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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO FÍSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO-SENSU EM EDUCAÇÃO
FÍSICA
COMPARAÇÃO DO DESEMPENHO COGNITIVO E DA
ATIVIDADE CORTICAL DE ATLETAS DE JUDÔ COM
DIFERENTES NÍVEIS DE EXPERIÊNCIAS NO ESPORTE
Heloiana Karoliny Campos Faro
NATAL – RN
2018
1
COMPARAÇÃO DO DESEMPENHO COGNITIVO E DA ATIVIDADE
CORTICAL DE ATLETAS DE JUDÔ COM DIFERENTES NÍVEIS DE
EXPERIÊNCIAS NO ESPORTE
HELOIANA KAROLINY CAMPOS FARO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Educação Física da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
como requisito parcial para a obtenção do grau
de Mestre em Educação Física.
ORIENTADOR: EDUARDO BODNARIUC FONTES
CO-ORIENTADOR: HENRIQUE BORTOLOTTI
2
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Moacyr de Góes - CE
Faro, Heloiana Karoliny Campos.
Comparação do desempenho cognitivo e da atividade cortical de
atletas de Judô com diferentes níveis de experiência no esporte /
Heloiana Karoliny Campos Faro. - Natal, 2018.
72f.: il.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de
Ciências da Saúde, Programa de Pós-Graduação em Educação
Física.
Orientador: Eduardo Bodnariuc Fontes.
Coorientador: Henrique Bortolotti.
1. Eletroencefalografia. 2. Judô. 3. Atenção. I. Fontes, Eduardo
Bodnariuc. II. Bortolotti, Henrique. III. Título.
RN/UF/
3
DEDICATÓRIA
Dedico esta dissertação à meu pai Pedro Silvestre (in
memoriam) e minha mãe Maria José, que mudaram
minha vida e a quem devo tudo que sou, tudo que
conquistei e tudo que conquistarei.
Dedico também à todos os professores que fizeram
parte da minha formação (acadêmica, marcial e
humana), por dedicarem suas vidas a uma profissão
tão honrosa.
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço, em primeiro lugar, à minha família por acreditar e me apoiar nos meus
objetivos, sobretudo a minha mãe e meu pai, Maria José e Pedro Silvestre (in memmorian) por
serem meus maiores incentivadores e por terem feito de mim o que sou. Agradeço a meus irmãos,
Solange, Pedro, Gerson, Surama e Heloany, por todo suporte de vida e amor incondicional.
Agradeço as pessoas com quem cultivei uma amizade que supera, inclusive, o
distanciamento geográfico, principalmente: Kamylle Quadros, Allana Melo, Vanessa Lima,
Valéria Lima, Terezinha Gonçalves, Liliane Rodrigues, Maria Farias e Layde Caroline. Vocês
são a família que escolhi.
Às pessoas que me acolheram tão bem na cidade de Natal, dentre elas (e sobretudo) aos
meus colegas ingressantes do mestrado em 2016.1, nas pessoas de Antônio Jr., Ludmila Cabral,
Ricardo Bezerra, Yuri Freire, Gledson Amorim e Petrus Gantois. Aos meus colegas de
laboratório (GEPEBIEX/NEUROex) pela convivência, aprendizado e paciência. Destaco os
nomes de Daniel Machado (Dan Dan) e Paulo Henrique (Bomba) que tornaram possível esse
trabalho, saibam que sem o apoio (afetivo e acadêmico) e incentivo de vocês eu estaria sem chão.
Agradeço ao meu orientador, professor Eduardo Fontes, por ser um verdadeiro pai desde
que cheguei a Natal. Agradeço também aos demais professores da UFRN que contribuem para
minha formação, principalmente: professor Hassan Elsangedy, professor Okano Hideki,
professor Renan Moioli, professor Leônidas Oliveira, professor Eduardo Caldas e professor
Henrique Bortolotti. Agradeço também aos professores que desde a graduação me incentivaram
e acreditaram no meu potencial, sobretudo a meus ex-orientadores: professoras Vera Solange,
Carmem Lilia Faro, Patrícia de Araújo e professor Emerson Monte.
Agradeço aos voluntários que doaram um pouco do seu tempo, suor e paciência para
construir esse trabalho. Agradeço especialmente a Mayra Nascimento, que tanto contribuiu para
o recrutamento dos judocas nessa empreitada.
Agradeço aos meus professores/mestres de diversas artes marciais aos quais já pratiquei,
sobretudo ao meu mestre de Karatê-do Paulo Ramôa, meus mestres/professores de Brazilian Jiu
Jitsu Álvaro Ferreira, Henrique Souza, Everton Rocha e Marcus Vinicius. Sem vocês o espírito
marcial não seria a base do meu estilo de vida. Adicionalmente, agradeço à Equipe Pitbull
Brothers e Nelson Bahia pelo acolhimento tão fraterno no mundo das artes marciais em Natal.
5
Mesmo sem poder citar nominalmente cada pessoa que construiu comigo esse caminho,
meus agradecimentos se estendem a todos que contribuíram positivamente na minha história de
vida até então.
"Se você nunca encontra razões para agradecer, a falha está em você" (Buda)
Grata pela contribuição de todos.
Atenciosamente
Heloiana Faro
OSS!
6
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS .............................................................................................................................. 8
LISTA DE FIGURAS ................................................................................................................................ 9
LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS ................................................................................................. 10
RESUMO .................................................................................................................................... 12
ABSTRACT ................................................................................................................................ 13
1.INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 14
2. OBJETIVOS ........................................................................................................................... 18
2.1. Objetivo Geral .......................................................................................................... 18
2.2. Objetivo Específico .................................................................................................. 18
3. REVISÃO DA LITERATURA .............................................................................................. 18
3.1. Mecanismos neurocognitivos nos esportes .............................................................. 18
3.2. Cognição .................................................................................................................. 20
3.2.1. Funções Executivas ................................................................................... 20
3.2.2. Atenção ..................................................................................................... 22
3.2.3. Stroop Test ................................................................................................ 23
3.3. Atividade Eletrofisiológica ...................................................................................... 24
3.3.1. Eletroenfalografia (EEG) .......................................................................... 24
3.3.2. Análise temporal (ERP) ............................................................................ 27
3.3.3. Oscilações cerebrais .................................................................................. 28
3.4 Atividade cortical e desempenho em atletas ............................................................. 29
4. MATERIAIS E MÉTODOS ................................................................................................... 31
4.1. Amostra ................................................................................................................... 31
4.2. Desenho do estudo ................................................................................................... 31
4.3. Antropometria .......................................................................................................... 31
4.4. Teste cognitivo ......................................................................................................... 32
4.5. Atividade cerebral .................................................................................................... 32
4.5.1. Aquisição de dados ................................................................................... 32
4.5.2. Pré-processamento dos dados ................................................................... 33
4.5.2. ERP ........................................................................................................... 34
4.5.2. ERSP ......................................................................................................... 34
4.6. Testes de aptidão física ............................................................................................ 35
7
4.6.1. YY-IR1.................................................................................................................. 35
4.6.2. SJFT ...................................................................................................................... 37
4.7. Análise estatística ..................................................................................................... 37
5.RESULTADOS ........................................................................................................................ 38
6.DISCUSSÃO ........................................................................................................................... 46
7.CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 51
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................... 52
LISTA DE APÊNDICES E ANEXOS ....................................................................................... 63
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Informações sobre as características gerais da amostra, com informações de idade
(em anos), estatura (em centímetros), massa corporal (em quilogramas), volume máximo de
oxigênio (em mililitros por quilogramas por minutos) e índice gerado pelo Special Judô Fitness
Test
Tabela 2 – Áreas neuroanatômicas, número de componentes do cluster, área de Brodmann e
coordenadas (x, y, z) dos centroides de cada grupo, separadamente.
Tabela 3 – Clusters com mais componentes ativados durante a realização do teste cognitivo
Tabela 4 - Valores da análise de covariância para cada janela de tempo de ERP onde foram
encontradas diferenças entre os grupos.
Tabela 5 – Descrição das janelas temporais que apresentaram diferenças significativas em delta,
theta, alpha, beta e gama, para estímulos congruentes e incongruentes, na áreas aPFC e cOL.
9
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Estímulos congruentes e incongruentes, e suas respectivas respostas Go ou NoGo
durante teste de Stroop.
Figura 2 – Fluxograma de análise dos dados realizada no EEGLab.
Figura 3 – Comparações de percentual de Acerto (A) e Erro (B) entre judocas faixas pretas e
brancas grupos.
Figura 4 – Comparações de percentual de acerto (A), tempo de reação das respostas
congruentes, em milissegundos (B), tempo de reação das respostas congruentes, em
milissegundos (C) e diferença dos tempos de reação das respostas incongruentes pelas respostas
congruentes (D) entre os grupos.
Figura 5 – Visão transversal (z) da localização do centróide médio (ponto em vermelho) de cada
grupo, separadamente, durante a realização do Stroop Test.
Figura 6 – Visão topográfica dos clusters e seus respectivos componentes de ambos os grupos.
Pontos em preto representam os componentes dos faixas pretas, pontos em azul representam os
componentes dos faixas brancas e pontos em vermelho representam os centroides dos clusters.
Figura 7 – Comparação dos ERP's das grandes médias dos estímulos congruentes (A) e
incongruentes (B) na região do aPFC
Figura 8 - Comparação dos ERSP's, separados por áreas e tipos de estímulos. (A) comparação
em aPFC para estímulos congruentes; (B) comparação em aPFC para estímulos incongruentes;
(C) comparação em cOL para estímulos congruentes; (D) comparação em cOL para estímulos.
10
LISTA DE SIGLAS, ABREVIAÇÕES E SÍMBOLOS
fMRI - Functional magnetic resonance imaging
NIRS - Near-infrared spectrospy
EEG – eletroencefalografia ou eletroencefalograma
ERP - Event Related Potencial
EOG - eletro-oculograma
ICA - Independent Component Analysis
sLORETA - standardized low-resolution brain electromograthy
BESA - brain electrical source analyses
EMG – Eletromiografia
FFT - Fast Fourier transform
Hz – Hertz
FB – Faixas brancas de Judô
FP – Faixas pretas de Judô
CG – estímulos congruentes
IG – estímulos incongruentes
TR – Tempo de Reação
YY-IR1 - Yo-Yo Intermittent Recovery Level 1
SJFT - Special Judo Fitness Test
PCA - Principal Components Analysis
PET – Positron Emission Topography
ERS - Event-Related Synchronization
ERD - Event-Related Desynchronization
ERSP – Event Related Spectral Perturbation
ITC – Inter-trial Coherence
ACC - Anterior Cingulate Cortex
OFC – Córtex Orbitofrontal
cOL - lobo occipital, cuenus
aPFC – Anterior Prefrontal Cortex
DLPFC – Dorsolateral Prefrontal Cortex
PCC – Posterior Cingulate Cortex
11
PMC_e – Premotor cortex esquerdo
PMC_d – Premotor cortex direito
Pc_e – precuneus esquerdo
Pc_d – precuneus direito
12
RESUMO
COMPARAÇÃO DO DESEMPENHO COGNITIVO E DA ATIVIDADE
CORTICAL DE ATLETAS DE JUDÔ COM DIFERENTES NÍVEIS DE
EXPERIÊNCIAS NO ESPORTE
Autora: Heloiana Karoliny Campos Faro
Orientador: Eduardo Bodnariuc Fontes
Co-Orientador: Henrique Bortolotti
O alcance de níveis de excelência no esporte é dependente da regulação cerebral integrada entre
o controle motor e a capacidade cognitiva. Estudos recentes sugerem que essa adaptação neural
em praticantes experientes de artes marciais pode promover desempenho superior quando
comparados à atletas amadores, no entanto, pouco se sabe quanto a localização dessas diferenças
e as respectivas respostas eletrofisiológicas em judocas. O objetivo deste estudo foi comparar o
desempenho cognitivo e o comportamento eletrofisiológico de praticantes de judô com diferentes
níveis de experiência. Foram recrutados 16 faixas pretas (26,5 ± 7,9 anos; 172,2 ± 8,1 cm; 69,3
± 18,9 kg; 43,5 ± 3,8 ml/kg/min) e 18 faixas brancas (25,2 ± 5,8 anos; 172 ± 8 cm; 63,7 ± 13 kg;
40,71 ± 1,8 ml/kg/min) para amostra do estudo. Os participantes realizaram Stroop Test
acompanhado de mensuração eletroencefalográfica por 64 eletrodos ativos, medidas
antropométricas e testes de potência aeróbica geral e específica da modalidade. Analise
algorítmica encontrou ativação nos lobos frontal, parietal e occipital para ambos os grupos. O
teste t Student identificou diferenças significativas (p < 0,05) entre os grupos na ativação da área
em todos os corteses durante estímulos congruentes e incongruentes, apesar de não haver
diferenças no tempo de reação e número de erros do teste. Nossos achados mostram que
praticantes de judô com mais experiências, durante a realização de teste cognitivo apresentam
menor amplitude de onda eletroencefalográfica nos corteses pré-frontal anterior e cingulado
posterior, acompanhados de maior amplitude de de-sincronização neural. Dessa forma, é possível
concluir que praticantes de judô com expertise na luta apresentam, de fato, um comportamento
neuronal potencialmente mais sofisticados comparados a lutadores iniciantes, quando
submetidos a teste com demanda cognitiva atencional.
