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Comunicação Pública de Ciência – Um Guia para Cientistas Manuel Leite Valença Outubro, 2015 Trabalho de Projeto Mestrado em Comunicação de Ciência

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Comunicação Pública de Ciência – Um Guia para Cientistas

Manuel Leite Valença

Manuel Leite Valença

Outubro, 2015

Trabalho de Projeto

Mestrado em Comunicação de Ciência

Trabalho de Projeto apresentado para cumprimento dos requisitos necessários à

obtenção do grau de Mestre em Comunicação de Ciência

realizado sob a orientação científica da Doutora Ana Maria Beirão da la Fuente Sanchez

(Professora auxiliar convidada do Instituto de Tecnologia Química e Biológica da

Universidade Nova de Lisboa) e

orientação externa da Doutora Maria Carla Ribeiro Kullberg

(Professora auxiliar da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa).

Comunicação Pública de Ciência – Um Guia para Cientistas

Manuel Leite Valença

RESUMO

PALAVRAS-CHAVE: Comunicação de Ciência, Comunicação Pública Direta de Ciência,

Cientistas, Estratégias de comunicação, Comunicação verbal e não-verbal

A comunicação de ciência tem conhecido um enorme desenvolvimento nas últimas décadas como disciplina científica de seu próprio direito. No entanto, continua a ser uma disciplina com tensões internas dada a sua natureza multidisciplinar, o que implica um constante equilíbrio entre a teoria e as evidências empíricas que surgem da prática diária. A comunicação de ciência apresentou ao longo de tempo, diferentes conceções, não só do público, mas também de quais as melhores estratégias a implementar, de forma a alcançar os seus objetivos.

Tensões existem também no interior da comunidade científica, a quem a sociedade exige um crescente empenho no desenvolvimento de práticas comunicacionais integrativas do público não-especializado. A falta de tempo e capacidades individuais, ou a falta de reconhecimento institucional e dos pares, ou ainda a falta de suporte logístico podem inibir alguns cientistas no momento de desenvolverem estas ações de ligação com a sociedade. Contudo, esta mesma comunidade reconhece e aceita a importância do seu papel na sociedade e possui uma ‘sensação de dever’ que os impele a continuar a dialogar com o público.

Se existe vontade, existe solução! No entanto, os esforços dos cientistas não devem ser realizados de forma isolada e descontextualizada. No sentido de uma melhoria contínua da qualidade das ações de comunicação pública implementadas pelos cientistas, existem já bastantes exemplos de boas-práticas e possibilidades de formação disponíveis a toda a comunidade científica.

O ‘desenhar’ de uma eficiente estratégia de comunicação é a base para o sucesso. Seja através de ações de comunicação pública direta ou indireta, uma planificação atempada produz certamente uma melhoria da qualidade das ações desenvolvidas, uma redução do esforço exigido ao cientista e principalmente, um aumento dos impactos desejados na sociedade.

As instituições científicas, como as universidades por exemplo, apresentam já indícios de uma crescente preocupação com esta área e começam a disponibilizar recursos humanos, materiais e financeiros aos ´seus’ cientistas, para os ajudar na realização destas ações. No entanto, apenas a prática e a experiência acumulada trará confiança aos cientistas para continuarem a melhorar o seu diálogo com o público não especializado. A prática faz a perfeição.

Science Communication – A practical guide for scientists

Manuel Leite Valença

ABSTRACT

KEYWORDS: Science Communication, Direct Science Communication, Scientists,

Communication strategies, Verbal and nonverbal communication

In the last decades, Science Communication has experienced, a huge development as a main discipline. However, there are still some internal tensions precisely due to its multidisciplinary nature, which implies the need for a constant balance between the theory and the evidence resulting from daily practice. Science communication as a field, has had different conceptions through time, concerning its public and what it wants, and also which are the best strategies to achieve its goals.

Even inside the scientific community, such tensions also occur, as society increasingly demands more efforts from researchers to engage with the non-specialists. Shortage of time and personal skills, lack of formal recognition from the institutions and from their peers, as well as lack of support can discourage some of the scientists engaging in science communication activities. However, this same community also recognises and accepts its own responsibility in playing the main role when communicating science with and for society.

If there´s a will, there´s a way! However, this effort must not be done in a ‘lone ranger’ style. Aiming for a continuous improvement in the quality of science communication activities, there are, numerous examples of best practices and science communication workshops available for all the scientific community, specifically designed to help scientists in this task.

The framing of an efficient communication strategy is the key to success. Whether through the use of direct or indirect science communication, a well-timed strategy can improve the quality of a science communication activity, reduce the effort demanded from the scientist and most importantly, achieve a greater impact in society.

Scientific institutions are already paying much more attention to the importance of science communication, and begun to provide their in house scientists with human, material and financial resources to assist them in performing these actions. However, only through practical experience scientists will be able to improve and gain more positive attitudes towards communicating with the public. The best way is doing it.

Índice

INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 1

CAPÍTULO 2 - A COMUNICAÇÃO E A CIÊNCIA ..................................................... 3

2.1 - A comunicação ........................................................................................................................... 3

2.2 - Teorias da comunicação ............................................................................................................. 5

2.3 - Modelos de comunicação .......................................................................................................... 8

2.4 - O Marketing ............................................................................................................................. 10

2.5 - A Comunicação de Ciência ....................................................................................................... 13

2.6 - A Comunicação de Ciência e o Marketing ................................................................................ 16

2.7 - A Comunicação de Ciência e a Educação de Ciência ................................................................ 19

2.8 - A evolução nos paradigmas da Comunicação de Ciência ........................................................ 21

2.9 - Modelos de Comunicação de Ciência ...................................................................................... 27

2.10 - Público ou públicos da Ciência? ............................................................................................. 30

CAPÍTULO 3 – OS CIENTISTAS E A COMUNICAÇÃO PÚBLICA DE CIÊNCIA ........ 36

3.1 – Motivações e dificuldades dos cientistas ................................................................. 36

3.1.1 - Motivações para a Comunicação Pública de Ciência ............................................................ 36

3.1.2 - Dificuldades percecionadas pelos cientistas ......................................................................... 39

3.1.3 - Fatores que influenciam a participação dos cientistas ......................................................... 43

3.1.4 - Formação dos cientistas em Comunicação Pública de Ciência ............................................. 44

3.1.5 - Os cientistas como representantes públicos da ciência ....................................................... 47

3.1.6 - Quem ‘faz’ comunicação de ciência? .................................................................................... 50

3.2 – As instituições, o financiamento científico e a comunicação pública ........................ 52

3.2.1 - As instituições científicas ...................................................................................................... 52

3.2.2 - Os organismos financiadores ................................................................................................ 55

3.2.3 – Sugestões de boas-práticas nas candidaturas a financiamento........................................... 56

CAPÍTULO 4 - A COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA ........................ 68

4.1 – Enquadramento ...................................................................................................... 68

4.1.2 - Comunicação Pública Direta vs. Comunicação Pública Indireta ........................................... 69

4.1.3 - Ações mais frequentes de Comunicação Pública de Ciência ................................................ 71

4.1.4 - Tipologias de ações de Comunicação Pública Direta de Ciência ........................................... 72

4.2 – Sugestões e dicas práticas ....................................................................................... 75

4.2.1 - No papel de convidado ......................................................................................................... 77

4.2.2 - No papel de organizador ....................................................................................................... 82

4.2.3 - Sugestões e dicas em interações públicas ............................................................................ 94

A - Sugestões para apresentações públicas ................................................................................................ 99

B - Sugestões para interações em atividades com grupos ........................................................................ 106

C - Sugestões para interações em ‘stands’ ................................................................................................ 111

CONCLUSÕES ..................................................................................................... 114

BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................... 116

GLOSSÁRIO DOS PRINCIPAIS CONCEITOS DA LITERATURA ................................. 122

Lista de abreviaturas

C&T - Ciência e Tecnologia.

CC – Comunicação de Ciência

CPC – Comunicação Pública de Ciência

CPDC – Comunicação Pública Direta de Ciência

CPIC – Comunicação Pública de Ciência

PUS – Compreensão Pública de Ciência [Public Understanding of Science]

PAS – Perceção Pública de Ciência [Public Awareness of Science]

PEST – Compromisso Público com a Ciência e Tecnologia [Public Engagement With Science

and Technology]

PPSR – Participação Pública na Pesquisa Científica (Ciência Cidadã) [Public Participation in

Scientific Research (Citizen Science)]

NOTA

Em consonância com Burns et al. (2003), a palavra ‘Ciência’ será utilizada ao longo deste guia

como representando genericamente todas as diferentes áreas científicas, suas aplicações e

linguagens. Para facilidade de expressão, os substantivos ´cientista’ e ‘investigador’ serão ao longo

do guia “usados em sentido lato, designando pessoas que trabalham em investigação científica e

tecnológica, independentemente da sua área específica de trabalho” (Granado & Malheiros, 2001).

1

Introdução

O presente guia tem com público-alvo as pessoas que estão ativamente envolvidas na

investigação científica e/ou docência no ensino superior português, o designado ‘cientista’.

Os três principais objetivos deste guia são:

Apresentar uma visão global e evolutiva da disciplina de Comunicação de Ciência;

Sintetizar as dificuldades e motivações da comunidade científica em comunicar com o

público não-especializado;

Fornecer um conjunto integrado e coerente de sugestões para o desenvolvimento

pelos cientistas de atividades com público não especializado.

Por conseguinte, cada um dos capítulos deste guia possui correspondência direta com os objetivos

principais enumerados.

O capítulo 2 “A comunicação e a Ciência”, apresenta uma visão histórica e evolutiva dos Estudos da

Comunicação e da Comunicação de Ciência, desde as razões que impulsionam o ‘nascimento’ destas

áreas, passando pela evolução dos seus paradigmas teóricos até o momento atual. Isto, com o

objetivo de contextualizar ao leitor a Comunicação de Ciência, através das relações que esta

estabelece com o Marketing e a Educação de Ciência. No final do capítulo são ainda apresentadas as

visões do público português e europeu sobre a ciência e os cientistas.

O capítulo 3 “Os Cientistas e a Comunicação Pública de Ciência”, centra a análise nos cientistas e

nas motivações, dificuldades e barreiras que estes enfrentam quando participam em atividades de

comunicação com o público não-especializado. Possuindo as motivações e dificuldades individuais

dos cientistas naturais ligações às conceções que as instituições científicas e organismos de

financiamento científico têm da comunicação de ciência, também estas serão alvo de análise neste

capítulo. Finalmente, são ainda apresentadas algumas sugestões ao leitor, quanto às boas práticas

no preenchimento dos campos relacionados com atividades de comunicação nas candidaturas aos

organismos de financiamento.

Finalmente, o capítulo 4 “A comunicação Pública Direta de Ciência” começa por apresentar ao leitor

as diferenças entre Comunicação Pública Direta e Indireta de Ciência, e as respetivas vantagens e

desvantagens da sua implementação. Possuindo este guia um enfoque na Comunicação Pública

Direta de Ciência, é fornecido ao leitor um conjunto integrado de sugestões para implementação de

2

ações que promovem o contacto direto com o público não especializado, ou seja, no ´terreno´. As

sugestões apresentadas estão estruturas do seguinte modo: 1) Sugestões para implementação: 1a)

O leitor como convidado a participar; 1b) O leitor como organizador; 2) Sugestões para o ato

comunicacional em si: 2a) Em apresentações públicas; 2b) Em interações com grupos; 2c) Em

interações num ‘stand’.

3

Capítulo 2 - A Comunicação e a ciência

“Criámos uma civilização global na qual os elementos fundamentais – os

transportes, as comunicações e todas as outras indústrias: a agricultura, a

medicina, a educação, as diversões, a proteção do meio ambiente e até a

instituição democrática fundamental das eleições – dependem

profundamente da ciência e da tecnologia. Também dispusemos as coisas de

tal modo que quase ninguém compreende a ciência e a tecnologia. Isto é

uma receita para a catástrofe. Podemos continuar durante algum tempo,

mas, mais tarde ou mais cedo, esta mistura explosiva de ignorância e de

poder vai rebentar-nos na cara” (Sagan, 1997 citado por Granado e

Malheiros, 2001, p. 19).

O objetivo principal deste capítulo é o de apresentar ao leitor uma visão sucinta e integrada

da Comunicação de Ciência. Será abordada a evolução dos principais paradigmas teóricos da área ao

longo do tempo, assim como as relações que a Comunicação de Ciência estabelece com o Marketing,

os Estudos da Comunicação e a Educação de Ciência. No final, será ainda apresentada ao leitor uma

síntese dos principais fatores que influenciam a aproximação do público à ciência, assim como uma

caracterização do público português quanto à sua relação com a ciência.

2.1 - A comunicação

A comunicação é um fenómeno que tem acompanhado o homem ao longo de toda a sua

existência. A sobrevivência, a organização em grupo, a divisão das tarefas, a caça, a recoleção e a

confeção de alimentos, os rituais festivos, o estabelecimento de indústrias, a vida parlamentar, a

troca de ideias, as conversas entre amigos, enfim, desde os primórdios que a base da vida do Homem

é a comunicação (Sebastião, 2009).

A comunicação não é, todavia, uma disciplina científica, constituindo-se como o objeto de

confluência entre ciências cognitivas, físicas e sociais. Entre as primeiras distingue-se a psicologia e

no âmbito da qual se estuda a memória, a perceção e a linguagem. As segundas têm por objeto de

estudo os problemas de comunicações suscitados pelos dispositivos tecnológicos comunicantes. Por

fim, no campo das ciências sociais, estudam-se disciplinas como a Ciência Política, a História, a

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Geografia Humana, Economia e Sociologia dos media, Direito da comunicação, Antropologia, o

Estudo das formas culturais, Psicolinguística, Linguística e Semiologia. O confluir de todas estas

disciplinas conferiu aos Estudos da Comunicação uma natureza pluridisciplinar (Cruz, 2002).

A palavra comunicação provém do latim Communis, que significa comum. Só há comunicação

quando o que é transmitido tem um significado comum para os dois pólos: emissor e recetor (Rego,

2010, p. 54). Comunicar implica uma relação de partilha, de passagem do individual ao coletivo,

envolvendo uma troca de mensagens carregadas de significado (Cruz, 2002, p. 12).

Wood (2012, p. 3) define comunicação como um processo sistemático em que as pessoas

interagem com e através de símbolos para criarem e interpretarem significados. Importa

compreender ainda os diferentes modos em que a comunicação se pode concretizar, de acordo com

Rogério Santos (1998, p. 104-107):

Interpessoal: É a forma mais simples de comunicação entre dois ou mais indivíduos.

Contudo, revela-se também a mais complexa dada a sua imprevisibilidade. Permite o diálogo, a

aceitação e rejeição dos pontos de vista, num registo interativo considerado a base do contacto e da

comunicação humana; De massas: Modo de comunicação em que um emissor organiza, elabora e

distribui a informação para uma audiência que, ao longo do tempo, se tem revelado cada vez mais

vasta. Recorre aos meios mais diversos de difusão: imprensa, cinema, televisão, painéis exteriores,

entre outros; Organizacional: Ocorre dentro de uma estrutura ou grupo coerente, visando um

objetivo comum. Dentro deste grupo processa-se também a comunicação interpessoal, no entanto,

esta é limitada por aspetos produtivos ou ideológicos, uma vez que a liberdade de expressão e

intervenção do indivíduo se adapta aos interesses da organização (Sebastião, 2009, p. 27). De

salientar que McQuail adiciona ainda, um quarto modo de comunicação, que é o nível intrapessoal

e que corresponde a um processo mental interno como a reflexão (Serra, 2007).

Por sua vez, a comunicação pode também ser classificada de acordo com os fenómenos

comunicacionais:

Quanto ao tempo: Comunicação direta ou síncrona versus comunicação diferida ou

assíncrona; Quanto ao número: Comunicação interpessoal versus comunicação de massas; Quanto

ao espaço: Comunicação presencial face a face versus comunicação mediatizada à distância; Quanto

ao código: Comunicação verbal que recorre aos signos linguísticos versus comunicação não-verbal,

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em que se utilizam signos como gestos, movimentos, espaços, tempos, desenhos, sons, p. ex.. (Serra,

2007, p. 80).

2.2 - Teorias da comunicação

O estudo da comunicação, reforçado pela sua natureza multidisciplinar e estreita ligação aos

contextos sociais, possui uma evolução complexa, repleta de teorias e conceitos.

Em 1975, Carey distingue as duas principais visões sobre comunicação. Com base no trabalho

de Carey, John Fiske define posteriormente as duas escolas da comunicação: A processual, que

concebe a comunicação como transmissão de mensagens através da qual se procura produzir um

determinado efeito sobre os recetores, se centra nas questões da eficácia e da exatidão da

comunicação e se relaciona sobretudo com as ciências sociais, nomeadamente a sociologia e a

psicologia; A semiótica, que concebe a comunicação como produção e troca de significados

resultantes da interação das pessoas com as mensagens ou textos, centrando-se nas diferenças

culturais entre emissores e recetores e relaciona-se sobretudo com disciplinas como a linguística e o

domínio das artes (Serra, 2007).

Focando, neste guia, a atenção na escola processual podem agora ser identificadas as

principais teorias e modelos. A utilização do plural surge de forma consciente, dado não existir uma

única teoria da comunicação. As razões desta “ausência de uma teoria consensual no domínio dos

estudos de comunicação, além de se prenderem obviamente com a complexidade dos problemas, tem

sobretudo a ver com a diversidade e com o antagonismo das teorias sociais que se confrontam na

modernidade” (Rodrigues, 1994 citado por Serra, 2007, p. 41).

O estudo científico da comunicação humana teve início nos EUA a partir de 1930 e

rapidamente se difundiu na Europa. Existindo numerosos autores que se debruçaram sobre este

tema, o movimento que levou à autonomização dos estudos científicos sobre a comunicação deveu-

se à influência conjunta do cientista político Harold Lasswell, do sociólogo Paul Lazarsfeld e dos

psicólogos sociais Kurt Lewin e Carl Hovland (Cruz, 2002).

Lasswell e Lazarsfeld interessaram-se na década de 1940 sobre o efeito das mensagens

públicas difundidas pelos meios de comunicação social na formação das atitudes dos indivíduos. Esta

foi uma década em que a obra controversa de Tchakhotine ‘Le viol des foules par la propagande

politique’ fazia acreditar que os efeitos dos meios de comunicação eram fortes e todo-poderosos. Os

efeitos da rádio, seja nos EUA com propaganda antinazi, ou na Alemanha glorificando o regime Nazi,

6

pareciam indicar igualmente ser ilimitados na sua ação. A célebre emissão de Orson Wells, a 30 de

outubro de 1938, conseguiu levar o público americano a acreditar incondicionalmente no relato

ficcional de Wells sobre uma invasão marciana à terra (Cruz, 2002).

Assim, em 1948 surge a Teoria da Comunicação de Massas ou Picada Hipodérmica, em que

Lasswell refere que os indivíduos de uma sociedade e que constituem uma massa1, podiam ser

controlados, manipulados e levados a agir caso captassem a mensagem difundida pelos meios de

comunicação social (Sebastião, 2009). Os meios de comunicação social injetariam as atitudes que

pretendiam difundir, da mesma forma que um enfermeiro dá uma injeção a um paciente (Cruz,

2002).

O estudo ‘The people´s Choice: how the voter makes up his mind in a presidential campaign’

realizado por Lazarsfeld em 1944 sobre as eleições presidenciais de 1940 nos EUA, tornou-se

rapidamente num clássico sobre comunicação. Esperava-se que o candidato Wilkie, apoiado pela

maior parte da imprensa, derrotasse o candidato Roosevelt, mas o resultado foi o contrário. O poder

avassalador dos meios de comunicação social começou a ser criticado por vários autores (Cruz, 2002).

Surge então a Teoria do Two Step Flow Communication, que identifica a existência de

influências mais poderosas na formação da opinião pública2 do que a comunicação de massas,

emergindo o líder de opinião como figura central nesta teoria. Lazarsfeld e Katz perceberam que as

pessoas encaravam com uma certa indiferença a propaganda política difundida pelos meios de

comunicação social, classificando-a como informação destinada a persuadir. Pelo contrário, o líder

de opinião era visto como uma pessoa de confiança, sendo a sua opinião por isso valorizada

(Sebastião, 2009). Assim, a mensagem dos meios de comunicação social só persuadirá se conseguir

atingir o líder de opinião, que por sua vez, atingirá os outros membros da comunidade.

Contudo, estudos posteriores continuavam a classificar de excessivamente simplistas estas

teorias na explicação do impacto dos meios de comunicação social sobre a formação das atitudes e

1 A massa é constituída por um “conjunto homogéneo de indivíduos que, enquanto membros, são essencialmente iguais, indiferenciáveis, mesmo que provenham de ambientes diferentes, heterogéneos, e de todos os grupos sociais. Além disso, a massa é composta por pessoas que não se conhecem, que estão separadas umas das outras no espaço e que têm poucas ou nenhumas possibilidades de exercer uma ação ou uma influência recíprocas. Por fim a massa não possui tradições, regras de comportamento ou estrutura organizativa” (Wolf, 1992 citado por Sebastião, 2009, p. 19) 2 A opinião pública resulta dos “juízos coletivos emitidos pelos cidadãos que como membros de determinado sistema político têm o direito de manifestar e saber divulgada a sua opinião sobre os mais diversos assuntos” (Santos, 1997 citado por Sebastião, 2009, p. 31).

7

comportamentos das audiências (Cruz, 2002). Surgem assim, várias teorias que aprofundam o

estudo e a análise dos efeitos dos meios de comunicação social sobre a audiência.

Pela sua importância, é possível destacar os Estudos Produtivos, que concentraram a sua

atenção na década de 1950, na análise do trabalho dos produtores de notícias. De entre estes

destacam-se: Gatekeepers (White) e o Newsmaking (Galtung e Ruge) (Sebastião, 2009).

White verificou que nem todas as notícias que entram numa redação são difundidas para o

público e procurou investigar como decorre este processo de seleção. Os gatekeepers selecionam as

notícias não pelo seu gosto pessoal e simpatias ou antipatias, mas sim pela presunção subjetiva do

que eles pensam ser o interesse do seu público.

O Newsmaking de Galtung e Ruge complementa o Gatekeeping pela introdução de critérios

objetivos que conduzem à seleção ou eliminação de certas notícias. Segundo os autores, estes

valores-notícia funcionam como uma forma de criar rotinas no trabalho e facilitar a escolha e a

produção informativa (Sebastião, 2009). De acordo com Galtung e Ruge, estes são:

O momento do acontecimento (as notícias de última hora têm maior

probabilidade de serem divulgadas);

A intensidade ou magnitude do acontecimento;

A clareza do acontecimento;

A proximidade;

A consonância (com os preconceitos);

A continuidade (“novelas”);

A composição (equilíbrio do conjunto das notícias);

Os valores socioculturais vigentes.

Estes critérios tentam introduzir alguma racionalidade no processo de newsmaking,

diminuindo o papel e a influência da subjetividade do gatekeeper. Contudo, muitos autores recentes

salientam o papel algo limitado destes nove critérios, identificando a presença de outros fatores

adicionais (objetivos e subjetivos) no momento de seleção de notícias.

Deve no entanto, ser salientado que outras teorias existem no campo dos efeitos da

comunicação social sobre as audiências, das quais podem ser salientadas:

Estudos Culturais de Hall;

Teorias dos Usos e das Gratificações de Katz, McQuaile Gurewitch;

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Teorias dos Efeitos a Prazo de onde se salientam o ‘Agenda-Setting’ de

McCombs e Shaw, a ‘Dependência dos Efeitos dos Meios de Comunicação Social’ de DeFleur

e Ball-Rokeach, a ‘Espiral do Silêncio’ de Noelle-Neumann e o ‘Hiato Comunicativo’ de

Tichenor, Donohue e Olien (Sebastião, 2009).

2.3 - Modelos de comunicação

Os modelos comunicacionais possuem uma estreita relação com as teorias da comunicação,

mas não são a mesma coisa. Os modelos são analogias que representam simbolicamente sistemas

ou processos complexos. A mais importante função dos modelos é adjuvar o desenvolvimento de

teorias, sendo que estas ambicionam explicar e prever enquanto um modelo pretende apenas

representar. Numa evolução histórica é possível aqui apresentar três tipologias de modelos

comunicacionais: o linear, o interativo e o transacional. Dentro destas tipologias vários modelos

coexistem, sendo que aqui apenas serão apresentados um exemplo para cada uma das tipologias.

Modelo linear

Em 1948 Lasswell desenvolve um modelo que possui uma clara associação à Teoria de

Comunicação de Massas, identificando a comunicação como um processo linear e unidirecional, em

que uma pessoa atua sobre outra. Este modelo consiste em cinco questões que descrevem as visões

iniciais sobre o funcionamento da comunicação: ‘Quem?’; ‘Diz o quê?’; ‘Em que canal?’; ‘A quem?’;

‘Com que efeito?’. Claude Shannon e Warren Weaver (1949) atualizam o modelo de Lasswell

introduzindo a noção de ruído ou interferências, responsável pela distorção da clareza da

comunicação (Wood, 2012). Embora esta tipologia tenha sido um bom ponto de partida

(considerando que até à década de 1960 dominou a pesquisa sobre comunicação de massas), era

excessivamente simplista para capturar a complexidade da comunicação humana.

Modelo interativo

O maior problema enfrentado pelos modelos lineares é a representação de um recetor

apenas passivo, nunca podendo este enviar mensagens no decorrer do processo comunicacional.

Assim, Wilbur Schramm desenvolve em 1955 um modelo interativo de forma a incluir o feedback.

Este novo elemento pode apresentar-se sob a forma verbal, não-verbal ou ambas, podendo ser

intencional ou mesmo não intencional. O modelo interativo apresenta ainda a ideia de que os

comunicadores criam e interpretam as mensagens dentro de um quadro de experiências pessoais.

9

De forma a apresentar os elementos deste modelo, surge aqui um exemplo de uma conversa informal

entre dois colegas de laboratório (Rego, 2010, p. 55):

Emissor: admita que é o leitor;

Recetor: pense num seu colega de trabalho;

A ideia a transmitir: o leitor quer dizer ao colega que pretende que ele não chegue

atrasado para o início do ensaio que vão fazer no laboratório;

O código: conjunto de símbolos e sinais necessários para que as ideias se traduzam

em mensagem (pode ser a língua portuguesa);

A mensagem: por exemplo o leitor diz com firmeza: “Gostaria que não voltasse a

chegar atrasado”;

O meio: o suporte que utiliza (admita que utiliza o telefone);

Ruído: isto é, qualquer fator que perturbe, confunda ou interfira na comunicação.

Alguns exemplos: o seu colega de laboratório tem dificuldades de audição, está num local muito

barulhento, percebe mal a língua portuguesa, é muito desconfiado e imputa às suas palavras um

sentido que o leitor não lhe quer dar;

[Feedback] Perante esta mensagem, o recetor descodifica-a e interpreta-a.

Continuando a usar o exemplo, o seu colega pode emitir a seguinte mensagem de retorno: “Custa-

me a aceitar que me diga isso da maneira como o fez. É a primeira vez que chego atrasado, e isso

aconteceu porque tive de levar a minha filha ao hospital”;

Contexto: representa o quadro cultural, social e psicológico em que a comunicação se

processa. Por exemplo, a mesma mensagem pode ser interpretada de modos diferentes e dar origem

a diferentes respostas do recetor, consoante a cultura a que pertencem os comunicadores (dada a

natureza internacional da investigação científica, tal situação é muito comum). Se o seu colega for

chinês, é provável que não lhe faculte o feedback referido – e antes sorria e acene a cabeça, levando

a crer, erradamente, que ele aceita a sua crítica.

Modelo transacional

O maior problema dos modelos interativos, de acordo com Wood (2012) é que estes modelos

não incorporam a possibilidade de tanto os emissores e recetores enviarem mensagens

simultaneamente. Por exemplo, durante uma conferência de imprensa um cientista enquanto fala

observa os jornalistas para perceber se estes estão ou não interessados, e com base no que observa

10

adapta o seu discurso, podendo levar a alterações do comportamento dos jornalistas. Tanto o

emissor como o recetor estão a emitir e a receber.

Os modelos interativos também não conseguem capturar a evolução temporal da

comunicação, tendo em conta que a dinâmica comunicacional se modifica ao longo do tempo entre

os comunicadores. Ilustrando esta situação com o exemplo anterior da conversa entre um cientista

português e um chinês que trabalham no mesmo laboratório, é possível perceber que após um

período de mútua convivência, as diferenças culturais que os separavam começam a dissipar-se à

medida que as experiências em comum se vão acumulando. Assim, o modelo transacional de Wood

tenta representar a comunicação como um processo contínuo que se vai modificando com a

passagem do tempo, em que ambos os comunicadores são emissores e recetores de mensagens

simultaneamente. Adicionalmente, este modelo tenta reforçar o papel influenciador do contexto em

que a comunicação ocorre. Este contexto inclui não só os ambientes sociais comuns a ambos os

comunicadores (local de trabalho, a cidade, a cultura, p. ex.) como também os contextos pessoais

(família, religião, amigos, p. ex.).

2.4 - O Marketing

O Marketing é uma área que lida com a identificação e oferta de respostas às necessidades

sociais e humanas. Uma das definições mais curtas de marketing pode ser: “resposta a necessidades

de forma lucrativa” (Kotler & Keller, 2006). A Associação Americana de Marketing oferece a seguinte

definição formal: “Marketing é uma função organizacional e um conjunto de processos para criar,

comunicar e fornecer valor a clientes e para gerir as relações com os clientes de uma forma que

beneficie a organização e os seus acionistas” (Kotler & Keller, 2006).

A interdependência organizacional entre o marketing e a comunicação é muito elevada ao

nível dos objetivos de posicionamento de uma organização. No entanto, enquanto os objetivos do

marketing visam a diferenciação e a identificação da organização, a comunicação divulga o

posicionamento estratégico pretendido (Sebastião, 2009). O papel da comunicação de marketing é

produzir uma mensagem apropriada a um ou a vários dos grupos que compõem o meio onde uma

organização se insere: presentes e futuros clientes; acionistas; empregados; distribuidores;

retalhistas; reguladores; decisores políticos e público geral. A mensagem, o meio utilizado e os

objetos da comunicação variam em medida da audiência com que se pretende interagir. As razões

pela qual uma organização pretende comunicar podem também variar. Não é sempre o objetivo de

11

uma organização comunicar para vender um produto ou um serviço. Estas podem também

ambicionar criar reconhecimento de produtos, fornecer informação específica ou reforçar

associações, atitudes e preferências (Young, 2003). Kotler e Keller (2006) salientam que o marketing

pode atuar sobre 10 áreas diferentes: produtos; serviços; eventos; experiências; pessoas;

propriedades; organizações; informação e ideias.

Considerando o público-alvo do presente guia é possível salientar que no âmbito de uma

universidade, por exemplo, alguns destes pontos (senão todos) assumem uma crescente

importância:

Serviços: Comunicação dos serviços prestados pelas universidades;

Eventos: Gestão de inaugurações, exposições, presenças em feiras de divulgação ou

científicas, por exemplo;

Organizações: Comunicação à sociedade da performance e valores da organização –

comunicação corporativa;

Informação: Comunicação ao público-alvo da sua oferta pedagógica e/ou do

conhecimento produzido no seio da instituição.

A Comunicação Integrada de marketing

A comunicação ao serviço das organizações insere-se na sua estratégia de marketing e visa os

seguintes objetivos (Sebastião, 2009):

Informar; Divulgar/dar a conhecer; Dar notoriedade; Promover a experimentação;

Estimular a compra; Preparar a venda; Promover a fidelização; Combater a sazonalidade;

Credibilizar/promover a imagem; Vender/escoar produtos; Transmitir confiança; Envolver.

Para que estes objetivos possam ser alcançados eficientemente é necessário tomar decisões

quanto às técnicas comunicacionais a adotar num determinado momento e contexto. O mix

comunicacional apresenta a combinação dos instrumentos comunicacionais que podem ser

acionados de acordo com as estratégias definidas pela organização. A definição de cada uma destas

técnicas pode ser encontrada no glossário do presente guia.

12

Tabela 1 - Técnicas de comunicação na Comunicação de Marketing (mix comunicacional)

Técnicas de comunicação na Comunicação de Marketing (Mix comunicacional)

Publicidade

Marketing Direto

Merchandising

Força de vendas

Promoções

Patrocínio

Mecenato

Relações públicas

Fonte: adaptado de Sebastião (2009, p. 40)

Uma divisão clássica destas técnicas é a diferenciação em ‘above the line’ e ‘below the line’.

Tabela 2 - Técnicas de comunicação 'above the line' e 'below the line'

Comunicação de Massas ‘Above the line’

Publicidade; TV/cinema; Rádio; Imprensa; Outdoor; Online – Websites; Mobile

Comunicação direcionada ‘Below the line’

Marketing Direto; Promoções; Merchandising; Relações públicas; Patrocínios; Mecenato; Feiras; Eventos

Fonte: adaptado de Rasquilha, 2009, p. 19

Perante a diversidade de características das várias técnicas de comunicação é possível

perceber que a ausência de uma coordenação estratégica incorre no sério risco de a seleção e

aplicação das várias técnicas comunicacionais não ser coerente, comprometendo os objetivos

comunicacionais da organização.

Com o propósito de um incremento da eficácia comunicacional, foi desenvolvido nos últimos

anos o conceito de Comunicação Integrada de Marketing. Este conceito tenta reforçar a visão de

que as várias técnicas podem e devem trabalhar em conjunto para reforçar os objetivos globais da

13

organização. A comunicação integrada de marketing surge num contexto em que os consumidores

estão agora expostos a informação de um grande número de fontes simultaneamente. Esta situação

obriga os profissionais a coordenarem a comunicação de forma a que as várias técnicas se potenciem

mutuamente e não se tornem redundantes ou mesmo antagónicas (Steward & Kamins, 2002).

Adicionalmente, os omnipresentes meios digitais vieram derrubar as tradicionais

classificações, sendo que atualmente um meio como a internet pode ser simultaneamente um canal

de comunicação, um canal de distribuição e até um serviço em si mesmo. Esta situação obriga a que

perante determinado conteúdo, serviço ou produto, os profissionais determinem qual o mais

eficiente canal, contexto e mensagem a utilizar para alcançar os seus objetivos específicos.

2.5 - A Comunicação de Ciência

A comunicação entre a comunidade científica e o público leigo não é de todo, recente. Mesmo

antes de o termo cientista existir (surge apenas em 1835 num encontro da Associação Britânica para

o Desenvolvimento da Ciência), já Humphrey Davy e Michael Faraday estavam envolvidos na

popularização da ciência, através de apresentações públicas na Royal Institution em 1799. Por sua

vez, Joseph Priestley encorajava já o desenvolvimento de uma prática de experimentação científica

por parte do público não especialista (Bowater & Yeoman, 2013; Science for All Group, 2010).

Sendo que o interesse dos cientistas em comunicar com o público não é recente, a tentativa

de estudar este processo comunicacional é bastante mais recente. E uma das primeiras respostas

académicas surge com o conceito de Literacia Científica. No contexto da guerra fria e da corrida

espacial entre os EUA e a ex-URSS, surge nos EUA a preocupação com o apoio do público norte-

americano a esta corrida pela supremacia tecnológica na conquista do espaço. Surge assim em 1957,

imediatamente antes do lançamento do Sputnik 1 pela ex-URSS, o primeiro inquérito nacional às

atitudes do público norte-americano para com a ciência (Entradas, 2015b). O leitor pode verificar a

proximidade temporal entre o início dos Estudos da Comunicação e o início da Comunicação de

Ciência.

Como área de investigação e análise das práticas no ‘terreno’, a Comunicação de Ciência

tem conhecido um desenvolvimento exponencial nas últimas décadas. No entanto e tal como a

área dos Estudos da Comunicação, a Comunicação de Ciência enfrenta também vários desafios

devido à sua natureza multidisciplinar. É possível encontrar na Comunicação de Ciência conexões

com Estudos da Comunicação, Sociologia, Educação, Psicologia, Filosofia, História, Ciência Política,

Ética e claro, Ciência e Tecnologia (Bowater &Yeoman, 2013; Bauer, 2009). De acordo com Trench e

14

Bucchi: “o crescimento da comunicação de ciência irá depender, pelo menos parcialmente, de uma

bem-sucedida articulação das teorias relacionadas com a área” (2010 citado por Palmer & Schibeci,

2014, p. 512). Como área académica de investigação têm ocorrido notáveis desenvolvimento na

comunicação de ciência (Bowater & Yeoman, 2013), sendo que atualmente existem já:

Teorias e modelos próprios;

Publicações científicas da área, com processo de revisão por pares;

Conferências internacionais regulares;

Cursos e cadeiras ao nível do ensino superior e de pós-graduação;

Sociedades científicas de comunicação de ciência.

No entanto, e devido precisamente à sua natureza multidisciplinar esta área apresenta

alguma tensão e uma falta de clareza na linguagem utilizada. Isto porque a prática é desenvolvida

maioritariamente por cientistas das áreas naturais, exatas ou tecnológicas, enquanto a pesquisa

académica é feita, por sua vez, maioritariamente por cientistas sociais (Bowater & Yeoman, 2013).

Como refere Bauer (2009), quando se debate a comunicação pública de ciência, existe sempre um

equilíbrio que é necessário ter em atenção quanto à teoria e quanto às evidências empíricas que

surgem da prática de comunicação de ciência. Numa área com implicações na esfera política, na

esfera da ética e em organizações privadas e públicas, as críticas à sua teoria e prática ocorrem

sempre e por vezes com um vigor considerável (Science for All Expert Group, 2010).

Os argumentos para comunicar ciência

De acordo com Baltitude (2011) existe um conjunto de razões chave que podem ser

identificadas ao nível das instituições e dos países para a promoção da Comunicação de Ciência:

Razões utilitárias: As pessoas envolvidas irão adquirir competências e conhecimentos

que lhes serão úteis no dia-a-dia;

Razões económicas: A economia atual exige uma força de trabalho tecnologicamente

especializada; a ciência aumenta significativamente os resultados económicos de um país;

Razões culturais: A ciência representa uma herança cultural e deve ser reconhecida

como parte de uma noção de cultura mais vasta;

Razões democráticas: A ciência afeta as principais decisões a tomar numa sociedade,

pelo que é importante o público ser capaz de interpretar informação científica básica (Osborne 2000,

p. 226-230 citado por Baltitude, 2011, p.4).

