comunidade, educaÇÃo e meio ambiente: um estudo de … · do flexal no município de...

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0 UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA Márcio Moreira Monteiro COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do Flexal, Pracuúba, Amapá, Brasil Macapá (AP) 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS

REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E

MATEMÁTICA

Márcio Moreira Monteiro

COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de caso na

comunidade de São Miguel do Flexal, Pracuúba, Amapá, Brasil

Macapá (AP)

2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS

REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E

MATEMÁTICA

Márcio Moreira Monteiro

COMUNIDADE, EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE: um estudo de caso na

comunidade de São Miguel do Flexal, Pracuúba, Amapá, Brasil

Tese apresentada ao Programa de Pós-

graduação em Educação em Ciências e

Matemática da Rede Amazônica de Educação

em Ciências e Matemática – REAMEC. Linha

de Pesquisa: Fundamentos e Metodologias

para a Educação em Ciências e Matemática.

Orientador: Prof. Dr. Germano Guarim

Neto

Macapá (AP)

2018

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Dedico este trabalho, em primeiro lugar, aos

moradores da Comunidade de São Miguel do

Flexal, Pracuúba, Amapá, sem os quais essa

produção científica não seria possível, tendo a

certeza de que os escritos aqui contidos poderão

contribuir para a construção de outros olhares em

relação a esse espaço amazônico.

Aos amigos Fábio Xavier, Rafaella Xavier e família

(em memória) com muita saudade e convicção de

que estão em melhor lugar.

À minha amada Cristilene de Moura Mendonça,

companheira que espero ter por toda minha vida.

Aos meus filhos Pedro Henrique Araújo Monteiro,

Manoela Barata Monteiro, Maria Eduarda Figueira

Monteiro e ao caçula Christian Reizo Mendonça

Monteiro, presentes que recebi do Criador.

Aos meus pais Francisco Xavier Monteiro e

Marlene Moreira Monteiro, só posso dizer que os

amo muito por tudo que representam na minha

vida.

Aos meus irmãos Marcel Moreira Monteiro,

Marcilene Moreira Monteiro e Marilene Moreira

Monteiro com extensão aos cunhados e cunhadas.

Aos meus avós Pedro Moreira (em memória), Edith

Cipriano Moreira, Manoel Monteiro (em memória),

Edilena Monteiro (em memória) e a todos os meus

familiares e amigos.

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Gosto de ser gente porque, mesmo sabendo que

as condições materiais, econômicas, sociais e

políticas, culturais e ideológicas em que nos

achamos geram quase sempre barreiras de difícil

superação para o cumprimento de nossa tarefa

histórica de mudar o mundo, sei também que os

obstáculos não se eternizam.

Paulo Freire

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AGRADECIMENTOS

Agradeço em primeiro lugar a Deus, pois sem sua presença em nossas vidas

não seríamos nada, por ter proporcionado forças para o enfrentamento de todos os

obstáculos surgidos no caminho trilhado.

Ao Professor Germano Guarim Neto, Orientador e amigo querido, sem o qual

este trabalho não teria alcançado os objetivos traçados.

Aos amigos de doutorado, em especial: Danielle Dias, Alexandre Pereira,

Alexandre Damasceno, Adriano Aparecido, Lourimara Farias, Jacirene Vasconcelos

e Edslei Rodrigues.

À minha amiga Leda Valéria por todas as contribuições acadêmicas

A todos os professores do Programa de Doutorado/REAMEC, especialmente

aos que ministraram aula para os doutorandos do Polo UFPA.

Ao meu sogro Paulo Leite de Mendonça e minha sogra Maria Madalena de

Moura Mendonça, por todo incentivo e conhecimentos compartilhados.

A Raquel Moura por suas traduções impecáveis.

Aos amigos Gilvane Cordeiro e Hudson Marques pelo apoio e orientações na

formatação do trabalho.

Aos moradores de São Miguel por terem aceitado dialogar e compartilhar

saberes com este pesquisador.

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RESUMO (Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na

comunidade de São Miguel do Flexal, Pracuúba, Amapá, Brasil). A presente

pesquisa focaliza como eixo central de investigação, a compreensão sobre as

condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do

Flexal e suas influências na alteração ou conservação do meio ambiente, bem como,

no Ensino de Ciências desenvolvido na escola local. Busca-se, com este estudo,

realizar um intenso exercício de reflexão sobre as condições educacionais e

socioeconômicas experimentadas nessa região, assim como, da relação

comunidade/natureza, caracterizada por singularidades, visto sua localização e seus

aspectos sociais, culturais, ambientais e econômicos. Neste sentido, questiona-se

em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade

de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do

meio ambiente, bem como, o Ensino de Ciências desenvolvido na escola local? A

base metodológica teve como sustentação a Pesquisa Narrativa, efetivada por meio

da Analise Textual Discursiva, considerando a necessidade de apresentar um olhar

singular e interpretativo sobre os fenômenos vividos na localidade. As percepções

apresentadas pelos informantes por meio de suas vozes e de minhas intepretações

constituem um conjunto de preocupações, angústias e saberes que foram

construídos ao longo da história dessa população a qual se caracteriza pela

necessidade dos recursos naturais ainda hoje presentes na vida dos moradores,

levando à constatação de que a ausência de políticas públicas das mais diversas

ordens, necessidade de sobrevivência do homem local e ação de agentes externos

na exploração e comércio do que é retirado da natureza contribuem decisivamente

para alteração da paisagem e desaparecimento de espécies da fauna e flora local.

Conhecimento dos ciclos naturais, de plantas, animais e de seres naturais e

sobrenaturais que efetivamente habitam o cotidiano local, são alguns dos saberes

presentes no dia a dia de quem vive esse ambiente, sendo indispensáveis à

construção de uma proposta pedagógica de cunho ambiental que valorize os

saberes tradicionais por meio do Ensino de Ciências desenvolvido na escola.

Palavras-chave: Comunidade. Conservação. Meio Ambiente. Ensino de Ciências.

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ABSTRACT (Community, education and the environment: a case studied in the

community of São Miguel do Flexal, Pracuúba, Amapá, Brazil). The present research

focuses on the central role of the understanding of São Miguel do Flexal community‟s

conditions and life experiences, as well as their influence on the alteration or

conservation of the environment, and also on the science education that the local

school has being developing. This study intends to carry out an intense exercise of

reflection about the educational and socioeconomic conditions present in this region,

as well as on the relationship between community and nature, characterized by their

singularities: location and their social, cultural, environmental and economic aspects.

In this sense, it was questioned in which terms the São Miguel do Flexal / Pracuúba /

AP community‟s conditions and shared life experiences have been influencing on the

alteration or conservation of the environment, as well as if the local school has being

teaching science education. The methodological base was the Narrative Research,

carried out through the Discursive Textual Analysis, considering the need to present

a singular and interpretative look at these phenomena that have been happenning in

the place. A set of worries, anxieties and knowledge of the informants‟ perceptions

and my interpretations throughout the history of this population, concerning the need

of natural resources still present in the life of the residentes – taking to the fact that

the absence of public policies of the most diverse orders, the necessity for local

man's survival and the action of external agents in the exploration and trade of what

is taken from nature – contribute decisively to the alteration of the landscape and the

disappearance of species of local fauna and flora. Knowledge of the innate cycles,

plants, animals and natural and supernatural beings, that effectively inhabit the

community, are some of the knowledge present in the daily life of those who live in

this ambience, indispensable to the construction of an environmental pedagogical

proposal, which values traditional knowledge through the teaching of science that the

local school develops.

Key words: Community. Conservation. Environment. Science teaching.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 01 - Mapa esquemático produzido por um morador São Miguel do Flexal 24

Figura 02 - Animal bubalino sendo preparado para o transporte de carga 24

Figura 03 - Três momentos: águas grandes, estiagem e transição 31

Figura 04 - Chegada a Comunidade de São Miguel do Flexal 50

Figura 05 - Visão geral: Escola e Posto de Saúde 52

Figura 06 - Extração de leite e manejo do gado em período de transição 57

Figura 07 - Início da saída: procissão e encontro na praça 61

Figura 08 - Momento de queima de fogos 62

Figura 09 - Espécies típicas da região: frutinheira e andirobeira 68

Figura 10 - Pescaria em período de transição das águas 69

Figura 11 - Período de garças, marrecas e pequenos peixes 70

Figura 12 - Capivara abatida por moradores 71

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SUMÁRIO

1 CONCEPÇÕES INTRODUTÓRIAS: contextualizando o estudo. ....................... 12

2 IDAS E VINDAS NO PROCESSO CONSTRUTIVO: a trilha metodológica e suas

singularidades. ........................................................................................................ 22

2.1 Área de estudo: descrevendo a comunidade de São Miguel do Flexal .... 22

2.2 Caracterização do processo construtivo ..................................................... 25

2.3 O universo do estudo .................................................................................... 30

2.4 Amostragem: os informantes e suas informações ..................................... 31

2.5 A coleta/construção dos dados: a vez e a voz dos informantes ............... 32

3 AFINAL DE QUE CIÊNCIA ESTAMOS FALANDO?: reflexões sobre o

pensamento científico e o ensino de ciências. ..................................................... 34

3.1 A ciência ocidental e a “necessidade de generalização” ........................... 34

3.2 Saber local: conhecimento complexo, interpretativo e cultural. ............... 40

3.3 Educação ambiental e perspectivas para o ensino de ciências ................ 44

4 APRESENTANDO O CENÁRIO: singularidades e saberes no âmbito

comunitário .............................................................................................................. 50

4.1 Condições de vida: organização social e políticas públicas ..................... 51

4.1.1 O cenário educacional local ...................................................................... 53

4.1.2 Aspectos gerais da saúde local ................................................................. 54

4.1.3 Trabalho .................................................................................................... 56

4.2 Experiências de vida: relações culturais, hábitos e formas de

subsistência. ........................................................................................................ 58

4.2.1 Crenças, festas e suas implicações. ......................................................... 59

4.2.1.1 O arraial de São Francisco ..................................................................... 60

4.2.1.2 A crença inabalável nos dons de cura e no conhecimento dos mais

idosos. ................................................................................................................ 63

4.2.2 Saberes locais e meio ambiente ............................................................... 65

4.2.3 Extrativismo: flora, pesca, caça ................................................................. 68

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5 CONHECIMENTO CIENTÍFICO E SABERES AMBIENTAIS: representação,

memória e significados para o ensino de ciências .............................................. 73

5.1 Percepções ambientais presentes no cotidiano local ................................ 75

5.1.1 Sobre políticas locais ................................................................................ 79

5.1.2 Sobre alterações ambientais ..................................................................... 82

5.1.3 Sobre a convivência com o meio ambiente ............................................... 85

5.1.4 Sobre Educação Ambiental ....................................................................... 89

5.2 Ordem e desordem no ensino de ciências: a complexidade da Educação

Ambiental ............................................................................................................. 92

5.3 Textos e contextos na construção do conhecimento ambiental ............. 102

6 POSSIBILIDADES PARA O DESENVOLVIMENTO DE PRÁTICAS

PEDAGÓGICAS AMBIENTAIS A PARTIR DO ENSINO DE CIÊNCIAS ............... 110

6.1 Dimensão teórico-epistemológica: porque Educação Ambiental por meio

do Ensino de Ciências? .................................................................................... 111

6.2 Dimensão político-cultural-ambiental: problematização e temas

geradores locais ................................................................................................ 116

6.3 Dimensão pedagógico-escolar: materiais didáticos e conhecimentos

tradicionais ......................................................................................................... 117

6.3.1 Eixo 1 – Ciclos naturais e seus tempos ................................................... 118

6.3.2 Eixo 2 – Relação ser humano-ambiente ................................................. 119

6.3.3 Eixo 3 - Ambiente e desenvolvimento ..................................................... 120

7 REFLEXÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................... 122

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 129

APÊNDICES ........................................................................................................... 135

ANEXO ................................................................................................................... 149

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1 CONCEPÇÕES INTRODUTÓRIAS: contextualizando o estudo.

Os mitos alimentam nossa alma, são elementos que nos dão força para continuar a viver; são possuidores de forças de esperança, uma forma de lidar com medos e desejos, uma maneira de entendermos a nós mesmos e à nossa realidade [...] (SILVA, 2016, p. 30)

Apresentar e representar aspectos culturais, vivências e experiências

educacionais voltadas para a Educação Ambiental e o Ensino de Ciências

compartilhado no âmbito de tão singular comunidade, Comunidade de São Miguel

do Flexal no município de Pracúuba/AP, rica em suas diversas formas, humanas,

instrumentais, culturais, estéticas, folclóricas, mitos e tradições, por certo, é uma

tarefa que exige um olhar atento e diferenciado acerca das atividades humanas e

das relações produzidas a partir deste movimento, caracterizado por conhecimento

profundo da natureza e de sua relação com as condições e experiências de vida

experimentadas nesta localidade.

Adentrar nesse espaço, ser aceito pelos moradores, ter a oportunidade de

conviver intensamente o cotidiano local, com suas regras de conduta, tradições e

formas de ensinar e aprender ciências em contato com o ambiente local me permite

“mergulhar” em um universo cultural genuinamente amazônico, marcado por

saberes, até então, não observados pelo modelo de ciência clássico e sua rigidez

metodológica preocupada em formular e confirmar hipóteses pré-fabricadas que na

maioria das vezes não dão conta dos problemas que se apresentam no movimento e

no dinamismo do cotidiano de cada realidade apresentada.

O processo de imersão no cotidiano da comunidade é algo imprescindível

nessa pesquisa, uma vez que, para entender as mais variadas teias e tramas

produzidas ao longo das relações estabelecidas na localidade, torna-se necessário

estar impregnado dos elementos constituintes dos saberes produzidos e de suas

influências na alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, no ensino de

ciências desenvolvido na escola local.

Diante do cenário apresentado e do senso de ética e responsabilidade mútuo

em relação à comunidade, tenho cada vez mais a convicção de que esta pesquisa

se encontra em um terreno rico em possibilidades de vivências e saberes, não se

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resumindo somente a relatar fatos e histórias de vida. Enfatizo este ponto, por

considerar que um trabalho construído sob essa ótica necessita estabelecer um

diálogo aberto com as pessoas que fazem parte do cotidiano, e nesta perspectiva,

se entrelaçam atitudes, hábitos, modos de vida, saberes, elementos culturais que

permitem, de acordo com o repertório teórico de cada um, a construção de uma

concepção e de percepções próprias que subvertem e extrapolam a generalização

científica.

Não se pode sentir pelos outros, a experiência, embora seja relacional e

coletiva, produz efeitos nas subjetividades, nas formas como cada indivíduo enxerga

o mundo que o cerca e com ele interage, então o olhar é sempre um olhar de

alguém, a história que se conta está repleta de elementos que fazem parte da vida

de quem a descreve, suas alegrias, tristezas e saberes, que no caso, são muito mais

locais do que universais.

Sempre acreditei que para se construir um trabalho de cunho científico, seria

necessário, primeiramente, a construção de um vasto referencial teórico sobre o

objeto de estudo que se pretende investigar e posteriormente proceder a

transposição deste referencial para o campo de trabalho, como um jogo de encaixe

perfeito, matematizado no sentido mais puro da ciência. Nesse caso, não se

pretende espaço para coisas inesperadas e muito menos para o improviso, pois

levantam-se hipóteses que devem ser confirmadas ou negadas por meio da

experimentação, a qual se sustenta em um equilíbrio metodológico que ao mesmo

tempo em que assegura o sucesso acadêmico, também amordaça o pesquisador a

medida que não permite a vivência, a subjetividade e todas as suas possibilidades

de aprendizagem.

O desejo de conhecer e de aprender com e na comunidade de São Miguel

levaram-me a um processo de (des)construção epistemológica e metodológica, já

que, no momento em que resolvi abraçar esse trabalho, tive a necessidade de

refletir e reelaborar minhas “convicções” acerca da produção do conhecimento

científico, algo que está acontecendo de forma contínua, sem preocupação de ponto

de partida ou de chegada.

Importante esclarecer que não estou desprezando o rigor científico e

metodológico apresentado pela ciência e seus paradigmas, muito menos a

importância de suas contribuições para o conhecimento humano. Apenas, com

fundamento em concepções próprias, vivências e repertório teórico, chego a

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conclusão de que a maneira como eu entendia e fazia ciência não poderia dar conta

dessa proposta de trabalho, uma vez que, trata-se de pesquisar e trazer para o

mundo acadêmico conhecimentos que se encontram no campo das relações sociais,

políticas, culturais e humanas. Subjetividades que se entrelaçam e que compõem

um mosaico de conhecimentos que só apresentam sentido no cotidiano, no saber

local com todas as suas nuances e peculiaridades.

Meus esquemas de pesquisa, e foram muitos elaborados, não podiam mais

me ajudar no desafio que se apresentava neste novo cenário acadêmico. Ficava

imaginando como “coletar” os dados e posteriormente como apresentar tais dados

para academia. Esta preocupação tornou-se latente por conta de um episódio em

especial, no qual ouvi uma pesquisadora formada em uma instituição de renome

nacional a seguinte afirmativa: “na instituição em que cursei doutorado tem que se

usar a expressão coleta de dados, se não for assim, você já está reprovado”. Este

pressuposto me chamou atenção e aguçou ainda mais a curiosidade e necessidade

de entender outras possibilidades epistemológicas e metodológicas de pesquisa,

principalmente pelo fato de que simplesmente, “coletar dados” não seria o suficiente

para representar toda gama de conhecimentos presentes e em construção na

comunidade pesquisada.

A partir de conversas e leituras indicadas por meu orientador de pesquisa e

de disciplinas cursadas neste programa de doutorado (Educação em Ciências e

Matemática – PPGECEM/REAMEC), em destaque, bases epistemológicas e

pesquisa narrativa, e principalmente por minha convivência junto à comunidade e a

convicção de que o conhecimento compartilhado não é algo estático a ser “coletado”

como frutos em uma árvore devidamente catalogada e classificada dentro dos

padrões científicos, passo a entender a pesquisa como um processo em construção

onde as coisas não são dadas, mas sim construídas nas subjetividades e nas

relações sociais e culturais presentes no cotidiano. Nesse sentido, com a intenção

de melhor entender os conhecimentos presentes no cenário em estudo, me

aproximo da pesquisa narrativa e da própria antropologia, na vertente proposta por

Geertz (2008), tomando emprestado as ideias de Ryle (1949), buscando fazer uma

descrição densa das condições e experiências de vida compartilhadas nessa

localidade da região amazônica e a relação de seu povo com o meio ambiente.

Lembro-me dos primeiros contatos que tive com a comunidade de São

Miguel, que datam da época em que fui professor do Sistema Modular de Ensino

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(SOME), um projeto da Educação Básica implementado pela Secretaria de Estado

da Educação/AP. Resumidamente, mesmo porque discutir esse projeto não é a

proposta da pesquisa, o SOME funcionava com um calendário escolar diferenciado

permitindo aos professores a convivência por 50 (cinquenta) dias letivos em um

determinado município, o suficiente para o cumprimento das cargas horárias das

disciplinas ofertadas naquele módulo. Tal dinâmica permitia que grupos de

professores estivessem presentes, no mínimo em quatro munícipios durante o ano,

levando-se em consideração o cumprimento de 200 (duzentos) dias de efetivo

trabalho escolar conforme previsto no art. 24, I, da Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional. Esse sistema possibilitou condições para que desenvolvesse

minhas atividades docentes em um determinado período, por volta do ano 2000, no

município de Pracuúba, e então, mesmo que de forma atrapalhada, tenho minha

primeira aproximação com o município. Utilizo a expressão atrapalhada pelo fato de

que a experiência docente a qual me refiro, pelo menos do meu ponto de vista, não

foi das mais promissoras, sobretudo para os alunos. Não expresso orgulho quando

abordo esse episódio, na verdade, tenho até vergonha, porém é algo que marca

minha formação enquanto docente e pesquisador e fundamentalmente funcionou

como aprendizado no decorrer de minha carreira. No período em que estive por lá,

ministrei a disciplina filosofia da educação em duas turmas do Ensino Médio (tarde e

noite). A turma da tarde era formada por adolescentes, já a do período noturno, em

sua maioria por trabalhadores rurais que, mesmo com o cansaço diário,

demonstravam entusiasmo em participar das aulas o que não acontecia com os

alunos do período da tarde. Não é difícil profetizar o que aconteceu. Por óbvio, o

discurso que imprimo nesse trecho, permite a dedução de que houve reprovação em

massa na turma vespertina, o que de fato aconteceu.

Refletindo, ao longo de minha formação, penso ter sido um momento crítico,

haja vista, que pude conhecer uma realidade bem diferente do que estava

acostumado, e realmente, não tive a competência e o bom senso para trabalhar as

situações apresentadas, entender o momento, os indivíduos e principalmente o

contexto que estava tendo a oportunidade de vivenciar. Como se fala no dito popular

“não conseguia enxergar um palmo a frente do meu nariz”, aliás, enxergar um palmo

a frente do nariz não é tarefa das mais simples, principalmente dentro de uma

perspectiva interpretativa das relações culturais. Nesse sentido, provavelmente,

algumas coisas consigo enxergar e outras não. O fato é que as lentes que utilizo

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hoje me permitem lançar outro olhar sobre as relações, e é claro, que tais lentes não

alcançam tudo aquilo que desejo ou que pelo menos necessito. Certo que estou

desse fato, me permito a modificação de lentes. Procuro usar àquelas que me

possibilitem ver o mundo em constante movimento, suas relações, suas tramas,

suas alegrias, suas tristezas, seus dramas e seus saberes.

Uso a metáfora das lentes, visto ser muito apropriada ao tipo de estudo que

estou propondo, voltado para uma coletividade capaz de conviver com o meio

ambiente, conhecedora de seus problemas e que tem muito a contar, compartilhar e

ensinar. As lentes funcionam como um alargador de possibilidades no sentido de me

propiciar uma visão mais acurada das vivências e relações culturais. É claro que

mesmo com as lentes mais potentes, sempre será o meu olhar acerca do observado

e vivenciado, serão minhas impressões e considerações sobre cada episódio, cada

conto, cada história e estória compartilhada no plano comunitário. Em verdade, não

pretendo formular uma teoria geral, mesmo porque seria incoerente com as bases

epistemológicas desse trabalho. O que se pretende, é o entendimento mais rico

possível das complexas relações subjacentes no fazer da comunidade em seus

diversos campos de atuação.

Retornando ao meu contato com o município de Pracuúba, somente volto a

visitá-lo no ano de 2010, por intermédio de minha esposa, que como dizem os

moradores da região “possui o umbigo enterrado na comunidade”. Daí surge a

curiosidade, o interesse em conhecer as formas e condições de vida daquela gente

e sua relação com o ambiente e o ensino de ciências trabalhado na escola de São

Miguel. Meus sentidos se aguçam, principalmente por conta das histórias que passo

a ouvir de moradores antigos e que retratam traços culturais marcantes do convívio

social local.

A partir desse início de convivência, começo a me preocupar com os

problemas enfrentados na e pela comunidade, iniciando um processo de integração,

não para me tornar um nativo local, mas na tentativa de compreender os costumes,

hábitos e formas de relação com a natureza apresentada pelos moradores. Assim,

me proponho a questionar de forma central em que termos as condições e

experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do

Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem

como, o ensino de ciências desenvolvido na escola local? Com a intenção de criar

eixos que norteiem a construção dos objetivos da pesquisa, também questiono

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subsidiariamente: Que condições e experiências de vida são compartilhadas na

comunidade de São Miguel do Flexal?; Que tipo de relação se estabelece entre

moradores da comunidade e alteração ou conservação do meio ambiente?; Que

ensino de ciências se desenvolve na escola e qual sua relação com práticas

ambientais amparadas no saber local?

As vivências experimentadas nas relações que estabeleço com os moradores

de São Miguel, me permitem sentir, subjetivamente é claro, as angústias, as

alegrias, as tristezas e as motivações que levam a comunidade a se constituir de

maneira particular, única no cenário amazônico. Com base nos sentimentos

expostos, proponho o delineamento da pesquisa a partir de duas ideias principais: a

primeira refere-se ao pressuposto de que as condições e experiências de vida

compartilhadas na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam

diretamente na conservação/alteração do meio ambiente, porém, tendo pouca

expressividade no que concerne ao ensino de ciências desenvolvido na escola local,

dificultando a valorização das vivências, saberes e relações culturais

experimentadas na comunidade, o que provavelmente aconteça pelo fato de a

escola não trabalhar com conteúdos emergentes das relações sociais e culturais do

cotidiano dos alunos; a segunda se sustenta na premissa de que o trabalho

pedagógico desenvolvido pelos professores quando fundamentado em temas

geradores locais (TGL) possibilita maior envolvimento com os saberes da

comunidade, tornando os conteúdos mais significativos para os alunos e suas

famílias, consequentemente permitindo a valorização da cultura local e das práticas

de conservação ambiental.

Abraço a investigação do tipo etnográfica como pressuposto basilar desta

pesquisa, e não poderia ser diferente, uma vez que, o foco do trabalho está nas

relações cotidianas no âmbito da comunidade e da escola, tendo como objetivo

principal compreender em que termos as condições e experiências de vida

compartilhadas na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a

alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o ensino de ciências

desenvolvido na escola local e de maneira específica: Identificar as condições e

experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do Flexal;

Entender a relação estabelecida entre moradores da comunidade e alteração ou

conservação do meio ambiente; analisar o ensino de ciências desenvolvido na

escola e sua relação com práticas ambientais amparadas no saber local; apontar

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para possibilidades pedagógicas que permitam a valorização dos saberes

tradicionais ambientais por meio do ensino de ciências.

Nesse tempo em que frequento a comunidade, entrei em um processo de

integração, participando de suas festas profanas, religiosas e culturais, além de

envolvimento com o trabalho local, no trato com o gado (bovinos e bubalinos), com a

pesca, caça e com a flora abundante na região. Assim, inicio um processo descritivo,

analítico e envolvente que me proporciona o entendimento das crenças e dos contos

locais, presentes, por exemplo, na soltura dos quelônios (projeto que descrevo

posteriormente) e no arraial de São Francisco (festa católica que reúne a

comunidade de maneira geral), além do que consigo observar e ouvir no cotidiano

dos moradores, frequentando suas casas e o seu campo de trabalho. Posso dizer

que me sinto muito a vontade com as pessoas e suas histórias, e penso que isto foi

determinante para o desenvolvimento dessa investigação, já que pelas relações

estabelecidas, tornou-se implícita uma aceitação de convivência por parte dos

moradores, os quais abrem suas casas e se prontificam a me contar e me mostrar

seus afazeres domésticos e profissionais.

Interpretar os elementos culturais de um povo é uma tarefa que exige

disposição, bom senso, impregnação, envolvimento na vida comunitária em toda sua

extensão. Por este motivo, tenho a preocupação inicial, em ser aceito pela

comunidade, como alguém que mereça a confiança de compartilhar os diversos

saberes construídos ao longo de sua história. É dessa maneira que me situo

enquanto pesquisador, alguém com compromisso ético em descrever, analisar e

apresentar ao mundo acadêmico os saberes produzidos nas praticas de vida

cotidiana de pessoas que não se preocupam em fazer ciência, pelo menos não do

ponto de vista da ciência clássica e de seus paradigmas e hipóteses.

Para efeito de organização e apresentação da pesquisa, buscando a melhor

organização didática das trilhas que descrevo e analiso, proponho capítulos

entrelaçados, ligados por uma perspectiva de um fazer ciência alicerçado na e para

comunidade, uma ciência constituinte e constituída nas relações culturais de um

povo e sua trajetória de vida.

A partir daqui, descrevo inicialmente o percurso metodológico da pesquisa, a

qual se caracteriza por uma abordagem qualitativa em uma perspectiva narrativa,

tendo como parâmetro orientador a análise textual discursiva, visto a necessidade

de compreensão de fenômenos, concepções e fazeres constituídos em âmbito local.

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Denomino essa parte do trabalho como o processo de “IDAS E VINDAS NO

PROCESSO CONSTRUTIVO: a trilha metodológica e suas singularidades”, pois

são vários os momentos de encontros e desencontros no decorrer da investigação,

levando-me a caminhos até então não previstos no planejamento.

O terceiro ponto que proponho, visa refletir sobre o pensamento científico

ocidental produzindo-se uma análise de seus aspectos históricos e suas

repercussões na ciência contemporânea. Outro item em destaque refere-se a

etnociência como pressuposto de um fazer científico forjado no saber local e em

suas construções culturais e simbólicas no campo comunitário, além de discutir a

Educação Ambiental e suas possibilidades para o ensino de ciências. Assim, intitulo

essa parte da pesquisa indagando “AFINAL DE QUE CIÊNCIA ESTAMOS

FALANDO?: reflexões sobre o pensamento científico e o ensino de ciências”.

Como quarto pressuposto, enfatizo os saberes locais interpretados sob o

prisma das condições e experiências de vida presentes na comunidade de São

Miguel do Flexal, apontando características e peculiaridades das convivências

estabelecidas pelos moradores, em capítulo que configuro como “APRESENTANDO

O CENÁRIO: singularidades e saberes no âmbito comunitário”

O quinto momento “CONHECIMENTO CIENTÍFICO E SABERES

AMBIENTAIS: representação, memória e significados para o ensino de

ciências”, trata das percepções ambientais presentes no cotidiano local a partir de

uma lógica complexa considerando o contexto organizacional em movimento e

observando aspectos políticos, ambientais e sociais. Enfatiza a importância de

professores e alunos se aventurarem em novos caminhos, nem sempre seguros, por

vezes até bastante escorregadios, mas que proporcionam a abertura de novas

trilhas e descobertas no que concerne ao processo dialógico de construção de

conhecimentos ambientais. Por fim, analisa o fazer pedagógico docente e os modos

de entendimento sobre os conhecimentos ambientais já construídos pelos alunos na

vivências experienciadas em nível local.

A parte final da pesquisa “POSSIBILIDADES PARA O DESENVOLVIMENTO

DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS AMBIENTAIS A PARTIR DO ENSINO DE

CIÊNCIAS”, tem a preocupação de apresentar perspectivas pedagógicas para um

fazer educativo ambiental voltado para a comunidade de São Miguel do Flexal,

apontando diretrizes e propostas sustentadas em Temas Geradores Locais, tendo a

intenção de criar condições para o desenvolvimento de um processo educacional

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condizente com os saberes produzidos na localidade. Os conhecimentos do

cotidiano são colocados em destaque juntamente com os denominados conteúdos

escolares o que se faz por um processo de problematização e reflexão de temas

emergentes das relações sociais, políticas, culturais e ambientais experimentadas

na comunidade.

Os caminhos escolhidos para conduzir essa construção científica

necessitaram de bases teóricas com potencial suficiente para sustentar a análise

das relações investigadas durante a pesquisa, principalmente pelo fato de que

quando se estuda saberes de um determinado povo, nada está pronto e acabado, o

dinamismo com que tudo acontece produz novas formas de entendimento sobre um

fenômeno, redefinindo percepções e ideias que outrora pareciam se encaixar

perfeitamente na proposta inicial, por vezes alterando a própria proposta e

apontando cenários até então desconhecidos por parte deste pesquisador.

Na intenção de subsidiar as reflexões e conclusões contidas nessa produção,

trago para o campo do debate teóricos que julgo essenciais para uma

fundamentação condizente com os saberes compartilhados em São Miguel do

Flexal, dentre os quais destaco Diegues (2000a) desmitificando a ideia de uma

natureza intocada pelo homem, virginal, composta por ecossistemas que devem ser

protegidos da ação humana. Para este autor, o pressuposto de uma natureza

intocada tem servido aos desejos de grupos imperialistas que em geral possuem

interesses econômicos nessas áreas tidas como de proteção ambiental, em especial

no que se refere aos parques nacionais. Alicerçados em uma visão crítica sobre

Educação Ambiental, Layrargues e Lima (2014) defendem o engajamento

político/ambiental do processo educacional, visto que este faz parte de um contexto

onde estão presentes elementos sociais, culturais e ideológicos imbricados nas

subjetividades dos sujeitos. Alinham-se com Freire (1987, 1992, 1996) no sentido de

uma educação emancipadora que parta da leitura de mundo do sujeito em um

intenso jogo de problematização e produção de temas geradores oriundos das

problemáticas locais.

Na esteira do pensamento científico contemporâneo, oportuno o pensamento

de Alves (1990) acerca da ciência como parte da vida, devendo postar-se a serviço

do bem estar das pessoas independente da classe social, gênero ou etnia. Nessa

perspectiva Geertz (2008) ensina que o universo newtoniano não atende as relações

culturais produzidas no âmbito do saber local, pois estas, encontram-se em um

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terreno que se movimenta no próprio cotidiano dos sujeitos, ensejando a

implementação de uma prática científica mais próxima das realidades mundanas.

Analisando o caráter humano da ciência (Morin, 2005) aponta para o fato de que os

sujeitos singulares se desenvolvem em um mundo social, cultural e eminentemente

complexo à medida que se propõe a superação da fragmentação dos saberes e

reconhece o ser humano como um ser constituído nas relações culturais.

Tratando do saber local e da Educação Ambiental Guarim (2000) enfatiza que

tais saberes fazem parte das vivências culturais e sociais de uma comunidade,

estando inevitavelmente vinculadas as condições e experiências de vida

compartilhadas em cada contexto. Seguindo a mesma linha de raciocínio, Pereira e

Guarim Neto (2009) indicam a necessidade de construção de um processo

educativo que esteja alinhado com os elementos culturais, subjetivos e ambientais.

No que concerne ao ensino de ciências, importante o entendimento do que

Chaves (2003) denomina de condição marginal do professor que atua na Amazônia,

explicando que ser professor no cenário amazônico implica em transgressão as

regras e aos discursos estabelecidos como hegemônicos, sendo portanto,

desobrigado de preservar discursos, abrindo possibilidades de criação de novas

verdades e identidades.

Evidentemente nem todos os teóricos abordados na pesquisa foram utilizados

nesse momento introdutório, o que não significa dizer que sejam menos importantes,

já que cada fundamento anotado possibilitou uma forma de análise e de

entendimento sobre as indagações levantadas, porém, gostaria de encerrar esse

ponto referendado por Chassot (2016) afirmando que existem saberes,

conhecimentos de ordem popular que não podem ser desprezados pela ciência e

muito menos pela escola, pois fazem parte da vida dos sujeitos e propiciam uma

leitura de mundo posicionada a partir dos problemas locais sem perder de vista seu

caráter universal.

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2 IDAS E VINDAS NO PROCESSO CONSTRUTIVO: a trilha metodológica e suas

singularidades.

[...] o visível não é a base do dizível, mas o inverso. Não é, portanto, o olho que nos faz dizer o que vemos, mas o que é dito, repetido e reeditado continuamente que nos faz ver de determinado modo. (CHAVES, 2016, p. 218)

Antes de avançar em meus escritos, e para que se tenha noção de onde

estou falando, considero importante fazer uma descrição de onde a comunidade de

São Miguel do Flexal está situada e com base nessas reflexões apresentar a

proposta metodológica da pesquisa, a qual se fundamenta na Pesquisa Narrativa,

impulsionada por meio da Análise Textual Discursiva, por este motivo, esse item foi

dividido em cinco eixos norteadores: descrição da comunidade, caracterização do

processo construtivo, o universo do estudo, amostragem: os informantes e suas

informações e coleta/construção dos dados: a vez e a voz dos informantes.

2.1 Área de estudo: descrevendo a comunidade de São Miguel do Flexal

O olhar que lanço sobre a comunidade encontra ressonância em suas

riquezas naturais e ecológicas, bem como, nas paisagens que se apresentam todos

os dias em que tenho convivido com os moradores locais, porém, não posso deixar

de relatar que tais riquezas e belezas, também, vêm acompanhadas de graves

problemas sociais, econômicos e ambientais que se intensificam pela ausência de

políticas públicas que oportunizem aos moradores estabelecerem condições para

uma relação equilibrada com o meio em que vivem.