Palavras-chave: Eletroencefalografia; Judô; Atenção
13
ABSTRACT
COMPARISON OF COGNITIVE PERFORMANCE AND CORTICAL
ACTIVITY OF JUDO ATHLETES WITH DIFFERENT LEVELS OF
EXPERIENCES
Author: Heloiana Karoliny Campos Faro
Advisor: Eduardo Bodnariuc Fontes
Co-Advisor: Henrique Bortolotti
The achievement of levels of excellence in sports is dependent on the integrated brain regulation
between motor control and cognitive ability. Recent studies show that this neural adaptation in
experienced martial arts practitioners may promote differentiated performance when compared
to non-practitioners, beginners or amateur athletes, however, little is known about the location of
these differences and their neurophysiological responses. We propose compare cognitive
performance and electrophysiological behavior of experienced judokas (black belts) and
beginners (white belts). We recruited 16 black belts (26.5 ± 7.9 years; 172.2 ± 8.1 cm; 69.3 ±
18.9 kg; 43.5 ± 3.8 ml/kg/min) and 18 white belts (25.2 ± 5.8 years; 172 ± 8 cm; 63.7 ± 13 kg;
40.71 ± 1.8 ml/kg/min) for the study sample. The participants performed Stroop Test
accompanied by electroencephalographic measurement by 64 active electrodes, anthropometric
measurements and general and specific aerobic power tests of the modality. Algorithmic analysis
found activation in the frontal, parietal and occipital lobes for both groups. The Student t test
identified significant differences (p <0.05) between the groups in the activation of the area in all
the courtesans during congruent and incongruent stimuli, although there were no differences in
reaction time and number of test errors. Our findings show judo players with more experience
during cognitive testing have lower electroencephalographic wave amplitude on anterior
prefrontal and posterior cingulate, with a greater amplitude of neural de-synchronization. Thus,
it is possible to conclude that judo practitioners with expertise in the fight have, in fact, a
potentially more sophisticated neuronal behavior compared to beginner fighters, when submitted
to the test with attentional cognitive demand.
Keywords: Electroencephalography, Judo; Attention.
14
1. INTRODUÇÃO
Os efeitos do exercício físico nos sistemas periféricos do organismo têm sido amplamente
investigados pela literatura e seus mecanismos são bem evidenciados (1). Por outro lado, os
efeitos no cérebro ainda precisam de maior entendimento. Em modelo animal, estudos têm
demonstrado que o exercício pode induzir o aumento da permeabilidade da barreira
hematoencefálica, aumento da concentração de neurotransmissores, neurogênese e angiogênese
(2). Adicionalmente, o conceito de neuroplasticidade tem sido investigado e hipotetizado como
possível explicação fisiológica à adaptações do cérebro ao exercício, principalmente do ponto de
vista cognitivo, e também por ser um mecanismo ligado à excitabilidade cerebral. Em nível
estrutural, a plasticidade neural apresenta correlações com o estilo de vida ativo, sobretudo com
o envolvimento em atividades aeróbicas (3). Por outro lado, a neuroplasticidade funcional está
associada a sinalizações hormonais, que por sua vez serão indutores neurogênicos, que levaram
a mudanças comportamentais importantes, tais como melhora da memória e atenção. (4).Essas
incertezas possivelmente estão associadas a limitações de técnicas para acessar o cérebro. Nesse
sentido, os avanços tecnológicos dos últimos anos têm permitido a mensuração da atividade e
adaptação cerebral associado ao exercício, seja de forma aguda (5,6) ou crônica (7). Dentre as
principais técnicas disponíveis para acessar a função cerebral, a eletroencefalografia (EEG) é a
mais utilizada, visto que apresenta um custo reduzido perante as demais, é pouco invasiva, oferta
alta resolução temporal, apresentando eficácia quando associada à respostas motoras, cognitivas
e comportamentais (8).
Quando se pensa em prática de exercício em longo prazo, o esporte parecer ser um campo
interessante de análise, pois o volume de tempo ao qual o praticante se dedica a uma determinada
modalidade está intimamente relacionada ao seu desenvolvimento dentro desta. No alto
rendimento, essa relação é ainda mais intensa já que contem fatores associados à recompensa
social e financeira. Tem sido sugerido que para alcançar níveis de excelência no esporte, é preciso
considerar uma regulação cerebral integrada entre o controle motor, aspectos cognitivos e
psicológicos (9). Investigações que tragam respostas mais conclusivas acerca no funcionamento
cerebral atléticos, poderão promover formas de inovar na busca pelo alcance da vitória. Portanto,
considerando que os níveis de excelência atingido por atletas no tocante da percepção e
inteligência corporal (consciência e sensação corporal originada no interior do corpo e o corpo
agindo em resposta a outras ações ou ambientes (10)) são associados a comandos do sistema
nervoso central (SNC) (11), abre-se um leque de possibilidades de investigação e possibilidades
15
de intervenções que otimizem o desenvolvimento desse sistema, a fim de impulsionar o alcance
de vitórias no campo desportivo.
No cenário do alto rendimento, os esportes olímpicos protagonizam as atenções e
despertam grande interesse popular e científico, devido seus participantes apresentarem
altíssimos níveis de habilidades (12,13). Dentre eles, o judô ganha destaque nacional por ser o
esporte que mais trouxe medalhas olímpicas (22 ao todo, entre as Olimpíadas de 1976 e 2016).
Assim como a maioria dos esportes de luta de origem oriental, o judô categoriza os níveis de
experiência na luta através de cores de faixa, partindo da branca (menor grau) até a coral (grau
supremo). Porém, a faixa que geralmente representa o período de desenvolvimento competitivo
do praticante é a preta. Nesse sentido, existe uma representatividade social, física e emocional
sobre o significados ser um faixa preta. O imaginário criado sobre o que um faixa preta
representa, foi em grande parte construída pelo filmes que retratavam personagem fortes e
habilidosos que de modo geral tinham essa graduação em uma ou várias lutas. Simbólica e
filosoficamente, o preto é a junção de todas as cores e representa o fim de uma jornada (passando
pelas faixas coloridas) e início de uma nova, com o judoca dotado de mais sobriedade e
responsabilidade. Desde sua origem, o judô cultiva a formação do sujeito, tanto através da sua
disciplina interna, baseada em princípios zen-budistas e dos próprios princípios da luta, quando
da aquisição de destreza e aplicação das técnicas de judoísticas.
Fisiologicamente, esse esporte de combate é intermitente, com movimentos
determinantemente anaeróbicos e demanda geral predominantemente aeróbica, sendo suas lutas
desenvolvidas continuamente (sem separação por rounds) e sua disputa realizada em um só dia
(14,15). O objetivo principal do judô é projetar tecnicamente o adversário ao solo de forma
perfeita (ippon) ou parcial (wazare). Nesse sentido, essa luta demanda habilidades cognitivas que
são fundamentais no desenvolvimento técnico e tático durante a luta, sobretudo a atenção, tempo
de reação, capacidade inibitória, processamentos neuropsicológicos e respostas motoras (16,17).
Portanto, a capacidade de dinamizar mecanismos neurais ligados a processos cognitivos pode ser
determinante para tomadas de decisão acertadas ou não dentro da luta.
A cognição está ligada aos processos mentais envolvendo aquisição, armazenamento,
arranjo e uso do conhecimento adquirido, tais como as tomadas de decisão, percepção, raciocínio,
processos criativos e planejamento (18). Os mecanismos biológicos e neurais da cognição são
passíveis de mensuração através de comportamentos e comandos advindos do SNC. Do ponto de
16
vista neuroanatômico, a cognição é um processo complexo que envolve diferentes áreas
cerebrais, no entanto, tem sido sugerido que as regiões ventromedial, dorsolateral e anterior do
córtex pré-frontal, além do córtex cingulado anterior possuem um papel chave na hierarquia do
controle cognitivo (19,20). No âmbito esportivo, a chave para o desenvolvimento no alto
rendimento está na automatização tanto de movimentos, quando de processos cognitivos. Porém,
essa automatização não é, em si, o motivo da excelência esportiva, mas sim a capacidade que o
esportista tem de desenvolver habilidades ligadas ao seu esporte e desenvolve-la de forma
automática (12), fator que está fortemente ligado ao desenvolvimento de fatores cognitivos e
atencionais. Do ponto de vista prático, a necessidade de controle constante das ações, impõe
maior demanda atencional ao esportista, prejudicando a fluidez dos gestos desportivos e
aumentando a perturbação da consciência, e, consequentemente, o desenvolvimento técnico-
tático no esporte.
Estudos que tem por objetivo investigar atribuições cerebrais desenvolvidas pela prática
esportiva possuem diversos limitantes, ligados principalmente a mensurações durante a prática
motora ou pela escassez de desenhos experimentais que respondam a demandas especificamente
esportivas. Atletas de alto nível possuem estrutura e resposta cerebral diferenciada, fator
possivelmente associado a um aumento no número de sinapses e de volume cerebral (21–24). De
forma mais ampla, um bom desenvolvimento cognitivo no esporte está entrelaçado a boas
respostas técnicas e táticas (16), psicologicamente representada pelas estratégias e
comportamentos expostos pelo atleta durante a prática esportiva (25). Nesse sentido, o
entendimento das demandas corticais, bem como a configuração de comportamento neural
durante tarefas e situações predominantemente cognitivas ou que levarão o atleta a uma tomada
de decisão importante, são de vital importância para seu desenvolvimento intraesporte, bem
como no desenvolvimento de métodos que potencializem seus atributos cognitivos solicitados
durante a prática esportiva.
As respostas eletrofisiológicas ligadas a experiência desportiva têm sido exploradas nos
últimos anos, principalmente através de estudos utilizando EEG, através de mensurações de
sinais neurais associadas a expertise esportiva em função da frequência (ex. Event-Related
Spectral Perturbation) e tempo (ex. Event Related Potencial - ERP), ou a tentativas de aumento
do desempenho (neurofeedback) (26). Uma das possíveis adaptações neurais geradas pela prática
esportiva é a “eficiência neural”, que preconiza a diminuição da atividade rítmica
eletrofisiológica cerebral de esportista com mais tempo de prática, a fim de diminuir o dispêndio
17
energético neural e assim apresentarem menores amplitudes em oscilações cerebrais (27–30).
Esse comportamento foi principalmente encontrado em testes que envolviam estímulos visuais,
ofereciam estímulos ligados ao esporte (ex. mae gueri visualizado por lutadores de karatê). De
maneira oposta, maiores amplitudes de frequência alpha foram encontradas quando os atletas
eram desafiados a apresentar controle motor (31,32). Assim, o comportamento de amplitude do
sinal pode apresentar comportamento variado entre esportista, a depender do desenho
experimental ao qual foi conduzida a investigação
De todo modo, estudos que identifiquem e caracterizem as particularidades associadas ao
comportamento neural de atletas ainda precisam ser realizados. Além disso, o estudo das
respostas ligadas a frequências cerebrais em testes cognitivos não relacionados ao esporte, mas
que sejam fidedignos quanto a respostas comportamental e neuroelétrica possuem lacunas em
suas respostas, o que leva, dentre muitos questionamento, à dúvida se a resposta neuroelétrica
mais econômica (“eficiência neural”) extrapola estímulos apenas relacionados ao esporte.
Os mecanismos complexos que descrevem os processos cognitivos não estão totalmente
elucidados e expõem uma ampla área de conhecimento a ser estudada, principalmente quando há
envolvimento de exercício físico e esporte. Ademais, as atividades e oscilações neurais ligados a
atenção precisam de investigações mais a fundo, sobretudo para que possam descrever
particularidades associadas aos esportistas e como as qualidades neuropsicológicas são
aperfeiçoadas através da prática esportiva. Do ponto de vista prático, o conhecimento das
demandas corticais ligadas à atenção poderão auxiliar o desenvolvimento de habilidade técnico-
tático-cognitiva dos atletas, haja vista que este é um componente cognitivo ligado à tomada de
decisão dentro do esporte.
De acordo com a literatura apresentada sobre adaptações neurais a pratica esportiva,
hipotetizamos que participantes com maior tempo de prática na modalidade esportiva
apresentarão maior “eficiência neural”, representada por uma menor amplitude de onda, a partir
da análise de ERP, bem como menores amplitudes de de-sincronização (Event-Related
Desynchronization – ERD) na frequência alpha e beta. Considerando a natureza cognitiva
utilizada, acredita-se que áreas frontal (ex. Córtex dorsolateral pré-frontal) sejam
majoritariamente solicitadas durante a realização da tarefa, em ambos os grupos.
Adicionalmente, escores melhores de desempenho cognitivo serão apresentados pelo grupo faixa
preta em comparação ao grupo faixa branca para o tempo de reação, percentual de acerto e efeito
Stroop.
18
2. OBJETIVOS
2.1. Geral
Comparar o desempenho cognitivo e eletrofisiológico de praticantes de judô com diferentes
níveis de experiência na luta.