15

Se vivemos numa sociedade em que a ciência e a tecnologia possuem um profundo impacto

no nosso quotidiano, todo o público e não apenas uma pequena elite, deverá ser capaz de

compreender as vantagens e os riscos de um determinado tema científico (Entradas, 2015b). A

aquisição de uma atitude pró-ativa é essencial para que cada cidadão possa por si mesmo, tomar

decisões informadas e conscientes sobre assuntos, como alimentação, vacinação ou o apoio a

determinada legislação ambiental ou desenvolvimento tecnológico. Como refere Haldane: “o homem

comum deve saber alguma coisa sobre todas as áreas da ciência, pela mesma razão que um

astrónomo deve saber sobre botas. A razão é que são temas que afetam a sua vida diária” (Haldane,

1939 citado por Entradas, 2015b, p. 7).

O argumento de que a ciência faz parte da nossa cultura e todos possuem o direito ao

conhecimento científico tal como todos possuem direito à cultura surge em articulação com o que

autores como Durant (1987 e 1993) e Miller (1998) salientam ser a necessidade de incorporar a

ciência no conceito mais vasto de cultura (Entradas, 2015b).

Segundo Entradas (2015b) existe ainda um quinto argumento que pode ser identificado: o

apoio do público à ciência. Este argumento surge em força após a divulgação do relatório ‘Public

Understanding of Science’ da Royal Society em 1985, que frisa a necessidade de aumentar a atitude

positiva do público para com a ciência, para que esta continue a receber financiamento público.

Como proferido por Isaac Asimov: "sem um público informado, os cientistas não serão mais apoiados

financeiramente, serão ativamente perseguidos” (Entradas, 2015b, p. 74). Sendo que existem forças

e fraquezas em cada um destes argumentos, no seu conjunto eles representam as principais

motivações apresentadas para a promoção da comunicação de ciência (Baltitude, 2011).

A Comunicação Pública de Ciência

Burns et al. (2003, p. 191) definem Comunicação de Ciência como sendo o uso apropriado de

competências, meios de comunicação social, atividades e diálogo para produzir uma ou mais

respostas pessoais relativamente à Ciência:

Perceção e familiaridade com os novos aspetos da ciência; Satisfação ou outra

resposta afetiva (p. ex. apreciando ciência como entretenimento ou arte); Interesse evidenciado pelo

envolvimento voluntário com a ciência ou a sua comunicação; Opiniões que formam, reformam ou

confirmam atitudes para com a ciência; Compreensão da ciência, os seus conteúdos, processos e

fatores sociais.

16

Comunicação de ciência pode assim envolver membros da comunidade científica, mediadores

e outros membros do público geral, seja entre pares ou entre diferentes grupos.

Mackinnon & Vos (2014) sugerem que comunicação de ciência é o conceito genérico, onde

coexistem diferentes métodos e técnicas comunicacionais mas todas com o mesmo objetivo geral.

Assim muito dependendo do tipo de informação que se pretende comunicar poderão ser utilizados

as técnicas da Literacia Científica 3, da Perceção Pública de Ciência (PAS)4, do Compromisso Público

com a Ciência e Tecnologia (PEST)5, da Compreensão Pública de Ciência (PUS)3 ou ainda da

Participação Pública na Pesquisa Científica (PPSR)6.

Por Comunicação Pública de Ciência entende-se um conceito diretamente ligado ao conceito

de Comunicação de Ciência definido por Burns et al. (2003) 7 . Trata-se de uma derivação do conceito

referido, através da delimitação do público-alvo do processo comunicacional, ao implicar que a

comunicação pública de ciência seja dirigida a um público leigo e não especialista. Mantendo a quase

totalidade da definição de Burns et al. (2003), a diferença surge na eliminação da comunicação

interpares no interior da comunidade científica. Esta comunicação no interior da comunidade

científica possui objetivos e metodologias próprias que a distinguem de uma comunicação

direcionada para um púbico leigo.

Assim na comunicação pública de ciência continuam a manter-se não só, os objetivos

propostos por Burns et al. (2003), como os envolvidos no processo comunicacional: membros da

comunidade científica, mediadores e outros membros do público não especialista.

2.6 - A Comunicação de Ciência e o Marketing

Analisando a definição de Burns et al. (2003), constata-se que a comunicação de ciência

procura inspirar uma ou mais atitudes simultâneas nos cidadãos: perceção, satisfação, compreensão,

interesse e participação. E que a procura destas atitudes individuais ocorre precisamente para que

se possam alcançar os grandes objetivos da comunicação de ciência: uma verdadeira integração da

cultura científica no plano mais vasto da cultura e capacitar o cidadão de um conjunto de

3 Ver definição de Literacia científica no glossário. 4 Ver definição de Perceção Pública de ciência no glossário. 5 Ver definição de Compromisso Público com a Ciência e Tecnologia no glossário. 6 Ver definição de Participação Pública na Pesquisa Científica no glossário. 7 Ver definição de Comunicação de Ciência no glossário.

17

ferramentas que lhe permita tomar decisões informadas ao nível pessoal e influenciar a decisão

política.

Analisando os objetivos da comunicação de marketing anteriormente apresentados verifica-

se que muitos desses termos são similares aos utilizados na linguagem da comunicação de ciência:

informar, divulgar, dar notoriedade, promover a imagem, transmitir confiança e envolver.

Inclusivamente muitos dos termos ingleses utilizados na área da Gestão de Projetos são idênticos a

alguns dos termos utilizados na terminologia inglesa da comunicação de ciência: ‘awareness’,

‘understanding’ e ‘commitment’. Esta comparação surge em resultado do debate que

frequentemente ocorre sobre se a comunicação promovida pelas instituições científicas corresponde

à área das relações públicas ou da comunicação de ciência.

Na maior parte dos países da OCDE (Organização Para a Cooperação e Desenvolvimento

Económico) as universidades transformaram-se em organizações empresariais. A nova governança

da ciência é acompanhada por uma crescente pressão para a demonstração da sua legitimidade

(Marcinkowski, Kohring, Fürst, & Friedrichsmeier, 2013). Isto é especialmente verdade para as

universidades da Europa Central, que deixaram de estar sob controlo estatal, mas ainda dependem

largamente de fundos públicos. Consequentemente, as universidades ganharam autonomia, mas

vêm-se agora sujeitas a uma maior pressão para conquista do apoio do público e de financiamento

de entidades privadas.

A modificação que as organizações científicas atravessam possui reflexo nos esforços

mediáticos por parte dos seus membros. Na tentativa de mostrar a sua competitividade, assim como

dos seus serviços à sociedade, as universidades têm-se mostrado crescentemente interessadas em

comunicação pública. Tal está relacionado com o facto de a investigação científica estar mais

dependente da legitimidade pública na sociedade do que o ensino (Bishop, 2006). A forma mais eficaz

de alcançar visibilidade nos meios de comunicação social é através da comunicação dos resultados

científicos gerados pela sua investigação (Marcinkowski, Kohring, Fürst, & Friedrichsmeier, 2013, p.

58).

Sejam estas mudanças entendidas como uma problemática comercialização do ensino

superior ou um desenvolvimento positivo das ‘universidades empresariais’, estas devem ser

entendidas como um importante contexto para a comunicação de ciência, dado terem transformado

a governança da ciência numa atividade central para muitos cientistas. Analisando de um ponto de

vista de comunicação corporativa, os cientistas líderes da sua área científica transformaram-se em

18

importantes figuras da identidade interna da sua instituição. Tal como os gestores de topo

representam a identidade de uma empresa, os cientistas de topo representam e simbolizam agora a

ciência ou a instituição científica na comunicação pública (Horst, 2013).

Os esforços mediáticos das instituições científicas têm sido concentrados nos seus gabinetes

de comunicação, cuja tendência para a criação destes gabinetes tem sido crescente nas últimas

décadas. A maioria das universidades têm investido em relações públicas, de forma a capacitar a

instituição de uma maior visibilidade pública e assim potenciar a aceitação nos seus vários públicos

externos. Os cientistas têm procurado a ajuda destes gabinetes no estabelecimento de contactos

com os jornalistas. No entanto, estes gabinetes cultivam uma relação tradicional com os meios de

comunicação social, através de uma dependência em comunicados de imprensa e recortes de

imprensa, em detrimento de outras opções estratégicas (Marcinkowski, Kohring, Fürst, &

Friedrichsmeier, 2013, p. 62)

Em linha com a crítica de Marcinkowski et al. (2013), Carver (2014) refere que o comunicado

de imprensa continua a ser a ferramenta de comunicação exterior mais utilizada pelas universidades.

Sendo que este é apenas um dos vários instrumentos de Relações Públicas que podem ser utilizados

na relação com os meios de comunicação social, a utilização recorrente de apenas este instrumento

poderá transformar-se de facto, pouco eficiente e limitativa, caso a instituição pretenda desenvolver

uma comunicação de ciência mais abrangente e significativa.

O que se pretende realçar neste guia e em consonância com Carver (2014) é que o debate em

torno de um determinado instrumento comunicacional, ser ou não comunicação de ciência é

enganador. Tal como a comunicação integrada de marketing surge pela necessidade de uma eficaz

coordenação das várias técnicas a utilizar no cumprimento da estratégia de comunicação de uma

empresa, o mesmo deverá ocorrer na comunicação de uma instituição científica.

Tal como refere Horst (2013), o foco na comunicação pública da pesquisa científica requer um

interesse crescente na colaboração e coordenação entre diferentes disciplinas, departamentos e

instituições científicas. Após a conceção de uma estratégia de comunicação, poderão ser

seguidamente utilizadas várias técnicas comunicacionais de uma forma coordenada: eventos,

relações públicas, ou publicidade, por exemplo. A organização de um evento como um ‘dia aberto’,

uma entrevista com um cientista ou a participação numa feira científica pode ter tanta ou mais

atenção pública e mediática do que um comunicado de imprensa. Não existem técnicas

comunicacionais pouco dignas para a ciência, existem sim estratégias coordenadas de aplicação das

19

várias técnicas, com o propósito de comunicar ciência, seja para o público geral, para empresas ou

para a comunidade científica.

2.7 - A Comunicação de Ciência e a Educação de Ciência

A Educação de Ciência é usualmente entendida como sendo a componente formal da

apresentação da ciência à sociedade e que ocorre principalmente através do curriculum escolar.

Existem dois argumentos de base à introdução de conteúdos científicos no curriculum escolar:

i) assegurar o crescimento do número de novos cientistas; ii) fornecer uma educação científica de

base ao aluno que o ajude a exercer os seus direitos e deveres como cidadão. (Mckinnon & Vos, 2014,

p. 5). Assim, a educação de ciência possui uma dupla função: criar um certo nível de literacia científica

nos alunos com o potencial para desenvolver novos cientistas.

Sendo que a comunicação de ciência surge com o objetivo de obter apoio do público à ciência

no contexto social, a educação de ciência procura, por sua vez, a formação de novas gerações de

cientistas. O objetivo mais difuso da comunicação de ciência, ao procurar o apoio de toda a

sociedade, contrasta com o objetivo bem definido da educação de ciência: habilitação dos jovens em

C&T. Como consequência destas origens distintas, as duas áreas apresentam diferentes conjuntos de

terminologias e metodologias. Sendo que a educação de ciência está mais focada no conceito de

Literacia Científica, a comunicação de ciência, por sua vez, utiliza conceitos como Compromisso

Público com Ciência e Perceção Pública de Ciência. A utilização de diferentes conceitos possui

também as suas raízes na ambição de ambas as áreas em apresentar à sociedade a sua

independência. (Mckinnon & Vos, 2014). No entanto, e apesar de um desejo latente de

independência, a realidade é que tanto ao nível dos objetivos como das soluções apresentadas

existem vários pontos de contacto. Ambas as áreas possuem como objetivo a “formação de cidadãos,

agora e no futuro, que possam participar na vida da sociedade moderna e assegurar o futuro do

planeta que foi transformado pelas aplicações da ciência e tecnologia” (Donghong & Shunke, 2008).

Quanto às soluções apresentadas para a aquisição de conhecimentos científicos pelos cidadãos ao

longo da sua vida, são também várias as interdependências.

Considerando que a aprendizagem pode ser definida como o processo pelo qual um indivíduo

assimila informação, ideias e valores, adquirindo assim conhecimentos, competências e habilitações

técnicas, três tipologias distintas de educação de ciência podem ser enumeradas:

20

Ensino Formal: aprendizagem que ocorre num ambiente estruturado e organizado

(escolas e universidades) e é explicitamente concebida para o ensino (em termos de objetivos, anos

de escolaridade e recursos educativos). Educação formal é intencional do ponto de vista do aprendiz.

Conduz a validação e certificação dos conhecimentos. (European Centre for the development of

vocational training, 2009). Exemplos de contribuições da comunicação de ciência para o ensino

formal: Participação ativa no desenvolvimento de políticas e reformas educativas; Participação no

desenvolvimento dos curricula científicos; Formação e atualização de docentes; Disponibilização de

infraestruturas laboratoriais para o desenvolvimento de aulas práticas e de cariz experimental dos

alunos (Mckinnon & Vos, 2014).

Ensino Não-formal: aprendizagem que ocorre em instituições com vocação educativa

(p ex. associações profissionais e de formação vocacional) no decurso de atividades nem sempre

desenhadas explicitamente para o ensino (em termos de objetivos, tempo ou recursos) mas que

contêm uma importante componente de ensino. Esta aprendizagem é intencional por parte do

aprendiz. Pode eventualmente conduzir a validação e certificação dos conhecimentos (European

Centre for the development of vocational training, 2009). Exemplos de contribuições da

comunicação de ciência para o ensino não-formal: Organização de atividades de ciência para alunos

do ensino básico e secundário em instituições de investigação, como ‘escolas de verão’. Organização

de cursos e workshops para grupos de interesse específicos (profissionais de telecomunicações,

agricultores, p. ex.) (Mckinnon & Vos, 2014).

Ensino Informal: aprendizagem que resulta de atividades diárias em diferentes

contextos: ambiente profissional, familiar ou de lazer. Não é organizado ou estruturado em termos

de objetivos, tempo ou recursos educativos. Esta aprendizagem é maioritariamente não intencional

por parte do aprendiz. Não conduz a validação e certificação dos conhecimentos e ocorre ao longo

da vida (Comissão Europeia, 2015). Exemplos de contribuições da comunicação de ciência para o

ensino informal: Organização de dias ou semanas temáticas de ciência, que criam uma atmosfera de

cultura científica que envolve o público; Criação de exposições interativas por centros de ciência ou

museus de ciência para desenvolvimento da aprendizagem ao longo da vida; Cooperação com os

meios de comunicação social, de modo a promover a informação científica; Desenvolvimento de

interações com o público através das tecnologias de informação e comunicação, como blogues,

fóruns e redes sociais (Mckinnon & Vos, 2014).

21

Se a educação de ciência possui como um dos seus principais objetivos a formação científica

das novas gerações de cientistas, poderá ser questionada qual a influência da comunicação de ciência

na atração de jovens para a carreira científica e de investigação. Este foi o objetivo principal do estudo

realizado por Stekolschik, Draghi, Adaszko, & Gallardo (2010)8. Neste estudo, os autores enumeraram

como possíveis influências na decisição de seguir a carreira científica, os seguintes factores:

Professores: representa a influência de um ou mais professores;

Família: representa a influência do ambiente familiar do investigador;

Oportunidades de emprego: representa a perceção da probabilidade de emprego na

carreira científica;

Prestígio: representa a reputação adquirida por ser um profissional da ciência;

Publicações: representa a influência de ler revistas populares de ciência ou artigos de

ciência em jornais generalistas;

Audiovisuais: representa a influência de conteúdos científicos em materiais

audiovisuais;

Centros de ciência: representa a influência de experiências passadas com atividades

de ciência em museus, laboratórios ou centros interativos de ciência;

Os resultados indicam que o principal fator de influência são os professores, o que demonstra

a estreita ligação com a educação de ciência. Como segundo e quarto fatores mais influentes surgem

agora as publicações e os centros de ciência, respetivamente. Ambos os fatores apresentam relação

direta com a comunicação de ciência, atestando a importância desta na captação de novas gerações

de cientistas.

2.8 - A evolução nos paradigmas da Comunicação de Ciência

Sendo aqui apresentada uma sequência evolutiva dos paradigmas da Comunicação de

Ciência, é conveniente desde já salientar, que esta serve apenas como indicador do período em que

os paradigmas surgiram e possuíram predominância simbólica. Na prática eles não se anularam e

todos se mantêm atuais, e são inclusivamente utilizados de forma combinada, dependendo dos

8 Inquérito realizado com os 9 863 investigadores registados em Março de 2007 no National Council of scientific and Technical Research (CONICET) (Stekolschik et al., 2010, p. 626).

22

contextos socioculturais, económicos e políticos enfrentados (Oliveira & Carvalho, 2015 e Bauer et

al., 2007).

Literacia Científica

No contexto da ‘guerra fria’ e da ‘corrida espacial’, o governo dos EUA estava preocupado

com o nível de conhecimento científico da população norte-americana e em como isso poderia afetar

o apoio público aos esforços governamentais nesta corrida tecnológica com o seu ‘inimigo’

ideológico, a ex-URSS. John D. Miller, na década de 1970, após definir o que significa ser literado em

ciência9 estabeleceu um limiar mínimo de conhecimento a partir do qual uma pessoa pode ser

considerada cientificamente literada. A ideia de literacia científica assenta no entendimento de que

a ciência faz parte da cultura que todos os cidadãos devem possuir. O trabalho deste autor tornou-

se na base dos inquéritos bianuais que a ‘National Science Foundation’ (NSF) aplica aos cidadãos

norte-americanos desde 1970 até aos dias de hoje. Contudo, os resultados iniciais dos inquéritos

identificam um claro problema de défice de literacia científica por parte da população, o que por sua

vez, impediria o público de participar no processo de decisão política sobre ciência (Bauer, Allum, &

Miller, 2007).

Soluções que este paradigma preconiza

A mais importante recomendação deste paradigma assenta na sua ‘agenda’ educacional e a

ambição de um aumento do esforço educacional de crianças e adultos, de forma a diminuir o défice

de conhecimentos identificado nos inquéritos quantitativos (Bowater & Yeoman, 2013).

Principais críticas apontadas ao paradigma

A inclusão na definição proposta por Miller de que a pessoa literada cientificamente tem de

ter apreço pelos resultados da ciência, é criticada pelo facto de implicar a perceção de que uma

pessoa com fortes conhecimentos científicos não possa ter atitudes negativas para com um

determinado resultado científico. O que pode não ser verdadeiro.

São também apontadas críticas à introdução de um limiar mínimo absoluto de literacia

científica, e em como este muito dificilmente pode ser quantificado, dada a complexidade e

subjetividade inerente ao processo individual de aprendizagem ao longo da vida. E de facto, ao longo

9 Ver definição de Literacia científica no glossário.

23

dos anos foram introduzidas alterações nos inquéritos aplicados, na tentativa de contornar a

dificuldade de operacionalização de um limiar mínimo de literacia científica (Bauer, Allum, & Miller,

2007).

Compreensão pública da ciência (PUS)

É possível indicar a origem deste paradigma com a publicação do influente relatório da Royal

Society em 1985, produzido por um comité liderado por Sir Walter Bodmer. Por essa razão este

relatório ficou conhecido como Relatório Bodmer (Bowater & Yeoman, 2013). Durant, Evans e

Thomas foram os primeiros autores a apresentar a ideia de que “as pessoas mais informadas têm

tendência para terem uma atitude positiva genérica para com a ciência” (Durant et al. 1989 citado

por Entradas, 2015b).O trabalho deste autor está na base de uma das principais premissas do

‘Relatório Bodmer’, de que um aumento da compreensão de ciência pelo público significaria um

aumento das atitudes positivas do público e por conseguinte, um aumento do apoio do público à

ciência e ao seu financiamento pelo estado. De facto, tal relação é ainda hoje assumida por muitos

como uma das razões que impulsionam a implementação de atividades de comunicação de ciência

(Entradas, 2015b). Assim, este paradigma salienta a necessidade de continuar a utilizar a pesquisa

por inquérito, de forma a testar a relação “quanto mais sabes, mais gostas”. Contudo, na PUS já não

ocorre a atribuição de um limiar mínimo de literacia, ou seja, já não se “trata de ser literado ou não”,

mas sim, “se é mais ou menos informado” (Bauer, Allum, & Miller, 2007).

Soluções que este paradigma preconiza

Este paradigma apela à aplicação de uma de duas agendas - a racionalista ou a realista - sendo

que ambas concordam na identificação do problema: o público não está ‘apaixonado’ pela ciência.

(Bauer, Allum, & Miller, 2007). Diferem no entanto, na forma de alterar as atitudes do público. Para

os normativo-racionalistas, as atitudes são o produto final do processamento da informação de uma

forma racional. Assim sendo, o foco mantém-se na educação já que um público conhecedor irá

certamente concordar com os especialistas. Esta é uma ‘luta’ pelas mentes do público.

24

Tabela 3 - Evolução dos paradigmas de comunicação de ciência

Parad

igma

Perío

do

de

do

min

ância

Pro

blem

a id

entificad

o

Pesq

uisa a

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Solu

ções a

imp

lemen

tar

Prin

cipais

Co

nce

itos

teó

ricos

Literacia Cien

tífica

Década de 1960 até meio

da década de 1980

Défice de conhecimento

do público.

Medição da literacia

científica dos cidadãos.

Educação do público.

Cu

ltura cien

tífica

Literacia científica

Co

mp

reensão

blica d

e ciência

De 1985 até

meado de 1990

Défice de atitudes

positivas pelo público.

Medição da relação

conhecimento e atitudes do

público.

Educação e modificação das atitudes do público.

PU

S

PA

S

PEST o

u P

E

PP

SR

Ciên

cia na

socied

ade

Desde os anos 90 até hoje

Défice da comunidade científica na

envolvência do público. Crise de

confiança.

Avaliação do impacto.

Ações de participação

e deliberação pública.

Fonte: adaptado de Bauer (2007); (Bowater & Yeoman, 2013); (Oliveira & Carvalho, 2015)

Para os empírico-realistas, as atitudes desenvolvem-se numa relação com o mundo carregada

de valores e emoções. Para os realistas, as emoções são um facto da vida, e a ‘luta’ deve ser na

conquista dos corações do público. Para o público consumidor, não existe diferença entre um carro,

lixívia ou a ciência. Assim, temos de conhecer as motivações do público, segmentá-lo e seduzir cada

um dos públicos que pretendemos atingir (Bauer, Allum, & Miller, 2007). Surge assim o conceito de

Perceção Pública de Ciência (PAS), que se relaciona diretamente com o desenvolvimento de atitudes

positivas do público para com a ciência.

Principais críticas apontadas ao paradigma

Verificou-se com o avançar dos anos e da pesquisa sobre PAS, que o nível de atitudes positivas

não evoluía como desejado, aumentando inclusivamente os sinais de uma crescente desconfiança

do público para com a ciência. De facto, vários estudos mostravam a existência de uma ligeira

25

correlação entre o aumento do conhecimento científico e o aumento de uma atitude positiva, mas

apenas quanto a questões genéricas. Para temas científicos específicos e controversos como

nanotecnologia ou energia nuclear, a correlação é praticamente zero, podendo atingir valores

negativos – ou seja, surgem atitudes negativas com o aumento do conhecimento científico

(Entradas, 2015b). Bauer (2007) refere que o conhecimento é um bom preditor entre a existência ou

não de uma atitude, mas não se essa atitude é positiva ou negativa. A segunda grande crítica ao PUS

é o facto de perpetuar uma ideia sobre o público: este possui um défice científico e por isso não é

capaz de manifestar suficientes atitudes positivas para com a ciência. Os críticos deste paradigma

referem que continua a ser privilegiado o conhecimento dos especialistas relativamente a outras

formas de conhecimento. Ao mesmo tempo que negligencia a noção de que a ciência precisa de ser

relevante para o cidadão ‘comum’ no seu quotidiano, para que este possa aceitar os resultados da

ciência e apoie a pesquisa científica (Haywood & Besley, 2013).

Ciência na Sociedade

Tal como a PUS, este paradigma pode também ter o seu início identificado com a publicação

de dois outros influentes relatórios: ‘Science and society’ da House of Lords no ano 2000 e ‘Science

and the public’, do Office of science and technology / Wellcome Trust Sanger Institute também no

ano 2000 (Oliveira & Carvalho, 2015). Com a conferência de envolvimento público organizada pela

União Europeia em Lisboa em 2007 surge a institucionalização de um novo termo - Public

Engagement with Science and Technology10 (PEST) - de forma a marcar o corte com as ideias

preconizadas pelo PUS.

O problema agora identificado não está no público, mas sim na comunidade científica, que

não se liberta da ideia de um público ignorante e desconfiado perante a ciência. A ideia central do

PEST é o compromisso entre a sociedade e a ciência através de uma discussão aberta e de igual para

igual que possibilite aos leigos tornarem-se protagonistas nas decisões científicas com impacto social

(Oliveira & Carvalho, 2015).

Assim, com base nesta ideia de proporcionar uma verdadeira comunicação bidirecional entre

os cientistas e o público, enquanto simultaneamente se fornecem ferramentas ao cidadão para que

este possa influenciar a decisão política, emerge o conceito de ‘Public Participation in Scientific

10 Ver definição de PEST no glossário.

26

Research’ (PPSR), referido frequentemente como ciência cidadã. Os académicos do PEST utilizam as

técnicas do PPSR de modo a potenciarem o envolvimento dos cidadãos na prática científica com a

intenção de aprofundarem a interação entre cientistas, decisores políticos e cidadãos (Haywood &

Besley, 2013).

Soluções que este paradigma preconiza

A deliberação e participação do público é o novo caminho para conquistar a confiança do

público. O relatório ‘Science and society’ (2000) lista muitas formas de ações deliberativas como

conferências de consenso, painéis de cidadãos ou debates a nível nacional para envolver o público.

Tais esforços devem ser realizados perto do momento de início dos desenvolvimentos científicos de

forma a que seja alcançada uma verdadeira participação do público e não apenas num momento

posterior e perante factos já estabelecidos (Bauer, Allum, & Miller, 2007).

Principais críticas apontadas ao paradigma

Num período inicial de glória, são estabelecidos no Reino Unido vários programas a nível

nacional, como ‘GM Nation’ ou ‘Nanodialogues’. A amplitude destes programas conduziu

inclusivamente ao nascimento de um indústria de angels, que são profissionais contratados para a

gestão destes programas, que exigem um conhecimento prático que não era detido pelos membros

da comunidade académica (Bauer, 2009). No entanto, e como apontam Bowater & Yeoman (2013),

a análise dos relatórios destes programas permitiu identificar alguns problemas:

Envolvem apenas um número muito limitado de pessoas;

Os participantes não possuem um papel ativo na definição da agenda;

Não existe uma responsabilidade direta dos organizadores em traduzirem os

resultados das várias ações em decisão política;

As expectativas dos cidadãos precisam de ser abordadas através de um diálogo

continuado e não pontual;

Os membros do público que participaram nos vários eventos não representam o

público no seu todo – os que participam são pessoas ou bem informadas ou que já possuem opiniões

muito marcadas sobre o assunto;

Existe uma grande dificuldade em transformar atividades de diálogo em atividades

para grandes audiências, sendo que a maior parte dos eventos realizados são uma combinação de

informação e diálogo, o que indica que os paradigmas anteriores continuam presentes.

27

Como refere Bensaude Vicente, a introdução do conceito de PEST apresenta desde o início

uma discrepância: “a expressão não foi introduzida por cientistas ou ativistas sociais, mas sim pelo

mundo burocrático da política e da administração de ciência. O que significa que, ironicamente,

enquanto o significado enfatizou a necessidade de romper com a comunicação de cima para baixo, o

próprio significante viajou de cima para baixo” (2014, p. 243 citado por Oliveira & Carvalho, 2015).

Outros autores criticam a distorção das principais ideias em que assenta o novo paradigma. A

legitimidade do PEST não depende apenas dos seus pressupostos iniciais mas também dos seus

resultados na governança de ciência. Estes exercícios podem assim não desafiar as lógicas instituídas

mas apenas reforçarem as estruturas vigentes. As atividades de PEST podem ser vistas pelas

instituições como mais uma oportunidade, não para repensarem as suas estratégias e políticas, mas

sim para conquistarem confiança do público em estratégias já delineadas (Stilgoe, Lock, & Wilsdon,

2014).

Necessário novo paradigma?

Nas palavras de Bauer: “é preciso ter cuidado para não estar constantemente a reinventar a

roda” (2009, p. 6). A referência deste autor surge como consequência do apelo de vários autores a

uma necessidade de introduzir novos métodos de avaliação das ações de PEST. Métodos esses que

poderiam envolver a medição do impacto mediático ou da modificação da perceção pública de

ciência, conhecimentos e atitudes do público para com a ciência ou mesmo o impacto sobre a agenda

política. O que segundo Bauer et al. (2007) poderá corresponder à aplicação dos mesmos métodos

utilizados nos paradigmas anteriores.

Haywood & Besley (2013) sugerem que uma rejeição absoluta da transmissão de informação

e aconselhamento de especialistas em nome de uma igualdade democrática pode afetar o ideal

apolítico e independente da investigação científica. Os autores salientam que não concordam com a

ideia de que a democracia e a ciência sejam inerentemente contraditórias, mas pelo contrário apelam

a uma integração criativa dos princípios dos três paradigmas. Isto porque a teoria e a prática de um

dos paradigmas não elimina ou é superior a qualquer um dos outros.

2.9 - Modelos de Comunicação de Ciência

Tal como os modelos apresentados nos Estudos da Comunicação, a função dos modelos na

Comunicação de Ciência é também promover uma “representação ou modelação do processo

comunicacional” (Burns et al., 2003). Possuindo uma clara relação com os paradigmas teóricos da

28

área, é possível encontrar três modelos distintos: modelo do défice, do diálogo e da participação

(Oliveira & Carvalho, 2015).

Modelo do défice

Ocorre uma transferência unidirecional do conhecimento, a partir do cientista para o público

com vista a colmatar o seu défice de conhecimento. O público é aqui visto como um mero recetor de

informação.

Tabela 4 - Evolução dos modelos de comunicação de ciência

Paradigma Modelos Visões do Público

Literacia Científica

Défice Transferência e disseminação do conhecimento

num único sentido, ‘top-down’, com vista à popularização da ciência.

- ‘O público é hostil’. - ‘O público é ignorante’.

- ‘O público pode ser persuadido’.

Compreensão pública de

ciência

Diálogo Diálogo, consulta e negociação em dois sentidos,

‘top-down’ e ‘bottom-up’, e de um modo interativo para uma maior transparência e uma

edificação da confiança na ciência.

- ‘Nós, cientistas, entendemos as suas

diversas necessidades’. - ‘Nós, cientistas,

descobrimos os pontos de vista do público’.

- ‘O público responde’. - ‘O público assume a

questão’.

Ciência na sociedade

Participação Coprodução do conhecimento através da conversação em múltiplos sentidos, com

múltiplos públicos e múltiplos tipos de ações.

- ‘O público e nós, cientistas, moldamos a

questão’. - ‘O público e nós,

cientistas, definimos a agenda’.

- ‘O público e nós, cientistas, negociamos

significados’.

Fonte: adaptado de Oliveira & Carvalho (2015).

29

Modelo do diálogo

Implica uma comunicação bidirecional entre cientistas e público, com vista a uma negociação

e com base num enquadramento das questões sociais e políticas, benefícios, desvantagens e custos

para os intervenientes. Ao contrário do modelo de défice, no engagement os públicos mais do que

simples observadores e experimentadores da ciência são participantes ativos na discussão e análise

dos temas e problemas. Pretende-se que os cidadãos se envolvam, coloquem questões, troquem

perspetivas, conhecimentos e experiências (Oliveira & Carvalho, 2015).

Modelo da participação

O público participa na deliberação de políticas de ciência, na definição da agenda da

comunicação de ciência e eventualmente até na própria ciência.

O conhecimento científico não é mais o único conhecimento válido, existindo outros saberes

que podem ter a mesma relevância para a resolução de um problema específico. No fundo,

preconiza-se que o conhecimento relevante não é produzido apenas pela comunidade científica. A

produção científica implica um diálogo, uma consulta e uma aprendizagem mútua entre os cientistas

e os cidadãos comuns, numa comunicação não linear mas complexa e envolvendo diversos

interlocutores (Oliveira & Carvalho, 2015).

Se o leitor estabelecer uma comparação entre os modelos agora apresentados com os

modelos da área dos Estudos da Comunicação poderá verificar uma similitude na evolução das suas

ideias base: a passagem de uma transmissão unidirecional para uma comunicação bidirecional,

culminando numa comunicação reforçada pela negociação e interpretação de significados por parte

de todos os envolvidos no processo comunicacional.

A Comunicação de Ciência como processo integrado

Sendo que os modelos apresentados por Oliveira & Carvalho (2015) estão em consonância

com os modelos apresentados por vários autores da área, torna-se relevante aqui apresentar uma

representação desenvolvida pelo Science for all Expert Group em 2010 e que conjuga os três modelos

através das dinâmicas comunicacionais de cada um deles: transmissão, consulta e colaboração

(Baltitude, 2011).

30

Fonte: Science for all (2010) citado por Baltitude (2011, p. 6).

A vantagem desta representação (ver figura 1) é o reconhecimento de que os atos

comunicacionais não operam em isolamento, mas sim numa combinação diferenciada dos vários

eixos. Qualquer atividade de comunicação de ciência irá muito provavelmente envolver uma mistura

dos três eixos, de acordo com as necessidades da audiência e dos cientistas envolvidos (Baltitude,

2011).

2.10 - Público ou públicos da Ciência?

De uma forma similar ao realizado pela área da Pesquisa de Marketing no estudo dos

mercados e da segmentação do público enquanto consumidores, o mesmo poderá ser feito na

comunicação de ciência através do estudo das diferentes relações do público com a ciência.

Okamura (2015)11 tentou compreender quais as variáveis que influenciam os diferentes tipos

de relação que as pessoas manifestam com a ciência. As três categorias por si definidas, foram:

11 Inquérito realizado no Japão em 2011 com uma amostra de 6 136 pessoas (Okamura, 2015, p. 3).

TRASMITA Para inspirar, informar, alterar, educar, incitar

envolvimento e influenciar as decisões

dos outros.

RECEBA Utilize as visões, competências e

conhecimento de outros para inspirar, informar,

alterar, educar e reforçar as suas próprias capacidades e decisões.

COLABORE Para colaborar, considere,

crie ou decida algo em conjunto.

Figura 1 - Modelo do 'Public engagement triangle'

31

Envolvidos12 - apresentam vontade de se envolver ativamente no processo de decisão

política sobre ciência e tecnologia;

Interessados – possuem um interesse moderado em ciência e tecnologia, mas deixam

para os especialistas a decisão política em ciência e tecnologia;

Residuais – possuem um interesse mínimo em ciência e tecnologia (Okamura, 2015,

p. 1).

Adicionalmente, o autor apresenta um modelo conceptual para a formação de atitudes do

público relativamente à decisão política em ciência e tecnologia (ver figura 2).

Figura 2 - Modelo conceptual de formação de atitudes do público para com a decisão política

em ciência e tecnologia.

Fonte: Okamura (2015, p. 8)

Com base na sua análise multivariada, as pessoas com maior idade têm maior probabilidade

de pertencer aos ‘envolvidos’ e ‘residuais’, sendo que o aumento da idade possui influência no

afastamento dos ‘interessados’. As pessoas que apresentam um aumento do interesse ou acreditam

numa sociedade baseada na C&T, têm maior probalidade de ascenderem na escala: ‘Residuais’,

depois ‘interessados’ e no topo ‘envolvidos’. A variável ‘confiança em cientistas’ apresenta uma

influência contrária à idade, ou seja, promove a confluência dos indivíduos para os ‘interessados’.

12 Tradução para português da palavra ‘Attentive’.

32

Assim esta variável pode induzir as pessoas a confiarem apenas ao cientistas a decisão política em

ciência e tecnologia, passando dos ‘envolvidos’ para os ‘interessados’.

As variáveis ‘educação formal’ e ‘conhecimento científico’ surgem apenas como relevantes

na transição dos ‘interessados’ para os ‘envolvidos’ e não na passagem de ‘residuais’ para

interessados (Okamura, 2015, p. 9).

Finalmente, é relevante notar segundo o autor, as váriaveis ‘genéro’, ‘estado civil’ ou

‘rendimento’ não apresentam qualquer influência significativa no posicionamento ou transição dos

indivíduos entre as três categorias.

Figura 3 - Variáveis preditivas da transição entre as categorias 'Envolvidos', 'Interessados' e

'Residuais'

Fonte: Okamura (2015, p. 9)

Consequentemente, é possível verificar que o interesse e o acreditar numa sociedade baseada

na C&T são as variáveis com maior capacidade de influência no mobilização das pessoas para a

participação em processos decisórios de ciência e tecnologia.

Quanto à segmentação do público português, é possível aqui apresentar uma síntese do

estudo realizado por Costa et al. (2002) e que surge citado no influente artigo de Bauer (2007, p. 84),

como um dos exemplos europeus na segmentação do público da ciência.

Costa et al. (2002) investigaram13 e definiram os vários modos de relação da sociedade

portuguesa com a ciência, através de várias dimensões14 de análise:

13 A constituição da amostra nacional do inquérito e as dimensões analisadas podem ser consultadas em Costa et al., 2002, p. 45-49.

14 A leitura de revistas sobre ciência; Outras práticas de contacto com informação científica; Os contextos de aquisição e utilização de conhecimentos sobre ciência; As autoavaliações dos inquiridos acerca dos seus conhecimentos científicos; As suas conceções das relações entre ciência e sociedade, especificamente quanto às consequências do

33

Envolvidos (2,3%): Modo de relação intenso nas diversas dimensões consideradas.

Lêem revistas sobre ciência com regularidade e desenvolvem com frequência outras práticas, mais

ativas ou mais passivas, de contacto com a informação científica. Possuem predisposição para

continuar a melhorar os seus conhecimentos científicos e utilizam a ciência principalmente na escola

e no estudo, mas também na vida pessoal;

Consolidados (9,2%): Apresentam um importante grau de proximidade com a ciência.