São Miguel do Flexal faz parte de um cenário denominado pela população

local de “Região dos Lagos do Amapá”, também conhecido como “Campos

Inundáveis do Amapá”, considerando uma de suas principais características de

ordem natural, qual seja, no período de estiagem – aproximadamente entre os

meses de setembro a novembro - formam-se campos com pastagens exuberantes,

estabelecendo formas de locomoção e convívio adaptados as condições climáticas,

já no período chuvoso – aproximadamente entre os meses de janeiro a maio -, a

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paisagem se transforma em campos inundáveis, exigindo dos moradores novas

formas de convívio e sobrevivência. Interessante registrar que entre os dois períodos

narrados, existe o que se pode denominar de transição – localizado entre a estiagem

e o período chuvoso e entre as chuvas e estiagem -. Tendo em vista as

peculiaridades presentes na localidade, torna-se evidente que a maneira como a

natureza se organiza, dita o ritmo das relações entre os indivíduos e o meio

ambiente em suas diversas dimensões.

Na interpretação de Mendonça (1983, p.6) a denominação de Região dos

Lagos surgiu “[...] devido à imensidade e aglutinação de lagos, lagoas, rios, igarapés

além de uma vasta extensão de campos naturais sujeitos às inundações periódicas,

além de pequenas ilhas e tesos que ficam menos sujeitos às águas no período

chuvoso”. Conhecendo o local, posso afirmar que a Comunidade de São Miguel

situa-se no coração onde esse fenômeno acontece, podendo, tomando como

referência qualquer ponto, o ciclo ser observado com clareza em cada uma de suas

especificidades.

São Miguel é um componente do município de Pracuúba, juntamente com as

comunidades de Breu, Flexal, Cujubim e Pernambuco, cada uma delas

apresentando características distintas quanto aos aspectos geográficos, sociais e

culturais. Por uma questão metodológica, descrevo apenas os elementos de

interesse dessa pesquisa, no caso, os que dizem respeito à localidade de são

Miguel do Flexal.

Quanto a sua localização, encontra-se na porção leste do município de

Pracuúba e dista da sede aproximadamente 8 km, estando a margem esquerda do

rio Maringá, tributário da margem direita do rio Flexal (figura1). No período chuvoso

a locomoção é feita por meio de embarcações motorizadas ou não: voadeira

(embarcação não fabricada na comunidade, movida a motor de popa, muito utilizada

por indivíduos com maior poder aquisitivo, visto o alto consumo de combustível),

montaria/canoa (é o tipo mais comum de embarcação utilizada na comunidade,

geralmente impulsionada por remo ou varejão, nesse caso a energia é gerada pela

força física do sujeito que com suas habilidades controla a direção da embarcação),

batelão (embarcação semelhante a anterior, porém dotada de maior porte, uma vez

que está destinada ao transporte de carga).

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Figura 1 – Mapa esquemático produzido por um morador (São Miguel do Flexal)

Fonte: Acervo do pesquisador – 2017

Na estiagem, com a mudança do cenário, as formas de locomoção ganham

outros contornos, sendo possível, nos dias atuais, a entrada de automóveis,

motocicletas e bicicletas que passam a circular no local, porém, a comunidade, em

sua maioria, utiliza principalmente animais de montaria: boi-cavalo (búfalos e

bovinos) e cavalos que passam a se configurar como os principais meios de

transporte. No período de transição, a forma de locomoção mais utilizada pelos

moradores é o búfalo (figura 2), já que sua adaptação em áreas inundáveis é muito

mais fácil, levando-se em conta sua rusticidade e suas múltiplas utilidades, servindo

de montaria, tração e transporte de materiais.

Figura 2 - Animal bubalino sendo preparado para o transporte de carga

Fonte: Acervo do pesquisador - 2016

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As principais formas de trabalho são voltadas para a subsistência familiar,

explorando a pesca, caça de animais de pequeno porte (capivaras, cutias,

marrecas...), pecuária bovina e principalmente bubalina, animal introduzido na

região, segundo dizem os moradores, por volta dos anos de 1940. A pecuária

permite a exploração de carne e de leite, favorecendo a produção de coalhada, doce

de leite, queijo e manteiga, alimentos, ao lado do pescado e da caça, quase sempre

presentes nas refeições diárias dessa população. Outro alimento bastante

consumido, não diferente de outras regiões da Amazônia, é a farinha de mandioca,

utilizada como acompanhamento em todos os pratos servidos.

O Arraial de São Francisco de Assis é a principal festa existente na

comunidade, acontecendo durante o mês de novembro, atualmente com duração de

quatro dias. Em outras épocas, segundo relatos de moradores, o arraial durava

treze noites, iniciando no período de lua para facilitar o deslocamento dos fieis. Por

três vezes tive a oportunidade de participar das festividades e pude observar que a

programação se divide basicamente em dois eixos: religiosidade delineada por

orações, louvores, novenas e procissão e a parte profana regada a bingos, leilões,

fogos e corrida a cavalo.

Nesse ponto fica evidente que poderia continuar abordando as diversas

características e singularidades da comunidade, porém, são muitos os caminhos que

necessito percorrer para interpretar narrativamente os saberes que se apresentam,

por esse motivo trouxe nesse item, apenas uma pequena amostra do que posso

chamar de descrição da comunidade de São Miguel do Flexal. Esclareço que não

tive a pretensão de dar “números finais” ao processo, em verdade, a intenção foi no

sentido de oferecer uma visão contextual do ambiente em investigação,

vislumbrando a possibilidade que prosseguir a pesquisa, não de maneira segura,

mas com reais possibilidades de produzir as conexões necessárias para o alcance

dos objetivos propostos.

2.2 Caracterização do processo construtivo

Entender a relação entre o morador local e a conservação do meio ambiente,

parece ser o grande desafio de qualquer proposta de pesquisa com essa natureza

ecológica e humana, e esta não é diferente, consciente que sou da necessidade de

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observar, ouvir, aprender e interpretar o conhecimento latente em cada fala,

símbolo, desejo e traço cultural expressado pelos moradores de São Miguel, em

especial, no que diz respeito ao ensino de ciências desenvolvido na escola local.

Recentemente ouvi dizer que sou apaixonado pelo local da pesquisa, realmente

parece ser verdade, mas não seria essa a função do pesquisador em relação ao seu

objeto de estudo? Como poderia estudar de forma empolgante e aprofundada algo

que não me despertasse paixão? Afirmo que sou apaixonado pela comunidade,

porém, esta paixão não me proíbe o olhar crítico que proponho em relação às

mazelas sofridas no contexto local, pelo contrário, me fazem querer maior

compreensão e quem sabe contribuir de forma efetiva para o desenvolvimento da

região, aliás, penso ser este um dos pilares dessa produção, tendo em vista a

possibilidade não só de colher, mas de compartilhar conhecimentos e contribuir para

a melhoria das condições de vida presentes no cenário investigado.

Para atingir o propósito almejado parto da convicção de que o conhecimento

é dinâmico, mutável e completamente dependente do dia a dia de quem o faz ser

como é, pois “toda compreensão é pontual, parcial, provisória, lacunar e inacabada,

assim como todo método e toda pesquisa” (KNOBBE, 2016, p. 59).

Corroborando com essa ideia e em defesa de um pensamento científico pós-

moderno emancipatório de oposição, o qual deve começar pela crítica do

conhecimento, Santos (2002) considera necessário subverter a lógica de isolamento

em busca de uma ciência contextualizada, politicamente engajada e responsável

afirmando que:

A teoria crítica pós – moderna parte do pressuposto de que o conhecimento é sempre contextualizado pelas condições que o tornam possível e de que ele só progride na medida em que transforma em sentido progressista essas condições. Por isso o conhecimento-emancipação conquista-se assumindo as consequências de seu impacto. (SANTOS, 2002, p. 32)

Nessa pesquisa, por se tratar de um trabalho eminentemente de cunho

qualitativo e contextual, com base em categorias emergentes, a tarefa de interpretar

e organizar lucidamente as composições de falas, imagens, gestos, documentos,

experiências e vivências, tornou-se algo, em certos momentos, insano, levando-me

a viagens que ao invés de apontar caminhos conhecidos, forneciam-me

instrumentos imprecisos, mas que de algum modo, permitiram chegar a pontos,

ainda que provisórios, de entendimento sobre a trama envolvendo as práticas

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ambientais e o ensino de ciências desenvolvido na comunidade. Referenciando o

argumento construído, Alves (2016, p.110) explica que:

O que define a pesquisa qualitativa não são os instrumentos utilizados, mas os múltiplos processos envolvidos na produção de conhecimentos. Por ser um objeto complexo, a subjetividade não aparece de forma direta perante o observador. Ele precisa construir seus processos e formas de organização a partir de variadas formas de expressão. Enquanto sistema, a subjetividade não pode ser captada por procedimentos metodológicos que operam por meio da definição, do controle e da manipulação de variáveis. Os casos singulares são valorizados por sua contribuição ao modelo teórico em construção e não pela identificação de regularidades que comprovem teorias já estabelecidas.

Os variados desencontros nas leituras e informações conduziram-me por

vezes ao que muitos poderiam considerar, como se diz na linguagem popular, “um

beco sem saída”, sem a famosa “luz”, que tantos buscam para efetivarem seus

trabalhos. “Estou precisando de uma luz, cheguei a um ponto que não consigo

avançar”, disse um amigo em relação a sua pesquisa. Por várias vezes também ouvi

tal expressão de meus alunos da graduação, mas confesso que nunca dei a

importância devida, talvez pelo fato de poucas vezes ter ficado sem a tal “luz

solucionadora dos problemas acadêmicos”. Pois bem, descobri que chegar a esse

ponto não é algo ruim, em verdade significa envolvimento com o objeto de estudo,

imersão no que se está fazendo, é colocar-se na posição de quem busca o

entendimento impulsionado pela curiosidade científica.

A almejada luz não é um prêmio que se encontra no fim de um túnel, como uma

recompensa, é sim, antes de tudo, um ato de reflexão que exige desencontros,

contradições e subversões, em uma trilha que não está predeterminada por uma

lógica determinista. O fazer científico, pelo menos como estou entendendo nessa

construção, amparado nas ideias de Santos (2002) configura-se como um ato de

rebeldia, de não aceitação da realidade como simplesmente é, o que efetivamente

promove uma ruptura com o pensamento simplista difundido pela ciência moderna

na medida em que abre caminhos para a compreensão de elementos qualitativos da

complexidade das relações sociais, levando a um processo de consciência ética,

social e política por parte do pesquisador.

Para ilustrar o que estou tentando justificar em relação ao tipo de pesquisa que

estou propondo nesse trabalho, Pesquisa Narrativa por meio da Análise Textual

Discursiva em um contexto de cunho Etnográfico, gostaria de apresentar um trecho

da obra “Palomar” de Ítalo Calvino, por considerar a força poética com que o autor

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trata o assunto, sem perder de vista a mensagem que imagino desejar passar ao

leitor. Eis o trecho em destaque:

A casa dos queijos representa para Palomar o mesmo que uma enciclopédia para um autodidacta; poderia memorizar todos os nomes, tentar uma classificação de acordo com as formas – forma de sabonete, de cilindro, de cúpula, de bola – de acordo com a consistência – seco, amanteigado, cremoso, sem estratos, compacto – de acordo com as matérias estranhas misturadas com a casca ou com a pasta – pasta, pimenta, nozes, gergelim, ervas, bolores – mas isso não o aproximaria um só passo do verdadeiro conhecimento, que reside na experiência dos sabores, feita de memória e de imaginação em conjunto, e só na base dessa experiência poderia estabelecer uma escala de gostos e preferências e curiosidades e exclusões”. (CALVINO, 2004, p. 43)

A curiosidade e a necessidade de envolvimento com o objeto de estudo por

meio da experiência, das vivências em comunidade, construindo dados e não

simplesmente coletando, permitem um movimento de imersão na vida cotidiana dos

envolvidos, nos seus mitos, no trato com o meio ambiente, nas manifestações

culturais, visto que “o objeto do conhecimento não é o mundo, mas a comunidade

nós-mundo, porque o nosso mundo faz parte de nossa visão do mundo, que faz

parte do nosso mundo” (MORIN, 2005, p. 205).

Reconhecendo a perspectiva de construção de dados no próprio contexto

onde a investigação é efetivada, faço a opção por uma abordagem qualitativa, já que

permite, “[...] em maior grau e profundidade, a interpretação das particularidades dos

comportamentos ou atitudes dos indivíduos” (OLIVEIRA, 2004, p. 117).

O procedimento utilizado na investigação obedeceu aos pressupostos do

estudo de caso que se sustenta na “análise aprofundada e exaustiva de um objeto

de pesquisa restrito de modo a possibilitar seu amplo e detalhado conhecimento”

(MOROZ; GLANFALDONI, 2002, p.45). Dessa maneira, tornou-se possível apontar

aspectos singulares de uma comunidade, da educação produzida em seu contexto e

de uma escola com características particulares, favorecendo uma análise a partir de

questões de ampla dimensão no que se refere às condições e modos de vida

presentes no lugar investigado.

O enfoque Narrativo que proponho não me permite a tranquilidade da

segurança metodológica, pois trabalho com categorias que emergem no decorrer da

pesquisa, traçando caminhos não previstos no planejamento inicial. Dessa maneira,

alerto que a Pesquisa Narrativa não é uma simples narração de fatos, busca,

essencialmente, a produção de textos originais, instituídos no próprio contexto, não

se confundindo com o gênero literário narrativo, pois o propósito é a organização

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das diversas bifurcações presentes em falas, imagens, gestos, documentos, dentro

de um caldeirão contextual (CLANDININ; CONELLY, 2011)

Considero muito ilustrativo o pensamento de Morin (2005) em relação ao

método, ou melhor, seu discurso a procura de um método que no seu entendimento

não se apresenta de forma simples, pois está imbricado na complexidade. Diz o

autor:

Ao contrário de Descartes, que partia de um princípio de verdade, ou seja, que identificava a verdade com as ideias claras e distintas, e por isso podia propor um discurso do método em poucas páginas, eu faço um discurso muito longo à procura de um método que não se revela por nenhuma evidência primária e que deve ser elaborado com esforço e risco. A missão desse método não é fornecer as fórmulas programáticas de um pensamento “são”. É convidar a pensar-se na complexidade. (MORIN, 2005, p. 140)

Por tudo que foi exposto, obviamente não poderia analisar os dados de

maneira simplificada, sem a profundidade necessária a produção de textos com

potencial para explicar os saberes ambientais produzidos na comunidade, por este

motivo a Análise Textual Discursiva é adotada como parâmetro de análise de dados,

visto que suas proposições favorecem a construção de um olhar singular e

interpretativo sobre as relações vividas na localidade.

Por meio do processo de unitarização foi possível fragmentar as informações

em unidades de significados, sendo possível a partir desse movimento, criar

categorias/eixos com amplitude e força suficiente para direcionar o trabalho até a

construção de argumentos constitutivos do texto final apresentado (MORAES, 2003).

Vale ressaltar, que não tive a pretensão de estabelecer “a verdade” sobre o

processo de Educação Ambiental e o Ensino de Ciências desenvolvido em São

Miguel, o que desejei foi analisar e apresentar uma das possíveis interpretações

concernentes ao tema abordado, propósito que penso ter alcançado ao longo das

narrativas construídas.

Os pressupostos metodológicos adotados buscam familiaridade com o que

Santos (2008, p. 85) entende como “paradigma emergente”, na medida em que se

utilizam de conhecimentos não categorizados previamente, saberes que estão em

constante processo de mutação, pois se fazem nas experiências diárias de uma

comunidade amazônica. Nesse ponto, o pesquisador encontra-se completamente

envolvido com as tramas presentes na investigação, imprimindo em seu trabalho

investigativo, valores, elementos culturais e sociais, visões de mundo que fazem

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parte da sua biografia e que inevitavelmente entrarão no jogo construtivo do fazer

científico, uma vez que:

[...] nossas trajectórias de vida pessoais e coletivas (enquanto comunidades científicas) e os valores, as crenças e os prejuízos que transportam são a prova íntima do nosso conhecimento, sem o qual as nossas investigações laboratoriais ou de arquivo, os nossos cálculos ou os nossos trabalhos de campo constituiriam um emaranhado de diligências absurdas sem fio nem pavio. (SANTOS, 2008, p. 85)

A premissa enunciada pelo autor coloca o pesquisador no âmago do cenário

estudado, promovendo o deslocamento da relação entre este e objeto de estudo,

que passam a fazer parte de um jogo em que a regra principal deixa de ser

fragmentação, isolamento e objetividade, assumindo-se um paradigma em que as

relações são marcadas por historicidade, temporalidade e subjetividades construídas

nas vivências dos sujeitos partícipes da construção científica.

2.3 O universo do estudo

A pesquisa teve como lócus de investigação a compreensão das condições e

experiências de vida compartilhadas na comunidade e suas influências na alteração

ou conservação do meio ambiente, bem como, no ensino de ciências desenvolvido

na escola local. Buscou-se realizar um intenso exercício de reflexão sobre as

condições educacionais e socioeconômicas experimentadas nessa região, assim

como, da relação comunidade/natureza, caracterizada por singularidades, visto sua

localização e seus aspectos sociais, culturais, ambientais e econômicos.

O Município de Pracuúba faz parte do universo de 16 Municípios do Estado

do Amapá, localizado na parte Nordeste do Estado a cerca de 280 km da Capital

Macapá, com uma população aproximada de 5.000 habitantes. A população é

atendida por 12 Unidades Escolares (Municipais e Estaduais), distribuídas nas 06

principais Comunidades, entre elas a de São Miguel do Flexal, distante a 8 km da

sede Municipal. A região possui uma sazonalidade climática, que define o período

chuvoso e o de estiagem, cujas fases de transição dificultam o acesso dos alunos à

escola. O acesso dos alunos é uma história que merece certo destaque, pois no

período chuvoso o transporte escolar é feito por voadeira contratada pela própria

escola, sendo realizado sem maiores problemas, já na estiagem os alunos seguem

de montaria, bicicleta ou a pé, nesse caso acompanhados por um tutor que se

encarrega de guiar os alunos até a instituição. A situação fica difícil mesmo, no

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período de transição, visto não ter água suficiente para as embarcações deslizarem

e também por conta da ausência de terra firme que permita a caminhada com

tranquilidade, posto que nessa época é muito comum a formação de “valas” e de

trechos de pequenos lagos que cortam os campos (figura 3), sendo estes, povoados

por arraias, poraquês e até mesmo jacarés que por vezes ocasionam acidentes.

Figura 3 – Três momentos: águas grandes, estiagem e transição

Fonte: Acervo do pesquisador - 2016

A Escola da comunidade foi fundada há mais de 60 anos, desde então vem

formando alunos, filhos de produtores rurais e de vaqueiros que atuam nas áreas de

fazenda principalmente na criação de gado de corte. Dadas as características

ambientais da região, as famílias residem em áreas dispersas, em virtude das

diferentes atividades desenvolvidas (pecuária, extrativismo e agricultura familiar). A

Escola oferta o primeiro segmento do Ensino Fundamental, conta com 22 alunos

matriculados, distribuídos em 05 turmas, que funcionam no turno matutino e

vespertino, possui um quadro docente constituído por 03 professores formados em

nível superior, que adotam o sistema multisseriado, tendo em sua Equipe Gestora

um Diretor, um Coordenador Pedagógico e Pessoal de Apoio.

2.4 Amostragem: os informantes e suas informações

A amostra utilizada foi definida de maneira não-probabilística, o que de

acordo com Silva e Silveira (2007, p.161) se configura como “processo informal de

seleção”. Os atores escolhidos apresentaram características que se entrelaçaram

com o proposto na pesquisa facilitando o entendimento das ações aplicadas no

contexto das instituições e famílias investigadas. O critério utilizado para a definição

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do corpus do trabalho foi o de saturação, sendo alcançada, segundo o entendimento

de Moraes (2003, p. 194) “quando a introdução de novas informações nos produtos

de análise já não produz modificações nos resultados anteriormente atingidos”.

A partir das características apresentadas pelos informantes e suas

informações, tornou-se possível constituir um material com densidade suficiente

para produzir um processo de análise condizente com a importância da temática. As

informações foram fragmentadas em unidades de análise e em seguida organizadas

em categorias que passaram a figurar como eixos norteadores dos capítulos

apresentados nesse texto.

Em coerência com o critério amostral adotado, se dispuseram a participar

diretamente da pesquisa: 12 moradores da comunidade (indivíduos não estudantes

e não servidores da escola), diretora da escola, três professores e alunos. Todos os

informantes concordaram em relatar suas impressões sobre meio ambiente,

Educação Ambiental e o Ensino de Ciências desenvolvido dentro e fora do contexto

escolar.

2.5 A coleta/construção dos dados: a vez e a voz dos informantes

A primeira fase foi constituída de leitura de parte do referencial escrito a

respeito do assunto abordado, sendo possível, a partir das leituras iniciar um

processo de reflexão acerca das bases epistemológicas norteadoras da

investigação. O propósito desse procedimento foi o de permitir a construção de um

referencial teórico com capacidade para apontar possíveis rotas para o

prosseguimento do estudo, visto tratar-se de temática complexa e principalmente por

estar voltada para a interpretação de saberes presentes em uma comunidade

amazônica, dotada de traços culturais e práticas que fazem parte de uma realidade

singular.

O segundo momento teve como foco a pesquisa de campo onde foram

observadas e analisadas as condições e experiências de vida presentes no cotidiano

local, assim como, as práticas ambientais e pedagógicas desenvolvidas na escola e

na comunidade, além de entrevistas semiestruturadas com os atores envolvidos na

pesquisa. Para Silva e Silveira (2007, p.158) a entrevista semiestruturada consiste

em “perguntas abertas, feitas oralmente em ordem prévia, mas na qual o

entrevistador pode acrescentar questões de esclarecimento ou instigar respostas do

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entrevistado”, levando a uma maior interação e empatia entre entrevistador e

entrevistado. Na utilização dessa ferramenta, muitas questões foram levantadas

além do que estava previsto no roteiro, visto que, durante o procedimento os

entrevistados se dispunham a abordar assuntos que não estavam previstos na base

da pesquisa, mas que evidentemente foram importantes para analisar as questões

levantadas.

A fim de melhor entender o fenômeno, também foram utilizados como

instrumentos de investigação a história ou relato de vida, o que se fez por meio de

conversas abertas com os participantes, optando-se pela informalidade, pois, neste

tipo de investigação o que se busca são informações contidas na vida pessoal dos

envolvidos, podendo ser um relato autobiográfico expondo reflexões e experiências

ou de maneira literária tradicional por meio de memórias ou relatos de experiências

vividas (CHIZOTTI, 2001). Essa ferramenta merece destaque especial, considerando

que possibilitou maior proximidade e intimidade com os participantes, tornando

possível estabelecer uma relação de confiança propícia a busca de informações

relevantes ao propósito do trabalho.

As informações obtidas tiveram tratamento fundamentado na Análise Textual

Discursiva, foram unitarizadas, categorizadas e devidamente organizadas levando-

se em consideração o contexto local, os pressupostos teóricos e as experiências

vivenciadas ao longo da pesquisa, possibilitando a construção de um documento

fundamentado em práticas e teorias entrelaçadas de forma indissociável com os

saberes ambientais produzidos nessa parte da Amazônia, conhecida por suas

belezas naturais, por sua forma de convívio com a natureza e por outro lado, de

maneira aviltante, também caracterizada por graves problemas no que se refere a

garantia dos constitucionalmente denominados Direitos Sociais: educação, saúde,

alimentação, trabalho e outros não menos importantes para que se possa ter acesso

a condições de vida mais condizentes com a dignidade do povo convivente nesse

espaço amazônico.

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3 AFINAL DE QUE CIÊNCIA ESTAMOS FALANDO?: reflexões sobre o

pensamento científico e o ensino de ciências.

Felizmente a ciência é destituída de preconceito”: este é mais um preconceito. Não foi Galileu só que sofreu nas garras da inquisição. Também as comunidades científicas possuem suas inquisições, com outros nomes, (ALVES, 1990, p. 119)

Para apresentar o assunto, ou pelo menos refletir sobre ele de maneira

densa, há necessidade de mergulhar nos condicionantes históricos que fazem a

ciência se apresentar desta ou daquela maneira, buscando entender os

pressupostos que embasam o pensamento científico contemporâneo e em seguida

compará-lo e analisá-lo a partir de outros fundamentos epistemológicos e

metodológicos, e obviamente de outras formas de compreender o conhecimento.

Com base nessa premissa, proponho neste capítulo, uma análise histórica da

ciência como fundamento do pensamento ocidental e em seguida apresento o saber

local em uma perspectiva etnocientífica, abordando a cultura como aspecto basilar

das construções sociais e simbólicas de uma comunidade. Por fim, discuto a

educação ambiental e suas possibilidades para o ensino de ciências, recordando e

narrando memórias de minha atuação enquanto aluno, pedagogo e professor

universitário.

3.1 A ciência ocidental e a “necessidade de generalização”

O conhecimento científico tem por séculos impulsionado a evolução humana

e seus modos de vida e produção, bem como, avanços tecnológicos que favorecem

nossa existência, capacidade de adaptação e controle do ambiente natural ao qual

vivemos, mas que também, sustentam a guerra e a própria degradação da espécie,

fenômeno, no mínimo, contraditório em suas perspectivas e objetivos aparentes. O

fato é que o ato de conhecer ganha contornos diferenciados quando a proposta é

trabalhar com a ciência, pelo menos da maneira como esta é apresentada em geral

pelo mundo acadêmico. Em contraposição ao que denomino de visão menos

amordaçada de ciência, Santos (2012, p, 67.) afirma que a “logicidade da ciência

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reside na observação racional e sistemática e no controle dos fatos, nas suas

experimentação e explicação metódica, ou seja, consiste nos procedimentos e

exercícios intelectuais do cientista”.

A afirmativa colocada pelo autor é intrigante e perturbadora do ponto de vista

da vivência científica e dos múltiplos conhecimentos existentes e das incontáveis

possibilidades de pesquisa. Quem definiu o modo certo e o errado de fazer ciência e

de pensar cientificamente? Qual conhecimento vale a pena ser investigado?

Frequentemente considerada a soberana do conhecimento válido, ela, “a

ciência” estabelece a linguagem adequada para que um conhecimento receba a

credibilidade acadêmica, diz quais os métodos adequados para coletar dados e

entender determinados fenômenos, descreve as regras de organização e análise,

assim como, a apresentação dos resultados, porém, questiono-me se realmente

existe um “método científico” que tenha potencial para entender e descrever

experiências das diversas realidades e subjetividades? Propondo uma reflexão

crítica acerca da ideia de um paradigma dominante, Santos (2008, p. 30-31) lembra

que a ciência moderna enquanto “[...] conhecimento baseado na formulação de leis

tem como pressuposto metateórico a ideia de ordem e de estabilidade do mundo, a

ideia de que o passado se repete no futuro [...]”, desconsiderando, portanto, o

processo histórico, cultural, social e temporal que se encontra na base das

produções humanas.

Penso que a diversidade de cotidianos e de culturas inviabilizam a utilização

de uma linguagem única, universal, neste sentido, mais adequado falar em

linguagens e em ciências, neste caso no plural, pois não existe uma única, então me

posiciono em favor de uma ciência do cotidiano, fundamentada em conhecimentos

locais, sem a pretensão de generalização, visto não ser este seu objetivo.

Silva (2016, p. 18) introduzindo uma discussão sobre “o mito da sociedade

moderna” afirma ter sido,

[...] sobretudo, a partir do século 17, com o nascimento das ciências modernas, quando uma parte do mundo ocidental passa a ser regido pelo pensamento científico e pela racionalização, que os mitos foram sendo desclassificados e entendidos como sinônimo de ilusão, superstições e crença do passado. A partir daí, a ciência acreditou que o mundo só poderia ser compreendido por meio dos mecanismos da razão. As narrativas míticas vão sendo deixadas de lado, pois na mente de um homem racional não deveria existir lugar para essas divagações „sem lógica‟. Esse pecado original que „impedia‟ o uso da racionalidade deveria ser expurgado para que triunfasse a razão.

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Em busca de demonstrar a pluralidade de conhecimentos construídos pelo

homem em suas relações sociais e culturais Tréz (2011) amparado em Brayboy e

Castagno faz uma comparação entre o que convencionou de ciência ocidental e o

que denominou de ciência indígena apontando que a ciência ocidental se caracteriza

por conhecimento obtido por observação, realidade material, separação sujeito-

objeto, busca de universalidade para o conhecimento, formula categorias e se

fundamenta na razão instrumental enquanto que a ciência indígena se apresenta por

conhecimentos obtidos não somente pela observação, realidade misteriosa e

conectada ao espiritual, ausência de categorias, busca aplicação local para o

conhecimento, visão holística e interconectada sendo sustentada por uma razão que

se fundamenta no mistério e na sobrevivência.

Por certo a visão cartesiana de conhecimento, influenciou e ainda influencia

as formas com que conhecemos o mundo e os instrumentos que utilizamos para

organizá-lo em nossas mentes. Contudo, influenciado por cada leitura que faço,

cada vivência que experimento nas relações cotidianas, me convenço que pensar e

fazer ciência dentro de uma lógica puramente racional e instrumental é ficar atrelado

a uma realidade absurdamente laboratorial e experimental em nome de um método

científico, o qual estou convicto de não dar conta das formas de viver e conviver dos

seres humanos em seus ambientes locais. Com esse pensamento assumo uma

tendência voltada aos estudos culturais, concordando com Souza Torres (2017, p.

36) no sentido de que:

“[...] essa perspectiva teórica tira-nos da zona de conforto teórico-metodológica produzida pela racionalidade técnico-científica que caracterizou a modernidade. Isso porque os estudos culturais não admitem falar em certezas, em estabilidades e muito menos em significado único para as palavras, não admitindo também supor a existência de fronteiras rígidas que justificam binarismos [...]

Trabalhar com as vivências e necessidades locais da humanidade exige por

parte do cientista, desprendimento teórico e metodológico, há necessidade de estar

livre das amarras impostas pelo modelo de ciência academicista. Alves (1990, p. 11)

refletindo sobre a ciência e os cientistas alerta que este, o cientista:

Virou um mito. E todo mito é perigoso, porque ele induz o comportamento e inibe o pensamento. Este é um dos resultados engraçados (e trágicos) da ciência. Se existe uma classe especializada em pensar de maneira correta (os cientistas), os outros indivíduos são liberados da obrigação de pensar e

podem simplesmente fazer o que os cientistas mandam.

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Continua sua ideia dizendo que a “ciência é uma função da vida. Justifica-se

apenas enquanto órgão adequado à nossa sobrevivência. Uma ciência que se

divorciou da vida perdeu sua legitimação”. ( ALVES, 1990, p. 37)

O ato de pensar cientificamente tornou-se tarefa de poucos e para poucos, os

cientistas, que diferentemente dos “homens comuns”, dominam as teorias, os

métodos e as técnicas de pesquisa “válidas”, tornaram-se os “donos da ciência”,

pois supostamente estariam incumbidos da tarefa de pensar corretamente dentro

dos padrões definidos como ciência. O conhecimento válido passa a ser o que os

cientistas afirmam ter validade. Ao “homem comum” sobram tarefas não científicas,

pois segundo a lógica academicista, este não estaria habilitado ao ato de pensar e

agir cientificamente. Na análise de Souza Torres (2017, p. 40) “a natureza

gnosiológica da ciência, deslocada de sua dimensão ontológica, deu a ela um

estatuto de legitimidade e de hegemonia em relação a outras formas de

conhecimento (filosófico, artístico, religioso, narrativos)”, afirma ainda que tal

paradigma teve como sustentação três rupturas: “passado-presente; logos-mito; ser

humano-natureza”.

Valendo-me desse raciocínio, proponho um exercício de reflexão: afinal o que

diferencia o cientista do “homem comum”? Que características apresentam essas

duas “espécies de seres humanos”?

Creio que as questões propostas levam à construção de um diálogo, que se

não esclarecem definitivamente a discussão, e logicamente não é esta a pretensão

neste trabalho, pelo menos permitem refletir sobre seu objeto, considerando que

pensar e fazer ciência são atividades eminentemente humanas exigindo processos

mentais complexos e não simplesmente programados geneticamente, como outros

animais naturalmente e instintivamente o fazem.

Para melhor ilustrar o tema, tomo emprestadas as ideias de Geertz (2008)

fazendo uma crítica à visão iluminista de homem. Para estes, havia uma natureza

humana imutável, perfeitamente organizada e simples conforme o universo

newtoniano. Dentre outros, o grande problema da perspectiva iluminista reside no

fato de que tal visão desconsidera o tempo, espaço e as relações culturais em que o

homem está inserido, em nome de uma natureza universal, solidificada por uma

essência sobre-humana, para além das relações cotidianas, tornando mais simples

o processo de quantificação, matematização da ciência em detrimento de elementos

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qualificadores oriundos de uma lógica complexa de pensamento. No entendimento

de Geertz (2008, p. 27):

Assumir esse passo gigantesco longe da perspectiva uniforme da natureza humana, no que concerne ao estudo do homem, é abandonar o Paraíso. Alimentar a ideia de que a diversidade de costumes no tempo e o espaço não é simplesmente uma questão de indumentária ou aparência, de cenários e máscaras de comediantes, é também alimentar a ideia de que a humanidade é tão variada em sua essência como em sua expressão. E com esta reflexão começam a se afrouxar alguns ancoradouros filosóficos bem

amarrados, iniciando-se uma jornada em águas bem perigosas.

Com fundamento na premissa da incompletude do ser humano e que este

constrói sua humanidade por meio das relações culturais vivenciadas em seu

ambiente social, em suas instituições, em seu tempo e espaço, definitivamente não

posso acreditar em um ideal de homem universal com uma essência pré-

determinada pelas leis explicativas do universo. O homem é o que é não somente

por fatores genéticos ou maturacionais, mas sim, pela sua capacidade de se

relacionar em um mundo em movimento, com generalidades e especificidades, ou

seja, os homens diferem entre si em razão de sua maneira de se relacionar e sentir

o mundo, sendo, portanto incabível pensar em uma essência natural e universal de

homem. Provavelmente, por esse motivo, Morin (2005, p.78) diz tentar “[...] não

esquecer que a ciência é feita por cientistas que também são seres humanos, com

todos os defeitos dos seres humanos”.

O “homem comum” seria então um artefato social e cultural, construído nas

particularidades locais, forjado em suas alegrias e tristezas em meio a um turbilhão

de sentimentos que caracterizam a vida humana. Se este é o “homem comum”, o

que se pode dizer do cientista? Sempre ouvi dizer que o cientista é aquele que

pensa de maneira lógica, científica; é aquele que pensa e descobre coisas que a

maioria das pessoas não consegue; é capaz de aplicar métodos e obter resultados.

Mais recentemente ouvi que o cientista é alguém com inteligência fora do normal.

Pergunto-me então se o cientista, na concepção de ser extraordinário, estaria fora

do ambiente e das emoções vividas pelo homem comum? Seria este ser

extraordinário incapaz de sentir emoções em nome de uma ciência sem influência

“mundana”?

Refiro-me a expressão mundana como realce de uma perspectiva que

considere o ser humano em suas dimensões cotidianas, marginais, livre das amarras

científicas e de suas Leis universais. Antes de ser qualquer coisa, o cientista é um

ser mundano, com vivências e experiências que querendo ou não fazem parte de

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seu cotidiano e que indubitavelmente influenciam suas formas de pensar e agir, seja

dentro ou fora do campo da ciência.

Ser cientista então não se sustenta em algo fora da normalidade,

extramundano, visto que este se encontra inserido em um contexto social e cultural

que o constituem enquanto sujeito provido da capacidade de pensar e de aprender

continuamente. Nesse sentido, afirmo ser o cientista alguém que caminha pelo

mundo, vive e observa suas relações, construindo ideias que se fundamentam nas

necessidades humanas, sejam elas estéticas, tecnológicas, sociais ou culturais.

Analisando o contexto científico atual e o processo de moralização da

natureza, em prol de uma ciência do homem e para o homem, Barros (2016, p. 67)

recorre ao pensamento nietzschiano para fundamentar sua ideia e nos relata que:

Nietzsche põe em questão a ideia de um mundo “real”, objetivo, e indica mesmo que este é apenas uma necessidade humana e que por esse motivo deve ser interpretado também como uma forma necessária, intransponível de representação. Segundo ele, se estas noções nos parecem extremamente problemáticas, isso se deve ao fato de que nos últimos dois mil e quinhentos anos, a cultura ocidental habituou-se a mobilizar conceitos como verdade e realidade, pressupondo a autoevidência dos mesmos.

