considerações sobre a técnica na terapia ericksoniana
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Terapia EricksonianaTRANSCRIPT
FACES- Faculdade de Ciências de Educação e Saúde Curso- Psicologia
CONSIDERAÇÕES SOBRE A TÉCNICA NA TERAPIA ERICKSONIANA.
RODRIGO MELO.
JUNHO/2009
RODRIGO MELO
CONSIDERAÇÕES SOBRE A TÉCNICA NA TERAPIA ERICKSONIANA.
Monografia apresentada ao Centro
Universitário de Brasília como requisito
básico para obtenção do grau de Psicólogo
da Faculdade de Ciências da Educação e
Saúde. Professor-Orientador: Maurício
Neubern
BRASÍLIA, JUNHO/2009
FACES- Faculdade de Ciências de Educação e Saúde Curso- Psicologia
Esta monografia foi aprovada pela comissão examinadora
composta por:
Fernando González González Rey
Maurício da Silva Neubern
Valéria Mori
A mensão final obtida foi:
___________
JUNHO/2009
iii
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a meu pai Ricardo, por ter sido uma inspiração e ter me escolhido como foco de seu amor paterno.
A minha Mãe Patrícia por ter escolhido corretamente o seu caminho, e ter sido muito paciente ao longo de toda esta jornada de uma vida.
A meu finado avô João Grandão, por guiar meus caminhos mesmo estando em outro plano espiritual.
iv
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a meus pais e meu irmão, por terem acreditado em mim, e nunca terem me abandonado nem nas horas mais difíceis.
Agradeço a Ana Virgínia, por ter me mostrado os caminhos de uma vida preenchida pela
luz do amor que constrói, e por ter estado ao meu lado durante a batalha ferrenha que foi o meu caminhar pela estrada sinuosa da academia.
A meu orientador e mestre, Maurício da Silva Neubern, por ter tido a paciência e
compreensão que me guiaram a este momento de vitória, e por ter sido a luz que me guia no caminho do saber.
A Giselle, também meus mais sinceros votos de agradecimento, pela pronta resposta a
minhas perguntas e a disposição de ler e comentar o trabalho. A meus colegas de turma e orientandos por estarem sempre juntos e ansiosos, e que
mesmo assim não abandonaram o barco que nos conduz, por terem chorado e curtido os doces e amargos momentos de supervisão de monografia.
E por fim, agradeço ainda, àquela luz que eu via no fim do túnel, pois ela se mostrou
muito diferente do trem que eu acreditava que ela fosse.
v
Sumário
DEDICATÓRIA ................................................................................................................ iii
AGRADECIMENTOS ...................................................................................................... iv
RESUMO........................................................................................................................... vi
INTRODUÇÃO .................................................................Error! Bookmark not defined.
CAPÍTULO 1...................................................................................................................... 6
1.1 A relação terapêutica..................................................................................................... 6
1.2 Contexto...................................................................................................................... 10
1.3 Papéis .......................................................................................................................... 12
CAPÍTULO 2.................................................................................................................... 16
2.1 As Técnicas................................................................................................................. 16
CAPÍTULO 3.................................................................................................................... 26
3.1 Mudanças em terapia .................................................................................................. 26
CONCLUSÃO .................................................................................................................. 36
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................. 40
vi
RESUMO
O presente trabalho tem o objetivo de apresentar uma forma de terapia, que tem se mostrado efetiva em vários aspectos, no tocante a mudanças de sentido que proporcionam uma melhora no quadro geral da pessoa que procura a terapia, e como estas técnicas podem ser muito efetivas na produção de sentidos dentro de um contexto terapêutico, discorrendo em como a psicoterapia ericksoniana produz, de uma forma bastante indireta e metafórica, uma comunicação simbólica com o paciente. Para tanto, este trabalho se baseia e constrói a noção de relação terapêutica e quais formas ela pode assumir dentro de uma terapia, para então, discutir o que vem a ser o contexto terapêutico e como este exerce influência nas construções de sentido, tanto do terapeuta, como do cliente e como que estas construções permitem que ocorram mudanças de sentido. Versa ainda sobre os papéis que podem ser assumidos por ambos no decorrer desta terapia, e quais as implicações destes papéis no caminhar da intervenção terapêutica, fazendo uma relação com o poder que possui a solidificação da relação entre os sujeitos, e a produção de novos sentidos em terapia. Estes conceitos de contexto, relação terapêutica e papéis, são trabalhados para que, sob a luz de seu conhecimento, possam ser discutidas as técnicas que serão utilizadas em uma terapia breve ericksoniana, e quais as implicações na construção dos sentidos subjetivos do sujeito em terapia, e também, como estas técnicas se comunicam simbolicamente com o inconsciente do sujeito, para assim verificar que tipo de atuação elas tem na produção de sentidos gerada pelo cliente, em qual medida esta comunicação simbólica e indireta é eficaz na produção de mudanças para o sujeito que se encontra em terapia. Concluindo, este trabalho trás ao final um breve estudo de caso1 ilustrando como uma terapia ericksoniana se conduz sob a premissa da utilização das técnicas para uma comunicação indireta e metafórica com o inconsciente do sujeito, a forma que esta dimensão simbólica da comunicação se torna extremamente importante no rumo às mudanças terapêuticas, e também como a hipnose ericksoniana e suas técnicas atuam em um contexto terapêutico, para que assim a intervenção do terapeuta permita a produção de sentidos pelo sujeito.
Palavras chave: Terapia ericksoniana, Sentido subjetivo, Contexto terapêutico.
1 Os dados referentes as pessoas envolvidas no estudo de caso são fictícios.
As demandas de terapia nos dias de hoje são muito extensas, e um dos aspectos que tem
sido cada vez mais trabalhado é a questão da singularidade de cada sujeito. As terapias estão
cada vez mais voltadas para entender e orientar o sujeito na construção de novos sentidos dentro
das questões apresentadas em um contexto terapêutico.
Desta forma, a demanda por uma terapia que proporcione uma mudança concreta nesta
construção de sentidos é crescente, e a proposta da terapia ericksoniana é ser uma terapia voltada
muito mais para a intervenção.
A terapia ericksoniana recebe o nome de Terapia Breve, exatamente por ter este foco
muito direcionado à demanda do cliente, utilizando de formas indiretas de comunicação para
comunicar-se simbolicamente com o inconsciente do sujeito, e assim proporcionar mudanças em
terapia.
O presente trabalho tem por finalidade apresentar e demonstrar como ocorre uma terapia
de acordo com as técnicas de terapia breve ericksoniana.
A base deste trabalho está fundamentada na psicoterapia desenvolvida por Milton
Erickson e em suas técnicas hipnóticas, perpassando pela utilização da linguagem peculiar deste
pensador e de outras técnicas desenvolvidas por ele, relativas à prática psicoterapêutica.
A base deste trabalho está fundamentada na psicoterapia desenvolvida por Milton
Erickson (Erickson & Rossi 1980) e em suas técnicas hipnóticas, perpassando pela utilização da
linguagem peculiar deste pensador e de outras técnicas desenvolvidas por ele, relativas à prática
psicoterapêutica.
2
Segundo Neubern (no prelo), o contexto tem uma participação significativa na terapia,
pois permite que sentidos possam ser gerados e transformados de forma segura, para que assim
ocorra a terapia de fato, sentidos estes que segundo González Rey (2003) são produzidos pelo
sujeito e podem ser modificados e criados a partir de perspectivas histórico-culturais,
dependendo de alguns fatores inerentes ao sujeito, sua história e a seu contexto cultural, e que
podem estar associados com aspectos dos seus relacionamentos sociais.
Portanto, este trabalho está focado nas transformações de sentidos que podem ocorrer no
sujeito em terapia, e mais ainda, que efetividade pode ter a abordagem apresentada neste trabalho
diante do panorama geral de uma terapia.
Algumas técnicas utilizadas neste trabalho lidam com uma noção de inconsciente onde
grande parte do que ocorre na vida de uma pessoa é inconsciente (Erickson & Rossi, 1980). Para
tanto é necessário então, que existam maneiras efetivas de se conversar simbolicamente com este
inconsciente sem que a consciência atrapalhe esta comunicação.
A terapia ocorre entre a pessoa do terapeuta e a do paciente, e o terapeuta lançando mão
de uma abordagem diretiva indireta (Haley 1985) irá dialogar com o inconsciente do paciente,
para proporcionar mudanças de uma maneira segura e duradoura. O terapeuta delineia o
direcionamento desta caminhada, orientando o cliente na produção de novos sentidos para as
questões trazidas em terapia.