2.2. Específicos
Comparar desempenho cognitivo em tarefas congruente e incongruente durante teste de
Stroop entre judocas faixas branca e preta;
Identificar áreas ativadas nos grupos durante a realização da tarefa cognitiva;
Comparar amplitudes de potenciais relacionados aos eventos em áreas corticais comuns
ativadas pelos grupos durante a realização do teste cognitivo;
Comparar diferenças de sincronização/desincronização em análise de tempo-frequência
entre judocas faixas brancas e pretas.
3. REVISÃO DA LITERATURA
3.1. MECANISMOS NEUROCOGNITIVOS NOS ESPORTES
O desenvolvimento de habilidades motoras no esporte envolvem vários processos neurais
para além de aprendizagem técnica. De acordo com Callan & Naito (33), quatro elementos se
destacam como adaptações do desenvolvimento neural em atletas de ponta: 1) a “eficiência
neural”, ligada a diminuição da amplitude da atividade neuroelétrica e menor dispêndio
energético cerebral; 2) expansão cortical, referente ao uso de áreas maiores ligadas a habilidades
motoras e/ou discriminações sensoriais; 3) processamento especializado em regiões específicas
cerebrais desenvolvidas através da experiência desportiva, que induz maior automatização das
conexões neuroelétricas; e 4) modelos internos, que simulam, mentalmente, as situações
desportivas aos quais os atletas serão submetidos (22,33). Tais adaptações estão majoritariamente
investigadas considerando áreas motoras, que seriam as regiões cerebrais protagonistas no
desenvolvimento esportivo. Todavia, em se tratando de SNC, outras áreas tem ganhado destaque
no desenvolvimento esportivo, sobretudo pela necessidade de engajamento cognitivo envolvido
nas ações esportivas (34).
19
É importante destacar que fatores psicológicos (motivação, emoção, etc.) são de suma
importância ao desenvolvimento esportivo. Além disso, o desenvolvimento de habilidades
esportivas é dependente de fatores perceptuais, cognitivos e motores, sendo estes analisados de
forma integrada (12). As ações técnico-táticas dentro do esporte são extremamente dependentes
de fatores cognitivos, o que infere, do ponto de vista cerebral, que melhores padrões cognitivos
desenvolvidos no meio esportivo, podem dar acesso mais rápido aos sistemas de memória e
motor, por exemplo. Logo, a compreensão da dinâmica de integral ligada ao desenvolvimento
esportivo se faz necessário para que todas as capacidades sejam desenvolvidas ao máximo.
Os processamentos cognitivos e sensoriais desencadeiam em uma tomada de decisão,
representada ou não por uma ação motora, sendo essa tomada de decisão é composta por
elementos subjacentes, tais como atenção, antecipação, memória e percepção (35,36). De
maneira esquemática, os fatores cognitivos levam a tomadas de decisões, mas também a
elementos perceptuais ligados ao esporte, e ambos (tomada de decisão e percepção), estão ligados
a ações táticas, que por sua vez dependerá, em última instancia, da capacidade técnica do atleta
(34). Dentre os elementos subjacentes ligados a esse processo, a atenção é a que está diretamente
ligada ao objetivo final da ação desportiva, podendo esta ser seletiva, dividida ou sustentada (37).
As características inerentes a cada esporte podem predizer qual das formas é mais determinante
para um melhor padrão desportivo. Tal predição pode ser guiada por diversas características,
como ser seletiva ou dividida, ter objetivos intrínsecos ou por estímulos externos, e de foco
interno ou externo (36). Portanto, o desempenho parcial ou geral do atleta no esporte ao qual é
dedicado dependerá sempre de ações físicas, psíquicas e cognitiva (9).
A prática extensiva de esportes, além da evidente melhora nas capacidades físicas e
motoras, induz a mudanças do ponto de vista neurocognitivo, tanto relacionadas a mudanças
estruturais e morfofuncionais (21,24), quanto ligadas a melhoras em domínios cognitivos (ex.
memória, percepção) (38). Uma estudo de metanálise demonstrou que atletas de elite, quando
comparados a sub-elite e novatos, apresentam desempenho cognitivo superior quando expostos
a situações específicas dos seus esportes (39). Anteriormente, muitos ensaios já apontavam para
o desenvolvimento da capacidade atlética de desenvolver memória, atenção, planejamento,
raciocínio e avaliação situacional, devido a prática esportiva deliberada (40). Um bom exemplo
de como as capacidades cognitivas podem ser cruciais no desempenho esportivo, é o estudo
conduzido por Vestberg e colaboradores (41), que demonstrou que melhores desempenhos em
testes de funções executivas (criatividade, controle inibitório e flexibilidade cognitiva) podem
20
predizer o sucesso esportivo em jogadores de futebol de alta performance. Dessa forma, é
razoável sugerir que o comportamento desenvolvido no campo esportivo é fruto de adaptações
físicas, psíquicas e cognitivas proporcionadas pela prática regular e deliberada de esporte.
De uma forma geral, dentro do esporte, a finalidade inerente a competição, a vitória, é a
representação clara do objetivo do esportista. Essa forma de modulação atencional, teoricamente
denominada “top down”, é intimamente ligada aos processos cognitivos, sendo ela capaz de
promover mecanismos de seletividade nas informações advindas do meio, desenvolvendo a
capacidade de se ater a determinados eventos e, sobretudo, aos eventos necessários para que
alcance o seu objetivo (42,43). Além disso, a visão de que apenas adaptações nos sistemas
periféricos (ex. músculos) são importantes para o alcance de níveis esportivos superiores é
limitada. Dessa forma, a compreensão dos mecanismos neurais que estão associados aos
processos cognitivos inerentes ao esporte é de suma importância para entender a regulação
cerebral durante o desenvolvimento esportivo.
3.2. COGNIÇÃO
3.2.1. FUNÇÕES EXECUTIVAS
A capacidade de realizar esforços mentais para um determinado objetivo, como tomar
uma decisão, requer o desenvolvimento de uma gama de processos neurais, onde a cognição
parece exercer papel protagonista. As “funções executivas”, nesse cenário, estão intimamente
ligadas aos processos do controle cognitivo, sobretudo as repostas neurais advindas do controle
“top down” (alta ordem de controle) e ligadas a atividade neuronal dos lobos frontais (19,44,45).
Na literatura científica, o termo “funções executivas” possui algumas sinonímias, tais como
“controle executivo” e “autorregulação” (46). Sua definição está ligada a ações mentais
responsáveis por controlar e coordenar comportamentos dirigidos. Nesse sentido, as funções
executivas seriam um mecanismo objetivo e organizado responsável pelo direcionamento da
atenção a processos específicos que estão em andamento (47,48). De acordo com Perner & Lang
(44) as funções executivas também seriam entendidas como o próprio autocontrole e teriam uma
relação de interdependência com a ‘teoria da mente’, que, por sua vez, está ligada a distinção
entre aparência e realidade, além de ambos conceitos estarem ligadas a mesma área cerebral. Há,
ainda, fatores associados a genética que podem contribuir em como o indivíduo desenvolve os
elementos da função executiva (49). Por outro lado, entende-la de forma unificada pode
21
promover uma redução em suas características, desconsiderando que a própria cognição é um
processo ligado a múltiplos sistemas cerebrais. Além disso, tem sido levantado questionamento
a respeito da consciência e inconsciência ligadas a processos executivos (50), uma vez que há
sempre uma associação desses a processos conscientes, mas não se sabe o quanto as funções
executivas podem ter participação nos processos inconscientes, levantando as plurais
possibilidades a respeito a abrangência das funções executivas. Dessa forma, permanece
relativamente em aberto quais seriam os componentes das funções executivas.
Atualmente, existem algumas hipóteses para definem as funções executivas. Uma das
definições, afirma que as funções executivas abrangem a auto regulação, controle cognitivo,
organização temporal e monitoramento do comportamento, inibição, planejamento e controle
atencional (51). Outros autores, propõem menos domínios, sumarizando as funções executivas
em foco de atenção, gerenciamento de tarefas, planejamento, monitoramento e codificação (52).
É importante perceber que tais domínios se mostram bastante abrangentes e, portanto, são
compostos por associação de características menores, como por exemplo, o foco de atenção, que
tem sua lógica conceitual ligada aos conceitos de atenção e inibição (52,53).
Há, ainda, a hipótese de que as funções executivas estariam em três grandes frentes:
processos mentais ligados a inibição, processos que requerem memória de trabalho e atenção
alternada, e memória de trabalho codificada e ligada aos seus conteúdos intrínsecos (49).
Diamond (2013) propõe que as funções executivas sejam divididas em três grandes núcleos:
inibição e interferência, memória de trabalho e flexibilidade cognitiva. Segundo a autora, o
controle inibitório estaria ligado ao controle sobre os estímulos internos (ex.: emoções) e/ou
externos (ex.: exercício); a interferência seria a capacidade de exercer o controle inibitório sobre
a atenção, no sentido de atender apenas a estímulos desejados; a memória de trabalho (subdividia
em verbal e não-verbal) é capacidade de retenção de informação, de forma que tal informação
seja útil de forma imediata; e a flexibilidade cognitiva estaria ligada à capacidade mental de
mudança de perspectiva e adaptabilidade a novas situações (54). Apesar dessa estabelecida
divisão de domínios, é importante considerar também que a constante mudança de rótulos aos
quais os conceitos científicos estão expostos por muitas vezes podem reduzir sua
dimensionalidade (45). Diante disso, os subprodutos e domínios das funções executivas são
interligados, interdependentes e indissociáveis (54). Logo, há controvérsias em associar testes
cognitivos às unidades de domínios, bem como desconsiderar as demais capacidades da mente
humana.
22
3.2.2. ATENÇÃO
Dentre as várias formas de entendimento sobre o conceito de atenção, um dos mais
clássicos é o viés de entendimento psicológico, onde a atenção é colocada quase como sinônimo
de focalização consciente, ou seja, a capacidade de aumentar a relevância a estímulos de maior
importância em detrimento de outros de menor importância (55). Nessa perspectiva, a atenção
também apresenta algumas subdivisões, podendo ser: sensorial ou intelectual, imediata ou
derivada, passiva ou ativa. As combinações entre essas características (ex.: atenção derivada
ativa) direcionaria a forma de condução de avaliação atencional, sendo alguns dessas
combinações associadas a determinados públicos ou forma de avaliações, podendo ser sensível
a fatores como idade, por exemplo.
Quando se trata especificamente das influências visuais para o mecanismo da atenção,
outra concepção, baseada em preceitos ligados às neurociências e aos estudos utilizando fMRI,
tem sido associada à percepção à atenção, de forma que a importância que se dá um estímulo
será proporcional ao nível de atenção que tal irá receber, associado mecanismo de filtragem de
informações distrativas ou irrelevantes contidas no ambiente (43,56). Um ponto de destaque é o
fato de a atenção ser flexível e moldável, a fim de que se atenda às necessidades momentâneas,
que podem ser internas (quando o indivíduo induz sua atenção a algo) ou externas (quando um
estímulo do ambiente chama a atenção do indivíduo). Nesse sentido, a modulação da atenção é
classificada em “bottom-up” – quando o estímulo é recebido de forma automática – e “top down”
– quando a atenção é exercida de forma voluntária (56–59). Um dos mecanismos voluntários
ligados ao desenvolvido cognitivo é atenção na sua forma seletiva.
A atenção seletiva é associada, interligada e as vezes até confundida com as funções
executivas, por ser a operação responsável por escolher qual, dentre vários, o estímulo que será
dado como prioritário, refletindo um comando de alta ordem (59,60). Yantis e Jonides (1990)
teorizam a respeito de a seletividade da atenção ser concebida a priori ou posteriori, de forma
que quando aprioristicamente, seletividade estaria ligada ao foco atencional, enquanto que a
seletividade a posteriori permitiria o desenvolvimento de tarefas de atenção dividida. Porém,
essa concepção é contestável, sobretudo quando a tarefa envolve estímulos que geram conflito.
De acordo com Lamers e colaboradores (2010), a concepção de tal seletividade dependerá das
circunstancias, sobretudo dos elementos denominados “conjunto de estímulos” – a seleção estaria
23
ligada a percepção do estímulo e suas características – e “conjunto de respostas” – a seleção
estaria ligada a eleição da resposta a partir das respostas possíveis.
É importante frisar que o cérebro humano tem limitações, dentre elas o de processamento
de informações. Tal limitação se manifesta sobretudo, quando há necessidade de seleção dos
estímulos, de forma que entre o input sensorial e a resposta motora, a necessidade de
processamento e seleção geram uma competição dos recursos neurais (62). Nesse sentido, há a
necessidade de que as influencias atencionais “bottom-up” e “top down” se mantenham em
equilíbrio para que viabilize todos os processos neurológicos que irão acionar outras áreas
corticais, de acordo com a necessidade do sujeito e, assim, guiando seu comportamento (43).
Quando o cérebro está exposto a estímulos que contem múltiplos fatores de distração e/ou
confusão o processamento tende a ser ainda mais limitado, isso por que há geração de conflitos
e, consequentemente, a necessidade de exercer maior controle atencional. O esforço neural para
resolver tais conflitos é de alta demanda e nem sempre desencadeia na sua resolução. Nesse
sentido, um bom exemplo de medição a respeito de como os conflitos tendem a gerar altas
demandas cognitivas foram os experimentos propostos por J. Ridley Stroop (1935), que
tornaram-se clássicos no que tange medidas de funções executivas.
