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José Miguel Mattos & Geizilene Alves Florêncio 2010 Brazilian Cultural Studies v. 1, n. 2, p. 147-171, Maio/Agosto 2010 Página147 A COMPREENSÃO LEITORA NO ENSINO DE LÍNGUA ESPANHOLA EM ESCOLA PÚBLICA BRASILEIRA José Miguel Mattos Geizilene Alves Florêncio UBC (SP) UBC (SP) Resumo Os estudos sobre a leitura e a história da leitura no processo educacional definem o perfil do leitor como sujeito inserido em seu contexto social. O leitor de hoje deve atender as demandas mais complexas diante da sociedade, que se transforma a todo tempo e que exige cada vez mais conhecimento e ações deste sujeito. Na contemporaneidade, não é preciso somente o saber, é necessariamente visível que se construa o saber. Os professores estão diante de novas exigências e desafios, e isto deve ser preocupação de todos os educadores que atuam nas áreas disciplinares, como os profissionais da disciplina de E/LE (Espanhol/Língua Estrangeira). O desafio deste educador é formar leitores que atuem na sociedade contemporânea do conhecimento, da informação e da ação.Desta forma, foram analisadas algumas questões, por meio da compreensão leitora proposta nas aulas de E/LE, de acordo com a exploração e o incentivo ao desenvolvimento crítico do leitor. Palavras-chave: Sujeito crítico. Leitura. Espanhol. E/LE. Compreensão. Exercícios. THE READING COMPREHENSION IN THE TEACHING OF SPANISH IN BRAZILIAN PUBLIC SCHOOLS Abstract The studies about the reading and the history of reading on the educational process define the reader profile as a subject inserted in its social context. The contemporary reader should comply with the more complex demands before the society, that is changing everytime and requires each time more knowledge and actions of this subject. In the contemporary era, it is not only necessary the knowing, but its is necessarily visible that the knowing is build up. Teachers are before new demands and challenges and that must be a concern to educators that actuate in disciplinary areas, such as the professionals of S/FL Spanish/Foreign Language (E/LE Español/Lengua Estranjera). The challenge of such educator is to form readers that play roles in contemporary society of the knowledge, of the information and of the action.By this way, it has been analyzed some questions, through the reading comprehension proposed in S/FL-E/LE classes, in accordance with the exploration and motivation to the critical development of the reader. Keywords: Critical subject. Reading. Spanish. E/LE. Comprehension. Exercises.

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A COMPREENSÃO LEITORA NO ENSINO DE LÍNGUA ESPANHOLA

EM ESCOLA PÚBLICA BRASILEIRA

José Miguel Mattos Geizilene Alves Florêncio

UBC (SP) UBC (SP)

Resumo

Os estudos sobre a leitura e a história da leitura no processo educacional definem o perfil do

leitor como sujeito inserido em seu contexto social. O leitor de hoje deve atender as demandas mais

complexas diante da sociedade, que se transforma a todo tempo e que exige cada vez mais

conhecimento e ações deste sujeito. Na contemporaneidade, não é preciso somente o saber, é

necessariamente visível que se construa o saber. Os professores estão diante de novas exigências e

desafios, e isto deve ser preocupação de todos os educadores que atuam nas áreas disciplinares, como

os profissionais da disciplina de E/LE (Espanhol/Língua Estrangeira). O desafio deste educador é

formar leitores que atuem na sociedade contemporânea do conhecimento, da informação e da

ação.Desta forma, foram analisadas algumas questões, por meio da compreensão leitora proposta nas

aulas de E/LE, de acordo com a exploração e o incentivo ao desenvolvimento crítico do leitor.

Palavras-chave: Sujeito crítico. Leitura. Espanhol. E/LE. Compreensão. Exercícios.

THE READING COMPREHENSION IN THE TEACHING OF SPANISH IN

BRAZILIAN PUBLIC SCHOOLS

Abstract

The studies about the reading and the history of reading on the educational process define the

reader profile as a subject inserted in its social context. The contemporary reader should comply with

the more complex demands before the society, that is changing everytime and requires each time more

knowledge and actions of this subject. In the contemporary era, it is not only necessary the knowing,

but its is necessarily visible that the knowing is build up. Teachers are before new demands and

challenges and that must be a concern to educators that actuate in disciplinary areas, such as the

professionals of S/FL – Spanish/Foreign Language (E/LE – Español/Lengua Estranjera). The

challenge of such educator is to form readers that play roles in contemporary society of the

knowledge, of the information and of the action.By this way, it has been analyzed some questions,

through the reading comprehension proposed in S/FL-E/LE classes, in accordance with the exploration

and motivation to the critical development of the reader.

Keywords: Critical subject. Reading. Spanish. E/LE. Comprehension. Exercises.

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Introdução

Na formação de cada cidadão bem como de um povo, a leitura é de máxima

importância, representando um papel essencial, pois revela-se como uma das vias no processo

de construção do conhecimento, como fonte de informação e formação cultural, a partir do

momento em que o leitor reflete sobre o texto.

As OCEM (2006) afirmam que a leitura será um instrumento intermediador das

relações entre mundo e aprendiz. Nas atividades de leitura, os temas transversais podem ser

de grande valia, assim como o letramento, multiletramento, multimodalidade aplicadas ao

ensino podem contribuir igualmente.

As condutas que reproduzem a leitura, segundo Silva em seu livro: A produção da

leitura na escola: Pesquisa X Proposta (2004) é a imitação, a contemplação passiva, a cópia,

o recolhimento na solidão, o ócio descompromissado, a ficha padronizada, a resposta ao

questionário, como a do livro didático, e na tortura da redundância os alunos passam a odiar

qualquer tipo de leitura.

Silva (2004) defende que outras propostas devam orientar a leitura no contexto

escolar:

Parar de ler para memorizar normas gramaticais ou conteúdos cristalizados ou

superficializantes e, a passos largos, começar a ler para enxergar o mundo; parar de ler para

vomitar matéria, ou apenas, para imitar, na base da osmose, o cânone dos clássicos e a passos

largos, começar a ler para compreender esta sociedade e para nos compreendermos

criticamente dentro dela. (SILVA, 2004, p.13)

Acrescentamos ainda que o desenvolvimento da compreensão leitora deva ter como

propósito levar a reflexão efetiva sobre o texto lido: mais além da decodificação do signo

linguístico, o propósito é interagir com o texto, com o autor, com seu contexto e assim atingir

a compreensão profunda.

Ilustramos abaixo as propostas encontradas nas OCNEM (2006):

Proposta das atividades a serem desenvolvidas em Língua Estrangeira no E.M

1° ano Leitura, comunicação oral e prática escrita.

2° ano Leitura, comunicação oral e prática escrita.

3° ano Leitura, comunicação oral e prática escrita.

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Estas atividades a serem desenvolvidas devem ser contextualizadas. Os temas a serem

trabalhados devem ser avaliados regionalmente, de acordo com a localidade. O trabalho de

leitura deve ter continuidade nestes três anos, embora com mudanças de perspectiva, a leitura

deve ser considerada como prática cultural e crítica de linguagem, um componente essencial

para a construção da cidadania e para a formação do educando.

