comunidade, educaÇÃo e meio ambiente: um estudo de … · do flexal no município de...
TRANSCRIPT
![Page 1: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/1.jpg)
0
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS
REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E
MATEMÁTICA
Márcio Moreira Monteiro
COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de caso na
comunidade de São Miguel do Flexal, Pracuúba, Amapá, Brasil
Macapá (AP)
2018
![Page 2: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/2.jpg)
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS
REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E
MATEMÁTICA
Márcio Moreira Monteiro
COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de caso na
comunidade de São Miguel do Flexal, Pracuúba, Amapá, Brasil
Tese apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Educação em Ciências e
Matemática da Rede Amazônica de Educação
em Ciências e Matemática – REAMEC. Linha
de Pesquisa: Fundamentos e Metodologias
para a Educação em Ciências e Matemática.
Orientador: Prof. Dr. Germano Guarim
Neto
Macapá (AP)
2018
![Page 3: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/3.jpg)
2
![Page 4: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/4.jpg)
3
![Page 5: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/5.jpg)
4
Dedico este trabalho, em primeiro lugar, aos
moradores da Comunidade de São Miguel do
Flexal, Pracuúba, Amapá, sem os quais essa
produção científica não seria possível, tendo a
certeza de que os escritos aqui contidos poderão
contribuir para a construção de outros olhares em
relação a esse espaço amazônico.
Aos amigos Fábio Xavier, Rafaella Xavier e família
(em memória) com muita saudade e convicção de
que estão em melhor lugar.
À minha amada Cristilene de Moura Mendonça,
companheira que espero ter por toda minha vida.
Aos meus filhos Pedro Henrique Araújo Monteiro,
Manoela Barata Monteiro, Maria Eduarda Figueira
Monteiro e ao caçula Christian Reizo Mendonça
Monteiro, presentes que recebi do Criador.
Aos meus pais Francisco Xavier Monteiro e
Marlene Moreira Monteiro, só posso dizer que os
amo muito por tudo que representam na minha
vida.
Aos meus irmãos Marcel Moreira Monteiro,
Marcilene Moreira Monteiro e Marilene Moreira
Monteiro com extensão aos cunhados e cunhadas.
Aos meus avós Pedro Moreira (em memória), Edith
Cipriano Moreira, Manoel Monteiro (em memória),
Edilena Monteiro (em memória) e a todos os meus
familiares e amigos.
![Page 6: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/6.jpg)
5
Gosto de ser gente porque, mesmo sabendo que
as condições materiais, econômicas, sociais e
políticas, culturais e ideológicas em que nos
achamos geram quase sempre barreiras de difícil
superação para o cumprimento de nossa tarefa
histórica de mudar o mundo, sei também que os
obstáculos não se eternizam.
Paulo Freire
![Page 7: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/7.jpg)
6
AGRADECIMENTOS
Agradeço em primeiro lugar a Deus, pois sem sua presença em nossas vidas
não seríamos nada, por ter proporcionado forças para o enfrentamento de todos os
obstáculos surgidos no caminho trilhado.
Ao Professor Germano Guarim Neto, Orientador e amigo querido, sem o qual
este trabalho não teria alcançado os objetivos traçados.
Aos amigos de doutorado, em especial: Danielle Dias, Alexandre Pereira,
Alexandre Damasceno, Adriano Aparecido, Lourimara Farias, Jacirene Vasconcelos
e Edslei Rodrigues.
À minha amiga Leda Valéria por todas as contribuições acadêmicas
A todos os professores do Programa de Doutorado/REAMEC, especialmente
aos que ministraram aula para os doutorandos do Polo UFPA.
Ao meu sogro Paulo Leite de Mendonça e minha sogra Maria Madalena de
Moura Mendonça, por todo incentivo e conhecimentos compartilhados.
A Raquel Moura por suas traduções impecáveis.
Aos amigos Gilvane Cordeiro e Hudson Marques pelo apoio e orientações na
formatação do trabalho.
Aos moradores de São Miguel por terem aceitado dialogar e compartilhar
saberes com este pesquisador.
![Page 8: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/8.jpg)
7
RESUMO (Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na
comunidade de São Miguel do Flexal, Pracuúba, Amapá, Brasil). A presente
pesquisa focaliza como eixo central de investigação, a compreensão sobre as
condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do
Flexal e suas influências na alteração ou conservação do meio ambiente, bem como,
no Ensino de Ciências desenvolvido na escola local. Busca-se, com este estudo,
realizar um intenso exercício de reflexão sobre as condições educacionais e
socioeconômicas experimentadas nessa região, assim como, da relação
comunidade/natureza, caracterizada por singularidades, visto sua localização e seus
aspectos sociais, culturais, ambientais e econômicos. Neste sentido, questiona-se
em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade
de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do
meio ambiente, bem como, o Ensino de Ciências desenvolvido na escola local? A
base metodológica teve como sustentação a Pesquisa Narrativa, efetivada por meio
da Analise Textual Discursiva, considerando a necessidade de apresentar um olhar
singular e interpretativo sobre os fenômenos vividos na localidade. As percepções
apresentadas pelos informantes por meio de suas vozes e de minhas intepretações
constituem um conjunto de preocupações, angústias e saberes que foram
construídos ao longo da história dessa população a qual se caracteriza pela
necessidade dos recursos naturais ainda hoje presentes na vida dos moradores,
levando à constatação de que a ausência de políticas públicas das mais diversas
ordens, necessidade de sobrevivência do homem local e ação de agentes externos
na exploração e comércio do que é retirado da natureza contribuem decisivamente
para alteração da paisagem e desaparecimento de espécies da fauna e flora local.
Conhecimento dos ciclos naturais, de plantas, animais e de seres naturais e
sobrenaturais que efetivamente habitam o cotidiano local, são alguns dos saberes
presentes no dia a dia de quem vive esse ambiente, sendo indispensáveis à
construção de uma proposta pedagógica de cunho ambiental que valorize os
saberes tradicionais por meio do Ensino de Ciências desenvolvido na escola.
Palavras-chave: Comunidade. Conservação. Meio Ambiente. Ensino de Ciências.
![Page 9: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/9.jpg)
8
ABSTRACT (Community, education and the environment: a case studied in the
community of São Miguel do Flexal, Pracuúba, Amapá, Brazil). The present research
focuses on the central role of the understanding of São Miguel do Flexal community‟s
conditions and life experiences, as well as their influence on the alteration or
conservation of the environment, and also on the science education that the local
school has being developing. This study intends to carry out an intense exercise of
reflection about the educational and socioeconomic conditions present in this region,
as well as on the relationship between community and nature, characterized by their
singularities: location and their social, cultural, environmental and economic aspects.
In this sense, it was questioned in which terms the São Miguel do Flexal / Pracuúba /
AP community‟s conditions and shared life experiences have been influencing on the
alteration or conservation of the environment, as well as if the local school has being
teaching science education. The methodological base was the Narrative Research,
carried out through the Discursive Textual Analysis, considering the need to present
a singular and interpretative look at these phenomena that have been happenning in
the place. A set of worries, anxieties and knowledge of the informants‟ perceptions
and my interpretations throughout the history of this population, concerning the need
of natural resources still present in the life of the residentes – taking to the fact that
the absence of public policies of the most diverse orders, the necessity for local
man's survival and the action of external agents in the exploration and trade of what
is taken from nature – contribute decisively to the alteration of the landscape and the
disappearance of species of local fauna and flora. Knowledge of the innate cycles,
plants, animals and natural and supernatural beings, that effectively inhabit the
community, are some of the knowledge present in the daily life of those who live in
this ambience, indispensable to the construction of an environmental pedagogical
proposal, which values traditional knowledge through the teaching of science that the
local school develops.
Key words: Community. Conservation. Environment. Science teaching.
![Page 10: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/10.jpg)
9
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 01 - Mapa esquemático produzido por um morador São Miguel do Flexal 24
Figura 02 - Animal bubalino sendo preparado para o transporte de carga 24
Figura 03 - Três momentos: águas grandes, estiagem e transição 31
Figura 04 - Chegada a Comunidade de São Miguel do Flexal 50
Figura 05 - Visão geral: Escola e Posto de Saúde 52
Figura 06 - Extração de leite e manejo do gado em período de transição 57
Figura 07 - Início da saída: procissão e encontro na praça 61
Figura 08 - Momento de queima de fogos 62
Figura 09 - Espécies típicas da região: frutinheira e andirobeira 68
Figura 10 - Pescaria em período de transição das águas 69
Figura 11 - Período de garças, marrecas e pequenos peixes 70
Figura 12 - Capivara abatida por moradores 71
![Page 11: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/11.jpg)
10
SUMÁRIO
1 CONCEPÇÕES INTRODUTÓRIAS: contextualizando o estudo. ....................... 12
2 IDAS E VINDAS NO PROCESSO CONSTRUTIVO: a trilha metodológica e suas
singularidades. ........................................................................................................ 22
2.1 Área de estudo: descrevendo a comunidade de São Miguel do Flexal .... 22
2.2 Caracterização do processo construtivo ..................................................... 25
2.3 O universo do estudo .................................................................................... 30
2.4 Amostragem: os informantes e suas informações ..................................... 31
2.5 A coleta/construção dos dados: a vez e a voz dos informantes ............... 32
3 AFINAL DE QUE CIÊNCIA ESTAMOS FALANDO?: reflexões sobre o
pensamento científico e o ensino de ciências. ..................................................... 34
3.1 A ciência ocidental e a “necessidade de generalização” ........................... 34
3.2 Saber local: conhecimento complexo, interpretativo e cultural. ............... 40
3.3 Educação ambiental e perspectivas para o ensino de ciências ................ 44
4 APRESENTANDO O CENÁRIO: singularidades e saberes no âmbito
comunitário .............................................................................................................. 50
4.1 Condições de vida: organização social e políticas públicas ..................... 51
4.1.1 O cenário educacional local ...................................................................... 53
4.1.2 Aspectos gerais da saúde local ................................................................. 54
4.1.3 Trabalho .................................................................................................... 56
4.2 Experiências de vida: relações culturais, hábitos e formas de
subsistência. ........................................................................................................ 58
4.2.1 Crenças, festas e suas implicações. ......................................................... 59
4.2.1.1 O arraial de São Francisco ..................................................................... 60
4.2.1.2 A crença inabalável nos dons de cura e no conhecimento dos mais
idosos. ................................................................................................................ 63
4.2.2 Saberes locais e meio ambiente ............................................................... 65
4.2.3 Extrativismo: flora, pesca, caça ................................................................. 68
![Page 12: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/12.jpg)
11
5 CONHECIMENTO CIENTÍFICO E SABERES AMBIENTAIS: representação,
memória e significados para o ensino de ciências .............................................. 73
5.1 Percepções ambientais presentes no cotidiano local ................................ 75
5.1.1 Sobre políticas locais ................................................................................ 79
5.1.2 Sobre alterações ambientais ..................................................................... 82
5.1.3 Sobre a convivência com o meio ambiente ............................................... 85
5.1.4 Sobre Educação Ambiental ....................................................................... 89
5.2 Ordem e desordem no ensino de ciências: a complexidade da Educação
Ambiental ............................................................................................................. 92
5.3 Textos e contextos na construção do conhecimento ambiental ............. 102
6 POSSIBILIDADES PARA O DESENVOLVIMENTO DE PRÁTICAS
PEDAGÓGICAS AMBIENTAIS A PARTIR DO ENSINO DE CIÊNCIAS ............... 110
6.1 Dimensão teórico-epistemológica: porque Educação Ambiental por meio
do Ensino de Ciências? .................................................................................... 111
6.2 Dimensão político-cultural-ambiental: problematização e temas
geradores locais ................................................................................................ 116
6.3 Dimensão pedagógico-escolar: materiais didáticos e conhecimentos
tradicionais ......................................................................................................... 117
6.3.1 Eixo 1 – Ciclos naturais e seus tempos ................................................... 118
6.3.2 Eixo 2 – Relação ser humano-ambiente ................................................. 119
6.3.3 Eixo 3 - Ambiente e desenvolvimento ..................................................... 120
7 REFLEXÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................... 122
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 129
APÊNDICES ........................................................................................................... 135
ANEXO ................................................................................................................... 149
![Page 13: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/13.jpg)
12
1 CONCEPÇÕES INTRODUTÓRIAS: contextualizando o estudo.
Os mitos alimentam nossa alma, são elementos que nos dão força para continuar a viver; são possuidores de forças de esperança, uma forma de lidar com medos e desejos, uma maneira de entendermos a nós mesmos e à nossa realidade [...] (SILVA, 2016, p. 30)
Apresentar e representar aspectos culturais, vivências e experiências
educacionais voltadas para a Educação Ambiental e o Ensino de Ciências
compartilhado no âmbito de tão singular comunidade, Comunidade de São Miguel
do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas,
instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas, mitos e tradições, por certo, é uma
tarefa que exige um olhar atento e diferenciado acerca das atividades humanas e
das relações produzidas a partir deste movimento, caracterizado por conhecimento
profundo da natureza e de sua relação com as condições e experiências de vida
experimentadas nesta localidade.
Adentrar nesse espaço, ser aceito pelos moradores, ter a oportunidade de
conviver intensamente o cotidiano local, com suas regras de conduta, tradições e
formas de ensinar e aprender ciências em contato com o ambiente local me permite
“mergulhar” em um universo cultural genuinamente amazônico, marcado por
saberes, até então, não observados pelo modelo de ciência clássico e sua rigidez
metodológica preocupada em formular e confirmar hipóteses pré-fabricadas que na
maioria das vezes não dão conta dos problemas que se apresentam no movimento e
no dinamismo do cotidiano de cada realidade apresentada.
O processo de imersão no cotidiano da comunidade é algo imprescindível
nessa pesquisa, uma vez que, para entender as mais variadas teias e tramas
produzidas ao longo das relações estabelecidas na localidade, torna-se necessário
estar impregnado dos elementos constituintes dos saberes produzidos e de suas
influências na alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, no ensino de
ciências desenvolvido na escola local.
Diante do cenário apresentado e do senso de ética e responsabilidade mútuo
em relação à comunidade, tenho cada vez mais a convicção de que esta pesquisa
se encontra em um terreno rico em possibilidades de vivências e saberes, não se
![Page 14: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/14.jpg)
13
resumindo somente a relatar fatos e histórias de vida. Enfatizo este ponto, por
considerar que um trabalho construído sob essa ótica necessita estabelecer um
diálogo aberto com as pessoas que fazem parte do cotidiano, e nesta perspectiva,
se entrelaçam atitudes, hábitos, modos de vida, saberes, elementos culturais que
permitem, de acordo com o repertório teórico de cada um, a construção de uma
concepção e de percepções próprias que subvertem e extrapolam a generalização
científica.
Não se pode sentir pelos outros, a experiência, embora seja relacional e
coletiva, produz efeitos nas subjetividades, nas formas como cada indivíduo enxerga
o mundo que o cerca e com ele interage, então o olhar é sempre um olhar de
alguém, a história que se conta está repleta de elementos que fazem parte da vida
de quem a descreve, suas alegrias, tristezas e saberes, que no caso, são muito mais
locais do que universais.
Sempre acreditei que para se construir um trabalho de cunho científico, seria
necessário, primeiramente, a construção de um vasto referencial teórico sobre o
objeto de estudo que se pretende investigar e posteriormente proceder a
transposição deste referencial para o campo de trabalho, como um jogo de encaixe
perfeito, matematizado no sentido mais puro da ciência. Nesse caso, não se
pretende espaço para coisas inesperadas e muito menos para o improviso, pois
levantam-se hipóteses que devem ser confirmadas ou negadas por meio da
experimentação, a qual se sustenta em um equilíbrio metodológico que ao mesmo
tempo em que assegura o sucesso acadêmico, também amordaça o pesquisador a
medida que não permite a vivência, a subjetividade e todas as suas possibilidades
de aprendizagem.
O desejo de conhecer e de aprender com e na comunidade de São Miguel
levaram-me a um processo de (des)construção epistemológica e metodológica, já
que, no momento em que resolvi abraçar esse trabalho, tive a necessidade de
refletir e reelaborar minhas “convicções” acerca da produção do conhecimento
científico, algo que está acontecendo de forma contínua, sem preocupação de ponto
de partida ou de chegada.
Importante esclarecer que não estou desprezando o rigor científico e
metodológico apresentado pela ciência e seus paradigmas, muito menos a
importância de suas contribuições para o conhecimento humano. Apenas, com
fundamento em concepções próprias, vivências e repertório teórico, chego a
![Page 15: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/15.jpg)
14
conclusão de que a maneira como eu entendia e fazia ciência não poderia dar conta
dessa proposta de trabalho, uma vez que, trata-se de pesquisar e trazer para o
mundo acadêmico conhecimentos que se encontram no campo das relações sociais,
políticas, culturais e humanas. Subjetividades que se entrelaçam e que compõem
um mosaico de conhecimentos que só apresentam sentido no cotidiano, no saber
local com todas as suas nuances e peculiaridades.
Meus esquemas de pesquisa, e foram muitos elaborados, não podiam mais
me ajudar no desafio que se apresentava neste novo cenário acadêmico. Ficava
imaginando como “coletar” os dados e posteriormente como apresentar tais dados
para academia. Esta preocupação tornou-se latente por conta de um episódio em
especial, no qual ouvi uma pesquisadora formada em uma instituição de renome
nacional a seguinte afirmativa: “na instituição em que cursei doutorado tem que se
usar a expressão coleta de dados, se não for assim, você já está reprovado”. Este
pressuposto me chamou atenção e aguçou ainda mais a curiosidade e necessidade
de entender outras possibilidades epistemológicas e metodológicas de pesquisa,
principalmente pelo fato de que simplesmente, “coletar dados” não seria o suficiente
para representar toda gama de conhecimentos presentes e em construção na
comunidade pesquisada.
A partir de conversas e leituras indicadas por meu orientador de pesquisa e
de disciplinas cursadas neste programa de doutorado (Educação em Ciências e
Matemática – PPGECEM/REAMEC), em destaque, bases epistemológicas e
pesquisa narrativa, e principalmente por minha convivência junto à comunidade e a
convicção de que o conhecimento compartilhado não é algo estático a ser “coletado”
como frutos em uma árvore devidamente catalogada e classificada dentro dos
padrões científicos, passo a entender a pesquisa como um processo em construção
onde as coisas não são dadas, mas sim construídas nas subjetividades e nas
relações sociais e culturais presentes no cotidiano. Nesse sentido, com a intenção
de melhor entender os conhecimentos presentes no cenário em estudo, me
aproximo da pesquisa narrativa e da própria antropologia, na vertente proposta por
Geertz (2008), tomando emprestado as ideias de Ryle (1949), buscando fazer uma
descrição densa das condições e experiências de vida compartilhadas nessa
localidade da região amazônica e a relação de seu povo com o meio ambiente.
Lembro-me dos primeiros contatos que tive com a comunidade de São
Miguel, que datam da época em que fui professor do Sistema Modular de Ensino
![Page 16: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/16.jpg)
15
(SOME), um projeto da Educação Básica implementado pela Secretaria de Estado
da Educação/AP. Resumidamente, mesmo porque discutir esse projeto não é a
proposta da pesquisa, o SOME funcionava com um calendário escolar diferenciado
permitindo aos professores a convivência por 50 (cinquenta) dias letivos em um
determinado município, o suficiente para o cumprimento das cargas horárias das
disciplinas ofertadas naquele módulo. Tal dinâmica permitia que grupos de
professores estivessem presentes, no mínimo em quatro munícipios durante o ano,
levando-se em consideração o cumprimento de 200 (duzentos) dias de efetivo
trabalho escolar conforme previsto no art. 24, I, da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional. Esse sistema possibilitou condições para que desenvolvesse
minhas atividades docentes em um determinado período, por volta do ano 2000, no
município de Pracuúba, e então, mesmo que de forma atrapalhada, tenho minha
primeira aproximação com o município. Utilizo a expressão atrapalhada pelo fato de
que a experiência docente a qual me refiro, pelo menos do meu ponto de vista, não
foi das mais promissoras, sobretudo para os alunos. Não expresso orgulho quando
abordo esse episódio, na verdade, tenho até vergonha, porém é algo que marca
minha formação enquanto docente e pesquisador e fundamentalmente funcionou
como aprendizado no decorrer de minha carreira. No período em que estive por lá,
ministrei a disciplina filosofia da educação em duas turmas do Ensino Médio (tarde e
noite). A turma da tarde era formada por adolescentes, já a do período noturno, em
sua maioria por trabalhadores rurais que, mesmo com o cansaço diário,
demonstravam entusiasmo em participar das aulas o que não acontecia com os
alunos do período da tarde. Não é difícil profetizar o que aconteceu. Por óbvio, o
discurso que imprimo nesse trecho, permite a dedução de que houve reprovação em
massa na turma vespertina, o que de fato aconteceu.
Refletindo, ao longo de minha formação, penso ter sido um momento crítico,
haja vista, que pude conhecer uma realidade bem diferente do que estava
acostumado, e realmente, não tive a competência e o bom senso para trabalhar as
situações apresentadas, entender o momento, os indivíduos e principalmente o
contexto que estava tendo a oportunidade de vivenciar. Como se fala no dito popular
“não conseguia enxergar um palmo a frente do meu nariz”, aliás, enxergar um palmo
a frente do nariz não é tarefa das mais simples, principalmente dentro de uma
perspectiva interpretativa das relações culturais. Nesse sentido, provavelmente,
algumas coisas consigo enxergar e outras não. O fato é que as lentes que utilizo
![Page 17: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/17.jpg)
16
hoje me permitem lançar outro olhar sobre as relações, e é claro, que tais lentes não
alcançam tudo aquilo que desejo ou que pelo menos necessito. Certo que estou
desse fato, me permito a modificação de lentes. Procuro usar àquelas que me
possibilitem ver o mundo em constante movimento, suas relações, suas tramas,
suas alegrias, suas tristezas, seus dramas e seus saberes.
Uso a metáfora das lentes, visto ser muito apropriada ao tipo de estudo que
estou propondo, voltado para uma coletividade capaz de conviver com o meio
ambiente, conhecedora de seus problemas e que tem muito a contar, compartilhar e
ensinar. As lentes funcionam como um alargador de possibilidades no sentido de me
propiciar uma visão mais acurada das vivências e relações culturais. É claro que
mesmo com as lentes mais potentes, sempre será o meu olhar acerca do observado
e vivenciado, serão minhas impressões e considerações sobre cada episódio, cada
conto, cada história e estória compartilhada no plano comunitário. Em verdade, não
pretendo formular uma teoria geral, mesmo porque seria incoerente com as bases
epistemológicas desse trabalho. O que se pretende, é o entendimento mais rico
possível das complexas relações subjacentes no fazer da comunidade em seus
diversos campos de atuação.
Retornando ao meu contato com o município de Pracuúba, somente volto a
visitá-lo no ano de 2010, por intermédio de minha esposa, que como dizem os
moradores da região “possui o umbigo enterrado na comunidade”. Daí surge a
curiosidade, o interesse em conhecer as formas e condições de vida daquela gente
e sua relação com o ambiente e o ensino de ciências trabalhado na escola de São
Miguel. Meus sentidos se aguçam, principalmente por conta das histórias que passo
a ouvir de moradores antigos e que retratam traços culturais marcantes do convívio
social local.
A partir desse início de convivência, começo a me preocupar com os
problemas enfrentados na e pela comunidade, iniciando um processo de integração,
não para me tornar um nativo local, mas na tentativa de compreender os costumes,
hábitos e formas de relação com a natureza apresentada pelos moradores. Assim,
me proponho a questionar de forma central em que termos as condições e
experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do
Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem
como, o ensino de ciências desenvolvido na escola local? Com a intenção de criar
eixos que norteiem a construção dos objetivos da pesquisa, também questiono
![Page 18: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/18.jpg)
17
subsidiariamente: Que condições e experiências de vida são compartilhadas na
comunidade de São Miguel do Flexal?; Que tipo de relação se estabelece entre
moradores da comunidade e alteração ou conservação do meio ambiente?; Que
ensino de ciências se desenvolve na escola e qual sua relação com práticas
ambientais amparadas no saber local?
As vivências experimentadas nas relações que estabeleço com os moradores
de São Miguel, me permitem sentir, subjetivamente é claro, as angústias, as
alegrias, as tristezas e as motivações que levam a comunidade a se constituir de
maneira particular, única no cenário amazônico. Com base nos sentimentos
expostos, proponho o delineamento da pesquisa a partir de duas ideias principais: a
primeira refere-se ao pressuposto de que as condições e experiências de vida
compartilhadas na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam
diretamente na conservação/alteração do meio ambiente, porém, tendo pouca
expressividade no que concerne ao ensino de ciências desenvolvido na escola local,
dificultando a valorização das vivências, saberes e relações culturais
experimentadas na comunidade, o que provavelmente aconteça pelo fato de a
escola não trabalhar com conteúdos emergentes das relações sociais e culturais do
cotidiano dos alunos; a segunda se sustenta na premissa de que o trabalho
pedagógico desenvolvido pelos professores quando fundamentado em temas
geradores locais (TGL) possibilita maior envolvimento com os saberes da
comunidade, tornando os conteúdos mais significativos para os alunos e suas
famílias, consequentemente permitindo a valorização da cultura local e das práticas
de conservação ambiental.
Abraço a investigação do tipo etnográfica como pressuposto basilar desta
pesquisa, e não poderia ser diferente, uma vez que, o foco do trabalho está nas
relações cotidianas no âmbito da comunidade e da escola, tendo como objetivo
principal compreender em que termos as condições e experiências de vida
compartilhadas na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a
alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o ensino de ciências
desenvolvido na escola local e de maneira específica: Identificar as condições e
experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do Flexal;
Entender a relação estabelecida entre moradores da comunidade e alteração ou
conservação do meio ambiente; analisar o ensino de ciências desenvolvido na
escola e sua relação com práticas ambientais amparadas no saber local; apontar
![Page 19: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/19.jpg)
18
para possibilidades pedagógicas que permitam a valorização dos saberes
tradicionais ambientais por meio do ensino de ciências.
Nesse tempo em que frequento a comunidade, entrei em um processo de
integração, participando de suas festas profanas, religiosas e culturais, além de
envolvimento com o trabalho local, no trato com o gado (bovinos e bubalinos), com a
pesca, caça e com a flora abundante na região. Assim, inicio um processo descritivo,
analítico e envolvente que me proporciona o entendimento das crenças e dos contos
locais, presentes, por exemplo, na soltura dos quelônios (projeto que descrevo
posteriormente) e no arraial de São Francisco (festa católica que reúne a
comunidade de maneira geral), além do que consigo observar e ouvir no cotidiano
dos moradores, frequentando suas casas e o seu campo de trabalho. Posso dizer
que me sinto muito a vontade com as pessoas e suas histórias, e penso que isto foi
determinante para o desenvolvimento dessa investigação, já que pelas relações
estabelecidas, tornou-se implícita uma aceitação de convivência por parte dos
moradores, os quais abrem suas casas e se prontificam a me contar e me mostrar
seus afazeres domésticos e profissionais.
Interpretar os elementos culturais de um povo é uma tarefa que exige
disposição, bom senso, impregnação, envolvimento na vida comunitária em toda sua
extensão. Por este motivo, tenho a preocupação inicial, em ser aceito pela
comunidade, como alguém que mereça a confiança de compartilhar os diversos
saberes construídos ao longo de sua história. É dessa maneira que me situo
enquanto pesquisador, alguém com compromisso ético em descrever, analisar e
apresentar ao mundo acadêmico os saberes produzidos nas praticas de vida
cotidiana de pessoas que não se preocupam em fazer ciência, pelo menos não do
ponto de vista da ciência clássica e de seus paradigmas e hipóteses.
Para efeito de organização e apresentação da pesquisa, buscando a melhor
organização didática das trilhas que descrevo e analiso, proponho capítulos
entrelaçados, ligados por uma perspectiva de um fazer ciência alicerçado na e para
comunidade, uma ciência constituinte e constituída nas relações culturais de um
povo e sua trajetória de vida.
A partir daqui, descrevo inicialmente o percurso metodológico da pesquisa, a
qual se caracteriza por uma abordagem qualitativa em uma perspectiva narrativa,
tendo como parâmetro orientador a análise textual discursiva, visto a necessidade
de compreensão de fenômenos, concepções e fazeres constituídos em âmbito local.
![Page 20: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/20.jpg)
19
Denomino essa parte do trabalho como o processo de “IDAS E VINDAS NO
PROCESSO CONSTRUTIVO: a trilha metodológica e suas singularidades”, pois
são vários os momentos de encontros e desencontros no decorrer da investigação,
levando-me a caminhos até então não previstos no planejamento.
O terceiro ponto que proponho, visa refletir sobre o pensamento científico
ocidental produzindo-se uma análise de seus aspectos históricos e suas
repercussões na ciência contemporânea. Outro item em destaque refere-se a
etnociência como pressuposto de um fazer científico forjado no saber local e em
suas construções culturais e simbólicas no campo comunitário, além de discutir a
Educação Ambiental e suas possibilidades para o ensino de ciências. Assim, intitulo
essa parte da pesquisa indagando “AFINAL DE QUE CIÊNCIA ESTAMOS
FALANDO?: reflexões sobre o pensamento científico e o ensino de ciências”.
Como quarto pressuposto, enfatizo os saberes locais interpretados sob o
prisma das condições e experiências de vida presentes na comunidade de São
Miguel do Flexal, apontando características e peculiaridades das convivências
estabelecidas pelos moradores, em capítulo que configuro como “APRESENTANDO
O CENÁRIO: singularidades e saberes no âmbito comunitário”
O quinto momento “CONHECIMENTO CIENTÍFICO E SABERES
AMBIENTAIS: representação, memória e significados para o ensino de
ciências”, trata das percepções ambientais presentes no cotidiano local a partir de
uma lógica complexa considerando o contexto organizacional em movimento e
observando aspectos políticos, ambientais e sociais. Enfatiza a importância de
professores e alunos se aventurarem em novos caminhos, nem sempre seguros, por
vezes até bastante escorregadios, mas que proporcionam a abertura de novas
trilhas e descobertas no que concerne ao processo dialógico de construção de
conhecimentos ambientais. Por fim, analisa o fazer pedagógico docente e os modos
de entendimento sobre os conhecimentos ambientais já construídos pelos alunos na
vivências experienciadas em nível local.
A parte final da pesquisa “POSSIBILIDADES PARA O DESENVOLVIMENTO
DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS AMBIENTAIS A PARTIR DO ENSINO DE
CIÊNCIAS”, tem a preocupação de apresentar perspectivas pedagógicas para um
fazer educativo ambiental voltado para a comunidade de São Miguel do Flexal,
apontando diretrizes e propostas sustentadas em Temas Geradores Locais, tendo a
intenção de criar condições para o desenvolvimento de um processo educacional
![Page 21: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/21.jpg)
20
condizente com os saberes produzidos na localidade. Os conhecimentos do
cotidiano são colocados em destaque juntamente com os denominados conteúdos
escolares o que se faz por um processo de problematização e reflexão de temas
emergentes das relações sociais, políticas, culturais e ambientais experimentadas
na comunidade.
Os caminhos escolhidos para conduzir essa construção científica
necessitaram de bases teóricas com potencial suficiente para sustentar a análise
das relações investigadas durante a pesquisa, principalmente pelo fato de que
quando se estuda saberes de um determinado povo, nada está pronto e acabado, o
dinamismo com que tudo acontece produz novas formas de entendimento sobre um
fenômeno, redefinindo percepções e ideias que outrora pareciam se encaixar
perfeitamente na proposta inicial, por vezes alterando a própria proposta e
apontando cenários até então desconhecidos por parte deste pesquisador.
Na intenção de subsidiar as reflexões e conclusões contidas nessa produção,
trago para o campo do debate teóricos que julgo essenciais para uma
fundamentação condizente com os saberes compartilhados em São Miguel do
Flexal, dentre os quais destaco Diegues (2000a) desmitificando a ideia de uma
natureza intocada pelo homem, virginal, composta por ecossistemas que devem ser
protegidos da ação humana. Para este autor, o pressuposto de uma natureza
intocada tem servido aos desejos de grupos imperialistas que em geral possuem
interesses econômicos nessas áreas tidas como de proteção ambiental, em especial
no que se refere aos parques nacionais. Alicerçados em uma visão crítica sobre
Educação Ambiental, Layrargues e Lima (2014) defendem o engajamento
político/ambiental do processo educacional, visto que este faz parte de um contexto
onde estão presentes elementos sociais, culturais e ideológicos imbricados nas
subjetividades dos sujeitos. Alinham-se com Freire (1987, 1992, 1996) no sentido de
uma educação emancipadora que parta da leitura de mundo do sujeito em um
intenso jogo de problematização e produção de temas geradores oriundos das
problemáticas locais.
Na esteira do pensamento científico contemporâneo, oportuno o pensamento
de Alves (1990) acerca da ciência como parte da vida, devendo postar-se a serviço
do bem estar das pessoas independente da classe social, gênero ou etnia. Nessa
perspectiva Geertz (2008) ensina que o universo newtoniano não atende as relações
culturais produzidas no âmbito do saber local, pois estas, encontram-se em um
![Page 22: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/22.jpg)
21
terreno que se movimenta no próprio cotidiano dos sujeitos, ensejando a
implementação de uma prática científica mais próxima das realidades mundanas.
Analisando o caráter humano da ciência (Morin, 2005) aponta para o fato de que os
sujeitos singulares se desenvolvem em um mundo social, cultural e eminentemente
complexo à medida que se propõe a superação da fragmentação dos saberes e
reconhece o ser humano como um ser constituído nas relações culturais.
Tratando do saber local e da Educação Ambiental Guarim (2000) enfatiza que
tais saberes fazem parte das vivências culturais e sociais de uma comunidade,
estando inevitavelmente vinculadas as condições e experiências de vida
compartilhadas em cada contexto. Seguindo a mesma linha de raciocínio, Pereira e
Guarim Neto (2009) indicam a necessidade de construção de um processo
educativo que esteja alinhado com os elementos culturais, subjetivos e ambientais.
No que concerne ao ensino de ciências, importante o entendimento do que
Chaves (2003) denomina de condição marginal do professor que atua na Amazônia,
explicando que ser professor no cenário amazônico implica em transgressão as
regras e aos discursos estabelecidos como hegemônicos, sendo portanto,
desobrigado de preservar discursos, abrindo possibilidades de criação de novas
verdades e identidades.
Evidentemente nem todos os teóricos abordados na pesquisa foram utilizados
nesse momento introdutório, o que não significa dizer que sejam menos importantes,
já que cada fundamento anotado possibilitou uma forma de análise e de
entendimento sobre as indagações levantadas, porém, gostaria de encerrar esse
ponto referendado por Chassot (2016) afirmando que existem saberes,
conhecimentos de ordem popular que não podem ser desprezados pela ciência e
muito menos pela escola, pois fazem parte da vida dos sujeitos e propiciam uma
leitura de mundo posicionada a partir dos problemas locais sem perder de vista seu
caráter universal.
![Page 23: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/23.jpg)
22
2 IDAS E VINDAS NO PROCESSO CONSTRUTIVO: a trilha metodológica e suas
singularidades.
[...] o visível não é a base do dizível, mas o inverso. Não é, portanto, o olho que nos faz dizer o que vemos, mas o que é dito, repetido e reeditado continuamente que nos faz ver de determinado modo. (CHAVES, 2016, p. 218)
Antes de avançar em meus escritos, e para que se tenha noção de onde
estou falando, considero importante fazer uma descrição de onde a comunidade de
São Miguel do Flexal está situada e com base nessas reflexões apresentar a
proposta metodológica da pesquisa, a qual se fundamenta na Pesquisa Narrativa,
impulsionada por meio da Análise Textual Discursiva, por este motivo, esse item foi
dividido em cinco eixos norteadores: descrição da comunidade, caracterização do
processo construtivo, o universo do estudo, amostragem: os informantes e suas
informações e coleta/construção dos dados: a vez e a voz dos informantes.
2.1 Área de estudo: descrevendo a comunidade de São Miguel do Flexal
O olhar que lanço sobre a comunidade encontra ressonância em suas
riquezas naturais e ecológicas, bem como, nas paisagens que se apresentam todos
os dias em que tenho convivido com os moradores locais, porém, não posso deixar
de relatar que tais riquezas e belezas, também, vêm acompanhadas de graves
problemas sociais, econômicos e ambientais que se intensificam pela ausência de
políticas públicas que oportunizem aos moradores estabelecerem condições para
uma relação equilibrada com o meio em que vivem.
São Miguel do Flexal faz parte de um cenário denominado pela população
local de “Região dos Lagos do Amapá”, também conhecido como “Campos
Inundáveis do Amapá”, considerando uma de suas principais características de
ordem natural, qual seja, no período de estiagem – aproximadamente entre os
meses de setembro a novembro - formam-se campos com pastagens exuberantes,
estabelecendo formas de locomoção e convívio adaptados as condições climáticas,
já no período chuvoso – aproximadamente entre os meses de janeiro a maio -, a
![Page 24: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/24.jpg)
23
paisagem se transforma em campos inundáveis, exigindo dos moradores novas
formas de convívio e sobrevivência. Interessante registrar que entre os dois períodos
narrados, existe o que se pode denominar de transição – localizado entre a estiagem
e o período chuvoso e entre as chuvas e estiagem -. Tendo em vista as
peculiaridades presentes na localidade, torna-se evidente que a maneira como a
natureza se organiza, dita o ritmo das relações entre os indivíduos e o meio
ambiente em suas diversas dimensões.
Na interpretação de Mendonça (1983, p.6) a denominação de Região dos
Lagos surgiu “[...] devido à imensidade e aglutinação de lagos, lagoas, rios, igarapés
além de uma vasta extensão de campos naturais sujeitos às inundações periódicas,
além de pequenas ilhas e tesos que ficam menos sujeitos às águas no período
chuvoso”. Conhecendo o local, posso afirmar que a Comunidade de São Miguel
situa-se no coração onde esse fenômeno acontece, podendo, tomando como
referência qualquer ponto, o ciclo ser observado com clareza em cada uma de suas
especificidades.