O sentido que é apresentado aqui tem sua fundamentação no que González Rey (2003)
afirma ser uma construção que perpassa pelo conceito de subjetividade que tem um aspecto
histórico e social, dentro de um contexto cultural de produção do sujeito, onde o mesmo não
3
pode ser reduzido a apenas um fenômeno em si, e deve ser compreendido como um todo, que
engloba vários aspectos contextuais inerentes ao sujeito que produz o sentido.
Sendo assim cada um desses sujeitos terá uma construção de sentido própria e singular. A
terapia, então, tem a finalidade de orientar para que as novas construções tenham um
direcionamento que leve o cliente a sair da posição que se encontra na terapia. Este
direcionamento deve ser conduzido de uma forma segura e protegida, de acordo com as próprias
potencialidades do sujeito, dando movimento a esta produção de sentidos de uma maneira
positiva.
A orientação do terapeuta tem o objetivo de guiar as modificações de sentido, bem como
a produção de novos sentidos para um caminho construtivo de reorganização da pessoa em
terapia (Neubern no prelo; Erickson & Rossi 1980; Carvalho, 1999), para que a mesma não faça
nenhum mal a si ou a outros que estejam presentes em seu contexto de relações.
A dinâmica da terapia também será revista neste trabalho, tentando dialogar com o
conceito de contexto proposto por Neubern (no prelo) onde é colocado pelo autor que o contexto
tem uma característica de ser mutável até certo ponto, e onde os contextos podem exercer
influências nas pessoas envolvidas na terapia, e também pode existir a construção de novos que
podem, e até certo ponto devem, ser transpostos para fora do espaço de terapia e onde o paciente
pode tomar para si novas formas de compreender os que já existiam.
Para tanto é necessário que a terapia seja compreendida como algo bastante maleável e de
extrema mobilidade. O que propomos neste trabalho é que a terapia deve ser focada no que o
paciente trás, adequando à terapia e a postura do terapeuta, para o que o cliente possa se sentir
seguro e protegido dentro do contexto psicoterapêutico. Sendo assim, a terapia tende a estar
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focada no processo relacional do paciente e em como as queixas do mesmo apresentam-se, para
que o foco seja muito mais pessoal tratando o cliente de uma forma mais acolhedora.
Portanto, este trabalho tenta mostrar a efetividade de se construir um contexto de terapia,
onde a temática central seja a de proteger o cliente, pois todo tipo de construção de novos
sentidos pode desestruturar a pessoa que se encontra em tratamento. Para que a pessoa não seja
prejudicada neste processo, é muito importante que o terapeuta possa entrar neste universo
relacional do cliente, buscando em suas próprias potencialidades maneiras de criar uma proteção
como se criássemos uma cerca ao redor desta pessoa (Robles, 2008).
Este trabalho apresenta uma forma de terapia, que tem se mostrado efetiva em vários
aspectos no tocante a mudanças de sentido que proporcionam uma melhora no quadro geral da
pessoa que procura a terapia.
O primeiro capítulo deste trabalho está focado em aspectos relacionais de uma terapia,
como se desenvolve a relação terapêutica e quais as implicações do estabelecimento de uma
relação verdadeira entre o cliente e o terapeuta. Este capítulo trata também de questões
relacionadas com o contexto de terapia, como ele se constrói e modifica-se ao longo do percurso
da terapia, proporcionando um ambiente seguro para a construção de novos sentidos. E por fim é
trabalhada a questão dos papéis assumidos em uma terapia e suas implicações nas construções de
sentido do cliente.
O segundo capítulo faz uma descrição das técnicas utilizadas por Erickson no
desenvolvimento de uma psicoterapia. Discorre sobre as técnicas psicoterapêuticas
desenvolvidas por Erickson e de que forma estas técnicas são efetivas nas construções e
modificações de sentido. Outro aspecto deste capítulo é como estas técnicas se comunicam com
5
o inconsciente e que tipo de linguagem se mostra mais efetiva na comunicação simbólica com
este.
O terceiro capítulo deste trabalho é focado em uma terapia direcionada com algumas das
técnicas apresentadas no segundo capítulo, mostrando em que níveis podem ocorrer mudanças.
Na tentativa de demonstrar a utilização das técnicas de terapia breve ericksoniana em um
contexto terapêutico.
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CAPÍTULO 1
1.1 A relação terapêutica.
Um dos grandes desafios do psicólogo nos dias de hoje é compreender a demanda do
cliente, para que assim possa ser realizada a terapia, o que implica em aspectos que devem ser
tratados de uma forma mais minuciosa, como por exemplo, os relacionados aos vínculos
terapêuticos formados em um contexto de terapia, que está em permanente estado de construção
e ressignificação. O terapeuta pode desempenhar um papel ativo na reconstrução do mundo
experiencial de seus pacientes. (Keeney, 1983). A relação terapêutica é um fator de suma
importância em uma terapia, pois partimos de um diálogo, no intuito de mudar alguns sentidos
construídos pelo cliente.
A narrativa para ocorrer precisa, neste momento, de dois atores, e mais do que simples
atores, deve ser entre duas pessoas que se relacionam: a pessoa do cliente e a do terapeuta. O
terapeuta deve entender como se constitui a experiência do cliente, e ao mesmo tempo deve ser
capaz de estar em contato com sua própria experiência (Hycner 1995).
A terapia acontece no encontro de dois indivíduos. O cliente tem uma demanda e o
terapeuta possui algumas teorias e técnicas para orientar na caminhada ao encontro de mudanças.
O psicólogo tem a tarefa de aceitar o seu cliente enquanto indivíduo, para em um
primeiro momento poder se encontrar verdadeiramente com a pessoa do cliente que procura por
terapia. O terapeuta deve ser capaz de entrar no mundo do cliente e percebê-lo a partir da
perspectiva dele (Hycner 1995).
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É esta relação que começa a se estabelecer, que gera a confiança para o trabalho a ser
realizado. “A existência humana, em seu nível mais fundamental é inerentemente relacional.”
(Hycner, 1995, p. 22). Sendo assim, a base do processo psicoterapêutico é a relação que se
estabelece entre terapeuta e cliente. O terapeuta tem, entre outros papéis, o de acolher o cliente,
para que assim a narrativa do cliente possa ser aceita como tal, unindo-se em uma exploração
mútua desta experiência significativa. (Anderson & Golishian, 1998)
Existe um momento na relação entre cliente e terapeuta, onde o cliente está retraído
devido ao seu sentimento de auto-proteção, que pode estar arraigado em encontros anteriores, e
assim podemos compreender que há uma “fuga do encontro” com o terapeuta, bem como com
qualquer outra pessoa. Passado este momento o cliente pode movimentar-se para a libertação
deste chamado “auto-aprisionamento” (Trub citado em Hycner 1995).
A terapia acontece no espaço entre os dois indivíduos. Este encontro entre a pessoa do
terapeuta e a pessoa do cliente é que proporciona a base de um contexto terapêutico. Este
contexto perpassa toda a história de vida do cliente, onde o mesmo construiu seus sentidos
mediante o círculo social ao qual se relacionou durante sua vida. Portanto, o terapeuta deve estar
atento a esta realidade para assim acolher a pessoa do cliente de uma forma verdadeira. Este
diálogo feito na base da compreensão do cliente pode ser muito engrandecedor para a terapia,
pois está sendo estabelecida uma relação que pode produzir novos sentidos. A construção de
sentidos segue uma via de mão dupla, pois ao mesmo tempo que a terapia segue em direção a
mudanças de compreensão ou até mesmo reformulações da narrativa do cliente (Anderson &
Golishian, 1998), esta mudança também ocorre no terapeuta.
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Quando se fala em um contexto terapêutico pode-se dizer que este está sendo construído
e transformado enquanto a relação se solidifica no diálogo e no encontro. O contexto perpassa
pelo espaço vivido, tanto pelo cliente como pelo terapeuta, sendo assim é permeado de sentidos
construídos ao longo de uma vida, o que torna possível transformar o sentido de acordo com a
dinâmica do contexto que se insere na psicoterapia, lembrando que este contexto é de uma
plasticidade limitada e pode sofrer influência à medida que caminha a terapia (Neubern, no
prelo).
O cliente não pode ser transformado apenas em um objeto na relação. Esta relação tem
que ser entre duas pessoas, entre sujeitos, para que desta maneira o cliente se sinta seguro para
entrar nesta relação, e a partir daí ser capaz de proporcionar uma contextualização, que seja
orientada para a terapia de forma a produzir novas possibilidades de relacionamentos em seu
círculo social. Aceitando efetivamente esta relação com o terapeuta, o cliente pode relacionar-se
de maneira genuína com outros sujeitos de sua rede social, assim sendo pode proporcionar
mudanças em seus círculos sociais, que indicam a caminhada em direção à cura.
