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CONTEXTUALIZANDO A PRÁXIS FORMATIVA DE EDUCADORES AMBIENTAIS: PERCURSOS POLÍTICOS DA FORMAÇÃO INICIAL À CONTINUADA Com a gravidade dos problemas socioambientais e, paradoxalmente, na tentativa de sua manutenção, naturalizam-se discursos e práticas conservadores por dentro e por fora do contexto escolar. Considerando o campo educacional como campo de disputa, entendemos ser possível infiltrar, por entre as brechas existentes, o que é o caso da formação inicial e continuada, uma Educação Ambiental emancipatória que questione e lute por qualidade de vida e justiça socioambiental. Com isso, tecemos discussões relevantes acerca da formação de educadores ambientais sob o viés crítico, compreendendo-a como um mecanismo de enfrentamento do modelo de sociedade vigente. Desta forma, como resultado de pesquisas de mestrado e de doutorado desenvolvidas junto ao Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Ambiental de Sergipe, da UFS, e ao Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Ambiental, Diversidade e Sustentabilidade, da UFRRJ, intencionamos expor uma discussão que abarca três estudos: no primeiro, intitulado “Das Tensões Políticas à Formação de Educadores Ambientais: contextualizando políticas públicas e a práxis pedagógica”, a autora analisa as concepções de gestores participantes da construção da Política Estadual de Educação Ambiental sergipana quanto à formação de educadores ambientais,em seu viés crítico; no segundo, “Possibilidades para Formação de Educadores Ambientais em Cursos de Pedagogia”, a autora analisaas propostas curriculares dos cursos de Pedagogia de universidades sergipanas,a fim de refletir sobre a formação inicial de educadores ambientais; e, no terceiro estudo, de título “Unidade de Conservação como Espaço Formativo: uma proposta para a formação de educadores ambientais”, a autora traça reflexõessobre o processo formativo de educadores ambientais em espaços extramuros acadêmicos, isto é, no Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu. Ademais, dessa maneira, a EA torna-se relevante pela sua capacidade de intervenção na dinâmica social e pela possibilidade de provocar mudanças por meio do processo educativo crítico, emancipatório e transformador. Palavras-Chave: Educação Ambiental Crítica. Formação Educadores Ambientai., Políticas Públicas XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 10436 ISSN 2177-336X

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CONTEXTUALIZANDO A PRÁXIS FORMATIVA DE EDUCADORES

AMBIENTAIS: PERCURSOS POLÍTICOS DA FORMAÇÃO INICIAL À

CONTINUADA

Com a gravidade dos problemas socioambientais e, paradoxalmente, na tentativa de

sua manutenção, naturalizam-se discursos e práticas conservadores por dentro e por

fora do contexto escolar. Considerando o campo educacional como campo de disputa,

entendemos ser possível infiltrar, por entre as brechas existentes, o que é o caso da

formação inicial e continuada, uma Educação Ambiental emancipatória que questione

e lute por qualidade de vida e justiça socioambiental. Com isso, tecemos discussões

relevantes acerca da formação de educadores ambientais sob o viés crítico,

compreendendo-a como um mecanismo de enfrentamento do modelo de sociedade

vigente. Desta forma, como resultado de pesquisas de mestrado e de doutorado

desenvolvidas junto ao Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Ambiental de

Sergipe, da UFS, e ao Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Ambiental,

Diversidade e Sustentabilidade, da UFRRJ, intencionamos expor uma discussão que

abarca três estudos: no primeiro, intitulado “Das Tensões Políticas à Formação de

Educadores Ambientais: contextualizando políticas públicas e a práxis pedagógica”, a

autora analisa as concepções de gestores participantes da construção da Política

Estadual de Educação Ambiental sergipana quanto à formação de educadores

ambientais,em seu viés crítico; no segundo, “Possibilidades para Formação de

Educadores Ambientais em Cursos de Pedagogia”, a autora analisaas propostas

curriculares dos cursos de Pedagogia de universidades sergipanas,a fim de refletir

sobre a formação inicial de educadores ambientais; e, no terceiro estudo, de título

“Unidade de Conservação como Espaço Formativo: uma proposta para a formação de

educadores ambientais”, a autora traça reflexõessobre o processo formativo de

educadores ambientais em espaços extramuros acadêmicos, isto é, no Parque Natural

Municipal de Nova Iguaçu. Ademais, dessa maneira, a EA torna-se relevante pela sua

capacidade de intervenção na dinâmica social e pela possibilidade de provocar

mudanças por meio do processo educativo crítico, emancipatório e transformador.

Palavras-Chave: Educação Ambiental Crítica. Formação Educadores Ambientai.,

Políticas Públicas

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10436ISSN 2177-336X

POSSIBILIDADES PARA FORMAÇÃO DE EDUCADORES AMBIENTAIS

EM CURSOS DE PEDAGOGIA

Mônica Andrade Modesto

(Secretaria de Estado da Educação-SE)

Resumo

As contradições deste modelo de sociedade, sobretudo no formato da crise

socioambiental, têm se intensificado. A Educação Ambiental (EA) Crítica emerge

como mecanismo indispensável para o enfrentamento desse contexto. No entanto,

uma EA Conservadora, que se difunde em seu fazer, corrobora com a manutenção do

padrão societário vigente tornando-o, ideologicamente, natural. A fim de

problematizar tal vertente, a formação de educadores ambientais críticos traz uma

possibilidade concreta, por isso não idealizada, para a constituição de uma EA de

tendência histórica que vise à emancipação humana. Neste ínterim, o campo do

currículo expressa um projeto de sujeito e de sociedade, podendo promover a inclusão

ou a exclusão destes, dependendo da forma como é desenvolvido. Desta feita, diante

da compreensão do campo do currículo como um território em que o saber, a

identidade e o poder estão interconectados, este artigo busca compreender as

possibilidades para a formação de educadores ambientais mediante cursos de

Pedagogia, tomando como pressuposto a dimensão ambiental da formação, a

educação ambiental crítica e a interdisciplinaridade. As análises curriculares dos

cursos de Pedagogia das universidades sergipanas foram realizadas a partir da análise

de conteúdo, delimitando como categorias a educação ambiental presente de forma

explícita nos currículos e a interdisciplinaridade. Os resultados desvelaram que os

currículos analisados apresentam-se como um espaço profícuo para a promoção de

educadores ambientais e as possibilidades, para isto estão presentes de forma tácita

nas disciplinas que os compõem. Contudo, é preciso que os professores dos cursos em

questão compreendam as possibilidades desveladas e as promovam em suas práticas

pegaógicas.

Palavras-chave: Currículo. Formação de educadores ambientais. Pedagogia.

Perspectivas curriculares e formação de educadores ambientais

Historicamente, a formação é fruto de um sistema de ensino fragmentado e,

por meio dele, constroem-se conhecimentos arraigados em apreensões de conteúdos

explícitos e implícitos no currículo. À vista disso, a formação docente não está alheia

a essa situação, afinal, a estrutura da escolarização de nível básico e superior foi

planejada a partir do paradigma tradicional do ensino que se fundamenta no “espírito

da privatização e da postura moral de egoísmo em quase todos os níveis do currículo

formal e oculto” (GIROUX; PENNA, 1997, p. 69).

Diante desse contexto, pensar na formação de educadores ambientais é pensar

em possibilidades para o enfrentamento desse modelo paradigmático que predomina

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10437ISSN 2177-336X

até os dias atuais e buscar caminhos para uma possível ressignificação das ideias

ocultas que estão inseridas nos currículos e que promovem a alienação e a divinização

do “eu” em detrimento da coletividade, superando, assim armadilhas paradigmáticas

das práticas pedagógicas (GUIMARÃES, 2012).

Nessa direção, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação

Ambiental (DCNEA) apontam para a necessidade de se vislumbrar a dimensão

ambiental da educação, superando a ideia fragmentada de que a educação ambiental

(EA) é uma especialização. Sob a óptica desse documento, a EA é entendida como

uma prática intencional, desconstruindo a ideia ingênua de que a educação é neutra,

desvelando um intuito de que o cerne da dimensão ambiental da educação é a busca

por uma relação homem-natureza pautada na ética.

Esse entendimento está relacionado a uma postura por parte do educador que

deverá pensar a sua prática pedagógica a partir da percepção de que a educação

ambiental enquanto dimensão estará, ainda que de forma implícita, promovendo uma

práxis transformadora. Essa postura proporcionará também um distanciamento da

visão utilitarista da educação ambiental, que se limita a oferecer uma série de

informações consideradas "úteis" ou “ecologicamente corretas” para a obtenção de

resultados em detrimento da promoção de “uma formação geral na direção de uma

educação integral” (GADOTTI, 2000, p. 08).

Nessa perspectiva, faz-se necessário refletir sobre a formação docente, afinal,

se os currículos de cursos de formação de professores pautarem-se nesse modelo

paradigmático, as instituições de ensino superior estarão formando multiplicadores de

uma educação ambiental ingênua e reducionista que, futuramente, formarão sujeitos

também ingênuos e esse ciclo não se romperá. Diante disso, entender como currículos

do curso de Pedagogia podem apresentar possibilidades para a formação de

educadores ambientais é um problema a ser refletido.

Considerando então que o papel da universidade na formação de professores é

“estabelecer um espaço educativo de diálogo para provocar a discussão das questões

socioambientais e o enfrentamento dos dilemas causados pela crise ambiental”

(GUERRA, 2011, s/p), os currículos voltados para a formação docente precisam

estabelecer nexos entre múltiplas culturas, linguagens e contextos e articular

conteúdos objetivos e subjetivos na produção de conhecimento e de sentidos a fim de

superar a lógica da racionalidade instrumental que exclui da construção do

conhecimento os valores entre ser humano e natureza (TRISTÃO, 2002) para que

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10438ISSN 2177-336X

assim possam estar formando educadores ambientais capazes de promover uma práxis

docente que vislumbra uma aprendizagem humanizada e significativa que busca o

enfrentamento da problemática ambiental.

