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Corpo vegetativo O trevo-subterrâneo é uma planta anual, prostrada, com um sistema radicular relativamente pouco profundante. Até à entrada do inverno observam-se, com frequência, no colo das plantas, os restos dos glomérulos que continham as sementes. Protegido da competição de outras plantas, sob uma pressão intensa de pastoreio, diferencia numerosos caules axilares, frequentemente mais de 10, que irradiam, mais ou menos ramificados e rentes ao solo, a partir do colo. Os folíolos das folhas são obcordados (com a forma de um coroação estilizado ao contrário) e densamente peludos (sobretudo na página inferior), de nervuras nítidas, por regra com uma marca d’água de cor clara impressa em forma de meia lua, complementada, ou não, por pequenas riscas ou pintas vermelhas e irregulares (Figura 2). As folhas, por si só, são suficientes para distinguir o trevo-subterrâneo das demais espécies, indígenas ou cultivadas, do género Trifolium (trevos). Os pecíolos, as estípulas e os caules podem ser glabros ou peludos. Este aspeto tem um grande interesse prático para distinguir cultivares (maior do que as marcas d’água). Por exemplo, a cv. Denmark, uma das cultivadares mais semeadas em Portugal, só tem pelos nas folhas. A área de distribuição natural do trevo-subterrâneo estende-se pelo noroeste de África, oeste da Europa até aos sistemas dunares mais quentes da Holanda e do sul da Grã-Bretanha e da Irlanda. Prolonga- se por todo o sul da Europa de clima mediterrânico e submediterrânico, por várias ilhas do Mar Mediterrâneo, em torno dos Mares Negro e Cáspio, e pela Turquia, Síria, Israel, Jordânia, Iraque, Irão e Etiópia. Em consequência de introduções involuntárias está presente nas ilhas da Madeira e Porto Santo (Arquipélago da Madeira), nas ilhas do Pico, Graciosa, S. Miguel e Stª Maria (Arquipélago dos Açores) e no Arquipélago Canário. Está também naturalizada, ou é cultivada noutras regiões extratropicais de verãos secos, como sejam o sul da Austrália, a Nova Zelândia, o centro e sul do Chile, o sul da África do Sul e o ocidente dos Estados Unidos da América, onde se destacam os estados da Califórnia e do Oregão. Figura 1. Montado com pastagem seminatural de trevo-subterrâneo. As pastagens dizem-se seminaturais se constituídas por plantas indígenas mas ativamente geridas pelo homem. Figura 2. Folha de trevo-subterrâneo sem marca d’água. Inflorescência, flores, frutificações e sementes As flores surgem organizadas em pequenos capítulos com 2-6 flores férteis (mais frequentemente 3-4), na extremidade de um longo pedúnculo, inserido na axila de uma folha. O cálice é verde, maculado, ou não, de vermelho. As flores têm corolas brancas, por vezes rosadas, duas vezes mais longas do que o cálice. Finda a fecundação diferenciam- se os glomérulos (infrutescências), que tomam uma forma globosa. Como adiante se explicita, o exterior dos glomérulos está revestido por flores estéreis. Cada glomérulo contém geralmente 3 a 4 frutos indeiscentes (que não libertam as sementes), mais ou menos envolvidos pelo cálice da flor, cada um com uma única semente. Em termos botânicos, o fruto dos trevos é um aquénio, e não uma vagem como acontece na maioria das leguminosas. As sementes do trevo-subterrâneo são invulgarmente grandes e pesadas para um trevo: rondam as 180.000/kg, variando de 160.000 a 220.000/kg. A cor das sementes tem, como ser verá, um grande interesse para distinguir subespécies.

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Page 1: Corpo vegetativo - drapc.min-agricultura.pt · A subsp. subterraneum apresenta cálices longitudinalmente estriados e sementes negras a vermelho muito escuro. Suporta com dificuldade

Corpo vegetativoO trevo-subterrâneo é uma planta anual, prostrada, com um sistemaradicular relativamente pouco profundante. Até à entrada do invernoobservam-se, com frequência, no colo das plantas, os restos dosglomérulos que continham as sementes. Protegido da competição deoutras plantas, sob uma pressão intensa de pastoreio, diferencianumerosos caules axilares, frequentemente mais de 10, que irradiam,mais ou menos ramificados e rentes ao solo, a partir do colo.