Revelam valores mais baixos que os ‘envolvidos’ na leitura de revistas sobre ciência e nas práticas

ativas de contacto com a informação científica. O traço mais característico deste perfil-tipo está

localizado nos contextos de utilização da ciência. São as únicas pessoas que significativamente

utilizam a ciência no âmbito da respetiva atividade profissional e também de forma elevada na vida

pessoal. Pelo contrário, já não a utilizam no contexto escolar, porque muito provavelmente já não o

frequentam. Têm um perfil consolidado no interesse e utilização da ciência, mas já não estão

envolvidos no desenvolvimento intensivo nem na formação avançada nesse domínio;

Iniciados (7,8%): Apresentam uma relação com a ciência que pode ser entendida como

sendo de carácter inicial. Trata-se de indivíduos que utilizam a ciência sobretudo na escola e no

estudo, podendo também fazê-lo na vida pessoal, mas em menor grau. A leitura de revistas sobre

ciência e as práticas de contacto com a ciência apresentam valores mais baixos que os dois perfis

anteriores. No entanto, todas estas práticas apresentam valores acima da média global;

Autodidatas (17,7%): Modo de relação com a ciência que se caracteriza por uma

proximidade de grau inferior aos três grupos anteriores mas ainda assim acima da média nas

diferentes dimensões. O traço distintivo é a declaração da utilização da ciência com alguma

frequência no contexto da vida pessoal, mas quase exclusivamente neste. Assim, parece indiciar um

modo autodidata de relação com a ciência, sendo que as práticas de contacto de tipo passivo com a

informação científica assumem algum relevo. Possui desejo de melhorar os seus níveis de

conhecimento científico;

Indiferentes (22,6%): O modo de relação deste perfil-tipo com a ciência apresenta

uma importante rutura face aos anteriores: praticamente todos os valores médios das diferentes

dimensões encontram-se abaixo da média. A leitura de revistas é uma prática praticamente ausente,

assim como o contacto com a informação científica (seja passiva ou ativa), o que revela um maior

desenvolvimento da ciência; Preferências quanto a conteúdos e formas de tratamento em publicações sobre temas científicos.

34

desinteresse e alheamento. A indiferença emerge como um dos principais traços da relação destas

pessoas com a ciência;

Benevolentes (28,1%): Este grupo configura uma relação com a ciência em que ao

mesmo tempo que se acentuam os traços de distanciamento, emergem sinais do que pode ser

considerado de boa vontade.

Isto porque apesar de as práticas de contacto com a informação científica serem quase

inexistentes, quando questionados sobre as várias dimensões em análise, estes inquiridos dispõem-

se a conceder importância a todas dimensões. Curiosamente, só os envolvidos e os consolidados

apresentam valores tão elevados nestas variáveis. Se no caso destes perfis, tal reflete um intensa

proximidade com a esfera científica, aqui estará muito provavelmente associado à tentativa de

corresponder ao que se julga ser a resposta socialmente adequada perante um mundo desconhecido,

mas aceite como importante.

Retraídos (12,4%): O último grupo desta tipologia caracteriza-se por um

distanciamento extremo face à ciência. As práticas de contacto são quase nulas, as avaliações

subjetivas exprimem não só uma autoavaliação negativa dos conhecimentos sobre ciência, mas

também de forma sem precedentes, a ausência de vontade de melhorar as capacidades neste

domínio. Este perfil-tipo é revelador de um forte alheamento e desvalorização desta temática, uma

vez que a importância média atribuída a cada uma das dimensões é extremamente baixa (Costa,

Ávila, & Mateus, 2002, pp. 64-70).

Uma ‘fotografia’ global aos europeus

De acordo com os dados dos vários indicadores retirados dos Eurobarómetros Especiais 22415,

34016 e 41917 é possível referir que o nível de interesse dos cidadãos europeus em ciência e tecnologia

se mantém elevado, apesar de não ter apresentado qualquer alteração desde 2005. A percentagem

média de pessoas que referem ter estudado ciência e tecnologia corresponde a mais de metade da

população europeia. No entanto, a percentagem de europeus que estudou ciência e tecnologia numa

instituição de ensino superior é bastante inferior. Em Portugal, apenas 11% dos inquiridos estudou

ciência numa instituição de ensino superior.

15 (Comissão Europeia, 2005). 16 (Comissão Europeia, 2010). 17 (Comissão Europeia, 2014).

35

O nível de informação sobre ciência e tecnologia que os europeus consideram possuir em

2010 permanece em termos médios, inferior ao seu nível de interesse em ciência e tecnologia, e com

um uma ligeira descida relativamente aos valores de 2005.

A tendência global também se regista em Portugal: as pessoas estão globalmente mais

interessadas do que informadas sobre as novas descobertas científicas. Em Portugal, 57% das

pessoas classifica-se como pouco informadas, 38% moderadamente informadas e apenas 3% indica

estar muito informada sobre novas descobertas científicas.

A participação dos cidadãos em processos de decisão política sobre ciência e tecnologia

mantém em 2010 os valores muito pouco significativos identificados em 2005.

Quanto à perceção dos europeus sobre os cientistas, contata-se que continuam a acreditar

serem estes os mais indicados para explicar à sociedade os impactos da ciência e tecnologia, no

entanto mais de metade da população possui também a perceção de que os cientistas não estão a

fazer o devido esforço comunicacional.

A percentagem de europeus que consideram que os impactos da ciência e tecnologia na

sociedade serão positivos no futuro permanecem altas, sendo inclusivamente maioritária em vários

temas como a saúde, energia ou a educação, por exemplo. Quanto ao financiamento público, a

maioria dos europeus não se opõe aos níveis de financiamento atual ou até ao aumento deste,

considerando ainda que prioritariamente este deve ser aplicado nas universidades e laboratórios do

estado.

A análise de Costa et al. (2002) implica alguma reflexão sobre a necessidade de continuar os

esforços de comunicação pública de ciência em Portugal, já que 63,1% da população portuguesa

possui um grande afastamento da ciência. Os dados dos Eurobarómetros Especiais de Ciência e

Tecnologia indicam, por seu lado, que os europeus possuem um nível de interesse superior ao nível

de informação que consideram possuir sobre os resultados de C&T.

Sendo que variáveis como o interesse, e a confiança numa sociedade baseada na C&T são

fatores decisivos no estreitar da ligação do público à ciência, os esforços comunicacionais em

Portugal e na Europa terão de continuar a ser prioritariamente dirigidos a estas variáveis.

É necessário conseguir estimular o interesse dos ‘Retraídos’, ‘Benevolentes’ e ‘Indiferentes’

para que o seu afastamento quase total da ciência seja substituído por uma gradual aproximação à

ciência. As metodologias a utilizar poderão estar relacionadas com qualquer um dos paradigmas

anteriormente apresentados, desde que consigam alcançar de forma sustentada os objetivos.

36

Capítulo 3 – Os cientistas e a comunicação pública de ciência

“Os cientistas irão posicionar-se numa escala de vontade [de participar em

comunicação pública de ciência] que se estende desde os que nunca irão

participar até aqueles cujo interesse é tal que irão superar qualquer barreira

que surja” (Bowater & Yeoman, 2013, p. 68)

O objetivo principal deste capítulo é o de apresentar ao leitor uma síntese das conceções da

comunidade científica sobre a comunicação pública de ciência.

O enfoque será colocado nos objetivos, pressões, barreiras e recompensas experienciadas

pelos cientistas quando se envolvem nestas atividades. Considerando a importância dos

instrumentos de financiamento na investigação científica, será ainda produzida uma breve síntese

das conceções de vários organismos financiadores sobre a comunicação pública de ciência, no final

são fornecidas algumas sugestões ao leitor, para a incorporação de atividades de comunicação

pública de ciência na submissão de candidaturas a estes organismos.

3.1 – Motivações e dificuldades dos cientistas

O ónus da implementação de ações de comunicação pública de ciência recai maioritariamente

sobre os ‘ombros’ dos cientistas, no entanto pouco se sabe sobre o que os próprios cientistas pensam

verdadeiramente sobre este assunto (Ecklund, James, & Lincoln, 2012). A compreensão das

narrativas e conceções dos cientistas permite o acesso aos significados que estes atribuem a tais

ações e às influências que rodeiam a comunidade científica (Johnson, Ecklund, & Lincoln, 2013).

Contudo, é necessário desde já referir, que muitos das conclusões aqui apresentadas estão

obviamente relacionados com o contexto cultural onde são produzidas (país, ano, amostra e até área

científica), não devendo ser conduzidas extrapolações indevidas.

3.1.1 - Motivações para a Comunicação Pública de Ciência

Em muitos países, um grande enfâse tem sido colocado na disseminação dos resultados da

investigação para um público geral e não especialista (Bentley & Kyvik, 2011). Sendo que o papel

atribuído aos cientistas é não menos do que o papel central. Nas palavras de Lord Drayson (ministro

da ciência do Reino Unido em 2009): “acreditamos que os cientistas têm o dever – particularmente

37

quando financiados por impostos públicos – para se envolverem na arena pública e se dedicarem à

comunicação dos desafios e potencias preocupações éticas sobre a sua ciência” (Burchell, Franklin, &

Holden, 2009, p. 9)

A nível governamental existem indicações que apontam para a importância atribuída à

comunicação pública de ciência. No programa Portugal 2020, que define as prioridades de

financiamento com fundos estruturais europeus para o período 2014-2020, esta componente está

implícita nas ações de ‘sensibilização e de informação’ e de ‘divulgação e disseminação de resultados

de I&D’ associadas ao objetivo de aumentar a produção científica de qualidade reconhecida

internacionalmente, no âmbito do ‘Objetivo Temático 1 - Reforço da investigação, do

desenvolvimento tecnológico e da inovação’ (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 117). Uma recomendação

da Comissão Europeia, de 11 de março de 2005 e relativa à Carta Europeia do Investigador (Comissão

Europeia, 2005) adverte para a necessidade de estabelecer um compromisso direto com a sociedade

que permita, por um lado, aos investigadores compreenderem melhor o interesse e as suas

preocupações e, por outro lado, à sociedade conhecer os resultados da investigação e compreender

melhor a ciência (Oliveira & Carvalho, 2012). Se existe esta pressão política para o envolvimento dos

cientistas na comunicação pública de ciência, será que os cientistas aceitam a incorporação desta

responsabilidade na sua prática diária?

O relatório ‘The Role of scientists in Public Debate’ publicado pelo Wellcome Trust Sanger

Institute18 no ano 2000 indica que a grande maioria dos cientistas ingleses sente ser sua

responsabilidade promover a comunicação pública de ciência (Bowater & Yeoman, 2013, p. 63). Em

2009 é publicado o relatório ‘Public Culture as Professional Science’ com base nos resultados do

projeto ScoPE19 confirma que os cientistas ingleses apresentam uma mudança de atitude, quando

afirmam agora percecionar a comunicação pública de ciência como uma parte fundamental da sua

investigação. A aquisição de competências em comunicação com o público não-especializado é vista

por estes cientistas com o mesmo grau de importância que as competências científicas e de docência

(Burchell, Franklin, & Holden, 2009, p. 6). Por sua vez, na Dinamarca, Nielsen, Kjaer & Dahlgaard

18 Relatório produzido no ano 2000 pela empresa de pesquisa de mercado inglesa Ipsos MORI a pedido do Wellcome Trust Sanger Institute. Neste relatório foram entrevistados 1540 cientistas pertences a 112 instituições do ensino superior do Reino Unido (Bowater & Yeoman, 2013, p. 63).

19 Projeto conduzido no Centre for the study of Bioscience, Biomedicine, Biotechonology (BIOS), onde foram realizadas 30 entrevistas semiestruturadas com investigadores da área das ciências biológicas no Reino Unido (Burchell, Franklin, & Holden, 2009, p. 6)

38

(2007, p. 7), reportam que 43% dos cientistas dinamarqueses concordam também com a ideia de

recair sobre eles próprios, a responsabilidade de comunicar com o público.

Em Espanha, Martín-Sempere, Garzon-Garcia & Rey-Rocha estudaram20 as motivações dos

investigadores do Spanish Council for Scientific Research (CSIC) que participaram na Feira de Ciência

de Madrid entre os anos de 2001 e 2004. Os seus resultados indicam uma combinação de motivações

intrínsecas e extrínsecas como estando na base da participação destes investigadores. Relativamente

às motivações intrínsecas, sobressaem o desejo de estimular o interesse e o entusiasmo público com

a ciência, aumentar a cultura científica do público e ainda reforçar a perceção e atitudes do público

para com a ciência (2008, p. 362). As motivações dos investigadores séniores resultam em grande

parte de um elevado sentido de dever, tendo estes investigadores salientado o seu compromisso em

comunicar com o público. No entanto, os investigadores mais jovens (doutorandos) expressam como

principal motivação, o prazer e satisfação pessoal em comunicar com o público, mais do que

propriamente um sentido de dever. No entanto, Martín-Sempere et al. salientam também a presença

de uma forte motivação externa, ou seja, a participação resulta não apenas de motivação interna

mas também como resultado de indicações expressas de chefias diretas (2008, p. 363). Já na

Argentina, Kreimer, Levin, & Jensen (2011) analisaram21 as perceções dos cientistas pertencentes ao

CONICET (National Sciemtific and Technical Research Council) e os seus resultados apontam também

para grande maior proponderância de motivações intrinsecas, como ‘sentido de dever’, ‘aumento da

perceção pública de ciência’ e ‘transmissão da importância da ciência’ (p. 42).

Em Portugal, Oliveira & Carvalho indicam vários estudos nacionais22 que identificaram as

principais motivações dos cientistas nacionais como estando centradas na disseminação científica e

na legitimação da ciência. Apesar de salientarem a relevância de divulgar ciência e promover a cultura

científica com o objetivo de captar alunos, o desejo de descomplexificar a ciência, a vontade de

fascinar o público e mostrar a importância da sua investigação junto da comunidade, são no fundo,

as suas principais motivações (2015, p. 170).

20 Estudo realizado em Espanha, entre os anos de 2001 e 2004, através de questionários estruturados e presencial a 220 membros do Spanish Council for Scientific Research (CSIC) que participaram na Madrid Science Fair (Martín-Sempere, Garzón-García, & Rey-Rocha, 2008, p. 352).

21 Estudo realizado no ano de 2007 na Argentina a 5 162 cientistas do CONICET através de questionário online, com uma taxa de resposta de 23,2% (Kreimer, Levin, & Jensen, 2011, p. 39).

22 Conceição, Gomes, Pereira, Abrantes & Costa, 2008; Jesuíno & Diego, 2003; Lamas, Araújo, Bettencourt-Dias & Coutinho, 2007; Machado & Conde, 1988; Pinto & Carvalho, 2011; Portela, 2010.

39

Tal como os seus congéneres estrangeiros, os cientistas nacionais identificam igualmente a

crescente presença de motivações externas. Motivações estas que surgem através de solicitações

por parte da instituição de que fazem parte com o intuito de promover a captação de alunos para a

instituição. No entanto, os cientistas nacionais, e mais uma vez, em concordância com as opiniões de

cientistas estrangeiros, indicam que apesar de motivados para esta tarefa enfrentam várias

dificuldades na concretização destas tarefas (Oliveira & Carvalho, 2012).

3.1.2 - Dificuldades percecionadas pelos cientistas

Considerando a diversidade de estudos e de diferentes contextos culturais em que estes

foram produzidos, não serão apresentados os resultados de cada estudo individualmente. Estes

resultados serão combinados e incorporados em cada uma das principais dificuldades identificadas.

Incentivos institucionais / Impacto na carreira científica

Quanto a este ponto, é possível ter duas análises distintas: o suporte material prestado pela

instituição ao desenvolvimento das atividades de CPC pelos cientistas ou o reconhecimento destas

atividades na avaliação da carreira docente e de investigação. Oliveira & Carvalho (2012) referem

que os cientistas nacionais abordam não só a falta de reconhecimento institucional e o consequente

impacto na carreira mas também a falta de apoio logístico por parte das instituições em que estão

inseridos. As autoras salientam que através de uma análise do Estatuto da Carreira Docente

Universitária nacional, se verifica que o esforço na participação em atividades de comunicação

pública de ciência (CPC) não é recompensado com um impacto direto na avaliação do desempenho

e na evolução da carreira (Oliveira & Carvalho, 2012, p. 26).

A questão do impacto na carreira é também partilhada por cientistas ingleses: “muitos dos

entrevistados queixam-se de que o public engagement (PEST) não é adequadamente refletido e

recompensado na carreira docente e científica da mesma forma que a publicação de artigos

científicos, docência ou atividades clínicas” (Burchell, Franklin, & Holden, 2009, p. 55).

No entanto, algumas diferenças entre os dois países podem ser identificadas, já que por parte

dos cientistas ingleses não se verifica uma perceção de falta de apoio institucional: “os cientistas

entrevistados referiram que são de facto encorajados a participar nestas atividades e que várias

formas de apoio lhes são proporcionadas” (Burchell, Franklin, & Holden, 2009, p. 55). A diferença

pode em parte ser explicada porque durante muitos anos, a comunidade científica nacional não teve

40

as condições sociais, políticas, económicas e institucionais (Gonçalves & Castro, 2003) desejáveis para

uma relação de proximidade com a sociedade.

O investimento público nos recursos humanos, em I&D, bem como na formação e na

educação científico-tecnológica foi relativamente baixo até meados dos anos 90 (Oliveira & Carvalho,

2015). O contexto do sistema científico português ajuda a compreender as dificuldades apontadas

pelos cientistas nacionais. Como referido, até há pouco tempo as atividades de comunicação de

ciência eram tidas como um objetivo de menor relevância, ocorrendo escassas vezes e sem

financiamento público significativo. Verifica-se, por conseguinte, alguma imaturidade por parte da

comunidade científica e do próprio sistema científico nessa vertente, embora seja reconhecido por

vários especialistas que se esteja no bom caminho (Alves, 2011 citado por Oliveira & Carvalho, 2012,

p. 26).

No entanto, uma outra questão surge quando se aborda o tema da inserção de métricas de

avaliação na carreira docente relativamente a atividades de CPC. Alguns dos cientistas “inquiridos

levantaram a questão da injusta equidade na inserção de métricas universais já que o envolvimento

com o público pode ser mais simples para umas áreas científicas do que para outras. Outros

mencionaram ainda a subjetividade inerente às capacidades individuais na comunicação pública de

uns cientistas relativamente a outros” (Burchell, Franklin, & Holden, 2009, p. 60).

Tempo disponível

Este é um tópico que apresenta uma quase unanimidade na comunidade científica: a carreira

científica/docência exige uma sobrecarga horária, o que limita o tempo disponível para a participação

neste tipo de atividades.

“Para ter um razoável sucesso como cientista algo como um mínimo de 80 horas por semana

é necessário, acho eu. Tento manter a cabeça acima da linha de água com as aulas, submissão de

projetos, de artigos, e presença em painéis públicos de avaliação. Ser cientista é uma vocação e um

compromisso pessoal mais o que um trabalho das nove as cinco” (entrevista a um investigador que

manteve o anonimato citado por Burchell, Franklin, & Holden, 2009, p. 57).

Bentley & Kyvik (2011) reforçam a ideia que “mesmo tendo os cientistas genuíno interesse em

particpar em atividades de comunicação pública de ciência, as outras atividades profissionais deixam

pouco tempo para o envolvimento com o público geral. Os dados indicam que em média os

41

académicos trabalham 48 horas por semana, incluíndo 40 horas em atividades centrais como

docência, investigação e gestão.” (2011, p. 60).

Perceções dos pares sobre comunicação pública de ciência

De entre as questões de carácter subjetivo abordadas neste capítulo, este é um tópico de

particular difícil de quantificação. No entanto, a verdade é que este surge quando se abordam as

dificuldades sentidas pelos cientistas na participação em atividade de CPC, e pode ter duas

perspetivas distintas. “Os cientistas que dedicam atenção à comunicação pública de ciência são

identificados como tendo objetivos não consistentes com as normas da ciência. São acusados de

sacrificar princípios científicos como a modéstia e o rigor, na prossecução de interesses próprios e

satisfação do seu ego ou interesses comerciais” (Burchell, Franklin, & Holden, 2009, p. 61).

No entanto, não apenas a crítica perante um suposto desvio das normas da ciência pode ser

referida, já que críticas ao próprio mérito científico de quem participa em atividade de CPC são

também identificadas: “outros cientistas apontam que se um cientista está a fazer algo positivo em

termos de PEST é porque pretende seguir uma carreira alternativa dado não ter tido sucesso como

cientista” (Burchell, Franklin, & Holden, 2009, p. 62).

Isto apesar de o extenso23 estudo de Jensen, Rouquier, Kreimer, & Croissant (2008), ter

indicado que existe uma tendência para que os cientistas mais ativos em comunicação pública de

ciência serem também os mais ativos em termos académicos (com um índice h superior à média).

Preparação para participar em atividades de comunicação pública de ciência

“Um dado consistentemente expresso por todos os entrevistados é a dificuldade de participar

em atividades de comunicação pública fora de cenários conhecidos como por exemplo, laboratórios

ou reuniões científicas. Atividades como palestras em escolas ou conferências de imprensa, refletem

potenciais sentimentos de desconforto, imprevisibilidade, exposição e vulnerabilidade” (Burchell,

Franklin, & Holden, 2009, p. 62).

Como referem Brownell, Price, & Steinman (2013) sendo aceite que os cientistas precisam de

ser comunicadores, comunicar com público leigo não é uma tarefa trivial. Os cientistas são

23 Foram analisados os dados cedidos pela Direção de Recursos Humanos da CNRS referentes a 11 000 cientistas. Os cientistas são obrigados a preencher uma declaração onde registam anualmente as atividades de comunicação em que participaram no ano transato (Jensen, Rouquier, Kreimer, & Croissant, 2008, p. 2).

42

meticulosamente treinados em metodologias e técnicas laboratoriais, mas frequentemente não

recebem qualquer treino formal na comunicação pública direta ou indireta de ciência. Sendo a

comunicação com um público não especializado normalmente difícil, a comunicação com grupos

ativistas ou setoriais apresenta ainda maiores dificuldades, dada a sua possível hostilidade inicial para

com o cientista. Tal “desconforto pode conduzir a um ´silenciamento´ do cientista que caso contrário

poderia estar disponível a partilhar a sua pesquisa com o público” (Burchell et al., 2009, p. 63).

Oliveira & Carvalho abordam a mesma perceção dos cientistas nacionais que se “deparam

com dificuldades em entender o processo comunicativo que este tipo de comunicação envolve,

sublinhando a excessiva simplificação jornalística da informação que transmitem, tornando-a

redutora e sem conteúdo suficiente e a dificuldade em explicar a relevância social e complexidade de

alguns assuntos de forma concreta e percetível” (2012, p. 26).

Posição na carreira científica

Relativamente a este ponto, parece existir uma relativa contradição nos argumentos

avançados. Se por um lado, são reconhecidas as características únicas dos investigadores mais jovens

e em fases iniciais da carreira no contacto com o público relativamente aos mais séniores, é também

reconhecida uma certa pressão para que precisamente os mais jovens não percam o seu tempo com

estas atividades.

“O que precisamos é de pessoas jovens, de pessoas com vigor e excitantes e que comuniquem

esse entusiasmo ao público e aos estudantes” (Ian Craig, cientista inglês citado em Burchell et al.,

2009, p. 64). No entanto, outros cientistas expressam a sua preocupação para com os cientistas mais

jovens, já “que são aqueles para quem os imperativos de tempo e de pressão para publicação são

mais prementes” (Burchell et al., 2009). No entanto e tal como expresso no estudo de Martín-

Sempere et al., (2008, p. 362), os mais jovens são os que são mais influenciados externamente na sua

decisão de participação ou não em atividades de comunicação pública. Como refere Kay Davies,

“quando os meus post docs me perguntam se devem ou não participar, eu digo que devem fazer

aquilo com que se sentem confortáveis, mas refiro igualmente que o futuro deles como cientistas

depende dos seus resultados científicos e não podem passar muito tempo em atividades de

envolvimento com o público” (Burchell et al., 2009, p 64).

43

3.1.3 - Fatores que influenciam a participação dos cientistas

Perante a identificação das principais dificuldades sentidas pelos cientistas, alguns estudos

tentaram discernir quais são as barreiras que influenciam efetivamente a participação dos cientistas

em atividades de comunicação pública.

Poliakoff & Webb (2007, p. 254) referem24 que os fatores que mais influenciam a participação

dos cientistas em atividades de comunicação pública são:

Comportamento passado: perceção da sua participação nestas atividades no passado;

Atitudes: se os cientistas consideram como positivo a participação neste tipo de

atividades;

Perceção de controlo: se os cientistas se sentem capazes de participar neste tipo de

atividades;

Normas descritivas: a perceção do número de colegas cientistas que estão também a

participar também nestas atividades.

Em linha com outros autores, surgem os resultados apresentados por Dudo (2012, p. 491)25.

Os cientistas com um maior estatuto e uma maior autonomia organizacional para

comunicarem com o exterior participam numa maior quantidade de atividades de comunicação

pública. Sendo que o ‘género’ não se mostrou significativo quanto ao nível de atividade de CPC.

Os cientistas com atitudes mais positivas quanto à participação neste tipo de

atividades, ou com uma perceção mais positiva das suas competências comunicacionais ou ainda

com formação formal em comunicação apresentam maior probabilidade de participar em atividades

de CPC.

Finalmente, Besley, Oh, & Nisbet (2012) 26 referem que na globalidade, a ‘disciplina científica’,

a ‘idade’ e o ‘género’ são pouco preditivos do nível de participação em atividades de comunicação

24 Estudo realizado entre 2004 e 2005 na universidade de Manchester, Reino Unido. Foram enviados 1000 questionários para cientistas desta universidade, tendo obtido uma percentagem de resposta de 16,9%, ou seja, 169 respostas (Poliakoff & Webb, 2007, p. 249). 25 Estudo realizado entre 2005 e 2006, com uma amostra de 1 254 cientistas (epidemiologistas e investigadores da área das células estaminais) norte americanos. Responderam ao inquérito enviado por correio 363 cientistas (Dudo, 2012). 26 A análise dos autores é baseada em dois estudos independentes. O estudo 1 resulta dos dados obtidos pelo PEW/AAAS (Research Centre for the People and the Press / American Association for the Advancement of Science), conduzido em 2009 a 2 533 membros da AAAS, através de questionários postais e online. O estudo 2 resulta de um questionário realizado pela Royal Society, conduzido a 1377 cientistas e engenheiros de 50 instituições de ensino superior no Reino Unido, através de questionário online (Besley, Oh, & Nisbet, Predicting scientists’ participation in public life, 2012).

44

pública por parte dos cientistas. Pelo contrário, factores como a perceção e atitude para com estas

atividades possuem um maior poder preditivo da participação dos cientistas (Besley, Oh, & Nisbet,

2012, p. 984).

Isto porque todos os autores aqui referidos identificam a importância do desenvolvimento de

atitudes positivas pelos cientistas para com as atividades de comunicação pública. E estas serão

sempre mais potenciadas se os cientistas percecionarem que os seus pares e a própria instituição

valoriza e incentiva a sua participação. Seja através de uma valorização moral e subjetiva, ou seja

através de incentivos e apoios tangíveis, como o providenciar de formação formal em comunicação

pública. Isto para que uma frase frequentemente utilizada no ‘terreno’ e citada por Bauer não seja a

norma mas sim a exceção: “São sempre os mesmos a participar nestas atividades” (Bauer & Jensen,

2011, p. 5).

3.1.4 - Formação dos cientistas em Comunicação Pública de Ciência

O tema da formação (formal ou informal) de cientistas em comunicação de ciência abarca em

si mesma, duas perspetivas distintas: o nível institucional e o nível individual.

A nível individual, são identificadas pelos cientistas dificuldades na atuação em contextos que

não lhes são familiares e para os quais “não se consideram as pessoas mais equipadas” (Martín-

Sempere et al., 2008, p. 350). Esta situação pode ter uma influência decisiva na perceção (positiva ou

negativa) do cientista quanto às experiências anteriores de comunicação com o público, o que

segundo Poliakoff & Webb corresponde a um “factor com poder preditivo na disponibilidade do

cientista em participar em atividades futuras” (2007, p. 256).

Existe, por vezes, uma perceção irrealista de que os cientistas, pelo facto de serem

especialistas no seu campo são naturalmente especialistas em comunicar com o público não

especializado. Apesar de existirem membros da comunidade científica com notáveis capacidades de

comunicação (Oliver Saks, Carl Sagan ou Stephen Hawking, por exemplo), estas não surgiram de

forma inata, tendo sido desenvolvidas ao longo de anos (Brownell et al., 2013). Um cientista sem

experiência em comunicar com o público leigo necessita de, tal como em qualquer outra área,

praticar a sua comunicação pública de modo a evoluir.

Mas se existem cientistas que desejam participar em formações de comunicação de ciência,

existem outros que não pretendem dedicar o seu já pouco tempo disponível, a este tipo de ações:

“Penso que já usei isto [participação na Semana do Cérebro] como um treino de comunicação –

45

aprendi muito sobre como comunicar com o público acerca do meu trabalho. Eu estarei mais

confiante da próxima vez. Mas não penso que formação específica iria funcionar e não dedicaria o

meu tempo a isso.” (entrevista de cientista citada por Poliakoff & Webb, 2007, p. 256). Contudo,

Brownell et al. (2013) realçam que se existem muitas oportunidades ao longo da carreira científica

para comunicação entre pares, através de cursos, lab meetings, retiros científicos e congressos,

existem muito menos oportunidades quando se aborda a comunicação com público não-

especializado.

Apesar de ao longo da formação científica e na investigação, os cientistas terem a

possibilidade de participar nas suas instituições em atividades como ‘dias abertos’ ou feiras de

ciência, estas ações são relativamente informais e não sistemáticas. Não são assim, utilizadas pelos

estudantes como uma forma de desenvolvimento das suas competências comunicacionais e são

inclusivamente, por vezes desaconselhadas pelos seus próprios orientadores (Brownell, Price, &

Steinman, 2013).

Por conseguinte, a formação em comunicação pública surge como uma possibilidade de ajuda

aos cientistas no ultrapassar das suas dificuldades. De facto, Miller, et al. (2009) referem que existem

evidências empíricas de que os cientistas que receberam formação em comunicação de ciência

apresentam maior confiança em contactar com os meios de comunicação social. No entanto, a

possibilidade de participação dos cientistas nestas ações de formação está muito relacionada com as

instituições em que estão integrados.

As instituições científicas apresentam diferenças significativas quanto ao nível de importância

atribuído à comunicação pública. A disponibilização ao corpo académico de oportunidades de

formação nesta área é precisamente um dos indicadores utilizados na classificação do nível de

envolvimento com esta área por parte de uma instituição. Dada a diversidade de possíveis formatos

e conteúdos que podem ser apresentados em formações de comunicação de ciência, não é possível

apresentar ao leitor qual o formato ou quais as competências que poderá adquirir, caso participe

numa destes formações.

46

Miller, Fahy, & ESConet Team (2009) através do projeto27 da European Science

Communication Network (ESConet), referem que o objetivo primordial das formações ministradas a

cientistas foi: “capacitar os cientistas, principalmente cientistas em início de carreira, para comunicar

eficazmente como os meios de comunicação social, decisores políticos e diferentes segmentos do

público leigo e ao mesmto tempo encorajar os cientistas a refletir sobre o lugar da ciência na

sociedade e adotar uma atitude aberta quanto à comunicação pública” (p. 117). Os 12 módulos das

formações realizadas no âmbito deste projeto abarcavam: 1) ‘Com quem estás a comunicar e

porquê?’ 2) ‘Escrita para os meios de comunicação social´; 3) ‘Falar com os meios de comunicação

social‘; 4) ‘Como os meios de comunicação social reportam a ciência’; 5) ‘Apresentar a ciência a

decisores políticos’; 6) ‘ Ciência na Web’; 7) ‘Ciência Hands-On’; 8) ‘Comunicação de risco‘; 9)

‘Apresentar ciência e ouvir‘; 10) ‘Ciência e a controvérsia‘; 11) ‘As ciências sociais e a comunicação

de ciência’; 12) ‘Ciência e cultura’ (Miller, Fahy, & ESConet Team, 2009, p. 119).

Tendo tido este projeto um âmbito extremamente alargado, outras formações que o leitor

poderá encontrar irão tipicamente abordar apenas uma ou duas áreas – seja a relação com os meios

de comunicação social, ou técnicas de comunicação oral, por exemplo. Assim, caso o leitor possua

interesse, poderá estar atento à divulgação da sua instituição ou de outras instituições similares,

consultando os objetivos e estruturação de conteúdos de cada formação específica.

Brownell et al. (2013) apresentam uma outra possibilidade que as universidades poderão

adotar no sentido de capacitar os seus alunos e investigadores em início de carreira: a inserção de

disciplinas opcionais de comunicação de ciência nos currícula dos cursos científicos. Os autores

apresentam o exemplo de uma disciplina inserida no curso de Imunologia da Escola Médica da

Universidade de Sanford (EUA). Tendo sido esta disciplina principalmente dirigida para a formação

em escrita científica para públicos leigos e para os meios de comunicação social, os autores

apresentam três recomendações para outras instituições:

Apresentação de conteúdos científicos de base em conjunto com as técnicas de

comunicação nas aulas (não eliminar a parte científica, para não ‘afastar’ alunos que não tenham um

interesse inicial em comunicação de ciência);

27 Desenvolvido entre 2009 e 2010, onde foram realizados 20 workshops, envolvendo 231 cientistas de 34 países (informação disponível no relatório final do projeto disponível em https://esconet.files.wordpress.com/2012/09/esconet_trainers_final_report.pdf) (consultada a 15 setembro de 2015).

47

Inserção de exercícios práticos e relacionados com situações específicas da área

científica;

Inserção de conteúdos relacionados com técnicas de comunicações orais.

Brownell et al. (2013) abordam ainda a dúvida quanto à inserção destas disciplinas apenas ao

nível de estudos pós-graduados ou não. A opinião dos autores é que tal deve ser feito também ao

nível de licenciatura, como uma forma de promoção da importância da comunicação pública por

entre todos os estudantes de ciências e não apenas os que tencionam seguir uma carreira científica.

Assim e caso o leitor ambicione uma formação mais completa na área da comunicação de

ciência existem em Portugal estudos pós-graduados (mestrados e doutoramentos) em várias

universidades, como a Universidade Nova de Lisboa, Universidade do Porto, Universidade de Aveiro,

Universidade de Lisboa, Universidade de Évora e Universidade de Coimbra.

3.1.5 - Os cientistas como representantes públicos da ciência

Sendo verdadeiro o acima referido por Marcinkowski et al. (2013), de que os cientistas

assumem de facto um papel cada vez mais importante na personificação de uma instituição científica

perante os meios de comunicação social e a sociedade, será relevante perceber quais os possíveis

papéis assumidos pelos cientistas quando comunicam publicamente. Horst (2013) identifica três

possíveis papéis assumidos pelos cientistas:

O papel de representação de uma disciplina científica (especialista);

O papel de representação de uma organização científica (gestor científico);

O papel de representação da ciência como um todo (guardião da ciência).

Cada um destes papéis representa não só uma identidade assumida pelo cientista, como

também uma visão do que é a ciência e quem são os públicos. Contudo, Horst (2013) salienta que na

prática, os cientistas poderão adotar qualquer um destes papéis de acordo com o contexto e em

diferentes combinações. Sendo importante realçar e em concordância com o apresentado nos

estudos anteriores, que a atitude do cientista perante a ciência possui maior influência no assumir

de um destes papéis do que propriamente aspetos sociodemográficos, como idade ou género.

Apesar desta possível flexibilidade, Horst (2013, p. 774) indica que o assumir do papel de

‘especialista’ é o mais frequente, dado corresponder ao âmago da identidade dos cientistas.

48

O ‘especialista’

Quando o cientista representa uma área do conhecimento, este assume-se como um

‘especialista’ perante o público. A ciência é por este concebida como um conjunto de disciplinas que

providenciam conhecimento factual sobre o mundo. Neste papel, avalia a qualidade da comunicação

principalmente com base no rigor científico, não se preocupando muito com a audiência apesar de

ter uma vaga ideia de diferentes públicos. Estes públicos são diferenciados apenas com base nos

diferentes interesses do público para com a sua disciplina científica (interessados vs. desinteressados,

apoiantes vs. opositores, p. ex.).

O ‘especialista’ considera ser sua obrigação comunicar com o público, no entanto e dado o

seu enfâse no rigor científico, preocupa-o a falta de conhecimento científico do público e as possíveis

distorções inseridas na comunicação quando tem de ‘falar’ com os meios de comunicação social.

Em termos da avaliação das comunicações de outros cientistas, o ‘especialista’ considera que

o primordial é que estes se resumam aos factos e mantenham o maior rigor possível. Colocam a

hipótese de interferir com a comunicação de um outro cientista, mas apenas se identificarem a

existência de erros factuais, e sempre numa perspetiva de um colega para outro. Quanto ao modo

como os cientistas poderão ou deverão aprender a comunicar com o público, não dedica muito

tempo a isso e considera que tal virá com o tempo e da mesma forma que um cientista aprende ao

longo da sua carreira a lidar com procedimentos administrativos.

O ‘gestor de ciência’

Quando o cientista assume este papel, está a representar uma instituição científica. Neste

papel, a ciência é agora uma atividade social organizada em universidades e outras organizações

científicas, que para produzirem conhecimento necessitam de recursos. Quando comunica e tal como

os ‘especialistas’ preocupa-se com o rigor científico, mas agora preocupa-se igualmente com a

imagem da instituição que representa. Assim pensa mais estrategicamente sobre a sua audiência,

atribuindo importância às motivações pessoais dos diferentes públicos a que se dirige. O ‘gestor de

ciência’ não é movido primordialmente pela sua sensação de dever para com a sociedade, mas sim

por considerar isso como uma função importante da sua atividade de gestor e em representação da

sua instituição. Assim sendo, o seu objetivo principal não é o de transmitir factos científicos mas

antes colocar a instituição numa situação competitiva o mais favorável possível.

49

Consequentemente, o ‘gestor de ciência’ vê a aquisição sistemática de competências de

comunicação como algo favorável e necessário. Possui já a perceção da importância de desenvolver

proactivamente atividades de comunicação para efeitos de promoção da sua instituição. Este papel

é de facto, o que mais se relaciona com o alcançar de uma posição de coordenação científica. No

entanto, Horst (2013) refere que alguns dos seus entrevistados, mesmo tendo tido no passado

posições de gestão de grandes unidades de investigação, não assumiram este papel de ´gestor de

ciência´.

O ‘guardião da ciência’

Quando o cientista representa a ciência como uma conquista cultural, está a assumir o papel

de ‘guardião da ciência’. A ciência é neste papel, comunicada como sendo a base racional da

resolução de problemas na sociedade e fonte última de esclarecimento e iluminação. Tal posição

reflete-se no que o ‘guardião da ciência’ considera ser o principal objetivo da comunicação pública:

aumentar a perceção da ciência pelo público. Assim sendo, o seu principal critério de avaliação é se

a comunicação consegue ou não reforçar a ‘iluminação’ dos cidadãos.

