contracultura e anarquismo na imprensa alternativa brasileira

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  • 8/9/2019 Contracultura e Anarquismo Na Imprensa Alternativa Brasileira

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    Do undergroundbrotam flores do mal: contracultura e anarquismo na imprensa

    alternativa brasileira (1969-1992)

    Joo Henrique C. Oliveira (*)

    RESUMO

    A proposta do trabalho foi investigar a atuao de grupos anarquistas e contraculturais no

    Brasil, entre 1969 e 1992, privilegiando como fontes primrias os jornais por eles publicados.

    Partindo de suas idias-base, tais grupos foram divididos em dois: os que se reivindicavam

    anarquistas e os que eram mais prontamente identificados com os movimentos de

    contracultura. Assim, pretendeu-se avaliar como o anarquismo foi ressignificado no contextodos anos 60/70/80 no Brasil. Alm disso, delinear que tipo de relao foi estabelecida entre os

    movimentos de contracultura e a filosofia libertria, ressaltando ainda o legado/influncia que

    tais ideologias deixaram para os movimentos sociais contemporneos.

    Palavras-chave: anarquismo, contracultura, imprensa alternativa.

    ABSTRACT

    This research aims investigate the activity of anarchist and counterculture groups in Brazil,

    between 1969 and 1992, using their alternative newspapers as primary fonts. From their

    base-ideas, they are divided in two tendencies: the self-nominated anarchists and those ones

    who were identified with the counterculture movements. The objective here is to assess how

    anarchism was recover on the context of 1960s , 1970s and 1980s; or even, to discover

    what type of relation was established between counterculture movements and anarchist

    philosophy, pointing out the present influence in contemporary social movements.

    Keywords: anarchism, counterculture, alternative press.

    (*) Mestre em Histria Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF)

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    Introduo

    A historiografia da imprensa alternativa no Brasil vem trabalhando, h tempos,

    com um conjunto de fontes que acabou se tornando sinnimo desse tipo de mdia

    independente. Quando se fala do perodo de ditadura civil-militar no pas (1964-1985), por

    exemplo, as referncias giram em torno de O Pasquim,Movimento, Opinio,Em Tempo etc.

    Contudo, poucos ouviram falar de ttulos como O Inimigo do Rei, Barbrie, Tribo, Ao

    Direta, Soma e outros que representaram grupos tambm opostos ditadura, porm pouco

    lembrados (ou at mesmo esquecidos) pelos pesquisadores das esquerdas.

    A proposta da pesquisa aqui apresentada de forma resumida foi justamente

    focalizar a atuao desses grupos libertrios, entre 1969 e 1992, privilegiando como fontesprimrias os jornais por eles publicados. Interessava demonstrar que o espectro tanto dos

    jornais alternativos quanto das esquerdas no Brasil foi bem mais amplo do que se costuma

    pensar, revelando diferentes espaos sociais do fazer imprensa e contribuindo para o

    conhecimento de memrias pouco valorizadas pelas principais linhas de investigao

    historiogrfica.

    De incio, era necessrio estabelecer marcos conceituais para um recorte

    temtico-cronolgico que tornasse exeqvel a pesquisa. Nesse sentido, trs temas geraisforam delineados: contracultura, anarquismo, imprensa alternativa. A partir da, iniciou-se a

    operao de recorte de arestas.

    Uma definio de contracultura se fez necessria. Todavia, dois caminhos se

    apresentaram logo de incio: um caminho histrico e outro a-histrico. No primeiro caso,

    interessaria delimitar o campo do fenmeno, localiz-lo no tempo-espao e definir marcos

    investigativos consistentes. No segundo, a contracultura seria compreendida em sua acepo

    mais ampla, que brota da prpria estrutura da palavra. Ou seja: contracultura poderia ser tudoaquilo que estivesse contra uma determinada cultura.

    Logo, era impossvel no tratar, ainda que de forma superficial, da temtica da

    cultura. Nesse sentido, buscou-se uma linha terica distinta do que se habituou a chamar de

    culturalismo, ou seja, uma perspectiva epistemolgica que superdimensionaria o peso da

    cultura (entendida aqui como algo ligado ao campo das representaes, a padres de

    comportamento, a simbologias etc.) nos acontecimentos histricos, tornando secundrios (ou

    at mesmo nulos) os fatores econmicos, sociais e polticos. 1 Pelo contrrio, procurou-se dar

    1 bvio que a discusso sobre o culturalismo muito mais profunda do que expus sucintamente no texto acima.No entanto, fugiramos demais de nosso objetivo se tratssemos aqui de tal debate.