Á luz desse pensamento, foram analisadas, do ponto de vista curricular,

possibilidades para a dimensão ambiental e formação de educadores ambientais nos

cursos de Pedagogia ofertados pelas universidades sergipanas, utilizando, para tanto, a

análise de conteúdo. A justificativa pela opção por esse curso está no fato de que o

foco da formação do pedagogo consiste em formar profissionais generalistas, aptos

para desenvolver, além de atividades relacionadas à docência, atividades que

compreendam a organização e a gestão de sistemas de ensino, bem como outras

relacionadas à produção técnico-científica, conforme expressam as Diretrizes

Curriculares Nacionais para os cursos de Pedagogia (DCN-Ped). Para tanto, faz-se

imprescindível uma formação que englobe “conhecimentos como o filosófico, o

histórico, o antropológico, o ambiental-ecológico, o psicológico, o lingüístico, o

sociológico, o político, o econômico, o cultural" (BRASIL, 2006, p. 01).

A análise curricular foi realizada delimitando como categorias “educação

ambiental explícita” e “interdisciplinaridade” que ajudaram a compreender como a

dimensão ambiental da formação se faz presente nos currículos dos cursos de

Pedagogia da Universidade Federal de Sergipe (UFS) e da Universidade Tiradentes

(UNIT).

A categoria “educação ambiental explícita” foi delimitada a partir dos

pressupostos da vertente crítica e a categoria “interdisciplinaridade” foi delimitada

com base no pressuposto de que a interdisciplinaridade é uma “nova atitude diante do

ato de conhecer" (CARVALHO, 1998, p. 09), levando em consideração as

orientações das DCN-Ped que delineiam que o pedagogo, ao formar-se, precisa estar

apto para “ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia,

Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do

desenvolvimento humano” (BRASIL, 2006, p. 02).

Desta feita, foi considerada, em ambas as categorias, a presença de conteúdos

relativos às questões ambientais, às relações socioambientais e à relação homem-

natureza a fim de identificar em que medida é possível promover a educação

ambiental ao longo da formação dos futuros pedagogos e o possível viés dessa

formação. É importante salientar que para o estabelecimento dessas categorias não

foram considerados elementos implícitos tais como “normas, valores e crenças não

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10439ISSN 2177-336X

declaradas que são transmitidas aos estudantes através da estrutura subjacente do

significado e no conteúdo formal das relações sociais da escola e na vida em sala de

aula” (GIROUX; PENNA, 1997, p. 57) pelo fato de que apenas a análise do projeto

pedagógico do curso não é suficiente para a identificação de resultados sólidos

referentes a esses elementos. Seria necessário, para tanto, observações, entrevistas,

questionários, etc, e, como esse não é o objetivo geral desta pesquisa, analisou-se os

elementos explícitos e implícitos relativos especificamente aos conteúdos presentes

nas ementas das disciplinas.

O currículo do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Sergipe e as

possibilidades para a formação de educadores ambientais

O atual currículo do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Sergipe é

resultado de uma série de reformulações que ocorreram ao longo desses 47 anos de

funcionamento. Nessa perspectiva, a estrutura curricular resultante da reformulação

atual, de 2007, apresenta um prisma unitário da sociedade e da educação que

vislumbra “a aproximação de teoria e prática, o respeito e o reconhecimento dos

diferentes saberes existentes em toda relação pedagógica” (BRETAS, 2009, p. 43),

tomando como princípio primeiro a interdisciplinaridade, segundo a mesma autora.

Dessa maneira, os conteúdos relativos aos eixos temáticos (campos do conhecimento

educacional; sociedade, Estado e educação; prática educativa; currículo,

conhecimento e diversidade sociocultural; política e gestão em educação; docência,

infância, juventude e cultura, e, educação e comunicação) são problematizados forma

integrada ao longo do curso das disciplinas que também são articuladas aos

conhecimentos de outras áreas, corroborando assim com as indicações contidas nas

DCN-Ped. Esses eixos temáticos são distribuídos entre as 64 disciplinas que

compõem a estrutura curricular do curso, dentre as quais 48 pertencem a gama

obrigatória e 16, à optativa.

Dessa maneira, verificou-se, mediante a categoria “educação ambiental

explícita” que apenas a disciplina Educação e Ética Ambiental apresenta de forma

manifesta conteúdos relativos à educação ambiental permeando os aspectos históricos

e normativos da educação ambiental, sua epistemologia, a dimensão educativa dos

estudos ambientais e a sua inserção nos espaços escolares e não-escolares. Todavia,

mediante a categoria “interdisciplinaridade” verificou-se que há uma grande

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10440ISSN 2177-336X

potencialidade para a promoção da abordagem ambiental da formação, uma vez que

um quantitativo considerável de disciplinas elenca algum conteúdo capaz de desvelar

essa promoção, conforme os dados apresentados na tabela 01.

Tabela 01 – Conteúdos potenciais para a abordagem ambiental da formação de

professores no currículo de Pedagogia da UFS

Legenda: (*) Disciplina obrigatória / (**) Disciplina optativa

Disciplina Conteúdos Fundamentos Filosóficos da Educação

(*) As correntes filosóficas.

Fundamentos Sociológicos da Educação (*)

Relação entre educação e sociedade.

Introdução à História da Educação (*)

Doutrinas pedagógicas.

Antropologia na Educação (*)

Sociedade, escola, cultura e conhecimento.

Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem

I (*)

O desenvolvimento humano e as condições sociais de

existência.

Fundamentos da Investigação Científica (*)

A ciência moderna e os cientistas.

Política e Educação (*)

Transformações econômicas e políticas dos séculos

XVII a XIX e a educação.

Trabalho e Educação (*)

A relação trabalho e educação

Ensino de Ciências nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental (*)

A relação entre Ciência, tecnologia e sociedade.

Ensino de História nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental (*)

Concepções de História.

Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental (*)

A relação entre Geografia, sociedade e educação.

Educação do Campo (*)

Relações econômicas e sociais contemporâneas no

campo e na cidade.

Política e Gestão Educacional II (*)

Autonomia das escolas. Educação, gestão democrática

e participação popular.

Educação e Movimentos Sociais (**)

Movimentos sociais na América Latina e no Brasil.

História Econômica Geral e do Brasil (**)

Relações entre História e Economia. Fonte: Anexo IV da Resolução nº 25/2008/CONEPE.

À primeira vista os conteúdos listados na tabela podem até parecer distantes da

educação ambiental ou dar a impressão de que não se relacionam a ela, mas

retomando as discussões aqui abarcadas, observa-se que há um ponto comum entre

eles: a relação entre o homem, a cultura, a história e o ambiente e não há educação

ambiental que desconsidere essa relação. Ratificando o que fora apontado por Bretas

(2009), as disciplinas convergem para a consolidação da abordagem relativa aos eixos

temáticos e para a mescla dos mesmos ao longo do curso. Dessa maneira, há uma

abordagem de conteúdos variada em cada semestre, intercalando-se disciplinas de

caráter técnico-pedagógico e epistemológico, do início ao fim do curso.

Esse fator é potencial para que se faça uma abordagem ambiental quando na

ocasião da transmissão dos conteúdos, posto que ao se trabalhar as correntes

filosóficas, por exemplo, é possível tratar do desencantamento do mundo e da busca

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10441ISSN 2177-336X

pela racionalidade que remete aos gregos e que ocasionou o desencadeamento de um

entendimento científico e instrumental do mundo, no qual “por meio do conhecimento

científico e da sua aplicação prática, os humanos dominariam a natureza, tornar-se-

iam seu dono, adquirindo, assim, o direito de usufruir dela „sem qualquer custo‟”

(DESCARTES, 1989, p. 79 apud QUINTAS, 2009, p. 34).

Essa compreensão permite ao aluno o desenvolvimento de percepções

relacionadas à educação e à sociedade, à educação e ao trabalho, à educação e à

política, à educação e à economia, entre outras, que abrangem a atual problemática

ambiental e, acima disso, a atual crise racional e civilizatória que temos vivenciado

que dogmatizou “mitos da acumulação progressiva e depurada do conhecimento

científico, da inviolabilidade do sujeito humano, da ordem logocêntrica do mundo e

das verdades universais” (GONZÁLEZ-GAUDIANO, 2005, p. 132). Essas

percepções, quando desenvolvidas, convergem para a evolução do estado de

consciência ingênua para o estado de consciência crítica do sujeito.

É exequível uma formação para o ensino de Ciências, de História e de

Geografia sob a égide da abordagem ambiental, pois ambas as áreas têm como figura

principal o homem e suas ações situadas no tempo e no espaço e não há como falar

das ações humanas sem considerar seus impactos (benéficos e maléficos) para o

ambiente. O ensino de História, Geografia e Ciências tem como conteúdo intrínseco e

implícito a contextualização das transformações espaço-temporais protagonizadas

pelo homem ao longo da produção dos seus meios de existência provenientes do

estabelecimento das culturas e esse conteúdo, quando enxergado e trabalhado,

apresenta condições de suscitar uma percepção crítica das consequências dessas

transformações.