Ainda segundo as OCNEM (2006), a leitura é exposta como constituinte do processo

de letramento. É indicada a insuficiência da compreensão de textos pelas investigações no

campo dos letramentos e dos multiletramentos, que indicam a necessidade de haver algumas

mudanças nas perspectivas praticadas no desenvolvimento da leitura, com levar em conta o

surgimento dos gêneros textuais novos.

Ao que se refere ao trabalho com a leitura, reafirmamos a necessidade da adoção das

teorias de letramentos e multiletramentos, que funcionam como base educacional e

epistemológica. Estas poderão contribuir para ampliar a visão de mundo dos alunos para

trabalhar o senso de cidadania, desenvolver a capacidade crítica, construir conhecimento em

uma concepção epistemológica contemporânea.

Reproduzimos abaixo uma proposta de leitura (A e B), encontrada nas OCNEM

(2006), para ilustrar a relação entre leitura, leitura crítica e trabalho de letramento.

Atividade A

Uma professora leva um anúncio publicitário sobre o Dia das Mães extraído de uma

revista. Pede aos alunos que o leiam e respondam as perguntas, tais como:

a. A quem se dirige?

b. O anúncio atende a que necessidade ou desejo (saúde, popularidade, conforto,

segurança)?

c. Que argumentos não estão sustentados?

d. Que recursos gráficos são utilizados para alcançar certas informações no texto?

e. Como o custo do objeto anunciado se apresenta minimizado ou disfarçado?

f. Por que o anúncio utiliza depoimentos de pessoas?

g. Que palavras ou idéias utilizadas para criar uma impressão específica ou

particular?

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Atividade B

Uma professora leva um anúncio publicitário sobre o Dia das Mães extraído de uma

revista. Pede aos alunos que o leiam e respondam as perguntas, tais como:

a. As mães representadas no anúncio se parecem com as que você conhece? Por que

não?

b. Quais as mães que não estão representadas no anúncio?

c. Que filhos vão dar presentes às mães?

d. Como os filhos arranjam dinheiro para comprar presentes para suas mães?

e. Quem cria/produz esse anúncio?

f. Por que essas pessoas que produzem os anúncios despendem tempo e trabalho para

garantir que o leitor saiba qual produto está disponível no mercado?

Ao comparar essas duas atividades podemos perceber que o mesmo texto ganha

objetivo e tratamento diferentes por meio das perguntas de compreensão que são usadas,

podendo levar a resultados pedagógicos diferentes. Como exemplo, na atividade A as

perguntas objetivam desenvolver a compreensão de texto e ao mesmo tempo promover a

leitura crítica. A atividade B, por sua vez, busca imprimir características de um trabalho de

letramento, levando os alunos a construir sentidos a partir do que lêem, em vez de extraí-los

do texto; tenta construir o sentido do texto dentro de um contexto histórico, social, imerso em

relações de poder, tendo como objetivo de leitura uma atividade que envolve conhecer o

mundo e refletir sobre as possibilidades e as conveniências de transformação social. Os

estudos indicam que o senso de cidadania poderá ter mais oportunidade de expansão no tipo

de desenvolvimento de leitura proposto pela atividade B.

Os PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) tratam de temas transversais,

focalizando claramente questões de interesse social. A Multieducação, por sua vez, fala de um

núcleo curricular básico que articule princípios educativos e núcleos conceituais (da

Identidade, do Tempo, do Espaço e da Transformação). Ambas as propostas privilegiam o

trabalho com o texto escrito, promovendo a habilidade de leitura. E os cursos temáticos

parecem assim ser perfeitamente aplicáveis dentro destas perspectivas, articulando sempre a

cultura local com a cultura-alvo de uma maneira crítica, dinâmica e atual.

As OCEM (2006) apresentam que as questões que buscam desenvolver o letramento

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crítico levam em consideração o trabalho com a compreensão geral do texto, dos pontos

principais e as informações detalhadas dos textos. No entanto, o letramento crítico representa

uma ampliação e uma definição desse trabalho de leitura no que se refere à expectativa de

desenvolvimento crítico dos alunos:

O projeto de letramento pode coadunar-se com a proposta de inclusão digital e social e atender

a um propósito educacional, pois possibilita o desenvolvimento do senso de cidadania. O

projeto prevê trabalhar a linguagem (em língua materna e em línguas estrangeiras)

desenvolvendo os modos culturais de ver, descrever, explicar. No que concerne à leitura,

contempla pedagogicamente suas várias modalidades: a visual (mídia, cinema), a informática

(digital), a multi-cultural e a crítica (presente em todas as modalidades).p.98.

Diferenças entre leitura e letramento crítico

Área Leitura crítica Letramento crítico

Conhecimento Conhecimento - por meio de experiência

sensorial e raciocínio; fatos - realidade.

Distinguem-se os fatos (objetivos) das

inferências e dos julgamentos

(subjetivos) do leitor.

Conhecimento- não é natural

ou neutro. Conhecimento-

baseia-se em regras discursivas

de cada comunidade. Logo, o

conhecimento é ideológico.

Realidade

Pode ser conhecida. Serve como

referência para a interpretação

Não há um conhecimento

definitivo sobra a realidade. A

realidade não pode ser

“capturada” pela linguagem. A

“verdade” não pode ser

definida numa relação de

correspondência com a

realidade, deve ser

compreendida em um contexto

localizado.

Autoria

Detectar as intenções do autor- base

para os níveis mais elevados da

interpretação textual.

O significado é sempre

múltiplo, contestável,

construído cultural e

historicamente, considerando

as relações de poder.

Educação Desenvolvimento de níveis elevados de

compreensão e interpretação.

Desenvolvimento de

consciência crítica.

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A partir dessas considerações, podemos afirmar que a leitura é parte constituinte do

processo de letramento. É indicada a insuficiência da compreensão de textos pelas

investigações no campo dos letramentos e dos multiletramentos, que apontam a necessidade

de haver algumas mudanças nas perspectivas praticadas no desenvolvimento da leitura, como

levar em conta o surgimento dos gêneros textuais novos.

A ideia de levar em conta os gêneros textuais também é compartilhada por Kleiman

(2008). A autora ainda aponta a necessidade da leitura objetivada e intencionada, a partir da

divisão ou da não-divisão dos textos em gêneros textuais.

Os PCN: LE (1998) argumentam que a utilização de tipos de textos diferentes em sala

de aula, além de contribuir para o conhecimento intertextual, pode mostrar claramente que os

textos são usados para propósitos diferentes na sociedade.

Alguns textos, levando em consideração seus gêneros, como descreve Kleiman (2000),

romances, contos, fábulas, biografias, notícias, artigos de jornal, artigos científicos, ensaios,

editoriais, manuais didáticos, receitas, cartas; parecem determinar claramente seus objetivos.