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    pesos iguais s diversas esferas, no perdendo de vista uma concepo scio-histrica da

    cultura.

    A escolha, portanto, foi seguir o caminho da histria. Interessava entender uma

    contracultura historicamente localizada, materialmente articulada por sujeitos sociais

    concretos, condicionados por seu entorno social, poltico e econmico. Em especial, a

    contracultura que desponta nos anos 60/70, partindo de regies ocidentais industrializadas

    (principalmente Estados Unidos e Europa) e influenciando outros pontos do planeta pelas vias

    da indstria cultural. 2

    Em tal acepo, o conceito contracultura vai definir um heterogneo caldo de

    grupos e movimentos sociais que trazem alguns traos em comum, entre outros: (a) a

    oposio aos sistemas tecnocrticos que emergem no cenrio da Guerra Fria 3; (b) aparticipao macia de jovens e de alguns gurus da gerao dos anos 40 e 50 (como os

    beatniks, por exemplo); e (c) a defesa de umaprxis essencialmente libertria.

    A partir dessa definio, escolhemos tratar da atuao de grupos de

    contracultura no Brasil dos tempos de ditadura civil-militar; saber como as idias da

    contracultura foram tratadas nessas terras abaixo do Equador; e mapear, ainda que de forma

    incompleta, grupos e indivduos que melhor representariam essa tendncia em nosso pas.

    Nesse mesmo movimento, procurou-se contribuir para uma viso mais ampla da histria dasesquerdas, alargando o entendimento senso comum que s considera os sujeitos

    influenciados pelo iderio marxista-leninista.

    Devia-se, contudo, partir de algo concreto, de alguma manifestao material

    dessas idias e prticas. Dessa maneira, no conseguimos achar melhores fontes do que os

    jornais independentes publicados por esses grupos. Veio da a opo de trabalhar com o vasto

    universo da imprensa alternativa brasileira, selecionando alguns ttulos que julgamos

    adequados aos objetivos iniciais.Mas tambm no bastava falar da contracultura brasileira de uma forma que j

    foi abordada em alguns trabalhos. Estudos que, embora no to numerosos, trataram dos

    grupos de contracultura em seus aspectos mais conhecidos (hippies, poesia marginal,

    revoluo sexual etc.). Fez-se, ao contrrio, a opo por abordar as interconexes entre

    2 Alguns tericos entenderam contracultura para alm de fronteiras histricas. Trata-se de uma definiovlida, posto que a prpria estrutura da palavra traga a noo de um conjunto de valores que contradizem os dasociedade dominante. A partir da, poderiam ser considerados contraculturais movimentos como a cristandade

    na Jerusalm judaica e na Roma pag ou algumas seitas da Inglaterra do sculo XVII.3 Pode-se entender a tecnocracia como a forma de administrao social encabeada por Estados Nacionaisfortes e militarizados que buscam sua legitimao numa suposta neutralidade do saber cientfico e tecnolgico.Foi caracterstico dos blocos capitalista (EUA) e socialista (URSS) no auge da Guerra Fria.

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    movimentos de contracultura e idias/prticas inspiradas no anarquismo. Assim, tratou-se de

    descobrir como, aonde epor quem aprxis anarquista vinha sendo atualizada, ressignificada,

    naqueles anos ps Segunda Guerra Mundial. Tnhamos a referncia de autores estrangeiros,

    que j haviam observado a tendncia de retomada do anarquismo diante da burocratizao

    excessiva dos partidos marxista-leninistas em todo o mundo (Cf. WOODCOCK, 1984).

    Restava indagar como teria se dado esse renascimento do anarquismo no Brasil.