É possível também que se trate de autonomia e gestão escolar chamando a

atenção dos futuros professores para a importância do coletivo, da parceria, dos

movimentos que emergem da sociedade civil na busca pela sensibilização e de

soluções para várias questões que predominam dentro e fora do espaço escolar (má

distribuição de renda, violência, fome, degradação ambiental, etc.), frutos de um

processo de ordenamento social dos bens ambientais na sociedade que explicita uma

ordem social “criada para servir a poucos e que se fundamenta na injustiça, na

desigualdade social e no uso intensivo e predatório dos recursos naturais”

(QUINTAS, 2009, p. 59).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10442ISSN 2177-336X

Além disso, o curso oferta estágios supervisionados curriculares obrigatórios

no qual o aluno tem a oportunidade de experienciar a relação teoria-prática e a

autonomia para desenvolver atividades relativas aos temas transversais, inclusive, o

tema meio ambiente e assim dar os primeiros passos para a promoção da educação

ambiental. Oferece ainda, atividades complementares de formação como a

participação em projetos de iniciação científica, de extensão e de iniciação à docência,

sendo este último o que abarca maior quantitativo de discentes e, ao mesmo tempo,

permite ao discente a paralela vivência da relação teoria-prática e, tal qual a disciplina

de estágio supervisionada, lhe permite autonomia para o desenvolvimento de projetos

relativos à educação ambiental.

Entretanto, respeitada a autonomia pedagógica do professor, cabe a cada

docente a escolha de realizar ou não essa abordagem em sua práxis assim como, de

realizar essa abordagem em disciplinas que não foram listadas por não apresentarem

uma ementa contemplativa de abordagem ambiental, através do referencial

bibliográfico indicado e das estratégias metodológicas escolhidas para o andamento

da disciplina. Para tanto, há que haver por parte dos professores o entendimento dessa

possibilidade que é também uma necessidade.

O currículo do curso de Pedagogia da Universidade Tiradentes e as

possibilidades para a formação de educadores ambientais

O currículo do curso de Pedagogia da Universidade Tiradentes é composto por

uma estrutura curricular que teve sua última reformulação no ano de 2015. Assim,

atualmente o curso é composto por 40 disciplinas, sendo 34 de caráter obrigatório e

06 de caráter optativo, o que perfaz um total de 146 créditos. Dessas 40 disciplinas,

verificou-se que 17 disciplinas apresentam conteúdos, em suas ementas, capazes de

promover a educação ambiental, sendo que, correspondendo à categoria “educação

ambiental explícita”, tem-se somente uma disciplina: Fundamentos e Metodologias do

Ensino de Ciências.

Ainda assim, pondera-se que a educação ambiental é um conteúdo dessa

disciplina, diferentemente do que ocorre na Universidade Federal de Sergipe que tem

uma disciplina direcionada exclusivamente para a educação ambiental. Em que pese

haja a observância desse fato, isso não quer dizer que nessa instituição a abordagem

da educação ambiental tenha menor importância que na anterior, isso vai depender

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10443ISSN 2177-336X

das estratégias utilizadas pelo docente da disciplina no decorrer do curso. Como se

trata apenas de um tópico de uma ementa de uma disciplina, não é possível identificar

a nuance de educação ambiental que é abordada na disciplina Fundamentos e

Metodologias do Ensino de Ciências.

Já em relação à categoria “interdisciplinaridade” verifica-se que as 17

disciplinas apresentam uma diversidade de conteúdos que perpassam diferentes áreas

do conhecimento capazes de promover a educação ambiental sob a óptica do trabalho

interdisciplinar, conforme é possível verificar na tabela 02.

Tabela 02 – Conteúdos potenciais para a abordagem ambiental da formação de

professores no currículo de Pedagogia da Unit

Legenda: (*) Disciplina obrigatória

Disciplina Conteúdos Seminários Integrados I, II e III

(*) Reflexão interdisciplinar sobre os temas transversais.

História da Educação (*)

O iluminismo e suas concepções de cultura e

educação.

Práticas Extensionistas I e II (*)

O papel da extensão universitária. Desenvolvimento de

ações extensionistas.

Cultura Afro-Brasileira e Indígena (*)

O contato entre o europeu e o africano e a chegada dos

africanos no Brasil. As diversas formas e tipos de

escravidão. A cultura negra e a cultura indígena. A

formação da sociedade nacional.

Fundamentos Antropológicos e Sociológicos (*)

O processo identitário do homem cultural e social. O

homem e a organização da sociedade.

Filosofia e Cidadania (*)

Evolução do conhecimento. Escola e Sociedade.

Ciência e Valores. Educação e Transformação. Ética e

Cidadania.

Organização do Trabalho Pedagógico (*)

LDB. Diretrizes Curriculares. Plano Nacional de

Educação.

Pedagogia Social (*)

Globalização e Identidade Social. Movimentos

Sociais. Problemas sociais na sociedade

contemporânea.

Fundamentos e Metodologia do Ensino de Ciências (*)

Interdisciplinaridade entre os estudos de Ciências

Naturais e a formação do espírito crítico. Educação

Ambiental.

Princípios do Ensino Médio e suas Modalidades (*)

Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino

Médio. Parâmetros Curriculares Nacionais.

Educação de Jovens e Adultos (*)

Valores, crenças, sentimentos concepções sobre o

mundo, representações sociais.

Currículos e Programas na Educação Básica (*)

Currículo e práxis.

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

e Geografia (*)

O sentido da História e da Geografia.

Educação e Saúde Escolar (*)

Saúde. Prevenção.

Fonte: Ementário do curso de Pedagogia da Universidade Tiradentes.

Os conteúdos que perpassam as disciplinas listadas são conteúdos que, sob a

égide da interdisciplinaridade, apresentam condições para a promoção de uma

educação ambiental crítica e transformadora. A exemplo disso é possível citar que as

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10444ISSN 2177-336X

disciplinas Seminários Integrados I, II e III, ao tratar especificamente dos temas

transversais propostos pelo MEC, intrinsecamente estará tratando de parâmetros “que

devem garantir uma mesma qualidade na construção do currículo regional, mas

atrelados e enfatizando a necessidade de restaurar a base material das escolas

públicas” (CASTRO; SPAZZIANI; SANTOS, 2012, p. 168) e também do tema Meio

Ambiente, elucidando, certamente, alguma nuance da educação ambiental. Ademais, a

abordagem ambiental e o desenvolvimento da percepção do significado da mesma

podem ser desvelados com os estudos relacionados à legislação educacional vigente,

na qual, em conformidade com os autores, é ressaltada, ainda que de forma vaga e

dispersa, “a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da

tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade” (idem, p. 166).

Além dos temas transversais, conteúdos relacionados ao desenvolvimento da

razão e à evolução do conhecimento são propícios para uma discussão de cunho

crítico sobre a abordagem ambiental da produção científica que, ao tempo em que

leva cada vez o sujeito ao esclarecimento, instrumentaliza seu pensamento e sua ação

e o torna um senhor, “não apenas porque é o senhor ou se estabeleceu como senhor de

toda a natureza, mas porque é senhor de si mesmos e de seus atos” (ARENDT, 2014,

p. 178), sendo, portanto, livre para produzir e também para destruir.

O estudo sobre a cultura, seja ela indígena, africana, europeia ou de quaisquer

povos, sobre a diversidade cultural e a multiculturalidade no Brasil e sobre o processo

identitário são também outra fonte para discussões interdisciplinares que promovem a

abordagem ambiental da educação. Afinal, não há como tratar desses conteúdos sem

considerar as diferenças entre os povos e os indivíduos e sem “observar as variantes

culturais a partir das quais grupos humanos interagem com a natureza, interagem

entre eles e entre eles e os seus símbolos” (BRANDÃO, 2005, p. 83), resultantes de

modos de vida imbuídos de significações distintas sob as lentes de diversas culturas. E

compreender os modus vivendi é basilar para a compreensão da nuance crítica da

educação ambiental.

O ensino de conteúdos relacionados à globalização e seus desdobramentos na

contemporaneidade pode ser outro locus para a abordagem ambiental da formação

docente, posto que a relação entre esse conteúdo e a problemática ambiental é

indissociável. A respeito disso, Meira-Cartea (2005) aponta que a globalização e,

principalmente, a globalização econômica é responsável pelas perversões econômicas,

sociais e ecológicas que ludibriam “os riscos ecológicos que a sociedade industrial

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10445ISSN 2177-336X

contemporânea produz” (p. 153). Corroborando com esse entendimento está Porto-

Gonçalves, ao afirmar que o mundo globalizado que é o “mundo para ganhar dinheiro

é o fim da humanidade” (2011, informação verbal), uma vez que o consumo

desenfreado, além de instrumentalizado, é estimulado através da construção do

significado de que só é possível “o fortalecimento das identidades individuais e

sociais por meio da aquisição de bens” (ZACARIAS, 2009, p. 119).

Currículo e práxis, valores, crenças, concepções sobre o mundo são conteúdos

que propiciam o debate relacionado à educação ambiental crítica que, em seu caráter

transformador, pressupõe como urgente a emancipação dos sujeitos e essa

emancipação não ocorrerá enquanto o currículo for compreendido como um território

em disputa pela reprodução de uma ideologia que utiliza como instrumentos a

correlação de forças sociais, políticas e culturais. É interessante pensar que mesmo

sendo um campo de disputa, é também “o mais politizado, inovado, ressignificado”

(ARROYO, 2013, p. 13), apesar disto, o currículo permanece asfixiado pela mídia,

pelos gestores, pelas avaliações, pela imposição de um currículo por competências, de

um currículo único, pelo controle repressor dos docentes, entre outros (idem). E isto

acontece porque sutilmente ele estabeleceu-se como um instrumento de poder. Mas o

mesmo poder que tem para reproduzir uma ideologia dominante, pode vir a ter para

promover uma educação crítica e pautada na abordagem ambiental da formação.