Entendendo o cientista como ser humano e que, portanto, está envolvido em

uma teia cultural de símbolos e significados que só fazem sentido em seu contexto,

torna-se difícil digerir a simples ideia da existência de um modelo de ciência a ser

seguido como verdade única, um paradigma universal detentor das Leis soberanas

do universo. Generalizar fenômenos não cabe no que penso sobre ciência, pois se

assim o fizesse estaria cometendo uma espécie de suicídio acadêmico, haja vista, a

perspectiva em que me encontro, de estudar conhecimentos locais que seguramente

não são universais e muito menos generalizáveis, no entanto, se configuram como

uma ciência voltada para a vida e para cultura de cada povo.

Torna-se incoerente então pensar em termos de uma ciência única que dê

conta de todos os problemas do mundo, como uma teoria geral, carregada de

técnicas e métodos universais. Tal pressuposto não se sustenta e, ancorado nessa

ideia, afirmo que cada vez mais surgem alternativas de estudos diferenciados,

profundos e que levam em consideração as simbologias, crenças e culturas locais,

apontando para a construção de múltiplas ciências mais adequadas as vivências da

humanidade, distanciando-se de visões generalizantes. Penso ser este um dos

propósitos dessa pesquisa, refletir o conhecimento a partir de uma ciência engajada,

mundana, voltada para as vivências dos homens em suas mais variadas dimensões,

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em uma composição nem sempre regular, unidirecional, posto que, sob esse prisma,

o cientista não é o “dono da ciência e do método”.

3.2 Saber local: conhecimento complexo, interpretativo e cultural.

Quando me refiro ao saber local, inevitavelmente sou levado a buscar a ideia

de populações tradicionais, comunidades que vivem em certo grau de isolamento

das grandes e médias cidades e que, por meio de conhecimentos construídos a

partir de suas vivências culturais e sociais desenvolveram formas de sobrevivência e

de relação com a natureza que se configuram como únicas, pois estabelecem um

vínculo de pertencimento com a comunidade e suas particularidades ambientais e

ecológicas (GUARIM, 2000).

É nessa perspectiva que surge a etnociênica, partindo “[...] da linguística para

estudar o conhecimento das populações humanas sobre os processos naturais,

tentando descobrir a lógica subjacente ao conhecimento humano do mundo natural”

(DIEGUES, 2000b, p. 28). Então, em uma perspectiva etnocientífica, interagir com a

comunidade torna-se fundamental para entender e descrever os processos de

manejo e convívio com a natureza, uma vez que, a relevância dos componentes

linguísticos, culturais e simbólicos construídos demonstram o tipo de relação com o

meio ambiente e suas implicações no cotidiano da vida nas comunidades.

Seguindo a mesma linha de raciocínio o autor considera o “Conhecimento

tradicional como o saber e o saber fazer, a respeito do mundo natural e

sobrenatural, gerados no âmbito da sociedade não urbano/industrial e transmitidos

oralmente de geração em geração” (DIEGUES, 2000b, p. 30). Parece então, que o

saber local transcende o âmbito do conhecimento natural, ele abarca o sobrenatural

e suas implicações nos modos de vida da comunidade, uma vez que para elas,

existe uma relação estreita entre o mundo sobrenatural e o natural, como por

exemplo: lugares sagrados, pessoas com dons de cura e de reza, além de seres não

catalogados pela ciência natural, mas que possuem grande relevância para o povo

local. Esses elementos estão presentes no cotidiano da vida em comunidade, tendo

total envolvimento com a cultura vivida, que por certo determina as práticas locais

em variados aspectos, como o religioso, o profano e também as formas de trabalhar

e se relacionar diariamente.

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Os mitos, as crenças construídos nas relações locais, logicamente fazem

parte do cotidiano, em verdade, estão imbricados em um ambiente cultural dinâmico

e complexo, constituído de uma teia de saberes que possuem força para retratar a

realidade da comunidade, de maneira muito mais precisa e dinâmica do que

qualquer modelo científico pré-determinado, pois, em geral, as crenças e mitos são

construídos levando em consideração as experiências vividas na localidade a partir

dos ciclos naturais e biológicos, constituindo um conhecimento que é repassado de

geração em geração, fortalecendo a cultura local e transformando as relações entre

seus membros. No entendimento de Morin (2005, p. 179) “[...] é no quadro localizado

dos ecossistemas que os indivíduos singulares se desenvolvem e vivem”. Assim, no

campo do saber local, mitos e crenças são dotados de importância não por simples

validação científica, mas pelo fato de trazer para a reflexão elementos constitutivos

da cultura e das formas de se relacionar em sociedade.

Para descrever o que digo, e quebrando os padrões definidos pela ciência

moderna como científico, apresento relatos feitos por dois informantes dessa

pesquisa, já neste primeiro capítulo, a fim de contextualizar e dar mais vida as

referências teóricas descritas.

Assim a Sra. Edith narrou a maneira de saber os meses mais chuvosos do

ano:

“Minha avó dividia montes de sal, e colocava no sereno entre os dias 12 e 13

de dezembro, dia de Santa Luzia, cada um representava um mês do ano. Pela

manhã os encharcados significavam os meses de mais chuva”.

Ainda sobre o tempo, outro relato interessante foi do Sr. Carlos, nesse caso

buscou fundamentação no “canto” dos sapos habitantes dos campos e lagos da

região:

“A cutaca está cantando fino é sinal de chuva chegando, já o sapo com este

som grosso, está chamando verão”.

As narrativas dos informantes evidenciam um tipo de conhecimento não

acatado pela ciência, mas que, assim como outros saberes presentes e em

construção na comunidade, funcionam como representações dos elementos

simbólicos e culturais que, pelo menos, momentaneamente, caracterizam os sujeitos

e suas relações de convivência, o que não quer dizer imutabilidade ou mesmo

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estabilidade, visto que a “cultura”, assim como o “natural” são representações

construídas pelo homem. Tomando como fundamento, as reflexões de Nietzsche

acerca da cultura, Barros (2016, p. 71) salienta que:

por meio desses pressupostos a cultura passa a ser compreendida como resultado de um grande número de representações, das quais está totalmente ausente a verdade, então entendida também como representação. O mesmo vale para a natureza, pois ela é apenas uma unidade referencial, sem nenhuma possibilidade de possuir unidade ou univocidade, pois estas são necessidades humanas e não aspectos efetivos. Todas as nossas tentativas de dizer o que ela é são, em última análise, representações dela, constituídas a partir de uma pressuposição valorativo-moral que jamais recai em uma designação basilar ou final sua. O conceito “Natureza” – assim como o conceito “Cultura” – são formulações humanas, fortemente marcadas pela perspectividade intransponível.

Dessa forma, a cultura tem papel preponderante no que concerne ao

entendimento do conhecimento tradicional, pois é ela quem estabelece a rede de

relações entre o ser humano e seu ambiente, uma vez que, toda prática tem um

sentido, nada é feito por acaso, as comunidades vivem com fundamento em suas

crenças e convicções que funcionam como Leis aplicadas pela comunidade. Há um

código de ética implícito às práticas locais e que revelam o respeito às tradições

como sustentáculo de uma sociedade com hábitos complexos.

Defendendo a pesquisa no campo do saber local e de suas singularidades,

além de se contrapor ao que chama de neurose acadêmica pela generalização

científica e pela necessidade que certos cientistas possuem em criar Leis universais,

Geertz (1997, p. 229) assim se posiciona:

Esse medo do particularismo, que considero uma certa neurose acadêmica (algo, que suponho já é evidente a essa altura), existe principalmente em meu próprio campo de trabalho, a antropologia, onde os que entre nós se dedicam a casos específicos e normalmente peculiares recebem advertências constantes de que estão reduzindo as possibilidades de obter um conhecimento geral e que, portanto, deveriam buscar alguma ocupação realmente científica [...]

A perspectiva em que me situo, extrapola as fronteiras que supostamente

estariam separando o natural do cultural, entendendo que o conhecimento

tradicional está em ambos os aspectos, imbricados em uma relação dinâmica entre

natureza e a cultura presente na comunidade, tendo suas próprias regras, sua forma

de classificar e reconhecer o ambiente e suas características, estabelecendo modos

de classificação e de reconhecimento de sons e odores dos diversos animais e

plantas presentes em seu cotidiano o que ocorre a revelia do que foi convencionado

denominar de validação científica, ou seja, os saberes tradicionais não se sujeitam,

enquanto prática, às regras metodológicas estabelecidas pela ciência moderna.

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No que diz respeito as relações culturais, concordo com Chaves (2003, p, 37)

ao afirmar que:

[...] cultura é um espaço de conflito, de luta, de disputa pelo poder de significação. Há entre as diferentes culturas e no interior de cada uma delas, visto que não são homogeneidades, uma constante luta por estabelecer quem pode, quem tem o direito de dizer o que é verdade, e, com base nela,

produzir a realidade.

O espaço cultural não está isento de conflitos, pelo contrário, é um espaço de

disputa, interligado por relações de poder que estabelecem o que pode e o que não

pode ser dito, inclusive dentro do espaço escolar, por esse motivo, dentre outros que

poderiam ser citados, há necessidade de oferecer aos alunos possibilidades de

entender o mundo sob outras óticas, lentes que talvez não tenham ainda construído

ao longo de sua existência, porém isso não significa uma mera substituição de sua

forma de viver e compreender o mundo, pelo contrário funciona como um alargador

de possibilidades. É neste sentido que imagino a importância da escola enquanto

condutora de formação e valorização dos conhecimentos produzidos em nível local.

Entendo dessa forma pelo fato de o ambiente escolar ser o lugar de onde se

pretende um processo educativo que atenda as necessidades reais dos alunos, um

local de esperança, do saber e do saber fazer, capaz de valorizar os conhecimentos

ali produzidos, escapando da surdez, cegueira e ausência de olfato e paladar que

teimam em assombrar nossas escolas. Cogito então, ser necessário para a

construção de um diálogo educativo que se passe dentro e fora do espaço escolar,

primeiramente entender: O que fazem e como fazem os moradores locais? Que

práticas desenvolvem? Como se relacionam com o ambiente? Que elementos

culturais estão presentes em seu cotidiano?, e em seguida refletir sobre: Que

conhecimentos são repassados de geração em geração? Que conteúdos são

necessários a vida dos alunos? Que conteúdos são trabalhados atualmente na

escola? Como trabalhar no âmbito escolar os saberes produzidos no cotidiano?

As indagações que proponho não estão meramente no campo retórico, visto

que, no decorrer desta pesquisa irei abordar essa matéria, trazendo para o campo

da discussão aspectos da cultura presente e em transformação na comunidade,

além de suas implicações na educação ambiental experimentada pelos alunos e

moradores de São Miguel do Flexal.

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3.3 Educação ambiental e perspectivas para o ensino de ciências

Nos últimos anos, o cenário educacional brasileiro, em especial a partir das

políticas estabelecidas a partir das discussões travadas na Eco-92 e da

implementação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9.394/96,

além dos Parâmetros curriculares Nacionais, tem acenado com uma necessidade de

se discutir no âmbito das escolas os problemas ambientais, constantemente

lembrados pela mídia e por movimentos ligados a ecologia.

Mesmo reconhecendo a importância dos conteúdos apresentados nos

documentos citados, é inegável que pouca coisa tem sido feita para uma efetiva

Educação Ambiental com potencial para atingir e se constituir como fundamento

formacional de cidadãos dos mais diversos campos sociais. Se de um lado é

verdade, que o tema tem atraído pesquisadores da área educacional e que tem

despertado interesse de jovens que cada vez mais demonstram preocupação com o

meio ambiente, de outro, é possível observar o descaso do poder público no que

concerne ao estabelecimento de políticas educacionais e sociais de cunho

ambiental, que possibilitem não só a proteção do chamado ambiente natural, mas

também de manutenção digna do homem do campo em seu habitat, em seu espaço

de convivência. Concordando com este pensamento, Jacobi (2003, p.196) ressalta

que o desafio mais latente “[...] é, pois, o de formular uma educação que seja crítica

e inovadora, em dois níveis: formal e não formal. Assim, a educação ambiental deve

ser acima de tudo um ato político voltado para a transformação social”.

A relação ser humano-natureza é complexa, constituindo-se de uma teia de

conhecimentos e vivências que não estão limitadas a um simples olhar do ambiente

natural como algo intocável e imutável, pelo contrário, tem seus fundamentos

forjados no cotidiano de cada comunidade e de cada ser presente no ambiente,

inclusive o homem, o qual se faz presente por meio de seu trabalho, costumes e de

sua cultura que marcam o tipo de convivência estabelecida. Ainda, abordando a

questão, Jacobi (2003, p. 190) afirma que “[...] a produção do conhecimento deve

necessariamente contemplar as inter-relações do meio natural com o social,

incluindo a análise dos determinantes do processo [...]”. Nessa perspectiva e com

base nas tendências que venho demonstrando neste trabalho, fica evidente meu

posicionamento acerca da importância entre os aspectos sociais de um povo e sua

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forma de interagir com o ambiente, pois, este não se encontra imune à ação

humana.

Na tentativa de explicar de forma didática a temática, Trivelato e Silva (2013)

apontam uma classificação em três categorias de Educação Ambiental:

conservadora, pragmática e crítica. Resumindo as três categorias apresentadas

pelas autoras, vê-se que a conservadora tem como base, práticas ambientalistas de

caráter romântico, no sentido de defender a natureza intocada, descontextualizada

dos aspectos sociais e culturais, separa homem e meio ambiente. A pragmática

aproxima-se do tecnicismo, dando primazia a práticas que compatibilizem

desenvolvimento econômico e recursos naturais, o chamado desenvolvimento

sustentável. No que concerne a categoria crítica, coloca a educação ambiental no

campo político, questionando o modelo econômico vigente e suas influencias no

meio ambiente, está apoiada na práxis, na relação entre sujeitos, natureza e objetos,

por um intenso processo de reflexão na e sobre a ação.

Empreendendo um posicionamento engajado, ciente do poder transformador

que a Educação Ambiental pode despertar em professores e alunos Guarim (2000,

p. 23) “[...] concebe um ambiente não só como meio físico biótico, mas também

social e cultural, estabelecendo uma relação entre os ambientes e o modelo de

desenvolvimento adotado pela comunidade”. Concordando com este pressuposto

Pereira e Guarim Neto (2009, p. 15) afirmam que:

A educação contemporânea precisa ser pensada levando-se em conta as transformações sociais, culturais e subjetivas de nossa era, buscando alternativas para a práxis educativo-social em relação ao meio ambiente, visando a construção de uma consciência ambiental.

As premissas apresentadas instigam a reflexão sobre: o que efetivamente

enquanto professores e cidadãos, estamos fazendo para desenvolver uma educação

ambiental consciente, politizada, com potencial para a construção de uma relação

menos predatória entre as partes envolvidas?

Indagar sobre isto me conduz a pensar sobre o ensino de ciências trabalhado

nas escolas que tive a oportunidade de atuar enquanto pedagogo, e principalmente

na minha vida de estudante do então ensino de 1º grau, e, mais recentemente

enquanto docente no curso de Licenciatura em Ciências Naturais da Universidade

em que desenvolvo minhas atividades de ensino.

Para narrar as vivências que neste momento passo a recordar, buscar em

minhas memórias, não como algo estático, paralisado no tempo e no espaço,

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indiferente às lentes que possuo hoje, proponho uma análise embasada em

determinados episódios, que evidentemente, não são os únicos que tive a

oportunidade de compartilhar, mas que em coerência como minhas subjetividades,

marcam meu olhar sobre o ensino de ciências.

Inicio, não por uma preocupação cronológica, mas por estar marcado de forma

muito viva em minha memória, com uma narrativa da minha vida estudantil em que o

professor de ciências desenvolveu uma atividade envolvendo a “importância de

conservar o meio ambiente”. A proposta, não diferente de outras que tratavam da

temática, tinham como propósito final cada estudante plantar uma árvore, o que por

certo era feito, afinal todos necessitavam da nota para passar de ano. Para nós,

alunos, a tarefa era muito simples, pois isso era basicamente a “salvação” para

quem estava “pendurado” na matéria, e, convenhamos plantar uma árvore não era lá

coisa de outro mundo. O dever estava cumprido, havíamos realizado nossa parte na

difícil tarefa de proteger a natureza, pelo menos isso era o que diziam nossos

professores. A visão de “proteção” a natureza estava limitada a plantar uma árvore.

Não nos perguntávamos de quem estávamos protegendo a natureza? Quem a

ameaçava? Porque ameaçava? Qual o propósito de protegê-la? Imagino que os

próprios professores não se fizeram estas perguntas, já que no meu caso, só

recentemente, ousei fazê-las.

A segunda narrativa refere-se a minha atuação enquanto pedagogo em uma

escola pública do Estado do Amapá, onde discutíamos em reunião a possibilidade

de produzir uma mostra científica que tivesse como tema principal “o meio

ambiente”, afinal o discurso difundido em nível mundial era o de proteção ao meio

ambiente, e em nível local, pelo governo do Estado, na época, era o de

sustentabilidade, representado por um programa governamental denominado PDSA

(Plano de Desenvolvimento Sustentável do Amapá). Com a concordância da diretora

da escola organizamos e produzimos a tal mostra científica, onde foram

apresentadas diversas experiências desenvolvidas no sentido de preservação do

meio ambiente, em geral relativas ao não desperdício da água e a conservação de

nossas florestas, como fundamento de nossa sobrevivência enquanto espécie,

porém sem questionar pontos cruciais para uma análise crítica dos interesses que

envolvem o ambiente e sua naturalização. Não questionamos, por exemplo, sobre o

modelo de desenvolvimento vigente e muito menos sobre o que supostamente seria

implantado pelo governo. A quem realmente interessa o discurso da conservação?

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Que pressupostos teóricos embasam tal discurso? Que impactos as políticas têm na

relação homem/meio ambiente?

A última narrativa, memória recente, trata da minha experiência enquanto

docente na Universidade do Estado do Amapá, em especial no curso de Licenciatura

em Ciências Naturais, neste caso formador de formadores. Lembro-me de em

muitas reuniões travarmos discussões sobre a reorganização, reconstrução da

proposta curricular do curso, já que, de acordo com as falas dos participantes, o

currículo não atendia o que de essencial necessitava ter um professor de ciências.

“tem muita disciplina pedagógica”, “precisamos colocar um pouco mais de botânica”,

“as disciplinas pedagógicas são importantes, mas não podemos esquecer que

estamos formando professores de ciências naturais”, assim os discursos se

sucediam de forma voraz, pois a palavra de ordem era “modificar a proposta

curricular”. As discussões me influenciaram tanto que minha primeira proposta de

projeto para construção de tese versava sobre o currículo do curso de Licenciatura

em Ciências Naturais da Universidade do Estado do Amapá - UEAP, mais

precisamente o seguinte tema: “Currículo e construção de prática pedagógicas

progressistas-inovadoras: um estudo sobre o currículo do curso de Licenciatura

em Ciências Naturais da Universidade do Estado do Amapá – UEAP.”. Evidente que

não restou muita coisa da proposta inicial de tese, já que fiz a opção de estudar uma

comunidade e suas formas de viver e conviver com a natureza ultrapassando os

espaços físicos da Universidade e me aventurando em um campo onde tudo pode

acontecer, desprovido de situações ideais laboratoriais.

Do lugar de onde falo me pergunto se realmente existe uma essência

fundamental constitutiva de professores de ciências? Se as disciplinas consideradas

“específicas”, são mais importantes do que as chamadas pedagógicas? Talvez a

pergunta não seja propriamente esta, sendo mais interessante questionar se existe

uma disciplina que não seja pedagógica? Ou se as disciplinas pedagógicas também

não são específicas, visto estarmos tratando de formação de professores?

Com as narrativas apresentadas e indagações que passam a fazer parte de

meus pensamentos, descubro que as certezas e verdades que possuía enquanto

docente, e em quanto formador de docentes, haviam se transformado em pó, algo

que não podia e não posso segurar por entre os dedos e muito menos classificar em

uma ordem lógica como pressupõe o conhecimento científico.

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No intuito de dar um fechamento a esse capítulo, mesmo estando ciente de

que poderia continuar com outros relatos e outras experiências, tomo emprestado

um trecho do livro Reencantar a ciência, reinventar a docência, de autoria da

Professora Sílvia Nogueira Chaves, não por acaso minha professora no Curso de

Doutorado/Reamec, e que, de maneira convicta, afirmo ter muita influência nos

discursos que combato e as vezes reproduzo. Diz a professora em uma de suas

narrativas sobre o seu ingresso no contexto da Universidade:

Mas, qual não foi meu descontentamento ao descobrir que na universidade não havia o maravilhoso que eu buscava. Lá o “mundo natural”, tão livre, amplo e pujante quanto meu desejo, estava miniaturizado no fundo de provetas e lâminas ao alcance de apenas um olho armado de microscópio. (CHAVES, 2003, p. 20)

Refletindo sobre seu currículo, sua história de vida e suas opções, em destaque,

a feita no campo das licenciaturas, chega a conclusão, pelo menos naquele

momento, de que a vida na universidade está restrita aos laboratórios com seus

instrumentos específicos, não atendendo a vida em toda sua extensão, pelo

contrário encontra-se presa aos ditames de uma ciência dos cientistas, distanciada

do cotidiano das pessoas em nome de uma cientificidade pura, não mundana,

distanciada das realidades pulsantes do convívio humano. Esse pressuposto

demonstra o conhecimento difundido no âmbito escolar, como algo feito para o real

científico, validado pela ciência e, na maioria das vezes, fora do contexto dos

estudantes. Por esse motivo, a autora constantemente propõe uma reflexão sobre o

porquê ensinamos determinados conteúdos e não outros? O que nos leva a ensinar

ciências? Imagino ser este um posicionamento muito mais saudável, aquele que não

cerceia, mas, estimula. Dessa forma a liberdade é colocada como condição

fundamental de uma educação científica para o ser humano, capaz de se

fundamentar nas práticas sociais e culturais vividas no cotidiano.

Ainda sob a influência das ideias colocadas tomo emprestado outro trecho da

obra de Chaves (2003):

Quantas fórmulas temos aprendido nas diferentes escolas que frequentamos em nossas vidas. Com quantas fórmulas significamos e aprisionamos os outros e a nós mesmos a partir daquilo que a escola nos classifica como certo/errado, falso/verdadeiro, bom/ruim? Esses esquemáticos binarismos que têm nos enformado, conformado, e que ainda hoje trazemos na memória, à moda de chips culturais, nos ditando padrões a serem seguidos, perseguidos ou lamentados quando neles não conseguimos nos enquadrar (CHAVES, 2003, p. 35)

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Tenho convivido cotidianamente com esse dilema, principalmente quando

escuto falar de ciência e da própria realidade. São colocadas apenas duas opções:

certo e errado, Como argumentou um professor conhecido em uma discussão sobre

políticas. “O Senhor como professor de políticas educacionais deveria saber que só

existem dois lados: situação e oposição”. A premissa colocada pelo dito professor

me fez refletir sobre o ponto levantado e a questionar de que lado eu estava, pois as

opções ofertadas foram somente duas. Concluo que a realidade é multifacetada,

com possibilidades que ultrapassam os dois lados da moeda situação/oposição.

Prefiro me situar em um espaço que me inquiete enquanto sujeito, acadêmico e

docente, e penso que isto me abre espaços de aprendizagem e de intervenção não

amordaçados pelos dois lados formulados, e, para longe dos discursos

demagógicos, me oportunizem discutir ciência e o ensino de ciências como um

território sem dono, sem as demarcações de espaço típicas de quem busca receitas

para viver e “educar”.

Imagino que esse novo olhar construído sobre o mundo e mais

especialmente sobre Educação Ambiental e Ensino de Ciências seja um caminho

sem retorno, pois, como disse anteriormente por meio de outras palavras, minhas

certezas e verdades foram severamente abaladas em suas estruturas, e

sinceramente, que bom isso ter acontecido. A estabilidade em que estavam

assentadas as convicções norteadoras de minhas práticas pedagógicas se

pulverizou, o que de fato possibilitou conceber, viver e a aprender com as

instabilidades presentes no cotidiano da comunidade, sendo possível sugerir

praticas pedagógicas possíveis no contexto da Escola de São Miguel, o que faço no

capítulo 6 dessa tese.

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4 APRESENTANDO O CENÁRIO: singularidades e saberes no âmbito

comunitário

Paralelamente ao receio da destruição ambiental, surgiu a preocupação com a ameaça de desaparecimento de outra parte do patrimônio nacional: um grande número de culturas marcadas por uma relação especial com os ecossistemas de alta diversidade biológica, tais como a cultura caiçara, dos jangadeiros, dos açorianos, dos ribeirinhos da Amazônia, dos pantaneiros. (DIEGUES, 2001, p.98)

A comunidade apresenta seu “cartão de visita”, com uma beleza natural que,

com a certeza das ciências exatas, ou com as peculiaridades que caracterizam o

local, não necessita de retoques ou ajustes (figura 4), basta simplesmente se

encantar e tentar com os recursos tecnológicos disponíveis, registrar imagens que

demonstram um pouco do estilo de vida e da cultura de um povo que vive do seu

trabalho e de suas crenças.

Figura 4 – Chegada à comunidade de São Miguel do Flexal

Fonte: Acervo do pesquisador - 2016

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O conhecimento construído e compartilhado no âmbito da comunidade de

São Miguel definitivamente não pode ser traduzido ou simplesmente relatado de

forma precisa, ou classificado e generalizado de acordo com os padrões científicos

clássicos, mesmo porque este não é o objetivo dessa pesquisa. Então o que cabe

ao pesquisador? A perspectiva em que me situo, estabelece um elo entre descrição

e interpretação daquilo que consigo observar e vivenciar em âmbito local,

possibilitando, dentro de minhas limitações teóricas e dos parâmetros estabelecidos

na proposta, apresentar descrições e reflexões a respeito das experiências

compartilhadas com os informantes, principalmente pelo fato de que pude sentir,

mesmo que por momentos, suas angústias e suas alegrias, seja em uma caçada

bem sucedida, em uma pescaria, em sala de aula ou mesmo nas festas e

programações culturais da comunidade. Esse capítulo está constituído de saberes

que permitem um olhar interpretativo sobre as condições e experiências de vida

presentes em São Miguel do Flexal, apontando suas características e peculiaridades

enquanto comunidade encravada no extremo norte do Brasil, mais precisamente no

Estado do Amapá.

4.1 Condições de vida: organização social e políticas públicas

Precipuamente, considero importante lembrar o que contou o informante

Mário sobre as condições de vida experimentadas em sua época de infância na

comunidade, posto que, ilustra de forma muito precisa os problemas sociais

enfrentados naquele período e que se estendem com outros contornos, obviamente,

contemporaneamente. Afirma o informante que seu avô chegou à comunidade no

início do século XX, para trabalhar na pecuária, na pesca, agricultura o que já era

feito por outras famílias presentes na região. A comunidade cresceu

demograficamente por meio século e a partir daí passou por um processo de êxodo,

principalmente pela necessidade de continuidade de estudo dos filhos dos

moradores locais. Sobre este aspecto o informante relata o seguinte:

“Meu pai encontrava muitas dificuldades para criar seus filhos, uma vez que, a

gente não tinha oportunidade de ter outros benefícios do Estado, visto a distância,

pois a comunidade fica muito longe de Macapá, da capital, e com isso vivíamos

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quase que no abandono, encontrando dificuldades em sobreviver, mas através de

um trabalho integrado da família, da união, conseguimos suplantar todos os

problemas que apareciam naquela época.” (MÁRIO)

O relato deixa claro, que as condições de vida experimentadas não eram as

melhores, e digo, com toda convicção que continuam precárias, pois durante minha

estada na comunidade foi possível constatar problemas agudos nos aspectos

econômicos e sociais: escola com uma estrutura física precária, funcionando com

classes multisseriadas e materiais didáticos sucateados, ausência de posto de

saúde, neste caso existe um prédio em ruinas (figura 5), abandonado pelo poder

público, bem como, falta de oportunidade para continuidade de estudos no próprio

local, sem abandonar a família e o trabalho no campo.

Figura 5 – Visão geral: Escola e Posto de Saúde

Fonte: Acervo do pesquisador - 2016

Politicamente fraca, a comunidade encontra sérias dificuldades na construção

e implementação de políticas públicas que fortaleçam suas instituições,

principalmente no campo da saúde e da educação, áreas que carecem de uma

atenção mais responsável por parte do poder público estadual e municipal.

Provavelmente, esse fator de enfraquecimento tenha dificultado a própria relação do

sujeito comunitário com o meio ambiente, haja vista, que a sobrevivência passa a

ser o primeiro instinto levado em consideração quando confrontado com práticas de

conservação ambiental.

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4.1.1 O cenário educacional local

O processo educacional e suas nuances serão analisados de forma detalhada

no capítulo seguinte, no entanto, entendo ser necessário apresentar aspectos gerais

sobre o assunto, como forma de estabelecer um diálogo acerca das condições de

vida a partir da única instituição educacional em funcionamento na comunidade, a

Escola Estadual São Miguel do Flexal.

Conforme dito anteriormente, a localidade faz parte do município de

Pracuúba, e como tal, recebe a herança de um modelo educacional que pouco se

vale dos saberes produzidos em nível amazônico, o que por certo, estimula o

desenvolvimento de uma cultura de apologia aos conteúdos prescritos pelos

programas oficiais, que na maioria das vezes estão distanciados da vida cotidiana

dos alunos.

Poucos recursos financeiros, precariedade no que concerne a pessoal de

apoio, ausência de políticas de formação profissional, são alguns dos problemas que

se apresentam no cenário educacional vivido por alunos, professores e gestores que

desenvolvem suas atividades na escola. Como disse a diretora da escola,

Professora Helena, apresentando a situação vivida em sua página no facebook:

“Escola São Miguel do Flexal, onde sou gestora, mas também faço trabalho

de secretária, pedagoga, ministro aulas na ausência de professores, lavo, faço

merenda com ajuda de algumas pessoas da comunidade. Não é vergonha nenhuma

e sim um prazer”.

Alguns poderiam dizer que o processo educativo pode ocorrer em qualquer

lugar, talvez seja verdade, porém essa premissa não exime o poder público da

responsabilidade de fornecer condições para o desenvolvimento de uma educação

com qualidade, nesse caso, tendo como pressuposto os saberes vividos na

realidade dos moradores onde o processo educativo acontece.

Imagino que se educar não é tarefa fácil para quem se encontra nas capitais

ou pelo menos em centros que recebem maior atenção do Estado, então o que dizer

das condições enfrentadas pelos atores que fazem a educação acontecer nesse

espaço amazônico?

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Certamente o tamanho do desafio desses educadores não é menor do que as

dificuldades apontadas nas vozes e observações realizadas, sendo necessário

reconhecer os reflexos que a carência de ação do poder público tem tido na

educação dos sujeitos que frequentam o espaço escolar comunitário. Pondero, que

apesar do enredo relatado, educandos e educadores conviventes em São Miguel

não perderam a capacidade de acreditar na escola como instituição promotora de

formação e com vigor suficiente para melhorar as condições educacionais

presentes. Acredito firmemente, que esse pensamento, a utopia de um presente e

futuro com maiores perspectivas de vida, funciona como uma fuga ao pensamento

conformista que tem assolado a sociedade brasileira em suas variadas dimensões

sociais.

4.1.2 Aspectos gerais da saúde local

O quadro apresentado na área da saúde não é muito diferente do observado

na educação, sendo um outro direito social constitucionalmente previsto, oferecido

de maneira extremamente irregular e insatisfatória, visto não atender as

necessidades básicas da comunidade. Verdadeiramente a saúde funciona de

maneira um pouco pior do que a educação, uma vez que, institucionalmente não

existe no espaço comunitário. O prédio construído para funcionar o posto de saúde

encontra-se em ruinas, abandonado pelo poder público, em evidente desperdício e

descaso com a coisa pública.

Em diálogo com o informante Mário, torna-se possível entender um pouco da

situação atual com base em informações históricas da comunidade. Descrevendo

como funcionava em outras épocas, relata que:

“As pessoas eram atendidas pelos Pajés e pelas parteiras, não cobravam

nada, eles sabiam o que fazer em cada caso, naquela época é que não tinha médico

mesmo, aí a gente procurava os Pajés, curavam muitas doenças, os remédios eram

feitos aqui, plantas e rezas eram usadas na cura das pessoas. Eu nasci com ajuda

de parteira, como te disse, não tinha médico, e sair da comunidade era muito difícil,

tinha que varejar por meio de barrancos, levava muitas horas e exigia muito esforço

de quem varejava”.

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“Boa parte das vezes as matriarcas e patriarcas, pessoas idosas, com mais

conhecimentos, utilizavam plantas para fazer chás e remédios que eram utilizados

para curar”

Os pajés eram vistos como pessoas com poderes sobrenaturais, mas que

também utilizavam ervas e plantas da flora local em seus encantamentos de cura.

Segundo dizem os informantes chegavam a curar doenças em estágios avançados,

por meio de rezas, unguentos e plantas com propriedades medicinais.

Em momento oportuno falarei de forma mais específica sobre os pajés e

outras crenças que caracterizam a fé do povo local, e que possuem influência no

modo de vida experimentado, porém, nesse momento quero continuar falando sobre

os aspectos da saúde na comunidade, a fim de que se possa ter uma visão geral

acerca do cenário.

O atendimento médico, nos dias atuais, é feito no posto de saúde da sede do

município, o qual conta com um médico e profissionais técnicos em enfermagem que

procuram dar conta das demandas apresentadas. Casos considerados mais

complicados são encaminhados para a capital do Estado, o que é feito por meio de

uma ambulância que por vezes não consegue atender a todos os enfermos. Para

ilustrar o que estou dizendo cito o caso do saudoso vereador e pequeno criador de

gado, Sr. Raul, nascido, criado e falecido na comunidade, tragicamente atacado por

um animal bubalino de grande porte, não resistindo aos ferimentos, chegando sem

vida a sede do município dentro de uma embarcação.

Infelizmente vivenciei esse momento de inarrável tristeza para os moradores

locais e família, visto tratar-se de um personagem muito querido e segundo dizem,

com incontáveis serviços prestados a São Miguel do Flexal. Não sei dizer se o

funcionamento do posto de saúde salvaria sua vida, mas posso dizer que os

primeiros socorros aconteceriam de maneira muito mais eficiente, talvez até

propiciando reais possibilidades de sobrevivência.

O fato é que o bem estar social tem repousado sobre um poder público

inoperante, incapaz de criar e manter instituições que se configurem como

promotoras dos direitos legalmente constituídos, aliás essa situação de precariedade

tem sido algo corriqueiro em nível nacional, mostrando sua face mais perversa em

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regiões com menor poderio econômico, como no caso da Amazônia Amapaense, em

especial, na comunidade objeto desse estudo.

4.1.3 Trabalho

Inicio o tópico afirmando que as principais atividades laborais

desempenhadas pelos sujeitos locais estão voltadas para a pesca artesanal, caça

de animais silvestres e pecuária, criação de bovinos e principalmente bubalinos que

povoam os lagos no período das águas grandes e os campos em épocas de

estiagem. Ressalto que a introdução do búfalo nessa região é algo que tem gerado

polêmica e fomentado debates sobre os possíveis prejuízos ambientais gerados por

essa espécie considerada exótica em relação aos campos inundáveis do Amapá.

Alegam que o búfalo está mudando a paisagem, abrindo caminhos onde não

existiam e fechando trechos em outros momentos transitáveis, porém, na visão de

quem mora na comunidade, a criação de búfalo e a exploração de seus derivados

propicia trabalho e alimento, gerando renda para quem depende do local para

sobreviver (figura 6). A fim de exemplificar o que estou apresentando, importante

lembrar o que dizem os informantes sobre o assunto.

