construa seu espectrometro sbf www.sbfisica.og.br fne vol3 num2 a13
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40 Física na Escola, v. 3, n. 2, 2002
Este artigo mostra como pode-se construir umespectrômetro de baixo custo a partir de mate-riais simples e realizar experimentos com ma-teriais facilmente encontráveis no mercado.
Construa seu espectrômetro
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As primeiras observações da luzsolar passando por um prismae se decompondo em várias
cores tiveram grande importância nodesenvolvimento da Física. Estavaaberta a possibilidade de se analisar acomposição da luz emitida por outrosprocessos, como por uma vela, pordescargas elétricas em gases etc. Issolevou à descoberta de novos elementosquímicos a partir da análise da luz poreles produzida quando aquecidos aorubro. A observação desses diferentesespectros de luz no Ensino Médio cer-tamente levará a uma discussãoaprofundada não somente sobre anatureza da luz mas também sobre odesenvolvimento da Física e Químicamodernas, ressaltando a contribuiçãodesse tipo de análise no surgimentode modelos atômicos. Construir umdispositivo que permita fazer a obser-vação e análise do espectro luminosode uma fonte de luz pode ser simplese barato, como veremos a seguir.
O prisma tem capacidade de se-parar as diversas cores porque o seuíndice de refração é uma função dafreqüência da luz incidente. Destaforma a luz com diferentes freqüên-cias irá se propagar com diferentesvelocidades dentro do prisma, sofren-do diferentes desvios.
A luz também pode ser decom-posta quando atravessa uma rede dedifração. A difração ocorre quandouma onda contorna um ou mais obs-táculos, mudando sua direção de pro-pagação. Ondas luminosas, ao sofre-rem difração, invadem a zona de som-bra geométrica após contornarem osobstáculos e ao atingirem um ante-paro produzem interferências cons-trutivas e destrutivas.
Se um feixe de luz monocromática(fonte F) atravessar a rede de difraçãoda Figura 1, cujas fendas estão sepa-radas pela distância d, a luz espalhadaatingirá o anteparo, colocado a umadistância L da rede. Para que no pontoP ocorra uma interferência constru-tiva caracterizada por uma franja deluz, as ondas luminosas que se espa-lharam a partir das fendas A e B de-vem estar em fase, isto é, “crista comcrista”. No entanto, essas ondas cami-nham distâncias diferentes, comomostram os raios que partem das fen-das na Figura 1. Então, para que es-tejam em fase, a diferença de cami-nhos percorridos, ∆, deve ser múltiplainteira de λ, o comprimento de ondada luz, isto é, ∆ = nλ, onde n = 0, 1,2, 3, ...
Para n = 0, a franja de luz é pro-duzida por ondas luminosas quecaminham a mesma distância, produ-zindo uma franja de interferênciaconstrutiva exatamente no eixo de in-cidência da luz. Chamamos essa fran-ja de máximo central.
O ângulo θ corresponde ao ângulode desvio do ponto P onde aparece afranja de luz em relação ao máximo
Marisa Almeida CavalcanteGoPEF: Grupo de Pesquisa em Ensinode Física da PUC/SPhttp://mesonpi.cat.cbpf.br/marisaE-mail: [email protected]
Cristiane R.C. TavolaroGoPEF: Grupo de Pesquisa em Ensinode Física da PUC/SPE-mail: [email protected]
Figura 1. Diferença de caminhos percor-ridos por ondas luminosas que sofreramdifração em uma rede cujas fendas são es-paçadas pela distância d.
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central. Vemos na Figura 1 que ∆ = dsenθ e então podemos escrever que
nλ = d senθ (1)
Logo, escolhida a rede de difração(escolhido d), para um feixe de luz decomprimento de onda λ, teremosfranjas de interferência construtivaem pontos diferentes do anteparo, poispara cada valor de n teremos um ân-gulo θ de desvio em relação ao máxi-mo central, e simétricos a ele (Figu-ra 2).
No entanto, nos interessa usar arede de difração para decompor a luzpolicromática e determinar o compri-mento de onda de suas componentes.Ao incidir luz policromática na rede,observaremos que quanto maior ocomprimento de onda da compo-nente, maior será o ângulo de desvio,isto é, cada cor de luz aparecerá emum ponto diferente do anteparodependendo de seu comprimento deonda λ. Ao conjunto de componentesda luz chamamos ‘espectro’. Esse es-pectro se repete para n = 2, 3 etc e ofator ‘n’ é chamado ordem do espectro(Figura 3).