Resta aos cursos de formação docente o desafio de romper com esse paradigma e

formar futuros professores aptos a mediarem a emancipação dos alunos desse

processo reprodutor.

O ensino de conteúdos relacionados à saúde é outra abertura de caminho para

a promoção da educação ambiental, uma vez que o termo saúde não faz menção

exclusivamente às condições biológicas do organismo, mas também às condições do

ambiente no qual estamos inseridos e um ambiente saudável proporciona sensações

benéficas ao organismo que se traduzem também em saúde, tanto que vários

pesquisadores já começam a considerar o conceito de saúde como ausência de doença

um conceito falido, uma vez que a ausência de saúde é “consequência das condições

de vida – incluindo aspectos relacionados à alimentação, ao salário, à educação, à paz,

ao lazer e à justiça social” (GUIMARÃES, 2010, p. 13).

Desse modo, observa-se que o currículo do curso de Pedagogia da

Universidade Tiradentes apresenta ampla condição para a promoção da educação

ambiental através de práticas docentes interdisciplinares. As disciplinas e conteúdos

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10446ISSN 2177-336X

listados, pelo teor diversificado, possibilitam o estabelecimento de relações sobre

vários dos aspectos englobados na problemática ambiental, o que é bastante positivo,

visto que permite ao aluno a ampliação de seu horizonte e de sua percepção sobre o

ambiente. Possibilitam também uma abordagem ambiental crítica da formação

docente, que seja capaz de desvelar ao aluno a complexidade da educação ambiental e

a superação da visão ingênua na qual lhe é atribuído um significado simplista e

limitado de criticidade (CARVALHO, 2012).

Considerações

As estruturas curriculares dos cursos de Pedagogia das instituições

pesquisadas apresentam possibilidades para que se aborde uma dimensão ambiental

voltada para a égide da emancipação e transformação por meio de possibilidades de

práxis capazes de desvendar aos futuros professores ética, reconhecimento do outro e

alteridade para com os homens e o ambiente.

Através das análises realizadas torna-se possível concluir que, do ponto de

vista documental, o currículo do curso de Pedagogia desvela condições para a

promoção de uma formação docente capaz de formar também educadores ambientais

que, a partir de suas futuras práticas pedagógicas, poderão atuar frente ao

enfrentamento da problemática ambiental. Mas, para que isso possa acontecer, é

preciso que os professores do curso compreendam as possibilidades desveladas e as

promovam em suas práticas de ensino.

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10449ISSN 2177-336X

UNIDADE DE CONSERVAÇÃO COMO ESPAÇO FORMATIVO: UMA

PROPOSTA PARA A FORMAÇÃO DE EDUCADORES AMBIENTAIS

Edileuza Dias de Queiroz

Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ)

Universidade Federal Fluminense (UFF)

Resumo

O processo educativo representa um poderoso fenômeno social, capaz de contribuir

com a transição paradigmática necessária para se construir, historicamente, novas

formas sustentáveis de relações dialógicas entre seres humanos e a natureza. Nesse

sentido, a Educação Ambiental (EA) passou a ser apresentada como uma importante

estratégia para a formação de indivíduos partícipes na construção de uma sociedade

sustentável, socialmente justa e ecologicamente equilibrada. Assim, há a necessidade

de estimular os ambientes educativos ancorados em vivências, ou seja, construir

conhecimentos in lócus, ou seja, participar da realidade. Estamos vivenciando na

sociedade uma moderna um período de crise socioambiental, onde uma de suas causas

é a oposição sociedade-natureza. Com isso, esta pesquisa objetiva contribuir para o

processo formativo de educadores ambientais em espaços extramuros acadêmicos,

tomamos como locos da formação uma Unidade de Conservação localizada no

município de Nova Iguaçu/RJ, o Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu. Os

principais atores inseridos no processo formativo são os docentes de duas escolas do

entorno do Parque. Como forma de contribuir na construção de orientações teórico-

metodológicas, visamos a inserção no processo formativo de educadores ambientais

elementos que contribuam, efetivamente, para uma postura que ressalte a importância

da relação homem-natureza, estamos avançando na pesquisa e propondo reflexões e

ações durante esse processo a partir da vivência, da formação no interior no Parque.

Acreditamos que a formação nesses espaços propiciem o contato direto com a natureza,

possibilitando uma visão diferenciada de mundo, pois, é no contato com a realidade

socioambiental que cada indivíduo que se encontra em formação vai se constituindo

enquanto educador ambiental.

Palavras-chave: Educação Ambiental. Formação de Educadores Ambientais.

Unidades de Conservação.

Considerações Iniciais

Este artigo é parte de uma pesquisa de Doutorado, que encontra-se em

andamento no Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal

Fluminense (POSGEO/UFF), bem como, oriundo da minha experiência enquanto

professora da Educação Básica, reflexões no Grupo de Estudo e Pesquisa em

Educação Ambiental, Diversidade e Sustentabilidade (GEPEADS), participação como

Supervisora e Coordenadora de Área do PIBID – subprojeto Geografia (IM-UFRRJ).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10450ISSN 2177-336X

Assim, é de grande interesse e importância avançar, em termos de aprofundamento

teórico, metodológico e de pesquisas, devendo culminar com uma tese.

A partir do lugar de onde falo, considero que a Educação é condição

fundamental na formação cidadã frente às questões socioambientais. No Brasil, a Lei

9795/99 (BRASIL, 1999) – regulamentada pelo Decreto 4281/2002 (BRASIL, 2002)

– que instituiu a Política Nacional de Educação Ambiental, no Art. 5º, inclui a

Educação Ambiental em todos os níveis e modalidades de ensino, recomendando ser

trabalhada transversalmente, com valorização da dimensão ambiental em cada

disciplina. As Diretrizes Curriculares Nacionais de Educação Ambiental (BRASIL,

2012) vem ratificar a legislação anterior, ressaltando a inserção da Educação

Ambiental (EA) em todos os níveis e modalidades de ensino. Apesar da legislação

existente, observamos uma fragilidade muito acentuada em relação à inserção da EA

no processo educativo, pois,

(...) existe um descompasso entre o discurso sobre a inserção e a efetivação

da Educação Ambiental e a prática, seja na escola, seja na Universidade.

Então, é preciso que as instituições formadoras direcionem a atenção para

esse fato, a começar pela reflexão sobre o papel dos professores

formadores. Alertamos também para o fato de que existe um silêncio, no

que diz respeito os debates socioambientais, no campo das políticas

curriculares para a educação superior (QUEIROZ, 2012, p.86).

Acreditamos que uma das possibilidades para a inserção da dimensão

socioambiental na formação de educadores é a discussão da temática na instituição

universitária, especialmente junto aos cursos de Licenciatura. Guimarães (2004, p.

158) enfatiza a importância da formação de educadores ambientais:

A formação de educadores ambientais como dinamizadores de um

ambiente educativo, fomentada por uma pedagogia do movimento

complexo, amplia o “campo ambiental” ao incorporá-los, como novos

“sujeitos ecológicos”, ao movimento contra-hegemônico de uma

resistência crítica.

Desse modo, consideramos que os educadores são importantes agentes

colaboradores para o processo de transformações sociais e, portanto, a Universidade

deve lhes proporcionar uma formação tanto político-filosófica quanto técnico-

metodológica.

Neste sentido, vislumbramos uma formação docente, intrínseca ao processo

formativo do educador ambiental, uma vez que vivemos mergulhados nas práticas de

uma organização social predatória, ou seja, num modelo específico de sociedade e de

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10451ISSN 2177-336X

seu modo de produção (GUIMARÃES, 2004), onde o individualismo impera sobre a

coletividade. Advém, então, a necessidade de fazer com que as pessoas construam

novas relações, vislumbrando a construção de uma outra realidade, mais justa e menos

degradada sociambientalmente.

A Educação Ambiental que vem sendo chamada pela sociedade a contribuir na

superação dessa grave realidade, deve contemplar em suas propostas educativas o

resgate do natural numa vivência em outros referenciais paradigmáticos, como uma

forma pedagógica de enfrentamento desta situação.

Essa dimensão educacional pode contribuir significativamente com o

enfrentamento deste grave momento de crise em que vivemos. Por esse caminho,

Guimarães (2006, p. 26) define a EA como:

Proposta voltada para um processo educativo desvelador e desconstrutor

dos paradigmas da sociedade moderna com suas “armadilhas

paradigmáticas” e engajado no processo de transformações da realidade

socioambiental, construtor de novos paradigmasconstituinteseconstituídos

por uma nova sociedade ambientalmente sustentável e seus sujeitos.

As questões socioambientais quando minimizadas, reduzidas a um universo

essencialmente natural e técnico, e, portanto, “neutro”, levam à armadilha

paradigmática (GUIMARÃES, 2004), e serve para apaziguar, cada vez mais, as

acirradas contradições sociais inerentes a esse contexto.

Consideramos o processo educativo como um poderoso fenômeno social capaz

de contribuir com a transição paradigmática necessária para se construir historicamente

novas formas sustentáveis de relações dialógicas entre seres humanos e a natureza.

Assim, há a necessidade de estimular os ambientes educativos ancorados em vivências,

ou seja, construir conhecimentos in lócus, ou seja, participar da realidade.