“O búfalo ajuda bastante, no leite, no queijo, no trabalho, faço diária

trabalhando com búfalo, tenho que sustentar minha família e a situação não tá fácil

pra ninguém, as vezes vou até pro „arrebio‟, atrás de laçar gado brabo. É perigoso

mas eu preciso do dinheiro” (ZECA)

“O meu marido não é empregado, mas faz queijo, só que é por época, precisa

ter leite para fazer o queijo e as vezes não tem suficiente, aí tem que procurar

outra coisa pra fazer”. (JULIANA)

“Eu trabalho com búfalo, vendo meus mamotes, e com o leite faço queijo,

vendo aqui mesmo e minha irmã vende também lá no Flexal, na casa dela perto da

estrada” (MARCOS)

“Eu trabalho com o gado, sou criador, faço queijo, vendo gado e também faço

transporte dos alunos pra escola. O búfalo deve influenciar o ambiente, mas

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nós precisamos desse animal aqui na região, acho que o problema é a

quantidade no campo. Acho que esse ano vamo ter problema com água, ano

passado secou os lagos e o gado sofreu” (JARDEL)

Inegavelmente a bubalinocultura se reveste de força quando o assunto é

trabalho e geração de renda em toda Região dos Lagos do Amapá, pois muitos

moradores exploram carne, leite e seus derivados, para subsistência e pequenas

relações comerciais em âmbito local. Com o pasto adequado e o manejo feito de

maneira a respeitar as características dos animais e as condições oferecidas, torna-

se possível extrair leite de forma a garantir a subsistência e ainda o fabrico de queijo

(manteiga e coalho).

Figura 6 – Extração de leite e manejo do gado em período de transição

Fonte: Acervo do pesquisador - 2016

A produção e comércio de leite e queijo garante a subsistência de muitas

famílias da comunidade, já que notoriamente a localidade possui uma vocação para

este tipo de produção, que se justifica por gerações de indivíduos que dedicaram

sua vida ao trabalho no campo. Os conhecimentos sobre manejo e produção de

queijo foram passados de geração-a-geração, absorvendo, por óbvio, algumas

vezes aspectos da cultura moderno-urbana, no sentido de aumentar a produtividade

e diminuir as dificuldades de tal processo, porém, é possível afirmar, que a maior

parte da produção ainda é feita de maneira artesanal, considerando as dificuldades

econômicas e obviamente tecnológicas enfrentadas pelos pequenos fabricantes de

queijo.

No que concerne à pesca, atividade laboral muito desenvolvida pelos

comunitários, também trás em suas práticas movimentos que confrontam a

conservação do meio ambiente e a necessidade de sobrevivência,

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reconhecidamente vinculada aos aspectos ambientais. Nesse sentido, um

informante relata a nocividade dos chamados geleiros (atravessadores comerciais

que se valem do baixo poder aquisitivo do povo de São Miguel para a exploração

predatória do pescado) no tocante a conservação do ambiente e ao próprio consumo

do pescado pelos moradores. Relata o informante:

“Passa um rabeta atrás do outro e sempre tem um geleiro no meio pra comprar o

melhor peixe bem barato e vender caro, as vezes o peixe não fica nem aqui, pro

Tartarugalzinho e até pra Macapá. Se continuar assim, daqui mais uns anos não vai

ter nem traíra na região”

Essa forma de entender o processo já havia sido observada por Mendonça

(1983, p. 54) alertando que:

[...] de modo geral, somente o intermediário é quem está ganhando com isso, porquanto o pescador, preocupado em querer aumentar o volume de produção, devido o preço no mercado, esquece que seu trabalho está somente proporcionando um esvaziamento das riquezas renováveis, comprometendo assim o futuro de seus filhos e das novas gerações.

Institucionalmente, o poder público revela-se novamente como um ente

ausente da vida no âmbito comunitário, posto que os problemas relacionados ao

trabalho e fundamentalmente relacionados à sobrevivência do homem local se

acumulam e se agudizam por influência de agentes externos que por força do poder

econômico ditam as regras de comércio e consumo, consequentemente impactando

a relação com o ambiente.

A análise das relações expostas é vital para o entendimento do

funcionamento das práticas laborais em vigência na comunidade, haja vista, que tais

ações estão inseridas em um contexto que longe de ser simplesmente natural, está

fundado na vida social, política e cultural dos integrantes desse cenário

eminentemente amazônico.

4.2 Experiências de vida: relações culturais, hábitos e formas de subsistência.

São Miguel do Flexal é uma comunidade com estilo de vida simples, o povo

não possui grandes ambições no que se refere ao acúmulo de capital, considerando

que vivem basicamente do que retiram do meio ambiente, da criação de animais de

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pequeno porte e principalmente da bubalinocultura. A cordialidade com que os

moradores recebem as pessoas externas é uma marca de seu modo de vida, sendo

quase uma obrigação beber um pouco de café, algo imediatamente oferecido pelo

anfitrião quando do recebimento de visita.

As pessoas que habitam a região possuem traços culturais fortes,

evidenciados por saberes tradicionais que são construídos, modificados, repassados

e aplicados a cada nova geração, por esse motivo, os aspectos apresentados nessa

parte do trabalho possuem a intenção de trazer para o campo de análise

informações sobre as experiências de vida experimentadas pelos sujeitos que fazem

parte do cotidiano comunitário. Evidencia eixos relacionados à cultura, meio

ambiente e extrativismo.

4.2.1 Crenças, festas e suas implicações.

Os elementos culturais que fazem parte da vida de um povo são traços

característicos das formas de entender e conviver no e com o mundo a sua volta,

são constituintes de aspectos subjetivos que traduzem um estilo de vida com tempo

e espaço próprio, por esse motivo introduzo o assunto crenças, festas e suas

implicações por meio de um trecho histórico apresentado por Mendonça (1983, p.

30), narrando, com base em suas memórias, uma noite na comunidade de São

Miguel em um tempo sem luz elétrica, o que segundo o autor acontece por volta dos

anos de 1970.

“À noite sem luz elétrica, mas seguidos por lanternas, porongas e a própria

luz da lua, costumavam fazer visitas aos vizinhos mais próximos, onde, sentados

no chão, tinham ao meio o contador de estórias que era ouvido com muita

atenção pelos adultos e crianças [...], ficavam até alta noite tomando café,

fumando cigarros e cachimbos e tabaco de corda, contando suas aventuras e as

aventuras por eles conhecidas.”

O relato ilustra com muita propriedade o fazer comunitário em uma época

diferente da atual, obviamente com sua beleza e problemas característicos daquele

contexto. Vizinhos buscando espaços de reunião, trocando saberes, informações,

histórias e estórias que ilustram as mentes dos mais jovens e que por certo

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conduzem a um processo de aprendizagem, de difusão de conhecimentos próprios

do fazer local.

Obviamente, nos dias atuais existem outras relações, outras formas de

convívio que se refletem nas práticas adotadas no cotidiano dos sujeitos. A energia

elétrica é uma realidade recente, e afirmo que embora em outros momentos fosse

de certa forma romântico ficar sem esse benefício social, visto as caminhadas a luz

da lua, as reuniões de vizinhos e parentes, sua importância para a comunidade é

inquestionável, visto ser basilar para processos de comunicação, educação, saúde,

segurança, além de propiciar conforto aos moradores, afinal nem só de pão deve

viver o homem.

4.2.1.1 O arraial de São Francisco

A festa de maior importância e agregadora da comunidade é a de São

Francisco de Assis, considerado como santo protetor dos animais o que se justifica

pelo fato de ser a criação de bubalinos uma das atividades laborais mais

desenvolvida localmente. Segundo a programação do ano de 2016, a duração do

evento é de quatro dias alternando momentos eminentemente religiosos (oração,

louvor, novena, procissão) e momentos profanos regados a muita bebida alcoólica,

leilão, bingo, corrida a cavalo.

Ressalto que em outras épocas, segundo relatos, a festividade possuía

programação mais extensa, tendo duração de até 20 (vinte) dias, sendo construída

uma estrutura em madeira para o acolhimento de crianças que juntamente com seus

familiares participavam do evento.

“Lembro como se fosse hoje, muitas crianças dormindo em redes levadas pela

família. Ninguém queria ir embora, então descansavam por lá mesmo e no outro dia

lá estava todo mundo de novo” (Mário)

Ninguém queria perder nada, eu era criança, mas tava lá também, queria participar,

o que achava melhor era a corrida de cavalo, mas também gostava da parte

religiosa. Meu pai dizia que era importante fazer e pagar promessa pra São

Francisco de Assis.” (Jardel)

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As rezas são conduzidas por um padre que se desloca para a comunidade no

período do arraial, na sua falta, o ritual é comandado por outro membro da

comunidade, em geral a Senhora Carla, que entoa em voz alta cânticos católicos e

rezas em nome das famílias presentes e ausentes na festividade. Em seguida, após

o momento religioso, encontram-se todos na praça improvisada localizada em frente

a pequena igreja (figura 7) onde é possível confraternizar, contar histórias, rever

amigos que, por algum motivo, se fazem presentes apenas durante o arraial.

Figura 7 – Início da saída: procissão e encontro na praça

Fonte: Acervo do pesquisador – 2016

Na programação, bingo e leilão fazem sucesso, os prêmios oferecidos vão de

doces em geral, até animais bovinos, bubalinos, suínos e aves doadas por criadores

e demais membros da comunidade que reconhecem a importância do evento, não

só como aspecto religioso, mas, sobretudo, como um evento que permite a

fraternidade e momentos de comunhão entre moradores locais e visitantes que

prestigiam a programação (figura 8).

A festa fica mais emocionante nos dois últimos dias, quando acontece a

procissão de São Francisco, realizada às 17 horas, já no entardecer da Amazônia

Amapaense, verificando-se um clima mais ameno, mas ainda assim com calor

suficiente para impulsionar os romeiros, que com a fé característica de um povo

crente, acompanha a imagem do padroeiro por todo o trajeto, sendo comum a

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queima de fogos que rompem o silêncio, dividindo espaços com os sons

provenientes da fauna local.

Figura 8 - Momento da queima de fogos

Fonte: Acervo do pesquisador - 2017

O encerramento acontece na manhã de domingo, com uma atividade muito

aguardada e de grande prestígio junto aos moradores, a corrida de cavalo. É um

momento que apresenta grande teor de competitividade, já que podem concorrer

cavaleiros e animais oriundos de outras comunidades. Nesse caso, o clima nem

sempre é amistoso, sendo possível presenciar discussões sobre o melhor cavalo de

corrida, o melhor para laçar gado e outras modalidades. Os vencedores recebem

premiação, além de reconhecimento e prestígio junto aos comunitários.

Em conversa com a equipe organizadora, foi possível constatar o desejo de

ampliar as modalidades de integração entre os participantes, assim como, o número

de dias do evento, o que se justifica na fala do Sr. Jardel o qual afirma esperar o ano

inteiro pelo momento de confraternização, quando segundo ele, poderá rever amigos

e colocar os assuntos em dia.

“Aparece aqui gente, amigos que a gente não vê faz muito tempo e que às vezes nem

sabemos se estão bem, se inda estão vivos”. (Sr. Jardel)

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O significado da festa para a vida na comunidade é algo que emociona, visto

que a fé no santo padroeiro leva crianças, jovens, adultos e idosos a exaustivas

caminhadas, por trilhas nem sempre tão fáceis de percorrer, a fim de chegar em

tempo hábil para fazer promessas e obviamente “pagar os débitos” com o santo. A

simbologia dos atos e a força com que influenciam os fazeres comunitários no que

se refere à caça e pesca, o trato com o ambiente e mesmo o aumento do rebanho,

demonstram traços marcantes de uma cultura que se renova dentro das histórias e

estórias vividas nesse espaço/tempo amazônico.

O Arraial de São Francisco de Assis é um campo aberto à aprendizagem e ao

ensino em uma perspectiva transcendente aos parâmetros disciplinares, já que o

conhecimento está presente nas próprias relações vividas durante todo o evento. Os

conteúdos estão em movimento, estão nas vozes, nos mitos, nos fazeres de cada

um dos sujeitos e que infelizmente encontram-se distantes dos fazeres pedagógicos

trabalhados na escola. Não quero com essa fala, desmerecer as práticas dos

docentes que por lá trabalham, pois sei que fazem o possível dentro das condições

ofertadas, porém é inegável a necessidade de entrelaçar, ou usando uma expressão

mais adequada, indissociar os conteúdos das práticas de vida, daqueles trabalhados

no ambiente escolar.

4.2.1.2 A crença inabalável nos dons de cura e no conhecimento dos mais idosos.

Em tópico anterior abordei o quadro da saúde na comunidade, e conforme

relatei, não há sequer posto de saúde em funcionamento, estando os moradores

desprovidos de atendimento médico. Disse também, que essa situação configura-se

como um problema de longas datas, sofrendo com a ausência de políticas públicas

eficazes que possam fornecer o mínimo de estrutura de atendimento a população.

Considerando o cenário apresentado e a própria sobrevivência, a comunidade

ao longo de sua história, necessitou produzir conhecimentos que pudessem dar

conta de suas demandas nas mais variadas áreas, principalmente no campo da

saúde e do conhecimento dos ciclos naturais, talvez por esse motivo, ainda hoje

deposite confiança em pessoas, no meu entendimento, verdadeiramente sábias:

Pajés, Parteiras e Experientes, assim denominados pelos comunitários.

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Afirmam os comunitários que os Pajés são pessoas com poderes

sobrenaturais e que em outras épocas, visto a dificuldade em deslocar pessoas

doentes para a sede do município ou para a capital, era mais prudente procurar o

Pajé que na voz de um informante,

“Realizava sessões dirigidas e assistidas por pessoas da comunidade,

usando instrumentos como caco de brasa, charuto, cachaça, maracá, pena de arara

e fitas coloridas, além de ervas que curavam doenças. Durante as sessões outras

pessoas podiam se atuar e, se isto acontecesse, elas seriam trabalhadas para

serem os futuros pajés. Ave era o nome dado pelos espíritos e pelos presentes ao

Pajé durante o tempo que se encontrava incorporado”. (Mário)

As parteiras também tiveram presença marcante no nascimento de muitas

pessoas na região, famílias inteiras vieram à luz por mãos de parteiras, que segundo

os relatos seriam mulheres com muito conhecimento que se disponibilizavam a

ajudar as que entravam em trabalho de parto. A orientação pós-parto era a de que,

“Após o parto a mulher que paria tinha que tomar purgante de mamona e

outros ingredientes não revelados pela parteira, para fazer limpeza, ficava oito dias

do mosquiteiro sem pegar vento forte, comendo somente galinha durante quarenta

dias” (Mário)

Outro personagem que merece destaque é o indivíduo, geralmente mais

idoso, denominado como Experiente, certamente alguém reconhecidamente com

conhecimentos suficientes dos ciclos naturais para orientar os melhores momentos

para o plantio, caça e pesca, além de um acurado poder de observação e de

análise, já que eram considerados consultores sobre diversos assuntos pertinentes a

vida comunitária. Exemplificando a função do Experiente relatou-se o seguinte:

“O papai não colocava uma roça sem consultar o tio Tonho, sempre dava

certo o que ele falava, ele dizia o melhor dia, local e até a melhor hora pra começar

o trabalho. Ele dizia até a melhor marca para utilizar nos animais, para dar sorte e

aumentar o rebanho. Ele assessorou muita gente aqui” (Mário)

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As ocupações descritas ainda hoje possuem lugar de destaque na

comunidade, evidentemente com menos intensidade do que em outros tempos, pois

os avanços no campo da comunicação e do transporte permitiram um deslocamento

com maior eficácia, oportunizando, principalmente em casos considerados mais

graves, a transferência do enfermo para centros com maiores recursos tecnológicos.

Para encerrar esse ponto, lembro que os ritos adotados nas práticas descritas,

estabelecem uma forma de fazer característica de quem mora no local e que embora

não se apresentem como normas escritas, são dotadas de força mandamental.

O cenário apresentado pelas vozes relatadas demonstram acima de tudo que

os saberes produzidos e continuamente em produção ao longo da história da

comunidade são indiscutivelmente necessários a sobrevivência dos sujeitos locais,

considerando que pela não ação do Estado, buscam alternativas que possam dar

conta das demandas político-sociais. É dentro desse contexto que a comunidade se

movimenta, e se reinventa enquanto corpo social, cultural e político. Nesse sentido,

saber realmente é poder, à medida que passa a constituir um processo evolutivo

social em que a comunidade assume o papel de protagonista.

Importante destacar que em hipótese alguma desejo retirar a

responsabilidade estatal junto aos moradores, pelo contrário, acredito que o Estado

tem papel fundamental na implementação de políticas públicas que sejam

construídas no próprio âmbito comunitário, e nesse sentido, não é o poder público

unilateralmente quem vai dizer o que precisa ser feito, são os próprios sujeitos

conviventes que deverão a partir de seus problemas e conhecimentos definir as

melhores estratégias e caminhos para a construção de políticas que possibilitem

condições de vida mais adequadas às necessidades do povo de São Miguel.

4.2.2 Saberes locais e meio ambiente

No que diz respeito à relação com o meio ambiente, entendo ser um ponto

verdadeiramente capital, já que a pesquisa possui forte ligação com a temática

ambiental, sendo portanto necessário lançar um olhar atento sobre as relações que

se estabelecem nesse campo. Recentemente produzi dois trabalhos juntamente com

meu orientador de pesquisa e outros parceiros colaboradores, no sentido de retratar

um pouco dessa relação entre os sujeitos locais e o meio ambiente na comunidade

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de São Miguel do Flexal. Por uma questão de originalidade, optei por não trazer

para dentro dessa tese tais produções, porém vejo a necessidade de apresentar

algumas das ideias trabalhadas por lá, com um enfoque mais conectado a essa

pesquisa. Proponho então a compreensão de um meio ambiente em constante

mutação, altamente influenciado pelos modos de vida presentes na comunidade

entendendo o homem local como sujeito responsável e consciente da importância de

conservar o meio ambiente para o presente e para o futuro.

Primeiramente acredito ser necessário entender que de maneira alguma o

homem local deve ser afastado do seu habitat, pois ninguém melhor do que ele

compreende a importância da conservação do ambiente em que vive, e nesse

sentido, não se pode esquecer que é esse sujeito quem sofre com a depredação da

natureza, com o desparecimento de espécies da fauna e da flora, antes apenas

utilizadas para subsistência, hoje, despertando interesses econômicos de sujeitos

externos.

A partir desse ponto de vista, os saberes produzidos localmente passam a ser

fundantes para uma proposta de conservação ambiental voltada para compreensão

do ser humano enquanto indivíduo capaz de conviver harmonicamente com o meio.

Apoiado em Diegues (2000b) entendo que as práticas de manejo tradicionais

contribuíram e contribuem para conservação da biodiversidade local de forma muito

mais efetiva do que os megaprojetos preservacionistas que, em geral, excluem o

homem de seu habitat, destituindo-o de seu direito a terra.

Analisando o assunto é importante lembrar o que dizem Pimbert e Pretty

(2000, p. 196 ) enfatizando que “[...] os esforços de conservação devem identificar e

promover os processos sociais que permitem às comunidades locais conservar e

aumentar a biodiversidade como parte de seu modo de vida”. Ora, conservar o

ambiente implica então em reconhecer as culturas locais como propulsoras de

formas de manejo e de entendimento dos ciclos naturais, inseridos na vida cotidiana.

O Homem do campo vive na e pela natureza, possuindo consciência de sua

necessidade para sua subsistência enquanto ser humano membro de uma

comunidade. A esse respeito torna-se importante demonstrar como pensam os

participantes da pesquisa, o que se faz por meio de suas vozes.

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“A gente depende daqui, se não cuidar, daqui um tempo não vai ter mais, tiro

pelo peixe, que antes tinha em grande quantidade, agora tá mais difícil pegar,

porque são muitas redes colocadas no lago, os geleiro levam quase tudo”. (João)

“O peixe tá diminuindo porque tão acabando com os aningais, é lá no meio

dos aningais que eles desovava, antes era fácil pegar apaiari, até pirarucu a gente

pegava, agora só se a gente for pra longe, e aí é mais difícil (Zeca)

“Acho que tinha que controlar os geleiro, eles levam muito, aí sobra pouco,

cada ano vai diminuindo mais. Outra coisa que eu acho que tinha que fazer era

diminuir a quantidade de gado búfalo, tem demais, eles abre vala e prejudica o

ambiente” (Olavo)

“Antes o que era tirado daqui era em pequena quantidade, só era pra comer

mesmo, meu pai não aceitava estragar comida, pra ele era uma ofensa muito

grande, lembro dele com raiva porque tinham tirado muito tracajá do lago e acabou

estragando” (Mário)

As abstrações que produzo com base nas vozes dos sujeitos ressaltam a

ideia de que as populações tradicionais, por meio dos conhecimentos produzidos no

fazer diário, vivem há muito tempo em determinados locais da Amazônia,

convivendo com eventos naturais, culturais e muitas vezes sobrenaturais

constituintes dos modos de vida na comunidade. Portanto, demonstraram saber

conviver com seu ambiente, degradando apenas o mínimo necessário.

É óbvio que nem toda relação entre as comunidades tradicionais e o meio

ambiente se condiciona harmoniosamente, pois são vários os fatores que interferem

nesse contexto, dentre eles elementos políticos e sociais que via de regra empurram

o sujeito comunitário a explorar mais do que seria normalmente necessário a sua

sobrevivência. O que estou dizendo é que por si só nenhuma relação é

perfeitamente harmônica, pois estão sujeitas a um contexto que se movimenta, se

desloca em várias direções, em um processo metamórfico em que o ser humano

influencia e é influenciado pelo meio em que vive e convive.

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4.2.3 Extrativismo: flora, pesca, caça

O extrativismo desenvolvido na comunidade não difere muito de outras

regiões amazônicas, porém tem maior destaque a pesca artesanal, seguida da caça

de animais silvestres, extração de açaí e madeira, além outros frutos característicos

da flora local, explorados para garantia da subsistência das famílias e pequenas

relações comerciais que propiciam alguma renda a quem desenvolve essas práticas.

A flora regional é muito rica, contando com vegetais como açaí, bacaba,

manga, ingá, ameixa, frutinheira, andirobeira, marajá, cuia de onça (figura 9) e

outras que participam dessa composição do cenário local. Destaque especial

merece a aninga, pois embora não tenha valor comercial conhecido, pelo menos não

na comunidade, apresenta-se como elemento de suma importância ao equilíbrio

ecológico, já que, segundo informações dos comunitários, e observadas durante a

pesquisa, é lá nos aningais que os peixes se reproduzem, sendo ainda abrigo de

muitas outras espécies como quelônios, jacarés e capivaras.

Figura 9 – Espécies típicas da região: frutinheira e andirobeira

Fonte: Acervo do pesquisador - 2016

A pesca realizada em São Miguel é essencialmente artesanal, explorada tanto

em águas fluviais como marítimas, visto que muitos pescadores, em busca de maior

quantidade de pescado, se aventuram em águas mais distantes e perigosas. Rede

de pesca, caniços, e anzóis, são itens comuns em qualquer casa da comunidade,

visto que no período de águas grandes torna-se possível pescar dos trapiches

existentes nas residências. Como se diz por lá, “[...] é fácil puxar piranha, porque

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tem muita, tem arraia, poraquê, traíra, mandubé, mandi...”. Quando as águas

começam a baixar, com a formação das “valas” e pequenos lagos, a pescaria ganha

outros contornos, sendo mais comum a captura de tamuatás e acaris, o que se faz

com o uso de redes de pesca e pequenas malhadeiras (figura10).

O informante (Mário) lembrava que em outras épocas o processo adotado era

muito próximo as técnicas utilizadas pelos indígenas, com pouca agressão ao meio,

“Era feita através de anzol, anzol de mão, arpão, cacuri, lanterna e zagaia e

muitas vezes com as próprias mãos usando poronga”.

Há algum tempo esse cenário vem se modificando e embora ainda seja

considerado um processo de pesca artesanal, a ação dos atravessadores/geleiros,

tem estimulado o avanço de práticas de captura de peixes, em volume bem maior do

que no passado, tendo um impacto negativo tanto para o meio ambiente quanto para

aqueles que necessitam do pescado para o consumo próprio. Espécies como o

pirarucu, por exemplo, despareceram dos lagos, sendo muito raramente

encontradas, ainda assim em pontos mais longínquos, de difícil acesso ao homem.

Figura 10 – Pescaria em período de transição das águas

Fonte: Acervo do pesquisador - 2016

A caçada de animais silvestres faz parte da cultura local, servindo

principalmente para alimentação, e em outro polo, atendendo ao mercado externo,

para o comércio clandestino de couro, carne, penas e ovos. Segundo o informante

Mário,

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“a garça branca parece ter sido a primeira espécie a ser caçada, com

finalidade comercial, depois vieram jacarés, veados, onças, capivaras, cutias,

tracajás, marrecas e outros”.

A esse respeito, é interessante observar a imagem seguinte (figura 11), pois

retrata o cenário de forma muito densa, demonstrando uma fase em que as águas

estão baixas e várias espécies da fauna regional se fazem presentes de forma

corriqueira.

Figura 11 – Período de garças, marrecas e pequenos peixes

Fonte: Acervo do pesquisador - 2015

O que se observa nas imagens é o retrato do período em que se aglomeram

grandes quantidades de garças e marrecas, além de pequenos peixes que ficam

presos nas valas que se formam no final das chuvas. Nessa fase muitos membros

da comunidade se ocupam da caça de marrecas e outros pequenos animais como

capivaras (figura 12) e cutias, além de uma intensa busca por quelônios que iniciam

seu período de reprodução. Os quelônios, principalmente o tracajá, são muito

apreciados como alimento entre os membros da comunidade e também como

iguaria de grande valor econômico na capital Macapá.

A maior parte dos moradores reconhece que há um risco muito grande

dessas espécies desaparecerem dos lagos, florestas e campos, pois a captura tem

sido intensa e em geral predatória, por este motivo buscam alternativas para

preservação da fauna regional, sendo um bom exemplo o “Projeto Quelônios da

Amazônia – PQA”, o qual tem como propósito a proteção da espécie,

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acompanhando o período de reprodução, incubação dos filhotes, culminado na

soltura destes na natureza.

As informações coletadas afirmam que o projeto é de inciativa do IBAMA em

conjunto com membros da comunidade, em especial a família Vaz Brito, que cede

sua propriedade localizada no “lago da ponta baixa” para que sirva de base na

culminância do trabalho, além de coordenar todos os procedimentos adotados

durante a efetivação do projeto. Evidentemente o PQA isoladamente não irá resolver

a problemática enfrentada, mas há que se ressaltar o seu potencial mobilizador,

social e educativo, tendo em vista que consegue o envolvimento de grande parte da

comunidade.

Figura 12 - Capivara abatida por moradores

Fonte: Arquivo do pesquisador – 2016

A face mais desumana dessa relação reside no fato de que embora o volume

do comércio tenha aumentado nos últimos anos, estimulado principalmente pelo

mercado externo, tal fator não tem se configurado como condutor de melhorias nos

aspectos socioeconômicos presentes na região, pelo contrário, o empobrecimento

da população está acontecendo na razão direta do esgotamento dos recursos

naturais o que tem gerado preocupação no que se refere à própria existência da

comunidade.

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Subsistir na região exige cada vez mais a compreensão dos fenômenos

sociais, políticos e econômicos presentes no contexto local, visto que tais aspectos

estimulam e condicionam os moradores ao desenvolvimento de práticas de

sobrevivência que em geral não condizem com os saberes, tradições e modos de

vida secularmente repassados de geração a geração. Ressalto que evidentemente

mudanças deveriam ocorrer, haja vista, que o local, assim como o mundo, está em

movimento, em constante metamorfose, porém, o que vem acontecendo é um

verdadeiro assédio econômico, nocivo ao meio ambiente e, sobretudo, a população

local.

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5 CONHECIMENTO CIENTÍFICO E SABERES AMBIENTAIS: representação,

memória e significados para o ensino de ciências

“Hoje alguma coisa mudou, mas ainda se conservam os laços primitivos da cultura local. É uma gente simples, humilde, sem grandes aspirações, porém no fundo tudo é motivo de felicidade, olhar em volta e estar tudo tranquilo, as árvores, as aves, os animais a natureza em si, dando paz de espírito e amor, é vida do campo” (Trecho retirado de documento de antigo morador da região, 1983, Autodenominado Retalho Verde)

Inicio este momento da pesquisa com um pequeno relato de uma das manhãs

que pude vivenciar no decorrer de minha interação com os moradores locais. Faço

isso, na intenção de contextualizar o diálogo e me inserir no processo que tento

descrever e analisar neste capítulo, pois, imagino que a partir desse exercício a

escrita possa fluir de maneira mais suave, já que, nesse momento, tornou-se

possível o acesso a saberes que até então não cabiam na forma esquemática como

eu entendia o conhecimento científico.

As ideias que passam a povoar meus pensamentos são construídas em um

caldeirão de falas, imagens, símbolos e teorias oriundas de minha vivência

acadêmica e do envolvimento desta com os saberes locais, de certa forma,

obrigando-me a sair do que muitos popularmente chamariam de “zona de conforto”,

e que prefiro academicamente denominar de “zona de estabilidade.” Para não me

alongar nesse ponto introdutório da discussão, passo então ao relato, aqui

funcionando como um prelúdio para em seguida refletir sobre percepções

ambientais presentes no cotidiano da comunidade, construção do conhecimento

ambiental e o fazer pedagógico docente em relação ao repertório de conhecimentos

locais já produzidos pelos alunos.

Pessoas humildes, que descrevem apenas coisas que conseguem observar

de suas vivências, coisas sobre plantas, animais e formas de se relacionar com o

trabalho e o ambiente, caracterizando um processo educacional dinâmico, rico em

experiências cotidianas, que infelizmente, passam longe da escola. Francisco, filho

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de 9 (nove) anos de idade, de uma família com 7 (sete) membros, ajuda o pai no

trabalho, monta a cavalo e toca o gado, juntando as reses espalhadas no campo,

direcionando para o curral. Mesmo com sua estatura diminuta e pequena força

física, se comparado a um adulto da comunidade, desempenha a tarefa com relativa

facilidade, algo que parece ser comum nessa região do Amapá.

Aqui o trabalho começa cedo com os preparativos para o trato com o gado,

pois a rotina do campo é bem diversa daquela experimentada na cidade,

considerando que imprime uma rotina com tempo, espaço e relações culturais

diferenciadas, às vezes não obedecendo ao que o relógio ou o próprio corpo do

homem da cidade reclama como direito. Dorme-se cedo, porém, acorda-se com os

pássaros, que por sinal, são muitos e das mais variadas espécies habitantes de

nossa Amazônia do “Pantanal Pracuubense”. Marrecas, Sabiás, Curiós, Curicacas,

Colhereiros, dentre outros que escapam, não minhas percepções, mas minha forma

de classificar e organizar o mundo ao meu redor, dão o tom das dissonâncias

presentes na sinfonia que abre o dia, neste caso, com um sol, que por volta do final

da manhã, está tão denso que chega a deformar a paisagem. E assim inicia o dia

em são Miguel do Flexal, com inúmeras formas, cores, sons e cheiros, elementos

que fazem parte do cenário amazônico e que são indispensáveis a compreensão

dos modos e experiências de vida presentes no cotidiano dos comunitários.

Com o entendimento de que a Educação Ambiental e o ensino de ciências

fazem parte de uma complexa estrutura institucional, cultural e simbólica, que

transformam realidades e se transformam enquanto práticas cotidianas estabeleceu-

se um convívio com os informantes, no intuito de estimular suas reflexões e falas em

relação ao ensino de ciências desenvolvido na escola e sobre as práticas

educacionais ambientais vigentes no fazer dos docentes.

A respeito do argumento levantado, as vozes e práticas foram registradas,

unitarizadas, categorizadas e organizadas em eixos temáticos que possibilitaram a

produção de textos originais construídos a partir do corpus da pesquisa e do

repertório teórico que fundamenta minha formação humana e acadêmica. Na

intenção de facilitar a compreensão, vozes e práticas foram colocadas em evidência,

organizados a partir dos eixos geradores, indicando seus respectivos informantes.

Importante enfatizar que embora as vozes estejam em destaque, prima-se pela

indissociabilidade dessas com o texto e o contexto do objeto de estudo, pois

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entende-se este princípio como fundamental nesse tipo de pesquisa, já que a ideia é

trabalhar com categorias emergentes (MORAES, 2003).

5.1 Percepções ambientais presentes no cotidiano local

Considero este ponto da pesquisa como essencial ao entendimento do fazer

ambiental na comunidade, já que por meio das vozes dos informantes, e de minha

vivência junto aos moradores, observando, analisando e construindo dados

apresento reflexões que julgo, com base em minhas leituras e experiências de vida,

importantes para uma efetiva compreensão dos saberes locais e suas implicações

no meio ambiente.

Como descrever as percepções ambientais evidenciadas nas vozes e atitudes

dos informantes? Melhor ainda, como fazer isso sem cair na rotina entediante de um

simples relato? Até que ponto posso ou devo fazer os recortes sem causar prejuízos

ao sentido das falas e daquilo que foi observado?

As perguntas que acabo de apresentar são composições reflexivas do que

venho fazendo ao longo dessa investigação, e não estão limitadas por um método

em especial. Embora tenha feito a opção por uma Pesquisa Narrativa com

fundamento na Análise Textual Discursiva conforme proposto por Moraes (2003),

não considero que essa escolha se constitua como um limitante, mas sim como uma

trilha que pode ter inúmeras bifurcações, pousos, repousos e chegadas ainda não

determinadas por hipóteses pré-fabricadas.

É apoiado nessa premissa, de que o método não pode ser visto como o

instrumento mágico capaz de dar conta das múltiplas realidades, ou pelo menos

como receita da forma “correta” de dizer o que deve ser dito, que apresento as

percepções sobre Educação Ambiental presentes nos discursos dos participantes.

Antes de demonstrar e analisar as percepções ambientais identificadas no

cotidiano dos moradores locais, penso ser importante lembrar, considerando que

essa pesquisa se direciona para Educação Ambiental, que o processo de

entendimento dessa trama está longe de ser homogêneo, pois como afirma

Layrargues e Lima (2014, p. 25) “[...] o campo da Educação Ambiental já é

atualmente reconhecido como multifacetado, composto por inúmeras correntes

político-pedagógicas [...]”, dentre as quais destacam-se: macrotendência

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conservacionista – possui caráter comportamentalista não tendo preocupação com

mudanças na estrutura da sociedade, valoriza o aspecto afetivo de conservação da

natureza; macrotendência pragmática – tem como sustentação a lógica do mercado,

voltando-se para a ideia de consumo verde, ajustando-se as práticas neoliberais de

utilização dos recursos naturais; macrotendência crítica – O aporte principal dessa

tendência está no processo político-pedagógico que se encontra no cerne dos

debates ambientais, trazendo para discussão a complexidade das relações sociais

presentes na dinâmica ambiental (LAYRARGUES; LIMA, 2014)

A essa altura, por tudo que já foi narrativamente produzido, evidencio que

essa investigação não busca o enquadramento numa teoria em particular, mas

obviamente, situa-se em uma lógica complexa, entendendo a Educação Ambiental e

as práticas ambientais dentro de um contexto organizacional em movimento, imerso

nas necessidades socioambientais. Apoiado nesse discurso, passo a narrar meus

diálogos com os sujeitos participantes da pesquisa.

Certo dia, em uma das minhas interações com membros da comunidade,

neste caso, com o Sr. João (Trabalhador rural e morador local), caminhávamos

próximos a um trecho do campo em que outrora, de acordo com seus relatos, havia

sido um lugar de pescaria fácil no período da cheia das águas, devido a abundância

de pescado e da ausência de pesca predatória para fins de comercialização em

larga escala com os geleiros locais e não locais.

Dizia-me o Sr. João:

“Tem muitas pessoas que não preservam o meio ambiente, mais tarde pode

prejudicar muito. Os nossos filhos vão sofrer com isso. Do tempo que eu cheguei pra

cá, pirarucu e tracajá a gente via de quantidade no rio. Hoje em dia pra pegar um

alimento desses, a gente encontra dificuldade, porque a exploração do homem foi

grande nesses anos. Cada ano que passa a natureza se modifica e fica mais difícil.”

“O impacto foi muito grande sobre os aningais. Todo tipo de pescado, apaiari

e tucunaré, por exemplo, desovavam pra justamente reproduzir. Hoje em dia tem

bem pouco aningal. O próprio homem destruiu o meio de vida sobre os peixes,

porque não tinha onde eles desovarem e aí eles correm para o campo. A nossa

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água de começo de janeiro tem um tipo de capim, chamado capim de marreca, esse

capim solta um tipo de veneno que mata peixe em grande quantidade.”

A conversa com este sujeito, suas explicações e indagações durante a

caminhada, faz com que minha atenção se volte para a paisagem ao meu redor, que

embora seja bela, realmente revela traços de agressão ao ambiente. Observo a

formação de grandes valas, que segundo ele, são resultado da criação de búfalos e

da ação da própria natureza por conta da “corredeira das águas”.