3.2.3. STROOP TEST
O trabalho original escrito por J. Ridley Stroop e publicado no ano de 1935, se propôs a
investigar como a interferência causada por paradigma de nomeação de cores poderia aumentar
o tempo de reação das respostas em tal tarefa. Para responder tais perguntas, Stroop realizou
experimentos de nomeação de palavras com interferência de cores (ex.: AZUL escrito em
AMARELO, resposta correta: azul), comparado a nomeação de palavras somente na cor preta, e
de nomeação de cores com interferência de palavras (ex.: VERMELHO escrito em VERDE,
resposta correta: verde), comparada a nomeação de cores em um quadrado, sendo ambos
experimentos com respostas orais. Os tempos de reação apresentados no primeiro experimento
(interferência de cor vs. palavra em preto) não foram diferentes, enquanto que no segundo
experimento (interferência da palavra vs. cores no quadrado) houve diferença no tempo de reação
de 47 segundos quando as respostas eram incongruentes. Dessa forma, foi dado o nome de
“Efeito Stroop” a interferência da palavra sobre tarefa de nomeação de cores, onde a natureza de
tal interferência está no envolvimento e geração de conflito no sistema semântico antes ou na
seleção da resposta (61,64–66).
24
O “Stroop Test” tornou-se referência para análises cognitivas, sobretudo com objetivos
de medir desempenho atencional, inibição e interferência. Adicionalmente, houve a necessidade
introduzir e aperfeiçoar elementos intrínsecos ao teste, a fim de que se apurasse sua estrutura,
tais como mudança da cor de fundo, predição de tempos de respostas de forma individual (trial
a trial), introdução de respostas congruente (ex.: AMARELO em AMARELO) e respostas de
forma manual (67–71).
Uma das muitas variações do Stroop Test em relação ao paradigma clássico, chama-se
“Stroop pareado”, onde os estímulos congruentes e incongruentes devem ser comparados a outro
estímulos (72). No caso do Stroop Test aqui utilizado, a resposta congruente ou incongruente
deve ser comparada a uma barra colorida, e as respostas devem levar em conta as características
do Stroop Test, comparando-os a um estímulo de outra dimensão (65). Um dos autores a utilizar
o Stroop pareado foi por Luo (1999) a fim de testar a hipótese de que o delay observado nas
respostas incongruentes advém da necessidade de acessar o sistema semântico. Machado-
Pinheiro e colaboradores (2010), a fim de verificar a influência do intervalo entre estímulos no
envolvimento do sistema semântico, introduziram neste mesmo paradigma o tipo de resposta
Go/NoGo, onde as respostas Go se dão quando a cor da barra é correspondente ao significado da
palavra (independentemente de ser congruente ou incongruente), enquanto que resposta NoGo se
dá quando essa relação não existe. Tal fator adicionaria um fator conflitante ao teste, relacionado
à resposta (73).
Do ponto de vista neuroanatômico, estudos que utilizaram a técnica de fMRI tem
relacionado a detecção do conflito presente no Stroop pareado ligado a ativação do córtex
cingulado anterior (em inglês, anterior cingulate cortex – ACC) (74). A respeito dessa mesma
área cerebral, sugere-se um papel ligado à cognição e ação, onde o córtex cingulado anterior teria
uma papel de ajuste compensatório no controle cognitivo, além de contribuir no direcionamento
atencional (66,75). Outros estudos têm focado em explorar a atividade neuroelétrica e o
comportamento de ondas eletrofisiológicas quando os estímulos são apresentados ao sujeito.
Nesse sentido, destaca-se a utilização de eletroencefalograma com ou sem análise de potenciais
relacionados aos eventos (em inglês, Event-Related Potentials – ERP).
3.3. ATIVIDADE ELETROFISIOLÓGICA
3.3.1. ELETROENCEFALOGRAFIA (EEG)
25
Dentre as diversas técnicas de mensuração de atividade cerebral não-invasivas, a
eletroencefalografia (EEG) se destaca por seu baixo custo e boa resolução temporal, quando
comparadas ao fMRI, por exemplo. Pioneiramente proposto por Hans Berger em 1929, a técnica
permite estudos que descrevam atividade neurofisiológica. Basicamente, sua aquisição de dados
se dá pela fixação de eletrodos nas diversas áreas anatômicas do escalpo (frontal, parietal,
temporal, occipital), com demarcação padronizada a partir do sistema internacional 10-20 ou 10-
10 (76), de forma que tais eletrodos captam a atividade neuroelétrica gerada pelos disparos
neuronais, viabilizando o acesso as funções corticais do cérebro e possibilitando estudos que
analisem a interação entre cérebro e comportamento (26,77). Os potenciais elétricos recebidos
são amplificados, gravados de forma contínua e geralmente transmitidos em uma tela
simultaneamente a sua aquisição.
A atividade neuroelétrica registrada pelo EEG fornece informações robustas a respeito de
mudanças nos potencias corticais, levando em conta a atividade rítmica e os disparos sinápticos
(8,20). Sua resolução temporal permite o rastreio de processos sensoriais, cognitivos e motores
(26). Classicamente, há duas grandes formas de analisar dados gerados pelo EEG: pelo domínio
da frequência e pelo domínio do tempo. A primeira se baseia no teorema de Fourier, que
basicamente discorre a respeito de que sinais recorrentes podem ser interpretados como atividade
sincronizada e decompostas em funções matemáticas (78). Dessa forma, áreas cerebrais
transmitem sinais neuroelétricos sincronizados, tais sinais são captados pelo EEG e, após
passarem pelo implemento algorítmico-computacional da transformada rápida de Fourier (Fast
Fourier transform – FFT) são decompostas em diferentes frequências e seus potencias espectrais,
classicamente classificadas em delta (Δ: >4 Hz), teta: (θ: 4 – 8 Hz), alfa (α: 8 – 12 Hz), beta (β:
13 - 30 Hz) e gama (γ: 30 - 150 Hz), podendo haver pequenas variações em tais taxas de
frequência (9).
Quando se trata do domínio do tempo, a prioridade de análise está relacionada a
amplitude, latência e morfologia da onda. As mudanças prováveis em tais variáveis são
relacionadas a respostas sensoriais, cognitivas, processamento, imagética, pensamento,
percepção, dentre outros (9). Tais modulações as quais as ondas estão propensas estão
relacionadas a eventos ou estímulos dados aos sujeitos. Nesse sentido, para que tais eventos
sejam mensurados e estudados de forma sistemática, a metodologia empregada é de potenciais
relacionados aos eventos, que são marcações temporais na ordem de milissegundos, que
permitem a análise de variações nas ondas de EEG após a recepção de um estímulo (65).
26
Obviamente, como as demais técnicas de análise cerebral, o EEG possui limitações. As
principais estão ligadas à limitação da resolução espacial, influência da corrente elétrica externa
e a sensibilidade a movimentos do corpo, sendo essas últimas duas geradoras de ruídos,
facilmente identificáveis pela visível perturbação que a gravação continua sofre. Tais percalços
limitam, sobretudo, estudo de EEG e exercício simultaneamente, necessitando que uma limpeza
de dados muito invasiva, que por muitas vezes acaba por eliminar grande parte dos dados. Mesmo
assim, alguns estudos têm utilizado tal técnica para identificar áreas cerebrais mais ativadas
durante exercícios cíclicos (ex.: ciclo ergômetro) (20,79–81). É importante frisar que os dados
de EEG brutos são submetidos a filtros de frequência que ajudam nas eliminações de artefatos,
apesar de que tais filtros devem ser utilizados com cautela para que não interfiram na análise de
frequência.
Os ruídos contidos nas coletas utilizando EEG geram uma série de contaminações,
denominadas artefatos, que podem prejudicar as análises destes. Sua origem, na maioria dos
casos, está ligado a movimentos voluntários ou involuntários do corpo (ex.: piscadas, sudorese,
movimentação mandibular, etc). Adicionalmente, mudança de posicionamento dos eletrodos e a
captação, por parte dos eletrodos, de campos eletromagnéticos criados pelo ambiente contendo
correntes elétricas expostas, podem afetar a aquisição de dados e gerar muitos artefatos (8,77).
Felizmente, grande parte dos artefatos é visualizável e de fácil identificação, portanto sendo
passível de inspeção visual. Quando se trata de artefatos ligados a piscadas e movimentos
horizontais dos olhos, muitas pesquisas tem utilizado o eletro-oculograma (EOG), que identifica
a atividade dos músculos dos olhos (77). Alternativamente, a técnica modernamente utilizada
para identificação e exclusão de artefatos (ocular, muscular, da pele, etc.) é de análise de
componentes independentes (em inglês, Independent Component Analysis – ICA) (77,82,83).
Procedimentos matemáticos têm sido utilizados para realizar a localização de fonte dos
disparos neuronais, tais como a eletro topografia, sLORETA (standardized low-resolution brain
electromograthy), BESA (brain electrical source analyses), dentre outros. Um dos softwares que
tem ganhado notoriedade, sobretudo por ser um instrumento de análise gratuita, é o EEGLAB,
uma ferramenta interativa no Matlab que permite o processamento de sinais eletrofisológicos
(EEG, EMG, etc.), bem como diversas análises (rejeição de artefatos, estatística, etc.), inclusive
a detecção de fonte (84). Fazendo o uso de uma ferramenta pré-instalada no programa
(FieldTrip), associada função matemática escrita pioneiramente por Robert Oostenveld, o
DIPFIT2 é capaz de plotar de onde, espacialmente, os disparos neurais tem sua origem através
27
da identificação de dipolos (85–87). A ferramenta de localização de fonte proposta em análise de
sinal neuroelétrico é de suma importância, uma vez que as inferências de muitos estudos são
feitas a partir do comportamento encontrado em canais dispostos fixamente no escalpo. No
entanto, considerando, principalmente, a dispersão do sinal eletrofisiológico, um mesmo canal
pode obter sinal elétrico de diversos corteses, tornando as análises extremamente genéricas e
imprecisas, ao passo que a identificação das fontes permite a análise da própria fonte de onde
advém o sinal (88)
3.3.2. ANÁLISE TEMPORAL (ERP)
Do ponto de vista neural, os ERP’s representam a soma de potenciais pós-sinápticos de
conjuntos de neurônios que disparam em sintonia (5,89). Nesse sentido, o fenômeno dos ERP’s
ocorrem 1) em resposta a um estímulo; 2) na preparação para uma resposta ou recepção de um
estímulo (5). Classicamente, para que tais análises sejam extraídas de uma coleta de dados
realizada com EEG, são realizadas marcações temporais feitas no sinal continuo de EEG e se
relacionam com estímulos gerados externamente. Porém, tais marcações, conhecidas como
janelas de tempo, podem camuflar diferenças de amplitude de onda mais sutis, mas que, se
tratando de esporte, podem ser decisivas em repostas neurais ligadas tomadas de decisão. Além
disso, estabelece-se uma janela de análise ao redor de um evento de interesse, e a partir de médias
ao longo de repetições do experimento, consegue-se destacar sincronias e dessincronias neurais
e minimizar efeitos de ruídos.
Os ERP’s são constituídos de sucessões de componentes positivos (P) e negativos (N),
que representam a orientação da onda eletroencefalográfica. Tais componentes são passiveis de
interpretação quando analisados em funções de suas amplitudes (relacionada a magnitude e
dispersão da onda) e latências (relacionada a velocidade de ocorrência dos eventos positivos e
negativos), sendo as mais conhecidas N1, N2, N3, P1, P3 e Slow Potencial, onde a letra inicial
representa a orientação da onda (positivo ou negativo) e o numeral representa a localização
temporal (em milissegundos) aproximada do pico de onda, podendo também ser representada
nas casas as centenas (ex.: P3 = P300, ocorrência em aproximadamente 300 milissegundos). Tais
eventos podem ser relacionados a determinadas análises e assim passiveis de interpretação, de
acordo com as características que apresentarem.
Quando se trata especificamente de processos cognitivos e atencionais, os ERP’s são
utilizados em larga escala. Importantes marcadores relacionado aos processos neurais são N2,
28
relacionado ao monitoramento de conflito em tarefas Go/NoGo, e N450, relacionado a detecção
de conflito, ambos como o existente no Stroop Test (90,91). Nesse sentido, West e Alain (1999)
foram os primeiros a relacionar a detecção de conflito nos estímulos incongruentes em um
período aproximado a 500 ms. Essa análise é pautada na continuidade negativa (ou menos
positiva) de onda em regiões frontais, que geralmente se inicia em 350 ms e se prolonga até
aproximadamente 500 ms, sendo analisado o valor médio da área de onda compreendido nessa
janela de tempo (350 a 500 ms), e seu pico identificado em aproximadamente 410 ms (65,93,94).
Além disso, estudos realizados por Liotti e colaboradores (2000) e West (2003) apontam que a
fonte neuronal responsável pela geração do componente N450 advém do córtex cingulado
anterior, inferindo que maiores amplitudes refletiriam maiores conflitos (65).