Quando o leitor inicia, por exemplo, a leitura de um jornal, já na primeira página o leitor faz

uso de mecanismos para a apreensão rápida de informação visual dando uma mera passada de

olhos, que consiste em uma leitura global, uma leitura superficial, de itens selecionados pelo

leitor, a fim de obter uma ideia geral sobre o tema e subtemas.

Uma consideração proposta por Kleiman (2008), sobre uma maneira adequada de

ativar o conhecimento prévio da criança, consiste em oferecer um objetivo à leitura (vamos

ler para descobrir por que, como...; para conhecer os detalhes de...; para ter uma idéia geral

de...). A criança deve aprender a adaptar suas estratégias de leitura e de abordagem ao texto

aos seus próprios objetivos. Daí a dupla validez de uma prática em que o professor define,

antes da leitura, os objetivos da mesma, assim modelando uma atitude de acesso importante

de acesso ao texto.

Kleiman (2008) defende que ao realizar a leitura global o leitor criará hipóteses sobre

o que o texto irá tratar, e ao ler o texto ele irá utilizar de seu conhecimento de mundo, ou

conhecimento prévio para a compreensão do texto. O aluno desenvolverá seu cognitivismo

opondo-se aos automatismos e mecanicismos típicos de passar o olho, que muitas vezes é tido

como leitura nas escolas.

A autora compartilha da mesma idéia crítica que apontam as OCEM (2006), na

medida em que o contexto escolar não específica o porquê de o aluno ler certos textos, não

expõe seus objetivos específicos em relação às atividades de leitura. Fora da escola, o aluno

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tem essa preocupação de planejar um objetivo para cada atividade que irá realizar, porém

quando se trata de leitura na escola, acaba ficando vaga esta proposta, onde na maioria das

vezes, o texto de leitura é utilizado como linha de intermédio para outras atividades, e o aluno

permanece sem saber onde irá chegar e qual a finalidade daquela leitura.

Silva (2004) preconiza que outras propostas orientem as atividades de leitura no

contexto escolar, onde o aprendiz deva parar de ler para memorizar normas gramaticais,

conteúdos cristalizados e superficializantes, para começar a ler enxergando o mundo; parar de

ler para despejar a matéria, ou apenas, com base na osmose, imitar os cânones dos clássicos,

começar a ler para compreender a sociedade e para compreender-se criticamente dentro dela e

começar a descobrir os diferentes aspectos da vida. Aos poucos, ir desautomatizando, ir

desrotinizando os protocolos conservadores que regem a leitura em todos os graus de ensino

do país.

Kleiman (2004) ainda faz uma crítica ao expor que a leitura, a julgar pelo exercício de

compreensão e interpretação dos livros didáticos e da sala de aula, fica reduzida, quase sem

exceções, à manipulação mecanicista de sequência discretas de sentenças, não havendo

preocupação pela depreensão do significado global do texto.

A autora postula que o paradoxo parece ser fruto da simplificação do processo de

interação. Numa atividade de leitura, é preciso distinguir as relações que são instituídas entre

autor e leitor, por um lado, e entre leitor e contexto, por outro. No contexto escolar, o

professor, um dos fatores da ação no contexto imediato no leitor, é também constitutivo do

processo. Ele determina, em grande medida, os objetivos de leitura, um dos quais, poderia

inclusive, ser a retipificação do discurso, determinando, por extensão a adequação da leitura,

isto é, uma leitura é adequada ou inadequada a um objeto específico. Neste processo, o

professor não desempenha o papel de mediador entre autor e leitor, mas de fornecedor de

condições para que se estabeleça a interlocução.

A compreensão dependerá das relações que o leitor estabelece com o autor durante a

leitura do texto. Podemos até pensar em propostas de ensino que privilegiam o autor nessa

relação ao se preocupar exclusivamente com o reconhecimento de sentido do autor, por meio

de tarefas que se baseiam principalmente na identificação de marcas formais no texto.

Em última instância, a percepção das marcas de autoria no texto é essencial para a

leitura crítica, postula Kleiman (2008). O senso crítico é definido como uma atitude de

descrença, de ceticismo que faz com que exijamos evidencia para as opiniões e ideias que são

apresentadas, e que podem servir de base para a formação de opiniões de ideias próprias. Essa

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atitude implica, necessariamente, uma análise do texto, prévia a qualquer discussão;

pressupõe uma interação, um escutar do outro.

Silva (2004) traz alguns apontamentos referentes à qualidade dos textos e ao exercício

de leitura nas escolas, este afirma que o trabalho com retalhos do texto, texto sem contexto,

só um tipo de texto, o texto e o teste, a lição sem texto ou só com gravura, o texto fino, o texto

curto, tudo isso como pretexto para o consumo rápido, acrítico e asséptico de doses

homeopáticas de informações. A leitura é apresentada como sendo sem substância, sem

significado, sem sequência, sem unidade e sem aprofundamento. O autor afirma que o leitor

fornece passivamente respostas e estímulos a fim de contentar as exigências das provas, e isto,

ocorre de série em série, de ano para ano, e a monotonia circular cotidiana desestimula aos

poucos a curiosidade do leitor.

O autor ainda postula os exercícios como sendo um movimento mecanizado e

sincronizado, executado da mesma maneira de ano para ano e, quase sempre, teatralizado nos

palcos da mentira, em que os atores apenas fingem que lêem para contentar a instituição.

Abrem o livro, lêem a lição, respondem questões, repassam a gramática, redigem trinta linhas

e entregam ao professor, repetindo esse movimento nas aula seguintes.

A ideia de leitura e compreensão deve estar ancorada em uma concepção que não veja

como simples resposta passiva e mecânica, mas considere-se enquanto um processo

dinamizador da produção de sentidos por um grupo de pessoas, enquanto transmissão ou

interação entre leitor e diferentes tipos de texto. É preciso que saiba traduzir essa concepção

da leitura em programas significativos de ensino, que resultem na transformação, na

emancipação, na libertação dos leitores.

O modelo de leitura compreendida de um modo crítico projetaria a transformação da

sociedade em comunidade criadora, postula a escritora Goettenauer (2009). Ainda que essa

projeção seja uma utopia, não podemos esquecer que a tendência crítica em nosso tempo é

dupla: uma de ordem científica, que consiste em investigar o processo de criação e a obra em

seus elementos constitutivos; outra de ordem poética, que pretende ampliar o campo de

criação.

Partindo das orientações didáticas para o ensino da compreensão escrita encontradas

nos PCN: LE (1998), primeiramente, é necessário que o professor escolha o texto a ser usado,

a seguir, deve estabelecer um propósito para a leitura, esse propósito definirá o nível de

compreensão a ser alcançado. A compreensão envolve crucialmente a percepção da relação

interacional entre quem fala, para que, o que, quando, por que e onde.