Vejo grande quantidade de gado no campo, bovinos e bubalinos que pastam

em uma espécie de campo comunal e que por certo fazem aquele ambiente ser do

jeito que é, uma vez que, influenciam no chamado “ambiente natural”. Outro aspecto

destacado refere-se à ação dos pescadores profissionais, que em sua boa parte,

imprimem práticas predatórias de pescaria em escala muito maior do que aqueles

que apenas pescam para subsistência. A ação do homem tem sido decisiva na

alteração ou conservação do ambiente e essa ideia está presente nas vozes dos

participantes da pesquisa. Corroborando com esse pensamento Pereira e Guarim

Neto (2009, p. 25) ensinam que:

A sobrevivência das diferentes espécies que abundam o ambiente da floresta é inteiramente dependente do papel que cada uma desempenha nesse ecossistema. O ser humano, enquanto integrante desse bioma, dotado de inteligência e livre arbítrio contribui expressivamente no processo de transformação ou preservação do ambiente.

Esse pressuposto de que a ação humana tem sido, de certa forma, a grande

causadora dos desequilíbrios ambientais, levando a um contínuo prejuízo ecológico

e social também está explícito no que apresenta Guarim (2005, p. 9) afirmando que:

As atividades humanas parecem ser as causas mais comuns atingindo as comunidades ribeirinhas, isto porque a excessiva pesca predatória e o turismo desorganizado têm levado à alteração de hábitat e à perda da biodiversidade. Algumas das alterações ambientais têm sido consideradas como sendo induzidas pelos homens, por exemplo, a poluição dos rios, o desbarrancamento de suas margens, as queimadas, a diminuição da pesca etc.

As percepções expostas caracterizam não somente aspectos teóricos ou falas

desconexas de moradores da comunidade, são de fato, produtos de uma rica

vivência no cotidiano local, fundamentada em saberes que antes de qualquer coisa,

fazem parte de um acervo cultural e social construído nas práticas, nas festas, nos

contos, nas rodas de conversa, no folclore e no trabalho em família. Nesse caso, o

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dito e o não dito possuem força para representar o tipo de relação que essa

comunidade tem com o ambiente, nem sempre agressiva, nem sempre com fundo

ecológico, mas em todo caso respeitosa, por reconhecer que a sobrevivência na

comunidade está, de maneira inseparável, conectada aos recursos naturais

disponíveis e aos saberes oriundos da relação homem/ambiente.

Foram muitas as caminhadas que fiz durante as interações junto aos

moradores da comunidade, e nos trajetos que tive oportunidade de fazer, não

faltaram diálogos, observações e reflexões quanto aos diversos problemas

enfrentados pelas famílias erradicadas nesse espaço amazônico. Problemas de

ordem econômica, social e política, que acabam por influenciar o convívio com o

meio ambiente.

Lembro-me especialmente de um encontro em que tive a oportunidade de

conversar com três indivíduos pertencentes ao local. As falas que apresento são

uníssonas no sentido de que a comunidade está mudando, pois está sofrendo com a

ausência de políticas públicas que oportunizem ao homem do campo viver em

plenitude no seu habitat, não de forma natural, como gostariam alguns defensores

da natureza intocada, mas como sujeito social, político e cultural que depende do

ambiente para viver.

O cenário em que o diálogo acontece, é diferente do apresentado

anteriormente, haja vista, que estávamos em pleno inverno, e, neste caso, o lago

toma conta do campo, formando um verdadeiro “oceano de água doce”, uma

paisagem fluvial caracterizada pelo trânsito constante de embarcações e de uma

fauna específica para a época, sendo comum principalmente os mergulhões que

ousam voos rasantes e mergulhos certeiros em busca das “iguarias” oferecidas pelo

lago. Nas partes mais rasas os búfalos se banham, resfriando o corpo das altas

temperaturas do norte do Brasil e também aproveitam para amenizar os constantes

ataques de insetos presentes nesse período de “águas grandes”.

Vale ressaltar, que nesse período a dinâmica da comunidade se modifica em

suas relações, principalmente por conta da forma de deslocamento fluvial que exige

o uso de voadeiras e também de embarcações movidas a motores “rabeta” e a força

humana por meio de remos e varejões os quais exigem por parte do barqueiro

extrema coordenação e força, além de profundo conhecimento da navegação local.

O encontro acontece em um retorno de uma visita que fiz a Escola de São

Miguel, onde acabara de ter uma conversa inicial com a diretora e os docentes sobre

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a intenção de pesquisa. Transitávamos por um trecho não tão profundo do lago,

ainda próximo a escola, quando cruzamos com duas embarcações e resolvemos

parar a fim de ouvir um pouco sobre as histórias produzidas e reproduzidas no lugar,

e, sobretudo, aprender sobre a cultura, hábitos e costumes que se mostravam em

cada ponto do cenário dos campos inundáveis do Amapá. Refletíamos sobre a

política local, oportunidades de emprego, mudanças ambientais acontecidas nos

últimos anos e no quanto isso afetava as condições e experiências da vida cotidiana.

Destaco falas e argumentos produzidos na conversa, os quais foram registrados e

organizados em três categorias/eixos extraídos do próprio contexto em que o diálogo

foi realizado: políticas locais, alterações ambientais e convivência homem/ambiente.

5.1.1 Sobre políticas locais

A conversa inicia com a reclamação de um morador sobre um furto de gado

acontecido recentemente em suas terras, segundo ele, levaram quatro vacas

mansas de leite as quais não tinham preço, ou pelo menos não havia como

mensurar o valor de cada uma, considerando que serviam ao sustento de sua

família: esposa, filhos e netos. O diálogo prossegue sendo abordado temas como

saúde, educação, trabalho e os impactos ambientais no âmbito da comunidade.

Argumentavam que os políticos, não aparecem no local nem mesmo em

época de eleição com medo da cobrança dos moradores, já que as condições

básicas para oferta dos direitos sociais, diga-se de passagem, descritos no art. 6º da

Constituição Federal (BRASIL, 1988), são as mais precárias possíveis: ausência de

posto de saúde (somente existe um prédio abandonado em avançado estado de

deterioração), escola funcionando com extrema carência de recursos, ausência de

políticas que gerem emprego e renda no próprio local o que deduzo serem causas

potenciais de uma relação desarmônica com o ambiente, pois, logicamente e com

razão de sobra, a sobrevivência das famílias passa a ser a prioridade. Na intenção

de colocar em evidência as vozes dos informantes, apresento trechos de suas falas

em relação às políticas locais:

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“Deveriam reunir todos os criadores e pescadores. Pra ter o equilíbrio teria

que ter o apoio do governo, porque o governo tem que ter uma assistência pro

pescador e pro próprio criador também” (Sr. João)

“Os políticos têm que olhar mais pra cá, não tem um posto de saúde aqui na

comunidade e o roubo de gado é muito grande, sou criador de gado, faço queijo e

vendo, mas desse jeito estou tendo prejuízo” (Sr. Jardel)

“O governo promove uma perseguição ao criador de búfalo, mas parte da

comunidade sobrevive dessa criação e foi o Estado que anos atrás possibilitou a

compra de matrizes e incentivou a criação de búfalos”. (Sr. Mário)

“Os políticos nem aparecem aqui, então o que a gente sabe fazer é pescar, e é isso

que eu faço coma ajuda dos meus filhos” (Sr. Olavo)

Refletindo sobre esse tópico, passo a entender que as poucas ações estatais

que se apresentam no espaço comunitário, não são realmente políticas públicas,

são em verdade, aplicações locais de programas estabelecidos pelo governo federal

a exemplo do programa luz para viver melhor e seguro defeso para os pescadores.

Cabe destacar, que o ente federal desconhece as diversas realidades vividas nas

comunidades, e que, portanto torna-se incompetente no sentido de estabelecer

ações que atendam as necessidades locais, ficando no âmbito das generalidades e

universalidades. Evidentemente não acredito em soluções gerais, justamente pela

impossibilidade de se conhecer a diversidade de problemas, culturas e

conhecimentos construídos pelas relações vividas entre homens e natureza em cada

comunidade desse país. Por esse motivo, entendo que as políticas, sejam lá quais

forem ou em que áreas forem, devem, sobretudo nascer das práticas locais, com

todas as suas peculiaridades e subjetividades que só dizem respeito àquele contexto

social.

Fazendo uma análise sobre os efeitos nefastos das políticas de implantação

de parques e reservas nacionais sobre as populações tradicionais, Pimbert e Pretty

(2000, p. 184) dizem que:

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Falta de segurança em sua forma de vida enfraquece os esforços para

conservação, uma vez que a pobreza, a degradação ambiental e os

conflitos crescem em zonas contíguas aos parques nacionais e reservas

naturais. Na verdade, a degradação se torna mais provável quando as

comunidades locais são excluídas.

Com base nas informações apresentadas faço a seguinte indagação: O que

nos dizem as populações tradicionais?

Talvez essa pergunta fosse a primeira a ser feita, para assim pensarmos em

uma política ambiental séria e que atenda as necessidades das pessoas e não

somente aos interesses particulares de grupos empresariais que sob o “manto” de

protetores do meio ambiente, encurralam as populações locais em um ciclo de

pobreza e degradação humana, e, principalmente se estamos tomando como

pressuposto a premissa de que homem e natureza têm caminhado juntos ao longo

de toda a história, sendo no mínimo, contraditório pensar em conservação ambiental

sem levar em consideração o fator humano.

Tratando dos efeitos nocivos da economia de mercado, Diegues (2000a, p.

97) alerta que:

[...] a pauperização dessas populações tradicionais como fruto desses processos, e muitas vezes a miséria extrema, associada à perda de direitos históricos sobre áreas em que viviam, tem levado muitas comunidades de moradores a sobre-explotar os recursos naturais.

Afirmo que, obviamente, nem todas as práticas das comunidades locais,

acontecem de forma harmoniosa com a natureza, pois nem sempre é assim que

funciona esse processo relacional e complexo, mas, creio que boa parte do percurso

de degradação ambiental esteja acompanhado da ausência de políticas que

propiciem uma relação vantajosa para seres humanos e ambiente. Arrisco-me a

dizer que esta ausência de políticas acaba por estimular as comunidades locais ao

desenvolvimento de práticas danosas não só as espécies da fauna e da flora

presentes nesse espaço, como também, das próprias formas de sobreviver na

região, já que ficam em uma situação vulnerável, a qual permite a ação de

oportunistas, mercenários que veem a natureza como comércio em um mercado

lucrativo e nocivo às pessoas que mais dependem desse bioma. Estes se

aproveitam do conhecimento das populações tradicionais e intensificam a

exploração do que chamam de recursos naturais, causando prejuízos de grande

monta para os habitantes das comunidades.

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Não tenho dúvida que a valorização dos conhecimentos oriundos do fazer

cotidiano, passa pelo estabelecimento de políticas que tenham como foco os

saberes produzidos nas relações dos sujeitos que efetivamente vivem na Amazônia

e que por certo dependem desse espaço ambiental e cultural para sua

sobrevivência. Importante ficar claro que não estou partindo em defesa de uma

suposta validação científica para os saberes locais, o que enfatizo é a necessidade

de se entender os variados elementos e saberes componentes desse contexto e a

partir daí a construção de condições institucionais para a sustentabilidade local.

5.1.2 Sobre alterações ambientais

O ambiente de São Miguel foi bem alterado nas duas últimas décadas. As

mudanças não se restringem aos elementos paisagísticos, e sim, são sentidos em

outras dimensões como a quantidade e qualidade de espécies presentes na fauna e

na flora vivente nos campos, florestas, rios e lagos da comunidade.

Obviamente, tal fator não é fruto de uma ação isolada dos sujeitos locais,

tendo em vista que a alteração do ambiente vem acontecendo por um conjunto de

condições políticas, econômicas e sociais que durante a história recente dessa parte

da Amazônia, vem estabelecendo o tom da relação homem/natureza, editando

nesse contexto formas de convívio nem sempre respeitosas com o ambiente e muito

menos com os sujeitos que fazem parte da comunidade. Com efeito, penso ser

necessário superar a ideia clássica de que toda ação do homem sobre a natureza

configura-se como inimiga do meio ambiente (GÓMEZ-POMPA; KAUS, 2000), aliás,

esse é um discurso muito difundido pela mídia de maneira geral, e por grupos

vinculados a ideia de natureza intocada e intocável, que terminam por influenciar

concepções até certo ponto equivocadas de que o homem, em seu sentido mais

geral, é inimigo da natureza, e, portanto deve ficar fora de tudo que se refere ao

meio ambiente.

Esse pressuposto desqualifica o homem do campo, as populações

tradicionais e os saberes por eles produzidos, desabilitando-os ao convívio com o

seu habitat, pois, pressupõe-se que suas práticas violam os “santuários ecológicos”

construídos e estabelecidos no imaginário dos que se julgam os “guardiões da

natureza”. O problema com essa concepção, dentre outros, é que parece

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desconhecer, ou pelo menos seus adeptos não querem enxergar que essas

populações, comunidades convivem há muito tempo com o meio ambiente e

entendem a importância não de mantê-lo intocado, mas de retirar apenas o

necessário para sobrevivência demonstrando um equilíbrio efetivo no que concerne

à conservação do bioma.

O desequilíbrio acontece quando forças externas, principalmente oriundas

dos interesses do capital, passam a agir nas comunidades, ou pela ausência de

políticas públicas eficazes no sentido de garantir a sobrevivência do homem do

campo. Dentro dessa lógica, Loureiro e Layrargues (2013, p. 58) asseguram,

[...] que na sociedade contemporânea globalizada, há uma expansão contínua do mercado de matéria-prima, para suprir a demanda por mercadorias, acompanhada da precarização do trabalho, buscando assegurar a margem de lucro necessária à acumulação e à reprodução ampliada do capital.

Em coerência com o que venho dizendo narrativa e analiticamente nesse

trabalho, me proponho a imergir profundamente nas práticas ambientais locais,

convivendo, observando, anotando e interpretando ações, falas e imagens

expressadas no contexto onde as relações são vividas. À vista disso, tornou-se

possível apresentar os dados construídos em campo num texto com potencial para

demonstrar as interações e os impactos sofridos pelo meio ambiente, o que se faz

nas vozes dos participantes da pesquisa.

“Mudou muito, os campos secaram. Na minha época de criança, dali da

redenção pra cá, no verão a gente passava por dentro desse aningal. Aqui tinha um

atoleiro em pleno verão (apontando para uma parte só de água no inverno). A gente

tinha que estivar aningueira para passar. Aí com o passar do tempo secou e em

1983 aterraram o rio lá, e começou entrar carro, aí tinha ano que entrava e tinha ano

que não entrava. Agora tá com mais ou menos cinco anos que entra carro direto no

verão”. (Sr. Jardel)

“Antes a gente sentava uma rede, pegava peixe para sustentar duas famílias.

Serviço em quase todo canto tinha, hoje tem dificuldade, porque eles não sabe

administrar o país, atinge o Brasil todo, a crise não foi só lá fora, atingiu pescador,

agricultor, pecuarista, foi geral, hoje tá mais difícil”. (Sr. João)

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“Acho que a natureza com a interferência ou não do homem vai se

transformar. O problema é que estamos sofrendo com essas transformações. Vou te

dar um exemplo: da minha época pra cá já mudou muita coisa, Antes era muito farto

tinha grande quantidade de pirarucu, jacaré, tracajá e outras espécies, agora está

muito escasso”. (Sr. Mário)

“O peixe tá acabando, cada vez nós têm que ir mais longe para conseguir

pescar alguma coisa, mesmo quando tá cheio o lago [...] aqui perto já não tem muito

peixe grande, mesmo os pequenos tá difícil de pescar, são muitas redes” (Sr. Olavo)

A história contada por meio dos relatos de quem vive a realidade amazônica,

aponta para caminhos que não se acomodam na “ordem natural” das coisas, pelo

contrário, são observações e saberes construídos na necessidade de sobrevivência,

no sustento da família, na relação com a natureza e o meio ambiente, o que se faz

não por simples contemplação de belezas naturais, mas sim, por considerar que

conservar o ambiente está estritamente ligado ao fortalecimento dos aspectos

sociais, políticos e culturais na comunidade. Nessa linha de raciocínio, e em defesa

de uma ecologia política, Loureiro e Layrargues (2013, p. 4), lecionam que:

Na ecologia política a natureza é vista não somente como fonte de recursos, mas como ontologicamente prioritária para a existência humana, aquilo que nos antecede e que de nós independe, cuja dinâmica ecológica, mesmo que por nós mediada e transformada, precisa ser reconhecida e respeitada [...].

Os sujeitos deixam claro em suas falas que possuem a noção exata da

importância de manter uma relação harmônica com o ambiente, visto admitirem que

as mudanças de caráter predatório ocorridas nos últimos anos têm prejudicado os

modos de vida na comunidade, afetando aspectos como alimentação, trabalho e

saúde dos moradores, já que muitas espécies da fauna e da flora diminuíram ou

despareceram dos lagos, rios e florestas, ocasionando um severo desequilíbrio e

certo saudosismo sobre o que antes era encontrado em abundância na comunidade.

Os fatores apontados como cruciais para a alteração da paisagem e

desparecimento de espécies baseiam-se principalmente em três pontos: Ausência

de políticas públicas das mais diversas ordens, sobrevivência do homem local e

ação de agentes externos.

Durante o desenvolvimento dessa pesquisa, foi possível observar a ausência

de políticas ambientais que envolvam o homem do campo, que estejam voltadas

para garantia de direitos sociais mínimos. Definitivamente tal garantia não parece

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estar na ordem de prioridades do Estado, considerando o abandono suportado por

quem vive na comunidade.

Com o abandono estatal a sobrevivência no âmbito de São Miguel tornou-se

bem mais penosa do que deveria ser. Digo isso, pela tristeza com que os

informantes falam da abundância existente no passado e do que necessitam fazer

atualmente para garantir o sustento de suas famílias, por vezes adotando práticas

predatórias ao meio ambiente, o que por certo não fazem com orgulho. Fazem por

absoluta necessidade.

Quanto à ação de agentes externos, refiro-me principalmente aqueles que se

valem dos “recursos naturais”, exploração em larga escala para revenda em centros

urbanos, é o caso, por exemplo, dos denominados “geleiros”. Esses agentes

estimulam a pesca em larga escala, e em períodos não propícios a pesca (período

de defeso), compram o pescado por valores mínimos e revendem a preços bem

mais atraentes, principalmente na capital Macapá.

A comunidade precisa ter seus valores e saberes respeitados, não de forma

exótica e demagógica como receitam os discursos inflamados de grupos políticos

com interesses eleitoreiros, pois o que está em jogo não é um simples elemento

paisagístico, é sobretudo, um terreno cultural, formado por sujeitos que entendem a

importância da conservação do meio ambiente para sua sobrevivência enquanto

grupo local, tradicional.

5.1.3 Sobre a convivência com o meio ambiente

Proponho neste item uma indagação introdutória, com o propósito de que

sirva de parâmetro para as reflexões, ideias e afirmações que deverão constar no

decorrer do texto: O que, de fato, significa conviver em harmonia com o ambiente?

Inicio com essa pergunta por ter ouvido esse discurso de convivência

harmônica em diversas ocasiões na sociedade contemporânea, seja pelos meios de

comunicação, seja nas escolas onde tive oportunidade de atuar enquanto educador

ou mesmo nas falas de alguns políticos empunhando bandeiras de proteção à

natureza e de quebra anunciando destinos catastróficos e apocalípticos caso não

haja adesão ao seu projeto político de preservação ambiental.

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Então para proteger o ambiente, em nome de uma harmonia com a natureza,

há necessidade de anulação do homem? A natureza tem que ser mesmo algo

intocável, sagrado, como uma peça de museu? Ou seria uma obra de arte altamente

elitizada, inacessível aos não iniciados na arte de preservar?

A pertinência de minhas indagações reside no fato de que grande parte das

políticas e estudos sobre meio ambiente, preservação, conservação e

sustentabilidade, partem de agentes externos ao ambiente a ser "preservado”,

“conservado", assim a ideia que sustenta a ação é de que os sujeitos locais são

nocivos ao ambiente, e claro que a partir dessa visão, são estabelecidas as formas

designadas como corretas de convívio com o meio, obviamente excluindo o homem

local enquanto parte do contexto. Analisando o cenário, tomando como base as

ideias de Leff a Ingold, Cooper e Anjos (2014, p. 138) elucidam que:

Temos tido cada vez mais contato com informações díspares sobre o que pode ser definido como ambiente. Tal conceito, muitas vezes midiaticamente criado, tem se revelado a nós através de imagens e paisagens, da fauna e dos povos de todo o planeta, em inúmeros casos, com o acompanhamento de fatos e números montados para oferecer uma atraente, porém distante e impessoal mensagem. Estamos demasiadamente acostumados com essa forma de pensar sobre o ambiente que nos esquecemos de que este é, em primeiro lugar, o mundo em que vivemos e não o mundo que olhamos, observamos.

O olhar sobre a natureza precisa respeitar as necessidades humanas, pelo

menos é assim que penso enquanto alguém que vive na Amazônia e que busca

entender o que se passa na comunidade de são Miguel do Flexal. Proteger a

natureza sem levar em consideração o ser humano e suas necessidades, torna-se

algo extremista que leva a degradação de ambos, tanto do homem quanto da

natureza a qual faz parte. Nesse sentido, entender as ações que as populações

tradicionais vem praticando há séculos em determinadas áreas, configura-se como

aspecto basilar no que concerne a harmonia homem/natureza, principalmente se

partirmos da premissa de que a natureza intocada é um mito (DIEGUES, 2000a) que

pouco acrescenta na construção de uma ecologia com princípios de justiça social e

de uma natureza que se transforma e transforma o homem e suas ações. Tomando

como fundamento as ideias de Geertz (1997), considero o bom senso pressuposto

elementar para o desenvolvimento de práticas que não sejam nocivas ao ambiente.

Com esse objetivo, vejamos o que dizem os informantes:

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“Eles trabalham muito com o gado e a gente entende que o búfalo tá

acabando com o rio, abrindo outras valas, aí o rio escoa e pra comunidade está

sendo ruim, principalmente para os alunos da escola. Na época que seca bastante,

ficam algumas valas por onde os búfalos passam e vai escoando a água, por onde

poderia passar com as crianças agora fica seco. As crianças têm que esperar secar

totalmente para não correr risco de serem ferradas por arraia”. (Professora Helena)

“É questão de conscientizar a população, não só aos alunos, e sim, a

comunidade como um todo, se a gente não fizer desse jeito não tem como mudar o

que tá acontecendo aqui na comunidade de São Miguel, só que a situação é muito

difícil de ser mudada”. (Professora Bena)

“Essa época para mim é complicado porque eu não ando de animal. E

quando tá secando é pior porque tem que andar um bom pedaço pra pegar a canoa,

passei 32 dias sem poder sair daqui. Fiquei ilhada sem poder sair e isso tem a ver

como o meio ambiente”. (Professora Edileuza)

“Meu pai zurucando (movimento com uma vara ou outro instrumento em

direção ao fundo do lago, com a intenção de tocar casco de quelônios) aqui nessa

região acertava casco de tracajá, pegava só o que era necessário para alimentação,

ele era muito assim, não retirava mais do que ele precisava, lembro que ele ficou

muito aborrecido porque contou para algumas pessoas sobre esse local, aí foram lá

e acabaram, estragaram” (Sr. Mário)

“Precisamos aprender a conviver com a natureza como ela nos ensina,

porque não tem coisa mais importante de que a própria natureza, pois ela nos diz

pra onde a água deve correr. Devemos aproveitar o que a natureza tem a oferecer, e

a gente vai se adaptando as condições sem agredir. Sem aproveitar a natureza o

homem do campo vai perder toda a vontade de viver no próprio campo, porque sem

ajuda da natureza é quase impossível a sobrevivência no campo, não tem os

mesmos benefícios da cidade ” (Sr. Mário)

“Gente da própria comunidade e de todo o município, que são os que através

do fogo destroem a floresta, destroem os próprios locais, que as tracajás, por

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exemplo, se acomodam no inverno. Tacam fogo no aningal, aí acaba. Açaí no tempo

que eu cheguei pra cá tinha desconforme, hoje em dia a gente já encontra

dificuldade pra. conseguir esse alimento por causa do homem tá destruindo a

floresta”. (Sr. João)

“O pessoal foi botando fogo. Na época a gente pensava assim né, abrir

campo pra criar gado, mas só que o barranco foi se acumulando e fazendo uma

estufa. As queimadas acabaram com um bocado dos aningais, e o gado búfalo

também aumentou, acho que isso tá fazendo secar o lago” (Sr. Jardel)

Os saberes compartilhados pelos moradores da comunidade e também por

integrantes da escola: diretora, professores e alunos, demonstram preocupação com

o meio ambiente em uma perspectiva global e principalmente local, pois deixam

claro em suas falas os impactos que este vem sofrendo, de maneira mais intensa,

nos últimos anos, principalmente na fauna e na flora presentes em São Miguel. Vale

registrar que tais impactos afetam de forma determinante as maneiras de viver da e

na comunidade, considerando que as relações estabelecidas entre moradores e seu

habitat, passam por um processo de transformação, que, em regra, constituem-se

de forma muito mais predatória de que em outras épocas,

Conviver harmonicamente é algo que requer, antes de tudo, respeito aos

seres que habitam o local, sejam eles naturais ou sobre naturais. Refiro-me as

plantas e animais, mas não somente, falo também dos seres que povoam o

imaginário das famílias da comunidade, suas crenças, seus contos, suas festas, seu

folclore e fundamentalmente seus elementos culturais, presentes no dia a dia, no

que denomino nesse trabalho, tomando como referência Guarim (2000) de

experiência de vida.

A partir das experiências de vida, o homem local torna-se responsável pela

conservação do seu espaço, talvez não da forma como alguns ambientalistas

presumem ser a forma correta, redentora dos males do mundo, mas sim,

sustentados em suas práticas de vida cotidiana, tirando da natureza o suficiente

para o seu sustento e de sua família, e quem sabe, fomentar pequenas relações de

comércio.

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5.1.4 Sobre Educação Ambiental

A compreensão dos elementos que fazem parte do contexto ambiental é de

suma importância para a sustentação da comunidade, configura-se como um tipo de

saber presente no dia a dia dos indivíduos, porém, distante do ambiente escolar

(ponto discutido detalhadamente em itens posteriores). No campo da vida, as

famílias de São Miguel, retiram da natureza o que é necessário à sobrevivência e

entendem que conservá-la deve ser responsabilidade de todos, inclusive dos

agentes políticos, que segundo suas falas e percepções, encontram-se ausentes da

realidade da comunidade.

O processo de Educação Ambiental está presente na prática, na convivência

com a natureza, no fazer cotidiano, permeado por uma relação dialógica entre os

que de fato dependem do local. Diferentemente do que se possa imaginar em uma

visão romântica de proteção a natureza, o processo acontece de maneira

consciente, intencional, observando os elementos sociais, políticos e culturais que

envolvem o contexto amazônico. Considerando esse aspecto Gómez-Pompa e Kaus

(2000, p. 140) advertem que:

Às vezes esquecemos que a experiência muitas vezes é a melhor professora e damos maior importância aos títulos que vêm antes ou depois do nome da pessoa, ao jeito com que fala e ao material que escreve. Reagindo assim, criamos a barreira da educação formalmente estruturada e da linguagem, imposta às populações rurais.

As percepções de Conservação e Educação Ambiental, evidentemente sem

preocupação com construções teóricas sofisticadas, são princípios que norteiam as

práticas cotidianas da vida em comunidade, estão presentes no trabalho, nas festas,

no folclore e no entendimento dos ciclos naturais, mas infelizmente distantes da

escola e consequentemente da educação formal. Embora nas vozes dos que

trabalham na escola se observe a noção de importância do meio ambiente, o que se

vê no fazer escolar é um efetivo distanciamento e separação de conteúdos. Nesse

caso os conteúdos dos livros didáticos são sobrepostos e supervalorizados em

relação aos conteúdos da vida dos alunos e dos próprios professores atuantes na

escola. Partindo desse prisma, Guarim (2005) afirma que a escola do meio rural,

seguindo a cartilha oficial, promove uma desvalorização dos saberes locais,

estimulando um processo de enaltecimento do estilo de vida urbano em detrimento

do convívio local. Na busca de entender os meandros dessa relação até certo ponto

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conflituosa no que diz respeito à Educação Ambiental, torna-se salutar apresentar e

analisar o que dizem os participantes da pesquisa.

“Educação ambiental é saber conviver com a natureza sem destruir, e passar

esses conhecimentos para os mais jovens em um processo de respeito ao próximo e

ao ambiente”. (Sr. Mário)

“Tento mostrar pros meus filhos e meus netos como fazer pra caçar e pescar

sem acabar o que tem aqui” (Sr. Jardel)

“A gente vive do que tem aqui, os mais novos têm que manter, só sentar rede

pensando que não vai acabar [..].fica difícil, então tento ensinar o que eu sei” (Sr.

Olavo)

“Meu filho me acompanha no que eu faço aqui, ensino pra ele como tratar

com o gado, pescar e caçar, mas cada vez tá ficando mais difícil, muita gente de

fora pescando aqui” (Sr. João)

“Educação ambiental... é uma maneira de nós educadores passarmos para os

alunos, sobre o que não se pode fazer no ambiente em que vivemos”

(Professora Helena)

Em primeiro lugar vem a questão do ambiente, ter zelo pelo ambiente que a

gente vive, não só a população, o município tem que zelar pelo ambiente, porque vai

chegar um dia em vai ficar complicado. Vejo que a gente tem que conscientizar

nossos alunos em relação ao meio ambiente. Aqui na comunidade de são Miguel é

precário. Uma escola muito bonita mas a educação ambiental deixa a desejar.

(Professora Edileuza)

“É tudo quilo que nos rodeia, não é só o campo, é tudo, é a sala de aula, os

animais, os seres que estão ao nosso lado, os objetos, para mim é tudo isso”

(Professora Bena)

“Na verdade a gente tem aqui muita coisa para aproveitar como Educação

Ambiental, mas só que a gente assim é muito reduzido, as vezes falta incentivo, falta

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projeto, falta material pra gente dar....sempre tem que ter um cabeça, um chefe para

conduzir o processo e fazer um projeto sobre educação ambiental”.

(Professora Bena)

Valendo-me de pressupostos apresentados por Diegues (2000a) vejo como

interessante, esclarecer que fora do contexto local, principalmente em um plano

teórico, as concepções subjacentes quando se fala em Meio Ambiente e Educação

Ambiental, ainda possuem muito da visão de um mundo natural intocado pelo

homem, ou seja, para que a natureza continue preservada, dentro dessa visão, o

sujeito humano precisa ser retirado do ambiente. Neste caso, os defensores dessa

ideia parecem desconhecer, ou simplesmente desconsiderar o conhecimento das

populações tradicionais, e a ciência implícita em seus fazeres, que demonstram

conhecimento profundo dos diversos ciclos naturais controlados ou não pela ação do

homem em convívio com o ambiente natural.

No que concerne ao papel da escola no processo de Educação Ambiental,

acredito ser importante lembrar o que dizem Pereira e Guarim Neto (2009, p. 38)

acerca da matéria, os autores enunciam que:

Hoje, a Educação Ambiental caracteriza-se como instrumento que se propõe a contribuir na formação de cidadãos críticos, preocupados com a realidade e inseridos num processo contínuo de aprendizagem dentro da filosofia do trabalho participativo. Suas ações não devem ficar restritas à transmissão de conhecimento, mas também permear a cultura, inserindo-se no contexto social a partir da discussão e avaliação dos problemas das comunidades e oferecendo subsídios para solucioná-los.

A escola, tratando de Educação Ambiental ou qualquer outro tema, necessita

dialogar com quem está inserido no contexto, com quem efetivamente vive a

realidade, revisitar os saberes muitas vezes considerados marginais e obviamente

não condizentes com o que está prescrito nos programas oficiais. Com esse modo

de reconhecer as relações escolares e ambientais, posiciono-me junto aos que

entendem a educação a partir de um processo político, forjado nos saberes

construídos na multidimensionalidade do cotidiano, pois se a proposta é “que a

produção material e social da vida se dê em outras bases ontoepistemológicas não

podemos prescindir de uma educação ambiental crítica que contribua para

transformar as relações sociais de produção em direção a um outro projeto

civilizatório.” (TREIN, 2012, p. 314)

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Em uma perspectiva complexa e transformadora, resgatar os conhecimentos

produzidos no âmbito da vida cotidiana para dentro do ambiente escolar, torna-se

tarefa essencial para construção de um projeto político/ambiental/social/cultural que

dê conta de subverter a ordem estabelecida institucionalmente pelo discurso

educacional oficial.

5.2 Ordem e desordem no ensino de ciências: a complexidade da Educação

Ambiental

Antes de analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas pelos docentes

atuantes na escola de São Miguel, assim como, o ensino de ciências aplicado nesse

espaço de aprendizagem, torna-se necessário, para melhor entendimento de suas

peculiaridades, lançar um olhar sobre a conjuntura que envolve tais procedimentos,

a propósito, determinantes no que concerne a pedagogia vigente e as formas de

ensinar, aprender e produzir conhecimentos dentro e fora da sala de aula.

Inicialmente, evidenciam-se as precárias condições estruturais, físicas do

prédio da escola, somando-se a isso, a quantidade de insumos e recursos

financeiros insuficientes para dar conta das demandas apresentadas pela

comunidade escolar, o que por certo, não difere de muitas outras escolas da

Amazônia brasileira. Segundo relato da Diretora:

“A escola recebe apenas, por mês, R$ 380,00 (manutenção), R$ 211,00

(merenda), mas desse dinheiro de merenda, só pode usar 70%, R$ 147,70. O

restante é da agricultura familiar e não usamos, acaba voltando, já que não temos

pessoas aqui para fazer este tipo de compra, então não compramos”

“A direção da escola está sendo um longo e sofrido aprendizado, tenho que

matar um leão por dia, aliás, mato aranhas, baratas, só não mato cobras”

“Recebo menos como gestora do que se tivesse somente como professora.

No cargo, perco a regência de classe, dou aula e ainda tenho que fazer a merenda

(risos)”.

Embora não sejam muitos alunos em atividade, são 24 no total, distribuídos

em classes multisseriadas do 1º ao 5º ano, há necessidade de reconhecer as muitas

e sérias limitações enfrentadas por diretora, professores e alunos. Nessa

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perspectiva, entendo como apropriado, para fundamentar o cenário apresentado, um

pensamento de Freire (1996, p. 66) no sentido de que:

O professor tem o dever de dar suas aulas, de realizar sua tarefa docente. Para isso, precisa de condições favoráveis, higiênicas, espaciais, estéticas, sem as quais se move menos eficazmente no espaço pedagógico. Às vezes, as condições são de tal maneira perversas que nem se move. O desrespeito a este espaço é uma ofensa aos educandos, aos educadores e à prática pedagógica.

Esse parece realmente ser o cenário mais acertado para empregar essa ideia,

estendendo o sentido da premissa a toda comunidade escolar, considerando que

sofrem um abandono estatal e político, que atinge o processo formativo e a

possibilidade de desenvolver práticas pedagógicas talvez mais adequadas ao

contexto. Sempre ouvi dizer que ser professor não é tarefa fácil e realmente não é,

imagina então desempenhar este ofício em um lugar tão rico e ao mesmo tempo tão

desprovido dos recursos elementares para o funcionamento de uma instituição

educacional.

O primeiro contato que tive, em nível formal, aconteceu com a diretora da

escola, professora Helena, a qual oportunizou o início e prosseguimento da

investigação, sendo a ela explicado o projeto de pesquisa e a importância desse

trabalho para a comunidade, assim como, para o conhecimento científico. O tom da

conversa não seguiu para a formalidade, facilitando o entendimento e o

envolvimento com os problemas enfrentados por aqueles que fazem a educação na

localidade, principalmente os concernentes aos recursos disponíveis para o

desenvolvimento de uma educação ambiental, politizada e cidadã, com potencial

para transformar realidades.

Os dados, que em verdade são construções históricas, sociais e culturais de

uma comunidade, adiante apresentados, são reflexos de observações e análises de

práticas e falas dos informantes diretamente de seus contextos educativos. Vejamos

o que esses agentes nos dizem a partir dos questionamentos realizados durante a

pesquisa.