Da mesma forma que o ‘especialista’, o ‘guardião da ciência’ preocupa-se bastante com a falta

de conhecimento científico do público leigo e dos decisores políticos. No assumir deste papel, todas

as atividades de comunicação representam uma ‘batalha’ pela iluminação. O mundo é representado

com base em dicotomias e a ciência está sob ‘ataque’, pelo que o ‘guardião da ciência’ tenta modificar

esta situação através do seu compromisso pessoal. Por este facto, a sua sensação de dever diferencia-

se ligeiramente da do ‘especialista’. Mais do que fornecer informação científica, preocupa o ‘guardião

da ciência’ se a comunicação consegue marcar ou não a diferença perante um público ávido de

informação. Assim sendo, dedica um considerável esforço a refletir na sua própria comunicação e no

seu estilo de comunicar.

Este é um esforço pessoal derivado de uma opção pessoal, não sendo o seu objetivo levar

outros cientistas a comunicar, apesar de considerar que o seu esforço pode inspirar os cientistas

menos experientes no seu trabalho. O modo como outros cientistas poderão adquirir competências

em comunicar com o público, não é uma preocupação principal. Tal como o ‘especialista’, essa é uma

competência que poderá surgirá com o tempo e a experiência.

50

Numa perspetiva global, Horst (2013) conclui que os cientistas denotam uma grande

proximidade ao modelo do défice: existe uma falta de conhecimento no público leigo e decisores

políticos e é o ´dever´ dos cientistas colmatar essa falha.

3.1.6 - Quem ‘faz’ comunicação de ciência?

Sendo a comunicação de ciência uma área multidisciplinar, realizada por pessoas com

diferentes formações e ambições, poderá ser importante tentar compreender quem são essas

pessoas e com que objetivos. Bowater & Yeoman (2013) na tentiva de responderem a esta pergunta

apresentam os resultados do relatório ‘Towards a Professional Framework for Scientists Involved in

Public Engagement Work’ produzido em 2010 pelo instituto Wellcome Trust Sanger.

Neste relatório, surge a identificação de 5 grupos distintos quanto às suas características e

objetivos (Bowater & Yeoman, 2013, p . 63).

Comunicadores de ciência profissionais

Os elementos deste grupo podem exercer funções em centros de ciência, museus, institutos

de investigação e universidades, ou podem ainda ter atividade própria. Frequentemente possuem

formação como cientistas, mas já não têm a ciência como a sua ocupação principal.

Académicos da área da comunicação de ciência

Este grupo é composto por académicos com formação em ciências naturais, exatas ou sociais,

podendo eventualmente conduzir a sua própria pesquisa. Possuem como principal característica

dirigirem e/ou ensinarem em cursos de pós graduação em comunicação de ciência. Estes académicos

podem eles próprios estar envolvidos em atividades de comunicação de ciência.

Divulgadores de ciência

Grupo composto por elementos que adquiriram popularidade com o público através dos

meios de comunicação social, como a imprensa, rádio ou a televisão ou ainda através de palestras

públicas. Este grupo corresponde a cientistas com uma grande motivação para entusiasmar as

audiências sobre a ciência.

Defensores da ciência

Os elementos deste grupo estão fortemente envolvidos na comunicação de ciência. A sua

investigação é socialmente controversa ou ‘noticiável’, sendo por esse facto muitas vezes convidados

pelos meios de comunicação social a participarem em debates ou reportagens. A diferença para os

51

‘divulgadores de ciência’ reside na motivação, já que este grupo não possui um elevado entusiasmo

em comunicar com o público, definindo-se primordialmente como cientista.

Cientistas

Grupo composto por cientistas que se envolvem em comunicação pública com grupos

escolares ou em eventos de comunicação de ciência, como algo acessório ao seu trabalho principal.

A motivação principal deste grupo é cumprir a sua sensação de dever para com a sociedade.

Neste momento o leitor pode legitimamente perguntar qual a diferença entre estas

definições e os papéis assumidos na comunicação pública. A diferença reside no âmbito da pergunta

que os origina. Se o relatório ‘Towards a Professional Framework for Scientists Involved in Public

Engagement Work’ procura identificar os diferentes grupos que desenvolvem comunicação pública

de ciência, Horst (2013) tentou categorizar os modos de representação da ciência considerando

apenas os cientistas. Não só os cientistas produzem comunicação pública de ciência. Os

comunicadores profissionais de ciência surgem como uma classe profissional distinta que apesar de

uma grande relação com a ciência, não têm como ocupação principal a investigação. No entanto,

perante os restantes grupos podem ser estabelecidas pontes para com os modos de representação

da ciência definidos por Horst (2013). Os ‘académicos da comunicação de ciência’, dado o seu

interesse profissional nesta área e o empenho na formação de novas gerações de comunicadores de

ciência possuem caraterísticas que os colocam entre um profissional de comunicação de ciência e

um cientista, escapando em grande parte aos modos de representação definidos por Horst (2013).

Quanto aos ‘divulgadores de ciência’, estes possuem claras similitudes com os ‘guardiões da

ciência’, enquanto os ‘defensores da ciência’ pelas suas características poderão assumir o papel de

‘especialista’ ou de ‘guardião da ciência’ de acordo com o contexto. Por último, o ‘cientista’ é

claramente enquadrado pelo papel de ‘especialista’. Surge como relevante novamente salientar, que

estas definições não são mutuamente exclusivas ou incompatíveis, podendo ser adotados diferentes

papéis de acordo com o contexto do momento em que se comunica ciência com o público.

52

3.2 – As instituições, o financiamento científico e a comunicação pública

Neste subcapítulo será aprofundado o tema da relação das instituições científicas com a

comunicação pública de ciência e se a ligação destas à sociedade é uma preocupação transposta ou

não para as suas missões, valores e funcionamento diário. Por fim, serão abordadas as conceções de

comunicação pública de ciência tidas por alguns organismos de financiamento científico. Isto porque

tais conceções possuem relação direta com os requisitos de comunicação pública de ciência que

inserem nos seus formulários para candidaturas a financiamento. Dado o público-alvo deste guia, os

exemplos apresentados terão um enfoque particular na Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT)

e no programa Horizon 2020 da Comissão Europeia.

3.2.1 - As instituições científicas

A comunicação pública de ciência tem tido uma crescente atenção por parte das instituições

de investigação científica da Europa. Recursos financeiros e humanos têm sido dedicados a estas

atividades e os cientistas são encorajados institucionalmente a desenvolverem esta ‘terceira função’

além das mais tradicionais funções de investigação e docência (Neresini & Bucchi, 2011).

Contudo, enquanto as últimas duas funções possuem indicadores de avaliação formalmente

estabelecidos na carreira científica – apesar de periodicamente serem tema de debate – as atividades

de comunicação pública de ciência são ainda realizadas como um ato de ‘boa vontade’ (Neresini &

Bucchi, 2011). Em linha com Neresini & Bucchi (2011) e outros autores referidos nos subcapítulos

anteriores, Austin Smith (investigador inglês em células estaminais) refere que apesar de reconhecer

que estas atividades são agora uma parte integrante da carreira científica: “O que vais encontrar nas

universidades é que irão dizer ‘isso é muito bom’ mas quando surge o próximo momento de promoção

na carreira na universidade isso é completamente ignorado” (entrevistado por Burchell, Franklin &

Holden, 2009, p. 56). Jensen et al. (2008) apresentam precisamente a mesma ideia: “Apesar de uma

crescente preocupação com o tema, a realidade no terreno é ainda bastante diferente. No formulário

de candidatura a ‘Directeur de recherche’ do CNRS apenas 9 linhas são fornecidas para sintetizar 20

anos de comunicação pública da sua pesquisa” (p. 1).

Com o objetivo de responder à pergunta ‘Estão as instituições realmente envolvidas no

encorajamento de atividades de comunicação pública?’, Neresini & Bucchi (2011) realizaram um

53

estudo exploratório28 com 40 instituições europeias, sendo duas destas, universidades portuguesas.

Segundo os autores, a resposta a tal pergunta não se pode limitar à identificação da presença ou

ausência destas atividades, mas também à compreensão do estatuto dado pelas organizações a estas

atividades. Estatuto esse que se depara com o dilema entre ‘Especialização’ (a comunicação e o

envolvimento do público tem de ser confiado a pessoas especialmente treinadas e dedicadas ao

tema) e ‘Difusão’ (tais atividades devem ser confiadas aos cientistas). Sendo que como Davies refere

“na prática serão sempre indivíduos ou pequenos grupos de especialistas que irão entrar em contacto

com o público, não a ciência ou a instituição per si” (2008 citado por Neresini & Bucchi, 2011, p. 65).

Finalmente, Neresini & Bucchi (2011) abordam ainda a questão de que uma análise

quantitativa dos recursos alocados por uma instituição para a comunicação pública não é

imediatamente traduzida na qualidade dos resultados das atividades e muito menos no impacto na

sociedade. Analisando vários indicadores de práticas organizacionais e das páginas de internet

institucionais, os autores criaram um ranking (‘alto’, ‘médio-alto’, ‘médio-baixo’ e ‘baixo’) para

distribuição das instituições analisadas. A sua principal conclusão é a de que a maior parte das

instituições se posicionam na categoria ‘médio-baixo’. Os autores interpretam os resultados como

uma indicação de que a comunicação pública de ciência ainda não desempenha um papel relevante

nas instituições europeias de investigação científica. Os resultados apontam também para um

cenário desigual: um grande ‘fosso’ entre uma minoria de instituições muito ativas nesta área e uma

grande maioria de instituições pouco ativas (Neresini & Bucchi, 2011).

A falta de uma real integração da comunicação pública na cultura organizacional conduz a que

muitos dos cientistas que integram a instituição não conheçam os recursos disponibilizados pela

própria instituição: “Tanto quanto eu saiba, não consigo identificar nenhum gabinete [de

comunicação] …tenho uma impressão que existe, sim…tenho a certeza que existem pessoas dedicadas

a isto, mas não sei quem são e onde estão localizadas” (investigadora júnior, área da biomedicina

citado por Neresini & Bucchi, 2011, p. 76). Um dos principais tipos de riscos associados a esta fraca

integração na cultura organizacional é que a ‘boa vontade’ demonstrada pelos cientistas na

28 Estudo realizado em duas fases distintas: a primeira decorreu entre janeiro de 2007 e novembro de 2008, envolvendo a recolha de dados quantitativos através de inquérito e a segunda fase decorreu entre janeiro de 2009 e março de 2010 através de entrevistas em profundidade com diretores, membros do gabinete de comunicação e investigadores de 12 instituições das 40 da primeira fase ( (Neresini & Bucchi, 2011, p. 66).

54

participação nestas atividades ficará sempre confinada a episódios muito limitados e circunscritos no

tempo (Neresini & Bucchi, 2011).

Quanto ao posicionamento das universidades portuguesas, Oliveira & Carvalho (2015)

analisaram a informação inserida nas páginas de internet de várias instituições científicas nacionais.

De entre as instituições analisadas29, todas possuem referências à ligação da instituição com a

sociedade, utilizando uma grande variedade de expressões: ‘divulgação científica´, ‘ciência e

sociedade´ ou ‘outreach’. Fundamentam a importância destas ações salientando que a sua instituição

“reconhece a importância das implicações sociais e o interesse público na investigação” e o seu papel

“determinante no estimular da curiosidade e do interesse pela atividade científica, atraindo jovens e

menos jovens para o estudo e para a investigação em todas as áreas do conhecimento” (Oliveira &

Carvalho, 2015, p. 169).

Assim, apesar de uma notória aproximação aos paradigmas da Literacia Científica e da

Compreensão Pública de Ciência, é possível verificar que as instituições de ensino superior nacionais

demonstram publicamente a importância do reforço da sua ligação com o público não-especialista

(Oliveira & Carvalho, 2015, p. 170).

Por sua vez, Entradas (2015a) analisou as motivações das unidades de Investigação e

Desenvolvimento (I&D) portuguesas30 para comunicarem com o público não especializado. A

‘exigência por parte da instituição/universidade’ não é um fator relevante para as unidades de I&D.

No entanto, o mesmo já não se passa com a ‘exigência pelas instituições financiadoras’ que

representa já 12,0% das respostas recolhidas. As principais motivações para o desenvolvimento de

atividades de comunicação pública por parte destas unidades foram: a disseminação dos resultados

científicos (61,8%) e a resposta às políticas nacionais de promoção de ciência (16,7%).

Curiosamente, as motivações para a comunicação pública demonstradas pelas unidades de

I&D possuem maior semelhança com as motivações individuais dos cientistas do que com as das

instituições científicas. Assim, estas unidades aparentam possuir um maior sentido de dever para

com a sociedade do que uma prática comunicacional baseada numa política empresarial que as

universidades crescentemente adotam. Uma possível explicação, e sem dados empíricos que a

29 Listagem das universidades disponível em Oliveira & Carvalho (2015, p. 169). 30 Estudo refente aos anos 2013 e 2014, com uma amostra inicial de 386 unidade de I&D, tendo respondido ao

questionário 234 unidades de I&D (taxa de resposta de 61%) (Entradas, 2015ª, p. 2).

55

suportem, é o facto de o financiamento destas unidades provir maioritariamente de candidaturas a

programas públicos de financiamento. A identificação da ‘exigência por instituições financiadoras’

como importante fator de influência para comunicação com o público por parte destas unidades

pode estar relacionada com esta possível explicação. No entanto, perante a pequena percentagem

de respostas ‘queremos ouvir e envolver o público’, verifica-se que tal como os cientistas e as

universidades, existe uma maior proximidade da unidades de I&D aos paradigmas da Literacia

Científica e da Compreensão Pública da Ciência do que ao paradigma da Ciência na Sociedade.

Quanto ao nível de participação em atividades de comunicação pública, Entradas (2015a)

salienta que esta é uma prática algo recente nas unidades de I&D, já que perto de 20% destas apenas

comunica para o público geral há menos de cinco anos. Do total de 234 unidades, 89,9% refere já ter

participado em ações de comunicação pública, sendo que as que não desenvolvem estas práticas

apresentam as seguintes explicações para esse facto: ‘falta de recursos financeiros’ (50%);

‘comunicar não é uma prioridade’ (25%); ‘falta de tempo/capacidade/interesse dos seus

investigadores’ (16,7%).

Em consonância com as universidades, as unidades de I&D reconhecem a importância da

comunicação pública, contudo não interiorizam essa prática a um nível organizacional: 52% das

unidades não possuem recursos humanos alocados a tarefas específicas de comunicação e em

termos médios, dedicam apenas 1 a 5% do financiamento total para atividades de comunicação

pública.

3.2.2 - Os organismos financiadores

A obtenção de financiamento para a ciência é uma crescente preocupação das instituições

científicas, que competem com outras instituições similares pela atração de alunos e cientistas. Deste

modo, a identificação de programas de financiamento dirigidos à ciência e tecnologia assumem

particular relevância não só para universidades, mas também para unidades de I&D e grupos de

investigação.

Como referem Neresini & Bucchi (2011), o nível de integração da comunicação pública de

ciência na cultura corporativa de uma instituição possui também relação direta com a candidatura a

programas de financiamento científico. Isto porque um dos riscos associados a um baixo nível de

integração é uma falta de consenso no seio da sua comunidade sobre o que é a comunicação pública

de ciência, promovendo uma inserção vaga e descontextualizada (ou mesmo a não inserção) de

56

atividades de comunicação pública de ciência nas submissões de candidaturas a organismos

financiadores.

Sendo então importante a integração da comunicação pública de ciência na cultura interna

de uma instituição, o conhecimento de qual a conceção de comunicação de ciência tida pelo

organismo financiado também se configura como relevante. Com este tema em mente, Palmer &

Schibeci, (2014) analisaram31 20 organismos de financiamento científico na Europa, América do

norte, América do sul, Ásia, Oceânia e África. As suas principais conclusões são que todos os

organismos analisados promovem a comunicação entre pares (da comunidade científica), contudo

quanto à comunicação pública, existem diferentes posicionamentos. A proximidade aos modelos de

défice por estes organismos permanece maioritária, sendo que existem evidências de uma gradual

transposição para a adoção dos modelos de diálogo e participativo. É ainda possível salientar que de

entre os 20 organismos analisados pelos autores, os únicos que apresentavam uma conceção de

comunicação de ciência claramente ligada ao modelo participativo eram a Comissão Europeia e o

Research Council do Reino Unido.

3.2.3 – Sugestões de boas-práticas nas candidaturas a financiamento

Considerando o público-alvo do presente guia, serão aqui abordadas em maior detalhe as

conceções de comunicação pública de ciência da Comissão Europeia e da Fundação para a Ciência e

a Tecnologia. Isto com o objetivo de exemplificar quais os requisitos em termos de comunicação

pública na submissão de candidaturas a financiamento a estes organismos e apresentar sugestões de

boas práticas no preenchimento desses campos pelo leitor. Naturalmente, mesmo apenas no âmbito

destes dois organismos, não será aqui possível apresentar uma lista exaustiva de todas as possíveis

candidaturas. As sugestões apresentadas serão genéricas o suficiente para representar qualquer tipo

de candidatura, permitindo no entanto estabelecer um quadro conceptual que promova uma eficaz

demonstração aos organismos financiadores do plano de comunicação pública proposto por si em

qualquer tipologia de candidatura.

A Comissão Europeia, através do seu programa-quadro Horizon 2020 apresenta um

orçamento de 80 mil milhões de euros para um período de sete anos (2014 e 2020) de forma a

31 Através da recolha de informação presente nas páginas de internet, formulários de candidatura a financiamento e a missão e valores das várias organizações.

57

implementar a sua visão de uma “ união inovadora, que é uma estratégia de criação de um ambiente

facilitador para a transformação de ideias em produtos e serviços que irão permitir o crescimento

económico e a criação de emprego”32. Além da preocupação com a criação de empregos (que reflete

a grande preocupação dos europeus nos temas económicos), este programa-quadro possui uma

visão da comunicação de ciência totalmente integrada nos princípios do modelo de participação. Para

tal basta consultar a conceção de Public engagement presente no Horizon 2020: “O public

engagement implica o estabelecimento de um diálogo, partilha e participação de vários atores de

forma a promover uma compreensão mútua, cocriação de investigação e impactos inovadores,

conseguindo influenciar a agenda política. Corresponde à inclusão de cientistas, decisores políticos,

indústria, organizações civis e cidadãos no processo de deliberação sobre ciência e tecnologia”33.

Reforçando esta ideia, é possível constatar que de entre as oito secções do programa-quadro, uma

delas corresponde a ‘Science with and for society’ com a presença de calls em seis áreas distintas:

‘Public engagement in Responsible Research and Innovation’, ‘Ethics’, ‘Science Education’, ‘Promoting

Gender Equality in Research Equality and Innovation’, ‘Responsible research & innovation’ e ‘open

science (open acess)’34.

Numa análise dos formulários de candidatura35 é possível perceber que a inserção destas

atividades ocorre maioritariamente na secção dos ‘Impactos’, podendo surgir ou não, uma

diferenciação entre a disseminação/exploração dos resultados e atividades de comunicação. Apesar

da existência de claros pontos de contacto entre ambas, a diferença surge no âmbito dos objetivos.

A disseminação e exploração dos resultados possui uma vertente mais económica, onde é necessário

explicar (se for aplicável) como serão geridos os resultados obtidos pelo projeto e a relação que será

estabelecida com os potenciais utilizadores/consumidores desses resultados. As atividades de

comunicação possuem um enfoque na estratégia de comunicação do projeto e seus resultados,

através de diversas formas de interação com o(s) público(s)-alvo selecionado(s).

32 Informação disponibilizada em http://ec.europa.eu/research/innovation-union/index_en.cfm. (consultada a 5 de outubro de 2015). 33 Informação disponibilizada em http://ec.europa.eu/research/swafs/index.cfm?pg=policy&lib=engagement. (consultada a 5 de outubro de 2015). 34 Informação disponibilizada em http://ec.europa.eu/programmes/horizon2020/en/h2020-sections. (consultada a 5 de outubro de 2015). 35 Informação disponibilizada em http://ec.europa.eu/research/participants/portal/desktop/en/funding/reference_docs.html#h2020-call_ptef-pt. (Consultada a 5 de outubro de 2015).

58

Excerto de um formulário de candidatura de uma Coordination and Support Actions (CSA) e

Research and Innovation Actions (RIA) no âmbito do Horizon 202036:

“2.2 Measures to maximise impact a) Dissemination and exploitation of results Provide a draft plan for disseminating and exploiting the project’s results’ (unless the work programme topic explicitly states that such a plan is not required). The plan, which should be proportionate to the scale of the project, should contain measures to be implemented both during and after the project; Dissemination and exploitation measures should address the full range of potential users and uses including research, commercial, investment, social, environmental, policy making, setting standards, skills and educational training. The approach to innovation should be as comprehensive as possible, and must be tailored to the specific technical, market and organisational issues to be addressed. (...)” b) Communication activities Describe the proposed communication measures for promoting the project and its findings during the period of the grant. Measures should be proportionate to the scale of the project, with clear objectives. They should be tailored to the needs of various audiences, including groups beyond the project’s own community. Where relevant, include measures for public/societal engagement on issues related to the project.

Excerto de um formulário de candidatura a bolsa individual de uma ação Marie Skłodowska-Curie

no âmbito do Horizon 202037:

“2. Impact 2.2 Effectiveness of the proposed measures for communication and results dissemination. The new knowledge generated by the action should be used wherever possible to advance research, to foster innovation, and to promote the research profession to the public. Therefore develop following three points: - Communication and public engagement strategy of the action - Dissemination of the research results - Exploitation of results and intellectual property rights Concrete plans for the above must be included in the Gantt Chart (see point 3.1). The following sections of the European Charter for Researchers refer specifically to public engagement and dissemination: Public engagement Researchers should ensure that their research activities are made known to society at large in such a way that they can be understood by non-specialists, thereby improving the public's understanding of science. Direct engagement with the public will help researchers to better

36 Informação disponibilizada em http://ec.europa.eu/research/participants/data/ref/h2020/call_ptef/pt/h2020-call-pt-ria-ia_en.pdf. (consultada a 20 de agosto de 2015). 37 Informação disponibilizada em http://ec.europa.eu/research/participants/data/ref/h2020/call_ptef/pt/h2020-call-pt-msca-if_en.pdf. (consultada a 20 de agosto de 2015).

59

understand public interest in priorities for science and technology and also the public's concerns. Dissemination, exploitation of results All researchers should ensure, in compliance with their contractual arrangements, that the results of their research are disseminated and exploited, e.g. communicated, transferred into other research settings or, if appropriate, commercialised. Senior researchers, in particular, are expected to take a lead in ensuring that research is fruitful and that results are either exploited commercially or made accessible.”

A Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), por sua vez, apresenta na sua visão dois pontos:

“i) Tornar Portugal numa referência internacional em ciência, tecnologia e inovação; ii) Assegurar

que o conhecimento gerado pela investigação científica é plenamente utilizado para o crescimento

económico e o bem-estar dos cidadãos”, Como sua missão refere: “A missão da FCT é promover

continuadamente o avanço do conhecimento científico e tecnológico em Portugal, atingir os mais

elevados padrões internacionais de qualidade e competitividade em todos os domínios científicos e

tecnológicos, e estimular a sua difusão e contribuição para a sociedade e o tecido produtivo” 38.

Tal como no caso da Comissão Europeia, verifica-se a importância atribuída à relação da

ciência com a sociedade e a ciência como motor de crescimento económico. No entanto, não existem

indicações expressas de uma ligação tão próxima ao modelo participativo de comunicação de ciência

como no programa Horizon 2020.

Excerto do guião para elaboração e submissão de propostas de projetos IC&DT 2014 no âmbito da

FCT39:

“Indicadores Previstos Ações de divulgação da atividade científica. Embora seja importante a realização de iniciativas de divulgação da atividade científica, em fase de candidatura essa indicação expressa uma previsão de realização. A concretização destas ações deverá ser relatada durante a realização do projeto através dos relatórios de progresso e no relatório final e será objeto de análise pelos avaliadores após a conclusão dos trabalhos. Este campo não é obrigatório. A realização de ações de divulgação da atividade científica pode não ser adequada ao tipo de projeto ou, embora sendo-o, o/a IR poderá considerar não as incluir nas atividades do projeto. Em qualquer dos casos aconselha-se o/a IR a explicar, neste campo, a ausência de propostas deste tipo de atividade.”

38 Informação disponibilizada em http://www.fct.pt/fct.phtml.pt. (consultada a 20 de agosto de 2015). 39 Informação disponibilizada em http://www.fct.pt/apoios/projectos/concursos/2014/docs/Guiao_Candidatura_C2014_PT.pdf. (consultada a 20 de agosto de 2015).

60

Excerto do guião para submissão de candidatura a Investigador FCT 2014 no âmbito da FCT40:

“C.1.3 Expected outcomes/impact (Maximum 5 000 characters) Refer to the expected outcomes/impact of your project and how this will impact on your career development and on the scientific strategy of the host institution. If you expect your research to be a demonstrable example of excellent research contributing to society and to the economy, this should be mentioned. If activities of scientific dissemination are integral to your research project, and you consider organising them, describe your plans.”

Apenas com base nestes exemplos é possível verificar que existem situações muito diversas,

como candidaturas individuais, de um grupo de investigação, de uma Unidade de I&D, ou ainda de

uma instituição individual ou em consórcio. As escalas podem também ser várias: locais, regionais,

nacionais ou internacionais. Relativamente aos campos afetos a atividades de comunicação pública

estes podem ainda ser obrigatórios ou opcionais. Sendo uma realidade, que nestas candidaturas

(com exceção de calls cujo objetivo primordial é a comunicação pública) o enfoque principal reside

na componente científica, a verdade é que as atividades de disseminação e/ou comunicação pública

possuem uma crescente importância, sendo também analisadas pelos painéis de avaliação e

solicitadas nos relatórios de progresso dos projetos aceites para financiamento.

Como referido no documento da Comissão Europeia ‘Communicating EU research and

innovation guidance for project participants’41, as vantagens para o leitor apresentar uma boa

estratégia comunicacional poderão ser várias:

Aumentar a taxa de sucesso da proposta;

Atrair a atenção de potenciais parceiros;

Atrair estudantes e cientistas talentosos para o seu grupo/unidade/instituição;

Aumentar a sua reputação e visibilidade local, nacional ou internacional;

Ajudar na penetração de mercado dos produtos ou serviços gerados pelo projeto.

Possuindo então potenciais efeitos benéficos na avaliação das propostas é recomendável a

inserção nestas candidaturas de estratégias de comunicação pública eficazes e estruturadas. Para tal,

40 Informação disponibilizada em https://www.fct.pt/apoios/contratacaodoutorados/investigador-fct/2014/docs/ApplicationGuide_IF2014.pdf. (consultada a 20 de agosto de 2015).

41 Informação disponível em http://ec.europa.eu/research/participants/data/ref/h2020/other/gm/h2020-guide-comm_en.pdf. (consultado a 20 de agosto de 2015).

61

é aconselhável que defina antecipadamente o plano comunicacional para que estes campos não

sejam uma ‘dor de cabeça’ de última hora.

Como tal, a primeira e principal sugestão é a utilização dos recursos que a sua instituição de

acolhimento lhe proporciona. Apesar de possíveis diferentes designações (gabinete, departamento,

serviço, p.ex.), existem recursos humanos nas instituições de acolhimento em três áreas com

particular interesse para si:

Gestão de projetos - que poderão prestar informação sobre todas as questões que

envolvem um projeto ou uma call específica;

Inovação e transferência de conhecimento - que poderão prestar informação sobre

as melhores estratégias na relação com o setor empresarial ou gestão de direitos de autor e de

propriedade intelectual, por exemplo;

Comunicação/relações públicas/relações externas - que poderão prestar

informações e sugerir as melhores estratégias no contacto com a sociedade ou segmentos

populacionais de interesse, como público escolar, organizações não-governamentais, ou órgãos de

comunicação social, por exemplo.

Seguidamente serão enunciadas as principais fases na definição de qualquer estratégia

comunicacional, independentemente da escala ou dimensão dos recursos materiais, financeiros e

humanos da candidatura. Os avaliadores do organismo financiador deverão ser capazes de

rapidamente compreender na avaliação da candidatura que existe uma estratégia de comunicação

coerente e adequada e não um conjunto de medidas ad hoc.

1 – Defina numa frase qual a mais-valia para a sociedade da sua investigação/projeto

Qual a necessidade/problema/ambição da sociedade a que este projeto ou investigação

responde?

2 – Defina o público-alvo que pretende contactar

Existe frequentemente a tentação de definir logo à partida o canal de comunicação, sem

definição de quais os objetivos, a mensagem ou o público-alvo que pretende atingir. Como salientado

no documento de apoio aos candidatos ao programa Horizon 2020, ‘Communicating EU research and

innovation guidance for project participants’: “Quem nunca leu numa candidatura ‘vamos fazer um

vídeo para informar a sociedade’ sem definição do objetivo, da mensagem e público-alvo?”. Assim,

considere inicialmente a resposta à pergunta: “Qual o público que quero contactar?”.

62

A resposta a esta pergunta irá guiar toda a sua estratégia comunicacional. A resposta pode

ser apenas uma opção ou várias: o setor empresarial, o público geral não especializado, o público

escolar, os decisores políticos ou as associações ou representantes civis, por exemplo. Depois de

definir um ou mais destes grupos, responda: “De entre o público selecionado, quem possui interesse

direto ou pode contribuir para a minha investigação?”.

Se selecionou o mercado empresarial, qual é o setor ou as empresas que

utilizam/produzem/compram/distribuem o serviço ou produto gerado na sua investigação? São

pescadores, são empresas de software? Se selecionou o público geral, quem são as pessoas que

poderão ter interesse ou contacto no seu quotidiano com a sua investigação? São as pessoas que

utilizam os transportes públicos, são as pessoas que compram produtos alimentares orgânicos, são

desportistas? Se selecionou decisores políticos, quem são os decisores que possuem influência direta

no tema da sua investigação? Estão na área da educação, no planeamento urbano? O objetivo será

tentar definir com alguma precisão qual o público que pretende contactar.

Finalmente, de entre os públicos-alvo que selecionou identifique mediadores importantes

entre si e o público-alvo e qual o seu nível de ação. Ou seja, pretende agir a nível local (Lisboa, Aveiro,

p.ex.), a nível regional (região centro, norte, p. ex.), a nível nacional ou a nível internacional?

Conjugando estas duas informações, poderá identificar com relativa precisão a sua estratégia

comunicacional. Por exemplo, se possui um nível local e pretende comunicar com pessoas que

utilizam os transportes públicos, identifique a existência de associações civis ou outras organizações

que representam essa audiência e que poderão funcionar futuramente como multiplicadores

eficazes da sua comunicação.

3 – Defina o seu objetivo e impacto pretendido

Tendo identificado um público-alvo ou vários, responda: “Qual a reação, comportamento ou

contribuição que pretendo da minha audiência?”.

Assim, pretende contribuir para um aumento do nível de conhecimento científico do seu

público-alvo? Pretende impulsionar a sua audiência a alterar comportamentos? Pretende conhecer

a opinião e dialogar com o seu público-alvo? Pretende que o resultado do seu projeto seja

comercializado e disponibilizado no mercado?

Cada público-alvo definido representará um objetivo comunicacional distinto. Caso defina um

objetivo único para diferentes públicos-alvo pode existir a possibilidade de não estar a ser específico

63

o suficiente, reduzindo a eficácia da estratégia comunicacional. O objetivo da comunicação com um

vereador municipal dos transportes é distinto do objetivo de comunicar com as pessoas que utilizam

os transportes públicos ou ainda com alunos do secundário que estudam o tema dos combustíveis

fósseis ou a mobilidade nas cidades, por exemplo.

4- Defina a sua mensagem

Nesta fase, considere a adequação da sua mensagem ao público-alvo selecionado de acordo

com o impacto que pretende alcançar. Para tal deve tentar responder a algumas questões: “Qual o

nível de informação do público-alvo sobre o tema?”, “Qual a perceção (positiva ou negativa) do

público-alvo sobre o tema?”, “Qual o contributo que este público-alvo me pode fornecer?”

Será recomendável e eficiente uma construção conjunta da estratégia de comunicação entre

o cientista e os recursos humanos especializados de comunicação e/ou transferência de

conhecimento e tecnologia da instituição de acolhimento. Isto porque estes recursos humanos

poderão fornecer aos cientistas estudos de opinião já realizados ou pelo menos informações valiosas

baseadas na experiência de contacto direto com públicos da área de influência da instituição de

acolhimento, e que poderão ajudar na resposta a estas questões.

Se o público-alvo que identificou possui uma perceção negativa sobre o tema da sua

investigação, a sua mensagem terá de ter em consideração essa perceção. Por exemplo, se procede

a investigação utilizando testes com animais, poderá ter de incorporar na sua mensagem as regras

éticas que regem o seu trabalho e as razões que tornam necessário a experimentação animal. Se, por

exemplo, o público – alvo perceciona o seu tema de investigação como uma mais-valia para o seu

dia-a-dia ou para a sua empresa, a sua mensagem poderá focar-se nesse aspeto particular.

Em qualquer situação, a área da comunicação poderá disponibilizar informação que lhe

permitirá poupar muito tempo de pesquisa. Inclusivamente, poderão prestar assistência no teste

prévio da eficácia da mensagem definida. Tal pode ser conseguido, dialogando diretamente com

membros de cada um dos públicos-alvo identificados, de forma a integrar o contributo destes na sua

estratégia comunicacional ou inclusivamente na sua investigação.

Quanto à mensagem, esta deve ser clara e concisa, sendo capaz de cumprir os objetivos e

impactos definidos considerando as perceções específicas do público-alvo. De salientar que o

conceito de mensagem aqui referido corresponde aos pontos focais que pretende comunicar com

cada um dos seus públicos-alvo, ou seja, corresponde à ‘Take Home Message’.

64

5 – Defina os canais e técnicas de comunicação

Nesta fase, serão definidos os canais e formatos de comunicação a utilizar, com base nas

conclusões das fases anteriores. Assim, poderá utilizar comunicação interpessoal e/ou comunicação

de massas. As atividades de comunicação interpessoal possuem tipicamente uma audiência mais

reduzida, apresentam menores custos orçamentais, mas também um maior custo em termos de

tempo. Sendo mais interativas, fornecem bons indicadores de avaliação e feedback da audiência. Por

sua vez, as atividades de comunicação de massa apresentam a vantagem de poderem alcançar

grandes audiências simultaneamente através dos meios de comunicação social como mediadores da

informação, mas providenciam um menor feedback da audiência e capacidade de interação direta.

No entanto, neste momento estará em posição de conseguir responder: “Quais os locais ou

eventos que permitem um mais eficaz contacto com este público – alvo?”, “Quais os canais e

técnicas de comunicação mais eficazes para este público-alvo?”.

Se o seu projeto possui enfoque, por exemplo, em influenciar a decisão política, as melhores

ações comunicacionais serão as reuniões presenciais com os decisores políticos, que permitam

apresentar não só os resultados da sua investigação, mas também as perceções, necessidades e

opiniões do público geral que está diretamente relacionado com o tema e do qual já obteve feedback

como resultado de outras ações comunicacionais. Como por exemplo, a organização - na instituição

científica ou em locais públicos como a Câmara Municipal ou associações civis - de conferências de

consenso, mesas redondas ou painéis de cidadãos. No caso de pretender comunicar especificamente

com público escolar, poderá utilizar vários formatos coordenados com a direção das escolas e

professores da área de influência do projeto ou investigação. Poderão assim, ser desenvolvidas idas

periódicas da equipa de cientistas às escolas realizando apresentações, sessões laboratoriais ou

debates com professores e alunos, no âmbito do tema específico do projeto. Ou então, promover a

vinda de alunos à instituição de acolhimento de forma regular, numa ação faseada no tempo e

coordenada previamente com os professores.

Se, pelo contrário, pretende contactar com o público-geral e informar o maior número

possível de pessoas sobre determinado tema, então a utilização de comunicação de massas poderá

ser o mais indicado. No entanto, inclusivamente nestas situações é possível direcionar o esforço

comunicacional. Se atuação é ao nível local, o enfoque na imprensa regional poderá ser uma

estratégia eficiente ou através de divulgação em newsletters e publicações municipais, por exemplo.

A produção de material comunicacional como folhetos ou registos audiovisuais poderão ser então

65

concebidos de acordo com a mensagem anteriormente definida e as plataformas de distribuição

selecionadas de acordo com as características do público-alvo pretendido.

6 – Medição e avaliação do impacto

A manutenção de um registo atualizado das ações realizadas com os públicos-alvo

selecionados (desde número de reuniões realizadas, número de presenças em feiras e congressos,

materiais comunicacionais produzidos, p. ex.) irá permitir uma fácil disponibilização destes

indicadores nos relatórios de progresso à organização financiadora.

A produção de um website do projeto é uma estratégia eficaz, funcionando como uma ‘janela’

sempre disponível para o público. Na sua conceção, é recomendável a identificação logo na

Homepage de diferentes secções de acordo com os públicos-alvo definidos inicialmente. Assim, a

Homepage apresentará, por exemplo, uma secção relativa à componente científica e direcionada

para a comunidade científica, uma secção destinada ao setor empresarial e outra dirigida ao público

especializado. Em cada uma das secções, os utilizadores deverão ser capazes de identificar que os

conteúdos foram criados tendo em consideração as suas características específicas.

Em termos comunicacionais, um website possibilita uma complementaridade às várias ações

de interação direta ou indireta com os públicos-alvo, funcionando como um local onde os potenciais

interessados e parceiros poderão obter informação adicional ou apresentar as suas sugestões e

contribuições. No caso de não ser possível a criação de um website de raiz, poderá existir a

possibilidade, de o incorporar no website da instituição de acolhimento do projeto/investigação.

7 – Adequação dos recursos e objetivos

Sendo naturalmente distintos os recursos humanos, financeiros e materiais, as estratégias

comunicacionais a integrar na candidatura ao organismo financiador serão também distintas e

adequadas aos parâmetros de cada candidatura. No entanto, as fases antes mencionadas

permanecerão as mesmas, com a devida adequação à especificidade de cada projeto e candidatura.

Numa candidatura individual, resumidamente:

Identifique qual o público-alvo que pretende atingir ao longo da sua investigação e a

relação destes com o tema da sua investigação;

66

Quais os métodos que tenciona desenvolver para obter as perceções e contributos

desses públicos-alvo específicos no decorrer da sua investigação (reuniões com associações civis,

reuniões com professores, p. ex.);

Refira qual o impacto que espera gerar nesses públicos-alvo (contribuir para uma

alteração de regulação legal, alterar comportamentos de compra e hábitos de consumidores ou

profissionais de uma área, contribuir para um reforço de atitudes positivas para com a ciência, p. ex.);

Identifique as possíveis ações comunicacionais a realizar durante a sua investigação e

que potenciam a obtenção dos impactos pretendidos (presença em debates e apresentações,

comunicados de imprensa, ida a escolas na região ou receção destas no seu laboratório, saídas de

campo com público geral, conferências. p. ex.).