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Quanto à compreensão textual, ela não é obtida pela transferência de informações já

identificadas e codificadas, coaduna as OCEM (2006). A compreensão de um texto abrange o

entendimento, a percepção do conteúdo global, da mensagem que se pretende transmitir, das

idéias principais e da opinião do autor, mesmo que essa seja contrária a nossa. Percebe-se

então que está mais voltada para os objetivos e as idéias do autor, por isso muitos a

confundem com a idéia da compreensão como mera captação da mensagem, o que não é

verdade. Afinal, o indivíduo, ao compreender o posicionamento de outro, não está impedido

de pensar, refletir, ou inclusive de confrontar suas idéias.

Nas concepções em que o processo de leitura se dá de forma interativa, isto é, aquelas

que consideram que no processo de leitura o conhecimento do leitor interage com as

informações do texto, uma das fontes necessárias para a depreensão do tema é o

conhecimento que o leitor tem sobre a estrutura do texto.

Com as disciplinas de língua estrangeira, busca-se a formação do sujeito, o que inclui

o desenvolvimento de consciência social, criatividade, disposição para os conhecimentos

novos. O encontro com o mundo cultural hispânico interessa para o autoconhecimento e,

nesse sentido, para o empreendimento de mudanças que possam possibilitar melhorias no

contexto nacional. Conhecer o outro, para a partir dele, conhecer-se melhor. Deste modo, uma

reforma na maneira de pensar e ver o mundo, contribuir para a formação dos indivíduos como

parte de suas preocupações educacionais.

As OCEM (2006) esclarecem que a língua estrangeira possui função educacional, e

um de seus papéis mais importantes é o de expor aos alunos a outra língua a partir de uma

óptica menos instrumental, o que poderá interferir positivamente na relação que os estudantes

brasileiros guardam com a própria língua. É interessante levar o estudante a ver-se e

constituir-se como sujeito a partir do contato e da exposição ao outro, as diferenças do

reconhecimento das diversidades.

Na nossa sociedade, o conhecimento de língua estrangeira é muito valorizado no

âmbito profissional, no entanto, ele não pode estar voltado para esta função ou para a

superação de provas seletivas. Estas situações fazem parte da vida do aluno, mas não se pode

esquecer de que dominar uma língua estrangeira requer conhecer os valores e crenças

presentes em diferentes grupos sociais, que certamente entrarão em contato.

Devemos pensar o ensino do espanhol, antes de qualquer coisa, como um conjunto de

valores e relações interculturais, interagindo com a transversalidade com reflexões sobre

pontos como: a política, a economia, educação, esportes, lazer, informações, língua,

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linguagem e reflexões sociais. Estas reflexões devem adaptar-se às diferentes realidades do

país. É importante que a abordagem da língua estrangeira esteja subordinada à análise de

temas relevantes na vida dos estudantes, na sua formação enquanto cidadãos, na sociedade na

qual fazem parte, na sua inclusão.

A LDB (Lei de Diretrizes e Bases), em vigor, apresenta o ensino de uma língua

estrangeira de uma forma obrigatória para o nível de ensino primário nos seguintes termos:

“na parte obrigatória do currículo será incluída obrigatoriamente, a partir da quinta série, o

ensino de pelo menos, uma língua estrangeira moderna, cuja eleição ficará a cargo da

comunidade escolar, dentro das possibilidades da instituição” (art. 26, § 5°).

Em discussão sobre o ensino de espanhol, as OCEM (2006) apontam que existe hoje

no ensino de espanhol na rede estadual uma implementação diferenciada (UECHI, 2005)

adotada por algumas escolas estaduais para o ensino de línguas. Essas instituições abrem uma

estrutura paralela em forma de centro de línguas para seus próprios alunos, com organização

semelhante ao curso de idiomas, com horário fora da grade escolar. Outra versão desse centro

surge da parceria com institutos de idiomas: o mesmo se aplica a organização das turmas e

horários; os professores, porém, são selecionados pelo instituto conveniado; e este é

responsável pela qualidade pedagógica da implementação.

Sedycias (2009) expõe que a situação do espanhol em terras brasileira é de progressão

e de prestígio crescente, e por isso torna-se imprescindível para uma melhor compreensão do

lugar dessa língua estrangeira no firmamento pedagógico e cultural do nosso país, o processo

ensino-aprendizagem desse idioma para usuários da língua portuguesa.

O valor de um idioma comum é fundamental, tanto para facilitar o entendimento em

relações culturais ou comerciais, como para a formação de uma verdadeira comunidade

“latino-americana”. É o que a acrescenta Francisco Moreno (2009), quando postula que, o

ensino do espanhol no sistema público brasileiro é insuficiente no legislativo e no

organizativo

A aprendizagem do idioma espanhol, sob a visão de Sedycias (2009), apresenta um

universo novo em termos de literatura, historiografia, filosofia, filme, música, folclore, cultura

popula, e, ainda, não devemos esquecer uma das verdades mais simples sobre uma língua

estrangeira; quando iniciamos o aprendizado de uma nova língua, não aprendemos apenas a

descrever a nossa realidade convencional com sons novos e exóticos; aprendemos também a

criar uma realidade completamente nova.

Ao longo da proposta feita pelas OCNEM (2006) transparecem também conceitos de

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cultura e de como trabalhá-las, ainda conceitos de língua, em especial do espanhol, na

formação do sujeito, naquilo que lhe proporciona em termos de inclusão social e étnica, na

constituição da sua cidadania, dos desafios que são impostos por esta sociedade globalizada e

informatizada, questões referentes à construção de visão de mundo, para poder, talvez, melhor

lidar com elas, auxiliando o aprendiz na construção de sua identidade.

Dentro da formação que se pretende oferecer aos nossos estudantes, uma disciplina

deve interagir com todas as demais para que se obtenham resultados de maior alcance na

constituição da cidadania. É necessário que as disciplinas encontrem interdependências,

convergências, de modo que se estabeleçam ligações de nossa realidade complexa que os

olhares simplificados tentam desfazer, neste caso a construção da cidadania passa a ser

coletiva.

A aprendizagem de língua não se refere somente a aprendizagem da língua com

objetivos instrumentais, mas faz parte da formação integral dos alunos. É fundamental

trabalhar com a linguagem não apenas como forma de expressão e comunicação, mas como

constituintes de significados.

Enfim, nossa preocupação, e a de inúmeros professores de espanhol, é aproveitar os

diversos estudos linguísticos voltados para o ensino/aprendizagem de língua e assentar as

bases para que o ensino de espanhol não repita o fracasso do ensino de inglês. É necessária

uma relação pedagógica, mas sem ignorar os aspectos específicos de cada habilidade e de

cada texto.

Diante dessas considerações, desenvolveremos um estudo de três unidades do livro

didático “Espanhol Expanción: Ensino Médio” (2004), de Romanoe & Jacira, analisando as

atividades de compreensão leitora. Em que medida estes exercícios exploram o

conhecimentos de mundo e informações exteriores ao texto, auxiliando no desenvolvimento

cognitivo dos aprendizes, formando não somente leitores, mas cidadãos críticos e envolvidos

em seu contexto social.