    Buscando responder a essa questo, descobrimos que a histria das esquerdas

    no Brasil ainda pode nos revelar nuances que surpreendem aqueles que se acostumaram a

    cenrios prontos, construdos por verses historiogrficas solidificadas. Para tanto, basta estar

    disposto a descer do barco que navega pelas correntes principais e caminhar nas margens,

    onde h muita vida escondida, ainda que em pequenos ramos, pronta para ser colhida.

    A histria que brota das margens: imprensa alternativa e contracultura no Brasil

    Rivaldo Chinem, pesquisador da imprensa alternativa, conta que entre 1964 e

    1980 nasceram e morreram cerca de trezentos peridicos que se caracterizavam pela oposio

    intransigente ao regime militar (CHINEM, 1995: 7). Desse amplo e heterogneo conjunto,

    escolhemos sete peridicos para perceber as relaes entre contracultura e anarquismo: OPasquim (interessando, em particular, a coluna Underground, assinada por Luiz Carlos

    Maciel), Tribo, Soma, O Inimigo do Rei, Barbrie, Autogesto e Utopia. Todos lanados

    entre as dcadas de 60 e 90, com uma rea de concentrao maior entre os anos 70 e 80.

    Seguindo a classificao proposta por Leila Miccolis (MICCOLIS, 1986), os

    primeiros trs ttulos da lista acima (O Pasquim/Underground, Tribo e Soma) identificar-se-

    iam mais com o que poderamos chamar de imaginrio contracultural. Os quatro ltimos (O

    Inimigo do Rei, Barbrie, Autogesto e Utopia), embora aludam por vezes temtica dacontracultura, investiriam mais no resgate/reafirmao dos princpios cratas, ressignificados

    no contexto ps-68. Mas cada um trazia uma rica singularidade.

    Aps a anlise da coluna Underground (publicada no interior de O Pasquim

    entre 1970 e 1972), por exemplo, fica a impresso de que as referncias de seu editor, Lus

    Carlos Maciel, estavam mais voltadas para a contracultura norte-americana. No h dilogo

    direto com o anarquismo. Quando citado, o tema surge das declaraes de alguns grupos da

    contracultura, como o Living Theatre, um coletivo de teatro independente que vivia uma

    experincia comunitria e tinha o anarquismo como influncia terica. H mais referncias,

    entretanto, a um discurso essencialmente psicanaltico, com destaque para Norman OBrown

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    (so inmeras as vezes que Maciel discute ou apresenta textos desse autor). Em outras vezes,

    so os aspectos religiosos/espirituais que so valorizados, como o zen budismo pregado por

    Alan Watts. Quando fala de Brasil, faz muitas referncias ao grupo de artistas marginais

    representado por Waly Salomo, Hlio Oiticica, ou os mais conhecidos Caetano Veloso e

    Gilberto Gil.

    Tribo e Soma eram editados em menor escala, no tendo a visibilidade de O

    Pasquim. Mas, assim como Underground, tambm investiam na temtica da contracultura:

    experimentalismo visual, busca de novas linguagens, dilogo com manifestaes da indstria

    cultural (histria em quadrinhos, rocknroll, cinema...), culto da esttica psicodlica, entre

    outros tpicos. Esses dois jornais, no entanto, encampavam discursos mais prximos de um

    imaginrio radical que no negava as referncias como militncia social, luta de classes erevoluo. Nesse sentido, Tribo e Soma conseguem estabelecer pontes com um iderio mais

    plenamente revolucionrio, 4 sem abandonar, todavia, os revolucionamentos estticos,

    espirituais e comportamentais tpicos do discurso contracultural.

    Nessa linha, Tribo (um jornal de vida curta, com trs nmeros publicados em

    1972) trazia crticas aos problemas sociais em Braslia cidade onde o tablide surgiu, no

    meio universitrio e fazia referncias indiretas (lembremos dos tempos de ditadura) s

    prises injustas. Neste ltimo caso, cita a desobedincia civil de Henry David Thoreau (1817-1862), descrito no jornal como um dos primeiros anarquistas americanos.