Para tal, a terapia deve então produzir no cliente uma compreensão de que ele possui
capacidade de relacionar-se de maneira diferente do que já havia tentado anteriormente, e estes
relacionamentos podem ser “saudáveis”. Sendo essa a base para mudanças esperadas dentro de
um contexto terapêutico, que pode inclusive transpor o espaço de terapia e serem levadas para
outros contextos, dentro das relações sociais do cliente.
Quando o cliente aparece na terapia o mesmo tem uma imagem de si, o que Erickson
chama de Body Image (Haley, 1985). Neste aspecto a pessoa do terapeuta em contato com a
pessoa do cliente pode ter informações substanciais da maneira como o cliente se vê perante os
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seus relacionamentos, captando em vários níveis informações transmitidas pelo cliente,
permitindo um conhecimento do outro muito sutil que permitirá a obtenção de ganhos futuros no
tocante a novos sentidos construídos, e a partir daí proporcionar novo enfoque de terapia, para
tentar em conjunto modificar estas narrativas do cliente e assim montar um novo esquema de
relacionamento dentro do contexto do cliente. Um vínculo terapêutico formado é de grande valia
neste ponto, pois tende a proporcionar segurança no cliente para que o mesmo se lance rumo ao
desconhecido futuro.
Uma das mudanças na narrativa do cliente pode ser exatamente trazer a luz um futuro que
antes era desconhecido e inimaginado (Anderson e Golishian, 1998; O’Hanlon, 1994). A partir
desta nova compreensão de futuro, ou da nova perspectiva dos caminhos possíveis de serem
trilhados. O paciente então, cria mecanismos que o direcionam a mudanças consistentes na sua
forma de relacionar-se consigo e com seu meio social.
Esta mudança de sentido proporcionada no encontro da terapia é o que direciona o
paciente a uma compreensão maior de suas capacidades, forças e fraquezas, que o levarão a um
estado de conforto, onde o paciente poderá voltar-se para outras questões, para que assim
caminhe em direção a novas construções de sentido que o levarão à cura.
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1.2 Contexto
Quando se fala em uma terapia, pode-se dizer que ela acontece dentro de um contexto,
porém cabe aqui dimensionar o que pode ser entendido como contexto. A noção aqui
apresentada pretende dialogar com a compreensão de que este contexto é dinâmico e mutável, à
medida que a relação entre duas pessoas acontece.
“O contexto remete ao conjunto de processos e registros simbólicos que
atravessam e perpassam as relações entre as pessoas, como também sua própria
subjetividade individual, e podem se ligar a suas respectivas histórias, mas também a suas
inserções sociais, geográficas, institucionais, familiares, étnicas, culturais e políticas. Ao
mesmo tempo em que se insere e envolve as relações terapêuticas, ele também as
antecede, mas pode ser influenciado pelos sujeitos que dele tomam parte que, em certa
medida, também o fabricam por meio de suas ações. Desse modo, pode-se assim partir de
um pressuposto segundo o qual a psicoterapia pode se tornar uma espécie de oficina de
contextos, isto é, um momento relacional que pode influenciar e reconstruir importantes
momentos dos sistemas de dimensões que se entrecruzam nas relações entre os sujeitos.”
(Neubern, No prelo).
O contexto terapêutico está sempre em movimento. Ele é construído e se transforma à
medida em que são gerados sentidos diferentes diante do encontro entre o cliente e o terapeuta. O
contexto que perpassa por toda uma história de vida do cliente sofre também a influência do
contexto do terapeuta, quando estes se encontram. O espaço vivido neste relacionamento ou em
qualquer círculo social está inserido no contexto.
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Os sentidos construídos pelo cliente e os variados contextos experimentados por ele
encontram-se na terapia, para que assim, este possa gerar no encontro com o terapeuta novos
sentidos e transpô-los para fora deste contexto terapêutico.
Este aspecto de contexto inserido no espaço social do cliente pode ser compreendido
como um organizador de sua personalidade, ou seja, a ação deste sujeito possui um vínculo entre
uma ação socialmente situada e a organização da personalidade (González Rey, 2007). Portanto,
ao passo que se constroem novos significados em um espaço de terapia, este sujeito reorganiza
sua narrativa dando sentidos novos a suas relações.
Este contexto é dinâmico e assim sendo modifica-se de acordo com os novos sentidos
produzidos em terapia, e fora dela. Para que aconteça de fato o encontro entre a pessoa do
terapeuta e a pessoa do cliente, este contexto deve ser compreendido pelo cliente como um
espaço seguro de relacionamento onde possa se expressar livremente e onde possa construir
novos sentidos sem que seja julgado ou desmerecido, onde possa ser visto como um sujeito do
próprio saber. O contexto perpassa pelo espaço vivido, tanto pelo cliente como pelo terapeuta,
sendo assim é permeado de sentidos construídos ao longo de uma vida. O que torna possível
transformar o sentido de acordo com a dinâmica do contexto que se insere na psicoterapia,
lembrando que este contexto é de uma plasticidade limitada e pode sofrer influência à medida
que caminha a terapia (Neubern, no prelo). Para tal, é necessário que o terapeuta atue
construindo um contexto acolhedor para o cliente onde as narrativas tenham um sentido de
proteção, para que protegidamente possa construir novos sentidos e transformar sua narrativa,
ajudando a tornar o inconsciente consciente de modo a facilitar as próprias soluções do sujeito
(Neubern, 2004), bem como possa se sentir à vontade para deixar que este conteúdo permita a
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produção de novos sentidos para esta relação, que cresce e se transforma no decorrer dos
encontros entre terapeuta e cliente.
O terapeuta pode dar uma direção para a formação de significados do cliente, mas apenas
o cliente fará as suas associações, enquanto seu inconsciente trabalha de uma forma contínua
após sua saída do consultório. O contexto permite que haja uma nova construção de sentido, que
abre possibilidades de novas avaliações acerca de vários aspectos vividos pelo cliente, o que
facilita o caminho em direção as mudanças de sentidos construídos pelo cliente.
O que de certa forma valida o que o cliente já viveu, e viverá, como uma perspectiva de
futuro plausível a si mesmo, pois ao perceber que os contextos são mutáveis o paciente pode
então tornar-se o “timoneiro” que guiará suas próprias construções de sentidos e interpretações
de significados em um novo contexto de sua própria existência enquanto sujeito.
1.3 Papéis
No decorrer da terapia a relação assume diferentes formas, onde o próprio terapeuta deve
assumir funções distintas, podendo assumir, por exemplo, o papel de pai, ou de professor. Cada
cliente se mostra de forma particular e diferente e com demandas distintas. O terapeuta, então,
deve estar atento as questões levantadas, para poder atuar de forma mais direta em torno da
queixa (Zeig & Robles 1991), para produzir o resultado esperado de uma forma mais efetiva,
permitindo ao cliente chegar as suas próprias conclusões.
“O que tentamos fazer como terapeutas é investigar o mais prontamente possível, a
linguagem experiencial do paciente e utilizá-la” (Zeig & Robles 1991). Para tanto, a atuação do
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terapeuta tem que ser condizente com a queixa e tem que fazer sentido para o cliente. Por
exemplo, se o cliente precisa de algum ensinamento o terapeuta pode assumir o papel do
professor.
O importante é que no decorrer da terapia o terapeuta tenha a capacidade de assumir
outros papéis quando for necessário, pois ao passo que ficar em apenas um papel, pode fazer com
que a terapia não progrida, ou se mantenha estagnada sem produzir novos sentidos devida a uma
paralização desta relação em papéis engessados.
O papel do terapeuta pode ser o de apenas estimular o cliente para que ele traga a tona
suas potencialidades que estão “adormecidas” em seu inconsciente (Zeig & Robles, 1991).
Entretanto, existem papéis que se assumidos pelo terapeuta podem fazer a terapia estagnar ou
fazer com que não progrida, como por exemplo, o papel de “voyeur” que fica apenas observando
as dinâmicas do paciente, deixando-o a mercê de seus problemas (Zeig & Robles 1991).
Assumindo este papel o cliente não terá o correto direcionamento para a dissolução de alguns
problemas. Existem variados papéis que podem ser assumidos em terapia, como o do boxeador,
que responde ao cliente confrontando-o, como se estivesse batendo nele. Este tipo de terapia
pode trazer benefícios, ao ponto que o cliente precise de uma intervenção mais abrupta, para a
construção de novos sentidos. Porém, se este papel não se modificar ao longo da terapia, o
cliente pode se retrair, protegendo-se dos ataques do terapeuta.
O papel do Guru aparece também, quando o terapeuta demanda atenção de seu cliente a
ponto de se tornar o único caminho viável, o caminho da verdade absoluta e incontestável,
quando o terapeuta se coloca no único lugar de destaque possível, como o único que pode levar
às tão necessárias respostas onde o paciente precise da consulta ao terapeuta para tomar qualquer
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tipo de decisão. Este papel pode ser muito desconstrutivo e ao mesmo tempo pode tornar o
cliente muito dependente do terapeuta.