Aqui cabe uma observação impor-tante: para que o espaçamento entreas franjas de luz seja perceptível, istoé, para que ocorra uma boa dispersãoda luz, é necessário que a distância dentre as fendas seja da mesma ordemde grandeza do comprimento de ondada luz, como mostra a Eq. 1. A luzvisível tem comprimentos de ondaaproximadamente entre 400 nm e700 nm. Certamente as empresas queproduzem equipamento de laborató-rio de Física e Química disponibilizam
redes de difração para espectrometriacom cerca de 500 a 600 fendas/mm(d = 6600 nm, aproximadamente).No entanto nossa proposta é cons-truir um dispositivo com material defácil acesso de modo que professorese alunos possam reproduzir em casa.
Um CD pode ser utilizado comorede de difração. Em um primeiromomento podemos dizer que a luz re-fletida na película existente sobre astrilhas do CD sofre interferência,resultando no mesmo efeito descritoanteriormente. As cores que vemos noCD são conseqüência desse fenômeno.Um modo de optimizar o CD comorede é retirando a película refletora(CDs graváveis têm a película expostapodendo ser retirada com a ajuda deuma fita adesiva). Neste caso teremosuma rede de difração em potencial jáque o CD tem cerca de 600 trilhas/mm, como as redes comerciais paraespectrometria.
Vamos à construção do nossoespectrômetro caseiro. Corte o CDtransparente em pequenos pedaços,cerca de 2 x 2 cm (um único CDrenderá vários espectrômetros). Pegueuma caixa de papelão pequena, comouma caixa de disquetes, por exemplo.Em uma das tampas (aba móvel) re-corte um quadrado pouco menor quesua rede de difração. Esta janela deveser feita próximo à lateral da tampa(Figura 4a). A rede será encaixada nes-ta janela e presa com fita adesiva.
Na outra tampa precisamos pro-duzir uma fenda de largura variávelpara a entrada de luz e um anteparocom uma escala graduada. Numa tirade papelão da mesma largura e com-primento da tampa, cole um pedaçode papel milimetrado, cobrindo total-mente a tira.
Recorte totalmente a tampa e cole-a na caixa transversalmente comomostra a Figura 4b. Desse modo atampa funcionará como trilho supor-te para o anteparo com a escala. Intro-duza o anteparo com a escala voltadapara dentro e deixe um vão (fenda)do mesmo lado da rede de difração,
para a entrada de luz.Pronto! Agora é só experimentar!
Direcione a fenda para uma lâmpadaqualquer e olhe através da rede. Ajustea largura da fenda (cerca de 2 a 3 mm)até que seja possível ver o espectroprojetado no anteparo.
Para determinar o comprimentode onda das diferentes radiaçõesemitidas pela lâmpada, é necessárioobservar simultaneamente o espectroprojetado e a escala graduada. Paraisso vamos iluminar a escala atravésde uma abertura lateral (um furo de1 cm de diâmetro na lateral oposta àfenda).
Dessa forma é possível medir adistância ‘x’ (Figura 5) entre a franjacentral (na posição da fenda) e a franjacujo λ se quer determinar. Dependen-
Figura 2. Feixe de laser (luz monocromá-tica) projetado após atravessar uma redede difração. Podemos ver as franjas de in-terferência em diferentes ângulos em re-lação ao eixo e simetricamente a ele.
Figura 3. Espectro da luz policromática emitida por uma lâmpada de mercúrio.
Figura 4. Montagem da caixa.
Figura 5. A distância ‘x’ corresponde à dis-tância entre a fenda e cada uma das fran-jas de luz, sendo medida diretamente naescala do anteparo.
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do do tamanho da caixa é possívelobservar também o espectro de se-gunda ordem (n = 2). Escolha n = 1e determine senθ fazendo
, sendo L o compri-
mento da caixa e então λ = d senθ,onde d = 1/600 trilhas/ mm.
Lâmpadas incandescentes produ-zem espectros contínuos, isto é, oscomprimentos de onda emitidos porum sólido incandescente são tão pró-ximos que não percebemos separaçãoentre eles. Já as lâmpadas lumines-centes, que têm gases em seu interior(muitas vezes mercúrio), emitem umespectro discreto característico do gás,
isto é, alguns comprimentos de ondabem distintos. Use seu espectroscópiopara estimar os comprimentos de on-da do mercúrio e discuta com seusalunos a natureza discreta dos espec-tros gasosos. Esta é uma sugestãopara introduzir um tema tão impor-tante na Física e Química quanto aomodelo atômico de Bohr.
Ensino de Física: Conteúdo,Metodologia e Epistemologia numaConcepção Integradora
Organizado por Maurício Pietro-cola, Editora da UFSC, Florianópolis,2001, 236 pp.