Pode incluir a referência de que irá procurar o apoio dos recursos humanos especializados da

instituição de acolhimento, tanto na realização de contactos iniciais como nas ações comunicacionais

a implementar futuramente.

No caso de um projeto de investigação, onde estão envolvidas várias equipas de

investigadores ou várias instituições nacionais e internacionais, os recursos dedicados a atividades

de comunicação terão outra magnitude e exigência. Assim, e de forma a transmitir ao organismo

financiador a perceção da importância atribuída à comunicação e disseminação dos resultados do

projeto, a inclusão de uma work package de comunicação que atravesse toda a planificação temporal

do projeto é uma boa estratégia (como sugerido no documento de apoio da Comissão Europeia

‘Communicating EU research and innovation guidance for project participants’).

Nesta work package poderão ser incluídas não só as tarefas de comunicação pública, como

as tarefas de comunicação interna do projeto. A comunicação será responsável, por exemplo, pela:

Conceção da imagem gráfica; Implementação e atualização do website do projeto;

Organização de eventos e reuniões entre os vários membros do projeto; Distribuição de relatórios e

documentos internos e externos (para o organismo financiador); Definição da estratégia

comunicacional com os públicos-alvo; Organização e avaliação das atividades de comunicação

pública com os vários públicos-alvo; Organização de ações de formação em comunicação de ciência

dos cientistas envolvidos no projeto; Gestão do processo de criação de materiais comunicacionais

como por exemplo, vídeos, manuais, folhetos ou exposições.

67

Quanto maior a dimensão de um projeto, maior a amplitude das tarefas comunicacionais

envolvidas. Por conseguinte, será necessário equacionar logo de início, a existência ou não de

disponibilidade de recursos humanos internos para tarefas como: criação da imagem gráfica,

desenvolvimento e manutenção do website, criação de materiais impressos ou exposições. Se tal não

for possível, será necessário prever a contratação de empresas externas nas rubricas de prestação

de serviços. Isto para demonstrar ao organismo financiador uma adequação entre os objetivos e os

recursos alocados para a sua concretização. Perante um objetivo como implementar uma exposição

para o público geral ou um documentário vídeo muito dificilmente tal objetivo será concretizável

apenas com os recursos internos disponíveis da instituição de acolhimento e sem necessidade de

contratação de empresas especializadas.

68

Capítulo 4 - A Comunicação Pública Direta de Ciência

“Comunicar. Na década da informação, esta skill é cada vez mais

determinante – em casa, no trabalho ou na vida social. Há quem diga que

saber comunicar é uma arte e uma enorme vantagem competitiva num

mundo altamente concorrencial. Para muitas pessoas, comunicar não passa

de uma áspera gritaria inexpressiva. Despejam quilos e quilos de palavras,

em vão – a mensagem não chega ao recetor. São os discursos mudos, estilo

monótona ladainha. A boa notícia? É possível melhorar esta qualidade”

(Ramos, 2000 citado por Rego, 2010, p. 24)

O objetivo principal deste capítulo é o de apresentar ao leitor um conjunto de sugestões do

‘terreno’. Muitas destas sugestões poderão ser consideradas pelo leitor como senso-comum e na

verdade são mesmo. O objetivo é que através de uma apresentação estruturada destas sugestões, o

leitor as possa utilizar para maximizar a eficiências das suas atividades de comunicação pública direta

de ciência, evitando ‘dores de cabeça’ desnecessárias.

Estas sugestões são baseadas na experiência profissional do autor e divididas em dois níveis:

o leitor como convidado a participar num ação de CPDC ou então como organizador de uma ação de

CPDC. Finalmente, serão também apresentadas algumas recomendações sobre o próprio ato

comunicacional, agora em três níveis distintos: numa apresentação pública, numa atividade com

grupos, numa presença em ‘stand’.

4.1 – Enquadramento

Tendo o leitor analisado as dificuldades e barreiras que enfrenta no seu dia-a-dia em

conjugação com a complexidade apresentada pelos diferentes públicos da ciência e decide iniciar ou

continuar a participar em atividades de comunicação pública de ciência, existem inúmeros formatos

e possibilidades de ações comunicacionais que pode implementar. Considerando a comunicação

pública de ciência, ou seja, a comunicação para públicos não especializados, duas grandes áreas

podem ser consideradas: a comunicação pública direta e a comunicação pública indireta.

69

4.1.1 - Comunicação Pública Direta vs. Comunicação Pública Indireta

O conceito de Comunicação Pública Direta de Ciência (CPDC) é uma terminologia adotada no

presente guia42 e que resulta da derivação do conceito de comunicação pública de ciência, pela

delimitação do fenómeno comunicacional quanto ao tempo e número43. Sendo que os objetivos

descritos na definição de comunicação de ciência se mantêm inalterados. Assim, a CPDC envolve a

realização de atividades comunicacionais síncronas, em que os participantes do processo

comunicacional estão a interagir no mesmo momento temporal. Adicionalmente, e tendo em

consideração a definição de massas, as atividades de CPDC correspondem a atividades

comunicacionais interpessoais. Tipicamente a CPDC é uma comunicação presencial, contudo perante

as atuais tecnologias de informação (transmissão multimédia bidirecional p. ex.), poderão ocorrer

situações em que se processa uma comunicação mediatizada à distância. Seguidamente são

apresentados alguns exemplos de ações de comunicação pública direta de ciência44:

Atividades45: Palestras públicas; Sessão laboratorial/experimental; Visitas guiadas

com um especialista (ao terreno ou a um laboratório, p. ex.); Reuniões para decisão política; Cafés

de ciência e similares; Peças de teatro e similares (Stand-up comedy p. ex.); Painéis de cidadãos e

similares;

Projetos46: Projetos pedagógicos com escolas, projetos científicos de Ciência-cidadã;

Eventos47: Dias abertos e semanas de ciência, p. ex.;

Iniciativas48: Ciclos de conferências, semanas nacionais e europeias de ciência, p. ex.;

Programas49: ‘Escolas de verão’, competições e olimpíadas científicas, p. ex.

Por sua vez, e na mesma medida da CPDC, a Comunicação Pública Indireta de Ciência (CPIC)

resulta também da derivação do conceito de comunicação pública de ciência, pela delimitação do

fenómeno comunicacional quanto ao número e ao espaço.50. Assim, a CPIC envolve a realização de

atividades comunicacionais para massas e mediatizadas à distância. Tipicamente a CPIC é uma

42 Com base no apresentado em Bowater. & Yeoman (2013). 43 Ver definição de Comunicação no glossário. 44 Lista de ações não é exclusiva e com base no apresentado por Entradas (2015b) e Bowater & Yeoman (2013). 45 Ver definição de atividade de comunicação de ciência no glossário. 46 Ver definição de projeto de comunicação de ciência no glossário. 47 Ver definição de evento de comunicação de ciência no glossário. 48 Ver definição de iniciativa de comunicação de ciência no glossário. 49 Ver definição de programa de comunicação de ciência no glossário. 50 Ver definição de Comunicação no glossário.

70

comunicação assíncrona, contudo perante as atuais tecnologias de informação (websites, blogues e

fóruns de discussão p. ex.), poderão ocorrer situações em que se pode processar uma comunicação

síncrona entre alguns membros das massas e o emissor. Exemplos de ações de comunicação pública

indireta de ciência51:

Entrevistas rádio/imprensa/televisão; Conferências de imprensa; Notícias, artigos de

opinião, comunicados de imprensa e newsletters; Materiais informativos (brochuras/folhetos

impressos ou digitais); Exposições; Livros/artigos de divulgação científica; Projetos científicos com

escolas ou com cidadãos; Conteúdos para escolas e/ou manuais escolares; Relatórios para apoio à

decisão política; Websites, Blogs, redes sociais e fóruns de discussão online; Concursos científicos

(fotográfico, literário, multimédia, p. ex.).

Deve ser salientado que perante a grande diversidade de possíveis ações de comunicação

pública, existem algumas que não serão totalmente caracterizadas por estas definições, porque, por

exemplo, podem ser constituídas por várias fases distintas em que umas se caracterizam por ações

comunicacionais diretas e outras por ações comunicacionais indiretas. Isto num contexto social em

que crescentemente as ações possuem uma complementaridade entre o presencial e o ambiente

online.

Com base nesta divisão, é possível identificar em termos globais, vantagens e desvantagens

na implementação de ações de comunicação púbica direta ou indireta. Assim, a CPDC possui

vantagens quanto ao contacto direto que permite estabelecer, envolvendo comunicação bidirecional

entre o cientista e o público. Possibilita um maior controlo da informação, dado o significado das

mensagens emitidas e recebidas poder ser interpretado em tempo real. Finalmente pode ainda

envolver parcerias com outras entidades públicas ou privadas na construção da ação, o que permite

uma maior multidisciplinaridade. Quanto às desvantagens da CPDC, a dimensão da audiência a

alcançar em cada ação é relativamente reduzida, e apresenta custos acrescidos em termos de tempo

e recursos humanos, materiais e financeiros (Baltitude, 2011).

Por sua vez, as ações de CPIC atingem audiências potencialmente com muito maiores

dimensões (dependendo dos canais mediáticos utilizados), acarretando custos bastante mais

reduzidos em termos de tempo e recursos materiais, humanos ou financeiros. Em termos de

51 Lista de formatos de atividades não é exclusiva e compilada com base no apresentado por Entradas (2015b) e Bowater & Yeoman (2013).

71

desvantagens produz frequentemente uma comunicação unidirecional (sendo que canais online

podem permitir uma interação entre o cientistas e o público), implicando um menor controlo da

forma como a mensagem é percecionada pelo público. Além da presença de um mediador (o

jornalista, p. ex.) que possui liberdade na forma como reporta determinado tema científico,

escapando à supervisão do cientista, não existe forma de compreender como o significado é

posteriormente interpretado pela audiência final (Baltitude, 2011).

4.1.2 - Ações mais frequentes de Comunicação Pública de Ciência

No estudo realizado por Entradas (2015b) às unidades de I&D portuguesas, é possível

constatar que as ações de comunicação pública realizadas com maior frequência entre 2013 e 2014

foram, por ordem decrescente: palestras públicas; entrevistas em jornais; palestras em escolas;

artigos em jornais/revistas; Newsletters; workshops por organizações locais ou municípios ou

associações locais e ainda Comunicados de imprensa.

No entanto, se análise for produzida com base na percentagem de unidades de I&D que

realizaram uma determinada ação, ocorrem alterações na ordem decrescente: Palestras públicas

(76%); Entrevistas jornais (66%); Workshops por organizações ou municípios ou associações locais

(62%); Palestras nas Escolas (61%); Entrevistas rádio (57%); Exposições (56%); Newsletters (51%).

Não sendo possível precisar sobre as razões que conduzem à seleção de uma ou outra ação

de comunicação pública, é possível estimar que esta resulta de uma combinação de adequação aos

objetivos de cada unidade de I&D e de um uso eficiente de recursos disponíveis.

Pela análise das atividades mais realizadas verifica-se o recurso tanto a ações de CPDC como

de CPIC. A presença de atividades como entrevistas aos media ou newsletters e comunicados de

imprensa pode ser justificada pelo potencial destas atividades em alcançarem uma grande audiência,

necessitarem de poucos recursos humanos, financeiros e principalmente de disponibilidade de

tempo pelos envolvidos. Quando se consideram as atividades de CPDC, como palestras ou workshops

por organizações locais, pode-se referir que pela sua presença no topo das mais realizadas, existe

interesse em comunicar diretamente com a audiência (público geral ou púbico escolar). Verifica-se

naturalmente uma maior frequência destas atividades quando comparadas com outras de ações

CPDC como Dias abertos ou Cafés de ciência, pela implicação logística que estas últimas acarretam.

E ainda pelo facto das primeiras (palestas) se aproximarem mais dos contextos comunicacionais que

72

os cientistas encontram no decorrer da sua atividade profissional (comunicação com os seus pares

ou com alunos do ensino superior).

4.1.3 - Tipologias de ações de Comunicação Pública Direta de Ciência

Dado o enfoque do presente guia na comunicação pública direta de ciência e considerando a

enorme diversidade de terminologias aplicadas, serão adotados neste guia os seguintes termos,

tendo em consideração o apresentado na literatura e a terminologia utilizada no quotidiano do

contexto nacional. Isto, apesar da clara perceção de que existirão sempre ações de CPDC que não

serão completamente caracterizadas por uma única das categorias abaixo apresentadas.

Atividade de Comunicação Pública Direta de Ciência

Pode ser definida como “um processo que possui a intenção de estimular aprendizagem

através de uma interação real” (Bowater & Yeoman, 2013). Este termo é aplicado “maioritariamente

a uma sessão experimental/laboratorial, contudo pode representar também um debate ou uma

palestra” (Bowater & Yeoman, 2013, p. 129). A atividade não é definida pelo conteúdo ou formato,

mas sim “por se tratar da unidade mínima de construção de ações de maior escala de comunicação

pública direta de ciência” (Bowater & Yeoman, 2013, p. 129). Como exemplos de atividades, temos

palestras ou apresentações públicas, sessões laboratoriais, debates, peças de teatro, saídas de

campo, entre outras.

Evento de Comunicação Pública Direta de Ciência

Resulta da união de “várias atividades individuais” (Bowater & Yeoman, 2013, p. 129) de

comunicação pública direta de ciência. É um acontecimento único e marcado no tempo, utilizado

para atrair a atenção do público e da comunicação social para determinada organização (Sebastião,

2009). Como exemplos de eventos, temos dias ou semanas abertas de universidades/institutos de

investigação, feiras ou festivais de ciência, entre outros.

Projeto de Comunicação Pública Direta de Ciência

Termo entendido de acordo com a definição apresentada pela área da gestão de projetos:

“um conjunto de atividades interdependentes, organizadas e implementadas com um definido ponto

de início e fim, de forma a alcançar resultados específicos para satisfazer as necessidades da

organização” (Young, 2003). Na transposição para ações de comunicação pública de ciência, deve ser

salientado que os projetos possuem características que englobam simultaneamente ações de

73

comunicação pública direta e indireta. Como exemplos de projetos, temos os de cariz pedagógico

(tipicamente entre especialistas e escolas e/ou alunos do sistema de ensino) e projetos de pesquisa

científica com a contribuição de cidadãos não especialistas (projetos de ciência cidadã).

Iniciativa enquanto conjunto de atividades de Comunicação Pública Direta de Ciência

Usualmente concebida e implementada por uma única instituição, em que um formato de

atividade é repetido periodicamente sob a égide de um tema agregador. Como exemplos de

iniciativas desta tipologia, temos os ciclos de conferências, ciclos de debates, entre outros.

Iniciativa enquanto conjunto de eventos de Comunicação Pública Direta de Ciência

Usualmente concebida por uma instituição, que convida outras instituições a implementarem

eventos organizados autonomamente sob a égide de um tema agregador. Como exemplos de

iniciativas enquanto conjunto de eventos, temos semanas nacionais, europeias ou mundiais (‘semana

nacional da ciência e tecnologia’, ‘semana mundial do espaço’, ‘dia mundial do ambiente’, p. ex.),

dias internacionais como a Noite europeia dos investigadores ou a Ciência Viva no Verão, p. ex. A

celebração de anos internacionais da UNESCO, por exemplo, corresponde a um caso especial de uma

iniciativa que pela sua escala e objetivos, escapa a vários das categorias definidas anteriormente.

Dado ocorrer apenas um vez e por indicação da assembleia geral das Nações Unidas, esta iniciativa

decorre ao longo de todo um ano civil, agregando todas as tipologias de ações de CPDC possíveis

(atividades, eventos, projetos, iniciativas e programas) implementadas por um elevado número de

instituições a nível mundial.

Programa enquanto conjunto de atividades de Comunicação Pública Direta de Ciência

O termo ‘Programa’ é aqui entendido como um conjunto integrado e coerente de atividades

de comunicação pública direta de ciência, cujas características o diferenciam de um evento e de um

projeto. Como exemplos de programas temos: As ‘escolas de verão’, cursos e ‘masterclasses’;

‘Campos de férias’; Competições/olimpíadas científicas e programas similares. É conveniente referir

que no período de tempo definido para o programa podem ocorrer repetições de atividades

(exemplo: ao longo de um mês podem ocorrer repetições das atividades de um campo de férias para

participantes diferentes).

74

Programa enquanto conjunto de projetos de Comunicação Pública Direta de Ciência

O termo ‘Programa’ será aqui entendido como na definição apresentada pela área da gestão

de projetos: “um conjunto de projetos interdependentes geridos de uma forma coordenada, que no

seu conjunto produzirão os desejados resultados” (Young, 2003). Como exemplos de programas

enquanto conjunto de projetos, temos exemplos nacionais como o “Escolher Ciência”52 ou o “Pais

com Ciência”.

52 Informação disponível em http://www.cienciaviva.pt/home/ (consultado a 20 de agosto de 2015).

75

4.2 – Sugestões e dicas práticas

O leitor pode legitimamente perguntar: “Mas porquê o foco em ações de comunicação pública

direta? Trabalhar com os media é muito mais rápido e eu tenho uma agenda sobrecarregada”.

A única resposta possível é o que o leitor tem razão. No entanto, tal como no debate sobre

quais as técnicas comunicacionais que são ou não comunicação de ciência, não se coloca aqui a

questão de saber se as ações de CPDC são superiores ou inferiores às ações de CPIC. A resposta

possível será sempre a coordenação estratégica, tal como a comunicação integrada de marketing

surge como uma reposta de maior coordenação na área do marketing. Assim, no âmbito de uma

estratégia de comunicação eficaz devem ser identificadas quais as tipologias de ações que mais se

adequam aos seus objetivos e limitações logísticas e de tempo que enfrenta.

No entanto, se a frase ‘uma imagem vale por mil palavras’ é verdadeira, a experiência reforça

a ideia que ‘um contacto direto pode valer por mil palavras’. Pela análise tanto do conceito de

comunicação de ciência como das possíveis segmentações do público de acordo com a relação destes

com a ciência, o despertar de interesse na ciência e reforço da confiança nos cientistas são sempre

fatores preditivos de uma maior aproximação do público à ciência. Quando se consideram apenas os

fatores de influência na escolha de uma carreira científica pelos jovens, constata-se a influência dos

professores, da família e de atividades interativas de comunicação de ciência. As ações de CPDC

possuem um elevado potencial na prossecução destes objetivos.

Quer isto dizer que a aposta deve ser maioritariamente feita nestas ações? Não! Estas ações

possuem exigências que vão precisamente de encontro a algumas das dificuldades manifestadas pela

comunidade científica, como a disponibilidade de tempo, o apoio logístico necessário e a exposição

a contextos desconhecidos e não totalmente controláveis pelos cientistas. Assim, a aposta deve ser

numa conjugação de ações de CPDC e CPIC de acordo com o contexto e os objetivos que o cientista

possui. Sendo que o mais eficiente é planear num horizonte temporal de um ano, de forma a preparar

convenientemente a participação nas ações selecionadas. Isto porque se é possível aceitar dar uma

entrevista para um órgão de comunicação social num espaço de dias, a preparação de uma sessão

laboratorial com público escolar ou organização de um evento pode demorar semanas, se não

mesmo meses.

Neste momento, é também legítima a pergunta do leitor “Então, em que me vão ajudar estas

sugestões?”. O objetivo principal é o de poder maximizar a eficiência com que conduz ações de CPDC.

76

De acordo com as barreiras enfrentadas pelos cientistas na comunicação pública de ciência, um eficaz

planeamento possui relação direta com o adquirir de uma perceção positiva e de uma maior sensação

de controlo por parte dos cientistas envolvidos. Consequentemente existirá uma maior

disponibilidade para futuras participações em ações similares.

Considerando as ações de CPDC mais frequentes acima apresentadas, as sugestões irão

abordar dois níveis distintos: o cientista como convidado a participar numa ação organizada por um

instituição ou então como organizador da própria ação. Muitas destas sugestões, em qualquer um

dos destes níveis, poderão ser consideradas pelo leitor como senso-comum. O que é também

verdade. O objetivo é contudo, o de apresentar uma planificação-quadro, capaz de ser adaptada a

qualquer contexto específico que o leitor enfrente.

Finalmente, e antes de qualquer outra sugestão, deve ser reforçada a ideia de que planear e

implementar de uma ação de CPDC de forma isolada é contraproducente. O leitor deve procurar

ativamente apoio em termos de recursos humanos, materiais e eventualmente financeiros,

principalmente no interior da sua instituição de acolhimento. Adicionalmente, o explorar de

exemplos de ações realizadas por outras entidades é sempre uma estratégia recomendável. Tal como

a ciência evoluiu com a disponibilização dos resultados obtidos por um grupo de cientistas a toda a

restante comunidade científica (para replicação e validação dos resultados), a comunicação de

ciência “deve ser agora matura o suficiente para passar de uma fase ‘heroica’, em que vale tudo pelo

bem da comunicação da ciência, para uma fase em que a qualidade é a principal preocupação de

todas as partes envolvidas” (Bucchi, 2013). Existindo muitos websites com exemplos e informações

úteis e de fácil consulta, ficam aqui algumas recomendações:

Agência Nacional para a Cultura Científica e Tecnológica53;

Centre for advancement of informal science education54;

National Co-ordinating centre for public engagement55;

American Association for the Advancement of science56.

53 Informação disponível em www.cienciaviva.pt/home/ (consultado a 12 outubro de 2015). 54 Informação disponível em www.informalscience.org (consultado a 12 de outubro de 2015). 55 Informação disponível em www.publicengagement.ac.uk (consultado a 12 de outubro de 2015). 56 Informação disponível em www.aaas.org/programs (consultado a 12 de outubro de 2015).

77

4.2.1 - No papel de convidado

As sugestões aqui apresentadas surgem com base no cenário de um eventual convite que lhe

foi feito por parte de uma instituição ou organização. Ou seja, não será da sua responsabilidade a

organização da ação na sua totalidade, mas apenas da sua atividade específica que se insere num

evento, iniciativa ou programa da responsabilidade da instituição que faz o convite.

De salientar, que aqui não se considera a participação em iniciativas ou programas enquanto

conjunto de eventos (semanas internacionais de ciência ou anos internacionais, p. ex.), já que tal

implica a organização autónoma de um evento pelo leitor. Aqui são considerados, por exemplo,

pedidos de palestras em escolas ou em associações civis e museus/centros de ciência, participação

em feiras ou festivais de ciência, cafés de ciência, debates públicos e similares.

I - Objetivo da participação

Perante o convite de uma instituição externa, considere em primeiro lugar a possível

existência de algum tipo de incompatibilidade entre os objetivos, missão ou valores dessa instituição

relativamente aos seus próprios objetivos e valores ou ainda, aos da sua instituição de acolhimento

e/ou financiamento. Informação essa que deverá encontrar ou no convite que lhe foi endereçado ou

no website do evento ou da instituição. Por regra, caso o convite surja da sua instituição de

acolhimento, tais incompatibilidades são menos frequentes.

No entanto, seja em que situação for, deverá sempre perceber claramente qual o objetivo do

convite. Este surge de forma individual, ou seja, na sua capacidade de investigador e possuidor de

conhecimento factual ou com o intuito de algum tipo de representação institucional? Isto porque tal

distinção possui implicações logísticas. Além das naturais diferenças entre o assumir de um papel de

‘especialista’, ‘guardião da ciência’ ou ‘gestor de ciência’, poderá ser conveniente (caso assuma um

papel de representante da instituição) discutir a situação com a coordenação do grupo,

departamento, unidade de I&D ou mesmo da direção da sua instituição de acolhimento. Além de que

poderão já existir templates institucionais de apresentações eletrónicas e um conjunto de

informações consideradas primordiais pela sua instituição e que poderão ajudar o leitor no assumir

deste papel de ‘gestor de ciência’.

No caso de não existirem incompatibilidades, responda inicialmente às perguntas: “Qual o

objetivo desta ação?”, “Adequa-se à minha investigação e aos meus objetivos de comunicação

pública?”, “É possível envolver e obter contribuições do público-alvo para a minha

78

investigação/projeto?”. Apenas perante estas respostas equacione as fases seguintes e

principalmente, se aceita participar ou não, na ação de comunicação pública para a qual é convidado.

II - Público-alvo

Relativamente à audiência da atividade ou evento específico, responda às seguintes questões:

“Quem é o público-alvo?”, “Qual a faixa etária do público-alvo”, “Qual a dimensão da audiência?“;

“Quais os interesses e objetivos desse público-alvo para participar nesta ação de CPDC?”.

No caso de uma atividade numa escola, o professor que lhe endereça o convite possui

informações bastante detalhadas sobre o público-alvo: idade dos alunos, número de alunos

presentes, ano de escolaridade e no âmbito de qual disciplina decorrerá a sua participação.

Principalmente obtenha indicações sobre qual o objetivo pretendido: Que os alunos adquiram

conhecimento científico adicional? Que interajam com um equipamento laboratorial/protótipo? Que

os alunos percebam qual a ligação da sua investigação com a sociedade? Que se relacionem com a

sua experiência profissional e pessoal?

No caso de uma palestra pública, não terá acesso a dados tão específicos como numa

escola, no entanto será possível perceber junto da organização qual a dimensão da audiência

esperada (ou que participou em ações similares anteriores), algumas características

sociodemográficas relevantes e ainda se é possível discernir quais os interesses e motivações

principais dos participantes. O público-alvo é movido pela curiosidade sobre ciência e tecnologia? O

público-alvo possui alguma relação direta com o tema (como uma questão ambiental local, p. ex.)?

No caso de um café de ciência/debate público, novamente os dados poderão ser

escassos, mas a dimensão esperada da audiência pode ser estimada pela organização, e se é

composta (por comparação com atividades anteriores) maioritariamente por jovens, famílias ou

profissionais de alguma área. O tema específico do café de ciência/debate público será bastante

importante para compreender o público-alvo e principalmente quais serão as suas motivações e

interesses. O objetivo da sua participação é entusiasmar o público para o tema da sua investigação?

Ou pelo contrário, o objetivo é envolver a audiência num processo decisório sobre ciência e

tecnologia, ouvindo as contribuições e feedbacks destes sobre o tema?

No caso de programas como ‘escolas de verão’ ou eventos como ‘feiras de ciência’,

as características do público-alvo variam significativamente. No caso de programas como ‘escolas de

verão’ ou ‘masterclasses’ por exemplo, será possível a organização fornecer indicações precisas sobre

as faixas etárias, motivações, origem e número de participantes. Quanto a eventos preparados para

79

grandes audiências (‘dias abertos’, ‘semanas da ciência’ e feiras de ciência e Tecnologia) a

organização possuirá dados bastante menos específicos sobre as características sociodemográficas

da audiência. No máximo será possível segmentar a audiência em grandes grupos: público escolar do

secundário ou profissionais de uma determinada área de atividade, por exemplo. Quanto ao número

de visitantes, será muito difícil esta estimativa principalmente em eventos de grandes dimensões,

mas poderão ser fornecidos os dados de edições anteriores.

III - Informações práticas

Quanto a este ponto, tente obter as respostas às seguintes perguntas: “Qual a data ou datas

de participação?”, “Qual o local e horário de início?”, “Qual a duração da participação?”, “É

necessário o envio prévio de informações/materiais?”, “Quais as características do espaço onde

decorre a atividade?”, “Existem questões financeiras associadas à participação?”.

No caso de uma atividade numa escola, a data, o local, o horário de início e a duração

da participação (tempo disponível para a atividade) serão definidos com grande detalhe pelo

professor dos alunos em causa. No entanto, peça ao professor indicações quanto às caraterísticas do

espaço onde decorrerá a atividade: existe projetor, sistema de som, computador e acesso à internet?

No caso de realizar uma atividade experimental com equipamento que planeia transportar para a

escola, existem condições para a realização da atividade, como pontos de eletricidade, lavatórios ou

bancadas, p. ex.?

No caso de atividades em escolas procure obter informações sobre a existência ou não de um

procedimento padrão da sua instituição de acolhimento. Existe pedido à escola de reembolso pela

deslocação do investigador? Existe reembolso pela instituição de acolhimento das despesas de

deslocação do investigador às escolas? Existe algum tipo de seguro pela instituição de acolhimento

que seja necessário ativar?

No caso de uma palestra pública, além da data, local, horário de início e o tempo

disponível para a duração da palestra, procure obter indicações sobre o programa da atividade. A sua

apresentação é a única a ocorrer ou pelo contrário existem mais apresentações? Se for este o caso,

a sua apresentação surge em primeiro lugar, em último, antes do coffee-break ou imediatamente a

seguir? Se não for possível visitar o espaço antecipadamente, solicite informações sobre as condições

da sala: existe projetor, sistema de som, computador, apontador laser remoto e acesso à internet? É

necessário a utilização de microfone?

80

Muito provavelmente a organização irá pedir-lhe o envio prévio da sua apresentação

eletrónica, de forma a ter o sistema de projeção preparado no momento de início da sua

apresentação. Ao proceder a este envio, é importante que não se esqueça de enviar também os

ficheiros associados à apresentação como ficheiros de som ou de vídeo. Isto para que no momento

da apresentação, não tenha surpresas inesperadas. Poderá ainda ser necessário o envio prévio de

informações biográficas como fotos ou resumos profissionais.

Quanto a questões financeiras, obtenha indicações sobre a existência ou não de reembolsos

de despesas de deslocação e alimentação por parte da entidade organizadora. Finamente, sendo

cada vez mais frequente a transmissão live streaming através da internet das conferências e

palestras, procure informar-se se tal irá ocorrer e decida se se sente confortável com essa situação.

No caso de um café de ciência/debate público, mais uma vez, o conhecimento da

data, local e horário de início serão fundamentais. Contudo, o formato da atividade poderá

apresentar variações significativas. Assim, procure obter indicações sobre a estrutura da atividade.

Existe um período definido para intervenções dos participantes ou todo o período da atividade

decorre num formato de pergunta e resposta? No caso de existirem estes períodos definidos, saiba

qual o tempo disponível e se podem ser utilizados suportes visuais (existem formatos em que não há

utilizações de suportes visuais ou estão limitados em termos do número de slides). No caso de existir

projeção eletrónica ou pretender fazer a demonstração de algum protótipo ou equipamento

laboratorial, procure as mesmas respostas referidas anteriormente referidas.

Contudo, frequentemente estes formatos envolvem menores audiências e decorrem em

espaços mais intimistas e próximos do público geral (museus, centros de ciência, câmara municipal,

cafés, p. ex.). Sendo ideal uma visita prévia ao espaço com um membro da organização da atividade,

caso não seja possível, peça indicações sobre o espaço à organização (O público está sentado numa

bancada e separado dos oradores? É um formato de mesa redonda? É um formato de espaço de

café?).

No caso de programas como ‘escolas de verão’ ou eventos como ‘feiras de ciência’,

a diversidade de situações que poderão ser aqui enquadradas é enorme. Por conseguinte, as

sugestões logísticas estão divididas em dois níveis: A participação num programa com características

específicas como ‘escolas de verão’; A participação num evento dirigido a grandes audiências. A

distinção surge pelas implicações logísticas que as duas situações acarretam. No caso da primeira

opção é contruída uma programação muito específica englobando as várias atividades dos cientistas

81

que aceitam participar. Usualmente estes programas decorrem numa única instituição e as

atividades acontecem maioritariamente nos espaços de trabalho de cada cientista ou equipa de

investigação. Assim e considerando que estes programas tipicamente implicam inscrição prévia dos

visitantes, a organização irá previamente ao ‘fechar’ da programação solicitar ao cientista

informações como: Duração da sua atividade; Número máximo de participantes numa sessão;

Número de possíveis repetições da atividade; Local onde decorre (sala/laboratório/ponto de

exterior); Um breve texto descritivo da atividade. De forma a não existirem percalços logísticos,

forneça estas indicações com precisão.

No sentido inverso, solicite à organização informações sobre as faixas etárias dos

participantes, número de participantes inscritos na sua atividade, qual a data e horário da sua

atividade específica e quem será responsável pelo encaminhar dos participantes até ao local onde

decorrerá a sua atividade. Por último, procure obter indicações sobre questões materiais como

aquisição de materiais laboratoriais por exemplo. Caso seja aplicável, indique ainda à organização

necessidades específicas como o pedido de os participantes trazerem consigo algum tipo de material

para o bom desenrolar da atividade.

Relativamente a eventos usualmente dirigidos a grandes audiências, como ‘Dias abertos’ ou

feiras de ciência e tecnologia, estas podem ocorrer na sua instituição ou numa instituição externa.

Tipicamente, as atividades inseridas nestas programações decorrem em espaços abertos, com uma

elevada rotatividade de visitantes e fora dos habituais espaços de trabalho dos cientistas. Assim,

procure obter indicações precisas quanto ao local onde estará sediado no decorrer do evento. Qual

a dimensão do espaço que terá acesso? Existem mesas, cadeiras, pontos de eletricidade, água e

internet? Se transportar consigo material sensível (ecrãs, protótipos e/ou material laboratorial),

torna-se premente considerar questões de segurança e arrumação dos materiais que transporta,

caso o evento dure mais do que um dia ou necessite de transportar o material em data anterior ao

evento (particularmente em instituições exteriores).

Relativamente a datas e horários de início e permanência no local, verifique a necessidade da

presença no local de mais do que um investigador de forma a assegurar a permanência no local

durante todo o evento. Particularmente no caso de participação em eventos de instituições externas,

poderá ser necessário indicar à organização os elementos que irão estar consigo, para sua

acreditação. Caso seja necessário a presença de vários elementos, considere a possibilidade de

82

previamente reunir com todos, de forma a acordar a distribuição de horários de permanência no

evento e quais os materiais a transportar.

Finalmente, procure indicações na sua instituição de acolhimento ou perante a organização

do evento, relativamente a questões de reembolso de despesas de deslocação, alimentação, estadia

e ainda seguros de pessoas e materiais no decorrer do evento.

IV – Registos futuros e avaliação da participação

Considere agora as seguintes perguntas: “Serão conduzidos registos fotográficos ou

audiovisuais?”; “Serão aplicados alguns métodos de avaliação?”.

Tais questões devem ser colocadas à organização, para perceber se é possível o acesso a estes

dados. Sendo importante a manutenção de dados atualizados sobre as ações de CPDC realizadas no

âmbito da sua investigação/projeto, o acesso a registos fotográficos ou audiovisuais permitirá a

disponibilização de bons indicadores tanto a organismos financiadores, como à sua instituição de

acolhimento para produção de material informativo. No entanto, o acesso a indicadores de avaliação

é fundamental, já que apenas através da análise dos dados disponibilizados será possível a contínua

melhoria das suas participações futuras e o reforço dos impactos positivos das suas participações, no

público-alvo e consequentemente na sociedade.

4.2.2 - No papel de organizador

Neste papel terá que ter em consideração aspetos com os quais não tem de se preocupar

enquanto participante. Como referido anteriormente, a principal fase de uma ação de CPDC não é a

sua concretização, mas sim o planeamento estratégico. As sugestões aqui apresentadas irão incidir

sobre as atividades mais frequentemente realizadas e ainda passíveis de ser concretizadas por um

cientista ou grupo de investigação. Ações de maior escala, como festivais de ciência ou de maior

complexidade como conferências de consenso ou peças de teatro implicam o estabelecimento de

colaborações com empresas profissionais de comunicação ou parcerias com instituições totalmente

dedicadas ao tema, como centros e museus de ciência.

I- Planeamento estratégico

Um dos principais problemas na conceção de atividades como palestras, conferências,

atividades laboratoriais com público escolar ou ‘dias abertos’ e semanas de ciência, advêm da

planificação temporal. Assim e como primeira sugestão, considere o horizonte temporal quando

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planifica uma atividade, evento ou programa de ‘raiz’. Não inicie a preparação de um ‘dia aberto’

de um departamento/unidade de I&D/instituição, ou de um ciclo de palestras públicas a apenas um

mês de distância. Caso ambicione a presença de público geral ou púbico escolar na sua instituição,

perante este horizonte temporal poderá enfrentar a situação de não conseguir mobilizar os recursos

materiais necessários e ter um número de visitantes muito aquém das expectativas. Todo o esforço

realizado, que pode ter sido considerável e sob pressão nas semanas anteriores à atividade podem

assim ser considerados infrutíferos e gerar as perceções negativas abordadas nas dificuldades

enfrentadas pelos cientistas no capítulo 3.

I A – No horizonte de um ano decida quais os seus objetivos em termos de CPDC: “Pretende

disseminar a sua investigação ou projeto?”; “Pretende informar ou alterar comportamentos do

público geral sobre uma questão específica?”; “Pretende entusiasmar para a ciência o público

escolar?”; “Pretende influenciar a decisão política sobre ciência e tecnologia?”.

I B – Considere o seu público-alvo: É o publico-geral? - De entre o público-geral, existe algum

grupo de especial interesse? É o público escolar? - De entre este público, ambiciona contactar com

alunos do secundário ou da primária? É o setor empresarial? - De entre este setor qual a área

profissional de maior interesse?

I C - Defina o formato da atividade. “De acordo com os recursos existentes, qual a tipologia

de atividade que possui mais impacto no público-alvo?”. Considere possibilidades como uma

palestra, atividade laboratorial, concurso/competição científica, presença em feira do setor ou

debate público/reunião presencial, por exemplo. É importante que o formato esteja adequado aos

recursos que consegue mobilizar para a implementação da ação. Ou seja, não planeie conceber uma

exposição se não possuir recursos materiais para tal, como também não procure realizar uma semana

contínua de atividades, se não possuir recursos humanos ou logísticos para assegurar um conjunto

coerente de atividades. Discuta esta situação com elementos dirigentes do seu departamento,

unidade de I&D ou faculdade. No entanto, equacione que uma única palestra ou um café de ciência

bem planeado pode possuir mais impacto no seu público-alvo do que a realização de um grande

número de atividades ‘mais ou menos’.

I D - Decida a localização. O primeiro nível de decisão abarca a possibilidade de organizar a

ação na sua instituição de acolhimento ou numa instituição externa. No caso de instituições externas,

pondere as que são mais frequentadas pelo público-alvo definido e as que oferecem as melhores

84

condições para a condução do formato definido. “Numa feira profissional? Num bar? Num teatro?

Num centro comercial?”

