    macroeconomia do crescimento econômico.

    O desafio da teoria evolucionária do crescimento econômico consistiu na

    formulação de modelos teóricos que prescindissem da noção de equilíbrio para

    que os aspectos evolucionários – mutação, seleção e transmissão de tecnologias

    – da competição interfirmas despontassem como o motor do crescimento

    econômico, deixando claro que esse fenômeno é fundamentalmente uma

    mudança qualitativa da economia.

    Coube a Nelson e Winter (1982) o primeiro passo em direção à

    consolidação da teoria evolucionária do crescimento econômico. Os fundamentos

    evolucionários do modelo sugerido por esses autores podem ser resumidos nos

    seguintes termos:

    i) A adoção de uma nova tecnologia é o resultado de um processo de

    busca condicionado pelo estado prevalecente da indústria (path

    dependent) e cujos resultados técnico-econômicos não podem ser

    previstos a priori.

    ii) As firmas se diferenciam quanto às regras de decisão ou rotinas que

    definem esse processo de busca e quanto à evolução do estado de

    suas tecnologias.

    iii) As firmas que alcançam os melhores resultados nesse processo de

    busca serão responsáveis pela evolução do estado tecnológico da

    indústria.

    Esses fundamentos, ao abortarem a noção de equilíbrio para colocar em

    cena a heterogeneidade e a transformação dos agentes econômicos, destroem a

    natureza ergódiga que caracteriza os modelos ortodoxos e comprometem a

    produção de resultados que dependem de soluções matemáticas. O exercício de

    simulação foi uma alternativa encontrada por Nelson e Winter (1982) e por todos

    21

  • os demais autores evolucionários para formalizar as implicações teóricas desses

    fundamentos.

    Para fins do exercício de simulação, as firmas no modelo de Nelson e

    Winter (1982) se diferenciam também em termos dos valores iniciais do estoque e

    da rentabilidade do capital. Quanto à rentabilidade do capital, segundo os autores,

    formam-se dois grupos de firmas: a) as que estão engajadas no processo de

    busca, motivadas pelo fato de que a rentabilidade do capital está abaixo de 12%

    (em outro cenário, esse valor é reduzido para 6%) e b) as que não estão

    engajadas nesse processo, pois estão satisfeitas com os retornos obtidos pela

    tecnologia tradicional.

    Quanto ao processo de busca, deve-se salientar que esse processo se

    traduz na exploração probabilística de um espaço cartesiano constituídos pelos

    pares de coeficientes técnicos – mão-de-obra e capital – aleatoriamente

    distribuídos em torno dos valores estatísticos apresentados no artigo de Solow

    (1957). A probabilidade de uma firma extrair um desses pares é inversamente

    proporcional à “distância” entre esses pares e os pares adotados por essa firma e

    diretamente proporcional ao índice de adoção desses pares pelas demais firmas.

    A associação desse mecanismo de busca com a hipótese de que as firmas

    suspendem essa busca quando a rentabilidade ultrapassa um determinado nível

    pode ser vista como um recurso teórico de fundamental importância para que

    esse modelo seja compatível com a premissa evolucionária da persistência da

    diversidade (heterogeneidade) entre as firmas de uma mesma indústria. Essa

    premissa é a base da concepção de que o crescimento econômico é um produto

    emergente das interações entre diferentes regras de decisão ou rotinas

    associadas à busca de novas tecnologias e aos investimentos produtivos. A

    natureza não randômica dessas regras ou rotinas demonstra que o crescimento

    econômico não decorre de avanços tecnológicos espontâneos. O exercício de

    simulação permite analisar o papel dessas regras na determinação das

    tendências evolutivas do estado tecnológico da indústria, evidenciando assim a

    importância dessas regras na determinação do formato das séries temporais

    relativas às variáveis macroeconômicas, que podem ser geradas pelo modelo.

    Os resultados produzidos pelo o exercício de simulação definem o intervalo

    de valores para os parâmetros do modelo que geram padrões de crescimento

    econômico semelhantes ao que foi apresentado no artigo de Solow (1957). Com

    22

  • isso, Nelson e Winter alcançam o propósito de construir um modelo teórico

    apoiado em duas premissas aparentemente contraditórias, mas compatíveis com

    a noção de auto-organização dos sistemas complexos: a premissa da diversidade

    (heterogeneidade), que exclui a noção de equilíbrio (micro e macroeconômico), e

    a premissa do steady state do crescimento econômico.