No entanto se houver na terapia espaço para este tipo de papel, como por exemplo, se o
paciente não tiver uma construção sólida de seu sentido de identidade, este terapeuta guru pode
proporcionar um direcionamento através de uma linguagem mais diretiva, para tirar o cliente da
inércia em que se encontrava.
O professor é o papel daquele que ensina, que mostra os caminhos, que leva o cliente a
conhecer novos conceitos, que introduz novos conhecimentos, na medida que a necessidade
destes novos conhecimentos aparece. Entretanto, a rigidez do terapeuta neste papel pode fazer
com que o cliente mantenha a estagnação em relação à terapia, assumindo o papel de aluno, e
não mais produzindo questionamentos para a construção de novos sentidos, e se manter receptivo
apenas aos ensinamentos do terapeuta, podendo este assumir o papel de guru, devido a esta
paralisação.
Existe também o papel do terapeuta Mãe, aquele que é bastante acolhedor, que dá o colo
e cuida amorosamente. Este papel é de muita valia para casos onde o cliente se sinta rejeitado ou
não pertencente a qualquer espécie de círculo social, além de exercer um papel importante para
que seja estabelecido um contrato terapêutico.
Mas este papel, como todos os papéis que podem ser assumidos pelo terapeuta, tem que
ser dinâmico, e acompanhando as transformações produzidas pela terapia. Se o caso for de
depressão, é necessário que se faça uma intervenção no intuito de acolher o cliente. Entretanto,
estabelecido o vínculo terapêutico, existe a possibilidade de mantido este papel, o cliente não só
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não produzir uma mudança de sentido para esta depressão, bem como de o de entrar mais
profundamente nela.
Para tanto, é necessário que os papéis assumidos pelo terapeuta sejam dinâmicos, uma
vez que o processo terapêutico é dinâmico, e no sentido de que o cliente e o terapeuta estão
produzindo novas construções durante todo o processo de terapia.
Os papéis assumidos em terapia funcionam de certa forma, para que a dramatização do
contexto terapêutico tome proporções maiores e que os sentidos que se constroem ou se
modificam tenham maior força de transformação.
É através dos papéis que o terapeuta consegue atingir a efetividade necessária para que
ocorra a terapia, pois são na maioria das vezes os papéis assumidos que permitem a assimilação
de novos conceitos de uma forma eficaz pelo paciente, e assim construindo novos sentidos este
cliente pode mudar seu posicionamento diante da terapia, produzindo significados que antes não
eram possíveis e que agora podem guiá-lo em direção a novas questões que proporcionem a cura
que está buscando, ou direcionar o paciente a novos questionamentos, que produzam outros
sentidos subjetivos (González Rey, 1997) de suas relações ou ainda novas relações.
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CAPÍTULO 2
2.1 As Técnicas
A construção de uma terapia se dá à medida que a relação entre o cliente e o terapeuta se
torna mais forte, onde podem ser assumidos diferentes papéis no intuito de conduzir a terapia.
Durante este processo, também há a construção de um contexto terapêutico, proporcionando a
produção de novos sentidos que dão o direcionamento à terapia. Para tanto, é necessário a
utilização de algumas técnicas de terapia para que o trabalho seja orientado de forma segura e
positiva. Diante de diversas técnicas de se produzir uma psicoterapia, este trabalho tem seu foco
nas técnicas de hipnose desenvolvidas por Milton Erickson, e na sua forma de conduzir uma
psicoterapia.
A psicoterapia ericksoniana tem seu foco na valorização da autonomia e potencialidade
do cliente, para que ele encontre em si, sentidos para as dúvidas que o cercam e que o trazem à
terapia, dando significativa importância para a singularidade do sujeito. Todos os pacientes têm a
força necessária para produzir mudanças e possuem os mecanismos necessários, só que estes
estão adormecidos no que chamamos de inconsciente. Portanto, as técnicas hipnóticas visam
trazer este conteúdo a uma superfície mais palpável, de forma que o cliente se beneficie deste
conteúdo, mesmo que não saiba como ou porque, pois os padrões dos pacientes se tornam formas
de limitar suas opções (Zeig e Robles, 1991).
O processo de indução do transe deve ser visto como um método para ensinar aos
pacientes novas maneiras de aprender algo, e desta forma habilitá-los a descobrir capacidades
ainda não pensadas, e a agir de novas formas que poderão ser aplicadas a outras coisas inerentes
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a seu contexto2 (Erickson & Rossi, 1980). E assim sendo a terapia proporciona as mudanças de
sentido necessárias para a mudança da compreensão do cliente a cerca da sua queixa, ou do seu
sofrimento psíquico.
O cliente que vem à terapia se encontra com o psicólogo, que utilizando conhecimentos
teóricos e vivenciais pode delinear uma terapia condizente com as necessidades do paciente. O
terapeuta que se encontra com a pessoa do cliente deve estar sempre atento para aspectos que
façam sentido para o paciente, que possam direcionar a ação do terapeuta, para que ele utilize o
que o cliente trás, de forma a ser mais efetivo nesta terapia (Zeig & Robles 1991). Esta técnica de
buscar o que o cliente trás e assim poder utilizar isso em terapia, é chamado da técnica da
“Utilização” (Haley 1985, Zeig & Robles 1991).
Erickson utilizava esta técnica sob a premissa de que, enquanto o terapeuta se comunica
com o cliente utilizando os sentidos construídos pelo mesmo, a comunicação se mantém em um
nível de grande compreensão, permitindo que o inconsciente trabalhe livremente buscando seus
próprios sentidos e construindo novos, no decorrer da sessão terapêutica, e da terapia (Haley
1985).
Buscando no próprio cliente a força necessária para a mudança, bem como os sentidos
que estão sendo construídos, ou deixados de lado, utilizando o que o próprio cliente apresenta
podemos fazer com que clientes resistentes possam ser persuadidos e assim possam ser levados a
atingir seus objetivos (Haley 1985).
2 Tradução do autor
18
É como se utilizássemos o que o próprio cliente sabe fazer como, por exemplo,
expressões corporais ou linguagem. Utilizamos os padrões e os reenquadramos dando a eles
novos sentidos (Zeig e Robles 1991), para que isso ocorra é necessário que seja estabelecido um
bom “rapport” que tenha força significativa para este cliente.
Estes princípios da utilização estão ligados a aspectos da relação entre o paciente e o
terapeuta, portanto é necessário que o terapeuta esteja atento aos detalhes desta relação, como ele
se posiciona em terapia, como o cliente está se colocando, se está responsivo ou não, quais são as
expressões do cliente, para que a partir deste contato, possam ser utilizadas as questões do cliente
em favor dele mesmo, proporcionando um contexto favorável de produção e modificação de
sentidos.
A linguagem utilizada neste caso é a mais próxima possível da linguagem do paciente,
para facilitar a compreensão, e para que o terapeuta esteja no mesmo patamar de compreensão e
assim possa utilizar dos mecanismos apresentados em terapia.
Outra técnica utilizada nas terapias de Erickson é baseada na forma como a linguagem
aparece, pois, ao se comunicar com o paciente, é necessário que o terapeuta seja muito sutil. Esta
sutileza na comunicação é necessária para que haja uma conversa indireta com o inconsciente
sem que a parte consciente do cliente crie algum ruído nesta comunicação, pois o conteúdo
presente no inconsciente é inerentemente simbólico (Neubern no prelo).
Para Erickson, a forma como a fala se apresenta é mais importante do que o conteúdo
propriamente dito (Haley, 1985), e através da forma que a comunicação se mantém dentro dos
padrões da sutileza necessária para a comunicação entre o inconsciente do terapeuta e do
paciente.
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Dentre as formas de comunicação podemos destacar alguns princípios como, por
exemplo, Entremeamento (Haley, 1985, Zeig & Robles, 1991), onde a entonação da palavra ou
grupo de palavras muda, pode mudar a extensão, pode alongar ou encurtar o tempo de pronúncia,
ou apenas mudar a sonoridade, dando ênfase à palavra ou sentença que se quer destacar, para que
apenas o inconsciente perceba esta sutil mudança no tom de voz do terapeuta quando esta
palavra for pronunciada.
Esta técnica é muito forte para a comunicação, pois passa despercebida pelo cliente e vai
diretamente exercer sua influência no inconsciente. É uma técnica que tem uma dramaticidade
muito grande. Erickson conferia muito drama a suas intervenções psicoterapêuticas (Haley,
1985, Zeig & Robles, 1991).
Quanto mais indireta for a comunicação, mais o inconsciente será estimulado. Esta forma
de comunicação é o que Erickson chamou de abordagem diretiva indireta (Haley, 1985, Neubern,
2004) que permite a diretividade de uma psicoterapia e a comunicação indireta que o
inconsciente necessita para ser trabalhado.