A formação in loco

Como forma de contribuir na construção de orientações teórico-

metodológicas, visando a inserção no processo formativo de educadores ambientais

elementos que contribuam, efetivamente, para uma postura que ressalte a importância

da relação homem-natureza, estamos avançando na pesquisa e propondo reflexões e

ações durante esse processo a partir da vivência. Neste contexto, Queiroz e Guimarães

(2015, p. 12) afirmam que,

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10452ISSN 2177-336X

A vivência in loco, favorecida pelo trabalho de campo, representa um

ambiente educativo que deve ser mais valorizado, uma vez que parte da

realidade empirista, da observação, da experienciação pelos sentidos. A

partir daí há a possibilidade de uma olhar mais crítico, sensível e engajado,

para as diferentes questões que permeiam a vida em sociedade. Essa

vivência também nos possibilita a ampliação das fronteiras do

conhecimento, da percepção de mundo por outras referências.

Nesta direção, acreditamos que a formação em espaços de propiciem o contato

direto com a natureza possibilita uma visão diferenciada de mundo, pois, é no contato

com a realidade socioambiental que cada indivíduo que se encontra em formação vai

se constituindo enquanto educador ambiental. E assim, encontramos espaços “extra-

muros acadêmicos” um ambiente com grande potencial. Ressaltamos aqui, a

importância da vivência in loco, pois esta, segundo Guimarães e Queiroz (2013, p.

58),

[...] colabora com o despertar do aluno para a pesquisa, para o sentido

investigativo do processo de ensino-aprendizagem, o que é fundamental

para a formação de um profissional pesquisador dinâmico e criativo, apto a

rupturas paradigmáticas. Ao experienciar a pesquisa nesse contexto, o

pesquisador neófito no campo da Educação Ambiental deve ser estimulado

a pensá-la a partir das demandas socioambientais e dos problemas

vivenciados no cotidiano, como forma de práxis da pesquisa.

A formação ancorada na vivência, no contato direto com a realidade

socioambiental, possibilita uma “nova forma” de fazer Ciência, uma vez que o objeto

estudado está sendo visto, sentido, vivido. Assim, corroboramos com Kayser (2006, p.

94), ao afirmar que “qualquer um que deseje conhecer um fenômeno só poderá ter

sucesso se entrar em contato com ele, ou seja, vivê-lo (praticá-lo) dentro do próprio

meio desse fenômeno”.

Unidades de Conservação enquanto espaços de formação

As Unidades de Conservação não dizem respeito apenas à proteção de

ecossistemas ameaçados pela ação do ser humano, Coelho, Cunha e Monteiro (2009),

afirmam que “As Unidades de Conservação são, ao mesmo tempo, territórios de

conservação, territórios de vida, territórios de produção, territórios de pesquisa

acadêmica, entre outros.”

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10453ISSN 2177-336X

A partir da aprovação da Lei 9.985/2000, que implementou o Sistema

Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), as Unidades foram categorizadas em

dois grupos: as de proteção integral e as de uso sustentável. Na primeira categoria o

objetivo principal é a proteção da natureza, admitindo-se o uso restrito dos recursos

naturais (visitação, pesquisa científica e Educação Ambiental); na segunda categoria,

o objetivo primeiro é compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável

dos recursos naturais (extrativismo, coleta e manejo ambiental).

A Lei 9885/2000, define a Unidade Conservação como:

(...) espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas

jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído

pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob

regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas

de proteção(BRASIL, 2000).

No entanto, consideramos que estes espaços devem ultrapassar sua concepção

como espaços de preservação de ecossistemas e de seus recursos naturais, pois, devem

ser considerados espaços de relações socioambientais. No entanto, esses espaços não

têm sido privilegiados no sentido de acolher determinados usos, ou seja, são

subutilizados. Vallejo (2002), ressalta que as parcerias, com os diversos setores,

inclusive as universidades não têm investido ou realizado parcerias como deveriam

fazer.

Espaços como as Unidades de Conservação são potenciais mobilizadores de

novas concepções, possibilitam a compreensão/percepção mais complexa da realidade

socioambiental local e seu “desvelamento”, a realização da vivência imersa na

realidade socioambiental que se deseja pesquisar é imprescindível, pois parte-se do

pressuposto de que,

[...] a chave do entendimento da problemática ambiental está no mundo da

cultura, ou seja, na esfera da totalidade da vida em sociedade [...]. Afinal,

são as práticas do meio social que determinam a natureza dos problemas

ambientais que afligem a humanidade [...].No processo de transformação

do meio ambiente [...] são criados e recriados modos de relacionamento da

sociedade com o meio natural [...] e no seio da própria sociedade [...]

(QUINTAS, 2005).

Nesta direção, segundo Queiroz e Guimarães (2015), é fundamental um

esforço para se conhecer e sistematizar todos os aspectos que compõem a realidade e

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10454ISSN 2177-336X

refletir acerca de processos formativos, a fim de construir consistentes caminhos que

direcionem para o real entendimento do mundo que se vive.

No caso específico da pesquisa que vem sendo realizada – e aqui apresentada

em parte –, além da vivência no contexto social, político e produtivo de uma

determinada Unidade de Conservação, haverá participação do cotidiano de diferentes

usuários que constituem/vivenciam esse espaço em sua essência como ambiente vivo.

A importância desses espaços, para fins educativos, também é ressaltada por

Pimentel e Magro (2014, p. 7), ao afirmarem que,

Os parques podem ser encarados como laboratórios de ensino de uma nova

postura social em relação ao meio ambiente. Daí a importância da

educação ambiental nessas áreas, pois suas práticas, quando socialmente

referenciadas, promovem uma visão crítica e interligam as atribuições

básicas dessas UCs, relacionadas a conservação, ao seu uso público e ao

desenvolvimento sustentável das comunidades adjacentes.

Encontramos na Educação Ambiental subsídios para a efetivação de práticas

formativas em Unidades de Conservação. Esta vertente educativa/formativa tem a

pretensão de contribuir para o amadurecimento, crescimento e fortalecimento do

saber, da ação, da reflexão e na construção do caminho que levem à

compreensão/intervenção na realidade.

Para Valenti et al (2012), “é preciso haver processos de formação continuada

de educadores ambientais que atuam nas Unidades de Conservação e outras

estratégias que possibilitem maior repercussão das políticas públicas em seu

trabalho cotidiano”.

Percursos e caminhos da pesquisa

Com o intuito de apontar iniciativas e instrumentos estratégicos de ação, para

subsidiar as atividades de uso público e a gestão em uma Unidade de Conservação

localizada no município de Nova Iguaçu- RJ – Parque Natural Municipal de Nova

Iguaçu (PNMNI), objeto de estudo da pesquisa –, apontamos a formação do educador

ambiental como fomentadora de atividades que proporcionem transformações da

realidade atual.

O PNMNI faz parte da Área de Proteção Ambiental do Gericinó-Mendanha,

considerada Reserva da Biosfera pela UNESCO em 1996. Em 05 de junho de 1998, o

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10455ISSN 2177-336X

Parque passou a ser considerado como Unidade de Conservação de Proteção Integral

pelo Decreto nº 6001. Segundo o NIMA (2010), o PNMNI é o primeiro Geoparque do

Estado do Rio de Janeiro, sendo detentor de atributos que contemplam valores

ecológicos, culturais e históricos, além de uma significativa importância geológica

devido à existência de um vulcão que se estima estar inativo há 38 milhões de anos.

Neste sentido, o PNMNI é considerado de grande importância para a região, no

entanto, existe a carência de inserções de projetos que o tornem mais atraente, onde a

comunidade crie laços de identidade, valorizando-o e dando-lhe maior visibilidade.

Acreditamos que atividades envolvendo principalmente as escolas do entorno,

tornam-se de grande relevância.

Com isso, buscamos investigar como se dá, no processo formativo através de

vivências in lócos, a dimensão socioambiental, a fim de subsidiar a proposição de

indicativos para a consolidação da Educação Ambiental em espaços

deeducação/formação extramuros acadêmicos. Apostamos na educação como forte

aliada no processo de transformações sociais. Neste sentido, Carspecken e Aplle

(1992, p. 509 apud ALVES-MAZZOTTI e GEWANDSZNADJER, 2004, p. 139):

A educação tem sido uma importante arena na qual a dominância é

reproduzida e contestada, na qual a hegemonia é parcialmente formada e

parcialmente quebrada na criação do senso comum de um povo. Assim,

pensar seriamente sobre educação, como sobre cultura em geral, é pensar

também seriamente sobre poder, sobre os mecanismos através dos quais

certos grupos impõem suas visões, crenças e práticas.

Há necessidade de pensar e realizar processos formativos de Educação Ambiental em

espaços onde a natureza seja um fator de grande inspiração. Refletindo sobre isso,

elencamos duas escolas que estão localizadas no entorno da Unidade de Conservação

que é objeto de estudo desta pesquisa, num raio de aproximadamente 2 km. No

primeiro momento, foram feitas visitas às escolas, onde aconteceu uma palestra sobre

Educação Ambiental e processos formativos, foi discutido com o trabalho com a

Educação Ambiental vem sendo realizado pelos professores, a questão da importância

da Unidade de Conservação para a região, o diálogo entre a direção do PNMNI e os

educadores.

A partir daí, foi feito um convite para os educadores interessados na temática,

para a uma formação realizada no interior do Parque. Acreditamos no afloramento do

sentimento de pertencimento, de inserção, de participação fazendo com que a

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10456ISSN 2177-336X

identidade e a valoração (re)nasçam. E quando isto ocorrer, as ações cumprem os seus

objetivos, pelo menos em parte. Objetivamos trabalhar com questões relacionadas à

percepção ambiental; à reflexões acerca da importância do espaço vivenciado; a

projetos envolvendo a inserção dos alunos no Parque. Planejamos, cinco encontros

quinzenais, aos sábados, no período da manhã. As atividades partiram sempre de uma

reflexão inicial, seguida de uma pequena trilha.