    Vale ressaltar que a dinâmica auto-organizada do sistema representado

    por esse modelo depende de alguns pressupostos extraídos diretamente do

    paradigma neoclássico, pois no modelo adota-se a hipótese de que o produto

    nacional, o qual emerge das interações competitivas (em que operam os

    mecanismos de mutação, seleção e transmissão) entre as unidades produtivas

    heterogêneas em termos do volume de capital, do emprego e da produtividade da

    mão-de-obra, é todo realizado na forma de consumo e investimento.

    A primeira geração de modelos evolucionários foi produzida em meio à

    necessidade de revisão do modelo de Nelson e Winter (1982). A introdução de

    hipóteses mais elaboradas para o processo de busca – com ênfase sobre a

    aquisição do conhecimento (aprendizagem) – e para o processo de seleção –

    apoiado no princípio de Fisher (replicator equation) – de novas tecnologias são

    exemplos das principais mudanças nos microfundamentos dos modelos

    evolucionários. A determinação do valor da produção a partir dos gastos de

    consumo e de investimento é outra mudança substancial em relação ao modelo

    original de Nelson e Winter (1982). A incorporação do princípio da demanda

    efetiva nesses modelos foi motivada pelo interesse de se integrar ciclos e

    tendências na análise do crescimento econômico. O reconhecimento de que a

    dinâmica capitalista é marcada por flutuações e tendências de crescimento não

    regulares é um ponto central que irá permear de forma definitiva a heurística dos

    modelos evolucionários de crescimento econômico.

    Uma das primeiras contribuições nessa linha pesquisa foi produzida por

    Silverberg (1987). No modelo sugerido por esse autor fica clara a preocupação de

    modelar o processo de busca usando pressupostos extraídos diretamente dos

    fatos que tipificam o comportamento padrão das firmas no mundo dos negócios.

    Em seu modelo, Silverberg (1987) adotou o pressuposto de que a mudança

    tecnológica resulta de uma regra simples e prática (rules of thumb) muito utilizada

    pelas empresas nas suas decisões relativas à aquisição de novas tecnologias:

    23

  • tornar obsoletas as máquinas antigas usando como parâmetro as vantagens

    econômicas oferecidas pelas novas máquinas (vintage-payback approach).

    Não resta dúvida de que uma parte importante das mudanças tecnológicas

    em nível da firma ocorre por conta da tecnologia incorporada nos bens e serviços

    de capital. No entanto, o autor não contemplou no seu modelo as atividades

    tecnológicas que transcorrem no setor produtor de bens de capital e que

    respondem pelo desempenho produtivo dessas máquinas.

    Essa limitação do modelo Silverberg (1987) pode ser parcialmente

    contornada diante do pressuposto de que existe um fluxo contínuo e regular de

    inovações no setor produtor de máquinas. De qualquer modo, fica pendente a

    necessidade de esclarecimento do modus operandi da atividade tecnológica

    desse setor e a confirmação empírica que sustenta o referido pressuposto.

    No modelo de Silverberg (1987), o nível de competitividade é determinado

    por um vetor constituído de três variáveis: o nível de preço, o prazo de entrega

    (delivery delay) e a qualidade do produto, a qual, segundo o autor, apresenta

    dificuldades conceituais e por esse motivo ela foi abstraída do modelo. O nível de

    produção de cada firma evolui de acordo com as taxas de crescimento do market

    share e da demanda total. A dinâmica do market share é regulada pela equação

    replicadora (replicator equation), enquanto que a da demanda total depende do

    nível médio de preços e de outras variáveis que foram consideradas autônomas

    (exógenas) no modelo. No exercício de simulação, a taxa de crescimento da

    demanda total foi considerada exógena.

    O uso da equação replicadora requer o pressuposto de que os produtos

    não são homogêneos, de modo que haja um processo seletivo que penaliza as

    firmas com produtos de menor grau de atratividade (uma combinação de preço,

    prazo de entrega e qualidade). Por outro lado, a dinâmica dos preços está

    associada à taxa de renovação da tecnologia embutida no estoque de capital e na

    política de mark up de cada firma, enquanto que o prazo de entrega fica

    submetido à margem de ociosidade do estoque de capital que cada firma

    considera estratégico para atender a todos os pedidos de seus clientes. Desse

    modo, os valores específicos de cada firma para o tempo de recuperação do

    capital (payback), o mark up e a taxa de utilização do estoque de capital

    asseguram a diferenciação interfirma quando às suas estratégias econômicas e

    24

  • tecnológicas. Vale ressaltar que nesse modelo não se adota processos

    randômicos na dinâmica da competitividade e da mudança tecnológica.