Enunciando sua visão sobre a comunidade de São Miguel, a diretora da

escola se pronunciou da seguinte maneira:

“É formada por gente humilde, em geral pescadores, que vivem faz muito

tempo na comunidade, possuem raízes aqui”.

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“Tem também os criadores de gado, donos de grandes terrenos, eles criam

búfalos e pra mim isso tem sido prejudicial ao meio ambiente, pois os búfalos

formam grandes valas fazendo secar muito rápido”

“E mais, eles poderiam fazer outra coisa, tipo agricultura, possuem terrenos

imensos aqui, mais eles não tem costume de fazer isso e nem trabalhar somente

com bovino. Aí eles pegam aqueles gados que estão lá [...] perdidos lá no que eles

chamam de brabeza e vão criando. Eu particularmente não acho interessante”

A fala deixa evidente a existência de problemas sociais e ambientais, os quais

estão interligados por uma teia de práticas e conhecimentos que se sustentam por

meio das condições e experiências de vida convergentes e divergentes nesse

espaço intersubjetivo que é a Amazônia amapaense, onde os indivíduos necessitam

sobreviver, viver e conviver com o meio ambiente num cambiante processo de

ensino/aprendizagem. Em proximidade com esse pressuposto, e em defesa do

saber tradicional pantaneiro Guarim Neto (2006, p. 74) lembra que:

O momento da pesca, da preparação de artefatos, das caminhadas nas roças e pastos, do cultivo de subsistência, da condução da boiada e outros, são ricos no repasse do conhecimento, pautado na forte oralidade que permeia essas ações. O aproveitamento desses elementos em uma proposta educativa, tendo como instrumento a Educação Ambiental, deve prever a sua introdução gradativa no seio da formalidade do saber escolarizado.

O contexto descrito tem a intenção de funcionar como um breve preâmbulo

para o entendimento das práticas pedagógicas desenvolvidas no âmbito escolar,

afinal, para entendê-las de maneira coerente, torna-se necessário um mergulho nos

condicionantes históricos que regem as relações locais, e, nessa perspectiva, a

escola configura-se como uma das engrenagens sociais que movimentam a

comunidade e que provavelmente fazem com que ela se constitua de uma

determinada maneira, refletindo-se na educação formal e informal (ARANHA, 2006),

no trabalho, no convívio social, familiar e nas tradições culturais do povo que ali vive,

em um intenso processo produtivo caracterizado por peculiaridades que ”combinam

formas materiais e simbólicas com as quais os grupos humanos agem sobre o

território” (CASTRO, 2000, p. 167).

Destaque especial faço para o que a informante chamou de “brabeza”, neste

caso, referindo-se a Reserva Biológica Lago Piratuba, onde muitos jovens arriscam

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a vida em busca de laçar bubalinos que se encontram em estado selvagem dentro

da reserva e que por vezes torna-se a opção de sobrevivência, neste caso uma

atividade extremamente perigosa e que exige habilidades voltadas ao trato com o

gado e uma resistência diferenciada às intempéries naturais.

Efetivamente não existe fórmula para educar e certamente muito menos para

se construir cidadania, visão científica e práticas pedagógicas de cunho ambiental,

muito embora, existam, ainda nos dias atuais, aqueles que arduamente se debruçam

na tarefa de criar/inventar/descobrir/aplicar/replicar procedimentos metodológicos

que por vezes se tornam muito mais âncoras pedagógicas, terrenos sossegados de

conteúdos do que propriamente espaços e possibilidades de diálogo e construção

do conhecimento. Tratando sobre a construção do conhecimento científico na

escola, Trivelato e Silva (2013, p. 9) ressaltam que:

[...] quando pequenas, ainda na fase pré-escolar, as crianças geralmente têm uma relação prazerosa com os conhecimentos relacionados aos fenômenos da natureza e da sociedade. Sentem satisfação em formular questões sobre o assunto, fazer explorações e descobertas, levantar hipóteses e tentar explicar o mundo a sua volta. No entanto o que se percebe é que, no decorrer da escolaridade, essa relação prazerosa com o conhecimento muitas vezes vai se perdendo. Uma das tarefas do professor do Ensino Fundamental é evitar que isso aconteça, proporcionando atividades que propiciem um aprendizado prazeroso e com significado.

Aprender exige em primeiro lugar um querer aprender, sentir-se estimulado a

descobrir por meio da curiosidade as relações que dão sentido ao mundo em um

jogo que não tem ponto de partida ou de chegada, mas que está em constante

movimento, visto constituir-se na ordem e na desordem, no universal e no particular,

no acerto e no erro, naquilo que é dito e não dito, em um tecido complexo de

informações e pensamento. No que concerne a complexidade e sua relação com a

ciência e o conhecimento de modo geral, é Morin (2005), em oposição ao paradigma

simplificador adotado pela ciência moderna, quem busca esclarecer a história, ou

pelo menos trazer para o campo do debate um outro paradigma, da complexidade,

não limitado pela linearidade e disciplinarização, com potencial para interagir com a

desordem, contradição, pluralidades, com o caos. Assim o autor afirma que:

De fato, a aspiração à complexidade tende para o conhecimento multidimensional. Ela não quer dar todas as informações sobre um fenômeno estudado, mas respeitar suas diversas dimensões: assim como acabei de dizer, não devemos esquecer que o homem é um ser biológico-sociocultural, e que os fenômenos sociais são, ao mesmo tempo, econômicos, culturais, psicológicos etc. Dito isto, ao aspirar a multidimensionalidade, o pensamento complexo comporta em seu interior um princípio de incompletude e de incerteza. (MORIN, 2005, p. 177)

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Invoco a ideia do paradigma da complexidade por acreditar que o ambiente

educacional necessita ser observado e vivenciado a partir do jogo das relações e

interações que se estabelecem entre os sujeitos participantes do processo educativo

e entre estes e os objetos de estudo. Nessa perspectiva, o professor e suas práticas,

ganham papel de destaque no processo de aprendizagem, pois é ele quem,

juntamente com os alunos, deve estabelecer o que, por quê? e como algo deve ser

trabalhado em sala de aula, permitindo que os conteúdos locais sejam colocados na

ordem do dia ou dos dias, suplantando a mera utilização do livro didático como “o

instrumento didático/metodológico”. Analogamente, Lima (2009, p. 148), considera

que a ideia de “[...] complexidade se justifica pela premissa que compreende as

questões ambientais como inerentemente interdisciplinares e multidimensionais, não

sendo possível abordá-las adequadamente por olhares disciplinares e

reducionistas”.

A complexidade do ponto de vista ambiental crítico, trabalha no sentido de

produzir relações em que o sujeito cultural e histórico atua na e com a natureza em

um processo de articulação movido fundamentalmente pela necessidade de

construção de uma racionalidade ambiental com vistas à sustentabilidade dos povos

e do ambiente. (LEFF, 2000).

Sustentada em suas vivências como educadora, e obviamente em seu

repertório teórico, a gestora da escola, explica sua maneira de agir em relação aos

procedimentos pedagógicos desenvolvidos na escola de São Miguel, o que leva a

uma reflexão do que realmente é considerado importante para que os alunos

aprendam naquele contexto.

“Deixo os professores a vontade, não pego os conteúdos deles, mas é

explorado apenas o básico, pois damos atenção a língua portuguesa e matemática,

pois temos que alfabetizar esses alunos. Precisam aprender a ler e conhecer o

básico da matemática para poderem prosseguir” (Professora Helena)

Torna-se institucionalizada a receita do que deve ser aprendido, dos

conhecimentos que estão postos como prioritários, no caso Língua Portuguesa e

Matemática, pois na visão da educadora, pelo menos é o que consigo interpretar

não somente de sua fala, mas do contexto em que a conversa acontece,

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primeiramente se deve aprender números e letras, cálculos, palavras e frases e

somente a partir daí, alçar outros voos. Com essa lógica de pensamento, as

interligações, a dinamicidade e a não linearidade do conhecimento fica perdida na

preocupação em “alfabetizar”, desconhecendo-se que o processo de alfabetização

exige pluralidade de conhecimentos e fundamentalmente que existe um jogo

contextual de ensino/aprendizagem onde os conteúdos nascem de problemas reais

e saberes produzidos na vida cotidiana. Dessa forma, alfabetizar e estar alfabetizado

exige compreensão da multidimensionalidade do saber, distanciando-se da

disciplinarização exacerbada vigente no modelo educacional brasileiro.

Posicionando-se contra a visão positivista da educação e em favor de uma

concepção construída na história e na provisoriedade do conhecimento, Pozo e

Crespo (2009, p. 23) chamam atenção para o fato de que:

Um sistema educacional, mediante o estabelecimento dos conteúdos das diferentes disciplinas que compõem o currículo, tem como função formativa essencial fazer com que os futuros cidadãos interiorizem, assimilem a cultura em que vivem, em um sentido amplo, compartilhando as produções artísticas, científicas, técnicas, etc. próprias dessa cultura e compreendendo seu sentido histórico, mas, também, desenvolvendo as capacidades necessárias para acessar esses produtos culturais, desfrutar deles e, na medida do possível, renová-los. Mas essa formação cultural ocorre no marco de uma cultura da aprendizagem que evolui com a própria

sociedade.

Há necessidade de professores e alunos se aventurarem em novos

caminhos, nem sempre os mais seguros e estáveis, por vezes até escorregadios e

movediços, porém, abertos a novas trilhas e descobertas, forjadas na instabilidade

que caracteriza a vida humana e sua história. Assim, o currículo é colocado em

movimento e passa a ser terreno de contradições e tensões ambientais, políticas,

estéticas e científicas.

Muito embora acredite que a educação ao invés de uma sinfonia

perfeitamente harmônica, orquestrada, seja em verdade o encontro de dissonâncias

e improvisos que acontecem no cotidiano escolar em busca de algo inovador e

singular, penso que o educador ocupa papel de destaque nessa relação, não como

um maestro, talvez um violonista, saxofonista ou pianista em uma banda de jazz,

respeitando os espaços de cada instrumentista, mas em certos momentos

subvertendo as convenções harmônicas e musicais.

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Fazendo alusão a sua forma de trabalhar os conteúdos em sala de aula, e

com a convicção de que está fazendo o melhor possível para ensinar o que “deve

ser ensinado”, a Professora. Edileuza descreveu seu método da seguinte maneira:

“Pego o conteúdo e coloco lá. Por exemplo: seres vivos. Faço uma introdução

básica do que é ser vivo e de lá faço com que meu aluno se interesse por isso aí, e

ele vai buscar imagens pra mim. Dessa forma que eu venho trabalhando. E também

tento pegar coisas da região. Educação do campo” (Professora Edileuza)

“fizemos um peixinho em dobradura de papel. Colaram no papel e isso

chamou muito a atenção deles. Tudo que faço de diferente, chama a atenção dos

alunos e facilita a aprendizagem”.(Professora Edileuza)

A docente, dentro de suas possibilidades teóricas e formativas, estabeleceu

seu modo de ensinar, obviamente buscando a segurança dos conteúdos prescritos

no livro didático utilizado, e em um procedimento rotineiro que segundo sua lógica

de pensamento, “facilita” a tarefa diária.

Propondo um deslocamento na forma de pensar a educação e o próprio ato

de ensinar/aprender e ser professor, em especial na Amazônia, recordo do

pensamento de Chaves (2003, p. 96) quando afirma que

[...] ser professor na Amazônia pode ser punk, muito punk. Pois, tal como os ingleses, da origem do movimento punk, somos identidades marginais num mundo globalizado e por isso, na condição de marginais, não precisamos preservar, policiar nossos discursos do perigo iminente dos outros, outros discursos. Estamos na condição de inventar novos discursos, novas identidades, na posição de transgressores, de quem não se espera nada, mas de onde tudo pode vir [...]

As práticas rotineiras relatadas pela docente são produtos de um fazer

pedagógico simplificador, alheio a complexidade das relações cotidianas

experimentadas em nível local. Certamente a docente desconhece, ou não se sente

livre o suficiente para ser punk, para transgredir as normas, as verdades

convencionadas, nessa situação, em um livro didático, já que a escola não conta

nem mesmo com a vigilância e controle estatal.

Não me cabe, enquanto pesquisador, e nem tenho a pretensão de fazê-lo,

avaliar, julgar ou simplesmente apontar o “certo” e o “errado” nas práticas

desenvolvidas, porém, considero necessário refletir sobre o que está sendo feito na

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educação oferecida na comunidade e a partir disso ajudar na construção de

ferramentas que permitam compreender o ensino/aprendizagem como algo forjado

nas diversidades e singularidades da região.

Com toda certeza não seremos castigados por colocarmos a prova o que

aparentemente é verdadeiro. O aluno necessita ser desafiado a ir em busca de suas

verdades a partir de seu cotidiano, daquilo que vive em sua comunidade. Que

conhecimentos permeiam sua vida? Que ciência está subjacente às práticas

desenvolvidas pelos membros da comunidade?

Com essas indagações em mente iniciei conversa com Professora Bena a

qual tentava me iniciar “nas coisas da comunidade”, no seu funcionamento, nas suas

regras de conduta e, de maneira muito intensa, nas dificuldades para desenvolver

um trabalho “de melhor qualidade”. Em sua visão, a conjuntura que envolve a

comunidade influencia diretamente na atuação dos professores, o que certamente

não duvido, porém, admito ser possível tomar as rédeas da situação e escapar do

enquadramento imposto pela não-política local.

Sendo coerente, mas de certa forma politicamente ingênua, com seus

argumentos, Bena, de maneira muito breve narrou seus procedimentos pedagógicos

ministrando aulas de Ciências a partir do tema Meio Ambiente.

“Fazemos desenhos utilizando colagem, cartazes e o resto é conteúdo do

livro, fica mais fácil trabalhar desse jeito. As dificuldades são muito grandes aqui, aí

acabamos seguindo o livro didático”. (Professora Bena)

“Quando trabalhamos partes das plantas, cortamos as partes. Dividi em

grupos e cada um foi fazer sua planta com suas partes. Foi bem interessante,

chamou a atenção dos alunos. Despertou o interesse deles”.(Professora Bena)

De fato, ensinar “nas bandas de cá”, é algo que certamente, como se diz por

aí, não é o desejo de consumo de muitos professores, considerando as condições

institucionais e sociais precárias vigentes na região. Contudo, é algo desafiador, que

inspira coragem dos professores que atuam nessas condições, que, sobretudo

possuem plena convicção da importância do trabalho que desenvolvem em São

Miguel, daí a responsabilidade em fazer a diferença, em despertar em si e nos

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alunos o espírito curioso e crítico característico da humanidade, por vezes silenciado

e amordaçado pelos que se julgam donos do saber e do poder.

Tratando da visão crítica sobre Educação Ambiental, e da importância de

superar concepções conservadoras que invariavelmente amordaçam professores e

alunos, Lima (2009, p. 156) afirma que

com relação ao diálogo intraescolar, a EA crítica alimenta o desejo de uma renovação profunda de todo ambiente educativo a partir de seu sistema de ensino-aprendizagem, seus métodos, princípios epistemológicos e paradigmáticos, conteúdos curriculares, formas de organização e relação com o entorno. Claro que, dado ser a escola uma instituição inserida em uma estrutura social mais ampla, essas mudanças encontram obstáculos diversos como, por exemplo, a adoção de princípios interdisciplinares e de transversalidade que sejam os mais visíveis. (LIMA, 2009, p. 156)

Posiciono-me junto àqueles que ao longo de sua trajetória não se deixaram

abater pelo pessimismo de que “nada muda e nada vai mudar”, aliás, esta máxima

muito difundida na sociedade brasileira, em especial, no momento político atual em

que verdadeiras quadrilhas dilapidam o patrimônio público e subtraem direitos

trabalhistas e sociais, tem servido como argumento para manter tudo como está,

sustentando-se no discurso de que “O Brasil não tem jeito e de que tudo aqui acaba

em pizza”.

Freireanamente advogo pelo otimismo, não de maneira ingênua, mas sim de

forma engajada, politizada, em uma perspectiva dialógica, transformadora,

reconhecendo que toda sociedade, comunidade, tem problemas gerais e

particulares que devem ser enfrentados no hoje, na história vivida, suplantando o

discurso de espera de um futuro melhor, afinal “os educadores e as educadoras

progressistas coerentes não têm que esperar que a sociedade brasileira global se

democratize para que elas e eles comecem também a ter práticas democráticas com

relação aos conteúdos”. (FREIRE, 1992, p. 114)

O engajamento político na ação docente configura-se como eixo fundante da

construção de concepções e práticas pedagógicas otimistas, que tenham como

propósito não apenas o repasse de conteúdos de ordem física ou natural, mas sim,

formadoras e fomentadoras de uma educação com potencial para transformação

socioambiental. Comunidade, educadores e alunos encontram-se em um terreno

arenoso que exige a construção de esquemas e estratégias que subvertam os

padrões didáticos convencionais, já que encontram-se em uma cenário com

problemas e peculiaridades constituídos na dinâmica comunitária. Dialogando sobre

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aspectos da política local e sobre ensino,/aprendizagem o professor Gabriel também

expressou a organização do trabalho que desenvolve em sala de aula.

“Trabalho com o livro, mas procuro incentivar e ouvir os alunos. Tento fazer

com que eles aprendam o conteúdo que vai ser importante pra vida deles”

(Professor Gabriel)

“Procuro usar os conhecimentos dos livros e relacionar com a realidade da

comunidade, observando como funcionam as coisas aqui, mas nem sempre é fácil,

temos um conteúdo básico que deve ser trabalhado e muitas vezes nem

conseguimos”. (Professor Gabriel)

Novamente ressurge a preocupação em “vencer os conteúdos”, em cumprir,

ainda que de forma parcial, o que está prescrito nos livros didáticos adotados pela

escola, visto que na visão dos docentes, sem a aquisição dessas informações pré-

elaboradas, não há como os alunos progredirem em seus estudos e mesmo na vida,

pois em suas palavras “para ser alguém, é preciso estudar”.

Realmente estudar faz parte do processo de socialização e humanização,

além de propiciar avanços no campo científico e tecnológico, mas, em nome de uma

visão crítica do processo educativo, e da necessidade de “virar a mesa” em favor de

educandos e educadores penso ser necessário indagar o que estudar? porque

estudar? E porque estudar determinados conteúdos e não outros talvez mais

condizentes com as realidades locais?

Os questionamentos levantados apontam não para uma resposta definitiva

aos problemas educacionais da comunidade, mas instigam que nos aventuremos

em campos, rios e lagos menos estáveis, com maior turbulência, sem um caminho

pré-determinado, pois estão cheios de bifurcações e novas trilhas construídas nos

diversos acontecimentos, para isso basta que tenhamos o espírito livre e o otimismo

daqueles que se arriscam sem medo de errar, pois para os que se aventuram, o

“erro” faz parte do processo de aprendizagem.

Considerando a importância política e pedagógica da perspectiva otimista da

educação como elemento de transformação do fazer pedagógico e afirmando que a

atividade docente situa-se no campo coletivo do saber e do saber fazer, Carvalho e

Gil-Pérez (1995, p. 18) ensinam que:

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[...] a complexidade da atividade docente deixa de ser vista como um obstáculo à eficácia e um fator de desânimo, para tornar-se um convite a romper com a inércia de um ensino monótono e sem perspectivas, e, assim, aproveitar a enorme criatividade potencial da atividade docente.

Suponho então, que as práticas pedagógicas devem estar voltadas aos

interesses de educandos e educadores, afinal este é o propósito de uma educação

que visa o desenvolvimento pleno da cidadania, pelo menos isso é o que está

descrito como finalidade da educação nacional na Lei de Diretrizes e Bases em seu

artigo 2º afirmando a educação como “[...] dever da família e do Estado, inspirada

nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade

o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e

sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1996). Espero que minha referência a Lei

não tenha sido interpretada de forma irônica, mas se assim for entendida, não posso

culpá-los, posto que, boa parte de seus dispositivos não refletiram nem de longe

como de fato funcionou a educação nacional nos últimos 21 anos no país da

péssima distribuição de renda e de recursos.

Quando abordo esse conteúdo, procuro me conter para que o texto não fuja o

seu propósito de abordar a Educação Ambiental e o ensino de ciências, mas o

comedimento é de certa forma equilibrado pela perspectiva complexa com que

busco analisar a educação na comunidade de São Miguel, observando suas

relações intra e extraescolar, seus aspectos históricos, políticos e culturais que em

verdade, deveriam constituir a base do processo educativo e do fazer pedagógico

docente.

5.3 Textos e contextos na construção do conhecimento ambiental

Certamente, alunos, professores e demais indivíduos pertencentes à

comunidade de São Miguel, possuem um repertório de conhecimentos construídos

na emergência das relações cotidianas, nas práticas sociais e culturais que

fundamentam um saber e um saber fazer por vezes negligenciado e até negado pela

educação formal escolar, mas que de fato, são vitais para sobrevivência nessa

região da Amazônia amapaense.

O saber, nesse caso, é efetivamente produto e produtor das relações de

convívio social, tendo influencia direta no trabalho, na cultura, na forma de

problematizar e entender o mundo em sua complexidade. Corroborando com esse

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pensamento Layrargues e Lima (2014, p. 33) entendem que “as dimensões política e

social da educação e da vida humana são fundamentais para sua compreensão,

mas elas não existem separadas da existência dos indivíduos, de seus valores,

crenças e subjetividades”. Partindo da constatação de que existem, no âmbito da

comunidade, conhecimentos que se entrelaçam em uma teia de informações e

vivências, indago-me como a escola vem trabalhando esses conteúdos? Que

práticas pedagógicas os professores desenvolvem no sentido de valorizar ou negar

esses conhecimentos?

Adianto, amparado em minhas observações e interpretações, que, em geral

as aulas ministradas são conduzidas apenas dentro do espaço da sala de aula,

deixando para o lado de fora das paredes inúmeras possibilidades de aprendizagem,

optando-se pelo livro didático e pela lousa, como recursos didáticos dominantes, e a

aula expositiva como método principal de ensino, evidenciando-se conteúdos

distanciados da realidade, diria até, bem próximos ao que Freire (1987) denominou

como concepção “bancária” de educação em contraposição a uma visão

emancipadora e problematizadora dos processos de ensino/aprendizagem.

Na intenção de estabelecer certa ordem, sem perder de vista o caos e a

desordem que fazem parte dessa construção multidimensional, apresento

narrativamente três episódios que, de maneira singular e contextual, permitem uma,

dentre outras possíveis, interpretação do fazer pedagógico praticado pelos docentes

e seus modos de entendimento sobre os conhecimentos prévios dos alunos.

Episódio 1 – Professora Bena

A aula se inicia com a professora sentada, abrindo o livro de Língua

Portuguesa como um “procedimento padrão”, quem sabe uma fórmula para ensinar

da maneira que aprendeu, ou talvez por considerar que este seja o método mais

adequado para o ensino naquele contexto, ou ainda por acreditar que nesse roteiro

reside a segurança e a eficácia do processo ensino/aprendizagem.

Cada aluno está inquietamente postado em sua carteira, e em ocasiões

pontuais, tentam completar as falas da professora que de maneira proposital, faz

pausas no que está pronunciando, provavelmente imaginando que está

possibilitando a participação dos alunos e assim o progresso da aprendizagem dos

conteúdos.

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O fato é que os esforços e os procedimentos pedagógicos adotados

encontram-se perturbadoramente limitados por uma rotina de trabalho previamente

programada, na qual docente e discentes, parecem estar automatizados, presos a

um cenário em que não se oportuniza possibilidades de problematização, bem como

fomento ao diálogo e a criatividade, condições indispensáveis para uma

aprendizagem politizada, engajada, com potencial para promover mudanças de

pensamentos e atitudes em relação ao meio ambiente e aos problemas

socioambientais vigentes na comunidade. Sob o mesmo ponto de vista Alves (2016,

p. 108) afirma que,

[...] levar em conta necessidades, experiências e interesses dos estudantes; valorizar o diálogo, a negociação e a construção de novos sentidos; promover a reflexão, a produção de ideias e comprometer o estudante com a própria aprendizagem são todas condições importantes para motivar o estudante a superar a perspectiva reprodutiva da aprendizagem e motivá-lo

a aprender de forma criativa e produtiva.

Estou certo de que não existe uma forma universal para aprender, validada

cientificamente como "a forma", afinal a diversidade de realidades e de interações as

quais dependem de uma série de fatores, dentre eles o cultural, não se enquadram

em fórmulas previamente elaboradas e testadas como o remédio para todos os

males. Dessa maneira, ainda concordando com Alves (2016, p. 98) assumo “[...] que

uma estratégia de ensino de ciências é usada por um professor específico, com

determinada formação, em um dado contexto institucional, com um currículo

próprio”.

Em determinado momento escuto que os alunos deveriam ter lido e

respondido o texto com suas palavras, já que as perguntas estavam indicadas no

livro e as respostas, obviamente, deveriam estar de acordo com o gabarito marcado

no livro do professor. A orientação repassada pela professora merece destaque,

visto ficar claro sua dependência em relação ao prescrito nos livros. Nessa

perspectiva, o “conteúdo correto” está vinculado a uma realidade externa, fora do

contexto local, e dessa maneira, aquilo que emerge dos saberes produzidos nas

relações cotidianas acaba por perder importância e legitimidade. Assim, o

conhecimento local deixa de ter papel protagonista, preponderante, gerador e passa

a ser simplesmente uma forma exótica de conhecer. Esse pressuposto fica evidente

na fala da professora Bena, explicando sua maneira de tratar os conhecimentos dos

alunos.

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“Sim, utilizo o conhecimento deles, não todos, mas é um meio deles se

interessarem, pois tento valorizar o que eles já sabem, porque eles já têm aquele

conhecimento que trazem de casa, da convivência com a família, com os

coleguinhas, com os mais velhos” (Professora Bena)

Dentro dessa lógica, os conteúdos considerados legítimos, já estão definidos,

fazem parte de um rol de conhecimentos elaborados, avaliados e comprovados

cientificamente como adequados para a aprendizagem dos alunos de cada classe e

de cada faixa etária. Via de regra é assim que tem funcionado, porém, em favor de

uma Educação Ambiental crítica e cidadã, postulada em uma visão otimista do

processo educativo, acredito firmemente na possibilidade de subverter essa ordem

em busca de alternativas pedagógicas que não só permitam valorizar o saber local,

mas que fundamentalmente se constituam como parte integrante desse contexto.

Conduzir o olhar para fora da sala de aula permite colocar o mundo em

movimento, possibilita o diálogo com as necessidades de educandos e educadores,

tornando possível um processo educacional produzido a “ferro e fogo”, forjado na

prática de vida dos que convivem nesse ambiente, logo, os conhecimentos já

construídos e em construção pelos alunos tornam-se condição essencial para a

aprendizagem no que concerne ao ensino de ciências em uma perspectiva

ambiental, haja vista, as crianças conviverem com a natureza, com suas tradições e

cultura, aprendendo conteúdos, provavelmente nunca experimentados pelos

professores.

Episódio 2 – Professora Edileuza

Aluno por aluno leva a tarefa para a professora corrigir, depois retornam as

suas carteiras silenciosamente e continuam o exercício, assim a aula se estende,

nesse ritmo sonolento por todo o período da manhã. Os alunos pintam figuras dos

livros e cobrem os desenhos pontilhados com a dedicação de quem tem a certeza e

a responsabilidade da necessidade de cumprimento do dever.

Muito embora a escola não consiga trabalhar com o que podemos chamar de

conteúdos emergentes, nascidos dos problemas e necessidades da comunidade,

seu prestígio continua inabalado, pois o que se observa, é a fé, às vezes beirando a

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cegueira, de que ali está o caminho a ser trilhado e que os conteúdos prescritos são

a chave para a mudança nas condições de vida. No entendimento de Guarim (2005,

p. 42):

Mais do que refletir as desigualdades sociais rurais e urbanas, é possível perceber que a questão da cidadania e os problemas da comunidade estão ausentes do cotidiano escolar. A escola não tem conseguido criar laços entre ensino e sociedade. Mesmo assim, os pais e a comunidade supervalorizam a escola, dando-lhe credibilidade.

Interessante notar que mesmo as atividades desconectadas da realidade

local, mas que em algum momento fogem a rotina diária, despertam o interesse dos

alunos, como por exemplo, a aula de ciências adiante descrita em que a docente

introduz um estudo sobre reprodução de plantas centrando-se em uma flora não

encontrada na região e indiscutivelmente desconhecida dos alunos.

“As plantas podem se reproduzir por meio de:

Sementes: necessitam de terra apropriada, água, ar e calor para a

germinação. Ex: Pinheiro – do – Paraná

Mudas: Galhos que originam novas plantas. Ex: Videira

Folhas: Ex: Violeta – africana

Caules: bulbos, tubérculos que dão origem a novas plantas. Ex: Batata”

Há, efetivamente, certa contradição entre o falado e o executado em sala de

aula, posto que a docente demonstra-se, no desenvolvimento da aula, conformada

com o que Geertz, (1997, p. 331) chamou de “Taxionomia de cabeçalho de jornal” e

em sua fala, aponta, embora de maneira transmissiva, a possibilidade de

aprendizagem com os alunos ou pelo menos uma troca de informações no sentido

de entender os problemas locais. Em sua fala diz o seguinte:

“Eu transmito informações pra eles assim como eles me transmitem, porque

eu não conhecia a realidade deles, então a gente troca ideias. Eu aprendo com eles.

Com todos os problemas o aluno ainda chega aqui disposto a aprender, isso é muito

gratificante” (Professora Edileuza)

A abstração que faço da situação apresentada é a de que a docente, talvez

de forma mecânica, reproduza dois discursos que acabam se refletindo em sua

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maneira de ensinar e de aprender: o primeiro sustenta-se em suas práticas

pedagógicas aplicadas no ambiente escolar, uma vez que, apresenta aos alunos

conteúdos distanciados da realidade vivida, mesmo estando no meio de um cenário

rico em possibilidades de aprendizagem em diversos campos, inclusive ambiental; o

segundo discurso traduz-se em suas palavras, já que reproduz a concepção de que

se deve aprender com os alunos, porém, dando ênfase na transmissão de

conhecimento como fundamento da aprendizagem,

Não é de hoje a premissa presente no cenário educacional de que transmitir

não significa ensinar e que memorizar/absorver não traduz o melhor sentido de

aprender, considerando que ensino/aprendizagem fazem parte de um processo

indissociável e sobretudo relacional. Então, educar é um ato que exige por parte de

ensinantes e aprendentes, a vontade e necessidade de conhecer, estar efetivamente

no mundo e com ele interagindo, observando, experienciando, experimentando, e

fundamentalmente refletindo na e sobre todas as relações apresentadas dentro e

fora do ambiente escolar, já que cada uma delas permite a quem aprende e também

a quem se dispõe a ensinar, um contexto social, cultural, ambiental e político, com

potencial formativo.

Episódio 3 – Professor Gabriel

O professor inicia a leitura. Livro nas mãos como se fosse a Bíblia sagrada e

o quadro branco o lugar onde a “revelação” deve ocorrer, mostrando aos alunos o

conhecimento “correto”, aquele que precisa ser aprendido, visto que está amparado

pela ciência e seus métodos de validação.

“No inverno, cedo o sol se põe, cedo fica escuro e anoitece, já no verão, o dia

cedo amanhece e fica mais claro, aí temos que nos proteger, usando roupas leves e

tomando bastante água, para fazer a hidratação do nosso corpo”.

(Professor Gabriel)

O livro continua nas mãos do professor, que prossegue a cópia da matéria no

quadro das “revelações”. Os alunos atentamente copiam e copiam, obedecendo ao

ritual estabelecido como método de ensino.

O diálogo, no melhor sentido freireano, definitivamente, não faz parte daquele

momento, a formalidade e passividade de ambos, professor e alunos marcam o

momento. O silêncio ensurdecedor, somente é quebrado pelos sons dos pássaros

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do lado de fora, ou por alguns estudantes que não entendem a escrita de alguma

palavra.

Em busca de quebrar o silêncio, pelo menos entendi desse modo, o professor

inicia uma conversa com vistas a incentivar os alunos ao prosseguimento de

estudos.

“Não temos que desistir jamais de nossos objetivos. Não desistam de estudar,

venham todos os dias, isso é importante para o que queremos ser na vida e o que

queremos de bom pra nós”.

“Quem sabe o que vocês poderão ser no futuro? Médico? Engenheiro?

Psicólogo?”

“Eu tenho um filho que já está na terceira faculdade. Eu só consegui estudar

uma. Preciso ainda fazer uma pós-graduação”.

“Vou passar avaliações valendo ponto”. (Professor Gabriel)

De maneira geral, o respeito dos alunos em relação aos professores e aos

conteúdos trabalhados é algo que simboliza a educação desenvolvida na escola,

ficando evidente a percepção dos alunos acerca da importância da aprendizagem,

da educação e da instituição escola para suas vidas, talvez algo reproduzido pelos

pais no ambiente familiar, já que não somente no ambiente urbano, mas também

nas comunidades campesinas a educação tem sido vista como a única forma de

mudar de vida, de "ser alguém" na sociedade, já que, nesse caso, o “ser alguém”

refere-se a uma ocupação na hierarquia social.

Sobre esse elemento, busco em minhas memórias as constantes indagações

que fazia a minha mãe e aos professores da escola em que estudei o então ensino

de 1º grau, as respostas eram invariavelmente as mesmas: “estudamos para ser

alguém [...]”. Possivelmente por isso, ainda hoje, cursando doutorado, me questiono:

o que é ser alguém? a criança não é ninguém? Será que já sou alguém?

Penso que no campo cultural, a criança inicia sua jornada enquanto sujeito,

aprendendo e se relacionando com o mundo em sua volta, interagindo com objetos,

símbolos, significados em um ambiente cambiante, capaz de transformar e ser

transformado. Não tenho dúvidas de que é nesse processo que o homem se

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constitui enquanto sujeito. É por meio da cultura e de suas relações, que o indivíduo

constrói suas subjetividades e passa a ser o que é, pelo menos por um tempo, até

que novas interações sejam estabelecidas, mas isso não justifica “estudar para ser

alguém”, já que a ideia em jogo refere-se à construção do sujeito enquanto ser

humano, e não apenas a posição que ocupa dentro do espaço social. É a partir

desse pensamento simplificado que ser “alguém”, passa a ser sinônimo de uma

ocupação na hierarquia social: engenheiro, médico, advogado, cientista.

Sustentado nas ideias de Freire (1996) afirmo que problematizar o ensino por

meio de tema geradores locais, permite a efetiva construção do conhecimento, o

qual passa a ser produzido a partir do mundo observado e lido por alunos e

professores em um processo dialógico onde a mediação entre sujeito - objeto -

conhecimento acontece continuamente, sem separação do "conteúdo bom do ruim",

aproximando-me do que Layrargues e Lima (2014, p. 29) identificaram como

Educação Ambiental “crítica, emancipadora, transformadora, popular” ensinando que

nesse entendimento é impossível “conceber os problemas ambientais dissociados

dos conflitos sociais”

É dentro dessa perspectiva que entendo o processo ensino/aprendizagem em

uma proposta de Educação Ambiental, como uma relação forjada na prática

cotidiana nos saberes construídos por meio de problemas reais, vistos e analisados

por quem se encontra no “epicentro do furacão", inevitavelmente envolvidos em

todas as tramas que circundam as subjetividades, crenças e valores que se

encontram no campo cultural.

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6 POSSIBILIDADES PARA O DESENVOLVIMENTO DE PRÁTICAS

PEDAGÓGICAS AMBIENTAIS A PARTIR DO ENSINO DE CIÊNCIAS

Cometamos essa ilegalidade:

desobedeçamos aos currículos

impostos pelos dominadores.