A noção de que o inconsciente trabalha de uma forma indireta é o que norteia os
princípios das técnicas da terapia de Erickson, portanto a utilização, bem como o entremeamento,
são formas sutis de passar informações pertinentes à terapia, outra técnica amplamente utilizada
no que tange a comunicação indireta, é a semeadura.
A semeadura é a técnica que permite que idéias sejam semeadas no começo da terapia
com enfoque de serem trabalhadas ao longo da sessão, sem que o cliente tome conhecimento
deste fato, para que este tema semeado seja trabalhado em um momento posterior com maior
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efetividade. Como se uma semente fosse plantada agora, para que em um momento posterior
possamos colher os frutos desta árvore.
Erickson estabelecia certas idéias e no decorrer das sessões, trabalhava sobre estas
questões (Haley, 1985) e a partir daí poderia colher as respostas que foram programadas. Esta
semeadura pode ocorrer inclusive no momento de coleta de informações no estabelecimento do
“rapport”, e no momento apropriado podem ser utilizadas (Haley 1985).
Erickson se utilizava destas técnicas de várias maneiras. Uma delas é através da hipnose,
o transe formal, que pode ser utilizado de várias formas em terapia. Estas técnicas que foram
apresentadas, não necessariamente precisam ser aplicadas em um sujeito que esteja em transe
formal. Haley (Zeig & Robles, 1991) não utiliza transes formais em sua terapia, por exemplo.
Entretanto, uma técnica muito eficaz para ser utilizada em terapia é a hipnose, onde pode
haver um estado de transe formal ou não. O transe é um estado de consciência, onde se pode
estabelecer um contato simbólico com o inconsciente (Erickson & Rossi 1980; Neubern no
prelo), e a partir deste estado utilizar técnicas como o entremeamento ou a semeadura, para que
sejam atingidos os objetivos de terapia.
A hipnose pode ser compreendida como uma forma de sugestão (Zeig & Robles 1991,
Haley, 1985) na qual o terapeuta conduz o cliente de uma forma muito tranqüila e indireta, para
trabalhar e repensar as questões que são trazidas à terapia.
Portanto, a comunicação em transe deve ser feita de uma forma muito indireta, uma
forma que Erickson utilizava em larga escala, chegando a uma condição de maestria, é a
comunicação por metáforas (Haley, 1985).
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A comunicação feita através de metáforas tem a característica de passar mensagens de
uma forma muito sutil, enquanto o terapeuta pode orientar o cliente para determinadas metas
traçadas para a terapia, sem que o consciente participe desta conversa. Como se estivesse
propagando uma tradição muito antiga em que contos e lendas eram utilizados para transmitir
valores morais, éticos e culturais (Rosen 1982).
Desta forma a mensagem tem uma força muito grande, necessária para que ocorram
mudanças nas construções de sentido do cliente. Quando a comunicação indireta é feita o cliente
não se dá conta de que algo está fazendo sentido nesta conversa, e seu inconsciente pode
continuar processando as informações durante muito tempo após a saída da terapia.
Uma pílula amarga pode ser mais facilmente engolida se for envolvida por uma cobertura
doce (Rosen, 1982). É esta a força que conduz o paciente no caminho das mudanças terapêuticas
proporcionadas pela terapia, com base na linguagem metafórica.
O que torna a comunicação por metáforas uma técnica muito forte é que estas histórias e
contos, que podem ser apresentados tanto em transe como em estado de vigília, e proporciona ao
paciente o vislumbre de que ele não precisa ficar preso as suas estruturas de pensamento,
limitado a estruturas já conhecidas. Em parte, graças a estas histórias, o paciente pode perceber
que existem outras possibilidades, outras construções, que ele pode abraçar ou rejeitar, tanto no
plano inconsciente como consciente (Rosen, 1982).
Neste contexto de utilização de metáforas, se o cliente está com dificuldades em relação
ao tempo percorrido da terapia, ou a velocidade com que as coisas estão se encaminhando, de
acordo com a linguagem trazida por ele, podemos utilizar a metáfora de um carro subindo a
ladeira. Por exemplo, se a ladeira é muito íngreme, não adianta colocar a quarta marcha e tentar
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subir rápido, pois a caixa de marchas fatalmente quebrará. Fazendo uma clara alusão ao fato de
que algumas pessoas precisam de um tempo maior para conseguir criar sentidos novos e
proporcionar mudanças, e não adianta forçar, pois podem não dar conta e talvez até abandonar a
terapia.
Entretanto as associações são exclusivas do cliente, por mais que o terapeuta oriente ou
utilize metáforas, somente o próprio cliente é quem poderá interpretá-las e dar sentido às
metáforas desta comunicação. Cada ser humano tem suas questões e constrói seus sentidos de
uma forma muito única e exclusiva (Frankl, 1984).
Estas metáforas podem conter outra técnica de comunicação entremeada, que é chamada
de Truismo e Yes set. O truísmo consiste na constatação daquilo que é óbvio para o paciente,
com o intuito de demonstrar que o terapeuta está atento ao seu paciente e ao que ele trás.
Esta técnica tem uma força também muito grande, pois permite o estabelecimento de um
vínculo muito forte com o inconsciente, pois trás evidências para o sujeito, demonstrando ao
paciente que o terapeuta compreende como este pensa.
Uma seqüência de truísmos seguida de uma sugestão tem o nome de Yes Set (Zeig &
Robles, 1991). Esta é uma técnica muito poderosa para inserir novas idéias em terapia, pois o
inconsciente registra as sugestões de forma mais tranqüila e sem que haja a percepção da
consciência, e assim esta sugestão é assimilada mais consistentemente.
E desta forma a terapia adquire uma força grande, no sentido de direcionar o sujeito em
terapia a resoluções e a novas compreensões, que não faziam sentido até aquele momento.
Constantemente estão sendo construídos novos sentidos, e a terapia toma novas direções de
acordo com o que o paciente trás a tona.
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Uma técnica poderosa também é a prescrição de tarefas. Esta tem a finalidade de por em
prática as questões trabalhadas em terapia fazendo com que o inconsciente trabalhe de forma
mais poderosa ainda, mesmo que o cliente não tenha consciência do que significa a tarefa, o
inconsciente estará constantemente trabalhando e produzindo mudanças (Haley,1985).
A prescrição de tarefas representa simbolicamente o tema a ser trabalhado (Zeig e Robles
1991). Por exemplo, a cliente que chegou ao consultório e se sente solitária, pois não encontra
um companheiro, a tarefa prescrita foi a de procurar na prateleira do supermercado onde ficam os
refrigerantes, um tempero para comidas.
De fato, ela não encontraria o tempero, entretanto a diretiva aqui é a de que o
inconsciente processe a idéia de que é necessário procurar nos lugares certos algo que faça
sentido nos momentos adequados. Outro caso que pode ser relacionado é o do paciente que se
sente paralisado, uma prescrição foi a de beber muita água, mais até do que ele está acostumado,
pois o mesmo terá que se movimentar para pegar a água, e mesmo que ele tenha uma garrafa
perto, após um tempo terá que se movimentar novamente, nem que seja para ir ao banheiro.
De qualquer forma todas as associações são feitas pelo paciente, neste caso o papel do
terapeuta é orientar a tarefa de uma forma que seja mais adequada à demanda apresentada neste
momento da terapia (Zeig & Robles 1991).
As técnicas relacionadas à hipnose podem ser utilizadas de uma forma terapêutica, ou
não, tudo dependerá do contexto em que a hipnose está sendo utilizada (Erickson & Rossi, 1980;
Neubern, 2004).
A hipnose assume um papel muito importante enquanto técnica de terapia, pois tem uma
força muito singular, e uma comunicação muito efetiva com o inconsciente do sujeito.
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Entretanto, esta dependerá do contexto de terapia formado entre cliente e terapeuta, para que de
fato ocorram mudanças efetivas nos sentidos gerados pelo sujeito em terapia.
Para tanto, existem outras técnicas bastante poderosas no sentido de gerar novos
significados, conhecidas como fenômenos hipnóticos, que em um estado de transe formal
assumem um caráter terapêutico de grande valor, quando utilizados dentro de um contexto de
terapia.
A levitação da mão, por exemplo, é um processo ideomotor de muita força, pois permite
que associações sejam produzidas, de dentro para fora, no sentido de o cliente perceber que ele
pode gerar sentidos novos para aquela experiência, onde seu inconsciente estará gerando
associações variadas para esta experiência que está no corpo do paciente, demonstrando que está
fisicamente presente.
A consideração principal a se fazer no tocante a técnicas ideomotoras não é a respeito da
elaboração que elas proporcionam e sim na iniciação do processo de atividade motora, que seja
real ou apenas uma alucinação positiva, como um meio de fixar e focar a atenção do sujeito em
suas capacidades e aprendizados subjetivos (Erickson & Rossi, 1980).