    As propriedades microeconômicas que emergem da dinâmica desse

    sistema se resumem nos seguintes termos:

    i) A dinâmica do market share é relativamente instável, pois ao longo do

    período estipulado pelo exercício de simulação, um número cada vez

    menor de firmas garante uma participação cada vez maior no total da

    produção

    ii) A taxa de lucro, a relação lucro/salários e o grau de utilização do

    estoque de capital de cada firma mantém-se relativamente estável

    dentro do período abrangido pelo exercício de simulação.

    iii) A produtividade da mão de obra de cada firma sofre oscilações ao

    longo do período analisado, sendo que, na maioria dos casos, observa-

    se uma tendência de crescimento levemente positiva.

    A aparente contradição entre o item i e ii advém do trade-off entre os

    investimentos de ampliação e de renovação do estoque de capital. As firmas

    que adotam uma política expansionista mais agressiva são impelidas para

    uma taxa mais elevada de renovação do seu estoque de capital, o que reduz

    suas vantagens em termos de prazo de entrega e força uma redução mais

    drástica do mark up para compensar essa desvantagem. Nota-se, portanto,

    que não existe a priori um conjunto de estratégias ótimas; somente a posteriori

    poderão ser conhecidos os impactos dessas estratégias.

    As propriedades macroeconômicas desse modelo não foram analisadas

    pelo autor. Mas, em vista das propriedades microeconômicas descritas

    anteriormente são cabíveis os seguintes resultados:

    i) Os valores médios da produção, do estoque de capital e da

    produtividade da mão-de-obra crescem de forma contínua e regular.

    ii) O valor médio da relação lucro/salários mantém-se relativamente

    estável ao longo do período analisado.

    Em princípio, essas propriedades macroeconômicas podem ser vistas

    como uma conseqüência natural das mudanças ocorridas na esfera da produção

    (lado da oferta). Mas, o que o autor pretende demonstrar é que essas

    25

  • propriedades emergem sob quaisquer condições prevalecentes no lado da

    demanda. Quer dizer, o montante inicial do total de gastos da economia e sua

    taxa de crescimento, que definem a demanda efetiva em cada período, foram

    considerados fatores de pouco relevância para explicar as propriedades

    microeconômicas do modelo. Em outras palavras, a emergência de uma estrutura

    industrial concentrada, com estabilidade da taxa de lucros e do grau de utilização

    da capacidade produtiva, independe das mudanças evolutivas observadas no

    lado da demanda.

    Esse modelo sofre uma revisão substancial em Silverberg e Verspagen

    (1994). No modelo proposto por esses autores dá-se ênfase à atividade inovativa

    realizada pelas firmas, sendo a intensidade dos gastos com P&D (P&D/vendas) o

    indicador da proporção de recursos da firma destinada à produção de novos

    conhecimentos. Nesse modelo são incorporados também os efeitos de spilllover e

    de catching up.

    Semelhantemente ao modelo anterior, a produtividade da mão-de-obra e a

    taxa de lucros evoluem conforme o ritmo de renovação das safras tecnológicas

    embutidas no estoque de capital (vintage approach). Essa atualização

    tecnológica, por sua vez, depende do fluxo de inovação, cuja intensidade está

    ligada à proporção de recursos destinados à atividade inovativa das firmas. Além

    dos investimentos em P&D, essa atividade conta também com o efeito spillover e

    catching up. Esse último é condicionado pela “distância” tecnológica entre a

    melhor prática (best practice) adotada pela firma e a do mercado: quando maior

    essa distância (indicada pelo inverso da relação entre o produtividade da mão-de-

    obra da firma e a média das demais firmas) maior é o efeito do catching up sobre

    a probabilidade de adoção de uma nova tecnologia.