ANÁLISE DAS ATIVIDADES DE COMPREESÃO TEXTUAL

PRESENTES NAS AULAS DE E/LE

Os conceitos teóricos, citados no primeiro capítulo, que cercam a leitura, a

compreensão textual e, partindo destas duas atividades, o desenvolvimento da formação do

leitor como cidadão crítico e participativo em sua sociedade, nos permitem analisar como são

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condicionadas as atividades, de compreensão leitora propostas nas aulas de E/LE.

Conduziremos esta investigação apoiados em três unidades do livro didático, utilizado

nas aulas de língua espanhola de uma escola estadual de São Paulo localizada na cidade de

Mogi das Cruzes , “Espanhol Expanción: Ensino Médio” (2004), de Romanoe & Jacira. A

presença deste material didático remete à escolha feita pelo corpo docente da unidade de

ensino, já citada. O material que será analisado são atividades de compreensão leitora,

propostas nas aulas de E/LE, as referentes unidades encontram anexadas no trabalho.

Na primeira unidade encontramos o seguinte texto:

Identidad

La identidad humana está compuesta de diferentes marcas, bien sean físicas,

heredadas genéticamente de nuestros antepasados, bien sean ideológicas, heredadas de la

cultura del grupo social al que pertenecemos.

En Hispanoamérica, dichas herencias se constituyen de las influencias de los

colonizadores mezcladas a la cultura de los habitantes de raíz de cada lugar. México, por

ejemplo, tiene en las raíces de su historia a los indios aztecas. Países de la región Andina

Central, como el Perú, Bolivia, Chile y Argentina recibe influencia de los incas. Ya Honduras,

Guatemala, El Salvador y El sur de México, de los mayas. Pero en todos ellos contribuyen a

la caracterización de su cultura la influencia del colonizador, en este caso el español,

mezclada a algunos rasgos sobrevivientes de sus orígenes. Cada pueblo, por supuesto, aparte

de poder compartir raíces comunes, tiene sus particularidades histórico-culturales, lo que de

cierto modo, se reflejara también de variantes línguisticas.

En cuanto el pueblo español, se puede afirmar que numerosas inmigraciones llegadas

a la Península Ibérica contribuyeron para la formación de su identidad: los iberos, los celtas,

raza belicosa que penetro por los Pirineos; los primeros colonizadores, griegos, fenicios y

cartagineses, en corto numero y con acción mas intensa en el litoral; los romanos,

caracterizados por fuertes inmigraciones; los bárbaros y, a su vez, los musulmanes (árabes).

Somos todos reflejo de los encuentros y de los confrontos de nuestra historia.

Analisaremos o processo de exploração da criticidade do leitor por meio dos

exercícios de compreensão textual que seguem abaixo:

Comprensión lectora

1) ¿Según el texto, de que marcadores está compuesta la identidad humana?

R: La identidad humana está compuesta de marcas físicas (heredadas genéticamente) e

ideológicamente (heredadas culturalmente)

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2) Escribe los nombres de los países que recibieron influencias de los:

Aztecas: México.

Incas: Perú, Bolivia, Chile y Argentina.

Mayas: Honduras, Guatemala, El Salvador y sur de México.

3) ¿Por qué se dice haber “mescla” cultural?

R: Porque se suman herencias de pueblos de diferentes culturas.

4) ¿Cómo se explica la existencia de variantes lingüísticas?

R: Las variante linguísticas son un reflejo de las particularidades histórico-culturales de

cada pueblo.

5) ¿Qué grupos participan históricamente de la formación del pueblo español?

R: Los iberos, los celtas, los griegos, los fenicios, los cartagineses, los romanos, los

bárbaros y los árabes.

Os conceitos citados anteriormente, que cercam o termo leitura, permitem-nos

verificar que os exercícios de compreensão acima seguem algumas das propostas encontradas

nas OCEM (2006) e nos PCN: LE (1998), conduzindo o aluno ao conhecimento da cultura

espanhola. As questões estimulam o aluno a reforçar o que já foi lido a respeito da identidade

do povo espanhol e de sua cultura, porém as questões possuem respostas objetivas e que estão

explícitas no texto em questão.

Kleiman (2004) explica que formular perguntas é também constitutivo da leitura, uma

vez que elas são próprias das estratégias de monitoração da compreensão e de

estabelecimento de objetivos, estratégias essas necessárias à compreensão e, portanto,

necessariamente utilizadas pelo leitor proficiente. Nas atividades próprias de leitura no

contexto escolar a atenção do aluno está voltada para um tipo de informação; em se tratando

de perguntas sobre informações mais altas na hierarquia de conteúdo, isto é, sobre idéias

principais.

O ato de ler pode ser conceituado como um exercício de indagação, de entendimento,

de reflexão crítica, de captação de sinais e símbolos, de mensagens, de conteúdo e de

informações. A leitura como exercício nas aulas de E/LE pode ser apontada como atividade

de intercâmbio, uma vez que possibilita relações intelectuais e potencializa outras. A leitura

permite a formação de conceitos, explicações e entendimento sobre realidades.

Kleiman (2004) cita Orlandi (2000) em sua obra que, por sua vez, entende que a

leitura é uma questão linguística, pedagógica e social ao mesmo tempo. Portanto, parte dos

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seguintes pressupostos: a leitura não deve se restringir ao seu caráter mais técnico,

instrumental; deve-se procurar uma forma de leitura que permita ao aluno trabalhar sua

própria história de leituras, assim como a história das leituras dos textos e a história da sua

relação com a escola e o conhecimento legítimo; e por último deve-se considerar que o leitor

atribui sentido ao texto e não meramente apreende um sentido que está presente

(decodificação).

Segundo Kleiman (2004), um método comumente usado pelo professor no contexto

escolar, para verificar se houve compreensão, é a formulação de perguntas sobre o texto,

especialmente sobre informações explícitas no mesmo.

Muitas das reações do sujeito à tarefa são aquelas que se tornam mais simples, mais

fácil, esclarece Kleiman (2004). Então, se o que solicitamos ao aluno pode ser resolvido

satisfatoriamente mediante automatismos, porque o aluno iria, no caso em questão, utilizar

estratégias que tornam a tarefa de ler mais complexa, que requerem operações cognitivas

superiores como a análise e a inferência?

Perguntamo-nos, então, até que ponto a escola ensina seus alunos a resolver

mecanicamente, por meio de operações associativas das mais elementares, tarefas de leitura

que, em princípio, requerem o engajamento de processos cognitivos de ordem superior.

Observaremos agora a segunda unidade deste livro didático, que apresenta o seguinte

texto:

Los españoles

En España existen enormes diferencias entre una región y otra, a consecuencia de La

variedad de pueblos que han invadido y se han establecido en La península, a través de su

larga historia. España es una mescla de razas.

Las características diferenciales de un pueblo no siempre pueden explicar-se

racionalmente. El alma del hombre no es una máquina. El español es ante de todo un feroz

individualista, es también un hombre de pasión, más que de la acción, de pensamiento y de

método.