São Miguel é um componente do município de Pracuúba, juntamente com as
comunidades de Breu, Flexal, Cujubim e Pernambuco, cada uma delas
apresentando características distintas quanto aos aspectos geográficos, sociais e
culturais. Por uma questão metodológica, descrevo apenas os elementos de
interesse dessa pesquisa, no caso, os que dizem respeito à localidade de são
Miguel do Flexal.
Quanto a sua localização, encontra-se na porção leste do município de
Pracuúba e dista da sede aproximadamente 8 km, estando a margem esquerda do
rio Maringá, tributário da margem direita do rio Flexal (figura1). No período chuvoso
a locomoção é feita por meio de embarcações motorizadas ou não: voadeira
(embarcação não fabricada na comunidade, movida a motor de popa, muito utilizada
por indivíduos com maior poder aquisitivo, visto o alto consumo de combustível),
montaria/canoa (é o tipo mais comum de embarcação utilizada na comunidade,
geralmente impulsionada por remo ou varejão, nesse caso a energia é gerada pela
força física do sujeito que com suas habilidades controla a direção da embarcação),
batelão (embarcação semelhante a anterior, porém dotada de maior porte, uma vez
que está destinada ao transporte de carga).
![Page 25: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/25.jpg)
24
Figura 1 – Mapa esquemático produzido por um morador (São Miguel do Flexal)
Fonte: Acervo do pesquisador – 2017
Na estiagem, com a mudança do cenário, as formas de locomoção ganham
outros contornos, sendo possível, nos dias atuais, a entrada de automóveis,
motocicletas e bicicletas que passam a circular no local, porém, a comunidade, em
sua maioria, utiliza principalmente animais de montaria: boi-cavalo (búfalos e
bovinos) e cavalos que passam a se configurar como os principais meios de
transporte. No período de transição, a forma de locomoção mais utilizada pelos
moradores é o búfalo (figura 2), já que sua adaptação em áreas inundáveis é muito
mais fácil, levando-se em conta sua rusticidade e suas múltiplas utilidades, servindo
de montaria, tração e transporte de materiais.
Figura 2 - Animal bubalino sendo preparado para o transporte de carga
Fonte: Acervo do pesquisador - 2016
![Page 26: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/26.jpg)
25
As principais formas de trabalho são voltadas para a subsistência familiar,
explorando a pesca, caça de animais de pequeno porte (capivaras, cutias,
marrecas...), pecuária bovina e principalmente bubalina, animal introduzido na
região, segundo dizem os moradores, por volta dos anos de 1940. A pecuária
permite a exploração de carne e de leite, favorecendo a produção de coalhada, doce
de leite, queijo e manteiga, alimentos, ao lado do pescado e da caça, quase sempre
presentes nas refeições diárias dessa população. Outro alimento bastante
consumido, não diferente de outras regiões da Amazônia, é a farinha de mandioca,
utilizada como acompanhamento em todos os pratos servidos.
O Arraial de São Francisco de Assis é a principal festa existente na
comunidade, acontecendo durante o mês de novembro, atualmente com duração de
quatro dias. Em outras épocas, segundo relatos de moradores, o arraial durava
treze noites, iniciando no período de lua para facilitar o deslocamento dos fieis. Por
três vezes tive a oportunidade de participar das festividades e pude observar que a
programação se divide basicamente em dois eixos: religiosidade delineada por
orações, louvores, novenas e procissão e a parte profana regada a bingos, leilões,
fogos e corrida a cavalo.
Nesse ponto fica evidente que poderia continuar abordando as diversas
características e singularidades da comunidade, porém, são muitos os caminhos que
necessito percorrer para interpretar narrativamente os saberes que se apresentam,
por esse motivo trouxe nesse item, apenas uma pequena amostra do que posso
chamar de descrição da comunidade de São Miguel do Flexal. Esclareço que não
tive a pretensão de dar “números finais” ao processo, em verdade, a intenção foi no
sentido de oferecer uma visão contextual do ambiente em investigação,
vislumbrando a possibilidade que prosseguir a pesquisa, não de maneira segura,
mas com reais possibilidades de produzir as conexões necessárias para o alcance
dos objetivos propostos.
2.2 Caracterização do processo construtivo
Entender a relação entre o morador local e a conservação do meio ambiente,
parece ser o grande desafio de qualquer proposta de pesquisa com essa natureza
ecológica e humana, e esta não é diferente, consciente que sou da necessidade de
![Page 27: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/27.jpg)
26
observar, ouvir, aprender e interpretar o conhecimento latente em cada fala,
símbolo, desejo e traço cultural expressado pelos moradores de São Miguel, em
especial, no que diz respeito ao ensino de ciências desenvolvido na escola local.
Recentemente ouvi dizer que sou apaixonado pelo local da pesquisa, realmente
parece ser verdade, mas não seria essa a função do pesquisador em relação ao seu
objeto de estudo? Como poderia estudar de forma empolgante e aprofundada algo
que não me despertasse paixão? Afirmo que sou apaixonado pela comunidade,
porém, esta paixão não me proíbe o olhar crítico que proponho em relação às
mazelas sofridas no contexto local, pelo contrário, me fazem querer maior
compreensão e quem sabe contribuir de forma efetiva para o desenvolvimento da
região, aliás, penso ser este um dos pilares dessa produção, tendo em vista a
possibilidade não só de colher, mas de compartilhar conhecimentos e contribuir para
a melhoria das condições de vida presentes no cenário investigado.
Para atingir o propósito almejado parto da convicção de que o conhecimento
é dinâmico, mutável e completamente dependente do dia a dia de quem o faz ser
como é, pois “toda compreensão é pontual, parcial, provisória, lacunar e inacabada,
assim como todo método e toda pesquisa” (KNOBBE, 2016, p. 59).
Corroborando com essa ideia e em defesa de um pensamento científico pós-
moderno emancipatório de oposição, o qual deve começar pela crítica do
conhecimento, Santos (2002) considera necessário subverter a lógica de isolamento
em busca de uma ciência contextualizada, politicamente engajada e responsável
afirmando que:
A teoria crítica pós – moderna parte do pressuposto de que o conhecimento é sempre contextualizado pelas condições que o tornam possível e de que ele só progride na medida em que transforma em sentido progressista essas condições. Por isso o conhecimento-emancipação conquista-se assumindo as consequências de seu impacto. (SANTOS, 2002, p. 32)
Nessa pesquisa, por se tratar de um trabalho eminentemente de cunho
qualitativo e contextual, com base em categorias emergentes, a tarefa de interpretar
e organizar lucidamente as composições de falas, imagens, gestos, documentos,
experiências e vivências, tornou-se algo, em certos momentos, insano, levando-me
a viagens que ao invés de apontar caminhos conhecidos, forneciam-me
instrumentos imprecisos, mas que de algum modo, permitiram chegar a pontos,
ainda que provisórios, de entendimento sobre a trama envolvendo as práticas
![Page 28: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/28.jpg)
27
ambientais e o ensino de ciências desenvolvido na comunidade. Referenciando o
argumento construído, Alves (2016, p.110) explica que:
O que define a pesquisa qualitativa não são os instrumentos utilizados, mas os múltiplos processos envolvidos na produção de conhecimentos. Por ser um objeto complexo, a subjetividade não aparece de forma direta perante o observador. Ele precisa construir seus processos e formas de organização a partir de variadas formas de expressão. Enquanto sistema, a subjetividade não pode ser captada por procedimentos metodológicos que operam por meio da definição, do controle e da manipulação de variáveis. Os casos singulares são valorizados por sua contribuição ao modelo teórico em construção e não pela identificação de regularidades que comprovem teorias já estabelecidas.
Os variados desencontros nas leituras e informações conduziram-me por
vezes ao que muitos poderiam considerar, como se diz na linguagem popular, “um
beco sem saída”, sem a famosa “luz”, que tantos buscam para efetivarem seus
trabalhos. “Estou precisando de uma luz, cheguei a um ponto que não consigo
avançar”, disse um amigo em relação a sua pesquisa. Por várias vezes também ouvi
tal expressão de meus alunos da graduação, mas confesso que nunca dei a
importância devida, talvez pelo fato de poucas vezes ter ficado sem a tal “luz
solucionadora dos problemas acadêmicos”. Pois bem, descobri que chegar a esse
ponto não é algo ruim, em verdade significa envolvimento com o objeto de estudo,
imersão no que se está fazendo, é colocar-se na posição de quem busca o
entendimento impulsionado pela curiosidade científica.
A almejada luz não é um prêmio que se encontra no fim de um túnel, como uma
recompensa, é sim, antes de tudo, um ato de reflexão que exige desencontros,
contradições e subversões, em uma trilha que não está predeterminada por uma
lógica determinista. O fazer científico, pelo menos como estou entendendo nessa
construção, amparado nas ideias de Santos (2002) configura-se como um ato de
rebeldia, de não aceitação da realidade como simplesmente é, o que efetivamente
promove uma ruptura com o pensamento simplista difundido pela ciência moderna
na medida em que abre caminhos para a compreensão de elementos qualitativos da
complexidade das relações sociais, levando a um processo de consciência ética,
social e política por parte do pesquisador.
Para ilustrar o que estou tentando justificar em relação ao tipo de pesquisa que
estou propondo nesse trabalho, Pesquisa Narrativa por meio da Análise Textual
Discursiva em um contexto de cunho Etnográfico, gostaria de apresentar um trecho
da obra “Palomar” de Ítalo Calvino, por considerar a força poética com que o autor
![Page 29: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/29.jpg)
28
trata o assunto, sem perder de vista a mensagem que imagino desejar passar ao
leitor. Eis o trecho em destaque:
A casa dos queijos representa para Palomar o mesmo que uma enciclopédia para um autodidacta; poderia memorizar todos os nomes, tentar uma classificação de acordo com as formas – forma de sabonete, de cilindro, de cúpula, de bola – de acordo com a consistência – seco, amanteigado, cremoso, sem estratos, compacto – de acordo com as matérias estranhas misturadas com a casca ou com a pasta – pasta, pimenta, nozes, gergelim, ervas, bolores – mas isso não o aproximaria um só passo do verdadeiro conhecimento, que reside na experiência dos sabores, feita de memória e de imaginação em conjunto, e só na base dessa experiência poderia estabelecer uma escala de gostos e preferências e curiosidades e exclusões”. (CALVINO, 2004, p. 43)
A curiosidade e a necessidade de envolvimento com o objeto de estudo por
meio da experiência, das vivências em comunidade, construindo dados e não
simplesmente coletando, permitem um movimento de imersão na vida cotidiana dos
envolvidos, nos seus mitos, no trato com o meio ambiente, nas manifestações
culturais, visto que “o objeto do conhecimento não é o mundo, mas a comunidade
nós-mundo, porque o nosso mundo faz parte de nossa visão do mundo, que faz
parte do nosso mundo” (MORIN, 2005, p. 205).
Reconhecendo a perspectiva de construção de dados no próprio contexto
onde a investigação é efetivada, faço a opção por uma abordagem qualitativa, já que
permite, “[...] em maior grau e profundidade, a interpretação das particularidades dos
comportamentos ou atitudes dos indivíduos” (OLIVEIRA, 2004, p. 117).
O procedimento utilizado na investigação obedeceu aos pressupostos do
estudo de caso que se sustenta na “análise aprofundada e exaustiva de um objeto
de pesquisa restrito de modo a possibilitar seu amplo e detalhado conhecimento”
(MOROZ; GLANFALDONI, 2002, p.45). Dessa maneira, tornou-se possível apontar
aspectos singulares de uma comunidade, da educação produzida em seu contexto e
de uma escola com características particulares, favorecendo uma análise a partir de
questões de ampla dimensão no que se refere às condições e modos de vida
presentes no lugar investigado.
O enfoque Narrativo que proponho não me permite a tranquilidade da
segurança metodológica, pois trabalho com categorias que emergem no decorrer da
pesquisa, traçando caminhos não previstos no planejamento inicial. Dessa maneira,
alerto que a Pesquisa Narrativa não é uma simples narração de fatos, busca,
essencialmente, a produção de textos originais, instituídos no próprio contexto, não
se confundindo com o gênero literário narrativo, pois o propósito é a organização
![Page 30: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/30.jpg)
29
das diversas bifurcações presentes em falas, imagens, gestos, documentos, dentro
de um caldeirão contextual (CLANDININ; CONELLY, 2011)
Considero muito ilustrativo o pensamento de Morin (2005) em relação ao
método, ou melhor, seu discurso a procura de um método que no seu entendimento
não se apresenta de forma simples, pois está imbricado na complexidade. Diz o
autor:
Ao contrário de Descartes, que partia de um princípio de verdade, ou seja, que identificava a verdade com as ideias claras e distintas, e por isso podia propor um discurso do método em poucas páginas, eu faço um discurso muito longo à procura de um método que não se revela por nenhuma evidência primária e que deve ser elaborado com esforço e risco. A missão desse método não é fornecer as fórmulas programáticas de um pensamento “são”. É convidar a pensar-se na complexidade. (MORIN, 2005, p. 140)
Por tudo que foi exposto, obviamente não poderia analisar os dados de
maneira simplificada, sem a profundidade necessária a produção de textos com
potencial para explicar os saberes ambientais produzidos na comunidade, por este
motivo a Análise Textual Discursiva é adotada como parâmetro de análise de dados,
visto que suas proposições favorecem a construção de um olhar singular e
interpretativo sobre as relações vividas na localidade.
Por meio do processo de unitarização foi possível fragmentar as informações
em unidades de significados, sendo possível a partir desse movimento, criar
categorias/eixos com amplitude e força suficiente para direcionar o trabalho até a
construção de argumentos constitutivos do texto final apresentado (MORAES, 2003).
Vale ressaltar, que não tive a pretensão de estabelecer “a verdade” sobre o
processo de Educação Ambiental e o Ensino de Ciências desenvolvido em São
Miguel, o que desejei foi analisar e apresentar uma das possíveis interpretações
concernentes ao tema abordado, propósito que penso ter alcançado ao longo das
narrativas construídas.
Os pressupostos metodológicos adotados buscam familiaridade com o que
Santos (2008, p. 85) entende como “paradigma emergente”, na medida em que se
utilizam de conhecimentos não categorizados previamente, saberes que estão em
constante processo de mutação, pois se fazem nas experiências diárias de uma
comunidade amazônica. Nesse ponto, o pesquisador encontra-se completamente
envolvido com as tramas presentes na investigação, imprimindo em seu trabalho
investigativo, valores, elementos culturais e sociais, visões de mundo que fazem
![Page 31: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/31.jpg)
30
parte da sua biografia e que inevitavelmente entrarão no jogo construtivo do fazer
científico, uma vez que:
[...] nossas trajectórias de vida pessoais e coletivas (enquanto comunidades científicas) e os valores, as crenças e os prejuízos que transportam são a prova íntima do nosso conhecimento, sem o qual as nossas investigações laboratoriais ou de arquivo, os nossos cálculos ou os nossos trabalhos de campo constituiriam um emaranhado de diligências absurdas sem fio nem pavio. (SANTOS, 2008, p. 85)
A premissa enunciada pelo autor coloca o pesquisador no âmago do cenário
estudado, promovendo o deslocamento da relação entre este e objeto de estudo,
que passam a fazer parte de um jogo em que a regra principal deixa de ser
fragmentação, isolamento e objetividade, assumindo-se um paradigma em que as
relações são marcadas por historicidade, temporalidade e subjetividades construídas
nas vivências dos sujeitos partícipes da construção científica.
2.3 O universo do estudo
A pesquisa teve como lócus de investigação a compreensão das condições e
experiências de vida compartilhadas na comunidade e suas influências na alteração
ou conservação do meio ambiente, bem como, no ensino de ciências desenvolvido
na escola local. Buscou-se realizar um intenso exercício de reflexão sobre as
condições educacionais e socioeconômicas experimentadas nessa região, assim
como, da relação comunidade/natureza, caracterizada por singularidades, visto sua
localização e seus aspectos sociais, culturais, ambientais e econômicos.
O Município de Pracuúba faz parte do universo de 16 Municípios do Estado
do Amapá, localizado na parte Nordeste do Estado a cerca de 280 km da Capital
Macapá, com uma população aproximada de 5.000 habitantes. A população é
atendida por 12 Unidades Escolares (Municipais e Estaduais), distribuídas nas 06
principais Comunidades, entre elas a de São Miguel do Flexal, distante a 8 km da
sede Municipal. A região possui uma sazonalidade climática, que define o período
chuvoso e o de estiagem, cujas fases de transição dificultam o acesso dos alunos à
escola. O acesso dos alunos é uma história que merece certo destaque, pois no
período chuvoso o transporte escolar é feito por voadeira contratada pela própria
escola, sendo realizado sem maiores problemas, já na estiagem os alunos seguem
de montaria, bicicleta ou a pé, nesse caso acompanhados por um tutor que se
encarrega de guiar os alunos até a instituição. A situação fica difícil mesmo, no
![Page 32: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/32.jpg)
31
período de transição, visto não ter água suficiente para as embarcações deslizarem
e também por conta da ausência de terra firme que permita a caminhada com
tranquilidade, posto que nessa época é muito comum a formação de “valas” e de
trechos de pequenos lagos que cortam os campos (figura 3), sendo estes, povoados
por arraias, poraquês e até mesmo jacarés que por vezes ocasionam acidentes.
Figura 3 – Três momentos: águas grandes, estiagem e transição
Fonte: Acervo do pesquisador - 2016
A Escola da comunidade foi fundada há mais de 60 anos, desde então vem
formando alunos, filhos de produtores rurais e de vaqueiros que atuam nas áreas de
fazenda principalmente na criação de gado de corte. Dadas as características
ambientais da região, as famílias residem em áreas dispersas, em virtude das
diferentes atividades desenvolvidas (pecuária, extrativismo e agricultura familiar). A
Escola oferta o primeiro segmento do Ensino Fundamental, conta com 22 alunos
matriculados, distribuídos em 05 turmas, que funcionam no turno matutino e
vespertino, possui um quadro docente constituído por 03 professores formados em
nível superior, que adotam o sistema multisseriado, tendo em sua Equipe Gestora
um Diretor, um Coordenador Pedagógico e Pessoal de Apoio.
2.4 Amostragem: os informantes e suas informações
A amostra utilizada foi definida de maneira não-probabilística, o que de
acordo com Silva e Silveira (2007, p.161) se configura como “processo informal de
seleção”. Os atores escolhidos apresentaram características que se entrelaçaram
com o proposto na pesquisa facilitando o entendimento das ações aplicadas no
contexto das instituições e famílias investigadas. O critério utilizado para a definição
![Page 33: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/33.jpg)
32
do corpus do trabalho foi o de saturação, sendo alcançada, segundo o entendimento
de Moraes (2003, p. 194) “quando a introdução de novas informações nos produtos
de análise já não produz modificações nos resultados anteriormente atingidos”.
A partir das características apresentadas pelos informantes e suas
informações, tornou-se possível constituir um material com densidade suficiente
para produzir um processo de análise condizente com a importância da temática. As
informações foram fragmentadas em unidades de análise e em seguida organizadas
em categorias que passaram a figurar como eixos norteadores dos capítulos
apresentados nesse texto.
Em coerência com o critério amostral adotado, se dispuseram a participar
diretamente da pesquisa: 12 moradores da comunidade (indivíduos não estudantes
e não servidores da escola), diretora da escola, três professores e alunos. Todos os
informantes concordaram em relatar suas impressões sobre meio ambiente,
Educação Ambiental e o Ensino de Ciências desenvolvido dentro e fora do contexto
escolar.
2.5 A coleta/construção dos dados: a vez e a voz dos informantes
A primeira fase foi constituída de leitura de parte do referencial escrito a
respeito do assunto abordado, sendo possível, a partir das leituras iniciar um
processo de reflexão acerca das bases epistemológicas norteadoras da
investigação. O propósito desse procedimento foi o de permitir a construção de um
referencial teórico com capacidade para apontar possíveis rotas para o
prosseguimento do estudo, visto tratar-se de temática complexa e principalmente por
estar voltada para a interpretação de saberes presentes em uma comunidade
amazônica, dotada de traços culturais e práticas que fazem parte de uma realidade
singular.
O segundo momento teve como foco a pesquisa de campo onde foram
observadas e analisadas as condições e experiências de vida presentes no cotidiano
local, assim como, as práticas ambientais e pedagógicas desenvolvidas na escola e
na comunidade, além de entrevistas semiestruturadas com os atores envolvidos na
pesquisa. Para Silva e Silveira (2007, p.158) a entrevista semiestruturada consiste
em “perguntas abertas, feitas oralmente em ordem prévia, mas na qual o
entrevistador pode acrescentar questões de esclarecimento ou instigar respostas do
![Page 34: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/34.jpg)
33
entrevistado”, levando a uma maior interação e empatia entre entrevistador e
entrevistado. Na utilização dessa ferramenta, muitas questões foram levantadas
além do que estava previsto no roteiro, visto que, durante o procedimento os
entrevistados se dispunham a abordar assuntos que não estavam previstos na base
da pesquisa, mas que evidentemente foram importantes para analisar as questões
levantadas.
A fim de melhor entender o fenômeno, também foram utilizados como
instrumentos de investigação a história ou relato de vida, o que se fez por meio de
conversas abertas com os participantes, optando-se pela informalidade, pois, neste
tipo de investigação o que se busca são informações contidas na vida pessoal dos
envolvidos, podendo ser um relato autobiográfico expondo reflexões e experiências
ou de maneira literária tradicional por meio de memórias ou relatos de experiências
vividas (CHIZOTTI, 2001). Essa ferramenta merece destaque especial, considerando
que possibilitou maior proximidade e intimidade com os participantes, tornando
possível estabelecer uma relação de confiança propícia a busca de informações
relevantes ao propósito do trabalho.
As informações obtidas tiveram tratamento fundamentado na Análise Textual
Discursiva, foram unitarizadas, categorizadas e devidamente organizadas levando-
se em consideração o contexto local, os pressupostos teóricos e as experiências
vivenciadas ao longo da pesquisa, possibilitando a construção de um documento
fundamentado em práticas e teorias entrelaçadas de forma indissociável com os
saberes ambientais produzidos nessa parte da Amazônia, conhecida por suas
belezas naturais, por sua forma de convívio com a natureza e por outro lado, de
maneira aviltante, também caracterizada por graves problemas no que se refere a
garantia dos constitucionalmente denominados Direitos Sociais: educação, saúde,
alimentação, trabalho e outros não menos importantes para que se possa ter acesso
a condições de vida mais condizentes com a dignidade do povo convivente nesse
espaço amazônico.
![Page 35: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/35.jpg)
34
3 AFINAL DE QUE CIÊNCIA ESTAMOS FALANDO?: reflexões sobre o
pensamento científico e o ensino de ciências.
Felizmente a ciência é destituída de preconceito”: este é mais um preconceito. Não foi Galileu só que sofreu nas garras da inquisição. Também as comunidades científicas possuem suas inquisições, com outros nomes, (ALVES, 1990, p. 119)
Para apresentar o assunto, ou pelo menos refletir sobre ele de maneira
densa, há necessidade de mergulhar nos condicionantes históricos que fazem a
ciência se apresentar desta ou daquela maneira, buscando entender os
pressupostos que embasam o pensamento científico contemporâneo e em seguida
compará-lo e analisá-lo a partir de outros fundamentos epistemológicos e
metodológicos, e obviamente de outras formas de compreender o conhecimento.
Com base nessa premissa, proponho neste capítulo, uma análise histórica da
ciência como fundamento do pensamento ocidental e em seguida apresento o saber
local em uma perspectiva etnocientífica, abordando a cultura como aspecto basilar
das construções sociais e simbólicas de uma comunidade. Por fim, discuto a
educação ambiental e suas possibilidades para o ensino de ciências, recordando e
narrando memórias de minha atuação enquanto aluno, pedagogo e professor
universitário.
3.1 A ciência ocidental e a “necessidade de generalização”
O conhecimento científico tem por séculos impulsionado a evolução humana
e seus modos de vida e produção, bem como, avanços tecnológicos que favorecem
nossa existência, capacidade de adaptação e controle do ambiente natural ao qual
vivemos, mas que também, sustentam a guerra e a própria degradação da espécie,
fenômeno, no mínimo, contraditório em suas perspectivas e objetivos aparentes. O
fato é que o ato de conhecer ganha contornos diferenciados quando a proposta é
trabalhar com a ciência, pelo menos da maneira como esta é apresentada em geral
pelo mundo acadêmico. Em contraposição ao que denomino de visão menos
amordaçada de ciência, Santos (2012, p, 67.) afirma que a “logicidade da ciência
![Page 36: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/36.jpg)
35
reside na observação racional e sistemática e no controle dos fatos, nas suas
experimentação e explicação metódica, ou seja, consiste nos procedimentos e
exercícios intelectuais do cientista”.
A afirmativa colocada pelo autor é intrigante e perturbadora do ponto de vista
da vivência científica e dos múltiplos conhecimentos existentes e das incontáveis
possibilidades de pesquisa. Quem definiu o modo certo e o errado de fazer ciência e
de pensar cientificamente? Qual conhecimento vale a pena ser investigado?
Frequentemente considerada a soberana do conhecimento válido, ela, “a
ciência” estabelece a linguagem adequada para que um conhecimento receba a
credibilidade acadêmica, diz quais os métodos adequados para coletar dados e
entender determinados fenômenos, descreve as regras de organização e análise,
assim como, a apresentação dos resultados, porém, questiono-me se realmente
existe um “método científico” que tenha potencial para entender e descrever
experiências das diversas realidades e subjetividades? Propondo uma reflexão
crítica acerca da ideia de um paradigma dominante, Santos (2008, p. 30-31) lembra
que a ciência moderna enquanto “[...] conhecimento baseado na formulação de leis
tem como pressuposto metateórico a ideia de ordem e de estabilidade do mundo, a
ideia de que o passado se repete no futuro [...]”, desconsiderando, portanto, o
processo histórico, cultural, social e temporal que se encontra na base das
produções humanas.
Penso que a diversidade de cotidianos e de culturas inviabilizam a utilização
de uma linguagem única, universal, neste sentido, mais adequado falar em
linguagens e em ciências, neste caso no plural, pois não existe uma única, então me
posiciono em favor de uma ciência do cotidiano, fundamentada em conhecimentos
locais, sem a pretensão de generalização, visto não ser este seu objetivo.
Silva (2016, p. 18) introduzindo uma discussão sobre “o mito da sociedade
moderna” afirma ter sido,
[...] sobretudo, a partir do século 17, com o nascimento das ciências modernas, quando uma parte do mundo ocidental passa a ser regido pelo pensamento científico e pela racionalização, que os mitos foram sendo desclassificados e entendidos como sinônimo de ilusão, superstições e crença do passado. A partir daí, a ciência acreditou que o mundo só poderia ser compreendido por meio dos mecanismos da razão. As narrativas míticas vão sendo deixadas de lado, pois na mente de um homem racional não deveria existir lugar para essas divagações „sem lógica‟. Esse pecado original que „impedia‟ o uso da racionalidade deveria ser expurgado para que triunfasse a razão.
![Page 37: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/37.jpg)
36
Em busca de demonstrar a pluralidade de conhecimentos construídos pelo
homem em suas relações sociais e culturais Tréz (2011) amparado em Brayboy e
Castagno faz uma comparação entre o que convencionou de ciência ocidental e o
que denominou de ciência indígena apontando que a ciência ocidental se caracteriza
por conhecimento obtido por observação, realidade material, separação sujeito-
objeto, busca de universalidade para o conhecimento, formula categorias e se
fundamenta na razão instrumental enquanto que a ciência indígena se apresenta por
conhecimentos obtidos não somente pela observação, realidade misteriosa e
conectada ao espiritual, ausência de categorias, busca aplicação local para o
conhecimento, visão holística e interconectada sendo sustentada por uma razão que
se fundamenta no mistério e na sobrevivência.
Por certo a visão cartesiana de conhecimento, influenciou e ainda influencia
as formas com que conhecemos o mundo e os instrumentos que utilizamos para
organizá-lo em nossas mentes. Contudo, influenciado por cada leitura que faço,
cada vivência que experimento nas relações cotidianas, me convenço que pensar e
fazer ciência dentro de uma lógica puramente racional e instrumental é ficar atrelado
a uma realidade absurdamente laboratorial e experimental em nome de um método
científico, o qual estou convicto de não dar conta das formas de viver e conviver dos
seres humanos em seus ambientes locais. Com esse pensamento assumo uma
tendência voltada aos estudos culturais, concordando com Souza Torres (2017, p.
36) no sentido de que:
“[...] essa perspectiva teórica tira-nos da zona de conforto teórico-metodológica produzida pela racionalidade técnico-científica que caracterizou a modernidade. Isso porque os estudos culturais não admitem falar em certezas, em estabilidades e muito menos em significado único para as palavras, não admitindo também supor a existência de fronteiras rígidas que justificam binarismos [...]
Trabalhar com as vivências e necessidades locais da humanidade exige por
parte do cientista, desprendimento teórico e metodológico, há necessidade de estar
livre das amarras impostas pelo modelo de ciência academicista. Alves (1990, p. 11)
refletindo sobre a ciência e os cientistas alerta que este, o cientista:
Virou um mito. E todo mito é perigoso, porque ele induz o comportamento e inibe o pensamento. Este é um dos resultados engraçados (e trágicos) da ciência. Se existe uma classe especializada em pensar de maneira correta (os cientistas), os outros indivíduos são liberados da obrigação de pensar e
podem simplesmente fazer o que os cientistas mandam.
![Page 38: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/38.jpg)
37
Continua sua ideia dizendo que a “ciência é uma função da vida. Justifica-se
apenas enquanto órgão adequado à nossa sobrevivência. Uma ciência que se
divorciou da vida perdeu sua legitimação”. ( ALVES, 1990, p. 37)
O ato de pensar cientificamente tornou-se tarefa de poucos e para poucos, os
cientistas, que diferentemente dos “homens comuns”, dominam as teorias, os
métodos e as técnicas de pesquisa “válidas”, tornaram-se os “donos da ciência”,
pois supostamente estariam incumbidos da tarefa de pensar corretamente dentro
dos padrões definidos como ciência. O conhecimento válido passa a ser o que os
cientistas afirmam ter validade. Ao “homem comum” sobram tarefas não científicas,
pois segundo a lógica academicista, este não estaria habilitado ao ato de pensar e
agir cientificamente. Na análise de Souza Torres (2017, p. 40) “a natureza
gnosiológica da ciência, deslocada de sua dimensão ontológica, deu a ela um
estatuto de legitimidade e de hegemonia em relação a outras formas de
conhecimento (filosófico, artístico, religioso, narrativos)”, afirma ainda que tal
paradigma teve como sustentação três rupturas: “passado-presente; logos-mito; ser
humano-natureza”.
Valendo-me desse raciocínio, proponho um exercício de reflexão: afinal o que
diferencia o cientista do “homem comum”? Que características apresentam essas
duas “espécies de seres humanos”?
Creio que as questões propostas levam à construção de um diálogo, que se
não esclarecem definitivamente a discussão, e logicamente não é esta a pretensão
neste trabalho, pelo menos permitem refletir sobre seu objeto, considerando que
pensar e fazer ciência são atividades eminentemente humanas exigindo processos
mentais complexos e não simplesmente programados geneticamente, como outros
animais naturalmente e instintivamente o fazem.
Para melhor ilustrar o tema, tomo emprestadas as ideias de Geertz (2008)
fazendo uma crítica à visão iluminista de homem. Para estes, havia uma natureza
humana imutável, perfeitamente organizada e simples conforme o universo
newtoniano. Dentre outros, o grande problema da perspectiva iluminista reside no
fato de que tal visão desconsidera o tempo, espaço e as relações culturais em que o
homem está inserido, em nome de uma natureza universal, solidificada por uma
essência sobre-humana, para além das relações cotidianas, tornando mais simples
o processo de quantificação, matematização da ciência em detrimento de elementos
![Page 39: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/39.jpg)
38
qualificadores oriundos de uma lógica complexa de pensamento. No entendimento
de Geertz (2008, p. 27):
Assumir esse passo gigantesco longe da perspectiva uniforme da natureza humana, no que concerne ao estudo do homem, é abandonar o Paraíso. Alimentar a ideia de que a diversidade de costumes no tempo e o espaço não é simplesmente uma questão de indumentária ou aparência, de cenários e máscaras de comediantes, é também alimentar a ideia de que a humanidade é tão variada em sua essência como em sua expressão. E com esta reflexão começam a se afrouxar alguns ancoradouros filosóficos bem
amarrados, iniciando-se uma jornada em águas bem perigosas.
Com fundamento na premissa da incompletude do ser humano e que este
constrói sua humanidade por meio das relações culturais vivenciadas em seu
ambiente social, em suas instituições, em seu tempo e espaço, definitivamente não
posso acreditar em um ideal de homem universal com uma essência pré-
determinada pelas leis explicativas do universo. O homem é o que é não somente
por fatores genéticos ou maturacionais, mas sim, pela sua capacidade de se
relacionar em um mundo em movimento, com generalidades e especificidades, ou
seja, os homens diferem entre si em razão de sua maneira de se relacionar e sentir
o mundo, sendo, portanto incabível pensar em uma essência natural e universal de
homem. Provavelmente, por esse motivo, Morin (2005, p.78) diz tentar “[...] não
esquecer que a ciência é feita por cientistas que também são seres humanos, com
todos os defeitos dos seres humanos”.
O “homem comum” seria então um artefato social e cultural, construído nas
particularidades locais, forjado em suas alegrias e tristezas em meio a um turbilhão
de sentimentos que caracterizam a vida humana. Se este é o “homem comum”, o
que se pode dizer do cientista? Sempre ouvi dizer que o cientista é aquele que
pensa de maneira lógica, científica; é aquele que pensa e descobre coisas que a
maioria das pessoas não consegue; é capaz de aplicar métodos e obter resultados.
Mais recentemente ouvi que o cientista é alguém com inteligência fora do normal.
Pergunto-me então se o cientista, na concepção de ser extraordinário, estaria fora
do ambiente e das emoções vividas pelo homem comum? Seria este ser
extraordinário incapaz de sentir emoções em nome de uma ciência sem influência
“mundana”?
Refiro-me a expressão mundana como realce de uma perspectiva que
considere o ser humano em suas dimensões cotidianas, marginais, livre das amarras
científicas e de suas Leis universais. Antes de ser qualquer coisa, o cientista é um
ser mundano, com vivências e experiências que querendo ou não fazem parte de
![Page 40: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/40.jpg)
39
seu cotidiano e que indubitavelmente influenciam suas formas de pensar e agir, seja
dentro ou fora do campo da ciência.
Ser cientista então não se sustenta em algo fora da normalidade,
extramundano, visto que este se encontra inserido em um contexto social e cultural
que o constituem enquanto sujeito provido da capacidade de pensar e de aprender
continuamente. Nesse sentido, afirmo ser o cientista alguém que caminha pelo
mundo, vive e observa suas relações, construindo ideias que se fundamentam nas
necessidades humanas, sejam elas estéticas, tecnológicas, sociais ou culturais.
Analisando o contexto científico atual e o processo de moralização da
natureza, em prol de uma ciência do homem e para o homem, Barros (2016, p. 67)
recorre ao pensamento nietzschiano para fundamentar sua ideia e nos relata que:
Nietzsche põe em questão a ideia de um mundo “real”, objetivo, e indica mesmo que este é apenas uma necessidade humana e que por esse motivo deve ser interpretado também como uma forma necessária, intransponível de representação. Segundo ele, se estas noções nos parecem extremamente problemáticas, isso se deve ao fato de que nos últimos dois mil e quinhentos anos, a cultura ocidental habituou-se a mobilizar conceitos como verdade e realidade, pressupondo a autoevidência dos mesmos.
Entendendo o cientista como ser humano e que, portanto, está envolvido em
uma teia cultural de símbolos e significados que só fazem sentido em seu contexto,
torna-se difícil digerir a simples ideia da existência de um modelo de ciência a ser
seguido como verdade única, um paradigma universal detentor das Leis soberanas
do universo. Generalizar fenômenos não cabe no que penso sobre ciência, pois se
assim o fizesse estaria cometendo uma espécie de suicídio acadêmico, haja vista, a
perspectiva em que me encontro, de estudar conhecimentos locais que seguramente
não são universais e muito menos generalizáveis, no entanto, se configuram como
uma ciência voltada para a vida e para cultura de cada povo.
Torna-se incoerente então pensar em termos de uma ciência única que dê
conta de todos os problemas do mundo, como uma teoria geral, carregada de
técnicas e métodos universais. Tal pressuposto não se sustenta e, ancorado nessa
ideia, afirmo que cada vez mais surgem alternativas de estudos diferenciados,
profundos e que levam em consideração as simbologias, crenças e culturas locais,
apontando para a construção de múltiplas ciências mais adequadas as vivências da
humanidade, distanciando-se de visões generalizantes. Penso ser este um dos
propósitos dessa pesquisa, refletir o conhecimento a partir de uma ciência engajada,
mundana, voltada para as vivências dos homens em suas mais variadas dimensões,
![Page 41: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/41.jpg)
40
em uma composição nem sempre regular, unidirecional, posto que, sob esse prisma,
o cientista não é o “dono da ciência e do método”.
3.2 Saber local: conhecimento complexo, interpretativo e cultural.
Quando me refiro ao saber local, inevitavelmente sou levado a buscar a ideia
de populações tradicionais, comunidades que vivem em certo grau de isolamento
das grandes e médias cidades e que, por meio de conhecimentos construídos a
partir de suas vivências culturais e sociais desenvolveram formas de sobrevivência e
de relação com a natureza que se configuram como únicas, pois estabelecem um
vínculo de pertencimento com a comunidade e suas particularidades ambientais e
ecológicas (GUARIM, 2000).
É nessa perspectiva que surge a etnociênica, partindo “[...] da linguística para
estudar o conhecimento das populações humanas sobre os processos naturais,
tentando descobrir a lógica subjacente ao conhecimento humano do mundo natural”
(DIEGUES, 2000b, p. 28). Então, em uma perspectiva etnocientífica, interagir com a
comunidade torna-se fundamental para entender e descrever os processos de
manejo e convívio com a natureza, uma vez que, a relevância dos componentes
linguísticos, culturais e simbólicos construídos demonstram o tipo de relação com o
meio ambiente e suas implicações no cotidiano da vida nas comunidades.