Os folíolos das folhas são obcordados (com a forma de um coroaçãoestilizado ao contrário) e densamente peludos (sobretudo na páginainferior), de nervuras nítidas, por regra com uma marca d’água de corclara impressa em forma de meia lua, complementada, ou não, porpequenas riscas ou pintas vermelhas e irregulares (Figura 2). As folhas,por si só, são suficientes para distinguir o trevo-subterrâneo das demaisespécies, indígenas ou cultivadas, do género Trifolium (trevos).

Os pecíolos, as estípulas e os caules podem ser glabros ou peludos.Este aspeto tem um grande interesse prático para distinguir cultivares(maior do que as marcas d’água). Por exemplo, a cv. Denmark, umadas cultivadares mais semeadas em Portugal, só tem pelos nas folhas.

A área de distribuição natural do trevo-subterrâneo estende-se pelonoroeste de África, oeste da Europa até aos sistemas dunares maisquentes da Holanda e do sul da Grã-Bretanha e da Irlanda. Prolonga-se por todo o sul da Europa de clima mediterrânico e submediterrânico,por várias ilhas do Mar Mediterrâneo, em torno dos Mares Negro eCáspio, e pela Turquia, Síria, Israel, Jordânia, Iraque, Irão e Etiópia.

Em consequência de introduções involuntárias está presente nas ilhasda Madeira e Porto Santo (Arquipélago da Madeira), nas ilhas do Pico,Graciosa, S. Miguel e Stª Maria (Arquipélago dos Açores) e noArquipélago Canário. Está também naturalizada, ou é cultivada noutrasregiões extratropicais de verãos secos, como sejam o sul da Austrália,a Nova Zelândia, o centro e sul do Chile, o sul da África do Sul e oocidente dos Estados Unidos da América, onde se destacam os estadosda Califórnia e do Oregão.

Figura 1. Montado com pastagem seminatural de trevo-subterrâneo. Aspastagens dizem-se seminaturais se constituídas por plantas indígenas masativamente geridas pelo homem.

Figura 2. Folha de trevo-subterrâneo sem marca d’água.

Inflorescência, flores, frutificações e sementesAs flores surgem organizadas em pequenos capítulos com 2-6 floresférteis (mais frequentemente 3-4), na extremidade de um longopedúnculo, inserido na axila de uma folha. O cálice é verde, maculado,ou não, de vermelho. As flores têm corolas brancas, por vezes rosadas,duas vezes mais longas do que o cálice. Finda a fecundação diferenciam-se os glomérulos (infrutescências), que tomam uma forma globosa.Como adiante se explicita, o exterior dos glomérulos está revestidopor flores estéreis. Cada glomérulo contém geralmente 3 a 4 frutosindeiscentes (que não libertam as sementes), mais ou menos envolvidospelo cálice da flor, cada um com uma única semente.

Em termos botânicos, o fruto dos trevos é um aquénio, e não umavagem como acontece na maioria das leguminosas. As sementes dotrevo-subterrâneo são invulgarmente grandes e pesadas para umtrevo: rondam as 180.000/kg, variando de 160.000 a 220.000/kg. Acor das sementes tem, como ser verá, um grande interesse paradistinguir subespécies.

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A subsp. subterraneum apresenta cálices longitudinalmente estriadose sementes negras a vermelho muito escuro. Suporta com dificuldadesolos encharcados. Entre as três subespécies citadas é a mais eficientea enterrar os glomérulos no solo.

A subsp. yanninicum tem cálices enrugados transversalmente esementes grandes, de cor clara (café-com-leite a beges, Figura 4).Produz plântulas de assinalável dimensão. Das três subespécies é amais adaptada a solos mal drenados, frequentemente encharcados.As cultivares comerciais têm uma origem balcânica. As populaçõesindígenas são francamente raras.

Os frutos maduros da subsp. brachycalycinum apresentam-separcialmente cobertos (no máximo até metade) pelo tubo do cálice(daí o restritivo brachycalycinum). Nas subsp. subterraneum eyanninicum o tubo do cálice cobre mais de metade do fruto. Os cálicesdas flores estéreis são desiguais (diferentes uns dos outros), os maisexternos não alcançando a metade do glomérulo maduro. Ospedúnculos são muito compridos e geralmente não chegam a enterraros glomérulos no solo. As sementes são violáceas, algo comprimidaslateralmente (Figura 4). Esta subespécie está adaptada a solos dereação neutra a básica, ou a solos argilosos (que fendilham no verão).Todavia prospera também em solos subácidos, de pH >5,6, desdeque bem drenados.

Nas pastagens seminaturais de trevo-subterrâneo, a sul do Tejo,predomina a subsp. brachycalycinum. A norte do Tejo domina a subsp.subterraneum. Por uma questão de prioridade nas datas de publicação,a subsp. brachycalycinum deve agora ser designada por subsp.oxaloides.