Lejos de sr un hombre reservado, es sumamente expresivo, tanto en palabras como en

gestos. No es hipócrita. Es espontáneo. Más que uniforme y rutinario el español ES

contradictorio: duro y humano al mismo tiempo; resignado y rebelde; enérgico y indiferente.

Cosas sencillas como la conversación entre amigos, sentarse al aire libre en la terraza de un

café y ver pasar a la gente, dar un paseo por la calle constituyen el principal recreo de la

mayoría de los españoles.

El español tiene un concepto muy elevado a la dignidad personal. Juzga desde el

punto de vista humanístico, es decir, del hombre integral; no moral, no económico, no

religioso, sino de “hombre de carne y hueso”.

La puntualidad es una costumbre española. El ritmo de la vida en España es más

lento que en otros países. Dice el refrán que “no por mucho madrugar amanece más

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temprano”. Loa españoles de las ciudades almuerzan a las dos y cenan a las diez de la noche.

En las grandes ciudades hay movimiento y prisa como cualquier otra ciudad moderna. La

vida nocturna es fascinante, con teatros, cine y toda clase de diversiones.

Es proverbial la cortesía española. El saludo expresivo y el abrazo de los españoles

son algo instintivo y espontaneo.

El español ama con pasión la tierra donde nació, pero no es tan patriota como, por

ejemplo, el francés. Reconoce públicamente sus defectos y debilidades.

Neste ponto, observaremos o processo de exploração da criticidade do leitor por meio

dos exercícios de compreensão leitora que seguem abaixo:

Comprensió lectora

Contesta:

1) ¿A qué se deben las diferencias entre regiones en España?

R: A la variedad del pueblos que han invadido y se han establecido en las penínsulas.

2) Según los autores, “las características diferenciales de un pueblo no siempre pueden

explicarse racionalmente”. ¿Qué frase del texto justifica ese pensamiento?

R: “El alma del hombre no es una máquina”.

3) ¿Qué adjetivos resumen las características del español?

R: Espontáneo, contradictorio, apasionado expresivo, individualista, resignado,

rebelde, enérgico.

4) ¿Qué argumento usan los autores para explicar que “el español, tiene un concepto

muy elevado de la dignidad personal”?

R: Juzga desde el punto de vista humanístico, es decir, del hombre integral, el hombre

de carne y hueso.

5) ¿Qué costumbres españoles ejemplifican el refrán “no por mucho madrugar amanece

más temprano”?

R: Almuerzan a las dos y cenan a las diez de la noche.

6) ¿Por qué no es el español tan patriota como un francés?

R: Porque reconoce públicamente sus defectos y debilidades.

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Verificamos, por meio das atividades de compreensão leitora, que este texto “Los

españoles” apresenta as mesmas características do texto encontrado na primeira unidade,

“Identidad”. Tal atividade conduz o aprendiz a reforçar informações que já foram

apresentadas, porém, não possibilita o aluno a realizar uma reflexão sob o tema abordado.

Kleiman (2004) argumenta que a leitura, a julgar pelo exercício de compreensão e

interpretação dos livros didáticos e da sala de aula, fica reduzida, quase sem exceções, à

manipulação mecanicista de sequências discretas de sentenças, não havendo preocupação pela

depreensão do significado global do texto.

A autora ainda afirma que as dificuldades que o aluno tem na leitura e sua passividade

frente ao texto, não são nesta perspectiva problemas independentes. A passividade não é

consequência da ação do professor no contexto, mas da inação, do ponto de vista de ensino de

leitura, pois a passividade é produto de intervenção do professor como único interlocutor. Ela

decorre de práticas pedagógicas que começam pela utilização do texto para o ensino de

normas gramaticais e do léxico até chegar à utilização do texto didático, texto escrito

parcialmente para veicular informações ao escolar, como apoio visual do material apresentado

em sala de aula, e fornecedor de perguntas para o mesmo.

Se o texto didático fosse apenas utilizado para fornecer as perguntas de revisão, de

estudo para o aluno, o aluno talvez não transferisse maneiras de manipulação desse tipo de

texto a outros textos, a outras leituras. Mas o professor também utiliza técnicas de leitura e

explicação linear, que combinam certos procedimentos mecânicos de leitura e decodificação

com processos próprios de leitura. O que ocorre é a manipulação de práticas de leitura a que

conduz o aluno a adotar a manipulação, a identificação de informações para retenção como

um tipo de leitura.

Silva (2004) explica que os textos que são fornecidos nas escolas não oferecem

dinamização da leitura e que, na maioria das vezes são artificiais, dispersos e fragmentado,

dificultando o adentramento crítico do educando em determinados problemas da realidade.

As crianças não arriscam um possível erro e o uso generalizado de elementos seguros

neutros; as formas certas são aquelas que estão legitimizadas pela escrita, daí a preocupação

da criança em preencher com elementos já dados no texto; ler é decodificar e reter o explícito,

daí a confusão das crianças na inferência; a unidade significativa no texto é a sentença, daí a

incapacidade de reconstruir a unidade discursiva.

Ainda quando a atenção do aluno é dirigida para ao texto propriamente dito, não

apenas a estruturas neles contidas, este é tratado como um mero repositório de informações.

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Kleiman (2000) expõe que essa concepção pode ser constatada pela abundância de perguntas

que servem de estímulo para a extração ou evocação de informações explícitas que seguem o

texto no livro didático: explica-se então porque, para a criança, ler passa a significar “achar

informação” e “decorar a informação”, em vez de reconstruir a informação mediante a

utilização do conhecimento prévio, ou reestruturar o conhecimento prévio graças à nova

informação, num processo de influências mútuas entre leitor e autor, próprio e característico

da atividade de ler. É justamente por meio de informações que não estão explícitas, que o

aluno pode compreender o texto; compreendendo o implícito ele passa a conhecer o explícito.

A autora ainda advoga que o modelo associativo que subjaz às práticas da aula de

leitura não condiz com uma concepção construtiva, de base inferencial, da leitura. O

conhecimento prévio da criança, tanto linguístico como extralinguístico, não recebe demandas

cuja natureza permita o desenvolvimento de outros processos cognitivos, como o inferencial.

E isto, apesar de a função primordial da escola ser a promoção de situações de aprendizagem

que permitam o desenvolvimento de processos cognitivos, ainda não é totalmente

desenvolvido pela criança.

A importância de o professor propiciar condições que exijam o envolvimento do leitor

não com o objeto, mas com o significado do mesmo merece nossa reflexão.

A escolha do texto a ser utilizado na sala de aula não é uma escolha fácil. Sabemos

que não apenas os critérios de ordem cognitiva e afetiva como a motivação, conhecimento

prévio do assunto, experiência de mundo, dentre os critérios de seleção do texto têm sido

suficientes. Portanto, se há certas evidências de que elementos formais do texto funcionam

como veiculadores do tema, facilitando a depreensão da linha temática, tais elementos devem

ser levados em conta na seleção de textos.