I E - Decida o momento. Não se esqueça de ter em consideração: O nível de ocupação dos

espaços na instituição de acolhimento; O calendário escolar e de exames - caso pretenda contactar

com público escolar; Os períodos disponíveis - fins de tarde ou noite- no caso de querer contactar

com o público geral; Os momentos especiais de celebração (realização de semanas nacionais ou

internacionais de C&T, anos internacionais da UNESCO ou dias mundiais); Momentos de agregação

do público-alvo (feiras profissionais, reuniões ou plenários de discussão política). O momento

definido deve coincidir com momentos de menor sobrecarga da instituição organizadora e nos

momentos mais adequados para o público-alvo definido. Não tente implementar uma palestra para

público-geral, num domingo à noite ou durante a tarde de uma semana de trabalho, assim como não

é recomendável desenvolver atividades para público escolar no período de exames nacionais ou

períodos de avaliação (fins de período).

I F - Identifique possíveis parcerias. Seja em que contexto for, a possibilidade de agregação

de várias instituições ou várias áreas científicas diferentes apresenta benefícios. “Existem outras

áreas científicas na sua instituição que possam colaborar?”, “Existem empresa ou associações civis

que possuem relação direta com o tema e interesse em colaborar?”.

I G – Defina a equipa de trabalho (caso seja aplicável). Deve ser claramente identificado um

coordenador para cada uma das atividades ou eventos identificados na sua estratégia anual. Este

será responsável pelas primeiras fases do planeamento, assim como o encetar de contactos na

definição do plano operacional. Deverá igualmente centralizar toda a informação, de forma a poder

atribuir tarefas, promover colaborações e responder eficientemente a dúvidas de toda a equipa de

trabalho envolvida. Não devem ser efetuadas alterações estratégias sem conhecimento do

coordenador operacional, sob pena de criar entropia e mal-entendidos na organização.

Dependendo da escala da ação que pretende implementar, o que possui relação direta com

o número de pessoas envolvidas na organização (não considere possível realizar tudo sozinho),

estabeleça um calendário de reuniões presenciais para que a comunicação e troca de ideias entre a

equipa seja um fator de reforço da coesão. No entanto, não crie um calendário muito

sobrecarregado, dada a quase certa reduzida disponibilidade dos vários elementos da equipa.

85

Contudo, realisticamente, muitos dos assuntos serão tratados por email, principalmente

quando a ação exige uma equipa onde os seus elementos estão espalhados por grupos de

investigação ou departamentos diferentes. Assim, existem algumas questões que deve ter atenção.

Evite utilizar um único email para a transmissão de informação interna, desde o primeiro dia até

ao último. Por exemplo, foi enviado um primeiro email com o título “Vamos fazer um dia aberto do

departamento?” e partir daí, surge uma cadeia de 30 emails onde a informação se apresenta de

forma parcial e pouco clara. A maioria das pessoas da equipa vão deixar de ler esses emails, porque

são demasiados. A estratégia mais eficiente é criar listas diferenciadas de contactos de acordo com

o seu grau de envolvimento: a pessoa que vai prestar apoio técnico informático na data do evento,

não precisa de ler emails sobre eventuais reservas de sala, por exemplo. Evite responder a emails

utilizando a opção reply all. Escreva no email a informação que pretende transmitir de forma clara e

direta e apenas após isso adicione os endereços copiando da lista separada que possui (esta lista

deve estar sempre atualizada sob pena de ignorar inadvertidamente alguém quando não era essa a

intenção).

Em momentos que considerar chave produza um email a estabelecer pontos de situação e aí

sim, coloque toda a equipa como destinatários e marque uma reunião presencial para abordar

diretamente esses assuntos.

II - Criação da programação

Neste momento, ocorrerão os contactos com possíveis oradores/dinamizadores de atividades

na sua programação, colaboradores estratégicos e/ou patrocinadores. Ao encetar estes contactos

(faça-o presencialmente ou através de email individual e especialmente dirigido àquela pessoa), deve

transmitir todas as informações à pessoa que convida de uma forma clara e direta, assim como

solicitar quais as necessidades logísticas desta para o bom desenrolar da atividade. Quanto maior a

clareza das informações menor é o risco de o cientista convidado promover uma atividade

desajustada aos objetivos ou características da ação que está a planear. A quantidade e qualidade de

atividades que insere na programação (‘dia aberto’, ‘semana da ciência’, café de ciência, p. ex.)

devem ser adequada aos objetivos. Resista à tentação de ter uma programação repleta de atividades

mas que não apresentam coerência entre si ou relação direta com o tema da sua atividade/evento,

já que corre o risco de ter atividades sem público.

Seja criterioso na identificação das atividades que insere na programação: selecione

atividades que considere ter uma qualidade comprovada (por experiências anteriores), que

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promovam interatividade e sejam capazes de envolver toda a audiência esperada. Se planeia um

evento para muitas centenas de pessoas (dias abertos, ou feiras de ciência, p. ex.), a programação

deverá ser capaz de envolver todas essas pessoas no período de tempo definido para o evento (em

espaços abertos e com elevada repetição de atividades). Se pelo contrário, o evento está pensado

para algumas dezenas de pessoas (‘escolas de verão’ ou visitas guiadas, p. ex.), não insira apenas

atividades com características de eventos para grandes audiências (palestras em grandes anfiteatros

ou atividades em grandes espaços exteriores). O desenho de uma programação adequada aos

objetivos define o sucesso da sua ação de CPDC.

III – Processo de criação da imagem gráfica, página de internet, material de divulgação

A criação de uma imagem gráfica para a sua ação é sempre importante para que o visitante

possa facilmente associar essa imagem à sua ação. No caso de iniciativas como ciclos de conferências,

tal é ainda mais importante, dada a continuidade no tempo da iniciativa. Em qualquer caso, procure

junto dos serviços de imagem da sua instituição, se existe disponibilidade para o ajudarem na

conceção desta imagem e dos materiais de divulgação.

A conceção de uma página de internet é fundamental, para que esta possa acompanhar e

tornar mais eficaz o processo de divulgação da sua ação por entre o público-alvo selecionado. Todo

o material de divulgação deve assim ‘encaminhar’ o público-alvo para esta página, que será o local

ideal para obterem todas as informações. No material de divulgação coloque apenas e só a

informação absolutamente essencial. Numa sociedade em que o público está exposto a um sem

número de estímulos diferentes e simultâneos, a atenção do público é um recurso cada vez mais

escasso. Tente ser inovador nestes materiais de divulgação.

Nos materiais de divulgação digitais (vídeos, fotos, publicações nas redes sociais, p. ex.),

facilmente redireciona através de hyperlinks o seu público-alvo para a página de internet. Caso

pondere a criação de material impresso, considere a introdução de QRCodes, que possuem o mesmo

efeito. No entanto, e mesmo sendo o website um local de apresentação da informação, não o torne

repleto de informação e de difícil consulta. Na sua Homepage devem ser imediatamente

identificadas pelo visitante, 4 secções distintas: Informações sobre data, local, horário e um

contacto direto para esclarecimento de dúvidas (eventualmente custo da atividade/evento); A

programação (atividades e oradores/dinamizadores); Inscrição; FAQ´s. Esta última secção é uma

forma de apresentar toda a informação que rodeia a sua ação num formato de resposta a perguntas

típicas (Como chego aí? Posso estacionar aí? Como faço o pagamento? Posso chegar atrasado? p.

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ex.). Por último, não se esqueça de adicionar no website, os logotipos das instituições de acolhimento

e financiadoras, eventuais empresas patrocinadoras ou colaboradoras, assim como a identificação

de todos os membros da equipa envolvidos na organização.

IV – Processo de divulgação

Após a programação encerrada (ou próximo do final) proceda a uma estratégia atempada de

divulgação da sua ação. É importante ter sempre em consideração que o seu público-alvo

(particularmente o público geral e o público escolar) possui inúmeras outras solicitações, pelo que

selecionam criteriosamente das ações de CPDC em que participam. Assim, nunca considere que o

simples anunciar da atividade no website e no Facebook do grupo de investigação ou instituição de

acolhimento é suficiente para ter uma vasta audiência. Mais uma vez, a estratégia ideal reside na

capacidade de utilizar simultaneamente várias plataformas comunicacionais e selecionar as que são

mais utilizadas pelo público-alvo definido.

Caso pretenda contactar com público escolar, os professores serão os mediadores naturais

a serem identificados. Neste caso, o mais eficaz será recorrer aos serviços de comunicação/relações

externas da sua instituição, que possuem certamente uma extensa lista de contactos de escolas e

professores da região. No entanto, este público-alvo apresenta especificidades muito próprias e

possui atualmente várias limitações quanto a visitas de estudo (saídas da escola) preparadas com

pouca antecedência. O ideal será comunicar às escolas as atividades que planeia implementar no

futuro, no momento em que estas preparam o seu plano anual de atividades (início do ano letivo).

Relativamente à produção de comunicados de imprensa como método de contacto com os

meios de comunicação social, esta poderá ser uma boa estratégia. No entanto, três recomendações

são necessárias: na preparação e envio deste comunicado solicite colaboração dos serviços de

comunicação/relações externas da sua instituição (possuem certamente uma extensa lista de

contactos de jornalistas e órgãos de comunicação social); Não equacione apenas os órgãos de

comunicação social nacionais, já que os regionais poderão ser de igual ou superior importância; Não

se surpreenda se não obtiver resposta por parte de nenhum órgão de comunicação social, dada a

enorme quantidade de informação que diariamente chega às redações jornalísticas. Quanto maior

for a inovação da sua programação, maior a probabilidade de ser ´noticiável’.

A sugestão principal é não se limitar à utilização de plataformas genéricas (website e redes

sociais da sua instituição), equacionando quais os canais específicos utilizados pelo seu público-alvo:

88

publicações/websites para estudantes, para associações profissionais ou de câmaras municipais, por

exemplo. Utilize as redes sociais sim, mas para promover um acompanhamento à divulgação da

sua atividade. Ou seja, divulgando em várias plataformas a sua atividade ou evento, pode procurar

fidelizar a sua potencial audiência através das redes sociais. Pode ao longo do tempo, ir publicando

pequenas entrevistas com oradores e dinamizadores das atividades da programação ou inserindo

fotos e vídeos da preparação logística, por exemplo. Vá ‘conversando’ com o seu público.

Caso crie material impresso, como cartazes ou flyers, seja criterioso nos locais onde os coloca.

Pondere, não só quais os locais mais frequentados pelo seu público-alvo, como também quais os

locais onde este dedica algum do seu tempo livre. Os cartazes devem estar em locais com a maior

frequência possível de contactos (corredores, portas de acesso, transportes público, p. ex.). Já

materiais como flyers devem ser colocados em locais onde o público-alvo está parado e tem

oportunidade de dedicar um minuto (não será mais tempo do que isto!) para olhar para o seu flyer

(mesas de café ou outros locais de paragem como refeitórios).

Finalmente, seja verdadeiro na sua divulgação. Não crie expectativas infundadas no seu

público-alvo que não poderão ser cumpridas no momento do contacto direto. Apresente o mais

claramente possível como decorrerá a atividade ou evento.

V – Processo de inscrição

Esta é uma área, por vezes considerada de menor importância, no entanto e tal como a

programação, pode definir o sucesso ou insucesso da ação que está a ser implementada. Em primeiro

lugar, considere: a atividade/evento requer inscrição prévia? Possui número limite de inscrições?

Implica o pagamento pelo visitante? Pode ainda ocorrer a situação de a entrada no evento não

possuir limitações em termos de número ou horários, contudo existirem na sua programação

atividades específicas que requerem inscrição prévia e são limitadas a um determinado número de

participantes.

Equacione primeiro estas situações antes de decidir o formato das inscrições. No entanto, o

mais cómodo para o visitante, será sempre a inscrição online, para que não seja necessário o visitante

ter de telefonar ou enviar um email a solicitar inscrição. Além disto implicar a presença permanente

de uma ou duas pessoas adstritas a receber telefonemas ou emails, os dados enviados pelo visitante

podem não estar completos, implicando um segundo ou terceiro contacto posterior. O ideal será o

processo de inscrição ser completo (onde obtém do visitante todos os dados que necessita), mas não

89

demasiado complexo que ‘obrigue’ o visitante a muito trabalho ou que o faça desistir de participar

no seu evento.

A complexidade do processo de inscrições está diretamente relacionada com a tipologia da

atividade/evento que está a implementar. Se planeia organizar um evento para massas (‘dias

abertos’ e semanas de ciência, p. ex.), não é recomendável ‘obrigar’ o visitante a inscrever-se em

todas atividades presentes de forma individual ou a criar um plano detalhado de visita. Tal é

particularmente premente no caso do público escolar, já que visitam a atividade ou o evento em

grupos (turmas) compostos por alunos com diferentes interesses e motivações. Nesta situação,

prepare o seu evento para que no local o visitante possa decidir em que atividades participa. No caso

de existirem atividades com números limitados de participantes, permita que o visitante se possa

inscrever no local para um dos horários dessa atividade (usualmente atividades laboratoriais ou

visitas guiadas). Assim, nesta tipologia de eventos, a inscrição deve ser simples, solicitando poucos

dados, como nome, endereço de email, local de origem, número de pessoas que inscreve e um

contacto pessoal, por exemplo. A inscrição prévia é sempre recomendável, para que consiga ter

uma ideia do nível de adesão do público à sua atividade/evento. No caso de esta não existir, pode

estar a estimar e a preparar-se logisticamente para uma grande audiência e na data surgirem muitas

poucas pessoas, ou então o contrário. Tal é verdadeiro para eventos de massas, mas também para

atividades individuais como palestras ou conferências. Sem um registo prévio de visitantes não

consegue estimar qual será a ocupação da sala ou anfiteatro.

Considere ainda a situação de possíveis desistências. Ou seja, no caso de atividades em que

anuncia um número limite de participantes (seja pela capacidade do anfiteatro, seja por se tratar de

uma atividade laboratorial), considere a criação de uma lista de espera e métodos de voltar a

contactar essas pessoas em lista de espera. Se não o fizer, poderá encerrar a inscrição numa

atividade, as pessoas inscritas desistirem posteriormente e depara-se com uma atividade sem

público no momento de realização, quando tinha inicialmente uma grande procura. A situação das

desistências é particularmente influente em eventos gratuitos.

Em atividades que exigem pagamento, considere quais os métodos pelos quais o visitante

pode proceder ao pagamento. O formato mais cómodo para o visitante é a realização do

pagamento através de uma referência de multibanco. No entanto, esta questão está dependente

da capacidade de produção de um formulário de inscrição automatizado e para o qual necessitará da

ajuda de serviços informáticos especializados. Independentemente da sofisticação do formulário de

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inscrição online, equacione sempre a possibilidade de envio de um email de resposta confirmando a

inscrição do visitante. Perante uma ausência total de resposta, o visitante não sabe se está inscrito

ou não. Este email de reposta poderá servir para fornecer informação adicional ao visitante, como

mapas da instituição, informações de estacionamento, horários das atividades, informações de

almoço, entre outras.

Esta resposta é particularmente importante em eventos como ‘escolas de verão’, cursos de

formação ou reuniões e debates públicos. Em atividades com uma programação específica e que se

prolongam ao longo de vários dias, a inscrição é bastante mais personalizada e o visitante espera

preencher mais campos do que em eventos como ‘dias abertos’ ou conferências e palestras. No caso

de o seu público-alvo ser constituído por menores de idade (quando estão o dia inteiro ou vários dias

no seu evento), não se esqueça da necessidade de preenchimento por parte dos encarregados de

educação de termos de responsabilidade, como autorizações de saída, informações médicas,

necessidades específicas de alimentação ou utilização de direitos de imagem.

Em qualquer tipologia de público-alvo, ao solicitar no seu formulário de inscrição informações

e contactos pessoais, insira de forma visível que os dados solicitados não serão utilizados para outras

situações que não a atividade/evento que está a organizar.

VI - Estratégia de avaliação

A criação de uma eficaz estratégia de avaliação é da maior importância. Sendo extremamente

importante a implementação de estratégias de avaliação nas ações de CPDC, assegure-se no entanto

que esta é eficaz e capaz de produzir resultados. Existem inúmeras metodologias de avaliação, sendo

que qualquer uma delas apresenta vantagens e desvantagens na sua aplicação. Para conhecer quais

as metodologias que pode utilizar, consulte por exemplo, a secção de avaliação do ‘Centre for

Advancement of informal Science Education’57 ou do ‘National Co-ordinating Centre for Public

Engagement’58. Fundamentalmente, a seleção da estratégia de avaliação deve: Ser adequada aos

seus objetivos; Permitir recolher os indicadores que ambiciona; Proporcionar dados passíveis de

serem analisados em tempo útil; Ser pouco invasiva para o visitante; Ser adequada ao formato da

atividade/evento que está a implementar.

57 Informação disponível em http://www.informalscience.org/evaluation (consultado a 10 de outubro de 2015) 58 Informação disponível em http://www.publicengagement.ac.uk/plan-it/evaluating-public-engagement.

(consultado a 10 de outubro de 2015).

91

Se realiza um evento com um mesmo grupo de alunos do secundário ao longo de uma

semana, poderá utilizar metodologias de avaliação (inquérito escrito, registo áudio de entrevista,

p. ex.) no início e no fim do evento. Deste modo conseguirá identificar, por exemplo, a alteração de

perceções e conhecimentos sobre determinado tema, comparação das expectativas iniciais e finais

dos alunos, ou avaliação das atividades inseridas na programação, entre outros indicadores. Dado o

período de tempo em que acompanha um pequeno grupo de alunos, estes não sentirão um

desconforto excessivo em participar nestas atividades de avaliação. Contudo, considere se possui

recursos humanos para analisar e trabalhar tão grande quantidade de informação que é possível

recolher com tais metodologias. No caso de atividades como ‘dias abertos’, Cafés de ciência ou

palestras, não possuirá tempo ou disponibilidade dos visitantes para no local (entrada e/ou saída)

se submeterem a estratégias tão invasivas. Pode assim, utilizar outras metodologias menos invasivas

como observação direta de comportamentos e contacto breve com alguns visitantes (necessitará de

uma pessoa dedicada a apenas essa tarefa ao longo do evento). Pode inserir a avaliação no

desenrolar da própria atividade, como deixar uma bola em caixas com opções simples de avaliação

(‘gostei da atividade, mas não do dinamizador’, ‘atividade pouco interativa’, p.ex.) ou então uma

parede com papel de cenário onde os visitantes podem utilizar um marcador para escrever a sua

avaliação ou deixar um post-it. Pode ainda selecionar alguns visitantes e enviar posteriormente ao

evento um email a pedir o preenchimento de um breve questionário (apesar de se poder deparar

com muito baixas percentagens de resposta). As possibilidades são inúmeras e devem ser

adequadas aos objetivos e recursos disponíveis. Considere igualmente a possibilidade de realizar

atividades de avaliação, não apenas com os visitantes, mas também com os dinamizadores de

atividades presentes no evento que organiza. Defina antecipadamente quais os indicadores que

pretende recolher (avaliação sobre a divulgação, sobre o processo de inscrição, sobre a programação

e logística, sobe o impacto da participação, p. ex.) e as formas mais eficientes de os obter.

Fundamentalmente, não proceda a metodologias de avaliação muito exaustivas (registos áudio ou

vídeo, entrevistas presenciais em profundidade, perguntas abertas em questionários, p. ex.) se

posteriormente não conseguir analisar os dados. O que tem como consequência não conseguir

produzir um sucinto e estruturado relatório de avaliação desejado pelos membros da sua equipa e

restantes dinamizadores de atividades do seu evento.

92

VII - Tarefas prévias ao momento da ação

Sendo que a referida implementação das estratégias de divulgação, avaliação e processo de

inscrição necessitarem já da alocação de recursos humanos e materiais específicos, são agora

indicadas algumas recomendações gerais que se podem adaptar a todas as tipologias de atividades

e eventos. Naturalmente, dependendo da dimensão e localização (na sua instituição de acolhimento

ou num local exterior) existem recomendações que não são aplicáveis.

VII A - Recursos humanos:

Confirme que os oradores/dinamizadores estão na posse de toda a informação

necessária;

Confirme a alocação de recursos humanos na data da atividade/evento para: i)

Receção inicial dos visitantes; ii) Entrega de documentação e esclarecimento de dúvidas; iii)

Encaminhamento de visitantes (em pontos fixos de acesso ou acompanhamento a diferentes

atividades); iv) Atendimento de telefones e verificação de emails; v) Produção de registo fotográfico

e/ou audiovisual; vi) Aplicação das metodologias de avaliação definidas. vii) Apoio técnico de som e

imagem; viii) Apoio técnico informático; ix) Apoio logístico (transporte e montagem de materiais).

É de extrema importância não só a alocação dos recursos humanos, mas também uma

eficiente transmissão da informação entre os elementos. Assim, dependendo da dimensão do

evento, produza e distribua um pequeno documento com as informações fundamentais a todos os

elementos: horários, funções e contactos diretos. O seu contacto direto deve estar sempre na posse

de todos os elementos da equipa. Contudo, seja em eventos de maiores dimensões ou atividades

isoladas, é sempre benéfico reunir presencialmente com toda a equipa, não só para transmitir

informação, mas também para ouvir as dúvidas e contribuições de toda a equipa. Não se esqueça

que as pessoas que estão em contacto com os visitantes são a ‘cara’ da atividade e da instituição e

devem possuir todas as informações necessárias. O que infelizmente nem sempre acontece.

VII B - Recursos logísticos:

Confirme a aquisição/produção do material a entregar aos visitantes: pastas, sacos,

documentação, lápis ou caneta, cadernos de notas, fitas, cartões de identificação, senhas de refeição

e estacionamento, certificados de presença, brochuras e folhetos, entre outros;

Confirme a aquisição/entrega dos materiais solicitados pelos

oradores/dinamizadores das atividades;

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Confirme a aquisição/produção de material impresso como cartazes e sinalização

exterior: não assuma que os visitantes sabem onde se dirigir no local ou que basta perguntarem a

‘alguém’;

Confirme a aquisição/produção de fitas e cartões de identificação para membros da

equipa ou visitantes. Se pretender criar t-shirts alusivas à ação que está a implementar considere o

tempo que estas demoram a ser produzidas e não o faça no último momento;

Confirme a aquisição de serviços de catering para almoços e/ou coffee-breaks e que

estes estão na posse de toda informação: número de visitantes, horários e locais onde devem ser

prestados os serviços;

Confirme a reserva dos espaços: frequentemente as instituições de

investigação/universidades possuem uma sobrecarga de atividades em modo contínuo (investigação

e/ou docência), pelo que é recomendável proceder o mais atempadamente possível à reserva dos

espaços com os serviços da sua instituição ou no local de realização da ação. Adicionalmente, ao

efetuar a reserva considere sempre o tempo de reserva adicionando tempo para montagem e

desmontagem de materiais. Não reserve o espaço apenas para a duração específica da atividade;

Confirme questões de segurança e higiene: existe um seguro ativo de acidentes

pessoais? No caso do público-escolar, estes estão cobertos pelo seguro da escola, no entanto perante

outros públicos verifique essa situação com a instituição. Existe uma equipa para situações de

emergência médica na instituição? Caso exista, confirme que esta está informada da realização da

atividade/evento e pronta a atuar. Os serviços de segurança da instituição estão informados?

Confirme que eles estão devidamente informados para atuarem em situações de emergência e

prestar apoio. Isto porque serão quase de certeza responsáveis pelo acesso a parques de

estacionamento ou a salas da sua instituição e no caso de não estarem informados poderão bloquear

o acesso de visitantes aos locais de realização das atividades;

Confirme com os serviços informáticos da instituição a possibilidade de

disponibilização de acesso à internet aos visitantes.

VIII - Tarefas no decorrer da ação

Perante uma boa planificação, o leitor como coordenador da atividade/evento não precisará

de fazer muito. Pode relaxar e aproveitar para encetar os contactos com os visitantes, dinamizadores

das atividades ou ainda membros da comunicação social que estejam a fazer reportagem da

atividade/evento. Por conseguinte, se o leitor é o coordenador da ação não deve estar adstrito a

94

qualquer função específica, para que possa atuar sobre qualquer situação imprevista que ocorra.

Assim, possua sempre consigo o seu telemóvel ou walkie-talkie e todos os contactos da equipa.

IX - Tarefas após a ação

Confirme a desmontagem de todo o material e devolução ao seu local de origem.

Aplique as metodologias de avaliação aos elementos da equipa e

oradores/dinamizadores.

Proceda a um agradecimento presencial ou por email a todos os elementos envolvidos

pelo desempenho apresentado. É importante não se esquecer de ninguém: desde a equipa de apoio

técnico aos oradores e participantes da atividade/evento (caso seja possível).

Recolha todo o material fotográfico ou audiovisual produzido e caso seja aplicável,

disponibilize-o publicamente (através do website ou redes sociais) e aos serviços de

comunicação/relações externas da sua instituição.

Efetue a análise dos dados de avaliação recolhidos e produza o relatório de avaliação.

Proceda, em reunião presencial ou através de email, à distribuição do relatório de

avaliação produzido, disponibilizando-se para discussão dos resultados apresentados.

4.2.3 - Sugestões e dicas em interações públicas

Comunicar para um público leigo não é fácil para um cientista. Na verdade, comunicar

publicamente não é fácil para ninguém.

Se até ao momento, muitas páginas foram dedicadas à contextualização da comunicação de

ciência como área científica e sobre as partes ‘chatas’ da organização de ações de CPDC, chega o

momento de abordar o ato comunicacional propriamente dito. O que se pretende é agora tentar

responder a uma questão muito frequente no ‘terreno’: “Qual é a melhor maneira de eu dizer isto ao

público?”.

E isto pode afigurar-se como uma deceção, mas a verdade é que não existe nenhuma

planificação geral que sirva de resposta à sua pergunta. Não existe nenhum mapa ou guia que possa

indicar as várias fases que o leitor deve seguir para que comunique mais eficazmente. E porquê?

Porque a comunicação interpessoal é imprevisível e variável não só de acordo com o contexto, com

a audiência, mas principalmente com cada pessoa que pretende iniciar o ato comunicacional.

95

Nesse caso, o leitor pode então questionar-se sobre a real utilidade de cursos de formação

em comunicação, se a comunicação é então uma qualidade inata. Sendo verdade que existem

pessoas com maiores aptidões iniciais para a comunicação, (tal como para a música ou para a

escrita criativa), apenas a prática é capaz de melhorar essas qualidades. Os cursos de formação, o

que fazem é indica ao leitor quais as melhores estratégias para praticar. Na comunicação, como em

outras áreas, o único caminho é a ‘tentativa e erro’ e nova ‘tentativa e erro’ e nova ‘tentativa e erro…

Exatamente devido à subjetividade inerente, continuam atualmente a persistir vários mitos sobre o

processo comunicacional (ver tabela 5).

A importância da comunicação não-verbal

Não são só as nossas palavras que comunicam, mas também os nossos gestos, posturas ou

tom de voz. Esta linguagem não-verbal é de facto tão influente na comunicação, que não pode ser

ignorada porque quem pretender melhorar a sua eficácia comunicacional. Existem três tipos de

códigos que agregam as diferentes tipologias de comunicação não-verbal (sebastião, 2009, p. 29):

Código prosódico: inclui o timbre ou a qualidade individual da voz, o ritmo, a

entoação e pausas e a intensidade da palavra articulada;

Códigos quinésicos: associado aos movimentos e posturas corporais, incluindo

o olhar e o toque, ou seja, aos gestos e mímicas;

Código proxémico: relacionado com a conceção, estruturação e uso do espaço

que separa os interlocutores (emissor e recetor).

Tabela 5 - 10 mitos comunicacionais

Mito Realidade

Comunicamos apenas quando, consciente e deliberadamente,

decidimos comunicar.

Comunicamos o que os outros nos interpretam – mesmo que nada tenhamos dito ou feito e mesmo que não tenha

sido essa a nossa intenção.

As palavras tem o mesmo significado para nós e para os

nossos interlocutores

Devido a diferenças nas experiências pessoais, nos estados emocionais, nos backgrounds académicos e

mesmo nas origens culturais, as pessoas podem interpretar diferentemente as mesmas palavras.

96

Comunicamos, principalmente, através de palavras

Uma grande parte do nosso impacto comunicacional é transmitido por mensagens não-verbais. Acresce que os

seres humanos têm mais facilidade em mentir através das palavras do que da linguagem corporal. Por conseguinte,

a linguagem corporal pode ser mais ‘fiável’.

A mensagem que enviamos é idêntica à mensagem recebida pelo

recetor

Raramente conseguimos transmitir exatamente o que realmente pensamos e desejamos.

Para sermos eficazes, basta que sejamos claros

Podemos ser eficazes sem sermos claros. E podemos ser claros mas não sermos eficazes.

As incompreensões na comunicação geram resultados perversos.

Da diferença de interpretações podem surgir novos e mais criativos modos de encarar um problema e encontrar

soluções para resolvê-lo.

Se compreendermos bem a língua do nosso interlocutor estrangeiro, estamos aptos a comunicar com

clareza

As mesmas palavras não têm o mesmo significado em diferentes culturas. O significado das palavras pode ser

influenciado pelas diferenças entre os contextos culturais. Pode também ser afetado pelas diferenças entre os

significados das mensagens não-verbais em cada cultura.

O que importa é a mensagem, não o canal ou meio.

O meio pode influenciar o significado atribuído à mensagem.

Os meios de comunicação ‘pobres’ são menos eficazes.

Não necessariamente! Isso depende do tipo de mensagem, dos objetivos da comunicação e das

peculiaridades dos comunicadores.

Os homens e as mulheres comunicam do mesmo modo

Tendem a comunicar distintamente e têm diferentes competências para ‘ler’ a linguagem corporal. Isso deve-se a diferenças biológicas, cerebrais, hormonais e evolutivas.

Fonte: adaptado de Rego (2010, p. 41).

Dada a grande relação que apresenta com a componente cultural, o código proxémico varia

significativamente com o contexto cultural. Por exemplo, a distância considerada íntima entre

interlocutores nas culturas mediterrânicas e ibero-americanas é mais reduzida que nas culturas

nórdicas. Os povos latinos possuem maior tendência para o toque e contacto direto no ato

comunicacional do que povos do norte da europa, o que contribui para a sua classificação como

pessoas mais ‘frias’ pelos mediterrânicos.

97

Tabela 6 - Classificação do espaço comunicacional em relação à distância entre interlocutores

Espaço Distância

Íntimo 15-46 cm

Pessoal 46 – 120 cm

Social 120 – 360 cm

Público Mais de 360 cm

Fonte: adaptado de Sebastião (2009, p. 30).

A comunicação não-verbal não deve ser vista pelo leitor como algo com que apenas os

atores ou comunicadores profissionais se devem preocupar. Pondere na eficácia da comunicação

não-verbal, seja na sua comunicação com o público leigo, o mercado empresarial ou mesmo com os

seus pares, equacionando o seguinte (Sebastião (2009, p. 31):

Eficácia das formas de comunicação:

o Palavras (7%); Tom de voz (38%); Gestos (55%);

Ouvimos metade do que é dito (50%);

Escutamos metade disso (25%);

Compreendemos metade disso (12,5%);

Acreditamos em metade disso (6,75%);

Lembramo-nos de metade disso (3,125%).

Sugestões para interações públicas

“Vou estar com eles a olhar para mim. O que é que eu digo?” Esta é a pergunta que todas as

pessoas se colocam quando participam numa ação de comunicação pública direta. Seja em ciência

ou em que área for. Se como já referido, não é possível aconselhar o leitor sobre os passos que deve

seguir numa planificação-quadro, aqui serão apresentadas algumas sugestões gerais que poderá

seguir. Estão serão agrupadas em três cenários que o leitor irá com maior probabilidade enfrentar

ao longo da sua carreira: Apresentações públicas (palestras, conferências, p. ex.); Atividades com

grupos (visitas guiadas, atividades laboratoriais, cafés de ciência, p. ex.); Atividades em ‘stands’

(presença com uma banca em festivais de ciência ou feiras profissionais, p. ex.).

Primeira e principal sugestão: seja sempre ‘você’. Melhorar conscientemente a eficácia das

suas interações públicas é uma excelente estratégia, mas tentar imitar algum orador que viu no

98

youtube ou fazer uma apresentação igual à que viu numa conferência é uma péssima ideia. Ao utilizar

esta estratégia, no momento em que estiver a falar, o seu cérebro não estará preocupado apenas

com o conteúdo, com a audiência ou com o tempo que ainda têm, mas também em pensar como é

que a outra pessoa fazia. O seu comportamento não-verbal (gestos, sorrisos, tom de voz, p. ex.) será

desajustado da sua personalidade e o público muito facilmente identificará essa situação e irá ‘soar

a falso’. Nesse momento, terá perdido a confiança da audiência.

Segunda sugestão: pense criativamente mas com os ‘pés na terra’ e os ‘olhos na audiência’.

É sempre importante não apenas desafiar a audiência, mas desafiarmo-nos a nós próprios. Alcance

a sua audiência tanto cognitivamente como emocionalmente, podendo para isso utilizar formatos

ou meios pouco convencionais (Baltitude, 2011, p. 14). Pode utilizar vídeos, música, adereços, jogos,

entre outros. Contudo, é importante que o faça de forma segura. Ou seja, com tempo suficiente de

preparação, colaboração de outros colegas e fundamentalmente através de testes prévios à eficácia

dos meios que utiliza. Pode até já ter acontecido com o leitor, planear utilizar um vídeo onde explica

o seu trabalho ou mostra o seu laboratório para uma apresentação que ocorre daqui a três dias.

Possui uma excelente ideia, mas como já não tem tempo, utiliza a sua câmara de vídeo e filma o seu

laboratório ou entrevista os seus colegas e edita o vídeo na noite anterior. Contudo, o efeito no

momento da apresentação não é aquele que tinha imaginado. Seja pela qualidade da edição, a

duração ou a adequação ao tema da sua apresentação, os resultados não foram os pretendidos. A

utilização de formatos pouco convencionais são ‘ferramentas’ poderosas, mas requerem tempo,

testes prévios, e principalmente adequação ao público-alvo ou ao tema. Um famoso exemplo é o

vídeo ‘Science: it´s a girl thing’59 produzido pela Comissão Europeia. Este vídeo foi produzido por

profissionais altamente credenciados e com todas as ferramentas técnicas. Contudo, não foi bem

recebido pela comunidade científica e principalmente pelas mulheres cientistas, dada a falta de

adequação à realidade. Considere sempre quais as motivações, preocupações e ambições da sua

audiência.

Terceira sugestão: todas as pessoas sentem ansiedade em falar em público. Mesmo os mais

experientes oradores sentem alguma tensão perante os olhares de uma plateia.

59 Informação disponível em http://science-girl-thing.eu/en/splash. (consultado a 20 de outubro de 2015).

99

A principal origem do receio de falar em público é não estar habituado a fazê-lo.

Aproveite, pois, todas as oportunidades que lhe surgirem para praticar (Rego, 2010, p. 371).

O insucesso de um orador não se deve ao medo em si, mas ao medo de ter medo!

Quando mais receio tiver de bloquear, maior a probabilidade…de bloquear! (Rego, 2010, p. 371).

A tensão não é, necessariamente, um obstáculo ao sucesso de um orador. Pelo

contrário, uma certa quantidade de ‘terror da tribuna’, desde que controlada e doseada, pode

contribuir para a eficácia comunicacional. (Rego, 2010, p. 371).

A - Sugestões para apresentações públicas

As sugestões aqui apresentadas estão estruturadas com base no seguinte cenário: o leitor irá

falar sobre um determinado tema, tendo um determinado tempo, para uma audiência sentada em

formato de auditório ou sala de aula.

Existem inúmeras fontes com informação disponível sobre estratégias de estruturação da sua

apresentação. Rego (2010) apresenta uma dessas possíveis estruturas na tabela 7.

Com base nesta estruturação, todas as apresentações serão iguais? Não! Existem muitas

diferentes estruturas de apresentação. Na estruturação das várias fases, o leitor deve considerar não

apenas qual a mensagem a transmitir, a ‘Take Home Message’, mas também qual a sequência mais

clara e lógica das ideias. Conceitos como o de ‘Storytelling’ são aqui particularmente importantes. A

ideia chave é conseguir ‘prender’ a atenção da audiência, criando nas suas mentes a vontade de obter

uma resposta ou saber qual o desfecho de uma situação. Esta curiosidade é inerente a todas pessoas

e são a base do sucesso das séries televisivas: deixam sempre o espectador curioso sobre o que vai

acontecer a seguir.

Na sua apresentação, utilize a sequenciação das ideias que considera mais conveniente e que

mais se adequa à sua investigação. Tendo sempre em atenção quais as motivações específicas da sua

audiência (‘o que querem eles saber?’) e que os picos de atenção da audiência serão,

invariavelmente, no início e no fim da sua apresentação. Se o leitor observar a tabela 7, poderá

verificar que é no início e no fim onde deve dizer sucinta e claramente a ‘Take Home Message’ que

definiu.

100

Tabela 7 - Possível estruturação de uma apresentação

Fases Caracterização Tempo

aproximado

Faça a saudação

inicial

Apresentação pessoal e

saudação da plateia

Apresente-se a si, à sua área de investigação e onde trabalha e

cumprimente a audiência 20 segundos

Diga-lhes o que vai dizer

Introdução e objetivos; motivos

da sua apresentação

Esta fase deve ser curta. O orador deve estabelecer a sua credibilidade junto da

audiência, captar a sua atenção e fornecer-lhes o ‘mapa’ a seguir na apresentação

10%

Diga-lhes

Referência aos principais temas

Devem ser identificados os aspetos chave que serão posteriormente desenvolvidos.

20%

Desenvolvimento dos temas

Os argumentos são desenvolvidos lógica e racionalmente; os assuntos estão

interligados. 40%

Integração dos principais temas

Os temas abordados são integrados, proporcionando uma visão de conjunto.

20%

Diga-lhes o que disse

Resumo e conclusão

Faz-se o sumário dos pontos fundamentais, salienta-se em que medida a argumentação desenvolvida sugere uma das conclusões.

Expressam-se agradecimentos.

10%

Fonte: adaptado de Rego (2010, p. 361).

Pode assim, começar por um facto ou resultado surpreendente da sua investigação ou o

problema que encontrou no início da sua investigação e agora apresenta à audiência como o resolveu

ou pretende resolver. Ou então pode apresentar uma sequência temporal das etapas que foi

realizando ao longo da sua investigação. Independentemente de como estrutura o conteúdo, não

defraude as expectativas que gerou na audiência. Se promete uma resposta a uma pergunta que

coloca no início, forneça essa resposta a audiência ou então explique porque é que ainda não tem

essa reposta.