    A probabilidade de adoção de uma nova tecnologia é um processo de

    Poisson, cuja taxa de sucesso (parâmetro λ) de cada intervalo de tempo varia de

    acordo com a intensidade de P&D e o grau de catching up. Com relação à

    intensidade dos gastos com P&D, adota-se o pressuposto de que as firmas

    flexibilizam a proporção de recursos alocadas para esses investimentos. Em cada

    período existe uma probabilidade da firma alterar a relação P&D/vendas de modo

    aleatório (erros com distribuição normal) e uma probabilidade da firma imitar essa

    relação da firma que é a mais bem sucedida em termos de crescimento das

    vendas. A soma dessas probabilidades (necessariamente menor do que a

    26

  • unidade) define a probabilidade de mudança no valor da relação P&D/vendas

    mantida pela firma.

    Uma das propriedades microeconômicas desse modelo refere-se à

    tendência de redução do desvio-padrão da relação P&D/vendas entre as firmas. A

    intensidade dessa tendência varia conforme os parâmetros das equações de

    probabilidade e de catching up. Dentro de determinado intervalo de valores para

    esses parâmetros, o exercício de simulação mostra que o sistema pode evoluir de

    uma fase de pouca atividade tecnológica (período em que a maioria das firmas

    não alocam recursos para os investimento em P&D) para uma fase em que ocorre

    a estabilização da relação P&D/vendas, com a maioria das firmas investindo

    maciçamente em P&D.

    A tendência de convergência e de estabilização dos esforços inovativos

    das firmas se traduz em um fluxo contínuo e regular de inovações e, por

    conseguinte, em um aumento regular da produtividade média da mão-de-obra.

    Isso resulta em propriedades macroeconômicas semelhantes às do modelo de

    Silverberg (1987), analisado anteriormente.

    Uma proposta de aprimoramento dessa linha de pesquisa foi apresentada

    por Chiaromonte e Dosi (1993)3. No modelo sugerido por esses autores são

    explicitadas as interações entre demanda efetiva e desempenho inovativo das

    firmas, sendo contemplada também uma subdinâmica relativa ao processo de

    busca tecnológica que envolve dois tipos de regime de acumulação tecnológica:

    um regime do tipo baseado em ciência (compatível com o conceito de science

    based de Pavitt, (1984), prevalecente no setor de bens de capital (máquinas) e

    cuja atividade inovativa é desempenhada através dos investimentos em P&D e

    outro regime cujo processo de mudança tecnológica é fundamentalmente

    baseado na tecnologia incorporado aos bens de capital (compatível com o

    conceito de supply dominaded de Pavitt (1984) e que prevalece no setor produtor

    de bens de consumo (setor II daqui em diante). Por conta dessas características,

    as mudanças tecnológicas no setor produtor de máquinas (setor I daqui em

    diante) se manifestam por meio de inovações incrementais e radicais. O primeiro

    caso foi definido como uma situação em que não ocorrem mudanças no processo

    de produção no setor I, mas somente melhorias de qualidade dos seus produtos,

    3 Segue a mesma linha de raciocínio Chiaromonte et al. (1993).

    27

  • a qual pode ser medida pela produtividade da mão-de-obra que opera com os

    produtos do setor I. O segundo caso trata de mudanças simultâneas na qualidade

    dos produtos e no sistema de produção do setor I.

    As interações entre demanda efetiva e o desempenho inovativo podem ser

    analisadas de dois ângulos. O primeiro trata do pressuposto de que as

    oportunidades tecnológicas aumentam de acordo com o nível de atividade

    econômica, visto que o aumento da riqueza social potencializa maiores

    investimentos em infra-estrutura tecnológica (universidades, centros de pesquisa,

    tecnologias da informação, etc.). O segundo está associado à premissa de que as

    firmas adotam a regra simples e prática (rules of thumb) de fixar um percentual

    das vendas para investimentos em P&D, o que significa que o esforço tecnológico

    das firmas cresce na mesma proporção de suas vendas.

    O processo de busca no setor I se resume no evento do sucesso (adoção

    de uma nova tecnologia) ou do fracasso (nenhuma adoção de nova tecnologia),

    cuja distribuição de probabilidade é do tipo Bernoulli, sendo que a probabilidade

    de realização de um sucesso em cada período varia de acordo com o montante

    de gastos com P&D (valores absolutos) efetivado nesse período. A realização do

    sucesso provém da obtenção de inovações originais ou imitação. Sendo assim, o

    sucesso da atividade tecnológica no setor I depende de uma aprendizagem

    tecnológica que é do tipo custosa (non-costless), pois exige investimentos

    dirigidos especificamente para essa aprendizagem (Lazonick. 1993) e também

    para a absorção dos conhecimentos extra-firma (Cohen e Levinthal, 1989) e para

    imitação.