Seguindo a mesma linha de raciocínio o autor considera o “Conhecimento
tradicional como o saber e o saber fazer, a respeito do mundo natural e
sobrenatural, gerados no âmbito da sociedade não urbano/industrial e transmitidos
oralmente de geração em geração” (DIEGUES, 2000b, p. 30). Parece então, que o
saber local transcende o âmbito do conhecimento natural, ele abarca o sobrenatural
e suas implicações nos modos de vida da comunidade, uma vez que para elas,
existe uma relação estreita entre o mundo sobrenatural e o natural, como por
exemplo: lugares sagrados, pessoas com dons de cura e de reza, além de seres não
catalogados pela ciência natural, mas que possuem grande relevância para o povo
local. Esses elementos estão presentes no cotidiano da vida em comunidade, tendo
total envolvimento com a cultura vivida, que por certo determina as práticas locais
em variados aspectos, como o religioso, o profano e também as formas de trabalhar
e se relacionar diariamente.
![Page 42: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/42.jpg)
41
Os mitos, as crenças construídos nas relações locais, logicamente fazem
parte do cotidiano, em verdade, estão imbricados em um ambiente cultural dinâmico
e complexo, constituído de uma teia de saberes que possuem força para retratar a
realidade da comunidade, de maneira muito mais precisa e dinâmica do que
qualquer modelo científico pré-determinado, pois, em geral, as crenças e mitos são
construídos levando em consideração as experiências vividas na localidade a partir
dos ciclos naturais e biológicos, constituindo um conhecimento que é repassado de
geração em geração, fortalecendo a cultura local e transformando as relações entre
seus membros. No entendimento de Morin (2005, p. 179) “[...] é no quadro localizado
dos ecossistemas que os indivíduos singulares se desenvolvem e vivem”. Assim, no
campo do saber local, mitos e crenças são dotados de importância não por simples
validação científica, mas pelo fato de trazer para a reflexão elementos constitutivos
da cultura e das formas de se relacionar em sociedade.
Para descrever o que digo, e quebrando os padrões definidos pela ciência
moderna como científico, apresento relatos feitos por dois informantes dessa
pesquisa, já neste primeiro capítulo, a fim de contextualizar e dar mais vida as
referências teóricas descritas.
Assim a Sra. Edith narrou a maneira de saber os meses mais chuvosos do
ano:
“Minha avó dividia montes de sal, e colocava no sereno entre os dias 12 e 13
de dezembro, dia de Santa Luzia, cada um representava um mês do ano. Pela
manhã os encharcados significavam os meses de mais chuva”.
Ainda sobre o tempo, outro relato interessante foi do Sr. Carlos, nesse caso
buscou fundamentação no “canto” dos sapos habitantes dos campos e lagos da
região:
“A cutaca está cantando fino é sinal de chuva chegando, já o sapo com este
som grosso, está chamando verão”.
As narrativas dos informantes evidenciam um tipo de conhecimento não
acatado pela ciência, mas que, assim como outros saberes presentes e em
construção na comunidade, funcionam como representações dos elementos
simbólicos e culturais que, pelo menos, momentaneamente, caracterizam os sujeitos
e suas relações de convivência, o que não quer dizer imutabilidade ou mesmo
![Page 43: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/43.jpg)
42
estabilidade, visto que a “cultura”, assim como o “natural” são representações
construídas pelo homem. Tomando como fundamento, as reflexões de Nietzsche
acerca da cultura, Barros (2016, p. 71) salienta que:
por meio desses pressupostos a cultura passa a ser compreendida como resultado de um grande número de representações, das quais está totalmente ausente a verdade, então entendida também como representação. O mesmo vale para a natureza, pois ela é apenas uma unidade referencial, sem nenhuma possibilidade de possuir unidade ou univocidade, pois estas são necessidades humanas e não aspectos efetivos. Todas as nossas tentativas de dizer o que ela é são, em última análise, representações dela, constituídas a partir de uma pressuposição valorativo-moral que jamais recai em uma designação basilar ou final sua. O conceito “Natureza” – assim como o conceito “Cultura” – são formulações humanas, fortemente marcadas pela perspectividade intransponível.
Dessa forma, a cultura tem papel preponderante no que concerne ao
entendimento do conhecimento tradicional, pois é ela quem estabelece a rede de
relações entre o ser humano e seu ambiente, uma vez que, toda prática tem um
sentido, nada é feito por acaso, as comunidades vivem com fundamento em suas
crenças e convicções que funcionam como Leis aplicadas pela comunidade. Há um
código de ética implícito às práticas locais e que revelam o respeito às tradições
como sustentáculo de uma sociedade com hábitos complexos.
Defendendo a pesquisa no campo do saber local e de suas singularidades,
além de se contrapor ao que chama de neurose acadêmica pela generalização
científica e pela necessidade que certos cientistas possuem em criar Leis universais,
Geertz (1997, p. 229) assim se posiciona:
Esse medo do particularismo, que considero uma certa neurose acadêmica (algo, que suponho já é evidente a essa altura), existe principalmente em meu próprio campo de trabalho, a antropologia, onde os que entre nós se dedicam a casos específicos e normalmente peculiares recebem advertências constantes de que estão reduzindo as possibilidades de obter um conhecimento geral e que, portanto, deveriam buscar alguma ocupação realmente científica [...]
A perspectiva em que me situo, extrapola as fronteiras que supostamente
estariam separando o natural do cultural, entendendo que o conhecimento
tradicional está em ambos os aspectos, imbricados em uma relação dinâmica entre
natureza e a cultura presente na comunidade, tendo suas próprias regras, sua forma
de classificar e reconhecer o ambiente e suas características, estabelecendo modos
de classificação e de reconhecimento de sons e odores dos diversos animais e
plantas presentes em seu cotidiano o que ocorre a revelia do que foi convencionado
denominar de validação científica, ou seja, os saberes tradicionais não se sujeitam,
enquanto prática, às regras metodológicas estabelecidas pela ciência moderna.
![Page 44: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/44.jpg)
43
No que diz respeito as relações culturais, concordo com Chaves (2003, p, 37)
ao afirmar que:
[...] cultura é um espaço de conflito, de luta, de disputa pelo poder de significação. Há entre as diferentes culturas e no interior de cada uma delas, visto que não são homogeneidades, uma constante luta por estabelecer quem pode, quem tem o direito de dizer o que é verdade, e, com base nela,
produzir a realidade.
O espaço cultural não está isento de conflitos, pelo contrário, é um espaço de
disputa, interligado por relações de poder que estabelecem o que pode e o que não
pode ser dito, inclusive dentro do espaço escolar, por esse motivo, dentre outros que
poderiam ser citados, há necessidade de oferecer aos alunos possibilidades de
entender o mundo sob outras óticas, lentes que talvez não tenham ainda construído
ao longo de sua existência, porém isso não significa uma mera substituição de sua
forma de viver e compreender o mundo, pelo contrário funciona como um alargador
de possibilidades. É neste sentido que imagino a importância da escola enquanto
condutora de formação e valorização dos conhecimentos produzidos em nível local.
Entendo dessa forma pelo fato de o ambiente escolar ser o lugar de onde se
pretende um processo educativo que atenda as necessidades reais dos alunos, um
local de esperança, do saber e do saber fazer, capaz de valorizar os conhecimentos
ali produzidos, escapando da surdez, cegueira e ausência de olfato e paladar que
teimam em assombrar nossas escolas. Cogito então, ser necessário para a
construção de um diálogo educativo que se passe dentro e fora do espaço escolar,
primeiramente entender: O que fazem e como fazem os moradores locais? Que
práticas desenvolvem? Como se relacionam com o ambiente? Que elementos
culturais estão presentes em seu cotidiano?, e em seguida refletir sobre: Que
conhecimentos são repassados de geração em geração? Que conteúdos são
necessários a vida dos alunos? Que conteúdos são trabalhados atualmente na
escola? Como trabalhar no âmbito escolar os saberes produzidos no cotidiano?
As indagações que proponho não estão meramente no campo retórico, visto
que, no decorrer desta pesquisa irei abordar essa matéria, trazendo para o campo
da discussão aspectos da cultura presente e em transformação na comunidade,
além de suas implicações na educação ambiental experimentada pelos alunos e
moradores de São Miguel do Flexal.
![Page 45: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/45.jpg)
44
3.3 Educação ambiental e perspectivas para o ensino de ciências
Nos últimos anos, o cenário educacional brasileiro, em especial a partir das
políticas estabelecidas a partir das discussões travadas na Eco-92 e da
implementação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9.394/96,
além dos Parâmetros curriculares Nacionais, tem acenado com uma necessidade de
se discutir no âmbito das escolas os problemas ambientais, constantemente
lembrados pela mídia e por movimentos ligados a ecologia.
Mesmo reconhecendo a importância dos conteúdos apresentados nos
documentos citados, é inegável que pouca coisa tem sido feita para uma efetiva
Educação Ambiental com potencial para atingir e se constituir como fundamento
formacional de cidadãos dos mais diversos campos sociais. Se de um lado é
verdade, que o tema tem atraído pesquisadores da área educacional e que tem
despertado interesse de jovens que cada vez mais demonstram preocupação com o
meio ambiente, de outro, é possível observar o descaso do poder público no que
concerne ao estabelecimento de políticas educacionais e sociais de cunho
ambiental, que possibilitem não só a proteção do chamado ambiente natural, mas
também de manutenção digna do homem do campo em seu habitat, em seu espaço
de convivência. Concordando com este pensamento, Jacobi (2003, p.196) ressalta
que o desafio mais latente “[...] é, pois, o de formular uma educação que seja crítica
e inovadora, em dois níveis: formal e não formal. Assim, a educação ambiental deve
ser acima de tudo um ato político voltado para a transformação social”.
A relação ser humano-natureza é complexa, constituindo-se de uma teia de
conhecimentos e vivências que não estão limitadas a um simples olhar do ambiente
natural como algo intocável e imutável, pelo contrário, tem seus fundamentos
forjados no cotidiano de cada comunidade e de cada ser presente no ambiente,
inclusive o homem, o qual se faz presente por meio de seu trabalho, costumes e de
sua cultura que marcam o tipo de convivência estabelecida. Ainda, abordando a
questão, Jacobi (2003, p. 190) afirma que “[...] a produção do conhecimento deve
necessariamente contemplar as inter-relações do meio natural com o social,
incluindo a análise dos determinantes do processo [...]”. Nessa perspectiva e com
base nas tendências que venho demonstrando neste trabalho, fica evidente meu
posicionamento acerca da importância entre os aspectos sociais de um povo e sua
![Page 46: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/46.jpg)
45
forma de interagir com o ambiente, pois, este não se encontra imune à ação
humana.
Na tentativa de explicar de forma didática a temática, Trivelato e Silva (2013)
apontam uma classificação em três categorias de Educação Ambiental:
conservadora, pragmática e crítica. Resumindo as três categorias apresentadas
pelas autoras, vê-se que a conservadora tem como base, práticas ambientalistas de
caráter romântico, no sentido de defender a natureza intocada, descontextualizada
dos aspectos sociais e culturais, separa homem e meio ambiente. A pragmática
aproxima-se do tecnicismo, dando primazia a práticas que compatibilizem
desenvolvimento econômico e recursos naturais, o chamado desenvolvimento
sustentável. No que concerne a categoria crítica, coloca a educação ambiental no
campo político, questionando o modelo econômico vigente e suas influencias no
meio ambiente, está apoiada na práxis, na relação entre sujeitos, natureza e objetos,
por um intenso processo de reflexão na e sobre a ação.
Empreendendo um posicionamento engajado, ciente do poder transformador
que a Educação Ambiental pode despertar em professores e alunos Guarim (2000,
p. 23) “[...] concebe um ambiente não só como meio físico biótico, mas também
social e cultural, estabelecendo uma relação entre os ambientes e o modelo de
desenvolvimento adotado pela comunidade”. Concordando com este pressuposto
Pereira e Guarim Neto (2009, p. 15) afirmam que:
A educação contemporânea precisa ser pensada levando-se em conta as transformações sociais, culturais e subjetivas de nossa era, buscando alternativas para a práxis educativo-social em relação ao meio ambiente, visando a construção de uma consciência ambiental.
As premissas apresentadas instigam a reflexão sobre: o que efetivamente
enquanto professores e cidadãos, estamos fazendo para desenvolver uma educação
ambiental consciente, politizada, com potencial para a construção de uma relação
menos predatória entre as partes envolvidas?
Indagar sobre isto me conduz a pensar sobre o ensino de ciências trabalhado
nas escolas que tive a oportunidade de atuar enquanto pedagogo, e principalmente
na minha vida de estudante do então ensino de 1º grau, e, mais recentemente
enquanto docente no curso de Licenciatura em Ciências Naturais da Universidade
em que desenvolvo minhas atividades de ensino.
Para narrar as vivências que neste momento passo a recordar, buscar em
minhas memórias, não como algo estático, paralisado no tempo e no espaço,
![Page 47: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/47.jpg)
46
indiferente às lentes que possuo hoje, proponho uma análise embasada em
determinados episódios, que evidentemente, não são os únicos que tive a
oportunidade de compartilhar, mas que em coerência como minhas subjetividades,
marcam meu olhar sobre o ensino de ciências.
Inicio, não por uma preocupação cronológica, mas por estar marcado de forma
muito viva em minha memória, com uma narrativa da minha vida estudantil em que o
professor de ciências desenvolveu uma atividade envolvendo a “importância de
conservar o meio ambiente”. A proposta, não diferente de outras que tratavam da
temática, tinham como propósito final cada estudante plantar uma árvore, o que por
certo era feito, afinal todos necessitavam da nota para passar de ano. Para nós,
alunos, a tarefa era muito simples, pois isso era basicamente a “salvação” para
quem estava “pendurado” na matéria, e, convenhamos plantar uma árvore não era lá
coisa de outro mundo. O dever estava cumprido, havíamos realizado nossa parte na
difícil tarefa de proteger a natureza, pelo menos isso era o que diziam nossos
professores. A visão de “proteção” a natureza estava limitada a plantar uma árvore.
Não nos perguntávamos de quem estávamos protegendo a natureza? Quem a
ameaçava? Porque ameaçava? Qual o propósito de protegê-la? Imagino que os
próprios professores não se fizeram estas perguntas, já que no meu caso, só
recentemente, ousei fazê-las.
A segunda narrativa refere-se a minha atuação enquanto pedagogo em uma
escola pública do Estado do Amapá, onde discutíamos em reunião a possibilidade
de produzir uma mostra científica que tivesse como tema principal “o meio
ambiente”, afinal o discurso difundido em nível mundial era o de proteção ao meio
ambiente, e em nível local, pelo governo do Estado, na época, era o de
sustentabilidade, representado por um programa governamental denominado PDSA
(Plano de Desenvolvimento Sustentável do Amapá). Com a concordância da diretora
da escola organizamos e produzimos a tal mostra científica, onde foram
apresentadas diversas experiências desenvolvidas no sentido de preservação do
meio ambiente, em geral relativas ao não desperdício da água e a conservação de
nossas florestas, como fundamento de nossa sobrevivência enquanto espécie,
porém sem questionar pontos cruciais para uma análise crítica dos interesses que
envolvem o ambiente e sua naturalização. Não questionamos, por exemplo, sobre o
modelo de desenvolvimento vigente e muito menos sobre o que supostamente seria
implantado pelo governo. A quem realmente interessa o discurso da conservação?
![Page 48: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/48.jpg)
47
Que pressupostos teóricos embasam tal discurso? Que impactos as políticas têm na
relação homem/meio ambiente?
A última narrativa, memória recente, trata da minha experiência enquanto
docente na Universidade do Estado do Amapá, em especial no curso de Licenciatura
em Ciências Naturais, neste caso formador de formadores. Lembro-me de em
muitas reuniões travarmos discussões sobre a reorganização, reconstrução da
proposta curricular do curso, já que, de acordo com as falas dos participantes, o
currículo não atendia o que de essencial necessitava ter um professor de ciências.
“tem muita disciplina pedagógica”, “precisamos colocar um pouco mais de botânica”,
“as disciplinas pedagógicas são importantes, mas não podemos esquecer que
estamos formando professores de ciências naturais”, assim os discursos se
sucediam de forma voraz, pois a palavra de ordem era “modificar a proposta
curricular”. As discussões me influenciaram tanto que minha primeira proposta de
projeto para construção de tese versava sobre o currículo do curso de Licenciatura
em Ciências Naturais da Universidade do Estado do Amapá - UEAP, mais
precisamente o seguinte tema: “Currículo e construção de prática pedagógicas
progressistas-inovadoras: um estudo sobre o currículo do curso de Licenciatura
em Ciências Naturais da Universidade do Estado do Amapá – UEAP.”. Evidente que
não restou muita coisa da proposta inicial de tese, já que fiz a opção de estudar uma
comunidade e suas formas de viver e conviver com a natureza ultrapassando os
espaços físicos da Universidade e me aventurando em um campo onde tudo pode
acontecer, desprovido de situações ideais laboratoriais.
Do lugar de onde falo me pergunto se realmente existe uma essência
fundamental constitutiva de professores de ciências? Se as disciplinas consideradas
“específicas”, são mais importantes do que as chamadas pedagógicas? Talvez a
pergunta não seja propriamente esta, sendo mais interessante questionar se existe
uma disciplina que não seja pedagógica? Ou se as disciplinas pedagógicas também
não são específicas, visto estarmos tratando de formação de professores?
Com as narrativas apresentadas e indagações que passam a fazer parte de
meus pensamentos, descubro que as certezas e verdades que possuía enquanto
docente, e em quanto formador de docentes, haviam se transformado em pó, algo
que não podia e não posso segurar por entre os dedos e muito menos classificar em
uma ordem lógica como pressupõe o conhecimento científico.
![Page 49: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/49.jpg)
48
No intuito de dar um fechamento a esse capítulo, mesmo estando ciente de
que poderia continuar com outros relatos e outras experiências, tomo emprestado
um trecho do livro Reencantar a ciência, reinventar a docência, de autoria da
Professora Sílvia Nogueira Chaves, não por acaso minha professora no Curso de
Doutorado/Reamec, e que, de maneira convicta, afirmo ter muita influência nos
discursos que combato e as vezes reproduzo. Diz a professora em uma de suas
narrativas sobre o seu ingresso no contexto da Universidade:
Mas, qual não foi meu descontentamento ao descobrir que na universidade não havia o maravilhoso que eu buscava. Lá o “mundo natural”, tão livre, amplo e pujante quanto meu desejo, estava miniaturizado no fundo de provetas e lâminas ao alcance de apenas um olho armado de microscópio. (CHAVES, 2003, p. 20)
Refletindo sobre seu currículo, sua história de vida e suas opções, em destaque,
a feita no campo das licenciaturas, chega a conclusão, pelo menos naquele
momento, de que a vida na universidade está restrita aos laboratórios com seus
instrumentos específicos, não atendendo a vida em toda sua extensão, pelo
contrário encontra-se presa aos ditames de uma ciência dos cientistas, distanciada
do cotidiano das pessoas em nome de uma cientificidade pura, não mundana,
distanciada das realidades pulsantes do convívio humano. Esse pressuposto
demonstra o conhecimento difundido no âmbito escolar, como algo feito para o real
científico, validado pela ciência e, na maioria das vezes, fora do contexto dos
estudantes. Por esse motivo, a autora constantemente propõe uma reflexão sobre o
porquê ensinamos determinados conteúdos e não outros? O que nos leva a ensinar
ciências? Imagino ser este um posicionamento muito mais saudável, aquele que não
cerceia, mas, estimula. Dessa forma a liberdade é colocada como condição
fundamental de uma educação científica para o ser humano, capaz de se
fundamentar nas práticas sociais e culturais vividas no cotidiano.
Ainda sob a influência das ideias colocadas tomo emprestado outro trecho da
obra de Chaves (2003):
Quantas fórmulas temos aprendido nas diferentes escolas que frequentamos em nossas vidas. Com quantas fórmulas significamos e aprisionamos os outros e a nós mesmos a partir daquilo que a escola nos classifica como certo/errado, falso/verdadeiro, bom/ruim? Esses esquemáticos binarismos que têm nos enformado, conformado, e que ainda hoje trazemos na memória, à moda de chips culturais, nos ditando padrões a serem seguidos, perseguidos ou lamentados quando neles não conseguimos nos enquadrar (CHAVES, 2003, p. 35)
![Page 50: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/50.jpg)
49
Tenho convivido cotidianamente com esse dilema, principalmente quando
escuto falar de ciência e da própria realidade. São colocadas apenas duas opções:
certo e errado, Como argumentou um professor conhecido em uma discussão sobre
políticas. “O Senhor como professor de políticas educacionais deveria saber que só
existem dois lados: situação e oposição”. A premissa colocada pelo dito professor
me fez refletir sobre o ponto levantado e a questionar de que lado eu estava, pois as
opções ofertadas foram somente duas. Concluo que a realidade é multifacetada,
com possibilidades que ultrapassam os dois lados da moeda situação/oposição.
Prefiro me situar em um espaço que me inquiete enquanto sujeito, acadêmico e
docente, e penso que isto me abre espaços de aprendizagem e de intervenção não
amordaçados pelos dois lados formulados, e, para longe dos discursos
demagógicos, me oportunizem discutir ciência e o ensino de ciências como um
território sem dono, sem as demarcações de espaço típicas de quem busca receitas
para viver e “educar”.
Imagino que esse novo olhar construído sobre o mundo e mais
especialmente sobre Educação Ambiental e Ensino de Ciências seja um caminho
sem retorno, pois, como disse anteriormente por meio de outras palavras, minhas
certezas e verdades foram severamente abaladas em suas estruturas, e
sinceramente, que bom isso ter acontecido. A estabilidade em que estavam
assentadas as convicções norteadoras de minhas práticas pedagógicas se
pulverizou, o que de fato possibilitou conceber, viver e a aprender com as
instabilidades presentes no cotidiano da comunidade, sendo possível sugerir
praticas pedagógicas possíveis no contexto da Escola de São Miguel, o que faço no
capítulo 6 dessa tese.
![Page 51: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/51.jpg)
50
4 APRESENTANDO O CENÁRIO: singularidades e saberes no âmbito
comunitário
Paralelamente ao receio da destruição ambiental, surgiu a preocupação com a ameaça de desaparecimento de outra parte do patrimônio nacional: um grande número de culturas marcadas por uma relação especial com os ecossistemas de alta diversidade biológica, tais como a cultura caiçara, dos jangadeiros, dos açorianos, dos ribeirinhos da Amazônia, dos pantaneiros. (DIEGUES, 2001, p.98)
A comunidade apresenta seu “cartão de visita”, com uma beleza natural que,
com a certeza das ciências exatas, ou com as peculiaridades que caracterizam o
local, não necessita de retoques ou ajustes (figura 4), basta simplesmente se
encantar e tentar com os recursos tecnológicos disponíveis, registrar imagens que
demonstram um pouco do estilo de vida e da cultura de um povo que vive do seu
trabalho e de suas crenças.
Figura 4 – Chegada à comunidade de São Miguel do Flexal
Fonte: Acervo do pesquisador - 2016
![Page 52: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/52.jpg)
51
O conhecimento construído e compartilhado no âmbito da comunidade de
São Miguel definitivamente não pode ser traduzido ou simplesmente relatado de
forma precisa, ou classificado e generalizado de acordo com os padrões científicos
clássicos, mesmo porque este não é o objetivo dessa pesquisa. Então o que cabe
ao pesquisador? A perspectiva em que me situo, estabelece um elo entre descrição
e interpretação daquilo que consigo observar e vivenciar em âmbito local,
possibilitando, dentro de minhas limitações teóricas e dos parâmetros estabelecidos
na proposta, apresentar descrições e reflexões a respeito das experiências
compartilhadas com os informantes, principalmente pelo fato de que pude sentir,
mesmo que por momentos, suas angústias e suas alegrias, seja em uma caçada
bem sucedida, em uma pescaria, em sala de aula ou mesmo nas festas e
programações culturais da comunidade. Esse capítulo está constituído de saberes
que permitem um olhar interpretativo sobre as condições e experiências de vida
presentes em São Miguel do Flexal, apontando suas características e peculiaridades
enquanto comunidade encravada no extremo norte do Brasil, mais precisamente no
Estado do Amapá.
4.1 Condições de vida: organização social e políticas públicas
Precipuamente, considero importante lembrar o que contou o informante
Mário sobre as condições de vida experimentadas em sua época de infância na
comunidade, posto que, ilustra de forma muito precisa os problemas sociais
enfrentados naquele período e que se estendem com outros contornos, obviamente,
contemporaneamente. Afirma o informante que seu avô chegou à comunidade no
início do século XX, para trabalhar na pecuária, na pesca, agricultura o que já era
feito por outras famílias presentes na região. A comunidade cresceu
demograficamente por meio século e a partir daí passou por um processo de êxodo,
principalmente pela necessidade de continuidade de estudo dos filhos dos
moradores locais. Sobre este aspecto o informante relata o seguinte:
“Meu pai encontrava muitas dificuldades para criar seus filhos, uma vez que, a
gente não tinha oportunidade de ter outros benefícios do Estado, visto a distância,
pois a comunidade fica muito longe de Macapá, da capital, e com isso vivíamos
![Page 53: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/53.jpg)
52
quase que no abandono, encontrando dificuldades em sobreviver, mas através de
um trabalho integrado da família, da união, conseguimos suplantar todos os
problemas que apareciam naquela época.” (MÁRIO)
O relato deixa claro, que as condições de vida experimentadas não eram as
melhores, e digo, com toda convicção que continuam precárias, pois durante minha
estada na comunidade foi possível constatar problemas agudos nos aspectos
econômicos e sociais: escola com uma estrutura física precária, funcionando com
classes multisseriadas e materiais didáticos sucateados, ausência de posto de
saúde, neste caso existe um prédio em ruinas (figura 5), abandonado pelo poder
público, bem como, falta de oportunidade para continuidade de estudos no próprio
local, sem abandonar a família e o trabalho no campo.
Figura 5 – Visão geral: Escola e Posto de Saúde
Fonte: Acervo do pesquisador - 2016
Politicamente fraca, a comunidade encontra sérias dificuldades na construção
e implementação de políticas públicas que fortaleçam suas instituições,
principalmente no campo da saúde e da educação, áreas que carecem de uma
atenção mais responsável por parte do poder público estadual e municipal.
Provavelmente, esse fator de enfraquecimento tenha dificultado a própria relação do
sujeito comunitário com o meio ambiente, haja vista, que a sobrevivência passa a
ser o primeiro instinto levado em consideração quando confrontado com práticas de
conservação ambiental.
![Page 54: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/54.jpg)
53
4.1.1 O cenário educacional local
O processo educacional e suas nuances serão analisados de forma detalhada
no capítulo seguinte, no entanto, entendo ser necessário apresentar aspectos gerais
sobre o assunto, como forma de estabelecer um diálogo acerca das condições de
vida a partir da única instituição educacional em funcionamento na comunidade, a
Escola Estadual São Miguel do Flexal.
Conforme dito anteriormente, a localidade faz parte do município de
Pracuúba, e como tal, recebe a herança de um modelo educacional que pouco se
vale dos saberes produzidos em nível amazônico, o que por certo, estimula o
desenvolvimento de uma cultura de apologia aos conteúdos prescritos pelos
programas oficiais, que na maioria das vezes estão distanciados da vida cotidiana
dos alunos.
Poucos recursos financeiros, precariedade no que concerne a pessoal de
apoio, ausência de políticas de formação profissional, são alguns dos problemas que
se apresentam no cenário educacional vivido por alunos, professores e gestores que
desenvolvem suas atividades na escola. Como disse a diretora da escola,
Professora Helena, apresentando a situação vivida em sua página no facebook:
“Escola São Miguel do Flexal, onde sou gestora, mas também faço trabalho
de secretária, pedagoga, ministro aulas na ausência de professores, lavo, faço
merenda com ajuda de algumas pessoas da comunidade. Não é vergonha nenhuma
e sim um prazer”.
Alguns poderiam dizer que o processo educativo pode ocorrer em qualquer
lugar, talvez seja verdade, porém essa premissa não exime o poder público da
responsabilidade de fornecer condições para o desenvolvimento de uma educação
com qualidade, nesse caso, tendo como pressuposto os saberes vividos na
realidade dos moradores onde o processo educativo acontece.
Imagino que se educar não é tarefa fácil para quem se encontra nas capitais
ou pelo menos em centros que recebem maior atenção do Estado, então o que dizer
das condições enfrentadas pelos atores que fazem a educação acontecer nesse
espaço amazônico?
![Page 55: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/55.jpg)
54
Certamente o tamanho do desafio desses educadores não é menor do que as
dificuldades apontadas nas vozes e observações realizadas, sendo necessário
reconhecer os reflexos que a carência de ação do poder público tem tido na
educação dos sujeitos que frequentam o espaço escolar comunitário. Pondero, que
apesar do enredo relatado, educandos e educadores conviventes em São Miguel
não perderam a capacidade de acreditar na escola como instituição promotora de
formação e com vigor suficiente para melhorar as condições educacionais
presentes. Acredito firmemente, que esse pensamento, a utopia de um presente e
futuro com maiores perspectivas de vida, funciona como uma fuga ao pensamento
conformista que tem assolado a sociedade brasileira em suas variadas dimensões
sociais.
4.1.2 Aspectos gerais da saúde local
O quadro apresentado na área da saúde não é muito diferente do observado
na educação, sendo um outro direito social constitucionalmente previsto, oferecido
de maneira extremamente irregular e insatisfatória, visto não atender as
necessidades básicas da comunidade. Verdadeiramente a saúde funciona de
maneira um pouco pior do que a educação, uma vez que, institucionalmente não
existe no espaço comunitário. O prédio construído para funcionar o posto de saúde
encontra-se em ruinas, abandonado pelo poder público, em evidente desperdício e
descaso com a coisa pública.
Em diálogo com o informante Mário, torna-se possível entender um pouco da
situação atual com base em informações históricas da comunidade. Descrevendo
como funcionava em outras épocas, relata que:
“As pessoas eram atendidas pelos Pajés e pelas parteiras, não cobravam
nada, eles sabiam o que fazer em cada caso, naquela época é que não tinha médico
mesmo, aí a gente procurava os Pajés, curavam muitas doenças, os remédios eram
feitos aqui, plantas e rezas eram usadas na cura das pessoas. Eu nasci com ajuda
de parteira, como te disse, não tinha médico, e sair da comunidade era muito difícil,
tinha que varejar por meio de barrancos, levava muitas horas e exigia muito esforço
de quem varejava”.
![Page 56: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/56.jpg)
55
“Boa parte das vezes as matriarcas e patriarcas, pessoas idosas, com mais
conhecimentos, utilizavam plantas para fazer chás e remédios que eram utilizados
para curar”
Os pajés eram vistos como pessoas com poderes sobrenaturais, mas que
também utilizavam ervas e plantas da flora local em seus encantamentos de cura.
Segundo dizem os informantes chegavam a curar doenças em estágios avançados,
por meio de rezas, unguentos e plantas com propriedades medicinais.
Em momento oportuno falarei de forma mais específica sobre os pajés e
outras crenças que caracterizam a fé do povo local, e que possuem influência no
modo de vida experimentado, porém, nesse momento quero continuar falando sobre
os aspectos da saúde na comunidade, a fim de que se possa ter uma visão geral
acerca do cenário.
O atendimento médico, nos dias atuais, é feito no posto de saúde da sede do
município, o qual conta com um médico e profissionais técnicos em enfermagem que
procuram dar conta das demandas apresentadas. Casos considerados mais
complicados são encaminhados para a capital do Estado, o que é feito por meio de
uma ambulância que por vezes não consegue atender a todos os enfermos. Para
ilustrar o que estou dizendo cito o caso do saudoso vereador e pequeno criador de
gado, Sr. Raul, nascido, criado e falecido na comunidade, tragicamente atacado por
um animal bubalino de grande porte, não resistindo aos ferimentos, chegando sem
vida a sede do município dentro de uma embarcação.
Infelizmente vivenciei esse momento de inarrável tristeza para os moradores
locais e família, visto tratar-se de um personagem muito querido e segundo dizem,
com incontáveis serviços prestados a São Miguel do Flexal. Não sei dizer se o
funcionamento do posto de saúde salvaria sua vida, mas posso dizer que os
primeiros socorros aconteceriam de maneira muito mais eficiente, talvez até
propiciando reais possibilidades de sobrevivência.
O fato é que o bem estar social tem repousado sobre um poder público
inoperante, incapaz de criar e manter instituições que se configurem como
promotoras dos direitos legalmente constituídos, aliás essa situação de precariedade
tem sido algo corriqueiro em nível nacional, mostrando sua face mais perversa em
![Page 57: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/57.jpg)
56
regiões com menor poderio econômico, como no caso da Amazônia Amapaense, em
especial, na comunidade objeto desse estudo.
4.1.3 Trabalho
Inicio o tópico afirmando que as principais atividades laborais
desempenhadas pelos sujeitos locais estão voltadas para a pesca artesanal, caça
de animais silvestres e pecuária, criação de bovinos e principalmente bubalinos que
povoam os lagos no período das águas grandes e os campos em épocas de
estiagem. Ressalto que a introdução do búfalo nessa região é algo que tem gerado
polêmica e fomentado debates sobre os possíveis prejuízos ambientais gerados por
essa espécie considerada exótica em relação aos campos inundáveis do Amapá.
Alegam que o búfalo está mudando a paisagem, abrindo caminhos onde não
existiam e fechando trechos em outros momentos transitáveis, porém, na visão de
quem mora na comunidade, a criação de búfalo e a exploração de seus derivados
propicia trabalho e alimento, gerando renda para quem depende do local para
sobreviver (figura 6). A fim de exemplificar o que estou apresentando, importante
lembrar o que dizem os informantes sobre o assunto.
“O búfalo ajuda bastante, no leite, no queijo, no trabalho, faço diária
trabalhando com búfalo, tenho que sustentar minha família e a situação não tá fácil
pra ninguém, as vezes vou até pro „arrebio‟, atrás de laçar gado brabo. É perigoso
mas eu preciso do dinheiro” (ZECA)
“O meu marido não é empregado, mas faz queijo, só que é por época, precisa
ter leite para fazer o queijo e as vezes não tem suficiente, aí tem que procurar
outra coisa pra fazer”. (JULIANA)
“Eu trabalho com búfalo, vendo meus mamotes, e com o leite faço queijo,
vendo aqui mesmo e minha irmã vende também lá no Flexal, na casa dela perto da
estrada” (MARCOS)
“Eu trabalho com o gado, sou criador, faço queijo, vendo gado e também faço
transporte dos alunos pra escola. O búfalo deve influenciar o ambiente, mas
![Page 58: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/58.jpg)
57
nós precisamos desse animal aqui na região, acho que o problema é a
quantidade no campo. Acho que esse ano vamo ter problema com água, ano
passado secou os lagos e o gado sofreu” (JARDEL)
Inegavelmente a bubalinocultura se reveste de força quando o assunto é
trabalho e geração de renda em toda Região dos Lagos do Amapá, pois muitos
moradores exploram carne, leite e seus derivados, para subsistência e pequenas
relações comerciais em âmbito local. Com o pasto adequado e o manejo feito de
maneira a respeitar as características dos animais e as condições oferecidas, torna-
se possível extrair leite de forma a garantir a subsistência e ainda o fabrico de queijo
(manteiga e coalho).
Figura 6 – Extração de leite e manejo do gado em período de transição
Fonte: Acervo do pesquisador - 2016
A produção e comércio de leite e queijo garante a subsistência de muitas
famílias da comunidade, já que notoriamente a localidade possui uma vocação para
este tipo de produção, que se justifica por gerações de indivíduos que dedicaram
sua vida ao trabalho no campo. Os conhecimentos sobre manejo e produção de
queijo foram passados de geração-a-geração, absorvendo, por óbvio, algumas
vezes aspectos da cultura moderno-urbana, no sentido de aumentar a produtividade
e diminuir as dificuldades de tal processo, porém, é possível afirmar, que a maior
parte da produção ainda é feita de maneira artesanal, considerando as dificuldades
econômicas e obviamente tecnológicas enfrentadas pelos pequenos fabricantes de
queijo.
No que concerne à pesca, atividade laboral muito desenvolvida pelos
comunitários, também trás em suas práticas movimentos que confrontam a
conservação do meio ambiente e a necessidade de sobrevivência,
![Page 59: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/59.jpg)
58
reconhecidamente vinculada aos aspectos ambientais. Nesse sentido, um
informante relata a nocividade dos chamados geleiros (atravessadores comerciais
que se valem do baixo poder aquisitivo do povo de São Miguel para a exploração
predatória do pescado) no tocante a conservação do ambiente e ao próprio consumo
do pescado pelos moradores. Relata o informante:
“Passa um rabeta atrás do outro e sempre tem um geleiro no meio pra comprar o
melhor peixe bem barato e vender caro, as vezes o peixe não fica nem aqui, pro
Tartarugalzinho e até pra Macapá. Se continuar assim, daqui mais uns anos não vai
ter nem traíra na região”
Essa forma de entender o processo já havia sido observada por Mendonça
(1983, p. 54) alertando que:
[...] de modo geral, somente o intermediário é quem está ganhando com isso, porquanto o pescador, preocupado em querer aumentar o volume de produção, devido o preço no mercado, esquece que seu trabalho está somente proporcionando um esvaziamento das riquezas renováveis, comprometendo assim o futuro de seus filhos e das novas gerações.
Institucionalmente, o poder público revela-se novamente como um ente
ausente da vida no âmbito comunitário, posto que os problemas relacionados ao
trabalho e fundamentalmente relacionados à sobrevivência do homem local se
acumulam e se agudizam por influência de agentes externos que por força do poder
econômico ditam as regras de comércio e consumo, consequentemente impactando
a relação com o ambiente.
A análise das relações expostas é vital para o entendimento do
funcionamento das práticas laborais em vigência na comunidade, haja vista, que tais
ações estão inseridas em um contexto que longe de ser simplesmente natural, está
fundado na vida social, política e cultural dos integrantes desse cenário
eminentemente amazônico.
4.2 Experiências de vida: relações culturais, hábitos e formas de subsistência.
São Miguel do Flexal é uma comunidade com estilo de vida simples, o povo
não possui grandes ambições no que se refere ao acúmulo de capital, considerando
que vivem basicamente do que retiram do meio ambiente, da criação de animais de
![Page 60: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/60.jpg)
59
pequeno porte e principalmente da bubalinocultura. A cordialidade com que os
moradores recebem as pessoas externas é uma marca de seu modo de vida, sendo
quase uma obrigação beber um pouco de café, algo imediatamente oferecido pelo
anfitrião quando do recebimento de visita.