Não só a estruturação das ideias, mas também a complexidade dos termos utilizados é uma

‘dor de cabeça’ para os cientistas quando comunicam para um público não-especializado. Esta ‘dor

101

de cabeça’ não é apenas resultante de uma falta de vontade do leitor em usar palavras ditas

‘normais’. De acordo com Sharon & Baram-Tsabari (2014), os cienstistas sofrem de uma ‘maldição

do conhecimento’. Esta ‘maldição’ resulta de uma caraterística psicológica em que uma pessoa

invariavelmente sobrestima o conhecimento de outra pessoa, em resultado do seu próprio

conhecimento. Tal como quando sabemos uma repsosta a um problema, sobrestimamos a

capacidade de outra pessoa em responder corretamente a esse mesmo problema. Os autores

analisaram a quantidade de terminologia técnica utilizada pelos cientistas, comparando discursos

sobre o mesmo tema em seminários técnicos, palestras públicas e conferências de impresa. As suas

concusões indicam que os cientistas utilizam menos termos técnicos em apresentações para público

não especializado. No entanto, permanece a utilização de termos impercetíveis para o público leigo.

Assim, a melhor estratégia para o leitor, poderá fazer o mesmo que a comunicação de

marketing faz há muitos anos: o teste prévio da sua mensagem com o público-alvo. Ou seja, na

construção da sua apresentação, teste-a com pessoas que não são da sua área cientifica, nem estão

diretamente ligadas à investigação. Isto porque, mesmo testando a sua apresentação com colegas

que não da sua área científica (e consequentenente não conheçem em pormenor a sua investigação),

também estas sofrem da ‘maldição do conhecimento’ e não serão capazes de fornecer a perspectiva

que o leitor pretende obter da sua futura audiência. Teste a sua apresentação com familiares ou

amigos, mas com aqueles que mais se aproximam das características sociodemográficas da audiência

com que irá interagir.

Seguidamente são apresentadas algumas sugestões e boas práticas em apresentações

públicas. No entanto, nunca será demais reforçar a ideia de que estas sugestões não são regras

estáticas ou invioláveis. Servem apenas para o leitor as considerar como sugestões possíveis de ser

incorporadas nas suas apresentações, mas de forma adequada e de acordo com o seu estilo.

O texto da sua apresentação deve ser redigido para ser ouvido e não lido. Mesmo que leia o

texto (seja por necessidade – situações muito formais - ou por ausência de à-vontade) procure

incutir-lhe alguma espontaneidade, colocando histórias pessoais e exemplos. Uma leitura pura e

simples do texto pode criar afastamento emocional entre si e a plateia (Rego, 2010, p. 359).

102

Caso tenha de ler um texto escrito:

o Escreva numa letra de tamanho suficientemente grande, com espaços

razoáveis entre linhas e sublinhe as passagens mais importantes;

o Numere as páginas, para evitar o embaraço de, no caso de elas se trocarem,

ter de procurar as páginas enfrentando o silêncio da sala;

o Levante os olhos do papel de vez em quando, para mostrar à audiência que

está ali para eles (Rego, 2010, p. 360).

Mostre autoconfiança. Adquira uma autoimagem positiva.

Evite pedir desculpas por não ser competente na matéria. A pergunta da audiência

será “Se não é competente porque aceitou falar sobre a matéria?”. Se não sente confiança em ser a

pessoa mais indicada para falar não aceite o convite, tal como referido na secção 4.2.1.

O humor é uma ‘ferramenta’ poderosa para se relacionar com a audiência. No

entanto, se sentir desconforto no uso do humor, não o utilize. Se a sua mente estiver demasiado

ocupada com a necessidade de provocar risos, o mais provável é que não os consiga. Se pretender

incorporar alguma anedota, não a anuncie como tal. Caso contrário, quando o fizer e as pessoas não

se rirem, irá experimentar mal-estar.

Evite gracejos racistas, sexistas ou religiosos, pois pode ofender a audiência.

A regra de ouro da expressão facial é: ria, mas genuinamente. O riso sugere que a sua

postura é amigável e está satisfeito por partilhar algo com a audiência. Contribui também para se

sentir mais relaxado. Todavia, se mantiver o riso permanentemente, corre o risco de parecer artificial

e a sua plateia irá facilmente detetar esse comportamento (Rego, 2010, p. 367).

Use imagens e exemplos vividos pelo leitor. Personalize a apresentação usando nomes

(podem ser fictícios). Use analogias, metáforas e histórias, principalmente se forem de alguma forma

relacionadas ou conhecidas da audiência. Consegue assim uma maior aproximação emocional.

Ritmo e tom de voz

Adote um ritmo do discurso apropriado. Não fale demasiado depressa ou demasiado

devagar (pergunte à audiência se estão a sentir dificuldades em seguir o discurso).

Não tente ‘esconder’ o seu sotaque. Pelo contrário, referia-o logo no início, podendo

servir como um ‘quebra-gelo’ e apontamento de humor aproximando-se assim emocionalmente da

audiência.

Se possui ‘bengalas de linguagem’ (‘ah’, ‘ok’, ‘ora bem’, ‘pronto’, p. ex.) em excesso,

essa é uma situação sobre a qual poderá ter de atuar. É normal existirem estas bengalas na sua

103

comunicação oral, o problema surge quando utiliza apenas uma e de forma demasiado frequente e

repetitiva. Isso irá focar toda a atenção do público e não na sua mensagem.

Se considera que está a ficar nervoso ou que está a ficar sem tempo, não caia na

tentação de começar a falar mais depressa para dizer tudo o que tinha para dizer. Se por alguma

razão ficar sem tempo, continue a usar o mesmo ritmo do discurso, passe para o reforço da sua ‘Take

Home Message’ e refira que pode sempre apresentar mais informação posteriormente.

Não tente usar um tom e ritmo de voz que não é o seu, irá ‘soar a falso’. A audiência

poderá comparar o seu tom de voz antes da apresentação ou no final, onde irá certamente voltar

ao seu tom de voz ‘normal’ e a audiência irá detetar a diferença. Se o leitor leu ou alguém lhe referiu

que deve usar uma entoação de voz calma e num tom baixo (e essa não é a sua entoação), não a

utilize ao longo de toda a apresentação como se estive a representar.

Utilize pausas e mudanças de ritmo e tom de voz. Ajudará o leitor a voltar a ‘prender’

membros da audiência que perderam a atenção na sua apresentação (isso vai acontecer sempre, é

normal!). Um silêncio mais longo pode ser mais eficaz a chamar a atenção do que uma voz mais

estridente.

Utilize entusiasmo na sua voz. Tal é independente do seu tom de voz. A sua audiência

ficará imediatamente contagiada pelo seu entusiamo.

Postura e movimentos

Não utilize uma postura ‘fechada’: olhos no chão, braços cruzados à frente, ombros

descaídos ou ‘esconder-se’ atrás da mesa ou do púlpito. As pessoas irão perceber que está ou com

receio ou que não deseja estar ali. Se estiver entusiasmado com a sua apresentação, tal irá

naturalmente refletir-se na sua postura (tal como no tom de voz).

Quanto à movimentação no palco, a recomendação é a mesma que para os gestos

com os braços ou com as mãos: use com parcimónia. Não seja uma ‘estátua’, nem um ‘leão

enjaulado’. Se a primeira não denota entusiasmo, a segunda distrai e incomoda a audiência. Por essa

razão, é frequentemente definido um espaço no palco (com um tapete ou com projeção de luz), onde

é recomendado que o orador se mantenha. No entanto, não é uma regra universal (no fundo tal

como todas as outras recomendações).

Em regra, quanto maior a formalidade menor a capacidade de movimentação. No

entanto, e caso seja possível, aproxime-se do limite do palco ou vá mesmo até à audiência.

Independentemente se consegue aproximar-se ou não da audiência, mantenha sempre contacto

direto com o olhar. Mesmo quando está a ler de apontamentos escritos. Mostre à audiência que olha

104

para todos: o que estão à frente, atrás e nas laterais. Mostre à audiência que está ‘ali com eles’ e com

todos.

Evite ler diretamente dos apoios visuais, e caso o tenha de fazer, não se mantenha de

costas para a audiência. Coloque-se, por exemplo, de lado estando ‘disponível’ para o seu público e

conseguindo ver simultaneamente a projeção.

Quanto ao vestuário, use o que mais gostar, com a única premissa de que este não

seja motivo de atenção desmedida. O centro das atenções é o leitor e a sua mensagem e não a sua

roupa. Não tente ser demasiado exuberante no vestuário, utilizando-o como mecanismo de captar a

atenção da audiência. Sob pena de as pessoas deixarem de prestar atenção ao seu discurso e olharem

apenas para o seu vestuário. O mesmo pode ser dito, por exemplo, quanto a nódoas ou aos cordões

dos sapatos desapertados ou a um lenço de pescoço ‘quase’ a cair do pescoço. Tais situações irão

prender a atenção das pessoas. Quanto a acessórios, as sugestões são as mesmas que para o

vestuário. Não utilize acessórios que produzam barulho enquanto se mexe, como por exemplo,

pulseiras que fazem barulho enquanto bate na mesa ou movimenta os braços. Não utilize acessórios

que façam transparecer à audiência que está ‘de saída’: chapéus ou óculos de sol na cabeça.

Utilização do tempo disponível e apoios visuais:

Não inicie uma apresentação a pedir desculpa pelo tempo a mais que vai utilizar ou

que não sabe quanto tempo tem para falar. Qualquer uma das posturas não denota descontração

(caso seja a intenção ao dizer isto), mas farão antes a audiência pensar que não preparou

devidamente a apresentação.

Se deve demonstrar consideração pela audiência e pela organização utilizando apenas

o tempo disponível que lhe foi atribuído, não opte pelo extremo oposto, estando todo o tempo a

perguntar se ainda tem tempo ou a olhar para o relógio. A audiência poderá pensar que está com

pressa para sair.

Quanto aos apoios visuais, muitas ‘regras’ existem (dos três e dos seis, p. ex.) que

indicam a quantidade de texto que dever ter num slide e quantos slides deve ter num determinado

período de tempo. Utilize os apoios visuais da forma que quiser mas sempre com a consciência de

que eles são apoio. Ou seja, eles nunca devem substituir o orador, nem devem ser utilizados para o

orador ler os slides, agradecer e sair de palco. Para isso, a audiência teria lido os slides enviados pela

organização! Quanto mais texto tiver nos seus slides menos atenção terá da audiência. Utilize

imagens fortes mas sempre relacionadas com o seu tema (ou que as pessoas percebam que está

relacionado com o seu tema) – uma imagem de uma praia paradisíaca é uma imagem forte mas

105

apenas se realizou trabalho de campo nessa praia ou possui relação com o tema, senão é apenas

mais uma distração. Utilize nos slides referências à data, ao local ou ao evento em que está a falar

(nunca de esqueça de apagar a referência nos seus slides a um outro evento anterior onde falou).

Tenha atenção às cores demasiado fortes e aos contrastes de cores, como fundos vermelhos e letras

azuis, por exemplo.

Questões técnicas

Mesmo que a organização disponibilize um apontador laser remoto, o ideal será o

leitor possuir o seu próprio. No caso de utilizar um apontador da organização a que não está

habituado, poderá passar toda a apresentação a pedir desculpa por passar dois ou três slides à frente

inadvertidamente.

Evite utilizar o seu próprio portátil, ‘Smartphone’ ou ‘Tablet’ nas apresentações

públicas, especialmente se não for o único orador e ‘falar’ imediatamente a seguir a outro orador.

Terá de subir ao palco com o equipamento na mão e poderão surgir detalhes técnicos (mesmo com

o apoio de um técnico da organização) como erros de aquisição do sinal pelo projetor ou outro tipo

de incompatibilidades. Caso isso aconteça, ficará no palco num ‘limbo’ desconfortável.

Teste sempre os ficheiros associados à sua apresentação (caso os tenha). Esta é uma

das frases mais frequentes em apresentações: “desculpem mas este vídeo funcionava em casa”. Ao

enviar ou passar a sua apresentação para o computador da organização, certifique-se que os ficheiros

áudio e vídeo foram também enviados. Senão, ficará apenas o hyperlink ao ficheiro na sua

apresentação e dará erro quando o acionar no decorrer da sua apresentação. Assegure-se

igualmente de que existe um sistema de som na sala (caso precise).

‘Sentir’ a audiência

Adicionalmente a estabelecer contacto com o olhar, tente sentir o ‘estado de alma’

da audiência. Tal irá permitir ao leitor aproximar-se emocionalmente do seu público. Se conseguir

identificar se eles estão cansados, impacientes ou aborrecidos, poderá adaptar-se e atuar no

momento. Nesta situação mostre-lhes que compreende a situação (se é o último orador após uma

tarde toda de apresentações, ou se o almoço é a seguir, p. ex.), referindo isso abertamente e

conscientemente. As estratégias que pode seguir são várias. Em qualquer caso, conseguirá sempre

mostrar à audiência uma boa capacidade de adaptação. Pode por exemplo, encurtar a apresentação,

apresentando apenas a sua mensagem principal e disponibilizando-se para falar com quem tiver

interesse durante o almoço, coffee-break ou no final da sessão.

106

Ao perscrutar a audiência facilmente identifica grupos de pessoas potencialmente

interessadas - olham o orador nos olhos - e pessoas aborrecidas e distraídas – têm a cabeça

encostada na cadeira, falam para o lado ou a olham para o relógio ou para o tablet. Com o avançar

da apresentação, pode ir percebendo qual dos grupos (interessados ou aborrecidos) está a aumentar

em número e tentar atuar em conformidade – pode sair do palco e ir até esses grupos, pode fazer

um silêncio mais longo, alterar o tom de voz ou contar uma história pessoal, p. ex.

Caso exista lugar a perguntas e respostas no final da sua apresentação, o leitor entra

nesse momento, num ‘espaço’ onde tem ainda menor controlo. Isto porque não sabe que tipo de

perguntas lhe podem fazer. E poderão surgir todo o tipo de questões relacionadas mais com as

diferentes motivações pessoais, do que com a apresentação do leitor: desde pessoas que apenas

querem comentar sobre o tema e ‘mostrar-se’ à restante audiência ou então querem provocar

alguma reação do leitor. Em qualquer caso, seja sempre cortês, responda com segurança àquilo em

que sente ter confiança suficiente nos seus argumentos e não permita que a audiência perceba que

ficou irritado ou fragilizado com alguma questão. Se não sabe a resposta ou a pergunta colocada

não possui qualquer relação com o tema, refira cordialmente que não sabe a resposta mas que está

disponível para discutir a situação posteriormente.

Sobre este tópico, Rego (2010) apresenta um quadro com as possíveis tipologias de membros

da audiência (ver tabela 8).

B - Sugestões para interações em atividades com grupos

Nesta seção serão apresentadas algumas sugestões para atividades que pela sua dinâmica

comunicacional são diferentes de uma palestra. Atividades como cafés de ciência e similares,

atividades laboratoriais ou ainda visitas guiadas. No entanto, muitas das sugestões acima

apresentadas, continuam a manter-se válidas.

B 1 - Atividades laboratoriais

O público mais frequente neste tipo de atividade é o público escolar (dos vários anos de

escolaridade), podendo decorrer nos espaços laboratoriais do leitor ou nas escolas. Podem também

ocorrer com público geral (como famílias), no entanto dada disponibilidade horária das famílias (fins

de semanas), é muito mais frequente este público visitar centros ou museus de ciência do que

instituições científicas.

107

Caso participe nestas atividades, o leitor estará tipicamente perante uma turma de

alunos, e que ao contrário da maioria das palestras, apresentam relações e hierarquias informais

consolidadas, o que torna a comunicação distinta. Tendencialmente, um grupo social coeso possui

as suas próprias hierarquias informais e em determinados momentos funciona numa perspetiva de

‘nós e ele’. É importante ter sempre presente de que nas atividades de CPDC, não existe uma relação

de dependência formal do grupo para com o leitor. Ou seja, o leitor não representa naquele

momento uma figura de autoridade formal. Esse papel é desempenhado pelo professor que

acompanha a turma, que é a quem o grupo de alunos reconhece essa autoridade.

Ao desenhar a atividade laboratorial é recomendável que o leitor considere sempre se

é possível a realização de atividades práticas por todos os elementos da turma ou se a atividade

irá funcionar num princípio de demonstração. Mesmo que siga esta segunda possibilidade,

introduza sempre momentos em que vários elementos da turma possam realizar por eles mesmo

algumas tarefas práticas.

Em termos de duração da atividade, ao contrário de uma palestra, considere sempre

adicionar mais tempo do que o necessário para realizar apenas a atividade prática em si. Os

momentos de diálogo e dúvidas dos participantes ocupam bastante tempo da atividade.

Uma boa estratégia a seguir é reunir todo o grupo inicialmente, apresentando-se

claramente a si, ao espaço, ao tipo de investigação que é ali realizada e o que vão fazer naquela

atividade e qual o objetivo final. Entregue a todos um breve documento com o procedimento

experimental a ser realizado (principalmente se formar diferentes grupos de trabalho). Se não o fizer,

as paragens para explicação de procedimentos serão numerosas. Adicionalmente, o protocolo

funciona como ‘algo’ com o que os alunos poderão ficar para o futuro. As atividades em que os

participantes conseguem levar consigo uma amostra do que criaram ou observaram, produzem,

frequentemente, um maior impacto.

No caso de formar diferentes grupos de trabalho, assegure-se que todos os grupos

estão a conseguir realizar a atividade e a um ritmo que lhes permita concluir a atividade no tempo

estabelecido. O leitor enfrentará descontentamento e tristeza dos grupos que não conseguirem

terminar a atividade no tempo disponível, quando o principal objetivo é precisamente motivá-los

para a ciência.

108

Tabela 8 - Tipologias de membros da audiência numa palestra pública

Tipos Caracterização

Positivos

Assumem uma atitude positiva perante o orador e a comunicação. Estão genuinamente interessados em escutar o orador e aprender. As

perguntas que colocam são sinceras e destinam-se efetivamente, a esclarecer dúvidas

Cúmplices

Tomam partido pelo orador. Rejeitam críticas mais violentas que outros membros da audiência lhe façam e defendem-no. Nem sempre este

comportamento é genuíno – podendo destinar-se a gerir boas impressões no orador.

Radares falantes Analisam o modo de falar, de vestir e de gesticular do orador. Segredam,

aos ouvidos do parceiro, alguns comentários jocosos aos tiques e palavras do orador. Podem distrair o orador.

Concordantes gestuais

Procuram mostrar concordância com o orador (p. ex. acenando com a cabeça). Por vezes, visam a autopromoção junto dos restantes membros

da audiência (insinuando-se como estando ao nível do orador).

Protagonistas Em vez de dirigirem questões ao orador, produzem longos comentários,

tentando evidenciar-se (“Gostaria de felicitá-lo pela sua excelente apresentação, com a qual concordo inteiramente. Eu julgo que…”).

Implicantes Embirram com o orador. Não descansam enquanto não lhe dirigem

perguntas de difícil resposta.

Otários

Fazem perguntas idiotas, de que a plateia faz chacota. O orador deve ter especiais cuidados em não ‘destrui-los’ publicamente. Deve, antes,

assumir uma atitude pedagógica e cortês, o que pode aliás contribuir para que deixem de colocar perguntas obtusas ou que já foram

respondidas.

Falsos otários As suas perguntas aparentemente idiotas são realmente perspicazes e

encaram o tem em debate de uma maneira especial – e que a maioria da audiência (e até o orador) tem dificuldade em entender.

Fonte: adaptado de Rego (2010, p. 376).

Perante um grupo, a capacidade de comunicar com os todos elementos é

fundamental. Procure evitar à medida que a atividade se desenrola, abordar apenas os elementos

109

que expressam o seu interesse através de perguntas ao leitor. Procure ‘trazer’ para a dinâmica da

atividade todos os elementos do grupo.

Procure evitar fechar-se ou ignorar os elementos ‘desestabilizadores’ do grupo. Estes

elementos vão sempre existir e irão procurar perturbar a atividade, não com o intuito expresso de o

perturbar, mas para reforçar a posição na hierarquia informal no seio do grupo. Quanto mais

ativamente o leitor os ignorar, com maior ímpeto estes elementos tentarão ‘perturbar’ a atividade.

A estratégia ideal é sempre traze-los para a conversa ou serem estes os alvos preferenciais das suas

perguntas e pedidos de ajuda na realização das tarefas práticas. Deste modo, é o leitor que

estabelece a sua dominância comunicacional perante o grupo. Caso não produza os resultados

esperados, lembre-se que o professor dos alunos está ali consigo e deverá ser este a atuar em termos

de autoridade formal. No entanto seja sempre cortês e aberto a perguntas e comentários, tal como

nas respostas a perguntas incómodas numa palestra.

Perante um grupo num espaço pequeno, a sua movimentação é mais fácil. Assim,

utilize essa possibilidade para contactar com todos os elementos. Escape do centro do semicírculo

certamente formado pelo grupo de alunos à sua frente e movimente-se por entre o grupo. Ou então

‘visite’ todas as bancadas de laboratório por onde os diferentes grupos de trabalho estão a

desempenhar as atividades que o leitor preparou antecipadamente.

Se for possível ter consigo outros colegas ou alunos seus, tal facilitará o processo

comunicacional com o grupo no laboratório.

B 2 - Visitas guiadas

A quase totalidade das questões abordadas sobre atividades laboratoriais são adequadas

quando se abordam as visitas guiadas. No entanto subsistem algumas diferenças.

O tempo que terá de considerar para a realização da atividade é bastante superior à

soma dos tempos de diálogo em cada ponto de paragem. ‘Deslocar’ um grupo entre o momento em

que se ‘quebra’ o círculo formado pelos participantes à sua volta num ponto de paragem até à

formação do círculo no próximo ponto de paragem consome bastante tempo.

Nas visitas guiadas, o ideal (dependendo naturalmente da dimensão do grupo) será

estar ser realizada por duas pessoas: uma permanece na frente do grupo e a segunda permanece

atrás do grupo.

Procure evitar falar enquanto estiver de costas para o grupo que o segue. Quando

quiser reforçar alguma ideia importante entre os pontos de paragem previamente estabelecidos para

110

a visita, chame todo o grupo e espere que este se agregue à sua volta. Muito mais facilmente do que

numa atividade laboratorial, poderá transparecer ao grupo de que está a falar apenas para alguns e

não para todos. A segunda pessoa que conduz a visita deve ir minorando este efeito, interagindo com

os elementos que vão na traseira do grupo.

Nestas visitas, a possibilidade de oferecer um programa da visita (com informações

sucintas sobre todo os pontos de paragem) aos elementos do grupo é bastante importante. Isto irá

para permitir a ‘reentrada’ ou um enquadramento mental de todos elementos do grupo, mesmo

quando durante uma parte do percurso tenham estado ‘ausentes’ da comunicação.

B 3 - Cafés de ciência e similares

Este é um cenário comunicacional que corresponde a um meio-termo entre uma palestra e

uma atividade com um grupo.

Dadas as possíveis variações nesta tipologia de comunicação pública direta, o leitor

deve perceber prévia e claramente, qual será o formato: Existe uma apresentação inicial? Existe

possibilidade de utilização de suportes visuais digitais?

No entanto, seja em que formato for, estes formatos de comunicação privilegiam a

interação direta, pelo que será dedicado muito mais tempo do que numa palestra, a intervenções

da audiência e períodos de pergunta e resposta.

Nestas atividades, a utilização de analogias, experiências e histórias pessoais pelo

leitor possuem um grande impacto sobre a audiência. Tenha sempre em consideração que o principal

objetivo da audiência é relaxar e descontrair. Por isso, é que muitas destas atividades decorrem em

bares ou espaços similares, onde a audiência pode estar sentada e a beber um café. Quando estas

atividades são realizadas em museus ou centros de ciência, o espaço onde decorre a atividade tenta

inclusivamente simular o espaço de um café ou bar. Pode, até existir momentos musicais e artísticos.

É especialmente importante a comunicação não-verbal do leitor demonstrar ao

público de que está ali tanto para falar como para ouvir. É recomendável o assumir de uma postura

corporal aberta, disponível e ao mesmo nível que o público: sentando-se nas mesmas mesas ou

circulando entre estas, assumindo posturas descontraídas como por exemplo, beber um café

enquanto fala.

Nestas atividades, não existe preocupação com os tempos utilizados por cada

interveniente, apesar de existir frequentemente um moderador que vai ‘sentindo’ o pulso à

conversa.

111

C - Sugestões para interações em ‘stands’

O que aqui se aborda é o fenómeno comunicacional num contexto de múltiplas interações,

de curta duração e com elementos que possuem menores relações informais entre si. São contextos

enfrentados em eventos de grandes dimensões como ‘dias abertos’ ou feiras de ciência. Tipicamente

o leitor estará num pequeno espaço (mesa ou banca) que lhe é dado pela organização no interior do

grande espaço onde decorre o evento.

C 1 - Questões práticas

Estando num pequeno espaço equacione o material que transporta consigo. O ideal

será ter consigo um objeto capaz de despertar a atenção (seja pela dimensão ou pela sua

espetacularidade) de quem passa nas proximidades do seu espaço. Se este tiver de ser colocado em

cima da mesa, este não deve ser de tão grandes dimensões que ‘esconda’ o leitor da linha de visão

dos visitantes que por circulam nas proximidades.

Caso leve consigo um ecrã onde terá um vídeo em loop, não se esqueça de que este

deve ser facilmente compreendido sem necessidade de som. Mesmo que possua colunas, não é

recomendável que aumente o volume do vídeo sob pena de não conseguir ouvir as pessoas que

interagem consigo na mesa. Adicionalmente, este vídeo não deve ser demasiado longo, sob pena de

ninguém o ver na totalidade.

Mantenha sempre a sua bancada arrumada, de forma a não dar a impressão de

desleixo aos visitantes que circulam na sua proximidade. Evite igualmente ter materiais pessoais

em cima da bancada ou ainda comida e bebidas.

Caso transporte consigo material informativo, não o disponha todo na bancada nem

o distribua a todas as pessoas que passam. Caso contrário após um curto período de tempo não terá

mais material para distribuir. Quase certamente irá deparar-se com ‘recolectores profissionais’. São

visitantes cujo principal interesse não é interagir consigo mais sim obter todo o tipo de acessórios e

materiais impressos disponibilizados nas várias bancadas que estão presentes no evento.

Tenha sempre consigo cartões pessoais ou da instituição para fornecer aos visitantes

com que interage. Tenha igualmente um único dossier onde guarda todos os cartões e os contactos

de email dos visitantes que consigo vão interagindo.

112

C 2 - Questões comunicacionais

Tenha sempre em consideração que o estilo comunicacional nestas atividades é

distinto dos anteriormente apresentados. Os momentos de comunicação com cada visitante são

muito curtos, onde não poderá nem deverá tentar fornecer muita informação. O impacto da sua

comunicação deverá ocorrer num espaço de não mais do que cinco minutos. Caso pretenda indicar

ao leitor como obter mais informação, reforce a sua disponibilidade para contactos posteriores ou

através da página de internet do seu grupo de investigação ou instituição.

Muito provavelmente, o leitor não estará sozinho na sua bancada, pelo que é

importante não dar a impressão de isolamento para com os visitantes. Os elementos da equipa

presentes na bancada, não devem estar de costas ou ‘de lado’ para os locais de circulação e

envolvidos numa conversa a dois. Tais posturas corporais indicam pouca disponibilidade e abertura

para com os visitantes.

A dificuldade do processo comunicacional nestas atividades reside no primeiro

contacto. Os visitantes que circulam no corredor não sabem bem como se aproximar da sua bancada

e o leitor também não sabe bem como fazer ‘parar’ as pessoas que ali passam. Daí a importância de

um objeto ou de uma atividade que permita ‘quebrar o gelo’.

Se o objetivo é estabelecer muitos contactos breves com os visitantes, evite

apresentar na sua bancada atividades experimentais que exigem muita preparação logística ou que

ocupam muito tempo a um visitante para a concluir. Ao fazer isto está a impedir muitas pessoas de

se aproximarem da sua bancada (não existe espaço para muitas pessoas simultaneamente) e a correr

o risco de estar a reter durante muito tempo pessoas que querem visitar outras bancadas também.

O ideal serão atividades com uma elevada capacidade de repetição, que exigem pouco tempo de

preparação (por si) e de realização (pelos visitantes) e que os visitantes possam levar consigo o

resultado da atividade.

Neste contexto comunicacional poderá ainda encontrar um público-alvo, com

características muito específicas, que são as famílias. Tal como referido para o público escolar, este

público possui ainda mais fortes relações de interdependência, o que influencia o modo como o leitor

comunica com eles. A frase que mas ouvirá neste caso será certamente: “isto não é para mim, é para

o meu filho”. Com esta frase, o pai ou a mãe estão a ‘defender-se’ e a tentar retirar-se do processo

comunicacional. Contudo, evite dirigir-se apenas aos filhos (independentemente da faixa etária) e

procure sempre captar os pais para a atividade ou para a conversa. A verdade é que os pais irão estar

113

ali mesmo ao lado e irão certamente interagir (não consigo) mas com o(s) filho(s): “Não faças assim,

faz isto! Não estás a ver como se faz?”. Adicionalmente, é muito importante evitar sempre que

possível, revelar alguma falta de conhecimento dos pais em frente dos filhos, mesmo que o faça

inadvertidamente. Não coloque os pais perante a necessidade de responder a algo de forma direta.

Principalmente perante crianças de menores faixas etárias, em que os pais são ainda vistos pelas

crianças como as principais fontes de conhecimento. Se o fizer de forma direta e aberta (“Então o pai

não sabe responder?”), perderá um ‘aliado’ no processo comunicacional e obterá um ‘inimigo’.

No final fica aqui a recomendação mais importante de todas, seja em que contexto comunicacional

for: divirta-se, que o seu público irá também divertir-se consigo!

114

Conclusões

A principal pergunta que aqui pode ser feita ao leitor é a mesma que aparece no final das

páginas de internet de apoio ao utilizador: “Este guia foi útil?”. Toda a conceção e produção do guia

foi pensada para que a resposta do leitor seja “Sim”. Se a sua resposta é “Sim, mas quero mais

informação”, o objetivo foi também atingido já que demonstra interesse para saber mais sobre a

área da comunicação pública de ciência. Se, pelo contrário, a sua resposta foi “Não”, o objetivo não

foi de facto atingido. Contudo, a esperança é de que esta resposta advenha de o leitor possuir já um

nível de informação e experiência tal, que este guia não lhe traz nada de novo.

Contudo, e na possibilidade de não ser esse o caso, resta a esperança de que este guia não

tenha servido para afastar o leitor de comunicar e contactar diretamente com o público não

especializado. O leitor poderá encontrar muitas outras fontes de informação, assim como recursos

humanos especializados nesta área que o poderão ajudar. Principalmente não desista de comunicar

com a sociedade. A sociedade quer e precisa, não só, de ouvir o que o leitor tem para dizer, mas

também lhe quer dizer as opiniões das pessoas que a constituem.

Ao longo de todo o guia, as palavras com que o leitor mais se deparou foram: ‘público-alvo’,

‘dificuldades’, ‘motivações’, ‘estratégia’, ‘adequação dos recursos aos objetivos’, ‘sugestões´ e

‘recomendações’. Sendo perfeitamente possível que tudo o que aqui tenha lido surja, numa primeira

perspetiva, como ‘apenas senso-comum’. E a verdade é que o é mesmo.

No entanto, tal não implica necessariamente que por ser senso-comum, seja fácil de alcançar.

E este guia é apenas mais uma prova disso. No decorrer das várias semanas de escrita, a ideia

concreta de quem era o leitor e quais as suas ambições foram em determinados momentos

substituídas por algo que correspondia mais ao interesse do autor na área do que as necessidades

do leitor. Resultado: necessidade de eliminar dias e dias de trabalho, porque não correspondiam aos

objetivos inicialmente estabelecidos. O mesmo até já poderá ter acontecido com o leitor: “Mas como

é que vou pôr três anos de investigação em cinco slides para a palestra? Isto é tudo importante!”.

Sendo que o leitor enfrenta ainda a ‘maldição do conhecimento’, como definida por Sharon & Baram-

Tsabari (2014), em que muitas das terminologias que utiliza não são conhecidas do seu público-alvo.

Sendo que a sociedade espera que o leitor comunique e envolva o público na sua investigação,

a verdade é que pode não possuir tempo, recursos, suporte dos pares e da sua instituição de

115

acolhimento ou até mesmo considerar que não possui as capacidades pessoais para o fazer. Quanto

às capacidades, e tal com o indicam os vários autores referidos neste guia, essas poderão ser

melhoradas. No entanto, estas apenas poderão evoluir com a prática, ou seja, comunicando!

“Então e as outras dificuldades todas?”, pergunta o leitor. Se possui interesse e motivação,

planeie adequadamente a sua participação. Decida se utiliza a comunicação pública direta ou

indireta, decida qual o público-alvo, quais os seus objetivos e adeque os seus recursos. Assim, poderá

evitar muitas ‘dores de cabeça’ desnecessárias e que apenas provocam a desmotivação e

afastamento. O objetivo não é certamente abandonar as suas atividades de investigação para se

dedicar a comunicar com o público. O objetivo é que participe no pouco tempo que tem disponível,

de forma eficiente e satisfatória para si e para o seu público-alvo.

Principalmente, estabeleça contactos e parcerias com outros colegas de investigação,

procurando ajuda nos serviços da sua instituição (comunicação, relações externas e transferência de

conhecimento e tecnologia). No fundo, o que muito provavelmente o leitor já faz nos seus projetos

científicos nacionais e internacionais.

116

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Glossário dos principais conceitos da literatura

“O significado de comunicação de ciência e outros termos utilizados na área da

Literacia Científica tem sido infetados por uma infeliz falta de clareza” (Miller, 1983 citado

por Burns et al., 2003, p 183).

As definições dos conceitos na área da comunicação de ciência são surpreendentemente

difíceis de consolidar. A terminologia difere não apenas entre países como também dentro de cada

país (Bowater & Yeoman, 2013). Por essa razão, apresenta-se uma clarificação do significado adotado

para os principais termos utilizados ao longo do guia.

Enumeração dos conceitos aqui apresentados

COMUNICAÇÃO COMPREENSÃO PÚBLICA DE CIÊNCIA

[PUBLIC UNDERSTANDING OF SCIENCE]

CULTURA PERCEÇÃO PÚBLICA DE CIÊNCIA

[PUBLIC AWARENESS OF SCIENCE]

CIÊNCIA DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA [OUTREACH]

CIENTISTA COMPROMISSO COM A CIÊNCIA E A TECNOLOGIA

[PUBLIC ENGAGEMENT WITH SCIENCE AND TECHNOLOGY]

COMUNICAÇÃO DE CIÊNCIA [SCIENCE COMMUNICATION]

DISSEMINAÇÃO DE CIÊNCIA [KNOWLEDGE EXCHANGE]

LITERACIA CIENTÍFICA [SCIENCE LITERACY]

PARTICIPAÇÃO PÚBLICA NA PESQUISA CIENTÍFICA/ CIÊNCIA-CIDADÃ

[PUBLIC PARTICIPATION IN SCIENTIFIC RESEARCH / CITIZEN SCIENCE]

CULTURA CIENTÍFICA [SCIENTIFIC CULTURE]

COMUNICAÇÃO PÚBLICA DE CIÊNCIA

COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA COMUNICAÇÃO PÚBLICA INDIRETA DE CIÊNCIA

EDUCAÇÃO DE CIÊNCIA RELAÇÕES PÚBLICAS

MARKETING PUBLICIDADE

123

MARKETING DIRETO MERCHANDISING OU PROMOÇÕES

FORÇA DE VENDAS PATROCÍNIO

MECENATO ATIVIDADE DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA

EVENTO DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE

CIÊNCIA PROJETO DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA

PROGRAMA DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE

CIÊNCIA INICIATIVA DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA

COMUNICAÇÃO

A palavra comunicação provém do latim Communis, que significa comum. Só há comunicação

quando o que é transmitido tem um significado comum para os dois pólos: emissor e recetor (Rego,

2010, p. 54). Implica uma relação de partilha, de passagem do individual ao coletivo, envolvendo uma

troca de mensagens carregadas de significado (Cruz, 2002, p. 12).

Comunicação é um processo sistemático em que as pessoas interagem com e através de

símbolos para criarem e interpretarem significados (Wood, 2012, p. 3). Com base nesta definição de

comunicação é importante elaborar o significado das palavras-chave desta definição:

Processo: Comunicação é um processo, o que significa que está sempre em

movimento e em constante adaptação;

Sistémica: Ocorre num sistema de partes conectantes que se afetam mutuamente. De

forma interpretar a comunicação temos de considerar o sistema onde ocorre (ambiente familiar, de

lazer, profissional, p. ex.);

Simbólica: O que inclui toda a linguagem e muitos comportamentos não-verbais,

assim como arte e música. Tudo que abstratamente possa significar alguma coisa é um símbolo;

Significados: O que interpretamos de um determinado símbolo. O significado não está

embutido no símbolo, mas sim como interpretamos as palavras e a comunicação não-verbal (Wood,

2012, pp. 3-4)

Os fenómenos comunicacionais podem ainda ser classificados com base nas seguintes

oposições:

124

Quanto ao tempo: Comunicação direta ou síncrona versus comunicação diferida ou

assíncrona;

Quanto ao número: Comunicação interpessoal versus comunicação de massa;

Quanto ao espaço: Comunicação presencial face a face versus comunicação

mediatizada à distância;

Quanto ao código: Comunicação verbal que recorre aos signos linguísticos versus

comunicação não-verbal, que se utilizam signos como gestos, movimentos, espaços, tempos,

desenhos, sons, p. ex. (Serra, 2007, p. 80).

Importa compreender também os diferentes modos em que a comunicação se pode

concretizar, de acordo com Rogério Santos (1998, p. 104-107):

Interpessoal: É a forma mais simples de comunicação entre dois ou mais indivíduos.

Contudo, revela-se também a mais complexa dada a sua imprevisibilidade. Permite o diálogo, a

aceitação e rejeição dos pontos de vista, num registo interativo considerado a base do contacto e da

comunicação humana;

De massas: Modo de comunicação em que um emissor organiza, elabora e distribui a

informação para uma audiência que, ao longo do tempo, se tem revelado cada vez mais vasta.

Recorre aos meios mais diversos de difusão: imprensa, cinema, televisão, painéis exteriores, entre

outros;

Organizacional: Ocorre dentro de uma estrutura ou grupo coerente, visando um

objetivo comum. Dentro deste grupo processa-se também a comunicação interpessoal, no entanto,

esta é limitada por aspetos produtivos ou ideológicos, uma vez que a liberdade de expressão e

intervenção do indivíduo se adapta aos interesses da organização (Sebastião, 2009, p. 27).

De salientar que McQuail adiciona um quarto modo de comunicação, que é o nível

intrapessoal, e que corresponde a um processo mental interno como a reflexão (Serra, 2007).

