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Como show de aberrações financiou uma revolução na medicina5 fotos No começo do século 20, feiras de aberrações atraíam multidões de curiosos nos EUA e na Europa, reunindo de engolidores de espadas, mulheres tatuadas e dançarinas burlescas a bebês prematuros expostos em urnas de cristal. Na feira Luna Park de Coney Island, em Nova York, estes "bebês de incubadora" faziam parte de uma exposição cuja entrada custava US$ 0,25. O doutor Martin Couney, um neonatologista pioneiro que oferecia a pais desesperados uma alternativa inovadora, quando os hospitais consideravam seus bebês desenganados AP No começo do século 20, feiras de aberrações atraíam multidões de curiosos nos EUA e na Europa, reunindo de engolidores de espadas, mulheres tatuadas e dançarinas burlescas a bebês prematuros expostos em urnas de cristal. Na feira Luna Park de Coney Island, em Nova York, estes "bebês de incubadora" faziam parte de uma exposição cuja entrada custava US$ 0,25. A exposição foi aberta em 1903 e se continuou em cartaz por 40 anos. Mas, por trás das estranhas urnas havia mais do que um homem de negócios: o doutor Martin Couney, um neonatologista pioneiro que oferecia a pais desesperados uma alternativa inovadora, quando os hospitais consideravam seus bebês desenganados. Era este dinheiro dos visitantes que financiava o trabalho gratuito de Couney. Um médico fora do sistema O médico se formou na Alemanha e mais tarde estudou em Paris com o doutor Pierre Budin, pioneiro na teoria das incubadoras fechadas, projetadas para manter o calor dos bebês e protegê-los dos germes. Apesar dos resultados positivos, as técnicas de Couney e Budin não se encaixavam no receituário da maioria dos hospitais da época.

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Page 1: Como Show de Aberrações Financiou Uma Revolução Na Medicina - Notícias - Ciência

Como show de aberrações financiou umarevolução na medicina5 fotos

No começo do século 20, feiras de aberrações atraíam multidões de curiosos nos EUA ena Europa, reunindo de engolidores de espadas, mulheres tatuadas e dançarinasburlescas a bebês prematuros expostos em urnas de cristal. Na feira Luna Park deConey Island, em Nova York, estes "bebês de incubadora" faziam parte de umaexposição cuja entrada custava US$ 0,25. O doutor Martin Couney, um neonatologistapioneiro que oferecia a pais desesperados uma alternativa inovadora, quando oshospitais consideravam seus bebês desenganados AP

No começo do século 20, feiras de aberrações atraíam multidões de curiosos nos EUA ena Europa, reunindo de engolidores de espadas, mulheres tatuadas e dançarinasburlescas a bebês prematuros expostos em urnas de cristal.

Na feira Luna Park de Coney Island, em Nova York, estes "bebês de incubadora" faziamparte de uma exposição cuja entrada custava US$ 0,25.

A exposição foi aberta em 1903 e se continuou em cartaz por 40 anos.

Mas, por trás das estranhas urnas havia mais do que um homem de negócios: o doutorMartin Couney, um neonatologista pioneiro que oferecia a pais desesperados umaalternativa inovadora, quando os hospitais consideravam seus bebês desenganados.

Era este dinheiro dos visitantes que financiava o trabalho gratuito de Couney.

Um médico fora do sistema

O médico se formou na Alemanha e mais tarde estudou em Paris com o doutor PierreBudin, pioneiro na teoria das incubadoras fechadas, projetadas para manter o calordos bebês e protegê-los dos germes.

Apesar dos resultados positivos, as técnicas de Couney e Budin não se encaixavam noreceituário da maioria dos hospitais da época.

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Segundo conta Jeffrey P. Baker em um artigo sobre a história das incubadoras, Couneyse queixava de ser visto como simples empresário, já que foi o "salvador" de milharesde crianças.