    A probabilidade de ocorrência de uma inovação incremental diminui na

    medida em que se avança ao longo de uma trajetória tecnológica, enquanto que,

    ao mesmo tempo, aumenta a probabilidade de ocorrência de uma inovação

    radical. Nesse caso, os autores trabalham com a hipótese de rendimentos

    decrescentes dos gastos com P&D devido ao esgotamento das oportunidades

    tecnológicas que podem ser exploradas dentro de uma mesma trajetória

    tecnológica. Esse esgotamento opera como um mecanismo de focalização que irá

    dirigir os esforços de pesquisas em direção às novas fronteiras do conhecimento

    em busca de novos paradigmas tecnológicos para superar os trade-offs da

    produção.

    28

  • No setor II não se observa o processo de geração de novas tecnologias,

    mas tem-se o processo de learning by doing na adoção de novas tecnologias pelo

    acúmulo de experiência na atividade de produção.

    No que se refere às decisões sobre a ampliação da capacidade produtiva

    de cada setor, Dosi e Chiaromonte (1993) adotam a hipótese de que os

    produtores nos setores I e II seguem uma regra simples de projetarem para o

    próximo período a taxa de crescimento da demanda observada no período

    anterior. Por sua vez, as decisões de investimento no setor II segue o princípio da

    aceleração não flexível, desde que o investimento líquido não seja menor do que

    zero. No setor II não se aplica esse princípio, pois nesse setor não se utilizam

    bens de capital, restando apenas o uso da mão-de-obra.

    A demanda agregada no setor II é composta pelo o total de gastos da

    classe trabalhadora, o qual equivale ao total de salários. No setor I, a demanda

    agregada é formada pelo total de gastos com investimentos. A participção das

    firmas na demanda agregada dos seus respectivos setores é definida pela

    dinâmica do market share (equação replicadora), sendo o nível de

    competitividade determinado pelo nível de preço e pelo prazo de entrega de cada

    firma. No setor I entra também a variável “qualidade”, a qual é definida pela

    produtividade da máquina.

    De acordo com as análises apresentadas pelos autores, as propriedades

    microeconômicas podem ser resumidas nos seguintes termos:

    a) As oportunidades tecnológicas (setor I) não exploradas crescem em

    uma proporção maior do que as oportunidades efetivamente

    exploradas.

    b) Em ambos os setores observa-se uma tendência de concentração da

    produção, porém, no setor I essa tendência é de natureza caótica,

    enquanto que no setor II são poucas as firmas que se afastam da

    participação inicial.

    c) No setor I observa-se uma crescente disparidade entre as firmas em

    termos de capacidade tecnológica.

    No que se refere às propriedades macroeconômicas, tem-se os seguintes

    resultados:

    29

  • a) O produto nacional apresenta uma tendência de crescimento na maior

    parte da série. Na segunda metade da série, tem-se uma tendência

    estagnacionista. No curto prazo, obervam-se flutuações não regulares.

    b) A produtividade da mão-de-obra aumenta significativamente no início e

    no final da série, ficando estagnada no restante da série.

    Com esses resultados, Dosi e Chiaromonte (1993) puderam demonstrar

    que o processo evolucionário na dimensão microeconômica (busca, seleção de

    tecnologias, seleção de firmas, diversidade comportamental, etc.) é capaz de

    produzir os ciclos de tecnologia e de produção de curto e de longo prazo, o que

    não foi possível fazer com os outros modelos analisados nesta pesquisa.

    O modelo apresentado por Dosi e Fabiani (1994) pode ser considerado

    uma extensão do modelo de Chiaromonte e Dosi (1993) em direção às economias

    abertas, mas com algumas simplificações4. No modelo sugerido por Dosi e

    Fabiani (1994) existem dois setores, porém em ambos o processo de busca e de

    seleção de novas tecnologias é regido pelas mesmas equações, respeitanto o

    princípio da diversidade que se manisfesta nos valores dos parâmetros dessas

    equações. Por outro lado, não existe dependência tecnológica entre esses dois

    setores. O investimento em P&D é a variável-chave na determinação da

    probabilidade de sucesso da atividade inovativa das firmas. A distribuição dessa

    probabilidade obedece a um processo de Poisson. Os investimentos em P&D, por

    sua vez, são resultantes de uma regra simples adotada pelas firmas de fixar um

    percentual das vendas para esses investimentos. Não é feita a distinção entre

    inovações incrementais e inovações radicais. Todas as inovações se traduzem no

    aumento da produtividade do trabalho em ambos os setores. Não existem

    também investimentos em bens de capital, pois a mão-de-obra é único fator de

    produção empregado nos dois setores.