Janelas de tempos mais tardias (> 500 ms) também possuem representatividade em
analises de ERPs (93). O Slow Potencial (em algumas literaturas sustained positivity), nesse caso,
representaria um potencial relacionado a resolução do conflito, seleção de resposta e adaptação
ao conflito (96–98). Como próprio nome propõe, é um potencial lento, com direcionamento
positivo e de maior ocorrência em estímulos incongruentes (94). Sua fonte neuroanatômica é
incerta, apesar de estudos ligarem sua atividade a giros frontais e mediais, e córtex estriado (95).
De fato, tal potencial poderia registrar a ocorrência do Efeito Stroop.
3.3.3 OSCILAÇÕES CEREBRAIS
A análise de oscilações cerebrais é dependente de disparos neuronais sincronizados em
ativação. A forma mais comumente utilizada para o estudo de tais oscilações se dá principalmente
através das frequências corticais (alpha, tetha, etc.), que refletem a dinâmica de ritmos neurais e
dos padrões de sincronização de disparos de grupos neuronais (99). As frequências corticais tem
sido associadas a estados mentais (atenção, alerta, etc.) e também pode propor explicações sobre
as ligações entre respostas cerebral e comportamento (26). A ocorrência de tais bandas de
frequências tem sido associadas a diversas ações mentais, como sono (δ), relaxamento (α),
regulação autonômica (β), dentre outros (9,77).
Conjuntamente, as análises das bandas de frequência têm sido realizadas em associação
a mudanças no poder espectral em comparação ao baseline, descritas na literatura como padrões
de sincronização (em inglês, Event-Related Synchronization - ERS) ou de-sincronização (em
inglês, Event-Related Desynchronization - ERD) dos neurônios (9,26,99,100). O mapeamento
de ERD e ERS permitem o estudo dos padrões de atividade cortical. Estímulos sensoriais,
29
cognitivos ou motores podem promover mudanças no padrão ERD ou ERS. Aumentos nos níveis
de ERD estão ligados a maior excitabilidade/ativação neuronal na área ativada, além de um
padrão de funcionamento de disparos neuronais mais independentes, que em termos práticos
significa um estado de prontidão máxima e melhor capacidade de processamento de informações.
Inversamente, o ERS estão associadas a maior desativação funcional das áreas neuronais, não
necessariamente de ausência de disparos neuronais (101).
Mais recentemente, as análises de ERS/ERD foram generalizadas através da análise de
perturbações espectrais relacionadas ao evento (em inglês, ERSP – Event-Related Spectral
Perturbation), que identificam mudanças significativas relacionadas ao evento no poder
espectral, ao longo do tempo nas diversas frequências cerebrais existentes (84). O ERSP é
conhecido na literatura como análise de tempo-frequência e de fundamental importância no
entendimento de estado de inibição ou excitação de populações neuronais (9). Outro estudo
também demonstrou a utilidade desta ferramenta em evidenciar diferenças nas oscilações
neuronais ligadas a expertise motora e à modulação de respostas antecipatórias sensoriomotoras
uma determinada modalidade esportiva (102). Associado aos resultados de ERSP, os resultados
de bloqueio de fase relacionado aos eventos ou coerência entre tentativas (em inglês, ITC – Inter-
trials Coherence) que refletem a coordenação temporal dos processos corticais (103).
Adicionalmente, as informações fornecidas através desse tipo de análise tem sido
complementares as informações de ERP, uma vez que conjuntamente, tais informações fornecem
um perfil de atividade neuronal mais completo e, ainda, que podem acontecer de forma
dissociada, revelando atividade neuronais distintas (104).
3.4. ATIVIDADE CORTICAL E DESEMPENHO EM ATLETAS
O conhecimento da dinâmica cerebral têm sido apontado como altamente relevante para
o desenvolvimento esportivo, uma vez que tanto a expertise motora, quando o desenvolvimento
de aspectos psicofisiológicos são derivados de comandos advindos do sistema nervoso central,
e, consequentemente, de adaptações neurofisiológicas (9,22,100). O processamento neural em
atletas de alto rendimento se dá de maneira diferenciada devido as constantes demandas aos quais
os atletas são submetidos, bem como a necessidade de tomadas de decisão, processamento
perceptivo e ações motoras acontece, do ponto de vista neural, de forma paralela (12). De forma
resumida, os processos neurais aos quais estão envolto o alcance do alto nível desportivo são
descridos em quatro grandes adaptações: “eficiência neural”, expansão cortical, processamento
30
especializado e desenvolvimento de modelos internos (33). Adicionalmente, diversas adaptações
em nível cognitivo-perceptual estão ligadas ao desenvolvimento atlético e são associadas a
aquisição de expertise esportiva, dentre elas: retenção, recordação e reconhecimento de
informação; maior conhecimento declarativo, processual e estratégico; melhor capacidade
processamento atencional e em tomar decisões complexas; capacidade perceptiva superior,
quando comparados a iniciantes (105).
Estudos envolvendo análises de ERP demonstram que a aquisição e execução de
atividades motoras de forma extensiva, além da necessidade constante de tomada de decisão,
necessidades perceptivas e atenção, promovem reforço em redes neurais e neuroplasticidade (22).
Essa leitura é possível devido a capacidade das características das ondas de ERP (ex. latência)
apresentarem adaptabilidade, no caso, ao exercício crônico (9,103,106–108). Nesse sentido, é
razoável pensar que análises eletrofisiológicas temporais fornecem respostas sobre a
adaptabilidade neural de atletas ao treinamento e da sensibilidade das respostas neuroeletricas a
expertise esportiva, bem como o quão essa adequação está relacionada a estágios específicos do
comportamento, que, por sua vez, tendem a mudar ao avançar da prática esportiva (26,109,110).
Ademais, considerando a performance esportiva amplamente dependente das capacidades
psicofisiológicas (100) e que os ERP’s fornecem respostas temporais bastante precisas, o
conhecimento das respostas neuroelétricas características do alto nível esportivo pode abrir
caminho para uma nova forma de desenvolvimento das capacidades mentais em atletas.
Em análises de poder espectral é possível avaliar a dinâmica cortical das habilidades
motoras através de tarefas visuomotoras (111). Nesse sentido, o fenômeno de ERD é mais
evidenciado durante períodos de preparação motora e execução de movimento voluntários em
atletas. Particularmente os ritmos alpha tem sido associados a processamentos cognitivos, e
quando sua ocorrência acontece na região occipital este tem ligação com o processamento visual
necessário para a execução de movimento (ex. tiro) (22). Além disso, muito estudos
evidenciaram que o padrão de ERD, principalmente alpha e beta, são diferentes entre níveis de
habilidade motora, sobretudo demonstrando que a amplitude de-sincronização é menor em atletas
mais experientes, evidenciando a “eficiência neural” (28,112,113). Porém, sugere-se cautela na
estrapolação de tais evidencia, sugerindo que, em se tratando de frequência alpha, o
comportamento neuronal dependerá da condição experimental (9), como por exemplo quando se
necessita estabilização corporal (31), destacando a ideia de que a conjuntura neuronal do atleta é
adaptável ao nível de desafio ao qual o atleta é confrontado. Adicionalmente, estudos tem
31
relatado um maior padrão de de-sincronização neuronal em atletas com maior expertise,
revelando uma sofisticação maior na modulação atencional e na resposta motora desses atletas.
(9,99,102,114)
4. MATERIAIS E MÉTODOS
4.1. AMOSTRA
Foram recrutados 34 praticantes de judô de ambos os sexos (30 homens e quatro
mulheres), sendo 18 faixas brancas (FB) e 16 faixas pretas (FB), sem doenças mentais
autorrelatadas. Os critérios de inclusão, para grupo FB, foram: possuir menos de um ano de
prática na luta e não ter experiência/graduação em outras lutas de percussão (ex.: karatê). O grupo
FP deveria ter experiência maior que 10 anos de prática acumulados em judô e ter sido ou ser
competidor da luta. Para ambos os grupos foram adotados critérios de inclusão de não possuir
alguma limitação visual (ex.: daltonismo) e/ou estar com alguma lesão musculoesquelética. Os
FB praticavam exercício físico de forma regular ou faziam esportes de forma amadora. Foram
exclusos das análises participantes que não completaram todas as análises.
A amostra foi recrutada por conveniência através de divulgações em mídias sociais e em
campeonatos de Judô. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE – APÊNDICE I), como preconiza a Resolução 466/12 do Conselho Nacional
de Saúde. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte, de acordo com o parecer número 1.762.512 (ANEXO I).
4.2. DESENHO DO ESTUDO
Na primeira sessão os participantes realizavam medidas antropométricas e o teste
cognitivo acompanhado da eletroencefalografia (EEG). A segunda sessão acontecia com um
intervalo mínimo de 24h, onde o participante realizava o Yo-Yo Intermitent Recovery Level 1
(YY-IR1). No terceiro encontro, com período mínimo de 48h, o participante realizou o Special
Judo Fitness Test (SJFT), acompanhado de duas pessoas com uma variação de mais ou menos
5% do seu peso corporal. Em todas as avaliações os sujeitos foram orientados a não realizar
atividade ou exercício físico nas 12h que antecediam o teste.
4.3. ANTROPOMETRIA
32
As medidas de peso e estatura foram aferidas na balança/estadiometro Welmy (W110 H,
Santa Bárbara d’Oeste, SP, Brasil), com precisão de 0,1 kg e 0,01 cm, respectivamente.
4.4. TESTE COGNITIVO
Foi utilizado Stroop Test Pareado computadorizado, sendo a resposta do tipo Go/NoGo
para a avaliação cognitiva dos participantes. Essa variação de Stroop Test exige que a cor de uma
barra colorida seja comparada a uma palavra escrita abaixo dela, contendo (resposta Go) ou não
seu significado (respostas NoGo). Nas respostas do tipo Go o sujeito deveria apertar o botão “1”
do teclado, enquanto que nas respostas NoGo deveria apenas não aperta-lo e esperar o próximo
estímulo aparecer na tela. Dentre as respostas Go, alguns estímulos eram do tipo congruente (sem
interferência de cor sobre o significado da palavra) e incongruente (com interferência de cor
sobre o significado da palavra). O teste contém cinco tipos de estímulos, sendo dois Go e três
NoGo. A aplicação do teste se dava em ~15 minutos. A figura 1 ilustra exemplos de como eram
os estímulos do teste.
CONGRUENTE INCONGRUENTE
RESPOSTA Go
VERMELHO VERMELHO
RESPOSTA
NoGo VERMELHO VERMELHO VERMELHO
Figura 1 – Estímulos congruentes e incongruentes, e suas respectivas respostas Go ou NoGo
durante teste de Stroop.
Os estímulos eram divididos em três blocos de 55 trials (165 trials no total), sendo os
blocos aleatorizados e os intervalos auto selecionados pelos voluntários. Estímulos congruentes
e incongruentes correspondiam a 60 trials cada, enquanto que os demais estímulos somavam 45.
O teste foi implementado através do software E-prime v.1.2 (Psychological Software Tools Inc.),
mensurando dados de quantidades de acerto, erro e tempo de reação das respostas.
4.5. ATIVIDADE CEREBRAL
4.5.1. AQUISIÇÃO DE DADOS
33
A aquisição de dados de atividade cerebral foi realizada através da técnica de
eletroencefalografia (EEG), utilizando-se 64 eletrodos ativos de Ag-AgCl (Act-cap, Herrsching,
Alemanha) montados em uma touca EEG no tamanho adequado e fixada a cabeça do avaliado
(Easy-cap, Herrsching, Alemanha), eletrodo FCz como de referência e o AFz como eletrodo
terra, através do software Brain Vision Recorder e sua respectiva licença. A organização dos
eletrodos obedeceu a distribuição do sistema internacional 10-20 sobre os córtices frontal,
parietal, temporal e occipital. Os eletrodos eram preenchidos com gel de alta viscosidade
(EasyCap GmhH, Herrsching, Alemanha) a fim de aumentar a transdução do sinal. A avaliação
somente iniciava quando a impedância de todos os eletrodos era mantida abaixo de 20 kΩ. Os
sinais analógicos foram amplificados e convertidos à digitais através do amplificador Brainamp
DC (Brain Vision, Herrsching, Alemanha) e gravados a uma taxa e amostragem de 1000 Hz em
um computador auxiliar. Uma medida de baseline foi realizada com o indivíduo de olhos abertos
e olhando para um ponto fixo (+) por cinco minutos antes de iniciar o teste. Essa avaliação ocorria
em uma sala com temperatura controlada (18º a 20ºC) e baixa luminosidade. O tempo total de
coleta foi ~30 minutos.
4.5.2. PRÉ-PROCESSAMENTO DOS DADOS
Os dados de EEG foram processados através do EEGLab v.14.0.0 toolbox (84). A taxa
de amostragem foi mantida a 1000 Hz, os filtros passa baixa e alta aplicados foram de 1 e 55 Hz,
respectivamente. Os dados foram re-referenciados utilizando-se a média de todos os eletrodos.