Acrescentamos que, a inserção da Educação Ambiental nas Unidades de

Conservação devem, não apenas direcionar para a sensibilização e interpretação

ambiental – apesar destas serem consideradas de grande valor –, mas, trabalhar com o

senso crítico da população, a fim de torná-la reflexiva e sensível, onde os sujeitos

tenham capacidade de criar alternativas para a solução de problemas, tornando-se

assim, mais participativos nos processos de tomada de decisão pelo poder público, por

meio de novas práticas reflexivas. Ou seja, tendo uma nova práxis de intervenção na

realidade, resultado do processo formativo

Considerações

Ressaltamos a necessidade de refletir acerca de diretrizes e procedimentos

metodológicos para projetos de Educação Ambiental em Unidades de Conservação,

sobretudo, as localizadas em grandes centros urbanos, tendo em vista, também, a

baixa produtividade acadêmica nesta área que possa embasar e instrumentalizar

efetivas práticas socioambientais nestes respectivos espaços.

É enveredando por entre trilhas, muitas vezes sinuosas, que a implementação

da Educação Ambiental pode, efetivamente, ocorrer. Essa educação não formal em

contato direto com a natureza pode possibilitar um maior envolvimento das pessoas

com as questões socioambientais, considerando-se que, as Unidades de Conservação –

mais especificamente a categoria Parque – , abrigam motivações e interesses que

despertam para uma formação cidadã, com capacidade de estabelecer uma nova

dinâmica socioambiental.

É imprescindível formação dos diversos atores envolvidos escolares com a

dinâmica do Parque, no planejamento de ações e políticas públicas em Educação

Ambiental para esse contexto. Ainda é frágil esse diálogo.

Apostamos na Educação Ambiental porque esta é, antes de tudo, educação. E

como reflete Guimarães (2004, p. 138), “educação é construção e não apenas

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10457ISSN 2177-336X

reprodução e transmissão de conhecimentos, é a construção de novos caminhos, de

novas relações entre a sociedade e a natureza”.

Reafirmamos aqui que a articulação, da escola e seus atores com o Parque é

fundamental, para que haja compreensão, valoração, aprendizagem. Exige, também,

muito conhecimento acerca do saber ambiental, pois este “flui a seiva epistêmica que

reconstitui as formas do ser e do pensar para apreender a complexidade ambiental”

(LEFF, 2001, p. 192).

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DAS TENSÕES POLÍTICAS À FORMAÇÃO DE EDUCADORES

AMBIENTAIS: CONTEXTUALIZANDO POLÍTICAS PÚBLICAS E A

PRÁXIS PEDAGÓGICA

Aline Lima de Oliveira Nepomuceno

Universidade Federal de Sergipe (UFS)

Resumo

A Educação Ambiental (EA) nasce da sensibilidade de aliar conhecimento científico,

tecnológico, artístico e cultural a uma nova consciência de valores, de respeito aos

seres humanos e aos recursos naturais, com perspectiva de ajudar a formar uma

mentalidade impulsionadora da construção de um novo paradigma emancipador e

transformador da crise civilizatória atual. Diante disso, as políticas públicas

ambientais e os programas educativos relacionados à transformação da crise

socioambiental demandam cada vez mais novos enfoques integradores de uma

realidade contraditória e geradora de desigualdades, que transcendem a mera

aplicação dos conhecimentos científicos e tecnológicos disponíveis. Partindo dessas

assertivas, esta pesquisa visa analisar as concepções de formação de educadores de

gestores participantes do processo contrutivo da Política Estadual de EA de Sergipe

(Lei nº 6882/2010). Assim, busco discutir, minimamente, a influência ou não desta lei

na formação de educadores apontando caminhos de consolidação da EA Crítica e suas

respectivas potencialidades para a emancipação e enfrentamento da ordem dominante,

instaurada no regime de exclusão das relações sociais e, sobretudo, da relação ser

humano e natureza. Com isso, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os

principais gestores desse processo de construção política. E, posteriormente, para

subsidiar as análises dos dados coletados, utilizei metodologicamente adaptações da

Análise Textual Discursiva (ATD) visando perceber concepções e práticas inebriadas

por visões ideologizadas de mundo. Portanto, a intenção foi a produção de um

trabalho que avance nas reflexões a respeito de quais sentidos e quais distintos

projetos políticos se agregam à EA em Sergipe. Tais avanços, nos campos

epistemológico e epistêmico, possibilitarão dar novos sentidos às práticas educativas

de EA.

Palavras-chave: Educação Ambiental. Formação de educadores ambientais. Política

Pública.

Introdução: caminhos e pressupostos políticos e epistemológicos

A crise socioambiental que nos envolve vem ganhando proporções planetárias

que se impõem perante a sociedade. O atual estágio de desenvolvimento do modo de

produção capitalista atingiu patamares de destruição ambiental, não experimentados

em nenhuma outra fase da história da humanidade. Milhões de seres humanos estão

condenados a viver sob condições degradantes de vida e, enquanto isso, os avanços

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10459ISSN 2177-336X

científicos e tecnológicos pouco têm contribuído para amenizar os impactos

socioambientais que atinge grande parte da população humana no planeta.

Nessa direção, a Educação Ambiental (EA) passou a ser apresentada como

uma importante estratégia para a formação de indivíduos partícipes na construção de

uma sociedade sustentável, socialmente justa e ecologicamente equilibrada.

No contexto internacional, as discussões sobre a EA se solidificaram na

década de 1970, em virtude da realização de importantes eventos. Dentre eles, destaco

a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano (1972) e a Conferência

Intergovernamental de Educação Ambiental (1977), a partir dos quais foram definidos

princípios, objetivos, estratégias e recomendações para o desenvolvimento da EA

mundial.

Neste ínterim, o histórico de criação de políticas públicas de EA em âmbito

federal no Brasil iniciou-se em 1973 com a criação da Secretaria Especial de Meio

Ambiente (Sema), que tinha como uma de suas atribuições “o esclarecimento e a

educação do povo brasileiro para o uso adequado dos recursos naturais, tendo em

vista a conservação do meio ambiente” (BRASIL, 2005, p. 22).

Apesar de indícios da formação do campo socioambiental ter se dado nos anos

de 1970, somente a partir da década de 1980 é que a EA no Brasil começou a ganhar

visibilidade, tendo em vista a abertura política e a ascensão dos movimentos sociais.

Nesse momento, iniciaram-se diversos encontros e reuniões como importantes

espaços de construção de identidade social em torno das práticas educativas voltadas

para o meio ambiente.

Com isso, foi apenas em 1981 que a EA apareceu pela primeira vez em um

marco legal federal, inserida como um princípio da Política Nacional do Meio

Ambiente (BRASIL, 1981). Posteriormente, em 1988, teve a sua importância

reforçada ao ser destacada na Constituição Federal no artigo nº 225, como uma forma

de se assegurar o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e

também de defesa e preservação ambiental para as gerações presentes e futuras

(BRASIL, 1988). Em seguida, direcionando a EA para a formação humana e cidadã

foi criada em 1999 a Política Nacional de EA – Lei nº 9795/99 (BRASIL, 1999), que

além de muitos outros encaminhamentos institui a EA como obrigatória em todos os

níveis de ensino formal.

Neste sentido, em 2010 é instituída em Sergipe a Política Estadual de

Educação Ambiental - Lei nº 6882/10 (SERGIPE, 2010), que dispõe sobre a

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10460ISSN 2177-336X

Educação Ambiental e seus princípios, objetivos e campos de atuação, visando a

garantia do envolvimento ativo e permanente da comunidade escolar na defesa da

qualidade socioambiental do território onde está inserida.

Neste cenário a EA surge como uma área a ser implementada, tendo em vista a

crescente conscientização sobre a problemática ambiental, do qual é vitimado todo o

planeta sem distinções. Sendo assim, como contribuição destes encontros e demais

vêm sendo promovidos questionamentos sobre as formas de ocupação e exploração

que o homem tem destinado ao meio ambiente natural e, consequentemente, ao

ambiente social e cultural. Nasce, desta forma, a preocupação de dotar a EA de

sólidos argumentos que possibilitem uma maior e melhor compreensão das questões

ambientais e dos desafios políticos, culturais, sociais, econômicos e ecológicos que

estamos envolvidos.

Com efeito, decorrente das diferentes visões de mundo que constituíram a EA

ao longo da história e da pluralidade de perspectivas pedagógicas inerentes à sua

prática, muitas são as possibilidades de entendimento dos conceitos associados à

dimensão ambiental. Contudo, chamo atenção para as ações em EA que ainda hoje

apresentam-se fragilizadas, mesmo com a crescente difusão da EA, sobretudo no

processo educativo (GUIMARÃES, 2004). Diante destas práticas é possível afirmar

que a inserção da EA tem sido feita basicamente por três caminhos: projetos,

disciplinas especiais e inserção da temática ambiental nas disciplinas.

É nesse sentido que considero importante investigar os discursos presentes no

campo da EA, particularmente materializados nesta pesquisa, nos documentos oficiais

que definem suas diretrizes e suas políticas públicas, em especial a de Sergipe

instituída pela Lei nº 6882/10 que concretizou a Política Estadual de Educação

Ambiental (PEEA). Assim, nesta pesquisa busco respostas para alguns desafios

enfrentados na implementação da EA, especificamente no tocante a PEEA para a

educação formal. Procuro investigar como a política sergipana de EA, especialmente

no discurso de seus gestores, materializa a formação de educadores ambientais e suas

práticas pedagógicas.