Ele afirmava que fazia "campanha pelos devidos cuidados aos prematuros".

Na prática, afirma Baker, as exposições de bebês prematuros no começo do século 20ofereciam um tecnologia para cuidados médicos que nenhum hospital da épocapossuía.

Nas mostras, os bebês eram atendidos por médicos e enfermeiras que se revezavam emturnos.

O próprio doutor estimou ter mantido vivos entre 1903 e 1943 cerca de 7,5 mil dos 8,5mil prematuros que passaram por suas incubadoras de exposição.

Um destes bebês sobreviventes é Beth Allen, que nasceu prematura em 1941, com umairmã gêmea que não sobreviveu ao parto.

Foi o pai de Beth que registrou o trabalho de Couney em fotografias. É ela que aparecenos braços do próprio doutor Couney, na foto que ilustra o alto desta página.

Em entrevista à agência de noticias AP, Allen contou que a sua mãe a princípio nãoqueria pôr a filha em uma das incubadoras de Coney Island, mas foi convencida pelopai.

A mulher, que hoje tem 74 anos e mora em Nova Jersey, considera assustador oespetáculo de prematuros, algo impensável hoje em sua opinião.

"Quanto mais envelheço, mais aprecio a oportunidade que me foi dada para estar aquihoje falando com você e para viver a vida maravilhosa que tive", afirmou.

'Acho que pesava apenas uns 900 gramas'

Lucille Horn, nascida em 1920, é outro bebê prematuro que sobreviveu graças àsmostras de prematuros.

"O meu pai me disse que eu era tão pequena que eu cabia na palma da sua mão",afirmou à própria filha em uma entrevista para o projeto StoryCorps, uma iniciativaamericana de registro de histórias pessoais em áudio.

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"Acho que pesava apenas uns 900 gramas, e não podia sobreviver por conta própria,era muito frágil", diz ela na gravação.

Lucille também tinha uma irmã gêmea que morreu no parto. No hospital, não lhederam a menor esperança de vida.

Mas ela conta que o pai não se deu por vencido: envolveu a criança numa toalha e alevou num táxi até Coney Island, onde o doutor Couney mantinha a exposição deprematuros.

E ali Lucille passou seis meses.

A hoje nonagenária afirma que quando era adolescente voltou à feira de aberraçõespara ver os bebês. E decidiu se apresentar ao doutor Couney ao vê-lo.

"Havia um homem em frente a uma incubadora olhando para o seu bebê, e o doutorCouney se aproximou e o tocou no ombro", relembra Lucille.

"Olhe esta jovem, é um de nossos bebês. E é assim que o seu bebê irá crescer", afirmouo médico ao pai agoniado, segundo a sobrevivente.

Popularização demorada

A invenção da incubadora em 1880 alimentou décadas de entusiasmo popular emédico, mas o desenvolvimento da tecnologia foi lento nos 50 anos seguintes.

Um artigo publicado em 2000 na revista especializada Journal of Perinatology apontaque é importante considerar esta história não apenas pelo lado tecnológico, mas sob aperspectiva da responsabilidade em relação ao recém-nascido, e como esta foi sendotransferida das mães aos obstetras e, depois, aos pediatras.

O doutor Couney morreu em 1950, pouco depois da popularização das incubadoras noshospitais.

Atualmente, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), 15 milhões deprematuros nascem por ano - são prematuros os nascimentos registrados antes da 37ªsemana de gestação, das 40 de praxe.

Cerca de um milhão desses bebês não sobrevive. E muitas destas mortes podem serevitadas mantendo apenas o calor dos bebês.

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A temperatura do corpo de um bebê cai logo que ele deixa o ambiente controlado doútero materno. Por isso é importante regular a sua temperatura após o parto.

Ocorre, contudo, que prematuros possuem pouca gordura corporal, daí a capacidadereduzida de controlar a própria temperatura - e a importância do experimento do dr.Couney.

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