As pessoas que habitam a região possuem traços culturais fortes,
evidenciados por saberes tradicionais que são construídos, modificados, repassados
e aplicados a cada nova geração, por esse motivo, os aspectos apresentados nessa
parte do trabalho possuem a intenção de trazer para o campo de análise
informações sobre as experiências de vida experimentadas pelos sujeitos que fazem
parte do cotidiano comunitário. Evidencia eixos relacionados à cultura, meio
ambiente e extrativismo.
4.2.1 Crenças, festas e suas implicações.
Os elementos culturais que fazem parte da vida de um povo são traços
característicos das formas de entender e conviver no e com o mundo a sua volta,
são constituintes de aspectos subjetivos que traduzem um estilo de vida com tempo
e espaço próprio, por esse motivo introduzo o assunto crenças, festas e suas
implicações por meio de um trecho histórico apresentado por Mendonça (1983, p.
30), narrando, com base em suas memórias, uma noite na comunidade de São
Miguel em um tempo sem luz elétrica, o que segundo o autor acontece por volta dos
anos de 1970.
“À noite sem luz elétrica, mas seguidos por lanternas, porongas e a própria
luz da lua, costumavam fazer visitas aos vizinhos mais próximos, onde, sentados
no chão, tinham ao meio o contador de estórias que era ouvido com muita
atenção pelos adultos e crianças [...], ficavam até alta noite tomando café,
fumando cigarros e cachimbos e tabaco de corda, contando suas aventuras e as
aventuras por eles conhecidas.”
O relato ilustra com muita propriedade o fazer comunitário em uma época
diferente da atual, obviamente com sua beleza e problemas característicos daquele
contexto. Vizinhos buscando espaços de reunião, trocando saberes, informações,
histórias e estórias que ilustram as mentes dos mais jovens e que por certo
![Page 61: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/61.jpg)
60
conduzem a um processo de aprendizagem, de difusão de conhecimentos próprios
do fazer local.
Obviamente, nos dias atuais existem outras relações, outras formas de
convívio que se refletem nas práticas adotadas no cotidiano dos sujeitos. A energia
elétrica é uma realidade recente, e afirmo que embora em outros momentos fosse
de certa forma romântico ficar sem esse benefício social, visto as caminhadas a luz
da lua, as reuniões de vizinhos e parentes, sua importância para a comunidade é
inquestionável, visto ser basilar para processos de comunicação, educação, saúde,
segurança, além de propiciar conforto aos moradores, afinal nem só de pão deve
viver o homem.
4.2.1.1 O arraial de São Francisco
A festa de maior importância e agregadora da comunidade é a de São
Francisco de Assis, considerado como santo protetor dos animais o que se justifica
pelo fato de ser a criação de bubalinos uma das atividades laborais mais
desenvolvida localmente. Segundo a programação do ano de 2016, a duração do
evento é de quatro dias alternando momentos eminentemente religiosos (oração,
louvor, novena, procissão) e momentos profanos regados a muita bebida alcoólica,
leilão, bingo, corrida a cavalo.
Ressalto que em outras épocas, segundo relatos, a festividade possuía
programação mais extensa, tendo duração de até 20 (vinte) dias, sendo construída
uma estrutura em madeira para o acolhimento de crianças que juntamente com seus
familiares participavam do evento.
“Lembro como se fosse hoje, muitas crianças dormindo em redes levadas pela
família. Ninguém queria ir embora, então descansavam por lá mesmo e no outro dia
lá estava todo mundo de novo” (Mário)
Ninguém queria perder nada, eu era criança, mas tava lá também, queria participar,
o que achava melhor era a corrida de cavalo, mas também gostava da parte
religiosa. Meu pai dizia que era importante fazer e pagar promessa pra São
Francisco de Assis.” (Jardel)
![Page 62: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/62.jpg)
61
As rezas são conduzidas por um padre que se desloca para a comunidade no
período do arraial, na sua falta, o ritual é comandado por outro membro da
comunidade, em geral a Senhora Carla, que entoa em voz alta cânticos católicos e
rezas em nome das famílias presentes e ausentes na festividade. Em seguida, após
o momento religioso, encontram-se todos na praça improvisada localizada em frente
a pequena igreja (figura 7) onde é possível confraternizar, contar histórias, rever
amigos que, por algum motivo, se fazem presentes apenas durante o arraial.
Figura 7 – Início da saída: procissão e encontro na praça
Fonte: Acervo do pesquisador – 2016
Na programação, bingo e leilão fazem sucesso, os prêmios oferecidos vão de
doces em geral, até animais bovinos, bubalinos, suínos e aves doadas por criadores
e demais membros da comunidade que reconhecem a importância do evento, não
só como aspecto religioso, mas, sobretudo, como um evento que permite a
fraternidade e momentos de comunhão entre moradores locais e visitantes que
prestigiam a programação (figura 8).
A festa fica mais emocionante nos dois últimos dias, quando acontece a
procissão de São Francisco, realizada às 17 horas, já no entardecer da Amazônia
Amapaense, verificando-se um clima mais ameno, mas ainda assim com calor
suficiente para impulsionar os romeiros, que com a fé característica de um povo
crente, acompanha a imagem do padroeiro por todo o trajeto, sendo comum a
![Page 63: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/63.jpg)
62
queima de fogos que rompem o silêncio, dividindo espaços com os sons
provenientes da fauna local.
Figura 8 - Momento da queima de fogos
Fonte: Acervo do pesquisador - 2017
O encerramento acontece na manhã de domingo, com uma atividade muito
aguardada e de grande prestígio junto aos moradores, a corrida de cavalo. É um
momento que apresenta grande teor de competitividade, já que podem concorrer
cavaleiros e animais oriundos de outras comunidades. Nesse caso, o clima nem
sempre é amistoso, sendo possível presenciar discussões sobre o melhor cavalo de
corrida, o melhor para laçar gado e outras modalidades. Os vencedores recebem
premiação, além de reconhecimento e prestígio junto aos comunitários.
Em conversa com a equipe organizadora, foi possível constatar o desejo de
ampliar as modalidades de integração entre os participantes, assim como, o número
de dias do evento, o que se justifica na fala do Sr. Jardel o qual afirma esperar o ano
inteiro pelo momento de confraternização, quando segundo ele, poderá rever amigos
e colocar os assuntos em dia.
“Aparece aqui gente, amigos que a gente não vê faz muito tempo e que às vezes nem
sabemos se estão bem, se inda estão vivos”. (Sr. Jardel)
![Page 64: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/64.jpg)
63
O significado da festa para a vida na comunidade é algo que emociona, visto
que a fé no santo padroeiro leva crianças, jovens, adultos e idosos a exaustivas
caminhadas, por trilhas nem sempre tão fáceis de percorrer, a fim de chegar em
tempo hábil para fazer promessas e obviamente “pagar os débitos” com o santo. A
simbologia dos atos e a força com que influenciam os fazeres comunitários no que
se refere à caça e pesca, o trato com o ambiente e mesmo o aumento do rebanho,
demonstram traços marcantes de uma cultura que se renova dentro das histórias e
estórias vividas nesse espaço/tempo amazônico.
O Arraial de São Francisco de Assis é um campo aberto à aprendizagem e ao
ensino em uma perspectiva transcendente aos parâmetros disciplinares, já que o
conhecimento está presente nas próprias relações vividas durante todo o evento. Os
conteúdos estão em movimento, estão nas vozes, nos mitos, nos fazeres de cada
um dos sujeitos e que infelizmente encontram-se distantes dos fazeres pedagógicos
trabalhados na escola. Não quero com essa fala, desmerecer as práticas dos
docentes que por lá trabalham, pois sei que fazem o possível dentro das condições
ofertadas, porém é inegável a necessidade de entrelaçar, ou usando uma expressão
mais adequada, indissociar os conteúdos das práticas de vida, daqueles trabalhados
no ambiente escolar.
4.2.1.2 A crença inabalável nos dons de cura e no conhecimento dos mais idosos.
Em tópico anterior abordei o quadro da saúde na comunidade, e conforme
relatei, não há sequer posto de saúde em funcionamento, estando os moradores
desprovidos de atendimento médico. Disse também, que essa situação configura-se
como um problema de longas datas, sofrendo com a ausência de políticas públicas
eficazes que possam fornecer o mínimo de estrutura de atendimento a população.
Considerando o cenário apresentado e a própria sobrevivência, a comunidade
ao longo de sua história, necessitou produzir conhecimentos que pudessem dar
conta de suas demandas nas mais variadas áreas, principalmente no campo da
saúde e do conhecimento dos ciclos naturais, talvez por esse motivo, ainda hoje
deposite confiança em pessoas, no meu entendimento, verdadeiramente sábias:
Pajés, Parteiras e Experientes, assim denominados pelos comunitários.
![Page 65: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/65.jpg)
64
Afirmam os comunitários que os Pajés são pessoas com poderes
sobrenaturais e que em outras épocas, visto a dificuldade em deslocar pessoas
doentes para a sede do município ou para a capital, era mais prudente procurar o
Pajé que na voz de um informante,
“Realizava sessões dirigidas e assistidas por pessoas da comunidade,
usando instrumentos como caco de brasa, charuto, cachaça, maracá, pena de arara
e fitas coloridas, além de ervas que curavam doenças. Durante as sessões outras
pessoas podiam se atuar e, se isto acontecesse, elas seriam trabalhadas para
serem os futuros pajés. Ave era o nome dado pelos espíritos e pelos presentes ao
Pajé durante o tempo que se encontrava incorporado”. (Mário)
As parteiras também tiveram presença marcante no nascimento de muitas
pessoas na região, famílias inteiras vieram à luz por mãos de parteiras, que segundo
os relatos seriam mulheres com muito conhecimento que se disponibilizavam a
ajudar as que entravam em trabalho de parto. A orientação pós-parto era a de que,
“Após o parto a mulher que paria tinha que tomar purgante de mamona e
outros ingredientes não revelados pela parteira, para fazer limpeza, ficava oito dias
do mosquiteiro sem pegar vento forte, comendo somente galinha durante quarenta
dias” (Mário)
Outro personagem que merece destaque é o indivíduo, geralmente mais
idoso, denominado como Experiente, certamente alguém reconhecidamente com
conhecimentos suficientes dos ciclos naturais para orientar os melhores momentos
para o plantio, caça e pesca, além de um acurado poder de observação e de
análise, já que eram considerados consultores sobre diversos assuntos pertinentes a
vida comunitária. Exemplificando a função do Experiente relatou-se o seguinte:
“O papai não colocava uma roça sem consultar o tio Tonho, sempre dava
certo o que ele falava, ele dizia o melhor dia, local e até a melhor hora pra começar
o trabalho. Ele dizia até a melhor marca para utilizar nos animais, para dar sorte e
aumentar o rebanho. Ele assessorou muita gente aqui” (Mário)
![Page 66: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/66.jpg)
65
As ocupações descritas ainda hoje possuem lugar de destaque na
comunidade, evidentemente com menos intensidade do que em outros tempos, pois
os avanços no campo da comunicação e do transporte permitiram um deslocamento
com maior eficácia, oportunizando, principalmente em casos considerados mais
graves, a transferência do enfermo para centros com maiores recursos tecnológicos.
Para encerrar esse ponto, lembro que os ritos adotados nas práticas descritas,
estabelecem uma forma de fazer característica de quem mora no local e que embora
não se apresentem como normas escritas, são dotadas de força mandamental.
O cenário apresentado pelas vozes relatadas demonstram acima de tudo que
os saberes produzidos e continuamente em produção ao longo da história da
comunidade são indiscutivelmente necessários a sobrevivência dos sujeitos locais,
considerando que pela não ação do Estado, buscam alternativas que possam dar
conta das demandas político-sociais. É dentro desse contexto que a comunidade se
movimenta, e se reinventa enquanto corpo social, cultural e político. Nesse sentido,
saber realmente é poder, à medida que passa a constituir um processo evolutivo
social em que a comunidade assume o papel de protagonista.
Importante destacar que em hipótese alguma desejo retirar a
responsabilidade estatal junto aos moradores, pelo contrário, acredito que o Estado
tem papel fundamental na implementação de políticas públicas que sejam
construídas no próprio âmbito comunitário, e nesse sentido, não é o poder público
unilateralmente quem vai dizer o que precisa ser feito, são os próprios sujeitos
conviventes que deverão a partir de seus problemas e conhecimentos definir as
melhores estratégias e caminhos para a construção de políticas que possibilitem
condições de vida mais adequadas às necessidades do povo de São Miguel.
4.2.2 Saberes locais e meio ambiente
No que diz respeito à relação com o meio ambiente, entendo ser um ponto
verdadeiramente capital, já que a pesquisa possui forte ligação com a temática
ambiental, sendo portanto necessário lançar um olhar atento sobre as relações que
se estabelecem nesse campo. Recentemente produzi dois trabalhos juntamente com
meu orientador de pesquisa e outros parceiros colaboradores, no sentido de retratar
um pouco dessa relação entre os sujeitos locais e o meio ambiente na comunidade
![Page 67: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/67.jpg)
66
de São Miguel do Flexal. Por uma questão de originalidade, optei por não trazer
para dentro dessa tese tais produções, porém vejo a necessidade de apresentar
algumas das ideias trabalhadas por lá, com um enfoque mais conectado a essa
pesquisa. Proponho então a compreensão de um meio ambiente em constante
mutação, altamente influenciado pelos modos de vida presentes na comunidade
entendendo o homem local como sujeito responsável e consciente da importância de
conservar o meio ambiente para o presente e para o futuro.
Primeiramente acredito ser necessário entender que de maneira alguma o
homem local deve ser afastado do seu habitat, pois ninguém melhor do que ele
compreende a importância da conservação do ambiente em que vive, e nesse
sentido, não se pode esquecer que é esse sujeito quem sofre com a depredação da
natureza, com o desparecimento de espécies da fauna e da flora, antes apenas
utilizadas para subsistência, hoje, despertando interesses econômicos de sujeitos
externos.
A partir desse ponto de vista, os saberes produzidos localmente passam a ser
fundantes para uma proposta de conservação ambiental voltada para compreensão
do ser humano enquanto indivíduo capaz de conviver harmonicamente com o meio.
Apoiado em Diegues (2000b) entendo que as práticas de manejo tradicionais
contribuíram e contribuem para conservação da biodiversidade local de forma muito
mais efetiva do que os megaprojetos preservacionistas que, em geral, excluem o
homem de seu habitat, destituindo-o de seu direito a terra.
Analisando o assunto é importante lembrar o que dizem Pimbert e Pretty
(2000, p. 196 ) enfatizando que “[...] os esforços de conservação devem identificar e
promover os processos sociais que permitem às comunidades locais conservar e
aumentar a biodiversidade como parte de seu modo de vida”. Ora, conservar o
ambiente implica então em reconhecer as culturas locais como propulsoras de
formas de manejo e de entendimento dos ciclos naturais, inseridos na vida cotidiana.
O Homem do campo vive na e pela natureza, possuindo consciência de sua
necessidade para sua subsistência enquanto ser humano membro de uma
comunidade. A esse respeito torna-se importante demonstrar como pensam os
participantes da pesquisa, o que se faz por meio de suas vozes.
![Page 68: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/68.jpg)
67
“A gente depende daqui, se não cuidar, daqui um tempo não vai ter mais, tiro
pelo peixe, que antes tinha em grande quantidade, agora tá mais difícil pegar,
porque são muitas redes colocadas no lago, os geleiro levam quase tudo”. (João)
“O peixe tá diminuindo porque tão acabando com os aningais, é lá no meio
dos aningais que eles desovava, antes era fácil pegar apaiari, até pirarucu a gente
pegava, agora só se a gente for pra longe, e aí é mais difícil (Zeca)
“Acho que tinha que controlar os geleiro, eles levam muito, aí sobra pouco,
cada ano vai diminuindo mais. Outra coisa que eu acho que tinha que fazer era
diminuir a quantidade de gado búfalo, tem demais, eles abre vala e prejudica o
ambiente” (Olavo)
“Antes o que era tirado daqui era em pequena quantidade, só era pra comer
mesmo, meu pai não aceitava estragar comida, pra ele era uma ofensa muito
grande, lembro dele com raiva porque tinham tirado muito tracajá do lago e acabou
estragando” (Mário)
As abstrações que produzo com base nas vozes dos sujeitos ressaltam a
ideia de que as populações tradicionais, por meio dos conhecimentos produzidos no
fazer diário, vivem há muito tempo em determinados locais da Amazônia,
convivendo com eventos naturais, culturais e muitas vezes sobrenaturais
constituintes dos modos de vida na comunidade. Portanto, demonstraram saber
conviver com seu ambiente, degradando apenas o mínimo necessário.
É óbvio que nem toda relação entre as comunidades tradicionais e o meio
ambiente se condiciona harmoniosamente, pois são vários os fatores que interferem
nesse contexto, dentre eles elementos políticos e sociais que via de regra empurram
o sujeito comunitário a explorar mais do que seria normalmente necessário a sua
sobrevivência. O que estou dizendo é que por si só nenhuma relação é
perfeitamente harmônica, pois estão sujeitas a um contexto que se movimenta, se
desloca em várias direções, em um processo metamórfico em que o ser humano
influencia e é influenciado pelo meio em que vive e convive.
![Page 69: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/69.jpg)
68
4.2.3 Extrativismo: flora, pesca, caça
O extrativismo desenvolvido na comunidade não difere muito de outras
regiões amazônicas, porém tem maior destaque a pesca artesanal, seguida da caça
de animais silvestres, extração de açaí e madeira, além outros frutos característicos
da flora local, explorados para garantia da subsistência das famílias e pequenas
relações comerciais que propiciam alguma renda a quem desenvolve essas práticas.
A flora regional é muito rica, contando com vegetais como açaí, bacaba,
manga, ingá, ameixa, frutinheira, andirobeira, marajá, cuia de onça (figura 9) e
outras que participam dessa composição do cenário local. Destaque especial
merece a aninga, pois embora não tenha valor comercial conhecido, pelo menos não
na comunidade, apresenta-se como elemento de suma importância ao equilíbrio
ecológico, já que, segundo informações dos comunitários, e observadas durante a
pesquisa, é lá nos aningais que os peixes se reproduzem, sendo ainda abrigo de
muitas outras espécies como quelônios, jacarés e capivaras.
Figura 9 – Espécies típicas da região: frutinheira e andirobeira
Fonte: Acervo do pesquisador - 2016
A pesca realizada em São Miguel é essencialmente artesanal, explorada tanto
em águas fluviais como marítimas, visto que muitos pescadores, em busca de maior
quantidade de pescado, se aventuram em águas mais distantes e perigosas. Rede
de pesca, caniços, e anzóis, são itens comuns em qualquer casa da comunidade,
visto que no período de águas grandes torna-se possível pescar dos trapiches
existentes nas residências. Como se diz por lá, “[...] é fácil puxar piranha, porque
![Page 70: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/70.jpg)
69
tem muita, tem arraia, poraquê, traíra, mandubé, mandi...”. Quando as águas
começam a baixar, com a formação das “valas” e pequenos lagos, a pescaria ganha
outros contornos, sendo mais comum a captura de tamuatás e acaris, o que se faz
com o uso de redes de pesca e pequenas malhadeiras (figura10).
O informante (Mário) lembrava que em outras épocas o processo adotado era
muito próximo as técnicas utilizadas pelos indígenas, com pouca agressão ao meio,
“Era feita através de anzol, anzol de mão, arpão, cacuri, lanterna e zagaia e
muitas vezes com as próprias mãos usando poronga”.
Há algum tempo esse cenário vem se modificando e embora ainda seja
considerado um processo de pesca artesanal, a ação dos atravessadores/geleiros,
tem estimulado o avanço de práticas de captura de peixes, em volume bem maior do
que no passado, tendo um impacto negativo tanto para o meio ambiente quanto para
aqueles que necessitam do pescado para o consumo próprio. Espécies como o
pirarucu, por exemplo, despareceram dos lagos, sendo muito raramente
encontradas, ainda assim em pontos mais longínquos, de difícil acesso ao homem.
Figura 10 – Pescaria em período de transição das águas
Fonte: Acervo do pesquisador - 2016
A caçada de animais silvestres faz parte da cultura local, servindo
principalmente para alimentação, e em outro polo, atendendo ao mercado externo,
para o comércio clandestino de couro, carne, penas e ovos. Segundo o informante
Mário,
![Page 71: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/71.jpg)
70
“a garça branca parece ter sido a primeira espécie a ser caçada, com
finalidade comercial, depois vieram jacarés, veados, onças, capivaras, cutias,
tracajás, marrecas e outros”.
A esse respeito, é interessante observar a imagem seguinte (figura 11), pois
retrata o cenário de forma muito densa, demonstrando uma fase em que as águas
estão baixas e várias espécies da fauna regional se fazem presentes de forma
corriqueira.
Figura 11 – Período de garças, marrecas e pequenos peixes
Fonte: Acervo do pesquisador - 2015
O que se observa nas imagens é o retrato do período em que se aglomeram
grandes quantidades de garças e marrecas, além de pequenos peixes que ficam
presos nas valas que se formam no final das chuvas. Nessa fase muitos membros
da comunidade se ocupam da caça de marrecas e outros pequenos animais como
capivaras (figura 12) e cutias, além de uma intensa busca por quelônios que iniciam
seu período de reprodução. Os quelônios, principalmente o tracajá, são muito
apreciados como alimento entre os membros da comunidade e também como
iguaria de grande valor econômico na capital Macapá.
A maior parte dos moradores reconhece que há um risco muito grande
dessas espécies desaparecerem dos lagos, florestas e campos, pois a captura tem
sido intensa e em geral predatória, por este motivo buscam alternativas para
preservação da fauna regional, sendo um bom exemplo o “Projeto Quelônios da
Amazônia – PQA”, o qual tem como propósito a proteção da espécie,
![Page 72: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/72.jpg)
71
acompanhando o período de reprodução, incubação dos filhotes, culminado na
soltura destes na natureza.
As informações coletadas afirmam que o projeto é de inciativa do IBAMA em
conjunto com membros da comunidade, em especial a família Vaz Brito, que cede
sua propriedade localizada no “lago da ponta baixa” para que sirva de base na
culminância do trabalho, além de coordenar todos os procedimentos adotados
durante a efetivação do projeto. Evidentemente o PQA isoladamente não irá resolver
a problemática enfrentada, mas há que se ressaltar o seu potencial mobilizador,
social e educativo, tendo em vista que consegue o envolvimento de grande parte da
comunidade.
Figura 12 - Capivara abatida por moradores
Fonte: Arquivo do pesquisador – 2016
A face mais desumana dessa relação reside no fato de que embora o volume
do comércio tenha aumentado nos últimos anos, estimulado principalmente pelo
mercado externo, tal fator não tem se configurado como condutor de melhorias nos
aspectos socioeconômicos presentes na região, pelo contrário, o empobrecimento
da população está acontecendo na razão direta do esgotamento dos recursos
naturais o que tem gerado preocupação no que se refere à própria existência da
comunidade.
![Page 73: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/73.jpg)
72
Subsistir na região exige cada vez mais a compreensão dos fenômenos
sociais, políticos e econômicos presentes no contexto local, visto que tais aspectos
estimulam e condicionam os moradores ao desenvolvimento de práticas de
sobrevivência que em geral não condizem com os saberes, tradições e modos de
vida secularmente repassados de geração a geração. Ressalto que evidentemente
mudanças deveriam ocorrer, haja vista, que o local, assim como o mundo, está em
movimento, em constante metamorfose, porém, o que vem acontecendo é um
verdadeiro assédio econômico, nocivo ao meio ambiente e, sobretudo, a população
local.
![Page 74: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/74.jpg)
73
5 CONHECIMENTO CIENTÍFICO E SABERES AMBIENTAIS: representação,
memória e significados para o ensino de ciências
“Hoje alguma coisa mudou, mas ainda se conservam os laços primitivos da cultura local. É uma gente simples, humilde, sem grandes aspirações, porém no fundo tudo é motivo de felicidade, olhar em volta e estar tudo tranquilo, as árvores, as aves, os animais a natureza em si, dando paz de espírito e amor, é vida do campo” (Trecho retirado de documento de antigo morador da região, 1983, Autodenominado Retalho Verde)
Inicio este momento da pesquisa com um pequeno relato de uma das manhãs
que pude vivenciar no decorrer de minha interação com os moradores locais. Faço
isso, na intenção de contextualizar o diálogo e me inserir no processo que tento
descrever e analisar neste capítulo, pois, imagino que a partir desse exercício a
escrita possa fluir de maneira mais suave, já que, nesse momento, tornou-se
possível o acesso a saberes que até então não cabiam na forma esquemática como
eu entendia o conhecimento científico.
As ideias que passam a povoar meus pensamentos são construídas em um
caldeirão de falas, imagens, símbolos e teorias oriundas de minha vivência
acadêmica e do envolvimento desta com os saberes locais, de certa forma,
obrigando-me a sair do que muitos popularmente chamariam de “zona de conforto”,
e que prefiro academicamente denominar de “zona de estabilidade.” Para não me
alongar nesse ponto introdutório da discussão, passo então ao relato, aqui
funcionando como um prelúdio para em seguida refletir sobre percepções
ambientais presentes no cotidiano da comunidade, construção do conhecimento
ambiental e o fazer pedagógico docente em relação ao repertório de conhecimentos
locais já produzidos pelos alunos.
Pessoas humildes, que descrevem apenas coisas que conseguem observar
de suas vivências, coisas sobre plantas, animais e formas de se relacionar com o
trabalho e o ambiente, caracterizando um processo educacional dinâmico, rico em
experiências cotidianas, que infelizmente, passam longe da escola. Francisco, filho
![Page 75: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/75.jpg)
74
de 9 (nove) anos de idade, de uma família com 7 (sete) membros, ajuda o pai no
trabalho, monta a cavalo e toca o gado, juntando as reses espalhadas no campo,
direcionando para o curral. Mesmo com sua estatura diminuta e pequena força
física, se comparado a um adulto da comunidade, desempenha a tarefa com relativa
facilidade, algo que parece ser comum nessa região do Amapá.
Aqui o trabalho começa cedo com os preparativos para o trato com o gado,
pois a rotina do campo é bem diversa daquela experimentada na cidade,
considerando que imprime uma rotina com tempo, espaço e relações culturais
diferenciadas, às vezes não obedecendo ao que o relógio ou o próprio corpo do
homem da cidade reclama como direito. Dorme-se cedo, porém, acorda-se com os
pássaros, que por sinal, são muitos e das mais variadas espécies habitantes de
nossa Amazônia do “Pantanal Pracuubense”. Marrecas, Sabiás, Curiós, Curicacas,
Colhereiros, dentre outros que escapam, não minhas percepções, mas minha forma
de classificar e organizar o mundo ao meu redor, dão o tom das dissonâncias
presentes na sinfonia que abre o dia, neste caso, com um sol, que por volta do final
da manhã, está tão denso que chega a deformar a paisagem. E assim inicia o dia
em são Miguel do Flexal, com inúmeras formas, cores, sons e cheiros, elementos
que fazem parte do cenário amazônico e que são indispensáveis a compreensão
dos modos e experiências de vida presentes no cotidiano dos comunitários.
Com o entendimento de que a Educação Ambiental e o ensino de ciências
fazem parte de uma complexa estrutura institucional, cultural e simbólica, que
transformam realidades e se transformam enquanto práticas cotidianas estabeleceu-
se um convívio com os informantes, no intuito de estimular suas reflexões e falas em
relação ao ensino de ciências desenvolvido na escola e sobre as práticas
educacionais ambientais vigentes no fazer dos docentes.
A respeito do argumento levantado, as vozes e práticas foram registradas,
unitarizadas, categorizadas e organizadas em eixos temáticos que possibilitaram a
produção de textos originais construídos a partir do corpus da pesquisa e do
repertório teórico que fundamenta minha formação humana e acadêmica. Na
intenção de facilitar a compreensão, vozes e práticas foram colocadas em evidência,
organizados a partir dos eixos geradores, indicando seus respectivos informantes.
Importante enfatizar que embora as vozes estejam em destaque, prima-se pela
indissociabilidade dessas com o texto e o contexto do objeto de estudo, pois
![Page 76: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/76.jpg)
75
entende-se este princípio como fundamental nesse tipo de pesquisa, já que a ideia é
trabalhar com categorias emergentes (MORAES, 2003).
5.1 Percepções ambientais presentes no cotidiano local
Considero este ponto da pesquisa como essencial ao entendimento do fazer
ambiental na comunidade, já que por meio das vozes dos informantes, e de minha
vivência junto aos moradores, observando, analisando e construindo dados
apresento reflexões que julgo, com base em minhas leituras e experiências de vida,
importantes para uma efetiva compreensão dos saberes locais e suas implicações
no meio ambiente.
Como descrever as percepções ambientais evidenciadas nas vozes e atitudes
dos informantes? Melhor ainda, como fazer isso sem cair na rotina entediante de um
simples relato? Até que ponto posso ou devo fazer os recortes sem causar prejuízos
ao sentido das falas e daquilo que foi observado?
As perguntas que acabo de apresentar são composições reflexivas do que
venho fazendo ao longo dessa investigação, e não estão limitadas por um método
em especial. Embora tenha feito a opção por uma Pesquisa Narrativa com
fundamento na Análise Textual Discursiva conforme proposto por Moraes (2003),
não considero que essa escolha se constitua como um limitante, mas sim como uma
trilha que pode ter inúmeras bifurcações, pousos, repousos e chegadas ainda não
determinadas por hipóteses pré-fabricadas.
É apoiado nessa premissa, de que o método não pode ser visto como o
instrumento mágico capaz de dar conta das múltiplas realidades, ou pelo menos
como receita da forma “correta” de dizer o que deve ser dito, que apresento as
percepções sobre Educação Ambiental presentes nos discursos dos participantes.
Antes de demonstrar e analisar as percepções ambientais identificadas no
cotidiano dos moradores locais, penso ser importante lembrar, considerando que
essa pesquisa se direciona para Educação Ambiental, que o processo de
entendimento dessa trama está longe de ser homogêneo, pois como afirma
Layrargues e Lima (2014, p. 25) “[...] o campo da Educação Ambiental já é
atualmente reconhecido como multifacetado, composto por inúmeras correntes
político-pedagógicas [...]”, dentre as quais destacam-se: macrotendência
![Page 77: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/77.jpg)
76
conservacionista – possui caráter comportamentalista não tendo preocupação com
mudanças na estrutura da sociedade, valoriza o aspecto afetivo de conservação da
natureza; macrotendência pragmática – tem como sustentação a lógica do mercado,
voltando-se para a ideia de consumo verde, ajustando-se as práticas neoliberais de
utilização dos recursos naturais; macrotendência crítica – O aporte principal dessa
tendência está no processo político-pedagógico que se encontra no cerne dos
debates ambientais, trazendo para discussão a complexidade das relações sociais
presentes na dinâmica ambiental (LAYRARGUES; LIMA, 2014)
A essa altura, por tudo que já foi narrativamente produzido, evidencio que
essa investigação não busca o enquadramento numa teoria em particular, mas
obviamente, situa-se em uma lógica complexa, entendendo a Educação Ambiental e
as práticas ambientais dentro de um contexto organizacional em movimento, imerso
nas necessidades socioambientais. Apoiado nesse discurso, passo a narrar meus
diálogos com os sujeitos participantes da pesquisa.
Certo dia, em uma das minhas interações com membros da comunidade,
neste caso, com o Sr. João (Trabalhador rural e morador local), caminhávamos
próximos a um trecho do campo em que outrora, de acordo com seus relatos, havia
sido um lugar de pescaria fácil no período da cheia das águas, devido a abundância
de pescado e da ausência de pesca predatória para fins de comercialização em
larga escala com os geleiros locais e não locais.
Dizia-me o Sr. João:
“Tem muitas pessoas que não preservam o meio ambiente, mais tarde pode
prejudicar muito. Os nossos filhos vão sofrer com isso. Do tempo que eu cheguei pra
cá, pirarucu e tracajá a gente via de quantidade no rio. Hoje em dia pra pegar um
alimento desses, a gente encontra dificuldade, porque a exploração do homem foi
grande nesses anos. Cada ano que passa a natureza se modifica e fica mais difícil.”
“O impacto foi muito grande sobre os aningais. Todo tipo de pescado, apaiari
e tucunaré, por exemplo, desovavam pra justamente reproduzir. Hoje em dia tem
bem pouco aningal. O próprio homem destruiu o meio de vida sobre os peixes,
porque não tinha onde eles desovarem e aí eles correm para o campo. A nossa
![Page 78: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/78.jpg)
77
água de começo de janeiro tem um tipo de capim, chamado capim de marreca, esse
capim solta um tipo de veneno que mata peixe em grande quantidade.”
A conversa com este sujeito, suas explicações e indagações durante a
caminhada, faz com que minha atenção se volte para a paisagem ao meu redor, que
embora seja bela, realmente revela traços de agressão ao ambiente. Observo a
formação de grandes valas, que segundo ele, são resultado da criação de búfalos e
da ação da própria natureza por conta da “corredeira das águas”.
Vejo grande quantidade de gado no campo, bovinos e bubalinos que pastam
em uma espécie de campo comunal e que por certo fazem aquele ambiente ser do
jeito que é, uma vez que, influenciam no chamado “ambiente natural”. Outro aspecto
destacado refere-se à ação dos pescadores profissionais, que em sua boa parte,
imprimem práticas predatórias de pescaria em escala muito maior do que aqueles
que apenas pescam para subsistência. A ação do homem tem sido decisiva na
alteração ou conservação do ambiente e essa ideia está presente nas vozes dos
participantes da pesquisa. Corroborando com esse pensamento Pereira e Guarim
Neto (2009, p. 25) ensinam que:
A sobrevivência das diferentes espécies que abundam o ambiente da floresta é inteiramente dependente do papel que cada uma desempenha nesse ecossistema. O ser humano, enquanto integrante desse bioma, dotado de inteligência e livre arbítrio contribui expressivamente no processo de transformação ou preservação do ambiente.
Esse pressuposto de que a ação humana tem sido, de certa forma, a grande
causadora dos desequilíbrios ambientais, levando a um contínuo prejuízo ecológico
e social também está explícito no que apresenta Guarim (2005, p. 9) afirmando que:
As atividades humanas parecem ser as causas mais comuns atingindo as comunidades ribeirinhas, isto porque a excessiva pesca predatória e o turismo desorganizado têm levado à alteração de hábitat e à perda da biodiversidade. Algumas das alterações ambientais têm sido consideradas como sendo induzidas pelos homens, por exemplo, a poluição dos rios, o desbarrancamento de suas margens, as queimadas, a diminuição da pesca etc.
As percepções expostas caracterizam não somente aspectos teóricos ou falas
desconexas de moradores da comunidade, são de fato, produtos de uma rica
vivência no cotidiano local, fundamentada em saberes que antes de qualquer coisa,
fazem parte de um acervo cultural e social construído nas práticas, nas festas, nos
contos, nas rodas de conversa, no folclore e no trabalho em família. Nesse caso, o
![Page 79: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/79.jpg)
78
dito e o não dito possuem força para representar o tipo de relação que essa
comunidade tem com o ambiente, nem sempre agressiva, nem sempre com fundo
ecológico, mas em todo caso respeitosa, por reconhecer que a sobrevivência na
comunidade está, de maneira inseparável, conectada aos recursos naturais
disponíveis e aos saberes oriundos da relação homem/ambiente.
Foram muitas as caminhadas que fiz durante as interações junto aos
moradores da comunidade, e nos trajetos que tive oportunidade de fazer, não
faltaram diálogos, observações e reflexões quanto aos diversos problemas
enfrentados pelas famílias erradicadas nesse espaço amazônico. Problemas de
ordem econômica, social e política, que acabam por influenciar o convívio com o
meio ambiente.
Lembro-me especialmente de um encontro em que tive a oportunidade de
conversar com três indivíduos pertencentes ao local. As falas que apresento são
uníssonas no sentido de que a comunidade está mudando, pois está sofrendo com a
ausência de políticas públicas que oportunizem ao homem do campo viver em
plenitude no seu habitat, não de forma natural, como gostariam alguns defensores
da natureza intocada, mas como sujeito social, político e cultural que depende do
ambiente para viver.
O cenário em que o diálogo acontece, é diferente do apresentado
anteriormente, haja vista, que estávamos em pleno inverno, e, neste caso, o lago
toma conta do campo, formando um verdadeiro “oceano de água doce”, uma
paisagem fluvial caracterizada pelo trânsito constante de embarcações e de uma
fauna específica para a época, sendo comum principalmente os mergulhões que
ousam voos rasantes e mergulhos certeiros em busca das “iguarias” oferecidas pelo
lago. Nas partes mais rasas os búfalos se banham, resfriando o corpo das altas
temperaturas do norte do Brasil e também aproveitam para amenizar os constantes
ataques de insetos presentes nesse período de “águas grandes”.
Vale ressaltar, que nesse período a dinâmica da comunidade se modifica em
suas relações, principalmente por conta da forma de deslocamento fluvial que exige
o uso de voadeiras e também de embarcações movidas a motores “rabeta” e a força
humana por meio de remos e varejões os quais exigem por parte do barqueiro
extrema coordenação e força, além de profundo conhecimento da navegação local.
O encontro acontece em um retorno de uma visita que fiz a Escola de São
Miguel, onde acabara de ter uma conversa inicial com a diretora e os docentes sobre
![Page 80: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/80.jpg)
79
a intenção de pesquisa. Transitávamos por um trecho não tão profundo do lago,
ainda próximo a escola, quando cruzamos com duas embarcações e resolvemos
parar a fim de ouvir um pouco sobre as histórias produzidas e reproduzidas no lugar,
e, sobretudo, aprender sobre a cultura, hábitos e costumes que se mostravam em
cada ponto do cenário dos campos inundáveis do Amapá. Refletíamos sobre a
política local, oportunidades de emprego, mudanças ambientais acontecidas nos
últimos anos e no quanto isso afetava as condições e experiências da vida cotidiana.