    J Soma, em seu terceiro nmero, reproduzia (igualmente numa linguagem

    cifrada) notcias de jornal sobre a ditadura getulista do Estado Novo (1937-45). Para os mais

    atentos, fica claro que a aluso a uma ditadura passada era uma forma de crtica camuflada

    contra a ditadura de seu prprio tempo mais ou menos entre 1973 e 1974, j que a datao

    do jornal no aparece na capa do nmero analisado. A no-periodizao representando o

    no-tempo daquelas no-notcias expunha todo o experimentalismo da publicao. Seuseditores, que se consideravam uma corrente de ruptura artstica dentro do campo das artes-

    plsticas e da poesia, reivindicavam o fim da separao entre arte e poltica, demonstrando o

    desejo de engajamento. O posicionamento francamente libertrio, buscando se afastar tanto

    do capitalismo quanto do socialismo de Estado:

    4 Tambm seria complicado discutir aqui o conceito de revoluo, pois tomaria muito do espao destinado aoartigo, alm de fugir da temtica central. Entendemos, todavia, que o sentido de revoluo social gira em tornode um engajamento scio-poltico visando a transformaes mais profundas, em vez de apenas atentar paramudanas de comportamento ou de costumes (o que caracterizava muitos movimentos de contracultura).

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    Eis a a grande diferena da ditadura do proletariado, hoje ditadura

    sobre o proletariado, que absorve o indivduo de tal maneira na

    coletividade, massacrando-o, despersonalizando-o; enquanto que o modo

    de produo capitalista aliena o homem, obrigando-o a se tornar um

    egosta sensual e insatisfeito atravs da sociedade de consumo. O Estado

    uma instituio histrica transitria, uma forma patognica-social, a

    alienao fundamental.5

    Anarquismo nos tempos de ditadura

    Quando morre o militante anarquista Jos Oiticica, em 1957, um dos elosgeracionais do anarquismo brasileiro se rompe. Oiticica viveu o perodo em que o anarquismo

    obteve mais notoriedade entre as esquerdas. Participou da insurreio de novembro de 1918,

    quando um pequeno grupo pensou ser possvel instituir um soviete no Rio de Janeiro, ou seja,

    um conselho de trabalhadores nos moldes da Revoluo Russa (ADDOR, 2002). Os

    libertrios mais prximos de Oiticica seguiram em frente com suas atividades culturais e

    publicaes. Outros ativistas prestam uma homenagem ao criarem o Centro de Estudos

    Professor Jos Oiticica (CEPJO), em 1958.O CEPJO realizava palestras, cursos e conferncias sobre os mais diversos

    temas, tais como psicanlise, literatura, medicina, maonaria e, obviamente, socialismo

    libertrio. Em 1969 (em pleno regime militar) o Centro foi invadido por agentes da

    Aeronutica, teve objetos destrudos, livros apreendidos e documentos rasgados. Alguns

    diretores haviam sido presos no Quartel da Aeronutica, na Ilha do Governador. Outros

    detidos foram os estudantes ligados ao Movimento Estudantil Libertrio (MEL), acusados de

    associao ao CEPJO e de distribuir material subversivo.

    No inqurito policial (Cf. RODRIGUES, 1993) consta que os militantes 16

    ao todo foram detidos com base na famigerada Lei de Segurana Nacional, acusados de

    difuso de idias incompatveis com a Constituio Brasileira, manuteno de atividades

    perigosas, ofensa moral autoridade e incitamento pblico desobedincia. No

    julgamento, a defesa alegou, com base nos estatutos do CEPJO, que a doutrina anarquista no

    havia sido divulgada no local (uma mentira providencial, obviamente) e que no havia provas

    suficientes para caracterizar uma ao subversiva. Felizmente, todos foram absolvidos.

    5 An Arkhe. Soma, s/loc, n3, 1974 (?), p.3.

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    No final dos anos 70, com a relativa abertura do regime, novos grupos

    anarquistas foram surgindo. No ano de 1977, por exemplo, comea a ser publicado, em

    Salvador (BA), o peridico O Inimigo do Rei. Um jornal que exalava um inconfundvel

    perfume contracultural, trazendo em suas pginas desde textos falando sobre os mrtires de

    Chicago at matrias sobre sexualidade e maconha. A experincia editorial do Inimigo

    surpreendeu pela longevidade: de 1977 a 1988, com alguns hiatos. Depois dos primeiros

    nmeros, a Bahia ficou pequena: colaboradores do Rio, So Paulo, Porto Alegre e outros

    lugares participavam com textos e notcias que tornavam realidade a presena do anarquismo

    no pas.