Este livro é o resultado de três anosde atuação de vários professores daUFSC no projeto Pró-Ciências/CAPESe versa sobre vários temas de interes-se do Ensino de Física buscando a inte-gração entre seus aspectos de conteú-do, epistemológicos e metodológicos.Esta bem sucedida experiência pode serimitada em outros projetos de forma-ção continuada de professores e os en-saios desta compilação podem forne-cer subsídios relevantes na prática deensino no nível médio.
Leituras de Física
Grupo de Re-elaboração do Ensinode Física (GREF), IFUSP. Quatro cader-nos: Mecânica, Física Térmica. Ópti-ca e Eletromagnetismo
Após a bem sucedida coleção Fí-sica, destinada aos professores de Físi-ca do Ensino Médio, a equipe do GREFlança, numa versão preliminar, os ca-dernos de Leituras. São textos curtos,
bem ilustrados, em lin-guagem acessível, comexemplos do cotidiano,enfatizando os conceitose fenômenos físicos eatendendo aos parâme-tros curriculares nacio-nais definidos em legis-lação recente. Uma boa
indicação aos professores de Física.
O Sol, o Genoma e a Internet:Ferramentas das RevoluçõesCientíficas
Freeman Dyson, Cia. das Letras,São Paulo, 2001, 140 pp.
O físico Freeman Dyson, do Insti-tuto de Estudos Avançados de Prince-ton, retoma os seus ensaios, extraídosde palestras para o grande público,discutindo como surgem as revolu-ções científicas e o papel desempenha-do pelos novos conceitos e ferramen-tas. O autor especula acerca do modocomo novas tecnologias podem ser de-senvolvidas em busca de maior justiçasocial e a preservação de nosso pla-neta. Leitura obrigatória para profes-sores que buscam inserir um contextomultidisciplinar às suas aulas.
O Ano Miraculoso de Einstein:Cinco Artigos que Mudaram a Faceda Física
Organizado por John Stachel,tradução de Alexandre Tort, EditoraUFRJ, Rio de Janeiro, 2001, 222 pp.
O livro traz, pela primeira vez emportuguês, os cinco artigos de Einstein
publicados em nos anni mirabiles de1905: a sua tese de doutorado sobreas dimensões moleculares – por muitotempo, um dos seus trabalhos maiscitados –, a formulação da hipótesedo quantum de luz – reduzido equivo-cadamente ao “paper do efeito foto-elétrico” –, a teoria da relatividadeespecial que mudou as nossas concep-ções sobre espaço e tempo, as suasdescobertas sobre o movimentobrowniano e aquele trabalho em quederiva a sua mais famosa equação,E = mc2. Os textos são comentadospor John Stachel, um historiadordedicado aos estudos einsteinianos. Osprofessores poderão admirar no origi-nal os profundos e consistentes in-sights, hipóteses e deduções de Einsteinem variados temas que produziramum impacto incomensurável na nossacompreensão da Física.
Origens e Evolução das Idéias daFísica
Organizado por José FernandoRocha, EDUFBA, Salvador, 2002,372 pp.
Uma coleção de ensaios de seis pro-fessores da UFBA que pretende “trataros fatos científicos não com fatosisolados, mas, sobretudo, como con-seqüência natural e lógica de circuns-tâncias sócio-culturais e econômicasbem definidas”. Os temas abordadossão a Mecânica Newtoniana, a Termo-dinâmica e Mecânica Estatística, oEletromagnetismo, a Relatividade Es-pecial e as origens da Física Moderna.
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Referências Bibliográficas1. Cavalcante, M.A.; Jardim, V. e Barros,
A.A.J. Inserção de Física Moderna no EnsinoMédio: Difração de um feixe de laser. CadernoCatarinense de Ensino de Física, v. 16, n. 2,1999.
2. Cavalcante, M.A. e Benedetto, A. Intru-mentação em Física Moderna para o EnsinoMédio: Uma nova técnica para a análisequantitativa de espectros. Revista Brasileira deEnsino de Física v. 21, n. 3, setembro de 1999.
3. Vuolo, J.H.; Mammana, V.P. e Martins,J.M.V. Fendas micrografadas para experiências
de difração de luz. Revista Brasileira de Ensinode Física v. 22, n. 1, março de 2000.
4. Cavalcante, M.A. e Tavolaro, C.R.C. Umaabordagem experimental e interdisciplinar daFísica Moderna no Ensino. In: Prática de Ensino:Ações e reflexões. Raeça, D. (org). Ed. ArticulaçãoUniversidade/Escola, 1ª ed., p. 87-107, 2000.
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