    O nível de competitividade em ambos os setores é determinado pela

    produtividade da mão-de-obra e pela taxa de câmbio. Essa taxa, por sua vez, é

    endogenamente determinada pelo o saldo do balanço de pagamento (o qual

    corresponde ao saldo comercial, pois o modelo não incorpora os fluxos de renda

    e de capital externos). A dinâmica do market share das firmas é regida pelo

    4 Uma versão mais complexa nessa linha pesquisa pode ser encotrada em Verspagen (1994).

    30

  • princípio de Fisher (equação replicadora). Esse market share é definido em

    termos de participação das firmas no mercado global – representado pela soma

    da demanda dos mercados nacionais – dos seus respectivos setores. A demanda

    total em cada setor, por sua vez, corresponde a uma parcela fixa do total de renda

    produzida em cada país no período anterior.

    Com essa descrição sucinta do modelo de Dosi e Fabiani (1994) é fácil

    perceber a preocupação desses autores de simplificar os termos de causalidade

    do modelo diante das formulações sugeridas por Chiaromonte e Dosi (1993). Com

    todas essas simplificações, o modelo de Dosi e Fabiani (1994) permitiu a

    produção de resultados teoricamente relevantes para o estudo dos “fatos

    estilizados” do crescimento da economia mundial. Entre eles, o que mereceu

    maior atenção por parte dos autores foi a tendência de divergência das taxas de

    crescimento entre as economias nacionais. No ano zero da série todos os países

    apresentavam a mesma renda per capita e a mesma estrutura produtiva, sendo

    idêntica a participação das firmas na demanda global de cada setor. As mudanças

    probabilísticas e a cumulatividade dos efeitos produzidos por essas mudanças

    foram suficientes para gerar a tendência de divergência entre as taxas de

    crescimento das economias nacionais. Por outro lado, os autores demonstraram

    que diante de um spillover internacional de 100%, tende a ocorrer uma

    convergência entre essas taxas. Porém, essa convergência não se traduz em

    uma tendência de desaparecimento das disparidades internacionais, mas em

    flutuações não regulares em torno de um valor médio dessas taxas.

    Diversos outros autores fizeram contribuições importantes dentro da linha

    de modelos de crescimento econômico apresentados nesta seção5. Esta pesquisa

    não está sendo dirigida para o estudo exaustivo dos modelos evolucionários de

    crescimento econômico. O objetivo principal foi analisar os pontos essenciais

    desses modelos. Um deles se refere à ênfase que é dada aos aspectos

    microeconômicos da dinâmica tecnológica no ceio das firmas. Essa ênfase marca

    a filiação desses modelos ao programa de pesquisa científica da economia

    evolucionária, cujo cerne é a demonstração teórica de que os “fatos estilizados”

    da macroeconomia do crescimento é uma propriedade emergente das interações

    entre unidades heterogêneas que lutam pela sobrevivência usando a inovação

    5 Para um survey ver Silverberg (1997) e Kwasnicki (2001).

    31

  • como a principal arma de competição. O outro ponto essencial diz respeito ao

    grau de abstração desses modelos. A construção dos modelos evolucionários não

    foi dirigida para a produção dos “fatos estilizados” do crescimento das economias

    nacionais e sim dos fatos genéricos. Muitas vezes, porém, a reprodução desses

    fatos no exercício de simulação foi realizada à custa de hipóteses ad hoc, sem o

    suporte de estudos empíricos. Em conseqüência dessas características

    essenciais, tornou-se impraticável o uso desses modelos para replicação dos

    “fatos estilizados” de casos específicos, a exemplo do crescimento da economia

    brasileira nestas últimas décadas.

    1.3) Os projetos de síntese entre as abordagens kaldorianas e evolucionárias

    Os modelos kaldorianos e evolucionários estão alicerçados em alguns

    princípios cuja fundamentação empírica foi extraída diretamente dos fatos não

    controversos do comportamento das firmas ou dos agentes econômicos em geral.

    O princípio da demanda efetiva, baseado na premissa de que a demanda final

    carrega alguns componentes exógenos em relação ao nível de renda, é um deles.