A força de processos ideomotores podem em muitos aspectos fornecer ao paciente
materiais que o façam progredir em terapia de uma forma concreta, como por exemplo, no caso
de uma possível descrença nos métodos hipnóticos, esta pode ser desmistificada com a percepção
via fenômeno ideomotor, de que existem processos subjetivos e inconscientes ocorrendo, e que
em sua grande maioria não têm a menor possibilidade de controle consciente por parte do
paciente.
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As técnicas apresentadas neste capítulo, em geral tendem a trazer a tona potencialidades
adormecidas do cliente, e de dialogar com o inconscente, para que assim a terapia ocorra de uma
forma bastante sutil, porém com uma força até certo ponto devastadora.
Esta força devastadora seria a que impele o sujeito a fazer suas associações, a criar seus
sentidos, ou transformar aqueles que já estariam arraigados em seu inconsciente a ponto de
manter o mesmo paralisado sem perspectivas de mudanças.
A proposta destas técnicas seria então, a de movimentar o inconsciente do sujeito de uma
forma progressiva e duradoura que possa transpor as barreiras do contexto psicoterapêutico, e
assim transbordar para outros contextos do paciente, transformando contextos anteriormente
construídos, em potenciais geradores de bem estar ou construir novos contextos juntamente com
a construção e modificação de sentidos subjetivos inerentes a sua vida como um todo.
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CAPÍTULO 3
3.1 Mudanças em terapia
As técnicas de terapia apresentadas no capítulo anterior possuem uma grande aplicação
prática, neste capítulo será apresentado um caso onde pretendemos dialogar com as teorias
apresentadas nos capítulos anteriores, demonstrando a aplicabilidade das técnicas, e as mudanças
que foram proporcionadas dentro de um contexto terapêutico.
Helena 43 anos, solteira, com um filho de 7 anos, formada em processamentos de dados,
chegou ao consultório reclamando que sentia várias dores, que a incapacitavam, que estava
afastada do trabalho a dois anos e que poderia perder o benefício que lhe estava sendo pago
durante o afastamento.
A cliente chegou com uma postura muito agressiva mostrando uma face dela, que não é o
que ela reflete no interior, o que leva a crer que existe algo que a incomoda em um nível
subjetivo. A subjetividade de um indivíduo pode ser compreendida como a forma que o mesmo
percebe as construções sociais que o cercam, de acordo com as próprias construções psíquicas,
que perpassam pela sua história de vida (González Rey, 2003). Ela se coloca de uma forma
paralisada, como se a mesma tivesse que parar de alguma maneira, pois não dá mais conta. Foi
percebido que talvez haja algum fardo muito pesado na vida da mesma, que ela já não quer
carregar, algum tipo de contrato que ela haja feito, ou algum tipo de responsabilidade que ela não
gostaria de ter. Ainda se mostrou uma pessoa auto-suficiente como se não necessitasse de mais
ninguém para o correto funcionamento de sua vida, e como se ninguém suportasse estar ao lado
dela por ela ser muito chata.
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A busca da cliente então mostrou ser a de encontrar algum caminho para sair desta
situação que a faz sentir-se paralisada. O trabalho do terapeuta neste momento foi fazer um
mapeamento, que pode ser visto como a tentativa de compreensão ou a maneira de verificar onde
a paciente sente a dor, como ela é, se queima, se arde, como é essa dor, onde ela está, ou ainda
como ela se sente, o que a incomoda. É ter uma compreensão do que a cliente sente segundo sua
própria maneira de gerar o sentido do que ela passa naquele momento (Carvalho, 1999).
Esta técnica permite que seja articulada com o cliente a idéia de que existem coisas que
ele mesmo pode utilizar em seu próprio benefício, e ainda permite ao terapeuta aplicar a técnica
da utilização, para conseguir se comunicar com o cliente segundo suas próprias maneiras de
construir a narrativa.
O mapeamento teve a duração de duas sessões, para então poder discorrer sobre as
implicações de como a paralisia foi construída pela cliente.
É muito importante perceber que os relatos da cliente são metafóricos em sua grande
maioria. A metáfora é uma espécie de forma de comunicação onde existe uma comunicação
simbólica para falar sobre algo, para trazer a tona algum sentido, é uma linguagem utilizada por
Erickson no intuito de fazer o inconsciente trabalhar de uma forma bem sutil (Haley, 1985). A
cliente em questão trás para o consultório situações de terceiros, de uma forma indireta, nunca se
colocando abertamente.
O que pode demonstrar neste momento um sentimento de autoproteção muito grande e
que até certo ponto estava gerando uma paralização na terapia. Cinco ou seis sessões foram
necessárias para que o terapeuta percebesse a maneira dela se colocar no discurso, quando na
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verdade, ela era a protagonista, mas o fez de uma forma muito particular, que o terapeuta ainda
não havia percebido.
Forma é a maneira que com a qual o discurso acontece, os pequenos detalhes chamados
de minimal cues por Erickson, ou ainda a sonoridade da fala, o estilo de sua comunicação
(Ericson & Rossi 1980), ela contava sempre a história de alguém, ou algo que aconteceu, e a
partir destes relatos pôde-se perceber que a cliente falava dela mesma, até então o terapeuta não
tinha sequer percebido a forma que o discurso tomava.
Após esta descoberta o terapeuta pôde perceber a imagem de si (Body Image) que a
cliente construiu, ou seja, como ela se percebe perante o mundo, como ela se coloca diante destas
situações, como ela constrói a imagem de si, diante das dificuldades (Haley, 1985, Neubern no
prelo). Esta imagem é a imagem dela ser toda errada, e questionando-se enquanto mãe, ou ser
humano, ou ainda questionando, se alguma pessoa poderia realmente gostar de alguém tão
desagradável como ela se vê.
Este é o momento no qual se vislumbra a questão central da terapia em questão, que se
mostra a dificuldade que a cliente tem em encontrar uma completude, um sentido para o vazio
existencial de sua vida, que nem filho, nem amigos podem preencher, percebendo então a
necessidade de algo mais em sua vida. Existe a constatação, em um nível inconsciente até então,
de que é solitária e precisa de um companheiro.
É muito interessante perceber que a cliente chegou à terapia com uma aparência bem
cansada, e assim se manteve por mais ou menos três sessões. A partir da quarta sessão a mesma
apresentou significativa mudança na postura e no estado de humor, chegando até a fazer algumas
piadas. No início da terapia a relação entre o terapeuta e a cliente era bem distante, como se a
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cliente estivesse testando até onde poderia chegar, até onde poderia ir com segurança, mostrando
ao terapeuta como ela é complicada e que o mesmo não conseguiria resolver seus problemas, que
muitos não conseguiram apesar dela estar há muito tempo em terapia, sem nenhum sucesso,
corroborando a imagem de si mesma com uma pessoa errada.
Diante destas constatações, a intervenção terapêutica passou a lidar com esta imagem de
si, e as construções da narrativa do terapeuta passaram a contemplar esta dinâmica.
Sempre mostrando outras coisas, além das erradas, como a mesma tem sido uma mãe
muito cuidadosa, como tem podido ajudar seu filho de uma maneira correta, ou ainda como pode
mesmo com muitas dores, completar os afazeres domésticos.
Entremeando estas informações entre metáforas e analogias, aplicando estas técnicas na
paciente enquanto ela se encontrava em estados de transe formal ou no estado de vigília. A
aplicação destas técnicas de narrativas não se restringe ao estado de transe formal.
Aos poucos no decorrer da terapia a paciente foi se deixando ficar mais à vontade, e até
mesmo a sua postura na poltrona mudou denotando alguma mudança na relação, e também, que
aquele contexto estava se tornando um contexto protegido para a paciente. Se nas duas primeiras
sessões ela sentava-se de uma forma desleixada e descompromissada como se estivesse ali por
obrigação e como se aquele espaço não a pertencesse, a partir da terceira e quarta sessões ela
começou a sentar mais relaxada e à vontade, ao invés de desleixada, tomando para si o espaço de
terapia de fato aceitando o que estava sendo proposto, ou seja, que ela mesma constrói a busca
pela resposta.
De fato a principal questão aqui levantada é a necessidade da mesma em se relacionar
com um homem, o que representaria este homem, o sentido que ela dá a este homem é o de
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alguém que cuide e que esteja com ela, que não a faça se sentir sozinha, pois o que é percebido
na terapia, é que a solidão dela tem um sentido de proteção contra algum ferimento que possa
surgir desta relação amorosa como, por exemplo, o medo do abandono. Esta é a dinâmica central
da terapia. Que a todo momento desta terapia vem sendo trabalhada com técnicas de semeadura,
entremeamento, com a utilização de metáforas e analogias, sempre focando uma conversa com o
inconsciente, através da comunicação diretiva indireta.