Figura 3. Cálices com frutos de T. subterraneum. Legenda: a, b - T.subterraneum subsp. subterraneum; c - T. subterraneum subsp.yanninicumi; d, e, f - T. subterraneum subsp. brachycalycinum. Extraídode J. Katznelson & F.H.W. Morley (Isr. J. Bot. 14, 112–134, 1965).

A variabilidade das populações naturais de trevo-subterrâneo, amatéria prima dos melhoradores de plantas, é notável. Zohary &Heller (The Genus Trifolium, 1984) reconhecem oito variedades noâmbito desta espécie. As plantas indígenas e cultivadas em Portugalcabem em três grandes grupos, isolados por fortes barreiras deesterilidade (J. Katznelson, Isr. J. Bot. 23, 1974), consoante os autorestratados ao nível da variedade, subespécie ou espécie.Aceitemos a categoria de subespécie (subsp.) (Figura 3).

Figura 4. Sementes de T. subterraneum subsp. yanninicume de T. subterraneum subsp. brachycalycinum.

A domesticação do T. subterraneum é recente: a primeira cultivarcomercial – a cv. Mount Barker – foi colocada no mercado em1907, na Austrália. As características mais trabalhadas pelosmelhoradores no trevo-subterrâneo são a duração do ciclo de vida,a produtividade, a resistência a doenças, o teor em compostosantinutricionais com atividade estrogénica e a dormênciategumentar (produção de sementes duras). Como sempre aconteceem melhoramento de plantas, as cultivares mais produtivas sãoas mais exigentes em fertilidade do solo.

A Austrália continua a ser o maior produtor mundial de sementese a liderar o melhoramento desta importantíssima espécie pratense.Nas últimas décadas têm-se intensificado os trabalhos demelhoramento da espécie em Itália, Espanha e Portugal sendo jávárias as cultivares obtidas nestes países, ainda que a produção desementes continue concentrada na Austrália.

Ecologia das populações naturais e das pastagens semeadasde trevo-subterrâneo

O trevo-subterrâneo é muito frequente, quer como planta cultivada,quer como espécie indígena, nas áreas de clima mediterrânico dePortugal Continental. Mostra uma marcada preferência por solosmedianamente ácidos derivados de substratos duros. Com muitadificuldade persiste em areias, sobretudo se de reação ácida.Também não suporta solos de pH francamente alcalino, emparticular quando o teor em carbonato de cálcio excede os 20%.

Antes da expansão dos cereais a partir dos finais do séc. XIX, oestrato herbáceo dos montados de solos derivados de rochas durase ácidas era, em grande medida, dominado pelo trevo-subterrâneo.No interior Norte e Centro do país as melhores comunidades detrevo-subterrâneo encontram-se à entrada dos povoados, ondetradicionalmente os gados se concentravam ao final da tarde, antesde recolherem aos seus alojamentos. As pastagens seminaturaisde trevo-subterrâneo são extraordinariamente diversas em espéciesde plantas. Na impossibilidade de as listar regista-se apenas uma,a Poa bulbosa, uma gramínea perene com bolbilhos na base, comsignificativos crescimento outonais (ver imagens em www.flora-on.pt).

Sendo uma planta prostrada (Figura 5) adaptada ao pastoreio episoteio animais, o trevo-subterrâneo, à semelhança de muitasoutras leguminosas pratenses, é sensível à competição pelasgramíneas e outras plantas de porte ereto. Convém ter presenteque as leguminosas beneficiam de uma exposição direta à radiaçãosolar, e que as gramíneas apresentam crescimentos significativos

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no inverno, ou arrancam mais cedo do que as leguminosas nas áreasde acentuada continentalidade climática. O final do inverno-inícioda primavera é um momento chave para regular a competiçãogramíneas-leguminosas. Um bom maneio, através de pastoreio, quereduza o ensombramento causada pelas gramíneas e outras plantas,fomenta o crescimento e a persistência do trevo-subterrâneo.

As leguminosas aumentam a fertilidade do solo porque fixam azotoatmosférico (N2) através de uma simbiose com rizóbios (bactériasdiazotróficas do género Rhizobium e géneros afins). O incrementodeste macronutriente no ecossistema pastagem repercute-sefavoravelmente na produção e na qualidade da forragem, bem comona acumulação de matéria orgânica do solo. A matéria orgânica dosolo, além de melhorar a fertilidade física do solo, sequestraquantidades significativas de carbono.