Foram extraídos os estímulos (epoch) de interesse (S 2 – estímulos congruente e S 4 – estímulos
incongruentes). O algoritmo runica foi utilizado para decomposição de dados em Independent
Components Analysis (ICA). ICA também foi utilizada para identificação e exclusão de artefatos
musculares, piscada e sinais elétricos fora da cabeça (115). O algoritmo DIPFIT2 foi utilizado
para localização de fonte dos ICA’s e plotagem dos dipolos referentes a localização do sinal
elétrico captado por cada canal (85). Baseado no critério de kurtosis, eletrodos ruidosos foram
exclusos. Para o processamento de múltiplos sujeitos foi utilizada a técnica de agrupando de
componentes em STUDY, com separação entre grupos e tipos de estímulos. As ICA’s dos
participantes foram submetidos a um filtro residual de 25%. Após a filtragem, foram submetidos
a análise de Principal Components Analysis (PCA) clustering a fim de identificar os principais
pontos de ativação cerebral de forma separada (ativação de cada grupo) e conjunta (ativação de
ambos os grupos). Reduzir a dimensionalidade das grandezas eletrofisiológicas associadas a cada
34
componente independente (poder espectral, poder em faixas espectrais, etc.), para facilitar o
processo de agrupamento (clusterization). Os clusters foram identificados através da extensão
Neural Network toolbox e passaram por inspeção de componentes, obedecendo os critérios de
um componente por sujeito, sendo elegidos o de menor residual quando mais de um componente
por sujeito. O cluster só foi considerado nas análises posteriores caso houvesse componentes de
50%+1 de cada grupo (nove componentes dos faixas pretas e 10 componentes dos faixas
brancas). Os clusters localizados espacialmente abaixo do córtex cingulado foram exclusos. A
base de coordenadas MNI (Standard Montreal Neurological Institute) foi utilizada para
identificação das áreas de maior atividade durante a realização do teste. As coordenadas (x, y e
z) fornecidas pelo processo de PCA cluster foram inseridas no programa Talairach (116) para a
identificação de áreas de Brodmann envolvidas. A figura 2 demonstra o fluxograma de pré-
processamento dos dados.
4.5.3. ERP
Estímulos congruentes e incongruentes foram extraídos utilizando o período de pré-
estímulo (baseline) de -1000 ms e 2000 ms após o evento. Posteriormente, o período de baseline
foi reduzido a -200 e pós estímulo a 850 ms (considerando a maior média de tempo de reação).
Não foi realizado janelamento temporal prévio. O software apontou os períodos de diferenças
significativas, adotando-se p < 0.05, e a extensão std_erpStudio
(https://sccn.ucsd.edu/wiki/Std_erpStudio) apontou os períodos temporais específicos de
diferenças significantes, através de comparação entre grupos de pico e latência positivos ou
negativos (a depender o direcionamento da onda) de cada cluster incluso nas análises. A
comparação entre o pico e latência foram feitas através de teste t Student não pareado.
4.5.4. ERSP
A análise de tempo-frequência foi realizada através de ERSP. A janela de tempo utilizada
foi -1000 ms pré-estímulos e 2000 ms após o evento. Automaticamente o baseline foi reduzido
a -400 ms e manualmente a 1200 ms pós-estímulo. Para obter o espectro de frequência de janelas
de tempo, utilizou-se a técnica de wavelets (Morley wavelets, 3 ciclos). Para identificar pontos
de significância estatística, método de permutação não-paramétrica com 2000 conjuntos de dados
de substituição, sendo usado para mascarar a significância do ERSP. Para análise de frequência,
35
as janelas consideradas foram: delta (1 - 3 Hz), theta (4 - 7 Hz), alfa (8 - 14 Hz), beta (15 - 30
Hz) e gama (31 - 55 Hz).
4.6. TESTES DE APTIDÃO FÍSICA
Para verificar a capacidade física dos participantes, foram propostas duas avaliações:
potência aeróbia geral através do Yo-Yo Intermitent Recovery Level 1 (YY-IR1) e teste de
capacidade específica da modalidade através do Special Judo Fitness Test (SJFT).
4.6.1. YY-IR1
O YY-IR1 consiste na realização de corrida 40 metros, com mudança de direção no ponto
correspondente a 20 metros e descanso de 10 segundos ao fim dos 40 metros. Os participantes
precisam seguir tempos pré-determinados para o cumprimento da distância de 20 metros,
avisados através de um sinal sonoro (beep), sendo esse tempo diminuído a medida que o teste
avança. Há ainda uma divisão do teste em níveis que também estão relacionados ao incremento
do teste. O teste é interrompido quando o indivíduo não consegue cumprir a distância no tempo
estabelecido por duas vezes consecutivas. Ao fim, é contabilizada a distância total percorrida
pelo participante e inclusa na equação de predição de VO2 máximo descrita a seguir validada por
Bangsbo e colaboradores (117).
𝑉𝑂2(𝑚𝐿/𝑚𝑖𝑛/𝑘𝑔) = 𝑑𝑖𝑠𝑡â𝑛𝑐𝑖𝑎 𝑝𝑒𝑟𝑐𝑜𝑟𝑟𝑖𝑑𝑎 (𝑚) 𝑥 0,0084 + 36,4
AQUISIÇÃO DADOS DADOS
TAXA DE AMOSTRAGEM: 1000
Hz
PASSA BANDA:
BAIXA - 1 hz
ALTA - 55 Hz
ESTÍMULOS:
S 2 (CONGRUENTE)
S 4 (INCONGRUENTE)
JANELAMENTO:
BASELINE: -1000 ms
PÓS-ESTÍMULO: 2000 ms
RUNICA: LOCALIZAÇÃO DAS
COMPONENTES INDEPENDENTES
DIPFIT2: LOCALIZAÇÃO DE
FONTE DOS DIPOLOS
ICA: EXCLUSÃO DE ARTEFATOS
EXCLUSÃO DE CANAIS RUIDOSOS
STUDY
• STUDY DO GRUPO TODO
FILTRO RESIDUAL: 25%
PCA/NEURAL NETWORKS TOOLBOX
UM COMPONENTE POR SUJEITO
EXCLUSÃO DE CLUSTERS ABAIXO
DO CÓRTEX CINGULADO
ANÁLISE DE ERP/ERSP
STUDY
FB
STUDY
FP
Figura 2 - Fluxograma da análise dos dados de eletroencefalografia para a análise de ERP e ERSP e ITC de judocas com diferentes níveis de
expertise. FB = Faixa Branca; FP = Faixa Preta; ERP=Event Related Potentials; ERSP = Event-Related Spetral Perturbation; ICA = Independent
Component Analysis
A realização do teste se deu em quadra coberta, com remarcações em 0/40 e 20
metros, bem como cinco metro de espeço para os períodos de descanso e preparação. Os
participantes realizaram 5 a 7 minutos de aquecimento, seguido de uma familiarização
sonora.
4.6.2. SJFT
O SJFT tem por principais objetivos analisar a eficiência da aplicação de golpes
e a eficiência cardiovascular o judoca. Esse teste foi realizado sempre em tatame
apropriado a quedas e com o sujeito vestindo um frequencímetro (RS800CX training
computer, Polar®, Finland). O teste consiste na aplicação do maior número possível do
golpe ipon-seoi-nage em dois indivíduos que estão separados a uma distância de seis
metros. O executante (tori) inicia o teste a três metros de cada oponente (uke’s) e o tempo
do teste é dividido em três partes, sendo: 15, 30 e 30 segundos, com intervalo de dez
segundos entre cada período. A frequência cardíaca foi aferida imediatamente ao fim do
teste (FCfinal) e um minuto após do final do teste (FC1min.), além ainda do registro do
número de golpes aplicados. Os dados são inseridos na equação a seguir, que gerará um
índice referente ao desempenho do judoca no teste, com classificação de desempenho pré-
estabelecida.
Í𝑛𝑑𝑖𝑐𝑒 =𝐹𝐶𝑓𝑖𝑛𝑎𝑙(𝑏𝑝𝑚) + 𝐹𝐶1𝑚𝑖𝑛.(𝑏𝑝𝑚)
nº de golpes
Os indivíduos realizavam esse teste com pessoas equivalentes ao seu peso (igual,
até 5% a mais ou até 5% a menos). O teste foi validado por Franchini e colaboradores
(118).
4.7. ANÁLISE ESTATÍSTICA
A comparação sobre o comportamento de ondas (ERP) e comparação de tempo-
frequência se deu pelo EEGLAB parametric statistics, utilizando teste t de Student. Os
dados referentes ao desempenho cognitivo, antropometria e testes de aptidão física foram
tabulados em software de análise estatística. Foram adotados como parâmetros de
normalidade dos dados os coeficientes de simetria (skewness) e achatamento (kurtosis)
dos dados, sendo considerados normais valores menores que o dobro do erro padrão, para
ambos os coeficientes. Assumindo-se a normalidade, os dados foram apresentados em
média e desvio padrão. O teste t Student para amostras independentes foi utilizado para a
comparação entre os grupos. Adicionalmente, dado de caracterização geral da amostra
38
que apresentaram diferenças significantes (p < 0,05) entre os grupos com potencial fator
de confusão (Idade, escolaridade, VO2max e/ou Índice SJFT), foram alocadas como
variável de controle, realizando-se uma análise de covariância (ANCOVA). Foi adotada
a significância de p < 0,05 para todas as comparações.
5. RESULTADOS
Os dados apresentados na tabela 1 representam as características referentes a
idade, massa corporal, estatura, VO2 máximo estimado e índice SJFT dos judocas faixa
preta e branca.
Tabela 1 – Informações sobre as características gerais da amostra, com informações de
idade (em anos), estatura (em centímetros), massa corporal (em quilogramas), volume
máximo de oxigênio (em mililitros por quilogramas por minutos) e índice gerado pelo
Special Judô Fitness Test
Faixa Preta
(n=16)
Faixa Branca
(n=18)
t P-valor
Idade (anos) 26,5 ± 7,9 25,2 ± 5,6 0,571 0,571
Escolaridade (anos) 19,8 ± 4 20,5 ± 3,4 0,424 0,676
Estatura (cm) 172,2 ± 8,1 172 ± 8 0,090 0,929
Massa (kg) 71,9 ± 13,6 68,7 ± 12,4 0,708 0,484
VO2máx (ml/kg/min) 43,5 ± 3,8* 40,8 ± 1,7 2,467 0,020
Índice SJFT 13,1 ± 1,2* 15,5 ± 1,8 3,901 0,001 SJFT = Special Judo Fitness Test
Nas comparações em grupos sobre percentual de acerto (t=0,904; p=0,373), tempo
de reação dos estímulos congruentes (CG: t=0,646; p = 0,523), tempo de reação dos
estímulos incongruentes (IG: t=0,648; p = 0,522) e diferença do tempo de reação entre
respostas congruentes e incongruentes (efeito Stroop / ΔTR) (t=0,155; p = 0,878) não
foram encontradas diferenças significativas. Os gráficos comparativos estão
representados na figura 3.
39
A tabela 2 descreve o número de componentes (de acordo com os critérios
estabelecidos), as coordenadas e suas respectivas áreas de Brodmann dos centroides
encontrados quando analisados os grupos separadamente sobre quais áreas foram ativadas
durante a realização do teste cognitivo. Adicionalmente a figura 4 mostra suas
localizações espaciais através do corte transversal (z).
Tabela 2 – Áreas neuroanatômicas ativadas durante a realização do Stroop Test,
número de componentes do cluster, área de Brodmann e coordenadas (x, y, z) dos
centroides de cada grupo, separadamente. FAIXAS PRETAS FAIXAS BRANCAS
Lobe / Areas NC AB X Y Z Lobe / Areas NC AB X Y X
Lobo Frontal /
aPFC (E)
9 10 -35 52 6 Lobo Frontal /
aPFC (E)
11 10 -28 44 11
Lobo Frontal /
DLPFC (E)
10 9 -14 50 31 Lobo Frontal /
PMC (E)
10 4 -37 -18 56
Lobo Frontal /
OFC
9 11 -4 44 -11 Lobo Frontal /
PMC (D)
12 4 16 -25 65
Lobo Límbico /
ACC (E)
10 24 -19 -2 49 Lobo Parietal /
Pc (D)
11 39 39 -66 33
Lobo Occipital /
cOL (D)
11 7 14 -74 31 Lobo Occipital /
cOL (E)
12 19 -3 -85 30
Lobo Parietal / Pc
(E)
13 7 -18 -59 37 Lobo Parietal /
Pc (E)
14 31 -12 -49 26
NC = número de componentes; AB = Área de Brodmann; E = esquerdo; D = direito; aPFC = córtex pré-
frontal anterior; ACC = córtex cingulado anterior; DLPFC = córtex pré-frontal dorsolateral; OFC = córtex
orbito frontal; PMC = córtex pré-motor; cOL = lobo occipital, cuneus; Pc = precuneus.
Figura 3 – Comparações de percentual de acerto (A), tempo de reação das respostas
congruentes, em milissegundos (B), tempo de reação das respostas congruentes, em
milissegundos (C) e diferença dos tempos de reação das respostas incongruentes pelas respostas
congruentes (D) entre os grupos. FP = Faixa preta; FB = Faixa branca; TR = tempo de reação;
Δ = delta / subtração.