A pesquisa e seus aspectos metodológicos

Em virtude do objetivo desta pesquisa, opto por uma abordagem metodológica

de natureza qualitativa para a investigação e o relato analítico de experiências

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10461ISSN 2177-336X

realizadas (MINAYO, 1994). Para tornar exequível esta pesquisa, foram delimitados

os procedimentos metodológicos abaixo descritos.

Apoio-me no materialismo histórico dialético, enquanto método que

compreende o mundo sob a égide do capitalismo, por entender que esta perspectiva

permite uma melhor apreensão do movimento do real, visando a compreensão da

totalidade das relações existentes em determinado fato, fenômeno ou situação da

realidade, em que a unidade é o movimento.

Com isso, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com gestores da

política pública em questão. Os mesmos foram selecionados a partir da função que

assumiram no âmbito da construção da Lei nº 6882/10, de modo que fosse possível

visualizar a percepção de representantes do Governo Estadual da época quanto a

formação de educadores(as) ambientais, revelando no contexto de produção histórico

desta política pública quais as demandas para a práxis socioambiental e seus sujeitos

no cotidiano escolar, através da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Recursos

Hídricos – SEMARH (G1 e G2). Isso evidencia a necessidade de compreender melhor

o contexto de produção das políticas de EA, o como elas concebem a formação de

educadores(as) ambientais e problematizam a prática pedagógica dos mesmos na

concretização da EA nas escolas.

Para a realização das entrevistas, tomei cuidado com seu processo de

preparação, pois, assim como consideram Marconi e Lakatos (2009), essa etapa é

importante, porque requer tempo e exige algumas medidas, como, por exemplo: ter

em vista o objetivo a ser alcançado, levar em consideração o conhecimento prévio do

entrevistador sobre o assunto, garantir ao entrevistado o segredo de seus depoimentos

e de sua identidade, organizar um roteiro com as questões importantes; além de

submeter a pesquisa ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), via Plataforma Brasil,

pois trata-se de uma pesquisa que envolve seres humanos que sempre há um risco

mínimo, seja de constrangimento, seja de exposição. Após a realização das

entrevistas, foi efetuado o procedimento de transcrição, constituindo a primeira versão

escrita do texto do entrevistado. Tal processo também foi um momento de análise,

pois tornou possível captar alguns aspectos das falas e do contexto da entrevista.

As informações coletadas foram analisadas com base em um referencial

teórico que abarca a perspectiva da EA Crítica como ato político de transformação da

realidade, superando a visão hegemônica e reduzida da realidade, e, entendendo a

prática pedagógica como contextualizada e emancipatória. Essa opção se deu, uma

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10462ISSN 2177-336X

vez que acredito ser esta vertente a que está mais alinhada com o pensamento contra-

hegemônico e que colabora para com uma sociedade mais justa, mais democrática e

menos excludente. Essas escolhas se aproximaram da Análise Textual Discursiva –

ATD (MORAES, GALIAZZI, 2006) como metodologia de análise dos dados

coletados nas entrevistas capaz de subsidiar a análise crítica da realidade investigada.

É oportuno esclarecer que os instrumentos de coleta de dados aqui utilizados

para a pesquisa revelam posicionamentos e opiniões de um determinado grupo de

pessoas que ajuda a diagnosticar e a compreender algumas possibilidades e

dificuldades da implementação da EA Crítica a partir da dimensão política. Contudo,

esses dados não podem ser generalizados de forma absoluta, o que não quer dizer que

não são importantes para entender determinadas práticas político-pedagógicas neste

campo.

Disputas políticas em contexto

Para entender EA como política pública, é interessante iniciar com os

significados dessas palavras. Logo, como política pública compreendo como o

conjunto de ações desencadeadas pelo Estado, nas escalas federal, estadual e

municipal, com vistas ao bem comum. Estas ações podem ser preventivas ou

estimulativas, sendo exemplo dessas últimas o incentivo econômico para o

desenvolvimento sustentável ─ em muitos momentos questionáveis quanto a sua

viabilidade. Portanto, a responsabilidade pela implantação de políticas públicas

ambientais invoca toda a estrutura social, econômica e política, gerando a formação

de sistemas complexos.

Ressalto no processo de construção política a relevância da participação social,

como princípio democrático, no processo de construção e implementação de políticas

públicas. Logo, a participação pública não só é considerada um dos princípios

fundamentais da democracia (HOGAN, 1994), ela também é considerada um fator

estratégico na proteção ambiental (BACKER, 1991). Evidentemente, a participação

dos indivíduos nas decisões que afetam interesses que lhe dizem respeito, ocorre

mediada por formas coletivas de reivindicação, e por instancias institucionalizadas de

participação. Daí a importância especialmente dos Conselhos Escolares e da gestão

democrática escolar para a perspectiva participativa nas escolas para esta pesquisa.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10463ISSN 2177-336X

Ademais, a construção de um processo educativo identificado com a

autonomia individual e a emancipação social não pode prescindir de uma atitude

crítica, participativa e comprometida com a ampliação da cidadania. As políticas

ambientais e os programas educativos relacionados à transformação da crise

socioambiental demandam cada vez mais novos enfoques integradores de uma

realidade contraditória e geradora de desigualdades, que transcendem a mera

aplicação dos conhecimentos científicos e tecnológicos disponíveis.

Para tanto, a educação como uma ação política é discutida pelos educadores e

pela sociedade há bastante tempo. O caráter político pode ser expresso, ou não, na

intencionalidade e no potencial transformador das relações sociais nas quais a

educação, em suas mais variadas formas de institucionalização, está inserida. Assim,

defende-se que, para lidar com uma realidade em crise a ser transformada, a educação,

como prática social, e, por conseguinte, a EA devem ser eminentemente políticas, já

que estão intimamente imbricadas. Trata-se, portanto, de uma educação política de

caráter crítico transformador.

No seio dessa totalidade, há algumas políticas que chegam ou são planejadas

para chegar às escolas sem o necessário diálogo e a mediação destas com a sua

realidade, resultando em uma inserção marginal da EA, posto que não tocam em

questões inerentes ao “mundo da educação” e que são centrais para o seu

fortalecimento no contexto. Isto é, em muitos casos as políticas públicas chegam às

escolas como determinações que em alguns momentos não representam suas reais

necessidades, fato este que tem se agravado com a recorrente descontinuidade destas

políticas, que ficam a mercê de desejos e diferentes projetos políticos de diferentes

gestores.

Destarte, o tema, cujo foco está na compreensão dos diferentes sentidos em

disputa que têm sido sócio-historicamente mobilizados e imprimidos nas políticas

públicas, sobretudo no campo da EA para o contexto escolar, é o que move a

pesquisadora, por ser seu campo de atuação desde sua formação inicial, que na

tentativa de compreender os processos que envolvem a EA tem se voltado para

estudos quem vislumbram a EA da/na/para a escola, concebendo-a como mais um

importante espaço de formação humana, emancipação e de transformação social.

Educação Ambiental nas escolas e/ou as escolas na Educação Ambiental?

(Re)pensando os processos formativos de educadores ambientais

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10464ISSN 2177-336X

Ao falar sobre a participação das escolas e dos professores durante o processo

consultivo da PEEA, os gestores foram unânimes afirmando que os professores

estiveram presentes nestas discussões. “Os professores tiveram coparticipação no

processo de construção da politica.” (G1) Com isso, revela-se a preocupação de

regulamentação da PEEA que pudesse ser realmente instrumento de implementação

da EA nas escolas.

Entretanto, problematizando o título desta subseção: a EA deve estar na

escola? Ou a escola na EA? Ou ainda, a EA deve estar na escola e a escola na EA?

Acredito que a partir deste tipo de questionamento seja possível repensarmos alguns

práticas educativas que reduzem o sentido político, crítico e emancipatório da EA.

Todavia, o debate e a reflexão críticos sobre a sociedade não podem ser confundidos

com discursos político-ideológicos sem bases para a sustentação; contudo, devem ser

compreendidos como uma necessidade permanente do ser humano em seu movimento

de transformação histórica (LOUREIRO, 2006).

Assim, saliento que ações fragmentas e descontextualizadas de EA são

recorrentes nas escolas, que continuam realizando atividades pontuais,

comemorativas, projetos descontínuos, nas “brechas” entre uma demanda e outra dos

órgãos gestores, atendendo à exigências vindas de cima para baixo. Este é um quadro

que sustenta e aflige, mesmo quando se compreende de modo dialético a realidade e

se nega o entendimento linear da realidade, pois se evidencia uma dinâmica

contemporânea destrutiva e beligerante, de elevado risco para a sociedade

(LOUREIRO, 2006). Nesta dimensão, a EA está na escola, como nos remete a

pesquisa “O que fazem as escolas que dizem que fazem EA?” (TRAJBER e

MENDONÇA, 2006). Essa preocupação transparece no trecho abaixo:

Os projetos de EA, os eventos precisam estar sendo trabalhados, não

como uma questão eventual, mas como uma questão que vise a

sustentabilidade, que precisa dar continuidade para esse trabalho que é

importante para o município. Então, neste contexto surgiram alguns

projetos da secretaria, no âmbito geral, para que desperte dentro das

escolas ou comunidade, representações, empresas, etc., a importância de

se fomentar a sustentabilidade desta ação. (G1)

Questionar e refletir sobre essas concepções enraizadas em um modelo

hegemônico dominante é repensar a EA e seus processos formativos. Trata-se da

despolitização de questões socioambientais e da reificação da natureza como algo

previamente pronto, o que, infelizmente, tem mostrado sua supremacia nos últimos

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10465ISSN 2177-336X

anos, mesmo quando se diz respeito a processos formativos e práticas ditas políticas e

críticas. Dessa forma, estabelece-se a possibilidade de busca de soluções tecnocráticas

e gerenciais dos problemas, mas desvinculadas da análise do padrão societário. Há um

escamoteamento desses sentidos contra-hegemônicos, o que tem alertado em direção

à criação de instrumentos que possam reverter essa situação.