Em contrapartida, as pastagens dominadas por leguminosas comum pequeno contributo de gramíneas, podem ser colonizadas porum alargado leque de plantas nitrófilas, cuja gestão se pode tornarcrítica. A expansão destas espécies indesejáveis é promovida peladeposição concentrada de azoto nos dejetos animais. Citam-se, atítulo de exemplo, as geraniáceas (ex. Erodium cicutarium), váriasmalváceas (ex. Malva sylvestris), os cardos (sobretudo Carduustenuiflorus e Galactites tomentosa), algumas gramíneas (ex. dogénero Hordeum) e as urtigas (Urtica urens).

O pastoreio em períodos de chuva compacta seriamente os solosde pastagem. A compactação reduz a profundidade útil do soloexplorável pelas raízes e a disponibilidade de água na primavera. Otrevo-subterrâneo lida bem com esta contingência mas a suaprodutividade pode, em algumas situações, ser afetada. Entre asplantas bioindicadoras de compactação do solo nas pastagensdominadas por trevo-subterrâneo contam-se as seguintes: Agrostispourretii, Carlina racemosa, Chaetopogon fasciculatus, Juncusbufonius (também indicador de solo mal drenado), Plantagocoronopus e Trifolium cernuum (vd. imagens em www.flora-on.pt).

O retorno dos excrementos dos animais em pastoreio ao solo, e afertilização fosfórica, são determinantes na persistência do trevo-subterrâneo, um tema a retomar numa segunda ficha a dedicar aesta espécie.

Biologia da reprodução

O trevo-subterrâneo é uma planta cleistogâmica, isto é, quando acorola das flores se abre ao exterior (= ântese), os primórdios seminais(= óvulos) já estão fecundadas pelo pólen proveniente da mesmaflor. Significa isto que as populações naturais da espécie sãoconstituídas por linhas puras e que as características genéticas, e,implicitamente, as características morfológicas e agronómicas dascultivares comerciais se mantêm após a sementeira. Pela mesmarazão, os riscos de introgressão (cruzamento e troca genética) daspopulações indígenas com as cultivares melhoradas (e vice-versa) édiminuto.

Figura 5. Planta indígena de T. subterraneum subsp. subterraneumem floração.

Dispersão e enterramento dos glomérulos

Nas subsp. subterraneum e yanninicum, finda a fecundação, ospedúnculos engrossam e infletem em direção ao solo, na tentativade enterrar as sementes retidas no interior dos glomérulos (Figura6). Na subsp. brachycalycinum, os pedúnculos, em geral muito maisfinos e flexuosos, alongam-se e serpenteiam à superfície do solo,tentando penetrar alguma fissura, ou cavidades sob pequenaspedras.

Os glomérulos são exteriormente revestidos por flores estéreisreduzidas ao cálice, fletidas para trás, com a quadrupla função deamortecer agressões físicas, e de facilitar a dispersão, ancoragemao solo e enterramento dos glomérulos (com frutos e sementesinclusos). Numa fase inicial as flores estéreis têm a forma depequenos cones aguçados que funcionam como ganchos,promovendo a aderência e a penetração dos glomérulos no solo.Já em contacto com o solo alongam-se rapidamente, enrijecem esenescem.

O pisoteio animal, além de deprimir as plantas que competem como trevo-subterrâneo auxilia o enterramento dos glomérulos nosolo. Porém, os glomérulos maduros com facilidade ficam retidosentre as unhas ou pendurados no pelo dos ungulados (e.g. ovelhase vacas), que os dispersam a longa distância. Uma parte das sementeseventualmente ingeridas pelos animais é devolvida inteira ao solo,escarificada (com a dureza atenuada), pronta a germinar com asprimeiras águas do outono. O T. subterraneum tem, simultanea-mente, uma dispersão autocórica (por mecanismos próprios),ectozoocórica (sementes no exterior do corpo dos animais) eendozoocórica (por ingestão e posterior expulsão pelas fezesanimais).

Figura 6. Glomérulos de T. subterraneum subsp. subterraneum.

Figura 7. Glomérulos imaturos de T. subterraneum subsp. subterraneum.Notar revestimento de flores estéreis ainda em crescimento e frutos quasetotalmente revestidos pelo cálice.

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Autores: Carlos Aguiar, Francisco MondragãoRodrigues, Nuno Simões, Ana Barradas, TeresaCarita, Carlos Alarcão e David Crespo

Persistência

As variedades comerciais de T. subterraneum apresentam, de ummodo geral, uma elevada percentagem de sementes duras, isto é, dedormência seminal de tipo tegumentar, que ultrapassa, por vezes, os80% no fim da primavera/início do verão. A quebra da dormência(redução da percentagem de sementes duras) é favorecida porvariações acentuadas da temperatura diária. Os ciclos diários decontração e expansão dos tecidos da semente geram fendas notegumento, que por sua vez possibilitam a embebição em água e agerminação da semente.