Acredito que moralmente estaremos

absolvidos de tal desobediência

(CHASSOT, 2007, p. 56)

Ensinar ciências em uma perspectiva ambiental tendo como base o contexto

local de uma comunidade caracterizada por saberes construídos na tradição e em

traços culturais que indicam as formas de sobrevivência nesse espaço amazônico,

institui-se como um desafio de grandes proporções enfrentado pelos educadores

que se debruçam a essa atividade que ao mesmo tempo em que é gratificante,

também é dolorosa e desgastante, tendo em vista as dificuldades estruturais,

econômicas e sociais já descritas nessa pesquisa. Considerando a conjuntura

relatada ao longo do trabalho e a coerência com o referencial teórico adotado, fiz a

opção por discutir o assunto fundamentado em uma visão de prática pedagógica

como um processo de construção, eminentemente apoiado nas relações culturais,

sociais e políticas, haja vista que “[...] nas práticas pedagogicamente construídas, há

a mediação do humano e não a submissão do humano a um artefato técnico

previamente construído”. (FRANCO, 2016, p. 536)

Uma proposta pedagógica com esse fundamento é algo inegavelmente

importante para o entendimento e valorização dos saberes produzidos em nível

comunitário, já que neste caso, o foco está centrado em perspectivas locais de

conhecimentos e de práticas de vida, destacando-se nesse cenário o fazer

pedagógico como instrumento de transformação social e conservação ambiental. É

no cotidiano dos sujeitos locais que a conservação do ambiente se constitui como

algo primordial a sobrevivência, a julgar, pelo potencial impresso nas práticas

repassadas de geração a geração.

Com o entendimento de que a temática ambiental é algo complexo,

considerando suas variadas dimensões e ramificações: políticas, sociais,

econômicas, culturais, ecológicas, instrumentais, indago-me que bases teóricas e

epistemológicas podem sustentar uma proposta com essa intenção? O

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questionamento lançado de fato é perturbador à medida que desestabiliza

“verdades” outrora presentes em meu fazer científico e docente. Busco então,

obviamente a partir do repertório teórico disponível e de minha leitura de mundo,

elementos que incidam da vivência no cotidiano escolar, das aulas ministradas pelos

docentes e pelos saberes apresentados nesse ambiente, nas famílias e no viver

comunitário. Não afirmo que tenha encontrado o “segredo” para responder a questão

e, obviamente, por tudo que já foi discutido nessa pesquisa, fica claro que não é

essa a intenção, mas por certo, tornou-se possível trilhar o início de um caminho

com potencial suficiente para construir novas formas de entender e trabalhar o

ambiente por meio do ensino de ciências. Dito isso, apresento não a receita para o

sucesso acadêmico e escolar, o que proponho é uma maneira de trabalhar o tema,

dentre tantas outras possíveis que talvez sejam construídas ao longo das

transformações inevitáveis presentes na história da comunidade de São Miguel do

Flexal.

Para a construção de uma proposta pedagógica condizente com os saberes

circulantes na comunidade, considero ser necessário que se observe pelo menos

três dimensões: teórico-epistemológica, visando à reflexão sobre o trabalho com

Educação Ambiental por meio do Ensino de Ciências; Político-cultural-ambiental

tomando como base a problematização e a concepção de temas geradores locais no

intuito de promover a politização dos conteúdos e sua aproximação com as práticas

de vida; Pedagógico-escolar com o propósito de construir e aplicar materiais

didáticos a partir dos saberes tradicionais produzidos historicamente na comunidade.

6.1 Dimensão teórico-epistemológica: porque Educação Ambiental por meio do

Ensino de Ciências?

Muito embora os Parâmetros Curriculares Nacionais apresentem a Educação

Ambiental como um tema transversal, diferenciando-a das denominadas áreas

convencionais justamente por seu caráter emergente na sociedade atual, já que

“tratam de processos que estão sendo intensamente vividos pela sociedade, pelas

comunidades, pelas famílias, pelos alunos e educadores em seu cotidiano” (Brasil,

1998a, p. 26), entendo que o ensino de ciências seja espaço privilegiado para tratar

da temática no contexto escolar e comunitário, uma vez que, oportuniza a docentes

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e alunos a construção de um olhar diferenciado sobre a vida dos cidadãos e sua

relação com o ambiente local.

Não quero com isso reduzir Educação Ambiental a uma área convencional,

mesmo porque acredito que, independente da área de atuação, todos somos

responsáveis pelo ambiente em que vivemos, ampliando, por tanto, as

possibilidades de entendimento e aplicação de seus saberes, porém, necessito

reconhecer o papel de destaque que o assunto recebe na área de Ciências Naturais,

inclusive referendado nos próprios Parâmetros Curriculares Nacionais, no eixo vida

e ambiente, o qual, segundo o documento, “[...] busca promover a ampliação do

conhecimento sobre a diversidade da vida nos ambientes naturais ou transformados

pelo ser humano [...]” tendo como propósito estudar “[...] a dinâmica da natureza e

como a vida se processa em diferentes espaços e tempos” (BRASIL, 1998b, p. 42).

Ensinar ciências a partir de uma perspectiva ambiental, política, possibilita a

inclusão do sujeito no dinamismo da vida, favorece a construção de um

posicionamento crítico, engajado, diante dos acontecimentos históricos. Concordo

com Chassot (2016, p. 109) no sentido de que “temos de formar cidadãs e cidadãos

que não só saibam ler melhor o mundo onde estão inseridos, como também, e

principalmente, sejam capazes de transformar este mundo para melhor”. A

compreensão por parte de professores e alunos de que o conteúdo ambiental está

presente no cotidiano e inexoravelmente vinculado a uma educação politizada

aponta para a organização de um currículo em que o ensino de ciências passe a se

estabelecer como um território de reflexão sobre a relação ser humano/ambiente, e

nesse sentido, o que é ensinado torna-se fruto dos problemas diários dos envolvidos

no processo educativo.

Diante desse posicionamento, a responsabilidade político-ambiental do ensino

de ciências converte-se como condição essencial para um fazer pedagógico

consubstanciado nos saberes tradicionais locais presentes nas relações dos sujeitos

conviventes em São Miguel do Flexal, na medida em que se constitui como um

elemento balizador da valorização dos saberes e da cultura vivenciada pelos

cidadãos locais. Alinhada a esse pensamento, Franco (2016, p. 537-538) defende

uma pedagogia pensada a partir de “uma epistemologia crítico-emancipatória, que

considera ser a pedagogia uma prática social conduzida por um pensamento

reflexivo sobre o que ocorre nas práticas educativas, bem como por um pensamento

crítico do que pode ser a prática educativa”.

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Não quero nesse momento discutir a transversalidade da Educação

Ambiental, pois acredito que tal premissa já tenha sido amplamente debatida e

defendida nos próprios Parâmetros Curriculares Nacionais e na organização dos

currículos escolares, o que proponho é, especialmente no caso da Escola de São

Miguel do Flexal, que a temática ganhe força por meio de um ensino de ciências

envolvido politicamente e ambientalmente, capaz de indagar e refletir sobre os

problemas enfrentados na comunidade o que se sugere fazer mediante temas

geradores oriundos do contexto da comunidade, denominados nessa pesquisa de

Temas Geradores Locais (TGL).

Acredito que os temas geradores problematizados na vivência de alunos e

docentes tenham potencial para a produção e condução de um fazer pedagógico,

científico, cultural e político na medida em que não estão presos aos “[...] homens

isolados da realidade, nem tampouco na realidade separada dos homens”, só fazem

sentido “[...] nas relações homens-mundo” (FREIRE, 1987, p. 98). São estas

relações profundas, permeadas pelo diálogo, por indagações e reflexões, que levam

a valorização e a construção de novos conhecimentos, provavelmente mais

condizentes com a realidade dos indivíduos que fazem parte de uma determinada

sociedade.

É na prática cotidiana, vivenciando as relações diárias que docentes e

discentes se envolvem com o conhecimento, que neste caso, não é somente

escolar, faz parte de um complexo sistema cultural e social, produzindo-se uma

linguagem peculiar, com significados que estão distantes dos chamados currículos

oficiais, e evidentemente dos conhecimentos considerados como científicos. É nesse

momento, que a Educação Ambiental por meio do Ensino de Ciências conquista seu

destaque, pois, por via da problematização e da assunção de temas geradores,

torna-se possível o desenvolvimento de um trabalho com temas de múltiplas

dimensões e extensões sociais e pedagógicas.

Destaco que no âmbito da comunidade em estudo, especificamente no que se

refere à Escola de São Miguel, o desenvolvimento de um trabalho pedagógico com

Educação Ambiental por meio do Ensino de Ciências é algo que se reveste de

condição essencial para a estruturação de uma postura crítica diante das

dificuldades ambientais encontradas, tendo em vista, que a população local vive

basicamente do que o ambiente oferece e que os conteúdos trabalhados na escola

são prioritariamente voltados para aprendizagem de Língua Portuguesa e

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Matemática, na maioria das vezes esquecendo-se das ciências e do próprio

ambiente.

Conhecer é um ato que exige, antes de tudo, leitura de mundo, havendo

necessidade de que o sujeito se reconheça como um ser pertencente a este mundo,

e, portanto, capaz de entendê-lo e transformá-lo por meio da interação. Nada no

mundo permanece intacto ou intocável, nesse sentido, Diegues (2000a) alerta para o

mito da “natureza intocável”, o que seguramente tem servido como base de

sustentação de interesses econômicos de grupos imperialistas fortemente presentes

na Amazônia.

É nessa concepção que a Educação Ambiental por meio do Ensino de

Ciências no âmbito da escola, ganha contornos políticos e sociais, uma vez que,

proporciona a reflexão a partir de temas nascidos das interações cotidianas, das

práticas de vida, do ambiente cambiante, que longe de ser meramente natural, é um

espaço de conflito, de transformação e primordialmente de saberes compartilhados,

construídos, moldados e modificados no próprio ambiente, afinal, valendo-me das

ideias de Freire (1996, p. 54) “[...] minha presença no mundo não é a de quem a ele

se adapta mas a de quem nele se insere. É a posição de quem luta para não ser

apenas objeto, mas sujeito também da história”.

Os conhecimentos ambientais apresentados estão intimamente relacionados

às formas de sobrevivência experimentadas no cotidiano, é nesse espaço que o

conteúdo se torna significativo, parte das relações, fomentador de saberes.

Provavelmente por esse motivo, Chassot (2016, p.235) alerta para o fato de que:

O pescador solitário, que encontramos em silenciosas meditações, sabendo onde e quando deve jogar a tarrafa, também tem saberes importantes. A lavadeira, que sabe escolher a água para os lavados, tem os segredos para remover manchas mais renitentes ou conhece as melhores horas de sol para o coaro. A parteira, que os anos tornaram doutora, conhece a influência da lua nos nascimentos e também o chá que acalmará as cólicas do recém-nascido. A benzedeira não apenas faz rezas mágicas que afastam o mau-olhado, ela conhece chás para curar o cobreiro, que o dermatologista diagnostica como herpes zoster. O explorador de águas, que indica o local propício para se abrir um poço ante o vergar de sua forquilha de pessegueiro, tem conhecimentos de hidrologia que não podem ser simplesmente rejeitados.

São múltiplos os saberes que fazem parte de uma sociedade, de uma cultura,

e que estão diretamente impregnados nas formas de se relacionar com o ambiente e

com as condições e experiências de vida presentes em um contexto social. Penso

mesmo, que esses saberes regem o convívio dos sujeitos envolvidos e

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inevitavelmente influenciam nas ações destes, sobre a natureza. São esses saberes

que dizem quando e como se deve caçar, pescar, manejar o gado, quais os

instrumentos mais adequados para cada ocasião. O interessante, e ao mesmo

tempo perverso, é que nada disso consta no currículo oficial e muito menos nos

livros didáticos utilizados na escola, portanto, reforçando o distanciamento entre os

conhecimentos tradicionais e os conteúdos trabalhados na educação formal. Parece

que nesse caso, não se discute o que ensinar? Nem tampouco o como ensinar? São

questionamentos distantes do espaço escolar e comunitário. O poder decisório foge

das mãos dos que realmente conhecem a realidade. Para referendar o que digo,

valho-me novamente de Chassot (2007, p. 66) e sua discussão sobre desafios

curriculares. Afirma o autor que:

Se nós temos como meta ajudar a construir valores sociais, voltados não apenas para a conservação do meio ambiente e sua sustentabilidade, como também, valores críticos que se responsabilizem pelas modificações que ocorrem no ambiente natural, precisamos estar atentos a como se tomam as

decisões que passarão a reger o nosso fazer.

Por tudo que já foi apresentado, imagino estar evidente o caráter político

ambiental que se pretende sugerir para o ensino de ciências aplicado na escola.

Este pressuposto se justifica pela necessidade de colocar os saberes locais na

ordem do dia, em uma perspectiva reflexiva, permitindo a alunos e professores

decidirem sobre questões fundamentais para um processo educativo crítico: o que

ensinar? Como ensinar/ Para que ensinar?

Nessa lógica, uma proposta por meio de temas geradores locais potencializa

os conteúdos, considerando que estes passam a surgir de problemas reais vividos

pela comunidade, ensejando, portanto, métodos e objetivos que sejam produzidos

pelos agentes implicados no processo. Dentro dessa propositura, ensinar passa a

ser uma tarefa em que o docente deixa de ser o mero “tradutor do livro didático” e

assume um papel mediador, ao mesmo tempo em que ensina, também aprende por

meio das experiências compartilhadas. O aluno, por sua vez, constitui-se como

sujeito aprendente, alguém que se permite ir além do que está escrito nos livros

didáticos, com habilidades para entender as diversas maneiras de se relacionar com

o ambiente e suas implicações no viver comunitário.

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6.2 Dimensão político-cultural-ambiental: problematização e temas geradores

locais

A introdução de temas geradores locais como pressupostos fundantes da

pedagogia que deverá ser desenvolvida na escola se justifica pelo fato de que os

conteúdos trabalhados no ambiente educacional formal estão distantes das práticas

de vida, dos saberes que regem o cotidiano local e que estabelecem a relação com

o meio ambiente.

Defendo a ideia de que professores e alunos necessitam dialogar com os

conhecimentos produzidos histórico e culturalmente, em um processo reflexivo

capaz de propiciar a construção de fios condutores entre os dito saberes e o

currículo proposto pelos órgãos governamentais. Admitindo como verdade que não

se deve desprezar o currículo oficial por conta da própria unidade da educação

nacional e de outros argumentos propalados na literatura e na Lei de diretrizes e

Bases da Educação Nacional, também afirmo ser imprescindível que o conteúdo

contextual local, esteja contido no fazer pedagógico escolar, pois é este movimento

dialógico que garante a significância de teorias, métodos, práticas e conhecimentos

compartilhados na escola.

Lembro que durante a pesquisa foi possível observar a aplicação, por parte

dos docentes da Escola de São Miguel, de práticas pedagógicas burocráticas, quase

sempre desconectadas da realidade, práticas profundamente arraigadas aos livros

didáticos e ao currículo oficial, deixando de lado o ambiente, os saberes, relações

cotidianas e a cultura local. Não quero com isso discutir competência docente ou a

qualidade do ensino aplicado na escola, mesmo porque, exigiria uma análise atenta

das condições de trabalho e dos processos de formação de docentes e gestores

atuantes nesse espaço, o que não se configura como objeto de estudo dessa

investigação. Pretendo sim, nesse momento, sugerir uma proposta pedagógica que

possibilite a efetivação de um processo ensino/aprendizagem mais coerente com os

saberes científicos e ambientais em destaque nessa parte da Amazônia.

A problematização sugerida permite a professores e alunos a imersão no

contexto comunitário, gerando temas politicamente, cientificamente e

ambientalmente amalgamados à realidade amazônica. Os conteúdos tornam-se

parte da vida, passam a fazer sentido nas inter-relações cotidianas. Nessa

concepção a Educação Ambiental por meio do Ensino de Ciências alcança um

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status que ultrapassa a rigidez disciplinar e passa a funcionar como uma área

geradora e agregadora de conhecimentos, alargando as potencialidades de um

processo educacional eminentemente voltado para o cidadão convivente na

Amazônia.

Temas e fios condutores não estão dados, são elementos construídos no

processo de leitura de mundo, na problematização e reflexão sobre as relações

políticas, sociais e culturais em vigência no ambiente. Assim, o ensino de ciências

constitui-se dentro de um contexto relacional, estimulando discentes e docentes à

busca e construção de sabres que possam dar conta das situações enfrentadas.

Dentro desse prisma, atividades relacionadas à caça, pesca, saúde, trabalho,

consumo, ritos, períodos de chuva e estiagem, fases da lua, cantos de aves e

deslocamento de animais silvestres, tornam-se fontes de conteúdos e subsídios

pedagógicos que indiscutivelmente precisam fazer parte do trabalho escolar.

6.3 Dimensão pedagógico-escolar: materiais didáticos e conhecimentos

tradicionais

Os conhecimentos produzidos na comunidade fazem parte de um complexo

cenário, onde as relações sujeito/ambiente estão marcadas por elementos culturais

e históricos ausentes da vida escolar, em especial no que diz respeito ao currículo,

metodologias e materiais didáticos utilizados nas aulas ministradas. Os conteúdos

trabalhados estão presos aos livros didáticos ofertados pelo Ministério da Educação

em nível nacional, e obviamente encontram-se dissociados das diversas realidades

experimentadas Brasil a fora, o que por certo vem dificultando a implementação de

alternativas pedagógicas mais engajadas ambientalmente.

Advogo pela necessidade de que o material didático se constitua a partir de

uma proposta político-pedagógico-ambiental, levando em consideração a leitura de

mundo dos sujeitos envolvidos no fazer educativo, trazendo para dentro do ambiente

escolar conteúdos até então marginalizados, considerados como algo de pouca

importância para o sucesso acadêmico/profissional.

Como já demonstrado em outros momentos dessa pesquisa, são muitos os

saberes circulando no cotidiano de São Miguel do Flexal. Conhecimentos que

efetivamente fazem parte da vida, e que indiscutivelmente, permitem a sobrevivência

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na comunidade, visto que se consolidam por meio de ensinamentos repassados de

geração em geração, indicando os melhores tempos e espaços para o plantio, caça

e pesca, além das formas mais adequadas de utilização da flora local.

A responsabilidade da educação escolar necessita ultrapassar seus muros, já

que esta, não se encontra isolada das relações cotidianas. No caso de São Miguel,

em determinados momentos do ano, até existe certo isolamento físico, mas de

maneira alguma cultural, social, ambiental e político, por este motivo a valorização

dos saberes tradicionais é imprescindível no estabelecimento dos conteúdos e no

fazer pedagógico escolar.

As observações e interações junto à comunidade me favorecem, como

alguém externo obviamente, o entendimento de parte de sua dinâmica de vida,

sendo possível, apoiado nessa relação, sugerir possibilidades pedagógicas para

uma educação escolar mais humana e preocupada com o ambiente e sua

conservação. Pari passu com essa ideia, aponto para eixos temáticos que longe de

serem pontos fixos, encontram-se abertos a novas construções e inclusão de

saberes que talvez não estejam expressos nos conteúdos oficiais.

6.3.1 Eixo 1 – Ciclos naturais e seus tempos

O conhecimento dos ciclos naturais e de suas mudanças ao longo do tempo

faz parte das experiências de vida apresentadas pelos moradores da São Miguel.

Configuram-se como saberes essenciais as formas de sobrevivência na região, pois

estão na base das habilidades necessárias ao desenvolvimento do trabalho, e do

respeito à cultura e o ambiente local.

O eixo temático suscita questões emergentes que merecem discussão dentro

e fora do ambiente escolar: Que impactos os períodos chuvosos e de estiagem têm

na vida dos comunitários? Que mudanças ambientais ocorrem nos dois períodos?

Que aspectos da fauna e da flora se destacam durante a inundação dos campos e

nos tempos de estiagem? Que influências os seres humanos têm ou tiveram na

demarcação desses dois momentos? Como ocorre o processo migratório de aves

peixes, mamíferos e quelônios durante as duas fases?

As formas de entendimento dos ciclos e seus tempos direcionam para esses

questionamentos e provavelmente para outros não presentes nessa tese, mas que

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dentro das relações escolares deverão emergir com força suficiente para conduzir

uma aprendizagem mais significante, à medida que os envolvidos no processo

tornam-se protagonistas do fazer pedagógico.

6.3.2 Eixo 2 – Relação ser humano-ambiente

A maneira como os sujeitos locais interagem com o ambiente demonstra

vários aspectos da cultura presente no cotidiano, dentre eles o respeito às crenças e

aos mitos que fundamentam os saberes repassados de geração a geração e que

indubitavelmente influenciam a utilização da natureza enquanto recurso de

sobrevivência. Muito comum no dia a dia da comunidade se ouvir falar de como o

cenário de São Miguel vem se alterando nos últimos anos e o quanto tal fenômeno

tem modificado o convívio local no que tange a trabalho, alimentação e mesmo, as

formas de locomoção nesse espaço amazônico. Espécies da fauna e da flora antes

abundantes em rios, lagos e campos passam a ser cada vez mais raras,

principalmente por conta da ação humana no ecossistema.

O enredo relatado leva a questionamentos que a mim, enquanto pesquisador

parecem ter força geradora para fomentar a reflexão e o debate sobre problemas

enfrentados na coletividade: Que entendimento os moradores tem sobre as

mudanças ambientais? Que fatores estão promovendo tais mudanças ao longo do

tempo? Que espécies da fauna e da flora ainda são abundantes? Que espécies

estão desparecendo de rios, lagos e campos? O que pode ser feito para melhorar a

relação com o ambiente?

Problematizar a relação com o ambiente é condição para seu entendimento,

visto que com esse movimento torna-se possível a reflexão sobre as práticas

adotadas pelos moradores no sentido de depredação ou conservação do meio

ambiente, assim como, da influência de terceiros nesse processo. Esses conteúdos

necessitam ser revisitados, valorizados e explorados pela escola enquanto ponto de

partida de qualquer outro assunto que seja abordado em seu espaço visto fazerem

parte e afetarem diretamente a dinâmica local, funcionando como o cerne primordial

para a construção de uma Educação Ambiental politizada.

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6.3.3 Eixo 3 - Ambiente e desenvolvimento

Sobre este eixo repousa a discussão do momento em nível mundial, e

obviamente possui repercussão local, considerando que a Amazônia atrai os olhares

e intenções “preservacionistas e econômicas” de muitos países e organizações não

governamentais e também de gente realmente interessada na conservação

ambiental. De um lado, dos países mais poderosos e organizações em favor do

lucro, interesses econômicos encobertos por um discurso de preservação, de outro,

cientistas, políticos e intelectuais preocupados com o meio ambiente e nessa zona

de fronteira, os sujeitos das comunidades amazônicas, altamente dependentes do

espaço onde vivem.

São muitas as perguntas que inquietam minha maneira de entender

Educação Ambiental e o processo de desenvolvimento, porém, destaco como forma

de exemplificar o que pode ser feito em âmbito escolar, apenas algumas: O que

significa preservar a natureza? Quem decide o que deve e o que não deve ser

preservado? O que é desenvolvimento e como se relaciona com o ambiente?

Desenvolvimento melhora a vida da população local? Existe forma de

desenvolvimento sem agressão ao ambiente?

Novamente proponho indagações que evidentemente não são as únicas e

nem sei se são as melhores, já que estão fundamentadas apenas em percepções

individuais que se constituem como produto de inquietações de um ser humano

envolvido, mas não afetado diretamente pelos problemas políticos, sociais e

ambientais da comunidade.

Alerto para o fato de que nada está paralisado, os saberes estão em

movimento constante, transformando e sendo transformados no processo

dialógico/reflexivo. Assim, conhecer torna-se um ato inseguro, movediço, cambiante

e neste sentido, temas, questionamentos e eixos são modificados e substituídos de

acordo com as necessidades e indagações de alunos e professores participantes

das práticas educativas.

Esses são apenas alguns itens que podem ser construídos tomando como

base o processo de problematização e geração de temas e eixos. Efetivamente,

essa forma de pensar as práticas pedagógicas, possui potencial para estimular

outras reflexões tanto por parte de professores quanto de alunos, o que no meu

entendimento, proporciona maior interação entre os saberes produzidos na

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comunidade e a educação escolar. Certamente, apresentei indagações que se

referendam em vivências pessoais enquanto acadêmico, e evidentemente

representam minhas inquietações, porém, no ambiente escolar os contornos serão

outros, tendo em vista, a multiplicidade de saberes e questionamentos que estão na

base das relações escolares e fundamentalmente nos fazeres dos sujeitos que

fazem parte dessa região da Amazônia Amapaense. Assim, imagino ser possível a

construção de um processo educacional viabilizado por um currículo estruturado e

desestruturado a cada geração de moradores, caracterizado pela inclusão constante

de novos saberes, elementos políticos, culturais, sociais e por vezes até novas

paisagens formadas pela própria ação do homem e dos ciclos ambientais.

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7 REFLEXÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS

[...] o inacabamento do ser ou sua

inconclusão é próprio da experiência

vital. Onde há vida, há

inacabamento. (FREIRE, 1996, p.

50)

Abordar saberes ambientais em uma perspectiva local por meio do ensino de

ciências foi e tem sido algo desafiador para um professor/pesquisador, pedagogo,

advogado, oriundo de um mestrado em Planejamento e Políticas Públicas e que até

o início desse trabalho, tinha pouco contato com pesquisas em comunidades

tradicionais, muito embora, mantenha ainda hoje, certa vivência com a localidade em

estudo, conforme relatado nos dizeres introdutórios desta tese. Não creio que a falta

de experiência com esse tipo de pesquisa tenha atrapalhado o alcance dos objetivos

traçados, pelo contrário, tenho convicção de que este desconhecimento foi

desafiador e fundamental para o encontro e possíveis desencontros na busca de

dados, análises e organização da pesquisa.

Pensava em meus momentos de solidão produtiva: relações educacionais

ambientais, ensino de ciências em uma comunidade amazônica, realmente terei

muito trabalho. Como descrever de maneira densa o cenário educacional, a fauna, a

flora, os mitos e a cultura local sem me tornar um pesquisador enviesado? O

envolvimento emocional com o objeto de estudo aflora as subjetividades e as

possibilidades de análise, mas também, pode enviesar a criticidade de quem

escreve sobre determinado assunto.

Diante do exposto, fica notório o forte envolvimento com o objeto de estudo, e

inevitavelmente os esforços que precisei imprimir nessa construção, para que, como

diz uma amiga paraense, o texto não fique “panfletário”, desprovido do espírito

crítico necessário ao tipo de abordagem que estou propondo nessa investigação

científica. Preocupado com os rumos que o trabalho poderia seguir e buscando fugir

de um possível “tom panfletário”, algumas indagações passaram a ser feitas no

sentido de pesquisar de maneira central: em que termos as condições e

experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do

Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem

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como, o ensino de ciências desenvolvido na escola local? e subsidiariamente: Que

condições e experiências de vida são compartilhadas na comunidade de São Miguel

do Flexal?; Que tipo de relação se estabelece entre moradores da comunidade e

alteração ou conservação do meio ambiente?; Que ensino de ciências se

desenvolve na escola e qual sua relação com práticas ambientais amparadas no

saber local?

Cada pergunta colocada teve como propósito a elaboração e alcance dos

objetivos estabelecidos, quais sejam compreender em que termos as condições e

experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do

Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem

como, o ensino de ciências desenvolvido na escola local e em caráter específico:

Identificar as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade de

São Miguel do Flexal; constatar a relação estabelecida entre moradores da

comunidade e alteração ou conservação do meio ambiente; analisar o ensino de

ciências desenvolvido na escola e sua relação com práticas ambientais amparadas

no saber local; apontar para possibilidades pedagógicas que permitam a valorização

dos saberes tradicionais ambientais por meio do ensino de ciências.

A complexidade da temática abordada nessa pesquisa “Comunidade,

educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do

Flexal/Pracuúba/Amapá”, os questionamentos feitos e os objetivos traçados, levam a

resultados relevantes para o entendimento do objeto de estudo e proposição de

alternativas pedagógicas por meio do ensino de ciências, que estejam voltadas para

valorização dos saberes tradicionais ambientais em uso na comunidade.

A forma como os sujeitos se posicionam sobre os aspectos ambientais em

vigor na sociedade em estudo levam a convicção de que existem conflitos,

discordância de posicionamentos e atitudes referentes às práticas ambientais vividas

em são Miguel. Penso ser importante que as coisas aconteçam dessa maneira, pois,

demonstram os diversos interesses que estão implícita ou explicitamente

influenciando as práticas e discursos (re) produzidos pelos comunitários.

As percepções apresentadas pelos sujeitos por meio de suas vozes e de

minhas interpretações, constituem um conjunto de preocupações, angústias e

saberes que foram construídos ao longo da história dessa população a qual se

caracteriza pela necessidade dos recursos naturais ainda hoje presentes na vida dos

moradores. Conhecimento dos ciclos naturais, de plantas, animais e de seres

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naturais e sobrenaturais que efetivamente habitam o cotidiano local, são alguns dos

saberes presentes no dia a dia de quem vive esse ambiente.

Nesse sentido, tenho plena convicção da relação entre saber e poder, e na

perspectiva do conhecimento local, tal premissa ganha contornos particulares, na

medida em que o saber não é simplesmente um produto a ser comercializado, é

antes de qualquer coisa, um saber/poder indispensável à vida e ao equilíbrio das

relações do cotidiano. Nesse caso o saber / poder é fruto das tradições e da cultura,

relacionado ao conhecimento passado de geração em geração no ambiente familiar

e social, produto da vida e de sua história em movimento, na maior parte das vezes

distante do ambiente escolar ou da ciência ocidental de forma geral.

Dessa forma, conservar a natureza deixa de ser uma mera obrigação ética,

moral como algo a ser deixado para as futuras gerações de maneira intocável,

sagrada e passa a ser vivencia cotidiana, inspirada nas mais profundas

necessidades de sobrevivência humana em um processo que depende do

dinamismo que tem caracterizado a história das sociedades.

As condições e experiências de vida experimentadas pelos moradores da

comunidade de São Miguel do Flexal caracterizam os saberes produzidos no

cotidiano e possuem de maneira irrefutável, importância nas relações do dia a dia,

nas formas de trabalho, consumo, cultura, folclore, mitos, moradia, locomoção e

principalmente no trato com a natureza, porém, tendo expressividade diminuta no

que concerne a educação escolar, tendo em vista que os conteúdos atualmente

trabalhados nessa instituição encontram-se na contramão do cotidiano das práticas

de vida. Os livros didáticos oficiais são utilizados por professores e alunos como se

fossem “a verdade” incontestável, não passíveis de indagações e nessa perspectiva

a metodologia empregada centra-se na repetição e na memorização do que está

prescrito no material.

Com o distanciamento entre os saberes tradicionais comunitários e os

conteúdos trabalhados na escola, a Educação Ambiental por meio do Ensino de

Ciências fica sem sentido, visto que se torna apenas mais um tema na maioria das

vezes negligenciado por professores e alunos. Por tudo isso, acredito que o ensino

de ciências conduzido por Temas Geradores Locais favorece um maior

envolvimento com os saberes tradicionais e os problemas ambientais, possibilitando

a indissociabilidade entre o que é vivenciado no cotidiano e o que é ensinado na

escola.

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Há muito sabemos que ensinar não é uma tarefa simplória, pelo contrário, é

uma atividade que exige comprometimento político e formacional, responsabilidade

com a aprendizagem dos alunos, e dentro dessa intenção, refiro-me a construção de

um processo que se sobreponha a mera memorização de conceitos, a repetição de

conteúdos cristalizados pelos órgãos oficiais e se configure como um espaço de

problematização, discussão e reflexão, sem preocupação de estabelecer o certo e o

errado, mas que propicie a abertura de novas trilhas de conhecimento, favoreçam a

discordância e a rebeldia acadêmica. Nesse prisma, professores e alunos assumem

o comando de seus destinos educacionais, uma vez que, passam a decidir sobre o

que ensinar? Porque ensinar? e Como ensinar? flexibilizando o currículo e abrindo

novas possibilidades de ensino/aprendizagem.

Mesmo com as dificuldades enfrentadas no fazer diário, principalmente em

nível estrutural, educandos, educadores e pais de alunos ainda confiam na escola

enquanto instituição necessária ao desenvolvimento local e a melhoria das

condições de vida das pessoas que vivem na Amazônia e acredito que este

pensamento oportuniza o afastamento de uma visão pessimista, fortalecendo a

escola como promotora da construção de conhecimentos.

Notoriamente o estabelecimento de políticas públicas visando à construção e

o fortalecimento das instituições existentes, converte-se como condição

indispensável à edificação de relações sociais mais preocupadas com o ambiente.

Instituições fracas, pouco poder aquisitivo e perspectiva de vida muito limitada, são

fatores que atrapalham a relação do sujeito com o ambiente, posto que, o instinto de

sobrevivência prepondera sobre as práticas de conservação ambiental, muitas vezes

estimulando a exploração e comercialização dos chamados “recursos naturais” de

maneira predatória a fauna e a flora da comunidade. Com base nessa ideia,

constato que no espaço investigado, a ausência de políticas públicas institucionais,

ambientais tem ocasionado um tipo de relação que não é vantajosa para o ambiente

e muito menos para o ser humano.

Sinteticamente, analisando os dados da pesquisa, aponto três constatações

influentes na alteração da paisagem e no desaparecimento de espécies da fauna e

flora de São Miguel: ausência de políticas públicas das mais diversas ordens,

necessidade de sobrevivência do homem local e ação de agentes externos na

exploração e comércio do que é retirado da natureza.

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O cotidiano da comunidade de São Miguel do Flexal é fonte inesgotável de

conhecimentos, mitos e crenças, compostos por uma complexa teia de saberes que

traduzem o estilo de vida até então adotado na localidade e que certamente irá se

modificar dentro de um contexto histórico-cultural, reconhecendo-se que a cultura

ocupa papel de destaque nessa relação, haja vista, que é ela quem estabelece o elo

entre ser humano e ambiente que o cerca. Por este motivo, insisto que o natural e o

cultural fazem parte do mesmo jogo ambiental, estando os saberes tradicionais

presentes nesse contexto com regras próprias de reconhecimento, classificação e

entendimento desse espaço. Entendo que os saberes produzidos no ambiente

comunitário são elementos essenciais para construção de uma proposta pedagógica

escolar que tenha como eixo central a conservação ambiental, já que são estes

conhecimentos do cotidiano que possibilitam um fazer educativo mais conectado

com o ambiente.

A Educação Ambiental, de fato, está presente nas práticas adotadas na

convivência dos moradores e em seu envolvimento com o habitat amazônico, visto

que as percepções observadas e analisadas demonstram preocupação com o

equilibro da natureza, com a conservação e uso da fauna e da flora. Evidente que o

processo não é algo pacífico, pois está dentro de um território conflituoso, carregado

de interesses políticos e econômicos, sustentados por projetos que em sua maioria

não estão em consonância com as necessidades dos moradores dos diversos

pontos da Amazônia.

Nesse terreno de conflito que é o espaço ambiental, cultural e político da

comunidade, a escola merece destaque, pois necessita instigar os alunos a

construção de novos olhares, alargando as possibilidades de análise e de ação

sobre o fazer comunitário diário, assumindo posição como condutora de formação e

valorização dos conhecimentos produzidos em nível local. Conforme dito no capítulo

3 desse trabalho, prefiro acreditar na escola como “o lugar de onde se pretende um

processo educativo que atenda as necessidades reais dos alunos, um local de

esperança, do saber e do saber fazer, capaz de valorizar os conhecimentos ali

construídos, escapando da surdez, cegueira e ausência de olfato e paladar que

teimam em assombrar nossas escolas”.

Apesar dos problemas sociais e econômicos latentes, São Miguel do Flexal

demonstra potencial para construção de políticas ambientais e educacionais que

sejam condizentes com um tipo de desenvolvimento menos agressivo ao ambiente,

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aos saberes e a cultura local. Acredito nesta premissa pelo fato de que cada

entrevista realizada, cada conversa compartilhada e os momentos de convivência

com os moradores, permitiram-me a percepção de que existe um sentimento de

pertença, de raiz, de identificação com todos os elementos que compõem o cenário

local. A história da comunidade é contada com orgulho e com certa dose de

saudade dos tempos em que aparentemente as coisas eram “mais difíceis”. Dizia-

me um morador, sem negar a importância da luz elétrica, que em outras épocas a

luz da lua deixava tudo mais romântico e que a abundância do pescado e da caça

garantia a fartura na mesa do comunitário.