40
FAIXA PRETA FAIXA BRANCA
Figura 4 – Visão transversal (z) da localização do centróide médio (ponto em vermelho)
de cada grupo, separadamente, durante a realização do Stroop Test. aPFC = córtex pré-
frontal anterior; ACC = córtex cingulado anterior; DLPFC = córtex pré-frontal
dorsolateral; OFC = córtex orbito frontal; PMC_e = córtex pré-motor esquerdo; PMC_e
= córtex pré-motor direito; cOL = lobo occipital, cuneus; Pc_e = precuneus esquerdo;
Pc_d = precuneus direito.
A tabela 3 descreve o número de componentes (de acordo com os critérios
estabelecidos), as coordenadas e suas respectivas áreas de Brodmann dos centroides
(ponto em vermelho) quando analisados o grupo todo sobre quais áreas foram ativadas
durante a realização do teste cognitivo. Adicionalmente, a figura 5 mostra as suas
localizações espaciais através dos três planos anatômicos (x, y, z), bem como seus
respectivos componentes (pontos em azul e preto).
Pc_e
ACC
DLPFC
cOL
OFC
Pc_e
aPFC aPFC PMC_l
PMC_d Pc_d
cOL
z = 14
z = -35
z = -18
z = -19
z = -14
z = -7
z = -12
z = -37 z = -28
z = 16
z = -3
z = 39
41
Tabela 3 – Clusters com mais componentes ativados durante a realização do teste
cognitivo
Lobo / Area NC AB X Y Z
Lobo Frontal / aPFC (E) 22
10 -
33 41 19
Lobo Occipital / Cuneus / cOL (E) 24 7 3 -81 36
Lobo Parietal / Córtex Cingulado Posterior / PCC
(E)
25 31
-
15 -49 32
NC = número de componentes; AB = Área de Brodmann; E = esquerdo; aPFC = córtex pré-frontal
anterior; cOL = lobo occipital, cuneus; PCC = Córtex Cingulado Posterior.
Sagital Coronal Axial
aP
FC
cOL
PC
C
Figura 5 – Visão topográfica dos clusters e seus respectivos componentes de ambos os
grupos. Pontos em preto representam os componentes dos faixas pretas, pontos em azul
representam os componentes dos faixas brancas e pontos em vermelho representam os
centroides dos clusters. aPFC = córtex pré-frontal anterior; cOL = lobo occipital,
cuneus; PCC = Córtex Cingulado Posterior.
Os ERP’s relacionados a área cOL não apresentaram diferenças entre os grupos
(p > 0,05). Por outro lado, aPFC e PCC apresentaram diferenças significantes para ambos
42
os estímulos (congruente e incongruente), em diferentes períodos de tempo. Os estímulos
CG na área aPFC apresentaram maiores picos de negatividade em FB entre 180 e 230 ms
(Pico: t = 2,71; p = 0,006; Latência: t = 1,93; p = 0,088) e entre 440 e 520 ms (Pico: t =
2,14; p = 0,035; Latência: t = 0,78; p = 0,447), como visto na figura 6a. Na mesma área,
estímulos IG apresentaram diferenças entre 590 e 690 ms (Pico: t = 2,90; p = 0,003;
Latência: t = 0,16; p = 0,872), como visto na figura 6b. Períodos de tempo demarcados
em vermelho apresentam os períodos de diferença estatística significante descritas.
Nos estímulos CG da área PCC, foi encontrado um maior pico positivo em FB
entre 250 e 290 ms (Pico: t = 2,21; p = 0.046; Latência: t = 0,97; p = 0,343), como pode
ser visto na figura 7a. Nos estímulos IG, a diferença encontrada foi entre 240 e 300 ms
(Pico: t = 2,21; p = 0,044; Latência: t = 0,92; p = 0,376), como pode ser visto na figura
(A)
(B)
aPFC, FP vs FB, CG
aPFC, FP vs FB, IG
Figura 6 – Comparação dos ERP's das grandes médias dos estímulos congruentes (A) e
incongruentes (B) na região do aPFC. ERP = event-related potentials; aPFC = córtex
pré-frontal anterior; FP = Faixas Pretas; FB = Faixas Brancas; CG = estímulos
congruentes; IG = estímulos incongruentes; barra verde = média do tempo de reação
para faixas brancas; barra azul = média do tempo de ração para faixas pretas.
43
7b. Períodos de tempo demarcados em vermelho apresentam os períodos de diferença
estatística significante descritas.
Para a realização da ANCOVA, foram extraídos os valores de pico das janelas de
tempo que foram encontradas as diferenças significativas de ERP e controladas pelas duas
variáveis de caracterização da amostra que apresentaram diferenças significativas
(VO2max e SJFT). Não foram diferenças estatísticas significantes para nenhuma das
janelas de tempo, como descrito na tabela 5.
Figura 7 – Comparação dos ERP's das grandes médias dos estímulos congruentes (A)
e incongruentes (B) na região do PCC. ERP = event-related potentials; PCC = córtex
cingulado posterior; FP = Faixas Pretas; FB = Faixas Brancas; CG = estímulos
congruentes; IG = estímulos incongruentes; barra verde = média do tempo de reação
para faixas brancas; barra azul = média do tempo de ração para faixas pretas
(A)
(B)
PCC, FP vs FB, IG
PCC, FP vs FB, IG
44
Tabela 4 - Valores da análise de covariância, utilizando como variáveis de controle
VO2max e índice gerando pelo SJFT, para cada janela de tempo de ERP onde não foram
encontradas diferenças entre os grupos.
VO2max Índice SJFT
Janela F P-valor F P-valor
aPFC CG
180 – 230 ms
440 – 520 ms
2,211
0,301
0,153
0,590
2,940
1,890
0,172
0,228
IC 590 – 690 ms 1,384 0,254 0,170 0,689
PCC CG 250 – 290 ms 3,741 0,461 0,335 0,576
IG 240 – 300 ms 1,599 0,413 0,016 0,902 aPFC = córtex pré-frontal anterior; PCC = córtex cingulado posterior; CG = estímulos congruentes; IG =
estímulos incongruentes; SJFT = Special Judo Fitness Test
A análise de tempo-frequência revelou diferenças significativas entre os grupos
em diferentes frequências e momentos nas áreas aPFC e cOL, enquanto que a área PCC
não apresentou pontos de significância. A tabela 4 descreve as frequências os respectivos
tempos em que as diferenças significativas foram apresentadas. Complementarmente, a
figura 8 demonstra os pontos de diferença significantes (áreas demarcadas em vermelho)
para ambos tipos de estímulo, nas duas áreas cerebrais analisadas.
Tabela 5 - Descrição das janelas temporais que apresentaram diferenças significativas
em delta, theta, alpha, beta e gama, para estímulos congruentes e incongruentes, na
áreas aPFC e cOL, comparando FP e FB.
aPFC cOL
Δ CG
IG 250 – 650 ms 650 – 900 ms
θ CG 0 – 250 ms
IC 250 – 650 ms
α
CG 180 – 1200 ms
IG 120 – 550 ms
850 – 1150 ms
β
CG 180 – 1200 ms
IG 120 – 550 ms
850 – 1150 ms
γ CG
IG 650 – 950 ms FP = Faixa preta; FB = Faixa Branca; aPFC = córtex pré-frontal anterior; cOL = lobo occipital, cuneus; Δ
= delta / 1 – 3 Hz; θ = theta / 4 – 7 Hz; α = alpha / 8 -14 Hz; β = beta / 15 – 30 Hz; γ = 31 – 55 Hz; CG =
estímulos congruentes; IG = estímulos incongruentes.
(C)
(D)
ESTÍMULOS INCONGRUENTES
ESTÍMULOS CONGRUENTES
aPFC FB FP ESTÍMULOS CONGRUENTES
ESTÍMULOS INCONGRUENTES
cOL FB FP (A)
(B)
Figura 8 - Comparação dos ERSP's, separados por áreas e tipos de estímulos. (A) comparação em aPFC para estímulos congruentes; (B) comparação em
aPFC para estímulos incongruentes; (C) comparação em cOL para estímulos congruentes; (D) comparação em cOL para estímulos. cOL = lobo occipital,
cuneos; FP = Faixas Pretas; FB = Faixas Brancas; barra cinza = média do tempo de reação para faixas brancas; barra preta = média do tempo de ração para
faixas pretas.
6. DISCUSSÃO
O objetivo desse estudo foi comparar o desempenho cognitivo e eletrofisiológico
de judocas experientes (faixas pretas; FP) e iniciantes (faixas brancas; FB). De acordo
com as evidências presentes na literatura, foi hipotetizado que os atletas mais experientes
apresentariam desempenho cognitivo melhor no Stroop Test acompanhado de uma menor
amplitude de ativação neural, o que representaria o princípio da “eficiência neural”. Nesse
estudo, foi demonstrado que os grupos não apresentaram diferenças estatisticamente
significativas em porcentagem de acerto e nos tempos de reação analisados, o que
possivelmente se deu pela baixa sensibilidade do teste em discriminar diferenças entre
públicos e/ou por não ser um teste cognitivo que envolva fatores diretamente relacionados
ao judô. No entanto, na análise eletroencefalográfica, foi evidenciado que os atletas mais
experientes apresentaram menor amplitude de ativação no córtex pré-frontal anterior
(aPFC) e córtex cingulado anterior (PCC) nas análises de ERP. Encontrou-se, também,
um padrão de maior de-sincronização neuronal em atletas faixas pretas nas áreas aPFC e
lobo occipital (cOL) nas bandas de frequência delta, theta, alpha, beta e gama em diversas
janelas temporais. Quando analisados os grupos separadamente, as áreas cerebrais
solicitadas durante a realização do teste cognitivo também apresentaram diferenças entre
os grupos, tendo o grupo FP maior recrutamento de áreas do lobo frontal. Nesse sentido,
os resultados encontrados nesse estudo confirmam parcialmente as hipóteses
estabelecidas a priori. Adicionalmente, foram encontradas diferenças na potência aeróbia
geral (VO2máx) e especifica da modalidade Judô (SJFT), mas sem que o VO2máx
influenciasse no comportamento de onda.
Nos estímulos congruentes foram encontradas diferenças na amplitude de onda no
sentido negativo no período aproximado a 200 ms após a apresentação do estímulo do
teste Stroop. Picos negativos nesse período são descritos na literatura como N200 (119)
e tem sido associado a atenção seletiva, precursão de resposta motora e monitoramento
da ação e conflito (120,121). Alguns autores demostraram que esse período de onda é
sensível a diminuição de sua amplitude em sujeitos com maior aptidão física ligadas a
(107,122), o que corrobora com nossos achados referentes ao VOmax e possivelmente
explica tal resultado. Por outro lado, o aumento a predominância top-down atencional no
monitoramento de respostas, que está ligada a expertise esportiva, pode explicar tal
comportamento de onda (122), como em ações antecipatórias onde o monitoramento de
respostas é fundamental (123). Os estímulos congruentes também apresentaram
diferenças no pico aproximado a 440 ms. Especificamente no Stroop Test, espera-se
47
diferenças nesse período temporal, por esse ser associado a recepção do conflito gerado
pela tarefa, mesmo em tarefas congruentes (91). O desempenho comportamental e
atividade eletrofisiológica podem ser considerados reflexos de modulação advinda da
expertise em práticas esportivas, especialmente em esportivas de combate que exigem
níveis de atenção minuciosa que poderão determinar o sucesso ou fracasso resultantes das
tomadas de decisões durante as lutas (119,124). Logo, os padrões de ERP associados a
tempo de prática podem estabelecer uma avaliação mais acurada do perfil cognitivo do
atleta.
A diferença encontrada no PCC se deu no sentido positivo da curva de ERP, com
inicio em aproximadamente 250 ms para estímulos congruentes e 240 ms para estímulos
incongruentes, apontando para as diferenças em P300 (125,126). Em tarefas atencionais,
esse potencial tem sido ligado a discriminação dos tipos de estímulos (120,127). Menores
amplitudes e latências em P300 significam esforço reduzido e automatização no
processamento para completar a tarefa, o que reflete uma menor necessidade atencional
cerebral para a tomada de decisão, além de uma melhor seleção e processamento de
estímulos relevantes (127,128). Diferenças em amplitude e latência em P300 na região
posterior cerebral, mediadas pelo nível de experiência, também foram encontradas em
estudos envolvendo jogadores de cricket quando submetidos a teste de percepção, onde
participantes com mais expertise apresentaram resultados semelhantes aos nosso em
relação ao pico de onda (127). Assim, judocas faixas pretas parecem obter um padrão de
dispersão de onda melhor quando comparados a sujeitos com menor tempo de
treinamento (ver figura 7), o que corrobora as modulações eletrofisiológicas associadas
prática esportiva.