Destaco falas e argumentos produzidos na conversa, os quais foram registrados e
organizados em três categorias/eixos extraídos do próprio contexto em que o diálogo
foi realizado: políticas locais, alterações ambientais e convivência homem/ambiente.
5.1.1 Sobre políticas locais
A conversa inicia com a reclamação de um morador sobre um furto de gado
acontecido recentemente em suas terras, segundo ele, levaram quatro vacas
mansas de leite as quais não tinham preço, ou pelo menos não havia como
mensurar o valor de cada uma, considerando que serviam ao sustento de sua
família: esposa, filhos e netos. O diálogo prossegue sendo abordado temas como
saúde, educação, trabalho e os impactos ambientais no âmbito da comunidade.
Argumentavam que os políticos, não aparecem no local nem mesmo em
época de eleição com medo da cobrança dos moradores, já que as condições
básicas para oferta dos direitos sociais, diga-se de passagem, descritos no art. 6º da
Constituição Federal (BRASIL, 1988), são as mais precárias possíveis: ausência de
posto de saúde (somente existe um prédio abandonado em avançado estado de
deterioração), escola funcionando com extrema carência de recursos, ausência de
políticas que gerem emprego e renda no próprio local o que deduzo serem causas
potenciais de uma relação desarmônica com o ambiente, pois, logicamente e com
razão de sobra, a sobrevivência das famílias passa a ser a prioridade. Na intenção
de colocar em evidência as vozes dos informantes, apresento trechos de suas falas
em relação às políticas locais:
![Page 81: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/81.jpg)
80
“Deveriam reunir todos os criadores e pescadores. Pra ter o equilíbrio teria
que ter o apoio do governo, porque o governo tem que ter uma assistência pro
pescador e pro próprio criador também” (Sr. João)
“Os políticos têm que olhar mais pra cá, não tem um posto de saúde aqui na
comunidade e o roubo de gado é muito grande, sou criador de gado, faço queijo e
vendo, mas desse jeito estou tendo prejuízo” (Sr. Jardel)
“O governo promove uma perseguição ao criador de búfalo, mas parte da
comunidade sobrevive dessa criação e foi o Estado que anos atrás possibilitou a
compra de matrizes e incentivou a criação de búfalos”. (Sr. Mário)
“Os políticos nem aparecem aqui, então o que a gente sabe fazer é pescar, e é isso
que eu faço coma ajuda dos meus filhos” (Sr. Olavo)
Refletindo sobre esse tópico, passo a entender que as poucas ações estatais
que se apresentam no espaço comunitário, não são realmente políticas públicas,
são em verdade, aplicações locais de programas estabelecidos pelo governo federal
a exemplo do programa luz para viver melhor e seguro defeso para os pescadores.
Cabe destacar, que o ente federal desconhece as diversas realidades vividas nas
comunidades, e que, portanto torna-se incompetente no sentido de estabelecer
ações que atendam as necessidades locais, ficando no âmbito das generalidades e
universalidades. Evidentemente não acredito em soluções gerais, justamente pela
impossibilidade de se conhecer a diversidade de problemas, culturas e
conhecimentos construídos pelas relações vividas entre homens e natureza em cada
comunidade desse país. Por esse motivo, entendo que as políticas, sejam lá quais
forem ou em que áreas forem, devem, sobretudo nascer das práticas locais, com
todas as suas peculiaridades e subjetividades que só dizem respeito àquele contexto
social.
Fazendo uma análise sobre os efeitos nefastos das políticas de implantação
de parques e reservas nacionais sobre as populações tradicionais, Pimbert e Pretty
(2000, p. 184) dizem que:
![Page 82: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/82.jpg)
81
Falta de segurança em sua forma de vida enfraquece os esforços para
conservação, uma vez que a pobreza, a degradação ambiental e os
conflitos crescem em zonas contíguas aos parques nacionais e reservas
naturais. Na verdade, a degradação se torna mais provável quando as
comunidades locais são excluídas.
Com base nas informações apresentadas faço a seguinte indagação: O que
nos dizem as populações tradicionais?
Talvez essa pergunta fosse a primeira a ser feita, para assim pensarmos em
uma política ambiental séria e que atenda as necessidades das pessoas e não
somente aos interesses particulares de grupos empresariais que sob o “manto” de
protetores do meio ambiente, encurralam as populações locais em um ciclo de
pobreza e degradação humana, e, principalmente se estamos tomando como
pressuposto a premissa de que homem e natureza têm caminhado juntos ao longo
de toda a história, sendo no mínimo, contraditório pensar em conservação ambiental
sem levar em consideração o fator humano.
Tratando dos efeitos nocivos da economia de mercado, Diegues (2000a, p.
97) alerta que:
[...] a pauperização dessas populações tradicionais como fruto desses processos, e muitas vezes a miséria extrema, associada à perda de direitos históricos sobre áreas em que viviam, tem levado muitas comunidades de moradores a sobre-explotar os recursos naturais.
Afirmo que, obviamente, nem todas as práticas das comunidades locais,
acontecem de forma harmoniosa com a natureza, pois nem sempre é assim que
funciona esse processo relacional e complexo, mas, creio que boa parte do percurso
de degradação ambiental esteja acompanhado da ausência de políticas que
propiciem uma relação vantajosa para seres humanos e ambiente. Arrisco-me a
dizer que esta ausência de políticas acaba por estimular as comunidades locais ao
desenvolvimento de práticas danosas não só as espécies da fauna e da flora
presentes nesse espaço, como também, das próprias formas de sobreviver na
região, já que ficam em uma situação vulnerável, a qual permite a ação de
oportunistas, mercenários que veem a natureza como comércio em um mercado
lucrativo e nocivo às pessoas que mais dependem desse bioma. Estes se
aproveitam do conhecimento das populações tradicionais e intensificam a
exploração do que chamam de recursos naturais, causando prejuízos de grande
monta para os habitantes das comunidades.
![Page 83: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/83.jpg)
82
Não tenho dúvida que a valorização dos conhecimentos oriundos do fazer
cotidiano, passa pelo estabelecimento de políticas que tenham como foco os
saberes produzidos nas relações dos sujeitos que efetivamente vivem na Amazônia
e que por certo dependem desse espaço ambiental e cultural para sua
sobrevivência. Importante ficar claro que não estou partindo em defesa de uma
suposta validação científica para os saberes locais, o que enfatizo é a necessidade
de se entender os variados elementos e saberes componentes desse contexto e a
partir daí a construção de condições institucionais para a sustentabilidade local.
5.1.2 Sobre alterações ambientais
O ambiente de São Miguel foi bem alterado nas duas últimas décadas. As
mudanças não se restringem aos elementos paisagísticos, e sim, são sentidos em
outras dimensões como a quantidade e qualidade de espécies presentes na fauna e
na flora vivente nos campos, florestas, rios e lagos da comunidade.
Obviamente, tal fator não é fruto de uma ação isolada dos sujeitos locais,
tendo em vista que a alteração do ambiente vem acontecendo por um conjunto de
condições políticas, econômicas e sociais que durante a história recente dessa parte
da Amazônia, vem estabelecendo o tom da relação homem/natureza, editando
nesse contexto formas de convívio nem sempre respeitosas com o ambiente e muito
menos com os sujeitos que fazem parte da comunidade. Com efeito, penso ser
necessário superar a ideia clássica de que toda ação do homem sobre a natureza
configura-se como inimiga do meio ambiente (GÓMEZ-POMPA; KAUS, 2000), aliás,
esse é um discurso muito difundido pela mídia de maneira geral, e por grupos
vinculados a ideia de natureza intocada e intocável, que terminam por influenciar
concepções até certo ponto equivocadas de que o homem, em seu sentido mais
geral, é inimigo da natureza, e, portanto deve ficar fora de tudo que se refere ao
meio ambiente.
Esse pressuposto desqualifica o homem do campo, as populações
tradicionais e os saberes por eles produzidos, desabilitando-os ao convívio com o
seu habitat, pois, pressupõe-se que suas práticas violam os “santuários ecológicos”
construídos e estabelecidos no imaginário dos que se julgam os “guardiões da
natureza”. O problema com essa concepção, dentre outros, é que parece
![Page 84: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/84.jpg)
83
desconhecer, ou pelo menos seus adeptos não querem enxergar que essas
populações, comunidades convivem há muito tempo com o meio ambiente e
entendem a importância não de mantê-lo intocado, mas de retirar apenas o
necessário para sobrevivência demonstrando um equilíbrio efetivo no que concerne
à conservação do bioma.
O desequilíbrio acontece quando forças externas, principalmente oriundas
dos interesses do capital, passam a agir nas comunidades, ou pela ausência de
políticas públicas eficazes no sentido de garantir a sobrevivência do homem do
campo. Dentro dessa lógica, Loureiro e Layrargues (2013, p. 58) asseguram,
[...] que na sociedade contemporânea globalizada, há uma expansão contínua do mercado de matéria-prima, para suprir a demanda por mercadorias, acompanhada da precarização do trabalho, buscando assegurar a margem de lucro necessária à acumulação e à reprodução ampliada do capital.
Em coerência com o que venho dizendo narrativa e analiticamente nesse
trabalho, me proponho a imergir profundamente nas práticas ambientais locais,
convivendo, observando, anotando e interpretando ações, falas e imagens
expressadas no contexto onde as relações são vividas. À vista disso, tornou-se
possível apresentar os dados construídos em campo num texto com potencial para
demonstrar as interações e os impactos sofridos pelo meio ambiente, o que se faz
nas vozes dos participantes da pesquisa.
“Mudou muito, os campos secaram. Na minha época de criança, dali da
redenção pra cá, no verão a gente passava por dentro desse aningal. Aqui tinha um
atoleiro em pleno verão (apontando para uma parte só de água no inverno). A gente
tinha que estivar aningueira para passar. Aí com o passar do tempo secou e em
1983 aterraram o rio lá, e começou entrar carro, aí tinha ano que entrava e tinha ano
que não entrava. Agora tá com mais ou menos cinco anos que entra carro direto no
verão”. (Sr. Jardel)
“Antes a gente sentava uma rede, pegava peixe para sustentar duas famílias.
Serviço em quase todo canto tinha, hoje tem dificuldade, porque eles não sabe
administrar o país, atinge o Brasil todo, a crise não foi só lá fora, atingiu pescador,
agricultor, pecuarista, foi geral, hoje tá mais difícil”. (Sr. João)
![Page 85: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/85.jpg)
84
“Acho que a natureza com a interferência ou não do homem vai se
transformar. O problema é que estamos sofrendo com essas transformações. Vou te
dar um exemplo: da minha época pra cá já mudou muita coisa, Antes era muito farto
tinha grande quantidade de pirarucu, jacaré, tracajá e outras espécies, agora está
muito escasso”. (Sr. Mário)
“O peixe tá acabando, cada vez nós têm que ir mais longe para conseguir
pescar alguma coisa, mesmo quando tá cheio o lago [...] aqui perto já não tem muito
peixe grande, mesmo os pequenos tá difícil de pescar, são muitas redes” (Sr. Olavo)
A história contada por meio dos relatos de quem vive a realidade amazônica,
aponta para caminhos que não se acomodam na “ordem natural” das coisas, pelo
contrário, são observações e saberes construídos na necessidade de sobrevivência,
no sustento da família, na relação com a natureza e o meio ambiente, o que se faz
não por simples contemplação de belezas naturais, mas sim, por considerar que
conservar o ambiente está estritamente ligado ao fortalecimento dos aspectos
sociais, políticos e culturais na comunidade. Nessa linha de raciocínio, e em defesa
de uma ecologia política, Loureiro e Layrargues (2013, p. 4), lecionam que:
Na ecologia política a natureza é vista não somente como fonte de recursos, mas como ontologicamente prioritária para a existência humana, aquilo que nos antecede e que de nós independe, cuja dinâmica ecológica, mesmo que por nós mediada e transformada, precisa ser reconhecida e respeitada [...].
Os sujeitos deixam claro em suas falas que possuem a noção exata da
importância de manter uma relação harmônica com o ambiente, visto admitirem que
as mudanças de caráter predatório ocorridas nos últimos anos têm prejudicado os
modos de vida na comunidade, afetando aspectos como alimentação, trabalho e
saúde dos moradores, já que muitas espécies da fauna e da flora diminuíram ou
despareceram dos lagos, rios e florestas, ocasionando um severo desequilíbrio e
certo saudosismo sobre o que antes era encontrado em abundância na comunidade.
Os fatores apontados como cruciais para a alteração da paisagem e
desparecimento de espécies baseiam-se principalmente em três pontos: Ausência
de políticas públicas das mais diversas ordens, sobrevivência do homem local e
ação de agentes externos.
Durante o desenvolvimento dessa pesquisa, foi possível observar a ausência
de políticas ambientais que envolvam o homem do campo, que estejam voltadas
para garantia de direitos sociais mínimos. Definitivamente tal garantia não parece
![Page 86: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/86.jpg)
85
estar na ordem de prioridades do Estado, considerando o abandono suportado por
quem vive na comunidade.
Com o abandono estatal a sobrevivência no âmbito de São Miguel tornou-se
bem mais penosa do que deveria ser. Digo isso, pela tristeza com que os
informantes falam da abundância existente no passado e do que necessitam fazer
atualmente para garantir o sustento de suas famílias, por vezes adotando práticas
predatórias ao meio ambiente, o que por certo não fazem com orgulho. Fazem por
absoluta necessidade.
Quanto à ação de agentes externos, refiro-me principalmente aqueles que se
valem dos “recursos naturais”, exploração em larga escala para revenda em centros
urbanos, é o caso, por exemplo, dos denominados “geleiros”. Esses agentes
estimulam a pesca em larga escala, e em períodos não propícios a pesca (período
de defeso), compram o pescado por valores mínimos e revendem a preços bem
mais atraentes, principalmente na capital Macapá.
A comunidade precisa ter seus valores e saberes respeitados, não de forma
exótica e demagógica como receitam os discursos inflamados de grupos políticos
com interesses eleitoreiros, pois o que está em jogo não é um simples elemento
paisagístico, é sobretudo, um terreno cultural, formado por sujeitos que entendem a
importância da conservação do meio ambiente para sua sobrevivência enquanto
grupo local, tradicional.
5.1.3 Sobre a convivência com o meio ambiente
Proponho neste item uma indagação introdutória, com o propósito de que
sirva de parâmetro para as reflexões, ideias e afirmações que deverão constar no
decorrer do texto: O que, de fato, significa conviver em harmonia com o ambiente?
Inicio com essa pergunta por ter ouvido esse discurso de convivência
harmônica em diversas ocasiões na sociedade contemporânea, seja pelos meios de
comunicação, seja nas escolas onde tive oportunidade de atuar enquanto educador
ou mesmo nas falas de alguns políticos empunhando bandeiras de proteção à
natureza e de quebra anunciando destinos catastróficos e apocalípticos caso não
haja adesão ao seu projeto político de preservação ambiental.
![Page 87: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/87.jpg)
86
Então para proteger o ambiente, em nome de uma harmonia com a natureza,
há necessidade de anulação do homem? A natureza tem que ser mesmo algo
intocável, sagrado, como uma peça de museu? Ou seria uma obra de arte altamente
elitizada, inacessível aos não iniciados na arte de preservar?
A pertinência de minhas indagações reside no fato de que grande parte das
políticas e estudos sobre meio ambiente, preservação, conservação e
sustentabilidade, partem de agentes externos ao ambiente a ser "preservado”,
“conservado", assim a ideia que sustenta a ação é de que os sujeitos locais são
nocivos ao ambiente, e claro que a partir dessa visão, são estabelecidas as formas
designadas como corretas de convívio com o meio, obviamente excluindo o homem
local enquanto parte do contexto. Analisando o cenário, tomando como base as
ideias de Leff a Ingold, Cooper e Anjos (2014, p. 138) elucidam que:
Temos tido cada vez mais contato com informações díspares sobre o que pode ser definido como ambiente. Tal conceito, muitas vezes midiaticamente criado, tem se revelado a nós através de imagens e paisagens, da fauna e dos povos de todo o planeta, em inúmeros casos, com o acompanhamento de fatos e números montados para oferecer uma atraente, porém distante e impessoal mensagem. Estamos demasiadamente acostumados com essa forma de pensar sobre o ambiente que nos esquecemos de que este é, em primeiro lugar, o mundo em que vivemos e não o mundo que olhamos, observamos.
O olhar sobre a natureza precisa respeitar as necessidades humanas, pelo
menos é assim que penso enquanto alguém que vive na Amazônia e que busca
entender o que se passa na comunidade de são Miguel do Flexal. Proteger a
natureza sem levar em consideração o ser humano e suas necessidades, torna-se
algo extremista que leva a degradação de ambos, tanto do homem quanto da
natureza a qual faz parte. Nesse sentido, entender as ações que as populações
tradicionais vem praticando há séculos em determinadas áreas, configura-se como
aspecto basilar no que concerne a harmonia homem/natureza, principalmente se
partirmos da premissa de que a natureza intocada é um mito (DIEGUES, 2000a) que
pouco acrescenta na construção de uma ecologia com princípios de justiça social e
de uma natureza que se transforma e transforma o homem e suas ações. Tomando
como fundamento as ideias de Geertz (1997), considero o bom senso pressuposto
elementar para o desenvolvimento de práticas que não sejam nocivas ao ambiente.
Com esse objetivo, vejamos o que dizem os informantes:
![Page 88: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/88.jpg)
87
“Eles trabalham muito com o gado e a gente entende que o búfalo tá
acabando com o rio, abrindo outras valas, aí o rio escoa e pra comunidade está
sendo ruim, principalmente para os alunos da escola. Na época que seca bastante,
ficam algumas valas por onde os búfalos passam e vai escoando a água, por onde
poderia passar com as crianças agora fica seco. As crianças têm que esperar secar
totalmente para não correr risco de serem ferradas por arraia”. (Professora Helena)
“É questão de conscientizar a população, não só aos alunos, e sim, a
comunidade como um todo, se a gente não fizer desse jeito não tem como mudar o
que tá acontecendo aqui na comunidade de São Miguel, só que a situação é muito
difícil de ser mudada”. (Professora Bena)
“Essa época para mim é complicado porque eu não ando de animal. E
quando tá secando é pior porque tem que andar um bom pedaço pra pegar a canoa,
passei 32 dias sem poder sair daqui. Fiquei ilhada sem poder sair e isso tem a ver
como o meio ambiente”. (Professora Edileuza)
“Meu pai zurucando (movimento com uma vara ou outro instrumento em
direção ao fundo do lago, com a intenção de tocar casco de quelônios) aqui nessa
região acertava casco de tracajá, pegava só o que era necessário para alimentação,
ele era muito assim, não retirava mais do que ele precisava, lembro que ele ficou
muito aborrecido porque contou para algumas pessoas sobre esse local, aí foram lá
e acabaram, estragaram” (Sr. Mário)
“Precisamos aprender a conviver com a natureza como ela nos ensina,
porque não tem coisa mais importante de que a própria natureza, pois ela nos diz
pra onde a água deve correr. Devemos aproveitar o que a natureza tem a oferecer, e
a gente vai se adaptando as condições sem agredir. Sem aproveitar a natureza o
homem do campo vai perder toda a vontade de viver no próprio campo, porque sem
ajuda da natureza é quase impossível a sobrevivência no campo, não tem os
mesmos benefícios da cidade ” (Sr. Mário)
“Gente da própria comunidade e de todo o município, que são os que através
do fogo destroem a floresta, destroem os próprios locais, que as tracajás, por
![Page 89: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/89.jpg)
88
exemplo, se acomodam no inverno. Tacam fogo no aningal, aí acaba. Açaí no tempo
que eu cheguei pra cá tinha desconforme, hoje em dia a gente já encontra
dificuldade pra. conseguir esse alimento por causa do homem tá destruindo a
floresta”. (Sr. João)
“O pessoal foi botando fogo. Na época a gente pensava assim né, abrir
campo pra criar gado, mas só que o barranco foi se acumulando e fazendo uma
estufa. As queimadas acabaram com um bocado dos aningais, e o gado búfalo
também aumentou, acho que isso tá fazendo secar o lago” (Sr. Jardel)
Os saberes compartilhados pelos moradores da comunidade e também por
integrantes da escola: diretora, professores e alunos, demonstram preocupação com
o meio ambiente em uma perspectiva global e principalmente local, pois deixam
claro em suas falas os impactos que este vem sofrendo, de maneira mais intensa,
nos últimos anos, principalmente na fauna e na flora presentes em São Miguel. Vale
registrar que tais impactos afetam de forma determinante as maneiras de viver da e
na comunidade, considerando que as relações estabelecidas entre moradores e seu
habitat, passam por um processo de transformação, que, em regra, constituem-se
de forma muito mais predatória de que em outras épocas,
Conviver harmonicamente é algo que requer, antes de tudo, respeito aos
seres que habitam o local, sejam eles naturais ou sobre naturais. Refiro-me as
plantas e animais, mas não somente, falo também dos seres que povoam o
imaginário das famílias da comunidade, suas crenças, seus contos, suas festas, seu
folclore e fundamentalmente seus elementos culturais, presentes no dia a dia, no
que denomino nesse trabalho, tomando como referência Guarim (2000) de
experiência de vida.
A partir das experiências de vida, o homem local torna-se responsável pela
conservação do seu espaço, talvez não da forma como alguns ambientalistas
presumem ser a forma correta, redentora dos males do mundo, mas sim,
sustentados em suas práticas de vida cotidiana, tirando da natureza o suficiente
para o seu sustento e de sua família, e quem sabe, fomentar pequenas relações de
comércio.
![Page 90: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/90.jpg)
89
5.1.4 Sobre Educação Ambiental
A compreensão dos elementos que fazem parte do contexto ambiental é de
suma importância para a sustentação da comunidade, configura-se como um tipo de
saber presente no dia a dia dos indivíduos, porém, distante do ambiente escolar
(ponto discutido detalhadamente em itens posteriores). No campo da vida, as
famílias de São Miguel, retiram da natureza o que é necessário à sobrevivência e
entendem que conservá-la deve ser responsabilidade de todos, inclusive dos
agentes políticos, que segundo suas falas e percepções, encontram-se ausentes da
realidade da comunidade.
O processo de Educação Ambiental está presente na prática, na convivência
com a natureza, no fazer cotidiano, permeado por uma relação dialógica entre os
que de fato dependem do local. Diferentemente do que se possa imaginar em uma
visão romântica de proteção a natureza, o processo acontece de maneira
consciente, intencional, observando os elementos sociais, políticos e culturais que
envolvem o contexto amazônico. Considerando esse aspecto Gómez-Pompa e Kaus
(2000, p. 140) advertem que:
Às vezes esquecemos que a experiência muitas vezes é a melhor professora e damos maior importância aos títulos que vêm antes ou depois do nome da pessoa, ao jeito com que fala e ao material que escreve. Reagindo assim, criamos a barreira da educação formalmente estruturada e da linguagem, imposta às populações rurais.
As percepções de Conservação e Educação Ambiental, evidentemente sem
preocupação com construções teóricas sofisticadas, são princípios que norteiam as
práticas cotidianas da vida em comunidade, estão presentes no trabalho, nas festas,
no folclore e no entendimento dos ciclos naturais, mas infelizmente distantes da
escola e consequentemente da educação formal. Embora nas vozes dos que
trabalham na escola se observe a noção de importância do meio ambiente, o que se
vê no fazer escolar é um efetivo distanciamento e separação de conteúdos. Nesse
caso os conteúdos dos livros didáticos são sobrepostos e supervalorizados em
relação aos conteúdos da vida dos alunos e dos próprios professores atuantes na
escola. Partindo desse prisma, Guarim (2005) afirma que a escola do meio rural,
seguindo a cartilha oficial, promove uma desvalorização dos saberes locais,
estimulando um processo de enaltecimento do estilo de vida urbano em detrimento
do convívio local. Na busca de entender os meandros dessa relação até certo ponto
![Page 91: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/91.jpg)
90
conflituosa no que diz respeito à Educação Ambiental, torna-se salutar apresentar e
analisar o que dizem os participantes da pesquisa.
“Educação ambiental é saber conviver com a natureza sem destruir, e passar
esses conhecimentos para os mais jovens em um processo de respeito ao próximo e
ao ambiente”. (Sr. Mário)
“Tento mostrar pros meus filhos e meus netos como fazer pra caçar e pescar
sem acabar o que tem aqui” (Sr. Jardel)
“A gente vive do que tem aqui, os mais novos têm que manter, só sentar rede
pensando que não vai acabar [..].fica difícil, então tento ensinar o que eu sei” (Sr.
Olavo)
“Meu filho me acompanha no que eu faço aqui, ensino pra ele como tratar
com o gado, pescar e caçar, mas cada vez tá ficando mais difícil, muita gente de
fora pescando aqui” (Sr. João)
“Educação ambiental... é uma maneira de nós educadores passarmos para os
alunos, sobre o que não se pode fazer no ambiente em que vivemos”
(Professora Helena)
Em primeiro lugar vem a questão do ambiente, ter zelo pelo ambiente que a
gente vive, não só a população, o município tem que zelar pelo ambiente, porque vai
chegar um dia em vai ficar complicado. Vejo que a gente tem que conscientizar
nossos alunos em relação ao meio ambiente. Aqui na comunidade de são Miguel é
precário. Uma escola muito bonita mas a educação ambiental deixa a desejar.
(Professora Edileuza)
“É tudo quilo que nos rodeia, não é só o campo, é tudo, é a sala de aula, os
animais, os seres que estão ao nosso lado, os objetos, para mim é tudo isso”
(Professora Bena)
“Na verdade a gente tem aqui muita coisa para aproveitar como Educação
Ambiental, mas só que a gente assim é muito reduzido, as vezes falta incentivo, falta
![Page 92: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/92.jpg)
91
projeto, falta material pra gente dar....sempre tem que ter um cabeça, um chefe para
conduzir o processo e fazer um projeto sobre educação ambiental”.
(Professora Bena)
Valendo-me de pressupostos apresentados por Diegues (2000a) vejo como
interessante, esclarecer que fora do contexto local, principalmente em um plano
teórico, as concepções subjacentes quando se fala em Meio Ambiente e Educação
Ambiental, ainda possuem muito da visão de um mundo natural intocado pelo
homem, ou seja, para que a natureza continue preservada, dentro dessa visão, o
sujeito humano precisa ser retirado do ambiente. Neste caso, os defensores dessa
ideia parecem desconhecer, ou simplesmente desconsiderar o conhecimento das
populações tradicionais, e a ciência implícita em seus fazeres, que demonstram
conhecimento profundo dos diversos ciclos naturais controlados ou não pela ação do
homem em convívio com o ambiente natural.
No que concerne ao papel da escola no processo de Educação Ambiental,
acredito ser importante lembrar o que dizem Pereira e Guarim Neto (2009, p. 38)
acerca da matéria, os autores enunciam que:
Hoje, a Educação Ambiental caracteriza-se como instrumento que se propõe a contribuir na formação de cidadãos críticos, preocupados com a realidade e inseridos num processo contínuo de aprendizagem dentro da filosofia do trabalho participativo. Suas ações não devem ficar restritas à transmissão de conhecimento, mas também permear a cultura, inserindo-se no contexto social a partir da discussão e avaliação dos problemas das comunidades e oferecendo subsídios para solucioná-los.
A escola, tratando de Educação Ambiental ou qualquer outro tema, necessita
dialogar com quem está inserido no contexto, com quem efetivamente vive a
realidade, revisitar os saberes muitas vezes considerados marginais e obviamente
não condizentes com o que está prescrito nos programas oficiais. Com esse modo
de reconhecer as relações escolares e ambientais, posiciono-me junto aos que
entendem a educação a partir de um processo político, forjado nos saberes
construídos na multidimensionalidade do cotidiano, pois se a proposta é “que a
produção material e social da vida se dê em outras bases ontoepistemológicas não
podemos prescindir de uma educação ambiental crítica que contribua para
transformar as relações sociais de produção em direção a um outro projeto
civilizatório.” (TREIN, 2012, p. 314)
![Page 93: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/93.jpg)
92
Em uma perspectiva complexa e transformadora, resgatar os conhecimentos
produzidos no âmbito da vida cotidiana para dentro do ambiente escolar, torna-se
tarefa essencial para construção de um projeto político/ambiental/social/cultural que
dê conta de subverter a ordem estabelecida institucionalmente pelo discurso
educacional oficial.
5.2 Ordem e desordem no ensino de ciências: a complexidade da Educação
Ambiental
Antes de analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas pelos docentes
atuantes na escola de São Miguel, assim como, o ensino de ciências aplicado nesse
espaço de aprendizagem, torna-se necessário, para melhor entendimento de suas
peculiaridades, lançar um olhar sobre a conjuntura que envolve tais procedimentos,
a propósito, determinantes no que concerne a pedagogia vigente e as formas de
ensinar, aprender e produzir conhecimentos dentro e fora da sala de aula.
Inicialmente, evidenciam-se as precárias condições estruturais, físicas do
prédio da escola, somando-se a isso, a quantidade de insumos e recursos
financeiros insuficientes para dar conta das demandas apresentadas pela
comunidade escolar, o que por certo, não difere de muitas outras escolas da
Amazônia brasileira. Segundo relato da Diretora:
“A escola recebe apenas, por mês, R$ 380,00 (manutenção), R$ 211,00
(merenda), mas desse dinheiro de merenda, só pode usar 70%, R$ 147,70. O
restante é da agricultura familiar e não usamos, acaba voltando, já que não temos
pessoas aqui para fazer este tipo de compra, então não compramos”
“A direção da escola está sendo um longo e sofrido aprendizado, tenho que
matar um leão por dia, aliás, mato aranhas, baratas, só não mato cobras”
“Recebo menos como gestora do que se tivesse somente como professora.
No cargo, perco a regência de classe, dou aula e ainda tenho que fazer a merenda
(risos)”.
Embora não sejam muitos alunos em atividade, são 24 no total, distribuídos
em classes multisseriadas do 1º ao 5º ano, há necessidade de reconhecer as muitas
e sérias limitações enfrentadas por diretora, professores e alunos. Nessa
![Page 94: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/94.jpg)
93
perspectiva, entendo como apropriado, para fundamentar o cenário apresentado, um
pensamento de Freire (1996, p. 66) no sentido de que:
O professor tem o dever de dar suas aulas, de realizar sua tarefa docente. Para isso, precisa de condições favoráveis, higiênicas, espaciais, estéticas, sem as quais se move menos eficazmente no espaço pedagógico. Às vezes, as condições são de tal maneira perversas que nem se move. O desrespeito a este espaço é uma ofensa aos educandos, aos educadores e à prática pedagógica.
Esse parece realmente ser o cenário mais acertado para empregar essa ideia,
estendendo o sentido da premissa a toda comunidade escolar, considerando que
sofrem um abandono estatal e político, que atinge o processo formativo e a
possibilidade de desenvolver práticas pedagógicas talvez mais adequadas ao
contexto. Sempre ouvi dizer que ser professor não é tarefa fácil e realmente não é,
imagina então desempenhar este ofício em um lugar tão rico e ao mesmo tempo tão
desprovido dos recursos elementares para o funcionamento de uma instituição
educacional.
O primeiro contato que tive, em nível formal, aconteceu com a diretora da
escola, professora Helena, a qual oportunizou o início e prosseguimento da
investigação, sendo a ela explicado o projeto de pesquisa e a importância desse
trabalho para a comunidade, assim como, para o conhecimento científico. O tom da
conversa não seguiu para a formalidade, facilitando o entendimento e o
envolvimento com os problemas enfrentados por aqueles que fazem a educação na
localidade, principalmente os concernentes aos recursos disponíveis para o
desenvolvimento de uma educação ambiental, politizada e cidadã, com potencial
para transformar realidades.
Os dados, que em verdade são construções históricas, sociais e culturais de
uma comunidade, adiante apresentados, são reflexos de observações e análises de
práticas e falas dos informantes diretamente de seus contextos educativos. Vejamos
o que esses agentes nos dizem a partir dos questionamentos realizados durante a
pesquisa.
Enunciando sua visão sobre a comunidade de São Miguel, a diretora da
escola se pronunciou da seguinte maneira:
“É formada por gente humilde, em geral pescadores, que vivem faz muito
tempo na comunidade, possuem raízes aqui”.
![Page 95: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/95.jpg)
94
“Tem também os criadores de gado, donos de grandes terrenos, eles criam
búfalos e pra mim isso tem sido prejudicial ao meio ambiente, pois os búfalos
formam grandes valas fazendo secar muito rápido”
“E mais, eles poderiam fazer outra coisa, tipo agricultura, possuem terrenos
imensos aqui, mais eles não tem costume de fazer isso e nem trabalhar somente
com bovino. Aí eles pegam aqueles gados que estão lá [...] perdidos lá no que eles
chamam de brabeza e vão criando. Eu particularmente não acho interessante”
A fala deixa evidente a existência de problemas sociais e ambientais, os quais
estão interligados por uma teia de práticas e conhecimentos que se sustentam por
meio das condições e experiências de vida convergentes e divergentes nesse
espaço intersubjetivo que é a Amazônia amapaense, onde os indivíduos necessitam
sobreviver, viver e conviver com o meio ambiente num cambiante processo de
ensino/aprendizagem. Em proximidade com esse pressuposto, e em defesa do
saber tradicional pantaneiro Guarim Neto (2006, p. 74) lembra que:
O momento da pesca, da preparação de artefatos, das caminhadas nas roças e pastos, do cultivo de subsistência, da condução da boiada e outros, são ricos no repasse do conhecimento, pautado na forte oralidade que permeia essas ações. O aproveitamento desses elementos em uma proposta educativa, tendo como instrumento a Educação Ambiental, deve prever a sua introdução gradativa no seio da formalidade do saber escolarizado.
O contexto descrito tem a intenção de funcionar como um breve preâmbulo
para o entendimento das práticas pedagógicas desenvolvidas no âmbito escolar,
afinal, para entendê-las de maneira coerente, torna-se necessário um mergulho nos
condicionantes históricos que regem as relações locais, e, nessa perspectiva, a
escola configura-se como uma das engrenagens sociais que movimentam a
comunidade e que provavelmente fazem com que ela se constitua de uma
determinada maneira, refletindo-se na educação formal e informal (ARANHA, 2006),
no trabalho, no convívio social, familiar e nas tradições culturais do povo que ali vive,
em um intenso processo produtivo caracterizado por peculiaridades que ”combinam
formas materiais e simbólicas com as quais os grupos humanos agem sobre o
território” (CASTRO, 2000, p. 167).
Destaque especial faço para o que a informante chamou de “brabeza”, neste
caso, referindo-se a Reserva Biológica Lago Piratuba, onde muitos jovens arriscam
![Page 96: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/96.jpg)
95
a vida em busca de laçar bubalinos que se encontram em estado selvagem dentro
da reserva e que por vezes torna-se a opção de sobrevivência, neste caso uma
atividade extremamente perigosa e que exige habilidades voltadas ao trato com o
gado e uma resistência diferenciada às intempéries naturais.
Efetivamente não existe fórmula para educar e certamente muito menos para
se construir cidadania, visão científica e práticas pedagógicas de cunho ambiental,
muito embora, existam, ainda nos dias atuais, aqueles que arduamente se debruçam
na tarefa de criar/inventar/descobrir/aplicar/replicar procedimentos metodológicos
que por vezes se tornam muito mais âncoras pedagógicas, terrenos sossegados de
conteúdos do que propriamente espaços e possibilidades de diálogo e construção
do conhecimento. Tratando sobre a construção do conhecimento científico na
escola, Trivelato e Silva (2013, p. 9) ressaltam que:
[...] quando pequenas, ainda na fase pré-escolar, as crianças geralmente têm uma relação prazerosa com os conhecimentos relacionados aos fenômenos da natureza e da sociedade. Sentem satisfação em formular questões sobre o assunto, fazer explorações e descobertas, levantar hipóteses e tentar explicar o mundo a sua volta. No entanto o que se percebe é que, no decorrer da escolaridade, essa relação prazerosa com o conhecimento muitas vezes vai se perdendo. Uma das tarefas do professor do Ensino Fundamental é evitar que isso aconteça, proporcionando atividades que propiciem um aprendizado prazeroso e com significado.
Aprender exige em primeiro lugar um querer aprender, sentir-se estimulado a
descobrir por meio da curiosidade as relações que dão sentido ao mundo em um
jogo que não tem ponto de partida ou de chegada, mas que está em constante
movimento, visto constituir-se na ordem e na desordem, no universal e no particular,
no acerto e no erro, naquilo que é dito e não dito, em um tecido complexo de
informações e pensamento. No que concerne a complexidade e sua relação com a
ciência e o conhecimento de modo geral, é Morin (2005), em oposição ao paradigma
simplificador adotado pela ciência moderna, quem busca esclarecer a história, ou
pelo menos trazer para o campo do debate um outro paradigma, da complexidade,
não limitado pela linearidade e disciplinarização, com potencial para interagir com a
desordem, contradição, pluralidades, com o caos. Assim o autor afirma que:
De fato, a aspiração à complexidade tende para o conhecimento multidimensional. Ela não quer dar todas as informações sobre um fenômeno estudado, mas respeitar suas diversas dimensões: assim como acabei de dizer, não devemos esquecer que o homem é um ser biológico-sociocultural, e que os fenômenos sociais são, ao mesmo tempo, econômicos, culturais, psicológicos etc. Dito isto, ao aspirar a multidimensionalidade, o pensamento complexo comporta em seu interior um princípio de incompletude e de incerteza. (MORIN, 2005, p. 177)
![Page 97: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/97.jpg)
96
Invoco a ideia do paradigma da complexidade por acreditar que o ambiente
educacional necessita ser observado e vivenciado a partir do jogo das relações e
interações que se estabelecem entre os sujeitos participantes do processo educativo
e entre estes e os objetos de estudo. Nessa perspectiva, o professor e suas práticas,
ganham papel de destaque no processo de aprendizagem, pois é ele quem,
juntamente com os alunos, deve estabelecer o que, por quê? e como algo deve ser
trabalhado em sala de aula, permitindo que os conteúdos locais sejam colocados na
ordem do dia ou dos dias, suplantando a mera utilização do livro didático como “o
instrumento didático/metodológico”. Analogamente, Lima (2009, p. 148), considera
que a ideia de “[...] complexidade se justifica pela premissa que compreende as
questões ambientais como inerentemente interdisciplinares e multidimensionais, não
sendo possível abordá-las adequadamente por olhares disciplinares e
reducionistas”.