É muito importante aqui ressaltar a maneira como o terapeuta estava se enxergando na
relação com o paciente, como se estivesse sem saída, como se o que estivesse fazendo não
surtisse efeito, sem dar conta de que as mudanças ocorrem em um nível muito sutil, toda sessão
ela chegava um pouco diferente, demonstrando o fato de que tudo o que havia sido falado
anteriormente em algum nível foi aproveitado.
Nas primeiras sessões foi prescrita uma tarefa, segundo Erickson a prescrição de tarefas é
uma maneira de trabalhar o inconsciente sem que a pessoa precise saber o porquê, mas as
atitudes da mesma ativam o inconsciente, e ela pode trabalhar as questões da terapia de uma
forma bastante indireta (Haley, 1985; Neubern 2005; Zeig & Robles 1991), onde a cliente
deveria não dormir, e assim que estivesse morrendo de sono, beber uma garrafa de dois litros de
água, no intuito de urinar a noite inteira, ou ter o sono atrapalhado, entretanto, a mesma não o
fez, o que leva a crer que ela tem uma forma muito interessante de interagir com o mundo, ela é
“do contra” e com mais esta descoberta algumas intervenções puderam ser melhor aproveitadas,
seguindo esta linha de se pensar no mundo, pois a maneira como o terapeuta deveria utilizar a
linguagem teve de ser modificada, pois para que fosse realizada uma ação, era necessário que se
desse uma diretiva em sentido contrário a esta ação, por exemplo, se fosse interessante para a
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terapia que ela falasse bastante, poderia ser dito a ela que sentasse na cadeira e ficasse calada por
alguns momentos, quase que de pronto a paciente colocava-se a falar.
Na verdade esta constatação fez o terapeuta mudar a forma com a qual se comunicava
com a paciente, era bastante diretivo, e não tinha uma influência tão grande na terapia, mas a
mudança da forma como o terapeuta se comunicava com ela, fez toda a diferença neste momento
da terapia, neste ponto tornou-se muito mais indireto, utilizando um discurso diretivo indireto,
permeado de truísmos, e Yes sets, o Truismo é uma maneira de fazer com que o cliente perceba
que você o acolhe, e o entende, o Yes set é um truísmo seguido de uma sugestão, como se o
terapeuta sinalizasse que o entende, que o acolhe, mas que o cliente pode tomar determinada
direção (Erickson & Rossi, 1980), mas deixando claro que as associações ficam a cargo do
cliente, o terapeuta pode apenas dar uma direção, mas o sentido será construído ou transformado
pelo cliente apenas.
Erickson utiliza muito desta forma de comunicação em suas hipnoses, de fato ele
praticamente baseia-se nestas formas para que os clientes se tornem ainda mais sugestionáveis
(Zeig & Robles 1991).
Outra forma que de comunicação utilizada em terapia com grande sucesso, é o
entremeamento de sugestões no meio das falas do terapeuta, o que mostrou ser muito eficaz,
mesmo que de maneira sutil, muitas das vezes que esta técnica era utilizada a cliente comentava
algo relacionado a ela, como uma vez que foi apresentada a metáfora de um barco que para alçar
viagens deveria soltar as amarras e perder o medo de se lançar ao alto mar sem a segurança firme
de um cais, alguns momentos após a cliente relatou: “O meu barco não, ele está bem amarrado
ao cais, eu tenho muito medo do que posso encontrar lá fora”, neste momento a temática da
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terapia abraçou outro aspecto, foi percebido que a cliente tem um medo grande, ainda não se
tinha a imagem do que seria este medo ou que foco seria o deste medo naquele momento, mas
este ao longo das sessões foi sendo descoberto e tomou uma proporção no mínimo interessante
de ser avaliado e trabalhado em terapia.
É muito interessante neste ponto perceber que este medo é uma temática muito forte na
vida da cliente, o que é juntamente com a questão da busca por um companheiro o centro da
nossa terapia e o que a faz ficar paralisada, a busca de um homem pode ser a busca por cuidado,
pois nos encontros apareceu uma necessidade de cuidar de si muito grande onde ela disse que a
pior coisa era estar doente (gripada) e sem ninguém para cuidar dela, e como ela acha que precisa
de cuidados, mas não acredita que alguém possa cuidar dela por ela ser uma pessoa muito difícil.
Esta forma com a qual a paciente se apresenta para as pessoas é uma forma de se proteger
de algum tipo de frustração que ela possa ter vivido, é importante que se perceba aqui, que em
um nível inconsciente, parece que a cliente acaba por ter algum tipo de prazer em afastar as
pessoas que poderiam ser possíveis cuidadoras dela.
No decorrer da terapia, já com um vínculo terapêutico bem estabelecido, este medo de
algo relacionado com o possível abandono tomou uma forma até certo ponto curiosa, pois a
paciente comentou que quando era pequena em sua terra natal, lembrava que seu pai era muito
ausente, e que não a tinha ajudado a estudar, nem dava qualquer incentivo a ela, dizendo que ela
era burra e que não prestava para nada.
Com estas informações o medo toma uma forma mais concreta, onde a imagem de si que
ela faz, tem bastante sentido, pois devido a este fato ela saiu de sua casa, e foi estudar em
Brasília, o que a afastou da família. Neste ponto uma associação que se pode fazer é que para ela
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dar conta deste afastamento da família ela teve de se colocar segura na solidão, dando a esta
solidão um sentido de proteção contra futuros abandonos. O que torna a imagem de chata uma
barreira protetora contra futuros abandonos, pois podemos entender que para a paciente é mais
fácil neste momento estar só, do que ter que vivenciar outro abandono.
Após 10 sessões, que perfizeram o período de 2 meses e meio, a cliente não se queixava
mais das dores que sentia, e que houve uma ressignificação do sentido dado a essas dores, uma
nova forma de sofrimento apareceu sob um manto de solidão, o que leva a crer que a cliente não
tinha consciência, ou não queria acreditar que precisava de alguém por perto para cuidar dela e
desta forma inconsciente tenta fazer com que alguém cuide dela.
Outro fato marcante é que a cliente, não tem reclamado das dores, e ainda afirma que
melhorou bastante e tem conseguido dormir, o que demonstra o nível de mudanças conseguido
dentro de um contexto terapêutico, pois no começo da intervenção a paciente queixava-se de não
conseguir dormir direito, além de sentir muitas dores pelo corpo e que estas dores lhe deixavam
com a sensação de estar paralisada.
Isto leva a um questionamento relativo à melhora da mesma, onde ela pode ter melhorado
com a terapia, e ainda assim não acreditar nisto por algum motivo, ou de fato não ter consciência
alguma por ser esta uma terapia muito indireta na sua forma, deixando a cargo do inconsciente
muitas das construções e reformulações dos sentidos que permeiam o sofrimento da paciente.
É interessante neste momento fazer uma reflexão no tocante à relação entre o terapeuta e
a cliente, neste ponto a estética da relação aparece. A estética da relação é o processo do
terapeuta se pensar na relação entre o mesmo e o cliente (Neubern, no prelo).
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Esta relação teve algumas fases, que se transformaram ao longo da terapia, no início onde
havia algo de identificação ao terapeuta, até no sentido de ser ele o homem que proporciona o
acolhimento e o cuidado, tornando-se uma espécie de “homem idealizado”. Entretanto com o
decorrer da terapia este papel deixou de ser a temática central da relação, e foi percebido que a
paciente teve grande aceitação pelo papel de terapeuta, e aceitou de fato o papel dela de estar em
terapia, aceitando ainda o que era tratado em terapia como algo plausível permitindo-se fazer
suas próprias associações e produzindo novos sentidos ao longo do caminho percorrido.
Desta forma a terapia produziu na cliente uma mudança na maneira de como ela se
coloca e se vê no mundo, nas suas relações sociais, tanto dentro quanto fora do consultório.
Um questionamento que apareceu de uma forma muito forte e singular em terapia é o
questionamento de que ela não é mais criança, porque então estaria sozinha? Este
questionamento é a chave que demonstra a mudança de sentido, pois se no começo da terapia, ela
mesma não se via acompanhada por alguém que não queria conscientemente que alguém
estivesse com ela, e que tinha um certo alívio em estar sozinha e livre de “aporrinhações”, agora
se questiona quanto ao gostar mesmo de estar sozinha e querer de fato alguém a seu lado para lhe
dar o cuidado de que ela necessita agora. Neste sentido a terapia está produzindo efeitos e seus
sentidos estão ainda sendo processados, criados e reconstruídos.
A terapia ocorre em uma via de duas mãos, onde tanto o cliente como o terapeuta tem a
possibilidade de reformular questões, criar novos sentidos e interagir diferentemente do que era
anteriormente apresentado.