A exposição a temperaturas diurnas elevadas, acima dos 50-60oC, éparticularmente eficiente na quebra da dormência tegumentar (M.Smethan, Adv. Agron. 79, 2003). Por conseguinte, a remoção mecânicaou o pastoreio da biomassa pratense seca no estio, através da reduçãodo ensombramento do solo, reduz o número de sementes duras nofinal do verão, início do outono. A manutenção de uma quantidadeabundante de pasto seco até às primeiras chuvas de outono prejudicaa germinação das sementes e ensombra excessivamente as plântulasrecém-germinadas, com consequências nefastas na persistência eprodutividade das pastagens.

As sementes de T. subterraneum somam à dormência tegumentaruma dormência de tipo embrionar, governada pelos teores de dióxidode carbono no solo, pela temperatura e pela presença de substânciasinibitórias no tegumento (M. Smethan, op. cit.). Baixos teores de CO2

na atmosfera do solo e temperaturas superiores a 20oC têm um efeitoparticularmente favorável na persistência deste tipo de dormência.Chegado o período húmido outonal, a atividade biológica do soloaumenta e o teor de CO2 na atmosfera do solo sobe. A temperaturadesce, a água da chuva arrasta os inibidores acumulados no tegumento,e as sementes de T. subterraneum podem germinar em grande número.A dormência embrionar é menos importante na biologia do T.subterraneum do que a dormência tegumentar.

As dormências tegumentar e embrionária desempenham um papelessencial na regulação do ciclo biológico desta espécie pratenseporque reduzem o risco de germinações estivais, por exemplo apóstrovoadas intensas. A dormência tegumentar serve ainda para lidarcom as flutuações climáticas interanuais porque as sementes podempersistir dormentes no solo dois ou mais anos.

A germinação estival das sementes – as chamadas falsas partidas –representa um sério risco para a persistência do trevo-subterrâneono ecossistema pastagem. A germinação estival das sementessignificaria que as plântulas, com grande probabilidade, teriam queenfrentar um longo período quente e seco. A seleção de cultivarescom sementes duras reduziu significativamente a importância dasfalsas partidas e explica a notável perenidade das pastagens semeadasà base de trevo-subterrâneo.

Germinação, estabelecimento e crescimento

O trevo-subterrâneo é uma planta anual. Germina com as primeiraschuvas outonais e senesce (morre) no final da primavera, início doverão. A germinação é largamente condicionada pela precipitação,pela temperatura do solo e pela eficácia da quebra da dormência dassementes durante o verão.

Num ano ideal, as chuvas chegam no início do outono, com umatemperatura no solo bem acima dos 10oC, e mantêm o solo húmidoaté à chegada das geadas. Por vezes as chuvas atrasam-se e os solosjá estão frios. Muito raramente, a precipitação outonal é interrompidapor um longo período de seca que aniquila as plântulas. A instalaçãodas pastagens de trevo-subterrâneo, sobretudo nas zonas de maiorcontinentalidade climática, não deve ser atrasada de modo a evitaremergências irregulares causadas pelas baixas temperaturas do solo.A senescência deste trevo é regulada pela genética (varia de cultivarpara cultivar) e pela disponibilidade de água no solo. De um modogeral as cultivares de floração precoce concluem o ciclo de vida maiscedo.

A produtividade das pastagens de trevo-subterrâneo depende denumerosos fatores que serão desenvolvidos em pormenor numasegunda ficha. Importa desde já referir que as populações indígenasportuguesas de T. subterraneum, quando comparadas com ascultivares comerciais, são, geralmente, menos produtivas masmelhor adaptadas a solos pobres em fósforo. A melhoria dafertilidade química do solo causa a sua substituição pelas cultivaresmelhoradas. Pela mesma ordem de razões, os genótipos melhoradossão incapazes de competir em condições naturais, de baixafertilidade, com os indivíduos das populações indígenas. Aindaassim, é importante realçar, que em Portugal Continental ocorrematerial genético de grande interesse, que tem sido selecionadoe usado na obtenção de novas cultivares bem adaptadas, comcaracterísticas agronómicas superiores (ex. elevada produtividade).

Figura 8. Em Portugal estão em curso várias linhas de seleção de cultivaresde trevo-subterrâneo de elevada produtividade.