A complexidade do ponto de vista ambiental crítico, trabalha no sentido de
produzir relações em que o sujeito cultural e histórico atua na e com a natureza em
um processo de articulação movido fundamentalmente pela necessidade de
construção de uma racionalidade ambiental com vistas à sustentabilidade dos povos
e do ambiente. (LEFF, 2000).
Sustentada em suas vivências como educadora, e obviamente em seu
repertório teórico, a gestora da escola, explica sua maneira de agir em relação aos
procedimentos pedagógicos desenvolvidos na escola de São Miguel, o que leva a
uma reflexão do que realmente é considerado importante para que os alunos
aprendam naquele contexto.
“Deixo os professores a vontade, não pego os conteúdos deles, mas é
explorado apenas o básico, pois damos atenção a língua portuguesa e matemática,
pois temos que alfabetizar esses alunos. Precisam aprender a ler e conhecer o
básico da matemática para poderem prosseguir” (Professora Helena)
Torna-se institucionalizada a receita do que deve ser aprendido, dos
conhecimentos que estão postos como prioritários, no caso Língua Portuguesa e
Matemática, pois na visão da educadora, pelo menos é o que consigo interpretar
não somente de sua fala, mas do contexto em que a conversa acontece,
![Page 98: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/98.jpg)
97
primeiramente se deve aprender números e letras, cálculos, palavras e frases e
somente a partir daí, alçar outros voos. Com essa lógica de pensamento, as
interligações, a dinamicidade e a não linearidade do conhecimento fica perdida na
preocupação em “alfabetizar”, desconhecendo-se que o processo de alfabetização
exige pluralidade de conhecimentos e fundamentalmente que existe um jogo
contextual de ensino/aprendizagem onde os conteúdos nascem de problemas reais
e saberes produzidos na vida cotidiana. Dessa forma, alfabetizar e estar alfabetizado
exige compreensão da multidimensionalidade do saber, distanciando-se da
disciplinarização exacerbada vigente no modelo educacional brasileiro.
Posicionando-se contra a visão positivista da educação e em favor de uma
concepção construída na história e na provisoriedade do conhecimento, Pozo e
Crespo (2009, p. 23) chamam atenção para o fato de que:
Um sistema educacional, mediante o estabelecimento dos conteúdos das diferentes disciplinas que compõem o currículo, tem como função formativa essencial fazer com que os futuros cidadãos interiorizem, assimilem a cultura em que vivem, em um sentido amplo, compartilhando as produções artísticas, científicas, técnicas, etc. próprias dessa cultura e compreendendo seu sentido histórico, mas, também, desenvolvendo as capacidades necessárias para acessar esses produtos culturais, desfrutar deles e, na medida do possível, renová-los. Mas essa formação cultural ocorre no marco de uma cultura da aprendizagem que evolui com a própria
sociedade.
Há necessidade de professores e alunos se aventurarem em novos
caminhos, nem sempre os mais seguros e estáveis, por vezes até escorregadios e
movediços, porém, abertos a novas trilhas e descobertas, forjadas na instabilidade
que caracteriza a vida humana e sua história. Assim, o currículo é colocado em
movimento e passa a ser terreno de contradições e tensões ambientais, políticas,
estéticas e científicas.
Muito embora acredite que a educação ao invés de uma sinfonia
perfeitamente harmônica, orquestrada, seja em verdade o encontro de dissonâncias
e improvisos que acontecem no cotidiano escolar em busca de algo inovador e
singular, penso que o educador ocupa papel de destaque nessa relação, não como
um maestro, talvez um violonista, saxofonista ou pianista em uma banda de jazz,
respeitando os espaços de cada instrumentista, mas em certos momentos
subvertendo as convenções harmônicas e musicais.
![Page 99: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/99.jpg)
98
Fazendo alusão a sua forma de trabalhar os conteúdos em sala de aula, e
com a convicção de que está fazendo o melhor possível para ensinar o que “deve
ser ensinado”, a Professora. Edileuza descreveu seu método da seguinte maneira:
“Pego o conteúdo e coloco lá. Por exemplo: seres vivos. Faço uma introdução
básica do que é ser vivo e de lá faço com que meu aluno se interesse por isso aí, e
ele vai buscar imagens pra mim. Dessa forma que eu venho trabalhando. E também
tento pegar coisas da região. Educação do campo” (Professora Edileuza)
“fizemos um peixinho em dobradura de papel. Colaram no papel e isso
chamou muito a atenção deles. Tudo que faço de diferente, chama a atenção dos
alunos e facilita a aprendizagem”.(Professora Edileuza)
A docente, dentro de suas possibilidades teóricas e formativas, estabeleceu
seu modo de ensinar, obviamente buscando a segurança dos conteúdos prescritos
no livro didático utilizado, e em um procedimento rotineiro que segundo sua lógica
de pensamento, “facilita” a tarefa diária.
Propondo um deslocamento na forma de pensar a educação e o próprio ato
de ensinar/aprender e ser professor, em especial na Amazônia, recordo do
pensamento de Chaves (2003, p. 96) quando afirma que
[...] ser professor na Amazônia pode ser punk, muito punk. Pois, tal como os ingleses, da origem do movimento punk, somos identidades marginais num mundo globalizado e por isso, na condição de marginais, não precisamos preservar, policiar nossos discursos do perigo iminente dos outros, outros discursos. Estamos na condição de inventar novos discursos, novas identidades, na posição de transgressores, de quem não se espera nada, mas de onde tudo pode vir [...]
As práticas rotineiras relatadas pela docente são produtos de um fazer
pedagógico simplificador, alheio a complexidade das relações cotidianas
experimentadas em nível local. Certamente a docente desconhece, ou não se sente
livre o suficiente para ser punk, para transgredir as normas, as verdades
convencionadas, nessa situação, em um livro didático, já que a escola não conta
nem mesmo com a vigilância e controle estatal.
Não me cabe, enquanto pesquisador, e nem tenho a pretensão de fazê-lo,
avaliar, julgar ou simplesmente apontar o “certo” e o “errado” nas práticas
desenvolvidas, porém, considero necessário refletir sobre o que está sendo feito na
![Page 100: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/100.jpg)
99
educação oferecida na comunidade e a partir disso ajudar na construção de
ferramentas que permitam compreender o ensino/aprendizagem como algo forjado
nas diversidades e singularidades da região.
Com toda certeza não seremos castigados por colocarmos a prova o que
aparentemente é verdadeiro. O aluno necessita ser desafiado a ir em busca de suas
verdades a partir de seu cotidiano, daquilo que vive em sua comunidade. Que
conhecimentos permeiam sua vida? Que ciência está subjacente às práticas
desenvolvidas pelos membros da comunidade?
Com essas indagações em mente iniciei conversa com Professora Bena a
qual tentava me iniciar “nas coisas da comunidade”, no seu funcionamento, nas suas
regras de conduta e, de maneira muito intensa, nas dificuldades para desenvolver
um trabalho “de melhor qualidade”. Em sua visão, a conjuntura que envolve a
comunidade influencia diretamente na atuação dos professores, o que certamente
não duvido, porém, admito ser possível tomar as rédeas da situação e escapar do
enquadramento imposto pela não-política local.
Sendo coerente, mas de certa forma politicamente ingênua, com seus
argumentos, Bena, de maneira muito breve narrou seus procedimentos pedagógicos
ministrando aulas de Ciências a partir do tema Meio Ambiente.
“Fazemos desenhos utilizando colagem, cartazes e o resto é conteúdo do
livro, fica mais fácil trabalhar desse jeito. As dificuldades são muito grandes aqui, aí
acabamos seguindo o livro didático”. (Professora Bena)
“Quando trabalhamos partes das plantas, cortamos as partes. Dividi em
grupos e cada um foi fazer sua planta com suas partes. Foi bem interessante,
chamou a atenção dos alunos. Despertou o interesse deles”.(Professora Bena)
De fato, ensinar “nas bandas de cá”, é algo que certamente, como se diz por
aí, não é o desejo de consumo de muitos professores, considerando as condições
institucionais e sociais precárias vigentes na região. Contudo, é algo desafiador, que
inspira coragem dos professores que atuam nessas condições, que, sobretudo
possuem plena convicção da importância do trabalho que desenvolvem em São
Miguel, daí a responsabilidade em fazer a diferença, em despertar em si e nos
![Page 101: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/101.jpg)
100
alunos o espírito curioso e crítico característico da humanidade, por vezes silenciado
e amordaçado pelos que se julgam donos do saber e do poder.
Tratando da visão crítica sobre Educação Ambiental, e da importância de
superar concepções conservadoras que invariavelmente amordaçam professores e
alunos, Lima (2009, p. 156) afirma que
com relação ao diálogo intraescolar, a EA crítica alimenta o desejo de uma renovação profunda de todo ambiente educativo a partir de seu sistema de ensino-aprendizagem, seus métodos, princípios epistemológicos e paradigmáticos, conteúdos curriculares, formas de organização e relação com o entorno. Claro que, dado ser a escola uma instituição inserida em uma estrutura social mais ampla, essas mudanças encontram obstáculos diversos como, por exemplo, a adoção de princípios interdisciplinares e de transversalidade que sejam os mais visíveis. (LIMA, 2009, p. 156)
Posiciono-me junto àqueles que ao longo de sua trajetória não se deixaram
abater pelo pessimismo de que “nada muda e nada vai mudar”, aliás, esta máxima
muito difundida na sociedade brasileira, em especial, no momento político atual em
que verdadeiras quadrilhas dilapidam o patrimônio público e subtraem direitos
trabalhistas e sociais, tem servido como argumento para manter tudo como está,
sustentando-se no discurso de que “O Brasil não tem jeito e de que tudo aqui acaba
em pizza”.
Freireanamente advogo pelo otimismo, não de maneira ingênua, mas sim de
forma engajada, politizada, em uma perspectiva dialógica, transformadora,
reconhecendo que toda sociedade, comunidade, tem problemas gerais e
particulares que devem ser enfrentados no hoje, na história vivida, suplantando o
discurso de espera de um futuro melhor, afinal “os educadores e as educadoras
progressistas coerentes não têm que esperar que a sociedade brasileira global se
democratize para que elas e eles comecem também a ter práticas democráticas com
relação aos conteúdos”. (FREIRE, 1992, p. 114)
O engajamento político na ação docente configura-se como eixo fundante da
construção de concepções e práticas pedagógicas otimistas, que tenham como
propósito não apenas o repasse de conteúdos de ordem física ou natural, mas sim,
formadoras e fomentadoras de uma educação com potencial para transformação
socioambiental. Comunidade, educadores e alunos encontram-se em um terreno
arenoso que exige a construção de esquemas e estratégias que subvertam os
padrões didáticos convencionais, já que encontram-se em uma cenário com
problemas e peculiaridades constituídos na dinâmica comunitária. Dialogando sobre
![Page 102: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/102.jpg)
101
aspectos da política local e sobre ensino,/aprendizagem o professor Gabriel também
expressou a organização do trabalho que desenvolve em sala de aula.
“Trabalho com o livro, mas procuro incentivar e ouvir os alunos. Tento fazer
com que eles aprendam o conteúdo que vai ser importante pra vida deles”
(Professor Gabriel)
“Procuro usar os conhecimentos dos livros e relacionar com a realidade da
comunidade, observando como funcionam as coisas aqui, mas nem sempre é fácil,
temos um conteúdo básico que deve ser trabalhado e muitas vezes nem
conseguimos”. (Professor Gabriel)
Novamente ressurge a preocupação em “vencer os conteúdos”, em cumprir,
ainda que de forma parcial, o que está prescrito nos livros didáticos adotados pela
escola, visto que na visão dos docentes, sem a aquisição dessas informações pré-
elaboradas, não há como os alunos progredirem em seus estudos e mesmo na vida,
pois em suas palavras “para ser alguém, é preciso estudar”.
Realmente estudar faz parte do processo de socialização e humanização,
além de propiciar avanços no campo científico e tecnológico, mas, em nome de uma
visão crítica do processo educativo, e da necessidade de “virar a mesa” em favor de
educandos e educadores penso ser necessário indagar o que estudar? porque
estudar? E porque estudar determinados conteúdos e não outros talvez mais
condizentes com as realidades locais?
Os questionamentos levantados apontam não para uma resposta definitiva
aos problemas educacionais da comunidade, mas instigam que nos aventuremos
em campos, rios e lagos menos estáveis, com maior turbulência, sem um caminho
pré-determinado, pois estão cheios de bifurcações e novas trilhas construídas nos
diversos acontecimentos, para isso basta que tenhamos o espírito livre e o otimismo
daqueles que se arriscam sem medo de errar, pois para os que se aventuram, o
“erro” faz parte do processo de aprendizagem.
Considerando a importância política e pedagógica da perspectiva otimista da
educação como elemento de transformação do fazer pedagógico e afirmando que a
atividade docente situa-se no campo coletivo do saber e do saber fazer, Carvalho e
Gil-Pérez (1995, p. 18) ensinam que:
![Page 103: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/103.jpg)
102
[...] a complexidade da atividade docente deixa de ser vista como um obstáculo à eficácia e um fator de desânimo, para tornar-se um convite a romper com a inércia de um ensino monótono e sem perspectivas, e, assim, aproveitar a enorme criatividade potencial da atividade docente.
Suponho então, que as práticas pedagógicas devem estar voltadas aos
interesses de educandos e educadores, afinal este é o propósito de uma educação
que visa o desenvolvimento pleno da cidadania, pelo menos isso é o que está
descrito como finalidade da educação nacional na Lei de Diretrizes e Bases em seu
artigo 2º afirmando a educação como “[...] dever da família e do Estado, inspirada
nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade
o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e
sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1996). Espero que minha referência a Lei
não tenha sido interpretada de forma irônica, mas se assim for entendida, não posso
culpá-los, posto que, boa parte de seus dispositivos não refletiram nem de longe
como de fato funcionou a educação nacional nos últimos 21 anos no país da
péssima distribuição de renda e de recursos.
Quando abordo esse conteúdo, procuro me conter para que o texto não fuja o
seu propósito de abordar a Educação Ambiental e o ensino de ciências, mas o
comedimento é de certa forma equilibrado pela perspectiva complexa com que
busco analisar a educação na comunidade de São Miguel, observando suas
relações intra e extraescolar, seus aspectos históricos, políticos e culturais que em
verdade, deveriam constituir a base do processo educativo e do fazer pedagógico
docente.
5.3 Textos e contextos na construção do conhecimento ambiental
Certamente, alunos, professores e demais indivíduos pertencentes à
comunidade de São Miguel, possuem um repertório de conhecimentos construídos
na emergência das relações cotidianas, nas práticas sociais e culturais que
fundamentam um saber e um saber fazer por vezes negligenciado e até negado pela
educação formal escolar, mas que de fato, são vitais para sobrevivência nessa
região da Amazônia amapaense.
O saber, nesse caso, é efetivamente produto e produtor das relações de
convívio social, tendo influencia direta no trabalho, na cultura, na forma de
problematizar e entender o mundo em sua complexidade. Corroborando com esse
![Page 104: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/104.jpg)
103
pensamento Layrargues e Lima (2014, p. 33) entendem que “as dimensões política e
social da educação e da vida humana são fundamentais para sua compreensão,
mas elas não existem separadas da existência dos indivíduos, de seus valores,
crenças e subjetividades”. Partindo da constatação de que existem, no âmbito da
comunidade, conhecimentos que se entrelaçam em uma teia de informações e
vivências, indago-me como a escola vem trabalhando esses conteúdos? Que
práticas pedagógicas os professores desenvolvem no sentido de valorizar ou negar
esses conhecimentos?
Adianto, amparado em minhas observações e interpretações, que, em geral
as aulas ministradas são conduzidas apenas dentro do espaço da sala de aula,
deixando para o lado de fora das paredes inúmeras possibilidades de aprendizagem,
optando-se pelo livro didático e pela lousa, como recursos didáticos dominantes, e a
aula expositiva como método principal de ensino, evidenciando-se conteúdos
distanciados da realidade, diria até, bem próximos ao que Freire (1987) denominou
como concepção “bancária” de educação em contraposição a uma visão
emancipadora e problematizadora dos processos de ensino/aprendizagem.
Na intenção de estabelecer certa ordem, sem perder de vista o caos e a
desordem que fazem parte dessa construção multidimensional, apresento
narrativamente três episódios que, de maneira singular e contextual, permitem uma,
dentre outras possíveis, interpretação do fazer pedagógico praticado pelos docentes
e seus modos de entendimento sobre os conhecimentos prévios dos alunos.
Episódio 1 – Professora Bena
A aula se inicia com a professora sentada, abrindo o livro de Língua
Portuguesa como um “procedimento padrão”, quem sabe uma fórmula para ensinar
da maneira que aprendeu, ou talvez por considerar que este seja o método mais
adequado para o ensino naquele contexto, ou ainda por acreditar que nesse roteiro
reside a segurança e a eficácia do processo ensino/aprendizagem.
Cada aluno está inquietamente postado em sua carteira, e em ocasiões
pontuais, tentam completar as falas da professora que de maneira proposital, faz
pausas no que está pronunciando, provavelmente imaginando que está
possibilitando a participação dos alunos e assim o progresso da aprendizagem dos
conteúdos.
![Page 105: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/105.jpg)
104
O fato é que os esforços e os procedimentos pedagógicos adotados
encontram-se perturbadoramente limitados por uma rotina de trabalho previamente
programada, na qual docente e discentes, parecem estar automatizados, presos a
um cenário em que não se oportuniza possibilidades de problematização, bem como
fomento ao diálogo e a criatividade, condições indispensáveis para uma
aprendizagem politizada, engajada, com potencial para promover mudanças de
pensamentos e atitudes em relação ao meio ambiente e aos problemas
socioambientais vigentes na comunidade. Sob o mesmo ponto de vista Alves (2016,
p. 108) afirma que,
[...] levar em conta necessidades, experiências e interesses dos estudantes; valorizar o diálogo, a negociação e a construção de novos sentidos; promover a reflexão, a produção de ideias e comprometer o estudante com a própria aprendizagem são todas condições importantes para motivar o estudante a superar a perspectiva reprodutiva da aprendizagem e motivá-lo
a aprender de forma criativa e produtiva.
Estou certo de que não existe uma forma universal para aprender, validada
cientificamente como "a forma", afinal a diversidade de realidades e de interações as
quais dependem de uma série de fatores, dentre eles o cultural, não se enquadram
em fórmulas previamente elaboradas e testadas como o remédio para todos os
males. Dessa maneira, ainda concordando com Alves (2016, p. 98) assumo “[...] que
uma estratégia de ensino de ciências é usada por um professor específico, com
determinada formação, em um dado contexto institucional, com um currículo
próprio”.
Em determinado momento escuto que os alunos deveriam ter lido e
respondido o texto com suas palavras, já que as perguntas estavam indicadas no
livro e as respostas, obviamente, deveriam estar de acordo com o gabarito marcado
no livro do professor. A orientação repassada pela professora merece destaque,
visto ficar claro sua dependência em relação ao prescrito nos livros. Nessa
perspectiva, o “conteúdo correto” está vinculado a uma realidade externa, fora do
contexto local, e dessa maneira, aquilo que emerge dos saberes produzidos nas
relações cotidianas acaba por perder importância e legitimidade. Assim, o
conhecimento local deixa de ter papel protagonista, preponderante, gerador e passa
a ser simplesmente uma forma exótica de conhecer. Esse pressuposto fica evidente
na fala da professora Bena, explicando sua maneira de tratar os conhecimentos dos
alunos.
![Page 106: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/106.jpg)
105
“Sim, utilizo o conhecimento deles, não todos, mas é um meio deles se
interessarem, pois tento valorizar o que eles já sabem, porque eles já têm aquele
conhecimento que trazem de casa, da convivência com a família, com os
coleguinhas, com os mais velhos” (Professora Bena)
Dentro dessa lógica, os conteúdos considerados legítimos, já estão definidos,
fazem parte de um rol de conhecimentos elaborados, avaliados e comprovados
cientificamente como adequados para a aprendizagem dos alunos de cada classe e
de cada faixa etária. Via de regra é assim que tem funcionado, porém, em favor de
uma Educação Ambiental crítica e cidadã, postulada em uma visão otimista do
processo educativo, acredito firmemente na possibilidade de subverter essa ordem
em busca de alternativas pedagógicas que não só permitam valorizar o saber local,
mas que fundamentalmente se constituam como parte integrante desse contexto.
Conduzir o olhar para fora da sala de aula permite colocar o mundo em
movimento, possibilita o diálogo com as necessidades de educandos e educadores,
tornando possível um processo educacional produzido a “ferro e fogo”, forjado na
prática de vida dos que convivem nesse ambiente, logo, os conhecimentos já
construídos e em construção pelos alunos tornam-se condição essencial para a
aprendizagem no que concerne ao ensino de ciências em uma perspectiva
ambiental, haja vista, as crianças conviverem com a natureza, com suas tradições e
cultura, aprendendo conteúdos, provavelmente nunca experimentados pelos
professores.
Episódio 2 – Professora Edileuza
Aluno por aluno leva a tarefa para a professora corrigir, depois retornam as
suas carteiras silenciosamente e continuam o exercício, assim a aula se estende,
nesse ritmo sonolento por todo o período da manhã. Os alunos pintam figuras dos
livros e cobrem os desenhos pontilhados com a dedicação de quem tem a certeza e
a responsabilidade da necessidade de cumprimento do dever.
Muito embora a escola não consiga trabalhar com o que podemos chamar de
conteúdos emergentes, nascidos dos problemas e necessidades da comunidade,
seu prestígio continua inabalado, pois o que se observa, é a fé, às vezes beirando a
![Page 107: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/107.jpg)
106
cegueira, de que ali está o caminho a ser trilhado e que os conteúdos prescritos são
a chave para a mudança nas condições de vida. No entendimento de Guarim (2005,
p. 42):
Mais do que refletir as desigualdades sociais rurais e urbanas, é possível perceber que a questão da cidadania e os problemas da comunidade estão ausentes do cotidiano escolar. A escola não tem conseguido criar laços entre ensino e sociedade. Mesmo assim, os pais e a comunidade supervalorizam a escola, dando-lhe credibilidade.
Interessante notar que mesmo as atividades desconectadas da realidade
local, mas que em algum momento fogem a rotina diária, despertam o interesse dos
alunos, como por exemplo, a aula de ciências adiante descrita em que a docente
introduz um estudo sobre reprodução de plantas centrando-se em uma flora não
encontrada na região e indiscutivelmente desconhecida dos alunos.
“As plantas podem se reproduzir por meio de:
Sementes: necessitam de terra apropriada, água, ar e calor para a
germinação. Ex: Pinheiro – do – Paraná
Mudas: Galhos que originam novas plantas. Ex: Videira
Folhas: Ex: Violeta – africana
Caules: bulbos, tubérculos que dão origem a novas plantas. Ex: Batata”
Há, efetivamente, certa contradição entre o falado e o executado em sala de
aula, posto que a docente demonstra-se, no desenvolvimento da aula, conformada
com o que Geertz, (1997, p. 331) chamou de “Taxionomia de cabeçalho de jornal” e
em sua fala, aponta, embora de maneira transmissiva, a possibilidade de
aprendizagem com os alunos ou pelo menos uma troca de informações no sentido
de entender os problemas locais. Em sua fala diz o seguinte:
“Eu transmito informações pra eles assim como eles me transmitem, porque
eu não conhecia a realidade deles, então a gente troca ideias. Eu aprendo com eles.
Com todos os problemas o aluno ainda chega aqui disposto a aprender, isso é muito
gratificante” (Professora Edileuza)
A abstração que faço da situação apresentada é a de que a docente, talvez
de forma mecânica, reproduza dois discursos que acabam se refletindo em sua
![Page 108: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/108.jpg)
107
maneira de ensinar e de aprender: o primeiro sustenta-se em suas práticas
pedagógicas aplicadas no ambiente escolar, uma vez que, apresenta aos alunos
conteúdos distanciados da realidade vivida, mesmo estando no meio de um cenário
rico em possibilidades de aprendizagem em diversos campos, inclusive ambiental; o
segundo discurso traduz-se em suas palavras, já que reproduz a concepção de que
se deve aprender com os alunos, porém, dando ênfase na transmissão de
conhecimento como fundamento da aprendizagem,
Não é de hoje a premissa presente no cenário educacional de que transmitir
não significa ensinar e que memorizar/absorver não traduz o melhor sentido de
aprender, considerando que ensino/aprendizagem fazem parte de um processo
indissociável e sobretudo relacional. Então, educar é um ato que exige por parte de
ensinantes e aprendentes, a vontade e necessidade de conhecer, estar efetivamente
no mundo e com ele interagindo, observando, experienciando, experimentando, e
fundamentalmente refletindo na e sobre todas as relações apresentadas dentro e
fora do ambiente escolar, já que cada uma delas permite a quem aprende e também
a quem se dispõe a ensinar, um contexto social, cultural, ambiental e político, com
potencial formativo.
Episódio 3 – Professor Gabriel
O professor inicia a leitura. Livro nas mãos como se fosse a Bíblia sagrada e
o quadro branco o lugar onde a “revelação” deve ocorrer, mostrando aos alunos o
conhecimento “correto”, aquele que precisa ser aprendido, visto que está amparado
pela ciência e seus métodos de validação.
“No inverno, cedo o sol se põe, cedo fica escuro e anoitece, já no verão, o dia
cedo amanhece e fica mais claro, aí temos que nos proteger, usando roupas leves e
tomando bastante água, para fazer a hidratação do nosso corpo”.
(Professor Gabriel)
O livro continua nas mãos do professor, que prossegue a cópia da matéria no
quadro das “revelações”. Os alunos atentamente copiam e copiam, obedecendo ao
ritual estabelecido como método de ensino.
O diálogo, no melhor sentido freireano, definitivamente, não faz parte daquele
momento, a formalidade e passividade de ambos, professor e alunos marcam o
momento. O silêncio ensurdecedor, somente é quebrado pelos sons dos pássaros
![Page 109: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/109.jpg)
108
do lado de fora, ou por alguns estudantes que não entendem a escrita de alguma
palavra.
Em busca de quebrar o silêncio, pelo menos entendi desse modo, o professor
inicia uma conversa com vistas a incentivar os alunos ao prosseguimento de
estudos.
“Não temos que desistir jamais de nossos objetivos. Não desistam de estudar,
venham todos os dias, isso é importante para o que queremos ser na vida e o que
queremos de bom pra nós”.
“Quem sabe o que vocês poderão ser no futuro? Médico? Engenheiro?
Psicólogo?”
“Eu tenho um filho que já está na terceira faculdade. Eu só consegui estudar
uma. Preciso ainda fazer uma pós-graduação”.
“Vou passar avaliações valendo ponto”. (Professor Gabriel)
De maneira geral, o respeito dos alunos em relação aos professores e aos
conteúdos trabalhados é algo que simboliza a educação desenvolvida na escola,
ficando evidente a percepção dos alunos acerca da importância da aprendizagem,
da educação e da instituição escola para suas vidas, talvez algo reproduzido pelos
pais no ambiente familiar, já que não somente no ambiente urbano, mas também
nas comunidades campesinas a educação tem sido vista como a única forma de
mudar de vida, de "ser alguém" na sociedade, já que, nesse caso, o “ser alguém”
refere-se a uma ocupação na hierarquia social.
Sobre esse elemento, busco em minhas memórias as constantes indagações
que fazia a minha mãe e aos professores da escola em que estudei o então ensino
de 1º grau, as respostas eram invariavelmente as mesmas: “estudamos para ser
alguém [...]”. Possivelmente por isso, ainda hoje, cursando doutorado, me questiono:
o que é ser alguém? a criança não é ninguém? Será que já sou alguém?
Penso que no campo cultural, a criança inicia sua jornada enquanto sujeito,
aprendendo e se relacionando com o mundo em sua volta, interagindo com objetos,
símbolos, significados em um ambiente cambiante, capaz de transformar e ser
transformado. Não tenho dúvidas de que é nesse processo que o homem se
![Page 110: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/110.jpg)
109
constitui enquanto sujeito. É por meio da cultura e de suas relações, que o indivíduo
constrói suas subjetividades e passa a ser o que é, pelo menos por um tempo, até
que novas interações sejam estabelecidas, mas isso não justifica “estudar para ser
alguém”, já que a ideia em jogo refere-se à construção do sujeito enquanto ser
humano, e não apenas a posição que ocupa dentro do espaço social. É a partir
desse pensamento simplificado que ser “alguém”, passa a ser sinônimo de uma
ocupação na hierarquia social: engenheiro, médico, advogado, cientista.
Sustentado nas ideias de Freire (1996) afirmo que problematizar o ensino por
meio de tema geradores locais, permite a efetiva construção do conhecimento, o
qual passa a ser produzido a partir do mundo observado e lido por alunos e
professores em um processo dialógico onde a mediação entre sujeito - objeto -
conhecimento acontece continuamente, sem separação do "conteúdo bom do ruim",
aproximando-me do que Layrargues e Lima (2014, p. 29) identificaram como
Educação Ambiental “crítica, emancipadora, transformadora, popular” ensinando que
nesse entendimento é impossível “conceber os problemas ambientais dissociados
dos conflitos sociais”
É dentro dessa perspectiva que entendo o processo ensino/aprendizagem em
uma proposta de Educação Ambiental, como uma relação forjada na prática
cotidiana nos saberes construídos por meio de problemas reais, vistos e analisados
por quem se encontra no “epicentro do furacão", inevitavelmente envolvidos em
todas as tramas que circundam as subjetividades, crenças e valores que se
encontram no campo cultural.
![Page 111: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/111.jpg)
110
6 POSSIBILIDADES PARA O DESENVOLVIMENTO DE PRÁTICAS
PEDAGÓGICAS AMBIENTAIS A PARTIR DO ENSINO DE CIÊNCIAS
Cometamos essa ilegalidade:
desobedeçamos aos currículos
impostos pelos dominadores.
Acredito que moralmente estaremos
absolvidos de tal desobediência
(CHASSOT, 2007, p. 56)
Ensinar ciências em uma perspectiva ambiental tendo como base o contexto
local de uma comunidade caracterizada por saberes construídos na tradição e em
traços culturais que indicam as formas de sobrevivência nesse espaço amazônico,
institui-se como um desafio de grandes proporções enfrentado pelos educadores
que se debruçam a essa atividade que ao mesmo tempo em que é gratificante,
também é dolorosa e desgastante, tendo em vista as dificuldades estruturais,
econômicas e sociais já descritas nessa pesquisa. Considerando a conjuntura
relatada ao longo do trabalho e a coerência com o referencial teórico adotado, fiz a
opção por discutir o assunto fundamentado em uma visão de prática pedagógica
como um processo de construção, eminentemente apoiado nas relações culturais,
sociais e políticas, haja vista que “[...] nas práticas pedagogicamente construídas, há
a mediação do humano e não a submissão do humano a um artefato técnico
previamente construído”. (FRANCO, 2016, p. 536)
Uma proposta pedagógica com esse fundamento é algo inegavelmente
importante para o entendimento e valorização dos saberes produzidos em nível
comunitário, já que neste caso, o foco está centrado em perspectivas locais de
conhecimentos e de práticas de vida, destacando-se nesse cenário o fazer
pedagógico como instrumento de transformação social e conservação ambiental. É
no cotidiano dos sujeitos locais que a conservação do ambiente se constitui como
algo primordial a sobrevivência, a julgar, pelo potencial impresso nas práticas
repassadas de geração a geração.
Com o entendimento de que a temática ambiental é algo complexo,
considerando suas variadas dimensões e ramificações: políticas, sociais,
econômicas, culturais, ecológicas, instrumentais, indago-me que bases teóricas e
epistemológicas podem sustentar uma proposta com essa intenção? O
![Page 112: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/112.jpg)
111
questionamento lançado de fato é perturbador à medida que desestabiliza
“verdades” outrora presentes em meu fazer científico e docente. Busco então,
obviamente a partir do repertório teórico disponível e de minha leitura de mundo,
elementos que incidam da vivência no cotidiano escolar, das aulas ministradas pelos
docentes e pelos saberes apresentados nesse ambiente, nas famílias e no viver
comunitário. Não afirmo que tenha encontrado o “segredo” para responder a questão
e, obviamente, por tudo que já foi discutido nessa pesquisa, fica claro que não é
essa a intenção, mas por certo, tornou-se possível trilhar o início de um caminho
com potencial suficiente para construir novas formas de entender e trabalhar o
ambiente por meio do ensino de ciências. Dito isso, apresento não a receita para o
sucesso acadêmico e escolar, o que proponho é uma maneira de trabalhar o tema,
dentre tantas outras possíveis que talvez sejam construídas ao longo das
transformações inevitáveis presentes na história da comunidade de São Miguel do
Flexal.
Para a construção de uma proposta pedagógica condizente com os saberes
circulantes na comunidade, considero ser necessário que se observe pelo menos
três dimensões: teórico-epistemológica, visando à reflexão sobre o trabalho com
Educação Ambiental por meio do Ensino de Ciências; Político-cultural-ambiental
tomando como base a problematização e a concepção de temas geradores locais no
intuito de promover a politização dos conteúdos e sua aproximação com as práticas
de vida; Pedagógico-escolar com o propósito de construir e aplicar materiais
didáticos a partir dos saberes tradicionais produzidos historicamente na comunidade.
6.1 Dimensão teórico-epistemológica: porque Educação Ambiental por meio do
Ensino de Ciências?
Muito embora os Parâmetros Curriculares Nacionais apresentem a Educação
Ambiental como um tema transversal, diferenciando-a das denominadas áreas
convencionais justamente por seu caráter emergente na sociedade atual, já que
“tratam de processos que estão sendo intensamente vividos pela sociedade, pelas
comunidades, pelas famílias, pelos alunos e educadores em seu cotidiano” (Brasil,
1998a, p. 26), entendo que o ensino de ciências seja espaço privilegiado para tratar
da temática no contexto escolar e comunitário, uma vez que, oportuniza a docentes
![Page 113: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/113.jpg)
112
e alunos a construção de um olhar diferenciado sobre a vida dos cidadãos e sua
relação com o ambiente local.
Não quero com isso reduzir Educação Ambiental a uma área convencional,
mesmo porque acredito que, independente da área de atuação, todos somos
responsáveis pelo ambiente em que vivemos, ampliando, por tanto, as
possibilidades de entendimento e aplicação de seus saberes, porém, necessito
reconhecer o papel de destaque que o assunto recebe na área de Ciências Naturais,
inclusive referendado nos próprios Parâmetros Curriculares Nacionais, no eixo vida
e ambiente, o qual, segundo o documento, “[...] busca promover a ampliação do
conhecimento sobre a diversidade da vida nos ambientes naturais ou transformados
pelo ser humano [...]” tendo como propósito estudar “[...] a dinâmica da natureza e
como a vida se processa em diferentes espaços e tempos” (BRASIL, 1998b, p. 42).
Ensinar ciências a partir de uma perspectiva ambiental, política, possibilita a
inclusão do sujeito no dinamismo da vida, favorece a construção de um
posicionamento crítico, engajado, diante dos acontecimentos históricos. Concordo
com Chassot (2016, p. 109) no sentido de que “temos de formar cidadãs e cidadãos
que não só saibam ler melhor o mundo onde estão inseridos, como também, e
principalmente, sejam capazes de transformar este mundo para melhor”. A
compreensão por parte de professores e alunos de que o conteúdo ambiental está
presente no cotidiano e inexoravelmente vinculado a uma educação politizada
aponta para a organização de um currículo em que o ensino de ciências passe a se
estabelecer como um território de reflexão sobre a relação ser humano/ambiente, e
nesse sentido, o que é ensinado torna-se fruto dos problemas diários dos envolvidos
no processo educativo.
Diante desse posicionamento, a responsabilidade político-ambiental do ensino
de ciências converte-se como condição essencial para um fazer pedagógico
consubstanciado nos saberes tradicionais locais presentes nas relações dos sujeitos
conviventes em São Miguel do Flexal, na medida em que se constitui como um
elemento balizador da valorização dos saberes e da cultura vivenciada pelos
cidadãos locais. Alinhada a esse pensamento, Franco (2016, p. 537-538) defende
uma pedagogia pensada a partir de “uma epistemologia crítico-emancipatória, que
considera ser a pedagogia uma prática social conduzida por um pensamento
reflexivo sobre o que ocorre nas práticas educativas, bem como por um pensamento
crítico do que pode ser a prática educativa”.
![Page 114: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/114.jpg)
113
Não quero nesse momento discutir a transversalidade da Educação
Ambiental, pois acredito que tal premissa já tenha sido amplamente debatida e
defendida nos próprios Parâmetros Curriculares Nacionais e na organização dos
currículos escolares, o que proponho é, especialmente no caso da Escola de São
Miguel do Flexal, que a temática ganhe força por meio de um ensino de ciências
envolvido politicamente e ambientalmente, capaz de indagar e refletir sobre os
problemas enfrentados na comunidade o que se sugere fazer mediante temas
geradores oriundos do contexto da comunidade, denominados nessa pesquisa de
Temas Geradores Locais (TGL).
Acredito que os temas geradores problematizados na vivência de alunos e
docentes tenham potencial para a produção e condução de um fazer pedagógico,
científico, cultural e político na medida em que não estão presos aos “[...] homens
isolados da realidade, nem tampouco na realidade separada dos homens”, só fazem
sentido “[...] nas relações homens-mundo” (FREIRE, 1987, p. 98). São estas
relações profundas, permeadas pelo diálogo, por indagações e reflexões, que levam
a valorização e a construção de novos conhecimentos, provavelmente mais
condizentes com a realidade dos indivíduos que fazem parte de uma determinada
sociedade.
É na prática cotidiana, vivenciando as relações diárias que docentes e
discentes se envolvem com o conhecimento, que neste caso, não é somente
escolar, faz parte de um complexo sistema cultural e social, produzindo-se uma
linguagem peculiar, com significados que estão distantes dos chamados currículos
oficiais, e evidentemente dos conhecimentos considerados como científicos. É nesse
momento, que a Educação Ambiental por meio do Ensino de Ciências conquista seu
destaque, pois, por via da problematização e da assunção de temas geradores,
torna-se possível o desenvolvimento de um trabalho com temas de múltiplas
dimensões e extensões sociais e pedagógicas.