As possibilidades de atuação nos variados contextos que permeiam uma terapia é muito
extensa, possibilitando aberturas de caminhos para ambos, entretanto o direcionamento da
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terapia pode ser interpretado como um direcionamento ao cliente, fazendo do terapeuta uma
ponte entre as realidades vividas pelo paciente e os caminhos que o mesmo pode tomar rumo a
suas construções de sentido.
Este pequeno esboço do que pode ser uma terapia, e de que caminhos podemos tomar
diante de algumas técnicas com as quais dialogamos, nos trás a tona um questionamento
interessante acerca das teorias, onde podemos dialogar com elas, mas não necessariamente
devemos nos ater a elas, como um náufrago se agarra a seu colete salva-vidas.
E é possível fazer uma terapia utilizando muitas técnicas de hipnose e linguagem
hipnótica sem ter que necessariamente induzir um estado de transe formal. Podemos neste
sentido trabalhar com vários estados de transe, desde o leve, ao mais profundo, e ainda assim
ajudar os clientes a criarem novos sentidos, ou a transformar aqueles que já faziam parte de seus
contextos, proporcionando mudanças significativas em suas vidas.
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CONCLUSÃO
A proposta deste trabalho foi a de apresentar e demonstrar como ocorre uma terapia de
acordo com as técnicas de terapia breve ericksoniana. Para tanto é necessário que sejam revistas
considerações acerca de alguns conceitos. Primeiramente foi tratada a questão de como se
constrói a relação terapêutica, e que esta relação se mostra ser muito importante no caminho da
construção de significados pela pessoa em terapia. Segundo Keeney (1983), a relação terapêutica
é o que permite o desempenhar de um papel ativo pelo terapeuta, na reconstrução do mundo
experiencial de seus pacientes, sendo essa relação um dos pilares da psicoterapia. Foi verificado
que a base de uma psicoterapia se sustenta na solidificação de uma relação entre as pessoas,
segundo Hycner (1995) é esta relação que permite que o terapeuta consiga entrar no mundo do
paciente, e assim vislumbrar a queixa segundo sua própria ótica. Contudo é de suma importância
que esta relação seja a base de uma construção de sentido que dê o sustentáculo da criação de um
contexto terapêutico.
A terapia necessita da construção de um contexto terapêutico sólido, para
proporcionar ao cliente um ambiente favorável a construções de novos sentidos. Entretanto este
contexto é maleável e se constrói diante da produção de sentidos entre duas pessoas, a pessoa do
paciente e a do terapeuta (Neubern, no prelo). Esta noção apresentada é de suma importância
para a prática psicoterapêutica, entretanto não é muito discutida a construção de contexto pela
psicologia, devido as propostas psicoterapêuticas atuais serem baseadas numa proposta
positivista em que a subjetividade do psicólogo é desconsiderada. Assim, assumir a produção de
sentidos deste no contexto terapêutico é tido muitas vezes como um erro, pois não segue as
técnicas psicológicas que primam pela “neutralidade” do psicólogo.
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A noção de contexto que permita a construção de sentidos por parte do paciente e
terapeuta proporciona que haja uma troca simbólica muito efetiva entre ambos, uma vez que
podem desempenhar seus papéis nesta relação. Esta noção de contexto maleável e que se
constrói podendo influenciar tanto paciente como terapeuta (Neubern, no prelo) é que permeia a
terapia discutida neste trabalho. Desta forma houve a intenção de se discutir como se constrói
este contexto e qual a relevância do mesmo para a terapia.
A terapia ericksoniana é uma terapia voltada para a comunicação indireta com o
inconsciente no sentido de propor uma intervenção (Zeig & Robles 1991; Haley 1985), que visa
mudanças de sentido, muito mais do que a compreensão do paciente em um nível consciente
(Neubern 2004; Erickson & Rossi 1980). Verificou-se assim, que a intervenção do terapeuta tem
força muito grande quando a comunicação é realizada através de metáforas, onde o conteúdo
simbólico é o que se foca, ainda foi constatado que a comunicação com o inconsciente é indireta,
portanto se faz necessária a utilização de técnicas como o entremeamento e a semeadura, que
permitem que a comunicação simbólica seja muito mais eficaz.
Nesse trabalho apresentamos também técnicas da hipnose ericksoniana que
apresentaram-se para proporcionar uma nova qualidade na relação com o paciente, bem como a
produção de sentidos subjetivos através de uma comunicação simbólica com o sujeito que se
encontra em terapia. A noção de sentido subjetivo deste trabalho se apóia na teoria da
subjetividade sustentada por González Rey (2004), onde as construções do sentido subjetivo do
sujeito tomam forma em seus contextos de relacionamento, perpassando por toda uma
construção histórico-cultural que permeia o sujeito. Portanto, esta noção se faz pertinente, pois,
foi verificado que toda a construção de uma psicoterapia baseia-se na construção e modificação
dos sentidos gerados pelo sujeito. Logo, é possível considerar que a comunicação simbólica está
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voltada para a construção de novos sentidos e que estes novos sentidos possam transpor o
contexto de terapia, transbordando estas mudanças para a esfera social do paciente. Entretanto,
este trabalho não contemplou uma discussão mais profunda acerca do conceito de sentido
subjetivo, o que pode limitar um pouco a abrangência desta pesquisa, pois este estudo está
baseado nas construções e modificações de sentido que transformam a terapia em um caminho de
mudanças. Todavia, é necessário que se tenha compreensão de como estes mecanismos de
produção de sentidos atuam no sujeito e como uma comunicação simbólica com o inconsciente
pode vir a produzir esta mudança de sentido.
Esta mudança no sentido do sujeito está calcada em muitos aspectos no tipo de
orientação que o terapeuta está disposto a exercer, então este trabalho discutiu algumas formas
de papéis que os atores da terapia podem exercer. Papéis estes que exercem uma influência
grande na terapia, entretanto, se forem mantidos rígidos podem fazer com que a terapia não se
mantenha no movimento em direção a uma possível mudança. (Zeig & Robles, 1991).
Considerando que a terapia é um processo maleável (Neubern, no prelo), faz-se necessário que se
mantenha a dinâmica de terapia, pois as mudanças de rumo podem ser de extrema importância
para as construções de sentido do paciente (Neubern, 2004).
Nesta pesquisa foi realizado um breve estudo de caso, no qual constatou-se que
neste contexto de terapia a utilização das técnicas de hipnose, como por exemplo, a linguagem
hipnótica e prescrição de tarefas, assumiram caráter de extrema importância na comunicação
simbólica com o inconsciente do sujeito em tratamento. Logo, foi através desta força na
comunicação simbólica, que o paciente produziu os sentidos que desencadearam os processos de
mudanças. No entanto, para que se tenha uma dimensão mais clara de como ocorre esta
comunicação indireta com o inconsciente, este trabalho deveria contemplar de maneira mais
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profunda o conceito de comunicação simbólica, para que a partir deste conceito possa ser
desenvolvida melhor compreensão de como ocorrem os processos inconscientes de produção de
sentido. Portanto, é necessário que seja aprofundado este tema do simbólico na comunicação
entre terapeuta e paciente, para que as medidas em terapia apresentadas neste trabalho tenham
um maior valor significativo enquanto pesquisa acadêmica.
Foi considerado que devido ao caráter desse trabalho relacionar-se a uma pesquisa
final do curso de psicologia, é possível que em pesquisas posteriores e aprofundadas poder-se há
atingir a magnitude que as questões aqui discutidas apresentam de forma “embrionária”. Como
sugestão de pesquisas posteriores, é interessante que se aborde o tema não contemplado em sua
profundidade, ou seja, se faz necessária uma pesquisa que abranja o problema das construções de
sentido do sujeito, como ele se constrói simbolicamente, que tipos de contextos permitem esta
construção, quais as conseqüências destas mudanças de sentido e como isto afetará o paciente
que busca a mudança para seu sofrimento psíquico.
A dimensão simbólica do inconsciente também não foi trabalhada em
profundidade neste estudo e, portanto, se faz necessário um estudo mais abrangente neste
sentido, pois a dimensão do simbólico é de extrema importância na compreensão do tipo de
trabalho proposto pela hipnose ericskoniana, de acordo com a linguagem metafórica proposta.
Este trabalho trouxe a tona uma perspectiva de como conduzir uma terapia segundo uma
abordagem ericksoniana e como é possível através de uma intervenção produzir mudanças em
um nível inconsciente através das técnicas aplicadas. Em suma, com este estudo foi possível
considerar que a solidificação da relação terapêutica, bem como a produção de um contexto
terapêutico que dê também vazão à subjetividade do terapeuta, são pilares fundamentais para a
prática de uma psicoterapia.
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