O ERSP identifica mudanças significativas de sincronização ou de-sincronização
dos neurônios piramidais no espetro de potência em componentes ou canais relacionados
ao evento, ao longo do tempo e em uma determinada faixa de frequência (129–131). De
forma geral, esse tipo de análise generaliza as análises de ERS e ERD. Os achado do
presente estudo indicam um padrão de de-sincronização mais amplo em FP em delta,
theta e gama na região aPFC e delta, theta, alpha e beta na região cOL. Análise dos ritmos
cerebrais que precedem o momento de resposta ao estímulos são especialmente
importantes para identificação dos comportamento de oscilação dos sujeitos (9). Nesse
sentido, as principais diferenças em aPFC foram em tetha em estímulos CG e delta e theta
para estímulo IG, ambas sinalizando maior amplitude de ERD para FP. Mudanças no
ritmo delta são principalmente apresentadas em paradigmas envolvendo estímulos visuais
48
e estão associadas a seleção atencional (132). Considerando que os estímulos IG
envolviam uma necessidade maior de recursos atencionais, pode-se considerar o aumento
da atividade de-síncrona representa uma busca mais elaborada pela seletividade da
atenção por parte dos FP. A frequência theta, quando relacionada a estímulos cognitivos,
tem papel importante na codificação e construção da resposta ao estímulo (9), o que pode
ser especialmente importante no momento de tomada decisão atlética, considerando a
constante necessidade de processamento de informações táticas durante a prática
esportiva dos judocas.
A região occipital apresentou diferenças entre os grupos nas bandas de maior
interesse: alpha e beta, além de diferenças em delta. O ritmo alpha em esportistas vem
sendo estudado devido sua intima relação com a capacidade de controle cognitivo e sendo
o reflexo de um inibição global do córtex (9). Maiores amplitudes em alpha representam
um estado de relaxamento, mas que envolve foco atencional precedente a uma ação
motora, cognitivamente representado pela capacidade de inibir estímulos distratores e/ou
conflitante (133). Esse perfil de aumento do foco atencional parece ter um padrão de ser
gradual em atletas com maior experiências e de extrema importância que o sucesso da
ação motora seja alcançado (32,100). Estratégias para que se aumente a amplitude de
ERD em alpha (ex. imagética motora) tem sido utilizadas a fim de que se obtenha
incremento na performance desportiva (134). Mudanças no ritmo beta também tem sido
exploradas no âmbito esportivo. A ocorrência de beta se dá a nível de execução e
observação (114), sendo um potencial marcador no treinamento imaginário. Nesse
sentido, um incremento em ERD em atletas parecem ser interessantes, por estarem
relacionados a melhores cenários de desempenho neuronal.
Interessantemente, na região aPFC, apesar de menor amplitude de onda na análise
temporal (ERP), o padrão de ERD foi maior em FP, enquanto que acreditava-se que esse
relação seria positiva que a amplitude de ERD seria menor em FP. Dessa forma, os dados
reforçam o fato de que ERP e ERSP são análises que se complementam para um melhor
entendimento das respostas cerebrais frente à estímulos cognitivos, sendo o ERSP um
mais robusto e preciso nas análises, uma vez que é mais específicos em relação ao poder
espectral de cada faixa de frequência em função do tempo (129). Nesse sentido, é
interessante pensar que mesmo que a dispersão da onda de ERP pareça “mais econômica”,
a necessidade exponencial do atleta com maior tempo de treino de exercer controle
atencional sobre a resposta a ser dada é presente, bem como um adaptação positiva do
atleta quando confrontado a estímulos cognitivos. Além disso, a literatura tem indicado
49
que as análises de ERP são limitadas, uma vez que essas fornecesse uma média de um
conjunto de dados, de diversas frequências em determinando momento, fornecendo uma
informação unidimensional, enquanto que análises de frequência, em especial através de
ERSP, fornece informações a respeito de movimentos oscilatórios cerebrais produzidos
a partir de eventos experimentais (129). Isso nos leva a reflexão sobre a robustez de
resultados baseados em análises de dados sobre somente um ótica (ex.: ERP ou ERS ou
ERD) e geralmente presas a janelas temporais fechadas (ex.: 350-500ms = N450).
Este estudo evidenciou que FB recrutaram áreas corticais diferentes de FP durante
a tarefa Stroop, sendo os FP recrutando áreas predominantemente frontais (aPFC, OFC,
DLPFC e ACC), enquanto que FB necessitaram do recrutamento mais expansivo de áreas
(aPFC e PMC bilateralmente). Uma das possíveis explicações para essa necessidade de
mais áreas corticais envolvidas na tarefa por parte dos FB, se deve a necessidade de
recrutamento de mais áreas corticais para desenvolver uma determinada tarefa. Em
contrapartida, pessoas com maior tempo de treinamento parecem ter uma forma de
recrutamento neural mais direcionada, além de uma capacidade de organização mais
focalizada e menos recursos para inibir estímulos irrelevantes ou distratores. (135,136).
Adicionalmente, considerando, ainda, o padrão de oscilação neuronal encontrada nesse
estudo, levanta-se o questionamento de até quanto o tamanho da área atividade pode estar
associada e/ou interferir na amplitude de sinal encontrado.
Do ponto de vista prático, a necessidade de focalização da atenção para a
resolução de conflito – necessária nas respostas do Stroop Test – se apresenta como
inerente ao processo de tomada de decisão, bem como passível de desenvolvimento
através da prática de artes marciais (119). Dessa forma, o perfil desportivo e o
desenvolvimento da prática motora em longo prazo parecem contribuir não só com o
desenvolvimento morfológico cerebral (21), mas também refletir um padrão de
recrutamento e disparo neurais peculiares, tornando os processos neurais mais
especializados (11,33), refletindo os objetivos do treinamento desportivo. Dessa forma,
um circuito neural reforçado através da automatização neural e frequentemente acessado
pelo atleta, pode refletir a construção tática dentro do alto rendimento, podendo ser, por
exemplo, ponto crucial para a aplicação de um golpe no tempo e oportunidades corretos.
Um dos fatores que estão fortemente associados ao desenvolvimento e
aperfeiçoamento da performance cognitiva é o desenvolvimento da capacidade aeróbica
(42,103), de forma que as respostas ligadas as adaptações cardiovasculares tendem a
aperfeiçoar respostas neurais (137). Nesse sentido, apesar de nossos dados apresentarem
50
diferenças significativas nos valores de VO2max e índice SJFT entre os grupos, estes
parâmetros não foram fatores determinantes associados ao comportamento neuronal
como demonstrado pela análise de covariância (p > 0.05), levando-nos a crer que
características específicas ligadas a experiência esportiva são determinantes no
comportamento neuronal, e não a potência aeróbica. Em se tratando de SJFT, que propõe
a análise específica para o Judô (118), mostrou-se sensível para diferenciar níveis de
desenvolvimento interno na luta, identificando diferenças entre faixas e/ou níveis de
experiência. Dessa forma, os nossos dados confirmam que o grupo mais experiente na
modalidade foi significativamente melhor quando comparado ao grupo menos experiente
em parâmetros ligados a eficiência cardiovascular e motora ligadas à prática de judô
(138).
Este estudo contribui para avanço da ciência a respeito do entendimento sobre
como a experiência desportiva pode estabelecer marcos de mudança do comportamento
eletrocortical, confirmando o que tem sido mostrado por diversos estudos, sobre o
comportamento particular de atletas mais experientes esportivamente quando comparados
a seus pares menos experientes (12,27,33). Nesse sentido, é possível inferir que a
capacidade de promover mais de-sincronização neural, mesmo com amplitudes de onda
menores, é uma virtude associada a prática esportiva frente a necessidade de trabalho
cognitivo. Do ponto de vista neurocientífico, mostramos que a dinâmica cerebral atlética
possui muitas particularidades que necessitam ser compreendidas e quem nem sempre
corroboram com teorias, de certa forma, consolidadas.
Embora a eletroencefalografia possua altíssima precisão temporal, o uso em
conjunto de técnicas com maior precisão espacial, tais como ressonância magnética
funcional, é necessário para localizar com um maior grau de precisão a localização da
mudança da atividade neural, bem uma maior acurácia a respeito do próprio recrutamento
neural. Em segundo lugar, a construção de paradigmas que representem mais fielmente
as demandas do esporte (exemplo no Judô: pegada, domínio de lapela) podem levar a
respostas mais consistentes a respeito das demandas neurocognitivas relativas a
especificidade do esporte e respostas comportamentais, uma vez que a literatura mostra
que para testes específicos da modalidade pesquisa, atletas tem respostas mais rápidas e
acuradas (39). Em terceiro lugar, é importante frisar que o teste empregado neste estudo
não tem por objetivo, originalmente, comparação de desempenho, o que o tornou
insensível para este objetivo, considerando, ainda, que as respostas podem apresentar
variabilidade em função do tipo de esporte e valência cognitiva analisada (139).
51
7. CONCLUSÃO
Estudos têm indicado que funções neurocognitivas são fundamentais no âmbito
esportivo (11,22), e podem ser retroalimentadas pela prática extensiva de exercício físico
(42). Os achados deste estudo demonstram que o treinamento em longo prazo pode
modular o recrutamento neural e o comportamento eletrofisiológico de atletas com maior
tempo de prática em judô. Apesar da não diferenciação na resposta comportamental, os
judocas apresentaram a capacidade de concentração de recrutamento neural em áreas
corticais que são protagonistas na resolução de paradigmas cognitivos, bem como uma
menor amplitude de onda após a recepção de estímulo visual, apesar de um maior padrão
de de-sincronização neural em frequências ligadas a capacidade atencional, inibição,
observação e construção de respostas motores.
52
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63
LISTA DE APÊNDICES E ANEXOS
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) – APÊNDICE I
Folha de aprovação do Comitê de Ética – ANEXO I
64
APÊNDICE I
65
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO – TCLE
Este é um convite para você participar da pesquisa: Perfil Cognitivo de Atletas de
Judô, que tem como pesquisador responsável Heloiana Karoliny Campos Faro e orientada
pelo Prof. Dr. Eduardo Bodnariuc Fontes.
Esta pesquisa pretende verificar o perfil cognitivo em judocas.
O motivo que nos leva a fazer este estudo é explorar como se configura as funções
cognitivas em atleta de lutas, levando em conta as características adquiridas com
experiência desportiva.
Caso você decida participar, você deverá responder questionários sobre prontidão
para atividade física, estresse, sono, qualidade de vida, interocepção, ansiedade,
depressão, uso medicamentoso e ergogênicos, e aspectos socioeconômicos. Participará
de testes cognitivos ligados a funções cognitivas, realizará teste físico específico de Judô
e de Consumo máximo de oxigênio e passara por mensurações de ligadas a composição
corporal.
Durante a realização será utilizado aparelho de leitura de sinais elétricos cerebrais
(eletroencefalograma) e você passará por avaliação física utilizando os métodos de
perimetria e dobras cutâneas. A previsão de riscos é mínima, ou seja, o risco que você
corre é semelhante àquele sentido num exame físico ou psicológico de rotina.
Pode acontecer um desconforto durante a realização do teste cognitivo específico,
envolvendo gestos técnicos do Judô que será minimizado pela presença constante de
profissionais capacitados e você terá como benefício de receber os resultados de todas as
avaliações realizadas. Em caso de algum problema que você possa ter, relacionado com
a pesquisa, você terá direito a assistência gratuita que será prestada pelo Sistema Único
de Saúde e pelo pesquisador responsável.
Durante todo o período da pesquisa você poderá tirar suas dúvidas ligando para
Heloiana Karoliny Campos Faro, (84) 998006100.
Você tem o direito de se recusar a participar ou retirar seu consentimento, em
qualquer fase da pesquisa, sem nenhum prejuízo para você.
Os dados que você irá nos fornecer serão confidenciais e serão divulgados apenas
em congressos ou publicações científicas, não havendo divulgação de nenhum dado que
possa lhe identificar.
Esses dados serão guardados pelo pesquisador responsável por essa pesquisa em
local seguro e por um período de 5 anos.
66
__________________ (rubrica do Participante) ___________________ (rubrica do Pesquisador)
Se você tiver algum gasto pela sua participação nessa pesquisa, ele será assumido
pelo pesquisador e reembolsado para você, caso solicite.
Se você sofrer algum dano comprovadamente decorrente desta pesquisa, você será
indenizado.
Qualquer dúvida sobre a ética dessa pesquisa você deverá ligar para o Comitê de
Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, telefone 3215-3135.
Este documento foi impresso em duas vias. Uma ficará com você e a outra com o
pesquisador responsável Heloiana Karoliny Campos Faro.
Consentimento Livre e Esclarecido
Após ter sido esclarecido sobre os objetivos, importância e o modo como os dados
serão coletados nessa pesquisa, além de conhecer os riscos, desconfortos e benefícios que
ela trará para mim e ter ficado ciente de todos os meus direitos, concordo em participar
da pesquisa Perfil Cognitivo de Atletas de Judô, e autorizo a divulgação das informações
por mim fornecidas em congressos e/ou publicações científicas desde que nenhum dado
possa me identificar.
Natal _______ de ______________ de 20____
________________________________________________________
Assinatura do participante da pesquisa
_________________________________________________________
Pesquisador Responsável:
Heloiana Karoliny Campos Faro
Av. Senador Salgado Filho s/n, Lagoa Nova
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN
Impressão datiloscópica do
participante
67
Natal, RN Caixa Postal-1666
CEP – 59.078-900
(84) 998006100
Comitê de Ética e Pesquisa
Comitê de Ética – UFRN
Praça do Campus Universitário, Lagoa Nova
Caixa Postal – 1666, CEP 0 59.078-970 Natal/RN
Telefone/Fax: (84)3215-3135
68
ANEXO I
69
70
71
72