CULTURA

Muitos cientistas sociais atuais vêm a cultura como consistindo primariamente nos aspetos

simbólicos e intangíveis das sociedades humanas. O essencial de uma cultura não são os artefactos,

ferramentas ou outros elementos culturais tangíveis, mas sim como os membros do grupo os

interpretam, utilizam e percecionam. O que distingue uma pessoa de outra nas sociedades modernas

são os valores, símbolos, interpretações e perspetivas. As pessoas numa mesma cultura usualmente

125

interpretam o significado dos símbolos, artefactos e comportamentos de uma forma próxima e

similar. (Center for Advanced Research on Language Acquisition - University of Minnesota, 2015).

CIÊNCIA

O painel em assuntos públicos da Associação Americana de Física tentou definir ciência como

sendo o “processo sistemático de acumulação de conhecimento sobre o mundo, organizando e

condensando esse conhecimento em leis testáveis e teorias. (…) O sucesso e credibilidade da ciência

está ancorado na aceitação dos cientistas em exporem as suas ideias e resultados à replicação e

testes independentes por outros cientistas (….) e abandonar ou modificar as conclusões aceites

quando confrontados com evidências experimentais mais completas e fiáveis” (American Association

of Physics Teachers, 1999 citado por Burns, O´Connor, & Stocklmayer, 2003, p. 185).

Burns et al. (2003) referem que muitos dicionários completam esta definição identificando o

método científico como aquele que marca indiscutivelmente qualquer atividade como fazendo parte

do processo científico.

As áreas disciplinares abrangidas quando se aplica o termo Ciência é também um tema de

debate. Isto porque geralmente se procede à distinção entre ‘ciência pura’ (como definido

anteriormente e normalmente aplicada às Ciências Naturais) e áreas que correspondem ou a

aplicações de ‘ciência pura’ (tecnologia e medicina) ou ainda à linguagem utilizada pela ‘ciência pura’

(matemática e estatística). Sendo a engenharia considerada como a ligação entre a ‘ciência pura’ e a

tecnologia (Burns, O´Connor, & Stocklmayer, 2003).

Como confirmação desta questão, surgem vários acrónimos utilizados na literatura:

S&T - Science and Technology [Ciência e Tecnologia];

SME - Science, Mathematics and Engineering [Ciência, Matemática e Engenharia];

S&E - Science and Engineering [Ciência e Engenharia];

SET - Science, Engineering and Technology [Ciência, Engenharia e Tecnologia];

STEM - Science, Technology, Engineering and Mathematics [Ciência, Tecnologia,

Engenharia e Matemática].

No relatório à Comissão Europeia do grupo de especialistas em Educação de Ciência, ‘Science

Education for responsible citizenship’ (Comissão Europeia, 2015, p. 20) surge ainda o acrónimo

STEAM (STEM + A), como representando uma união entre ciência, tecnologia, engenharia e

matemática com as artes e humanidades.

126

A mesma questão de divisão entre áreas disciplinares pode ser identificada quando se

consideram os painéis de avaliação criados pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia no processo

de avaliação e financiamento da Unidades de Investigação e Desenvolvimento nacionais em 2013

(Fundação para a Ciência e a Tecnologia, 2015):

Ciências Exatas

Ciências da Engenharia

Ciências da Vida e da Saúde

Ciências Naturais e do Ambiente

Ciências Sociais

Humanidades

Multidisciplinar

CIENTISTA

Pessoas envolvidas na pesquisa ou na prática das ciências físicas, biológicas, engenharias,

matemáticas, médicas e da saúde, naturais ou sociais ou ainda na pesquisa em artes e humanidades

(Science for All Expert Group, 2010).

COMUNICAÇÃO DE CIÊNCIA (CC)

O uso apropriado de competências, meios de comunicação social, atividades e diálogo para

produzir uma ou mais respostas pessoais relativamente à Ciência:

Perceção e familiaridade com os novos aspetos da ciência;

Satisfação ou outra resposta afetiva (p. ex. apreciando ciência como entretenimento

ou arte);

Interesse evidenciado por envolvimento voluntário com a Ciência ou a sua

comunicação;

Opiniões que formam, reformam ou confirmam atitudes para com a Ciência;

Compreensão da Ciência, os seus conteúdos, processos e fatores sociais.

Comunicação de ciência pode envolver membros da comunidade científica, mediadores e

outros membros do público geral, seja entre pares ou entre diferentes grupos (Burns et al., 2003, p.

191).

127

Mackinnon & Vos (2014) sugerem que Comunicação de Ciência é o conceito genérico, onde

coexistem diferentes métodos e técnicas comunicacionais mas todas com o mesmo objetivo geral.

Assim muito dependendo do tipo de informação que se pretende comunicar poderão ser utilizados

as técnicas da Literacia Científica60, Perceção pública de ciência (PAS)61, Compromisso Público com a

ciência e tecnologia (PEST)62, Compreensão pública de ciência (PUS)3, ou ainda da Participação

pública na pesquisa científica (PPSR)63.

LITERACIA CIENTÍFICA [SCIENCE LITERACY]

Sendo um dos primeiros conceitos a emergir na área da comunicação de ciência, muitos

autores apresentaram já definições para Literacia Científica. De entre os mais conhecidos é possível

destacar Shen, Miller e Durant.

Em 1975, Shen indica que o conceito de Literacia Científica abarca três categorias:

Prática: Conhecimento científico que pode ser utilizado por uma pessoa para resolver

problemas em necessidades básicas como a saúde;

Cívica: Conhecimento científico que permite ao cidadão participar em decisões sobre

questões científicas e tecnológicas que afetam a sua vida;

Cultural: apreciação do cidadão pela Ciência como sendo uma conquista humana

universal (Entradas, 2015b, p. 73).

John D. Miller em 1983, por sua vez, identifica quatro componentes da Literacia Científica:

Conhecimento de factos básicos sobre ciência;

Compreensão dos processos e métodos utilizados na ciência;

Apreço pelos resultados positivos da ciência;

Rejeição de crenças supersticiosas (Bowater & Yeoman, 2013).

Para a aquisição de uma literacia científica, como definida por Miller (1983b, 1995, 1998,

2004) e aceite por outros (Miller & Pardo, 200; Durant et al. 1989; Durante 1993) um cidadão não

especialista tem de conseguir ler e compreender a secção de ciência de quinta feira do jornal The

New York Times (Entradas, 2015b, p. 73).

60 Ver definição de Literacia científica. 61 Ver definição de Perceção Pública de Ciência. 62 Ver definição de Compromisso Público com a Ciência e Tecnologia. 63 Ver definição de Participação Pública na Pesquisa Científica.

128

A interpretação do conceito de Literacia Científica evoluiu ao longo dos anos, deixando de

significar apenas a capacidade de ler e compreender notícias de ciência para representar atualmente

a aquisição de competências na compreensão e aplicação de conteúdos científicos à vida quotidiana.

(Burns, O´Connor, & Stocklmayer, 2003).

Emerge assim uma definição de Literacia Científica que apresenta uma maior relação com os

contextos sociais dos cidadãos: “Literacia científica deve ser uma prioridade para todos os cidadãos,

ajudando-os a estar interessados e a compreender o mundo que os rodeia, a envolverem-se nas

descobertas científicas, a serem céticos e a questionarem as afirmações de outros sobre matérias

científicas, a serem capazes de identificar questões, investigar e alcançar conclusões baseadas na

evidência e ainda a produzir decisões informadas sobre o meio-ambiente, a sua própria saúde e o seu

bem-estar” (Goodrun et al., 2001 citado por Burns et al., 2003, p. 188).

CULTURA CIENTÍFICA [SCIENTIFIC CULTURE]

Este conceito tem sido usado de muitas formas diferentes e com distintos significados.

Ilustrando este cenário, Burns et al. (2003) referem que a maioria dos países europeus utilizam o

termo Cultura científica para descrever o conceito de PUS utilizado no Reino Unido e Literacia

Científica nos Estados Unidos. O termo Cultura Científica possui como característica diferenciadora o

enfoque no ambiente cultural em que a ciência e a sociedade interagem.

Cultura científica corresponde a “um sistema integrado de valores sociais que promove a

ciência e uma generalizada literacia científica, como importantes objetivos de uma sociedade” (Burns,

O´Connor, & Stocklmayer, 2003).

COMPREENSÃO PÚBLICA DE CIÊNCIA64 [PUBLIC UNDERSTANDING OF SCIENCE] (PUS)

Conceito que possui o enfoque na compreensão da ciência pelos cidadãos não especialistas:

o seu conteúdo, processos e fatores sociais (Burns, O´Connor, & Stocklmayer, 2003, p. 190).

De acordo com o relatório da Câmara dos Lordes ‘Science and Society’, a PUS pode ser

considerada como uma “compreensão de matérias científicas por cidadãos não especialistas. Isto não

poderá obviamente significar um conhecimento profundo de todos os ramos da ciência. Pode contudo

64 Tradução para a língua portuguesa da designação inglesa ocorre em consonância com o apresentado em Oliveira & Carvalho (2015).

129

significar uma compreensão da natureza dos métodos científicos (…) e uma perceção dos mais

recentes avanços científicos e suas implicações”.

Compreensão pública de ciência tornou-se no termo no qual “se incluem todas as ações de

divulgação65 (no Reino Unido) pela comunidade científica ou por outros em sua representação

(escritores de ciência, museus, organizadores de eventos) para o público em geral, com o objetivo de

aumentar essa compreensão” (House of Lords, 2000).

No contexto da área da Educação de Ciência66, Miller propôs três aspetos da Compreensão

Pública de Ciência que podem servir para definir o conceito:

Compreensão do conteúdo científico ou conhecimento científico substantivo;

Compreensão dos processos e métodos da ciência;

Compreensão da ciência como uma dinâmica social (perceção do impacto da ciência

nos indivíduos e na sociedade) (Burns, O´Connor, & Stocklmayer, 2003).

PERCEÇÃO PÚBLICA DE CIÊNCIA67 [PUBLIC AWARENESS OF SCIENCE] (PAS)

Gilbert, Stocklmayer & Garnett definiram PAS como um conjunto de atitudes positivas para

com a Ciência que são evidenciadas através de um conjunto de competências e comportamentos

pessoais. Estas competências e comportamentos irão conduzir a seu tempo a uma compreensão de

ideias chave assim como do contexto em que elas surgiram, permitindo uma avaliação pelo cidadão

do estatuto do conhecimento científico e o seu significado para a sua vida pessoal, social e económica

(Gilbert et al., 1999 citado por Burns et al., 2003).

O termo PAS é por vezes usado como sinónimo de PUS. Sendo verdade que os termos são

similares e possuem claras interseções, PAS está predominantemente relacionado com as atitudes

do público para com a Ciência, podendo inclusivamente ser considerado como um pré-requisito para

a PUS e a Literacia Científica (Burns, O´Connor, & Stocklmayer, 2003, p. 187).

65 Ver definição de divulgação de ciência. 66 Ver definição de Educação de Ciência. 67 Tradução para a língua portuguesa da designação inglesa ocorre em consonância com o apresentado em Oliveira & Carvalho (2015).

130

DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA [OUTREACH]

Conceito que emerge no início da década de 1990, continuando a ser extensivamente

utilizado atualmente. Muitos autores identificam este conceito como estando relacionado com

públicos escolares, onde membros da comunidade académica interagem com alunos e professores

dos vários anos de escolaridade. Atividades como mentorado, realização de apresentações nas

escolas, envolvimento com alunos em atividades experimentais extracurriculares e escolas de verão,

continuam a ser atividades fortemente conotadas com atividades de outreach (Illingworth, Redfern,

Millington, & Gray, 2015).

Adicionalmente, o conceito está também enraizado nas universidades, laboratórios e centros

de investigação científica. O termo (tanto na língua portuguesa como na língua inglesa) é

extensivamente utilizado nos websites destas instituições para identificar as suas ações de

transmissão do conhecimento científica para a sociedade (Oliveira & Carvalho, 2015).

No entanto é de referir que o termo Divulgação Científica possui ainda, como referem Costa

et al. (2002) uma forte ligação à publicação de livros e revistas, com preocupações de democratização

alargada e/ou voltados para o consumo de massas. “Aí se incluem as publicações na área da

habitualmente chamada ciência popular (no espaço anglo-saxónico) ou vulgarização científica (na

esfera de influência francófona)” (Costa, Ávila, & Mateus, 2002, p. 29).

Como característica fundamental do conceito, Illingworth et al. (2015) referem tratar-se de

uma comunicação unidirecional, em que os cientistas comunicam a sua pesquisa para um público

leigo.

COMPROMISSO PÚBLICO COM A CIÊNCIA E A TECNOLOGIA68 [PUBLIC ENGAGEMENT WITH

SCIENCE AND TECHNOLOGY] (PEST)

O conceito de compromisso69, dada a sua abrangência conceptual tornou-se teoricamente

confuso e sofre pelo facto de significar tudo para todos (Fredericks et al., 2004 citado por Mckinnon

& Vos 2014).

68 Tradução para a língua portuguesa da designação inglesa ocorre em consonância com o apresentado em Oliveira & Carvalho (2015). 69 Termo utilizado como sinónimo de Engagement.

131

Existem duas ideias centrais ao conceito de compromisso. A primeira é de que o compromisso

é uma precondição ou um precursor à participação. A segunda é de que este pode ser definido

através de três dimensões: a) afetiva – ligação social, emocional ou psicológica; b) cognitiva – um

investimento mental; c) comportamental – desde fazer o mínimo possível até um envolvimento total

(Mckinnon & Vos, 2014).

Quando nos focamos na comunicação de ciência, este conceito envolve o compromisso entre

a sociedade e ciência através de uma discussão aberta e de igual para igual que possibilite aos leigos

tornarem-se os protagonistas nas decisões científicas com impacto social (Pitrelli, 2003 citado por

Oliveira &Carvalho, 2015,p. 156).

Nesta abordagem participativa a ênfase já não está na difusão do conhecimento, mas na sua

apropriação, na sua integração com outros saberes e na sua utilização na tomada de decisão, através

de um processo de contribuição mútua e de legitimação pública para o desenvolvimento de uma

ciência mais humanizada.

Esta posição mais igualitária de envolvimento público, como parte fundamental de uma

democracia forte e consolidada, estabelece uma via de duplo sentido: o conhecimento público da

ciência e o conhecimento da comunidade científica sobre o público (Oliveira & Carvalho, 2015).

DISSEMINAÇÃO DE CIÊNCIA [KNOWLEDGE EXCHANGE]

Qualquer atividade que envolva diálogo entre membros da comunidade científica e empresas

públicas e privadas, serviços do setor terciário, público generalista e comunidades locais. Estas

atividades são geralmente monitorizadas por instituições de financiamento da investigação científica

(Illingworth, Redfern, Millington, & Gray, 2015).

PARTICIPAÇÃO PÚBLICA NA PESQUISA CIENTÍFICA OU CIÊNCIA-CIDADÃ [PUBLIC PARTICIPATION IN

SCIENTIFIC RESEARCH OR CITIZEN SCIENCE] (PPSR)

O conceito de PPSR tornou-se na última década muito influente e amplamente discutido no

interior da comunidade científica (Riesch & Potter, 2013). De forma simplificada, PPSR implica a

colaboração entre cientistas ‘profissionais’ e membros do público não-especialista que estão

diretamente envolvidos num projeto científico.

A maioria dos projetos de PPSR envolve uma questão científica ou um tema ambiental cuja

resolução mais eficaz é através da análise de uma grande quantidade de dados que são recolhidos

132

numa grande área ou num longo período de tempo por cidadãos leigos e voluntários (Haywood &

Besley, 2013).

De acordo com Shirk et al. (2012) os principais formatos deste projetos são:

Contributários: Os membros do público leigo contribuem apenas com informação

para projetos já estabelecidos;

Colaborativos: Os membros do público leigo são envolvidos na análise e interpretação

dos dados;

Colegiais: Cientistas e leigos estão envolvidos em todas as fases do projeto científico

(Haywood & Besley, 2013).

COMUNICAÇÃO PÚBLICA DE CIÊNCIA70 (CPC)

Este conceito está diretamente ligado ao conceito de comunicação de ciência (CC) definido

por Burns et al. (2003) e anteriormente apresentado.

Trata-se de uma derivação do conceito referido, através da delimitação do público-alvo do

processo comunicacional, ao implicar que a comunicação pública de ciência seja dirigida a um público

leigo e não especialista. Mantendo a quase totalidade da definição de Burns et al. (2003), a diferença

surge na eliminação da comunicação interpares na comunidade científica. Esta comunicação no

interior da comunidade científica possui objetivos e metodologias próprias que a distinguem de uma

comunicação direcionada para a sociedade leiga.

Assim na comunicação pública de ciência continuam a manter-se não só, os objetivos

propostos por Burns et al. (2003), como os envolvidos no processo comunicacional: membros da

comunidade científica, mediadores e outros membros do público não especialista.

COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA (CPDC)

Terminologia adotada no presente guia e que resulta da derivação do conceito de

comunicação pública de ciência, pela delimitação do fenómeno comunicacional quanto ao tempo e

número71. Deste modo, os objetivos descritos na definição de comunicação de ciência mantêm-se

inalterados. Assim, a CPDC envolve a realização de atividades comunicacionais síncronas, em que os

70 A adoção desta terminologia ocorre em consonância com o apresentado em Oliveira & Carvalho (2015); Entradas (2015a); Bowater & Yeoman (2013). 71 Ver definição de Comunicação.

133

participantes do processo comunicacional estão a interagir no mesmo momento temporal.

Adicionalmente as atividades de CPDC correspondem a atividades comunicacionais interpessoais.

Tipicamente, a CPDC é uma comunicação presencial, contudo perante as atuais tecnologias de

informação (transmissão multimédia bidirecional p. ex.), poderão ocorrer situações em que se

processa uma comunicação mediatizada à distância. Quanto ao código, nas atividades de CPDC

poderá ser utilizada comunicação verbal e não-verbal.

Exemplos de ações de comunicação pública direta de ciência72:

Atividades73: Palestras públicas; Sessão laboratorial/experimental; Visitas guiadas

com um especialista (ao terreno ou a um laboratório, p. ex.); Reuniões para decisão política; Cafés

de ciência e similares; Peças de teatro e similares (‘Stand-up comedy’ p. ex.); Painéis de cidadãos

Projetos74: Projetos pedagógicos com escolas, Projetos científicos de Ciência-cidadã;

Eventos75: Dias e semanas abertas, p. ex.;

Iniciativas76: Ciclos de conferências, semanas nacionais e europeias, p. ex.;

Programas77: ‘Escolas de verão’, ‘master classes’, competições e olimpíadas científicas

p. ex.

COMUNICAÇÃO PÚBLICA INDIRETA DE CIÊNCIA (CPIC)

Terminologia adotada no presente guia e que resulta da derivação do conceito de

comunicação pública de ciência, pela delimitação do fenómeno comunicacional quanto ao número e

ao espaço.78. Deste modo, os objetivos descritos na definição de comunicação de ciência mantêm-se

inalterados. Assim, a CPIC envolve a realização de atividades comunicacionais para massas e

mediatizadas à distância. Tipicamente, a CPIC é uma comunicação assíncrona, contudo perante as

atuais tecnologias de informação (websites, blogues e fóruns de discussão p. ex.), poderão ocorrer

situações em que se pode processar uma comunicação síncrona entre alguns membros das massas e

72 Lista de ações não é exclusiva e com base no apresentado por Entradas (2015b) e Bowater & Yeoman (2013). 73 Ver definição de atividade de comunicação de ciência 74 Ver definição de projeto de comunicação de ciência 75 Ver definição de evento de comunicação de ciência. 76 Ver definição de iniciativa de comunicação de ciência. 77 Ver definição de programa de comunicação de ciência. 78 Ver definição de Comunicação.

134

o emissor. Quanto ao código, nas atividades de CPDC poderão ser utilizados códigos verbais e não-

verbais.

Exemplos de ações de comunicação pública indireta de ciência79:

Entrevistas rádio/imprensa/televisão;

Conferências de imprensa;

Notícias, artigos de opinião, comunicados de imprensa e newsletters;

Materiais informativos (brochuras/folhetos impressos ou digitais);

Exposições

Livros/artigos de divulgação científica;

Projetos científicos com escolas ou com cidadãos;

Conteúdos para escolas e/ou manuais escolares;

Relatórios para apoio à decisão política;

Websites, Blogs, redes sociais e fóruns de discussão on-line.

Concurso científico (fotográfico, literário, multimédia, p. ex.)

EDUCAÇÃO DE CIÊNCIA [SCIENCE EDUCATION]

Educação de ciência é usualmente entendida como sendo a componente formal de

apresentação da ciência à sociedade, o que ocorre principalmente através do curriculum escolar.

Existem dois fundamentos de base à introdução de conteúdos científicos no curriculum

escolar: i) assegurar o crescimento do número de cientistas; ii) fornecer uma educação científica de

base ao ‘aluno’ que o ajude a aplicar os seu direitos e deveres como cidadão. (Mckinnon & Vos, 2014,

p. 5). Assim, a educação de ciência possui uma dupla função: criar um certo nível de literacia científica

nos alunos, com o potencial para desenvolver novos cientistas.

Por essa razão vários autores salientam a importância fundamental da literacia científica para

a educação de ciência. Literacia Científica entendida de acordo com a definição por Goodrun et al.

(2001)80 e que pode ser resumida do seguinte modo: uma pessoa cientificamente literada possui

79 Lista de formatos de atividades não é exclusiva e compilada com base no apresentado por Entradas (2015b) e

Bowater & Yeoman (2013).

80 Ver definição de Literacia científica.

135

interesse na ciência, compreende o mundo que o rodeia, e envolve-se ao longo da sua vida com a

ciência pensa de forma crítica sobre matérias científicas.

Sendo que a aprendizagem pode ser definida como o processo pelo qual um indivíduo assimila

informação, ideias e valores, adquirindo assim conhecimentos, competências e habilitações técnicas

(European Centre for the development of vocational training, 2009), três tipos de educação de ciência

podem ser enunciadas:

Ensino Formal: aprendizagem que ocorre num ambiente estruturado e organizado

(escolas e universidades) e é explicitamente concebida para o ensino (em termos de objetivos, anos

de escolaridade e recursos educativos). Educação formal é intencional do ponto de vista do aprendiz.

Conduz a validação e certificação dos conhecimentos. (European Centre for the development of

vocational training, 2009).

Ensino Não-formal: aprendizagem que ocorre em instituições com vocação educativa

(p ex. associações profissionais, formação vocacional) no decurso de atividades nem sempre

desenhadas explicitamente para o ensino (em termos de objetivos, tempo ou recursos) mas que

contêm uma importante componente de ensino. Esta aprendizagem é intencional por parte do

aprendiz. Pode eventualmente conduzir a validação e certificação dos conhecimentos (European

Centre for the development of vocational training, 2009).

Ensino Informal: aprendizagem que resulta de atividades diárias em diferentes

contextos como atividade profissional, família ou atividades de lazer. Não é organizado ou

estruturado em termos de objetivos, tempo ou recursos educativos. Esta aprendizagem é

maioritariamente não intencional por parte do aprendiz. Não conduz a validação e certificação dos

conhecimentos e ocorre ao longo da vida (Comissão Europeia, 2015).

RELAÇÕES PÚBLICAS

O Instituto Britânico de Relações Públicas define Relações Públicas como um “esforço

deliberado, planificado e permanente para estabelecer e manter mútua compreensão entre uma

organização e o seu público” (Sebastião, 2009; Carver, 2014; Rasquilha 2009).

Rasquilha (2009, p. 179) apresenta ainda a definição da Associação Francesa de Relações

Públicas: “Atividades desenvolvidas por um grupo, tendo em vista estabelecer e manter as boas

relações entre os membros do grupo e entre os grupos e os diferentes setores da opinião pública”. As

relações públicas são uma arte aplicada às ciências sociais, tendo como principal consideração o

136

interesse público da sociedade e o interesse privado das organizações. No entanto, tal só será

possível com o recurso a técnicas com vista a uma maior eficácia no ajustamento das práticas

empresariais ao interesse dos públicos organizacionais (Sebastião, 2009, p. 73).

MARKETING

O Marketing lida com a identificação e resposta às necessidades sociais e humanas. Uma das

definições mais curtas de marketing pode ser: “resposta a necessidades de forma lucrativa” (Kotler

& Keller, 2006). A Associação Americana de Marketing oferece a seguinte definição formal:

“Marketing é uma função organizacional e um conjunto de processos para criar, comunicar e fornecer

valor a clientes e para gerir as relações com os clientes de uma forma que beneficie a organização e

os seus acionistas” (Kotler & Keller, 2006).

PUBLICIDADE

Técnica de comunicação de massas, destinada a um público específico e que é geralmente

paga e utilizada com o objetivo de dar a conhecer e valorizar uma marca (produto, serviço ou

organização), contribuindo para a sua experimentação, consumo, adesão, fidelização, utilização ou

apoio (Rasquilha, 2009).

MARKETING DIRETO

Esforço comunicacional feito com o objetivo de identificar o consumidor e de lhe dirigir a

mensagem de forma personalizada e individualizada para que a marca ou organização consiga

estabelecer contactos próximos e duradouros (Rasquilha, 2009). De entre as técnicas incluem-se o

direct mail, telemarketing ou direct response (vulgar anúncio de imprensa com um cupão através do

qual o consumidor solicita informações, o envio de amostras, p. ex.).

Uma nova evolução do marketing direto é o marketing relacional ou CRM (Costumer

Relationship Management), que reflete uma visão dinâmica da utilização destas técnicas de forma

simultânea e personalizada (Rasquilha, 2009).

MERCHANDISING OU PROMOÇÕES

Instrumentos de apoio à venda com grande impacto uma vez que acrescentam valor ao

produto e acompanham o ato da compra propriamente dito (descontos, oferta de acessórios, p. ex.).

137

Assim sendo, constituem mais um argumento de venda do produto que muitas vezes justifica por si

mesmo a compra (Sebastião, 2009).

FORÇA DE VENDAS

Conjunto de pessoas que numa empresa tem por função vender o produto, através do

contacto direto com clientes, potenciais clientes, distribuidores, entre outros. Esta função exige uma

elevada preparação de materiais demonstrativos (amostras, folhetos, p. ex.), assim como de

apresentações, exposições e outros eventos. Existe uma inter-relação direta entre a força de vendas

e relações públicas (Sebastião, 2009).

PATROCÍNIO

Corresponde essencialmente a uma relação comercial. De um lado, temos uma entidade que

oferece um suporte – em bens, serviços ou dinheiro – e do outro, uma segunda entidade que,

usufruindo desse benefício, oferece em contrapartida direitos, associação ou visibilidade que

interessam ao patrocinador. Existe um grande número de variações de patrocínios, seja no tipo de

evento que uma entidade patrocina (desportivo, cultural, ambiental), seja nos objetivos que essa

entidade possui em recorrer ao patrocínio (institucionais, comerciais, mistos, p. ex.) (Rasquilha,

2009).

MECENATO

Doação altruísta a uma instituição pública ou privada, com fins culturais ou artísticos. O

mecenato é um recurso de entidades e organizações com menor projeção do que o patrocínio

(Sebastião, 2009).

EVENTOS

Acontecimentos específicos de caracter cultural e de entretenimento que cumprem um

objetivo de apresentação, demonstração ou partilha de informação com um público-alvo específico

(lideres de opinião, consumidores, especialistas, p. ex.) (Rasquilha, 2009).

AÇÕES DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA: ATIVIDADE, EVENTO, PROJETO,

INICIATIVA E PROGRAMA

Dada a grande diversidade de terminologias aplicadas à organização e implementação de

ações de comunicação pública direta de ciência, são adotados neste guia os seguintes termos, tendo

138

em consideração o apresentado na literatura e a terminologia utilizada no quotidiano do contexto

nacional. Isto, apesar da clara perceção de que existirão sempre ações de comunicação pública direta

de ciência que não serão completamente caracterizadas por uma única das categorias abaixo

apresentadas.

ATIVIDADE DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA

Pode ser definida como “um processo com a intenção de estimular aprendizagem através de

uma interação real” (Bowater & Yeoman, 2013). Na área da comunicação de ciência, este termo é

aplicada “maioritariamente a uma sessão experimental/laboratorial, contudo pode representar

também um debate ou uma palestra” (Bowater & Yeoman, 2013, p. 129).

A atividade não é definida pelo conteúdo ou formato, mas sim “por se tratar da unidade

mínima de construção de ações de maior escala de comunicação pública direta de ciência” (Bowater

& Yeoman, 2013, p. 129).

Assim:

Quanto à duração: O desenrolar da atividade possui uma curta duração (entre

minutos a horas);

Quanto à localização: Realiza-se num único local;

Quanto à interdependência: Possui um início e um fim claramente delimitado,

podendo existir tematicamente e logisticamente isolada de qualquer outra atividade;

Quanto à dimensão do público-alvo: Varia tipicamente entre as unidades e as dezenas

de pessoas simultaneamente;

Periodicidade: Dado o seu elevado potencial de repetibilidade, não possui tipicamente

periodicidade associada.

Como exemplos de atividades, temos palestras ou apresentações, sessões laboratoriais,

debates, peças de teatro, saídas de campo, entre outras. Dada a extraordinária variedade de

atividades que podem ser implementadas, nunca será demais salientar que existem sempre exceções

como palestras para várias centenas de pessoas simultaneamente ou sessões experimentais com

equipamentos que possuem restrições de uso e/ou transporte.

139

EVENTO DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA

Resulta da união de “várias atividades individuais” (Bowater & Yeoman, 2013, p. 129) de

comunicação pública direta de ciência. É um acontecimento único e marcado no tempo, utilizado

para atrair a atenção do público e da comunicação social para determinada organização (Sebastião,

2009).

Assim:

Quanto à duração: Possui um período mais alargado do que a atividade, ocorrendo

em dias consecutivos (tipicamente entre 1 dia a uma semana);

Quanto à localização: Realiza-se num único local;

Quanto à interdependência: As atividades que o constituem possuem algum tipo de

relação, seja temática, institucional ou outra. As atividades inseridas no evento, não possuem uma

interdependência direta, podendo o público selecionar a ordem e quais as atividades em que

participa ou interage;

Quanto à dimensão do público-alvo: De acordo com a escala do evento pode variar

entre dezenas e milhares de pessoas simultaneamente. Existem significativas variações do número

de participantes entre as atividades de um mesmo evento;

Periodicidade: Genericamente apresenta uma periodicidade anual.

Como exemplos de eventos, temos dias ou semanas abertas de universidades/institutos de

investigação, feiras ou festivais de ciência, entre outros.

PROJETO DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA

Termo entendido na definição apresentada pela área da gestão de projetos: “um conjunto de

atividades interdependentes organizadas e implementadas com um definido ponto de início e fim, de

forma a alcançar resultados específicos para satisfazer as necessidades da organização” (Young,

2003). Na transposição para ações de comunicação pública de ciência, deve ser salientado que os

projetos possuem características que englobam simultaneamente ações de comunicação pública

direta e indireta.

Assim:

Quanto à duração: Poderão variar entre vários meses e vários anos;

Quanto à localização: Ocorre em diferentes localizações;

140

Quanto à interdependência: As atividades que o constituem possuem uma forte

interdependência através de uma ordem previamente estabelecida sendo que muitas tarefas

ocorrem ou paralelamente ou o seu início está dependente da conclusão das anteriores. Tipicamente

orientado para resultado mensurável e visível: descoberta ou análise de um fenómeno natural ou de

ação humana, produção de um equipamento tecnológico, uma exposição, um congresso, p. ex.;

Quanto à dimensão do público-alvo: De acordo com a escala do projeto pode variar

entre as unidades e milhares de pessoas simultaneamente. O número de participantes poderá

manter-se invariável do início ao final do projeto ou variar significativamente de acordo com a tarefa

que se está a desenrolar;

Periodicidade: Dado o seu muito baixo potencial de repetibilidade, não possui

periodicidade associada.

Como exemplos de projetos, temos os de cariz pedagógico (tipicamente entre especialistas e

escolas e/ou alunos do sistema de ensino) e projetos de pesquisa científica com a contribuição de

cidadãos não especialistas (projetos de ciência cidadã).

Os projetos de cariz pedagógico possuem genericamente um maior potencial para o

desenvolvimento de tarefas de CPDC (sessões laboratoriais, saídas de campos, reuniões, palestras,

p. ex.) do que os projetos de ciência cidadão que se baseiam maioritariamente em atividades de CPIC.

INICIATIVA

INICIATIVA ENQUANTO CONJUNTO DE ATIVIDADES DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA

Usualmente concebida e implementada por uma única instituição, em que um formato de

atividade é repetido periodicamente sob a égide de um tema agregador.

Assim:

Quanto à duração: Possui uma duração bastante mais alargada do que um evento

(meses a anos), não ocorrendo em dias consecutivos;

Quanto à localização: Realiza-se num único local;

Quanto a interdependência: As atividades não possuem interdependência, podendo

o público selecionar as datas em que participa na atividade, seja em consequência do conteúdo

científico ou da data em que se realiza;

141

Quanto à dimensão do público-alvo: Varia entre as dezenas e as centenas de pessoas

simultaneamente, com significativas variações do número de participantes entre diferentes datas;

Quanto à periodicidade: Possui uma periodicidade muito bem definida

(frequentemente semanal ou mensal).

Como exemplos de iniciativas como conjunto de atividades, temos os ciclos de conferências,

ciclos de debates, entre outros.

INICIATIVA ENQUANTO CONJUNTO DE EVENTOS DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA

Usualmente concebida por uma instituição, que convida outras instituições a implementarem

eventos organizados autonomamente sob a égide de um tema agregador.

Assim:

Quanto à duração: Usualmente entre um dia e um mês, podendo ocorrer em dias

consecutivos ou alternados;

Quanto à localização: Realiza-se em vários locais simultaneamente;

Quanto a interdependência: Os eventos não possuem interdependência, podendo o

público selecionar qual o evento ou as atividades de um evento em que participa, seja em

consequência do conteúdo científico, da localização do evento ou da data em que se realiza;

Quanto à dimensão do público-alvo: De acordo com a escala da iniciativa pode variar

entre as unidades e milhares de pessoas simultaneamente. Existem significativas variações do

número de participantes entre eventos, atividade e datas de realização (caso seja o caso);

Quanto à periodicidade: Tipicamente possui uma periodicidade anual.

Como exemplos de iniciativas enquanto conjunto de eventos, temos semanas nacionais,

europeias ou mundiais (semana nacional da ciência e tecnologia, semana mundial do espaço, dia

mundial do ambiente), dias internacionais como a ‘Noite europeia dos investigadores’, ‘Ciência Viva

no Verão’, p. ex. A celebração de anos internacionais da UNESCO, por exemplo, corresponde a um

caso especial de uma iniciativa que pela sua escala e objetivos, escapa a vários das categorias

definidas anteriormente. Dado ocorrer apenas um vez e por indicação da assembleia geral das

Nações Unidas, esta iniciativa decorre ao longo de todo um ano civil, agregando todas as tipologias

de ações de CPDC possíveis (atividades, eventos, projetos, iniciativas e programas) implementadas

por um muito elevado número de instituições a nível mundial.

142

PROGRAMA

Termo entendido na definição apresentada pela área da gestão de projetos: “um conjunto de

projetos interdependentes geridos de uma forma coordenada, que no seu conjunto produzirão os

desejados resultados” (Young, 2003).

PROGRAMA ENQUANTO CONJUNTO DE ATIVIDADES DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE

CIÊNCIA

O termo ‘Programa’ será aqui entendido como um conjunto integrado e coerente de

atividades de comunicação pública direta de ciência, cujas características o diferenciam de um evento

e de um projeto.

Assim:

Quanto à duração: Varia frequentemente entre dois dias a um mês, podendo ocorrer

em dias consecutivos ou alternados;

Quanto à localização: Ocorre num único local;

Quanto à interdependência: As atividades do programa possuem uma forte

interdependência entre si, sendo que os participantes interagem em todas as atividades inseridas no

programa;

Quanto à dimensão do público-alvo: Varia entre as unidades e as dezenas de

participantes. O número de participantes mantém-se invariável entre o início e o fim do programa;

Periodicidade: Tipicamente possui uma periocidade semestral ou anual.

Como exemplos de programas, temos as ‘escolas de verão’, cursos e ‘masterclasses’

organizadas por universidades/institutos de investigação, ‘campos de férias’ organizados por centros

de ciência/museus, competições/olimpíadas científicas organizados por universidades/institutos de

investigação/sociedades científicas e programas similares.

É conveniente referir que no período de tempo definido para o programa pode ocorrer uma

repetição de um programa (exemplo: ao longo de um mês podem ocorrer 4 repetições das atividades

de um campo de férias para participantes diferentes).

143

PROGRAMA ENQUANTO CONJUNTO DE PROJETOS DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA DIRETA DE CIÊNCIA

O termo ‘Programa’ será aqui entendido tal como definido por Young (2003).

Assim:

Quanto à duração: Poderá variar entre um e vários anos;

Quanto à localização: Realiza-se em vários locais simultaneamente;

Quanto à interdependência: Os vários projetos que constituem o programa possuem

formatos, características e públicos-alvo distintos, sendo agregados sob a égide de um objetivo

genérico e abarcador;

Quanto à dimensão do público-alvo: Pode variar entre centenas a milhares de

pessoas. Existem significativas variações do número de participantes entre os vários projetos;

Periodicidade: Dado o seu muito baixo potencial de repetibilidade, não possui

periodicidade associada.

Como exemplos de programas enquanto conjunto de projetos, temos exemplos nacionais

como o “Escolher Ciência”81, “Pais com Ciência”, entre outros.

81 Informação disponível em http://www.cienciaviva.pt/home/ (consultado a 20 de agosto de 2015)

144

Índice de Ilustrações

Figura 1 - Modelo do 'Public engagement triangle' ............................................................................. 30

Figura 2 - Modelo conceptual de formação de atitudes do público para com a decisão política em

ciência e tecnologia...................................................................................................................... 31

Figura 3 - Variáveis preditivas da transição entre as categorias 'Envolvidos', 'Interessados' e

'Residuais'..................................................................................................................................... 32

Tabela 1 - Técnicas de comunicação na Comunicação de Marketing (mix comunicacional) .............. 12

Tabela 2 - Técnicas de comunicação 'above the line' e 'below the line' ............................................. 12

Tabela 3 - Evolução dos paradigmas de comunicação de ciência ....................................................... 24

Tabela 4 - Evolução dos modelos de comunicação de ciência ............................................................ 28

Tabela 5 - 10 mitos comunicacionais ................................................................................................... 95

Tabela 6 - Classificação do espaço comunicacional em relação à distância entre interlocutores ...... 97

Tabela 7 - Possível estruturação de uma apresentação .................................................................... 100

Tabela 8 - Tipologias de membros da audiência numa palestra pública........................................... 108