Por fim, analisaremos a última unidade deste livro didático, que apresenta a seguinte

poesia:

Te quiero

Tus manos son mi caricia

mis acordes cotidianos

te quiero porque tus manos

trabajan por la justicia

si te quiero es porque sos

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mis cómplice y todo

y en la calle codo a codo

somos mucho más que dos

tus ojos son mi conjuro

contra la mala jornada

te quiero por tu mirada

que mira y siembra futuro

tu boca que es tuya y mía

tu boca no es equivoca

te quiero porque tu boca

sabe gritar rebeldía

si te quiero es porque sos

mi amor mi cómplice y todo

y en la calle codo a codo

somos mucho más que dos

y por tu rostro sincero

y tu paso vagabundo

y tu llanto por el mundo

porque sos pueblo te quiero

y porque amor no es aureola

ni cándida moraleja

y porque somos pareja

que sabe que no está sola

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te quiero en mi paraíso

es decir que en mi país

la gente viva feliz

aunque no tenga permiso

si te quiero es porque sos

mi amor mi cómplice y todo

y en la calle codo a codo

somos mucho más que dos.

A seguir, verificaremos o exercício de estímulo à criticidade do leitor, por meio das

atividades de compreensão leitora que seguem:

Comprensión lectora

1) En el texto “Te quiero” se mezclan dos perspectivas sobre la noción de amor: existe el

amor bajo el ángulo intimista de la relación humana, pero también el amor hacia el

mundo, hacia el social. Explica una y otra perspectiva con versos de la propia poesía.

R: En relación al amor bajo el ángulo intimista: “tus manos son mi caricia”, “si te quiero es

porque sos mis cómplice y todo”, entre otros, expresan sentimientos íntimos que hay entre

una pareja enamorada. El amor hacia el mundo “te quiero porque tu boca sabe gritar

rebeldía”, “somos mucho más que dos”, entre otros, hacen referencia a que el amor no se

limita al universo íntimo de la pareja, sino que lo transciende.

2) La voz interior de la poesía declara y justifica su amor. Al justificarlo, el raciocinio se

desdobla en dos razones distintas y a la vez intrínsecas. Explica, según el texto, las dos

razones que justifican el amor hacia:

Las manos:

R: Son su “caricia”, sus “acordes cotidianos” (proporción afecto y cariño); “trabajan por la

justicia” (se dedican a intereses relacionados con la justicia social).

Los ojos:

R: Son su “conjuro contra la mala jornada” (transmiten sentimientos positivos cuando el

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entorno no es tan bueno): y su “mirada que mira y siembra futuro” (contiene una visión de un

provenir mejor para el mundo).

La boca:

R: La boca que no es de los dos, “tuya y mía” (comparte el íntimo cariño del beso); su “boca

no se equivoca” y “que sabe gritar rebeldía” (es instrumento de protesta hacia la

dominación y la injusticia).

3) Explica: “Si te quiero es porque sos

Mi amor mi cómplice y todo

y en la calle codo a codo

somos mucho más que dos”

R: Los dos forman una pareja unida por sentimientos íntimos de amor y complicidad,

pero también conscientes de que forman parte de un grupo social con el cual están

comprometidos, lo que refuerzan sus sentimientos de unión.

4) Explica: “ y porque amor no es aureola

ni cándida moraleja

y porque somos pareja

que sabe que no está sola”

R: Es una contraposición al amor romántico que se fija exclusivamente en modelos de gloria

y pureza intimistas. Nuevamente se cristaliza la consciencia de parte integrante y actúale de

la sociedad.

5) ¿Qué sentido tiene la palabra “paraíso” en la penúltima estrofa?

R: El “paraíso” es su país y, por tanto, no lugar distante de la realidad (como ocurre en

obras románticas en que se idealizan lugares distintos y distantes).

6) Recoge del texto el verso en que está implícita la denuncia de la falta de libertad.

R: “…la gente vivía feliz aunque no tenga permiso”.

7) “Te quiero” es una poesía en la que existen marcas de una época y de una ideología.

Explícalas.

R: La poesía es de una época en que había muchas prohibiciones, principalmente hacia

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la expresión del pensamiento político: la dictadura uruguaya. La ideología que

transparece en sus versos es revolucionaria y, contextualmente, socialista.

A partir da leitura do texto desta última unidade e das questões propostas para a

compreensão leitora, observamos que existe certa progressão dos textos, relacionando-os à

possibilidade do exercício da leitura crítica.

A poesia “Te quiero” exige melhor entendimento do aluno sobre o sentido das

palavras e o significado deste léxico em relação ao mundo, justamente pela poesia ser um

texto de gênero literário e apresentar linguagem literária, como, por exemplo, a metáfora e a

metonímia, e que para compreendê-lo o leitor necessita apresentar conhecimentos prévios em

relação ao contexto histórico e social que envolvem o texto.

Apesar de esta poesia ser um texto em que o aluno pode encontrar fontes para treinar

sua habilidade crítica, os exercícios de compreensão leitora não corresponde a essas

expectativas pelo fato de manifestar questões que ainda possuem respostas automatizadas e

explícitas no texto. É preciso ir além, instigando os alunos por meio de questionamentos em

busca de sentidos que se encontram nas entrelinhas, buscando uma leitura aprofundada, que

verifique os implícitos linguísticos e extralinguísticos, cujo acesso depende muitas vezes de

informações trazidas pelo educador.

Outras atividades poderiam ser realizadas partir do mesmo material, no sentido de

ampliar e explorar as possibilidades significativas do aluno em ralação ao período político

ditatorial em que vivia o Uruguai.

Analisando as várias atividades em que o conhecimento sobre o próprio

conhecimento está envolvido na leitura, Kleiman parafraseia Kato (1984), que propõe duas

estratégias metacognitivas na leitura: o estabelecimento de um objetivo específico para a

leitura, e a automonitoração do processo de compreensão.

Numa crítica à essa visão mecanicista, Silva (2004) afirma que a leitura acaba se

transformando em um esquema de comportamento adquirido que, pela repetição se torna

involuntário e automático. Portanto, corre-se o risco de eliminar os atos reflexivos que

envolvem esse processo, privando o leitor da possibilidade de interagir com o texto e de se

constituir nele, conhecendo-se e transformando-se por meio da inserção e da participação de

um outro mundo, o mundo da leitura.

Outras atividades necessárias para a leitura são definidas e delimitadas em função

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desse objetivo, como a identificação desses elementos que são importantes para a comparação

dos textos (que restringem e controlam a comparação para a consecução do objetivo) e o uso

do conhecimento prévio para construir as relações relevantes à leitura.

Há obviamente, sujeitos que, até sem nenhuma orientação, se engajam em atividades

metacognitivas durante a leitura; entretanto, os demais precisam ser instruídos, não em algum

momento do futuro, em que hipoteticamente terá alcançado o nível de desenvolvimento

necessário para a tarefa, mas já, desde o momento em que começa a ler.