Com isso, alguns posicionamentos dos entrevistados, foram no sentido de

potencializar ações de EA na escola, fornecer ferramentas, junto à PEEA, para os

professores desenvolverem.

E um dos entraves, que eu acho que vai ser entrave ainda, é a questão da

necessidade de apoiar os professores e coordenadores de EA nas escolas.

Até porque quem faz a EA na escola é o professor. Existe um

coordenador de EA regional na DR e os professores que estão nas escolas.

Mas esse coordenador, geralmente, ele tem outras funções, ele é

coordenador de alguma coisa e EA. E a proposta que a Lei estabeleceu é

que nós deveríamos dar mais comissões para que esse coordenadores

trabalhassem só com EA. E que os professores envolvidos nas atividades

de EA nas escolas também fossem reconhecidos: ou redução de carga

horária, porque durante as discussões eram um dos grande problemas, é

que os professores além da carga horária de fazer não sei o que ainda

tinham que fazer EA, implantar a Agenda 21 na escola, a ComVida

(Comissão pela Vida e pelo Meio Ambiente) nas escolas também eram eles

que faziam, atividades interdisciplinares, projetos interdisciplinares, e no

processo sempre haviam dificuldades de estabelecer essas interrelações

com as disciplinas. (G2)

Refletindo nesta direção, e respondendo ao questionamento que intitula essa

seção, defendo que a EA esteja na escola e a escola esteja na EA, como um processo

educativo de movimento contínuo e dielético, com espaço garantido junto ao projeto

político da escola, com professores formados, motivados e incentivados para esse tipo

de prática pedagógica, atuando coletivamente. Quiçá desta forma a EA poderá ser

concebida interdisciplinarmente e o meio ambiente perpassará o currículo escolar de

maneira transversal, assim como recomendam algumas políticas públicas nacionais de

EA e como parece salvaguardar, durante o processo de construção da regulamentação

da PEEA, os gestores/educadores entrevistados.

Conjecturando sobre isso e diante da tentativa de compreender, sobretudo, a

prática pedagógica, remete-se à formação de professores. Essa preocupação, também,

esteve nas narrativas dos entrevistados:

Numa seara com 50 professores talvez 2 destes estavam motivados pela

EA e os outros não estavam porque desconheciam, não eram

sensibilizados para tal. Então, nós queríamos promover essa

sensibilização, essa capacitação, nós queríamos que os professores não só

o de Biologia e o de Geografia, mas o de Matemática, o de Química,

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10466ISSN 2177-336X

Português, Literatura, estivessem envolvidos com a questão ambiental,

mas eles não eram. (G2)

Achar que EA é assunto para professor de Ciências ou para aula de Ciências

ainda é muito comum entre os professores. Chamar a atenção por rasgar papel e jogar

lixo no chão é incorporar uma atitude de EA descontextualizada de uma totalidade, de

um processo de construção do sujeito crítico, reflexivo. Nesse sentido, Tozoni-Reis

(2002, p. 92) alerta para que “(...) a ideologia da eficiência tem sido um forte

obstáculo à formação crítica dos profissionais no ensino superior” os quais, mesmo

reconhecendo e sabendo dos artifícios e das artimanhas que o padrão excludente

possui, acabam por incorporar essas ações em seu retorno à sala de aula, dando uma

ideia de onipotência ao paradigma hegemônico. Pensar uma formação de educadores

superadora dessas “armadilhas” do/no processo educativo é, também, pensar a

formação do educador-reflexivo, do educador ambiental crítico, reflexivo,

participativo que, na inculcação e na transformação, busca um real desenvolvimento

da sociedade no âmbito de um padrão civilizatório diverso do atual.

Daí despontam alguns questionamentos de Nóvoa (1992) sobre como os

professores são vistos: se como funcionários ou se como profissionais reflexivos, se

como técnicos ou se como investigadores, se como aplicadores ou se como

conceptores curriculares.

Surge, nessa direção, a necessidade de investimento na formação de

educadores ambientais críticos, já que se reconhece a educação como ato político e

não neutro, como utopia e práxis. Essa inquietação foi possível diagnosticar durante a

criação da PEEA através do que foi dito pelos gestores.

Ao refletir sobre isso, ouso propor uma ruptura com o pensamento que

consolida o processo educativo como espaço de reprodução e o professor como

repetidor de conhecimentos produzidos por outros. Ao assumir que a dialogicidade,

por meio do movimento participativo, é o caminho sócio-político para a formação de

atores sociais críticos, reflexivos, cidadãos e transformadores, assume-se que,

somente com o entendimento da totalidade dos seres humanos como sujeitos

historicamente constituídos, será possível a transformação do paradigma dominante

em uma lógica contra-hegemônica de justiça social e, sobretudo, socioambiental.

É importante também salientar que, nesse processo meandroso, até nebuloso,

do “vai-e-vém” de ações críticas (apesar de dominantemente presentes as ideologias

de caráter conservador), elas se mostraram permeáveis.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10467ISSN 2177-336X

Todos os fatores, explicitados influenciam diretamente a formação do

educador, capacitando-o para ser um intelectual que opera a serviço dos interesses do

Estado e cuja formação social visa primordialmente manter e legitimar o status quo

(GIROUX e MCLAREN, 2009), são refletidos diretamente na prática pedagógica. A

maioria desses professores foi ou é formada na perspectiva conservadora presente,

consequente e diretamente, em suas práticas pedagógicas.

Logo, vale reforçar que esse tipo de prática também enquadra o processo

educativo da EA. Os educadores, formados dentro dessa lógica de silenciamento,

estão, na maioria das vezes, preocupados com a degradação da natureza e partilham

de soluções paliativas ou mitigadoras, engendradas pela racionalidade hegemônica

para a resolução de “problemas ambientais”. Essa dinâmica espelha uma prática

pedagógica limitada pelo discurso inadequado e ingênuo que forja o papel político do

ato pedagógico, tornando-o, ao mesmo tempo, vertical e excludente.

É com base nessas perspectivas que o processo educativo recai em

redundância e, consequentemente, a prática educativa se pauta na lógica da

“armadilha paradigmática” (GUIMARÃES, 2004). Tais práticas, então, tendem a

reproduzir um fazer pedagógico que inebria o caráter crítico e criativo do processo

educativo, homogeneizando e superficializando o discurso da EA. Nisto, o homem

sacrifica imediatamente a sua capacidade criadora (FREIRE, 2009).

O agravante desse tipo de concepção é que o paradigma dominante da

sociedade moderna, em sua racionalidade, reforça a visão fragmentada, dualista e

dicotômica de mundo, e naturaliza a separação entre o refletir e o agir. Nesse aspecto,

chama-se a atenção para a importância da práxis como reflexão e ação, como teoria e

prática, realizando-se concomitante e reciprocamente, direcionadas para a constituição

de um novo paradigma em conjunto com a construção de uma sociedade

ambientalmente sustentável.

Esses princípios educativos que buscam outros caminhos devem ancorar e/ou

estar ancorados em novas propostas pedagógicas, como as interdisciplinares em EA,

as quais, para se aproximar da complexa realidade socioambiental, assumem a

abordagem relacional com uma de suas principais características: o estabelecimento

da abertura ao outro e do diálogo. Esse tipo de ação, já recomendada por diversos

documentos normativos PCNs, Conferência de Tbilisi, entre outros , considera a

EA como um processo educativo por natureza transversal e interdisciplinar.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10468ISSN 2177-336X

Considerações

Acredito que repensar as políticas públicas de EA, e a própria EA em sua

essência é, antes de tudo, repensar a educação; é repensar o papel dos professores; é

repensar as condições de sobrevivência dos oprimidos e excluídos; é repensar o papel

dos seres humanos enquanto sujeitos histórico-dialeticamente determinados; é

transformar os padrões ditatorias, neoliberais, alienantes, conservadores,

individualizantes e antropocêntricos da lógica mercadológica vigente. Nessa direção,

é prestigioso que esse tipo de discussão envolva os professores/educadores, para que

os mesmos possam estar constantemente refletindo a partir de sua práxis e buscando

ações transformadoras, quiçá revolucionárias.

Diante das análises realizadas no que tange a formação de educadores(as)

ambientais, principalmente na perspectiva crítica, há predominância de uma visão

reduzida. Seja por uma prática pouco transformadora, seja por condições hegemônicas

que insistentemente se fazem presentes, esse tipo de formação acaba negligenciando

seus criadores e sua criação. Pensando nesse contexto, a educação como campo de

disputa e como espaço habitado por multissubjetividades, na percepção de um

movimento dialético de superação-persistência, a manutenção prevalece sobre a

contra-hegemonia e, opostamente, a resistência favorece a transformação; ou se

liberta da “armadilha paradigmática” (GUIMARÃES, 2004) e, por conseguinte, da

burocratização da mente, ou se prossegue alimentando as ideias parasitas reformistas.

Surge, veementemente, nessa direção, a necessidade de investimento na

formação de educadores ambientais críticos, já que se reconhece a educação como ato

político e não neutro, como utopia e práxis. Distante do processo de alienação que

acaba por inibir a criatividade e próximo à utopia e à esperança, luta-se por uma

pedagogia da humanidade em constante processo de libertação, pensada na/para a

formação plena do ser humano, sem estranhamento, sem dominação e sem exclusão.

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