Destaco que no âmbito da comunidade em estudo, especificamente no que se
refere à Escola de São Miguel, o desenvolvimento de um trabalho pedagógico com
Educação Ambiental por meio do Ensino de Ciências é algo que se reveste de
condição essencial para a estruturação de uma postura crítica diante das
dificuldades ambientais encontradas, tendo em vista, que a população local vive
basicamente do que o ambiente oferece e que os conteúdos trabalhados na escola
são prioritariamente voltados para aprendizagem de Língua Portuguesa e
![Page 115: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/115.jpg)
114
Matemática, na maioria das vezes esquecendo-se das ciências e do próprio
ambiente.
Conhecer é um ato que exige, antes de tudo, leitura de mundo, havendo
necessidade de que o sujeito se reconheça como um ser pertencente a este mundo,
e, portanto, capaz de entendê-lo e transformá-lo por meio da interação. Nada no
mundo permanece intacto ou intocável, nesse sentido, Diegues (2000a) alerta para o
mito da “natureza intocável”, o que seguramente tem servido como base de
sustentação de interesses econômicos de grupos imperialistas fortemente presentes
na Amazônia.
É nessa concepção que a Educação Ambiental por meio do Ensino de
Ciências no âmbito da escola, ganha contornos políticos e sociais, uma vez que,
proporciona a reflexão a partir de temas nascidos das interações cotidianas, das
práticas de vida, do ambiente cambiante, que longe de ser meramente natural, é um
espaço de conflito, de transformação e primordialmente de saberes compartilhados,
construídos, moldados e modificados no próprio ambiente, afinal, valendo-me das
ideias de Freire (1996, p. 54) “[...] minha presença no mundo não é a de quem a ele
se adapta mas a de quem nele se insere. É a posição de quem luta para não ser
apenas objeto, mas sujeito também da história”.
Os conhecimentos ambientais apresentados estão intimamente relacionados
às formas de sobrevivência experimentadas no cotidiano, é nesse espaço que o
conteúdo se torna significativo, parte das relações, fomentador de saberes.
Provavelmente por esse motivo, Chassot (2016, p.235) alerta para o fato de que:
O pescador solitário, que encontramos em silenciosas meditações, sabendo onde e quando deve jogar a tarrafa, também tem saberes importantes. A lavadeira, que sabe escolher a água para os lavados, tem os segredos para remover manchas mais renitentes ou conhece as melhores horas de sol para o coaro. A parteira, que os anos tornaram doutora, conhece a influência da lua nos nascimentos e também o chá que acalmará as cólicas do recém-nascido. A benzedeira não apenas faz rezas mágicas que afastam o mau-olhado, ela conhece chás para curar o cobreiro, que o dermatologista diagnostica como herpes zoster. O explorador de águas, que indica o local propício para se abrir um poço ante o vergar de sua forquilha de pessegueiro, tem conhecimentos de hidrologia que não podem ser simplesmente rejeitados.
São múltiplos os saberes que fazem parte de uma sociedade, de uma cultura,
e que estão diretamente impregnados nas formas de se relacionar com o ambiente e
com as condições e experiências de vida presentes em um contexto social. Penso
mesmo, que esses saberes regem o convívio dos sujeitos envolvidos e
![Page 116: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/116.jpg)
115
inevitavelmente influenciam nas ações destes, sobre a natureza. São esses saberes
que dizem quando e como se deve caçar, pescar, manejar o gado, quais os
instrumentos mais adequados para cada ocasião. O interessante, e ao mesmo
tempo perverso, é que nada disso consta no currículo oficial e muito menos nos
livros didáticos utilizados na escola, portanto, reforçando o distanciamento entre os
conhecimentos tradicionais e os conteúdos trabalhados na educação formal. Parece
que nesse caso, não se discute o que ensinar? Nem tampouco o como ensinar? São
questionamentos distantes do espaço escolar e comunitário. O poder decisório foge
das mãos dos que realmente conhecem a realidade. Para referendar o que digo,
valho-me novamente de Chassot (2007, p. 66) e sua discussão sobre desafios
curriculares. Afirma o autor que:
Se nós temos como meta ajudar a construir valores sociais, voltados não apenas para a conservação do meio ambiente e sua sustentabilidade, como também, valores críticos que se responsabilizem pelas modificações que ocorrem no ambiente natural, precisamos estar atentos a como se tomam as
decisões que passarão a reger o nosso fazer.
Por tudo que já foi apresentado, imagino estar evidente o caráter político
ambiental que se pretende sugerir para o ensino de ciências aplicado na escola.
Este pressuposto se justifica pela necessidade de colocar os saberes locais na
ordem do dia, em uma perspectiva reflexiva, permitindo a alunos e professores
decidirem sobre questões fundamentais para um processo educativo crítico: o que
ensinar? Como ensinar/ Para que ensinar?
Nessa lógica, uma proposta por meio de temas geradores locais potencializa
os conteúdos, considerando que estes passam a surgir de problemas reais vividos
pela comunidade, ensejando, portanto, métodos e objetivos que sejam produzidos
pelos agentes implicados no processo. Dentro dessa propositura, ensinar passa a
ser uma tarefa em que o docente deixa de ser o mero “tradutor do livro didático” e
assume um papel mediador, ao mesmo tempo em que ensina, também aprende por
meio das experiências compartilhadas. O aluno, por sua vez, constitui-se como
sujeito aprendente, alguém que se permite ir além do que está escrito nos livros
didáticos, com habilidades para entender as diversas maneiras de se relacionar com
o ambiente e suas implicações no viver comunitário.
![Page 117: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/117.jpg)
116
6.2 Dimensão político-cultural-ambiental: problematização e temas geradores
locais
A introdução de temas geradores locais como pressupostos fundantes da
pedagogia que deverá ser desenvolvida na escola se justifica pelo fato de que os
conteúdos trabalhados no ambiente educacional formal estão distantes das práticas
de vida, dos saberes que regem o cotidiano local e que estabelecem a relação com
o meio ambiente.
Defendo a ideia de que professores e alunos necessitam dialogar com os
conhecimentos produzidos histórico e culturalmente, em um processo reflexivo
capaz de propiciar a construção de fios condutores entre os dito saberes e o
currículo proposto pelos órgãos governamentais. Admitindo como verdade que não
se deve desprezar o currículo oficial por conta da própria unidade da educação
nacional e de outros argumentos propalados na literatura e na Lei de diretrizes e
Bases da Educação Nacional, também afirmo ser imprescindível que o conteúdo
contextual local, esteja contido no fazer pedagógico escolar, pois é este movimento
dialógico que garante a significância de teorias, métodos, práticas e conhecimentos
compartilhados na escola.
Lembro que durante a pesquisa foi possível observar a aplicação, por parte
dos docentes da Escola de São Miguel, de práticas pedagógicas burocráticas, quase
sempre desconectadas da realidade, práticas profundamente arraigadas aos livros
didáticos e ao currículo oficial, deixando de lado o ambiente, os saberes, relações
cotidianas e a cultura local. Não quero com isso discutir competência docente ou a
qualidade do ensino aplicado na escola, mesmo porque, exigiria uma análise atenta
das condições de trabalho e dos processos de formação de docentes e gestores
atuantes nesse espaço, o que não se configura como objeto de estudo dessa
investigação. Pretendo sim, nesse momento, sugerir uma proposta pedagógica que
possibilite a efetivação de um processo ensino/aprendizagem mais coerente com os
saberes científicos e ambientais em destaque nessa parte da Amazônia.
A problematização sugerida permite a professores e alunos a imersão no
contexto comunitário, gerando temas politicamente, cientificamente e
ambientalmente amalgamados à realidade amazônica. Os conteúdos tornam-se
parte da vida, passam a fazer sentido nas inter-relações cotidianas. Nessa
concepção a Educação Ambiental por meio do Ensino de Ciências alcança um
![Page 118: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/118.jpg)
117
status que ultrapassa a rigidez disciplinar e passa a funcionar como uma área
geradora e agregadora de conhecimentos, alargando as potencialidades de um
processo educacional eminentemente voltado para o cidadão convivente na
Amazônia.
Temas e fios condutores não estão dados, são elementos construídos no
processo de leitura de mundo, na problematização e reflexão sobre as relações
políticas, sociais e culturais em vigência no ambiente. Assim, o ensino de ciências
constitui-se dentro de um contexto relacional, estimulando discentes e docentes à
busca e construção de sabres que possam dar conta das situações enfrentadas.
Dentro desse prisma, atividades relacionadas à caça, pesca, saúde, trabalho,
consumo, ritos, períodos de chuva e estiagem, fases da lua, cantos de aves e
deslocamento de animais silvestres, tornam-se fontes de conteúdos e subsídios
pedagógicos que indiscutivelmente precisam fazer parte do trabalho escolar.
6.3 Dimensão pedagógico-escolar: materiais didáticos e conhecimentos
tradicionais
Os conhecimentos produzidos na comunidade fazem parte de um complexo
cenário, onde as relações sujeito/ambiente estão marcadas por elementos culturais
e históricos ausentes da vida escolar, em especial no que diz respeito ao currículo,
metodologias e materiais didáticos utilizados nas aulas ministradas. Os conteúdos
trabalhados estão presos aos livros didáticos ofertados pelo Ministério da Educação
em nível nacional, e obviamente encontram-se dissociados das diversas realidades
experimentadas Brasil a fora, o que por certo vem dificultando a implementação de
alternativas pedagógicas mais engajadas ambientalmente.
Advogo pela necessidade de que o material didático se constitua a partir de
uma proposta político-pedagógico-ambiental, levando em consideração a leitura de
mundo dos sujeitos envolvidos no fazer educativo, trazendo para dentro do ambiente
escolar conteúdos até então marginalizados, considerados como algo de pouca
importância para o sucesso acadêmico/profissional.
Como já demonstrado em outros momentos dessa pesquisa, são muitos os
saberes circulando no cotidiano de São Miguel do Flexal. Conhecimentos que
efetivamente fazem parte da vida, e que indiscutivelmente, permitem a sobrevivência
![Page 119: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/119.jpg)
118
na comunidade, visto que se consolidam por meio de ensinamentos repassados de
geração em geração, indicando os melhores tempos e espaços para o plantio, caça
e pesca, além das formas mais adequadas de utilização da flora local.
A responsabilidade da educação escolar necessita ultrapassar seus muros, já
que esta, não se encontra isolada das relações cotidianas. No caso de São Miguel,
em determinados momentos do ano, até existe certo isolamento físico, mas de
maneira alguma cultural, social, ambiental e político, por este motivo a valorização
dos saberes tradicionais é imprescindível no estabelecimento dos conteúdos e no
fazer pedagógico escolar.
As observações e interações junto à comunidade me favorecem, como
alguém externo obviamente, o entendimento de parte de sua dinâmica de vida,
sendo possível, apoiado nessa relação, sugerir possibilidades pedagógicas para
uma educação escolar mais humana e preocupada com o ambiente e sua
conservação. Pari passu com essa ideia, aponto para eixos temáticos que longe de
serem pontos fixos, encontram-se abertos a novas construções e inclusão de
saberes que talvez não estejam expressos nos conteúdos oficiais.
6.3.1 Eixo 1 – Ciclos naturais e seus tempos
O conhecimento dos ciclos naturais e de suas mudanças ao longo do tempo
faz parte das experiências de vida apresentadas pelos moradores da São Miguel.
Configuram-se como saberes essenciais as formas de sobrevivência na região, pois
estão na base das habilidades necessárias ao desenvolvimento do trabalho, e do
respeito à cultura e o ambiente local.
O eixo temático suscita questões emergentes que merecem discussão dentro
e fora do ambiente escolar: Que impactos os períodos chuvosos e de estiagem têm
na vida dos comunitários? Que mudanças ambientais ocorrem nos dois períodos?
Que aspectos da fauna e da flora se destacam durante a inundação dos campos e
nos tempos de estiagem? Que influências os seres humanos têm ou tiveram na
demarcação desses dois momentos? Como ocorre o processo migratório de aves
peixes, mamíferos e quelônios durante as duas fases?
As formas de entendimento dos ciclos e seus tempos direcionam para esses
questionamentos e provavelmente para outros não presentes nessa tese, mas que
![Page 120: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/120.jpg)
119
dentro das relações escolares deverão emergir com força suficiente para conduzir
uma aprendizagem mais significante, à medida que os envolvidos no processo
tornam-se protagonistas do fazer pedagógico.
6.3.2 Eixo 2 – Relação ser humano-ambiente
A maneira como os sujeitos locais interagem com o ambiente demonstra
vários aspectos da cultura presente no cotidiano, dentre eles o respeito às crenças e
aos mitos que fundamentam os saberes repassados de geração a geração e que
indubitavelmente influenciam a utilização da natureza enquanto recurso de
sobrevivência. Muito comum no dia a dia da comunidade se ouvir falar de como o
cenário de São Miguel vem se alterando nos últimos anos e o quanto tal fenômeno
tem modificado o convívio local no que tange a trabalho, alimentação e mesmo, as
formas de locomoção nesse espaço amazônico. Espécies da fauna e da flora antes
abundantes em rios, lagos e campos passam a ser cada vez mais raras,
principalmente por conta da ação humana no ecossistema.
O enredo relatado leva a questionamentos que a mim, enquanto pesquisador
parecem ter força geradora para fomentar a reflexão e o debate sobre problemas
enfrentados na coletividade: Que entendimento os moradores tem sobre as
mudanças ambientais? Que fatores estão promovendo tais mudanças ao longo do
tempo? Que espécies da fauna e da flora ainda são abundantes? Que espécies
estão desparecendo de rios, lagos e campos? O que pode ser feito para melhorar a
relação com o ambiente?
Problematizar a relação com o ambiente é condição para seu entendimento,
visto que com esse movimento torna-se possível a reflexão sobre as práticas
adotadas pelos moradores no sentido de depredação ou conservação do meio
ambiente, assim como, da influência de terceiros nesse processo. Esses conteúdos
necessitam ser revisitados, valorizados e explorados pela escola enquanto ponto de
partida de qualquer outro assunto que seja abordado em seu espaço visto fazerem
parte e afetarem diretamente a dinâmica local, funcionando como o cerne primordial
para a construção de uma Educação Ambiental politizada.
![Page 121: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/121.jpg)
120
6.3.3 Eixo 3 - Ambiente e desenvolvimento
Sobre este eixo repousa a discussão do momento em nível mundial, e
obviamente possui repercussão local, considerando que a Amazônia atrai os olhares
e intenções “preservacionistas e econômicas” de muitos países e organizações não
governamentais e também de gente realmente interessada na conservação
ambiental. De um lado, dos países mais poderosos e organizações em favor do
lucro, interesses econômicos encobertos por um discurso de preservação, de outro,
cientistas, políticos e intelectuais preocupados com o meio ambiente e nessa zona
de fronteira, os sujeitos das comunidades amazônicas, altamente dependentes do
espaço onde vivem.
São muitas as perguntas que inquietam minha maneira de entender
Educação Ambiental e o processo de desenvolvimento, porém, destaco como forma
de exemplificar o que pode ser feito em âmbito escolar, apenas algumas: O que
significa preservar a natureza? Quem decide o que deve e o que não deve ser
preservado? O que é desenvolvimento e como se relaciona com o ambiente?
Desenvolvimento melhora a vida da população local? Existe forma de
desenvolvimento sem agressão ao ambiente?
Novamente proponho indagações que evidentemente não são as únicas e
nem sei se são as melhores, já que estão fundamentadas apenas em percepções
individuais que se constituem como produto de inquietações de um ser humano
envolvido, mas não afetado diretamente pelos problemas políticos, sociais e
ambientais da comunidade.
Alerto para o fato de que nada está paralisado, os saberes estão em
movimento constante, transformando e sendo transformados no processo
dialógico/reflexivo. Assim, conhecer torna-se um ato inseguro, movediço, cambiante
e neste sentido, temas, questionamentos e eixos são modificados e substituídos de
acordo com as necessidades e indagações de alunos e professores participantes
das práticas educativas.
Esses são apenas alguns itens que podem ser construídos tomando como
base o processo de problematização e geração de temas e eixos. Efetivamente,
essa forma de pensar as práticas pedagógicas, possui potencial para estimular
outras reflexões tanto por parte de professores quanto de alunos, o que no meu
entendimento, proporciona maior interação entre os saberes produzidos na
![Page 122: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/122.jpg)
121
comunidade e a educação escolar. Certamente, apresentei indagações que se
referendam em vivências pessoais enquanto acadêmico, e evidentemente
representam minhas inquietações, porém, no ambiente escolar os contornos serão
outros, tendo em vista, a multiplicidade de saberes e questionamentos que estão na
base das relações escolares e fundamentalmente nos fazeres dos sujeitos que
fazem parte dessa região da Amazônia Amapaense. Assim, imagino ser possível a
construção de um processo educacional viabilizado por um currículo estruturado e
desestruturado a cada geração de moradores, caracterizado pela inclusão constante
de novos saberes, elementos políticos, culturais, sociais e por vezes até novas
paisagens formadas pela própria ação do homem e dos ciclos ambientais.
![Page 123: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/123.jpg)
122
7 REFLEXÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS
[...] o inacabamento do ser ou sua
inconclusão é próprio da experiência
vital. Onde há vida, há
inacabamento. (FREIRE, 1996, p.
50)
Abordar saberes ambientais em uma perspectiva local por meio do ensino de
ciências foi e tem sido algo desafiador para um professor/pesquisador, pedagogo,
advogado, oriundo de um mestrado em Planejamento e Políticas Públicas e que até
o início desse trabalho, tinha pouco contato com pesquisas em comunidades
tradicionais, muito embora, mantenha ainda hoje, certa vivência com a localidade em
estudo, conforme relatado nos dizeres introdutórios desta tese. Não creio que a falta
de experiência com esse tipo de pesquisa tenha atrapalhado o alcance dos objetivos
traçados, pelo contrário, tenho convicção de que este desconhecimento foi
desafiador e fundamental para o encontro e possíveis desencontros na busca de
dados, análises e organização da pesquisa.
Pensava em meus momentos de solidão produtiva: relações educacionais
ambientais, ensino de ciências em uma comunidade amazônica, realmente terei
muito trabalho. Como descrever de maneira densa o cenário educacional, a fauna, a
flora, os mitos e a cultura local sem me tornar um pesquisador enviesado? O
envolvimento emocional com o objeto de estudo aflora as subjetividades e as
possibilidades de análise, mas também, pode enviesar a criticidade de quem
escreve sobre determinado assunto.
Diante do exposto, fica notório o forte envolvimento com o objeto de estudo, e
inevitavelmente os esforços que precisei imprimir nessa construção, para que, como
diz uma amiga paraense, o texto não fique “panfletário”, desprovido do espírito
crítico necessário ao tipo de abordagem que estou propondo nessa investigação
científica. Preocupado com os rumos que o trabalho poderia seguir e buscando fugir
de um possível “tom panfletário”, algumas indagações passaram a ser feitas no
sentido de pesquisar de maneira central: em que termos as condições e
experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do
Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem
![Page 124: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/124.jpg)
123
como, o ensino de ciências desenvolvido na escola local? e subsidiariamente: Que
condições e experiências de vida são compartilhadas na comunidade de São Miguel
do Flexal?; Que tipo de relação se estabelece entre moradores da comunidade e
alteração ou conservação do meio ambiente?; Que ensino de ciências se
desenvolve na escola e qual sua relação com práticas ambientais amparadas no
saber local?
Cada pergunta colocada teve como propósito a elaboração e alcance dos
objetivos estabelecidos, quais sejam compreender em que termos as condições e
experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do
Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem
como, o ensino de ciências desenvolvido na escola local e em caráter específico:
Identificar as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade de
São Miguel do Flexal; constatar a relação estabelecida entre moradores da
comunidade e alteração ou conservação do meio ambiente; analisar o ensino de
ciências desenvolvido na escola e sua relação com práticas ambientais amparadas
no saber local; apontar para possibilidades pedagógicas que permitam a valorização
dos saberes tradicionais ambientais por meio do ensino de ciências.
A complexidade da temática abordada nessa pesquisa “Comunidade,
educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do
Flexal/Pracuúba/Amapá”, os questionamentos feitos e os objetivos traçados, levam a
resultados relevantes para o entendimento do objeto de estudo e proposição de
alternativas pedagógicas por meio do ensino de ciências, que estejam voltadas para
valorização dos saberes tradicionais ambientais em uso na comunidade.
A forma como os sujeitos se posicionam sobre os aspectos ambientais em
vigor na sociedade em estudo levam a convicção de que existem conflitos,
discordância de posicionamentos e atitudes referentes às práticas ambientais vividas
em são Miguel. Penso ser importante que as coisas aconteçam dessa maneira, pois,
demonstram os diversos interesses que estão implícita ou explicitamente
influenciando as práticas e discursos (re) produzidos pelos comunitários.
As percepções apresentadas pelos sujeitos por meio de suas vozes e de
minhas interpretações, constituem um conjunto de preocupações, angústias e
saberes que foram construídos ao longo da história dessa população a qual se
caracteriza pela necessidade dos recursos naturais ainda hoje presentes na vida dos
moradores. Conhecimento dos ciclos naturais, de plantas, animais e de seres
![Page 125: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/125.jpg)
124
naturais e sobrenaturais que efetivamente habitam o cotidiano local, são alguns dos
saberes presentes no dia a dia de quem vive esse ambiente.
Nesse sentido, tenho plena convicção da relação entre saber e poder, e na
perspectiva do conhecimento local, tal premissa ganha contornos particulares, na
medida em que o saber não é simplesmente um produto a ser comercializado, é
antes de qualquer coisa, um saber/poder indispensável à vida e ao equilíbrio das
relações do cotidiano. Nesse caso o saber / poder é fruto das tradições e da cultura,
relacionado ao conhecimento passado de geração em geração no ambiente familiar
e social, produto da vida e de sua história em movimento, na maior parte das vezes
distante do ambiente escolar ou da ciência ocidental de forma geral.
Dessa forma, conservar a natureza deixa de ser uma mera obrigação ética,
moral como algo a ser deixado para as futuras gerações de maneira intocável,
sagrada e passa a ser vivencia cotidiana, inspirada nas mais profundas
necessidades de sobrevivência humana em um processo que depende do
dinamismo que tem caracterizado a história das sociedades.
As condições e experiências de vida experimentadas pelos moradores da
comunidade de São Miguel do Flexal caracterizam os saberes produzidos no
cotidiano e possuem de maneira irrefutável, importância nas relações do dia a dia,
nas formas de trabalho, consumo, cultura, folclore, mitos, moradia, locomoção e
principalmente no trato com a natureza, porém, tendo expressividade diminuta no
que concerne a educação escolar, tendo em vista que os conteúdos atualmente
trabalhados nessa instituição encontram-se na contramão do cotidiano das práticas
de vida. Os livros didáticos oficiais são utilizados por professores e alunos como se
fossem “a verdade” incontestável, não passíveis de indagações e nessa perspectiva
a metodologia empregada centra-se na repetição e na memorização do que está
prescrito no material.
Com o distanciamento entre os saberes tradicionais comunitários e os
conteúdos trabalhados na escola, a Educação Ambiental por meio do Ensino de
Ciências fica sem sentido, visto que se torna apenas mais um tema na maioria das
vezes negligenciado por professores e alunos. Por tudo isso, acredito que o ensino
de ciências conduzido por Temas Geradores Locais favorece um maior
envolvimento com os saberes tradicionais e os problemas ambientais, possibilitando
a indissociabilidade entre o que é vivenciado no cotidiano e o que é ensinado na
escola.
![Page 126: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/126.jpg)
125
Há muito sabemos que ensinar não é uma tarefa simplória, pelo contrário, é
uma atividade que exige comprometimento político e formacional, responsabilidade
com a aprendizagem dos alunos, e dentro dessa intenção, refiro-me a construção de
um processo que se sobreponha a mera memorização de conceitos, a repetição de
conteúdos cristalizados pelos órgãos oficiais e se configure como um espaço de
problematização, discussão e reflexão, sem preocupação de estabelecer o certo e o
errado, mas que propicie a abertura de novas trilhas de conhecimento, favoreçam a
discordância e a rebeldia acadêmica. Nesse prisma, professores e alunos assumem
o comando de seus destinos educacionais, uma vez que, passam a decidir sobre o
que ensinar? Porque ensinar? e Como ensinar? flexibilizando o currículo e abrindo
novas possibilidades de ensino/aprendizagem.
Mesmo com as dificuldades enfrentadas no fazer diário, principalmente em
nível estrutural, educandos, educadores e pais de alunos ainda confiam na escola
enquanto instituição necessária ao desenvolvimento local e a melhoria das
condições de vida das pessoas que vivem na Amazônia e acredito que este
pensamento oportuniza o afastamento de uma visão pessimista, fortalecendo a
escola como promotora da construção de conhecimentos.
Notoriamente o estabelecimento de políticas públicas visando à construção e
o fortalecimento das instituições existentes, converte-se como condição
indispensável à edificação de relações sociais mais preocupadas com o ambiente.
Instituições fracas, pouco poder aquisitivo e perspectiva de vida muito limitada, são
fatores que atrapalham a relação do sujeito com o ambiente, posto que, o instinto de
sobrevivência prepondera sobre as práticas de conservação ambiental, muitas vezes
estimulando a exploração e comercialização dos chamados “recursos naturais” de
maneira predatória a fauna e a flora da comunidade. Com base nessa ideia,
constato que no espaço investigado, a ausência de políticas públicas institucionais,
ambientais tem ocasionado um tipo de relação que não é vantajosa para o ambiente
e muito menos para o ser humano.
Sinteticamente, analisando os dados da pesquisa, aponto três constatações
influentes na alteração da paisagem e no desaparecimento de espécies da fauna e
flora de São Miguel: ausência de políticas públicas das mais diversas ordens,
necessidade de sobrevivência do homem local e ação de agentes externos na
exploração e comércio do que é retirado da natureza.
![Page 127: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/127.jpg)
126
O cotidiano da comunidade de São Miguel do Flexal é fonte inesgotável de
conhecimentos, mitos e crenças, compostos por uma complexa teia de saberes que
traduzem o estilo de vida até então adotado na localidade e que certamente irá se
modificar dentro de um contexto histórico-cultural, reconhecendo-se que a cultura
ocupa papel de destaque nessa relação, haja vista, que é ela quem estabelece o elo
entre ser humano e ambiente que o cerca. Por este motivo, insisto que o natural e o
cultural fazem parte do mesmo jogo ambiental, estando os saberes tradicionais
presentes nesse contexto com regras próprias de reconhecimento, classificação e
entendimento desse espaço. Entendo que os saberes produzidos no ambiente
comunitário são elementos essenciais para construção de uma proposta pedagógica
escolar que tenha como eixo central a conservação ambiental, já que são estes
conhecimentos do cotidiano que possibilitam um fazer educativo mais conectado
com o ambiente.
A Educação Ambiental, de fato, está presente nas práticas adotadas na
convivência dos moradores e em seu envolvimento com o habitat amazônico, visto
que as percepções observadas e analisadas demonstram preocupação com o
equilibro da natureza, com a conservação e uso da fauna e da flora. Evidente que o
processo não é algo pacífico, pois está dentro de um território conflituoso, carregado
de interesses políticos e econômicos, sustentados por projetos que em sua maioria
não estão em consonância com as necessidades dos moradores dos diversos
pontos da Amazônia.
Nesse terreno de conflito que é o espaço ambiental, cultural e político da
comunidade, a escola merece destaque, pois necessita instigar os alunos a
construção de novos olhares, alargando as possibilidades de análise e de ação
sobre o fazer comunitário diário, assumindo posição como condutora de formação e
valorização dos conhecimentos produzidos em nível local. Conforme dito no capítulo
3 desse trabalho, prefiro acreditar na escola como “o lugar de onde se pretende um
processo educativo que atenda as necessidades reais dos alunos, um local de
esperança, do saber e do saber fazer, capaz de valorizar os conhecimentos ali
construídos, escapando da surdez, cegueira e ausência de olfato e paladar que
teimam em assombrar nossas escolas”.
Apesar dos problemas sociais e econômicos latentes, São Miguel do Flexal
demonstra potencial para construção de políticas ambientais e educacionais que
sejam condizentes com um tipo de desenvolvimento menos agressivo ao ambiente,
![Page 128: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/128.jpg)
127
aos saberes e a cultura local. Acredito nesta premissa pelo fato de que cada
entrevista realizada, cada conversa compartilhada e os momentos de convivência
com os moradores, permitiram-me a percepção de que existe um sentimento de
pertença, de raiz, de identificação com todos os elementos que compõem o cenário
local. A história da comunidade é contada com orgulho e com certa dose de
saudade dos tempos em que aparentemente as coisas eram “mais difíceis”. Dizia-
me um morador, sem negar a importância da luz elétrica, que em outras épocas a
luz da lua deixava tudo mais romântico e que a abundância do pescado e da caça
garantia a fartura na mesa do comunitário.
Este sentimento comum aos sujeitos fortalece a consciência de que há
necessidade de conservar o ambiente e que inegavelmente a educação tem papel
preponderante nesse propósito, visto seu potencial formativo tanto do ponto de vista
informal quanto na sua vertente institucional/formal efetivada por meio do processo
de escolarização. É dentro dessa perspectiva que o trabalho pedagógico
desenvolvido na escola de São Miguel carece de uma atuação voltada ao resgate
dos saberes locais para que sejam colocados dentro de seu espaço, ou melhor, os
conteúdos veiculados no cotidiano devem compor o currículo escolar, tendo em vista
que fazem parte do ambiente cultural, político e social de alunos, pais e professores.
A assunção de um processo educacional politizado que entenda os seres
humanos como pertencentes a um ambiente e que propicie o enfrentamento de
problemas concretos que atingem diretamente as forma de vida e de convivência na
comunidade, altera a relação entre educandos, educadores e conteúdos, à medida
que fios condutores passam a fazer a interligação entre o que se aprende no
ambiente escolar e os saberes e ferramentas presentes no cotidiano dos sujeitos
locais. Diante desse pressuposto, reafirmo a proposta pedagógica por meio de
temas geradores nascidos das práticas dos moradores, com significância para os
que possuem raízes e acreditam nesse espaço amazônico como um ambiente que
embora esteja carente de condições de vida, está rico em experiências, traços
culturais e conhecimentos que fazem parte do contexto social.
Estou convicto de que fazer educação na Amazônia é realmente um ato de
dedicação, coragem e fundamentalmente de respeito aos sujeitos que fazem parte
desse cenário. Afirmo também ser um ato de rebeldia contra a inoperância do poder
estatal que infelizmente tem se apresentado nas formas de corrupção e descaso
com a coisa pública. A rebeldia a qual me refiro, possibilita colocar em movimento a
![Page 129: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/129.jpg)
128
história da comunidade, tendo em vista que seus saberes e práticas passam a
conduzir suas trilhas enquanto povo do norte brasileiro, capaz de reinventar e
reeditar seu destino.
Compartilhar dos saberes e da confiança dos sujeitos pertencentes à
Comunidade de São Miguel, me tornaram um privilegiado, alguém, de certa maneira,
escolhido para ser o interlocutor entre os diversos conhecimentos aqui apresentados
e analisados sob uma determinada ótica e o mundo acadêmico-científico. Lembro
novamente, que se trata de um olhar dentre tantos outros possíveis, talvez até em
determinado grau, menos ou mais otimistas ou realistas, porém, nunca
simplesmente iguais, tendo em conta que o processo de construção foi amalgamado
em subjetividades divididas e compartilhadas entre pesquisador e sujeitos da
pesquisa. Perceptivelmente não sou mais o mesmo pesquisador, docente
universitário ou simplesmente sujeito, assim como, São Miguel também não o é, e
nem será a mesma, considerando que somos afetados por cada ação realizada ou
sofrida no cotidiano. Aí está uma das belezas em se investigar gente, seres
humanos em um contexto socioambiental, nada permanece intacto, pois as
mutações ocorridas nos permitem fugir aos determinismos e a criar outras maneiras
de conviver e educar.
Por todos os saberes produzidos e compartilhados nessa pesquisa, agradeço
ao povo de São Miguel do Flexal pela oportunidade de apresentar, como diria o
saudoso e inestimável Gonzaguinha, em forma de “grito de alerta”, uma tese
versando acerca das condições e experiências de vida, bem como, sobre a
Educação Ambiental e o Ensino de Ciências desenvolvido nessa comunidade da
“Amazônia Pracuubense”.
![Page 130: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/130.jpg)
129
REFERÊNCIAS
ALVES, J. M. Cultura científica escolar, subjetividade e motivação para aprender
ciências. In: CHAVES, S. N.; SILVA, C. A. F. da; BRITO, M. dos R. de
(Organizadores). Cultura e subjetividade: perspectivas em debate. São Paulo:
Livraria da Física, 2016. (p. 97-113) (Coleção contextos da ciência)
ALVES, R. Filosofia da ciência: introdução ao jogo e suas regras. 13. ed. São Paulo:
Brasiliense, 1990.
ARANHA, M.L. de A. Filosofia da educação. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2006.
BARROS, R. Naturalismo cultural e moralização da natureza: suas implicações e
desdobramentos. In: CHAVES, S. N.; SILVA, C. A. F. da; BRITO, M. dos R. de
(Organizadores). Cultura e subjetividade: perspectivas em debate. São Paulo:
Livraria da Física, 2016. (p. 41-62) (Coleção contextos da ciência)
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, DF: Senado, 1988.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei Nº 9394, 20 de dezembro de 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9795.htm. Acesso em: 02 de maio de 2017.
BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos: apresentação
dos temas transversais. Brasília: MEC/SEF, 1998a.
BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: ciências naturais. Brasília: MEC/SEF,
1998b.
CALVINO, Í. Palomar. São Paulo: Companhia das letras, 2004. CARVALHO, A.M.P. de; GIL-PÉREZ, D. Formação de Professores de ciências: tendências e inovações. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1995.
![Page 131: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/131.jpg)
130
CASTRO, E. Território, biodiversidade e saberes de populações tradicionais. In:
DIEGUES,A.C. (Org.) Etnoconservação: novos rumos para a conservação da
natureza. São Paulo: HUCITEC, NUPAUB – USP, 2000. p. 165-182
CHASSOT, A. Alfabetização científica: questões e desafios para a educação. 7.ed.
Ijuí: Unijuí, 2016.
CHASSOT, A. Educação consciência. 2.ed. Santa Cruz do Sul:: EDUNISC, 2007.
CHAVES, S. N. Reencantar a ciência, reinventar a docência. São Paulo: Livraria da
Física, 2003. (Coleção contextos da ciência)
CHAVES, S. N. Um currículo ara despertar adultos e adormecer crianças. In:
CHAVES, S. N.; SILVA, C. A. F. da; BRITO, M. dos R. de (Organizadores). Cultura e
subjetividade: perspectivas em debate. São Paulo: Livraria da Física, 2016. (Coleção
contextos da ciência) (p. 215-226)
CHIZOTTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 5.ed. São Paulo: Cortez,
2001.
CLANDININ, D. J.;CONNELLY, E. M. Pesquisa narrativa: experiências e história na
pesquisa qualitativa. Uberlândia: EDUFU, 2011.
COOPER, A. de F. S. C.; ANJOS, M. B. dos A. A constituição do pensamento
ambiental: de Leff a Ingold – bases da visão crítica?. Pesquisa em Educação
Ambiental, vol. 9, n. 2 – p. 133-146, 2014.
DIEGUES, A. C. Repensando e recriando as formas de apropriação comum dos
espaços e recursos naturais. In:______; MOREIRA, A.de C.C. (Org.) Espaços e
recursos naturais de uso comum. São Paulo: NUPAUB – USP, 2001. p. 97-124
DIEGUES, A. C. Etnoconservação da natureza: enfoques alternativos. In:______
(Org.) Etnoconservação: novos rumos para a conservação da natureza. São Paulo:
HUCITEC, NUPAUB – USP, 2000b. p. 1-46.
![Page 132: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/132.jpg)
131
DIEGUES, A. C. O mito moderno da natureza intocada. 3.ed. São Paulo: Hucitec,
USP, 2000a.
FRANCO, M. A. do R. S. Prática pedagógica e docência: um olhar a partir da
epistemologia do conceito. Rev. Bras. de Est. Pedag. (on-line), Brasília, v. 97, n.
247, p. 534-551, set./dez. 2016. Disponível em http://dx.doi.org/10.1590/s2176-
6681/288236353. Acesso em: 27 de dezembro de 2017.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
FREIRE, P. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido.
10.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 28.ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
GEERTZ, C. O saber local: novos ensaios em antropologia interpretativa. 3.ed.Tradução de Vera Mello Joscelyne. Petrópolis: Vozes, 1997.
GEERTZ, C. A interpretação das culturas. 1.ed., 13.. Rio de Janeiro: LTC, 2008.
GÓMEZ-POMPA, A.; KAUS, A. Domesticando o mito da natureza selvagem. In:
DIEGUES, A. C. (Org.) Etnoconservação: novos rumos para a conservação da
natureza. São Paulo: HUCITEC, NUPAUB – USP, 2000. p. 125-147.
GUARIM NETO, G. O saber tradicional pantaneiro. As plantas medicinais e a educação ambiental. Rev. Eletrônica do Mestr. Educ. Ambient. v. 17, jul./dez. 2006.
GUARIM, V. L. M. dos S. Educação e sustentabilidade ambiental em comunidades ribeirinhas tradicionais. Cuiabá: Instituto de Educação, 2000. 241 f. Tese (Doutorado em Educação e Meio Ambiente) – Programa Integrado de pós Graduação em Educação, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2000.
![Page 133: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/133.jpg)
132
GUARIM, V. L. M. A educação e a sustentabilidade ambiental em comunidades ribeirinhas de Mato Grosso, Brasil. Bol. Mus. Pará. Emiliio Goeldi. sér. Ciências Humanas, Belém, v.1, n.1, p. 7-44, jan-abr. 2005.
JACOBI, P. Educação ambiental, cidadania e sustentabilidade. Cadernos de
pesquisa. n. 118. p. 119-205. março/2003.