Relacionada a uma prática de leitura mecanicista está o que chamaremos de hipótese

de transferibilidade tipológica, a qual muitas propostas de ensino estão subjacentes. Kleiman

(2004) considera que a capacidade de compreensão é transferível por meioatravés de tipos

discursivos, isto é, a criança que compreende um texto narrativo não deveria ter dificuldade

para compreender um texto expositivo e assim por diante.

As expectativas da criança são um reflexo de sua sensibilidade à função do texto

didático que deveria, então, estabelecer toda relação de maneira transparente, para facilitar

essa transmissão de conhecimento, para a criança identificar essas relações, pois nessa

perspectiva, a leitura não é nem reconstrução de informação, numa perspectiva funcional-

comunicativa, nem negociação de sentido, numa perspectiva interacional pragmática.

A leitura é, nesse contexto, apenas recepção de informação, afirma Silva (2004). O

aluno não lê, mas recebe e espera a transmissão de informação, o que não deixaria lugar para

equívocos, mas também não deixa lugar para reflexão. Legibilidade se define na leitura,

porém, o texto didático não é lido, no processo não há seletividade mediante a reconstrução

de relações implícitas, não há inferências, não há integração, há apenas identificação de

explícitos.

Kleiman (2004) argumenta que uma consequência assustadora desse tipo de leitura é o

fato de o texto didático criar expectativas tão rígidas que levem ao desenvolvimento de

mecanismos que funcionam ao nível de recuperação da informação, e se constituem, portanto,

em mecanismos aceitáveis do ponto de vista do sucesso na escola. Esses mecanismos não são

necessariamente passos intermediários no desenvolvimento de habilidades de leitura: a

criança já é capaz de fazer inferências, por exemplo, só que na leitura do texto didático a saída

mais fácil é operacional.

Julga-se que o aluno que é capaz de perceber e avaliar o texto do ponto de vista formal

é capaz de interagir com o autor do texto; suspeita-se que o aluno é mais uma vez

manipulador, mas não ainda leitor. Consideramos importantes os enfoques metodológicos que

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procuram habilitar o aluno, criando condições para que ele recupere sua condição de sujeito

avaliador, enfoque em que fazem concomitantemente uma análise do sujeito, de suas

capacidades de leituras específicas para lhe permitir fazer, dentre as muitas, mais uma leitura,

privilegiando mediante essa análise o sujeito leitor.

Conclusão

Os PCNs (1998) apontam a leitura como a melhor alternativa para a realidade

brasileira. Nestes documentos a preocupação com a integração dos conhecimentos das

diversas áreas está presente. A busca de um trabalho interdisciplinar que possibilite o

intercâmbio é o que deve orientar a prática pedagógica. O tratamento dos conteúdos deve

integrar conhecimentos de diferentes disciplinas, já que contribuem para a construção de

instrumentos de compreensão e intervenção na realidade em que vivem os alunos.

O papel do professor não é o de mediador entre autor e leitor, mas de fornecedor de

condições para que se estabeleça a interlocução.

É um desafio trabalhar com E/LE na escola pública, onde as estratégias, os objetivos e

os procedimentos têm de estar sendo sempre repensados. É preciso reinterpretar o que já foi

feito e testar o que funciona continuamente. Além disso, é necessário convergir as

expectativas e os desejos vindos de todas as direções; da escola, dos colegas de trabalho, dos

alunos e dos documentos oficiais que norteiam a prática pedagógica do ensino, em prol de

uma ação educadora que seja também libertadora e transformadora.

A consciência crítica de como a linguagem é usada no mundo social pode ser bem

desenvolvida na língua estrangeira devido ao distanciamento que ela oferece, possibilitando

um estranhamento mais fácil em relação ao modo como as pessoas usam a linguagem na

sociedade. Ao mesmo tempo em que isso traz ao centro do currículo a relação da linguagem

com o mundo social, constitui um modo de integrar os temas transversais com a área de

língua estrangeira. Além disso, a consciência crítica em relação à linguagem possibilita o

surgimento de novas práticas sociais por meio da criação de espaços na escola para a

construção de contra-discursos.

Finalizamos nossas considerações reafirmando que a criticidade deve ser pautada na

formação de leitores que vejam, nos novos códigos (linguísticos, culturais e estéticos),

respostas às suas perguntas de ordem ideológica, filosófica ou pragmática. Ensinar a ler deve

ser, portanto, o caminho escolhido por professores de língua estrangeira para uma efetiva

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realização do processo ensino/aprendizagem.

Podemos afirmar que é possível e bastante viável desenvolver um trabalho nas aulas

de E/LE, e nas demais disciplinas, visando a formação de leitores “sujeitos”, ou seja, leitores

capazes de atribuir significado aos vários elementos do texto, de construir hipóteses de leitura

a partir das marcas linguísticas deixadas pelo autor e a partir da objetividade proposta pelo

educador. Esse leitor certamente aprenderá o valor do texto e da leitura como um todo para a

sua vida.

Nosso objetivo é a formação de um leitor maduro e que a cada nova leitura desloca e

altera o significado de tudo o que já leu, tornando mais profunda sua compreensão dos textos,

das pessoas e da vida. Neste processo, o papel do educador é auxiliar o leitor a entender que

aquilo que lê é uma representação textual, e que, diante do que lê, assume uma posição ou

relação epistemológica no que concerne a valores, ideologias, discursos, visão de mundo.

Com esse pressuposto, ensinar requer compreender esses conceitos, e também compreender

como as pessoas utilizam a leitura (e para quê) em sua vida ou no cotidiano; que a leitura tem

a ver com a distribuição de conhecimento e de poder numa sociedade.

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Referências

KLEIMAN, Angela. Texto e leitor: Aspectos Cognitivos da Leitura. 12. Ed. Campinas:

Pontes, 2008.

______. Leitura, ensino e pesquisa. Campinas: Pontes, 2004.

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA. Parâmetros curriculares do ensino Médio.

Brasília: MEC, 2000.

______. Orientações curriculares para o Ensino Médio: Linguagens. Códigos e suas

Tecnologias (volume1). Brasília: MEC, 2006.

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL. Parâmetros Curriculares Nacionais:

terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua estrangeira. Brasília: MEC, 1998.

SEDYCIAS, João (org.). O ensino do espanhol no Brasil: passado, presente, futuro. 2° ed.

São Paulo: Parábola, 2009.

SILVA, Ezequiel Theodoro da. A produção da leitura na escola. Pesquisa X Proposta. 2. Ed.

São Paulo: Ática, 2004.

Sobre os autores:

Geizilene Alves Florêncio– graduado em Letras pela Universidade Braz Cubas; formada em

Língua espanhola pelo Instituto Cervantes de São Paulo; docente da rede pública de ensino do

Estado de São Paulo.

e-mail: [email protected]

José Miguel Mattos - mestre e doutor em Língua Portuguesa pela Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo. Coordenador e docente do curso de Letras da Universidade Braz

Cubas , em São Paulo.

e-mail: [email protected]