    Como em IR, a revista Barbrie (Salvador, 1979-82) trazia um leque muito

    semelhante de temas: anarquismo, autogesto, movimento operrio, minorias sociais(indgenas, homossexuais, negros, mulheres...), pedagogia libertria, embate anarquismo vs.

    marxismo e espao para correntes filosficas contemporneas que vinham rediscutindo o

    papel do poder, do Estado e das instituies (Foucault, Deleuze, Chomsky, Guattari...).

    J o nmero 3 deAutogesto (So Paulo, junho de 1980) o nico no acervo

    de imprensa alternativa do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro (AGCRJ) mostra-se,

    de todos os peridicos anarquistas analisados, o mais simples em termos grficos. Um

    formato de revista, 46 pginas datilografadas e fotocopiadas com rarssimas ilustraes. Aproposta da publicao pode ser avaliada pelas chamadas de capa, fazendo referncia,

    sobretudo, a discusses tericas. H tradues de textos e participao de intelectuais

    brasileiros. A escolha dos textos revela uma posio aberta da publicao, permitindo espao

    a temticas e autores libertrios, mas no necessariamente anarquistas.

    Essa imprensa alternativa anarquista, tendo como marco a publicao de O

    Inimigo do Rei, manteve sua atividade, mesmo aps a morte do jornal baiano. O coletivo

    que publicou Utopia (1988-92), de certa forma, representou a continuao dessa mesmalinhagem, reunindo elementos de diferentes geraes. Dos quatro ttulos anarquistas

    pesquisados, Utopia o que apresenta a diagramao mais leve e equilibrada, com boas

    escolhas de ilustraes. Em relao temtica, tinha muito em comum com os outros jornais.

    Contudo, h uma caracterstica que se destaca: o investimento no tema da ecologia social. 6

    Em 1992, a revista deixa de ser lanada por dificuldades financeiras (uma sina dos veculos

    alternativos).

    6 ecologia social interessaria o estudo das interaes entre a sociedade e a natureza. uma das correntes maisinfluentes do chamado eco-anarquismo e deve muito de seus postulados aos trabalhos de Murray Bookchin(1921-2006).

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    Concluses

    No solo castigado da atualidade, sementes de rebeldia so arrancadas

    violentamente. Intolerncia e autoritarismo so moedas ainda comuns, e a maior democracia

    do planeta um imenso teatro tragicmico, mal conseguindo esconder os mpetos

    imperialistas que escorrem por suas mandbulas. Nesse quadro, pequenas clulas mantm vivo

    o pensamento libertrio, autnomo, autogestionrio. E um neo-anarquismo, conforme um

    tanto impropriamente nomeou Woodcock (pois, em essncia, ainda se trata de anarquismo),

    surge mesclado (e mesclando-se) nos mais destacados movimentos sociais da atualidade.

    Nos anos 1990, os movimentos antineoliberalismo contaram com muitas

    bandeiras negras entre as marchas de Seattle ou Gnova onde, afinal, foi um jovemanarquista a ser assassinado por policiais. Mais do que idias ou idealismos reavivados, trata-

    se de presena concreta, em movimentos sociais ativos, nas ruas, nos choques, nas lutas de

    classe de cada dia.

    Em tempos de massificao de informaes pelas grandes corporaes de

    mdia, tambm se faz necessria a ao de mdias independentes que reeditam, em certo

    sentido, a nsia por liberdade de expresso dos alternativos de dcadas atrs. E, agora, um

    novo elemento vem a tona: a Internet e as possibilidades de engajamento atravs das redescomunicacionais do ciberespao.

    Por tudo isso, torna-se atual e necessrio tratar de contracultura, imprensa

    alternativa e anarquismo (ou, mais amplamente, socialismo libertrio), visto que os canais

    para um desenvolvimento pleno das liberdades coletivas e individuais ainda esto obstrudos;

    e a histria recente desses movimentos pode servir de inspirao para lutas presentes e

    futuras. Isso porque embora alguns tentem nos fazer acreditar no contrrio as

    desigualdades, o conflito entre classes e a histria ainda no acabaram.

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    Algumas referncias bibliogrficas

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