KNOBBE, M. M. O método complexo: uma estratégia de deslocamento de
horizontes. In: CHAVES, S. N.; SILVA, C. A. F. da; BRITO, M. dos R. de
(Organizadores). Cultura e subjetividade: perspectivas em debate. São Paulo:
Livraria da Física, 2016. (Coleção contextos da ciência) (p. 41-62)
LAYRARGUES, P.P.; LIMA, G.F. da C. As macrotendências político-pedagógicas da
educação ambiental brasileira. Ambiente & Sociedade, São Paulo, v. 17, n.1, p. 23-
40, jan./mar., 2014.
LEFF. E. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder.
Petrópolis: Vozes, 2000.
LIMA, G.F. da C. Educação ambiental crítica: do socioambientalismo às sociedades
sustentáveis. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.35, n.1, p. 145-163, jan./abr.,2009.
LOUREIRO, C. F. B.; LAYRARGUES, P.P. Ecologia política, justiça e educação
ambiental crítica: perspectivas de aliança contra-hegemônica. Trab. Educ. Rio de
Janeiro, v.11, n. 1, p. 53-71, jan./abr., 2013.
MENDONÇA, P. L. de. Região dos lagos do Amapá. Departamento de Turismo –
DETUR. Secretaria de Planejamento – SEPLAN/AP, 1983.
MORAES, R. Uma tempestade de Luz: a compreensão possibilitada pela análise
textual discursiva. Ciência e Educação. v.9, n.2, p. 191-211, 2003.
MORIN, Edgar. Ciência com consciência. 8.ed. Tradução de Maria D. Alexandre e
Maria Alice Sampaio Dória. Rio de Janeiro: Bertrand, 2005.
![Page 134: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/134.jpg)
133
MOROZ M.; GLANFALDONI, M.H.T.A. Projeto de Pesquisa: iniciação. Brasília:
Plano, 2002.
OLIVEIRA, S. L. de. Tratado de metodologia científica: projetos de pesquisas, TGI,
TCC, monografias, dissertações e teses. São Paulo: Pioneira, 2004.
PEREIRA, I. C.; GUARIM NETO, G. Educação ambiental no parque florestal de
Sinop. Cuiabá: EdUFMT, 2009.
PIMBERT, M. P.; PRETTY, J. N. Parques, comunidades e profissionais: incluindo
“participação” no manejo de áreas protegidas. In: DIEGUES, A. C. (Org.)
Etnoconservação: novos rumos para a conservação da natureza. São Paulo:
HUCITEC, NUPAUB – USP, 2000. p. 183-223.
POZO, J.I.; CRESPO, M.A.G. A aprendizagem e o ensino de ciências: do
conhecimento cotidiano ao conhecimento científico. 5.ed. Porto Alegre: Artmed,
2009.
RYLE, G. The concept of mind. New York: Barnes e Noble, 1949.
SANTOS, B.de S. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição paradigmática. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2002.
SANTOS, B.de S. Um discurso sobre as ciências. 5.ed. São Paulo: Cortez, 2008.
SANTOS, I. E. dos. Manual de métodos e técnicas de pesquisa científica. 9.ed.
Niterói: Impetus, 2012.
SILVA, C. A. F. da. O mito da sociedade moderna. In: CHAVES, S. N.; SILVA, C. A.
F. da; BRITO, M. dos R. de (Organizadores). Cultura e subjetividade: perspectivas
em debate. São Paulo: Livraria da Física, 2016. (Coleção contextos da ciência)
SILVA, J. M. da; SILVEIRA, E. S. da. Apresentação de trabalhos acadêmicos: normas e técnicas. 2 ed. Petrópoles: Vozes, 2007.
![Page 135: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/135.jpg)
134
SOUZA TORRES, G.V. de. Educação em ciências naturais no currículo do curso de
pedagogia acordo Brasil – Japão: travessias de uma universidade da Amazônia em
território estrangeiro. Cuiabá: Rede Amazônia de Educação em Ciências e
Matemática, 2017. 182 f. Tese (doutorado) – Programa de Pós-Graduação em
Ensino de Ciências e Matemática, Universidade Federal de Mato Grosso, 2017.
TREIN, E. S. A educação ambiental crítica: crítica de que? Revista Contemporânea de Educação, vol. 7, n. 14, agosto/dezembro de 2012.
TRÉZ, T. A. Feyerabend, interculturalismo e etnobiologia: algumas possíveis
articulações no ensino de biologia. Biotemas (UFSC), vol. 24, n. 3, p. 129-140,
setembro/2011.
TRIVELATO, S. F.; SILVA, R. L. F. Ensino de ciências. São Paulo: Cengage Learning, 2013. (Coleção Ideias em ação).
![Page 136: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/136.jpg)
135
APÊNDICES
![Page 137: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/137.jpg)
136
APÊNDICE – A ROTEIRO DE ENTREVISTA – DIREÇÃO E COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA DA ESCOLA. 01 – Nome e formação
02 – Tempo de atuação no magistério
03 – O que você entende por educação ambiental?
04 – Como você entende a relação homem/meio ambiente na comunidade de São
Miguel?
05 – Atua em algum movimento relacionado a políticas sobre meio ambiente e
natureza?
06 – Durante a carreira do magistério já havia assumido alguma outra função diretiva
ou de coordenação?
07 – Há quanto tempo está na comunidade?
08 – Há quanto tempo atua na escola?
09 – Que ações/projetos a escola desenvolve ou já desenvolveu no sentido de
trabalhar a relação homem e meio ambiente junto a comunidade?
10 - Como você avalia a eficiência dessas ações?
11 - Alguma ação deixou de ser implementada? Por que?
12 – No seu entendimento as ações de governo satisfazem as necessidades no que
se refere a educação ambiental?
13 – Que ações ambientais estão previstas para os anos futuros?
14 - Você considera o currículo escolar um instrumento importante na construção de
ações, projetos e políticas voltadas para a educação ambiental?
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 138: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/138.jpg)
137
APÊNDICE - B ROTEIRO DE ENTREVISTA - PROFESSORES DA ESCOLA.
01 – Nome e formação do professor?
02 – Tempo de atuação no magistério?
03 – O que você entende por educação ambiental?
04 – Como você entende a relação homem/meio ambiente na comunidade de São
Miguel?
05 – Desenvolve alguma prática voltada a educação ambiental?
06 – Atualmente está fazendo algum curso de aperfeiçoamento profissional
relacionado a educação ambiental?
07 – Quais as maiores dificuldades em trabalhar a educação ambiental na escola?
08 – Como funciona o apoio pedagógico na escola no sentido de desenvolver a
educação ambiental?
09 – Há quanto tempo está na comunidade?
10 – Há quanto tempo atua na escola?
11 – Que ações/projetos a escola desenvolve ou já desenvolveu no sentido de
trabalhar a relação homem e meio ambiente junto a comunidade?
12 - Como você avalia a eficiência dessas ações?
13 - Alguma ação deixou de ser implementada? Por que?
14 – Que ações ambientais estão previstas para os anos futuros?
15 - Você considera o currículo escolar um instrumento importante na construção de
ações, projetos e políticas voltadas para a educação ambiental?
16 – A escola possui algum projeto sistemático de apoio a pratica ambiental? Como
funciona?
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 139: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/139.jpg)
138
APÊNDICE C ROTEIRO DE ENTREVISTA - MEMBROS DA COMUNIDADE DE SÃO MIGUEL DO FLEXAL.
01 – Nome e nível de escolaridade?
02 – Tempo em que vive na comunidade?
03 – O que você entende por educação ambiental?
04 – Que ocupação desenvolve na comunidade?
05 – O que entende sobre educação ambiental?
06 – Obteve alguma informação sobre educação ambiental na escola?
07 – Consegue observar algum tipo de mudança no seu modo de vida nos últimos
anos?
08 – Consegue observar alterações no ambiente natural da comunidade de São
Miguel do Flexal? Que alterações são essas?
09 - De maneira geral, o que as pessoas da comunidade fazem para sobreviver?
Que tipo de trabalho desenvolvem?
10 – No seu modo de entender, existe alguma relação entre a forma como as
pessoas da comunidade estão trabalhando/subsistindo e alteração do estilo de vida,
natureza, em especial com as plantas/flora?
11 - No seu entendimento existe dificuldades em manter o equilíbrio entre
comunidade e meio ambiente?
12 – Se existem dificuldades, quais são?
13 – Você considera importante e necessário manter uma relação equilibrada com o
meio ambiente? Por quê?
13 – No seu entendimento o trabalho desenvolvido pela escola contribui de alguma
forma para este equilíbrio?
14 – Buscando em suas recordações, você poderia relatar como se davam as
relações entre comunidade e meio ambiente em anos passados, no tempo em que
você era estudante?
15 – Você consegue ver possibilidades de melhorar a relação entre comunidade e
meio ambiente?
16 - No seu entendimento que fatores poderiam alterar esta relação?
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 140: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/140.jpg)
139
APÊNDICE D
ROTEIRO DE ENTREVISTA - ALUNOS DA ESCOLA.
01 – Qual o seu nome?
02 – Qual a sua idade?
03 – Como você vem para escola?
04 – Quantas pessoas têm na sua família?
05 – Que tipo de tarefa você mais gosta aqui na escola?
06 – O professor leva a turma de vocês para atividades fora da sala de aula?
07 – Que plantas você conhece?
08 – Que animais você conhece?
09 – A professora já falou de alguma planta ou animal que você conhece?
10 – O professor já fez alguma atividade usando plantas e animais conhecidos por
você?
11 – Que histórias sobre plantas e animais você já ouviu dos seus pais ou aqui na
escola?
12 – Tem alguma planta ou animal que serve para remédio? Já usou algum?
13 - Você lembra de plantas e animais que servem para alimento? Pode me dizer
alguns usados em sua casa?
14 – Qual a época do ano que você mais gosta? Por quê?
15 – Você mudaria alguma coisa na sua escola? O quê?
16 – Você mudaria alguma coisa na sua comunidade? O quê?
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 141: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/141.jpg)
140
APÊNDICE E – GUIA DE OBSERVAÇÃO: PRÁTICAS DOS PROFESSORES NA
EDUCAÇÃO AMBIENTAL.
ESCOLA SÃO MIGUEL DO FLEXAL
PROFESSOR: ________________________________________________________
TURMA:_____________________________________________________________
Indicadores Aula 1 Aula 2 Aula 3 Aula 4 Aula 5 Aula 6 Aula 7 Aula 8 Aula 9 Aula
10
Propõe atividades sobre
educação ambiental
Propõe tarefas fora de
classe, com objetivo de
observar e analisar o
meio ambiente.
Trabalha a educação
ambiental por meio de
textos.
Usa algum tipo de vídeo
educativo voltado a
temática ambiental.
Estimula os alunos a
refletir sobre o ambiente
em que vivem
Propõe atividades em
grupo
Proporciona atividades
socializadoras
Formula perguntas aos
alunos
Responde as perguntas
dos alunos
Ajuda no
desenvolvimento das
ideias dos alunos
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 142: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/142.jpg)
141
APÊNDICE F – GUIA DE OBSERVAÇÃO: APRENDIZAGEM DOS
ALUNOS/EDUCAÇÃO AMBIENTAL
ESCOLA SÃO MIGUEL DO FLEXAL
PROFESSOR:__________________________________________________________
TURMA:______________________________________________________________ Indicadores Aula 1 Aula 2 Aula 3 Aula 4 Aula 5 Aula 6 Aula 7 Aula 8 Aula 9 Aula 10
Respondem as
atividades escritas
Respondem as
perguntas diretas feitas
pelos professores
Questionam os
professores por
iniciativa própria
Realizam as tarefas de
casa
Conseguem fazer
leituras de textos Sobre
educação ambiental
Conseguem interpretar
textos sobre educação
ambiental
Conseguem produzir
textos sobre educação
ambiental
Apresentam algum tipo
de preocupação com o
meio ambiente
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 143: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/143.jpg)
142
APÊNDICE G - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO –
COMUNIDADE EM GERAL
Esta pesquisa de campo terá como tema “Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na
comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá” e será desenvolvida por Márcio Moreira Monteiro, doutorando do
Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática - REAMEC, sob a orientação do Prof. Dr. Germano
Guarim Neto.
A finalidade deste trabalho caracteriza-se por um intenso exercício de reflexão sobre as condições e experiências de
vida compartilhadas na comunidade de são Miguel, assim como, da relação comunidade/natureza, caracterizada por
singularidades e subjetividades, apontando para a elaboração de um estudo que sirva de instrumento científico e de consulta à
educandos e educadores que buscam em suas vidas profissionais e acadêmicas a construção de um novo fazer pedagógico,
preocupado com a qualidade de vida e educacional na extensa e diversificada região amazônica. A proposta de pesquisa
apresentada subsidiará construção de Tese doutoral, bem como, a publicação de artigos em eventos e revistas científicas.
Você está sendo convidado (a) a participar, como voluntário (a), de uma pesquisa cujos dados serão
utilizados na elaboração da Tese de Doutorado em Educação em Ciências e Matemática, caso você concorde em
participar, favor assinar ao final do documento o qual foi elaborado em duas vias originais. Assim, solicita-se a sua
colaboração por meio de entrevista e análise de dados oficiais, permitindo os registros fotográficos na Escola Estadual São
Miguel do Flexal, que venham a contribuir para esta pesquisa de campo, como também a sua autorização para apresentar os
resultados deste estudo em eventos da área da Educação e/ou áreas afins a esta temática. Por ocasião da publicação dos
resultados, seu nome será mantido em sigilo.
Ressalta-se que a sua participação no estudo será voluntária e, portanto, o(a) senhor(a) não é obrigado(a)
a fornecer as informações e/ou colaborar com as atividades solicitadas pelo pesquisador, onde o mesmo estará a sua
disposição para qualquer esclarecimento que considere necessário em qualquer etapa da pesquisa.
Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser
contatado em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora:
Profa. Dra. Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro
Diante do exposto, declaro que fui devidamente esclarecido (a) e dou o meu consentimento na autorização desta
pesquisa de cunho científico e para publicação dos resultados. Estou ciente que receberei uma via desse documento.
_________________________________________
Nome do participante (em letra de forma)
______________________________________
Assinatura do Participante da Pesquisa
______________________________________
Assinatura da Testemunha
Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor entrar em contato com o pesquisador Márcio
Moreira Monteiro.
Contato (96) 999627718 - 981282876
E-mail: [email protected]
Atenciosamente,
______________________________________
Márcio Moreira Monteiro
Pesquisador
Pracuúba, _____ de __________________de 201__.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 144: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/144.jpg)
143
APÊNDICE H - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA O
(A) PARTICIPANTE DA PESQUISA - DIRETORA
Eu, __________________________________________________________________, RG nº ___________________,
diretor(a) da E.E. São Miguel do Flexal declaro compreender meus direitos como participante desta pesquisa intitulada
“Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá”,
orientada pelp Prof. Dr. Germano Guarim Neto e que tem como pesquisador responsável Márcio Moreira Monteiro,
doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática – REAMEC.
Nesta pesquisa pretende-se compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade
de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o ensino de
ciências desenvolvido na escola local.
O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será obtido pelo pesquisador Márcio Moreira Monteiro que irá realizar
observações diretas, vídeos, gravações, entrevistas e demais registros pertinentes à construção. O referido pesquisador
esclareceu o seguinte:
A participação na pesquisa será no sentido de permitir a filmagem e gravações de áudio nas atividades com as crianças, que
após serem avaliadas e transcritas serão unitarizadas e categorizadas por meio da análise textual discursiva. A identificação
será feita por um nome fictício escolhido pelo pesquisador, caso não concorde, a pesquisa não a identificará de nenhuma
forma. Os resultados da pesquisa serão publicados em parceria com o orientador da pesquisa. Não terá nenhum gasto e ganho
financeiro por participar da pesquisa. Não existem riscos nessa pesquisa e os benefícios serão no sentido de compreender os
efeitos das condições educacionais e socioeconômicas nos modos de vida/produção e subsistência dessa comunidade. Você é
livre para deixar de participar da pesquisa a qualquer momento sem nenhum prejuízo ou coação.
Este termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada pelo
pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com padrões
profissionais de sigilo, atendendo a legislação brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde),
utilizando as informações somente para os fins acadêmicos e científicos.
Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser contatado
em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora: Profa. Dra.
Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro
Qualquer dúvida a respeito da pesquisa, você pode entrar em contato com a Prof. Dr. Germano Guarim Neto
([email protected]) e pesquisador Márcio Moreira Monteiro (monteiromm3@gmail)
________________________________
Assinatura do pesquisador
_______________________________
Assinatura do orientador da pesquisa
________________________________
Assinatura do participante da pesquisa
Pracuúba, ___de______________ de 201__.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 145: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/145.jpg)
144
.
APÊNDICE I - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA O
(A) PARTICIPANTE DA PESQUISA - COORDENADOR(A) PEDAGÓGICO(A)
Eu, __________________________________________________________________, RG nº ___________________,
coordenador(a) pedagógico(a) da E.E. São Miguel do Flexal declaro compreender meus direitos como participante desta
pesquisa intitulada “Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do
Flexal/Pracuúba/Amapᔹ, orientada pelo Prof. Dr. Germano Guarim Neto e que tem como pesquisador responsável
Márcio Moreira Monteiro, doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática –
REAMEC.
Nesta pesquisa pretende-se compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na
comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o
ensino de ciências desenvolvido na escola local. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será obtido pelo pesquisador Márcio Moreira Monteiro que irá realizar
observações diretas, vídeos, gravações, entrevistas e demais registros pertinentes à construção. O referido pesquisador
esclareceu o seguinte:
A participação na pesquisa será no sentido de permitir a filmagem e gravações de áudio nas atividades com as crianças, que
após serem avaliadas e transcritas serão, unitarizadas e categorizadas por meio da análise textual discursiva. A identificação
será feita por um nome fictício escolhido pelo pesquisador, caso não concorde, a pesquisa não a identificará de nenhuma
forma. Os resultados da pesquisa serão publicados em parceria com o orientador da pesquisa. Não terá nenhum gasto e ganho
financeiro por participar da pesquisa. Não existem riscos nessa pesquisa e os benefícios serão no sentido de compreender os
efeitos das condições educacionais e socioeconômicas nos modos de vida/produção e subsistência dessa comunidade. Você é
livre para deixar de participar da pesquisa a qualquer momento sem nenhum prejuízo ou coação.
Este termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada pelo
pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com padrões
profissionais de sigilo, atendendo a legislação brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde),
utilizando as informações somente para os fins acadêmicos e científicos.
Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser contatado
em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora: Profa. Dra.
Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro.
Qualquer dúvida a respeito da pesquisa, você pode entrar em contato com a Prof. Dr. Germano Guarim Neto
([email protected]) e pesquisador Márcio Moreira Monteiro ([email protected]
________________________________
Assinatura do pesquisador
_______________________________
Assinatura do orientador da pesquisa
Assinatura do participante da pesquisa
Pracuúba,____ de______ de 201__.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 146: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/146.jpg)
145
APÊNDICE J - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA O
(A) PARTICIPANTE DA PESQUISA – PROFESSOR (A)
Eu, __________________________________________________________________, RG nº ___________________,
professor(a) da E.E. São Miguel do Flexal declaro compreender meus direitos como participante desta pesquisa intitulada
“Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá”,
orientada pelp Prof. Dr. Germano Guarim Neto e que tem como pesquisador responsável Márcio Moreira Monteiro,
doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática – REAMEC.
Nesta pesquisa pretende-se compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade
de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o ensino de
ciências desenvolvido na escola local. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será obtido pelo pesquisador Márcio Moreira Monteiro que irá realizar
observações diretas, vídeos, gravações, entrevistas e demais registros pertinentes à construção. O referido pesquisador
esclareceu o seguinte:
A participação na pesquisa será no sentido de permitir a filmagem e gravações de áudio nas atividades com as crianças, que
após serem avaliadas e transcritas serão, unitarizadas e categorizadas por meio da análise textual discursiva. A identificação
será feita por um nome fictício escolhido pelo pesquisador, caso não concorde, a pesquisa não a identificará de nenhuma
forma. Os resultados da pesquisa serão publicados em parceria com o orientador da pesquisa. Não terá nenhum gasto e ganho
financeiro por participar da pesquisa. Não existem riscos nessa pesquisa e os benefícios serão no sentido de compreender os
efeitos das condições educacionais e socioeconômicas nos modos de vida/produção e subsistência dessa comunidade. Você é
livre para deixar de participar da pesquisa a qualquer momento sem nenhum prejuízo ou coação.
Este termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada pelo
pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com padrões
profissionais de sigilo, atendendo a legislação brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde),
utilizando as informações somente para os fins acadêmicos e científicos.
Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser contatado
em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora: Profa. Dra.
Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro
Qualquer dúvida a respeito da pesquisa, você pode entrar em contato com a Prof. Dr. Germano Guarim Neto
([email protected]) e pesquisador Márcio Moreira Monteiro ([email protected]
________________________________
Assinatura do pesquisador
_______________________________
Assinatura do orientador da pesquisa
Assinatura do participante da pesquisa
Pracuúba, __de ________de 201__.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 147: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/147.jpg)
146
APÊNDICE K - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA O (A) PARTICIPANTE DA PESQUISA – PAIS OU RESPONSÁVEIS
Eu, __________________________________________________________________, RG nº ___________________,
declaro saber da participação de meu (minha) filho (a) ______________________________________ na pesquisa
“Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá¹,
desenvolvida na E.E. São Miguel do Flexal, pelo pesquisador Márcio Moreira Monteiro, sob orientação do Prof. Dr.
Germano Guarim Neto. Qualquer dúvida a respeito da pesquisa, você pode entrar em contato com a Prof. Dr. Germano
Guarim Neto ([email protected]) e pesquisador Márcio Moreira Monteiro ([email protected]).
O presente trabalho pretende compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na
comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o
ensino de ciências desenvolvido na escola local.
Os instrumentos utilizados na pesquisa consistirão em observações, vídeos, gravações e entrevistas com as
professores, crianças e membros da comunidade por meio da análise textual discursiva, unitarizando e categorizando os dado.
As cenas das crianças filmadas em sua rotina escolar, após serem avaliadas serão transcritas no sentido de facilitar a análise.
Compreendo que tenho a liberdade de retirar o meu consentimento em qualquer fase da pesquisa, sem penalização alguma. A
qualquer momento posso buscar maiores esclarecimentos, inclusive relativos à metodologia do trabalho.
Este termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada
pelo pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com
padrões profissionais de sigilo, atendendo a legislação brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de
Saúde), utilizando as informações somente para os fins acadêmicos e científicos.
Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser
contatado em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora:
Profa. Dra. Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro
Os responsáveis pela pesquisa garantem o sigilo que assegure a privacidade dos sujeitos quanto aos dados
envolvidos na pesquisa. Também concordo que meu (minha) filho (a) possa escolher um nome fictício para ser colocado no
texto da pesquisa para não ser identificado pelo seu nome de nascimento. Eu concordo com o uso de imagem da minha
criança para o trabalho e questão. Declaro compreender que as informações obtidas só podem ser usadas para fins científicos,
de acordo com a ética na pesquisa e que esta participação não comporta qualquer remuneração.
Nome escolhido pelo menor:______________________________________________
Pracuúba, ________de _____________________ de 201____.
_________________________________________________________________
Assinatura dos pais ou responsáveis
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 148: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/148.jpg)
147
APÊNDICE L - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA O (A) PARTICIPANTE DA PESQUISA – FUNCIONÁRIO DA ESCOLA
Eu, __________________________________________________________________, RG nº ___________________,
funcionário (a) da Escola Estadual São Miguel do Flexal, declaro compreender meus direitos como participante desta
pesquisa intitulada “Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do
Flexal/Pracuúba/Amapá”, orientada pelp Prof. Dr. Germano Guarim Neto e que tem como pesquisador responsável
Márcio Moreira Monteiro, doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática –
REAMEC.
Nesta pesquisa pretende-se compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade
de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o ensino de
ciências desenvolvido na escola local.
O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será obtido pelo pesquisador Márcio Moreira Monteiro que irá realizar
observações diretas, vídeos, gravações, entrevistas e demais registros pertinentes à construção. O referido pesquisador
esclareceu o seguinte:
A participação na pesquisa será no sentido de permitir a filmagem e gravações de áudio nas atividades com as crianças, que
após serem avaliadas e transcritas serão, unitarizadas e categorizadas por meio da análise textual discursiva. A identificação
será feita por um nome fictício escolhido pelo pesquisador, caso não concorde, a pesquisa não a identificará de nenhuma
forma. Os resultados da pesquisa serão publicados em parceria com o orientador da pesquisa. Não terá nenhum gasto e ganho
financeiro por participar da pesquisa. Não existem riscos nessa pesquisa e os benefícios serão no sentido de compreender os
efeitos das condições educacionais e socioeconômicas nos modos de vida/produção e subsistência dessa comunidade. Você é
livre para deixar de participar da pesquisa a qualquer momento sem nenhum prejuízo ou coação.
Este termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada pelo
pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com padrões
profissionais de sigilo, atendendo a legislação brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde),
utilizando as informações somente para os fins acadêmicos e científicos.
Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser contatado
em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora: Profa. Dra.
Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro
Qualquer dúvida a respeito da pesquisa, você pode entrar em contato com a Prof. Dr. Germano Guarim Neto
([email protected]) e pesquisador Márcio Moreira Monteiro ([email protected]).
________________________________
Assinatura do pesquisador
_______________________________
Assinatura do orientador da pesquisa
__________________________________________
Assinatura do participante da pesquisa
Pracuúba, ___de _______________ de 201__.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 149: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/149.jpg)
148
APÊNDICE M - TERMO DE ASSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
(Anuência do participante da pesquisa, criança, adolescente ou legalmente incapaz)
Você está sendo convidado (a) como voluntário (a) a participar da pesquisa “Comunidade, educação e meio ambiente: um
estudo de caso na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá”. Nesta pesquisa pretendemos compreender em que
termos as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP
influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o ensino de ciências desenvolvido na escola local.
O motivo que nos leva a estudar esse assunto é de compreender as experiências compartilhadas na comunidade, bem como, a
relação que se estabelece com a natureza e o ensino de ciências na Escola São Miguel do Flexal.
Para esta pesquisa adotaremos o(s) seguinte(s) procedimento(s): observações diretas, vídeos, gravações, entrevistas, produção
de imagens e registros escritos pertinentes à construção do trabalho.
Para participar desta pesquisa, o responsável por você deverá autorizar e assinar um termo de consentimento. Você não terá
nenhum custo, nem receberá qualquer vantagem financeira. Apesar disso, caso sejam identificados e comprovados danos
provenientes desta pesquisa, você tem assegurado o direito à indenização. Você será esclarecido (a) em qualquer aspecto que
desejar e estará livre para participar ou recusar-se. O responsável por você poderá retirar o consentimento ou interromper a
sua participação a qualquer momento. A sua participação é voluntária e a recusa em participar não acarretará qualquer
penalidade ou modificação na forma em que é atendido (a). O pesquisador irá tratar a sua identidade com padrões
profissionais de sigilo. Você não será identificado em nenhuma publicação. Não existem riscos nessa pesquisa e os benefícios
serão no sentido de compreender os efeitos das condições educacionais e socioeconômicas nos modos de vida/produção e
subsistência dessa comunidade.
Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser contatado
em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora: Profa. Dra.
Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro
Os resultados estarão à sua disposição quando finalizada. Seu nome ou o material que indique sua participação não será
liberado sem a permissão do responsável por você. Os dados e instrumentos utilizados na pesquisa ficarão arquivados com o
pesquisador responsável por um período de 5 anos, e após esse tempo serão destruídos. Este termo de consentimento
encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada pelo pesquisador responsável, e a outra será
fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com padrões profissionais de sigilo, atendendo a legislação
brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde), utilizando as informações somente para os fins acadêmicos
e científicos.
Eu, __________________________________________________, fui informado (a) dos objetivos da presente pesquisa, de
maneira clara e detalhada e esclareci minhas dúvidas. Sei que a qualquer momento poderei solicitar novas informações, e o
meu responsável poderá modificar a decisão de participar se assim o desejar. Tendo o consentimento do meu responsável já
assinado, declaro que concordo em participar dessa pesquisa. Recebi o termo de assentimento e me foi dada a oportunidade
de ler e esclarecer as minhas dúvidas.
Nome escolhido pelo menor:_______________________________________________________________________
Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor entrar em contato com o pesquisador Márcio Moreira
Monteiro.
Contato (96) 999627718 – 981282876 E-mail: [email protected]; [email protected]
Pracuúba, ____ de ______________ de 201__.
____________________________________ Assinatura do (a) menor
____________________________________
Assinatura do (a) pesquisador (a)
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
![Page 150: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/150.jpg)
149
ANEXO
PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DE MATO GROSSO
![Page 151: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/151.jpg)
150
HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE
MATO GROSSO
PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP
DADOS DO PROJETO DE PESQUISA
Título da Pesquisa: ¿Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá¿
Pesquisador: márcio moreira monteiro
Área Temática:
Versão: 3
CAAE: 57881016.0.0000.5690
Instituição Proponente: Universidade Federal de Mato Grosso
Patrocinador Principal: Financiamento Próprio
DADOS DO PARECER
Número do Parecer: 1.771.229
Apresentação do Projeto:
A presente proposta de pesquisa focaliza como eixo central de investigação, a
compreensão sobre as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade e
suas influências na alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, no ensino de
ciências desenvolvido na escola local. Busca-se, com este estudo, realizar um intenso
exercício de reflexão sobre as condições educacionais e socioeconômicas
experimentadas nessa região, assim como, da relação comunidade/natureza,
caracterizada por singularidades, visto sua localização e seus aspectos sociais, culturais,
![Page 152: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/152.jpg)
Endereço: Rua Fernando Correa da Costa, 2367
Bairro: BOA ESPERANCA
CEP: 78.060-900
UF: MT
Telefone:
Município:
(65)3615-8935
CUIABA
E-mail: [email protected]
Página 150 de
05
HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE
MATO GROSSO 151
ambientais e econômicos. Neste sentido, observa-se a necessidade de trazer para a
discussão científica tal realidade educacional, pois, entende-se que a partir dela será
possível um olhar diferenciado sobre a educação no referido espaço amazônico.
Objetivo da Pesquisa:
Objetivo Primário:
Compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na
comunidade de Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do
meio ambiente, bem como, o ensino de ciências desenvolvido na escola local.
Objetivos Secundários:
![Page 153: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/153.jpg)
Endereço: Rua Fernando Correa da Costa, 2367
Bairro: BOA ESPERANCA
CEP: 78.060-900
UF: MT
Telefone:
Município:
(65)3615-8935
CUIABA
E-mail: [email protected]
Página 151 de
05
HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE
MATO GROSSO 152
- Constatar a relação estabelecida entre moradores da comunidade e alteração ou conservação do meio
ambiente;
- Analisar o ensino de ciências desenvolvido na escola e qual sua relação com o saber local;
- Preparar material que permita o aproveitamento dos dados catalogados para uso na Escola manifestando-
se na relação ensino-aprendizagem.
Avaliação dos Riscos e Benefícios:
Riscos:
Considerando da resolução 510/16 CNS, em especial no que concerne ao seus artigos 18,
19, 20 e 21, informo que a pesquisa apresenta riscos mínimos aos participantes,
considerando que nesse tipo de pesquisa, com caráter dialógico, os riscos estariam "no
potencial de causar danos maiores do que os existentes na vida cotidiana". Em razão dos
riscos mínimos apresentados, o pesquisador estará atento a qualquer alteração no sentido
de desvirtuar as ações cotidianas dos participantes, se comprometendo, caso ocorra algo
fora dos padrões éticos estabelecidos, em encerrar imediatamente a pesquisa e informar o
sistema CEP/CONEP, lembrando sempre, que esta pesquisa é concebida, sustentada na
resolução 510/16, no sentido de prever e evitar possíveis danos aos participantes, e para
garantir que isto ocorra, são assinados termos (anexos) que garantem o "respeito aos
valores culturais, sociais, morais e religiosos, bem como aos hábitos e costumes, dos
participantes das pesquisas" (art. 3º, III).
Benefícios:
Com fundamento no artigo 2º,III da resolução 510/16 CSN, o qual estabelece que
benefícios são "contribuições atuais ou potenciais da pesquisa para o ser humano, para
a comunidade na qual está inserido e para a sociedade, possibilitando a promoção de
![Page 154: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/154.jpg)
HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE
MATO GROSSO
Endereço: Rua Fernando Correa da Costa, 2367
Bairro: BOA ESPERANCA
CEP: 78.060-900
UF: MT
Telefone:
Município:
(65)3615-8935
CUIABA
E-mail: [email protected]
Página 152 de
05
153
- Identificar as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do Flexal;
qualidade digna de vida, a partir do respeito aos direitos civis, sociais, culturais e a um
meio ambiente ecologicamente equilibrado" é que se pretende que esta proposta de
pesquisa aponte para a elaboração de um estudo que sirva de instrumento científico e de
consulta à educandos, educadores e membros da comunidade, preocupados com a
mehoria da qualidade de vida e educacional na extensa e diversificada região amazônica,
em especial na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP. Além disso, pretende-
se preparar material a partir dos dados coletados com a finalidade de subsidiar o trabalho
pedagógico da escola de São Miguel, em busca de uma educação ambiental e um
ensino de ciências que se volte para os saberes locais.
![Page 155: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/155.jpg)
Endereço: Rua Fernando Correa da Costa, 2367
Bairro: BOA ESPERANCA
CEP: 78.060-900
UF: MT
Telefone:
Município:
(65)3615-8935
CUIABA
E-mail: [email protected]
Página 154 de
05
HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE
MATO GROSSO 154
Comentários e Considerações sobre a Pesquisa:
A pesquisa é relevante para a comunidade acadêmica e não acadêmica.
O item relativo aos grupos de pesquisa do campo "Intervenções a serem realizadas" ainda
não está definido separando a comunidade escolar em seus grupos menores (diretor,
coordenadores, professores, alunos e seus responsáveis), mas há a descrição, mesmo
que sucinta dos procedimentos a serem realizados.
Considerações sobre os Termos de apresentação obrigatória:
Apresenta os termos como segue: folha de rosto devidamente assinada; projeto e
informações básicas do projeto; autorização da instituição para realização da pesquisa,
roteiros para entrevista com aluno, professor, diretor/coordenador da escola e pessoas da
comunidade, roteiro de observação de aula e TCLE, contendo os dados, informações,
resguardando os direitos aos participantes de forma adequada.
Recomendações:
Sem recomendações.
Conclusões ou Pendências e Lista de Inadequações:
Todas as pendências e solicitações foram atendidas.
Considerações Finais a critério do CEP:
Considerando as Resoluções 466/2012 e 510/2016, e, uma vez que a documentação
apresentada atende ao solicitado, emitiu-se o parecer para o presente projeto: Aprovado.
Conforme as Resoluções 466/12 e 510/2016, é atribuição do CEP acompanhar o
desenvolvimento dos projetos, por meio de relatórios semestrais dos pesquisadores e de
![Page 156: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/156.jpg)
Endereço: Rua Fernando Correa da Costa, 2367
Bairro: BOA ESPERANCA
CEP: 78.060-900
UF: MT
Telefone:
Município:
(65)3615-8935
CUIABA
E-mail: [email protected]
Página 155 de
05
HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE
MATO GROSSO 155
outras estratégias de monitoramento, de acordo com o risco inerente a pesquisa. Por isso
o(a) pesquisador(a) responsável deverá encaminhar para o CEP/Humanidades/UFMT os
relatórios parciais a cada seis meses e o Relatório Final de seu projeto, até 30 dias após o
seu término.
Este parecer foi elaborado baseado nos documentos abaixo relacionados:
Tipo Documento Arquivo Postagem Autor Situação
Informações Básicas do Projeto
PB_INFORMAÇÕES_BÁSICAS_DO_P ROJETO_754054.pdf
13/09/2016 22:48:37
Aceito
Declaração de Pesquisadores
decla.jpg 13/09/2016 22:47:10
márcio moreira monteiro
Aceito
![Page 157: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/157.jpg)
Endereço: Rua Fernando Correa da Costa, 2367
Bairro: BOA ESPERANCA
CEP: 78.060-900
UF: MT
Telefone:
Município:
(65)3615-8935
CUIABA
E-mail: [email protected]
Página 156 de
05
HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE
MATO GROSSO 156
Outros Termo_resp_modificado2.docx 13/09/2016 22:31:09
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros Termo_assentimento_modificado2.doc 13/09/2016 22:30:10
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros Termo_prof_modificado.docx 15/08/2016 18:11:21
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros Termo_func_modificado.docx 15/08/2016 18:09:30
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros Termo_diretor_modificado.doc 15/08/2016 18:07:30
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros Termo_coord_modificado.docx 15/08/2016 18:06:27
márcio moreira monteiro
Aceito
TCLE / Termos de Assentimento / Justificativa de Ausência
TCLE_modificado.doc 15/08/2016 18:03:05
márcio moreira monteiro
Aceito
Projeto Detalhado / Brochura Investigador
Projeto_comunidade.doc 15/07/2016 00:58:54
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros Guia_aluno.docx 15/07/2016 00:54:17
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros guia_professor.docx 15/07/2016 00:53:45
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros Entrevista_aluno.docx 15/07/2016 00:53:06
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros Entrevista_professor.docx 15/07/2016 00:51:39
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros Entrevista_comunidade.docx 15/07/2016 00:50:04
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros Entrevista_diretor_coordenador.docx 15/07/2016 00:46:19
márcio moreira monteiro
Aceito
Outros aceite.pdf 14/07/2016 14:39:06
márcio moreira monteiro
Aceito
Folha de Rosto folha.pdf 14/07/2016 14:35:15
márcio moreira monteiro
Aceito
Situação do Parecer:
Aprovado
Necessita Apreciação da CONEP:
Não
![Page 158: COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de … · do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas, instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas,](https://reader030.vdocuments.com.br/reader030/viewer/2022040702/5d67437e88c993d0688b93b9/html5/thumbnails/158.jpg)
HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE
MATO GROSSO
Endereço: Rua Fernando Correa da Costa, 2367
Bairro: BOA ESPERANCA
CEP: 78.060-900
UF: MT
Telefone:
Município:
(65)3615-8935
CUIABA
E-mail: [email protected]
Página 150 de
05
157
CUIABA, 11 de Outubro de
2016
Assinado por:
Rosangela Kátia Sanches
Mazzorana Ribeiro
(Coordenador)