    O princípio da diversidade comportamental e tecnológica entre firmas ou

    indústrias é outro. E assim vai seguindo uma lista desses princípios, os quais

    serviram de base para construção dos modelos analisados nas seções anteriores.

    Não obstante, vimos que os modelos kaldorianos são extremamente

    superficiais em se tratando dos determinantes das mudanças tecnológicas,

    enquanto que os modelos evolucionários são extremamente abstratos para lidar

    com os fenômenos macroeconômicos.

    As afinidades e as complementaridades entre as abordagens kaldorianas e

    evolucionários aponta para a possibilidade do desenvolvimento de uma agenda

    de pesquisa promissora6, cujo objetivo é a formulação de modelos de crescimento

    econômico que integrem os postulados teóricos destas duas abordagens. A

    consolidação desta agenda de pesquisa como uma abordagem alternativa para

    6 Essas afinidades e complementaridades vêm sendo reconhecida pelos autores evolucionários há algum tempo (Dosi et al., 1994),

    32

  • os estudos do crescimento econômico ainda requer muito esforço de pesquisa,

    pois ainda são raras as tentativas de síntese entre estas abordagens.

    Nesta seção serão analisadas somente as contribuições de Fagerberg

    (1988), Amable (1993) e Verspagen (2002). Esta última será merecedora de mais

    atenção nesta seção visto ter sido ela a fonte inspiradora para a construção do

    modelo de simulação que será usado nesta pesquisa. Todas as discussões

    teóricas e empíricas desta pesquisa têm como ponto de partida o propósito de

    superação de algumas lacunas deixadas pelo modelo de Verspagen (2002). As

    contribuições empíricas de Fagerberg (1988) serão analisadas na seção 3.1.

    No seu artigo seminal, Fagerberg (1988) desenvolve um modelo teórico de

    um único setor e com diferenciação de produto para analisar a relação entre a

    competitividade industrial e o crescimento econômico. A rejeição da hipótese de

    que as elasticidades-renda e preço das exportações são exogenamente

    determinadas, tradicionalmente empregada nos estudos aplicados do comércio

    exterior, foi o ponto de partida para elaboração do modelo de Fagerberg (1988).

    Segundo Fagerberg (1988), a hipótese de exogeneidade da elasticidade-renda

    e da elasticidade-preço das exportações e das importações não é empiricamente

    consistente. A maioria dos países depara-se com mudanças significativas em

    seus market shares das exportações e importações, seja no curto, médio ou longo

    prazo. Segundo o autor, o estudo das interações entre crescimento industrial e

    competitividade externa não pode prescindir de uma equação determinante dos

    níveis de competitividade industrial de cada país.

    No modelo sugerido por Fagerberg (1988), o market share das exportações

    e das importações são definidos de acordo com os seguintes fatores: a) a

    capacidade de oferta; b) inovações de produto; c) inovações de processo; d)

    custo da mão-de-obra unitário.

    A capacidade de oferta é condicionada pela capacidade de absorção das

    inovações de processo, pelos investimentos em capital fixo e pela demanda

    (externa, no caso das exportações, e interna, no caso das importações); fatores

    esses que interferem diretamente na relação entre a demanda e o grau de

    utilização da capacidade produtiva. Quanto à capacidade de absorção das

    inovações de processo, o autor adota a hipótese de que essa capacidade está

    inversamente relacionada à distância tecnológica entre a economia em estudo e a

    33

  • economia que lidera a fronteira das inovações de processo7. O índice que

    combinada a intensidade relativa de P&D e de patentes é usado como a variável

    proxy dessa distância tecnológica. As outras variáveis determinantes da

    capacidade de oferta são alto explicativas.

    Quanto às inovações de produto, a variável proxy corresponde à taxa de

    crescimento do índice anterior.

    Em relação à variável proxy dos preços relativos, foi usado o custo da mão-

    de-obra unitário relativo. O emprego dessa variável está baseado na hipótese de

    que o mark up é relativamente constante, o mesmo ocorrendo com a quantidade

    e qualidade dos inputs empregados na produção. Essa proxy capta as variações

    na taxa de salário e na produtividade da mão-de-obra.

    Na determinação dos investimentos em capital fixo, o autor adota a

    hipótese de que existe uma proporção entre o investimento e a renda nacional, a

    qual varia de acordo com a participação dos gastos de consumo das famílias e do

    governo na renda nacional.

    Para cap