Este sentimento comum aos sujeitos fortalece a consciência de que há

necessidade de conservar o ambiente e que inegavelmente a educação tem papel

preponderante nesse propósito, visto seu potencial formativo tanto do ponto de vista

informal quanto na sua vertente institucional/formal efetivada por meio do processo

de escolarização. É dentro dessa perspectiva que o trabalho pedagógico

desenvolvido na escola de São Miguel carece de uma atuação voltada ao resgate

dos saberes locais para que sejam colocados dentro de seu espaço, ou melhor, os

conteúdos veiculados no cotidiano devem compor o currículo escolar, tendo em vista

que fazem parte do ambiente cultural, político e social de alunos, pais e professores.

A assunção de um processo educacional politizado que entenda os seres

humanos como pertencentes a um ambiente e que propicie o enfrentamento de

problemas concretos que atingem diretamente as forma de vida e de convivência na

comunidade, altera a relação entre educandos, educadores e conteúdos, à medida

que fios condutores passam a fazer a interligação entre o que se aprende no

ambiente escolar e os saberes e ferramentas presentes no cotidiano dos sujeitos

locais. Diante desse pressuposto, reafirmo a proposta pedagógica por meio de

temas geradores nascidos das práticas dos moradores, com significância para os

que possuem raízes e acreditam nesse espaço amazônico como um ambiente que

embora esteja carente de condições de vida, está rico em experiências, traços

culturais e conhecimentos que fazem parte do contexto social.

Estou convicto de que fazer educação na Amazônia é realmente um ato de

dedicação, coragem e fundamentalmente de respeito aos sujeitos que fazem parte

desse cenário. Afirmo também ser um ato de rebeldia contra a inoperância do poder

estatal que infelizmente tem se apresentado nas formas de corrupção e descaso

com a coisa pública. A rebeldia a qual me refiro, possibilita colocar em movimento a

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história da comunidade, tendo em vista que seus saberes e práticas passam a

conduzir suas trilhas enquanto povo do norte brasileiro, capaz de reinventar e

reeditar seu destino.

Compartilhar dos saberes e da confiança dos sujeitos pertencentes à

Comunidade de São Miguel, me tornaram um privilegiado, alguém, de certa maneira,

escolhido para ser o interlocutor entre os diversos conhecimentos aqui apresentados

e analisados sob uma determinada ótica e o mundo acadêmico-científico. Lembro

novamente, que se trata de um olhar dentre tantos outros possíveis, talvez até em

determinado grau, menos ou mais otimistas ou realistas, porém, nunca

simplesmente iguais, tendo em conta que o processo de construção foi amalgamado

em subjetividades divididas e compartilhadas entre pesquisador e sujeitos da

pesquisa. Perceptivelmente não sou mais o mesmo pesquisador, docente

universitário ou simplesmente sujeito, assim como, São Miguel também não o é, e

nem será a mesma, considerando que somos afetados por cada ação realizada ou

sofrida no cotidiano. Aí está uma das belezas em se investigar gente, seres

humanos em um contexto socioambiental, nada permanece intacto, pois as

mutações ocorridas nos permitem fugir aos determinismos e a criar outras maneiras

de conviver e educar.

Por todos os saberes produzidos e compartilhados nessa pesquisa, agradeço

ao povo de São Miguel do Flexal pela oportunidade de apresentar, como diria o

saudoso e inestimável Gonzaguinha, em forma de “grito de alerta”, uma tese

versando acerca das condições e experiências de vida, bem como, sobre a

Educação Ambiental e o Ensino de Ciências desenvolvido nessa comunidade da

“Amazônia Pracuubense”.

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APÊNDICES

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APÊNDICE – A ROTEIRO DE ENTREVISTA – DIREÇÃO E COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA DA ESCOLA. 01 – Nome e formação

02 – Tempo de atuação no magistério

03 – O que você entende por educação ambiental?

04 – Como você entende a relação homem/meio ambiente na comunidade de São

Miguel?

05 – Atua em algum movimento relacionado a políticas sobre meio ambiente e

natureza?

06 – Durante a carreira do magistério já havia assumido alguma outra função diretiva

ou de coordenação?

07 – Há quanto tempo está na comunidade?

08 – Há quanto tempo atua na escola?

09 – Que ações/projetos a escola desenvolve ou já desenvolveu no sentido de

trabalhar a relação homem e meio ambiente junto a comunidade?

10 - Como você avalia a eficiência dessas ações?

11 - Alguma ação deixou de ser implementada? Por que?

12 – No seu entendimento as ações de governo satisfazem as necessidades no que

se refere a educação ambiental?

13 – Que ações ambientais estão previstas para os anos futuros?

14 - Você considera o currículo escolar um instrumento importante na construção de

ações, projetos e políticas voltadas para a educação ambiental?

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

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APÊNDICE - B ROTEIRO DE ENTREVISTA - PROFESSORES DA ESCOLA.

01 – Nome e formação do professor?

02 – Tempo de atuação no magistério?

03 – O que você entende por educação ambiental?

04 – Como você entende a relação homem/meio ambiente na comunidade de São

Miguel?

05 – Desenvolve alguma prática voltada a educação ambiental?

06 – Atualmente está fazendo algum curso de aperfeiçoamento profissional

relacionado a educação ambiental?

07 – Quais as maiores dificuldades em trabalhar a educação ambiental na escola?

08 – Como funciona o apoio pedagógico na escola no sentido de desenvolver a

educação ambiental?

09 – Há quanto tempo está na comunidade?

10 – Há quanto tempo atua na escola?

11 – Que ações/projetos a escola desenvolve ou já desenvolveu no sentido de

trabalhar a relação homem e meio ambiente junto a comunidade?

12 - Como você avalia a eficiência dessas ações?

13 - Alguma ação deixou de ser implementada? Por que?

14 – Que ações ambientais estão previstas para os anos futuros?

15 - Você considera o currículo escolar um instrumento importante na construção de

ações, projetos e políticas voltadas para a educação ambiental?

16 – A escola possui algum projeto sistemático de apoio a pratica ambiental? Como

funciona?

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

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APÊNDICE C ROTEIRO DE ENTREVISTA - MEMBROS DA COMUNIDADE DE SÃO MIGUEL DO FLEXAL.

01 – Nome e nível de escolaridade?

02 – Tempo em que vive na comunidade?

03 – O que você entende por educação ambiental?

04 – Que ocupação desenvolve na comunidade?

05 – O que entende sobre educação ambiental?

06 – Obteve alguma informação sobre educação ambiental na escola?

07 – Consegue observar algum tipo de mudança no seu modo de vida nos últimos

anos?

08 – Consegue observar alterações no ambiente natural da comunidade de São

Miguel do Flexal? Que alterações são essas?

09 - De maneira geral, o que as pessoas da comunidade fazem para sobreviver?

Que tipo de trabalho desenvolvem?

10 – No seu modo de entender, existe alguma relação entre a forma como as

pessoas da comunidade estão trabalhando/subsistindo e alteração do estilo de vida,

natureza, em especial com as plantas/flora?

11 - No seu entendimento existe dificuldades em manter o equilíbrio entre

comunidade e meio ambiente?

12 – Se existem dificuldades, quais são?

13 – Você considera importante e necessário manter uma relação equilibrada com o

meio ambiente? Por quê?

13 – No seu entendimento o trabalho desenvolvido pela escola contribui de alguma

forma para este equilíbrio?

14 – Buscando em suas recordações, você poderia relatar como se davam as

relações entre comunidade e meio ambiente em anos passados, no tempo em que

você era estudante?

15 – Você consegue ver possibilidades de melhorar a relação entre comunidade e

meio ambiente?

16 - No seu entendimento que fatores poderiam alterar esta relação?

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

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APÊNDICE D

ROTEIRO DE ENTREVISTA - ALUNOS DA ESCOLA.

01 – Qual o seu nome?

02 – Qual a sua idade?

03 – Como você vem para escola?

04 – Quantas pessoas têm na sua família?

05 – Que tipo de tarefa você mais gosta aqui na escola?

06 – O professor leva a turma de vocês para atividades fora da sala de aula?

07 – Que plantas você conhece?

08 – Que animais você conhece?

09 – A professora já falou de alguma planta ou animal que você conhece?

10 – O professor já fez alguma atividade usando plantas e animais conhecidos por

você?

11 – Que histórias sobre plantas e animais você já ouviu dos seus pais ou aqui na

escola?

12 – Tem alguma planta ou animal que serve para remédio? Já usou algum?

13 - Você lembra de plantas e animais que servem para alimento? Pode me dizer

alguns usados em sua casa?

14 – Qual a época do ano que você mais gosta? Por quê?

15 – Você mudaria alguma coisa na sua escola? O quê?

16 – Você mudaria alguma coisa na sua comunidade? O quê?

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

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APÊNDICE E – GUIA DE OBSERVAÇÃO: PRÁTICAS DOS PROFESSORES NA

EDUCAÇÃO AMBIENTAL.

ESCOLA SÃO MIGUEL DO FLEXAL

PROFESSOR: ________________________________________________________

TURMA:_____________________________________________________________

Indicadores Aula 1 Aula 2 Aula 3 Aula 4 Aula 5 Aula 6 Aula 7 Aula 8 Aula 9 Aula

10

Propõe atividades sobre

educação ambiental

Propõe tarefas fora de

classe, com objetivo de

observar e analisar o

meio ambiente.

Trabalha a educação

ambiental por meio de

textos.

Usa algum tipo de vídeo

educativo voltado a

temática ambiental.

Estimula os alunos a

refletir sobre o ambiente

em que vivem

Propõe atividades em

grupo

Proporciona atividades

socializadoras

Formula perguntas aos

alunos

Responde as perguntas

dos alunos

Ajuda no

desenvolvimento das

ideias dos alunos

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

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APÊNDICE F – GUIA DE OBSERVAÇÃO: APRENDIZAGEM DOS

ALUNOS/EDUCAÇÃO AMBIENTAL

ESCOLA SÃO MIGUEL DO FLEXAL

PROFESSOR:__________________________________________________________

TURMA:______________________________________________________________ Indicadores Aula 1 Aula 2 Aula 3 Aula 4 Aula 5 Aula 6 Aula 7 Aula 8 Aula 9 Aula 10

Respondem as

atividades escritas

Respondem as

perguntas diretas feitas

pelos professores

Questionam os

professores por

iniciativa própria

Realizam as tarefas de

casa

Conseguem fazer

leituras de textos Sobre

educação ambiental

Conseguem interpretar

textos sobre educação

ambiental

Conseguem produzir

textos sobre educação

ambiental

Apresentam algum tipo

de preocupação com o

meio ambiente

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

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APÊNDICE G - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO –

COMUNIDADE EM GERAL

Esta pesquisa de campo terá como tema “Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na

comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá” e será desenvolvida por Márcio Moreira Monteiro, doutorando do

Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática - REAMEC, sob a orientação do Prof. Dr. Germano

Guarim Neto.

A finalidade deste trabalho caracteriza-se por um intenso exercício de reflexão sobre as condições e experiências de

vida compartilhadas na comunidade de são Miguel, assim como, da relação comunidade/natureza, caracterizada por

singularidades e subjetividades, apontando para a elaboração de um estudo que sirva de instrumento científico e de consulta à

educandos e educadores que buscam em suas vidas profissionais e acadêmicas a construção de um novo fazer pedagógico,

preocupado com a qualidade de vida e educacional na extensa e diversificada região amazônica. A proposta de pesquisa

apresentada subsidiará construção de Tese doutoral, bem como, a publicação de artigos em eventos e revistas científicas.

Você está sendo convidado (a) a participar, como voluntário (a), de uma pesquisa cujos dados serão

utilizados na elaboração da Tese de Doutorado em Educação em Ciências e Matemática, caso você concorde em

participar, favor assinar ao final do documento o qual foi elaborado em duas vias originais. Assim, solicita-se a sua

colaboração por meio de entrevista e análise de dados oficiais, permitindo os registros fotográficos na Escola Estadual São

Miguel do Flexal, que venham a contribuir para esta pesquisa de campo, como também a sua autorização para apresentar os

resultados deste estudo em eventos da área da Educação e/ou áreas afins a esta temática. Por ocasião da publicação dos

resultados, seu nome será mantido em sigilo.

Ressalta-se que a sua participação no estudo será voluntária e, portanto, o(a) senhor(a) não é obrigado(a)

a fornecer as informações e/ou colaborar com as atividades solicitadas pelo pesquisador, onde o mesmo estará a sua

disposição para qualquer esclarecimento que considere necessário em qualquer etapa da pesquisa.

Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser

contatado em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora:

Profa. Dra. Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro

Diante do exposto, declaro que fui devidamente esclarecido (a) e dou o meu consentimento na autorização desta

pesquisa de cunho científico e para publicação dos resultados. Estou ciente que receberei uma via desse documento.

_________________________________________

Nome do participante (em letra de forma)

______________________________________

Assinatura do Participante da Pesquisa

______________________________________

Assinatura da Testemunha

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor entrar em contato com o pesquisador Márcio

Moreira Monteiro.

Contato (96) 999627718 - 981282876

E-mail: [email protected]

[email protected]

Atenciosamente,

______________________________________

Márcio Moreira Monteiro

Pesquisador

Pracuúba, _____ de __________________de 201__.

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

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143

APÊNDICE H - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA O

(A) PARTICIPANTE DA PESQUISA - DIRETORA

Eu, __________________________________________________________________, RG nº ___________________,

diretor(a) da E.E. São Miguel do Flexal declaro compreender meus direitos como participante desta pesquisa intitulada

“Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá”,

orientada pelp Prof. Dr. Germano Guarim Neto e que tem como pesquisador responsável Márcio Moreira Monteiro,

doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática – REAMEC.

Nesta pesquisa pretende-se compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade

de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o ensino de

ciências desenvolvido na escola local.

O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será obtido pelo pesquisador Márcio Moreira Monteiro que irá realizar

observações diretas, vídeos, gravações, entrevistas e demais registros pertinentes à construção. O referido pesquisador

esclareceu o seguinte:

A participação na pesquisa será no sentido de permitir a filmagem e gravações de áudio nas atividades com as crianças, que

após serem avaliadas e transcritas serão unitarizadas e categorizadas por meio da análise textual discursiva. A identificação

será feita por um nome fictício escolhido pelo pesquisador, caso não concorde, a pesquisa não a identificará de nenhuma

forma. Os resultados da pesquisa serão publicados em parceria com o orientador da pesquisa. Não terá nenhum gasto e ganho

financeiro por participar da pesquisa. Não existem riscos nessa pesquisa e os benefícios serão no sentido de compreender os

efeitos das condições educacionais e socioeconômicas nos modos de vida/produção e subsistência dessa comunidade. Você é

livre para deixar de participar da pesquisa a qualquer momento sem nenhum prejuízo ou coação.

Este termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada pelo

pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com padrões

profissionais de sigilo, atendendo a legislação brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde),

utilizando as informações somente para os fins acadêmicos e científicos.

Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser contatado

em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora: Profa. Dra.

Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro

Qualquer dúvida a respeito da pesquisa, você pode entrar em contato com a Prof. Dr. Germano Guarim Neto

([email protected]) e pesquisador Márcio Moreira Monteiro (monteiromm3@gmail)

________________________________

Assinatura do pesquisador

_______________________________

Assinatura do orientador da pesquisa

________________________________

Assinatura do participante da pesquisa

Pracuúba, ___de______________ de 201__.

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.

APÊNDICE I - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA O

(A) PARTICIPANTE DA PESQUISA - COORDENADOR(A) PEDAGÓGICO(A)

Eu, __________________________________________________________________, RG nº ___________________,

coordenador(a) pedagógico(a) da E.E. São Miguel do Flexal declaro compreender meus direitos como participante desta

pesquisa intitulada “Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do

Flexal/Pracuúba/Amapᔹ, orientada pelo Prof. Dr. Germano Guarim Neto e que tem como pesquisador responsável

Márcio Moreira Monteiro, doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática –

REAMEC.

Nesta pesquisa pretende-se compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na

comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o

ensino de ciências desenvolvido na escola local. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será obtido pelo pesquisador Márcio Moreira Monteiro que irá realizar

observações diretas, vídeos, gravações, entrevistas e demais registros pertinentes à construção. O referido pesquisador

esclareceu o seguinte:

A participação na pesquisa será no sentido de permitir a filmagem e gravações de áudio nas atividades com as crianças, que

após serem avaliadas e transcritas serão, unitarizadas e categorizadas por meio da análise textual discursiva. A identificação

será feita por um nome fictício escolhido pelo pesquisador, caso não concorde, a pesquisa não a identificará de nenhuma

forma. Os resultados da pesquisa serão publicados em parceria com o orientador da pesquisa. Não terá nenhum gasto e ganho

financeiro por participar da pesquisa. Não existem riscos nessa pesquisa e os benefícios serão no sentido de compreender os

efeitos das condições educacionais e socioeconômicas nos modos de vida/produção e subsistência dessa comunidade. Você é

livre para deixar de participar da pesquisa a qualquer momento sem nenhum prejuízo ou coação.

Este termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada pelo

pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com padrões

profissionais de sigilo, atendendo a legislação brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde),

utilizando as informações somente para os fins acadêmicos e científicos.

Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser contatado

em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora: Profa. Dra.

Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro.

Qualquer dúvida a respeito da pesquisa, você pode entrar em contato com a Prof. Dr. Germano Guarim Neto

([email protected]) e pesquisador Márcio Moreira Monteiro ([email protected]

________________________________

Assinatura do pesquisador

_______________________________

Assinatura do orientador da pesquisa

Assinatura do participante da pesquisa

Pracuúba,____ de______ de 201__.

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APÊNDICE J - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA O

(A) PARTICIPANTE DA PESQUISA – PROFESSOR (A)

Eu, __________________________________________________________________, RG nº ___________________,

professor(a) da E.E. São Miguel do Flexal declaro compreender meus direitos como participante desta pesquisa intitulada

“Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá”,

orientada pelp Prof. Dr. Germano Guarim Neto e que tem como pesquisador responsável Márcio Moreira Monteiro,

doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática – REAMEC.

Nesta pesquisa pretende-se compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade

de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o ensino de

ciências desenvolvido na escola local. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será obtido pelo pesquisador Márcio Moreira Monteiro que irá realizar

observações diretas, vídeos, gravações, entrevistas e demais registros pertinentes à construção. O referido pesquisador

esclareceu o seguinte:

A participação na pesquisa será no sentido de permitir a filmagem e gravações de áudio nas atividades com as crianças, que

após serem avaliadas e transcritas serão, unitarizadas e categorizadas por meio da análise textual discursiva. A identificação

será feita por um nome fictício escolhido pelo pesquisador, caso não concorde, a pesquisa não a identificará de nenhuma

forma. Os resultados da pesquisa serão publicados em parceria com o orientador da pesquisa. Não terá nenhum gasto e ganho

financeiro por participar da pesquisa. Não existem riscos nessa pesquisa e os benefícios serão no sentido de compreender os

efeitos das condições educacionais e socioeconômicas nos modos de vida/produção e subsistência dessa comunidade. Você é

livre para deixar de participar da pesquisa a qualquer momento sem nenhum prejuízo ou coação.

Este termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada pelo

pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com padrões

profissionais de sigilo, atendendo a legislação brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde),

utilizando as informações somente para os fins acadêmicos e científicos.

Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser contatado

em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora: Profa. Dra.

Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro

Qualquer dúvida a respeito da pesquisa, você pode entrar em contato com a Prof. Dr. Germano Guarim Neto

([email protected]) e pesquisador Márcio Moreira Monteiro ([email protected]

________________________________

Assinatura do pesquisador

_______________________________

Assinatura do orientador da pesquisa

Assinatura do participante da pesquisa

Pracuúba, __de ________de 201__.

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APÊNDICE K - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA O (A) PARTICIPANTE DA PESQUISA – PAIS OU RESPONSÁVEIS

Eu, __________________________________________________________________, RG nº ___________________,

declaro saber da participação de meu (minha) filho (a) ______________________________________ na pesquisa

“Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá¹,

desenvolvida na E.E. São Miguel do Flexal, pelo pesquisador Márcio Moreira Monteiro, sob orientação do Prof. Dr.

Germano Guarim Neto. Qualquer dúvida a respeito da pesquisa, você pode entrar em contato com a Prof. Dr. Germano

Guarim Neto ([email protected]) e pesquisador Márcio Moreira Monteiro ([email protected]).

O presente trabalho pretende compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na

comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o

ensino de ciências desenvolvido na escola local.

Os instrumentos utilizados na pesquisa consistirão em observações, vídeos, gravações e entrevistas com as

professores, crianças e membros da comunidade por meio da análise textual discursiva, unitarizando e categorizando os dado.

As cenas das crianças filmadas em sua rotina escolar, após serem avaliadas serão transcritas no sentido de facilitar a análise.

Compreendo que tenho a liberdade de retirar o meu consentimento em qualquer fase da pesquisa, sem penalização alguma. A

qualquer momento posso buscar maiores esclarecimentos, inclusive relativos à metodologia do trabalho.

Este termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada

pelo pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com

padrões profissionais de sigilo, atendendo a legislação brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de

Saúde), utilizando as informações somente para os fins acadêmicos e científicos.

Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser

contatado em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora:

Profa. Dra. Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro

Os responsáveis pela pesquisa garantem o sigilo que assegure a privacidade dos sujeitos quanto aos dados

envolvidos na pesquisa. Também concordo que meu (minha) filho (a) possa escolher um nome fictício para ser colocado no

texto da pesquisa para não ser identificado pelo seu nome de nascimento. Eu concordo com o uso de imagem da minha

criança para o trabalho e questão. Declaro compreender que as informações obtidas só podem ser usadas para fins científicos,

de acordo com a ética na pesquisa e que esta participação não comporta qualquer remuneração.

Nome escolhido pelo menor:______________________________________________

Pracuúba, ________de _____________________ de 201____.

_________________________________________________________________

Assinatura dos pais ou responsáveis

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APÊNDICE L - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA O (A) PARTICIPANTE DA PESQUISA – FUNCIONÁRIO DA ESCOLA

Eu, __________________________________________________________________, RG nº ___________________,

funcionário (a) da Escola Estadual São Miguel do Flexal, declaro compreender meus direitos como participante desta

pesquisa intitulada “Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do

Flexal/Pracuúba/Amapá”, orientada pelp Prof. Dr. Germano Guarim Neto e que tem como pesquisador responsável

Márcio Moreira Monteiro, doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática –

REAMEC.

Nesta pesquisa pretende-se compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade

de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o ensino de

ciências desenvolvido na escola local.

O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será obtido pelo pesquisador Márcio Moreira Monteiro que irá realizar

observações diretas, vídeos, gravações, entrevistas e demais registros pertinentes à construção. O referido pesquisador

esclareceu o seguinte:

A participação na pesquisa será no sentido de permitir a filmagem e gravações de áudio nas atividades com as crianças, que

após serem avaliadas e transcritas serão, unitarizadas e categorizadas por meio da análise textual discursiva. A identificação

será feita por um nome fictício escolhido pelo pesquisador, caso não concorde, a pesquisa não a identificará de nenhuma

forma. Os resultados da pesquisa serão publicados em parceria com o orientador da pesquisa. Não terá nenhum gasto e ganho

financeiro por participar da pesquisa. Não existem riscos nessa pesquisa e os benefícios serão no sentido de compreender os

efeitos das condições educacionais e socioeconômicas nos modos de vida/produção e subsistência dessa comunidade. Você é

livre para deixar de participar da pesquisa a qualquer momento sem nenhum prejuízo ou coação.

Este termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada pelo

pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com padrões

profissionais de sigilo, atendendo a legislação brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde),

utilizando as informações somente para os fins acadêmicos e científicos.

Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser contatado

em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora: Profa. Dra.

Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro

Qualquer dúvida a respeito da pesquisa, você pode entrar em contato com a Prof. Dr. Germano Guarim Neto

([email protected]) e pesquisador Márcio Moreira Monteiro ([email protected]).

________________________________

Assinatura do pesquisador

_______________________________

Assinatura do orientador da pesquisa

__________________________________________

Assinatura do participante da pesquisa

Pracuúba, ___de _______________ de 201__.

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APÊNDICE M - TERMO DE ASSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

(Anuência do participante da pesquisa, criança, adolescente ou legalmente incapaz)

Você está sendo convidado (a) como voluntário (a) a participar da pesquisa “Comunidade, educação e meio ambiente: um

estudo de caso na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá”. Nesta pesquisa pretendemos compreender em que

termos as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP

influenciam a alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, o ensino de ciências desenvolvido na escola local.

O motivo que nos leva a estudar esse assunto é de compreender as experiências compartilhadas na comunidade, bem como, a

relação que se estabelece com a natureza e o ensino de ciências na Escola São Miguel do Flexal.

Para esta pesquisa adotaremos o(s) seguinte(s) procedimento(s): observações diretas, vídeos, gravações, entrevistas, produção

de imagens e registros escritos pertinentes à construção do trabalho.

Para participar desta pesquisa, o responsável por você deverá autorizar e assinar um termo de consentimento. Você não terá

nenhum custo, nem receberá qualquer vantagem financeira. Apesar disso, caso sejam identificados e comprovados danos

provenientes desta pesquisa, você tem assegurado o direito à indenização. Você será esclarecido (a) em qualquer aspecto que

desejar e estará livre para participar ou recusar-se. O responsável por você poderá retirar o consentimento ou interromper a

sua participação a qualquer momento. A sua participação é voluntária e a recusa em participar não acarretará qualquer

penalidade ou modificação na forma em que é atendido (a). O pesquisador irá tratar a sua identidade com padrões

profissionais de sigilo. Você não será identificado em nenhuma publicação. Não existem riscos nessa pesquisa e os benefícios

serão no sentido de compreender os efeitos das condições educacionais e socioeconômicas nos modos de vida/produção e

subsistência dessa comunidade.

Este estudo será submetido ao CEP humanidades da Universidade Federal de Mato Grosso, que poderá ser contatado

em caso de questões éticas, pelo telefone: (65) 3615-8935, e-mail: [email protected]).Coordenadora: Profa. Dra.

Rosangela Kátia Sanches Mazzorana Ribeiro

Os resultados estarão à sua disposição quando finalizada. Seu nome ou o material que indique sua participação não será

liberado sem a permissão do responsável por você. Os dados e instrumentos utilizados na pesquisa ficarão arquivados com o

pesquisador responsável por um período de 5 anos, e após esse tempo serão destruídos. Este termo de consentimento

encontra-se impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada pelo pesquisador responsável, e a outra será

fornecida a você. Os pesquisadores tratarão a sua identidade com padrões profissionais de sigilo, atendendo a legislação

brasileira (Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde), utilizando as informações somente para os fins acadêmicos

e científicos.

Eu, __________________________________________________, fui informado (a) dos objetivos da presente pesquisa, de

maneira clara e detalhada e esclareci minhas dúvidas. Sei que a qualquer momento poderei solicitar novas informações, e o

meu responsável poderá modificar a decisão de participar se assim o desejar. Tendo o consentimento do meu responsável já

assinado, declaro que concordo em participar dessa pesquisa. Recebi o termo de assentimento e me foi dada a oportunidade

de ler e esclarecer as minhas dúvidas.

Nome escolhido pelo menor:_______________________________________________________________________

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor entrar em contato com o pesquisador Márcio Moreira

Monteiro.

Contato (96) 999627718 – 981282876 E-mail: [email protected]; [email protected]

Pracuúba, ____ de ______________ de 201__.

____________________________________ Assinatura do (a) menor

____________________________________

Assinatura do (a) pesquisador (a)

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ANEXO

PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE

FEDERAL DE MATO GROSSO

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150

HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE

MATO GROSSO

PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP

DADOS DO PROJETO DE PESQUISA

Título da Pesquisa: ¿Comunidade, educação e meio ambiente: um estudo de caso na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/Amapá¿

Pesquisador: márcio moreira monteiro

Área Temática:

Versão: 3

CAAE: 57881016.0.0000.5690

Instituição Proponente: Universidade Federal de Mato Grosso

Patrocinador Principal: Financiamento Próprio

DADOS DO PARECER

Número do Parecer: 1.771.229

Apresentação do Projeto:

A presente proposta de pesquisa focaliza como eixo central de investigação, a

compreensão sobre as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade e

suas influências na alteração ou conservação do meio ambiente, bem como, no ensino de

ciências desenvolvido na escola local. Busca-se, com este estudo, realizar um intenso

exercício de reflexão sobre as condições educacionais e socioeconômicas

experimentadas nessa região, assim como, da relação comunidade/natureza,

caracterizada por singularidades, visto sua localização e seus aspectos sociais, culturais,

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Endereço: Rua Fernando Correa da Costa, 2367

Bairro: BOA ESPERANCA

CEP: 78.060-900

UF: MT

Telefone:

Município:

(65)3615-8935

CUIABA

E-mail: [email protected]

Página 150 de

05

HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE

MATO GROSSO 151

ambientais e econômicos. Neste sentido, observa-se a necessidade de trazer para a

discussão científica tal realidade educacional, pois, entende-se que a partir dela será

possível um olhar diferenciado sobre a educação no referido espaço amazônico.

Objetivo da Pesquisa:

Objetivo Primário:

Compreender em que termos as condições e experiências de vida compartilhadas na

comunidade de Miguel do Flexal/Pracuúba/AP influenciam a alteração ou conservação do

meio ambiente, bem como, o ensino de ciências desenvolvido na escola local.

Objetivos Secundários:

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Endereço: Rua Fernando Correa da Costa, 2367

Bairro: BOA ESPERANCA

CEP: 78.060-900

UF: MT

Telefone:

Município:

(65)3615-8935

CUIABA

E-mail: [email protected]

Página 151 de

05

HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE

MATO GROSSO 152

- Constatar a relação estabelecida entre moradores da comunidade e alteração ou conservação do meio

ambiente;

- Analisar o ensino de ciências desenvolvido na escola e qual sua relação com o saber local;

- Preparar material que permita o aproveitamento dos dados catalogados para uso na Escola manifestando-

se na relação ensino-aprendizagem.

Avaliação dos Riscos e Benefícios:

Riscos:

Considerando da resolução 510/16 CNS, em especial no que concerne ao seus artigos 18,

19, 20 e 21, informo que a pesquisa apresenta riscos mínimos aos participantes,

considerando que nesse tipo de pesquisa, com caráter dialógico, os riscos estariam "no

potencial de causar danos maiores do que os existentes na vida cotidiana". Em razão dos

riscos mínimos apresentados, o pesquisador estará atento a qualquer alteração no sentido

de desvirtuar as ações cotidianas dos participantes, se comprometendo, caso ocorra algo

fora dos padrões éticos estabelecidos, em encerrar imediatamente a pesquisa e informar o

sistema CEP/CONEP, lembrando sempre, que esta pesquisa é concebida, sustentada na

resolução 510/16, no sentido de prever e evitar possíveis danos aos participantes, e para

garantir que isto ocorra, são assinados termos (anexos) que garantem o "respeito aos

valores culturais, sociais, morais e religiosos, bem como aos hábitos e costumes, dos

participantes das pesquisas" (art. 3º, III).

Benefícios:

Com fundamento no artigo 2º,III da resolução 510/16 CSN, o qual estabelece que

benefícios são "contribuições atuais ou potenciais da pesquisa para o ser humano, para

a comunidade na qual está inserido e para a sociedade, possibilitando a promoção de

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HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE

MATO GROSSO

Endereço: Rua Fernando Correa da Costa, 2367

Bairro: BOA ESPERANCA

CEP: 78.060-900

UF: MT

Telefone:

Município:

(65)3615-8935

CUIABA

E-mail: [email protected]

Página 152 de

05

153

- Identificar as condições e experiências de vida compartilhadas na comunidade de São Miguel do Flexal;

qualidade digna de vida, a partir do respeito aos direitos civis, sociais, culturais e a um

meio ambiente ecologicamente equilibrado" é que se pretende que esta proposta de

pesquisa aponte para a elaboração de um estudo que sirva de instrumento científico e de

consulta à educandos, educadores e membros da comunidade, preocupados com a

mehoria da qualidade de vida e educacional na extensa e diversificada região amazônica,

em especial na comunidade de São Miguel do Flexal/Pracuúba/AP. Além disso, pretende-

se preparar material a partir dos dados coletados com a finalidade de subsidiar o trabalho

pedagógico da escola de São Miguel, em busca de uma educação ambiental e um

ensino de ciências que se volte para os saberes locais.

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Endereço: Rua Fernando Correa da Costa, 2367

Bairro: BOA ESPERANCA

CEP: 78.060-900

UF: MT

Telefone:

Município:

(65)3615-8935

CUIABA

E-mail: [email protected]

Página 154 de

05

HUMANIDADES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE

MATO GROSSO 154

Comentários e Considerações sobre a Pesquisa:

A pesquisa é relevante para a comunidade acadêmica e não acadêmica.

O item relativo aos grupos de pesquisa do campo "Intervenções a serem realizadas" ainda

não está definido separando a comunidade escolar em seus grupos menores (diretor,

coordenadores, professores, alunos e seus responsáveis), mas há a descrição, mesmo

que sucinta dos procedimentos a serem realizados.

Considerações sobre os Termos de apresentação obrigatória:

Apresenta os termos como segue: folha de rosto devidamente assinada; projeto e

informações básicas do projeto; autorização da instituição para realização da pesquisa,

roteiros para entrevista com aluno, professor, diretor/coordenador da escola e pessoas da

comunidade, roteiro de observação de aula e TCLE, contendo os dados, informações,

resguardando os direitos aos participantes de forma adequada.

Recomendações:

Sem recomendações.

Conclusões ou Pendências e Lista de Inadequações:

Todas as pendências e solicitações foram atendidas.

Considerações Finais a critério do CEP:

Considerando as Resoluções 466/2012 e 510/2016, e, uma vez que a documentação

apresentada atende ao solicitado, emitiu-se o parecer para o presente projeto: Aprovado.

Conforme as Resoluções 466/12 e 510/2016, é atribuição do CEP acompanhar o

desenvolvimento dos projetos, por meio de relatórios semestrais dos pesquisadores e de

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Bairro: BOA ESPERANCA

CEP: 78.060-900

UF: MT

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E-mail: [email protected]

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MATO GROSSO 155

outras estratégias de monitoramento, de acordo com o risco inerente a pesquisa. Por isso

o(a) pesquisador(a) responsável deverá encaminhar para o CEP/Humanidades/UFMT os

relatórios parciais a cada seis meses e o Relatório Final de seu projeto, até 30 dias após o

seu término.

Este parecer foi elaborado baseado nos documentos abaixo relacionados:

Tipo Documento Arquivo Postagem Autor Situação

Informações Básicas do Projeto

PB_INFORMAÇÕES_BÁSICAS_DO_P ROJETO_754054.pdf

13/09/2016 22:48:37

Aceito

Declaração de Pesquisadores

decla.jpg 13/09/2016 22:47:10

márcio moreira monteiro

Aceito

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Outros Termo_resp_modificado2.docx 13/09/2016 22:31:09

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros Termo_assentimento_modificado2.doc 13/09/2016 22:30:10

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros Termo_prof_modificado.docx 15/08/2016 18:11:21

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros Termo_func_modificado.docx 15/08/2016 18:09:30

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros Termo_diretor_modificado.doc 15/08/2016 18:07:30

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros Termo_coord_modificado.docx 15/08/2016 18:06:27

márcio moreira monteiro

Aceito

TCLE / Termos de Assentimento / Justificativa de Ausência

TCLE_modificado.doc 15/08/2016 18:03:05

márcio moreira monteiro

Aceito

Projeto Detalhado / Brochura Investigador

Projeto_comunidade.doc 15/07/2016 00:58:54

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros Guia_aluno.docx 15/07/2016 00:54:17

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros guia_professor.docx 15/07/2016 00:53:45

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros Entrevista_aluno.docx 15/07/2016 00:53:06

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros Entrevista_professor.docx 15/07/2016 00:51:39

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros Entrevista_comunidade.docx 15/07/2016 00:50:04

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros Entrevista_diretor_coordenador.docx 15/07/2016 00:46:19

márcio moreira monteiro

Aceito

Outros aceite.pdf 14/07/2016 14:39:06

márcio moreira monteiro

Aceito

Folha de Rosto folha.pdf 14/07/2016 14:35:15

márcio moreira monteiro

Aceito

Situação do Parecer:

Aprovado

Necessita Apreciação da CONEP:

Não

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CUIABA, 11 de Outubro de

2016

Assinado por:

Rosangela Kátia Sanches

Mazzorana Ribeiro

(Coordenador)